Razões e Perspectivas da Violência e da Criminalidade:
Uma Análise sob o Enfoque da Criminologia Clínica
A Verdade dos Mitos
A “verdade” dos mitos, na medida em que carregada de arquétipos, é mais profunda
que a “verdade” objetiva dos fatos, embora mais dificilmente acessível à razão pura.
Portanto: a versão bíblica sobre a história do homem e a própria mitologia contêm profundas verdades sobre o homem.
Razões e Perspectivas do Primeiro Crime do Homem
• Primeira grande violência:
fruta proibida (lei arbitrária e déspota) = RAZÃO
• Primeiro crime do homem:
querer igualar-se a quem o domina = PERSPECTIVA / RAZÃO
• Primeiro castigo do homem:
expulso do paraíso = nova violência = PERSPECTIVA / RAZÃO
Portanto: a primeira e fundamental RAZÃO de toda a cadeia de
violências é a própria irracionalidade da lei, que proíbe ao
dominado igualar - se ao dominador.
Segundo crime do homem:
fratricídio (violência explícita)
Suas razões: privação do carinho do pai
tratamento desigual
rivalidade
Suas perspectivas: banimento do infrator (violência)
novos crimes
novos castigos
Razões e Perspectivas do Segundo Crime do Homem
O Maior Crime da Humanidade
Maior crime da humanidade
Pedido de perdão:
“Eles não sabem o que fazem”
Primeira declaração de “inimputabilidade”
Mitologia Grega Motivações constantes (RAZÕES) nas violências da
mitologia grega:
Ý Sede insaciável de poderÝ Rivalidade entre pais e filhos
(medo de ser subjugado e destruído) Ý Tudo calcado no instinto de sobrevivência Ý Temática da tragédia grega:
busca do “êxtase”, do “entusiasmo”
“HUBRIS”
As RAZÕES e PERSPECTIVAS da violência e criminalidade na tragédia grega:
Imposição de limites por parte dos deuses (pais) =
proibição de acesso aos seus privilégios =
fruta proibida
Contra-reação do homem
Punição
Razões e Perspectivas da Violência na Tragédia Grega
• Necessidade premente de vencer, sempre vencer (de igualar-se a Deus – HUBRIS), ou acatar as condições humanas de vida: minoria dominante (seu endeusamento perante a maioria dominada).
Enfrentamento da interdição primária.• Necessidade de ter os mesmos direitos dos demais humanos,
ou submeter-se às condições sub-humanas de vida: maioria dominada.
Enfrentamento das interdições secundárias.
Dois Grandes Dilemas do Homem
Os delinqüentes: Comumente são identificados entre aqueles que, ainda que
de forma pouco ajustada ou “ilegítima”, tentam capturar
as frutas proibidas a que têm direito, a fim de
simplesmente tornarem-se iguais aos homens
Entretanto:Raramente são identificados entre aqueles que tentam se
igualar a “Deus”, na busca do poder e domínio
totais.
Curioso e Cruel Paradoxo
Dinâmica da Violência Fundamental
VIOLÊNCIA FUNDAMENTAL
“BI”
“BIA”
VIOLÊNCIA
“BIOS”
VIDA
LUTA PELA SOBREVIVÊNCIA, PELA VIDA
OBSTÁCULOS = PESSOAS (OUTROS)
OBJETOS: INDEFINIDOS
RIVALIDADE (SOBREPOR-SE AO OUTRO)
DILEMA TRÁGICO: “OU ELE OU EU”
PRIMEIROS OBJETOS: PAIS
“CANALIZADA” PELA LIBIDO
(INTEGRAÇÃO)
Integração da Violência Fundamental pela Libido - I
“O dinamismo de todo esse grupo instintual arcaico constituiria a base dinâmica, nesse momento mal diferenciada objetalmente, sobre a qual se estabeleceria o apoio da libido que, como diz Freud, extrairia nele amplamente (se não totalmente) a energia própria para sua vetorialização teleológica completamente específica, na direção da objetalidade autêntica, do intercâmbio amoroso e da criatividade” (Bergeret, 1990, p. 228).
As duas interpretações de Édipo, o Rei
Édipo matou seu pai
E ocupou seu lugar no leito (Sófocles, Sêneca, Voltaire, Racine)
PARA ocupar seu lugar no leito
(Freud)
Manifestações da ViolênciaFundamental
• No Lar• Na Adolescência• Na sociedade• Lei primordial e tirana do “pai”• Violência primária, da minoria dominante (objeto
pouco definido)• Violência secundária, da maioria dominada (objeto
mais definido)DILEMA TRÁGICO: “OU ELE OU EU”, “OU ELES OU NÓS”
Tipos de Criminalidade segundo HASSEMER
MODERNAEconômicaEcológicaComércio ExteriorDrogas (internacional)
a) Ausência de vítimas individuaisb) Danos causados pouco visíveis c) Formas burocráticas de açãoViolência Primária
DE MASSARouboSeqüestroHomicídioCrimes Sexuais
Suscitam medo, pânico, revolta
Violência Secundária
Violência Fundamental: Criança X Adulto
“A hipótese da existência de uma violência fundamental leva-nos a pensar que a luta entre
gerações constitui um fenômeno funcional inevitável. A criança muito pequena tem
espontaneamente tendência a projetar sobre o adulto sua violência ligada à sua necessidade de
sobreviver, enquanto que o adulto, ao mesmo tempo, vê despertar-se nele, como um eco, as partes
forçosamente mal integradas de sua própria violência primitiva” (Bergeret, 1990, p. 276).
“Não sabe o que faz”
• Opinião Pública• Preconceitos
• Prestígio Pessoal
• Interesses de Classe
• Necessidades
Inconscientes• Interesses Pessoais
• Defesas Inconscientes
• Viés Cultural
• Massas
• Mídia• Modismos
• Conveniências Emergentes• Sectarismos• Ideologia
• Viés Profissional
• Viés Político
Violência: Razão de Novas Violências
“Doutor, quando a gente sair pra rua, alguém vai ter que pagar pelo que a gente está passando aqui.” Ao que outros
presos responderam em coro: “Pode crer, Doutor.”
O resultado da aplicação da pena está sendo a prática de novas violências, que vão gerar outras violências futuras, conforme
declarado pelos presos, pelo que cai por terra qualquer pretensão de proteção dos bens jurídicos, de prevenção por intimidação ou de ressocialização, ao menos levando-se em
conta, é claro, as condições em que aqueles presos estão cumprindo suas penas, as quais não são muito diferentes, por
certo, das dos demais distritos.
Observações e Propostas
1. A violência e a criminalidade são sempre inerentes à história da humanidade.
2. A violência ultrapassa e muito os limites da criminalidade.
3. A atenuação das violências secundárias está na pendência da atenuação da violência primária.
4. Tomar medidas eficazes (não punições severas) com relação à violência primária. O que interessa a todos não é que ela seja punida, mas que ela não aconteça.
Observações e Propostas
5. As punições severas de nada sevem para resolver o problema da violência e da criminalidade.
6. Os limites para a discussão e encaminhamento de formas de atenuação do problema da violência ultrpassam os limites do Direito Penal, devendo englobar políticas de educação e de saúde pública, incluída aí a saúde da família.
7. Para a atenuação do problema da violência, as medidas a serem tomadas devem ter como meta a pacificação, a reconciliação, a solidarização.
Observações e Propostas
8. Qualquer punição ou mesmo decisão conciliatória só será útil na medida em que promover a reconciliação, entendida esta como um processo evolutivo, por parte de todos os envolvidos, de saber pensar sobre seus atos e suas conseqüências, procurando, cada um, sentir-se no papel do outro, a fim de também pensar sobre o comportamento desse outro e de saber o que ele fez. UTOPIA? Sem dúvida. Chamemo-lo, porém, de horizonte a ser perseguido.
A trajetória (saudável) das violências e dos conflitos
Reconhece Freud, reconhece Melanie Klein, reconhece Bergeret: a maturidade psíquica, a capacidade de simbolização, ou seja, de pensar sobre os próprios atos se dão pelo primado da libido, pelo primado das pulsões de amor. E se assim é na trajetória das violências e dos conflitos inerentes à história do indivíduo, assim também o será na trajetória das violências e dos conflitos inerentes à história da humanidade.