Modelo de Classes de Orçamento em Projetos de
Engenharia
Rafael Ferrari, Caio Torres, Clarisse Gomes, Gláucia Alves
RESUMO
O presente trabalho traz a adaptação do sistema de classificação das estimativas de custo
AACE 17R-97 para a realidade do modelo de desenvolvimento de propostas da Andrade
Gutierrez Engenharia. A adaptação foi realizada por um grupo de trabalho por meio da
utilização do método A3 de resolução de problemas. O objetivo foi otimizar os processos de
elaboração de estudos de engenharia por meio da utilização de classes de projetos/estudos
e suas respectivas etapas de elaboração necessárias. Como resultado, a gestão dos projetos
foi estruturada de forma a otimizar recursos e maximizar seu valor agregado. Adicionalmente,
dois cases de classificação são descritos, com suas respectivas etapas, pontos de destaque
e de melhoria.
PALAVRAS-CHAVE: Sistema de classificação, engenharia de propostas, AACE 17R-97.
ABSTRACT
The work aims to adapt the classification system of the cost estimation AACE 17R-97 to the
proposal development model of Andrade Gutierrez Engineering. The adaptation was carried
out by a working group through the use of the problem solving method A3. The objective was
to optimize the processes of elaboration of engineering studies through the use of classes of
projects / studies and their respective stages of preparation necessary. As a result, project
management was structured in a way to optimize resources and maximize their added value.
In addition, two classification cases are described, with their respective stages, points of
prominence and improvement.
KEYWORDS: Classification System, Proposal engineering, AACE 17R-97.
INTRODUÇÃO
A partir da década de 50 disseminou-se pelo mundo as técnicas de Gestão de Projetos. Como
a maior parte dos adventos estratégicos modernos, iniciou-se no setor militar antes de
espalhar-se pela indústria cinematográfica, automotiva, de engenharia e daí por diante. Em
seu cerne o auxílio no gerenciamento de equipes multifuncionais em definir, planejar, executar
2 Modelo de Classes de Orçamento em Projetos de Engenharia
e controlar o trabalho de forma coesa e confiável. Nesse sentido, conforme o PMBOK, a
Gestão do Projeto pode ser definida como um encadeamento finito de atividades inter-
relacionadas desenhadas para produzir um resultado definido, dentro de um prazo definido,
utilizando uma alocação específica de recursos.
No campo da Engenharia, a implementação dessas técnicas possibilitou um alinhamento
coordenado das funções. No âmbito da construção civil, em específico, onde existe uma
diversidade de um alto grau de especialização funcional, a Gestão de Projetos viabilizou a
execução de grandes resultados de forma mais econômica e rápida.
Entre seus principais pontos críticos, destaca-se uma das principais preocupações de todo
Gerente de Projeto: a gestão dos recursos. Uma gestão eficaz e bem fundamentada dos
recursos é fundamental para os resultados do projeto uma vez que oferecerá diretrizes de
padrões de uso que auxiliarão os participantes em suas tomadas de decisão ao longo do
projeto. Diversas técnicas foram desenvolvidas no sentido de auxiliar o gerente e sua equipe
na melhoria da alocação dos seus recursos desde um melhor gerenciamento e alocação de
pessoal até, de forma mais objetiva, a estimativa e controle dos custos e orçamentos, objeto
central na fundamentação das informações para as decisões relativas ao projeto.
Ao longo dos últimos 50 anos, a necessidade de técnicas de classificação e mensuração dos
custos de projeto sempre foi chave para a sustentabilidade contínua do gerenciamento do
projeto. Nesse sentido, instituições como AACE International (Association for the
Advancement of Cost Engineering International) tornam-se referência na disseminação,
criação e incentivo ao conhecimento nessa área. Dentre inúmeros trabalhos destaca-se o
Sistema de Classificação para Estimativa de Custos que tem por objetivo estabelecer
diretrizes de custos na avaliação, aprovação e financiamento de projetos no setor da
Engenharia, Suprimentos e Construção.
O processo de estimativa de custos é fundamental por estabelecer as diretrizes de
embasamento contratual que serão utilizadas durante a fase de desenvolvimento de projeto.
Este é um processo crítico nas empresas devido, principalmente, a variabilidade do nível de
informações e detalhamento do projeto e prazos exíguos de desenvolvimento dos estudos.
Por esta razão, um sistema de classificação de propostas traz como vantagens a adequação
do processo aos inputs do projeto, como nível de detalhamento, além do alinhamento entre
os stakeholders a respeito do nível de precisão e exposição ao risco característico de cada
classe.
O objetivo principal deste trabalho consiste na otimização dos recursos necessários para o
desenvolvimento de estimativas de custo em projetos de engenharia através de um sistema
de classificação de propostas adequado a projetos típicos do mercado de Engenharia e
Construção.
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Nesta sessão será apresentado o modelo que foi usado para o embasamento e construção
desenvolvido para a Andrade Gutierrez.
O modelo utilizado para a abordagem do tema de classificação de proposta foi baseado na
prática recomendada da AACE internacional 17R-97. O Sistema de classificação de
estimativa de custos tem como finalidade mapear as fases e etapas do custo estimado junto
com uma matriz genérica de maturidade e qualidade que pode ser aplicada em uma grande
variedade de indústrias.
3 Modelo de Classes de Orçamento em Projetos de Engenharia
A diretriz e suas adendas foram desenvolvidas de forma que:
• Forneçam uma compreensão comum dos conceitos envolvidos na classificação das
estimativas de custos do projeto, independentemente do tipo de empresa ou indústria a
que se relacionam as estimativas;
• Definam e correlacionem completamente as principais características utilizadas na
classificação das estimativas de custos para que as empresas possam determinar de
forma inequívoca a forma como as suas práticas se comparam às orientações;
• Usar o nível de maturidade dos resultados da definição de projeto como a principal
característica para categorizar a estimativa de classes; e
• Refletir práticas geralmente aceitas na profissão de engenharia de custos.
Destacou-se na abordagem a visão de que o modelo de classificação de orçamentos é uma
diretriz, onde a prática recomendada deve ser utilizada como ponto de partida para o
estabelecimento de processos e terminologias de cada organização.
Nesse sentido, foi realizado um entendimento do modelo genérico, que consiste em uma
metodologia de classificação que abrange inúmeras características de classificação, onde a
característica primária e principal adotada para definir as classes é o nível de maturidade de
definição do projeto. Outras características como o uso final da estimativa, a metodologia, o
esforço e o tempo necessários para preparar a estimativa são considerados itens secundários.
As designações da classe de estimativa são rotuladas como Classes 1, 2, 3, 4 e 5. Uma estimativa da Classe 5 é baseada em um nível baixo de maturidade do projeto e uma estimativa de Classe 1 é mais próxima da definição completa do projeto. Esta abordagem arbitrária de "contagem regressiva" considera que a estimativa é um processo pelo qual iterações sucessivas são realizadas até uma estimativa final encerrar o processo.
Tabela 1 – Classificação Orçamentária
A tabela acima dispõe as seguintes informações:
Nível de Definição do Projeto (característica principal): Esta característica é baseada em porcentagem completa da definição do projeto, correspondendo aproximadamente ao
4 Modelo de Classes de Orçamento em Projetos de Engenharia
percentual completo de engenharia. Ela define a maturidade ou a extensão e a tipologia dos dados de entrada disponíveis para o processo de estimativa. Esses dados incluem a definição do escopo do projeto, documentação sobre requisitos, especificações, planos de projetos, desenhos, cálculos, lições aprendidas de projetos anteriores, dados de reconhecimento e outras informações que devem ser desenvolvidas para definir o projeto. Cada indústria terá um conjunto típico de entregas que serão usadas para suportar o tipo de estimativas usadas nessa indústria. O conjunto de entregas se torna mais completo a medida em que o nível de definição do projeto (isto é, a engenharia de projetos) progride.
Uso Final (característica secundária): As várias classes das estimativas de custo preparadas para um projeto geralmente têm diferentes propósitos e usos finais. A medida em que o nível de definição do projeto aumenta, a finalidade de uma estimativa geralmente subsidia avaliações estratégicas, estudos de viabilidade para autorização de financiamento e orçamentos para fins de controle de projetos.
Metodologia da estimativa (característica secundária): Uma lista dos possíveis métodos que podem ser empregados para elaborar uma estimativa em cada classe.
Faixa de precisão esperada (característica secundária): O intervalo de precisão esperado da estimativa indica o grau em que o resultado real do custo de um dado projeto pode variar em relação ao seu custo estimado. A precisão é tradicionalmente expressa como um intervalo percentual em torno do ponto de estimativa após a aplicação da contingência, com um nível declarado de confiança. A expectativa é que o resultado real do custo fique dentro desse intervalo, somando a estimativa inicial aos impactos positivos ou negativos dos eventos incertos – riscos –, dado que os eventos têm diferentes distribuições de frequência em diferentes tipos de projetos. Com a Classe do projeto evoluindo em função do aumento da maturidade dos dados, a precisão esperada da estimativa tende a melhorar, indicado por um intervalo (+/-) mais apertado.
Esforço de Preparação: O nível de esforço necessário para preparar uma determinada estimativa é uma indicação do custo, tempo e recursos requeridos em sua elaboração. A medida de custo desse esforço normalmente é expressa como um percentual dos custos totais do projeto. À medida em que o nível de definição do projeto aumenta, a quantidade de esforço para preparar uma estimativa também aumenta, assim como o seu custo em relação ao custo total do projeto. O esforço para desenvolver o projeto de engenharia não está incluso nas métricas do esforço; eles cobrem apenas o custo para preparar a estimativa de custo em si.
O Modelo na Andrade Gutierrez
O Processo de elaboração de proposta na AGE consiste em 7 fases conforme a figura abaixo:
Figura 1 - Processo de desenvolvimento de proposta AGE
Através de estudo de benchmark foi identificado que o processo padrão da companhia é
bastante robusto e considerado “best in class” para projetos de longo prazo, contudo
observou-se que para propostas de menor prazo uma adequação se faz necessária.
5 Modelo de Classes de Orçamento em Projetos de Engenharia
Figura 2 - Orientações de prazo de elaboração de proposta para o processo standard
Analisando-se as propostas realizadas pela AGE em 2017, observou-se que 31% delas
tiveram prazos menores que 1,5 mês e foram elaboradas a partir de projetos com níveis de
maturidade distintos. Apesar disso, observa-se que o nível de expectativa dos stakeholders
quanto a realização de todos os processos, ao nível de profundidade dos estudos e
consequentemente ao nível de assertividade na consolidação dos orçamentos foi igual.
Objetivo
Nesse sentido, viu-se como necessário elaborar um modelo de classificação de proposta de
acordo com a realidade da AGE, utilizando como base a prática recomendada da AACE 17R-
97, para direcionar as fases, “gates” e processos a partir dos níveis de classificação de
propostas estabelecidos e ter um modelo de comunicação junto aos diversos “stakeholders”
para alinhar as expectativas das atividades a serem realizadas e o nível de assertividade da
elaboração do orçamento.
Matriz de Classificação da AGE
O desenvolvimento do trabalho de classificação para a AGE foi divido em quatro etapas:
1. Análise das informações que são dados de entrada para elaboração de um orçamento,
onde foi consolidado que os fatores primários para classificar são o nível de definição de
maturidade de projeto e o tempo disponível para a realização do estudo, sendo o fator
tempo um item relevante para o nosso cenário e não abordado pela 17R-97 como
característica primaria de classificação.
2. Definição de classes na AGE, onde foi consolidado utilizar cinco classes de classificação,
assim como o direcionador da pratica recomendada 17R-97.
2.1 Classe 5, um orçamento onde usa-se métodos de estimativa estocásticos,
paramétricos e de modelagem, estimativas com poucas horas de preparação;
2.2 Classe 4, um orçamento onde usa-se métodos de estimativa paramétricos e de
modelagem;
2.3 Classe 3, um orçamento onde em geral, usa-se itens de linha com custo unitário
mas podem ser lançados em um nível de detalhe de conjunto, em vez de um
componente, podendo ser usados para áreas menos significativas métodos de
fatoração;
6 Modelo de Classes de Orçamento em Projetos de Engenharia
2.4 Classe 2, um orçamento onde em geral, grande parte dos itens de orçamento são
itens com custo unitário baseados em quantidades aferidas;
2.5 Classe 1, um orçamento onde todos os itens da curva A e B do orçamento são
itens com custo unitário baseados em quantidades aferidas.
3 Definição dos drives para a classificação de propostas, onde foi dividida em seis grandes
áreas (engenharia, planejamento, custo direto, custo indireto, formação de preço e
processo), a matriz dita quais estudos devem ser gerados em cada área de acordo com a
classe.
4 Análise dos intervalos associados as áreas, para cada área, onde foi necessário levantar
as variáveis que influenciavam na duração da elaboração da proposta. Na engenharia, as
variáveis levantadas foram o volume de informações (número de páginas do Edital), a
quantidade de projetos, o número de pacotes da EAP, a quantidade de disciplinas técnicas
previstas durante a obra, o levantamento e a verificação de quantitativos, o
dimensionamento dos caminhos de serviço.
No planejamento, as variáveis foram o número de serviços para o qual será feito um
planejamento detalhado até o nível de pacote de entregáveis e quais serviços serão
planejados a partir do conceito do “takt”, que é uma técnica empregada na sincronização de
operações visando promover o fluxo contínuo de trabalho (Frandson, Berghede e Tommelein,
2013).
Na parte de custo direto, as variáveis foram o número de serviços que terão composições
detalhadas (mão de obra, materiais, equipamentos e subempreiteiros), a quantidade de
insumos que serão cotados pelo setor de suprimentos e a complexidade dessas cotações.
Na área de custo indireto, as variáveis foram a metodologia de dimensionamento da mão de
obra indireta, podendo ser de forma expedita ou através da metodologia de FTE “Full Time
Equivalent” ou “Força de Trabalho Equivalente” (Assis, 2005).
Na parte de formação de preço, foi avaliado quais são os modelos de consolidação de preço
devem ser aplicados para cada tipo de classe.
Na parte de processo, foi definido o modelo de processo que devem ser seguidos de acordo
com a classe, sendo consolidados três modelos de processo para elaboração de proposta o
standard, simplificado e o básico.
Uma vez definidas as variáveis, o grupo dedicou-se a agrupá-las em conjuntos correlatos, de
forma que as saídas de cada classe tivessem conexão. Dessa forma, para cada uma das
cinco classes definidas para a AGE, havia um direcionador de quais produtos seriam gerados
em cada uma das áreas, conforme figura abaixo.
7 Modelo de Classes de Orçamento em Projetos de Engenharia
Figura 3 - Matriz de saídas do processo
METODOLOGIA
Definição do Grupo de Trabalho
O trabalho desenvolveu-se dentro de um modelo de grupos de trabalho, que são times
multidisciplinares que se reúnem periodicamente para discutir temas estratégicos.
Esses times são compostos por uma mescla de profissionais jovens e experientes, com
diferentes especialidades, passando por engenheiros com larga atuação em obras e
elaboração de propostas técnico-comerciais, especialistas em suprimentos, gestão de riscos,
planejamento, equipamentos de construção pesada e atuação comercial no desenvolvimento
de clientes e negócios.
Metodologia A3
As reuniões ocorreram semanalmente e seguiram uma linha de raciocínio construída a partir
de uma metodologia intitulada A3, oriunda da Filosofia Lean. Nessa técnica, deve-se
preencher os sete campos abaixo, cada um com entregáveis específicos, sendo que todo o
material deve ser passível de escrita dentro de uma folha em tamanho A3.
8 Modelo de Classes de Orçamento em Projetos de Engenharia
Tabela 2 - Divisão de campos do A3
CAMPO ENTREGÁVEIS
Contexto Relevância da situação / Gap de performance
Estado atual Fatos e dados que comprovem o conteúdo do contexto
Objetivos Metas SMART
Plano proposto Planejamento de implementação das melhorias
Riscos Identificação de riscos à implantação do plano proposto
Contramedidas Ações preventivas para eliminação ou mitigação dos riscos
Acompanhamento Definição de KPI’s e periodicidade de acompanhamento
No início, realizou-se um treinamento com a equipe sobre a metodologia do A3 e uma sessão
de alinhamento de expectativas, com o objetivo de nivelar com todos quais seriam as entradas
e as saídas do trabalho. A partir disso, as discussões do grupo de trabalho foram direcionadas
para construir o A3 conforme a metodologia descrita acima.
No contexto, discorreu-se sobre o motivo do assunto estar sendo tratado em tal fórum,
argumentando sobre sua relevância para a organização.
No estado atual, foram levantados dados sobre como é o processo atual de elaboração de
propostas na empresa e no mercado, e também sobre como é feita a classificação
orçamentária em empresas que já a realizam.
Nos objetivos, foram traçadas as seguintes metas para a equipe: elaborar um modelo de
Classificação de Propostas de acordo com a realidade da AGE até outubro/2017; direcionar
as atividades do processo de elaboração de propostas a partir dos níveis de classificação
orçamentária; comunicar as mudanças às áreas de interface até dezembro/2017.
Redesenho dos Processos Internos
Uma vez definidos os produtos que seriam gerados em cada Classe, conforme a figura 3, o
grupo iniciou a discussão da metodologia que seria utilizada em cada caso. O objetivo era
garantir que todos os processos internos da empresa fossem redesenhados para atender ao
que era estipulado em cada segmento de classe.
A AGE possui um processo de elaboração de propostas composto por sete fases, conforme
figura 1.
Cada fase é composta por diferentes atividades com produtos (entradas e saídas) claros e
uma matriz de responsabilidades bem definida, envolvendo profissionais de orçamentação,
engenharia técnica, suprimentos, atuação comercial, jurídica e financeira.
Para a remodelagem dos processos conforme a classificação orçamentária, definiu-se que
seriam desenvolvidas três tipologias distintas de elaboração de propostas:
• Processo standard: procedimento padrão de elaboração de propostas, é composto por
todas as sete fases e suas atividades originais, com a participação de todo o público de
interface.
• Processo simplificado: procedimento mais enxuto que o standard, foi desenhado para
direcionar a elaboração de propostas com prazo de entrega mais curto, onde o standard
se mostra ineficiente.
9 Modelo de Classes de Orçamento em Projetos de Engenharia
• Processo básico: procedimento com menor grau de assertividade dos três, foi
desenhado para elaborar propostas estimativas ou “budgetárias”, ou seja, referências
de preço para o desenvolvimento de oportunidades junto a potenciais clientes.
Dinâmica do Grupo de Trabalho
A dinâmica do grupo consistiu em analisar as sete fases separadamente, de forma a discutir
os entregáveis, público participante e modelos padronizados (ou templates) de todas elas.
Iniciando pela Fase 2 – Kick off e entendimento do escopo (vide figura 1), o grupo dividiu seus
esforços em quatro momentos:
• Avaliação das atividades: definição de quais atividades previstas no processo standard
deveriam ser mantidas nos dois outros tipos de processo: simplificado e básico.
• Avaliação do público: definição de quais setores corporativos deveriam ter profissionais
envolvidos nas reuniões e dinâmicas de grupo nos processos simplificado e básico.
• Avaliação da dinâmica: definição de metodologias mais eficientes para as reuniões e
dinâmicas de grupo, a partir do público definido na etapa anterior.
• Templates: revisão dos modelos padronizados existentes para atender aos novos
processos.
Essa sequência ocorreu ciclicamente, percorrendo as Fases. Por vezes, fez-se necessário
envolver outros stakeholders – inicialmente não envolvidos no grupo de trabalho – para
discutir assuntos de interface que exigiam a presença de profissionais com maior experiência
ou especialidades diferentes.
A cada semana, a discussão abordou um dos temas acima. Alguns papéis tiveram que ser
designados para garantir o bom andamento dos trabalhos: um superintendente foi apontado
como “patrocinador”, responsável por enfatizar a relevância do grupo, garantir a participação
da equipe e contribuir para as discussões com sua experiência profissional. Também foi
definido um “facilitador” para atuar na preparação do material que foi levado em cada reunião
do grupo, alinhado com as diretrizes do patrocinador e com as expectativas da empresa.
Além do grupo contar com uma equipe fixa de dezesseis profissionais de diferentes
especialidades, foram realizadas pesquisas com toda a liderança da equipe de engenharia da
AGE. Tais pesquisas visavam entender quais eram as atividades do processo existente
(standard) que deveriam continuar sendo realizadas, seja porque traziam um diferencial
competitivo para a empresa ou porque diminuíam a exposição a riscos. Adicionalmente, os
entrevistados foram solicitados a apontar quais atividades deveriam ser mantidas por serem
requisitos legais, contratuais ou da política de compliance da AGE.
Também foram realizadas pesquisas em um ambiente virtual para entender mais a fundo a
percepção da equipe. Essa segunda rodada de pesquisas consistiu de perguntas onde o
entrevistado deveria avaliar os templates existentes em uma escala de zero (pior) à cinco
(melhor), assim como apontar seus aspectos que mais e menos agregavam competitividade
a proposta. Por fim, havia espaço para inclusão de sugestões e comentários.
A partir do resultado dessas pesquisas, o facilitador tinha o papel de listar quais atividades
eram percebidas pela equipe como mais e menos relevantes e levar essas informações para
o grupo de maneira visual, permitindo que as discussões fossem estruturadas e alinhadas
com os objetivos traçados.
10 Modelo de Classes de Orçamento em Projetos de Engenharia
Figura 4 – Exemplo de exposição visual dos resultados das pesquisas
Dinâmica das Reuniões Semanais
Em cima dos dados coletados, as discussões iniciaram-se pela análise das atividades
previstas no processo standard, sempre respeitando a sequência de Fases desenhada.
Também visando uma melhor comunicação visual, cada Fase foi representada em formato de
fluxograma, visando facilitar o entendimento dos participantes do grupo e orientar as
discussões.
Figura 5 – Fluxograma da Fase 4 do processo standard
O objetivo das discussões era definir se havia propósito em realizar as atividades do processo
standard para cada uma das cinco Classes de proposta. A partir dos resultados das pesquisas
11 Modelo de Classes de Orçamento em Projetos de Engenharia
realizadas, o grupo discutia quanto a inclusão ou exclusão das atividades nos processos
básico e simplificado. Ainda valendo-se de recursos visuais, ao final das reuniões o grupo
analisava o resultado final de cada Fase, observando se não havia atividades desconexas
e/ou falhas no raciocínio.
De maneira análoga, cada vez que uma das atividades era um workshop ou uma dinâmica de
grupo, a discussão virava-se para o público que deveria participar em cada uma das cinco
Classes. O grupo utilizou-se dos resultados das pesquisas virtuais para orientar a tomada de
decisão.
Ao final da discussão de cada Fase, o facilitador enviou um resumo para todos os participantes
do grupo, de forma que todos tivessem acesso ao conteúdo gerado.
Figura 6 - Ferramenta visual para discussão sobre as atividades de cada classe
RESULTADOS
A partir da matriz de saída dos processos desenhada (Figura 3), foram realizados testes
dentro da empresa. A medida que a AGE elaborava novas propostas, realizou-se a
classificação das mesmas e depois verificou-se se os produtos gerados estavam condizentes
com a matriz. Dado que eram as primeiras utilizações da referida matriz, esses testes tinham
por objetivo validar o trabalho desenvolvido pelo grupo e realizar eventuais ajustes.
Case 1
A primeira proposta a ser analisada foi uma oportunidade com um cliente privado de grande
porte do setor metalúrgico, que possuía como fatores primários para classificação um projeto
básico e solicitava que a proposta estivesse pronta em 34 dias corridos. A partir desses
dados, foi realizado a classificação da proposta através da análise dos intervalos associados
(Figura 3), e a capacidade da equipe do projeto de realizar as atividades, sendo concluído
12 Modelo de Classes de Orçamento em Projetos de Engenharia
que a proposta era compatível com uma Classe 3. Ao final de sua elaboração, constatou-se
que foram gerados alguns produtos além do previsto na matriz.
No direcionador de engenharia, evoluiu-se mais do que o preconizado na matriz, uma vez que
realizou-se a verificação de quantitativos da curva AB (95% do custo direto) enquanto a matriz
previa apenas da curva A (80% do custo direto). No entanto, o desenvolvimento de
metodologia executiva ocorreu conforme o esperado, apenas para a curva A.
Situação análoga aconteceu no direcionador de planejamento, onde elaborou-se o
planejamento da curva AB enquanto o previsto era somente da curva A.
Com relação aos custos diretos e indiretos, percebeu-se uma situação ainda mais
discrepante. Enquanto a matriz previa a elaboração de composições de custo unitário (CPU’s)
somente para a Curva A, na prática a equipe da proposta realizou essa atividade para a curva
AB. Além disso, o dimensionamento da mão de obra indireta por FTE (Full Time Equivalent)
foi realizado para alguns setores da obra, como Produção e Planejamento, o que não é
previsto para uma proposta de Classe 3, assim como o dimensionamento de custos indiretos
com análise de particularidades locais (ex: disponibilidade de empresas alimentícias,
transporte local, sindicato da região) que também foi realizado. As cotações de insumos e
materiais foram conforme o previsto, considerando a curva A e preços de referência para a
curva B.
Quanto a formação de preço, a matriz previa o processo de fechamento padrão da AGE para
a Classe 3, que foi o que ocorreu.
Em uma análise final, apesar da proposta ter sido inicialmente classificada como uma Classe
3, os produtos gerados oscilaram entre as Classes 2 e 3. Entende-se que parte dessas
variações ocorreram em função do baixo apetite ao risco associado ao projeto, dado que havia
disponibilidade de recursos internos para tal, e parte ocorreu devido a limitações do sistema
interno de orçamentação, que não tinha a flexibilidade necessária para gerar somente os
entregáveis mapeados. Segue representação visual da análise conforme a matriz de saídas
do processo (figura 3):
Figura 7 - Case 1 conforme matriz de saídas do processo
13 Modelo de Classes de Orçamento em Projetos de Engenharia
Case 2
A segunda proposta a ser analisada foi outra oportunidade com um cliente privado, dessa vez
do setor de geração de energia eólica, que possuía como fatores primários o projeto conceitual
e um prazo para a elaboração da proposta de 16 dias corridos. Utilizando a mesma
metodologia para classificação do case 1, averiguou-se que essa proposta era compatível
com uma Classe 4. Contudo, no meio do processo o prazo foi estendido para 54 dias corridos
e foi contratada uma projetista para desenvolver o projeto básico, alterando assim os fatores
primários de classificação. Sob essa ótica, a proposta se encaixaria em uma Classe 2. Ao
final de sua elaboração constatou-se que novamente os entregáveis destoaram um pouco do
previsto, já que foram desenvolvidos alguns que somente são previstos na Classe 1.
No direcionador de engenharia, desenvolveu-se a metodologia executiva e realizou-se a
verificação de quantitativos da curva AB (95% do custo direto), conforme previsto na matriz.
Por outro lado, realizou-se o dimensionamento dos caminhos de serviço, o que só era previsto
para propostas de Classe 1.
No direcionador de planejamento, elaborou-se o planejamento da curva AB, conforme o
previsto. Contudo, o direcionador de planejamento da Classe 2 também previa a utilização da
técnica do “takteamento” (nivelamento do ritmo de produção) para a Curva A, o que não foi
feito.
No que concerne aos custos diretos e indiretos, a matriz previa a elaboração de composições
de custo unitário (CPU’s) e cotações de insumos e materiais para a curva AB, o que ocorreu.
O dimensionamento da mão de obra indireta por FTE foi realizado novamente para os setores
de Produção e Planejamento, o era previsto para uma proposta de Classe 2, assim como o
dimensionamento de custos indiretos com análise de particularidades locais (ex:
disponibilidade de empresas alimentícias, transporte local, sindicato da região) que foi
realizado.
Quanto a formação de preço, a Classe 2 previa o processo de fechamento padrão da AGE,
que foi o que ocorreu.
Em uma análise final, apesar da proposta ter sido inicialmente classificada como uma Classe
4, a extensão de prazo e o desenvolvimento do projeto a transformaram em uma Classe 2,
sendo que os produtos gerados ficaram majoritariamente dentro do que estava previsto na
matriz.
O fato dos caminhos de serviço terem sido dimensionados tem relação direta com o tipo de
obra ser um parque eólico, onde esse estudo tem alta relevância de custo e influência no
planejamento.
Segue representação visual da análise conforme a matriz de saídas do processo (figura 3):
14 Modelo de Classes de Orçamento em Projetos de Engenharia
Figura 8 - Case 2 conforme matriz de saídas do processo
Próximos Passos
O grupo de trabalho continuará analisando novos “cases” durante a elaboração de outras
propostas, a fim de expandir a amostragem de dados e aferir a aderência às diretrizes
geradas.
A partir de um volume de informações mais compreensivo, pretende-se identificar padrões de
aplicação da classificação orçamentária por tipologia de obra dentro da construção civil e
também verificar a aplicabilidade do estudo em outras indústrias.
Desafios
Uma das principais dificuldades identificadas foi o enquadramento de todos os entregáveis
das propostas dentro de uma mesma Classe na matriz. Cada proposta tem as suas
particularidades e apresentou pelo menos um entregável que destoava dos demais,
dificultando a classificação da mesma.
Também foi difícil prever o real prazo para entrega das propostas, dado que ele
frequentemente foi postergado pelos clientes, alterando o planejamento e a gestão de
recursos previstos para a elaboração das propostas.
Outro desafio se refere a gestão de riscos dentro do processo de classificação orçamentária.
Existe um paradoxo nessa questão: quanto menos tempo se tem para desenvolver uma
proposta, mais enxuto o processo de elaboração deve ser. No entanto, a tendência é que ela
seja desenvolvida com menor assertividade, teoricamente aumentando a exposição a riscos.
Esse fator torna a discussão sobre gestão de riscos bastante interessante e relevante.
O grupo ainda não definiu como será feita a abordagem deste assunto em cada Classe, porém
já entendeu-se que a parametrização utilizada na simulação de cenários (técnica comum na
15 Modelo de Classes de Orçamento em Projetos de Engenharia
gestão de riscos) deve considerar a Classe da proposta, visto que ela representa uma análise
completa do cenário em que a estimativa foi elaborada.
GANHOS DO TRABALHO
Até o momento, notaram-se ganhos referentes a gestão dos recursos da engenharia durante
a elaboração de propostas. Tendo uma diretriz clara sobre os produtos que devem ser
elaborados conforme cada Classe, os gestores conseguem direcionar suas equipes para
desenvolver os estudos que trarão o maior impacto para a proposta, seja em termos de
aumento de competitividade ou de mitigação de riscos.
Além disso, os profissionais da área comercial da empresa passam a ter uma visão mais clara
dos produtos que serão gerados de acordo com as informações que os clientes disponibilizam
e com o tempo que a engenharia terá para desenvolver os projetos, o que possibilita uma
atuação comercial mais assertiva e eficaz.
INOVAÇÃO
A análise de processos de desenvolvimento de estimativas de custo é pouco explorada na comunidade científica brasileira limitando-se as considerações derivadas da precisão do desenho projetivo (IBRAENGE, 2016). O Instituto Brasileiro de Auditoria de Obras Públicas lança luz à temática das classes de orçamento também com foco na precisão das estimativas. O IBRAOP alerta que os percentuais admissíveis referentes a precisão não devem ser utilizados para justificar a ocorrência do sobrepreço ou se extrapolação dos limites percentuais de aditamento contratual.
No cenário internacional o assunto ganha destaque sendo assunto de artigos relevantes, onde são explorados elementos adicionais do sistema de classes de orçamento, tais como riscos e análise de fatores. Oberlender et al (2001) analisou o impacto de 45 elementos na acurácia de uma estimativa de custos, correlacionando aspectos intrínsecos e extrínsecos do projeto.
Neste contexto, este artigo traz como caráter inovador a percepção do sistema de classes de orçamento como elemento de otimização de processos no mercado de engenharia brasileiro, ampliando o entendimento usual atrelado ao nível de precisão da estimativa de custos.
16 Modelo de Classes de Orçamento em Projetos de Engenharia
REFERÊNCIAS
Christensen, P. e Dysert, L., 1997, AACE International Recommended Practice No.17R-97 – Cost Estimate Classification System.
Christensen, P. e Dysert, L., 2011, Prática Recomendada nº 17R-97 da AACE International – Sistema de Classificação para Estimativa de Custos e Orçamentação.
Christensen, P. e Dysert, L., 2012, AACE International Recommended Practice No.56R-97 – Cost Estimate Classification System – As Applied for the Building and General Construction Industries.
Christensen, P. e Dysert, L., 2016, AACE International Recommended Practice No.18R-97 – Cost Estimate Classification System – As Applied in Engineering, Procurement, and Construction for the Process Industries.
Frandson, A, Berghede, K e Tommelein, I.D., 2013, Takt time planning for construction of exterior cladding.
PMI, Um Guia do Conhecimento em Gerenciamento de Projetos, Guia PMBOK 5ª ed., EUA, Project Management Institute, 2013.
Assis, M., 2005, Indicadores de Gestão de Recursos Humanos: usando indicadores demográficos, financeiros e de processos na gestão do capital humano, Qualitymark, Rio de Janeiro, 1ª Edição.
INSTITUTO BRASILEIRO DE AUDITORIA DE ENGENHARIA. OT-004/2016-IBRAENG: Precisões e Margens de Erros dos Orçamentos de Engenharia. Fortaleza, 2016. Disponível em http://www.ibraeng.org/pub/normas. Acesso em Setembro de 2017.
INSTITUTO BRASILEIRO DE AUDITORIA DE OBRAS PÚBLICAS. Orientações Técnicas do IBRAOP. OT IBR 004/2012. Disponível em http://www.ibraop.org.br/enaop2012/docs/OT-IBR_004-2012.pdf. Acesso em Setembro de 2017.
Oberlender, G. e Trost, S., 2001, Predicting accuracy of early cost estimates based on estimate quality, (Journal of construction engineering and management), 127:173-182.