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SONGBOOKUBERABA, MG

2009

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SONGBOOKUBERABA, MG

2009

GUTI PRODUÇÕES ARTÍSTICAS E CULTURAIS

Page 4: Songbook Goiá

PROJETO MEMORIAL GOIÁ – O POETA AINDA VIVE / SONGBOOK

Alexandre Saad

Francisco Marcos Reis

Alexandre Saad

Ranyere Souza

Arquivo pessoal da família Coutinho / Carlos Barcelos

Rodrigo Fonseca

Publi Editora e Gráfica

Guti Produções Artísticas e Culturais

Coordenação geral:

Texto e pesquisa:

Coordenação musical:

Cifras e partituras:

Fotos:

Design gráfico e editoração eletrônica:

Impressão em off-set:

Editora:

CULTURA

Guti Produções

Artísticas e Culturais

Reis, Francisco MarcosR31m Memorial Goiá: o poeta ainda vive / Francisco Marcos

Reis – Uberaba, MG: Guti Produções Artísticas e Culturais, 200992 p.: il

Acompanha CD Áudio e vídeo documentário

1. Goiá, Gerson Coutinho da Silva, mais conhecido como-1935-1981. 2. Silva, Gerson Coutinho da-Vida e obra. 3.Compositores-Brasil-Biografia. I. Título.

CDD 927.81610981

Ficha catalográfica elaborada por:Sônia Maria Rezende Paolinelli – Bibliotecária CRB-6/1191

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A presença de Goiá no cenário artístico da musica sertaneja é, sem dúvida, uma

referência que demarca o território da inovação e a busca de mudanças no

tradicional discurso que até então determinava as “modas caipiras”. Ele, se não foi o

primeiro, está entre os pioneiros que procuram dar nobreza ao estilo, utilizando a

linguagem correta na composição das letras e em constante busca da inovação das

temáticas, incorporando discursos que refletiam, por exemplo, a grande migração

do povo do interior brasileiro para as capitais, entre as décadas de 50 e 60 do século

passado.

A compreensão deste fenômeno demográfico está presente em inúmeras canções

de Goiá, mais notadamente na letra de “Saudade de Minha Terra”, uma das músicas

mais gravadas e conhecidas do Brasil. A música, feita em parceria com Belmonte, é

cantada em todos os cantos do país, por pessoas das mais variadas classes sociais e

etárias, presente em programas de TV e nas ondas do rádio. A execução da referida

obra, no entanto, não oferece qualquer natureza de notoriedade para o principal

autorda mesma, jáqueodestaquerecai sempresobreos intérpretes.

Trata-se de um velho hábito brasileiro. Não se respeita a memória daqueles que

legaram a várias gerações sínteses da cultura regional, registros da criatividade dos

cancioneiros populares ea traduçãododiscursodos povos sertanejos e, porque não

dizer, dospovosdocerrado, comoéocasode Goiá. O Projeto Memorial Goiá nasceu

para oferecer, dentro de suas limitações naturais, uma contribuição para a

preservação da obra do poeta de Coromandel e, sobretudo, do bem imaterial

contidoemsuaobra, patrimôniodopovo brasileiro.

O projeto foi viabilizado através da ação parlamentar do deputado Narcio

Rodrigues, um jornalista nascido no interior e poeta, somada a diversas iniciativas

que buscam preservara memóriade Gerson Coutinhoda Silva. O projeto Memorial

Goiá, coordenado pelo cantor e compositor Alexandre Saad, procura sintetizar em

três vertentes o trabalho do músico e poeta que faleceu precocemente aos 46 anos.

Religioso, simples e portador de uma humildade comovente, homem de família,

Goiá foi umartistaem tempo integral.

PROJETOMEMORIAL GOIÁConsiderações iniciais

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Songbook

O som de Goiá

Vídeo Depoimento

Livro com biografia resumida pelo jornalista Francisco Marcos Reis, com letras e

partituras das músicas que estão no CD, acompanhado das respectivas cifras e

partituras. A publicação é ilustrada com fotos do acervo familiar e composta

também pela publicação de letras de 33 das principais canções do poeta. Conta,

ainda, com artigos do escritor José Humberto Henriques e do jornalista Narcio

Rodrigues. O designgráficoéde Rodrigo Fonseca.

CD produzido pelo compositor Alexandre Saad, com músicas de Goiá

interpretadas por ele, pela dupla Leonel e Goiá Filho, gravações resgatadas com a

participação de Goiá cantando com a esposa Hilda, e faixas de homenagem com o

próprioAlexandre Saad, Osvaldo Oliveira, Patrãode Minase Stella Maris. Adireção

musical do CD éderesponsabilidadede Eduardo Saad.

Dirigido pelo jornalista Wagner Fonseca, procura resgatar a memória do poeta

Goiá através de depoimentos de pessoas que conviveram com ele deste a juventude.

Entre os entrevistados estão a esposa Hilda, o filho Hilger (Goiá Filho) e os amigos

de Coromandel, que dão depoimentos relembrando e valorizando o legado

poético- musical de Goiá. As imagenseaediçãosãode Carlos Barcelos (Totó).

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O dia em que o Tião Carreiro morreu era um dia

comum (15 deoutubrode 1993). Masasua morte nãoeraum fato

comum. Tião Carreiro escreveu um dos mais ricos capítulos da

criação musical brasileira. Foi criadorerei do Pagode (umestilo

de música consagrado nacionalmente por ele). Formou com

Pardinho uma dupla que fez a alegria da família brasileira

durante mais de três décadas. Além do seu vozeirão, que o

distinguia de todos os demais cantores caipiras, Tião Carreiro

era, por excelência, um extraordinário violeiro. Há poucos dias,

ouvi o Almir Sater dizer que jamais teria existido, como artista,

se nãofosseoTião Carreiro.

Pois bem. No dia em que o Tião Carreiro morreu, os

jornais não noticiaram, senão em notas de rodapé, e o Jornal

Nacional – essa instituição brasileira – não deu sequer um

registro.

A verdade é que o Brasil trata muito mal seus heróis e

seus artistas. Falo do Tião Carreiro, como poderia estar falando

do Zé Fortuna, do Zé Carreiro, do Carreirinho, do Cascatinha e

da Inhana ou do Vieira e Vieirinha. Quem, como eu, foi criado

ouvindoa Rádio Nacional de São Paulo, o ProgramaZé Russoou

o ProgramaZé Béttio, nãopodeseconformarcomofatodequea

Música Caipiraestá, hoje, empoeirada nagavetada memóriado

País ou transitando livremente (como sobra fazer) na saudade

dosquecurtiramessetempo.

Quepaísruimde memóriaéo nosso!

Quando a Música Caipira mudou para a cidade,

fazendo nascer a Música Sertaneja, em nome das novidades – e

foram muito bem-vindos Chitãozinho e Xororó, João Mineiro e

Marciano, Matogrosso e Mathias, e depois Zezé de Camargo,

Luciano, João Paulo e Daniel etc etc. – enterrou-se um passado

de glórias e criação. Ficaram para trás as obras épicas do Brasil

GOIÁ:UM MOMENTO DE PROSASOBRE A SUA POESIA

Page 8: Songbook Goiá

histórico – fazem bem à alma brasileira. Devemos incentivar e

multiplicar iniciativas como essa, na visão clara de que a

produção poética de Gerson Coutinho é a mais pura expressão

da literatura e da poesia brasileiras. Autêntica e autenticada,

forjada na lida sofrida com os sentimentos e as emoções. Goiá

fala de perto a todos nós porque, no fundo, no fundo,

principalmente nós, do Sertão da Farinha Podre, nesse

Triângulo Mineiro que está no coração do Brasil, ainda

cultivamos as melhores tradições rurais e temos os pés fincados

na roça, na fazenda, no Sertão. Ainda somos roceiros, graças a

Deus.

Somos daqueles que acreditam nisso:

Goiá nuncaestevetãovivo... esuapoesiamostra isso.

“Tô aqui,

cantando, de longe escutando, alguém está chorando com o

rádio ligado”...

rural das décadas de 40, 50, 60 e parte de 70. Ainda assim, o

Sertanejo (que conquistou a cidade) soube reverenciar o

Caipira, em homenagens de resgate que não chegaram a se

constituir em restauração do que se poderia chamar de

Memória Musical Brasileira.

Goiá está entre esses personagens que pertencem à

vidadecadaumde nós, pelosversosquedeixou, eque nãopassa

de um desconhecido para a maioria esmagadora de quem

consomearte nesse País.

Todo mundo (que é brasileiro de verdade!) é capaz de

cantar

, masé muitopoucagente, pouquíssimas

pessoas mesmoqueseriamcapazesdereconhecernessesversos

a figuradogrande Goiá, poetaevioleirode Coromandel, que fez

história na música caipira, morreu em Uberaba e caiu no

esquecimento, apesardeversos impecáveise inesquecíveis.

Somos assim: acostumados a curtir versos e músicas,

semsequernosdarmoscontadequemosescreveu.

Esse trabalho, agora publicado, contribui para o

resgate da figura desse grande artista, que nasceu Gerson

Coutinhoda Silva, foi , proclamou o

, viveu menos de 50 anos e se

eternizou como poeta na memória popular. Juntando dois

talentos criativos – o jornalista Chico Marcos e o cantor e

compositorAlexandre Saad (Guti) –, o resultadodesse trabalho

sesomaaoesforçoderecuperara memóriadeum tempoemque

a música era a alegria da roça e o conforto dos corações. Goiá

confortou corações com seus versos. As rádios propagaram sua

cançãoepopularizaramsuafigura.

Penso que documentos como esse – de resgate

“De que me adianta viver na cidade se a felicidade não me

acompanhar. Adeus, paulistinha do meu coração, lá pro meu

Sertão eu quero voltar”

“guiado pelas mãos divinas”

“poço verde da esperança”

Narcio Rodrigues

Jornalista e deputado federal.

Esse projeto foi viabilizado graças a emenda individual de sua autoria ao

Orçamento Geral da União (Ministério da Cultura)

Page 9: Songbook Goiá

Que se justificasse, mas ninguém se julgava demais

para compreender as larguras dos horizontes que eram

desenhados nas alvuras de Coromandel. Eu mesmo cheguei a

tecer muitos comentários sobre uma eventualidade que me

parecia um fenômeno fácil de ser deduzido, o azul enorme

quando se estendia muito além quando se mostrava um ponto

ao Norte, na direção de Vazante, um ponto ao Sul, na direção de

Abadia dos Dourados, mais a Sudeste, a esguia figura de

Patrocínio e a Noroeste a maioridade do Rio Paranaíba. Assim é

que se limitava, mais ou menos, a estrutura do estado do

Coromandel, chamado desde os princípios dos tempos pelo

patronímico de Kala-Mandela. E foi nesse sistema de lucidez e

brilho que nasceu e figurou Gerson Coutinho da Silva, o grande

Goiá. Era um pontode luz quecomeçavaadarponto na região, a

mostrar a grandeza excepcional de um mundo que chegaria a

impressionar muitas gerações depois do desaparecimento do

compositor Goiá. A descrição do contorno geográfico desse

mundo é de extrema importância para que se entenda como

umacançãodo mestrepode impressionara tal ponto, quequem

dela se emenda, acaba por ser transpassado por toda a lúdica

luminosidade do mundo de Coromandel, lugar onde o mundo

sofre de dificuldade com horizonte. Pois que se veja, um

mutirão de coisas simples em vida de um cidadão do povo como

foi Goiás, desde o Chapadão do Arquimedes até as vazantes e

grandes veredas que compõem esse mágico universo cantados

entreas pedrasdo Rio Paranaíba. Poisquemédo Coromandel e

dasregiõesaltasque maisaindasobememdireçãoao Paracatue

Unaí, sabe que no Chapadão do Arquimedes viveu Sônia

Guedes, uma das mulheres mais bonitas desse mundo e que

ficou eternizada nem uma das canções de Goiá. Esses pequenos

detalhes são fundamentais para o entendimento de um

SAUDADES DE COROMANDEL(Para José Rogério)

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parece ter sofrido a influencia dos boleros de antigamente,

aqueles da década de cinqüenta, quando ainda tentava se

afirmarno LP . Depois, jácom ,

orumocomeçou a tomar itineráriopróprio. Abria-seocaminho

paraasparceriasque fariamsurgirascanções mais belasdetodo

o seu repertório, como foi o caso de Pé de Cedro, Tardes

Morenas do Mato Grosso, Meu Pecado Louro, Saudade da

MinhaTerraeo PoçoVerde. Háuma, porém, umvalseadoquese

chama Saudades de Coromandel, que é um verdadeiro primor.

Goiá jamais se esqueceu de cantar a sua terra. Deixou

Coromandel e o Rio Paranaíba conhecidos de cabo a rabo, por

esse país inteiro. Sempre foi apaixonado pela terra onde nasceu

e não se cansava de dizer que era lá que queria morrer e ser

enterrado. “Uma saudade amarga e cruel/de Coromandel/em

Minas Gerais”. Mas para dizer a grande verdade, só sabe

entender esse ritmo todo quem é deveras da terra ou já bebeu

daquelas águas de fonte que pode tanto dar o diamante como

pode soletrar o nome de uma mulher primorosa. Só quem já se

sentou em um boteco de beira de estrada, entre o Chapadão do

Arquimedes e as vertentes dos Palmitos, pediu uma dose de

aguardentee umaalmôndegada mais puracarnede porco, sabe

soletrar com ouvidos privilegiados a mesma canção que canta

um canário da terra subido às alturas de uma moita de piteira.

Nas goelas de um canário assim amarelinho costumam

acontecer acordes de um diamante muito polido que poderia

muito bemserchamadode Goiá. É apuraverdade.

Goiáem DuasVozes Goiáe Biá

cancioneiro caipira que abrangeu nada mais nada menos que

setecentas canções conhecidas, algumas nunca gravadas e

somentepertencidasaoacervododoutorLuís Manuel, grandee

consagrado coromandelense, um dos mais ilustres de todos os

tempos. Quem ouve o Poço Verde, uma das canções mais líricas

eprimorosasde Goiá, não háde imaginarqueopoçoverde nãoé

um artefato inventado, mas um grande olho de vulcão extinto

que acabou por ser preenchido porágua e fez a fotografia de um

dos mais belos palácios do meio Oeste de Minas Gerais,

exatamente nas divisas do mundo, onde um estado de cá

começa a enxergar as alturas escuras de lá, do belíssimo,

esplêndido mundo de Goiás. São memórias de grande valor em

vidado maiorcompositorde músicacaipirade todosos tempos,

sem a menor sombra de dúvida. Goiá, durante a sua juventude

foi viver em Goiânia. Trabalhou como balconista no Bazar

Paulistinha, uma loja de variedades que dava a frente para a

Avenida Anhangüera e os fundos para a Rua 24-A, quase que

uma grande esquina com a Avenida Paranaíba. A influência

desse tempo na sua obra inteira é massacrante. Daí surgiram as

grandecançõesquecantam Goiâniaeo RioAraguaia, cantamas

mulheres mais bonitas do país, exatamente aquelas que estão

caminhando pelas ruas de Goiânia e lançando seu perfume de

saia rodada aos narizes cobiçosos de todos os homens que

pensam adivinhar cios permanentes entre o sol de Goiás e uma

estradaque levaao Mato Grosso. E não foi à toaque Goiás meter

a colher de pau nas terras do Mato Grosso, Campo Grande e

Coxim surgem em seus textos de uma maneira profunda, fazem

parte de seu acervo e de uma saudade que somente ele soube

traduzir na confluência mágica de toda a sua grande poesia,

uma das verves mais profícuas das canções brasileiras que

merecem ser destacadas. Quando começou a compor, Goiá

José Humberto Henriques

26/10/2009

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.”

Adeus lagoa,poço verde da esperançaMeu tempinho de criança

que não volta nunca mais

Goiá

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A casa, certamente, era “entre bananeiras”, com laranjeiras no quintal,

onde os pintassilgos e canários cabeça-de-fogo cantavam um repicado

longo e harmonioso. A moradia modesta, sem energia elétrica, estava

separada da área rural apenas pela rua de terra batida e a porteira da

fazenda. Na parte de baixo, poucos metros depois da porteira, um

córrego corria manso no piso de pedras, serpenteando sob as árvores.

Eram 11 de janeiro de 1935. Quando Gerson Coutinho da Silva nasceu

em Coromandel, Minas Gerais, o Brasil ainda era um país que

acomodava quase dois terços de sua população na zona rural, em

vilarejos e cidades com menos de 20 mil habitantes. Coromandel, uma

cidade com poucas ruas calçadas em pé-de-moleque, com população

urbana inferior a cinco mil habitantes, era o presépio ideal para Goiá

amadurecersuaveiapoética.

Nas ondas do rádio, Francisco Alves, Vicente Celestino, Mário Reis,

Ataulfo Alves e tantos outros enviavam suas vozes, que chegavam

“agonizando” aos radinhosesparramados pelossertões. A Erado Rádio

estava iniciando e se transformaria, no futuro, num instrumento

essencial para o sucesso do poeta que acabara de aportar na casa de

dona Margarida Rosa de Jesus e Celso Coutinho da Silveira. As rádios

da capital ainda não valorizavam a toada caipira, que pouco mais tarde

ganharia os corações de grande parte dos brasileiros. A programação

da época preferia os dramalhões daquela urbanidade precária e, ao

mesmo tempo, reduziaoespaçodos sertanejosque já faziam showsem

circoseapareciamocasionalmente nosprogramasdeauditório.

Visitei a velha casa,Tão modesta e pequeninaNo recanto da campinaDela nunca me esqueci

RELATÓRIO SOBREUM CERTO GOIÁ

Francisco Marcos Reis

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O homem do interior, ensimesmado com os afazeres da roça e com as tarefas cotidianas nos pequenos municípios, vivia distanciado

da movimentação social e política. O ambiente, decerta forma, era propícioao fortalecimentodacultura regional, com avalorização

do folclore dos cancioneiros populares, através de vozes anônimas que sedimentavam a cultura oral do Brasil profundo. Lá em São

Paulo, sem saber, Caçula, Ferrinho, Zico Dias, Raul Torres e tantos outros “estimados companheiros” estavam abrindo caminho para

o Goiá e uma geração de talentos, que mais tarde reinventariam e elevariam a música sertaneja à condição de gênero reconhecido,

portadorda identidadeda maioriados brasileiros, avozdopovo maissimples.

Coromandel se reuniaem tornoda Matriz de Sant'Anaem inúmeras festas religiosas e retretas da bandinhado maestro José Ferreira.

Possuía um cine-teatro, pagodes e boas peladas domingueiras no campo de futebol de chão batido. A economia era tocada pela

agropecuária, ondepredominavam os latifúndios, acriaçãoostensivadegadoe formasde produçãocomarrendatáriose meeirosque

mal supriam as necessidades da subsistência. O comércio também tinha seu peso: nele comprava-se fumo de corda, carne seca,

ferramentas e até o cheiroso Leite de Rosas e o nem tão perfumado Biotônico Fontoura, sem esquecer, claro, dos famosos queijos de

Coromandel. O garimpo tambémeraumaatividadeeconômica importante, e foi atravésdelequeacidadeemergiu doanonimatoem

manchete nacional, atraindoaatençãodepraticamentetodoopaís.

Fiz tantos versosrecordando com carinho,um mimoso pedacinhodo interior do meu país

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As conturbações políticas da capital Rio de Janeiro, motivadas em

grande parte pela chamada Intentona Comunista – um levante

que tentou derrubar o Governo Vargas – nem de longe

perturbavam o sossego das serenatas, retretas e pagodes à luz das

lamparinas nos imensos sertões. A distância e a falta de

comunicação isolavam estes sertões, onde o lúdico constituía a

ambiência para uma vida tranquila e prazerosa, ao mesmo tempo

emqueo mundoestavapresteaentrarnumaescaramuçacolossal.

Enquanto o país passava por um período de grandes

transformações, a Europacomeçavaaconvivercom o fantasmada

Alemanha Hitlerista, prestes a detonar a 2º Guerra Mundial,

conflito de proporções inimagináveis que acabou inclusive

arrastando o Brasil e seus pracinhas para o palco das ações na

Itália. Era 1939. Goiáaindaeracriança...

Antes disso, em 1938, em várias peneiradas, quinze entre os vinte

maiores diamantes encontrados no Brasil saíram das lavras de

Coromandel. O maior deles foi “batizado” de “Diamante Getúlio

Vargas”, em óbvia homenagem ao presidente, governando, então,

como ditador do chamado Estado Novo. As pedras, infelizmente,

não visitaram as peneiras do garimpeiro Celso Coutinho da

Silveira, pai de Gerson, mas ofereceu ao poeta argumentação

lírica para inúmeras citações elogiosas à cidade e contribuiu,

certamente, para construir o imaginário na cabeça do garoto.

Naquele ambiente de cidade do interior, na companhia dos pais e

irmãos, Gerson Coutinho foi cultivando sua poesia e se

apaixonando pela natureza, pássaros, árvores, rios e, sobretudo,

pelacidadeonde nasceu. Nadadoquepercebeu foi esquecido...

Já ouço sonhando o galo cantando,O inhambu piando no escurecerA lua prateada clareando a estradaA relva molhada desde o anoitecerEu preciso ir pra ver tudo alíFoi lá que nasci, lá quero morrer.

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A infância transcorreu sem maiores contratempos, sem

catapora, coqueluche, queda de cavalo ou qualquer tipo de

incidente traumático, exceto, lá pelos 10 anos, quando Gerson

quase foi a óbito. Ele teve “

, conta o irmão Nelson Coutinho. Goiá não era

levado nem mansinho, vivia num ambiente rural, solto para

nadar nos riachos, “caçar paca, tatu, cotia não”... pegar

passarinhos, montar a cavalo e dar corda às invencionices. Nos

primeiros tempos, morou nas comunidades rurais de

Douradinho e Coqueiros, regiões de mineração, acompanhando

o pai garimpeiro nas “catas de emburrados”, de onde se esperava

extrair diamantes. A pedra procurada nunca apareceu, exceto

alguns xibius: diamantinhos do tamanhodegrãosdearroz. Nada

doqueviu perdeu-se; tudovirou matéria-primaparapoesia...

Professores e alunos do antigo Grupo Escolar de Coromandel (a

atual Escola Estadual Osório de Moraes) no começo dos anos 40

tiveram pouca convivência com Goiá. Não se sabe se foi por

rebeldia ou coisa que o valha, mas o fato é que ele frequentou

apenas oito meses de aulas para completar o primeiro ano

primário. Autodidata, substituiu a ausência da escola lendo tudo

que lhe caía nas mãos: revistas, jornais e principalmente livros,

para dominar o português melhor do que muitos letrados. A

poesia dele não tinha “ ”. Esse, aliás, é um aspecto

notável na trajetória do poeta, um exímio conhecedor da língua

portuguesa sem ter, praticamente, frequentado a escola formal.

Sua vida era brincar no garimpo e fazer piqueniques no Poço

Verde, local de referência na “saudade” manifestada em boa

partedassuas inúmerascomposições.

uma ‘peste’, curada a custa de chás e

muita ‘benzeção’ ”

vois-me-cê

Coromandel, fragmento radiosodiamante mais famosodos garimpos do Brasil

Page 19: Songbook Goiá

As lembranças da infância surgem como símbolo da idealização de felicidade. Não foi à escola, não tinha deveres de casa, não se

preocupava com “passar de ano” ou com a disciplina imposta pelos professores dos anos 40, inclusive com o uso da famosa

palmatória. Essa liberdade, na cabeça de menino-poeta, abriu caminhos para a composição dos primeiros versos. O estudo

tradicional da Língua Pátria, graças à inteligência privilegiada, nunca fez falta nem para exercício da escritura e nem para o domínio

completo da linguagem oral. E na outra ponta, quem sabe, permitiu a construção de uma visão singular do mundo, circunscrita aos

sentimentos pessoais, memórias do passado, consagração da saudade e ao amor à sua terra. As letras das músicas pintam quadros,

tiramretratosda natureza, indelevelmentegravados noarquivoemocionaldoautor.

Os primeiros anos da juventude

foram de festas, saudosas festas que

marcaram a vida do poeta para

sempre e, quem sabe, indutoras da

irremediável saudade de sua

Coromandel. Para ele saudade era

matéria-prima, argamassa formada

pela poeira dos sertões misturada às

lágrimas vertidas em proporções

industriais. Nas ruas, os sons de

sanfonas, violões, folias-de-reis e,

sobretudo, dobrados das retretas

tradicionais da “Furiosa”, a bandinha

que enchia a cidade de sons. A banda do maestro José Ferreira, por onde também passou Abel Ferreira, deu a Goiá as primeiras notas

musicais. Havia uma musicalidade permanente naquele rincão, berço de Biá e também da dupla Biazinho e Gauchito, todos irmãos

de Hildae futuroscunhadosde Goiá. Biá formoua bemsucedidaduplacom Palmeira nadécadade 50.

Manhã que assiste meu pranto na terraRepicam na serra gentis rouxinóisO Sol clareando regatos e floresMisturam-se as cores de mil girassóis

Page 20: Songbook Goiá

A minha mãezinha me deu um abraçosenti que o pranto turvava-me a vista.

Adeus meu menino, Jesus é teu guia,Que sejas um dia, um grande artista.

Page 21: Songbook Goiá

Quero visitar a sede dos artistasRever meus colegas artistas goianosVoltar aos tempos dos meus vinte anosQue a mente saudosa não esquece mais

Page 22: Songbook Goiá

Goiá, então com apenas 20 anos, é um jovem artista com

poucos recursos, migrando num período de grandes

transformaçõessociais nopaís. Milhõesde brasileiros trocama

vida do campo, dos pequenos municípios, pelas

oportunidades oferecidas nas cidades grandes. O país estava

em obras e Brasília se erguia como símbolo dos novos tempos,

numa transição alimentada por entusiasmo e sofrimento,

sentimentos comuns entre matutos e letrados, aventureiros e

desterrados. Goiá não só testemunhou o grande êxodo como

fez parte dele; era um retirante no meio do redemoinho, mas

tinha a favor de si o fato de ter ido para São Paulo com

referências e protegido, em parte, pela família de Hilda, que o

recebeu e o encaminhou. O conforto da acolhida familiar e o

apoiodoscunhados famososabriramgrandesperspectivasque

rapidamenteseconsolidariam.

O Brasil instalavasua indústriade base, aceleravaoprocessode

urbanização e, ao mesmo tempo, convivia com o trágico fim da

Era Vargas e o início dos anos dourados de JK. O país era um

canteiro de obras clamando por peões, por braços para tocar a

força motriz do desenvolvimento. Goiá viveu os dois Brasis, o

interior, sossegado e acolhedor, e o segundo, acelerado e

indiferente às angústias dos migrantes sertanejos. Ele, como

poucos, soube ler essa realidade e transformá-la numa

expressão de sentimentos coletivos. Sabia que seria cantor e

compositor. Não sabia, porém, que seria dele o principal hino

expressando a angústia de milhões de brasileiros desterrados

do aconchego dos pequenos municípios, das fazendas, para

tentaravida na cidade grande. E todos eles, claro, expressavam

essesentimentoouvindo “Saudadesde MinhaTerra”.

De que me adianta viver na cidadeSe a felicidade não me acompanhar

Page 23: Songbook Goiá

Então, mais uma vez, as cortinas de se abriram para Goiá (para

citar um clichê) com grande rapidez. Em pouco tempo ele estava

seapresentandoem várias rádios de São Paulo, sendogravado por

grandes nomes da música sertaneja e iniciando a construção de

uma identidadeartísticacomocompositor inovador, sofisticadoe

com um belo faro para o sucesso. Passou a ser um dos integrantes

do Trio Mineiro, formado na época por Mineirinho, Hernandes e

Goiá, e gravando o primeiro disco, “Épicos da Música Sertaneja”.

Duas das músicas, “Capricho” e “Coisas da Vida”, de autoria de

Goiá e Arlindo Pinto, foram gravadas no disco. Estava casado com

Hilda, compondo e se integrando a

um grupo de pessoas de grande

influência nas principais rádios

paulistas. Entre eles estava Biá, o

cunhado, autor do clássico “Boneca

Cobiçada”, apresentador do pro-

grama “Biá e seus Batutas” na Rádio

Nacional, onde oferecia espaço para

Goiá mostrar seus trabalhos e

declamarpoemas.

Como radialista, o poeta fez uma

carreira relativamente curta, mas

proveitosa para acelerar sua inserção

no meio artístico. No começo da

década de 60, Goiá foi para a Rádio

Bandeirantes, onde apresentava o

programa “Maiadorda Fazenda”, com

Zacarias Mourão, que viria a ser

grandeamigoeparceiroem inúmeras

músicas. Na mesma Bandeirantes criou o programa “Choupana

do Goiá”, além de substituir o “Capitão Balduíno” e o

“Comendador Biguá” nos programas “Brasil Caboclo” e “Serra da

Mantiqueira”. Em seguida, na Rádio Nove de Julho, onde

permaneceria por cerca de dois anos, ele divide o espaço com

Geraldo Meireles no programa “Crepúsculo Sertanejo”. A partir

daí, o poeta deixa o rádio para dedicar-se apenas às suas

composições e, diga-se, com grande sucesso. Passa então a

participar de inúmeros programas, mas na condição de

convidado.

Alberto Calçada, Palmeira, Biá e Goiá em estúdio de gravação na cidade de São Paulo

Page 24: Songbook Goiá

A luta pela sobrevivência acontece em meio a grandes

conturbações políticas e sociais, não mencionadas em suas

músicas mas que, por certo, devem ter gerado muitas

preocupações. Naviradadosanos 60, comofimdogoverno JKe

a eleição de Jânio Quadros, o país mergulha numa crise que

levaria à renúncia do presidente, sete meses depois da sua

eleição, e à posse do vice, Jango Goulart, numa transição

institucional tensa e complicada. O pavio estava aceso. Em 64,

vemo Golpe Militar. As liberdades individuaissãorestringidas,

a produção cultural controlada num cenário de tensões

violentas, centradas sobretudo em grandes cidades, como São

Paulo. De 1964 até o final dos anos 70, a produção cultural é

controlada pelo Estado, que fomenta o medo e a autocensura,

com ações de repressão à resistência que geram prisões,

sequestrose, inclusive, inúmeras mortes.

Enredos de peças de teatro, notícias de jornal, roteiros de

novelas e até mesmo letras da música sertaneja eram

submetidas ao censor da Polícia Federal e só chegariam à

exibição quando recebessem o carimbo de “liberada”. Entre as

músicas enviadas para avaliação “literária” do regime, apenas

uma tomou bomba, a música “Grande Esperança”, invocando a

necessidade de se fazer a reforma agrária no Brasil. A temática

da “reforma”, como se sabe, era assunto delicado (para não

dizer explosivo) e teria, inclusive, sido um dos detonadores do

Golpe de Estado de 1964. Goiá mantinha uma distância da

política que beirava a omissão, mesmo inserido neste cenário

que o obrigava a enviar seus poemas para serem avaliados. Ele,

conta Hilda, se resguardava no silêncio quando a prosa

caminhavaparaesterumo.

A classe roceira, a classe operáriaansiosas esperam a reforma agrária

sabendo que ela dará soluçãopara a situação que está precáriaesta grande crise que há tempos surgiumaltrata o caboclo ferido em seu briodentro de um país rico e altaneiro

morrem brasileiros de fome e de frio

Page 25: Songbook Goiá

O cenário oferecia outros... Os imigrantes chegavam às

capitais, como São Paulo e Rio, enfrentando um impiedoso

preconceito contra o homem do interior, chamados com

desdémde , e entreoutrosadjetivos

depreciadores. O Jeca Tatu, personagem de Monteiro Lobato

no livro de contos Urupês, publicado em 1918, ainda era o

símbolo do atraso

sócio-cultural asso-

ciado aos migrantes,

embora boa parte dos

habitantes de São

Paulo, à época, fosse

composta por gente do

interior, migrantes

pobres e originários da

oligarquia rural. Goiá

não gostava disso, mas

a p ró p r i a m ú s i c a

caipira incorporava

esse discurso precon-

ceituoso no repertório

de muitas músicas,

com sentido anedótico.

Na época era difícil

ev i tar esse c l ichê

dominante e até Goiá entrou nessa quanto encarnava o

Rouxinol do Trio Amizade, com bigodinho e roupa de

“roceiro”. Eraumperíododetransição...

“Jeca Tatu” cafuçu capiau,

Ele detestava ser visto como caipira e isso o impulsionou nos

anosseguintesaserumdospioneiros narenovaçãoda música

raiz, dando a ela um estilo mais leve, menos cabocla e mais

contemporânea. Mais do que escrever bem, Goiá criou um

novo discurso poético para a música sertaneja, e chegou

mesmo a enfrentar dificuldades para emplacar suas

composições devido a

essas inovações. Nas

suas letras não tinha

esse negócio de

, e .

Não abria mão de usara

escrita correta, preferia

composições com-

plexas, sem a afetação

forçada de regiona-

lismos que nem de

longe refletiam total-

mente a identidade dos

homens do sertão.

vós-mi-

cê nóis vai nóis foi

“Goiá não foi o primeiro

e nem o único a inovar

no gênero. Mas ao

contrário de outros,

assumiu a causa das

mudanças. Na memória dos artistas que viveram à época, ele

aparece como protagonista da modernização da música

sertaneja.”

Page 26: Songbook Goiá

A opção de Goiá pela música sertaneja mantinha-o com o pé

no interior e na “melancolia da cidade grande”, onde a

saudade manifestada em canções encantava milhões de

brasileiros. Boa parte deles, embora residindo em São Paulo e

em outras grandes cidades, se viam atolados nas mesmas

lembranças, na mesma saudade, apenas em outro endereço.

Entreas

duplas consideradas autênticas, apenas Tonico

eTinocogravaram músicasde Goiá.

Aconvicçãodeque Goiátenhacolocadoapedra

fundamental na nova música sertaneja é

consenso entre inúmeras duplas que gravaram

suas músicas na época. Buscar construções

poéticas mais elaboradas, arranjos musicais

mais sof isticados, era também uma

“Se Goiá é visto como tradicionalista, a maioria de suas

composições, incluindo as de maior sucesso, foram gravadas

por duplas cujos nomes se vinculam à inovação e à

modernização do gênero: Tibagi e Miltinho, Zilo e Zalo,

Belmonte e Amaraí, Pedro Bento e Zé da Estrada, Durval e

Davi, Milionário e Zé Rico, Chitãozinho e Xororó... (*)

necessidade emergencial, dado o esgotamento da temática

caipira diante da urbanização desenfreada em que passava o

país. A mudança era o meio mais eficaz para atrair novos

ouvintes e garantir rendimento para intérpretes e

compositores. O mestre em história pela Universidade

Federal de Uberlândia, Diogo de Souza, entrevistou vários

intérpretes da época e eles expressam essa idéia, de certa

forma relativizada pelo pesquisador diante da busca de

protagonismo por parte destas pessoas. A relativização, no

caso, não procura desmerecê-los, mas apenas deixar claro

que, além de Goiá, outros compositores participaram do

evento.

E onde estão meusestimados companheirosSe foram tantos janeirosdesde que eu deixei meus pais

Page 27: Songbook Goiá

A renovaçãododiscurso musical no Brasil nãoatingiriaapenas

a músicacaipiraque, numa transição meioconfusa, buscavase

firmar como sertaneja. Para muitos é difícil dissociar os dois

estilos, até porque elas eram e assim permaneceram, de certa

forma compondo uma mesma matriz musical com poucas e às

vezes irrelevantes diferenças. Mas é inegável que o sertanejo

caracteriza uma evolução do gênero musical caipira. É preciso

considerar nessadiscussãoo fatodequeo paísestava passando

por grandes transformações e estas, claro, também afetavam

toda a produção cultural. Os velhos cantores de boleros,

rumbas e sambas começaram a assistir a chegada da Jovem

Guarda e, principalmente, da Bossa Nova, dispensando os

vozeirões, a interpretação teatral, dramática e dando lugar à

suavidade de uma voz e um violão. E, para dizer a verdade,

começaram a assistir não só a chegada, mas o enorme sucesso

que ambos os estilos fizeram no Brasil e no exterior. Estava aí a

concepçãoda Música PopularBrasileira, a MPB.

Nesse aspecto, reservando as devidas diferenças, Goiá

desempenhou para a música regional papel semelhante ao de

Tom Jobim na Bossa Nova; os dois foram fundamentais na

renovação da linguagem, na introdução de novos elementos

musicais, na forma de cantar e compor. Cada um ao seu estilo,

claro! Em alguns casos, ambos até usaram recursos parecidos

na poética musical, com discursos de exaltação às belezas

naturais e às coisas do cotidiano. Quando compunham,

pintavam paisagens. O fatoconcretoéque nãose pode ignorar

a figurade Goiá nocontextoda músicasertaneja. Elese tornou

“formador de opinião no gênero e referência para os artistas

iniciantes, que passaram a adotar algumas de suas posturas e

justificativas. Para Goiá, a tática era firmar um compositor

não caipira, mas regionalista; um poeta saudoso da vida no

interior, da infância junto à natureza e da cultura tradicional”.

Page 28: Songbook Goiá

Enquanto João Gilberto e Vinícius de Morais exigiam um “

”, se referindo ao excesso de saudosismo na MPB, Goiá

fazia questão de reiterar que a saudade é elemento vital para

sobrevivência da memória dos retirantes. O e João

estavam de ‘saco cheio’ com os dramalhões de gosto duvidoso

presentes na produção musical dasdécadasde 40 e 50. Emboraas

realidades fossem bem diferentes, e não necessariamente

conflitantes, os dois partiram de lógicas semelhantes ao

contraporem os modelos adotados na produção de músicas com

elementos inovadores em relação às “modas tradicionais”, então

em claro declínio tanto nos ouvidos caipiras como nos

urbanizados. E sem ouvidos atentos, a música não cumpre o

objetivodosartistas, tanto noaspectoeconômicoquanto naquele

subjetivodeobteroreconhecimentodorespeitável público.

Como cancioneiro popular, Goiá percorreu o caminho do

discurso que remete à saudade, à identidade do povo do interior

e, ainda, às relações amorosas infelicitadas pela recusa, pela

distância e, claro, por impossibilidades diversas. Não são raros os

observadores que comparam Goiá com Cartola, cada qual em sua

seara mas igualmente talentosos, de origem popular, com pouco

estudo, autodidatas e com verve poética privilegiada. Enquanto

Cartola escreveu

, Goiá rabiscou

. Dois achados poéticos notáveis, com o uso de metáforas

para contar histórias sobre amores de formas tão inesperadas

quanto belas.

Chega

de Saudade

Poetinha

“As rosas não falam, simplesmente as rosas

exalam o perfume que roubam de ti” “Quem teve os

amores que eu tive na vida/ é gente entendida na mágoa e na dor/ e

sabe por certo que um doce carinho/ às vezes é espinho em forma

de flor”

“ ´

Não me abandones, luz de minh almaQue vale a vida sem teu amorAmarga hora desta partidaNa despedida choro de dor

Page 29: Songbook Goiá

Os desafios de Goiá e dos diversos intérpretes de suas músicas

não eram pequenos. Ser notado e cultuado como compositor

não era uma tarefa simples naqueles anos das décadas de 60 e

70. Além da música sertaneja, os ouvidos eram disputados

também pelo iê-iê-iê, a chamada Jovem Guarda, que tinha,

entre outros, Roberto Carlos, Erasmo Carlos, Wanderléa e

Paulo Sérgio. A Bossa Nova chegava com João Gilberto,

Silvinha Telles, Vinicius de Moraes, Tom Jobim e até Chico

Buarque (um pouco mais tarde), sem falar do Tropicalismo de

Caetano, Gil, Bethâniae Gal Costa. Além disso, existiaa “legião

estrangeira”, com Beatles, Rolling Stones, Bob Dylan, Willie

Nelson, Galhardo, Gardel, Pedro Vargas, Tony Bennett, Sérgio

Endrigo, Rita Pavone... e um detalhe: Elvis não morreu. Estava

vivinho... Era o mundo do bolero, do tango, do rock e da

florescente MPB.

Isso para citar apenas alguns nomes do cenário musical

naquela época. Enfim, Goiá e os profissionais da música

regional tinham de brigar, muitas vezes, com uma mídia que

oferecia pouco espaço na TV, em programas normalmente

exibidos em horários de baixa audiência. Para eles, o pessoal

da Sertaneja, a era do rádio ainda estava em pleno andamento,

visualizando milhões de casinhas, todas elas com rádios

ligados e poucas TVs nas salas. Goiá tinha noção clara de que

estava lidando com um tipo de produto que, embora

intangível, era de consumo, que seria bem sucedido se

emocionasse, gerasse desejo de compra. Compor era um

trabalho que consumia horas, dias e até semanas, como

também exigia ferramentas como mapas e dicionário à mesa,

de acordo com a narrativa de Hilda, viúva de Goiá, que reside

hoje no bairrodo Ipirangaem São Paulo.

Page 30: Songbook Goiá

Atrásdoaparentedesinteressede Goiápelosresultadoseconômicosdasobrasquecompunha, existiaosujeitoquesabiaclaramenteque

o sustento da família dependia dos versos que compunha e das vozes que os levariam às ondas do rádio. Tanto que foi um hábil

negociador com as principais duplas sertanejas da época para emplacar suas músicas. Mas isso não se mostrou suficiente para garantir

os rendimentos necessários a uma vida familiar tranqüila e um cotidiano confortável. Mesmo com músicas gravadas por inúmeros

artistas de sucesso, Goiá não recebeu proventos suficientes para atender satisfatoriamente as necessidades da casa. Essa situação,

naturalmente, passou perturbá-lo de forma impiedosa, gerando desconfiança sobre a carreira, sobre as perspectivas de continuar

fornecendoversose músicasparaumaatividadeque nãooremuneravacondignamente.

Era uma ressaca inter-

minável, gerada, em parte,

pelo rum que consumia

rotineiramente, em volu-

mes consideráveis, e pelas

incertezas com o dia

seguinte. Nos final dos anos

60, o poeta, com mulher e

três filhos, Robson, Mary e

Hilger para sustentar,

resolve tomar uma decisão

dramática para quem não

admitia outra hipótese na

vida senão a de ser artista.

Goiá reencarnou o Gerson

Coutinho e foi trabalhar no

Banco de Crédito Nacional onde, pelo visto, mostrou competência ao progredir na carreira e chegar ao cargo de gerente do setor de

Cadastro do BCN. Só mesmo sendo artista para avaliar o incômodo de exercer uma atividade fora da perspectiva de realização pessoal e

de característica tão séria quanto trabalhar em um banco, onde o espaço para o devaneio poético é inexistente. Mesmo assim, Gerson

Coutinhoda Silva nãodesistiudeserGoiá. Continuoucompondo, cantandocomamigosemcasae mantendocontatosesporádicoscom

asduplasque iamàsuacasaem buscadeversos.

Page 31: Songbook Goiá

A idéia da busca por um emprego fixo foi imposta pela realidade. O

dinheiro não vinha na proporção da adulação pública e privada

resultante do sucesso do poeta Goiá, portador de grande prestígio entre

osaficionadosda músicasertaneja. Entreos motivosdestadesproporção

que penalizavaa famíliae, claro, adeoutros compositores, estáo modelo

degestãodosdireitosautorais no Brasil. Umaverdadeiracaixa-preta, um

emaranhado de condições contratuais confusas que no fim subtraem,

até hoje, a propriedade do autor sobre sua própria obra e delega a gestão

de seus eventuais rendimentos a uma editora, que por sua vez, está

vinculada a uma sociedade de arrecadação de direitos autorais, que

também compartilha do bolo arrecadado. São “sócios” demais para um

negócio menos rentável do que se supõe. Sem meios de controlar o fluxo

deste caixa, o autor recebe o que lhe é destinado e fim. O problema

persisteaté hoje.

A viúva Hilda Coutinho da Silva, residente em São Paulo, recebe alguns

dividendos da obra, mas em valores bem aquém da necessidade do

próprio sustento. Com frequência, como ocorreu recentemente, Hilda

assistiu no programa “Domingão do Faustão” a duplas “universitárias”

cantarem “Saudade de Minha Terra” para pelo menos 50 milhões de

pessoas. E qual éoresultado financeirodessaexibição? Ninguém sabeao

certo. Como também é desconhecido o valor gerado pela veiculação das

músicas de Goiá nos mais diversos meios de comunicação – rádios, TV,

Internet, casas noturnas e apresentações das duplas mais famosas do

país em shows para milhares de pessoas. “Saudade de Minha Terra”,

gravada recentemente por César Menotti e Fabiano, está entre as dez

modas sertanejas mais belas da história, segundo pesquisa feita pelo

jornal Folha de São Paulo com compositores, radialistas e produtores

musicais, entreoutraspessoas.

Que saudade imensa do campo e do mato,

Do manso regato que corta as campinas

Aos domingos ia passear de canoa

Na linda lagoa de águas cristalinas

Que doce lembrança daquelas festanças

Onde tinha danças e lindas meninas

Eu vivo hoje em dia sem ter alegria

O mundo judia, mas também ensina

Estou contrariado, mas não derrotado

Eu sou bem guiado pelas mãos divinas

Page 32: Songbook Goiá

Além de receber pouco pelo que fez, Goiá ainda pagava um tributo a mais por sua

generosidade. Ele, com pouco apego à propriedade intelectual, às vezes dividia a

autoria de suas composições com quem estivesse por perto, sem exigências ou

critérios. O caso mais curioso, narrado pela esposa Hilda, se relaciona à música

“Saudade da Minha Terra”, cujo , não colocou sequer uma vírgula na letra ou

acorde na música. Quando Goiá deu acabamento na composição e começou a fazer o

arranjo, dividia o quarto com Belmiro e, para prestigiar o colega de “infortúnio”,

decidiu presenteá-lo com a parceria na música que seria seu maior sucesso. Belmiro,

então, para acertar uma dívida pessoal, repassou o presente

para Belmonte, que dá quitação ao débito sem maiores

queixas. Belmiro e Belmonte foram os primeiros a gravar

“Saudade de Minha Terra”, sem grande sucesso. A música

estourou mesmo, tempos depois, com o próprio Belmonte

cantando com o novo parceiro Amaraí. Aí então, não se

pode negar, Belmonte fezasuaparte...

Mas esses eram casos isolados. A divisão de parcerias, na

maioria das vezes, era negociada com objetivo de oferecer

algum tipo de vantagem para o compositor. Era uma

estratégia, meio encontrado para viabilizar a gravação e a

divulgação da música pela mídia da época. Essa

flexibilidade, na verdade, era e talvez ainda seja uma

negociação comum entre os produtores musicais,

radialistas, cantores e empresários. E havia também um

jogo mais pesado. Era comum, também, vender composições inteira para outros

“compositores” que, em muitos casos, conseguiam construir uma obra autoral

adquirindo poesias e músicas de Goiá de outros compositores. Era o preço da

sobrevivência... É impossível, hoje, identificar as músicas que entraram nesta

“maracutaia musical”, até porque o próprio poeta se negava terminantemente a

comentartais fatos. Não haviaética nacompra, massobrava nocompromissodesigilo.

“parceiro”

Page 33: Songbook Goiá

Os fatos narrados pela família de Goiá estão comprovados em

depoimentos obtidos pelo mestre em História pela

Universidade Federal de Uberlândia, Diogo de Souza Brito,

com vários artistas da época. Os depoimentos estão na tese

produzido para conclusão de

mestrado em História Social pela Universidade Federal de

Uberlândia. Gildemar José Rocha, o Durval da dupla “Davi e

Durval”, diz que Goiá “fez muitos compositores famosos.

Muitos! Tem muito compositor famoso aí, e foi com o nome de

Goiá, com músicas de Goiá. Tem muito compositor que nunca

fez um música, écomprositor”. Você leucerto, estamos falando

do , o sujeito que comprava, literalmente, a arte

produzida por terceiros. Sebastião Aurélio, empresário da

dupla Durval e Davi, porexemplo, exigiaadivisãodaautoriada

obra como condição para ela ser gravada. Esses são apenas

algunsdoscasosdeparcerias forjadas no interessedeviabilizar

agravaçãodascançõesesocorros financeiros naurgênciaquea

necessidade impunha. Erado jogo...

Essas circunstâncias impedem uma avaliação clara do

tamanho da obra de Goiá. Registradas, existem 311 canções e

destas, apenas 41 são assinadas por ele solitariamente,

enquanto outras tantas têm parceiros, digamos, de interesse, e

“Negociações de Um Sedutor”

“comprositor”

boa parte delas foi composta com legítimos companheiros de

criação. Não se pode generalizar. Apesar de alguns fazerem

estimativas mirabolantes, como Expedito José Rocha, o Davi,

que fala em duas mil músicas, outros compositores ouvidos

por Diogo de Souza estimam que as músicas de Goiá, entre

assinadas e vendidas, somam algo em torno de 600 ou 700

canções. De qualquer forma, independente da dimensão

numérica, Goiá foi gravado pelas principais duplas de sucesso

entre os anos 60 e 70. Para não citar todas, mencionamos

Vieira e Vieirinha, Irmãs Castro, Zilo e Zalo, Pedro Bento e Zé

da Estrada, Tibaji e Militinho, Nenete e Dorinho, Palmeira e

Biá, e Belmontee Amaraí, para falarapenas de alguns dos mais

antigos. Entre os “modernos” estão Sérgio Reis, Chitãozinho e

Xororó, MilionárioeZé Rico, CésarMenotti e Fabiano...

Só gente amiga lá me rodeiae ouvindo o canto de uma perdizA luz divina em mim clareiae ensina a forma de ser feliz

Page 34: Songbook Goiá

A expressão “estimados companheiros”, contextualizada na letrade , nãoéapenas um mote poético utilizado por

Goiá na composição da música. Se existia um sujeito apegado aos amigos e saudoso destes, era o poeta de Coromandel, que se

esforçava, enormemente, para mantê-los na sua intimidade. Enviava cartas escritas com textos intimistas, com conteúdo

poético, revelador de uma relação de estima acima das relações triviais que a maioria das pessoas têm com os amigos. São

repletas de declarações afetivas, de grande intensidade emocional, subjetivamente sugerindo grande intimidade e

cumplicidade. Outra demonstração de estima está presente na oferta de parceria aos amigos mais chegados em composições

feitasporele, emboraexistamexceções, comodo juizde Direitoaposentado, Luiz Manoel da Costa Filho, portador, também, de

canetapoética.

Comunicador nato, Goiá não se satisfazia com as simples missivas. Ele criou as “cartas sonoras”, com mensagens de voz

gravadas em fitas cassetes, endereçadas aos amigos mais próximos. Nas fitas, enviadas pelos Correios, ele mostrava novas

músicas e pedia opinião sobre o trabalho, apresentava pessoas do

meio artístico etc. Naquelas enviadas a Luiz Manoel, Goiá, de bate-

pronto, relatava num português admirável a estima que tinha pelo

amigo, em mensagens de felicitações pelo aniversário. Ele canta,

junto com a família e induz os filhos a

mandarem mensagens de felicitações para o então juiz de Direto

Luiz Manoel. Tudo numa simplicidade comovente. O juiz é um

entre vários amigos, como Sinval Pereira, Osvaldo Alfaiate,

Conceição, Arquimedes, doutor Helder e vários outros que

mereciamadeferênciadascartassonoras. Essacondutarendeuaele

amigos fiéis e sempre dispostos a ajudá-lo em momentos de

dificuldades.

“Recordação”

“Parabéns Pra Você”,

Gente querida muito obrigadoUm grande abraço, amigos meusEu me despeço emocionadoAté um dia, querendo Deus

Page 35: Songbook Goiá

Osamigos, quasetodosconquistadosdepoisde maisdeumadécadadeausênciae

após transformar-se em compositor de renome nacional, se envolveram de tal

forma com o poeta que passaram a atendê-lo nas mais diversas demandas. No

campo artístico, os amigos de Coromandel, liderados por Sinval e Conceição do

Bino, conseguiram viabilizar o lançamento de dois LPs solos, convencendo

pessoas de posses na cidade a comprar 500 discos. O número de

exemplares fazia parte da venda antecipada exigida pelas

gravadoras para bancar a produção da obra. O lançamento dos

discos deu novo alento à carreira de Goiá, então funcionário do

BCN, mas de olho no retorno à carreira artística. O

registrava canções em homenagem à cidade, e era uma inovação

para a época, com a utilização de permitindo a Goiá a

sobreposição da própria voz de forma a manter a sonoridade

tradicional dasduplassertanejas.

A obra autoral do artista, intitulada

se não foi um sucesso

em termos de vendagem, cumpriu um papel importante na

afirmação do compositor como referência na música sertaneja.

Como acontece hoje, naqueles tempos muitas vezes o nome do

compositor era ignorado pelo grande público, e até mesmo entre

os próprios artistas. A grana e a fama ficavam nas mãos de

empresários e intérpretes. Com os dois discos solos, Goiá conseguiu chamar

atenção das principais duplas para sua obra poética e musical, se reposicionando

no mercado depois de quase três anos vivendo discretamente como gerente de

cadastro do Banco de Crédito Nacional. Os demais discos, como os gravados em

Goiânia nos tempos do Trio Amizade, e na rápida passagem como integrante do

Trio Mineiro, em São Paulo, foram importantes para abrir portas, mas não

obtiveramarepercussãodesejada. Eletambémgravoucom Biá, seucunhado .

long-playing

playback,

“O C Goiá

Interpreta suas Músicas em Duas Vozes”,

ompositor

‘ ’

Meus companheiros irão comigoLá na Vendinha do AbacaxiDar um abraço em cada amigoDa linda terra onde nasci

Page 36: Songbook Goiá

Além das contribuições financeiras para edição dos discos, os

amigos de Goiá também foram responsáveis por popularizá-lo

na cidade através dos meios então existentes. Sinval Pereira, o

pioneiro, inventou o “cordel coromandelense” ao editar, por

mais de umadécada, panfletos com poemas de Goiáexaltando

a belezada terraeasvirtudes deseus homens. As peças tinham

também cunho publicitário para o e

. A iniciativa emocionou Goiá, que invocou

lágrimas de emoção, em carta chorosa de agradecimento ao

amigo Sinval. As cartas eram verdadeiras peças literárias,

escritas com o coração aberto, com a exposição, sem meias

palavras, deemoções relacionadas aosvalores daamizadeque,

de fato, conquistava corações. Goiá, para fazer um trocadilho

previsível, também brilhava narádio Diamante.

Posto Coromandel Casas

do Pedrinho

Os amigos de Goiá proporcionaram a ele recepções inesquecíveis,

elevando o compositor, de fama em parte restrita aos artistas, e de

público muitas vezes limitado, à condição de astro. Ninguém

competia com ele em Coromandel e cercanias, como Abadia dos

Dourados, Lagamar, Douradinho etc. Quando chegava à cidade,

além da recepção no famoso km 5, Goiá era conduzido em carro

aberto em desfile pela cidade, sob intenso foguetório e uma

programação intensa de visitas, hospedagem em casas variadas,

festas em fazendas e boêmias continuadas em diversos botecos.

Nessas visitas, quando se fazia acompanhar pela família, a

intensidadedas relaçõescom osamigos seestendia pelos familiares,

envolvendo esposas, filhos e demais parentes. Numa destas

ocasiões, Goiá e familiares permaneceram em Coromandel por

quaseum mês, numa maratonadefestasecompromissossociais.

Page 37: Songbook Goiá

A cidade de Coromandel era o porto seguro, às vezes

inalcançável, mas real o suficiente para oferecer conforto à

distância, e o discurso recorrente sobre algo que sugeria uma

forma de utopia tardia, contraditória, não sobre o futuro, mas

como parte da formatação de um passado de felicidades

incomparáveis. Era tão bom assim? Seria possível um lugar

guardar tanta beleza,

tantas pessoas virtu-

osas, tantas lembran-

ças felizes? Para Goiá,

sim... Ele certamente

conseguiu expurgar

todo o indesejável, os

problemas cotidianos,

lembranças infelizes

que estão, evidente-

mente, à disposição de

qualquer vivente. Ele

precisava da matéria-

prima para tecer suas letras e contar sua história através de uma

saudade, de uma idealização de felicidade bem acima das

expectativas da maioria das pessoas. Enquanto muitos

esquecem que já foram crianças, Goiá faz questão de fortalecero

laço, de resgatar lembranças da infância feliz nos “campos

amadosde Coromandel”.

Comoacidade maiscantadaem “tonseversos” de Minas Gerais,

com exposição pública comparável ao Rio de Janeiro na época,

Coromandel soube dar a Goiá a reciprocidade necessária para

alimentar sua verve poética. Além da estima dos amigos mais

próximos, Goiá gozava de grande popularidade entre os

habitantes e sabia alimentar essa com um dos traços mais

marcantes de sua

personalidade. Era

portador de uma

humildade descon-

certante, acessível a

todos, atencioso

com os mais velhos e

crianças que pre-

miava com balas e,

sobretudo, dispo-

nível para rodadas

de viola numa

interminável. O

reconhecimento afetivo fez-se acompanhar de um aparato

institucional incomum: virou nome da rua mais importante da

cidade, ganhou busto no entroncamento com a principal

avenida, virou nome de rodovia e acumulou um patrimônio

cultural admirável junto aos estimados companheiros da sua

adorada Coromandel.

boê-

mia

Ai quem me deraSe mudasse o meu destinoE voltasse a ser menino

Lá no meu Coromandel

Page 38: Songbook Goiá

Mas, como se sabe, existem “tempos que não voltam mais” e, pior que

isso, não há nada que possa impedí-lo na sua progressão inexorável,

comotambém nãoexiste formadecontê-lo narudeabreviaturadecertos

percursos. Goiá, no começo da década de 70, começa a enfrentar os

primeiros problemas de saúde, com o aparecimento de um diabetes que

se desdobraria em complicações cada vez mais severas. O poeta tinha

consciência de que abusara da saúde, consumindo bebidas destiladas

largamente, se alimentando mal e, para complicar, sem se submeter ao

acompanhamento médico recomendado para os portadores da doença.

As complicações, no final da década de 70, já estavam evidentes, com o

diagnóstico de cirrose em estado avançado, agravada posteriormente

porumaascite, água noperitônio, queo levouao hospitalalgumasvezes.

Numa carta de 22 de outubro de 1980, Goiá pede ao então juiz de Direito

Luiz Manoel da Costa Filho para viabilizar o atendimento médico em

Uberaba, junto ao conterrâneo doutor Freud Gomes, já falecido, na

época proprietário do Hospital São Lucas. Tudo foi feito como o poeta

desejava. Foi transferido para Uberaba e internado no hospital, onde

passou por tratamento intenso, sem no entanto obter resultados

favoráveis. Duranteo internamento, Goiá recebiaamigose parentes para

visitas de alta emotividade, em despedidas que sucederam por semanas.

Goiá tinha plena consciência que se encontrava em estado terminal e

enfrentava esta terrível realidade compondo no quarto do hospital, com

admirável serenidade. No poema ele assume

a sua condição de homem de fé, situa-se como pessoa conformada com o

destinoeesperançosaquantoàprogressãodavidaemoutradimensão.

“Os Olhos Azuis de Cristo”,

Vem chegando a nova aurora,

neste quarto de hospital,

onde estou lutando agora,

contra as dores do meu mal.

Mas de um ponto no infinito,

Deus me manda um sinal,

um sorriso tão bonito,

num manto angelical

Page 39: Songbook Goiá

A morte não tardou. Eram 20 de janeiro de 1981; poucos

dias depois de completar 46 anos, Goiá falece no Hospital

São Lucas, sua última morada, na cidade de Uberaba. O

“guardador de saudades”, enfim, entrega-se ao destino

anunciado, a sina de poeta, a morte precoce numa tarde

qualquer daquele janeiro. O corpo é conduzido a

Coromandel, onde é recebido no quilômetro cinco, desta

vez sem festa, sem desfile em carro aberto, sem foguetes,

numa mágoa compartilhada que mobilizou a cidade, que

evitou apavoramentos diante da morte consumada. Na

igrejinha de Santa'Ana, o corpo foi velado por parentes e

amigos num noite longa, estranha, cheira de rumores

musicais e lamentos de voz, em murmúrios que

atravessaram madrugada. Lentamente, o dia tomou

corpo e os moradores foram novamente se somando aos

pernoitados, aos que chegaram de longe, aos que vieram

de Lagamar, Coqueiros, Abadia, Palmito, Douradinho e

derincõespróximosparacomporumaformidável multidão.

A missadeencomendaçãodocorpo, emcerimôniacelebrada

pelo padre Paulo Sérgio Machado, foi entrecortada com

emocionados discursos de despedidas, cantos chorosos das

duplas Chico Rey e Paraná, Neném e Itamar, Manito e

Salvador Perez e o canto solitário de Clayton Aguiar, em

homenagem ao poeta. Em coro contido, vozes se

multiplicavam na cantoria de músicas de Goiá, num

lamento coletivo, espontâneo, sem ensaio... Era dia 21 de

janeiro de 1981 quando o poeta foi sepultado no Cemitério

Municipal de Coromandel. Ao lado do túmulo, uma muda

de cedro foi plantada para lhe garantir proteção contra o sol

escaldante, uma sombra para o sertanejo se integrar ao

sertão que tanto amou. Na lápide, a pedido do poeta, foi

grafado apenas

, iniciais de Gerson

Coutinhoda Silva, opoetaGoiá...

“Uma saudade amarga e cruel de

Coromandel em Minas Gerais – GCS”

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GoiáSONGBOOK

Cifras epartituras

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Aonde repousam campinas

Segredos recriam desejos

Saudades são amenidades

Igual ao sabor de um beijo

O verde que tinge a lembrança

Encerra um amor destemido

À terra que, ainda criança

Viveu um poeta sentido

O poço de régia esperançaExplica em suave poesiaA força que emana das águasVai se evaporar em magiaUm dia encantou o poetaQue pelas andanças da vidaCantou a beleza da terraCanções dessa terra querida

Nas horas boas, nas horas tristes

Nas cantorias, saudade insiste

E os passarinhos cantando dizem

Que esse poeta ainda vive

A saudade dos bons companheirosNas tardes e noites morenasParece conter melodias

A E A

E A

A E A

E

D

A

E

A

E A

E A

E A

E A(bis)

Pra versos de novos poemasNaquele sertão encantado

Nas horas boas, nas horas tristesNas cantorias, saudade insisteE os passarinhos cantando dizemQue esse poeta ainda vive

Aonde inda tem sabiáEu vejo o poeta compondoNa sombra de um jequitibá

Nos tempos da modernidadeEstradas são feitas de asfaltoMas num coração caipiraSertão ainda fala mais altoCortando o estradão dessa terraIgual ao poeta GoiáSegui lá pro rancho da serraPra ouvir sua gente cantar

(bis)

O Poeta Ainda Vive

A

D

E

Alexandre Saad

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Page 44: Songbook Goiá

Foi no belo Mato Grosso, há vinte anos atrás

Naqueles tempos queridos que não voltam nunca mais

Nas matas onde eu caçava um pequeno arbusto achei

Levando pra minha casa, no meu quintal o plantei

Era um belo pé de cedro, pequenino, em formação

Sepultei suas raízes na terra fofa do chão

Um dia parti pra longe, amei e também sofri

Vinte anos se passaram em que distante eu vivi

Hoje volto arrependido para o meu antigo lar

Abatido e comovido, com vontade de chorar

Vim rever meu pé de cedro, que está grande como o quê

Mas é menor que a saudade que hoje sinto de você

Cresceu como minha mágoa, cresceu numa força rara

Mas é menor que a saudade que até hoje nos separa

A terra ficou molhada do pranto que derramei

Que saudade, pé de cedro, do tempo em que eu te plantei.

E

B

E

B E

E B E

B E

A B E

E

Pé de Cedro

A

E

Goiá / Zacarias Mourão

B

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Amargurado pela dor de uma saudade

Fui ver de novo o recanto onde nasci

Onde passei minha bela mocidade

Voltei chorando com a tristeza que senti.

Vi a campina que brincava com maninho

E a palmeira que meu velho pai cortou

Chorei demais, com saudade do velhinho

Que Deus do céu há muitos anos já levou.

E onde estão meus estimados companheiros,

Se foram tantos janeiros desde que eu deixei meus pais;

Adeus, lagoa, poço verde da esperança

Meu tempinho de criança que não volta nunca mais.

Meu pé de cedro, desfolhado, já sem vida

Final amargo de uma rósea esperança

O monjolinho, quero ouvir sua batida

A embalar a minha alma de criança.

Manso regato que brotava lá da serra

Saudosa fonte que alegrava o meu viver

Adeus paisagem, céu azul da minha terra

Rincão querido, hei de amar-te até morrer.

E B E

B

A E

B E

E B E

B

A E

B E

B E

B E

B E

B E

(bis)

Recordação

A

E

Goiá / Nenete

B

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Poço verde, lago cheio de poesia

Água fria que tantos versos remaram

Idolatrado pelo punho do poeta

Quantas serestas suas águas transbordaram.

Poço verde, já brindei a minha vida

Foi despedida com quem tanto te amou

Foi inspirado nas palavras do poeta

Que encontrei estas pra cantar em seu louvor.

Visão do mato, olho verde da natureza

Contemplei sua beleza no rosto do sertão

Nas suas águas navegando com a saudade

Eu busquei essa mensagem pra escrever esta canção.

Poço verde, olho d'água solitário

Sai do calcário para seduzir o céu

Nas suas margens o vegetal faz parede

Brilhante verde, filho de Coromandel

Poço verde, afluente da solidão

Recordações à deriva sobre ti

Lindo cenário do poeta uma lembrança

Goiá descansa junto a Deus, perto daqui.

G C G

Am

D

C D G

G C G

G7 C

D G

A D G

C F C

G D

C G

A D G

Olho Verde Sullivan/Patrão de Minas

D

G7

Am

A

CG

F

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E A E

B

F#m B E

B E

E A E

A E B

E

B E

B F#

B

E

B E

Depois que partistes da terra magoada

Menina adorada, eu sofro demais

Quisera de novo ganhar seu carinho

Em nosso cantinho em Minas Gerais...

Recanto campestre no topo do mundo

Que marca bem fundo a recordação

Porque me deixastes tão cedo, criança

Levando a esperança do meu coração

Compondo meus versos na noite vazia

Em minha poesia tu sempre influis

Sozinho na vida, em meu abandono

Embala meu sono teus olhos azuis

Manhã que assiste meu pranto na terra

Repicam na serra gentis rouxinóis

O Sol clareando regatos e flores

Misturam-se as cores de mil girassóis

Saudade na tarde, lembrança bendita

Mas tu hoje habitas os campos do além

E penso que, algures, tua alma sensível

O pranto impossível derrama também.

Voei bem mais alto que a Mantiqueira

Ou a cordilheira lá dos Pirineus

É um sonho que morre na tarde formosa

Menina charmosa, meu anjo, adeus...

Meu Pranto em Teus Olhos Goiá

A

F#m

F#

E

B

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E

B

E

A

F#m B

A E

A B

A B E

De que me adianta viver na cidade

Se a felicidade não me acompanhar

Adeus, paulistinha, do meu coração

Lá pro meu sertão eu quero voltar.

Ver na madrugada, quando a passarada,

Fazendo alvorada, começa a cantar

Com satisfação, arreio o burrão,

Cortando o estradão saio a galopar.

E vou escutando o gado berrando,

Sabiá cantando no jequitibá

Por Nossa Senhora, meu sertão querido,

Vivo arrependido por ter te deixado

Esta nova vida aqui na cidade

De tanta saudade eu tenho chorado.

Aqui tem alguém, diz que me quer bem,

Mas não me convém, eu tenho pensado.

Eu fico com pena, mas esta morena

Não sabe o sistema em que fui criado

Tô aqui cantando, de longe escutando,

Alguém está chorando com o rádio ligado

Que saudade imensa do campo e do mato,

Do manso regato que corta as campinas

Aos domingos ia passear de canoa

Na linda lagoa de águas cristalinas

Que doce lembrança daquelas festanças

Onde tinha danças e lindas meninas

Eu vivo hoje em dia sem ter alegria

O mundo judia, mas também ensina

Estou contrariado, mas não derrotado

Eu sou bem guiado pelas mãos divinas.

Pra minha mãezinha já telegrafei

Que já me cansei de tanto sofrer

Nesta madrugada estarei de partida

Pra terra querida que me viu nascer.

Já ouço sonhando o galo cantando,

O inhambu piando no escurecer

A lua prateada clareando a estrada

A relva molhada desde o anoitecer

Eu preciso ir pra ver tudo ali

Foi lá que nasci, lá quero morrer.

Saudade de Minha Terra Goiá / Belmonte

A F#m

E B

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Chapadão, já alquebrado, cofre de recordação

Do pau-terra recurvado pelos ventos do sertão

Chapadão da velha igreja, eu sou quase um filho teu

Triste aldeia sertaneja que o progresso esqueceu.

Chapadão da passarada, revoando em mais de mil

Na mais linda alvorada do interior do meu Brasil

Canarinhos, avinhados, pintassilgos, bem-te-vis,

Cantadores muito amados das manhãs primaveris.

Chapadão, se eu pudesse florescer-te novamente

Se de novo aí viesse conviver a mesma gente

Chapadão da Sônia Guedes, doce imagem da ilusão

Chapadão do Arquimedes, pescador de solidão

Hoje vejo o Sol poente, muito além da pradaria

Descambando lentamente, num aceno de agonia

A canção aqui se encerra num contraste assustador

Chapadão de minha terra, mausoléu de um sonhador.

Am Dm Am

G C

E Am

E A

E D A

E D A

A7 D E A

B E Am

Chapadão Goiá / Sebastião Rocha

DmAm

A

A7

G

C E

D B

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G

D

C G

A D

C G

D G

A D

G

Caminhos verdes de minha infância

Vêm na memória tão docemente

São 20 anos dessa distância

De minha terra, de minha gente

Por mais que eu queira calar no peito

Essa saudade, gosto de fel

A mágoa chega e não tem jeito

Porque eu amo Coromandel.

Lá onde mora ...a alegria

Tão brevemente ...quero poder

Banhar os olhos na poesia

Nos horizontes do meu querer

Trilhando a rota de quem não era

As borboletas quero rever

Lá nas campinas de minha terra

No colorido do entardecer.

Na revoada dos beija-flores

Na quietude de um quintal

Dormir sonhando com os meus amores

À sombra amiga de um bambuzal

Meus companheiros irão comigo

Lá na “Vendinha do Abacaxi”

Dar um abraço em cada amigo

Da linda terra onde nasci

“Terra do queijo e do diamante”,

Minha sublime inspiração.

Este teu filho vive distante

Mas te conserva no coração.

Gente querida, muito obrigado

Um grande abraço, amigos meus

Eu me despeço, emocionado

Até um dia, querendo Deus.

Caminhos de Minha Infância Goiá

A

G D

C

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A E

D A

E

D A

E

D A

B E

A E A

D

E A

Oh! que saudade dos meus quinze anos

Quando tinha planos de ser um cantor.

Recordo Goiânia, com seus arvoredos,

Guardando segredos de um grande amor.

Goiânia, seu nome me traz a saudade

Da grande amizade que aí deixei.

Lembranças me levam à minha Campinas,

De lindas meninas que jamais verei.

Lembrança das noites saudosas goianas

E os fins de semana que não mais terei.

Esta canção que canto agora,

Contando a história de um grande artista,

Busquei na memória ao longo do tempo,

O grande momento de sua conquista.

Todas as frases dos seus lindos versos

Viraram sucessos por esse Brasil

Na voz sertaneja que canta, meu povo

Reclama de novo a alma gentil

Daquele poeta de grande memória

Compondo a história do nosso Brasil.

A facilidade com que escrevia

Por todos fazia ser admirado

Das rimas e trovas foi um grande artista,

Seu ponto de vista foi lido e cantado.

Falou de sertão, falou de cidade,

Falou de saudade, falou de paixão.

De Coromandel, sua terra querida,

Da infância da vida, a recordação.

Do seu poço verde, da cor de esperança,

Ficou na lembrança e na inspiração.

Nesta homenagem sincera que faço,

vai um grande abraço ao meu velho amigo.

Onde quer que esteja, onde quer que eu vá,

A sua imagem vai sempre comigo.

Seu nome era Gerson Coutinho da Silva,

Porém consagrou-se com nome Goiá.

Nos palcos da vida mostrou seu sucesso,

Deixando seus versos pro Brasil cantar.

Amigo Goiá, descanse em paz,

O povo jamais lhe esquecerá.

Homenagem de Amigo Osvaldo Oliveira

A E

D B

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C#m G# C#m

G# C#7

F#m C#m

G# C#m

C#m G# C#m

G# C#7

F#m C#m

G# C#m

F#m

B E

A G#

C#

F#m

B E

A G#

C#m

Tanto tempo de ausência da sua terra natal

Volta o filho pra reviver a infância que se foi

Na chegada, sente o cheiro do verde à distância,

Que nunca mais sentiu por todas as suas andanças.

Vê que a igreja onde rezava já não tem a mesma cor;

Seus amigos, a terra amada, motivos de tanta dor.

E as casas envelheceram e outras lhe são estranhas

E seu peito aperta e um grito lhe sai pelas entranhas.

Chora e deita no chão

Abraça a terra genitora

Olha a cruz iluminada

Reza protetora

Que Sant'Ana lhe proteja

E que dê felicidade

Pra aquele sertão querido

Pra toda a sua cidade.

Dm Gm Dm

A D

Gm C F

Bb A D

Gm C F

Bb A D

Gm C F

Bb A Dm

Acorda de madrugada, vai ver o Sol nascer;

No horizonte colorido sente sua alma renascer.

Tem os olhos embaçados, bate forte o coração;

Lá vai o poeta amado compor sua canção.

Certamente canção que fala de sua Coromandel,

Das belezas que só existem sob aquele céu;

Só este poeta sabe descrevê-las em canção.

Obrigada, Goiá, amigo de todo o coração.

Regresso Stella Maris

AE

DDm

B

C#m

G#

C#7

C#

F#m

Gm C

F

Bb

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A Bm

D A E A

B E

E D E A

Quando a maldade, formando teia, vem acusar-me do que não fiz

Saio da trama que me enleia, buscando a terra dos bem-te-vis.

Só gente amiga lá me rodeia e ouvindo o canto de uma perdiz

A luz divina em mim clareia e ensina a forma de ser feliz.

A mão do Mestre desfaz a teia, a vida toma lindo matiz

No fio de água que serpenteia por entre as flores do meu país.

Colher os frutos que a fé semeia, sem magoar-se com que se diz,

É o grande leme que aqui norteia a nau perdida do infeliz.

Quando a tristeza me desnorteia, o meu refugio, meu chafariz

É uma casinha modesta e feia, de móveis velhos e sem verniz;

A luz mortiça de uma candeia, sentindo o cheiro da Flor de Liz,

E o prateado da lua cheia, banhando as covas dos Buritis.

Nesta casinha parede-e-meia, no paraíso das juritis,

A minha sorte me presenteia com tudo aquilo que tanto quis;

Não guardo mágoa de quem me odeia, porque no mundo de idéias vis

Sou simplesmente um grão de areia, e o Ser Supremo é meu juiz.

Grão de Areia Goiá / Leonardo Amâncio

A

ED

B

Bm

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Page 65: Songbook Goiá

B F# B

F#

E F#

E

F# B

C# F#

E

B

E B

F#

B

Jamais verei minha terra pequenina

Porque sei que em cada esquina

Só teria desengano.

Mas não me esqueço do garimpo dos Coqueiros

E dos velhos companheiros

Dos saudosos nove anos.

Me lembro sempre do Josias de Anterino,

Agnaldo e Noraldino,

Desidério e Rafael,

Ai, quem me dera se mudasse o meu destino

E voltasse a ser menino

Lá no meu Coromandel.

Mas como posso te rever, minha cidade,

Se nas ruas da saudade

Meus amores não verei;

Se lá no alto, na casinha tão branquinha,

Não está minha mãezinha

Pois sem ela já fiquei.

E nas novenas de Sant'Anna, padroeira,

Já não há o Zé Ferreira,

Com a bandinha a tocar;

E nesse instante, meu Coromandel querido,

Baixo os olhos, comovido,

Pra ninguém me ver chorar.

Adeus, adeus, Macaúba das Vazantes,

Douradinho dos diamantes;

A saudade é meu tormento

Porque guardar os lindos sonhos de criança

É viver de esperança

Pra morrer de sentimento.

Coromandel, dos antigos sonhos meus,

A “Canção do meu adeus”

Para ti eu dediquei.

São pedacinhos de saudade dos parentes,

Das planícies e nascentes,

Desta terra que amei.

Canção do Meu Adeus Goiá / Zé Claudino

B F# E C#

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Cm G Cm

G Cm

Bb Eb

Bb7 Eb

Eb7 Ab

Eb Bb Eb

Bb

Bb F Bb

Eb

Bb Eb

Não me abandones, luz de minh'alma

Que vale a vida sem teu amor

Amarga hora desta partida

Na despedida, choro de dor.

Adeus, criança, menina grande,

Levas a alma de um sonhador.

Eu reconheço a minha culpa;

Te abandonei, te judiei, te fiz sofrer.

Mas hoje sei quanto te amo

E que sozinho não compensa nem viver.

Dentro da noite de amargura

A mente vaga na amplidão;

E amanhã, por essas horas,

Onde andará seu coração;

Talvez amando a outro alguém

Enquanto eu morro na solidão.

Eu reconheço a minha culpa;

Te abandonei, te judiei, te fiz sofrer.

Mas hoje sei quanto te amo

E que sozinho não compensa nem viver.

Luz de Minh´Alma Goiá / Osvaldo Alves da Silva

Cm G

Bb

Bb7

Eb

Eb7

Ab F

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G D C G

C G D G

B Em

C D G

D C G

D G

Se Coromandel, um lindo oásis, não conheces,

Venha ver de perto o que fez Deus com suas preces;

Suas noites estreladas, céu límpido cor de anil

É um lindo poema bem no centro do Brasil.

Poesia, poesia, terra amada, linda prece;

Quem te vê uma vez nunca mais te esquece.

Se você, porém, quiser tentar a sua sorte,

Garimpe a pedra rara pelo sul ou pelo norte;

Depois, pode pescar nos rios lindos de coral,

Que as manhãs de sol tornam mais lindos, sem igual.

Poesia, poesia, terra amada, linda prece;

Quem te vê uma vez nunca mais te esquece,

Coromandel...

Noites Estreladas Goiá / Luiz Manoel da Costa Filho

G D

C B

Em

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Coromandel, dos meustemposdecriança,

Ai, nuncaconsegui teesquecer.

Os lindoscamposondecantaasiriema

E o inhambuzinhoapiarnoentardecer.

Navelha igreja, depoisdaAve-Maria,

Aocairdatarde fria,velhosdiscosatocar;

Noitesde Reisea Saudadedo Matão,

Meu Deus, querecordação, tenhomesmoquechorar.

Meperdoese falotantodestaqueridacidade,

Onde hojea mocidade já nem lembra maisde mim.

Masqueméque nãorecordasuaaventurosa infância,

Queosanoseadistânciaparasemprederam fim.

Monte Carmelo, Patrocínio, Lagamar,

Ai,vivemparasempre na lembrança;

Quantasaudadedo meu Rio Paranaíba,

Emsua margensvi nasceraesperança.

Patosde Minas faz lembrarPadreTomáz,

Que medeu forçaepazqueumartistadeseja.

Minas Gerais, teenviocomemoção

A maispuragratidãode minh’almasertaneja.

Santo Inácio, Santa Clara, Abadiados Dourados,

São lugares bem lembrados, cadaum temseu papel;

Sãoossonhosdacriança, mistodesaudadeedor,

Dopoetasonhador, filhode Coromandel.

Liguei orádio nestatriste madrugada

E ouvi osversosque hátantosanos fiz

Em homenagemà menina maisamada,

Queemoutros tempos mefizeratão feliz.

Fui aopassadoerevi, tãocomovido,

A bela históriaqueo nossoamorviveu.

Nãoacreditoqueelatenha meesquecido;

Seusentimentoétãograndequantoo meu.

Ondeandarás, alma-gêmeade minh'alma?

Já não maispossoesconderestes meusais!

Todoessetempoquedeti estouausente,

Infelizmentecadavez tequero mais.

Sei quetudizesqueeusouoteuartista,

Que não maisqueresoutroalguémem teuviver,

Mastepertence igualmenteestaconquista,

Poiscomodisse, nãoconsigoteesquecer.

Busquei conforto nocalorde mil amores,

Nodesesperodeapagartua lembrança,

Mas nãoencontroteu perfumeemoutras flores,

E teencontraré minhaúltimaesperança.

Ondeandarás, alma-gêmeade minh'alma?

Já não maispossoesconderestes meusais!

Todoessetempoquedeti estouausente,

Infelizmentecadavez tequero mais.

Coromandel Goiá/Zalo Goiá/NatinhoUltima Esperança,

Page 74: Songbook Goiá

Amigo, escutecomcalma

A minhapobrecanção,

Quetraz lembrançasdaalma

Guardadas nocoração.

Háquasedezoitoanos,

Umsertanejo menino

Partiuseguindoodestino,

Buscandouma ilusão.

Só muitotardeentendeu

Queasua felicidade

Eraviverdesaudade

Doseuamadosertão.

Marcadopelatristeza,

Desesperadoeaflito,

Fezversosà natureza

E àquelesolobendito.

Nas matas, campose lagos,

Encantosdeumaterra,

Citouoaltodaserra

Noamanhecermais bonito.

E oastro-rei majestoso,

Nas manhãs maiscoloridas,

Pintandoquadrosdavida

Natelado infinito.

Quevida maiscor-de-rosa

Asortedeixou perdida

Naestradinha mimosa

De minha infânciaquerida.

Porquesoueuocaboclo

Que, pormissãoouvaidade,

Deixouafelicidade

Naterra nuncaesquecida.

Quisodestino mandar-me

Sentirnagrandecidade

O alvorecerdasaudade

Já nopoentedavida.

Voltarnãopude, éverdade,

À terrados madrigais,

Pra não morrerdesaudade

Comafaltadosvelhospais.

E hoje, um tantoalquebrado,

Herançaduradasorte,

Esperoantesda morte,

Nos meus instantes finais,

Que Deuspermitaqueeusonhe

Comaquelescamposdeflores,

Naterrados meusamores,

Que nãoverei nunca mais.

Poente da Vida Goiá/D. Thomaz

Page 75: Songbook Goiá

Qualquerdiadestespegoumavião

Evou pra Goiás matarumasaudade;

Descerem Goiânia, que felicidade,

Reveracidadequeamodemais.

Querovisitarasededosartistas,

Revermeuscolegasartistasgoianos;

Voltaraos temposdos meusvinteanos

Quea mentesaudosa nãoesquece mais.

Façoumaentrevistacomo Morais César;

Depois, o Claudinoqueroconhecer.

Aqui distante, sempreouvi dizer

Dos belosprogramasqueestagente faz.

Naquelaterravivi muitosanos

E, comorgulho, aqui euconfesso,

Seos meusdiscos fizeramsucesso,

Umagrandeparteeudevoa Goiás

Querovisitaro bazarPaulistinha,

VeroWaldomiro,velhocompanheiro,

E convidá-lopara meu parceiro

Numapescaria norioAraguaia.

Depois, pretendoreveras fazendas

E revivendoum temposaudoso,

Ouviropiodo jaó manhoso

Nas matasgoianasquandoosoldesmaia.

Embelezandoo Centro-Oeste brasileiro

Háumrincão hospitaleiro,

Que mais lindoaqui não há.

Cidadeverde, ondeo mausedesvanece,

E aquelequeaconhece

Nãoesquece maisde lá.

Terá naalma, tododia, todo instante

Apoesia fascinante

Daformosa Cuiabá.

Lindacapital matogrossense,

Salvetuagentetãogentil;

Hoje fazesparteda história,

Pois tedeuestavitória

Tuaraçavaronil.

Nossosparabéns, irmãosqueridos,

Cuiabanosdestemidos,

Queorgulhamo Brasil.

Quasetrêsséculosregistraocalendário;

Salveteuaniversário,

‘Capital das Catedrais’.

Estásem festa, relembrandoospioneiros,

Naalvoradaoscanoeiros

Entoando madrigais.

E a brisa mansa, aocairdosol poente,

Balançandodocemente

Aspalmeiras imperiais.

Visita a Goiás GoiáCuiabáGoiá/Sidon Barbosa

Page 76: Songbook Goiá

Deixaquete fale nessa horatriste,

Quando nãoexiste mais teugrandeamor;

Desdequete foste, desdequepartiste,

Tu medestruísteem todoo meuvigor.

Já nãosou mais nada, sou umafolhamorta;

Nada meconforta, nada mecompraz.

Quandofosteemborado meudoceabrigo

Também foi contigotodaa minhapaz.

Estaéadolorosa horadoabandono

Já nãotenhosono, já nemsei querer;

Nosilêncioescurodo meuquartopobre

Já ninguémdescobresombrasdeprazer.

Nãoestáscomigo, masdeixou-me n’alma,

Que nãotem maiscalma, fundacicatriz;

Ésa mocidadecheiadevigor,

E sem teuamor, sou um infeliz.

Quemé neste mundoque nãotemsaudade

Dafelicidadeque nãovolta mais.

Doverdeesperança, deumvale formoso,

Dotemposaudosodosqueridospais.

Euvivosofrendodetantasaudade,

Deumacidade, razãodos meusáis.

Umasaudadeamargaecruel,

De Coromandel, em Minas Gerais.

Eu tinha meu mundo nafontedoaçude,

Na mansaquietudedosvelhosquintais.

Deum mundodecoreseu fui companheiro,

Foi tãopassageiro, mas lindodemais.

Me lembroaté hojecom todocarinho,

Dosabiazinho lá nos laranjais.

Umasaudadeamargaecruel,

De Coromandel, em Minas Gerais.

O diaemquea morte, comsua inclemência,

Tirarminhavivênciacomoutros mortais,

Imploroàspessoas, àsquaisconsidero,

Nacampasóqueroas iniciais.

Masdeixem napedra, bem fundogravada,

De jeitoque nadaapagaossinais:

"Umasaudadeamargaecruel,

De Coromandel, em Minas Gerais."

Triste Abandono Goiá/Zacarias Mourão Goiá/BiazinhoSaudade de Coromandel

Page 77: Songbook Goiá

Fiz tantosversosrecordandocomcarinho

Um mimosopedacinhodo interiordo meu país!

E quantagentepropagou minhacidade,

O recantodasaudade, ondeumdia fui feliz...

Apósdezanos, fui revero berçoamado;

Na históriadopassado, revivi o meu papel;

E hojeescrevoacançãodo meu regresso,

Encantadocomoprogresso, lá no meu Coromandel.

Quemadmiraeentende minhasorte,

Aocantar, de Sul a Norte, a "Cançãodo Meu Adeus",

Entenderáo meuamoràquelepovo,

Quevoltei averde novo, pelagraçado Bom Deus;

Esseregresso, deu-meum mundode beleza,

E das trevasda incerteza, novamentevi a luz;

Porquereverminhagentetãoquerida,

Foi apazde minhavida, foram bençãosde Jesus.

Terrados Castro, dos Resendeedos Barbosa,

Dos Goulart, dos Penae Rosa,dos Machado, Cruvinel,

Dayrel, Ferreira, Aguiar, Moraes, Pereira,

Nobregente hospitaleira, queelevou Coromandel.

Queridaterra, dos Calixtoedos Caetano,

Seeu fosseumsoberano, depoderdescomunal,

Escreveriaoseu nometriunfante

Naestrela mais brilhantedosistemauniversal.

Benditoseja, ovoltardofilhoausente

Aoconvíviodeumagenteque lhedátantovalor.

Tanta homenagemrecebi em minhavida,

Mas nenhumatãoquerida, quantoaquelado interior.

Óh, garimpeiros, fazendeirosedoutores,

Nósseremosdefensoresdessaterratãogentil.

Coromandel, fragmentoradioso,

O diamante mais formosodosgarimposdo Brasil.

Canção do Meu Regresso Goiá

Page 78: Songbook Goiá

Deesperançaesolidão,

Semusarpalavraalguma,

Com medodeouvirum 'não’.

Vinteanosdesegredo,

Devazioem minhavida,

Semcontaro meusegredo

Àvocê, minhaquerida!

Vinteanossemumgesto,

Umapalavrasequer,

Escravodeseuencanto,

Deseu fascínio, mulher.

Vinteanosquepassaram

Qual se fosseumaprisão

Semdizerqualquerpalavra,

Com medodeouvirum 'não’.

"Vinteanosadorandooseu rostinhoencantador

Vinteanos na incertezadeganharoseuamor

Sei quevimpredestinadoacumpriressa missão

Vintecontasquecarrego norosárioda ilusão”

Vinteanossepassaram;

Resolvi falar, enfim.

Masvocê medestruiu

E nãoquisdizerum 'sim’.

Ontemeraumaesperança,

Hojeésódesilusão.

Nadaqueimacom mais força

Queadurezadoseu 'não'.

Adeus, adeus Filhinha,

Meuamore minhafã.

Vou partirnaclaridade

Daestrelada manhã.

Peloscamposorvalhados,

Vouchorandoporsaber

Queosolhosqueteamam

Nunca mais irãotever.

Quandoosol dasexta-feira

Esquentaressapoeira,

Dovermelhoestradão,

Estarei já bemdistante,

Recordandoteusemblante,

Teuamadocoração.

Adeus, Paranaíba,

Rio mansodo Coró.

Vejoaqui a multidão,

Mas mesinto muitosó,

Sairei escondidinho,

Poisoprantoé meu mal;

Quem nãopodedefender-se

Nãoenfrentatribunal.

Vinte Anos de SilêncioGoiá

Goiá/José NetoAdeus, Filhinha

Page 79: Songbook Goiá

Na melancoliadagrandecidade,

O queamenizao meudissabor

É adoce lembrançadasimplicidade

Dos meusconterrâneos, aosquais tenhoamor.

E hojesentindoopesoda idade,

Levando nopeitoum mundodedor,

Vou perambulandoprosul ou pro norte,

Quemsabechegandoàcasada morte,

Maspensoqueantes mereçaasorte

Deaindarevero meu interior.

As moçasusavamcabelosdetranças,

Que hojeemdia nãovejo iguais;

Oscasaisdevelhos, de falas tão mansas

Nas Festasde Reis, em Minas Gerais.

Congadas, catiras, trucadasedanças,

Na brisacheirosados buritizais;

Avidade hojevai setransformando,

Ascoisas tão lindasqueestou recordando,

Na noitedostemposestãoseapagando,

Daqui aalgunsanos nãoexistem mais.

Eu fui acriançasemvocabulário

Queacreditavaem Papai Noel;

Adeusaquecuidado itinerário

Jogou-me natorreda 'Grande Babel’.

E hojeescrevendodavidaodiário,

Cantandoeusintotristezacruel;

Não negoquesouestimadoonde moro,

Masumvelhosonhoa Deuseu imploro,

Andarabraçadocomquemeuadoro

Noscamposamadosde Coromandel.

Mansoremanso, que murmuradocemente,

Nesteretirosilenciosodosertão.

Oscavaquinhosdandovoltas nacorrente,

Umacigarraazunirnoespigão.

De muito longevemosomdafazendinha,

É oretireiroatratardacriação.

O sol sepõe,atardecai, a noitedesce,

Nesteamadofimde mundo, quase mortodeemoção.

Piade novo, meuquerido bacurau,

Avelhacavaqueoutrora foi caminho,

Enquantofazescontracantocomourutal,

Deixequeeuvolteaopassadocomcarinho.

Serradas Mesas, lá morou tiaZefa,

TiaAbadia, umpoucoalémdo Douradinho.

Pelasquebradas háumcantodiferente,

Rouxinoldesiludidoqueretorna hojeao ninho.

O sertanejosenteevoltaàsorigens,

Nodesesperodeencontrar felicidade,

Emboraquase nãoexistam matasvirgens,

Agenteencontraosretalhosdasaudade;

Um taperacomosrestosdeumcurral,

São fragmentosdoquefoi a mocidade.

Seasaudadeé bemque mefaz mal,

Vouvivendode lembrançasparater felicidade.

Campos Amados de Coromandel Retalhos de SaudadeGoiá/Waldemar de Freitas Assunção Goiá/Francisco do Carmo

Page 80: Songbook Goiá

Comarainhado meudestino

Fui conhecero JardimdeAlá,

Onde, nascoresda madrugada,

Aindacantaosabiá.

Tardes morenasde Matogrosso,

Apazdo mundoachei por lá.

Árvores lindase bemcuidadas,

Soltandofloresamareladas,

Sobreascalçadasde Cuiabá.

Domingotristedadespedida,

Choraviola lá no Crispim,

Deixei Matogrossodo Norte,

Maspeladeusa, chorandoeuvim;

Eu fizpraelaumsimplesverso,

Umuniversosorriu pra mim;

Minhaviola brilhou nostampos,

Devidoaos bandosdepirilampos

Nosverdescampos láde Coxim.

A novaaurora, tãoradiosa,

Aconteceuesegui além.

Em Campo Grande, passei pensando:

Porqueseráquequerooutroalguém?

Masumamorassimrepentino,

Àsvezesvalepormaisdecem;

Notei, de modotãocaprichoso,

Aquele lindorostocharmoso,

Olharmanhosodequemquerbem.

Adeus, rainha mato-grossense,

Nãosei se foi meu bemou meu mal;

Sósei que nuncaem minhavida

Euconhecioutroamorigual.

Adeus, gatinhatãocarinhosa,

Estátuaviva, escultural;

Adeus, meninadafala franca,

Quetemagraça, belezaepanca

Dagarça brancadopantanal.

Nesta madrugadacalmaefria,

Vemuma mulhersedespedir.

Deixoparasemprea boêmia

Em buscadeaventurasvou partir.

Quemsoueu para mudaroteudestino,

Nãose mudaoformatodeumaflor.

Tensasinadevenderfalsoscarinhos,

Não nascesteparaterumsóamor!

Segue, mariposa, a tuaestrada,

Queeu também irei pra muitoalém;

Da lamatu fizestetua morada,

E euquasecai nelatambém.

Porrecordartristepassado,

Evemachorarosolhosteus;

Nãopossomaisviverateu lado,

Mulher, flordo lodo, adeus!

Tardes Morenas de Mato Grosso Flor do LodoGoiá/Valderi

Goiá/Biá

Page 81: Songbook Goiá

Trago meu peitoesmagadodesaudade

Deumacidade, berçoamadoonde nasci;

Cidade meiga, pequeninae formosa;

Terrasaudosa, ondecontentevivi.

Vejoem meussonhosas montanhasverdejantes,

Queosviajantesvivemsempreacontemplar;

Lagoazul, esperançadeumavida,

Hojeperdida, pois não mais hádevoltar

Óh, mundo ingrato, que mefezviverausente,

Daquelagente, asaudade meacompanha;

Ah, comosofro, quandosonhocomacasinha,

E a igrejinha lá noaltoda montanha.

Por issoàsvezes, quandoé noitede luar,

Ouçoasonharocantardosseresteiros;

Óh, doce infância, sonhodefelicidade,

Juntoàsaudadedosantigoscompanheiros.

Campodo Meio, achorartedisseadeus,

Outroscaminhos meobrigaramatedeixar;

Porémeu peçoao bom Deusqueteproteja,

O bomcaboclonãoesqueceseu lar.

Mesmosorrindo,vivoquaseemumexílio,

Sou um bom filho, mastalvez nãovolte mais;

Adeusamigos, adeus Campodo Meio,

Adeusamores, adeus Minas Gerais.

Canção da Minha TerraGoiá/Luiz Castro

À minha mulheramada

Euofereçoestacanção;

Aeterna namorada

Detantosanosdeunião.

Companheiradedicada,

Queviveavidasem ilusão;

Sealegracomquase nada,

Aalma-gêmeatãoencantada,

Tetragosempre nocoração.

Asorte jávem marcada,

E cadaum, comsua missão.

Eu nuncaseria nada

Semessadeusadaperfeição;

Que,àsvezes, sofrecalada,

E meperdoaemcompreensão.

Semelaeu nãoexisto,

E aqui, em nomede Jesus Cristo,

Lherendoopreitodegratidão.

Nessa minhacaminhada,

Sempreàprocuradeperfeição,

Nãoparo nunca naestrada,

Porque nãofaltaorientação.

Atéofimda jornada

Terei comigoessaproteção.

Jamais terei empecilhos,

Hildaquerida, mãedos meus filhos,

Humildemente, lhe beijoa mão.

GoiáMinha Mulher Amada

Page 82: Songbook Goiá

O sonhomais beloquetiveemcriança

Foi seralgumdiaumcompositor.

Louvarem meusversosoverdeda mata,

O cantodaponte, oorvalhonaflor.

Com 14 anos, deixei minhaterra,

E quasequea mágoa me matadedor;

Morei empalácio, emranchodepalha,

Comi em banquete,vivi de migalha,

Maso itineráriode Deus nunca falha:

Nagrande batalha, eu fuivencedor.

Fizgrandesamigosem minha jornada,

Sem terpreconceitoderaçaoudecor.

Fui incentivadoemváriasescalas,

De mãode lixeiroagovernador.

Sougratoportudo, mas nãovaidoso,

Ascoisasda mentesótemumautor;

Tal qual aaragemqueondulaacampina,

Aondaserenaqueacalmaeensina,

Embora imperfeito, a mim ilumina

A Graça Divinado Meu Criador.

Àsvezesperguntamaos meuscompanheiros

Dograudeculturaquesou portador.

Nãofaçocampanhaem meu benefício,

Pra mima modéstia tem muitovalor.

Sou filhodiletodasimplicidade,

Adoroavidado interior;

Viajo naescalado meucarrossel,

Detremoude bonde, embalaocorcel,

E à minhacidadesousempre fiel,

PorCoromandel, eu morrodeamor.

Naforçasublimedos meusprotetores

Conquistoamizadesporondeeu for;

Caminhotranquilo, nãotemoa inveja,

Quem nãoé maldosonãoguardarancor.

Cultura não mudaaalmadagente,

Dascoisas maissimplesserei defensor.

Osreisda intrigaeas imperatrizes

Queseequilibrem nosprópriosdeslizes,

Se livremdaspelesde falsos juízes,

E sejam felizes na Pazdo Senhor.

Sonho de Criança Goiá

Page 83: Songbook Goiá

Fiz tanta homenagemao interior

E aotrabalhadordealmagentil,

Osversosquefiz, oscolegasgravaram

E seespalharamporeste Brasil.

E a 'Saudadeda MinhaTerra’

Tornou-seum hino navozdo meu povo;

Porquequemdeixousuaterraquerida,

Emboraalcançandosucessonavida,

Não háquem nãoqueirarevê-lade novo.

Queméqueesqueceocampo, acascata,

O lago, a mata, apescadeanzol,

O gadopastando, ocapimdoatalho,

Molhadodeorvalhobrilhandoaosol;

E agentilezadaquelepovo,

Queatodosdispensao mesmocalor.

Eugostodavidatambémdacidade,

E sei queexistea felicidade,

Masdeveser filhado interior.

Nos bailesdaroçaeusemprecantava,

Alguémque meamavachoravapormim;

Depoiseudançava nograndeterreiro,

Sentindoocheiroda florde jasmim.

E até hojeaindasintoaqueleperfumepairando noar

Quefazrevivera feliz mocidade,

É operfumedadocesaudade,

Que nada no mundoconsegueapagar;

É quaseum mistériodavidadagente,

A lutada menteéquasequevã;

Aquiloemque hojesevê naufragada,

Talvezserá nadaem nossoamanhã.

E a 'Saudadeda MinhaTerra’

Estáem minh'almaeem todoo meuser;

Nopalcodavidaeuvou trabalhando,

Masquandosentiracortina fechando,

É na minhaterraqueeuquero morrer.

Navegandovidaafora,

Pelo mardaesperança,

Aprendi, desdecriança,

Sobreasondas me manter.

Aoraiarda juventude

Vi passardepressaosanos;

Na marédosdesenganos,

Consegui sobreviver.

Evenci nessa jornada

Furacõesetempestades,

E mentiraseverdades,

Que navidatodostem.

Masperdi agrande luta

Paraumadorconstante,

Asaudadealucinante

Queeusintodealguém.

Guardiãodos navegantes,

Essemarmisterioso;

Quedestinocaprichoso,

Lhepergunto, éo meu?

Seopassadoestá morto

Nosconfinsda mocidade,

Porquevivodesaudades

Deumamorque já morreu?

Olhostristes, sonhadores,

Que meolhavamcom ternura

Quandoeueraacriatura

Mais felizquepôde haver.

Qual seráo felizardo

Queagorase fascina;

O encantode menina,

Nuncapudeteesquecer.

Quantasvezeseucomparo

O passadoeopresente;

Tusurgiste mansamente,

Enfeitandoosdias meus.

Fui feliz, masvemotédio,

Comosempre, dominando

E deixei-tesoluçando

Naesquinadoadeus.

Tu meamaste na idade

Dapaixão maiscomovida;

Massaí datuavida

Sem notaroquedeixei.

Jácansadodaprocura

De ilusõesesonhos loucos,

Hojeestou morrendoaospoucos

Peloamorquedesprezei.

Gente da Minha Terra GoiáEsquina do AdeusGoiá/Almir

Page 84: Songbook Goiá

Quem teveosamoresquetive navida

É genteentendida na mágoae nador;

E sabe, porcerto, queumdocecarinho

Àsvezeséespinhoem formadeflor.

Estandosofrendoaqui nacidade

A loucasaudadedeumcertoamor,

Busquei oremédiopra mentesaudosa

Navidagostosado interior

Cruzei oscerrados, chapadaseserras,

Pro ladodasterrasde Minas Gerais;

Vi campos floridose beloscenários,

Ouvi oscanários nos macaubais.

Fumaçadistante noazul do horizonte,

Naencostado monte, formandoespirais;

Vi tudoqueamo natranquilidade,

Mas minhasaudadeaindaera mais.

Passei uma noite no RanchoAmizade

Evi nasaudadeocomeçodofim;

Achuvacaía naquele borbulho,

Num triste murmúrioporsobreocapim.

A noiteavançavaeeu nãodormia,

Agorasabiaqueamareraassim;

Pois meentreguei aosonoprofundo

E aaurorado mundocaiusobre mim.

Voltei pracidade, fiquei naagonia,

Atéqueumdia meu bemencontrei;

Beijei a meninacom todocarinho,

E aquelerostinhoacariciei.

Cantandoseguiu-me na linhadavida,

Naestradadafloridaqueeu lhe mostrei;

Porqueelasabequeagoraéso minha,

És minharainha, eusouoseu rei.

Óh, minuanodosudoeste,

Ventinhofriodoanoitecer;

Naprimaverada minhavida,

Sintoo invernoseaproximar,

Enfrentochuva miúdae fina,

Quea lei docarma mefazviver;

Osgrandeserrosdasoutrasvidas,

Aqui naterraeuvimpagar,

Venhode longe, de muito longe,

Deumpontinhodaeternidade,

Umprisioneirodosprópriosatos,

Pagandoagorasuasações.

Tal qual atodos, nasci chorando,

Sem terachancede liberdade;

Poisvimcumprirminhasentença,

Nesteplanetadeprovações.

Humanidadeque, poucoapouco,

Nopróprioerroquerseafundar,

É impossível qualificar,

Tanta maldadequetodostêm;

Porém, conformedisseopoeta:

Nãotenhochancedecondenar.

Não meassisteessedireito,

Poissou umpobre humanotambém.

Nãotenhonadadepuritano,

Pelocontrário, errei demais;

Almavulgardepoucacultura,

Quevemdostemposdos filisteus,

Mas não lamentoasamarguras,

Poisafinal, em linhasgerais:

Adorensinaàalma impura

Comochegarmaispertode Deus.

Aurora do Mundo Goiá Goiá/MarcianoMinuano do Sudoeste

Page 85: Songbook Goiá

Há muitosanoseudeixei estacidade,

Chorandode amargura

Pelacriaturaqueeu tantoquis;

Chegando nacasinha, humildee bela,

Nãovi aquelaque jurou umdia mefazer feliz.

Ai, quantador...

Passoolhandoemsua janela,

E nãovejoelaesperarpormim.

Ai, quetransformação...

Encontrei meu bem narua, perdida,

Nuncaesperavaque minhaquerida

Magoassetantoumcoração.

Ai, mundoenganoso...

Quetransformaflorem folhacaída;

Meu bem, oque houvecom tuavida,

Porquete jogaste nestaperdição?

“Sepassaram tantosanos

Deamarguraedesenganos,

Nãocansei deteesperar;

Mas meuspaisserevoltaram,

Cruelmenteobrigaram,

Comooutroeu mecasar;

Sentindoasaudadetua,

Troquei o larpelarua

E nesteabismovim morar.”

E agorasóresta, meu bem,

Chorandodizer-te, adeus;

Roubandoodestinotão ingrato

Queumdia me levoudos braçosteus.

Éverdadeque muitotequero,

Massei que nãoposso livrar-tedo mal;

Nossauniãoécontraa lei daterra,

E na lei de Deusépecadomortal.

Deixa-tedesseorgulho,

Pobre messalinadostempos modernos.

Eu teadmirava,

Masde hojeemdiante já nãosouseu fã.

Esta matériapodre,

Células terrestresquecompõemocorpo,

Servirádepasto

Numacampaescurado nossoamanhã.

Quemsoueu...?

Meroperegrino, ante mil espelhos,

Eu nãosou ninguémparadarconselhos,

Repitosozinho, meu Deus, quemsoueu...?

Muitosutilmenteapresençadealguém,

Trazendo-meversos, talvezdoalém,

Paradarconfortoaquemseperdeu.

Viestedeoutraseras,

Trazendocontigoa nobre missão:

Napodridãodo mundo,

Pagastede novo, instintoanimal.

Poiscuida-te, menina,

Porqueestecorpo já nãovale nada,

Masresta-teoconforto

Decuidardaparteespiritual.

Pecado Mortal Goiá/MarcianoMessalinaGoiá/Benedito Seviere

Page 86: Songbook Goiá

Adeusamigos, companheirosdeviola,

Sei queéchegadaa horadeeu partirpraeternidade.

Meucoraçãochoraumprantoemcascata,

Pordeixaraserenata, bem naflorda mocidade.

Adeus,viola,dedicadacompanheira,

Juntoà minhacabeceira herdaasombradasaudade

Deumpobreartista, semplatéiadelirante,

Podeatécairnoprantoe nodramadeverdade.

De minhavida, umrosáriodeamargura,

Só não levoadesventuradequerermal aovioleiro;

Seeu merecer irmorar lá no infinito,

Caboclinhoe Gauchitovãoseros meusparceiros.

Nossotriodeamore humildade,

Pois nocéu não hávaidade nemquem mandaéodinheiro.

Deixo naterra meuscolegascombaterem,

Cadaqual semprequerendosermaiordoqueocompanheiro.

Adeus, colegas, perdoema minhafranqueza,

Poisécomgrandetristezaqueagoravou lhesdeixar.

Adeuscatiras, noites friasdegaroa,

Deixoestavidatão boa, queeu nãopuderaproveitar.

Adeus, Maria, nãosei odestino meu,

Lembraaspalavrasde Deuspravocêseconformar.

Brilhodocéu, somente Cristose lêsó...

O restoveiodopóeaopóretornará.

Socorro, Jesus Cristo, nossa floraesta morrendo,

Nossa faunaestáperdendoseusespécimes maisraros;

Destroem nossaterra, seusrecantosecastelos,

Patrimôniosdos mais belos, importantesetãocaros.

Florestassecularesestãosendodevastadas,

Nossaságuas maculadaspelasanha industrial;

Nãosendoencontradaoutra forma maisviável,

Será morte inevitável parao mundoanimal.

Permita Deusqueo mundo nãosevejaemapuros,

Prognósticos futuros, tristemente, nãosão bons:

Umsimplesapertardeum botãoemumaguerra

Podedestruiraterra, pormilhõesde megatons.

Que imagenstenebrosas, umplanetaressequido,

Pobreastro jáperdido, pelocosmoavagar;

Semrios, sem lagoas, sem florestasecerrado,

E osterráqueossufocados napoluiçãodoar.

Não matem nossaterra, grandes homensdospoderes,

Deixemque humildesseresvivamao natural;

Venham todosparaocampo, desfrutardoargostoso,

Detergentepoderosodapoluiçãomental.

Aos interessespróprios, muitagentedeapega,

E o mundo já não nega, estatristerealidade;

Algunscompatriotassãopioresqueserpente,

Concorrendo lentamenteparaofimda humanidade.

Adeus do Mineiro Goiá/Zacarias Mourão Goiá/Zacarias MourãoPoluição

Page 87: Songbook Goiá

Estou numgrandedilema, porquetenhotrêsamores,

Caminhoporentreas floresdeumparaísosem fim;

Trêsamoresdiferentesetrês tiposdecarinho,

Euachoqueo meucaminhonãopodeseguirassim;

Vou trilhando nestavidaestradinhasparalelas,

E se nãovivosemelas, elas nãovivemsem mim.

Aprimeiraéquietinha,vive nasimplicidade,

A maispuraamizade, emversos meus já falei.

Naaurorado meu mundo, conformeumafrase minha:

Elaé minharainha, aindasouoseu rei.

Cantacomigoemdueto,voz linda, bemcristalina;

Seeu perderessa menina, queseráde mim, nãosei.

Asegundaéartista, o Brasil todoconhece,

Aplatéiaestremececomseugrandeesplendor;

Muitos homensseajoelhamepraela fazem festa,

Mas, porém, eladetestaessetipodeamor;

Evoltapara São Paulo, para meu humilde ninho,

Buscandosempreocarinho, doseu poetacantor.

A terceiraé normalista, a mais lindaprofessora,

E emumaemissora, dáaulasdeportuguês.

Osamigos meperguntamcomoéquevou fazer...

Seeu possoescolherapenasumadastrês.

Sede novoperguntassemqual delasescolheria...

Entreas três, eu ficariacom todasdeumavez.

Três Amores Goiá/Toni Gomide

Ah, seeu pudesse, meu Deus,

Voltaraotempopassado,

Revero lagoencantado,

Do meuamadorincão...

Pisarde novooscaminhos

Porentreasserrasecampos,

Aperseguirpirilampos

Nas noitesde São João.

Quiserateraventura

Deveros meus horizontes;

Beberaáguadafonte,

Que nuncapudeesquecer.

Pescarno meu poçoverde,

Lagoacordaesperança,

Que minhaalmadecriança

Talvez jamaisvolteaver.

Quecoisaestranhaestavida!

Comoécruel odestino,

Que levaosonhomenino

Detodososcorações.

Só ficamdoces lembranças

Daquiloque nãoseesquece,

Aalmasedesvanece

Numvendaval de ilusões.

Óh, madrugadacheirosa

Da minhaterraquerida,

Dos bons momentosdavida,

Quetãodistantes jávão.

A minhagrandesaudade

Eraumavoltaaopassado,

Um hino interpretado

Nascordasdocoração.

Goiá/Antônio MaraniVolta ao Passado

Page 88: Songbook Goiá

Comochoro, Deusdocéu,

Minha infânciaventurosa!

Estradinhacor-de-rosa

Queavida me mostrou;

Meniniceencantada,

Quese foi tãoderepente

Dasaudadequeficou.

Quedistância nossepara

Das manhãsde minhaterra,

Da nascenteaopédaserra,

Do jaóconquistador;

Dacasinhadachapada,

Lá nosítio Bem-te-vi,

Ondeumdiaconheci

Meu primeirograndeamor!

Óh, meu Deus, seeu pudesse

Viajarcomopensamento,

Pra buscarumsentimento

Nosconfinsdo meu passado;

Euveria novamente

Meuamado Douradinho

E, quemsabe, o meu paizinho,

Estariado meu lado.

Depoisdesofrermuito navida,

Minhaquerida ,aqui estou.

Nãoencontrei a felicidade,

Poisasaudade medominou.

Sei que meamasinceramente,

E que, ausente, morrodedor;

Se nadistância nóspadecemos

É que nascemosparaoamor.

Seguimos juntinhos

O mesmocaminho,

E odoce beijinho

Agoraésó meu;

Mefale, me beije,

Meabraceapertado,

Presenteencantado

Queavida medeu.

O teu passadoeu nãocensuro;

Jurei e juro, sempreteamar.

A negra nuvema luaembaça,

Masquandopassa,voltaa brilhar.

Quero navidaseroseuguia,

Dar-tealegriaé meudireito;

Paraquem ficouapaixonado,

O bemamado nãotemdefeito.

Minha Infância Goiá/Hélio Alves Goiá/ZaloMesmo Caminho

Page 89: Songbook Goiá

Enquantoatrindade louvavao Divino

Surgiu umgrã-fino numcertosalão,

Falando horrores, comaresdetroça,

Dagentedaroçaquecuidadochão.

Masentreospresentes, um moçoouvia;

Comdiplomacia, chamou-lheaatenção:

‘Euvenhopedir, seu mau brasileiro,

Quetrateoroceirocomeducação.’

Jogandopratrásocabelocomprido,

Numgestoatrevido, falouarrogante:

‘Quemés, óhcaipira, comessarompança

Tedarconfiança meé humilhante;

Meu pai temriquezase nasociedade

Sófaçoamizadecomgente importante,

E quem teapóia, caipiraatrasado,

Procuraatestadode ignorante.’

Respondeuo moço, comeducação:

‘Vimverosertãoondefui criado;

Agoraaverdadetemqueviratona,

Não me impressionaseu papofurado;

Quevaleestaestampaderico fingido,

Seésatrevidoe mal educado?

Sou pobree humilde, masdigoaverdade,

Que nafaculdadefui diplomado.

Respeitoedefendoo nossoroceiro,

Queganhadinheiro lavrandoochão;

Semele, coitadodealgunsqueenriquecem

E àsvezesseesquecemquecomem feijão.’

Ouvindoestas frases, todaacaboclada

Em fila formada, apertaram-lhea mão,

E o moçogrã-fino,vencido, bradava:

‘Eu nãoesperavaporesta lição.’

Lição de Caboclo Goiá/Julião Saturno

AclasseroceiraeaclasseoperáriaAnsiosasesperamareformaagrária,SabendoqueelatrarásoluçãoParaasituação, queestáprecária.Saindooprojetodochãobrasileiro,Decadaroceiroplantarsuaárea,Sei que na miséria ninguémviveria,Seaprodução jáaumentariaQuinhentosporcento, até napecuária.

Estagrandecriseque hátempossurgiuMaltrataocaboclo, ferindoseu brio;DentrodeumpaísricoealtaneiroMorrem brasileirosde fomeedefrio;Em nossascidades, ricasem imóveis,Milhõesdeautomóveis jáseproduziu,EnquantoocoitadodopobreoperárioViveapertadoganhandosalário,Quesobedepoisquetudosubiu.

Nosso lavradorquevivedochãoSótema metadedasuaprodução;Porqueasementequeelesemeia,Temqueserameiacomseu patrão.O nossoroceiroviveumdilema,E oseu problema nãotemsolução;Porqueoricaço, quevive folgado,Achaqueoprojeto, se forassinado,Estará ferindoa Constituição.

Masgrandeesperançaopovoconduz,E pedea Jesus, pelaoração,PraguiaropobreporondeeletrilhaE paraa família nãofaltaropão.Queeles nãodeixemocapitalismoLevaraoabismoa nossanação;Adesigualdadequeexisteétamanha,Enquantooricaço nãosabeoqueganha,O pobredopobrevivedetostão.

Goiá/Francisco Lázaro

Grande Esperança ou Reforma Agrária

Page 90: Songbook Goiá

Meucoraçãodecaboclo,

Aqui nacidadegrande,

Quase morredesaudade

Dacasa branca naserra.

Porumcaprichodasorte,

Tivequedeixarumdia

Bailinhosdepoesia,

Pagodesde minhaterra.

Deixei as festasdereis,

Minhas lindas namoradas.

Segui poroutrasestradas,

Mas nunca meesqueci.

Guardei nofundodaalma

Aquelas horasqueridas,

Madrugadascoloridas

Dosertãoondeeu nasci.

Nunca maiseu pudeouvir

Osarrulhosdarolinha,

Nemosoldetardinha,

Noverdedoscafezais.

Vivo nacidadegrande,

Nos laçosdosdesenganos,

E comocorrerdosanos

Asaudadeaumenta mais.

Meu povo interiorano

Quevive nacidade,

Somosuma irmandade,

Sofremosa mesmador.

Meuabraçoemocionado

Aessagentequerida,

Queguardaportodavida

Lembrançasdo interior.

Bonecadarua, rainhasem trono,

Seucorposemdonoumdia foi meu;

Porémdesprezaste meu larsemriqueza,

Vendendoa belezaqueavidatedeu.

Rostinhodefada, corpinhodedama,

Florzinhada lama, enfeitedo mal.

Avida boêmiaqueatodosconsome,

Tu manchas meu nomeeatua moral.

Porquedesprezastesincerocarinho,

Seoutrocaminhoseráoteu fim?

Apesardetudo, tedigosincero,

Queaindatequero juntinhode mim.

Nocorrerdotempoaestradadeclina,

E tu, flormenina, perdea mocidade;

Osanospassados, qual água nafonte

Deixandoo horizonte na meigasaudade.

Menina formosa, teráseu regresso,

A ti euconfessoe juroporDeus :

Setudesprezaresavida inclemente,

Terás novamenteoscarinhos meus.

Coração Caboclo Goiá/Plínio Alves Goiá/Sebastião AurélioBoneca da Rua

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CULTURA

PRODUÇÃO:

CNPJ: 04.492.490/0001-41 – (34) 3312-5312

Rua Henrique Dias, 29 - B. Estados Unidos, Uberaba – MG – CEP 38015-100

Guti Produções

Artísticas e Culturais

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CULTURA

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O legado poético e musical de Gerson Coutinho da Silva, o Goiá, pertencente ao patrimônio cultural brasileiro,

revelaogêniocriadordessemineirodeCoromandel,quefezcarreiraemSãoPaulosemtiraropédoAltoParanaíbae

doTriânguloMineiro. Ele foi o porta-vozdemilhõesdebrasileiros quedeixaramsuas casas no interior e no sertão

paraocuparascidadeseconstruiroBrasildosnossostempos.

Gerson Coutinho é uma figura singular no cenário artístico nacional, como divulgador da cultura do interior e

criadordalinguagemquedeunovaroupagemàmúsicasertaneja. Goiáestudouapenasatéoprimeiroanoprimário

e,comonenhumoutrocompositordogênero,trabalhoupara“impor”ousodoportuguêscorretonascomposições

damúsicaregional,numgestodevalorizaçãodolegadoculturaldaspopulaçõesdointeriordopaís.

Nas centenas demúsicas que compôs, Goiá colocou como tema central a exaltação da vida simples, o respeito à

naturezaeoamor irrestritoàsuacidadenataldeCoromandel. Entresuasmúsicasdestaca-se,comoumadasmais

conhecidas e tocadas no país, “Saudade de Minha Terra”, gravada por mais de 50 duplas diferentes. Entre estes

estão Chitãozinho e Xororó, Sérgio Reis, César Menotti e Fabiano, Belmonte e Amaraí, Zilo e Zalo, Milionário e Zé

Ricoemuitosoutros. Goiánasceuem1935,emCoromandel,efaleceuem1981,nacidadedeUberaba.


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