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  • 2 edio / 2011 Revista Anamatra 1

    Os desafios da magistratura no Brasil

    Coordenador do IPEC destaca Brasil como exemplo internacional no Combate ao Trabalho Infantil

    Entrevista

    Magistrados do Trabalho na luta por direitos garantidos pela Constituio

    Brasil

    China: a 2 maior potncia econmica do mundo ainda ignora os direitos trabalhistas

    Internacional

    A difcil rotina de quem trabalha por uma Justia mais efetiva e clere

    FrOntEIraJuiz Antnio Csar

    Pereira, da 14a Regio, no Programa Justia

    a Bordo, em rea fronteiria do Acre

    com o Peru

  • 2 edio / 2011 Revista Anamatra 3

    A Anamatra tem defendido ainda outras causas importantes que vo ao encontro dos interesses do trabalhador brasileiro. Uma das matrias desta publicao apresenta estatsticas assustadoras sobre acidentes de trabalho no Brasil. Ciente deste problema, louvando a iniciativa do ministro Joo Oreste Dalazen, assinamos um protocolo de cooperao tcnica com o Tribunal Superior do Trabalho e agora integramos a Poltica Nacional de Segurana e Sade no Trabalho.

    Em outra reportagem, abordaremos os avanos promovidos neste ano na legislao trabalhista no Brasil, com a regulamen-tao do ponto eletrnico e da lei do aviso-prvio de at 90 dias, que foi enviada ao Congresso Nacional como anteprojeto de lei pela Anamatra, proporcionando maior transparncia e segurana jurdica na relao de empregador e empregado.

    Em uma entrevista especial, o coorde-nador nacional do Programa Internacio-nal para Eliminao do Trabalho Infantil (IPEC) da Organizao Internacional do Trabalho (OIT), Renato Mendes, re-vela a experincia exitosa e os desafios do Brasil nesta rea. Destaca ainda a importncia da parceria da Anamatra para o sucesso da municipalizao das aes em todo o Pas.

    Na editoria Internacional, mostramos a China, hoje segunda maior potncia econmica do planeta, mas que ainda precisa avanar quanto s condies e relaes de trabalho, fazendo cumprir sua legislao trabalhista e as conven-es da OIT.

    Esta a primeira Revista Anamatra com a nossa diretoria frente da Entidade. Ela chega s suas mos com um projeto grfico moderno que tornar a leitura ainda mais agradvel. Por meio dela e de muitas outras aes, queremos reforar o dilogo e a interao com os nossos associados e com a sociedade, colaborando para uma justia mais acessvel, clere e efetiva.

    Uma tima leitura a todos!

    Em 2011, quando a Anamatra comemorou 35 anos de existncia, consolidando uma trajetria que transcende a defesa da classe e atinge a luta em prol dos direitos da sociedade, tivemos que travar mais uma dura batalha. Vimo-nos diante da necessidade de reivindicar e zelar com mais afinco pelos benefcios assegurados magistratura pela Constituio Federal e que garantem a independncia e autonomia do Poder Judicirio

    Com este intuito, lanamos um Movimento Nacional de Valorizao da Magistratura e do Ministrio Pblico, com outras nove entidades, que culminou em um ato realizado no ms de setembro em Braslia, com a participao de cerca de dois mil magistrados, promotores e procuradores. Depois, em parceria com a Ajufe, deflagramos em novembro o dia nacional de paralisao das atividades, com adeso de 80% dos juzes do Trabalho, tudo para chamar ateno para nossos pleitos.

    Alm disso, visitamos diversos parlamentares, ministros e autoridades dos Trs Poderes, na tentativa de sensibiliz-los, bem como de esclarecer a sociedade acerca da importncia do nosso pleito. A pauta da magistratura e dos membros do MP bsica e reivindica a instituio de uma poltica nacional de segurana, uma poltica remuneratria que garanta a recom-posio das perdas inflacionrias, que j chegam a mais de 22% nos ltimos cinco anos, e um sistema de sade que previna doenas fsicas e mentais, alm de uma adequada cobertura previdenciria.

    Nesta edio, a Revista Anamatra mostrar que a pesquisa realizada pela Entidade em parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais para apurar as condies de sade dos magistrados do Trabalho comprovou dados alarmantes de estresse e adoecimento entre os 700 juzes entrevistados. Apesar disso, o estudo revela que o nvel de satisfao com o trabalho, cuja meta fazer justia, tambm alto. Essas infor-maes respaldam a certeza de que o caminho pode ser longo, mas a nossa causa justa. Defend-la tambm contribuir com a sociedade por meio de uma prestao jurisdicional plena e satisfatria.

    Conquistas da Anamatra em 2011 Carta ao Leitor

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  • Brasil 1 Os desafios da magistratura brasileira

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    Sumrio Expediente

    2 edio / 2011 Revista Anamatra 1

    Os desa os da magistratura no Brasil

    Coordenador do IPEC destaca Brasil como exemplo internacional no Combate ao Trabalho Infantil

    Entrevista

    Magistrados do Trabalho na luta por direitos garantidos pela Constituio

    Brasil

    China: a 2 maior potncia econmica do mundo ainda ignora os direitos trabalhistas

    Internacional

    A difcil rotina de quem trabalha por uma Justia mais efetiva e clere

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    DIRETORIA ANAMATRA gESTO 2011-2013Presidente: Renato Henry SantAnna (Amatra 15/Campinas e Regio)Vice-presidente: Paulo Luiz Schmidt (Amatra 4/RS)Secretrio-Geral: Fabrcio Nicolau dos Santos Nogueira (Amatra 9/PR)Diretor Administrativo: Joo Bosco de Barcelos Coura (Amatra 3/MG)Diretor Financeiro: Gilberto Augusto Leito Martins (Amatra 10/DF e TO)Diretora de Comunicao Social: Cla Maria Carvalho de Couto (Amatra 1/RJ)Diretor de Prerrogativas e Assuntos Jurdicos: Vitor Leandro Yamada (Amatra 14/RO)Diretor de Assuntos Legislativos: Germano Silveira de Siqueira (Amatra 7/CE)Diretor de Formao e Cultura: Narbal Antnio de Mendona Fileti (Amatra 12/SC)Diretor de Eventos e Convnios: Andr Machado Calvancanti (Amatra 13/PB)Diretor de Informtica: Valter Souza Pugliesi (Amatra 19/AL)Diretora de Aposentados: Terezinha Clia Kineipp Oliveira (Amatra 10/DF e TO)Diretor de Cidadania e Direitos Humanos: Sandra Miguel Abou Assali Bertelli (Amatra 2/SP)Conselho Fiscal: Viviane Maria Leite de Faria, Luciana Paula Conforti , Leonardo Ely. Suplente: Adib Pereira Netto Salim

    EXPEDIENTE REVISTA ANAMATRA Ano: XXIII, Nmero: 62. Segunda Edio 2011.Jornalistas Responsveis por esta edio: Mariana Monteiro (Mtb 7859/DF e Viviane Dias (Mtb 22.651/RJ)Projeto Grfico, edio, reviso, direo de arte, diagramao e arte-final: i-ComunicaoReportagens: Camila Gurgel, Heitor Menezes, Neuza Lambert e Wemerson Santos Colaboraram nesta edio: Edna Kauss, Guilherme Guimares Feliciano, Jorge Luiz Souto Maior, Ktia Arruda e Paulo Paim Superviso: Cla Maria Carvalho de Couto, diretora de comunicao da AnamatraFoto da capa: Arte sobre foto de arquivo da Ascom TRT 14

    REPRESENTAO COMERCIAL Contato: (61) 3322-0266/ 3322-0720E-mail: [email protected] Impresso: Grfica ExecutivaTiragem: 6.000 exemplares

    CORRESPONDNCIAS Anamatra: SHIS Qd 06. Bl E, Conj A, Salas 604/607, Braslia DF, CEP 70316-000E-mail: [email protected]: www.anamatra.com.br

    * A Revista da Anamatra uma publicao da Associao Nacional dos Magistrados da Justia do Trabalho. No nos responsabilizamos por ideias e conceitos emitidos em artigos assinados, que expressam apenas o pensamento dos respectivos autores, no representando necessariamente a opinio da revista, nem da Anamatra. A publicao reserva-se o direito, por motivos de espao e clareza, de resumir cartas, ensaios e artigos.

  • Internacional China: a 2 maior potncia econmica do mundo precisa avanar nos direitos trabalhistas

    3 Carta ao LeitorPresidente da Anamatra faz um balano do ano dedicado defesa da valorizao da magistratura.

    6 Entrevista renato Mendes (OIt)A experincia exitosa do Brasil e o dever de municipalizar as aes no combate ao trabalho infantil.

    12 tripaliareAnamatra completa 35 anos de existncia em defesa dos direitos da magistratura e da sociedade.

    30 Brasil 3Regulamentao do ponto eletrnico e lei do aviso prvio beneficiam os trabalhadores.

    44 CulturaMinistra Ktia Arruda lana livro de contos infantis.

    35 Observatrio da OItBrasil realiza amplo processo de dilogo social para discutir Trabalho Decente.

    Brasil 2Nmeros alarmantes de acidentes de trabalho ainda no correspondem realidade absoluta.

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    CulturaA sensibilidade e talento da juza aposentada e artista visual Edna Kauss.

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    22 artigo 1: Guilherme Guimares FelicianoUm olhar crtico sobre o regime de previdncia complementar para os servidores pblicos federais

    28 artigo 2: senador Paulo Paim A trajetria de 30 anos na vida poltica em defesa da Constituio e do Direito do Trabalho.

    32 artigo 3: Jorge Luiz souto Maior A ratificao da Conveno 189 da OIT que assegura os direitos aos empregados domsticos.

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    Educao integral: uma das formas de acabar com o trabalho infantilRenato Mendes coordenador nacional do Programa Internacional para Eliminao do Trabalho Infantil IPEC da OIT fala sobre a erradicao do trabalho infantil

    Entrevista / Renato Mendes

    Crianas vendendo balas nas ruas ou limpando carros em vez de estarem na escola, desenvolvendo potencialidades. Cenas comuns no cotidiano brasileiro, que muitas vezes passam despercebidas como trabalho infantil. Mesmo 21 anos depois da criao do Estatuto da Criana e do Adolescente ECA pela Lei n 8.069, e dez aps ter ratificado a Conveno n 138 da Organizao Internacional do Trabalho, que estabalece a idade mnima de admisso para o trabalho, o Brasil ainda se v diante do desafio de cuidar melhor de suas crianas e adolescentes.

    De acordo com os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domiclios (PNAD), cerca de 4,2 milhes de brasileiros entre 5 e 17 anos trabalhavam em 2009. Apesar dessa dura realidade, o coordenador do Programa Internacional para a Eliminao do Trabalho Infantil (IPEC) da Organizao Internacional do Trabalho (OIT), Renato Mendes, revela que o Pas conquistou avanos significativos nesta rea nas ltimas duas dcadas, e hoje referncia para o mundo em polticas pblicas exitosas. Em uma conversa mais aprofundada sobre o tema, ele explica que agora a hora de combater o ncleo duro do trabalho infantil e suas piores formas at 2016, e municipalizar as aes. Isso, sem retroceder, no permitindo a utilizao de mecanismos como concesses judiciais para o trabalho infantil, que saltaram de 1.283 em 2005 para 5.927 em 2009.

    Renato Mendes reforou tambm a educao integral e o trabalho decente dos adultos como ferramentas imprescindveis para a erradicao do trabalho infantil, e fez questo de destacar que, para percorrer essa longa estrada, necessria a parceria permanente do Governo, da sociedade civil, de entidades e da administrao da Justia do Trabalho. Veja a entrevista.

    anamatra / Como o senhor avalia a situao do trabalho infantil no Brasil?Renato Mendes / Desde 1992, o Brasil teve um ndice de su-cesso de aproximadamente 50%, ou seja: metade das crianas foram retiradas do trabalho infantil. O ndice de matrculas e escolarizao no Pas tambm melhorou e chega a quase 100%. O terceiro indicador a universalizao de aes que cola-boram para a diminuio da pobreza, como o Bolsa Famlia, implementado pelo Governo Federal, que beneficia todos os municpios e famlias mais pobres do Pas. Esses trs indica-dores nos do a garantia de que o caminho da erradicao do trabalho infantil no Brasil sustentvel. No entanto, o fato de ter avanado no significa que o trabalho est concludo; a tarefa ainda rdua e neste momento o Brasil est enfrentando o que ns chamamos de ncleo duro do trabalho infantil, suas piores formas, aquelas em que tanto a administrao da justia quanto a poltica pblica e a prpria sociedade tm maior difi-culdade de visualizao e alcance.

    anamatra / A OIT elaborou um mapa para a eliminao das piores formas de trabalho infantil at 2016. Quais so as estratgias tra-adas neste sentido? Mendes / Em 2010, na cidade de Haia, na Holanda, ns tivemos

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    a segunda Conferncia Mundial de Erradicao do Trabalho Infantil. Efetivamente, o mundo, e nesse caso o Brasil, assumiu as metas de erradicao das piores formas de trabalho infantil at 2016, e de todas as formas de trabalho infantil at 2020. Agora, como erradicar? L foram traadas algumas diretrizes, mas aqui entra outra estratgia da OIT em parceria com o Governo e com a sociedade: a elaborao e promoo de uma agenda de trabalho decente. Trabalho infantil no se erradica apenas afastando crianas do trabalho e colocando-as na escola, mas tambm criando oportunidades de trabalho decente para a sociedade adulta, porque uma famlia com melhores condies de trabalho cumpre melhor a sua funo protetora em relao criana, da mesma forma que um educador que tem boas condies de trabalho consegue promover uma educao de melhor qualidade.

    anamatra / Na contramo desse processo, em uma espcie de retrocesso, o Ministrio Pblico tem denunciado um aumento exorbitante de concesses das autorizaes para o trabalho infantil. Como o senhor avalia essa situao?Mendes / A tendncia, quando se fala em tantas autorizaes ju-diciais, que a sociedade e a opinio pblica queiram saber em que medida o juiz ou o promotor pblico esto escorregando

    na sua atividade tica e moral. Este no o elemento mais im-portante. O foco das discusses deve ser os direitos das crianas e dos adolescentes. A Conveno n 138 tem dois princpios fun-damentais: o estabelecimento da idade mnima de admisso ao trabalho e o aumento progressivo desta idade mnima. Ela prev algumas excees desde que os direitos fundamentais das crian-as estejam devidamente protegidos. Em caso de trabalho por motivos fticos, justificveis, um auditor mdico do trabalho de-veria examinar as condies de trabalho para verificar se o am-biente no nocivo criana e s depois do laudo tcnico que poderia haver essa autorizao judicial, e no de forma aleatria. Agora, quando o elemento da autorizao judicial est funda-mentado na discricionariedade do administrador da justia, do administrador das relaes do trabalho ou via Executivo brasi-leiro, existe um grande perigo de que isso leve arbitrariedade.

    anamatra / O que a OIT pode fazer para minimizar esse nmero de concesses? Mendes / A OIT no um ator interveniente no processo, uma facilitadora de dilogo entre as partes implicadas, e ten-ta estabelecer os critrios. Neste segmento, o fundamental a defesa dos direitos da criana e do adolescente. Uma vez que o trabalho infantil uma violao a esses direitos diante de

    BrasILAes do governo

    colaboram para erradicao

    da pobreza e consequentemente do trabalho infantil

    Trabalho infantil no se erradica

    apenas afastando crianas do trabalho

    e colocando-as na escola, mas

    tambm criando oportunidades de trabalho decente para a sociedade

    adulta

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    qualquer medida que venha a flexibiliz-los, o Estado brasilei-ro tem de estar de prontido. Em primeiro lugar, por se tratar de uma criana que est em fase de crescimento, em segundo, porque tambm reflete o projeto de desenvolvimento do Pas. O Brasil, neste momento, tem assumido um papel de liderana em um cenrio de globalizao, portanto, se ele no qualifica a mo de obra, no ter condies de igualdade na competitivi-dade internacional. No momento em que ratificou a Conveno n 138, o Pas se comprometeu, como membro fundador da OIT, a aplicar efetivamente essas obrigaes. Ao no cumpri-las e iniciar de forma massiva essas excees, o Brasil pode suscitar na comunidade internacional a interpretao de que no est alinhado a esses interesses.

    anamatra / Nesse caso, que tipo de consequncia poderia ser gerada para o Brasil?Mendes / Uma vez que a OIT um organismo tripartite, for-mado por organizaes de empregadores, trabalhadores e governo, um desses trs atores poderia apresentar uma queixa OIT para que o comit de peritos investigue a situao e solicite esclarecimentos ao Brasil por no estar observando esse preceito assumido internacionalmente, e isso seria levado Con-ferncia Internacional. A segunda possibilidade seria de o Estado brasileiro, de forma soberana, dizer que no tem mais condies de ratificar a conveno e que quer desratificar. O que chamamos de denunciar a conveno. Neste caso, teria de apresentar OIT sua manifestao, o que obviamente traria consequncias diplomticas e morais muito grandes para o Pas l fora, sobretudo por ser um lder na matria e pelo fato de a comunidade internacional estar es-perando para saber o que deu certo, como deu certo e quais so os avanos do Pas. Alm disso, mesmo que o Brasil fale eu no quero mais ratificar essa conveno, isso no o desobriga a cumpri-la. A alternativa seria desfiliar-se da OIT, o que tambm seria gravssi-mo, por ser membro fundador da Entidade.

    anamatra / Todos os anos, no dia 12 de junho, a OIT lana uma campanha anual de combate ao trabalho infantil e a deste ano est focada no trabalho perigoso. Quais so as situaes tidas como perigosas?Mendes / H um elemento constitutivo do trabalho de uma criana e de um adolescente que socializador, quando eles aprendem a trabalhar, com carter educativo e que no se sobrepe aos direitos que lhes so assegurados, at mesmo porque esta forma de aprendizagem estabelecida na legislao nacional est bem clara e regulamentada. Alm desse elemento da aprendizagem, que uma exceo da Constituio Federal, existe o Decreto n 6.481/2008, que estabelece 96 atividades consideradas perigosas. Em um sistema tripartite, foi traado um mapa de risco e segurana no trabalho definindo, dentro de determinada cadeia produtiva, quais so os momentos que requerem maior proteo e que, consequentemente, oferecem maior risco para a criana e o adolescente, tornando-os mais vulnerveis. Feito esse mapa de risco, foram determinadas, den-tro da lista de ocupaes brasileiras, as atividades chamadas pe-rigosas, que abrangem desde a execuo do trabalho domstico (perigoso pelas condies de realizao) at aquelas chamadas perigosas pela sua natureza, como: agricultura do fumo, coleta de mariscos em profundidade ou trabalho com pedra-sabo.

    anamatra / Como combater especialmente essas formas perigosas de trabalho infantil? Mendes / A funo primordial do Ministrio Pblico do Trabalho e da sociedade civil verificar se as nossas crianas

    Como resultado expressivo dessas iniciativas, hoje o

    Governo Federal j tem como poltica nacional, dentro do Brasil Sem Misria,

    a metodologia de identificao

    ativa necessrio no esperar a

    denncia, e sim ir atrs do que est

    acontecendo

    MEtasErradicar no Brasil

    as piores formas de trabalho infantil at 2016 e eliminar todas as formas de

    trabalho infantil at 2020

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    esto envolvidas nessas atividades e, portanto, a outra Conveno, a 182, diferentemente da 138, estabelece outro critrio, o da urgncia e do imediatismo se uma criana ou um adolescente est envolvido em uma dessas atividades, deve ser retirado de forma imediata, a ao tem de ser urgente. Ela no progressiva, como a 138, porque o critrio fundamental a integridade fsica e a vida dessa criana. Essas atividades so perigosas justamente por isso, pois a criana fica exposta de forma imediata, no uma questo crnica, e sim aguda, por isso a ao do Estado tem de ser imediata.

    anamatra / Quais so as metas e resultados esperados com essa Campanha?Mendes / Todos os anos definem-se algumas prioridades para fomentarmos o debate nacional. Neste ano, com relao s piores formas de trabalho infantil, o que se espera como resultado que se aumentem a fiscalizao, a escolarizao, a qualidade da educao e que sejam reduzidos os nmeros desse tipo de trabalho perigoso. Ns temos visto que nos l-timos anos as campanhas tm criado um ambiente favorvel para a conscientizao da populao, inclusive com o aumen-to do nmero de denncias por meio do Disque 100. Os pro-cessos que mais tm chamado ateno so o desenvolvimento de polticas pblicas e os laboratrios vivos que temos aqui. Tanto que, nas ltimas campanhas, comeamos a trabalhar os temas da educao, do trabalho perigoso e do mapeamen-to para sabermos onde esto essas crianas. Como resultado expressivo dessas iniciativas, hoje o Governo Federal j tem como poltica nacional, dentro do Brasil Sem Misria, a me-todologia de identificao ativa necessrio no esperar a denncia, e sim ir atrs do que est acontecendo.

    anamatra / Qual a real importncia de a sociedade participar, denunciar, usar o Disque 100?Mendes / A sociedade civil brasilei-ra, a sociedade civil organizada, desde 1992 tem tido um papel fundamental no controle social e poltico das aes pblicas; por outro lado, tambm uma das principais empregadoras da mo de obra infantil. Ento, hoje, o ncleo duro do trabalho infantil no est na mo do grande empresrio, nem na economia formal, e sim na informal. Quem so os empregadores domsticos? Somos ns, da sociedade civil. Quem so os com-pradores de balas e outros servios nos semforos? Somos ns. Quem compra flores nos bares e restaurantes das grandes cidades brasileiras? A so-ciedade civil. Ns somos os compra-dores do trabalho infantil. Ento muito importante que a sociedade, alm de fazer o controle, seja con-sequente quando vir uma criana trabalhando, preciso ter discernimen-to para entrar em contato com ela de forma pedaggica, mostrar o risco e ajud-la. No justo pr-conden-la pelo fato de ela ser pobre, achando que ela tem somente dois destinos fatais: trabalhar ou ser delinquente.

    InFOrMaEs Saiba mais

    como denunciar a explorao

    infantil no site www.disque100.

    gov.br

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    anamatra / Ou seja, a pobreza no pode se tornar uma espcie de libi ou justificativa para o trabalho infantil, isso?Mendes / Sem dvida alguma, porque trabalho trabalho. Trabalho infantil aquele realizado por um menor de 16 anos ou, se uma atividade perigosa, menor de 18 anos, indepen-dentemente se de classe alta, mdia ou baixa. O importante que o gestor pblico, o administrador de justia, no caia no facilismo, na inverso dos valores, e acabe delegando criana a responsabilidade de se proteger. Somos ns os chamados, por direito, dever e tica, a proteger essa criana. Quando algum vem me pedir uma autorizao para trabalhar, para mim, muito mais fcil buscar a polcia pblica disponvel para prote-ger essa criana. Acionar a famlia muito mais difcil, porm mais efetivo do que eu fazer a autorizao judicial para isso que a OIT vem chamando a ateno. Hoje, o Brasil tem poltica pblica, j atualizou suas polticas sociais e no tem desculpa para no buscar a proteo da criana.

    anamatra / O que falta ento para que essa proteo se torne mais efetiva, uma vez que o Pas j avanou em legislao e polti-cas pblicas? Falta fiscalizao, vontade poltica?Mendes / A manuteno do trabalho infantil, por um lado, se d por ausncia ou insuficincia da poltica pblica. Ento, quando voc analisa o territrio nacional, h maior concen-trao de trabalho infantil exatamente onde a poltica pblica mais escassa, insuficiente ou inexistente estamos falando do Nordeste do Brasil, especialmente do semirido, do setor florestal. Por outro lado, o desenvolvimento econmico do Pas tem de trazer providncias sociais para que a sociedade deixe de consumir trabalho infantil. A pobreza e a cultura podem at ser evocadas para explicar o trabalho infantil, jamais para justific-lo. Tambm importante refletirmos acerca de que as estratgias acertadas das dcadas passadas no necessariamente sero as mais adequadas daqui para frente. Hoje, o Brasil tem outro nvel de desenvolvimento, novas relaes de trabalho e trabalhos que nem existiam naquele momento. necessrio ficar atento a esta nova dinmica do mercado de trabalho. Por isso, quando se promove a agricul-tura familiar preciso ter regras muito claras para no obrigar o pequeno agricultor a envolver toda a famlia, inclusive seus filhos. Esta uma questo no s de assertividade da poltica pblica, mas tambm de conscincia social do cidado.

    anamatra / At que ponto a educao integral, defendida pelo senhor, pode ajudar de fato na erradicao do trabalho infantil? Mendes / Nos ltimos anos, como resposta a toda essa proble-mtica, a OIT tem insistido na ampliao do acesso educa-o, na melhoria das condies do trabalhador da educao, na qualidade da educao e na criao dos espaos da educao. Quando se fala de educao integral, no deixar a criana dentro da escola todo o dia, pois no se trata de ocupao do tempo livre dessa criana, e sim de uma educao que pro-porcione o direito de aprender a aprender, a fazer, a ser e a conviver, elementos bsicos da educao integral. O Brasil tem avanado. Por emenda constitucional, tomou uma determina-o bastante radical e aumentou a escolaridade at os 17 anos, que um dos compromissos que estavam pendentes com a Conveno n 138 da OIT. Agora, o segundo passo aumen-tar e no reduzir a idade de admisso ao trabalho. No atual nvel de desenvolvimento macroeconmico do Pas, no exis-tem justificativas para admitir mo de obra abaixo de 18 anos. Diferentemente de pases da sia, frica e outros da Amrica Latina, o PIB brasileiro j no necessita da mo de obra infantil.

    anamatra / A OIT lanou uma cartilha norteadora para a imprensa sobre como tratar o tema. Outro assunto diz respei-to s redes sociais Como elas podem ajudar? Mendes / Desde o incio da dcada de 1990, a imprensa tem sido a principal aliada na luta pela erradicao do trabalho infantil, ela que consegue comunicar aonde a poltica pblica no consegue chegar, alm de ditar pautas e comportamentos sociais. O formador de opinio tem papel fundamental na mudana de comportamento e de cultura, e, por isso, sempre foi considerado aliado estratgico nas campanhas e nos pro-cessos de preveno e de diminuio do trabalho infantil, sobretudo na qualificao do debate. O trabalho infantil no pode ser tratado com achismos. A imprensa tem trazido tona um debate qualificado com base no direito fundamental da criana e seu desenvolvimento pleno por meio da educa-o. Agora, o meio da comunicao tambm composto por setores que precisam ser enfrentados e discutidos, como o trabalho infantil na publicidade. Grande parte das autoriza-es judiciais realizada para adolescentes e crianas traba-lharem na publicidade. O uso de crianas em trabalhos tidos como artsticos, esportivos ou publicitrios ainda so conside-rados como glamourosos.

    anamatra / Qual a importncia de se fomentar a Rede Latino- Americana contra o Trabalho Infantil? Mendes / Com a integrao do mercado comum e agora com

    EsCOLarIzaOA OIT tem insistido

    na ampliao do acesso educao,

    na melhoria das condies do

    trabalhador da educao, na qualidade da

    educao e na criao dos espaos

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    a integrao da Amrica Latina como bloco, os movimentos sociais comeam a ser partilhados alm das fronteiras. A migra-o mais fcil entre os povos acaba levando o problema de um lugar para outro. Os pases precisam entender que responsabi-lidade de todos, dentro ou fora de seu territrio. Por isso, o res-surgimento desse movimento regional que a OIT e empresas do setor privado esto promovendo com grandes parcerias inter-nacionais justamente para comear a debater as manifestaes modernas do trabalho infantil. Quando poderia se pensar que crianas bolivianas com suas famlias trabalham em situaes precrias e anlogas escravido dentro de empresas brasileiras? Hoje, isso j uma realidade-foco. Quando, nas dcadas passa-das, poderia ser discutido, de forma politicamente adequada, o tema dos indgenas guarani migrantes entre o Paraguai, Bolvia, Argentina e Brasil? So povos que tm seu processo de transio, por meio dos seus ritos sagrados, e que necessitam de proteo. Nesse sentido, a rede de proteo vem a ser acionada especial-mente porque estamos em um processo de preparao para a Terceira Conferncia Mundial, que vai acontecer aqui no Brasil em 2013. necessrio que se tenha um ambiente favorvel para o cumprimento das metas de proteo das crianas, at porque o Brasil foi escolhido por aclamao para sediar e liderar esse processo, cooperando por meio da transferncia de tecnologia social. desta forma que a OIT e outras agncias da ONU atuam para que os pases dialoguem e analisem o que est dando certo e pode ser replicado em outro lugar.

    anamatra / Que experincias realizadas no Brasil podem ser consideradas exitosas?Mendes / Na sociedade civil, o Frum Nacional, que vai com-pletar 20 anos, congrega todos os atores que atuam no combate ao trabalho infantil e o grande articulador e mobilizador nacional e local com relao ao tema. Ele faz a fiscalizao da poltica pblica, analisando, solicitando a incidncia poltica e promovendo o debate. Na seara governamental, o Brasil est se preparando para desenvolver a educao integral, apesar de ser um pas em desenvolvimento. Aumentou a idade escolar obri-gatria para quatro a 17 anos, ampliando a escolarizao. Na poltica social, tem focalizado a erradicao da pobreza, uma das grandes causas do trabalho infantil. Na sade, implemen-tou as diretrizes nacionais dentro da rede de vigilncia epi-demiolgica do SUS para a identificao de casos de crianas doentes relacionados ao trabalho infantil. Com isso, possvel dimensionar a gravidade da situao dos acidentes de trabalho que envolvem crianas. E para se ter uma ideia, nos ltimos quatro anos, quatro crianas foram atendidas por dia no SUS por acidentes graves ou fatais relacionados ao trabalho infantil. Tambm importante destacar que as empresas fizeram seu dever de casa e a economia formal praticamente eliminou o trabalho infantil. Agora, o desafio eliminar o trabalho infan-til na cadeia produtiva, uma vez que, dentro de um processo de globalizao, o Pas comeou a terceirizar e quarteirizar os servios. Se no h critrios objetivos e condies de trabalho decente para esses trabalhadores terceirizados, pode-se motivar o recrudescimento do trabalho infantil.

    anamatra / Quais so os resultados concretos da parceria da OIT com a Anamatra para o combate ao trabalho infantil?Mendes / As relaes cordiais da OIT e da Anamatra so de longa data. A Anamatra e as Amatras sempre qualificaram os debates em nvel nacional por meio da promoo e participa-o de eventos nacionais sobre competncia de autorizaes judiciais e sobre os critrios para a relao de trabalho na aprendizagem dos jovens adultos, e isso tem sido fundamental para melhorar a poltica pblica e a administrao da justia com relao ao mundo do trabalho. Mas, recentemente, essa parceria tem inovado ao levar essa informao essencial para o pblico com o lanamento de cartilhas ilustradas na Confern-cia Mundial do Trabalho, em Lima. Elas tm tido grande su-cesso tanto l fora quanto aqui por terem conseguido sintetizar o que so os direitos fundamentais do trabalhador e a maneira como eles permeiam a vida da sociedade e so o fundamen-to da democracia. A cartilha veio, de maneira quase proftica, preconizar o cuidado, neste momento de crise internacional, para que o desenvolvimento econmico dos pases esteja vin-culado ao desenvolvimento social e tico. A parceria da OIT com a Anamatra tem sido fundamental para a sustentabilidade do dilogo social. O apoio que ela tem dado por meio das Amatras ao Frum Nacional agrega qualidade e credibilidade aos debates nos estados. Por meio desta parceria da OIT com o Governo Federal e com as instituies de administrao da justia, como a Anamatra e o Ministrio Pblico do Trabalho, ns estamos desenvolvendo um processo duplo: identificao ativa ( preciso saber onde esto essas crianas residuais do trabalho infantil no Pas) e municipalizao da poltica nacional de erradicao do traba-lho infantil. Uma poltica, para ser pblica, precisa ser univer-sal e obrigatria, no pode depender da adeso do municpio. Por isso, a estratgia com a Anamatra e as Amatras nos estados pode colaborar para que a poltica pblica se municipalize.

    Desde o incio da dcada de 1990, a imprensa tem sido a principal

    aliada na luta pela erradicao do

    trabalho infantil, ela que consegue comunicar aonde a poltica pblica

    no consegue chegar, alm de

    ditar pautas e comportamentos

    sociais

    PartICIPEEnvie seu

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  • 12 Revista Anamatra 2 edio / 2011

    Empresas beneficiadas com incentivos fiscais para a Copa podem ser obrigadas a contratar pessoas com deficincia

    Fundadores e ex-presidentes so homenageados em festa pelos 35 anos da anamatra

    Projeto de Lei do Senado, PLS n 506/2011, apresentado em novembro de 2011 pelo senador Lindbergh Farias (PT-RJ) e aprovado pela Comisso de Direitos Humanos, prev que as empresas que quiserem benefcios fiscais por atuarem em atividades relacionadas aos Jogos Olmpicos de 2016 e Copa de 2014 tero que destinar, pelo menos, 5% de seus postos de trabalho a pessoas com deficincia. Para alcanar tal objetivo, o PLS promove alteraes na Lei n 12.350/2010, a qual regula medidas tributrias relativas a esses grandes eventos esportivos. De acordo com o parecer, a proposio tem o mrito de inserir as pessoas com deficincia nas oportunidades de emprego que devero surgir principalmente com a Copa do Mundo e as Olimpadas. Em carter conclusivo, a iniciativa vai ser apreciada pela Comisso de Assuntos Econmicos.

    Os 35 anos de existncia da Anamatra e sua atuao marcante no mbito da Justia do Trabalho foram comemorados em Braslia, em uma solenidade que contou com a presena de vrias autoridades, alm de fundadores e ex-presidentes da Entidade.

    O ministro Ronaldo Lopes Leal (Amatra 4/RS), primeiro presidente da Anamatra, destacou que ao longo dos anos a Entidade passou a de-fender no s os interesses da magistratura, mas tambm os direitos humanos e das minorias. Leal e outros fundadores da Associao pre-sentes, entre eles Gensio Vivncio Solano Sobrinho (Amatra 15/Cam-pinas e Regio), Horcio de Senna Pires (Amatra 5/BA), Marilda Izique Chebabi (Amatra 15/Campinas e Regio) e Vicente Jos Malheiros da Fonseca (Amatra 8/PA) receberam uma medalha em comemorao data.

    Alm disso, tambm foram homenageados os ex-presidentes da Anamatra presentes: Antnio Carlos Facioli Chedid, Cludio Jos Montesso, Fernando Amrico Veiga Damasceno, Grijalbo Fernandes Coutinho, Gustavo Tadeu Alkmim, Hugo Cavalcanti Melo Filho, Ilce Marques de Carvalho, Ivanildo da Cunha Andrade e Luciano Athayde Chaves.

    Todas as 24 Amatras, assim como todos os membros da atual diretoria da Anamatra, tambm foram agraciados com placas e me-dalhas. O evento foi marcado ainda pelo lanamento da reedio do livro publicado pela Entidade: Trabalho escravo contemporneo: o desafio de superar a negao, organizado pelo ex-diretor de direitos humanos da Anamatra, Marcos Fava, e pelos juzes Andra Nocchi e Gabriel Napoleo Velloso Filho.

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    Implantao de tribunais regionais Federais (trFs)

    Demitidos e aposentados: direito a extenso da cobertura mdica

    Grupo de trabalho do CnJ vai propor melhorias para a sade da magistratura

    Foi lanada no ltimo dia 1 de dezembro a Frente Parlamentar Mista, que vai defender a criao dos TRFs nas regies: 6 (Paran), 7 (Minas Gerais), 8 (Bahia) e 9 (Amazonas). Formada por 223 integrantes, entre deputados e senadores, a Frente mobilizar o Congresso Nacional em relao necessidade da criao desses tribunais. At ento, os processos judiciais relativos a esses estados so julgados nos cinco TRFs j existentes no Pas, em outras capitais das respectivas regies.

    A Agncia Nacional de Sade Suplementar (ANS) aprovou uma norma que assegura aos profissionais demitidos sem justa causa e aos aposentados a manuteno do plano de sade empresarial que utilizavam no exerccio da funo. A medida, segundo a ANS, entrar em vigor em fevereiro de 2012, e valer desde que a pessoa assuma o pagamento integral das mensalidades. Convm destacar que o direito j estava previsto na Lei n 9.656, de 1998, porm em alguns casos o empregado, por no ter conhecimento sobre o benefcio, acabava tendo que pagar mais caro e efetuar um novo convnio. Desta forma, a ANS pretende tornar a norma de conhecimento pblico.

    O presidente do Conselho Nacional de Justia, ministro Cezar Peluso, criou um grupo de trabalho especfico para elaborar estudos e propor aes voltadas para melhorar as condies de sade dos magistrados e servidores do Poder Judicirio. A iniciativa vem ao encontro do pleito defendido pela Anamatra e corroborado pela pesquisa desenvolvida pela Entidade em parceria com a Universidade Federal de Minas Gerais, que comprovou elevados indicadores de estresse e precrias condies de trabalho entre os magistrados.

    Vrios tribunais demonstraram pre- ocupao com os ndices de licenas e afastamentos causados por doenas decor- rentes do trabalho e, por isso, sugeriram que fosse includa uma meta nacional relacionada a programas de preveno e promoo da sade nos tribunais, relata o juiz auxiliar Antnio Carlos Alves Braga Jnior, que coordena o grupo.

    Segundo ele, entre as alternativas possveis esto a criao pelo CNJ de um programa de preveno e pro-moo da sade em carter experimental que poder ser replicado nos demais tribu-nais, ou mesmo a adoo nacional de alguma ao j bem-sucedida nas regies. A expectativa que o gru-po apresente sugestes presidncia do CNJ ainda no primeiro trimestre de 2012.

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  • 14 Revista Anamatra 2 edio / 2011

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    Quando a vontade de fazer justia fala mais alto

    Diariamente, 3.117 juzes do Trabalho enfrentam as mais diversas dificuldades para garantir o acesso justia

    a milhares de brasileiros. A rotina permeada por processos, intermediao de conflitos, audincias, viagens, constante estudo e aperfeioamento, em uma estrutura por vezes precria, precedida por uma maratona que tambm exige esforo e dedicao.

    Atrados pelo idealismo de cola-borar com um pas mais justo e pela estabilidade to propagada sobre a profisso, centenas de bacharis em Direito lotam as salas dos cursos pre-paratrios em todo o Pas com o firme propsito de seguir a carreira da magis-tratura. Nesta fase, diante do sonho de ser juiz, os obstculos tornam-se prati-camente imperceptveis.

    Em tese, o concursando sabe que ter de se mudar de onde mora e trabalhar com dedicao, mas o foco que se d sobre a parte boa da carreira, refora o brasiliense Rinaldo Rapassi (41), recm-nomeado juiz auxiliar de Bom Jesus da Lapa, na Bahia.

    Rapassi foi servidor pblico e advogou na rea trabalhista por seis anos, tendo que conciliar trabalho e estudo at conseguir passar no concurso para o novo ofcio. No entanto, os desafios maiores s se manifestaram aps a nomeao. Assim que

    voc convocado a tomar posse, a vida muda muito mais do que se poderia imaginar, revela.

    Segundo ele, algumas vezes o juiz substituto no tem sala, telefone e muito menos computador exclusivo. Depois da posse, tudo isso teve que caber na mochila que levo sempre s costas, inclusive a toga. Ainda sobre o incio da carreira, quando atuou cinco meses como juiz substituto, explica que: a quan-

    tidade de trabalho aumenta muito se somada s tarefas administra-tivas, como as do vitaliciamento, treinamento constante realizado s vezes em lugares que distam cerca de 1.000 quilmetros de onde se oficia, e at que se ganhe prtica pode causar insnia.

    Outra questo apontada diz respeito insegurana de quem escolhe a profisso. O juiz corre mais risco de morte. Personifica o Estado ao decidir e, por isso, expe-se ao contato com as par-tes. Para evitar qualquer ideia de parcialidade, tambm restringe sua vida social.

    Apesar das dificuldades, Rinaldo Rapassi diz que movido pelo interesse de servir ao Pas e se entusiasma ao falar sobre a

    Texto / Camilla Gurgel

    Brasil 1 / Valorizao

    Em tese, o concursando sabe que ter de se mudar de onde mora e trabalhar

    com dedicao, mas o foco que se d sobre a parte

    boa da carreiraRinaldo Ripassi

    Juiz auxiliar de Bom Jesus da Lapa (BA)

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  • nome: Antnio Csar Coelho de Medeiros PereiraIdade: 36 anosnaturalidade: Recife (PE)Profisso: Juiz Titular de Cruzeiro do Sul (AC) h 5 anosMunicpios atendidos: Quatro da jurisdio de Cruzeiro do Sul: Mncio Lima, Rodrigues Alves, Marechal Thaumaturgo e Porto Walter. No Programa Justia a Bordo: Santa Rosa do Purus e Jordo

    2 edio / 2011 Revista Anamatra 17

    As dificuldades so vrias: temperatura elevada; necessidade de deslocamento a p e de barco; a infraestrutura precria dos municpios,

    tudo isso torna a atividade desafiante. Porm, prazeroso identificar que a magistratura influencia decisivamente a vida dos cidados

    Antnio Csar Coelho de Medeiros PereiraJuiz Titular de Cruzeiro do Sul (AC)

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    recompensa de todo esse esforo. Mergulhar nos fatos de ou-tras pessoas, de l emergir com a delimitao da providncia necessria e, efetivamente, atender a quem no tinha at ento nenhuma ajuda prtica uma alegria. Devolver um sorriso quando se tem convico do merecimento ou a paz s pessoas da sua comunidade d prazer, completa.

    J o juiz do Trabalho Gerfran Brasil (41) carioca e desde os 10 anos de idade mora no estado do Amazonas. No decorrer de sua carreira de magistrado, tem enfrentado situaes que beiram aventura. A geografia do estado com rios caudalosos e largos, clima quente e quase sempre chuvoso, alm das longas distncias, agregam ainda mais empecilhos para que as comu-nidades ribeirinhas tenham acesso Justia. As caractersticas naturais impedem tambm a construo de estradas. Assim, a locomoo se d, em geral, pelos rios e, onde possvel, de avio. Eu, por exemplo, trabalho em Tabatinga, para onde h voos dirios partindo de Manaus, que duram 2 horas e 30 minutos. Essa viagem pode durar uma semana se feita de barco e ainda h lugares de acesso muito mais difcil.

    As deficincias vo desde a infraestrutura, com poucos aeroportos e embarcaes nem sempre confortveis, preca-riedade das instalaes prediais. Embora o Tribunal de Justia do estado nos oferea seu auxlio, geralmente seus prdios so pequenos. Por isso, costumamos contar com o apoio das cmaras municipais, onde h mais espao para atender ao pblico.

    Uma das metas do Projeto Justia Itinerante exige que os juzes da 11 Regio visitem cada um dos municpios do Amazonas pelo menos uma vez por ano. Em algumas situa-es, eles contam at com o apoio da Marinha para vencer os percursos mais longos. Em vez de o cidado precisar se des-locar a uma vara localizada a dias de viagem de sua residncia, mais sensato e justo que o juiz se desloque, de tal sorte que o Estado cumpra seu dever de oferecer o servio pblico, afirma.

    Durante os atendimentos, eles realizam audincias e rece-bem novas aes ajuizadas. No meu caso, atendo jurisdio sobre seis municpios, alm da sede da vara. Normalmente,

    Oferecemos acesso jurisdio a pessoas que jamais o teriam se no

    fssemos at elas, para muitas pessoas nossas visitas so seu primeiro contato

    com o universo da Justia.gerfran Brasil

    Juiz do Trabalho em Tabatinga (AM)

    fao trs viagens anuais, atendendo dois municpios de cada vez, fazendo uma ou outra repescagem se houver um nmero relevante de processos ainda pendentes no exerccio, explica.

    Desde 2009, quando assumiu a vara trabalhista de Tabatinga, Gerfran Brasil calcula que j foram realizadas no mnimo 1.000 audincias fora da sede. A dois dias de viagem de uma vara trabalhista, quase ningum, em um lugar como o interior do Amazonas, reclamaria seus direitos. Por tudo isso, o juiz ressalta o que mais gratificante: Oferecemos acesso jurisdi-o a pessoas que jamais o teriam se no fssemos at elas, para muitas pessoas nossas visitas so seu primeiro contato com o universo da Justia.

    Ainda na regio Norte do Pas, os estados de Rondnia e Acre oferecem melhores instalaes para o trabalho, com sedes prprias para quase todas as unidades judicirias, providas de computadores adequados. o que revela o juiz trabalhista e diretor de Prerrogativas e Assuntos Jurdicos da Anamatra, Vitor Yamada.

    rOtInaPara Rinaldo Rapassi (acima) as dificuldades da profisso so compensadas pela oportunidade de promover justia. J Vitor Yamada ( direita) destaca a presso imposta pelas metas do CNJ

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    No que se refere s condies para o exerccio da Justia Itinerante na Regio, Yamada explica que ainda h muita dificul-dade em fazer compreender algumas necessidades bsicas dos juzes de 1 grau, principalmente nos deslocamentos a servio. Segundo ele, esses anseios so tidos equivocadamente como pseudoprivilgios, quando na realidade trata-se de mero forne-cimento de condies e ferramentas de trabalho.

    Desta vez falando como diretor de Prerrogativas e Assuntos Jurdicos da Anamatra, ele destaca que a presso maior sobre os juzes, hoje em dia, deve-se ao cumprimento das metas do Conselho Nacional de Justia, que se tornou verdadeiro suplcio para os magistrados.

    O atingimento, a qualquer custo, dos ndices de produtividade estabelecidos anualmente pelo CNJ passou a ser o primeiro, seno o nico, objetivo dos tribunais, que por meio de suas corregedorias passaram a exercer desmensurada cobrana por resultados e constrangedora fiscalizao do trabalho do juiz, isto sem levar em considerao a velha conhecida deficincia estrutural do Poder Judicirio, diz ele.

    Neste sentido, com o intuito de colaborar para melhores condies de trabalho e ao mesmo tempo para uma justia mais clere e efetiva, ele revela que a Anamatra criou uma comisso permanente que debate as metas e prope novas ideias para solucionar os problemas do Poder Judicirio sem sacrificar a qualidade do trabalho e principalmente a higidez fsica e mental daqueles que o executam, os juzes.

    As sugestes para o planejamento da Justia do Trabalho para os anos 2012 e 2013 foram, inclusive, encaminhadas ao Conselho Nacional de Justia.

    O trabalho desenvolvido pelos colegas juzes que com-pem a referida comisso tem por finalidade, justamente, equacionar o problema meta X estrutura, pois a Entidade entende que sem condies adequadas de trabalho o resultado dessa presso pela busca desenfreada dos nmeros, tanto para o cidado quanto para o magistrado, ser nefasto, conclui.

    Pesquisa comProva alto nvel de estresseUm estudo realizado pela Anamatra em parceria com

    a Fundao de Desenvolvimento da Pesquisa (Fundep) da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) apurou a situao de sade e as condies do exerccio profissional dos magistrados do Trabalho. A pesquisa, realizada entre novem-bro de 2010 e fevereiro de 2011, com a participao de mais de 700 associados, revelou alto nvel de estresse e adoecimento ocasionado por trabalho intenso em condies precrias.

    De acordo com o diretor de Assuntos Legislativos da Anamatra, Germano Siqueira, a iniciativa foi motivada por quei-xas recorrentes dos juzes do Trabalho em vrios estados. Mesmo afirmando que o estresse algo inerente atividade do juiz, ele re-conhece que no esperava indicadores to significativos. Quando a professora Ada vila, coordenadora da pesquisa, nos apresentou os resultados iniciais, fomos tomados de surpresa porque a expec-tativa no era de um resultado to impactante.

    Em contrapartida aos dados alarmantes de estresse e ado-ecimento, os respondentes revelaram gratificao, satisfao e envolvimento com o trabalho cujo produto fazer justi-a. Uma motivao que vem assegurando altos ndices de

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    A ressalva do juiz, porm, diz respeito m qualidade do acesso internet, que precisa ser aprimorado especialmente visando implantao do PJe (Processo Judicial Eletrnico). Outro problema tem sido a falta de recursos humanos. H carncia de magistrados e uma dificuldade enorme em prover estes cargos vagos na Regio. Faltam tambm servidores em grande parte das unidades, notadamente as de 1 grau, resultado da concentrao de pessoal na rea administrativa, o que acaba prejudicando a atividade-fim do Judicirio. Yamada acrescenta que o Conselho Superior da Justia do Trabalho vem tentando estabelecer um patamar estrutural mnimo a ser observado pelos tribunais, com forte resistncia destes, que relutam em cumprir a Resoluo n 63/2010 (que dispe sobre a padronizao da estrutura organizacional e de pessoal), j modificada pela Resoluo n 83/2011.

    InFOrMaEs Veja os dados completos da pesquisa no site da Anamatra, em Publicaes

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    produtividade. De acordo com o rela-trio Justia em Nmeros, divulga-do no ltimo ms de agosto pelo CNJ, referente a 2010, a Justia do Trabalho apresentou aumento no quantitativo de sentenas (6%) e reduo do nmero de magistrados (-2%), ocasionando cresci-mento do total de sentenas proferidas por magistrados entre 2009 e 2010. Ao mesmo tempo em que a carga de traba-lho da Justia do Trabalho aumentou, sua taxa de congestionamento diminuiu.

    Logo, para Germano Siqueira, se os juzes trabalharem em unidades bem aparelhadas do ponto de vista material e humano, sem presses psicolgicas, mas apenas com acompanhamento do tra-balho desenvolvido e correo pontual do que estiver imotivadamente fora da normalidade, os resultados sero ainda mais expressivos, alm de se resguardar a sade dos magistrados.

    desdobramentosOs resultados da pesquisa foram apresentados ao Conselho

    Nacional de Justia e ao Conselho Superior da Justia do Trabalho, que criaram uma comisso especfica para estudar a questo da sade dos juzes e servidores. Esperamos sensibilizar no s os conselhos, no sentido de entender que a questo de sade am-biental do trabalho importante, como tambm convencer os juzes de que devem, de outro modo, cuidar individualmente de aspectos de seu bem-estar, informa Germano Siqueira.

    Para o diretor da Entidade, questes como o receio da falta de estabilidade no futuro, bem como a no abertura de dilogo por parte do Governo sobre a recomposio das perdas infla-

    vaLOrIzaOCerca de 2 mil magistrados, promotores e procuradores, alm de autoridades e parlamentares, participaram do Dia Nacional de Valorizao da Magistratura e do Ministrio Pblico

    cionrias dos subsdios e ainda a falta de celeridade no enca-minhamento das PECs ns. 2 e 5/2011, alm da PEC n 68/2011, que prestigiam os profissionais com mais tempo de carreira, tambm afetam a tranquilidade dos juzes, agravando o estresse do dia a dia. Ao se resolverem essas questes, naturalmente o esprito de todos se apaziguar, finaliza.

    a luta Pela valorizao da carreiraDiante do descumprimento de direitos bsicos que lhes

    so assegurados pela Constituio Federal, 80% dos magis-trados do Trabalho em todo o Pas aderiram ao movimento

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    rEsuMO DOs PrInCIPaIs DaDOs Da PEsQuIsa

    45% dos respondentes revelou que se deita depois da meia-noite e 17,9%, que se levanta antes das 5h por causa do trabalho. Cerca de 84,4% dos magistrados costuma trabalhar em casa.

    Os itens de condies de conforto: cadeiras, mesas, recursos tcnicos e equipamentos foram considerados precrios (ou em estado razovel) pela maioria dos respondentes. Ventilao, temperatura e iluminao do ambiente de trabalho tambm foram avaliadas como deficientes por 48,9%, 40,8% e 34,7% dos respondentes, respectivamente.

    Trabalho intenso Condies precrias

    53,8% disse que

    dorme mal

    41,5% declarou diagnstico mdico

    de depresso

    17,5% informou usar medicamentos para

    depresso/ansiedade

    26% deixou de realizar tarefas habituais devido a algum problema

    de sade nos ltimos 30 dias

    33,2% esteve de licena mdica nos ltimos 12 meses

    sItuaO DE saDE

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    saIBa MaIs sOBrE O PLEItO DOs MaGIstraDOs

    Poltica nacional de segurana De acordo com o levantamento realizado pelo CNJ a pedido da Corregedoria Nacional de Justia nos tribunais de todo o Pas, atualmente 100 juzes brasileiros tm a vida ameaada. O nmero pode ser ainda maior, uma vez que nem todos os tribunais forneceram as informaes solicitadas. As estatsticas e o manifesto foram apresentados ao ministro da Justia, Eduardo Cardozo, que sugeriu a criao de um grupo de trabalho com a participao das entidades, alm de representantes do Conselho Nacional de Justia e do Conselho Nacional do Ministrio Pblico. O objetivo ser estudar a questo da insegurana das duas categorias e propor aes que estruturem uma poltica nacional de segurana.

    sistema previdencirio adequado A Anamatra tem se manifestado contrria ao Projeto de Lei n 1.992/2007, que institui o regime de previdncia complementar para os servidores pblicos federais titulares de cargo efetivo, fixa o limite mximo para a concesso de aposentadorias e penses no valor de R$ 3.700,00 e autoriza a criao de entidade fechada de previdncia complementar.A matria, que j foi aprovada pela Comisso de Trabalho, Administrao e Servio Pblico da Cmara, est em debate na Comisso de Seguridade Social e Famlia, devendo ainda ser analisada pelas Comisses de Finanas e Tributao e de Constituio, Justia e Cidadania, em carter conclusivo. Para o presidente da Anamatra, Renato SantAnna, o texto fere princpios constitucionais. A magistratura tem entre as suas garantias a vitaliciedade, ento esse modo de sistema previdencirio interfere na independncia do Poder Judicirio e, principalmente, no respeita a nossa singularidade, explica.

    Poltica remuneratria com recuperao das perdas inflacionrias Entre janeiro de 2006 e agosto de 2011, as perdas inflacionrias acumuladas no perodo chegam a 22,0676%, o que representa a subtrao de quase um quarto do poder de compra dos membros do Poder Judicirio e do Ministrio Pblico em cinco anos. Dois Projetos de Lei, ns. 7.749 e 7.753, tramitam desde agosto de 2010 e recompem os subsdios mensais dos ministros do Supremo Tribunal Federal e do procurador-geral da Repblica, respectivamente, a partir de janeiro de 2011. Ambos j tm o parecer favorvel na Comisso de Trabalho, Administrao e Servio Pblico na Cmara. Em setembro ltimo, o procurador-geral da Repblica, Roberto Gurgel, e o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Cezar Peluso, enviaram ainda ao Congresso Nacional os Projetos de Lei ns. 2.198 e 2.197/2011, estabelecendo, respectivamente, a reviso dos subsdios mensais do Ministrio Pblico e da Magistratura com um reajuste de 4,8%, a partir de 1 de janeiro de 2012, uma vez que os projetos anteriores no consideram as correes inflacionrias de 2011.

    deflagrado pela Anamatra em parceria com os juzes fede-rais e paralisaram suas atividades no ltimo dia 30 de no-vembro. Um momento histrico, protagonizado por quem tem como atividade-fim a defesa dos direitos da sociedade.

    O juiz que paralisou as suas atividades no dei-xou de ser juiz, pelo contrrio, hoje ele mais juiz do que nunca, pois est lutando pelo fortaleci-mento e pela independncia do Poder Judicirio, esclareceu o presidente da Anamatra, Renato SantAnna, durante o ato pblico promovido pela Amatra 10 (DF e TO), no prdio das Varas, em Braslia.

    O movimento fez com que 20 mil audincias em todo o Pas tivessem que ser remanejadas. Em contrapartida, foi mais uma iniciativa com o intuito de sensibilizar os demais Poderes e a sociedade sobre a importncia de uma poltica nacional de segurana, um sistema de sade que previna adoecimentos fsicos e mentais, uma adequada cobertura previdenciria, alm de uma poltica remuneratria que respeite a Constituio da Repblica e garanta a recompo-sio das perdas inflacionrias, que j chegam a quase um quarto do poder de compra nos ltimos cinco anos.

    No dia 21 de setembro, cerca de dois mil magistrados, procuradores e promotores, entre eles cerca de 500 juzes do Trabalho, j haviam participado do Dia Nacional de Valori-zao da Magistratura e do Ministrio Pblico, em Braslia. Durante a manifestao no Congresso Nacional, os partici-pantes vestiram preto em sinal de protesto e conseguiram a adeso de vrios parlamentares, dando clara demonstrao de unio e de mobilizao das duas carreiras. O evento marcou o incio da campanha permanente, coordenada pela Frente Associativa da Magistratura e do Ministrio Pblico da Unio (FRENTAS), integrada pela Anamatra e outras nove entidades.

    Os integrantes da Frente Associativa entregaram o ma-nifesto ao presidente do Senado Federal, Jos Sarney, ao pre-sidente do Supremo Tribunal Federal, Cezar Peluso, e ao advogado-geral da Unio, Lus Incio Lucena Adams. Tambm j recebe-ram a pauta de reivindicaes o vice- presidente da Repblica, Michel Temer, o presidente da Cmara, Marco Maia, o procurador-geral da Repblica, Roberto Gurgel, e o ministro da Justia, Eduardo Cardozo, entre outras autoridades.

    Esperamos sensibilizar no s os conselhos, no sentido de entender que a questo de sade ambiental do trabalho importante, como tambm convencer os juzes de que devem cuidar individualmente

    de aspectos de seu bem-estargermano Siqueira

    diretor de Assuntos Legislativos da Anamatra

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  • 22 Revista Anamatra 2 edio / 2011

    Artigo 1 / Previdncia Pblica

    a provado em 31.08.2011 na Comisso de Trabalho, Administrao e Servio Pblico, com o relatrio favorvel do deputado federal Slvio Costa, relator, o projeto depende agora de pareceres na Comisso de Constituio e Justia e de Cidadania (CCJC), na Comisso de Finanas e Tributao (CFT) e na Comisso de Seguridade Social e Famlia (CSSF), para ser finalmente levado votao no Plenrio da Cmara dos Deputados.

    A descrio do tortuoso iter legislativo que se seguir at a aprovao final na Cmara poderia instilar a falsa impresso de que o projeto ser objeto de amplo e qualificado debate, nos planos tcnico-jurdico e poltico-legislativo, como de fato pediria um texto to relevante para o futu-ro do servio pblico federal brasileiro. O que de fato se v, todavia, um projeto de lei que tramita em regime de urgncia (art. 64 da CRFB), a pedido do Governo Federal, com pouca disposio da base parlamentar governista para uma discusso mais acurada do tema, mediante sucessivas audincias pblicas que faam ouvir todos os segmentos interessados (como est sendo feito, bem mais apropria-damente, com o projeto do novo Cdigo de Processo Civil PL n 8.046/2010).

    Nada obstante, por insistncia das entidades de repre-sentao do servio pblico federal entre as quais h

    sobre Discursos Oficiais Desconexos:

    a Privatizao da natureza Pblica

    que incluir a Associao Nacional dos Magistrados da Justia do Trabalho (Anamatra), mobilizada desde o primeiro momento para o enfrentamento dessa questo e com a atuao competente de parlamentares que j conseguiram entrever no PL n 1.992/2007 o que ele de fato encaminha, realizou-se no ltimo dia 08.11.2011, no Anexo II da Cmara dos Deputados, audincia pblica conjunta ori-ginada pelo Ofcio n 318/2011 (deputado Saraiva Felipe), de que

    participaram, entre outras entidades, o Sindifisco, o Sindilegis e a prpria Anamatra, por intermdio deste articulista.

    Na ocasio, os representantes do servio pblico pontua-ram enfaticamente quais so os aspectos mais inconsistentes do PL n 1.992/2007, renunciando inclusive prpria discus-so prvia da constitucionalidade das Emendas Constitucionais ns. 20/1998 e 41/2004 (e, por conseguinte, dos pargrafos 14 a 21 do art. 40 da CRFB, que o PL n 1.992 pretende re-gulamentar) discusso que, diga-se, est sendo travada pela Anamatra no mbito do STF (v., e.g., ADIs ns. 2883 e 3308). Mas, a par dessa questo prejudicial e admitindo-se ad argumentandum tantum a constitucionalidade do regime de previdncia pblica complementar que a EC n 41/2004 instituiu, ainda assim o PL n 1.992 padeceria de inconstitu-cionalidades pelas razes que se seguem.

    1. O par. 15 do art. 40 estabelece que o regime de previ-dncia complementar de que trata o 14 ser institudo por lei de iniciativa do respectivo Poder Executivo, observado o disposto no art. 202 e seus pargrafos, no que couber, por intermdio de entidades fechadas de previdncia comple-mentar, de natureza pblica, que oferecero aos respectivos participantes planos de benefcios somente na modalidade de contribuio definida. A natureza pblica, segundo os doutos, impe entidade ainda que uma fundao privada

    GuILhErME GuIMarEs

    FELICIanOJuiz Titular da 1

    Vara do Trabalho de Taubat, presidente

    da Associao dos Magistrados da

    Justia do Trabalho da 15 Regio

    (Amatra XV), gesto 2011-2013. Professor

    Associado do Departamento de

    Direito do Trabalho e da Seguridade

    Social da Faculdade de Direito da Universidade de So Paulo

    Arqu

    ivo

    Anam

    atra

    O PL n 1.992/2007 visa instituir o regime de previdncia complementar para os servidores pblicos federais titulares de cargo efetivo, inclusive os membros dos rgos que menciona, fixa o limite mximo para a concesso de aposentadorias e penses pelo regime de previdncia de que trata o art. 40 da Constituio, autoriza a criao de entidade fechada de previdncia complementar denominada Fundao de Previdncia Complementar do Servidor Pblico Federal FUNPRESP, e d outras providncias.

  • 2 edio / 2011 Revista Anamatra 23

    instituda pelo Poder Pblico, como quer o PL n 1.992 um regime com derrogaes do direito comum, que no se resume s suas contrataes, mas sua prpria administra-o, responsabilidade especial de seus agentes, acumula-o remunerada e destinao de seu patrimnio (v., e.g., ARAJO, Edmir Netto de. Curso de Direito Administrativo. So Paulo: Saraiva, 2005. pp.184-185). No entanto, o PL n 1.992 prev nada mais que um fundo privado de capita-lizao, que os emissrios do Governo Federal j alardeiam como o maior fundo de penses da Amrica Latina, com algum verniz de direito pblico, a saber, a contratao de empregados mediante concursos pblicos e a licitao dos servios de gesto dos fundos. O verniz, porm, mal esconde o que realmente se far com a gesto de um fundo de aposentadorias e penses que deveria ter natureza pblica: a sua tercei-rizao, intermediada por licitaes, para terceiras empresas, provavelmente ligadas ao setor bancrio e financeiro. O que deve ter natureza pblica pode ser gerido pela iniciativa privada? Pode, em uma expres-so, alienar para terceiros, ainda que em contratos licitados, as escolhas financeiras no mercado? Parece claro que no: [...] a gesto desse patrimnio da prpria en-tidade, que dotada de personalidade ju-rdica, e as responsabilidades decorrentes so de seus agentes e dirigentes, em regime similar ao dos bens pblicos das Fazen-das (ARAJO, op.cit., p. 188 g.n.).

    2. No bastasse, o PL n 1.992 cria um microssistema de previdncia complemen-tar com base nas regras das Leis Comple-mentares ns. 108/2001 e 109/2001, que re-gulamentam a previdncia complementar privada, nos termos do art. 202, caput, da CRFB ([...] regime de previdncia privada, de carter complementar e organizado de forma autnoma em relao ao regime ge-ral de previdncia social [...]). Ora, o art. 40 da CRFB (na redao da EC n 41), em seus 14 e 15, pretendeu introduzir no sistema jurdico bra-sileiro uma nova figura, a saber, a previdncia complementar de natureza pblica, absolutamente desataviada da hiptese de conformao constitucional do art. 202 da Constituio. Nesses termos, a criao da Funpresp a fundao de di-reito privado que o PL n 1.992 cria para gerir a previdncia complementar do servio pblico federal deveria ser pre-cedida de uma lei geral para a previdncia complementar de natureza pblica, a consubstanciar valores e princpios diver-sos daqueles que guiaram as LCs ns. 108 e 109, exceto quanto ao equilbrio econmico-financeiro e atuarial (que, tributrio das leis de mercado onde a entidade de previdncia com-plementar fechada necessariamente atuar , evidentemente no pode delas se esquivar). Lei que, a propsito, por impe-rativo de paralelismo constitucional (agora, sim, em vista das LCs ns. 108 e 109), haveria de ser complementar (conquanto

    bem se saiba que, nos anais legislativos, esse item da bandei-ra de lutas das entidades representativas dos servidores no tenha resistido ao rolo compressor do Governo Lula, ao tempo da EC n 41/2004).

    Ao mais, para alm desses aspectos, h outros que, con-quanto no interfiram diretamente com a constitucionalidade do projeto, comprometem a sua factibilidade no plano eco-nmico-financeiro. Assim, por exemplo, a questo da desseg-mentao inicialmente pretendida (todos os servidores con-tribuiriam para o mesmo fundo, sem qualquer segregao de capitais). Ora, os clculos atuariais so tanto mais fidedignos e confiveis quanto mais uniforme for a massa de participantes e assistidos (inclusive porque dever levar em considerao ele-

    mentos como a expectativa mdia de vida, a sinistralidade tpica, a capacidade con-tributiva a longo prazo etc.). Nessa ordem de ideias, a amplitude demasiada do PL n 1.992/2007, em sua redao original, colo-cava em xeque a credibilidade da Funpresp, na medida em que equvoco afirmar, por exemplo, que a expectativa mdia de vida de servidores pblicos federais dos segmentos da sade ou da segurana pblica seja a mes-ma dos servidores pblicos federais do seg-mento das auditorias fiscais; ou, ainda, que a sinistralidade tpica de agentes da Polcia Federal seja a mesma de juzes do Trabalho ou de membros do Congresso Nacional; ou, alfim, que a capacidade contributiva perma-nente de servidores de carreira da Funai seja a mesma de membros do Ministrio Pblico da Unio. No se pode, em sntese, trabalhar com um universo seguro de expectativas atuariais, uma vez que a dessegmentao artificial do servio pblico federal, tal como procedida pelo PL n 1.992/2007, no per-mite aferir, na massa de participantes e as-sistidos, hipteses econmicas e financeiras que guardem [especfica] relao com suas respectivas atividades (v., e.g., o Anexo da Resoluo n 18, de 28.03.2006, do Conselho

    de Gesto da Previdncia Complementar). Por tantas razes, o mnimo a esperar do Governo Federal

    seria que desistisse do pedido de urgncia que impede o en-frentamento qualitativo das questes acima postas. Da Magis-tratura do Trabalho, por sua vez, no se podia esperar menos: a pauta da previdncia pblica foi desde sempre arrolada como um dos trs pontos prioritrios de sua agenda de reivin-dicaes, coroada com a dramtica e inevitvel mobilizao do dia 30 de novembro de 2011. A posteridade dir se, nesse item, os juzes do Trabalho e os demais servidores pblicos federais, por suas entidades de classe, tinham ou no razes para desa-creditar o miraculoso projeto governamental de saneamento das contas da previdncia pblica. Que nos digam, nos fins do sculo XXI, as futuras geraes de servidores. Infelizmente, j no podero ouvir os que hoje protagonizam a cantinela da moralidade pblica pelos escaninhos da privatizao.

    o PL n 1.992 prev nada mais que um fundo privado de capitalizao, que os emissrios do Governo Federal

    j alardeiam como o maior fundo de

    penses da Amrica Latina

  • 24 Revista Anamatra 2 edio / 2011

    a poesia de Chico Buarque, na sua famosa Constru-o, lanada em 1971, retrata a realidade de milhes de operrios que, em precrias condies de seguran-a, construam edifcios, viadutos e obras de todo porte, dando sua contribuio para o progresso do Pas na poca do cha-mado milagre econmico. Passadas quatro dcadas, a falta de dados oficiais atualizados mascara a dura realidade desses trabalhado-res e apenas serve de atenuante para a situ-ao de insegurana que afeta diretamente milhares de famlias brasileiras. Para se ter uma ideia, faltando pouco para encerrar o ano de 2011, o Ministrio da Previdncia divulgou, em outubro, os nmeros referen-tes aos acidentes de trabalho ocorridos em 2010. De acordo com o Anurio Estatstico da Previdncia Social, houve reduo no nmero de acidentes de trabalho notificados em todo o Brasil. Em 2009, foram 733.365 registros oficiais, enquanto em 2010 foram 701.496. Ainda conforme o levantamento, o nmero de mortes geradas por esses aciden-tes subiu de 2.560, em 2009, para 2.712 bi-tos, em 2010, considerando-se as diferentes atividades laborais. O setor de servios lide-ra os registros de acidentes de trabalho, com 331.895 notificaes. Em seguida, aparece o setor da indstria, que inclui a construo civil, com 307.620 ocorrncias. Os nmeros so alarmantes, no entanto, convm ressal-tar que ainda no correspondem a uma realidade absoluta, uma vez que no incluem os casos subnotificados pelas em-presas, nem os ocorridos com os milhes de trabalhadores da

    de trabalhoacidentes

    economia informal, muito menos os que atingem os servidores pblicos e militares. Como agravante, o impacto orament-rio de acidentes e doenas do trabalho obriga a Previdncia

    Social a despender anualmente aproxima-damente R$ 10,7 bilhes com o pagamento de auxlio-doena, auxlio-acidente e apo-sentadorias para seus segurados. A Justia do Trabalho acompanha com inquietao esse recrudescimento observado nos ndices estatsticos oficiais sobre acidentes de traba-lho no Brasil. Para o presidente do TST, Joo Oreste Dalazen, a demora do Poder Exe-cutivo na divulgao de dados atualizados sobre esse grave problema injustificada e renitente. Segundo ele, est claro que a ausncia de estatsticas consistentes e atua-lizadas impede a formulao e o fomento de polticas pblicas mais realistas e eficazes de preveno. O temor do presidente do TST que a situao venha a se agravar diante dos megaeventos esportivos previstos para os prximos anos. Justamente por isso, lanou em maio, com o apoio do Conselho Superior da Justia do Trabalho, o Programa Nacio-nal de Preveno de Acidentes de Trabalho. A iniciativa contou com a adeso de vrios parceiros institucionais, dentre eles a Asso-ciao Nacional dos Magistrados da Justia do Trabalho (Anamatra). Nosso objetivo para a fase inicial do programa tem sido mobilizar e alertar a sociedade para esse ver-

    dadeiro massacre de vidas humanas, afirma Dalazen. Como parte do Programa, tambm foram expedidas recomendaes, junto com a Corregedoria Geral da Justia do Trabalho, aos

    Por uma cultura de prevenoSubiu a construo como se fosse mquina. Ergueu no patamar quatro paredes slidas.

    Tijolo com tijolo num desenho mgico. Seus olhos embotados de cimento e lgrima. Construo (Chico Buarque)

    Brasil 2 / Preveno

    Nosso objetivo para a fase inicial do

    programa tem sido mobilizar e alertar a sociedade para esse verdadeiro massacre

    de vidas humanasJoo Oreste Dalazen

    Presidente do TST

    Texto / Heitor Menezes e Camilla Gurgel

  • 2 edio / 2011 Revista Anamatra 25

    desembargadores dos Tribunais Regionais do Trabalho e aos juzes do Trabalho para que atribuam prioridade tramitao e ao julgamento das reclamaes trabalhistas envolvendo acidente de trabalho. A ideia agora somar esforos ao Decreto n 7.602, que dispe sobre a Poltica Nacional de Segurana e Sade no Trabalho (PNSST), sancionado pela presidente Dilma Rousseff, no ltimo dia 7 de novembro.

    A medida tem como objetivo a promoo da sade, a melhoria da qualidade de vida do trabalhador e a preveno de acidentes e danos sade advindos, relacionados ao trabalho ou que ocorram no curso dele, por meio da eliminao ou reduo dos riscos nos ambientes de trabalho. Tudo isso por intermdio de uma ao articulada entre governo e organiza-es representativas de trabalhadores e empregadores.

    Dentre as competncias listadas para os Ministrios do Trabalho e Emprego, da Sade e da Previdncia Social, a PNSST estabelece: a articulao de uma rede de informaes sobre a Sade e Segurana do Trabalhador, a elaborao de diretrizes para a inspeo do trabalho, de normas regulamen-tadoras de segurana e sade, bem como o acompanhamento dos acordos e convenes ratificados entre o governo brasi-leiro e organismos internacionais, em especial a Organizao Internacional do Trabalho OIT.

    Para o juiz Sebastio Geraldo de Oliveira, do Tribunal Regional do Trabalho da 3 Regio (MG), atualmente convo-cado pelo TST, o problema de fundo que faz com que a PNSST ainda no esteja efetivamente em vigor passa justamente por este ltimo aspecto.

    O Brasil ratificou, em 1993, uma das mais importantes Convenes da OIT, no 155, que trata diretamente da sade do trabalhador. Essa Conveno prev em seu art. 4 que todo pas-membro que a ratificar dever formular, pr em prtica e reexaminar periodicamente uma poltica nacional em matria de sade e segurana dos trabalhadores no meio ambiente de trabalho, destaca. Ainda segundo o juiz, no art. 14 do documento da OIT, sobressai a recomendao explcita de que os pases- membros devero igualmente adotar medidas para a incluso das questes de segurana, sade e higiene no meio ambiente de trabalho em todos os nveis de ensino e treinamento. No estudamos ecologia, meio ambiente e trnsito? Por que no estudar tambm que o trabalho causa danos? O trabalho que dignifica tambm danifica, adverte. Para Oliveira, h um detalhe ainda mais intrigante: H uma confuso em relao ao decreto legislativo publicado em 1994, que ps em prtica a Conveno no Brasil. No sabemos por que razo foi suprimida a linha referente ao ensino das questes de segurana, sade e higiene no meio ambiente de trabalho. O juiz lembra que o Decreto de Ratificao, mesmo aquele escrito em espanhol, francs e ingls, inclusive o adotado em Portugal, tem texto acerca da necessidade de ensino, porm o Decreto Legislativo brasileiro, promulgado desde 1994, no o mesmo. Dessa forma, diz ele: Na verdade, foi suprimido o essencial para a adoo de uma poltica como a que pretendemos: formar mentalidade e conhecimento. Os alunos, futuros trabalhadores e empregadores, devem ter essa noo na escola, em seus primeiros momentos de formao. A poltica no uma simples

    regra, norma, mas sim um conjunto de atitudes perenes, capa-zes de estruturar um modo de pensar. O primeiro ponto dessa poltica deve ser o de desenvolver a cultura de preveno.

    Neste sentido, a PNSST tenta corrigir e avanar quando estabelece entre suas diretrizes a promoo da implantao de sistemas e programas de gesto da segurana e sade nos locais de trabalho; reestruturao da formao em sade do traba-lhador e em segurana no trabalho e o estmulo capacitao e educao continuada dos trabalhadores, alm da promoo de uma agenda integrada de estudos e pesquisas em segurana e sade no trabalho. No entanto, no se refere educao de base que antecipe a formao para o tema em escolas ou uni-versidades, como sugere o juiz.

    Apesar disso, Sebastio Oliveira lembra que o quadro j foi pior por volta de 1975, quando o Brasil era pas campeo mundial em acidentes de trabalho. Segundo ele, graas ao avano da legislao, o quadro vem mudando lentamente,

    PErIGOO setor de servios lidera os acidentes de trabalho com 331.895 notificaes.

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  • 26 Revista Anamatra 2 edio / 2011

    mesmo com a cultura da subnotificao. Nos ltimos trs anos, com a vigncia do Nexo Tcnico Epidemiolgico (metodologia que identifica quais doenas e acidentes esto relacionados com a prtica de determinada atividade profis-sional), felizmente passamos a captar tambm os acidentados para os quais no foi feita a devida comunicao de acidente de trabalho, pondera o juiz.

    comPetncia PenalOutra alternativa para tentar minimizar os impactos

    trazidos pelo elevado nmero de acidentes de trabalho no Brasil apontada pelo presidente da Anamatra, Renato SantAnna. Segundo ele, uma grande contribuio para o tema pode vir a partir da PEC no 327/2009, de autoria do deputado federal Valtenir Pereira (PSB/MT), que estabelece a competncia penal da Justia do Trabalho em caso de julgamento das aes decorrentes das relaes de trabalho. Na opinio de SantAnna, o juiz do Trabalho, por estar mais perto, conhece melhor a realidade trabalhista e pode tambm apreciar a matria penal, isso daria celeridade

    principalmente s questes que envolvem o trabalho escravo, o trabalho infantil, enfim, os acidentes no trabalho em que notria a exposio do trabalhador a esse tipo de risco.

    sindicato critica falta de Preveno nas emPresasEm Braslia, onde se localiza um dos maiores canteiros

    de obras da Amrica Latina, de acordo com o Sindicato dos Trabalhadores da Construo Civil e Mobilirio do DF, ao longo de 2011 ocorreram 15 mortes de operrios, incluindo dois na regio do entorno. O primeiro secret-rio da Entidade, Joo Barbosa de Arruda, lembra que o nmero j o triplo em comparao s ocorrncias de 2010. O sindicalista recorda que, embora trgicos, os nmeros so escamoteados diante da recusa das empresas em comunicar os acidentes, sejam fatais ou no. No momento em que os trabalhadores adoecem, so descartados pela empresa. Essa prtica ainda no acabou. No que tange previdncia, o problema continua, pois se as empresas, como de costume, no emitem a Comunicao de Acidente de Trabalho (CAT), o perito que atende os trabalhadores consequentemente no concede o benefcio devido. uma situao difcil, pois o perito tem condies de verificar o nexo acidentrio, mas no o faz, alegando a falta do documento, reclama. Segundo Joo Arruda, falta qualidade ao treinamento que as empresas disponibilizam aos trabalhadores (quando disponibilizam, ressalta) para o uso de equipamentos de proteo individual, entre outras medidas de segurana. As empresas confundem palestra com treinamento. O operrio novio na construo no sabe o que Equipamento de Proteo Individual EPI e muito menos colocar um cinto de segurana. Ele informa que outro problema tem a ver com as normas de segurana. Se ao menos as empresas cumprissem a principal delas, a NR 18 (que trata sobre treinamento, rea de vivncia,

    BrasLIaA capital federal tem hoje um dos maiores canteiros de obras da Amrica Latina

    As empresas confundem palestra com treinamento. O operrio novio na

    construo no sabe o que Equipamento de Proteo Individual EPI e muito menos

    colocar um cinto de seguranaJoo Barbosa Arruda

    Sindicato dos Trabalhadores da Construo Civil e Mobilirio do DF

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  • 2 edio / 2011 Revista Anamatra 27

    PrEvIDnCIa sOCIaL COBra rEsPOnsaBILIDaDE Das EMPrEsasDiante de gastos previdencirios que j batem a casa dos R$ 10 bilhes por ano, a Advocacia-Geral da Unio (AGU) trava luta perante os tribunais competentes para fazer valer as aes regressivas acidentrias (instituto jurdico que responsabiliza financeiramente as empresas negligentes ou omissas em relao segurana do trabalhador). A Previdncia Social, por meio da Procuradoria Geral Federal (PGF), fechou o primeiro semestre de 2011 contabilizando 1.430 aes dessa natureza, com o intuito de recuperar cerca de R$ 100 milhes pagos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) aos trabalhadores acidentados. A expectativa de que at o fim do ano o valor aumente na mesma proporo que novos acidentes de trabalho se transformem em aes na Justia. Segundo o presidente do INSS, Mauro Hauschild, tambm esto em curso diversas solues voltadas para mitigar os acidentes de trabalho no Pas. Uma delas, ainda em estudo por parte do Governo, prev a instituio de poltica de incentivos

    fiscais para as empresas que adotarem polticas de responsabilidade sociotrabalhista. Outra frente visa criao de um fundo nacional de reabilitao profissional com a finalidade de criar condies para a reinsero do trabalhador acidentado no mercado de trabalho.

    PCMAT, instalaes sanitrias, local de refeies, entre outros itens), ns deixaramos de falar em fatalidade. No existe fatalidade em acidentes de trabalho, mas sim falta de planejamento e responsabilidade administrativa. O auxiliar de pedreiro Clarindo da Silva Pires, 52 anos, faz parte da trgica estatstica de acidentes de trabalho na capital federal. O ex-trabalhador rural que h 10 anos migrou do campo, no interior da Bahia, atrado pelas oportunidades dos grandes centros, caiu em um tubulo durante as obras de concretagem das fundaes de um luxuoso hotel em construo no centro de Braslia. Pelo seu relato, deveria ter sido colocada uma tampa de madeirite sobre a cratera aberta por uma mquina de perfurao do solo. Em 31 de agosto de 2010, ao repetir a rotina, Clarindo despencou de uma altura de 12 metros dentro do tubo relativamente estreito. Mesmo com muita dor, e quase desfalecendo, ainda conseguiu gritar por socorro e s saiu depois que os colegas jogaram uma corda, que o prprio operrio teve que amarrar em volta do corpo.

    Detalhe: Clarindo no usava o equipamento de proteo individual necessrio para o tipo de tarefa que executava e s ouviu uma palestra sobre preveno na obra. Treinamento? Nenhum. Ele no chegou a ter fraturas, mas foi ao hospital, imobili-zado, e depois, levado para casa com suspeita de leso na coluna. Passado mais de um ano, conseguiu da empresa somente um colete ortopdico e o pagamento de metade das sesses mensais de hidroterapia. Nada mais. As sesses custam R$ 60,00. A empresa paga R$ 30,00. A recomendao mdica indicou musculao como com-plemento, mas a construtora se nega a bancar o tratamento. Vivendo do benefcio auxlio-acidente por acidente do trabalho, pago pelo INSS, no valor de um salrio mnimo (R$ 545,00), Clarindo afirma que at hoje precisa de analgsicos e outros medicamentos, alguns indisponveis no sistema pblico de sade.

    NMEROS REFERENTES A ACIDENTES DE TRABALHO DE ACORDO COM O MINISTRIO DA PREVIDNCIA

    NMERO DE MORTES GERADAS EM ACIDENTES DE TRABALHO

    2009 2.560 2010 2.712

    SETORES LDERES EM REGISTROS DE ACIDENTES DE TRABALHO

    NMERO DE ACIDENTES DE TRABALHO

    2009733.365

    2010701.496

    IndstriaServios331.895 307.620

    Gasto anual aproximado do Ministrio da Previdncia com o pagamento de auxlio-doena, auxlio-acidente e aposentadorias para seus segurados

    R$ 10,7bilhes

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  • 28 Revista Anamatra 2 edio / 2011

    Artigo 2 / Direito do Trabalho

    Os debates que iniciamos h mais de 23 anos, com a elaborao do texto constitucional, tm tido desdo-bramentos ao longo de mais de duas dcadas. Embora tenhamos aprovado uma Constituio rgida, muitas

    alteraes foram implementadas, e outras tantas tramitam no Congresso Nacional. Digo isso porque quase todas as emendas Constituio retiram direitos dos trabalhadores. Um exem-plo que me vem mente aconteceu no mbito da Reforma do Judicirio com a aprovao, em 2004, da Emenda n 45, que prev que, quando no h entendimento entre as entidades de empregados e empregadores, no possvel entrar com dissdio coletivo. Um verdadeiro retrocesso. Para reverter isso, apresen-tei a PEC n 42/2005, que retoma o texto original. O projeto est na CCJ do Senado aguardando indicao de relator.

    Outro ponto ainda atual diz respeito jornada de trabalho. Desde a Constituinte, lutamos para que fosse reduzida para 40 horas semanais, sem reduo de salrio. Na dcada de 1980, alguns diziam que a reduo da jornada causaria desemprego. E era exatamente o contrrio. Argumentamos vrias vezes que, reduzindo-a de 48 para 44 horas semanais, teramos o seguinte

    Constituio e Direito do trabalho

    resultado: de cada cinco empregos, um a mais seria criado, alm de reativarmos o mercado interno, pois teramos mais alguns milhes de trabalhadores recebendo e consumindo. Isso sem falar no aspecto social. Haveria ainda aumento de arrecadao nos cofres da Previdncia, fundos para habitao e outros.

    E este o discurso que mantemos hoje. A carga foi reduzida em quatro horas, e o Pas no quebrou por isso, fato. Reduzir a jornada reconhecer que o trabalhador tambm tem o direito de ficar mais tempo com seus familiares. A reduo significa que o trabalhador ter mais lazer, mais oportunidades para estudar e para se preparar para conviver com o avano tecnolgico.

    Apresentei em 1994, na Cmara dos Deputados, o PL n 4.653, que previa essa reduo de jornada. A proposta engloba os empregados da atividade privada e pblica, inclu-sive os rurais e as empregadas domsticas. Um ano depois, em parceria com o ento deputado Incio Arruda (PCdoB/CE), apresentamos a PEC n 231 com o mesmo objetivo.

    Atualmente tramitam no Senado Federal duas propostas de minha autoria: a PEC n 75/2003, que reduz a jornada para 36 horas, sem reduo salarial, e o PLS n 254/2005, que institui o

    PauLO PaIM Senador (PT/RS)

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  • 2 edio / 2011 Revista Anamatra 29

    Pacto Empresarial para o Pleno Emprego (Pepe), que reduz as atuais 44 horas semanais para 36 horas, sendo a adeso volun-tria por parte do empregador. Fala-se neste Pas que preciso distribuir melhor a renda, que preciso maior desenvolvimento, maior produo, mas quando se prope viabilizar essas propos-tas o ritmo lento, quase esttico.

    Outro assunto relevante a insalubridade. O Supremo Tribunal Federal (STF) editou a Smula Vinculante n 4, vedando a utilizao do salrio mnimo como indexador de base de clculo para qualquer fim. Com base nessa deciso, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) alterou a sua Smula 228 estabele-cendo que, a partir de 9 de maio de 2008, o adicional de insalu-bridade deve ser calculado sobre o salrio-base do trabalhador. Porm, segundo entendimento do STF, a Smula do TST foi anulada e ficou determinado que de competncia exclusiva do Poder Legislativo normatizar a matria. Diante dessa realidade, importante que exista uma nova base de clculo do adicional de insalubridade, que incidir sobre o salrio do trabalhador. Criou-se uma lacuna jurdica. A fim de solucionar o impasse, apresentei o PLS n 294/2008, que prev que o clculo dever ter por base o salrio de cada trabalhador. O projeto justifica-se pelo fato de a onerosidade estimular o empregador a promover aes que visem eliminao ou neutralizao de fatores fsicos e qumicos que trazem prejuzos sade do trabalhador.

    Quero lembrar tambm recente aprovao sobre o aviso- prvio. Diante da falta de regulamentao da matria, apre-sentei proposta sugerida pela Anamatra, o PLS n 112/2009, que ainda tramita no Senado. Porm, por presso do Supremo frente omisso legislativa, foi aprovado projeto neste sentido. A Lei n 12.506/2011, regulamentando a matria, entrou em vigor no ltimo dia 13 de outubro.

    No podia deixar de mencionar, claro, a minha luta histrica pela valorizao do salrio mnimo. So 24 anos de parlamento e mais de 30 anos de vida poltica pela adoo de uma poltica permanente de reajuste do salrio mnimo. Quando eu sonhava e afirmava que ele poderia ultrapassar a barreira dos US$ 100, muitos me chamaram de louco. Hoje temos um salrio mnimo que corresponde a mais de US$ 340 e a economia brasileira vai muito bem. No ainda o salrio ideal, mas estamos cami-nhando nesse sentido. Ao ganhar mais, o brasileiro passa a investir mais em si mesmo e em sua famlia. E assim, preceitos constitucionais como moradia, sade, lazer, cultura e tantos outros vo ficando mais prximos, mais visveis. Por isso, insisto que o Governo Federal deva incluir na pauta de discusses a poltica de reajuste e valorizao das aposentadorias e penses. No podemos continuar tendo reajustes diferenciados e muito abaixo do salrio mnimo, pois assim a situao no ir se alte-rar. Alm da equiparao de reajustes entre mnimo e benefcios de aposentadorias e penses, preciso recuperar as perdas sofridas ao longo de dcadas. inadmissvel que uma pessoa que se aposentou com dez salrios mnimos esteja recebendo hoje o equivalente a quatro ou menos. Se continuar assim, em breve todos os aposentados brasileiros estaro recebendo apenas um salrio mnimo. Para reverter essa situao, em 2003 apresentei e aprovei no Senado Federal o PLS n 58. Aprovei tambm uma emenda ao PL n 42/2001. A ideia assegurar para os aposentados e pensionistas o mesmo percentual de

    reajuste concedido ao salrio mnimo. Outro ponto importante, e que precisa ser visto com carinho, o fator previdencirio. Sua incidncia, desde 1999, tem prejudicado em demasia os trabalhadores. As perdas no momento das aposentadorias so altssimas. Mulheres podem ter cortes em suas aposentadorias de at 40% e homens, de at 35%. O Senado j aprovou o meu projeto qu


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