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GESTÃO, CIÊNCIA & SAÚDEREVISTA DA FUNDAÇÃO EZEQUIEL DIAS

Volume 3, número 2, julho/dezembro de 2008

Funed – Fundação Ezequiel Dias

Belo HorizontePeriódico semestral

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APRE

SENT

AÇÃO

É com grande satisfação que avança-mos com a revista científica da Funed, Gestão, Ciência & Saúde, lançando

o terceiro número e caminhando em busca da sua indexação na rede Scielo (scientific eletronic library online) e na Bireme (biblioteca virtual em saúde), cen-tro especializado da Organização Pan-Americana da Saúde, em colaboração com os Ministérios da Saúde e da Educação e com a Secretaria da Saúde e Uni-versidade Federal do Estado de São Paulo.

Mais contentamento sentimos pelo registro de valoro-sas contribuições em várias áreas do conhecimento relacionadas à saúde pública, vindas de diversas ins-tituições atuantes nessa esfera.

As contribuições da casa vêm de representantes do Cen-tro de Informação Científica, Histórica e Cultural com a descrição da homenagem pelo centenário da Fundação Ezequiel Dias e o registro das principais comemorações ocorridas durante o ano de 2007, importantes eventos científicos, históricos e tecnológicos, que mobilizaram todos os servidores, destacando a vitória de uma institui-ção pública que agregou nos seus mais de cem anos de existência conhecimento científico e valores sociais.

A colaboração da Diretoria de Pesquisa e Desen-volvimento trata de alguns aspectos relativos à uti-lização de espécies vegetais no desenvolvimento de fitofármacos e fitoterápicos, assim como da re-gulamentação brasileira para esses medicamentos, demonstrando o interesse da instituição para a bio-prospecção de produtos naturais vegetais, a exemplo de vários países desenvolvidos, para a produção de novos fármacos.

A Diretoria do Instituto Octávio Magalhães apresenta duas relevantes contribuições, relatos das atividades de vigilância sanitária de alimentos: a que avalia a in-fluência do inóculo de Aspergillus parasiticus na produ-ção de aflatoxinas, fungos contaminantes de uma gran-de variedade de alimentos cujas toxinas apresentam atividades carcinogênica, teratogênica e mutagênica, ilustrada, experimentalmente, em grãos de amendoim, e aquela que descreve o papel do Laboratório Central de Saúde Pública de Minas Gerais (LACEN-MG) na investigação de surtos de toxinfecções alimentares por enterotoxinas, permitindo estabeler uma análise de, risco dos produtos alimentícios e gerando informações orientadoras de programas para a produção e comer-cialização de alimentos no território nacional.

Foi convidada a participar deste número a consultora nacional para vigilância sanitária da Organização Pan-Americana da Saúde com uma excelente contribuição que avalia o regulamento técnico das boas práticas

para a fabricação de medicamentos como instrumen-to de vigilância sanitária nacional por meio do méto-do de análise documental participativa, centrada nos aspectos de suficiência, abrangência e compreensão textual, e concluí que esse instrumento exige melho-rias, recomendando a adequação da apresentação e a complementação de seu conteúdo temático, a revisão do nível de detalhamento e a adoção de providências visando superar algumas falhas documentais.

A Universidade Federal de Minas Gerais, convidada a participar do terceiro número da Gestão, Ciência & Saúde, apresenta uma revisão sobre os aspectos conceituais e históricos do currículo da Faculdade de Medicina, desde a sua criação em 1941, as modifi-cações ocorridas em 1975, ainda em funcionamento, acarretando estagnação e retrocesso, e refere-se à nova transformação curricular em curso, proposta pelo Ministério da Educação do Brasil. O primeiro au-tor dessa revisão recebeu a “Homenagem Persona-lidade Médica Mineira 2008”, na categoria Atividade Docente, reconhecida pela Associação Médica, pelo Conselho Regional de Medicina e pelo Sindicato dos Médicos do Estado de Minas Gerais.

Outro destaque deste volume é o representante da Fhe-mig, que abrilhanta nossa Revista com um artigo origi-nal que relata a importância da racionalidade de gestão sobre a saúde financeira de hospitais que lidam com vítimas com lesões cardiovasculares, ilustrado com da-dos do Hospital João XXIII, fortalecendo o papel da au-ditoria de contas para o setor assistencial de saúde.

Finalizando temos a contribuição da Pontifícia Univer-sidade Católica de Minas Gerais, que apresenta parte da história das ciências naturais em nosso País desta-cando como marco responsável pelo conhecimento dos produtos naturais brasileiros, bem como de seus usos e propriedades, a vinda de Dona Maria Leopoldina ao Brasil acompanhada pela missão científica que incluía os dois cientistas referenciados no texto e que instaura um período áureo de viagens científicas, dando início à profícua pesquisa acerca da flora e fauna brasileiras.

A meta da Gestão, Ciência & Saúde de registrar e di-vulgar o conhecimento desenvolvido na nossa e demais instituições atuantes em saúde pública faz parte da mis-são da Funed de “participar da construção do Sistema Único de Saúde, protegendo e promovendo a saúde”.

Que este número incentive a participação da comuni-dade científica com novas contribuições importantes na área do conhecimento das ciências da saúde!

Thais Viana de FreitasCoordenação Editorial

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EXPE

DIEN

TECoordenação Editorial

Editora: Thais Viana de FreitasRepresentante Fundação Ezequiel Dias:

Carlos Alberto Pereira Gomes

Conselho Editorial CientíficoAnna Bárbara de Freitas Carneiro Proietti

Presidente da Fundação Centro de Hematologia e Hemoterapia de Minas

Gerais - HEMOMINAS

Armando da Silva Cunha JúniorProfessor do Departamento de Pro-dutos Farmacêuticos da Faculdade

de Farmácia da Universidade Fede-ral de Minas Gerais

Benedito ScaranciSuperintendente de Epidemiologia da Secretaria de Estado de Saúde

Carlos Alberto Pereira Tavares Pró-Reitor de Pesquisa da Universi-

dade Federal de Minas Gerais

Carlos Alberto TagliatiProfessor do Departamento de

Análises Clínicas e Toxicológicas da Faculdade de da Faculdade de Farmácia da Universidade Federal

de Minas Gerais

Edson PeriniProfessor do Departamento de

Farmácia Social da Faculdade de da Faculdade de Farmácia da Universi-

dade Federal de Minas Gerais

Eugênio Vilaça MendesConsultor da Secretaria de Estado

de Saúde de Minas Gerais

Evaldo Ferreira Vilela Secretário-Adjunto da Secretaria

de Estado de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior de Minas Gerais

Francisco de Assis AcurcioProfessor do Departamento de

Farmácia Social da Faculdade de da Faculdade de Farmácia da Universi-

dade Federal de Minas Gerais

Geraldo LuchesiConsultor da Câmara dos Deputados

Federais

José Geraldo de Freitas Drumond Presidente da Fundação de Amparo

a Pesquisa do Estado de Minas Gerais – FAPEMIG

Josiano Gomes Chaves Diretor de Desenvolvimento Estraté-gico e Pesquisa da Fundação Hos-pitalar do Estado de Minas Gerais

- FHEMIG

Lin Chih ChengProfessor do Departamento de Enge-nharia de Produção da Faculdade de Engenharia da Universidade Federal

de Minas Gerais

Luiz Fernando Lima ReisDiretor de Pós-Graduação do Centro de Pesquisa e Ensino da Fundação Antônio Prudente (Hospital do Cân-

cer A. C. Camargo)

Mário Neto BorgesDiretor Científico da Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de

Minas Gerais – FAPEMIG

Orenzio Soler Consultor da Organização Pan-Ame-

ricana da Saúde

Paulo Eduardo Mayorga BorgesProfessor do Departamento de

Produção e Controle de Medicamen-tos da Faculdade de Farmácia da

Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Paulo Lee HooDiretor do Centro de Biotecnologia

do Instituto Butantan

Rosane Marques Crespo Costa Presidente da Fundação de Educa-

ção para o Trabalho de Minas Gerais – UTRAMIG

Comitê Editorial Executivo Marina de Castro Figueiredo

Assessora de Comunicação Social da Fundação Ezequiel Dias

Anna Maria Leite Pereira de Andrade Chefe do Centro de Informação

Científica, Histórica e Cultural da Fundação Ezequiel Dias

Revisores contribuintes Ana Maria Arruda Lana

(Universidade Federal de Minas Gerais) Flávio Diniz Capanema

(Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais)

Gecernir Colen (Universidade Federal de Minas Gerais)

João Carlos Pinto Dias (Centro de Pesquisas René Rachou

– Fio Cruz)Luiz Simeão do Carmo

(Universidade Federal de Minas Gerais) Maria de Fátima Fassy

(Fundação Ezequiel Dias)Maria Helena Savino

(Fundação Ezequiel Dias)Maria Mercedes Silva Petres

(Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais)

Mônica Maria Oliveira Pinho Cerqueira (Universidade Federal de Minas Gerais)

Myrna Sabino (Instituto Adolfo Lutz)

Patrícia Machado de Oliveira (Universidade Federal dos Vales do

Jequetinhonha e Mucuri)Rita de Cássia Marques

(Universidade Federal de Minas Gerais)Roberto Marini Ladeira

(Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais)

Solange de Oliveira Bicalho (Pontifícia Universidade Católica de

Minas Gerais)Tânia Maria de Almeida Alves

(Centro de Pesquisas René Rachou – Fiocruz)

Gestão, Ciência & Saúde - Revista da Fundação Ezequiel Dias

Periódico semestral dedicado à publica-ção de conteúdo técnico-científico com informações que contribuam significa-

tivamente para o conhecimento nas ciências da saúde e gestão, aberto à

contribuição da comunidade científica e distribuído a leitores de todo o País.

Criação, Editoração Eletrônica e Produção Gráfica

Rodrigo Cardoso de Araújo

ImpressãoAutêntica Editora

Tiragem800 exemplares

Endereço para CorrespondênciaConselho Editorial Científico da Gestão,

Ciência & Saúde – Revista da Fundação Ezequiel Dias

Centro de Informação Científica, Histórica e Cultural

Fundação Ezequiel Dias Rua Conde Pereira Carneiro, 80 - Bairro

Gameleira30 510-010, Belo Horizonte/MG

[email protected]

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SUM

ÁRIO

Fundação Ezequiel Dias: 100 anos de história Fabiana Melo Neves -------------------------------------------------------------------------------------------- 7

Utilização de espécies vegetais para o desenvolvimento de medicamentos:fitofármacos e fitoterápicosCarolina Paula de Souza MoreiraVera Lúcia de Almeida ---------------------------------------------------------------------------------------- 17

Influência do tamanho do inóculo de esporos de Aspergillus parasiticus na produção de aflotoxinas em amendoim (Arachis hypogaea L.)Guilherme PradoJovita Eugênia Gazzinelli Cruz MadeiraVanessa Andréa Drummond MoraisMarize Silva de OliveiraMabel Caldeira de AndradeRobson de Assis SouzaIgnácio José de GodoyJoenes Mucci PeluzioRaphael Sanzio Pimenta ------------------------------------------------------------------------------------ 29

Detecção de enterotoxinas estafilocócicas e de linhagens enterotoxigênicas em alimentos envolvidos em surtos de toxinfecção alimentarRicardo Souza DiasAna Carolina Cordeiro SoaresCamilla dos Santos PinheiroLeandro Leão Faúla ------------------------------------------------------------------------------------------- 37

O regulamento técnico das boas práticas para a fabricação de medicamentos (RDC-210/03) como instrumento de vigilância sanitária nacional Éji Pons Machado --------------------------------------------------------------------------------------------- 45

O Curriculum e o currículo médico da UFMGAri de Pinho TavaresRoberto Assis Ferreira ---------------------------------------------------------------------------------------- 57

Tomada de decisões para o trauma cardiovascular: contribuições da auditoria a partir de um estudo feito no Hospital João XXIII/Fhemig Ricardo Costa-ValMaria Cristina Marques -------------------------------------------------------------------------------------- 71

A vinda de Maria Leopoldina para o Brasil e o avanço das ciências naturais: um olhar sobre a obra de Martius e SpixMaria Raquel Joana dos ReisRenata Vieira da CunhaVanessa Regina de Queiroz -------------------------------------------------------------------------------- 81

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6 Gestão, Ciência & Saúde

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7Revista da Fundação Ezequiel Dias, v. 3, n. 2, jul./dez. 2008

FUNDAÇÃO EZEQUIEL DIAS: 100 ANOS DE HISTÓRIA

FOUNDATION EZEQUIEL DIAS: 100 YEARS OF HISTORY

Fabiana Melo Neves

Historiadora, Especialista em História da Ciência pela UFMG, Historiadora do Centro de Informação Científica Histórica e Cultural da Fundação Ezequiel Dias, [email protected]

RESUMO

Apresenta-se, neste artigo, o quadro histórico das origens da Fundação Ezequiel Dias, com o intuito de registrar as comemorações do centenário de uma das maiores instituições de ciência, saúde e pesquisa do País. O resgate e o registro da sua história contribuem para a preservação da memória institucional, pois não há identidade sem memória.

Palavras-chave: História, Saúde Pública, Memória, Ciência

ABSTRACT

This article presents the historical roots of the Ezequiel Dias Foundation, with the intent to re-gister the celebrations of the centenary of one of the most prestigious health and science research institution in this country. The recovery and record of its history contribute for the preservation of the Institution memory.

Keywords: History, Public Health, Memory, Science

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8 Gestão, Ciência & Saúde

1. INTRODUçãO

Tempo de comemorações e recordações. Tempo de histórias e memórias. Assim, foi o ano de 2007 na Fundação Ezequiel Dias (Funed). Ano em que a Instituição comemorou o seu centenário. Mo-mento em que o passado foi recuperado pelo presente, por meio de diversos eventos institu-cionais, reafirmando sua identidade e seu papel social na saúde pública.

Historicamente, a Funed tem investigado no tem-po e no espaço o seu processo de construção e formação, observando que tanto a memória tem sido construída com base nas narrativas do pre-sente quanto a história tem se tornado o resulta-do de experiências que se acumularam ao longo do tempo. Dessa forma, a Funed atribui sentido ao seu processo de criação e ao papel desempe-nhado na saúde coletiva.

2 - AS ORIGENS

O século XIX foi marcado por períodos de gran-des mudanças políticas, econômicas, culturais e sociais no Brasil. O contato com os países eu-ropeus, a introdução de conceitos positivistas e evolucionistas, aliados às novas aspirações da nascente república e da industrialização, promo-veram o surgimento das primeiras instituições científicas no País. Essas entidades focalizavam a aplicação dos resultados nas necessidades bra-sileiras, na exploração dos recursos naturais, na expansão agrícola e no saneamento urbano e de portos.

Várias instituições foram criadas, principalmente em São Paulo e no Rio de Janeiro, para dar su-porte ao desenvolvimento da economia nacional. Em 1899, foi criado o Instituto Soroterápico Mu-nicipal, instalado na antiga Fazenda de Mangui-nhos, no Rio de Janeiro. Com o objetivo de fabri-car o soro antipestoso e cuidar de uma violenta epidemia de peste bubônica no Porto de Santos, Tinha como diretor-geral o Barão de Pedro Afon-so e como diretor-técnico o jovem bacteriologista Oswaldo Cruz.

Em 1902, Oswaldo Cruz assumiu a direção geral do novo Instituto e selecionou Ezequiel Dias como seu assistente. O Instituto ampliou suas atividades

e investiu, principalmente, na formação de recur-sos humanos, como Miguel Couto, Carlos Chagas, Marques Lisboa, Ezequiel Dias, entre outros.

Em 1905, Ezequiel foi então nomeado Diretor de Hi-giene do Laboratório Bacteriológico do Rio de Janei-ro e encaminhado para o Maranhão, onde passou a desenvolver estudos sobre o Beribéri. Após alguns meses regressou para o Rio de Janeiro em razão do agravamento do seu estado de saúde, mas deixou no Maranhão um completo laboratório de pesquisa, além de ensinamentos experimentais sobre serviços de higiene pública de saúde. Por recomendação mé-dica e em caráter definitivo, seguiu imediatamente para Belo Horizonte, cujo clima era considerado sau-dável para o tratamento da sua doença.

Em Minas Gerais, o clima não estava diferente; a nova capital do Estado, Belo Horizonte, acabava de nascer a partir da visão moderna e progressista da repúbli-ca. A cidade fora planejada de acordo com os ditames científicos da época, respirava salubridade e moderni-dade, era uma cidade em sintonia com o seu tempo.

Na medida em que a economia agrícola e a pecuária ganhavam força e se desenvolviam no Estado de Minas Gerais, surgiam pragas agrícolas, doen-ças bovinas e moléstias humanas que reduziam a capacidade da mão de obra produtiva e o an-damento do desenvolvimento regional e nacional, sendo necessário combater as pragas do campo para não atingir os animais, e conseqüentemente o crescimento econômico, e o meio urbano.

Depois de um ano instalado na nova capital mi-neira e com expressiva melhora, Oswaldo Cruz convidou Ezequiel Dias para dirigir a primeira fi-lial do Instituto Manguinhos em Belo Horizonte.

A inauguração do Instituto Filial de Manguinhos, em 1907, veio demonstrar e reafirmar os novos conceitos de ciência e de saúde, se dedicando à pesquisa e ao combate das pragas que amea-çavam o desenvolvimento econômico do Estado e da nova capital. Ao mesmo tempo, o Instituto revelava novos pesquisadores, que lutavam para semear e fazer florescer o espírito científico em Belo Horizonte. Em 3 de agosto de 1907 foi inau-gurada em Belo Horizonte, na Rua da Bahia, onde hoje funciona a biblioteca pública do Estado, a primeira filial do Instituto Manguinhos (FIG. 1).

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9Revista da Fundação Ezequiel Dias, v. 3, n. 2, jul./dez. 2008

FIGURA 1 - Instituto filial de Manguinhos na Rua da Bahia em Belo Horizonte- 1907. Acervo do Centro de Informação Científica Histórica e Cultural - Funed

Para a implantação da filial, o governo de Minas cedeu na Praça da Liberdade, do lado esquerdo do Palácio da Liberdade, uma casa de aparência modesta, que foi adaptada pelo o arquiteto portu-guês Luís de Morais, o mesmo que projetou o cas-telo mourisco de Manguinhos no Rio de Janeiro.

Nos três primeiros anos, a atividade da filial se limitava à produção de linfas vacínicas contra as diferentes moléstias dos criadores de suíno, de gado bovino e eqüino e ao preparo e conservação do soro antidiftérico e anticarbunculoso.

Em abril de 1910, o raio de ação da filial se ampliou após uma visita de Oswaldo Cruz a Belo Horizonte para uma conversa com o diretor de higiene do Es-tado de Minas Gerais, Zoroastro Alvarenga. A insti-tuição começou a preparar vacinas antivariólicas e de peste da Manqueira e se encarregou de realizar exames necessários ao diagnóstico de doenças e de assuntos de higiene de Belo Horizonte.

Nesse momento também foi anexada à filial a Fazen-da do Leitão, hoje a região do Museu Abílio Barreto, para instalar uma enfermaria veterinária e um posto de observação. Na fazenda seriam examinados os animais suspeitos de doenças e se fariam experiên-cias de profilaxia e terapêutica. Durante esse período o Instituto realizou inúmeros trabalhos, pesquisas e exames relacionados aos problemas rurais, como fe-bre aftosa, peste dos polmões, moléstia de chagas, escorpionismo, entre outros. Haja visto que Minas foi um dos primeiros Estados da nação a ter uma insti-

tuição científica para auxiliar no desenvolvimento da indústria pastoril, seu grande forte na época.

Em fevereiro de 1918 foi assinado o contrato entre o governo de Minas e o Instituto Oswaldo Cruz Filial para o funcionamento do serviço antiofídico em Mi-nas Gerais. O Posto Antiofídico tinha a função de co-lher o veneno das serpentes que lhe eram enviadas pelos fazendeiros. Esse veneno era remetido para o Instituto Butantan, que retornava com o soro antiofí-dico. As serpentes raras ou desconhecidas ficavam no posto para estudo científico. Os materiais para captura das serpentes e as propagandas dos meios de luta contra o ofidismo eram fornecidos pelo Insti-tuto filial. Em troca, o Estado de Minas Gerais cede-ria um terreno ao lado da filial, executaria as obras de construção e subvencionaria o Instituto com uma verba mensal para manutenção do posto.

A filial de Manguinhos foi uma espécie de berço da comunidade científica em Minas Gerais, pois promo-via, como no Rio de Janeiro, reuniões semanais na biblioteca ou na casa de Ezequiel Dias, geralmente às quintas-feiras, para discutir artigos científicos na-cionais e estrangeiros. No café com biscoitos compa-reciam médicos, estudantes, pesquisadores e profes-sores para resumir e comentar os artigos científicos recém-chegados da Europa (FIG. 2). Há indícios de que esses saraus contribuíram para a criação da Fa-culdade de Medicina, em 1911, o que iniciou uma co-laboração duradoura que uniu a pesquisa, a produção e o ensino e deu início à discussão da necessidade de uma instituição para o tratamento e pesquisa do cân-cer em Minas Gerais. Em 1920, o Instituto Radium é criado por Borges da Costa, notável cirurgião também formado em Maguinhos.

Em 1922, Ezequiel morreu de tuberculose. Octávio Magalhães assumiu a direção da filial e verificou que a situação financeira do Instituto não era muito boa, com um balanço financeiro em déficit e uma baixa renda. Magalhães fez um estudo das possibilidades de crescimento e das necessidades da Instituição. Começou seu trabalho procurando melhorar os con-tratos de venda de produtos e ampliou a produção de novas vacinas e soros capazes de aumentar a renda e obter novos clientes. Depois propôs a refor-mulação do contrato com o Instituto Butantan, pois havia uma desproporção entre o soro conseguido pelo veneno remetido e o soro devido aos fazendei-ros pelas cobras enviadas por eles.

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10 Gestão, Ciência & Saúde

FIGURA 2 - Reunião de cientistas. De pé, da esquer-da para direita: Eugênio Sousa e Silva, Irineu Lisboa, J. Aroeira Neves, Odorico Nines. Sentado: Henrique Mar-ques Lisboa, Ezequiel Dias, Octávio Magalhães, Eurico Vilela. Acervo do Centro de Informação Científica Histó-rica e Cultural-Funed

As viagens ao interior do Estado eram um ponto-chave no papel do Instituto, além de ser uma he-rança dos mestres Oswaldo Cruz e Ezequiel Dias. Pesquisavam-se doenças humanas e de animais, de Chagas, escorpionismo, ofidismo, esquistosso-mose, bouba, varíola e outras. Por meio das excur-sões, também se colecionava e resgatava materiais de análise científica. Os elementos recolhidos eram organizados para a montagem de uma geografia médica e veterinária de Minas Gerais e dava ao Instituto condições e elementos de combate aos di-ferentes ramos da patologia.

Aos poucos o Instituto Ezequiel Dias introduzia melho-rias para obter novos produtos e conseqüentemente mais renda. Começou a preparar sulfato de cobre para o tratamento da febre aftosa, a vacina contra o “mal triste das aves” (tifose aviária), o soluto de urotropina para epitelioma das aves e a vacina contra a pneumon-terite dos bezerros ou “peste dos pulmões”. (6)

Em 1931 os exames microbiológicos aumentaram significativamente, tornando-se uma importante fonte de matéria-prima para as pesquisas epidemiológicas. Os estudos visavam o desenvolvimento de atividades preventivas no controle das doenças e, para tanto, o Instituto realizava o estudo e os diagnósticos epide-miológicos, além dos trabalhos de pesquisa científica, que geraram inúmeros artigos publicados nas melho-res revistas nacionais e estrangeiras.

Apesar do aumento das atividades, o Instituto enfren-tava grandes dificuldades financeiras na liberação de recursos do governo federal. Assim, Octávio Maga-lhães reivindicou a transferência da Instituição para a jurisdição de Minas Gerais. Em 1936 o processo con-cluído, o governo anunciou a ampliação do Instituto e a mudança para a Fazenda Gameleira.

Em 1940, com a implantação do Instituto na Fazen-da Gameleira, o governo de Minas sonhava em exer-cer o papel de escola modelo de saúde pública e de centro de pesquisa e cultura biológica por todo o Es-tado de Minas, pelo País e pelo mundo. Para tanto, aumentou a produção de soros, vacinas, produtos químicos e biológicos para hospitais e para as cam-panhas sanitárias dentro de suas fronteiras. Pronti-ficou-se a investir, a manter e a custear o Instituto, prometendo medidas para ampliar e desenvolver seus produtos, sempre visando a defesa humana, a vegetal e a animal daquele Estado.

Em 1941, o então interventor de Minas, Benedito Vala-dares, proíbe as atividades de pesquisa desenvolvidas em Bambuí pelos pesquisadores do Instituto Biológico Ezequiel Dias. Decreta uma reforma radical de toda a estrutura da Instituição e anuncia Antônio Valadares Bahia, seu parente, como o novo diretor do Instituto Biológico. Magalhães apresenta um relatório detalhado do andamento das atividades do Instituto e se despede. Nesse momento, a Instituição perde seu fio condutor, não havendo mais intercâmbio com os pesquisadores e os ensinamentos da escola de Oswaldo Cruz.

Uma nova fase se inaugurou com a saída de Octávio Magalhães do Instituto. Na época o governo de Minas visava o combate das novas endemias, “transformou o Instituto num centro de fabricação de vacinas e soros para o consumo do Estado” (6) em detrimento das ou-tras atividades da Instituição. Aos poucos, seus inúme-ros pesquisadores deixavam a Instituição por falta de incentivo, e as atividades de pesquisa foram se atro-fiando aos poucos.

Apesar do grande número de produtos fabricados pelo Instituto, a década de 1950 foi marcada pela estagna-ção da indústria farmacêutica nacional. Ao mesmo tem-po em que o mundo vivia as inovações tecnológicas, principalmente os antibióticos, ocorriam o estímulo à entrada de capital e produto estrangeiro no País, levan-do ao quadro de dependência tecnológica e industrial dos laboratórios e instituições de ciências brasileiras.

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11Revista da Fundação Ezequiel Dias, v. 3, n. 2, jul./dez. 2008

3 - A MODERNIZAçãO

Na década de 1960, com a retomada da indústria nacio-nal, foi criado pelo governo federal o Grupo Executivo da Indústria Farmacêutica (GEIFAR) que tinha como di-retriz realizar ações que fortalecessem a produção far-macêutica nacional e, por conseqüência, a redução do custo dos medicamentos. No mesmo período também foi estabelecido a Relação Nacional de Medicamentos Essenciais (RENAME) que determinou que os órgãos da administração pública federal somente adquirissem medicamentos indicados nessa relação, e a aquisição deveria ser feita, preferencialmente, em laboratórios públicos ou privados de capital nacional.

FIGURA 3 - Fábrica de Medicamentos da Fundação Eze-quiel Dias 1980. Acervo do Centro de Informação Científica Histórica e Cultural-Funed

Dentro dessa linha, o Instituto Ezequiel Dias amplia sua cesta de produtos biológicos, passando a oferecer tam-bém outros fármacos (Figura 3). Mas as políticas vol-tadas para a área de medicamentos visavam apenas o fortalecimento da produção em detrimento de outras áreas, sendo que as “primeiras ações que associavam o desenvolvimento da indústria farmacêutica à garantia do acesso da população ao remédio ocorreram somente após a crise do modelo de assistência social”. (3)

A década de 1970 foi o período em que os investi-mentos do governo na indústria farmacêutica foram maiores. A produção industrial no Instituto era moder-na e estava a todo vapor, a Funed ficou em terceiro lugar nacional em produção de fármacos (FIG. 4). Ao mesmo tempo o Instituto agregava ao seu patrimônio a Escola de Saúde Pública de Minas Gerais para dar suporte às suas atividades, além de se transformar de instituto em fundação, a Fundação Ezequiel Dias.

FIGURA 4 - Parque industrial da Fundação Ezequiel

Dias – 1970. Acervo do Centro de Informação Científica Histórica e Cultural - Funed

Para dar suporte à política desenvolvimentista, o go-verno federal criou a Central de Medicamentos (CEME) para promover e organizar o fornecimento dos medi-camentos àqueles que não tivessem condições de adquiri-los, com o objetivo de regular a produção e a distribuição de medicamentos dos laboratórios farma-cêuticos subordinados ou vinculados aos Ministérios. Sua principal finalidade estava em implantar progres-sivamente a substituição das importações por meio da implantação de uma proposta de autonomia para o setor químico-farmacêutico e da consolidação de um sistema estatal de produção de medicamentos essen-ciais (7).

Nesse contexto a Fundação Ezequiel Dias passou a receber apoio técnico, equipamentos e recursos financeiros da CEME permitindo, assim, o desenvol-vimento de um sistema fabril de medicamentos es-senciais para a saúde pública.

Apesar da crescente produção nacional de medicamen-tos essenciais, não havia um consumo homogêneo dos fármacos. A falta de uma política integrada que permitisse

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12 Gestão, Ciência & Saúde

um trabalho entre a união, os Estados e os municípios com as Instituições oficiais, promoviam o desperdício de muitas unidades em detrimento de outros medica-mentos. Somente na década de 1990 há um redire-cionamento dessa produção para o Sistema Único de Saúde (SUS). (2)

A crise nacional da produção de soros na década de 1980 forçou o Ministério da Saúde a investir nos insti-tutos nacionais. A Fundação Ezequiel Dias convidou o bioquímico especialista em veneno, o professor Carlos Ribeiro Diniz para reativar as atividades de pesquisa da Instituição, estagnada desde a década de 1940.

O professor Diniz implantou uma nova visão de pesqui-sa científica, reestruturou e ampliou os laboratórios e as linhas de pesquisa, além de incentivar a capacitação dos pesquisadores. Aos poucos as pesquisa desenvolvidas na Funed voltaram a ter prestígio nacional e internacional. A Funed incorporou ao seu patrimônio a Fazenda São Judas Tadeu, área de preservação ambiental, doado pelo governo do de Minas Gerais, para ampliar a produção de imunobiológicos. Os laboratórios de análise epidemioló-gica e sanitária ampliaram suas atividades para todo o Estado, reativando serviços antes estagnados e criando outros. E a Escola de Saúde (ESMIG) qualifica e capacita os profissionais de saúde do Estado.

Na década de 1990 a instituição enfrentou grandes desafios e dificuldades financeiras. Com os olhos vol-tados para a indústria farmacêutica, a Funed parecia ter encontrado a auto-suficiência, mas o restante da Fundação pedia socorro. A falta de investimento nos laboratórios de análise epidemiológica e sanitária, em equipamentos e infra-estrutura era grande.

Em 2003, o novo governo de Minas Gerais implantou uma reforma política no Estado, denominada choque de gestão, que visava à redução imediata de custos e a efetivação de um novo desenho institucional mais moderno e dinâmico. O objetivo era a promoção e o desenvolvimento mediante a reversão de quadros de déficits orçamentários por intermédio da busca e da implementação de novos modelos de gestão.

Na Funed houve uma grande mudança em todas as áreas da instituição, vários laboratórios de análise epi-demiológica e de vigilância sanitária foram reformados, ampliados e modernizados. A instituição tornou-se re-ferência nacional tanto na produção de soros e medi-camentos como na realização de pesquisas no campo

de saúde pública, na formação e na capacitação de recursos humanos para o SUS e no monitoramento das ações de vigilância sanitária, epidemiológica e am-biental, além de bater recordes na produção de medi-camentos, com mais de 1 bilhão de unidade (FIG. 5).

Figura 5 - Fábrica de Medicamentos da Fundação Eze-

quiel Dias. Acervo da Assessoria de Comunicação Social. Foto: Léo Drumond/ Agência Nitro

Nesse complexo quadro histórico, a Funed completa 100 anos de vida sendo uma das maiores institui-ções de ciência, saúde e tecnologia do País.

4 - O CENTENÁRIO

As comemorações dos 100 anos da Fundação Eze-quiel Dias, intitulada “Saúde direito de todos”, no ano de 2007, incluíram uma série de eventos ligados à promoção da saúde, da ciência e da valorização da história institucional.

No mês de janeiro de 2007, foram criadas seis co-missões temáticas internas para promover os feste-jos durante o ano. Cada comissão era responsável por um evento e tinha um patrono que fora presiden-te da instituição e que estava sendo homenageado pelo trabalho que foi desenvolvido na época.

No primeiro momento foi realizado um concurso para a escolha da logomarca símbolo do centenário. De-pois da seleção, várias peças gráficas foram elabo-radas para divulgação da imagem institucional e do ano comemorativo.

Ao mesmo tempo foi feito uma parceria com a Uni-versidade Federal de Minas Gerais (UFMG) para a

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13Revista da Fundação Ezequiel Dias, v. 3, n. 2, jul./dez. 2008

elaboração de um livro sobre a história da Funed. Uma vasta pesquisa histórica e documental foi reali-zada para a elaboração da obra. Inúmeros arquivos, instituições de pesquisa e funcionários antigos foram acionados, na busca de novos registros sobre a me-mória institucional. Juntamente com o livro, a UFMG realizou uma amostra fotográfica que remonta, seu desenvolvimento histórico, científico e tecnológico no cuidado com a saúde pública.

Em 3 de agosto de 2007, data do aniversário da Funed, com a presença do Secretário de Saúde, do Presidente da instituição e de diversas autoridades, ocorreu a abertu-ra oficial das comemorações. A reinauguração do auditó-rio central, mais moderno e estruturado, o lançamento do livro: Fundação Ezequiel Dias: Um século de promoção e proteção á saúde, a abertura da exposição fotográfica no hall principal e o lançamento do cartão telefônico com a imagem da Funed fizeram parte do evento. Houve uma grande festa confraternização para recepcionar os convi-dados, os funcionários e os servidores aposentados que participaram e fizeram parte da sua trajetória.

A partir da abertura oficial eclodiram diversos outros eventos. Entre eles o IV Fórum de Ciência e Tecnolo-gia, com discussões sobre os avanços tecnológicos e pesquisas que podem gerar produtos e serviços mais eficientes em saúde pública, como os biofármacos, medicamentos produzido a partir de organismos vivos.

Em parceria com a ANBio sediou, a Funed o Workshop Internacional de Biossegurança, even-to que reuniu diversos profissionais do mundo para discutir o cultivo geneticamente modificado e a evolução dos marcos regulatórios. Promoveu o seminário Rumo a Excelência-Qualidade e Biossegu-rança, em que foi discutida a importância da atuação dos laboratórios de saúde pública na implantação do regulamento sanitário internacional e a relevância dos ensaios de proficiência na gestão da qualidade.

Em setembro, a Funed lançou o concurso de redação para estudantes do ensino médio e da graduação, com o tema “Funed: Há um Século Protegendo e Promo-vendo Saúde”, com o objetivo de conscientizar e valori-zar o importante papel social que a instituição exerce e exerceu na saúde coletiva ao longo desses 100 anos.

Mantendo a preservação da memória viva, a Fun-dação Ezequiel Dias realizou uma sessão solene de inauguração da pintura do retrato do Prof. Amílcar

Viana Martins para compor a galeria de notáveis da presidência da Funed. Juntamente com a solenida-de, foi aberta ao público uma mostra fotográfica em homenagem ao importante cientista mineiro, que trabalhou e contribuiu com diversas pesquisas cien-tíficas realizadas no instituto, além de participar da construção e consagração da ciência da Funed.

Amílcar Martins começou a trabalhar no Instituto Ezequiel Dias em 1924 e desenvolveu importantes pesquisas de interesse para a saúde pública, como a Doença de Chagas, a esquistossomose e a febre maculosa. Foi professor da Faculdade de Medicina de Minas Gerais, participou da Segunda Guerra Mundial e dirigiu diversos órgãos de pesquisa e ensino na área da saúde, além de ter feito uma das maiores e mais completas coleções de Flebótomos do mundo.

Em novembro, a Instituição organizou o seminário “Gestão ambiental: Compromisso de todos. Funed rumo à sustentabilidade”, com o objetivo de discutir o Plano de Gerenciamento de Resíduos do Serviço de Saúde (PGRSS), com o lançamento de uma cartilha. Debateu temas relacionados à legislação ambiental, licenciamento e à redução do uso de materiais des-cartáveis. Também foi apresentado aos funcionários o projeto “Minha Caneca”, para sensibilizar os traba-lhadores sobre o uso excessivo de copos descartá-veis. Foi distribuída uma sacola de lixo para os car-ros e uma caneca a cada funcionário.

As comemorações do centenário foram um marco na Instituição, pois mobilizaram todos os funcionários, além de sediar importantes eventos científicos, his-tóricos e tecnológicos que contribuíram para o de-senvolvimento e para a preservação da memória da saúde pública.

5 - CONCLUSãO

“Aqueles que perdem suas origens, perdem sua identidade também” (1).

A celebração do centenário da Fundação Ezequiel Dias foi muito mais do que uma comemoração ins-titucional. Representou a vitória de uma empresa que agregou ao longo do tempo conhecimento cien-tífico e valores sociais. Poucas instituições no Brasil completam 100 anos de vida, atuando da mesma forma e em pleno vigor, apesar dos inúmeros per-calços pelo caminho.

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14 Gestão, Ciência & Saúde

A história da Funed justifica o seu importante papel na saúde pública e na luta em defesa do social. Hoje revigorada, suas ações se multiplicam e ultrapassam fronteiras, sempre em busca da excelência e da qua-lidade dos serviços prestados.

A instituição tem uma história que está sendo cons-truída diariamente e, preservar a sua memória, é con-tribuir para a preservação da saúde pública. Assim, “acompanhar a dinâmica da história, registrando-a para as futuras gerações, possibilitará às instituições um novo olhar sobre si mesmas, conscientizando-se de sua responsabilidade e do seu compromisso com a sociedade” (8).

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15Revista da Fundação Ezequiel Dias, v. 3, n. 2, jul./dez. 2008

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3. CASTRO, Cláudia Garcia Osório; FERNAN-DES, Ana Márcia; LUÍZA, Vera Lúcia. Arcabouço legal da Política Nacional de Medicamentos no Brasil: uma revisão. In: GARCIA, M et all. Vigilân-cia em Saúde. Rio de Janeiro: Escola de Governo em Saúde, 2004. p. 13-41.

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16 Gestão, Ciência & Saúde

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17Revista da Fundação Ezequiel Dias, v. 3, n. 2, jul./dez. 2008

UTILIZAÇÃO DE ESPÉCIES VEGETAIS PARA O DESENVOLVIMENTO DE MEDICAMENTOS: FITOFÁRMACOS E FITOTERÁPICOS

USE OF PLANT SPECIES FOR THE DEVELOPMENT OF MEDICINES: PHYTOMEDICINES AND PHYTOTHERAPICS

Carolina Paula de Souza Moreira1, Vera Lúcia de Almeida2

1 Graduada em Farmácia pela Universidade Federal de Minas Gerais, Mestre em Ciências da Saúde pelo Centro de Pesquisas René Rachou – Fiocruz, Pesquisadora no Serviço de Bioprospecção Farmacêutica, Di-

visão de Ciências Farmacêuticas, Diretoria de Pesquisa e Desenvolvimento, Fundação Ezequiel Dias, [email protected]; 2 Graduada em Farmácia pela Universidade Federal de Minas Gerais, Mestre em Química pela Universidade Federal de Minas Gerais, Pesquisadora no Serviço de Bioprospecção Farmacêu-tica, Divisão de Ciências Farmacêuticas, Diretoria de Pesquisa e Desenvolvimento, Fundação Ezequiel Dias,

[email protected]

RESUMO

As plantas têm sido utilizadas para o tratamento de doenças desde o início da humanidade e ainda hoje constituem uma fonte inestimável de produtos natu-rais, os quais são empregados no desenvolvimento de fitofármacos, além da utilização para a produção de fitoterápicos. Este trabalho descreve o desenvol-vimento de fitofármacos e fitoterápicos, bem como a regulamentação brasileira de medicamentos fito-terápicos.

Palavras-chave: Fitoterápicos, Fitofármacos, Produ-tos Naturais

ABSTRACT

Plants have been used to treat diseases since the beginning of mankind and are still an invalu-able source of natural products that are used for the development of phytomedicine. In addition, they can also be used for the production of phy-totherapics. This review has focussed attention on the development of phytomedicine and phyto-therapics as well as on the Brazilian legislation regarding phytotherapics.

Keywords: Phytotherapics, Phytomedicine, Natu-ral Products

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18 Gestão, Ciência & Saúde

1. INTRODUçãO

O homem sempre buscou na natureza a cura para as suas doenças. Um dos primeiros relatos sobre o uso de plantas medicinais vem da Mesopotâmia em 2600 a.C. (26).

A Organização Mundial de Saúde (OMS) reco-nhece que 80% da população dos países em desenvolvimento utilizam práticas tradicionais na atenção primária à saúde, e 85% dessa par-cela fazem uso de plantas ou de preparações delas (5,14,44). Além do mais as plantas são a base da medicina tradicional praticada por mi-lhares de anos em países como a China e a Índia (32).

As plantas podem ser utilizadas na terapêutica como fitofármacos e fitoterápicos (ou fitomedica-mento). Os fitofármacos utilizam compostos iso-lados de plantas como matéria-prima. Os fitote-rápicos, por sua vez, são medicamentos obtidos empregando exclusivamente matérias-primas ve-getais. Não se considera fitoterápico aquele que contém substâncias ativas isoladas de qualquer origem (19).

Este artigo tem como objetivo tratar de alguns aspectos relativos à utilização de espécies ve-getais no desenvolvimento de medicamentos, abrangendo tanto os aspectos gerais do isola-mento de produtos naturais bioativos e sua par-ticipação na elaboração de fitofármacos quanto o emprego de material vegetal na produção de fitoterápicos.

2. PRODUTOS NATURAIS NA BUSCA DE FÁRMACOS

Apesar dos avanços em técnicas utilizadas na busca de novos fármacos como a química com-binatória, técnicas de planejamento racional, qui-mioinformática e bioinformática, os produtos natu-rais (PN’s) continuam a ser uma importante fonte de novos compostos bioativos (13,37). O GRAF. 1 mostra a influência dos produtos naturais como fonte de novas substâncias bioativas no período de 1981-2006 (33).

GRÁFICO 1 - Fontes de novas substâncias bioativas no perí-odo de 1981-2006 (n= 983). N produto natural; DN derivados vindos de produtos naturais; S substância totalmente sintética; S* substância sintética, mas grupo farmacofórico vindo de PN.Fonte: Newman, 2008 (33).

A descoberta de novas técnicas de síntese, como a síntese em larga escala e a química combinatória, com a promessa de geração rápida de grandes cole-ções de substâncias, as quais poderiam ser testadas utilizando bioensaios em larga escala (HTS – High Throughput Screening) acarretou em um declínio na pesquisa de PN. No entanto, nos últimos tempos tem-se observado um interesse crescente no uso de plantas na busca por novos fármacos (33).

O desenvolvimento de novas técnicas de isolamento, identificação e bioensaios tem contribuído para o renas-cimento da busca por PN bioativos. É possível citar:

Avanços em métodos cromatográficos que têm 1. levado ao aumento da capacidade de separação e isolamento das substâncias. Além disso, o aco-plamento às técnicas espectrométricas (métodos hifenados) possibilitou a identificação online das substâncias, ou seja, identificação das substân-cias em misturas complexas sem a necessidade de isolamento e purificação das mesmas. Esse método é conhecido como desreplicação e evita a “redescoberta” de compostos já conhecidos (13). Avanços na tecnologia de elucidação estrutural, 2. como técnicas modernas de ressonância mag-nética nuclear (RMN) pulsada e espectrometria de massa, têm facilitado a determinação estrutu-ral dos compostos isolados.O desenvolvimento de bioensaios automatiza-3. dos, específicos e seletivos, que podem avaliar rapidamente e de forma economicamente viável frações e extratos vegetais (30) e facilitar a de-terminação da atividade biológica e a toxicidade de extratos, frações e substâncias puras.

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19Revista da Fundação Ezequiel Dias, v. 3, n. 2, jul./dez. 2008

Em 2005 o mercado mundial de fármacos ori-4. ginados de plantas foi estimado em aproxi-madamente U$ 18 bilhões. Espera-se que em 2011 a arrecadação seja de cerca de U$ 26 bilhões, representando uma média de cresci-mento de 6,6% entre 2006 e 2011 (37). Em contraste à relevância dos PN e seu cres-5. cente uso como fonte de novas substâncias bioativas, existe uma lacuna no conhecimen-to das plantas quando comparadas com a di-versidade existente. São conhecidas aproxi-madamente 400.000 espécies de plantas no mundo, sendo que apenas 10% delas foram caracterizadas quimicamente. Dessa forma, existe um potencial inexplorado de plantas como fonte de novas substâncias químicas (NCEs) (5,23).

3. VANTAGENS E DESVANTAGENS DO USO DE PRODUTOS NATURAIS NA BUSCA DE FÁRMACOS

Os compostos de origem natural desempenham papéis importantes na indústria de fármacos:

São fonte de fármacos cuja síntese é difícil 1. e inviável do ponto de vista econômico. Di-ferentes classes químicas de PN originaram diferentes fármacos de distintas classes te-rapêuticas, como, por exemplo, a morfina, a pilocarpina, a hipericina e os digitálicos (4).Podem ser utilizados, na produção de medica-2. mentos como mistura de uma determinada clas-se de substâncias, extratos ou planta in natura. Podem ser utilizados, como precursores para 3. a síntese de fármacos (alguns compostos são modificados por métodos químicos ou biológi-cos para produzir drogas mais potentes). São utilizados como adjuvantes farmacêuti-4. cos na produção de medicamentos. Podem ser utilizados como protótipos para a 5. síntese de novos medicamentos (38). Vários fatores favorecem o uso de PN como protótipos de novas substâncias bioativas: sua grande di-versidade estrutural, com estruturas complexas com vários estereocentros e grupos funcionais diferentes; a singularidade das moléculas e a diversidade de mecanismos de ação presentes (5,13). Além do mais, os PNs têm sido selecio-nados por pressão evolutiva, assim podem in-teragir com uma grande variedade de proteínas

e alvos biológicos (18). Podemos citar como exemplo o alcalóide quinina, isolado das cas-cas de espécies de Cinchona, que deu origem aos derivados antimaláricos cloroquina e meflo-quina obtidos por modificação molecular (26).

Existem vários fatores limitantes no uso de PN na busca de fármacos, quando comparados ao uso de compostos sintéticos, como, por exemplo:

As substâncias bioativas estão presentes em 1. pequenas concentrações nas plantas e nor-malmente como misturas de compostos com características químicas e físicas muito simi-lares, o que dificulta o seu isolamento (25).A quantidade da substância ativa isolada mui-2. tas vezes é insuficiente para sua utilização nas várias etapas do desenvolvimento de fármaco. A identificação da espécie vegetal pode ser in-3. correta, o que impossibilita sua recoleta (30). As substâncias ativas presentes em peque-4. nas quantidades podem não ser detectadas, uma vez que são utilizados extratos brutos nos processos de triagem. Interações entre os componentes da mistura (an-5. tagonismo, sinergismo) podem ocorrer, levando a resultados que algumas vezes não são obser-vados quando se testa a substância pura (46).

4. PROCEDIMENTOS GERAIS PARA OB-TENçãO DE SUBSTÂNCIAS BIOATIVAS

Embora as plantas possam conter centenas de metabólitos secundários, apenas os que estão em maior concentração são geralmente isolados, identificados e testados biologicamente (46). O processo para o isolamento e a identificação de novas substâncias bioativas originadas de plan-tas pode ser caro e demorado. A metodologia ge-ral empregada pode ser observada na Figura 2.

4.1.Seleção da planta e da coleta

Várias abordagens podem ser utilizadas para seleção da espécie a ser estudada, entre elas podemos citar a randômica, a etnofarmacológica, a quimiotaxonômica e a observação ecológica (28). Na primeira abordagem, a escolha da planta é realizada sem um critério especí-fico. A desvantagem desse método é o grande número de plantas testadas, sendo um processo oneroso. No segundo método, a seleção da espécie é feita segundo

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20 Gestão, Ciência & Saúde

o uso farmacológico por uma determinada popu-lação, o que muitas vezes tem levado a melhores resultados (34). Em quimiotaxonomia, as espécies são coletadas a partir de grupo vegetal, família ou gênero previamente definido de acordo com a classe de PN de interesse (38,47). A observação ecológica é um método baseado na observação do meio ambiente e as interações entre os indivíduos. Por exemplo, a constatação de ausência de preda-dores em áreas infestadas com herbívoros pode indicar a presença de compostos de defesa (5).

As características das plantas (como, por exemplo, infestação de insetos, ciclo vegetativo), o local e a época de coleta devem ser cuidadosamente ano-tados, uma vez que a concentração dos metabóli-tos secundários pode ser alterada segundo o ciclo vegetativo da planta e as condições ambientais. A planta coletada deve ser cuidadosamente identifi-cada, catalogada e a exsicata depositada em her-bário certificado. O material vegetal coletado deve ser separado, identificado, seco e armazenado em local adequado (45).

É importante ressaltar que a partir da Medida Provisó-ria nº 2.186-16 de 2001, regulamentada pelos Decre-tos nº 3945/01, nº 4946/03, nº 5439/05 e nº 6159/07, as atividades que visem isolar, identificar, obter infor-mações de substâncias provenientes do metabolismo dos seres vivos (componentes do patrimônio genéti-co) com a finalidade de pesquisa, desenvolvimento tecnológico ou bioprospecção, bem como a remessa do patrimônio genético e o acesso ao conhecimento tradicional existente no País, passaram a depender de autorização do Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGEM) e do IBAMA (11).

4.2. Preparo de extratos

Os métodos de extração podem ser classificados em métodos a frio ou a quente. São métodos de extração a frio: percolação, maceração, extração com microondas e extração com fluido supercrítico (36,40). Entre os métodos de extração a quente pode-se citar a extração utilizando aparelho de sox-let, a decocção e a infusão (38). A escolha do mé-todo de extração irá depender da parte da planta a

Solicitação de coletas aos órgãos competentes

Preparo do material vegetal

Extração

Análise fitoquímica preliminar e triagem dos extratos

Fracionamento biomonitorado

Substâncias puras

Elucidaçãoestrutural

Síntese deanálogos

Estudos de toxicidade

Estudos de SAR e QSAR

FIGURA 2 - Metodologia geral para o isolamento, a identificação e a determinação de atividade biológica de produtos naturais.

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21Revista da Fundação Ezequiel Dias, v. 3, n. 2, jul./dez. 2008

ser extraída, do metabólito secundário de interes-se e da capacidade técnica do laboratório.

A extração pode ser feita com um solvente específi-co, com misturas de solvente, ou mesmo utilizando extração fracionada com aumento de polaridade de acordo com a série eluotrópica (36). A escolha do solvente se baseia em critérios como característi-cas da substância a ser extraída, adequação tec-nológica (facilidade de remoção, riscos de inflama-bilidade) e toxicidade (38). Quando as substâncias presentes na planta não são conhecidas é comum à utilização do etanol como solvente para obtenção de extrato, tendo em vista sua característica de ex-trair substâncias de diferentes polaridades (16).

4.3. Análise fitoquímica preliminar e triagem dos extratos

A análise fitoquímica preliminar tem como objetivo verificar de forma rápida quais as principais classes de PN presentes na espécie em estudo. Os testes de caracterização são, geralmente, realizados com os extratos empregando-se soluções de reagentes que resultam no desenvolvimento de coloração ou precipitação características de cada classe (38).

Os extratos obtidos são testados em modelos prediti-vos para a atividade biológica selecionada. Em razão do grande número de amostras a serem analisadas, os ensaios devem ser simples, rápidos, reprodutíveis e de baixo custo (16,23). No entanto, apenas aqueles extratos com substâncias mais potentes e/ou em maior concentração irão apresentar resultados positivos.

A triagem em coleções de extratos vegetais, geral-mente, é mais trabalhosa e problemática do que em coleções de substâncias sintéticas. Isso pode ser ex-plicado se levarmos em consideração a complexidade dos extratos vegetais, o desconhecimento dos com-postos presentes neles e as propriedades químicas e físicas indesejáveis de substâncias existentes nos ex-tratos que podem influenciar os resultados biológicos de uma maneira não específica, como por exemplo, a precipitação de proteínas pelos taninos (13).

4.4. Fracionamento biomonitorado

Até alguns anos atrás, o objetivo dos fitoquímicos era basicamente isolar novos compostos, elucidar suas estrutura e publicar os resultados obtidos. Hoje

tem-se procurado cada vez mais isolar substâncias bioativas ou mesmo determinar possíveis atividades biológicas para as substâncias isoladas. Assim, o isolamento de substâncias tem sido monitorado por bioensaios in vitro (3,13,17,24).

Os extratos que apresentaram atividade biológica de-vem passar por processos de semipurificação. Entre os processos existentes podemos citar a partição e a coluna filtrante. O objetivo desses procedimentos é separar os compostos por diferença de polaridade.

O processo de separação e isolamento pode ser algo longo e tedioso. O isolamento de PN geralmente com-bina várias técnicas de separação. A escolha dos méto-dos de separação está relacionada com o tipo de extra-to a ser trabalhado; com a solubilidade, a volatilidade, a estabilidade das substâncias a serem separadas e as condições de infraestrutura do laboratório. Os métodos escolhidos devem ser rápidos, não devem levar à de-composição das substâncias presentes no extrato, não devem ocasionar perda do material ou a formação de artefato. As técnicas de separação mais utilizadas são os métodos cromatográficos (40).

4.5. Identificação, modificações estruturais e aspectos toxicológicos

Na identificação dos compostos isolados se utilizam as técnicas espectrométricas na região do ultraviole-ta e infravermelho, espectrometria de massas, RMN 1H e 13C. As informações fornecidas por cada um destes métodos isoladamente e o cruzamento des-ses dados por meio das análises dos espetros obtidos permitem a elucidação estrutural das substâncias.

A química computacional tem sido usada como uma ferramenta no estudo fitoquímico de PNs e auxiliado no trabalho de identificação das substâncias isoladas. Atualmente, programas computacionais são empre-gados na identificação dos compostos isolados pela comparação de dados espectrométricos obtidos com os de bancos de dados públicos, comerciais e/ou próprios (in house). Podemos citar como exemplos os bancos NMRShiftDB (39) e o ACD/CNMR (1).

Processos como a desreplicação têm facilitado o pro-cesso de estudo fitoquímico de uma espécie. Nesse processo é feito uma pré-triagem para detectar com-postos conhecidos. As “impressões digitais” (finger-print) dos dados espectrais são utilizadas para a busca

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22 Gestão, Ciência & Saúde

de similaridade nos bancos de dados disponíveis (39).Nos últimos anos, tem sido visto um desenvolvimen-to notável dos métodos cromatográficos analíticos e preparativos, bem como das técnicas espectrométri-cas. O acoplamento das técnicas de separação com as de identificação (técnicas hifenadas) tem diminuí-do o tempo e o custo no descobrimento de NCE. As cromatografias líquida (CL) e gasosa (CG) têm sido acopladas com diferentes detectores: espectrôme-tro de massas (CL/EM e CG/EM), arranjo de diodos (CL/UV), IV (CL/IV e CG/IV) e RMN (CL/RMN). Es-ses aparelhos também podem ser acoplados a bio-ensaios online (23).

Modificação estrutural, estudos de correlação es-trutura-atividade (SAR) e estudos de correlação estrutura-atividade quantitativa (QSAR) podem ser realizados para melhorar as propriedades farmacoci-néticas e/ou farmacodinâmicas da substância bioati-va. A modificação molecular racionalmente dirigida é o método mais utilizado para otimizar estas proprie-dades. Muitas mudanças podem ser introduzidas na molécula dependendo de seus grupos funcionais.

5. FITOFÁRMACO

O desenvolvimento de um fármaco é um processo caro e demorado, levando em média de 12 a 24 anos da descoberta de uma substância bioativa até o seu lançamento no mercado (27).

Para a obtenção de um fitofármaco é necessário se-guir várias etapas conforme a Figura 3. A primeira etapa é a descoberta de novas substâncias bioati-vas (composto líder) como descrito previamente. O desenvolvimento do fármaco é a segunda etapa.

O novo composto (composto líder) pode não ter as propriedades farmacodinâmicas, farmacocinéticas e químicas adequadas para ser utilizado como um fármaco. Nesse caso, é necessário realizar modifi-cações moleculares no composto líder obtendo um candidato a fármaco com características adequadas. Posteriormente, esse candidato passará pela fase de desenvolvimento que compreende as etapas de síntese ou extração e isolamento em maior escala, a determinação da formulação e a fase pré-clínica.

A primeira preocupação dos testes pré-clínicos é mostrar a eficácia da substância em estudo. Com-provada a efetividade, quantificado o efeito principal e os efeitos colaterais, é necessário a realização dos testes de toxicidade.Esses testes têm como objetivo detectar reações produzidas pelo uso do produto tanto desencadea-das pela administração acidental de doses excessi-vas como as conseqüentes do acúmulo causado por um desbalanceamento entre a dose administrada, o metabolismo e a eliminação do fármaco. A dura-ção dos testes toxicológicos é variável. Eles podem ser classificados em dois tipos: toxicidade aguda e a toxicidade crônica. Alguns estudos de toxicidade em longo prazo têm características especificas e são considerados como estudos complementares, como por exemplo, os testes de teratogenicidade, mutageni-cidade, carcinogenidade, indução de hábito, etc. (38)

A próxima etapa consiste nos ensaios clínicos que são divididos em 4 fases(Fases I, a IV). A legislação brasi-leira (Resolução 1996/96) regulamenta as etapas de pesquisa na fase clínica. Se o candidato a fármaco for aprovado na fase clínica (27), pode-se entrar com pedido de registro de um novo fármaco na ANVISA.

Seleção de material vegetal

Modificação decomposto líder

Obtenção de extratos Isolamento guiado por bio-ensaios e identificação

Obtenção de composto líder

Testes farmacológicos, toxi-cológicos e farmacocinéticos

Ensaios clínicos e registros

Candidato a fármaco

FIGURA 3 - Metodologia geral para o isolamento, identificação e determinação de atividade biológica de produtos naturais

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23Revista da Fundação Ezequiel Dias, v. 3, n. 2, jul./dez. 2008

6. FITOTERÁPICOS

Além de fornecer produtos naturais que são empre-gados direta ou indiretamente no desenvolvimento de medicamentos (fitofármacos), as plantas também são utilizadas na medicina tradicional.

Plantas medicinais são aquelas que possuem tra-dição de uso em uma população ou comunidade e são capazes de prevenir, aliviar ou curar enfer-midades (14,41). No Brasil, a medicina popular e o conhecimento específico sobre o uso de plantas são resultado de uma série de influências culturais, como a dos colonizadores europeus, dos indígenas e dos africanos (2).

Grande parte da população mundial utiliza plantas medicinais na atenção primária à saúde (14,44). No Brasil, não se sabe com exatidão o número de pessoas que utilizam as plantas, mas, seguramente, essa tendência mundial também é seguida.

Apesar de ser uma prática antiga, a utilização de plantas medicinais e de fitoterápicos sofreu um gran-de declínio, principalmente no Ocidente, com o apo-geu da química medicinal a partir da década de 1940. Nesse período, o fármaco com valor era aquele que correspondia a uma substância pura com efeitos te-rapêuticos e secundários bem determinados, cuja provável interação farmacológica com outro fármaco poderia ser estudada, caso fosse necessário o uso de ambos simultaneamente (46).

Atualmente o interesse em fitoterápicos vem cres-cendo, até mesmo em países desenvolvidos, por serem tratados com uma alternativa mais saudável ou menos danosa de tratamento. Em países em de-senvolvimento, o crescimento é resultante do difícil acesso aos centros de atendimento hospitalar e a medicamentos farmacoquímicos, da fácil obtenção de plantas medicinais e da grande tradição do seu uso (2,13,15,20,42).

Outro fator relevante para o crescimento do setor é o aprimoramento da tecnologia farmacêutica, com métodos modernos de identificação, determinação e quantificação de compostos químicos, o que permi-tiu um melhor controle de qualidade na fabricação de fitoterápicos, assim como os avanços e a norma-tização nas pesquisas de avaliação farmacológica e toxicológica (46).

Algumas das vantagens dos fitoterápicos que atualmen-te justificam seu uso são: (a) efeitos sinérgicos; (b) asso-ciação de mecanismos por compostos agindo em alvos moleculares diferentes; (c) menores riscos de efeitos co-laterais; (d) menores custos de pesquisa (46).

Os fitoterápicos sempre apresentaram uma parcela significativa do mercado de medicamentos. O setor movimenta globalmente US$ 21,7 bilhões por ano (15). Entre 2003 e 2006, o segmento de fitoterápicos no Bra-sil faturou aproximadamente R$ 2 bilhões com a venda de 123 milhões de unidades farmacêuticas (20).

A ampliação do consumo levou à normatização do setor com implementação e constante revisão de normas técnicas para a produção e comercialização de fitoterápicos visando garantir a segurança no uso, eficácia terapêutica e qualidade do produto (20).

No Brasil, a regulamentação dos medicamentos fi-toterápicos industrializados é realizada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), órgão federal do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, responsável pelo registro de medicamentos e outros produtos destinados à saúde. Todos os fitoterápicos industrializados devem ser registrados na ANVISA antes de serem comercializados, a fim de garantir que a população tenha acesso a medicamentos se-guros, eficazes e de qualidade comprovada.

A RDC nº 48/04 é a principal legislação atual que regu-lamenta o registro de fitoterápicos. Nela são estabele-cidos todos os requisitos necessários para a sua con-cessão, os quais se baseiam na garantia de qualidade. As avaliações abrangem a matéria-prima vegetal, os derivados de droga vegetal e o produto final, o medi-camento fitoterápico. Essa resolução define droga ve-getal como “planta medicinal ou suas partes, após pro-cessos de coleta, estabilização e secagem, podendo ser íntegra, rasurada, triturada ou pulverizada” e fitote-rápico como sendo “medicamento obtido empregando-se, exclusivamente, matérias-primas vegetais ativas, não podendo ser adicionada nenhuma substância ativa isolada, caracterizado pelo conhecimento da eficácia e dos riscos de seu uso, assim como pela reprodutibilida-de e constância de qualidade” (6).

A ANVISA reconhece uma lista de drogas vegetais para as quais a indústria tem a permissão de obter o registro simplificado para o fitoterápico preparado com essa matéria-prima (RE nº 89/04). Essa lista é

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composta por espécies vegetais com maior núme-ro de estudos científicos, não havendo necessidade de validar as indicações terapêuticas e segurança de uso (7). Constam nessa lista 34 espécies vege-tais, a maioria plantas exóticas originárias de outros países, sobretudo da Europa e América do Norte, onde as espécies vegetais locais são alvo de maior número de investigação científica. Caso o fitoterá-pico não integre a “Lista de registro simplificado de fitoterápicos”, cabe à indústria farmacêutica, para o lançamento de um fitoterápico no mercado nacional, entre outras exigências, comprovar a segurança e a eficácia do produto. Para essa comprovação é pos-sível seguir três diferentes caminhos, a saber:

A primeira opção, que por ser a mais onerosa é 1. a menos utilizada pela indústria, consiste na rea-lização de testes de segurança (toxicologia pré-clínica e clínica) e de eficácia terapêutica (far-macologia pré-clínica e clínica) do medicamento. Vale ressaltar que, nos últimos anos, essa opção fez com que houvesse uma aproximação das empresas com os centros de pesquisas brasilei-ros, possibilitando a realização de parcerias para a execução de alguns desses estudos (14,35).A segunda opção permite que a indústria farma-2. cêutica utilize a apresentação de monografias da droga vegetal presente na formulação do medi-camento, que atestem sobre sua segurança e eficácia. Para se certificar da seriedade dessas monografias, a ANVISA publicou uma “Lista de referências bibliográficas para avaliação de segu-rança e eficácia de medicamentos fitoterápicos” (RE nº 88/04), colocando as referências dentro de um elenco de pontuação, de acordo com a “qualidade científica” da obra. Dessa forma, para o laboratório farmacêutico possa comprovar a se-gurança e a eficácia do fitoterápico por meio de apresentação de estudos descritos nessas obras, o produto deve atingir, no mínimo, seis pontos, conferidos de acordo com a escala de pontuação das referências (8). Nesse caso, grande parte das obras refere-se a compêndios internacionais que contemplam estudos realizados principalmente com plantas de origem européia (35). A terceira opção é a apresentação de um levanta-3. mento etnofarmacológico ou de documentações tecnocientíficas que avaliem a indicação de uso, a coerência com relação às indicações terapêuticas propostas, a ausência de risco tóxico ao usuário e a comprovação de uso seguro por um período

igual ou superior a vinte anos (6). Para a pesquisa de um novo medicamento fitoterápico, partindo do conhecimento tradicional associado, o tempo de desenvolvimento desse produto poderá ser signi-ficativamente reduzido. Como exemplo, pode-se citar o caso do Acheflan®, primeiro medicamento fitoterápico pesquisado e desenvolvido totalmen-te no Brasil, elaborado com o extrato oleoso de Cordia verbenacea DC. (Varronia verbenacea (DC.) Borhidi) e indicado no tratamento de tendi-nite crônica e de dores musculares (26).

Um grande fator limitante para o desenvolvimento de novos fitoterápicos é que a maioria das plantas em uso popular não se encontra descrita em códigos oficiais (formulários e farmacopéias), não havendo estudos sobre as mesmas. Nesse contexto, investir nos códigos oficiais cuja finalidade é a elaboração de monografias que privilegiem desde o cultivo até à determinação de doses clínicas poderá representar a saída para a indústria nacional e para os centros de produção institucionais (41). Dessa forma, além de atender às necessidades básicas de saúde, serão geradas vagas de trabalho no campo e nos centros industriais, impulsionado a economia do País.

O governo brasileiro, atento ao crescimento do mer-cado de fitoterápicos e ciente dos problemas enfren-tados pela indústria nacional no que diz respeito ao lançamento de novos produtos, publicou em 2006 duas frentes de apoio ao setor de plantas medicinais e fitoterápicos. A primeira foi a Portaria Ministerial MS/GM nº 971, de 3 de maio de 2006, que aprova a Política Nacional de Práticas Integrativas e Comple-mentares (PNPIC) no SUS (9), e a segunda foi o De-creto nº 5.813, de 22 de junho de 2006, que aprova a Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápi-cos (PNPMF) e dá outras providências (12).

Ambas apresentam em suas diretrizes o incentivo à pesquisa e ao desenvolvimento com relação ao uso de plantas medicinais e fitoterápicos, priorizando a biodiversidade do País. Além disso, estimulam a adoção da fitoterapia nos programas de saúde pú-blica. Espera-se com isso um aumento no número de fitoterápicos registrados no País, principalmente com base em espécies nativas (14).

O Brasil apresenta pelo menos três características favoráveis à consolidação da indústria farmacêutica nacional baseada em produtos naturais de plantas:

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competência científica instalada no País (com grupos de pesquisa de renome nacional e internacional), sua enorme biodiversidade (19% da flora mundial) e a gran-de diversidade cultural das populações tradicionais, com extensa utilização de plantas medicinais. Segun-do especialistas, essa conjunção de fatores deveria ser mais bem explorada para o desenvolvimento de uma bioindústria competitiva e inovadora o País (26).

Os fitoterápicos têm sido contemplados com o apoio do governo brasileiro e o estímulo das agências de saúde nacional e internacional. Entretanto, esse se-tor necessita do estabelecimento de parcerias entre os laboratórios privados e os centros de pesquisa e, acima de tudo, de editais de fomento à área, para que o mercado nacional se expanda e a população seja be-neficiada com medicamentos de custo mais baixo, de boa qualidade e que resgatem a cultura popular.

7. CONCLUSãO

A pesquisa para o desenvolvimento de fitofármacos é um processo caro e longo, compreendendo as fases de descoberta, de desenvolvimento e de co-mercialização. No Brasil, as pesquisas para a busca de novas substâncias bioativas vindas de plantas ocorrem principalmente nas universidades e centros de pesquisa, demonstrando competência científi-ca e técnica para atuar na fase de descoberta com grande sucesso. A segunda e a terceira fases devem ocorrer nas indústrias, tornando-se necessária uma maior interação entre esse segmentos e os centros de pesquisa e as universidades.

O desenvolvimento de fitoterápicos inclui várias eta-pas e envolve um processo interdisciplinar, multidis-ciplinar e interinstitucional. As áreas de conhecimento envolvidas vão desde antropologia botânica, botânica, agronomia, ecologia, química, fitoquímica, farmacolo-gia, toxicologia, biotecnologia, clínica médica, química orgânica até tecnologia farmacêutica.

O desenvolvimento e a produção de fitoterápicos podem ser uma grande oportunidade para a indús-tria nacional de fármacos, principalmente quando se considera a grande biodiversidade brasileira, além do reconhecido potencial científico aqui existente. No entanto, existem alguns problemas, tais como a necessidade de investimento público-privado no setor e a dificuldade de obtenção de matéria-prima padronizada e de boa qualidade.

A prospecção ética da biodiversidade, visando agre-gar ciência e tecnologia a seus produtos, passa a ser de importância estratégica para os países em de-senvolvimento como o Brasil, sendo um instrumento tanto para a descoberta de alternativas para o trata-mento de doenças típicas desses países como para estimular o crescimento de suas economias.

AGRADECIMENTOS

As autoras agradecem a Dra. Cláudia Gontijo Silva e ao Dr. Júlio César Dias Lopes pela ajuda na elabora-ção deste trabalho e pela leitura exaustiva do texto.

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26 Gestão, Ciência & Saúde

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29Revista da Fundação Ezequiel Dias, v. 3, n. 2, jul./dez. 2008

INFLUÊNCIA DO TAMANHO DO INÓCULO DE ESPOROS DE Aspergillus parasiticus NA PRODUÇÃO DE AFLATOXINAS EM AMENDOIM (Arachis hypogaea L.)

INFLUENCE OF INOCULUM SIZE OF Aspergillus parasiticus SPORES ON AFLATOXINS PRODUCTION IN PEANUT (Arachis hypogaea L.)

Guilherme Prado1, Jovita Eugênia Gazzinelli Cruz Madeira2, Vanessa Andrea Drummond Morais3, Marize Silva de Oliveira4, Mabel Caldeira de Andrade5, Robson de Assis Souza6, Ignácio José de

Godoy7, Joenes Mucci Peluzio8, Raphael Sanzio Pimenta9

1 Farmacêutico-Bioquímico, Doutor, Fundação Ezequiel Dias (Funed), [email protected]; 2 Bióloga, PhD, Funed, [email protected]; 3 Bióloga, Mestre, Funed, [email protected]; 4 Bióloga, Mestre, Funed,

[email protected]; 5 Bióloga, Funed, [email protected]; 6 Bolsista Iniciação Científica Institucional Funed-Fapemig, [email protected]; 7 Engenheiro Agrônomo, Doutor, Instituto Agronômico de Cam-pinas, [email protected]; 8 Engenheiro Agrônomo, Doutor, Universidade Federal do Tocantins, joenesp@

udu.br; 9 Biólogo, Doutor, Universidade Federal do Tocantins, [email protected]

RESUMO

Aflatoxinas são produtos do metabolismo secundá-rio dos fungos filamentosos Aspergillus flavus, A. parasiticus e A. nomius, formados em grande varie-dade de alimentos e que apresentam atividade car-cinogênica, teratogênica e mutagênica. A influência do tamanho do inóculo fúngico na produção de afla-toxinas foi avaliada em amendoim autoclavado (121 ºC por 20 min), cultivares IAC Caiapó e IAC Runner 886, produzidos no Instituto Agronômico de Cam-pinas em 2005/2006. Uma cepa de A. parasiticus foi semeada em meio Czapek contido em placa de Petri e incubação por sete dias a 25 ºC. Transferiu-se parte do cultivo para o meio GYEP e incubou-se a 25 ºC durante sete dias para esporulação. A sus-pensão de esporos foi preparada adicionando-se solução de Tween 80 0,1%, sendo a concentração determinada em Câmara de Neubauer e ajustada para 103, 104, 105 e 106 esporos mL-1. Após inocu-lação em grãos de amendoim e incubação durante sete dias a 25 ºC, efetuou-se a quantificação das aflatoxinas por cromatografia em camada delgada (densitometria/366 nm). Observou-se uma maior produção de aflatoxinas B1, B2, G1 e G2 na concen-tração de 103 esporos mL-1. Os menores níveis de aflatoxinas foram encontrados em 106 esporos mL-1. Em concentrações elevadas do inóculo fúngico, a diminuição do processo de esporulação e a possi-bilidade de decomposição mais intensa das aflato-xinas, podem explicar essa diferença na produção das aflatoxinas em amendoim.

Palavras-chave: Aflatoxinas, Amendoim, Aspergillus parasiticus, Concentração de Esporos.

ABSTRACT

Aflatoxins are potent carcinogenic, teratoge-nic, mutagenic agents, produced as secondary metabolites by the filamentous fungus Asper-gillus flavus, A. parasiticus and A. nomius on big variety of food products. The influence of the inoculum size on the aflatoxin production was evaluated in autoclaved peanuts (121 0C by 20min), cultivars IAC Caiapó and IAC Run-ner 886, produced in Instituto Agronômico of Campinas in 2005/2006. A. parasiticus isola-te was inoculated in Petri dishes with Czape-ck media for seven days at 25 0C, followed by inoculation in GYEP media at 25 0C for seven days. The spores were collected and placed in a 0.1% Tween 80 solution, counted in a Neu-bauer chamber and adjusted to 103, 104, 105 and 106 spores mL-1. After peanut seeds were ino-culated and incubated for seven days at 25 0C and the aflatoxins were quantified by thin layer chromatography (densitometry/366nm). The hi-ghest production of aflatoxins B1, B2, G1 and G2 was observed in the concentration of 103 spores mL-1. The lowest levels of aflatoxins were found in 106 spores mL-1. At higher concentrations of inoculum, the decrease of sporulation process and the possibility of more intense aflatoxin de-sintegration, explain this difference in aflatoxin production in peanuts.

Keywords: Aflatoxins, Peanuts, Aspergillus, Spores Concentration

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1. INTRODUçãO

Os fungos estão amplamente distribuídos no solo, nas plantas, na matéria orgânica em decomposi-ção, na água, no ar e na poeira. Conseqüentemen-te, produtos não processados de origem animal e vegetal podem tornar-se contaminados com uma ampla variedade de espécies. Sob condições favo-ráveis de temperatura e umidade, os fungos podem crescer em diferentes tipos de alimentos, como ce-reais, carne, leite, frutas, vegetais e grãos e causar deterioração (3,10,24).

Aflatoxinas são produtos do metabolismo secun-dário de Aspergillus flavus, A. parasiticus e A. no-mius formados na maioria dos casos após a fase do crescimento exponencial do fungo, sendo des-critas como de atividade imunossupressora, tera-togênica e hepatocarcinogênica. As aflatoxinas são um grupo de pelo menos 16 ou 17 substân-cias, derivados bisfuranoisocumarínicos, sendo as aflatoxinas B1, B2, G1 e G2 as quatro principais naturalmente produzidas. A aflatoxina B1, entre todas as aflatoxinas, é usualmente a toxina de maior ocorrência e concentração presente nos alimentos, tendo sido classificada como provável carcinógeno para seres humanos pela Internatio-nal Agency for Research on Cancer (2,26).

O crescimento fúngico e a resultante produção de aflatoxinas é conseqüência da interação entre fungo, hospedeiro e ambiente. A combinação apropriada desses fatores determina o grau de colonização do substrato, o tipo e a quantidade de micotoxina que será produzida. As publicações sobre a incidência de aflatoxinas em alimentos naturais e processados, principalmente em amendoim, relatam níveis que atingem freqüentemente de 1 a 10 ng g-1, mas po-dem ocasionalmente ser detectados na faixa de 10 a 100 ng g-1 ou superiores (6,12,20,21).

Muitos estudos têm sido desenvolvidos para se determinar os fatores que infuenciam a produção de aflatoxinas em alimentos. Esses incluem tem-peratura, disponibilidade de água no substrato (expressa como atividade de água), umidade re-lativa do ar, natureza e composição do substrato, espécie do fungo, composição da atmosfera (re-lação de níveis de oxigênio e dióxido de carbono), presença de substâncias inibidoras, microbiota competidora, umidade do solo, práticas agrícolas,

dano por insetos e armazenamento em condições inadequadas. Poucos são os trabalhos, entretan-to, que têm procurado relacionar a concentração de esporos de fungos aflatoxigênicos e a produ-ção de aflatoxinas (16,17).

O objetivo deste estudo foi determinar in vitro a influência do tamanho do inóculo fúngico e a pro-dução de aflatoxinas, empregando-se uma cepa aflatoxigênica, em diferentes concentrações, cul-tivada em dois tipos de amendoim.

2. METODOLOGIA

2.1 Isolado fúngico

Foi utilizada a cepa de Aspergillus parasiticus IMI 242695 (International Mycological Institute, Ingla-terra) isolada de produtos alimentícios, compro-vadamente produtora de aflatoxinas. Essa cepa encontra-se depositada na coleção de cultura de fungos do Laboratório de Micologia da Fundação Ezequiel Dias.

2.2 Amendoim

Utilizaram-se neste trabalho aproximadamente seis kg de grãos de amendoim, cultivares IAC Caiapó e IAC Runner 886, produzidos no Instituto Agronômico de Campinas (SP), safra 2005/2006.

2.3 Preparação dos inóculos

A.parasiticus foi inoculado em meio Czapek (ni-trato de sódio 4%, cloreto de potássio 1%, sulfato de magnésio 1%, sulfato ferroso 0,02%, fosfato de potássio dibásico 2%, sacarose 3%, sulfato de zinco 1%, sulfato de cobre 0,5%, agar 2%) em placa de Petri e incubado a 25 °C por 7 dias. Se-guiu-se a inoculação no meio GYEP (glicose 2%, extrato de levedura 0,3% e peptona 1%) e incuba-ção a 25 °C por 7 dias. A suspensão de esporos foi preparada adicionando-se solução de Tween 80 0,1% ao cultivo e a contagem de esporos foi feita em Câmara de Neubauer e ajustada para 103, 104, 105 e 106 esporos mL-1.

2.4 Inoculação

A partir das suspensões de esporos preparadas, procedeu-se, em cinco repetições, a inoculação

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31Revista da Fundação Ezequiel Dias, v. 3, n. 2, jul./dez. 2008

de 5 mL de cada uma das suspensões de esporos em 15 g de amendoim em grão, contidos em er-lenmeyers de 125 mL, previamente autoclavados a 121 ºC durante 20 min. Os cultivos foram incu-bados a 25 ºC por um período de sete dias.

2.5 Soluções padrão de aflatoxinas

Para a quantificação das aflatoxinas em croma-tografia em camada delgada foram utilizadas as seguintes concentrações: aflatoxina B1 (0,88 µg mL-1), aflatoxina B2 (1,00 µg mL-1), aflatoxi-na G1 (1,22 µg mL-1) e aflatoxina G2 (0,84 µg mL-1), que foram preparadas a partir da dilui-ção das soluções estoque em benzeno:acetonitrila (98:2, v/v) de acordo com a AOAC (1).

2.6 Quantificação das aflatoxinas

O método empregado foi o descrito por Valente Soares e Rodriguez-Amaya (25) e validado por Prado (22). As aflatoxinas foram separadas e iden-tificadas por cromatografia em camada delgada (CCD), em placas de sílica gel 60G, 20 x 20 cm (Merck), sem indicador fluorescente, com espes-sura de 0,25 mm, utilizando-se como fase móvel tolueno:acetato de etila:clorofórmio:ácido fórmico (70:50:50:20, v/v/v/v), como recomendado por Gi-meno (11). Os extratos das amostras para CCD foram ressuspendidos em benzeno:acetonitrila (98:2), em volumes que variavam de 200 µL a 2 mL. Para aplicação na placa de cromatografia de camada delgada foram utilizados volumes que variaram de 2 a 10 µL. Para a elaboração das curvas de calibração foram utilizados volumes das soluções padrões na faixa de 2 a 10 µL, sem-pre com um mínimo de quatro concentrações. A quantificação das aflatoxinas foi feita por me-didas das intensidades das fluorescências dos spots das amostras e de padrões, em densitôme-tro Shimadzu, modelo CS9301PC, com lâmpada de xenônio, em leitura linear, feixe 0,4 x 5,0 mm e com alta sensibilidade de fluorescência. Os níveis de aflatoxinas nas amostras foram calculados a partir do cálculo das áreas dos picos das aflato-xinas referentes aos extratos das amostras e das soluções padrões de aflatoxinas.

2.7 Análise estatística

O delineamento experimental utilizado foi inteira-

mente casualizado, com cinco repetições e oito tratamentos. Os tratamentos foram instalados em um esquema fatorial constituído pelas quatro concentrações de esporos e dois cultivares de amendoim. Os resultados obtidos das concen-trações das aflatoxina B1, B2, G1 e G2 sofreram transformações logarítmicas, uma vez que foi observada instabilidade da resposta, isto é, au-mento da proporcionalidade entre as médias dos grupos experimentais e seus respectivos desvios padrões, configurando a não conformidade com os pré-requisitos exigidos para a análise de vari-ância. Os dados obtidos foram submetidos à aná-lise de variância e comparação das médias pelo teste de Tukey (p<0,05) (9).

3. RESULTADOS E DISCUSSãO

O resumo da análise de variância dos dados de aflatoxinas referentes aos efeitos dos tratamentos efetuados é apresentado na Tabela 1. Verificou-se interação significativa entre as concentrações de esporos e cultivares para os níveis de aflatoxi-na B1 e G1, indicando que os efeitos isolados das concentrações e cultivares não explicam todas as variações encontradas nos mesmos. Assim, fo-ram realizados os desdobramentos, sendo as mé-dias comparadas pelo teste de Tukey. De maneira contrária, não foi detectada interação significativa para os valores determinados para aflatoxinas B2

e G2. Assim, foram realizados estudos individu-ais para a concentração de esporos e cultivares, sendo as médias comparadas pelo teste de Tukey (Tabelas 2 a 5).

TABELA 1 - Resumo da análise de variância dos dados de aflatoxinas B1 , B2 , G1 e G2 em amendoim autoclavado, cul-tivares IAC Caiapó e IAC Runner 886, e em 04 concentra-ções de esporos do Aspergillus parasiticus IMI 242695.

Fontes de Variação (FV)

Graus de Liber-

dade (GL)

Quadrado Médio

Aflatoxina B1

Aflatoxina G1

Aflatoxina B2

Aflatoxina G2

Cultivar 1 1,483* 1,241* 1,456* 0,028

Concentração de esporos 3 2,910* 2,110* 6,176* 1,669*

Cultivar xConcentração

de esporos3

0,277* 0,514* 0,117 0,046

Resíduo 32 0,051 0,044 0,069 0,073

CV (%) 2,52 2,11 4,18 2,64

* Significativos a 5% de probabilidade, pelo teste F.

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32 Gestão, Ciência & Saúde

TABELA 2 – Níveis de aflatoxina B1 (µg Kg-1) produzidos por Aspergillus parasiticus IMI 242695, em função da concen-tração de esporos (esporos mL-1) em amendoim autoclava-do, cultivares IAC Runner 886 e IAC Caiapó.

Concentração de esporos

(esporos mL-1)

Cultivar

IAC Runner 886 IAC Caiapó

Aflatoxina B1 (µg Kg-1)*

106 3872Cb 5300Ba

105 5282BCb 7322Ba

104 6558Bb 14819Aa

103 15254Aa 16224Aa

* Média de 5 repetiçõesNa linha, as médias seguidas pela mesma letra minúscula, e na coluna, pela mesma letra maiúscula, não diferem entre si, pelo teste de Tukey, a 5% de probabilidade.

TABELA 3 – Níveis de aflatoxina G1 (µg Kg-1) produzidos por Aspergillus parasiticus IMI 242695, em função da concen-tração de esporos (esporos mL-1) em amendoim autoclava-do, cultivares IAC Runner 886 e IAC Caiapó.

Concentração de esporos

(esporos mL-1)

Cultivar

IAC Runner 886 IAC Caiapó

Aflatoxina G1 (µg Kg-1)*

106 13890Aa 14785Aa

105 15747Aa 20516Aa

104 14223Aa 7793Bb

103 40166Ba 43397Ba

* Média de 5 repetiçõesNa linha, as médias seguidas pela mesma letra minúscula, e na coluna, pela mesma letra maiúscula, não diferem entre si, pelo teste de Tukey, a 5% de probabilidade.

TABELA 4 – Níveis de aflatoxina B2 (µg Kg-1) produzidos por Aspergillus parasiticus IMI 242695, em função da concen-tração de esporos (esporos mL-1) em amendoim autoclava-do, cultivares IAC Runner 886 e IAC Caiapó.

Concentração de esporos

(esporos mL-1)

Cultivar

IAC Run-ner 886 IAC Caiapó

MédiaAflatoxina B2 (µg Kg-1)*

106 251 326 288A

105 266 487 377A

104 416 678 547B

103 540 1875 1708C

Média 368b 842a

* Média de 5 repetiçõesNa linha, as médias seguidas pela mesma letra minúscula, e na coluna, pela mesma letra maiúscula, não diferem entre

si, pelo teste de Tukey, a 5% de probabilidade.TABELA 5 – Níveis de aflatoxina G2 (µg Kg-1) produzida por Aspergillus parasiticus IMI 242695, em função da concen-tração de esporos (esporos mL-1) em amendoim autoclava-do, cultivares IAC Runner 886 e IAC Caiapó.

Concentração de esporos

(esporos mL-1)

Cultivar

IAC Run-ner 886 IAC Caiapó

MédiaAflatoxina G2 (µg Kg-1)*

106 1115,4 857 986A

105 1440,2 1496 1468B

104 2018,8 2225 2121C

103 2486,8 2363 2425C

Média 1765 1735

* Média de 5 repetiçõesNa linha, as médias seguidas pela mesma letra minúscula, e na coluna, pela mesma letra maiúscula, não diferem entre si, pelo teste de Tukey, a 5% de probabilidade.

As concentrações das aflatoxinas B1, B2, G1 e G2 au-mentaram com o decréscimo do tamanho do inóculo do A. parasiticus em ambos os cultivares de amen-doim, IAC Caiapó e IAC Runner 886. As aflatoxinas B1 e G1 foram produzidas em maior quantidade quan-do comparadas com as concentrações obtidas para as aflatoxinas B2 e G2, sendo a aflatoxina G1 a toxina mais sintetizada pelo A. parasiticus.

Os níveis de aflatoxinas foram maiores no cultivar IAC Caiapó quando comparados aos obtidos no IAC Run-ner 886, com exceção para a aflatoxina G2 na concen-tração do inóculo de 106 esporos mL-1. Entretanto, foi encontrada diferença significativa apenas para aflato-xina G1 na concentração de 104 esporos mL-1 e para aflatoxina B1 nas concentrações de 106, 105 e 104 es-poros mL-1, revelando que ambos os cultivares foram susceptíveis à ação do A. parasiticus nas condições experimentais executadas.

A influência do tamanho do inóculo no crescimen-to e na produção de aflatoxinas foi relatado ini-cialmente por Sharma et al. (23) e Odamtten et al. (19), em meio sintético e milho, respectivamente. Esses autores observaram que redução do inó-culo fúngico proporcionava aumento na produção de aflatoxinas. Em populações menores de fun-gos, foi observada uma maior expansão lateral nos substratos estudados durante o crescimento do micélio, o que resultava em maiores rendimen-tos de aflatoxinas. Segundo Farkas (8), em altos

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níveis do inóculo fúngico, a diminuição do proces-so de esporulação, que está relacionado ao meta-bolismo secundário dos fungos e a possibilidade de decomposição mais intensa das aflatoxinas, são fatores que podem explicar essa diferença na produção de aflatoxinas. Karunaratne e Bul-lerman (15) observaram esse mesmo fenômeno em arroz. Os maiores níveis de aflatoxinas foram produzidos na concentração de 103 esporos mL-1. Variações na quantidade de aflatoxinas foram também reportadas por Clavero et al. (5) quando A. parasiticus NRRL 2667 foi inoculado em amen-doim, cultivar Florunner, em concentrações de 102, 104 e 106 esporos mL-1. Os maiores níveis foram encontrados no inóculo de 102 esporos mL-1. Prado (22) observou maior produção de aflatoxina B1 em amendoim, cultivar Tatu Vermelho, após inocula-ção com A. flavus na concentração de 103 espo-ros mL-1. Mais recentemente, Gunterus et al. (13) também demonstraram uma relação inversa entre o tamanho do inoculo de A. parasiticus e o nível de aflatoxina B1, após inoculação em amendoim, cultivar Georgia Green. O inóculo de 102 esporos mL-1 proporcionou o maior acúmulo de aflatoxina, quando comparado às concentrações de 106, 105

e 104 esporos mL-1.

Os resultados descritos para outras micotoxinas são variáveis. Etcheverry et al. (7) observaram que o ta-manho do inóculo do Fusarium graminearum ITEM 124 não afetava a produção de desoxinivalenol e ze-aralenona, após inoculação em milho. Chulze et al. (4) verificaram que os maiores níveis de fumonisina em milho foram produzidos quando a concentração do inóculo do Fusarium moniliforme M7075 era 105

e 106 esporos mL-1 e os menores para 102 esporos mL-1. Em cevada, os níveis de ocratoxina A encontra-dos foram superiores na concentração de 105 espo-ros mL-1 quando comparados na de 103 esporos mL-1

de Aspergillus ochraceus 58968. Entretanto, não foi observada diferença significativa entre os níveis de ocratoxina A obtidos, quando a inoculação foi efetu-ada com o A. ochraceus SLV e o Penicilium viridi-catum M93 (14). Recentemente, Morales et al. (18) verificaram em maçã, após inoculação de diferentes espécies de Penicilium expansum, nas concentra-ções de 104 e 106 esporos mL-1, que o acúmulo de patulina era afetado pela temperatura, pelo tamanho do inóculo e pela espécie testada. A 20 ºC, o isolado UdLTA-3.72 produziu uma quantidade maior de pa-tulina na concentração de 104 esporos mL-1 quando

comparado a 106 esporos mL-1. O grau de contaminação de grãos por fungos é tradicionalmente utilizado como uma medida da qualidade. Imagina-se que contagens baixas de fungos (101 - 103 esporos g-1) representam uma maior segurança quando comparado a contagens elevadas (106 esporos g-1). Os resultados obtidos demonstraram que a produção de aflatoxinas, em amendoim, pode ocorrer na presença de fungos toxigênicos, mesmo em baixas concentrações. Ressalta-se, portanto, a importância de controlar as condições de umidade e temperatura nas eta-pas de colheita, pós-colheita e armazenamento, minimizando-se, assim, o crescimento fúngico e a produção de aflatoxinas.

4. CONCLUSÕES

Os cultivares de amendoim IAC Caiapó e IAC Runner 886 foram susceptíveis ao crescimento do fungo fila-mentoso A. parasiticus IMI 242695, não havendo evi-dências claras de diferenças entre os cultivares, uma vez que houve produção significativa das aflatoxinas B1, B2, G1 e G2, nas condições experimentais desen-volvidas, com ambos os genótipos. Foi observada a produção de aflatoxinas com todas as concentrações do inóculo fúngico.

AGRADECIMENTOS

Os autores agradecem à FAPEMIG (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais – CBB 1375/05) e ao CNPq (Processo 401790/2005-3) pelo apoio financeiro.

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34 Gestão, Ciência & Saúde

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36 Gestão, Ciência & Saúde

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37Revista da Fundação Ezequiel Dias, v. 3, n. 2, jul./dez. 2008

RESUMO

De janeiro de 2006 a julho de 2008 foram investigados 139 surtos de to-xinfecção alimentar ocorridos em 73 municípios mineiros. Aproximada-mente 2800 pessoas foram envolvidas e 1738 apresentaram manifesta-ções clínicas. Sobras de 323 alimentos foram analisadas no Laboratório de Enterotoxinas – FUNED – (LACEN – MG). Sessenta e quatro surtos (46,0%) foram confirmados como intoxicação estafilocócica e com re-gistro do envolvimento de 1418 pessoas. Desse total, 724 apresentaram predominantemente diarréia e vômito com período de incubação inferior a seis horas. O isolamento e a quantificação do microrganismo foram de acordo com a metodologia descrita pelo “Compendium of Methods for the Microbiological Examination of Foods” (2001). Noventa e uma amostras de alimentos foram submetidas à pesquisa de enterotoxinas pelo método “Enzyme Linked Fluorescent Assay” (ELISA-ELFA) e si-multaneamente pelo método “Optimum Sensitive Plate” (OSP) para as enterotoxinas SEA, SEB, SEC e SED, também utilizado para a verifica-ção do potencial enterotoxigênico das linhagens isoladas. Vinte e cinco (39,1%) surtos foram confirmados pela presença, nos alimentos, de enterotoxinas e Estafilococos coagulase positiva (>105UFC/g), em sua maioria produtoras SEA, seguida da SEC e SEB. Em 37 (57,8%) surtos a confirmação se deu pela presença de enterotoxinas nos alimentos, porém o microrganismo não foi isolado; a SEA foi a toxina detectada com maior freqüência. Do total de alimentos testados quanto à presença de enterotoxinas pelos dois métodos, 35 (38,5%) foram negativos e 17 (18,7%) positivos. Em 31 (34,1%) amostras a enterotoxina foi detectada pelo método OSP, porém todas negativas quando testadas pelo método ELISA-ELFA. Em oito (8,0%) amostras a enterotoxina foi detectada pelo método ELISA-ELFA com resultado negativo para o OSP. Em todos os surtos confirmados, os sinais, os sintomas e o período de incubação foram característicos de intoxicação estafilocócica. Entre as doenças transmitidas por alimentos, as intoxicações estafilocócicas representam uma parcela expressiva das notificações de surtos ocorridos nos muni-cípios mineiros. Assim, o estabelecimento da análise de risco para os produtos alimentícios e a geração de dados estatísticos sobre o cenário das doenças transmitidas por alimentos proporcionam informações ao Ministério da Saúde que contribuem para o desenvolvimento de progra-mas voltados à produção e à comercialização de alimentos seguros em todo o território nacional.

Palavras-chave: Enterotoxinas Estafilocócicas, Intoxicação Alimentar, Surto de Intoxicação Estafilocócica

DETECÇÃO DE ENTEROTOXINAS ESTAFILOCÓCICAS E DE LINHAGENS ENTEROTOXIGÊ-NICAS EM ALIMENTOS ENVOLVIDOS EM SURTOS DE TOXINFECÇÃO ALIMENTAR

DETECTION OF STAPHYLOCOCCAL ENTEROTOXINS AND ENTEROTOXIGENIC STRAINS IN FOO-DS INVOLVED IN FOOD POISONING OUTBREAKS

Ricardo Souza Dias1, Ana Carolina Cordeiro Soares2, Camilla dos Santos Pinheiro3, Leandro Leão Faúla4

1 Biólogo, mestre em Ciência de Alimentos, doutor em Ciências Biológicas, pesquisador no La-boratório de Enterotoxinas, Divisão de Vigilância Sanitária (Divisa), Diretoria do Instituto Octávio

Magalhães (DIOM) , Fundação Ezequiel Dias (Funed), professor no Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix, Belo Horizonte, [email protected]; 2 Médica Veterinária, analista de Saúde e Tecnologia, Laboratório de Enterotoxinas, Divisa, DIOM, Funed; 3 Técnica em Saúde e Tecnologia, Laboratório de Enterotoxinas, Divisa, DIOM, Funed; 4 Médico Veterinário, analista de Saúde e Tecnologia, professor no Centro Universitário Metodista Izabela Hendrix, Belo Horizonte

ABSTRACT

From January 2006 to July 2008, a hundred and thirty eight food poiso-ning outbreaks occurred in 73 municipalities in the state of Minas Ge-rais were investigated. Approximately 2800 individuals were involved in which 1738 became ill. Three hundreds twenty three left-over food involved in the outbreak were collected and analyzed at the Laboratory of Enterotoxins – FUNED – (Lacen – MG). Sixty four cases (46.0%) were confirmed as staphylococcal food poisoning with 1418 individuals affected of which 724 experienced predominantly diarrhea and vomit within six hours after eating the contaminated food. The detection of the pathogen followed the methods described in “Compendium of Methods for the Microbiological Examination of Foods” (2001). Ninety one food samples were assayed, in parallel for the presence of the enterotoxins using the “Enzyme-Linked Fluorescent Assay” (ELISA-ELF) and the “Optimum Sensitivity Plate” OSP” for detecting to SEA, SEB, SEC, and SED. The OSP method was used to enterotoxin testing by Staphylo-coccus strains isolated from foods. In 25 cases (39.1%), enterotoxins and strains of Staphylococcus coagulase positive (>105cfu/g) were de-tected the majority of them was SEA producers, followed by SEC and SEB. In thirty seven (57.8%) cases toxins were detected in the food samples tested but no strain was isolated, SEA was the toxin most fre-quently detected. In 35 (38.5%) food samples no toxin was detected by both methods. Enterotoxins were detected in 31 (34.1%) samples by the OSP method but were negative by the ELISA-ELF. In eight (8.0%) samples enterotoxin were detected by the ELISA-ELF but not by the OSP method. In all confirmed cases the clinical signs, symptoms, and incubation periods were characteristic of staphylococcal intoxication. Regarding foodborne diseases the staphylococcal intoxications repre-sent an expressive part of the notified outbreaks in the municipalities of the State of Minas Gerais. Therefore, establishing a risk analysis protocol for food products as well as generating statistical data about the scenery of foodborne diseases will provide the necessary informa-tion to local, state and federal health authorities to develop programs aimed at ensuring the commercialization of safe food products in the national territory.

Keywords: Staphylococcal Enterotoxins, Outbreak of Food Poisoning, Staphylococcal Food Poisoning

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1. INTRODUçãO

As doenças transmitidas por alimentos (DTA) são de ocorrência mundial e têm como principal causa, em cer-ca de 90% dos casos, a contaminação bacteriana. São responsáveis por surtos de pequenas, médias e gran-des proporções, representando um problema de saúde pública (18). Em razão da ingestão de alimentos conten-do microrganismos patogênicos e/ou seus metabólitos tóxicos, as DTA têm como principal característica o de-senvolvimento de sinais e sintomas entéricos. A síndro-me pode ser auto-limitante, mas em alguns casos pode evoluir para quadros graves, resultando em óbito.

De acordo com a análise dos dados publicados pelo Food and Drug Administration, Center for Food Safety & Applied Nutrition, nos Estados Unidos, as DTA aco-metem aproximadamente 76 milhões de indivíduos, resultando em 325 mil hospitalizações e 5.200 mortes a cada ano (16).

Embora no Brasil o número de notificações seja cres-cente, ele ainda é subestimado. Os indivíduos muitas vezes não relacionam os sinais e os sintomas apre-sentados à ingestão de alimentos, pois geralmente a síndrome é de curta duração e o período de incuba-ção varia de minutos a alguns dias. Com isso as pes-soas envolvidas acabam por não procurar os serviços de saúde e, quando procuram, profissionais de saúde não notificam os casos às autoridades sanitárias.

Entre as DTA, a intoxicação causada por bactérias do gênero Staphylococcus representa uma das prin-cipais causas de gastrenterites relacionadas à inges-tão de enterotoxinas pré-formadas no alimento (12). Devido a sua ampla distribuição na natureza, à capa-cidade de se desenvolver em variações de tempera-tura (7 a 48,5ºC) (19), pH (4.2 a 9.3) (5) e em elevada concentração de cloreto de sódio (15%), o Staphylo-coccus apresenta um potencial risco de contamina-ção de diversos alimentos, seja durante o preparo, o processamento ou seja durante a estocagem.

Nesse sentido, para uma criteriosa investigação de surtos de toxinfecções alimentares relacionadas a esse microrganismo, torna-se necessário que não ape-nas seja feita a identificação da espécie envolvida, ve-rificado o potencial enterotoxigênico da mesma e sua correlação com a dose infectante (igual ou superior a 105UFC/g), mas que sejam detectadas as enterotoxi-nas nas sobras dos alimentos consumidos.

As enterotoxinas pertencem ao grupo das exotoxi-nas, são proteínas de baixo peso molecular (24000 a 30000 Daltons) sintetizadas por algumas espécies de Staphylococcus, em especial pelo S. aureus. Apresentam atividade biológica similar e uma homo-logia na seqüência de aminoácidos que varia entre 30% e 86% (14). Os genes que codificam sua sínte-se podem ser de origem cromossomal ou plasmidial e podem ser transferidos de uma célula a outra por meio de bacteriófagos atenuados (1). De acordo com Loir et al. (16) já foram descritas até o momento vinte diferentes enterotoxinas, dessas, 16 sorologicamen-te caracterizadas como (SEs) A, B, C e suas formas variantes, D, E, e I; além das G, H, J, K, L, M, N, O, P, e Q. Quatro outras (R, S, T, e U) foram identificadas, porém, pouco caracterizadas.

A ingestão de enterotoxinas estafilocócicas resulta no desencadeamento de vômitos e diarréia, e em alguns casos observa-se o desenvolvimento de dor abdominal, sudorese, tremor e queda da pressão sangüínea (13). A síndrome surge entre 30 minutos e seis horas após a ingestão do alimento contendo a toxina pré-formada. O quadro clínico caracteriza-se por uma intoxicação alimentar de evolução rápida e auto-limitante (22), mas pode ser grave, levando a pessoa acometida à necessidade de cuidados mé-dicos. Em alguns casos o quadro do paciente pode evoluir para o óbito.

A gravidade da intoxicação alimentar depende da susceptibilidade do individuo à enterotoxina, da quantidade ingerida e do histórico de saúde da pes-soa envolvida (18). Casos mais graves estão rela-cionados a crianças e idosos, que muitas vezes necessitam de intervenção médica ou até mesmo hospitalização (20).

A contaminação dos alimentos por seres humanos é a principal causa das intoxicações de origem es-tafilocócica, pois o microrganismo é encontrado nas narinas de 20 a 30% dos indivíduos, sendo que o número de portadores intermitentes do microrganis-mo corresponde a 60% da população (17). A conta-minação dos alimentos é decorrente principalmente de manipuladores com poucos critérios de higiene, mas a ocorrência de surtos também está relaciona-da às falhas de conservação dos alimentos, como refrigeração inadequada, aos períodos longos entre o preparo e o consumo e a tratamentos térmicos inadequados (13), como também à qualidade da

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matéria-prima. Considerando o impacto socioeconômico das doen-ças transmitidas por alimentos em nosso meio, torna-se cada vez mais necessária a ação conjunta dos la-boratórios de saúde pública e vigilância sanitária na geração de dados estatísticos para que o Ministério da Saúde tenha o conhecimento sobre a participa-ção do microrganismo nas DTA no âmbito nacional.

Assim, o objetivo deste trabalho foi caracterizar a participação de linhagens enterotoxigênicas de Staphylococcus spp nos surtos de toxinfecção de origem alimentar ocorridos nos diferentes municí-pios do Estado de Minas Gerais.

2. METODOLOGIA

Realizou-se um estudo epidemiológico retrospectivo dos surtos de toxinfecção alimentar ocorridos em di-ferentes municípios mineiros, no período de janeiro de 2006 a julho de 2008.

Após a notificação do surto, os fiscais do Serviço de Vigilância Sanitária do município iniciaram a in-vestigação. As pessoas envolvidas foram entrevis-tadas para o preenchimento da ficha de inquérito epidemiológico. Sobras dos alimentos consumidos foram coletadas e encaminhadas para o Serviço de Microbiologia de Produtos (DIVISA) da Fundação Ezequiel Dias (LACEN-MG) onde foram analisadas. A análise dos dados epidemiológicos (sinais e sinto-mas, período de incubação, características das pes-soas envolvidas etc) proporcionou a indicação dos possíveis alimentos suspeitos e dos agentes respon-sáveis pelos surtos ocorridos. Para os surtos carac-terísticos de intoxicação estafilocócica, os alimentos foram submetidos à quantificação do microrganismo (UFC/g ou mL), à pesquisa de enterotoxinas e à veri-ficação do potencial enterotoxigênico das linhagens isoladas.

Para a etapa de isolamento e quantificação, 25 gra-mas ou quantidade disponível do alimento envolvido foram analisadas de acordo com a metodologia des-crita no “Compendium of Methods for the Microbio-logical Examination of Foods” (15). As colônias com crescimento típico e atípico em ágar Baird-Parker, após o período de incubação (48h a 36°C), foram con-tadas, e a espécie determinada por meio das provas de coagulase, termonuclease (Tnase), fermentação de manitol e de maltose e produção de hemólise. Em

paralelo, o alimento foi submetido ao protocolo de extração para a pesquisa de enterotoxinas pelo mé-todo imunoenzimático “Enzyme Linked Fluorescent Assay” (ELFA) empregando o sistema automatizado VIDAS® Staph enterotoxin II (BioMérieux). Também foi utilizado simultaneamente ao ELISA o método de imunodifusão em gel, “Optimum Sensitive Plate” (OSP) descrito por Robbins et al, (1974) (21) para a pesquisa e identificação das enterotoxinas (SEA, SEB, SEC e SED) no alimento e para a verificação do potencial enterotoxigênico das cepas isoladas de acordo com Hallander (1965) (10).

3. RESULTADOS E DISCUSSãO

Foram notificados 139 surtos ocorridos em 73 mu-nicípios, destes, 64 (46,0%) confirmados como into-xicação estafilocócica. A freqüência média de ocor-rência nesse período foi de 27 notificações a cada período (Figura 1).

FIGURA 1 - Freqüência de surtos de intoxicação estafilo-cócica ocorridos em Minas Gerais no período de janeiro de 2006 a julho de 2008

Trezentas e vinte e três amostras de alimentos foram coletadas pelos fiscais sanitários e, de acordo com a análise das fichas de inquérito epidemiológico, apro-ximadamente 2800 pessoas, entre crianças, jovens e adultos foram envolvidas, 1738 apresentaram ma-nifestações clínicas e três óbitos foram registrados neste período. Acredita-se que o número de pesso-as envolvidas/acometidas seja ainda maior, uma vez que em 38 (38,4%) notificações esses dados não foram informados.

As manifestações clínicas predominantes foram em geral diarréia e vômito, seguidos de febre e dores abdominais com período de incubação médio de oito

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Período: semestre

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JAN - JUL 2007

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horas, variando de 30 minutos a 24 horas. Para os surtos confirmados como intoxicação estafilocócica, o período de incubação foi inferior a seis horas. Os alimentos suspeitos mais freqüentes foram queijos, refeições prontas e produtos de confeitaria, o que sugere possíveis falhas na seleção da matéria-pri-ma, processamento e armazenamento, o que resul-taria na contaminação dos mesmos. Para Peresi et al, (18) alimentos submetidos à extensa manipula-ção e aqueles mantidos à temperatura ambiente por longos períodos estão entre os mais relacionados à ocorrência de surtos. Os alimentos foram consi-derados impróprios para o consumo em virtude da presença de Staphylococcus coagulase positiva com contagem igual ou superior a 105UFC/g e/ou enterotoxina(s) caracterizando-os como potencial-mente capazes de causar intoxicação alimentar. Dos surtos confirmados como intoxicação estafilocócica, aproximadamente 1418 pessoas foram envolvidas, destas, 724 apresentaram sinais e sintomas carac-terísticos da enfermidade, com a predominância de diarréia e vômito. Metade das fichas de inquérito epi-demiológico não apresentava informações sobre o número de pessoas expostas/doentes, o que eleva consideravelmente o número de pessoas envolvidas nos surtos de toxinfecção pelo microrganismo.

Os casos de óbito registrados nesse período não foram relacionados à intoxicação estafilocócica, as análises dos resultados revelaram a presença de Sal-monella em um dos episódios. Os alimentos associa-dos às outras duas mortes apresentaram resultados satisfatórios para os parâmetros microbiológicos pes-quisados, indicando que outros possíveis fatores es-tariam associados à ocorrência das mesmas. Nos Es-tados Unidos, estima-se que as doenças transmitidas por alimentos sejam responsáveis por duas mortes a cada ano (17). Embora relatos de óbito por ingestão de enterotoxinas estafilocócicas sejam raros, quando ocorrem estão relacionados a fatores como idade, estado nutricional das pessoas envolvidas, quantida-de de enterotoxinas ingerida, entre outros. No Brasil, Carmo et al. (6) registraram a ocorrência, em um úni-co surto, de 16 óbitos de crianças e idosos resultantes da ingestão de alimentos contendo elevada dose de enterotoxina A (SEA). Segundo os autores, os indiví-duos que consumiram em torno de 500 gramas de alimentos teriam ingerido aproximadamente 3 mg de enterotoxina. De acordo com a literatura, a SEA está entre as enterotoxinas identificadas com maior freqü-ência em surtos de intoxicação alimentar. Para Even-

son et al. (9) a presença de SEA na amostra de leite achocolatado envolvida em um surto de intoxicação alimentar foi a responsável pelo episódio ocorrido.

Do total de surtos caracterizados como intoxicação estafi-locócica (n=64), em 25 (39,1%) foi detectada a presença de linhagens enterotoxigênicas de estafilococos coagula-se positiva (>105 UFC/g) e de enterotoxinas nas sobras dos alimentos consumidos. As linhagens produtoras de enterotoxina A (SEA) foram as isoladas com maior fre-qüência, seguida da SEC e SEB. Em dois surtos foram encontradas elevadas contagens (>105 UFC/g) do micror-ganismo, mas as enterotoxinas SEA, SEB, SEC e SED não foram detectadas quando testadas pelo método OSP (Figuras 2 e 3).

FIGURA 2 - Toxinfecção alimentar causadas por Estafiloco-cos coagulase positiva e/ou enterotoxinas ocorridos em Mi-nas Gerais no período de janeiro de 2006 a julho de 2008

FIGURA 3 - Perfil enterotoxigênico de linhagens de Sta-phylococcus isoladas dos alimentos envolvidos nos surtos de toxinfecção ocorridos em Minas Gerais no período de janeiro de 2006 a julho de 2008

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Enterotoxinas detectadas - OSP - (indução)

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Enterotoxi-nas

Estafilococos coag. pos

Estafilococos coag. pos +

Enterotoxinas

Total de surtos confir-

mados

Enterotoxinas testadas - OSP - (SEA, SEB, SEC, SED) Estafilococos coag. pos (>100.000UFC/g)

14

SEA+SEB+SEC

SEA+SED

SEA+SEC

SEA+SEB

APENAS SEC

APENAS SEA

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A análise dos resultados sugere a possibilidade da presença de outras enterotoxinas ou a sensibi-lidade do método por não detectar baixas concen-trações. Casman & Bennett (1965) (7) utilizaram o método para a pesquisa de enterotoxinas em alimentos. Segundo os autores, quando se utili-za antígeno padrão com elevado grau de pureza (95%) a sensibilidade do método gera em torno de 1µg de toxina/mL, o que corresponde à quan-tidade de toxina necessária para a formação da linha de precipitação.

A cocção é uma das etapas de processamento a que os alimentos geralmente são submetidos e pode levar à redução dos contaminantes microbia-nos devido à injúria ou morte celular. Ao contrário das células, as enterotoxinas estafilocócicas são relativamente estáveis a tratamentos térmicos; segundo Bergdoll (4), é necessário o aquecimen-to a 100ºC, por 30 minutos para destruir toxinas brutas. Para Holečková et al. (11) a estabilidade térmica garante a integridade da proteína e de sua atividade biológica. Assim, do total de sur-tos confirmados pela presença de enterotoxinas e microrganismo+enterotoxinas (n=62) em 37 (59,7%) foram detectadas enterotoxinas nas so-bras dos alimentos, embora o microrganismo não tenha sido isolado. A SEA foi a toxina detectada com maior freqüência, estando presente mesmo quando detectadas mais de uma enterotoxina em um mesmo surto (Figura 4).Para quantidade de enterotoxina inferior a 50ng/g de alimento, a utili-zação de técnicas de radioimunoensaio (RIA), de aglutinação e métodos imunoenzimáticos (ELISA)

têm sido indicadas devido à especificidade e sen-sibilidade que as mesmas apresentam. Mas de acordo com Bergdoll (1990) (4), normalmente a quantidade de enterotoxina presente em alimen-tos envolvidos em surtos de toxinfecção alimentar é facilmente detectável uma vez que se encontra em concentrações que variam de 1 a 5µg/g de ali-mento.

Quando comparados os métodos de detecção de enterotoxinas testados nos sobrenadantes ob-tidos da extração realizada em 91 amostras de alimentos (OSP x ELISA-ELFA) (Figura 5), a con-cordância para os resultados negativos ocorreu em 35 (38,5%) alimentos e resultados positivos em 17 (18,7%). Pelo método OSP foi detecta-da a presença de enterotoxinas em 31 (34,1%) amostras analisadas, porém todas elas negativas quando testadas pelo método ELISA-ELFA. Em apenas oito amostras (8,0%) foi detectada ente-rotoxina pelo método ELISA-ELFA com resultado negativo para o OSP. Dos surtos analisados, as características dos alimentos envolvidos, sinais, sintomas apresentados pelas pessoas acometi-das e o curto período de incubação indicavam se tratar de intoxicação estafilocócica.

Embora o método imunoenzimático (ELISA) apre-sente uma sensibilidade de pelo menos 1ng/mL (3), sensibilidade superior à apresentada pelo método de imunodifusão em gel (OSP) que pode chegar a 100ng/mL (4), resultados positivos para o método de ELISA podem ocorrer na presença de concentrações não tóxicas de enterotoxinas. Assim, torna-se neces-

FIGURA 4 - Frequência de enterotoxinas detectadas nos alimentos envolvidos nos surtos de toxinfecção ocorridos em Minas Gerais no período de janeiro de 2006 a julho de 2008

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SEA + SEDSEA + SECSEA + SEBAPENASSEC

APENAS SEB

APENAS SEA

SEB + SEC ELISA TOTAL

Enterotoxinas SEA, SEB, SEC, SED testadas pelo método OSP - extração

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42 Gestão, Ciência & Saúde

sário determinar não só a presença, mas a quanti-dade de enterotoxinas para fins de reprovação do produto. De acordo com Asao et al. (2) há poucos es-tudos sobre a dose de enterotoxina necessária para desencadear os sinais e sintomas entéricos em seres humanos. Segundo os autores, ao analisarem amos-tras de produtos lácteos envolvidos em um surto de toxinfecção alimentar envolvendo aproximadamente 13420 pessoas, foi possível estimar que 20-100ng de SEA tenha sido a quantidade necessária para de-sencadear a síndrome. Raj e Bergdoll (19), ao es-tudar o efeito da enterotoxina SEB em estudantes voluntários jovens, constataram que a ingestão de aproximadamente 1,0 µg é suficiente para desenca-dear grave gastrenterite. De acordo com Evenson et al. (9) nanogramas (100-200ng) de SEA é suficiente para desencadear os sintomas agudos da doença.

Ambos os métodos testados para a pesquisa de en-terotoxinas nos alimentos apresentam interferentes que podem comprometer o resultado. Enquanto re-sultados falso-negativos para o método “OSP” pos-sam ocorrer devido ao processamento térmico em que o alimento é submetido tornando as toxinas soro-logicamente não reativas (3), o método de detecção pelo “ELISA” pode levar a resultados falso-negativos devido à presença de possíveis interferentes como substâncias não imunológicas ligadas à matriz.

Diante dos dados apresentados, observa-se que, entre as doenças transmitidas por alimentos, as in-

toxicações estafilocócicas representam uma parce-la expressiva no número de notificações de surtos ocorridos nos municípios mineiros. A quantificação, a verificação do potencial enterotoxigênico das li-nhagens isoladas e a pesquisa de enterotoxinas nos alimentos envolvidos são procedimentos imprescin-díveis para a elucidação dos surtos causados pelo microrganismo.

O estabelecimento da análise de risco para os pro-dutos alimentícios, assim como a geração de dados estatísticos sobre o cenário das doenças transmi-tidas por alimentos, proporcionarão informações necessárias ao Ministério da Saúde para o desen-volvimento de programas voltados à produção e à comercialização de alimentos seguros em todo o território nacional.

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OSP pos/ELI-SA neg.

Positivo em ambos

Negativo em ambos

OSP neg/ELISA pos.

Total de alimentos

Detecção de Enterotoxinas (extração)

FIGURA 5 - Detecção de enterotoxinas em alimentos envolvidos nos surtos de toxinfecção ocorridos em Minas Gerais no período de janeiro de 2006 a julho de 2008: “OSP” x “ELISA-ELFA”

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43Revista da Fundação Ezequiel Dias, v. 3, n. 2, jul./dez. 2008

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44 Gestão, Ciência & Saúde

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45Revista da Fundação Ezequiel Dias, v. 3, n. 2, jul./dez. 2008

RESUMO

Este trabalho avaliou o Regulamento Técnico das Boas Práticas para a Fabricação de Medicamentos vigente (RDC–210/03) como instrumento de vigilância sanitária nacional, cuja aplicação destina-se a assegurar a quali-dade final dos medicamentos, incidindo sobre a competi-tividade empresarial nacional e internacional, fornecendo informações ao setor produtivo para implementação das Boas Práticas e subsidiando a verificação de seu cum-primento pelos órgãos competentes.

Adotou-se o método de análise documental participativa, centrada em três aspectos do Regulamento: suficiência, abrangência e compreensão textual. Selecionaram-se 15 diretrizes para fundamentar a apreciação da suficiência; critérios históricos e técnicos orientaram a escolha das três diretrizes utilizadas no exame da abrangência; e para o en-tendimento do texto, recorreu-se à comparação entre sua redação e a de seus antecessores.

A avaliação demonstrou insuficiência temática, amplitude de conteúdo com escassez de procedimentos específicos e compreensão textual deficiente.

Este estudo concluiu que o Regulamento, como instru-mento de vigilância sanitária, exige aprimoramento. As-sim, no que diz respeito à suficiência, sugere a adequação da disposição e complementação do conteúdo temático; em relação à abrangência, cita melhorias no conteúdo; e quanto à compreensão textual, aconselha providências visando a superar as falhas documentais constatadas.

Palavras-chave: Boas Práticas de Fabricação. Medicamentos. Saúde Pública. Vigilância Sanitária. Indústria Farmacêutica

O REGULAMENTO TÉCNICO DAS BOAS PRÁTICASPARA A FABRICAÇÃO DE MEDICAMENTOS (RDC–210/03)

COMO INSTRUMENTO DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA NACIONAL

CRITICAL APPRAISAL OF THE TECHNICAL REGULATIONS GOVERNING GOOD MANUFACTU-RING PRACTICES FOR PHARMACEUTICAL PRODUCTS (RDC-210/03) AS A INSTRUMENT OF

NATIONAL PUBLIC HEALTH

Éji Pons Machado

Graduada em Farmácia e Farmácia-Bioquímica pela Universidade Federal doRio Grande do Sul, Mestre em Saúde Pública pela Faculdade de Saúde Públicada Universidade de São Paulo, Consultora Nacional para Vigilância Sanitária da

Organização Pan-Americana da Saúde / Organização Mundial da Saúde,[email protected] [email protected]

ABSTRACT

This Study has the objective of evaluating the current Good Manufacturing Practices (GMP) in the Pharmaceu-tical Industry, RDC-210/03 as a instrument of National Public Health to assure that the final products possess the requisite quality for medicaments as well as commercial competitiveness, both nationally and internationally and avail enough information to enable the production sector to implement GMP in its factory processes and allow the Authorities to verify compliance.The Study covers 15 GMP directives in Pharmaceutical Manufacturing. In order to select criteria for analysis the existing literature and the translation of the original GMP Directives were examined. The work comprised three an-alytical stages evaluating (i) sufficiency (ii) the level and depth of detail and (iii) comprehension of the text - a Portu-guese translation of the original GMP Directives.The Document is insufficient as an Industry Directive. It presents amplitude of content with lack of specific proce-dures. Comprehension of the text is poor. The study concludes that the Document, as a health sur-veillance instrument, requires enhancement. Thus, regard-ing to the sufficiency, it suggests a provision adaptation and a complementation of the thematic content; with re-gard to the coverage, it cites improvements in the content; and concerning the textual comprehension, it advises mea-sures aiming to overcome the documentary deficiencies found.

Keywords: Good Manufacturing Practices, Pharmaceuti-cal Products, Public Health, Health Surveillance, Pharma-ceutical industry

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46 Gestão, Ciência & Saúde

1. INTRODUçãO

A comercialização de medicamentos diferencia-se sobremaneira pelo fato do usuário quase não possuir elementos para avaliar previamente sua qualidade e, desta, depender a promoção, proteção ou recupera-ção de sua saúde. Embora concreta e demonstrável, apenas os aspectos da qualidade perceptíveis pelos sentidos físicos são passíveis de verificação indepen-dente de saberes específicos; dependentes, no en-tanto, do conhecimento prévio e, em muitos casos, da violação da embalagem primária. Além disso, somen-te após o uso do medicamento é possível verificar a ocorrência ou não do efeito esperado. Assim, ainda que existam fatores concorrentes, como, por exem-plo, o estágio e a gravidade da situação saúde/doen-ça, bem como a correta prescrição e acompanhamen-to profissional, a administração de um medicamento

pode abreviar, prolongar, agravar ou impedir a corre-ção almejada, dependendo de sua qualidade.

A produção de medicamentos em larga escala, des-vinculada da prescrição médica, expôs problemas que apesar da evolução dos setores regulado e re-gulador ainda persistem. Os últimos vinte anos teste-munharam esforços sanitários crescentes, acompa-nhados de desenvolvimento científico e tecnológico, historicamente inéditos. Porém, não obstante esse cenário positivo, os riscos inerentes aos problemas e as limitações da Vigilância Sanitária no cumprimento efetivo de seu papel revelam uma situação de carên-cia que impõe providências, dirigindo nosso olhar ao arcabouço legal e às ações de vigilância sanitária, remetendo-nos às Boas Práticas para a Fabricação de Medicamentos como objeto direto deste estudo e à qualidade, como seu objeto indireto.

TABELA 1 - Diretrizes para Boas Práticas de Fabricação para medicamentos, selecionadas para avaliação do Regulamento Técni-co das Boas Práticas para a Fabricação de Medicamentos (RDC-210/03), como instrumento de vigilância sanitária nacional.

TÍTULO ORIGEM /ANO DE PUBLICAçãO

IDENTIFICAçãO NO TEXTO

Regulamento Técnico das Boas Práticas para a Fabricação de Medicamentos (RDC-210/03) Brasil / 2003 Regulamento

Good Manufacturing Practices for Pharmaceutical Products: main principles.

Organização Mundial da Saúde / 2003 OMS/03

Regulamento Técnico das Boas Práticas para a Fabricação de Medi-camentos (RDC-134/01) Brasil / 2001 RDC-134/01

Guia de Boas Práticas para a Fabricação de Produtos Farmacêuticos Brasil / 1994 GUIA/94

Good Manufacturing Practices for Pharmaceutical Products Organização Mundial da Saúde / 1992 OMS/92

Guía de Normas de Correcta Fabricación de Medicamentos de la Comunidad Europea

Comunidade Econô-mica Européia / 1992 CEE/92

Buenas Prácticas de Manufactura de Productos Farmacéuticos Mercado do Cone Sul / 2000 MERCOSUL/00

Good Manufacturig Practices for Drug Manufacturers and Impor-ters / Bonnes Pratiques de Fabrication pour les Fabricats et les Importateurs de Drogues

Canadá / 1982 CANADÁ/82

Buenas Prácticas de Manufactura para la fabricación de productos faarmacéuticos Colômbia / 1996 COLÔMBIA/96

Normas de Buenas Prácticas de Fabricación para la Industria Farma-céutica Venezuela / 1990 VENEZUELA/90

Reglamento de Buenas Practicas de manufactura para La Fabricaci-ón y La Inspección em La Industria Farmacéutica Costa Rica / 1993 COSTA RICA/93

Current Good Manufacturing Practice for finished Pharmaceuticals Estados Unidos / 1996 EUA/96Buenas Practicas de Producción Farmaceéutica Cuba / 1992 CUBA/92Bonnes Pratiques de Fabrication França / 1995 FRANÇA/95Guía de Procedimientos Adecuados de Manufactura Farmacéutica México / 1986 MÉXICO/86

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47Revista da Fundação Ezequiel Dias, v. 3, n. 2, jul./dez. 2008

Este estudo foi inicialmente escrito como disserta-ção de mestrado apresentada à Faculdade de Saú-de Pública da Universidade de São Paulo, em 2002, avaliando criticamente as diretrizes de Boas Práticas para a Fabricação de Medicamentos (RDC-134/01) (1), vigentes à época, como instrumento de vigilân-cia sanitária nacional.

Da prática profissional da autora em vigilância sanitá-ria emergiam três perguntas que relacionavam as in-formações contidas no regulamento em questão com sua aplicabilidade, considerando o estágio tecnológi-co e a diversificação do parque fabril farmacêutico nacional, cujas respostas suficiência, abrangência e compreensão textual representaram os aspectos que definiram a conformação deste trabalho.

Assim, sem a pretensão de teorizar sobre técnica farmacêutica, as avaliações desses três aspectos compõem, em conjunto, a avaliação crítica das di-retrizes vigentes (RDC-210/03) (2), daqui em diante, nomeada Regulamento, como instrumento capaz de suportar a adequação da cadeia produtiva às neces-sidades de saúde da população. 2. METODOLOGIA

O conhecimento prévio de diretrizes de Boas Práti-cas para Fabricação (BPF) definiu o material (apre-sentado e identificado na Tabela 1) e a análise com-parativa como base para as avaliações. As etapas deste estudo estão representadas na Figura 1. Os achados iniciais apontaram para a perspectiva quali-tativa como foco metodológico, embora tenham sido utilizados recursos quantitativos como suporte à fun-damentação argumentativa resultante das análises comparativas realizadas.

A suficiência foi avaliada mediante análise de conver-gências e divergências totais e parciais das informa-ções por assunto, a qual estabeleceu a correspon-dência temática entre as diretrizes estudadas. Para avaliação da abrangência foram analisados tendência e detalhamento, sendo o material reduzido mediante combinação dos resultados da etapa anterior com o atendimento de dois dos critérios: i) convergências ou divergências técnicas ou legais relevantes; ii) represen-tatividade; iii) particularização técnica ou legal. Para avaliação da compreensão textual, da leitura ordenada do Regulamento (2), identificaram-se características que facilitavam, dificultavam ou alteravam sua inter-

pretação em relação ao regulamento anterior, quais sejam: organização do conteúdo, precisão da redação e exatidão da terminologia. Para tanto, foram necessá-rias as etapas adicionais: revisão da tradução do ori-ginal em inglês da OMS/92 (26) que resultou no texto do GUIA/94 (8); análise comparativa entre os textos do GUIA/94 (8) e da RDC-134/01 (1); análise comparativa entre os textos da RDC-134/01 (1) e do Regulamento (2). Quanto à organização do conteúdo, analisaram-se: superposição, supressão e acréscimo de informações, substituição de termos, modificação da redação e con-tinuidade do conteúdo. Em relação à precisão da re-dação, analisaram-se: coerência técnica e legal entre as informações apresentadas no Regulamento (2), e destas com as apresentadas nos principais regulamen-tos relacionados (5,6,7,9,10,11,12,22,23,24,25,28,29,30). Com referência à exatidão da terminologia foram avaliados rigor e uniformidade.

3. RESULTADOS E DISCUSSãO

3.1 Suficiência

A suficiência é aqui representada pela capacidade de o Regulamento (2) de suprir tanto o setor produti-vo quanto os órgãos competentes com informações bastantes para a fabricação de medicamentos. A avaliação da suficiência não se encerra em si mes-ma, evidenciando uma correlação dos resultados encontrados com a diversificação e o nível de de-senvolvimento tecnológico fabril.

Convergências e divergências, estabelecendo a cor-respondência temática evidenciaram 41 temas distin-tos no material estudado (Tabela 1). Dos temas com conteúdos equivalentes, consideraram-se totalmen-te convergentes aqueles que constavam de todas as diretrizes selecionadas (Tabela 1); parcialmente convergentes os temas com conteúdos equivalentes que constavam de, no mínimo, duas diretrizes; e di-vergente, o tema apresentado em apenas uma das diretrizes selecionadas.

Em termos absolutos, atentando à ordem cronológi-ca da publicação das diretrizes em estudo (Tabela 1), constata-se um período de novidades temáticas que se inicia em 1982 com Canadá/82 (13) pas-sando por: MÉXICO/86 (21), VENEZUELA /90 (30), OMS/92 (26), CUBA/92 (16), COSTA RICA/93 (15) e FRANçA/95 (19). A exceção nesse período cou-be ao Brasil com o GUIA/94 (8), explicada por ser

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48 Gestão, Ciência & Saúde

1ª ETAPA

ANÁLISE TEMÁTICA DAS DIRETRIZES SELECIONADAS

IDENTIFICAçãO DE CONVERGÊNCIAS E DIVERGÊNCIAS RELEVANTES

AVALIAçãO DA SUFICIÊNCIA

DAS DIRETRIZESBRASIL – ORGANIZAçãO MUNDIAL DA SAÚDE – COMUNIDADE ECONÔMICA EUROPÉIA –

MERCOSUL – CANADÁ – COLÔMBIA – VENEZUELA – COSTA RICA

2ª ETAPA

BRASIL – ORGANIZAçãO MUNDIAL DA SAÚDE – COMUNIDADE ECONÔMICA EUROPÉIA –ESTADOS UNIDOS

ANÁLISE COMPARATIVA ENTRE OS CONTEÚDOS DAS DIRETRIZES

IDENTIFICAçãO DE CONVERGÊNCIAS E DIVERGÊNCIAS RELEVANTES

AVALIAçãO DA ABRANGÊNCIA

3ª ETAPA

DA CONFORMAçãO TEXTUAL DO REGULAMENTO TÉCNICO DA RDC-210/03

ANÁLISE DA ORGANIZAçãO DO

CONTEÚDO

ANÁLISE DA PRECISãO DA

REDAçãO

ANÁLISE DA EXATIDãO DA TERMINOLOGIA

AVALIAçãO DA COMPREENSãO TEXTUAL

FIGURA 1 - Fluxograma das etapas metodológicas da avaliação crítica do Regulamento Técnico das Boas Práticas para a Fabricação de Medicamentos (RDC-210/03).

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tradução parcial da OMS/92 (26). Esse andamento é interrompido com EUA/96 (18). Também daí em diante, o Brasil foi exceção, publicando o tema Pro-dutos Biológicos na RDC-134/01 (1).

Entende-se que a inclusão de um novo tema referen-da sua importância, do mesmo modo que a ausência de novidades temáticas permite supor que os temas abordados são suficientes, naquele momento, para um país ou bloco econômico. Seguindo esse raciocí-nio o último trabalho para atualização das diretrizes nacionais considerou o conteúdo temático vigente suficiente para a realidade do País.

A análise da suficiência em termos relativos à si-tuação do parque fabril nacional apontou a ausência de temas essenciais para assegurar a fabricação de produtos com a qualidade pretendida e a preserva-ção do meio ambiente, como: produtos farmacêuticos não comercializáveis; produção de placebo; produção por campanha; gerenciamento de resíduos; descar-te de materiais e produtos; monitoramento da quali-dade pós-comercialização, entre outros. Percebe-se também a ausência de temas referentes a atividades, produção de formas farmacêuticas distintas e de pro-dutos farmacêuticos específicos. Mesmo que alguns deles sejam disciplinados em legislações próprias, e assim devam ser em razão de sua especificidade, in-terfaces com as BPF podem ser apresentadas como diretrizes sem gerar conflito; ao contrário, reforçando a correlação entre os assuntos sanitários regulamen-tados.

Além disso, sugere-se um novo tema: Comercia-lização de Equipamentos Novos e Usados, como mecanismo de controle – um elemento auxiliar no combate à clandestinidade e falsificação. A velocida-de da evolução tecnológica, associada às exigências técnicas referentes aos parâmetros da qualidade, força a substituição de equipamentos muitas vezes em condições de funcionamento. A formação de um banco de dados nacional dos equipamentos utiliza-dos na fabricação de medicamentos combinado com a regulamentação da comercialização de equipa-mentos usados facilitariam a adoção de medidas de monitoramento, dificultando a montagem de fábricas clandestinas. Porém, o mesmo silêncio que se ou-viu durante um século a respeito (ou a despeito?) da propaganda de medicamentos percebe-se atualmen-te em relação à comercialização de equipamentos destinados à fabricação de medicamentos e demais

produtos para a saúde. Embora a análise da composição temática do Re-gulamento (2) ateste insuficiência, os resultados de-monstram que essa não é sua exclusividade, sen-do comum a todas diretrizes estudadas (Tabela 1). Aliás, a representatividade das diretrizes selecionadas (Tabela 1) e o fato de o Regulamento (2) situar-se em terceiro lugar quanto ao número de temas apre-sentados poderiam sugerir suficiência satisfatória não fosse análise comparativa das informações con-tidas em cada tema com relação às atuais atividades fabris, a qual apontou a necessidade de um leque mais amplo de temas a serem abordados.

Os resultados da análise comparativa sugerem a ne-cessidade de revisão do conteúdo temático conside-rando a realidade tecnológica e econômica de nosso parque fabril e os interesses comerciais nacionais e internacionais. Do ponto de vista didático apontam para a consideração da lógica interna da disposição temática em relação às atividades de pré-fabricação, fabricação e pós-fabricação.

De fato, o momento atual registra uma atenção cres-cente com a qualidade, envolvendo, gradativamen-te, os diversos setores da sociedade, o que reforça a concepção de suficiência. Tal concepção agrega valor aos temas ausentes do Regulamento (2), des-tacados neste estudo como importantes.

Para ilustrar a relevância da regulamentação de procedimentos de Boas Práticas relembra-se, en-tre os problemas de saúde pública noticiados na mídia, aquele que divulgou a comercialização de placebo em vez de anovulatório, ocorrido no Brasil, em 1998. Da mesma maneira que a mídia mundial influenciou na compilação de normas que culmina-ram nas atuais diretrizes de BPF, a divulgação de problemas a elas relacionados, quando referentes a um tema ainda não regulamentado, deveria re-presentar indicador para o processo de regulamen-tação. Também procedimentos e situações obser-vados durante inspeções sanitárias, registrados em relatórios ou constantes de pareceres técnicos, me-recem atenção para novas regulamentações, para revisão das existentes ou para análise e gerencia-mento de risco. As atividades que envolvem esses procedimentos e situações necessitam ser discipli-nadas legalmente – regulamentadas na legislação sanitária; ou tecnicamente – descritas em literatura específica. Desse modo, a não-inclusão de novos

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temas na RDC-134/01 (1), tais como fabricação de placebo e descarte de materiais e produtos, frus-trou a expectativa gerada pela divulgação de falhas verificadas pela Vigilância Sanitária, no sentido de evitar a reincidência e de prevenir a ocorrência de casos semelhantes em outros estabelecimentos produtores. A não-inclusão desses temas no Regu-lamento (2) reforçou essa frustração.

Reconhece-se nas convergências temáticas totais a possibilidade de padronização das diretrizes, re-presentada pela equivalência técnica entre os certi-ficados de BPF emitidos por países diferentes. Essa equivalência, ao mesmo tempo em que desempe-nha um papel facilitador na avaliação da qualidade do produto, se presente atesta competitividade co-mercial e ausente, aponta para ações de orientação ou verificação do cumprimento das diretrizes por parte dos órgãos de vigilância sanitária.

Parece mesmo que o embasamento dessa avalia-ção está contido no inter-relacionamento das obser-vações decorrentes da análise temática:

a) a composição temática não é justificada em ne-nhuma das diretrizes estudadas;

b) a inclusão de novos temas indica o reconhecimen-to de sua importância;

c) a publicação de diretrizes sem novidades temáti-cas sugere que os temas regulamentados são sufi-cientes até aquele momento;

d) a representatividade da amostra estudada (Ta-bela 1) no contexto mundial pressupõe sustentação dos resultados.

Dessa representatividade, infere-se que as conver-gências e as divergências temáticas verificadas de-lineiam o panorama das BPF, traduzem tendências comerciais e direcionam as ações de vigilância sa-nitária para transações nacionais e internacionais. Logo, as não-conformidades constatadas pelos ser-viços de vigilância sanitária, se analisadas e cate-gorizadas, podem se constituir em valiosas informa-ções com vistas a aproximar-se da suficiência das diretrizes regulamentadas.

Pelo exposto, o cenário da suficiência convida à re-flexão quanto à necessidade da revisão do conteúdo

temático e de sua lógica de disposição. Ante a re-conhecida qualidade da legislação sanitária brasileira, acredita-se que a complementação temática reforça o comprometimento mútuo entre os setores regula-do e regulador e facilita a avaliação do cumprimen-to das BPF. Considera-se, ainda, que uma ampla cobertura temática contribui para a diminuição das não-conformidades verificadas em inspeções sanitá-rias, influenciando no impacto por elas causado.

3.2 Abrangência

Entendendo-se a abrangência de um tema como a am-plitude de seu conteúdo, foram analisadas as caracte-rísticas: tendência ¾ traduzida pelo índice de conver-gências e divergências e detalhamento ¾ mensurado em níveis de acordo com a particularização.

Selecionou-se para esta etapa, do grupo em que predominaram convergências: CEE/92 (20), pela re-presentatividade como bloco econômico; do grupo com divergências relevantes: EUA/96 (18), por apre-sentarem indícios de serem, tecnicamente, as mais detalhadas; OMS/03 (27), por representarem orga-nismo das Nações Unidas, transcendendo fronteiras e blocos econômicos. Consideraram-se convergen-tes totais as informações coincidentes nas aborda-gens principal e secundária; convergentes parciais as informações coincidentes somente na abordagem principal e divergentes as não-coincidentes quando comparados temas equivalentes.

Quanto às convergências, somadas as totais e as par-ciais, são altos os índices apresentados em relação à OMS/03 [94,45%] (27) e à CEE/92 [83,34%] (17), com detalhamento predominantemente equivalente: OMS/03 [83,33%] (27) e CEE/92 [72,22%] (17). Com respeito às divergências ¾ OMS/03 [5,55%] (27) e CEE/92 [16,67%] (17) ¾ os resultados da análise qualitativa demonstraram que as mesmas se devem quase que exclusivamente às informações acresci-das, em virtude da predominância de equivalência no detalhamento das informações com referência à OMS/03 [83,33%] (27) e à CEE/92 [72,22%] (17) (Ta-bela 3). Altos índices de convergência tendem à uni-formidade nas inspeções sanitárias, tão importante quão necessária para a consolidação de transações comerciais de medicamentos com qualidade, segu-rança e efetividade equivalentes.

Em relação a EUA/96 (18), as diretrizes nacionais

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(2) apresentam 50% de seu texto mais detalhado e 22,23 % com particularização equivalente (Tabela 3). Portanto, apenas 27,77% das BPF nacionais (2) são menos detalhadas do que as norte-americanas (18). Divergentes em 33,33% (Tabela 3), a análise qualita-tiva demonstrou que a divergência não é devida ao detalhamento, mas à suficiência (composição temá-tica): maior nas nacionais (2) do que nas americanas (18), conforme se verifica na Tabela 2.

Merece destaque o fato de que a análise comparativa utilizada nesse estudo, além de relacionar convergên-cias e divergências, coloca em evidência presença e ausência de informações nas diretrizes selecionadas (Tabela 1). Atenção ao detalhamento das informações caracteriza cuidado com os procedimentos apresenta-dos, influindo no padrão das informações oferecidas, embora sejam respeitadas as diferenças culturais existentes entre países e as relações internacionais que regem a harmonização e a adoção de normas em blocos econômicos e organismos internacionais. Em relação à aplicação das diretrizes, detalhamento

eficiente impede a condução por caminhos diversos, não deixando os procedimentos técnicos vulneráveis ao conhecimento, à criatividade e à lisura de executo-res e gestores das BPF.

A combinação da análise da tendência e do deta-lhamento do Regulamento (2) em relação às dire-trizes comparadas (27,17,18) mostra um nível de abrangência compatível com a implementação e a verificação do cumprimento das diretrizes, objetivos explicitados nas Considerações Gerais da OMS/92 (26) e OMS/03 (27).

No entanto, não é demais observar que as análises qualitativas desvelaram lacunas que merecem ser examinadas para que não resultem em brechas re-gulamentares nem comprometam a integridade das diretrizes nacionais (2). Ilustra-se essa observação com o relato: quando do primeiro trabalho de atuali-zação das diretrizes nacionais (8), cujo resultado foi a RDC-134/01 (1), foi suprimida a exigência de conhe-cimentos específicos para o pessoal principal, como

TABELA 2 - Número e percentagem de temas contemplados pelas diretrizes estudadas.

DIRETRIZES PARA BPFTEMAS CONTEMPLADOS

SIM NãO TOTALNº % Nº % Nº %

OMS/03 17 41,46 24 58,53 41 100,00

Regulamento 18 43,90 23 56,10 41 100,00

RDC-134/01 18 43,90 23 56,10 41 100,00

GUIA/94 17 41,46 24 58,53 41 100,00

0MS/92 18 43,90 23 56,10 41 100,00

CEE/92 19 46,34 22 53,65 41 100,00

MERCOSUL/00 17 41,46 24 58,53 41 100,00

CANADÁ/82 14 34,15 27 65,85 41 100,00

COLOMBIA/96 18 43,90 23 56,10 41 100,00

VENEZUELA/90 16 39,02 25 60,97 41 100,00

COSTA RICA/93 11 26,83 30 73,17 41 100,00

EUA/96 11 26,83 30 73,17 41 100,00

CUBA/96 07 17,07 34 82,92 41 100,00

FRANçA/95 23 56,10 18 43,90 41 100,00

MÉXICO/86 12 29,27 29 70,73 41 100,00

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52 Gestão, Ciência & Saúde

ciências farmacêuticas e tecnologia. Tal supressão foi mantida no Regulamento (2). No entanto, a OMS na edição de 2003 (27) manteve a mesma recomen-dação referente aos conhecimentos profissionais es-pecíficos do pessoal principal, existente em OMS/92 (26) e suprimida nas nacionais (1,2). Em suas consi-derações gerais verifica-se a informação de que as diretrizes recomendadas pela OMS (26,27) podem sofrer adaptações almejando satisfazer necessidades individuais, com a devida validação. A compensação dessas adaptações com a validação restringe essa flexibilidade aos procedimentos. O Brasil substituiu as especificações de conhecimento por qualificações de escolaridade previstas pela legislação vigente e expe-riência prática. Porém, relatórios de inspeção sanitá-ria registram departamentos de empresas fabris sob a responsabilidade de profissionais sem aqueles co-nhecimentos específicos em seus currículos universi-tários, realidade que merece cuidado, bem como ava-liação da tendência e do desempenho, considerando a situação do País no cenário mundial.

Nesse contexto, pode-se afirmar que a preponde-rância de convergências, mostra diretrizes nacionais (2) consoantes com mercados regulados ¾ Europa e América do Norte.

3.3 Compreensão Textual

Tão importante quanto suficiência e abrangência é o juízo correto das diretrizes regulamentadas. Perce-be-se a compreensão como a combinação da inter-pretação objetiva – apreensão do texto, com a inter-

pretação subjetiva – apreensão do contexto, ambas diretamente relacionadas à redação das informações. Regionalismos e significados distintos para um mes-mo termo, embora próximos, podem exacerbar sutile-zas, e aliados ao processamento intelectual-individual e progressivo, destacam a importância da redação e impedem a circunscrição da avaliação da compreen-são textual e o esgotamento de sua exploração neste estudo, o qual tem a intenção de propiciar uma dis-cussão sobre a conformação mais adequada para di-retrizes de Boas Práticas.

Quanto à organização do conteúdo, a primeira ca-racterística analisada ¾ superposição é aqui atri-buída a qualquer informação repetida em dois ou mais itens independentemente da seção na qual se encontram. Normalmente, as informações para Boas Práticas são apresentadas em itens, sendo alguns subdivididos em alíneas. Entende-se que a superposição pode sugerir ausência de análise sistemática do texto ou servir de reforço. Porém, no último caso faz-se necessário esclarecimento para preservar a qualidade do texto e evitar en-tendimento dúbio, errôneo, excessivo ou provocar desconforto ao leitor. Foram também analisadas: supressão ¾ informações não repassadas da RDC-134/01 (1) para o Regulamento (2); acrésci-mo ¾ informações aditadas ao Regulamento (2); substituição de termos, expressões ou informa-ções e mudança na redação com alteração ou não na compreensão do Regulamento (2) em relação à RDC-134/01 (1). Uma ou mais dessas característi-cas são verificadas em aproximadamente 12% do

TABELA 3 - Número e percentagem da tendência e do detalhamento do conteúdo dos temas apresentados no Regu-lamento Técnico das Boas Práticas para a Fabricação de Medicamentos (RDC-210/03) em relação aos conteúdos dos temas correspondentes contemplados nas diretrizes comparadas para avaliação da abrangência

NÍVEIS DOS CONTEÚDOS

RegulamentoX

OMS/03

RegulamentoX

CEE/92

RegulamentoX

EUA/96

TOTALDE

TEMAS

Nº % Nº % Nº % Nº %

TENDÊNCIA

CONVERGÊNCIATOTAL 16 88,90 11 61,11 02 11,11 18 100,00

CONVERGÊNCIA PARCIAL 01 5,55 04 22,23 10 55,55 18 100,00

DIVERGÊNCIA 01 5,55 03 16,67 06 33,33 18 100,00

DETALHAMENTO DO REGULAMENTO

EQUIVALENTE 15 83,33 13 72,22 04 22,23 18 100,00MAIOR 03 16,67 05 27,78 09 50,00 18 100,00MENOR 00 00,00 00 00,00 05 27,77 18 100,00

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Regulamento (2). Dessa percentagem, pouco mais de 20% alteram a compreensão. A análise da continuidade ¾ disposição lógica do conteúdo evidenciou fragmentação dos assuntos com informações complementares em itens distintos e não consecutivos, dificultando a visualização do conjunto das recomendações e obrigando a busca em diversas partes do documento para conhecimen-to de um determinado assunto, pois a ausência de índice remissivo pressupõe informações integrais sob títulos específicos.

A combinação dos resultados qualitativos e quantita-tivos da organização do conteúdo do Regulamento (2) nos remete ao refinamento lógico reconhecido como próprio das Boas Práticas. A disposição dos temas e de seus conteúdos, bem como a apresen-tação e informações para busca, constituem tópicos importantes na conformação textual. A particulariza-ção de cada tema aliada à sua fragmentação pode resultar em morosidade nas consultas ou em infor-mações incompletas. Destaca-se que dificuldades na utilização do Regulamento (2) prejudicam a difu-são de seu conhecimento.

Segunda característica da compreensão textual ana-lisada: precisão da redação. Entende-se que uma re-dação coerente não contradiz ou vai de encontro a disposições, informações ou afirmações técnicas ou legais vigentes. Analisou-se a coerência interna do Regulamento (2) e sua coerência externa em função da hierarquia e da data de publicação da legislação e de documentos consultados relacionados (3,4,6,7,9,11,12,22,23,24,25,26,27). Exemplifica-se com o assunto prazo de validade.

O GUIA/94 (8) recomendava a utilização de matérias-primas somente “dentro dos prazos de validade”. Po-rém, um mês após a adoção do GUIA/94 (8), foram regulamentadas as BPF para Indústrias Farmoquími-cas (9), facultando a determinação do prazo de valida-de para matérias-primas. Ambas as recomendações: farmacêuticas e farmoquímicas ainda vigoram.

Da exatidão da terminologia. Se aceitarmos o ri-gor como pano de fundo para a variação na in-terpretação, parece possível que a definição de termos inexatos minimize ou supere diferenças na interpretação transferindo o foco de discus-sões inconclusas para pontos que tragam maior contribuição às BPF. Sugere-se, para harmoni-

zar discórdias que remontam ao estabelecimen-to inicial das BPF, a elaboração de um glossário desses termos. Note-se que as BPF afirmam: “O conteúdo dos documentos não pode ser ambíguo: o título, a natureza e o seu objetivo devem ser apresentados de forma clara, precisa e corretos.” Ora, se os documentos referentes à fabricação de medicamentos devem contemplar essas parti-cularidades, que dizer das próprias diretrizes que recomendam estas condições?

Exemplifica-se o rigor da terminologia com a infor-mação das responsabilidades geralmente atribuídas e/ou compartilhadas pelos responsáveis pela produ-ção e pelo controle da qualidade. A OMS evidencia sua característica de organismo internacional, facul-tando aos países a possibilidade de adequação. Po-rém, a manutenção do termo geralmente no GUIA/94 (8), na RDC-134/01 (1) e no Regulamento (2), na au-sência de outro motivo não percebido nesse estudo, transparece compreensão vaga.

Quanto à uniformidade, exemplifica-se pela utiliza-ção de 11 termos diferentes passíveis do mesmo significado: procedimento operacional padrão. Com-binada com a ausência de sinonímia no glossário, transmite a idéia de indisciplina, não condizente com Boas Práticas, permitindo supor que a experiência profissional e o conhecimento prévio sobre o tema respondem pelas interpretações corretas.

4. CONSIDERAçÕES FINAIS

Cabe lembrar que a OMS considera as diretrizes para BPF um dos elementos técnicos que, junta-mente com os regulatórios e a base jurídica, forma o sistema da qualidade cujo objetivo é fornecer ao usuário um produto em conformidade com especifi-cações e normas estabelecidas.

Ponderando as BPF como normas críticas em relação ao sistema da qualidade, deduz-se que a composição temática, as lacunas desveladas na análise da ten-dência e do detalhamento e possíveis falhas devidas à alteração na compreensão podem apresentar re-sultados passíveis de desencadear ações desneces-sárias ou incorretas do ponto de vista da vigilância à saúde. Numa retroalimentação, na medida em que as diretrizes de Boas Práticas representam suporte para realização de inspeções sanitárias, a avaliação dos resultados dessas inspeções, associada à verificação

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54 Gestão, Ciência & Saúde

da qualidade dos medicamentos pela rede de labora-tórios de saúde pública, fundamenta a concessão e o cancelamento de autorização para funcionamento de empresas, o registro de produtos e a certificação em Boas Práticas. Além disso, os dados levantados nas inspeções sanitárias complementam a análise do risco relacionado aos medicamentos.

Como breve reflexão, lembra-se que a padronização das Boas Práticas regulamentadas como equivalên-cia técnica dos certificados de BPF para os diversos países que já os instituíram é uma forma de dimi-nuir as barreiras alfandegárias, possibilitando incre-mentar as transações comerciais internacionais e as ações de orientação e de verificação do cumprimen-to das diretrizes, por parte dos órgãos de vigilância sanitária.

Destaca-se que a correlação entre o estabelecimen-to de diretrizes técnicas e sua aplicabilidade cimenta a credibilidade do organismo regulador nos âmbitos nacional e internacional e reflete visão estratégica.

Assim, no contexto das avaliações da suficiência, da abrangência e da compreensão textual, entende-se que as diretrizes nacionais vigentes de Boas Práti-cas para a Fabricação de Medicamentos, como ins-trumento de vigilância sanitária, necessitam revisão e requerem aprimoramento.

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55Revista da Fundação Ezequiel Dias, v. 3, n. 2, jul./dez. 2008

17. ESPANHA. Guía de Normas de Correta Fabri-cación de Medicamentos de la Comunidad Europea, 1992.

18. ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA. Current Good Manufacturing Practices, 1996.

19. FRANçA. Bonnes Pratiques de Fabrication, 1995.

20. ESPANHA. Guía de Normas de Correta Fabri-cación de Medicamentos de la Comunidad Europea, 1992.

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RESUMO

O artigo faz uma síntese dos principais conceitos em relação a educação, educação médica, currí-culo e currículo médico. Faz também uma revisão dos aspectos conceituais e históricos do currículo da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais, desde sua criação em 1910, e das suas profundas modificações ocorridas em 1975 e que ainda estão em funcionamento, da estagnação e do retrocesso dessas modificações. Refere-se à nova transformação curricular que atualmente está em estudo, orientada pelas novas diretrizes curricu-lares do curso médico, propostas pelos Ministérios da Educação e da Saúde do Brasil.

Palavras-chave: Educação; Educação Médica; Cur-rículo Médico

O CURRICULUM E O CURRÍCULO MÉDICO DA UFMG*

THE CURRICULUM AND THE UFMG MEDICAL CURRICULUM

Ari de Pinho Tavares1, Roberto Assis Ferreira2

1 Médico, Especialista em Clínica Médica, Mestre em Fisiologia pelo ICB da UFMG, Doutor em Clínica Médica pela Faculdade de Medicina da UFMG, Professor Adjunto do Departamento de Clí-nica Médica da Faculdade de Medicina da UFMG, [email protected]; 2 Médico, Especialista em Pediatria e em Medicina do Adolescente, Doutor em Pediatria pela Faculdade de Medicina da

UFMG, Professor Adjunto do Departamento de Pediatria da Faculdade de Medicina da UFMG.

ABSTRACT

The article is a summary of the main concepts in relation to education, medical education, curricu-lum and medical curriculum. There is also a review of conceptual and historical aspects of the cur-riculum of the School of Medicine of the Federal University of Minas Gerais, since it was created in 1910, and the profound alterations in 1975, which are still valid, as well as the stagnation and retreat of these modifications. It refers to the new curricu-lar transformation which is currently under study, guided by the new curricular guidelines of the med-ical course, laid down by the Brazilian Ministry of Education and Healthy.

Keywords: Education, Medical Education, Medical Curriculum

*O presente artigo é parte da Tese de Doutorado “O currículo paralelo dos estudantes de medicina da UFMG”, do primeiro autor sob a orientação do segundo, defendida em se-tembro de 2006, no programa de Pós-graduação em Clínica Médica do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da UFMG.

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1. INTRODUçãO

A educação tem sido tradicionalmente descrita – de maneira otimista – como um processo de aperfeiçoa-mento, de desenvolvimento, de libertação e de igual-dade social das pessoas.

De acordo com Briani a educação refere-se ao “pro-cesso de desenvolvimento da capacidade física, intelectual e moral da criança e do ser humano em geral, visando à sua melhor integração individual e social” (4). Para Saltini, “é um processo que permite ao homem chegar a ser sujeito de sua própria ação em harmonia com o si mesmo e não apenas o objeto de outros sujeitos; um meio para que o homem pos-sa se construir como pessoa, em termos de sendo e não de tendo; uma iniciação à crítica, interpretação e transformação do mundo” (23).

Desde década de 1970 visões críticas têm visto a educação sob novos ângulos e abalado fortemente as visões otimistas de até então. Elas apontam o sis-tema educacional como instrumento de reprodução social e como mecanismo de manutenção e perpetu-ação das diferenças sociais e econômicas (6; 24).

Segundo Ferreira (6) os estudos sobre a reprodu-ção receberam posteriormente diversas críticas; en-tretanto, essas não impediram que apontassem os limites da educação na transformação social. Dessa maneira, as perspectivas otimistas ficaram abaladas e a educação passou a ser considerada também como instrumento de reprodução social.

Em relação aos objetivos da educação médica, con-siderada essencialmente e com as características próprias da educação de adultos, são classicamente colocados como de natureza cognitiva (conhecimen-to), psicomotoras (habilidades) e comportamentais (atitudes)

Os objetivos cognitivos seriam aqueles ligados a aquisição, elaboração e organização de informações por meio do acesso ao conhecimento existente. Nes-se processo, o aprendiz refaz, reconstrói e resignifi-ca o próprio conhecimento A grande dificuldade para estudantes e professores fica a cargo da enorme massa de informações disponíveis, que se torna ob-soleta cada vez mais rápido, e das dificuldades de separar o relevante do supérfluo.

Os objetivos psicomotores são relacionados à aquisição de habilidades que permitirão ao futuro médico o bom exercício profissional. Eles incluem desde as habilidades necessárias à relação médi-co paciente até as habilidades relacionadas aos procedimentos técnicos envolvidos nas mais di-versas especialidades e da extensa e cada vez mais complexa aparelhagem de uso em diagnós-tico e tratamento médicos.

Os objetivos comportamentais completam a forma-ção médica e são mais sutis de se analisar e com-preender. Eles estão relacionados às relações entre pessoas que a atividade médica exige, qual seja a relação entre o médico e seus pacientes e as rela-ções entre o médico, seus colegas e os diversos ou-tros profissionais que comporão as equipes de saú-de nas quais o médico irá trabalhar.

Os comportamentos e valores que devem ser agre-gados ao futuro profissional médico, principalmente os de ordem moral e ética freqüentemente são ad-quiridos nas vivências do dia a dia do seu aprendi-zado e na observação dos comportamentos de seus mestres e preceptores, possivelmente menos do que nos cursos de ética e outros relacionados, inseridos no currículo formal (10).

O citado autor lembra o ambiente de intensa pres-são emocional a que é submetido o estudante de medicina ao longo de seu curso, com o enorme vo-lume de novos conhecimentos que tem de adquirir, as exigências que progressivamente a comunidade e a família passam a fazer de sua atuação e no plano pessoal o desafio do enfrentamento do uso de álcool ou drogas. Também o próprio currículo médico acrescenta fortes componentes de tensão e ansiedade com os primeiros estudos da anatomia humana em cadáveres, os primeiros contatos com os pacientes e suas carregadas cores emocionais, passando pelo sistema de avaliação adotado pela faculdade, sem falar na extensa e estafante ativi-dade extracurricular que os estudantes freqüente-mente exercem. Outros elementos de tensão estão ligados à perda progressiva da visão romântica e glamurizada da medicina e do conhecimento das muitas limitações pessoais e profissionais que ele vê em seus professores, nele mesmo e na própria ciência médica, à medida que caminha no curso.

Propõe Gonçalves que:

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[...] por último e acima de tudo, deve o pro-fessor ter incorporada à sua personalidade a sensibilidade para compreender que con-dições psicológicas e emocionais negativas perturbam o processo de aprendizagem, o que obriga o professor a assumir, como um dos objetivos educacionais a serem busca-dos, o equilíbrio psicoemocional do estudan-te. Sem que esta condição seja atendida, ha-verá dificuldade de grau variável, mas sempre considerável, de adquirir conhecimentos, de-senvolver habilidades e incorporar comporta-mentos, sabidamente os três objetivos tradi-cionais da educação médica (10).

2. O CURRICULUM E O CURRÍCULO MÉDICO

A palavra “currículo” (curriculum) é de origem lati-na e significa percurso, carreira, ato de percorrer. Alguns autores citam a sua utilização por Platão e Aristóteles para descrever os temas ensinados no período clássico da civilização grega. Outros procu-ram a origem da palavra em alguma universidade européia da Idade Média ou no sistema educacio-nal medieval dos jesuítas (12; 2).

Na literatura da educação, em geral, e no entendi-mento diário e comum da maioria dos professores e alunos, o termo “currículo” se refere ao conjunto de disciplinas ou conteúdos de um curso geralmente representado por uma grade de disciplinas onde se explicitam os conteúdos, as ementas, os créditos, se obrigatória ou optativa, as respectivas cargas horá-rias, sua distribuição pelos períodos acadêmicos.

O estudo mais formal do currículo realizado por Bobbit ocorreu nos Estados Unidos a partir da segunda dé-cada de século passado com o processo da massifi-cação da educação, industrialização e urbanização. Segundo o autor os modelos de currículo escolar tomavam como modelo institucional a fábrica, e sua inspiração teórica, a administração cientifica do taylo-rismo, e onde o processo educacional era o de input e output fabris com objetivos, métodos e procedimentos especificados e resultados mensuráveis (3).

Em fins da década de 1940 consolida-se o modelo proposto por Bobbitt com a publicação da obra de Ty-ler, Princípios básicos do currículo e que vão dominar esse campo até os fins da década de 1980. Para Ty-

ler, quatro questões básicas deveriam ser respondi-das pelo currículo: Que objetivos educacionais deve a escola atingir? Que experiências educacionais podem ser oferecidas que tenham possibilidades de alcançar esses propósitos? Como organizar eficientemente es-sas experiências educacionais? Como podemos ter a certeza de que esses objetivos estão sendo alcança-dos? (currículo – ensino e instrução – avaliação) (3).

O currículo – incluindo o currículo médico – pode ser entendido de várias maneiras, desde como o mero texto escrito ou uma grade de disciplinas e de cargas horárias até o “tudo” que ocorre na es-cola ou na universidade. A visão mais focada em um desses dois pólos de interpretação pode levar a simplificações ou à tentativa de se controlar um infinito número de variáveis que, nos dois extremos, leva à chance de fracasso na tentativa do entendi-mento das dimensões e utilidades do currículo e da possibilidade de seu contínuo aperfeiçoamento (12).

O tema fica ainda mais controverso quando, em 1968, Philip Jackson publica de uma obra de grande impacto, intitulada Life in classroom. Nessa surge a expressão “currículo oculto” e, com ela, a considera-ção dos profissionais de educação de que certos fa-tores não prescritos no currículo se combinam para dar um sabor específico à vida da sala de aula [...], que incidem na eficácia do prescrito.

[...] nessa perspectiva, a área de currículo dei-xa de ser vista apenas como meramente téc-nica e voltada para as questões de procedi-mentos, técnicas e métodos e passa a incluir uma concepção crítica, guiada por questões sociológicas, políticas e epistemológicas. As questões do como (metodológicas) passam a ser importantes apenas na medida em que estejam relacionadas ao porquê das formas de organização do conhecimento escolar. O currículo, portanto, é considerado um artefa-to social e cultural. Isto é, o currículo se lo-caliza no âmbito das determinações sociais, históricas e de seu contexto. Não é um ele-mento transcendente e atemporal, mas tem uma história, vinculada a formas específicas de organização da sociedade e da educação. O currículo está implicado em relações de poder; transmite visões sociais particulares e interessadas; produz identidades individuais e sociais específicas. O currículo é uma área

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contestada, é uma arena política (12).Aplle outro reconhecido estudioso da área, ratifica que:

[...] o currículo nunca é apenas um conjunto neutro de conhecimentos, que simplesmente está sendo utilizado nos textos e nas salas de aula de uma nação. Ele sempre faz parte de uma seleção de alguém, da visão de al-gum grupo acerca do que seja conhecimento legítimo. É produto das tensões, conflitos e concessões culturais, políticas e econômicas que organizam um povo (1).

No caso da medicina e da questão da reprodução do currículo e da prática médica, assim se expres-sam Siqueira e Salgado, citados por Ferreira (6).

“O currículo funciona historicamente como ins-trumento político para conservar e servir aos interesses econômicos externos a ele, e que o controlam. Em contrapartida o currículo pode ser instrumento político de mudança social na medida em que se faz consciente e politica-mente viável, nesta direção. Neste caso far-se-á não só viável, mas viável para atender às ne-cessidades sociais, escapando ao controle dos interesses econômicos externos. Este escape será obviamente fugaz no tempo e microscópi-co no espaço, ou seja, inviável em termos signi-ficativos, exceto se ocorreram reestruturações econômico-sociais gerais, na mesma direção”.

A visão de currículo e de projeto pedagógico do Fó-rum de Pró-Reitores de Graduação das Universida-des Brasileiras (ForGRAD) foi explicitada no docu-mento “Política Nacional de Graduação”:

A organização curricular, que prevê as ações pedagógicas regulares do curso, elemen-to fundamental de um Projeto Pedagógico, é hoje orientada por Diretrizes Curriculares Nacionais que superam os estreitos contor-nos de currículos mínimos obrigatórios, pos-sibilitando uma organização curricular com relativa liberdade e flexibilidade. Neste novo contexto, a organização curricular preverá permeabilidade em relação às transforma-ções que ocorrem no mundo científico e nos processos sociais, a interdisciplinaridade, a formação sintonizada com a realidade social, a perspectiva de uma educação continuada

ao longo da vida, a articulação teoria-prática presente na indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão (7).

Já a visão de currículo da extensão universitária pode ser encontrada no Plano Nacional de Exten-são que assim se expressa:

Quanto ao ensino, discute-se e aprofunda-se um novo conceito de sala de aula, que não se limite ao espaço físico da dimensão tradicio-nal, mas compreenda todos os espaços, den-tro e fora da universidade, em que se realiza o processo histórico-social com suas múltiplas determinações, passando a expressar um conteúdo multi, inter e transdisciplinar, como exigência decorrente da própria prática (8).

O “currículo nulo” é aquilo que é parte do currículo, mas não tem aplicabilidade nem utilidade aparente, chegando-se a considerar como materiais e conte-údos supérfluos (16).

Os autores classificam o “currículo nulo” em uma série de categorias, entre as quais destacamos as seguintes, a nosso ver mais relevantes para o currículo médico:

Currículo nulo por ramificação: são elementos • programáticos ampliados em demasia e com pou-ca utilidade e aplicabilidade durante o exercício profissional.

Currículo nulo por preferência do professor: refe-• re-se a aspectos de um tema específico que são detalhados ao máximo por escolha ou preferência pessoal de professores, alunos ou instituição edu-cativa, cuja aplicabilidade prática não tem corres-pondência no tempo dedicado ao mesmo.

Currículo nulo por falta de preparo do professor: • situações em que o professor está pouco pre-parado ou tem pouca experiência no assunto.

Currículo nulo por defasagem do conhecimento: • produz-se quando são abordados conhecimentos necessários e relevantes ou de grande aplicabili-dade mas com conteúdo defasado ou obsoleto.

Currículo nulo por falhas metodológicas: são si-• tuações em que o processo de ensino/aprendiza-gem pode ser prejudicado por desconhecimento

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dos professores, geralmente excelentes profissio-nais, das bases metodológicas da educação.

Currículo nulo por falta de experiência profis-• sional: atualmente a contratação de professo-res universitários se dá fortemente baseada na titulação acadêmica e no currículo dos candida-tos e com pouca consideração pela experiência profissional prévia na carreira de origem do can-didato. Em medicina isso pode acarretar profes-sores excelentemente preparados do ponto de vista da pesquisa, mas pouco preparados nos aspectos ligados à atividade profissional e que serão muito relevantes na preparação dos alu-nos futuros médicos.

Currículo nulo por novidade: a inclusão de te-• mas e mesmo de disciplinas nos currículos sim-plesmente porque são novidades pode levar a confusão e mesmo a total perda de tempo se sua inclusão não é precedida de análise crite-riosa de sua aplicabilidade e relevância.

Currículo nulo por tradição: são situações em que • temas e mesmo disciplinas são mantidos simples-mente porque sempre estiveram lá, ou pela impor-tância e poder do professor, independentemente de sua importância para o futuro profissional.

Currículo nulo por falta de coordenação: refere-• se aos casos de repetição desnecessária de te-mas, em várias disciplinas, por falta de sintonia entre professores e coordenadores.

Os autores se referem a muitas outras formas de “currículo nulo”, de maior ou menor importância para o currículo médico, e todos nós podemos facil-mente nos lembrar de numerosos outros aspectos do processo de ensino/aprendizagem médico que acarretam perdas de tempo e recursos.

O “currículo paralelo” é definido por Rego (20) como “o conjunto de atividades extracurriculares que os alunos (de medicina) desenvolvem, subvertendo, na maioria das vezes a estrutura curricular formal estabelecida pela faculdade”.

O aprendizado do “currículo paralelo”, freqüente-mente não colocado de forma rotineira nos currícu-los formais dos cursos médicos, é, inegavelmente, ferramenta de grande valor para o estudante e fu-

turamente para o egresso, no seu trabalho como profissional. É um importante complemento aos currículos formais e tem o potencial de transformá-lo – naquilo que é um “caminho” ou “percurso” na sua uni ou bidimensionalidade – numa trajetória tri-dimensional, visualizada mais como um campo de possibilidades.

[...] a noção de flexibilidade curricular está, de forma mais profunda, ligada à idéia de um processo ativo e dinâmico de ensino-apren-dizagem. Isso implica uma mudança para-digmática em relação ao currículo que deixa de ser um curso linear de atividades para ser compreendido segundo a idéia de um cam-po de possibilidades, um percurso que não é totalmente pré-definido e que se constrói segundo o acompanhamento continuo e a oferta de vivências significativas: “um espaço vivencial” – do qual tanto professores quanto alunos são arquitetos e onde reciprocamente co-ordenam as suas experiências. Estas prá-ticas devem ser, portanto, vivências abertas e consideradas sob os seguintes critérios: (a) pelo seu potencial de provocar sínteses coerentes de experiências que os estudantes realizam em todos os domínios de sua vida – relacionando, por exemplo as suas ativi-dades escolares e extra-escolares; (b) pelo seu potencial de abrir “janelas” para outros domínios e (c) pelo seu potencial de desper-tar a curiosidade em relação a pontos que extrapolam o âmbito da própria vivência, mas podem ser destacados e aprofundados pelo aluno por conta própria. Isso significa deslo-car o conhecimento já feito para o conheci-mento em vias de formação (11).

O relatório Flexner publicado em 1910 teve profun-da influência na elaboração dos currículos das es-colas médicas norte-americanas e, a partir daí, no resto do mundo;

[...] em 1910 a Associação Médica America-na (AMA) encomendou a Fundação Carne-gie um estudo sobre as 160 escolas médicas que funcionavam então nos Estados Unidos com as mais diversas filosofias de ensino, financiamentos, estrutura de laboratórios e hospitais, padrão de professores etc. O con-vite se baseou num estudo prévio realizado

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pelo Conselho de Educação Médica da As-sociação Americana de Escolas de Medicina (AAMC) que em 1906 inspecionou as 160 escolas médicas e tendo chegado a conclu-são da aprovação de 82, 46 com problemas solucionáveis e 32 inaceitáveis.

Após a discussão desses resultados com a Associação Médica Americana (AMA), essa por razões de ordem ética optou por não publicar os resultados e convidar um grupo externo para conduzir uma investigação se-melhante o que efetivamente se configurou com o convite à Fundação Carnegie que por sua vez convidou a Abraham Flexner para re-alizar o estudo (21; 9).

De uma maneira geral as propostas decorrentes do relatório Flexner consignaram um modelo de ensino médico cujas principais características foram:

a) sólida formação em ciências básicas nos primei-ros anos do curso (anatomia, fisiologia, bioquímica, farmacologia, histoembriologia, bacteriologia e pa-tologia);

b) pouca ênfase nos aspectos de prevenção e pro-moção da saúde e concentração nos aspectos de atenção médica individual;

c) valorização da aprendizagem dentro do ambiente hospitalar, recomendando-se que as escolas tives-sem seu próprio hospital de ensino e considerando impróprio o uso de outros serviços;

d) recomendação para que o hospital de ensino con-tasse com um corpo clínico próprio e permanente;

e) limitação da assistência ambulatorial apenas aos casos que precisavam de internação;

f) organização minuciosa da assistência médica em cada especialidade;

g) ensino da assistência obstétrica dentro do hospi-tal e não fora dele;

h) recomendação para que o hospital de ensino contasse com número grande de leitos para cada aluno: quatrocentos leitos para cinqüenta estudan-tes (21; 9).

Nas últimas décadas, projetos, encontros e con-ferências internacionais como as Conferências de Vina Del Mar (Chile 1955), e de Tehualcan (Méxi-co, 1956) introduziram as experiências da medicina preventiva e social nos currículos médicos com a coordenação e participação da OPAS. Em 1978 é realizada a Conferência de Alma Ata na Rússia que propõe a meta da “Saúde para todos no ano 2000”, adotando a estratégia da atenção primaria em saú-de. (6; 14, 15, 13).

Também congressos mundiais de educação médica (I e II Conferências Mundiais de Educação Médi-ca de Edimburgo) propõem recomendações para ação e apelo à cooperação internacional em res-posta às varias situações que estão à espera de mudanças, todas no sentido da missão social e da implementação de currículos que visem a termina-lidade da formação de um médico geral, bem como a implantação de um novo modelo de assistir e de cuidar da saúde das pessoas em sua integralidade (6; 14, 15, 13).

No Brasil a ABEM (Associação Brasileira de Edu-cação Médica), a FEPAFEM (Federação Pan-Ame-ricana de Faculdades e Escolas Médicas), o CFM (Conselho Federal de Medicina) a CINAEM (Co-missão Interinstitucional Nacional de Avaliação das Escolas Médicas) e outras entidades de classe e de educação médica propõem diversos projetos e resoluções no sentido de modificações no ensino médico visando uma medicina mais integral e um melhor atendimento de saúde da população. Mais recentemente aparecem, na década de 1980 e 1990, os projetos IDA e UNI, financiados pela Fundação Kellogg, baseados nas estratégias da integração docente-assistencial e na aproximação dos cursos médicos com as realidades de saúde das comuni-dades e das escolas médicas (6; 14, 15, 13).

Nessa mesma linha destacam-se o movimento de reforma sanitária e a promulgação da constituição de 1988 com a consagração da saúde como direito de todos e dever do Estado, a criação do SUS (Sis-tema Único de Saúde) e a criação da estratégia do PSF (Programa de Saúde da Família), para implan-tar e gerenciar as atividades da atenção primaria de saúde à população, a aproximação dos ministérios da Saúde e da Educação e a construção da real possibilidade de parceria das escolas médicas e os serviços assistenciais públicos.

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Nos primeiros anos do século XXI são promulgadas as Diretrizes Curriculares dos cursos da área da saúde e do curso médico que oferecem a oportuni-dade da criação de um novo paradigma na formação do médico, com ênfase numa formação ética, gene-ralista, crítica, humanista e reflexiva, capaz de res-ponder às necessidades de promoção, prevenção, recuperação e reabilitação da saúde da população, com capacidade resolutiva e de auto-atualização, de trabalhar em equipe multiprofissional, com pou-ca dependência em equipamento e hospital e com uma visão integral dos problemas de saúde do ser humano (6; 14, 15, 13).

Todo esse conjunto de iniciativas vem criando as condições de se modificar o modelo “flexneriano” de formação médica ainda predominante, biologi-cista, individualista, baseado na especialização, na utilização intensiva de tecnologias e no hospital, considerado superado, insuficiente e responsável por boa parte dos problemas da atenção à saúde das populações e substituí-lo por um novo mode-lo mais integral, humano e menos equipamento e hospital-dependente (6; 14; 15, 13).

3. O CURRÍCULO MÉDICO DA UFMG

O currículo da Faculdade de Medicina da UFMG, que começou a funcionar em 1911, foi inspirado no da Escola de Medicina do Rio de Janeiro. A partir de então veio sofrendo mudanças representadas, praticamente, por sucessivos acréscimos de novas disciplinas básicas e de especialidades médicas. Na década de 1950 introduziu-se a importante área da Medicina Preventiva, que cresceu de maneira contínua até o currículo atual.

Em 1964 a Faculdade funcionou por 10 anos com um currículo experimental de cinco anos de dura-ção, que não se manteve.

Em 1967 extinguiram-se as cátedras e instituíram-se os departamentos, e em 1969 foi implantado o regime de tempo integral e dedicação exclusiva para professores.

Em 1968 foi criado o Instituto de Ciências Biológi-cas (ICB), com o desligamento das cadeiras bási-cas do ciclo profissional.

Em 1975, após quatro anos de discussões, come-

çou a funcionar um novo currículo que previa, entre outras mudanças, fusão de disciplinas, adaptação do ambulatório para atendimento em dois turnos, adequação de laboratórios e serviço de radiologia, ampliação do quadro docente e instalação do aten-dimento extramural. Em 1978 iniciaram-se as ativi-dades do Internato do 11º e 12º períodos, incluindo a experiência pioneira do Internato Rural.

As disciplinas do Ciclo Básico, 1º ao 4º períodos, foram mantidas como já estruturadas no Instituto de Ciência Biológicas (ICB). Esse currículo, com algu-mas modificações, a partir de 1994, se mantém até o momento atual (5).

Atualmente, a Faculdade de Medicina recebe 320 alunos por ano, divididos em duas entradas de 160 cada por semestre.

O curso é oferecido em 12 períodos, os quatro pri-meiros, cursados no curso básico no Instituto de Ciências Biológicas (ICB), e os oito restantes, no curso profissional, já na Faculdade de Medicina.

4. O CURRÍCULO MÉDICO DA UFMG DE 1975

Em junho de 1974, foi realizado um seminário de ensino médico da Faculdade de Medicina da UFMG, com o objetivo de sistematizar as propostas da mudança curricular que seria implantada a par-tir de 1975, que incluiu a participação de alunos, professores do ciclo básico e profissional, técnicos da OPS/OMS e representantes dos órgãos de pla-nejamento da Universidade e do Governo de Minas Gerais. O seminário fez uma série de recomenda-ções e estratégias para a reformulação do currícu-lo, suas adaptações necessárias durante a fase de convivência com o currículo antigo e sua completa implantação, a partir de 1975.

Entre as recomendações, as seguintes foram con-sideradas como os marcos conceituais mais impor-tantes, e, pela sua significância e atualidade, repro-duzimos na íntegra:

A Educação Médica deve ter como base um sistema em que a estrutura de atenção é vol-tada para os problemas de saúde prevalen-tes na comunidade em que vai atuar o futuro médico. A escola de medicina é apenas um subsistema, a quem cabe assumir a parte

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que lhe toca na responsabilidade pela aten-ção à saúde da comunidade. O sistema prin-cipal é constituído pela Universidade, através da integração do currículo médico a outras unidades da área da saúde e de ciências hu-manas, e pelos serviços de saúde existentes na comunidade.

A política e o planejamento da formação de médicos devem ter como referência a inte-gração do processo de aprendizagem com o Sistema de Atenção Médica, tomando a nosologia, as necessidades saúde da popu-lação e a própria estrutura dos serviços de saúde como objeto de estudo. A política de Educação Médica deve, ainda, explicitar as relações da Universidade com a Sociedade, bem como os níveis de participação e respon-sabilidade de cada um na busca de soluções para os problemas de saúde da comunidade em que está inserida.

Tendo em vista a realidade de saúde da área servida pela Faculdade de Medicina da UFMG, o objetivo prioritário de seu curso de graduação deverá ser a formação de um mé-dico generalista, policlínico, capaz de prestar a assistência primária de saúde e de exercer a medicina comunitária. Este médico deverá aplicar, na realização de seu trabalho, conhe-cimentos básicos das ciências do comporta-mento e da realidade sócio-econômica que o envolve, bem como exercer atitudes críticas permanentes em relação à dinâmica nosoló-gica e aos sistemas existentes de prestação de serviços de saúde.

A formação deste profissional deverá ser fruto de sua própria atuação, formalmente super-visionada pele Faculdade, na prestação de serviços de saúde, especialmente no campo da Medicina Comunitária.

Colocada assim a questão, o médico prepa-rado para dar respostas eficientes à deman-da da comunidade a que assiste deve ter presente que o instrumental técnico de que dispõe muitas vezes não soluciona inteira-mente os problemas, e que dada a comple-xidade de sua gênese, essa solução exige o concurso de outros profissionais. Portanto

o médico deve ser formado na consciência da relatividade de seu papel na solução de problemas de saúde e da necessidade de desenvolver atitudes favoráveis ao trabalho integrado com outros profissionais. O gene-ralista assim formado deveria dispor ainda de bases coerentes para uma especialização não deformante (25).

Salgado (22) pondera que seriam cinco os pontos centrais do currículo de 1975:

em primeiro lugar, o ensino médico não • pode ser improvisado, amadorístico ou imitativo; em decorrência, foram reali-zados estudos diagnósticos prévios de 1971 a 1975 e que continuaram poste-riormente;

em segundo lugar, o ensino tem como • princípio não perguntar ao professor e ao aluno o que a escola deve ensinar; alu-nos e professores devem procurar esta resposta na realidade e nas necessida-des sociais, às quais a escola deve res-ponder;

como terceiro ponto, o atendimento das • necessidades sociais deve ser avaliado de forma contínua, assim em vez de sur-gir um currículo como produto acabado, resulta um processo de desenvolvimen-to curricular; como conseqüência, o pro-cesso para avançar exige seminários de ensino, comissão de avaliação interdisci-plinar como o NAP (Núcleo de Assesso-ramento Pedagógico);

como quarto elemento, as habilidades, os • conhecimentos e as atitudes adquiridas, principalmente, através do atendimento ambulatorial precoce de adultos e crian-ças, permitem graduar o médico geral, não apenas capaz de atender à maioria das necessidades de saúde, mas tam-bém capaz de se adaptar ao mercado de trabalho atual e futuro; a integração com o sistema de assistencial e a inserção precoce do aluno na atividade assisten-cial é essencial;

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por fim, como quinto ponto, o novo ensi-• no é adequado não apenas à realidade de saúde, mas à realidade econômica do Bra-sil; exige pouco investimento de capital, exceto em infra-estrutura, e se concentra na utilização de recursos humanos.

O currículo implantado em 1975 foi e ainda é sujeito à intensa controvérsia na Faculdade de Medicina da UFMG, e vários autores tiveram a oportunidade de fazer sua avaliação crítica sobre o tema. Pela importância da proposta de mudança curricular de 1975 e como síntese da mesma, destacamos as considerações abaixo, da extensa revisão sobre o tema de Ferreira (6):

[...] a mudança do curso médico da UFMG, implantada a partir de 1975, diferiu bastan-te das reformas anteriores do currículo desta faculdade. A proposta foi construída com a participação de alunos e professores, foram ouvidos egressos e houve a colaboração de profissionais de outras áreas do conhecimen-to, fora do setor saúde. Deu-se assim, caráter amplo e inovador ao projeto. Os fundamentos apoiaram-se em princípios e objetivos que ul-trapassaram os limites habituais do ensino médico. Houve investimento na análise das condições e dos problemas internos da Fa-culdade, procurando-se, no entanto, dar res-postas aos desafios colocados para o ensino e a prática da medicina na segunda metade do século XX.

O currículo de 75, mesmo assumindo a for-ma de modelo pedagógico, estabelece como alvo a prática médica, representada por seu paradigma científico e pelo modelo assisten-cial na qual estava inserida.

O debate, que desde então se estabeleceu, procurou destacar, quase sempre, se a prática e o ensino médico estavam fundamentados nos aspectos biológicos ou nos sociais. Portanto, se o currículo era biocêntrico ou sociocêntrico.Quanto ao conteúdo pedagógico, por exem-plo, estava em causa: se o ensino deveria estar centrado no aluno ou no professor, na prática hospitalar ou na prática assistencial comunitária. O ensino da UFMG até então estimulara a prática tecnológica especializa-

da à qual se contrapunham a medicina ge-ral e a atenção primária, consagradas pouco tempo após na conferência sobre cuidados primários em Alma-Ata, em 1978.

A necessidade de superar o modelo Flexner de educação médica tornou-se a posição ma-joritária, na medida que amadurecia o projeto de mudança. O modelo Flexner estabelecia condições idealizadas para o ensino como laboratórios de pesquisa e hospital univer-sitário modelo, dando prioridade à formação científica sobre a prática social, modelo inviá-vel para a UFMG naquele momento.

O objetivo que se constituiu na UFMG não foi encontrar novo modelo pedagógico para a educação médica, mas sim comprometer a formação médica com as necessidades de saúde da população. O modelo pedagógico, em decorrência, seria flexível e subordinado aos objetivos do projeto.

O médico formado dentro deste modelo devia compreender e ajudar a transformar as con-dições de saúde existentes. Propunha-se um currículo engajado e comprometido com a re-alidade médico-social. A educação biocêntri-ca devia ser superada tornando-se sociocên-trica. Ou seja, o ensino que até então dava prioridade aos conteúdos biológicos, seria substituído, integrando o curso com a práti-ca assistencial. O aprendizado tornar-se-ia simultâneo ao equacionamento e respostas aos problemas concretos de saúde.

Como viabilizar o projeto? O estudante se vincularia à realidade de saúde, inserindo o ensino no sistema assistencial. Professor e aluno seriam deslocados da prática modelar – própria do Flexner – e integrariam o sistema assistencial não como atividade esporádica, de uma ou outra disciplina como ocorria, em geral, com a integração docente-assistencial. O ensino médico e o sistema assistencial deviam ter conexão orgânica, como aspecto central da atividade curricular. Assim, todo o currículo seria construído em integração com a prática assistencial (6).

Em resumo, o currículo médico de 1975 apresenta-

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va propostas radicais e pioneiras de modificações, como aprendizado eminentemente prático, o aten-dimento ambulatorial em unidades básicas de saú-de municipais, internatos em hospitais públicos e privados e o internato rural. Nas suas bases teóri-cas estavam incluídas as pretensões de questionar não apenas o paradigma médico dominante (Flex-ner), mas também o modelo pedagógico prevalente em educação médica. Tinha a intenção de formar médicos com características de “terminalidade” e “generalistas” e, portanto, mais de acordo com as necessidades de saúde da população e as possibi-lidades de financiamento governamentais (25, 6).

Se quisermos um resumo ainda mais sintético, poderíamos usar a frase de efeito que era lema daquela época: “o ensino é subproduto da boa as-sistência” (19).

Atualmente, o processo de mudança curricular de 1975 é considerado estagnado e mesmo em re-trocesso, assim, considera-se que a proposta de ensino médico na UFMG, tal como originalmente concebida, começou a se descaracterizar, em tor-no de 1986, deixando de evoluir e mesmo entran-do em regressão.

[...] de fato, algumas evidências confirmam essas opiniões: o sistema de cuidados pro-gressivos avança parcialmente no Hospital das Clínicas; o processo de integração com o sistema de saúde se faz lentamente; não ocorre a reorganização departamental su-bordinada à nova concepção de ensino e assistência; não se incorporam novos mode-los pedagógicos que podiam fazer avançar a integração vertical – ciclo básico, ciclo pro-fissional – como o uso de algumas técnicas de ensino baseado em problemas; a prepa-ração dos professores, inclusive dos novos contratados, é insuficiente, e estes trazem concepções pessoais ao ensino; o currículo continuo, considerado peça chave da subor-dinação do ensino à assistência, foi interrom-pido em 1986 (6).

5. PROPOSTAS PARA UM NOVO CURRÍCU-LO MÉDICO DA UFMG

Mais recentemente a Faculdade de Medicina da UFMG foi selecionada, em 2002, para o programa

PROMED, que é uma proposta de apoio às esco-las médicas que queiram, voluntariamente, adequar seus processos de ensino, sua produção de conhe-cimento e de serviços às necessidades do sistema de saúde do país. O objetivo é estimular as escolas médicas na busca de excelência técnica e relevân-cia social (17).

O PROMED é uma ação interministerial coordena-da (MS/MEC), que reafirma as orientações contidas nas Diretrizes Curriculares dos Cursos Médicos, no sentido de que esses devem formar profissio-nais com competência para terem postura ética, vi-são humanística, senso de responsabilidade social e compromisso com a cidadania; orientação para a proteção, promoção da saúde e prevenção das doenças; orientação para atuar em nível primário e secundário de atenção e resolver com qualidade os problemas prevalentes de saúde (17).

Na Faculdade de Medicina da UFMG foi criado um projeto específico para implantar e gerenciar os re-cursos e idéias do PROMED, com o nome de Proje-to Recriar, que se encontra em processo de discus-são pela comunidade da Faculdade (19).

No último seminário do Projeto Recriar definiram-se como pontos de atenção na condução das mudan-ças, para o futuro, e ainda integralmente válidos a necessidade de avaliação, acompanhamento e atua-lizações coerentes com os princípios fundamentais, “inegociáveis” da mudança curricular de 1975:

a pessoa (paciente-coletividade) como su-• jeito da assistência médica;

o cenário de prática como realidade e não • como cena ou simulação;

a integralidade da assistência médica (18).•

Recentemente, em novembro de 2005, foi criado pelos Ministérios da Saúde e da Educação o Pró-Saúde (18). “Este programa envolve 89 projetos de graduação em Enfermagem, Medicina e Odontolo-gia, bem como as Secretarias Municipais de Saúde dos municípios relacionados a esses Projetos. O Pró-Saúde tem a perspectiva de que os processos de reorientação da formação ocorram simultane-amente em distintos eixos, em direção à situação desejada apontada pelas Instituições de Ensino

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Superior (IES), que antevê uma escola integrada ao serviço público de saúde e que dê respostas às necessidades concretas da população brasileira na formação de recursos humanos, na produção do conhecimento e na prestação de serviços, em to-dos esses casos direcionados a construir o fortale-cimento do SUS. Essa iniciativa visa à aproximação entre a formação de graduação no País e as ne-cessidades da atenção básica, que se traduzem no Brasil pela estratégia de Saúde da Família.

O distanciamento entre os mundos acadêmicos e o da prestação real dos serviços de saúde vem sendo apontado em todo mundo como um dos responsáveis pela crise do setor da Saúde. No momento em que a comunidade global toma consciência da importância dos trabalhadores de saúde e se prepara para uma década em que os recursos humanos serão valori-zados, a formação de profissionais mais capazes de desenvolverem uma assistência humanizada e de alta qualidade e resolutividade será impactante até mesmo para os custos do SUS, na medida em que a experiência internacional aponta que profissionais gerais são capazes de resolver custos relacionados a 4/5 dos casos sem recorrer à propedêutica com-plementar, cada dia mais custosa.

O Brasil tem uma notável experiência em aproxi-mação entre a academia e os serviços, mas essa ainda está muito aquém do que seria necessário. Projetos experimentais, vinculados a pequena parte das escolas de medicina, odontologia e enferma-gem, deveriam se expandir e tornar-se o centro do processo de ensino e aprendizagem “(18).

De uma maneira tradicional, a profissão médica e a formação de novos médicos e médicas foram, du-rante muitos séculos, fundamentadas na idéia do modelo do “médico-sacerdote”, muito baseadas na relação de acolhimento, de ajuda, de compaixão, na valorização do método clínico, da observação e da reflexão, na formação de uma boa relação médico-paciente e que para muitos ainda formam a base na qual se apóia a boa prática e a boa educação médi-ca, e pouco em ciência, laboratório e tecnologia.

A partir das primeiras décadas do século passado, no processo de trabalho e de formação de novos profissionais, surgiu o chamado modelo “flexne-riano”, ou “modelo biomédico”, nascido nos EUA, fortemente baseado e dependente da metodologia

científica, da especialização, de exames de labo-ratório, do hospital e de novos aparelhos cada vez mais sofisticados e caros. Esse modelo obteve esmagador sucesso, predominou e se tornou he-gemônico também nas escolas médicas do mun-do ocidental: poderia ser chamado do modelo do “médico-cientista”.

Para muitos observadores e críticos da cena da pro-fissão e da pedagogia médicas, o modelo do “médi-co-cientista”, apesar de suas inegáveis qualidades e sucesso, vem se tornando um modelo desgastado e em exaustão, não só porque médicos e pacientes começam a perceber, cada vez com maior clareza, que na própria concepção do modelo reside boa parte dos problemas que têm tornado crescentes os conflitos da relação médico paciente, gerando franca e generalizada insatisfação com o mesmo, mas também pelos insuportáveis custos que o uso do modelo acarreta.

Uma boa aposta para o futuro é que ocorrerá uma síntese entre o modelo do “médico-sacerdote” e o do “médico-cientista”, aproveitando o que há de melhor em cada um deles, harmonizando os diver-sos pontos de vista da profissão e da pedagogia médicas, criando uma medicina mais equilibrada, menos conflituosa, com uma face mais humana e que resgate a verdadeira importância do médico e o real valor da medicina.

Não deixa de ser auspicioso que, atualmente, es-ses princípios estejam colocados nas diretrizes cur-riculares dos cursos da área da saúde em geral, e da profissão médica em particular, propostas pelo Ministério da Educação do Brasil, e façam parte também do ideário e da prática do Sistema Único de Saúde, criado pela Constituição de 1988, e do Programa de Saúde da Família.

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68 Gestão, Ciência & Saúde

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RESUMO

O trauma não é apenas um desafio biológico, mas também econômi-co. Inserido nesse contexto, o trauma cardiovascular é cada vez mais discutido, particularmente em seus aspectos epidemiológicos, fisiopa-tológicos e terapêuticos. No entanto, a visão e a tomada de decisões terapêuticas centradas na racionalidade econômica não têm sido abordadas, principalmente pela classe médica, na mesma proporção, o que requer ações e práticas administrativas que sejam capazes de mudar esse paradigma. Não há dúvidas de que devemos lutar para salvar nossos pacientes, mas não se pode “matar” a saúde financeira institucional. Torna-se relevante, portanto, a constante avaliação dos principais fatores que influenciam no aumento dos custos envolvidos e medidas capazes de minimizá-los. O objetivo deste artigo é o de demonstrar o custo e o impacto financeiro referente à primeira abor-dagem cirúrgica em vítimas com lesões cardiovasculares admitidos no Hospital João XXIII/FHEMIG, projetando-os para o setor de saúde assistencial brasileiro, e discutir propostas a partir da realidade viven-ciada. Trata-se de um estudo com aprovação ética, retrospectivo, de coorte e descritivo realizado a partir da auditoria de contas hospitala-res referentes a 70 prontuários catalogados pelo Serviço de Trauma Cardiovascular entre os anos de 2004 e 2006. Cinco (7,14%) pron-tuários foram excluídos por má qualidade técnica. Os dados analisa-dos revelaram correlação de proporcionalidade direta entre o impacto financeiro e topografia anatômica das lesões e exponencial com as variáveis hemoderivados e/ou de prótese vascular, além de corrobo-rar com evidências do alto impacto que o mesmo provoca nos custos Institucionais, calculados em R$ 103.614,96 ($60.949,97) e estimados em R$ 185.888,21 ($109.346,0) para o setor privado, implicando uma defasagem potencial de 44% caso não fossem tomadas medidas atenuadoras por parte da instituição. No entanto, e apesar de essas diminuírem a defasagem econômica, é necessário aperfeiçoá-las e acompanhá-las por equipe multidisciplinar e de modo contínuo. Este estudo fortalece a importância da auditoria de contas para o setor as-sistencial de saúde e a ampliação da transmissão do saber que não seja puramente biológico, mas também daquele com foco na raciona-lidade de gestão e na saúde financeira Institucional. Palavras-chave: Trauma, Lesão Cardiovascular, Auditoria, Tomada de Decisões, Gestão

TOMADA DE DECISÕES PARA O TRAUMA CARDIOVASCULAR: CONTRIBUIÇÕES DA AUDI-TORIA A PARTIR DE UM ESTUDO FEITO NO HOSPITAL JOÃO XXIII/FHEMIG

MAKING DECISION ON CARDIOVASCULAR TRAUMA: AUDIT CONTRIBUTIONS BASED UPON A JOãO XXIII HOSPITAL/FHEMIG STUDY

Ricardo Costa-Val1, Maria Cristina Marques2

1 Titular da Sociedade Brasileira de Angiologia e Cirurgia Vascular, Titular do Colégio Brasileiro de Cirurgiões, Mestre e Doutor em Medicina pela Universidade Federal de Minas Gerais, Cirurgião Titular do Hospital João XXIII/FHEMIG, Professor de Bioética do Curso de Medicina do Centro

Universitário de Belo Horizonte, [email protected]; 2 Enfermeira, Pós-Graduada em Auditória em Sistemas de Saúde pela Faculdade São Camilo de Belo Horizonte, Gerente Adminis-

trativa da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais

ABSTRACT

Trauma is not only a serious problem for the human being, but also for financial health system all over the world. Inside this context, cardiovascular trauma has been approached even more, but on epidemiologic and biologic concepts than administratively, which urges in behaviors capable of paradigm`s shift. We must labor in favor of our patients, but we can`t dye our Institution. So, it is re-levant a continuous and critical analysis about Trauma assistance in all aspects. The aim of this article is to analyze the expenses and impact of the first surgical approach in cardiovascular victims admitted at Hospital João XXIII/FHEMIG and stimulated reflec-tions based upon on personnel experiences. It is about an ethical approved study, retrospective and descriptive from audit did in 70 eligible patients enrolled by Cardiovascular Service. Five (7,14%) patients files were excluded for bad qualities records. Indeed, the data showed direct and exponential relationship between costs and anatomic topographic and blood/vascular prosthesis utiliza-tion and emphasizes the huge economic impact of these serious problem, estimated in R$109.346,00 for private system, 44% sli-ding scale for the Institution based on the endowment from Brazi-lian Public System ($60.949,97), which obliged the institutions to create others ways to minimized it. Therefore, these actions nee-ded continuously improvement and also, be made by a multidisci-plinary task force. These study allowed to conclude that the audit in health system is a must and evidences to necessity to spread a knowledge assistance focus not only on biological aspects but also on the vision that economic healthy Institutional needs to be chased by all. Keywords: Trauma, Cardiovascular Lesion, Expenses, Audit, Making Decision, Administration

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1. INTRODUçãO E REFERENCIAL TEÓRICO

O trauma é um dos maiores desafios mundiais da era moderna para as práticas assistenciais de saú-de pelo fato de provocar grande impacto nas ta-xas de morbimortalidade e por causar expressiva repercussão econômica na assistência à saúde. Seu poder de devastação se faz significativamen-te maior nos países em desenvolvimento. No Bra-sil, morreram mais de um milhão de pessoas em conseqüência da violência urbana e de acidentes de trânsito na década de 1990. E mais, apenas no ano de 2003, os hospitais públicos e convenia-dos ao Sistema Único de Saúde (SUS) interna-ram 753.304 vítimas diretamente relacionadas ao tema, com um custo hospitalar 27% maior do que todas as internações por todas as outras causas juntas (13,19,25).

Se avaliar esse grande problema público de saú-de tem sido difícil tarefa, seja nos grandes cen-tros urbanos, seja nas zonas rurais, por inúme-ros fatores, tais como ausência de padronização de coleta dos dados e sub-notificações, quiçá o próprio trauma cardiovascular, que se correlacio-na com altas taxas de mortalidade pré-hospitalar (1,19,21,31,33,36). Destarte tais obstáculos, o Hospital João XXIII/FHEMIG de Belo Horizonte vem progressivamente registrando uma crescen-te incidência de lesões cardiovasculares graves (8,9,14,29) e levando essa informação a público.

A proposta deste estudo se baseou na reconheci-da importância da Auditoria de Contas para as ins-tituições hospitalares e órgãos gestores de saúde pública e/ou privada, já que a mesma possibilita a análise técnica e a identificação de situações ad-ministrativas inadequadas. Ao realizar análise pe-ricial dos procedimentos hospitalares após a alta do paciente, a mesma permite ainda a avaliação sistemática da qualidade da assistência à saúde e a garantia de um pagamento justo, mediante a cobrança adequada (11,20,26).

No entanto, não é incomum nos depararmos com desperdícios e perdas, seja no mau planejamen-to assistencial, seja na utilização indevida de ma-teriais, equipamentos e dos recursos humanos, sendo essa a principal relevância do estudo apre-sentado e que poderá fomentar novos estudos de interesse institucional e nacional.

2. OBJETIVOS

2.1. Objetivo geral

Demonstrar o custo e o impacto financeiro referente à primeira abordagem cirúrgica em vítimas com lesões car-diovasculares admitidos no Hospital João XXIII/FHEMIG, projetando-os para o setor de saúde assistencial brasilei-ro, e discutir propostas a partir da realidade vivenciada.

2.2. Objetivos específicos

Averiguar a qualidade das folhas de sala referen-• tes à abordagem operatória inicial dos pacientes com lesão cardiovascular admitidos no Hospital João XXIII/FHEMIG, detectando falhas, e propor ações institucionais benéficas;

Avaliar os principais insumos que aumentaram o custo • da primeira abordagem terapêutica desses doentes;

Contabilizar o montante repassado pelo Sistema • Único de Saúde e projetar o custo e o impacto financeiro do trauma cardiovascular para o atual sistema brasileiro de saúde privada;

Contribuir para a literatura científica relaciona-• da ao tema, seja na esfera assistencial, seja na administrativa.

3. METODOLOGIA

3.1. Modelo de estudo e casuística

Trata-se de um estudo retrospectivo de coorte e des-critivo aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da FHEMIG, registro CEP/FHEMIG 575, vinculado ao Conselho Nacional de Pesquisa em Seres Hu-manos – CONEP, feito com base na análise de con-tas hospitalares de 70 prontuários catalogados pelo Serviço de Trauma Cardiovascular entre os anos de 2004 – 2006. Não há conflitos de interesse neste es-tudo.

3.2. Critérios de inclusão

Foram considerados critérios de elegibilidade a concor-dância entre os diagnósticos e os códigos de procedi-mentos do Sistema Único de Saúde, além dos materiais utilizados exclusivamente no centro cirúrgico do Hospital João XXIII/FHEMIG registrados na folha de sala e nos

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prontuários dos pacientes conforme supracitado.

3.3. Critérios de exclusão

Foram excluídos da análise dos custos: prontuários preenchidos de forma incorreta e/ou dúbia; pron-tuários pertencentes a pacientes que tinham lesão isolada de artéria e/ou veia de médio e pequeno ca-libre, definindo-se previamente para este estudo que enquadravam nessas condições as seguintes estru-turas vasculares: artéria e/ou veia radial, artéria e/ou veia ulnar, vasos dos quirodáctilos, artéria dorsal anterior, vasos dos pododáctilos, artéria temporal, veia jugular externa, veia cefálica e/ou basílica, veia safena magna e/ou safena parva bem como suas tributárias e vasos intra-abdominais de menor porte detectados pela laparotomia exploradora; todos os dados referentes aos procedimentos propedêuticos e/ou terapêuticos e respectivos materiais realizados fora centro cirúrgico.

3.4. Variáveis e parâmetros para análise

A estimativa do custo referente à primeira aborda-gem operatória, em reais, levou em consideração todos os materiais médico-hospitalares, incluindo medicamentos, órteses e prótese, gases medicinais e hemoderivados utilizados. Estratificaram-se ainda os resultados por topografias anatômicas das lesões e por clínicas cirúrgicas. Por outro lado, não foram computados gastos relacionados a depreciações de equipamentos, uso de sala cirúrgica, internação e remunerações aos profissionais da saúde. O re-passe financeiro teve como parâmetro os valores referentes aos códigos de procedimentos do Sis-tema Único de Saúde – SUS/2007 e a Planilha de Registro de Preços de Material Médico-Hospitalar da FHEMIG/2006. A projeção para o setor assistencial de saúde se baseou no Índice Referencial de Medi-camentos – Brasíndice/2007 e no Índice de Material Médico Hospitalar da União Nacional das Instituições de Auto Gestão em Saúde – Unidas/2006. 4. RESULTADOS

Dos 70 prontuários analisados, cinco (7,14%) foram excluídos em razão da má qualidade técnica das infor-mações registradas nas folhas de sala. Dos 65 casos analisados, houve apenas lesões cardiovasculares em 34 (52,3%) e outras associadas com injúrias de outros órgãos ou estruturas que exigiram intervenção em 31 (47,7%) casos, sendo cirurgia geral (41,9%), ortopedia

(35,5%), cirurgia plástica (19,4%) e neurocirurgia (3,2%).

O custo referente a todos os procedimentos cirúrgicos realizados no centro cirúrgico estimado para o setor privado de saúde seria de R$ 185.888,21 (mediana de R$ 2.236,55; ± R$ 1.546,34) e o repasse financei-ro feito pelo Sistema Único de Saúde para o hospital foi de R$ 103.614,96 (mediana de R$ 1.432,88; ± R$ 909,8), projetando uma defasagem de 44,3% caso a instituição não tivesse adotado pregão eletrônico, compra de materiais em lotes e negociação prefe-rencial com o setor industrial.

No entanto não houve homogeneidade dos valores financeiros referentes à projeção para o setor priva-do e nem para o repasse financeiro feito pelo Siste-ma Único de Saúde, conforme Figuras 1 e 2.

FIGURA 1 - Dispersão dos valores do custo operatório total, em reais, projetado para o setor privado de saúde, segundo o Brasíndice e Unidas, para todos os casos re-gistrados pelo Serviço de Trauma CCV no Hospital João XXIII/FHEMIG, entre os anos de 2004-2006.

FIGURA 2 - Dispersão dos valores do repasse do Sistema Único de Saúde, em reais, para todos os casos registrados pelo Serviço de Trauma CCV no Hospital João XXIII/FHE-MIG, entre os anos de 2004-2006.

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74 Gestão, Ciência & Saúde

Levando-se em consideração apenas os ca-sos com lesões cardiovasculares, o custo total projetado para o sistema privado de saúde e o repasse financeiro feito pelo Sistema Único de Saúde e seus impactos sobre o custo total foram, respectivamente, de R$ 96.171,32 (im-pacto de 52%) e de R$ 42.904,27 (impacto de 41%). E quando se analisaram os casos com lesões cardiovasculares associadas a outras lesões, computou-se que houve uma pequena redução do custo total e no impacto financeiro (R$ 89.716,89 e 48%, respectivamente) para o setor privado e um ganho significativo em rela-ção ao repasse público (R$ 60.710, 69 e 59%, respectivamente). No entanto, as Tabelas de 1 a 3 demonstram, claramente, como a utilização de sangue ou próteses vasculares encarecem, numa proporção direta para apenas uma dessas variáveis e de maneira exponencial para a as-sociação delas. Novamente, a associação entre lesões cardiovasculares com lesões de outros órgãos ou sistemas minimizou esse impacto.

TABELA 1 - Descrição comparativa entre a projeção do custo operatório total e seu impacto para o setor privado de saúde, segundo o Brasíndice e Unidas, com o valor financeiro repassado pelo SUS, em reais e em percentagem, nos casos exclusivos da CCV que utili-zaram apenas hemoderivados registrados pelo Serviço de Trauma CCV no Hospital João XXIII/FHEMIG, entre os anos de 2004-2006.

Caso Custo Total

Repasse SUS

% do repasse

22 2472,76 373,58 15,11%

30* 4548,91 373,58 8,21%

32** 3890,74 373,58 9,60%

38 2185,10 358,58 16,41%

46 1858,59 358,58 19,29%

49 3.345,75 358,58 10,72%

TOTAL 18.301,85 2.196,48 Mediana 13%

Impacto nos custos

(%)9,8% 2,1%

*Utilizou papa de hemácias e plasma fresco**Utilizou papa de hemácias, plasma fresco e concentrado de plaquetas

TABELA 2 - Descrição comparativa entre a projeção do custo operatório total e seu impacto para o setor privado de saúde, segundo o Brasíndice e Unidas, com o valor financeiro repas-sado pelo SUS, em reais e em percentagem, nos casos da CCV com outras clínicas que utilizaram apenas hemoderiva-dos registrados pelo Serviço de Trauma CCV no Hospital João XXIII/FHEMIG, entre os anos de 2004-2006.

Caso Custo Total

Repasse SUS

% do repasse

36 4455,32 1190,65 26,72%

43 3086,64 386,06 12,51%

56* 3549,68 1630,88 45,94%

TOTAL 11.091,64 3.207,59 Mediana 27%

Impacto nos custos

(%)5,1% 3,1%

*Utilizou papa de hemácias e plasma fresco

TABELA 3: Descrição comparativa entre a projeção do custo operatório total e seu impacto, para o setor privado de saúde, segundo o Brasíndice e Unidas, com o valor financeiro repas-sado pelo SUS, em reais e em percentagem, papa todos os casos que utilizaram hemoderivados e prótese vascular de P.T.F.E.® registrados pelo Serviço de Trauma CCV no Hospi-tal João XXIII/FHEMIG, entre os anos de 2004-2006.

Caso Custo Total

Repasse SUS

% do repasse

5 5712,13 2435,26 42,63%

7 7108,10 2157,06 30,35%

17 7015,63 1718,28 24,49%

23* 4310,38 1622,08 37,63%

26* 4263,03 1863,40 43,71%

27* 5493,32 2068,00 37,65%

29 4566,83 1893,03 41,45%

33* 4293,51 1718,28 40,02%

34* 4901,53 2223,68 45,37%

45 3221,43 1622,08 50,35%

60 4345,67 4494,55 103,43%

65* 5264,85 1718,28 32,64%

TOTAL 60.496,41 25.333,98 Mediana 41%

Impacto nos custos

(%)33% 25%

*Somente CCV.

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75Revista da Fundação Ezequiel Dias, v. 3, n. 2, jul./dez. 2008

Contrariando dogmas prévios, a utilização do cate-ter de Fogarty® não exerceu impacto significativo (15 casos no total, custo de R$ 40.762,99 e impac-to de 22% para a projeção sobre o setor privado e R$ 30.799,44 e impacto de 30% para o repasse público), independentemente da associação com as variáveis: associação de lesões, hemoderivados e prótese. Por fim, quando foi analisada a correlação entre topografia anatômica da lesão vascular com as outras variáveis descritas, se observaram na seguin-te ordem crescente de custo e impacto financeiro, to-mando como base a margem percentual em relação à projeção sobre o sistema privado de saúde:

Lesões abdominais e de membros inferiores – 38 • casos (58%), custo de R$ 109.734,72 e impacto de 59% para a projeção sobre o setor privado e custo de R$ 62.654,43 e impacto de 60,5% para o repasse público);

Lesões nos membros superiores – 16 casos • (25%), custo de R$ 27.784,90 e impacto de 15% para a projeção sobre o setor privado e custo de R$ 24.343,96 e impacto de 23,5% para o repas-se público);

Lesões cervico-torácicas – 11 casos (17%), custo • de R$ 48.368,59 e impacto de 26% para a proje-ção sobre o setor privado e custo de R$ 16.616,57 e impacto de 16% para o repasse público).

Notório se faz mencionar que todos esses dados de-vem ser interpretados sob o prisma de número do respectivo percentual sobre o número de casos ab-solutos para cada item.

5. DISCUSSãO

O modelo de estudo proposto mostrou-se adequado para com os objetivos previamente vislumbrados e a casuística de 70 prontuários, que representa 2/3 de todos os casos registrados, e fortalece a validade externa do estudo. Ademais, a utilização de tabelas para análise dos custos recentes para ambos os se-tores assistenciais minimiza erros sistemáticos.

Trauma, pandemia que reflete por meio de seus as-pectos epidemiológicos as diversidades de cada re-gião, país e sociedades. Trata-se ainda de agravo à saúde que exige atenção especial, além de ações contínuas e multidisciplinares, até com a participação

ativa de toda sociedade civil (27,28). Apesar de pre-valecer a difusão de saberes baseados em estudos que tomarem como base a experiência militar estran-geira (18,19,23,31,34) e das dificuldades em estudos epidemiológicos inerentes ao assunto, é evidente a progressiva produção nacional de estudos a respeito do tema (1-5,7-9,24,29). Mas acima de tudo, este es-tudo, que é fruto de um trabalho de conclusão (MCM), associado com outra publicação sobre o tema (10), consolida a visão de um dos autores (RCV) tomada há mais de uma década e reflete a postura do próprio Serviço de Cirurgia Cardiovascular do Hospital João XXIII/FHEMIG. Ao longo dos anos, vieram a público mais de uma centena de artigos (3,6-10,29), pales-tras, exposições e cursos que analisaram as diversas facetas do trauma cardiovascular. É de se destacar a recente publicação em nome da instituição e em uma das mais conceituadas revistas científicas da América Latina, talvez a maior casuística mundial prospectiva e de apenas um único centro hospitalar sobre trau-ma cardiovascular ocorrido exclusivamente em civis (10), corroborando com a necessidade de nos ater-mos não só à produção científica estrangeira, mas também com a realidade de nossa sociedade (1,4-7,9-10,24,33-36).

A assistência à saúde centrada na racionalidade administrativa com qualidade, humanização, aper-feiçoamento dos recursos humanos e materiais é marca registrada em todos bons gestores. Abraça-do ao atual paradigma mundial, o Governo de Minas Gerais, por meio de inúmeras ações, como o acordo interno de resultados, vem investido, cobrando, auxi-liando e estimulando suas diversas instituições e or-ganizações, na busca da excelência de gestão (15).

À semelhança de outras Fundações Estaduais enga-jadas no setor Saúde, a FHEMIG e suas diretorias, particularmente a de Desenvolvimento Estratégico e Pesquisa, de Ensino e Desenvolvimento de Pessoas e a de Planejamento Gestão e Finanças apóiam a busca de novos saberes que possibilitem a verdadei-ra e necessária efetivação dos postulados inerentes a todos os setores que se lidam com o setor da saú-de, sem dúvida, o mais importante de qualquer so-ciedade humana, pois, apesar de ser tido que saúde não é tudo, certamente tudo é nada sem saúde.

Inserido dentro do universo das boas práticas institu-cionais, a auditoria se revela ferramenta fundamen-tal para a política do Sistema Integrado de Gestão

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76 Gestão, Ciência & Saúde

Hospitalar. A análise dos espelhos de conta de cada prontuário em estudo, no qual consta em detalhe a conta, composta de Serviços Hospitalares (SH), Ser-viços Profissionais (SP), órteses e próteses (OPME) e ainda Serviços Auxiliares de Diagnóstico e Tera-pêutico (SADT) auxilia no árduo combate contra uma das principais dificuldades em se aprimorar a assis-tência à saúde que reside na incapacidade, individu-al ou coletiva, de se aplicar as concepções teóricas assimiladas (11,20,26).

Entender as incertas e discretas nuanças existentes entre uma instituição hospitalar vinculada ao Siste-ma Único de Saúde (SUS) e que não repassa re-cursos financeiros por ato cirúrgico exige acurácia ao se lidar com dados e explica o motivo de se ter excluído dos custos apresentados os valores dos Serviços Profissionais inerentes a cada código e não terem sido analisados os gastos em razão dos exames realizados fora do centro cirúrgico, sem dú-vida possível fator de confusão, já que o repasse financeiro referente aos mesmos não discrimina o setor do hospital no qual estes foram realizados.

De igual modo, a exclusão dos custos indiretos, en-tendidos como o uso ou a depreciação de materiais permanentes, se deve ao fato de que esses são ex-tremamente variáveis e, de certa forma, difíceis de serem quantificados. No entanto, deve-se fazer, en-tão, uma análise crítica de que o denominado custo total não levou em consideração tais variáveis.

A eliminação de apenas cinco prontuários por má qua-lidade dos registros condiz com uma hegemonia posi-tiva no setor. No entanto, algumas deficiências foram detectadas, e sugestões que visam à melhoria dos registros foram repassadas segundo a hierarquia da Instituição, corroborando de imediato a importância de estudos do gênero (11-12,16-17,20,22,26,32). Notório se faz mencionar a dificuldade por parte do médico em entender e preencher adequadamente o registro de suas ações, técnicas e/ou administrativas. Essa rea-lidade é conseqüência direta da histórica e universal ausência de disciplinas na graduação e nos programas de residência que abordem o assunto. A perpetuação dessa maneira errônea curricular faz com que o pro-fissional médico, elemento universal na assistência a saúde, não tenha de maneira geral a menor capacida-de de gerir adequadamente as instituições de saúde. A classe não sabe, por exemplo, dizer o significado os códigos dos procedimentos que realiza.

Urge ensinar a esses profissionais que nosso Sistema Único de Saúde repassa os recursos referentes a ci-rurgias realizadas, por meio de pacotes identificados pelos códigos de procedimentos, composta de códi-gos subdivididos em duas partes. O código básico é estruturado com oito dígitos assim denominados: XX.YYY.ZZ-D, que possuem diferentes significados, a saber: XX indica a especialidade, YYY o procedi-mento, ZZ o órgão ou região anatômica e D o dígito verificador, como por exemplo, o código 48.020.05-2, que se refere a: tratamento cirúrgico de lesão vascular traumática de membro inferior unilateral. Do contrário, grande fonte potencial de glosas e perdas financeiras legítimas se originam na fonte do registro.

A pequena diferença entre os valores dos códigos de procedimentos lançados no espelho da conta e a ta-bela dos códigos por procedimentos pagos pelo SUS residem no fato de as taxas de longa permanência estarem embutidas nos Serviços Hospitalares e de haver adicional de 50% repassado para o Hospital João XXIII por se tratar de um centro especializado no atendimento de urgências e emergências, denomi-nado pelo SUS de Índice de Valorização Hospitalar. Além disso, observou-se em mais de 30% das folhas de sala o inadequado registro referente ao ato médico e/ou a sub-notificação em virtude do absoluto des-conhecimento das regras dessa atividade. Apesar de existir no hospital equipe composta de profissionais da enfermagem, secretárias e ainda setores especializa-dos que corrigem esses registros, é necessário enfa-tizar novamente que não obstante a correção desses erros esteja acompanhada de atritos e desgastes, ela consume precioso tempo em razão de não se enqua-drar mais no cenário vigente (11,20,26).

A autorização de internação hospitalar (AIH) é o ins-trumento que deflagra a cobrança da conta hospita-lar do paciente e que permite a inclusão de até cinco procedimentos por cada ato operatório realizado a cada 24 horas. Mas é pertinente explicar aspectos que merecem atenção especial, a saber: a necessi-dade de se conhecer as regras referentes à remune-ração (em percentual decrescente dos valores), os procedimentos de diferentes especialidades médicas realizadas no mesmo ato operatório (que levam em consideração, também, a via de acesso cirúrgico) e ao código designado politraumatizado (39.000.00-1). Tais fatos explicam, em parte, a heterogeneidade ob-servada nos dois gráficos de dispersão dos valores

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77Revista da Fundação Ezequiel Dias, v. 3, n. 2, jul./dez. 2008

dos custos totais, mesmo quando havia códigos de procedimentos semelhantes.

Já a opção por se projetar o cálculo do custo ope-ratório total da primeira abordagem cirúrgica para o setor privado se baseou no fato de que a FHEMIG trabalha com o sistema de pregão eletrônico, com validade máxima de um ano, atitude que, sem dúvi-da, é responsável por significativa economia para a mesma, pois a salutar concorrência existente entre as indústrias do setor reduziu os custos dos medica-mentos na ordem de 20% e de 10% a 42% para as órteses/próteses, quando comparadas com as tabe-las BRASÍNDICE e das UNIDAS, respectivamente. Um sistema de custo com ênfase gerencial e de apoio à gestão dos departamentos produtivos deve informar não apenas quanto custa, mas também por que custa, para que custa e como custa o objeto de análise. Diante disso, ficou evidente que se deve promover, de imediato, na instituição campanhas esclarecedoras da necessidade do uso judicioso da utilização de hemoderivados e das próteses vas-culares, principalmente quando ocorrerem lesões vasculares isoladas. Nunca é demais lembrar que os recursos financeiros destinados à saúde são fi-nitos, independentemente de quem paga (11-12,16-17,20,22,26,32).

Deve-se registrar, apesar de não se justificar em sua plenitude, que o excesso de trabalho imposto aos profissionais da saúde, particularmente à classe mé-dica, independentemente do motivo, contribui para as graves falhas registradas, mesmo que corrigidas posteriormente.

Finalmente, a vivência de anos no setor e a constante reflexão do tema permitem destacar ainda a necessi-dade de ações positivas, das quais se destacam:

A adoção de medidas que erradiquem a concep-• ção de ilhas inter e intra-profissionais;

O estreitamento e o aprimoramento das comuni-• cações entre o setor administrativo, em especial das diretorias com a massa crítica de trabalhado-res, identidade única e de qualquer instituição;

A adoção de uma política que verdadeiramente • valorize os bons profissionais, não apenas enten-dida como uma remuneração digna, mas também com melhoria das condições de trabalho;

A constante aquisição de recursos tecnológi-• cos, muitas vezes só adquiridos anos depois de sua consolidação mundial e/ou de ações não-coletivas previamente tomadas;

A adoção de uma política justa em detrimento • da permuta política desleal, parte da imoralidade reinante da atual conjuntura brasileira associada ainda à adoção de programas educativos e fo-mentadores de pesquisas conforme a pluralida-de do contingente humano.

Não há a menor dúvida que a vida humana não po-derá jamais e de modo algum deixar de ser o foco de todas as nossas ações. No entanto, evitar a morte das instituições devida a uma má gestão precisa ser também alvo de todos (26,28,36,37).

6. CONCLUSÕES

Este estudo fortaleceu a importância da auditoria para o setor assistencial de saúde e a ampliação da transmissão do saber que não seja puramente bio-lógico, mas também com foco na racionalidade de gestão, na administração igualitária e na saúde fi-nanceira institucional.

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78 Gestão, Ciência & Saúde

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RESUMO

Este trabalho tem como objetivo demonstrar o quan-to a vinda da família real portuguesa para o Brasil, em 1808, seguida da vinda da Arquiduquesa Maria Leopoldina, em 1817, contribuíram para o avanço das Ciências Naturais em nosso País. O estudo foi feito com base na revisão bibliográfica de autores que abordam as diversas transformações advin-das da mudança da capital lusa para os trópicos e também as atividades desenvolvidas pelo grupo de cientistas que integravam a comitiva de Leopoldina. Dentre eles, destacamos a grande contribuição ofe-recida por João Batista von Spix e Carlos Filipe von Martius – dois naturalistas bávaros que se consa-graram por suas consistentes pesquisas acerca da flora e da fauna local. O estudo revela a importância do início do século XIX como um tempo de grandes avanços no campo científico brasileiro, pois uma vez que se encontrava fechado para o mundo, em razão do Pacto Colonial, a partir de então, o Brasil passou por mudanças que marcaram profundamente o cur-so de sua história.

Palavras-chave: 1808, Maria Leopoldina, Spix, Martius, Ciências Naturais

A VINDA DE MARIA LEOPOLDINA PARA O BRASIL E O AVANÇO DAS CIÊNCIAS NATURAIS: UM OLHAR SOBRE A OBRA DE MARTIUS E SPIX

THE DEVELOPMENT OF NATURAL SCIENCES IN BRAZIL DUE TO THE COMING OF THE BRAZILIAN ARCHDUCHESS MARIA LEOPOLDINA: A LOOK OVER MARTIU’S AND SPIX’S WRITINGS

Maria Raquel Joana dos Reis¹, Renata Vieira da Cunha², Vanessa Regina de Queiroz³

1 Graduanda em História pela PUC Minas, gerente administrativa do Pré-Vestibular Chromos Venda Nova, [email protected]; 2 Graduanda em História pela PUC Minas, estagiária do Centro de Documentação e Memória do Fundo Cristão para a crianças, [email protected]; 3 Advogada, graduanda em História pela PUC Minas, professora de inglês do Number One

Idiomas, [email protected].

ABSTRACT

This paper aims to demonstrate how the arrival of the Portuguese royal family to Brasil in 1808, followed by the arrival of Archeduchess Maria Leopoldina, in 1817, contributed to the advancement of Natural Sciences in our contry. The study was based on tha literature review of authors who address the various changes from the change of the Portuguese capital for the tropics and also the activities developed by the group of scientists that made the group of Leopol-dina. Among them, we highlight the great contribution offered by John the Baptist von Spix and Karl Friedri-ch von Martius – two Bavarian naturalists which are consecrated by its consistent research about the lo-cal flora and fauna. The study shows the importance of the beginning of thr nineteenth century as a time of great advances in the scientific field in Brazil, be-cause until then this area was closed to the world be-cause of the colonial pact, nut from that time in Brazil has experienced profound changes that marked the course of our history.

Keywords: 1808, Maria Leopoldina, Spix, Martius, Natural Sciences

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1. INTRODUçãO

O presente artigo tem por objetivo analisar a con-tribuição feita por Maria Leopoldina nos avanços das ciências no Brasil no início do século XIX. É no contexto da transferência da Corte Portuguesa para o Brasil no ano de 1817 que Maria Leopoldina vem para o nosso País para casar-se com D. Pedro, prín-cipe regente. Por esse fato, praticamente toda a his-toriografia construída em torno da princesa austríaca dedicou-se a retratar mais sua conturbada vida pes-soal e sua participação no cenário político nacional, esquecendo-se do papel por ela desempenhado no incentivo às Ciências Naturais no Brasil.

Tal omissão pode ser compreendida considerando a exclusão do gênero feminino da historiografia tradicio-nal, tanto brasileira quanto mundial, uma vez que no que diz respeito à mais alta esfera da nobreza imperial, a mulher, sempre quando referida em estudos, era as-sociada apenas ao cuidado com o marido e os filhos. No entanto, Leopoldina resistiu a esse estereótipo de-sempenhando um papel significativo como transmisso-ra de conhecimentos do mundo europeu para o Brasil, já que veio para o País à frente de uma missão cientí-fica. Antes da chegada desses estudiosos, as viagens para conhecimento da natureza brasileira eram reali-zadas por pessoas com pouca ou nenhuma especia-lização propriamente científica. Esse cenário transfor-mou-se após 1817, principalmente com a chegada dos cientistas Martius e Spix.

Percebendo essa lacuna historiográfica, propomo-nos a estudar o tema: “A vinda de Maria Leopoldina para o Brasil e o avanço das Ciências Naturais: Um olhar sobre a obra de Martius e Spix”. Objetivamos ainda desenvolver ao longo deste trabalho uma aná-lise acerca das inúmeras “emancipações” conquis-tadas pelo Brasil a partir da vinda da Corte de Dom João tanto no âmbito político, econômico, social e cultural quanto no científico, principalmente na área das Ciências Naturais.

2. METODOLOGIA

Tomando como referencial teórico livros que contex-tualizam o Brasil no início do século XIX, desenvolve-remos a primeira parte do texto que apresentará uma visão geral dos acontecimentos históricos, tanto euro-peus quanto brasileiros, com o objetivo de analisar as

transformações que a chegada de Maria Leopoldina provocou na colônia lusa, principalmente no que tan-ge ao avanço das Ciências Naturais aqui.

Já a segunda parte do artigo denominada “A che-gada de Spix e Martius” analisará grande parte do trabalho realizado por esses dois cientistas naturais. Para tanto, foram utilizados como fundamentação teórica livros e artigos virtuais que relatam os três anos de pesquisas (1817-1820) realizadas em terri-tório brasileiro pelos dois pesquisadores.

Concluiremos nosso artigo atribuindo maior relevân-cia à organização e à impressão da monumental Flo-ra Brasiliensis, iniciada em 1840 por von Martius e que ainda hoje é considerada uma obra fundamental para os estudiosos da Botânica.

3. DESENVOLVIMENTO

3.1. 1808: Rupturas, permanências e desdobra-mentos de um novo contexto brasileiro instaurado.

A corte portuguesa transferiu-se para o Brasil em razão de um conjunto de circunstâncias pelas quais atraves-sava a Europa. Entre esses acontecimentos destaca-se a invasão de Napoleão Bonaparte em vários países europeus. O príncipe regente português Dom João ti-nha consciência de que seu reino seria invadido pelo exército francês. Apoiado pelo governo inglês o futuro Rei de Portugal deixou-se convencer e transferiu sua Corte para o Brasil, garantindo a Inglaterra, em contra-partida, favorecimentos nas alfândegas brasileiras (8).

É importante explanarmos acerca de como era o Bra-sil em 1808 para entendermos a dimensão e o impacto causado pela instalação da Corte portuguesa. Em rela-ção à questão geográfica, o Brasil de 1808 tinha quase a mesma extensão territorial de hoje, com exceção do Acre, comprado da Bolívia em 1903, e de algumas regi-ões que constituem o sul do País hoje em dia. A maior parte da população estava concentrada nas áreas litorâ-neas dos atuais Estados da Bahia e do Rio de Janeiro e também nas regiões interioranas de Minas Gerais, por exemplo. Essa ocupação populacional fortuita devia-se aos maiores atrativos econômicos desses locais. A po-pulação indígena era bem maior do que é hoje, e o nú-mero de escravos africanos somava cerca de um terço do total de habitantes do País. Mantida por três séculos no atraso, a colônia era composta por áreas isoladas, distantes e estranhas entre si, as quais se transforma-

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ram radicalmente com a chegada da Corte (4).

Dentre as mudanças ocorridas no período joanino destacam-se: a transferência da sede político-admi-nistrativa para o Brasil; a abertura dos portos às na-ções amigas de Portugal; a revogação da proibição imposta em 1785 de se instalarem manufaturas no Brasil; a assinatura dos tratados de 1810; a criação de Ministérios e Tribunais; a criação da casa da Mo-eda, do Banco do Brasil, do Jardim Botânico, do Te-atro Real, da Imprensa Real, da Academia Real Mili-tar, da Academia Real de Belas Artes e da Biblioteca Real. É válido ressaltar a chegada à cidade do Rio de Janeiro, em 1816, da Missão Artística Francesa, que tinha por finalidade implementar as artes úteis no País, por meio da criação de uma Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios (9).

O ano de 1808 também pode ser entendido como um marco significativo na história da cultura científica do Brasil. Entre 1808 e 1821 inaugurou-se um ciclo de viagens e expedições científicas, à testa das quais es-pecialistas eminentes de várias partes do mundo puse-ram seu saber a serviço do conhecimento da flora, da fauna, da geografia, da geologia, da paleontologia e da etnologia dessa porção do Novo Continente (1).

Essas expedições científicas ganharam grande força principalmente na época em que a arquiduquesa Ca-rolina Josefa Leopoldina, filha do Imperador Francis-co II e de Maria Teresa da Sicília, veio para o Brasil com a incumbência de unir a Áustria – seu país de origem – a Portugal – pátria de seu futuro marido, D. Pedro. E como um traço importante de sua persona-lidade, podemos citar a grande paixão que a prince-sa revelava pelas Ciências Naturais e pelas artes. Já em relação à educação da arquiduquesa, pode-se dizer que foi baseada em princípios firmes e tradi-cionais, aliás, como praticamente todas as mulheres da nobreza européia da época. Esses princípios, se-gundo June Hahner (5), não eram válidos só para as mulheres européias, mas para praticamente todas, independente da região que habitavam.

O início do século XIX foi um período muito conturba-do na Europa, em virtude dos desdobramentos das invasões napoleônicas, como já foi citado anterior-mente, e, por isso, Portugal tentou estabelecer con-tatos diretos com outras grandes potências, como a Áustria, a Prússia e a Rússia, objetivando diminuir a dependência de que estava sujeita à Inglaterra.

Nesse contexto, a forma mais comum de assegurar uma aliança entre dois países era por meio do ma-trimônio. Sendo assim, diplomatas portugueses pro-puseram aos Habsburgos o casamento do príncipe regente de Bragança com a arquiduquesa austríaca. O contrato matrimonial foi assinado no dia 26 de no-vembro de 1816 e o casamento por procuração foi marcado para o dia 13 de maio de 1817.

Leopoldina era um bom exemplo de uma arquidu-quesa da família Habsburgo educada com perfeição. Ela aceitava as regras de uma estrita etiqueta e, sem resistir, cumpria com os deveres que lhe eram impostos. Esses deveres incluíam o casamento, o nascimento de filhos, a promoção do Estado no qual fosse viver e a subordinação de sua própria vida em prol dos interesses do mesmo. Porém, apesar de toda a educação tradicional que recebeu, não se pode subestimar a importância que Maria Leopoldi-na representou para o desenvolvimento da cultura e da educação científica no Brasil.

Registros afirmam que Maria Leopoldina tinha aulas de Ciências Naturais, inclusive Botânica, Mineralogia, As-tronomia e Física, assim como de Religião, Desenho, História, Francês, Italiano e Música. O gosto de Maria Leopoldina pelas ciências cresceu juntamente com ela, em grande parte pelo fato de seu pai ser um amante da Botânica. Quando emigrou para a colônia portuguesa Maria Leopoldina, levou com ela 42 caixas do tamanho de um indivíduo contendo o seu enxoval, sua bibliote-ca, suas coleções e os presentes para a casa real (6). Entretanto, a futura Imperatriz do Brasil não veio para o País sozinha; pelo contrário, seguiram-lhe vários natura-listas ingleses, franceses e de outras regiões européias que tinham por objetivo catalogar cada descoberta que fizessem por aqui. Como chefe da expedição científica que a acompanhou, foi nomeado o professor João Cris-tian Mikan, que era botânico e etnólogo, e juntamente com ele vieram: o médico e naturalista João Emanuel Pohl, o paisagista Tomás Ender, o pintor de plantas João Buchberger, o jardineiro Henrique Guilherme Schoft e o caçador Domingos Socher. Dois cientistas bávaros tam-bém foram indicados para fazerem parte da comitiva que acompanhava a princesa: Carlos Frederico Filipe von Martius e João Batista Von Spix. Tudo o que des-cobriam era detalhado em diários que posteriormente transformaram-se em livros (3).

De acordo com Lorelai Kury (7), pesquisadora em História das Ciências, durante boa parte do período

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colonial até a abertura dos portos em 1808, pelo prín-cipe D. João, as viagens para conhecimento da natu-reza foram realizadas com pouca ou nenhuma espe-cialização propriamente científica. Para ela, a relativa escassez de relatos de viajantes sobre a América por-tuguesa se explica igualmente pelo zelo de Portugal em tentar conservar sua colônia longe da cobiça das potências rivais. Nada que pudesse conter informa-ções úteis sobre o Brasil podia ser publicado. Até esse momento, início do século XIX, pode-se afirmar que o mundo pouco conhecia a respeito da flora, da fauna e da geografia brasileira, tendo conhecimento apenas dos poucos trabalhos realizados pela missão científi-ca de Nassau1 no século XVII.

3.2. A chegada de Spix e Martius

João Batista Von Spix e Carlos Filipe Von Martius, foram dois cientistas da Baviera que integraram a comitiva da arquiduquesa de Habsburgo e que se destacaram entre o ilustre grupo de cientistas euro-peus que vieram para o Brasil estudar a fauna e a flora local. Spix e Martius, como são popularmente conhecidos, chegaram ao Brasil em 1817, sendo responsáveis pela exploração e coleta dos mais di-versos materiais encontrados durante o tempo da expedição, em um momento em que quase todos os países da Europa também haviam mandado seus representantes por intermédio de cientistas, colecio-nadores e empalhadores. Spix, que nasceu em 9 de fevereiro de 1781, chegou ao Brasil com 36 anos. Tendo se doutorado aos 19 anos, era filho de um boticário e professor, natural de Hochstedt Aisch, na alta Francônia. Naquela época já era bastante reco-nhecido na Europa, tendo sido também o primeiro zoólogo que trabalhava na região amazônica. Foi responsável por parte fundamental e básica de nos-so conhecimento atual sobre a fauna do continente, especialmente sobre animais vertebrados. Antes da chegada ao Brasil, trabalhou para a Academia de Ciências por alguns anos. Nesse período, desen-volveu importantes trabalhos sobre anatomia morfo-lógica, biologia evolutiva e história natural, que lhe deram fundamentos para empreendimentos científi-cos futuros. Trabalhou ainda como conservador do Museu de Munique.

Seu companheiro de viagem, Martius, nasceu em Erlangen, Munique, em 17 de abril de 1794. Ten-do se doutorado aos 20 anos de idade, chegou ao Brasil com apenas 23. Trabalhou como médico, bo-tânico e antropólogo, sendo reconhecido como fun-dador da etnografia brasileira e como um dos mais importantes alemães que estudaram o País, espe-cialmente a região da Amazônia.

De acordo com Ernest Josef Fittkau (2), zoólogo e estudioso das obras de Spix, os dois cientistas uni-ram-se apenas para a expedição científica ao Bra-sil, e o grande sucesso da mesma é mérito de am-bos. Spix, por ser o mais velho e mais experiente, atuou como chefe das pesquisas, sendo também o responsável pela elaboração dos relatórios que deveriam ser enviados ao rei da Baviera, sogro do pai de Leopoldina. Durante os três anos de viagem, ambos percorreram uma extensão de 10.000 quilô-metros, não se limitando apenas ao litoral do Rio de Janeiro. Enveredaram pelo interior de Minas Gerais e de São Paulo, passando pela Bahia, por Pernam-buco, pelo Piauí, pelo Maranhão, pelo Pará e pelo Amazonas. E como nos afirma Barreto: “sem se li-mitarem às respectivas especialidades, coligiram, também, material sobre economia, geografia, medi-cina, clima, condições sociais e etnológicas” (1).

Após todo esse percurso, de labor infatigável e de muitos riscos, no dia 15 de junho de 1820 embar-caram para a Baviera, tendo reunido um acervo de aproximadamente 6.500 variedades de flora, 85 es-pécimes de mamíferos, 350 de aves, 130 de anfí-bios, 116 de peixes e 2.700 de insetos.

Uma vez na pátria, Spix e Martius se reuniram para a elaboração da obra que consagrou a viagem, conhe-cida como “Viagem pelo Brasil” (10), escrita em três volumes, de 1823 a 1831, e que, em virtude da morte de Spix, no ano de 1826, foi terminada por Martius.

Spix retornou da viagem em condições precárias de saúde, pois havia contraído esquistossomose, fato que teria sido a causa de sua morte na Europa, seis anos depois. Entretanto, apesar de se sentir muito fraco,

1 Johann Moritz of Nassau-Siegen, mais conhecido pelo nome “brasileiro”, Maurício de Nassau, foi governante da colônia ho-landesa no Nordeste do Brasil, com capital em Recife, de 1637 a 1644. Sua administração tornou-se conhecida pelos trabalhos de cientistas e artistas que o acompanharam e, sob seu patrocínio, exploraram e pintaram a nova terra, suas belezas naturais e seus habitantes. Humanista, Nassau estimulou as ciências e as artes. Fez construir um observatório astronômico, criou um jar-dim botânico e trouxe em sua comitiva mestres da pintura flamenga, como Frans Post e Albert Eckout, além de diversos artistas e cientistas, convidados a se juntar a ele num grande projeto que definiu como “exploração profunda e universal da terra”.

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continuou a desenvolver seus projetos, publicando inú-meros trabalhos acerca do material coletado no Brasil. Assim, seis anos mais tarde, Spix havia completado as descrições de cerca de quinhentas espécies de molus-cos e vertebrados colecionados, apresentando também estudos sobre macacos, tartarugas, morcegos, sapos, aves, cobras e lagartos. Logo após sua morte, sob a supervisão de Martius, que tomou conta de tudo o que o companheiro deixou, e contando com o apoio de ou-tros cientistas, foram ainda publicados alguns trabalhos referentes a moluscos, peixes e insetos.

Já Martius obteve grande sucesso na continuação de seus estudos, sendo inclusive nomeado titular da cadeira de Botânica da Universidade de Munique. Dotado de uma cultura extraordinária, desenvolveu trabalhos em diversas áreas, como, por exemplo, et-nografia, folclore brasileiro e estudos das línguas in-dígenas. Além disso, o referido naturalista escreveu um livro sobre a história antiga e moderna do Brasil, que tratava da vida política, dos assuntos civis, ecle-siásticos e literários do País. Esse livro foi encomen-dado pelo Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro (IHGB) nos anos de 1840. Todavia, as obras mais importantes de Martius são, sem dúvida alguma, as relativas à sua especialidade, a botânica brasileira. Sendo a obra mais consagrada de Martius a famosa “Flora Brasiliensis”, que abrange 40 volumes. E para compreendermos a magnitude dessa obra no cená-rio científico, recorremos novamente a Barreto, (1) quando sintetiza sua organização nas seguintes pa-lavras: iniciada por ele (Martius) em 1840 e continua-da até a sua morte (1868); foi depois prosseguida por Augusto Guilerme Eichler e Inácio Urban e termina-da em 1906, portanto 66 anos após Martius havê-la iniciado. Nela colaboraram 65 botânicos, na maioria cientistas da língua alemã, mas também alguns de outras nacionalidades, inclusive brasileiros. Escrita em latim, contém 20.753 páginas e 3.811 gravuras. Apesar das descobertas posteriores de milhares de plantas, a Flora Brasiliensis continua sendo a obra fundamental sistemática da nossa botânica.

Financiado pelo imperador Ferdinando I da Áustria, pelo rei Ludovico I da Baviera e por D. Pedro II, im-perador do Brasil, o projeto contém em sua maioria descrições de angiospermas brasileiras. A disposi-ção textual da coleção é composta por colunas (duas em cada página) que descrevem minuciosamente o sistema de classificação da vegetação brasileira criada por Martius.

Desde 1852, o Governo Brasileiro vinha patrocinan-do sua publicação, de alto custo pelas característi-cas editoriais, com uma quantia de dez contos de réis; por isso, a publicação levava impressão “Suble-vatum Populi Brasiliensis Liberalitale”

A precariedade dos recursos de captação de ima-gens tornou importante a presença de diversos artis-tas para a produção dos desenhos que compõem a Flora Brasiliensis, feitos a bico de pena. As edições da Flora Brasiliensis no Brasil são raríssimas e geral-mente ficam trancadas sem acesso nas bibliotecas que as possuem. O Centro de Informação Científica Histórica e Cultural da Fundação Ezequiel Dias é um desses poucos lugares que guardam essa majesto-sa coleção, precisamente nove fascículos.

Os avanços tecnológicos permitiram que recente-mente fosse disponibilizada, de forma gratuita, a versão eletrônica do livro no endereço <www.flora-brasiliensis.cria.org.br>. Para a grande maioria dos autores consultados, a Flora Brasiliensis é conside-rada uma obra prima da botânica, ou seja, o livro em que se encontram os registros mais antigos sobre a taxonomia de plantas brasileiras. Representa, ainda, a mais extensa reunião de descrições sobre a flora do País. E é justamente por todas essas contribui-ções que Martius é reconhecido como um dos mais ilustres conhecedores de sua especialidade, e em função da morte prematura de Spix, acabou sendo também o mais congratulado pelos sucessos da ex-pedição ao Brasil.

4. CONCLUSãO

Se durante muito tempo as viagens científicas ao Bra-sil foram uma exceção, em meados do século XVIII a situação se transformou. O movimento de ilustração em Portugal deflagrou um processo de valorização dos produtos naturais das colônias portuguesas, em especial a do nosso País.

Diante de tal realidade, a metrópole lusa começou a desenvolver uma política que influenciava a organi-zação de expedições científicas ao território brasilei-ro, visando ao conhecimento dos produtos da natu-reza, bem como de seus usos e propriedades.

No ano de 1817, quando a Princesa Leopoldina, em companhia de ilustres cientistas, também aportou em terras brasileiras, ocorreu uma ressignificação do

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tema que ora nos ocupa. E por meio da análise das obras de Martius e Spix encontramos dados que com-provam ainda que o início do século XIX é, de fato, um tempo de grandes avanços no campo científico, marcado por constantes permanências e rupturas, evidenciadas pelo próprio curso da História. Assim, apesar sabermos que tal episódio ocorrido entre os anos 1807-1808 não deve ser considerado somente a partir de perspectivas positivas, pode-se concluir que inegavelmente trata-se de um marco sem pre-cedentes na história nacional, responsável por um período de grandes questionamentos internos, que provocou um “novo descobrimento do Brasil” e que, levado aos últimos termos, acabou culminando com o processo de nossa emancipação política ante a metrópole portuguesa em 1822.

Contudo, pode-se concluir que a transferência da Corte portuguesa para o Brasil, assim como a vinda de D. Maria Leopoldina – acompanhada pela mis-são científica que incluía os dois grandes cientistas trabalhados no presente texto –, colaborou de forma bastante significativa para a transformação do contex-to até então vigente, instaurando assim, um período áureo para as viagens científicas em nosso País.

AGRADECIMENTOS

Às professoras Maria Mercedes Silva Petres e So-lange de Oliveira Bicalho, do curso de História da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, que gentilmente se dispuseram a revisar nosso texto.

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10. SPIX; MARTIUS. Viagem pelo Brasil: 1817-1820. Tradução Lúcia Furquim Lahmeyer. São Paulo: Ed. Da Universidade de São Paulo, 1981, v. 3, 326 p.

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INSTRUçÕES PARA COLABORADORES E NORMAS PARA PUBLICAçãO

1- OBJETIVOS

Gestão, Ciência & Saúde – Revista da Fundação Ezequiel Dias é um periódico semestral, dedicado à publicação de conteúdo técnico-científico, com informações que contribuam significativamente para o conhecimento nas ciências da saúde e da gestão. Editada pela Fundação Ezequiel Dias – Funed, a Revista tem como objetivo divulgar resultados de investigações científicas tanto básicas como aplicadas. Propõe-se a promover o debate cien-tífico, contribuindo de forma eficaz para garantir o resgate e a preservação da memória da ciência, a consolidação de áreas do conhecimento e para a melhor comunicação de resultados à comunidade científica e à sociedade.

2- ESTRUTURAÇÃO BÁSICA

A Revista será multidisciplinar com contribuições da comunidade científica por meio da publicação de artigos originais; relatos de experiência/caso; história da saúde pública; resenhas de livros, ar-tigos, dissertações e teses; relatórios de reuniões ou oficinas de trabalho e de pesquisa; comentários das instituições de saúde de Estado e revisões.

Os trabalhos das diversas categorias devem ser inéditos e se destinarem exclusivamente à Revista.

Artigos originais•

Textos que contenham relatos completos de estu-dos ou pesquisas concluídas e colaborações as-semelhadas. Devem apresentar, no máximo, vinte páginas impressas, excetuando figuras, tabelas e anexos.

Relatos de experiência/caso•

Textos que apresentem experiências nos temas de saúde, ciência e gestão, em que o resultado é ante-rior ao interesse de sua divulgação ou a ocorrência dos resultados não é planejada. Inclui novas téc-nicas, terapias, diagnóstico, patologias, materiais e soluções inovadoras para problemas especiais. De-vem apresentar, no máximo, vinte páginas impres-

sas, excetuando figuras, tabelas e anexos.

História da saúde pública•

Relatos sobre fatos e personalidades que con-tribuíram para a história da saúde pública e de disciplinas afins. Devem apresentar, no máximo, vinte páginas impressas, excetuando figuras, ta-belas e anexos.

Resenhas de livros, artigos, dissertações • e teses

Análises críticas para a divulgação de opiniões de pesquisadores e técnicos sobre textos publi-cados nas modalidades citadas referentes a te-mas atuais de sua especialidade, cujo conteúdo se enquadre nos objetivos da Revista. Devem apresentar, no máximo, dez páginas impressas excetuando figuras, tabelas e anexos.

Relatórios de reuniões ou oficinas de tra-• balho e de pesquisa

Textos sobre a discussão de temas relevantes em saúde, ciência e gestão, com recomenda-ções e conclusões. Devem apresentar, no máxi-mo, dez páginas impressas, excetuando figuras, tabelas e anexos.

Comentários das instituições de saúde do • Estado de Minas Gerais

Textos expressando a opinião em breve relato sobre temas relevantes da atualidade nas áreas de saúde, ciência e gestão. Devem apresentar, no máximo, quinze páginas impressas, excetuando figuras, tabelas e anexos.

Revisão•

Síntese crítica de conhecimentos disponíveis sobre determinado tema, mediante análise e interpretação de bibliografia pertinente. Devem apresentar, no máximo, vinte páginas impressas, excetuando figuras, tabelas e anexos.

Outras modalidades podem ser aceitas desde que aprovadas pelo Conselho Editorial Científico.

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3- INSTRUÇÕES GERAIS PARA AUTORES

Submissão de trabalhos•

Os trabalhos devem ser encaminhados por meio de carta, assinada pelo autor responsável pela correspondência, ao Conselho Editorial Científico da Gestão, Ciência & Saúde – Revista da Funda-ção Ezequiel Dias.

A carta deve descrever a categoria do trabalho e conter declaração de concordância com a cessão de direitos autorais. Tabelas e figuras publicadas em outros periódicos devem ter a fonte citada.A carta deve indicar o nome, endereço, números de telefone, fax e e-mail do autor para o qual a correspondência deve ser enviada.

O endereço postal é Conselho Editorial Científico da Gestão, Ciência & Saúde – Revista da Funda-ção Ezequiel Dias/ Centro de Informação Científi-ca, Histórica e Cultural/ Fundação Ezequiel Dias/ Rua Conde Pereira Carneiro, 80 – Bairro Game-leira/ Cep 30. 510-010, Belo Horizonte/MG.

Após aprovação final o trabalho deverá ser reen-caminhado para o endereço eletrônico [email protected].

Os trabalhos submetidos são arbitrados por pelo menos dois revisores pertencentes ao quadro de colaboradores da Revista. Os autores são res-ponsáveis pelas informações contidas nos tra-balhos e pelo ineditismo dos mesmos. Somente serão aceitos trabalhos que se destinem exclusi-vamente à Revista.

Apresentação do manuscrito:•

Os trabalhos deverão ser encaminhados em três có-pias, redigidos em português, digitados no programa Word for Windows, versão 6.0 ou superior, fonte Arial, tamanho 12, entrelinha espaço duplo, com margens superior de 3 cm e inferior e laterais de 2,5 cm, res-peitando-se o número máximo de páginas indicadas por categoria, incluindo referências bibliográficas e ex-cluindo figuras, tabelas e anexos. Todas as páginas do texto devem ser numeradas a partir da página de iden-tificação (página de rosto) com numeração no início da página (cabeçalho) e alinhamento à direita. As figuras, tabelas e anexos devem ser numerados conforme cita-

das no texto e auto-explicativas, no total máximo de cinco (05), e serão impressas em preto e branco.

No preparo do trabalho original será observada, sempre que possível, a seguinte estrutura:Página de rosto: Título do artigo – em português e inglês em letras maiúsculas e sem abreviatu-ras. Nome(s) do(s) autor(es): por extenso, com indicação da formação acadêmica profissional, títulos acadêmicos, função que exercem atual-mente, nome da instituição a que pertencem, endereço eletrônico (pelo menos do autor res-ponsável pela correspondência).

Resumo: em português e inglês, com no máxi-mo 350 palavras. O formato do resumo deve ser o narrativo, destacando objetivos, métodos bá-sicos adotados, resultados e conclusões mais relevantes. Não devem constar abreviaturas.

Palavras-chave: podem ser utilizados até seis descritores que identifiquem o conteúdo do ar-tigo, se possível baseados no DECS (Descrito-res em Ciências da Saúde), disponível no www.bireme.br terminologia em saúde e consulta ao DECS, em português e inglês.

Texto:•

Seguir estrutura formal para trabalhos científi-cos, numeradas com algarismos arábicos, com-preendendo:

1. Introdução;•

2. Desenvolvimento• (a critério do autor): exemplo: metodologia, resultados alcan-çados, discussão. Além do texto, poderão constar, até, no máximo, cinco tabelas, figuras ou anexos auto-explicativos e nu-merados conforme citados no texto, que serão impressos em preto e branco.

3. Conclusão.•

Agradecimentos: (opcional) •

C• itações Bibliográficas no texto: mencionar apenas o número recebido pelo docu-mento na listagem da Referência Biblio-gráfica (ordem alfabética). Esse numeral

Page 91: Revista Funed - Volume 3.pdf

91Revista da Fundação Ezequiel Dias, v. 3, n. 2, jul./dez. 2008

será entre parênteses e sem nenhum efeito (não sobre ou subescritar).

Referências Bibliográficas:• deverão ser orde-nadas alfabeticamente e numeradas (algaris-mos arábicos), redigidas também em espaço duplo. Devem obedecer ao estilo e à pontua-ção das normas da ABNT NBR 6023.

Dúvidas com relação às normas, consultar pelo endereço eletrônico: [email protected]


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