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  • SUPORTE NUTRICIONAL NO PACIENTE IDOSO:DEFINIO, DIAGNSTICO, AVALIAO E INTERVENO

    NUTRITIONAL SUPPORT IN GERIATRIC PATIENTS:DEFINITION, DIAGNOSIS, ASSESSMENT AND THERAPEUTIC

    Jlio Srgio Marchini1, 2; Eduardo Ferriolli2 & Julio Cesar Moriguti2

    1Docente da Diviso de Nutrio Clnica; 2Mdico Assistente da Diviso de Clnica Mdica Geral e Geriatria. Departamento de ClnicaMdica da Faculdade de Medicina de Ribeiro Preto da Universidade de So Paulo.CORRESPONDNCIA: Prof. Dr. Jlio Srgio Marchini Diviso de Nutrio Clnica do Departamento de Clnica Mdica da Faculdade deMedicina de Ribeiro Preto - CEP: 14049-900 - Ribeiro Preto - SP; Email: [email protected]

    MARCHINI JS; FERRIOLI E & MORIGUTI JC. Suporte nutricional no paciente idoso: definio, diagnstico, avali-ao e interveno. Medicina, Ribeiro Preto, 31: 54-61, jan./mar. 1998.

    RESUMO: Atualmente, vem ocorrendo um aumento importante no nmero de pacientes ido-sos submetidos a internao hospitalar, mantidos em casas de repouso ou atendidos em regimeambulatorial, cujo estado nutricional pode ser considerado crtico. Assim, fundamental que asalteraes prprias do envelhecimento sejam o mais precocemente possvel diferenciadas dossinais clnicos de desnutrio. Um alto grau de suspeita clnica de pacientes idosos desnutridos,e que, conseqentemente, necessitam de teraputica nutricional, pode ser obtido por meio dahistria clnica, exame fsico e dados laboratorias apropriados. A m nutrio que ocorre no idosopode ser devida s alteraes fisiolgicas do envelhecimento, s condies scio-econmicas,s doenas e interao entre nutrientes e medicamentos. Assim sendo, as principais causas dem nutrio podem ser catalogadas como secundrias ao envelhecimento, menor rendimentoeconmico, isolamento, a morte de entes queridos, doenas e outros fatores relacionados. Comoresultado, o idoso apresenta srio comprometimento do estado geral e uma maior morbidade emortalidade em geral. A interveno nutricional utiliza nutrientes, como frmacos, visando o trata-mento de doenas. Por fim, as recomendaes tm por objetivo indicar a quantidade mnima denutrientes que seria adequada para a maioria das pessoas em seu ambiente usual, sem traumasou doenas. No entanto, as recomendaes, para o idoso so extrapoladas das recomendaesobtidas para crianas e adultos jovens, nem sempre prprias para o idoso.

    UNITERMOS: Nutrio. Idoso. Dietoterapia.

    Medicina, Ribeiro Preto, Simpsio: NUTRIO CLNICA31: 54-61, jan./mar. 1998 Captulo V

    1. INTRODUO

    Atualmente, vem ocorrendo um aumento impor-tante no nmero de pacientes idosos submetidos a inter-nao hospitalar(1), mantidos em casas de repouso(2)ou seguidos em regime ambulatorial(3), cujo estado nu-tricional pode ser considerado crtico(4). No Hospitaldas Clnicas da Faculdade de Medicina de RibeiroPreto, a ocorrncia desse fenmeno ntida: o nmerode internaes de pessoas jovens vem diminuindo; emcontraposio, o nmero de idosos internados vem au-mentando significativamente, Tabela I. A proporo de

    internaes entre as diferentes faixas etrias, tambmse alterou nitidamente, entre 1980 e 1995, apontando parao nmero crescente de idosos, Figura 1. Ao mdico, cabeo desafio de estabelecer um plano teraputico, visando arecuperao e reabilitao desses pacientes, cujo trata-mento freqentemente multidimensional. Independen-te da causa da internao, em pacientes com mais desessenta anos, existe uma correlao significativa entreos menores valores da rea muscular do brao (< quintopercentil), perda de peso (> 20% do peso habitual), hipo-prealbuminemia (

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    Suporte nutricional no paciente idoso

    Tabela I - Nmero de internaes no Hospital dasClnicas da Faculdade de Medicina de RibeiroPreto, de acordo com a faixa etria, nos anos de1980 e 1995

    Faixa etria 1980 1995 Variao %0-10 4117 2830 - 3111-20 1979 1548 - 2221-30 3179 1886 - 4131-40 1897 2236 + 1841-50 1300 2024 + 5651-60 915 1854 + 10361-70 734 1784 + 14371-80 316 1022 + 22381 + 116 286 + 147

    de 17% apresentam albuminemia menor que 3,5 g/dl emenos de 2% tm ndice de massa corporal menor que19 kg/m. Na Irlanda, idosos, a nvel domiciliar, commais de noventa anos tm valores de ndice de massacorporal em torno de 24 kg/m e prega cutnea tricipitalde 12 mm, medidas estas considerados adequadas(10).Com o avanar da idade, existe um aumento progres-sivo da quantidade de tecido adiposo.

    Assim, fundamental que as alteraes prpri-as do envelhecimento sejam o mais precocemente pos-svel diferenciadas dos sinais clnicos de desnutrio.Um alto grau de suspeita clnica de pacientes idososdesnutridos, e que, conseqentemente, necessitam deteraputica nutricional, pode ser obtido por meio da his-tria clnica, exame fsico e dados laboratorias apropri-ados(11). A teraputica nutricional desempenha papelimportante na promoo da sade, preveno da do-ena e no cuidado geral, tanto em situaes clnicascomo em cirrgicas(12).

    Uma das maneiras de avaliar o estado nutricio-nal seria a procura de indicadores que estivessem maisrelacionados com uma maior morbidade e/ou mortali-dade. Pacientes idosos, portadores de desnutrioproteicocalrica, apresentam risco aumentado deadquirir doenas e/ou de evoluir de forma desfavor-vel a um tratamento especfico.

    2. M NUTRIO NO IDOSO

    Os processos carenciais no idoso, em analogiaa outros grupos etrios, podem ser subdivididos, didati-camente, em quatro grupos, conforme mostrado naTabela II.

    A m nutrio protica, tambm identificadacomo kwashiorkor, caraterizada por ndices antropo-mtricos praticamente inalterados devido ao edema ou,at mesmo, pelo acmulo de tecido adiposo e bioqu-mica nutricional, apresentando valores abaixo do espe-rado. Assim, no raro encontrar pacientes em anasar-ca, com peso mantido e albuminemia de 1.5 mg/dl.

    Figura 1 - Proporo de pacientes internados no Hospitaldas Clnicas de Ribeiro Preto, nos anos de 1980 e 1995,por faixa etria em anos.

    Tabela II - Classificao dos processos carncias que envolvemos idosos

    M nutrio Dados Bioquimicaantropomtricos nutricionalCalrica - Marasmo Protica - "Kwashiorkor" Proteicocalrica Especfica ou

    Existem evidncias de que cerca de 70% dosidosos institucionalizados ingerem dieta deficiente emenergia e fibras(6), e entre os pacientes idosos interna-dos, cerca de 80%, apresentam nveis re-duzidos de albuminemia e 50%, emagreci-mento importante(7). Em contraste a essesdados, os idosos (73-90 anos) da Finln-dia, que vivem em suas casas, tm maiorprobabilidade de apresentarem ingesto ali-mentar e medidas antropomtricas adequa-das, a no ser pela baixa ingesto de zincoe cido flico(8). Em Israel(9), entre os ido-sos que residem em casa prpria, menos

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    JS Marchini; E Ferrioli & JC Moriguti

    Os pacientes portadores de m nutrio calri-ca, ou energtica, tambm identificada como maras-mo, apresentam medidas antropomtricas, muito abai-xo do padronizado, e manuteno, em limite inferior,dos valores de bioqumica nutricional. Nesses casos,ocorre deficincia da ingesto energtica. A respostaimune tambm se encontra comprometida.

    Uma diminuio acentuada das medidas antro-pomtricas e bioqumicas caracteriza os casos de mnutrio proteicocalrica, alm de compromentimentoimunolgico importante. Nesses casos, h uma defi-cincia global da ingesto de nutrientes.

    A m nutrio especfica se caracteriza peladeficincia isolada ou mltipla de vitaminas, de mine-rais ou de oligoelementos. Pode ocorrer isolada ou as-sociada m nutrio calrica e/ou protica.

    2.1. Ingesto alimentar

    A ingesto de alimentos, em geral, pode serdiretamente relacionada com estados mrbidos depacientes idosos Tabela III. Quanto menor for a in-gesto calrica, por ocasio da internao, mais previ-svel ser que os pacientes sejam mais velhos, tenhampeso menor, maior taxa de dependncia funcional emaior morbidade, medida pela maior presena de do-enas associadas(13). Pode-se afirmar que a m nutri-o do idoso se correlaciona, positivamente e inde-pendentemente, com perodos de internaes maislongos e maior mortalidade(14).

    2.2. Anorexia

    A perda de peso do idoso, freqentemente,vem associada anorexia, sendo esta, muitas vezes,diagnosticada como a causa da perda de peso. Estaanorexia est associada a um maior efeito inibidor doapetite, provocado pela colecistoquinina, menor efeitode opiides e do xido nitrico(15). Uma variedade decondies sociais, psicolgicas e mdicas tambm re-sultam em anorexia patolgica, entre elas, a sndromedepressiva, neoplasias e artrite reumatide. A anore-xia dita senil pode estar associada sndrome depen-

    dente de citocinas(15). Alm de um suporte nutricional,agressivo, tanto via enteral como parenteral, vriasdrogas (hormnio do crescimento, megestrol,ciprohepatadine, tetraidrocanabinol, esterides ana-bolizantes e antidepressivos) tm sido utilizadas na ten-tativa de tratar a anorexia do idoso(15).

    Em particular, nos casos de demncia, no exis-te ainda um consenso de qual seria o melhor suportenutricional. Ao que se sugere, a nutrio enteral, pormeio de sonda naso-entrica, no resulta em benefcioou melhora de qualidade de vida para tais pacientes(16).

    2.3. Suplementao de vitaminas e de ferro

    A suplementao de vitaminas hidrossolveis(50% do RDA(17)), adicionada em 50 g de acar,resulta em melhora significativa dos nveis de tiamina,piridoxina, vitamina C e ganho de peso, em pessoas commais de sessenta e cinco anos(18). Recomenda-se que aoferta de vitamina C seja de, no mnimo, 150 mg/diaem sujeitos com mais de oitenta anos. Para ariboflavina e vitamina B6, as recomendaes seriamde, no mnimo, 3 mg/dia(19).

    As recomendaes de 10-11 mg/dia de ferro noso suficientes para impedir que a prevalncia de ane-mia, em idosos, seja consideravelmente alta(20).2.4. Osteoporose

    Fragilidade ssea, resultante da osteoporose,acomete significante nmero de mulheres idosas e ou-tros pacientes de risco. Os principais fatores de riscoincluem os estados hipogonadais (particularmente noperodo ps-menopausa), fumo, baixa ingesto de cl-cio, sedentarismo, histria familiar e o uso de certas me-dicaes. A estratgia de preveno da osteoporose baseada na manuteno da massa ssea pela dieta, exer-ccio, uso apropriado da teraputica de reposio hor-monal e eliminao de fatores de risco, como o fumo ecertos medicamentos (por exemplo, corticides). Muitosagentes famacolgicos para o tratamento da osteoporo-se esto sendo examinados. Entre eles, incluem-se oalendronato e a calcitonina. No entanto, o uso de frma-

    Tabela III - Caractersticas de pacientes idosos por ocasio da internao, ingesto alimentar e morbidade(13)

    Ingesto calrica 40 % da recomendada p


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