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Introduo
Atribui-se ao Romantismo a descobertada criana e Rousseau
(1985) apela necessidade de encarar a criana na sua infncia,
contrariando os tericos que a medem e a avaliam pela bitola da sua
prpria configurao de adultos (Torrado, 2002, p. 54). nossa
preocupao, aqui, na 1 infncia, mais concretamente entender como a
criana aprende e se desenvolve. Face a esta preocupao o nosso
intento no explanar os pressupostos dos vrios tericos do
desenvolvimento humano, mas, sobretudo, tomar abordagens mais
gerais sobre o prprio processo do desenvolvimento, os contextos e as
interaces humanas em que ocorre, se potencializa ou inibe.Neste sentido, optmos por abordar (1) a importncia dos
contextos do desenvolvimento humano atravs dos contributos da
perspectiva ecolgica e (2) o sentido global desse desenvolvimento
atravs dos contributos da perspectiva humanista. Ambas as teorias,
estando atentas s caractersticas individuais do ser humano,
contextualizam o seu desenvolvimento num sistema psicossocial de
influncias. O ser humano estudado como um todo em interaco comos diversos subsistemas, sendo o seu centro da ateno a experincia
subjectiva de cada pessoa.
Num primeiro momento, expomos uma sntese da perspectiva
ecolgica que apresenta o ser humano contextualizado numa rede de
influncias capazes de afectar o seu prprio desenvolvimento, quer seja
ao nvel individual, englobando a forma como cada um sente e vive o
contexto em que est inserido (microssistema), quer ao nvel dasinteraces entre os diferentes contextos em que se move
(mesossistema). Esta perspectiva configura, ainda, dois outros nveis de
influncias que, sendo mais abrangentes, constituem sistemas em que
cada ser humano no participa activamente mas que o afectam o
exossistemae o macrossistema. Reportando-nos creche, este captulo
descreve o desenvolvimento das crianas segundo uma perspectiva de
baixo para cima da creche (microssistema), uma perspectiva exterior-interna que focaliza as relaes famlia/creche (mesossistema), uma
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perspectiva interior centrada nos condicionalismos laborais dos
educadores (exossistema), bem como todas as determinantes sociais,
econmicas, culturais e/ou polticas da comunidade e tambm dos
responsveis pelas instituies que, na perspectiva exterior, afectam aorganizao e funcionamento das creches (macrossistema).
Um segundo momento aborda a perspectiva humanista que
considera que o ser humano se desenvolve em trs grandes dimenses:
auto-conceito, relao com o outroe viso de mundo. A interdependncia
entre estas dimenses prefigura o desenvolvimento do ser humano
como produto e produtor, entrecruzado numa rede de influncias
mais prximas e mais longnquas, tal como na perspectiva ecolgica,mas determinantes na configurao da sua personalidade.
No incio da vida, a formao do auto-conceito est relacionada
com a sensao de confiana bsica desenvolvida atravs das
interaces precoces me/pai-filho. Todavia, ao longo de toda a vida, vai
sendo modificado pelas variadas experincias, incluindo experincias de
sucesso ou insucesso vividas. O emprego das mes, e a consequente
colocao da criana em contextos de creche em idades muito precoces,veio alterar em muito a dinmica das interaces precoces com outros
significativos. As relaes estveis e seguras com outros significativos
relao com o outro sodeterminantes na formao do sentimento de
confiana bsica e, consequentemente, da personalidade. A
compreenso do desenvolvimento baseada na centralidade das relaes
enfatiza a ampla abrangncia da rede de relaes, que no apenas as de
pais-criana, mas englobando tambm todas as interaces com osoutros, nomeadamente educadores e grupo de pares. Importa, ento,
analisar o que a investigao nos diz sobre a influncia do outro no
desenvolvimento social e emocional da criana que frequenta a creche.
O processo de socializao da criana comea na famlia, mas a
sua entrada para outras instituies educativas amplia o seu contexto
social e a sua viso de mundo. Ancorada numa teia de relaes
afectivas e sociais estveis, o alargamento desta viso de mundodepender das propostas que o contexto fsico, cultural e social
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facultar, capazes de promoverem o desenvolvimento de competncias
cada vez mais amplas e complexas. Ou seja, integra-se neste mbito a
importncia das experincias cognitivas e sensoriais na infncia, entre
outras, como processos activos e dinmicos na construo da viso demundo mais alargada.
1.1. Desenvolvimento em contexto: contributo da
perspectiva ecolgica
A perspectiva ecolgica do desenvolvimento humano, preconizada
por Bronfenbrenner (1987), considera que o indivduo se desenvolve
num sistema complexo afectado por mltiplos factores do meio
ambiente. Ou seja, relaciona o desenvolvimento e a educao do
indivduo, ao longo do seu ciclo de vida, com as influncias do contexto
a que est vinculado e identificado, qualquer que seja a idade, o gnero
ou a cultura. Nesta perspectiva, o desenvolvimento concebido como
um fenmeno contextualizado e contnuo que, actuando num tempo e
num espao, pressupe a integrao das propriedades particulares da
pessoa e a estrutura dos cenrios ambientais, elementos dos processos
prximos(Bronfenbrenner & Morris, 1999).
As condies em que cada ser humano vive e cresce condicionam
o seu prprio processo de desenvolvimento, pelo que este ter de ser
entendido em funo dos cenrios mais prximos e imediatos e,
simultaneamente, em interdependncia com os mais amplos, em que os
primeiros se inserem, dada a ligao natural entre os diferentescontextos. Para Tietze (Tietze & Rossbach, 1984; Tietze, 1986), cenrio
uma estrutura social relativamente estvel, associada especificidade
do lugar, e onde ocorrem padres de aco relativamente estveis,
inseridos num contexto mais amplo (organizacional, legal, econmico).
Cada cenrio proporciona ao ser humano alguma actividade capaz de
favorecer uma conduta progressiva que possui um momento prprio e
que tem um significado ou inteno para os que participam no contexto(Bronfenbrenner, 1987, p. 65). Como tal, o cenrio susceptvel de ser
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operacionalizado em: i) variveis de estrutura, que incluem as
caractersticas fsicas, ambientais ou humanas e; ii) as variveis de
processo, que se referem dinmica das interaces da criana com os
outros indivduos. Nesta perspectiva, o meio deixa de ser visto comouma entidade exterior e esttica que afecta os seres humanos em
desenvolvimento, passando tambm a ser entendido como uma fora
dinmica, interactiva e em constante mudana, ou seja, passa a ser
equacionado como uma rede de relaes que configura a estrutura do
significado (Rogoff, 1993, p. 53). Este contexto em que os processos
prximos acontecem, considerando o que neles e entre eles decorre,
deve ser, consequentemente, analisado como um conjunto de unidadessistmicas e interdependentes (Bronfenbrenner, 1987).
Para Bronfenbrenner e Morris (1999), o desenvolvimento humano
pressupe no s estabilidade, mas tambm mudanas relevantes nas
caractersticas da pessoa, tomando como referncia a dimenso tempo:
micro, meso e macro. Este cronossistema ou dimenso temporal
considera que o desenvolvimento depende da continuidade/
descontinuidade (micro-tempo) e da periodicidade (meso-tempo) dosprocessos iniciados e ocorridos ao longo do ciclo de vida, mas tambm
das mudanas dentro e ao longo das diferentes geraes (macro-tempo).
O percurso da vida de cada ser humano entendido como um processo
determinado num momento histrico, multidireccional e
multidimensional, dinmico e plstico, na medida em que
influenciado pelas relaes entre os sistemas ecolgicos em que est
inserido e que promovem ou dificultam o seu crescimento(Bronfenbrenner, 1986, 1987, 1994; Bronfenbrenner & Morris, 1998).
Atravs de processos de interaces recprocas, progressivamente
mais complexas, regulares, e ao longo de extensos perodos de tempo,
entre o organismo bio-psicolgico humano e o contexto colectivo social,
objectos e smbolos do meio exterior, o ser humano envolve-se
activamente no seu prprio desenvolvimento pessoal (Bronfenbrenner &
Morris, 1999). A criana , assim, entendida como um agente activo edinmico na construo de si prpria e do mundo, segundo uma
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agendacontextualizada numa praxis social e histrica, entendendo-se,
por conseguinte, que a educao d-se e adquire-se; o mesmo acontece
natureza (Wartofsky, 1984, citado por Rogoff, 1993, p. 51).
As mudanas no meio influenciam, em funo do impacto quepossam ter nos indivduos, o seu prprio desenvolvimento. A influncia
do contexto, actuante e eficaz, pressupe a possibilidade de os factores
externos ao indivduo imprimirem mudanas no seu desenvolvimento.
Se a aco do meio for intencional, coerente e sistemtica, o
desenvolvimento pode ser concebido, simultaneamente, como produto
e produtor, formando-se uma rede de efeitos interdependentes.
Apesar da sua capacidade de produzir mudanas, a influncia domeio reveste-se sempre de um carcter subjectivo, pois cada ser
humano, directa ou indirectamente, o constri, o experimenta, o
vivencia e o percebe (Bronfenbrenner, 1987), de forma particular e
nica, revestido de um significado pessoal, porque revestido de suas
caractersticas, disposies, recursos, capacidades e curiosidade
(Bronfenbrenner & Morris, 1999).
Esta plasticidade do prprio desenvolvimento est, por isso,associada aos perodos crticos e aos perodos sensveis, entendidos
como perodos de tempo ptimos para que certas competncias surjam
e durante os quais o ser humano especialmente receptivo s
influncias do meio. Ou seja, o organismo est mais sensvel e receptivo
a estimulao externa durante um perodo crtico do que noutros
momentos do desenvolvimento (Prez Pereira, 1995, Mendoza, 1999).
Nesta perspectiva, Bailey (2002) prope a utilizao do termo perodocrtico como uma oportunidade de experincias indispensveis a um
saudvel crescimento de todas as crianas, em funo do
desenvolvimento, necessidades e predisposies na aprendizagem de
uma competncia ou conceito. Por outro lado, osperodos sensveisno
se referem apenas aos primeiros anos. Algumas dimenses, por
exemplo, a linguagem e a alfabetizao, tm a sua possibilidade de
optimizao numa fase posterior 1 ou, at, 2 infncia.
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Tambm Sameroff e Fiese (1990) referem a necessidade de
ocorrerem modificaes no meio, com vista a potencializar as melhores
condies para o desenvolvimento adequado e desejado, ou anular a
influncia de possveis variveis negativas. Esta perspectivatransaccionalconsidera que o desenvolvimento, submerso num sistema
regulador, um produto de interaces contnuas e dinmicas,
consubstanciado pelas transaces recprocas entre determinado
organismo e o meio. Segundo estes autores, assim como h uma
organizao biolgica o gentipo que desempenha um papel crucial
na regulao das expresses fenotpicas, existe tambm uma
organizao social o mestipo que regula o modo como a pessoa seintegra na sociedade e se forma para responder aos desafios de tal
integrao. Esta organizao, operando essencialmente atravs dos
padres familiares e culturais de socializao, define a matriz luz da
qual so criados os ambientes para proteger, tratar e educar as
crianas.
Sendo o desenvolvimento um processo estruturado pelas
directrizes contidas no mestipo, o momento em que se produz algumamudana no meio influencia esse mesmo desenvolvimento. As
regulaes do desenvolvimento acontecem em padres automticos de
interaces momentneas (microrregulaes), em interaces ocorridas
ao longo de actividades comuns e/ou dirias (minirregulaes), bem
como em mudanas surgidas nas experincias e que permanecem
durante um longo perodo de tempo (macrorregulaes). Por
conseguinte, o desenvolvimento da criana depende do uso que ela faz,na terminologia de Bruner e Haste (1990), da caixa de ferramentasque
o mundo lhe facilita atravs dos sistemas de macro, mini e
microrregulao (Sameroff & Fiese, 1990), especialmente
operacionalizados na preparao de ambientes estimulantes e em
interaces ricas e diversificadas.
Os sistemas reguladores podem incluir os indivduos, a famlia e
a comunidade, cada um com os seus prprios cdigos reguladores queincorporam diferentes aspectos do desenvolvimento e,
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consequentemente, com diversas estratgias de interveno. Esta
bidireccionalidade entre os factores biolgicos e sociais (Shonkoff &
Meisels, 1990) pressupe que a relao ambiente/contexto/pessoa no
influencia de igual forma todo o ser humano (Sameroff & Fiese, 1990).Supe-se que as alteraes que a criana sofre influenciam o seu
ambiente envolvente, provocando-lhe mudanas que, por sua vez,
acabam por afectar a prpria criana. A forma como as crianas
interagem com o ambiente (por exemplo, com os seus educadores)
altera esse ambiente e provoca determinadas respostas no ambiente (ou
nos educadores). Este ambiente modificado, por sua vez, repercute-se
de novo sobre as crianas, afectando o seu desenvolvimento.Pondera-se, assim, a necessidade de se considerar a
interdependncia entre os diferentes tipos de cenrios e contextos, e de
se atenderem s caractersticas individuais, aos comportamentos, aos
processos e s actividades especficas que neles decorrem. A criana
no existe no vazio (Eisold, 2001), desenquadrada de um contexto
humanizado. O seu processo de se tornar pessoa ir depender das
oportunidades fornecidas pelos seres humanos que a rodeiam,nomeadamente pais, professores/educadores e pares. Ou seja, no
possvel separar a construo pessoal da realidade circundante, dado
que no existem nem situaes livres de contexto nem competncias
descontextualizadas (Rogoff, 1993, p. 53).
Ao nvel individual, o desenvolvimento pressupe mudanas
qualitativas e quantitativas (Rogoff, 1993) e uma consequente
reorganizao ao nvel de percepo/ concepo e de aco/actividade.Piaget (1963, 1966) ilustrou este processo ao referir que o pensamento
foi primeiro aco intencional e esta se institui tendo por base os
reflexos e actividades motoras ligadas subsistncia do indivduo. Esta
reorganizao permite ao ser humano em diferentes contextos e em
diferentes momentos responder e resolver, de forma eficaz, as
situaes do quotidiano, atravs do recurso e apoio dos outros. Estes
outros aparecem particularmente valorizados na teoria dodesenvolvimento cognitivo proposto por Vygotsky (1978).
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Nas sociedades actuais e mais industrializadas, a creche emerge
como instituio relevante no desenvolvimento das crianas. Com efeito,
a creche constitui, actualmente, um contexto onde muitas crianas
crescem e se desenvolvem, em interaco com os diferentes sistemasque integram os seus contextos de desenvolvimento. Como referimos,
Bronfenbrenner (1987) define o contexto em quatro nveis de sistemas
concntricos e gradualmente mais abrangentes (micro, meso, exo e
macrossistema), numa organizao semelhante s bonecas russas.
Tomaremos esta perspectiva na anlise do potencial de aprendizagem e
de desenvolvimento na 1 Infncia, em contexto de creche: as crianas
(microssistema), os profissionais e as famlias (mesossistema), asinstituies (exossistema), e o Estado (macrossistema).
1.1.1. Microssistema
O microssistema abrange os cenrios de participao imediata da
criana, configurados por caractersticas prprias, inerentes
diversidade de padres de actividade e de experincias, bem como ao
desempenho de papis que favorece. A famlia e a creche so exemplos
de microssistemas particularmente relevantes na 1 infncia.
Na sociedade contempornea, as crianas iniciam a frequncia de
instituies educativas desde tenra idade, sendo colocadas num novo
microssistema a creche que, pelas suas caractersticas, ir facilitar
ou inibir o seu desenvolvimento. Sabe-se que as creches propem uma
configurao em tudo diferente da famlia, j que, em vez de ser um
beb a receber a ateno por parte de dois ou mais adultos, encontram-
se muitos bebs de uma mesma idade a receber cuidados de poucos
adultos.
Por outro lado, os educadores nas creches desenvolvem as suas
prticas educacionais, baseando-se no conhecimento adquirido e
acumulado sobre o processo de desenvolvimento e aprendizagem na 1
infncia, conhecimento influenciado e mediado pelos seus valores
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culturais bem como pelo conhecimento dos prprios contextos
educativos das famlias (Bergen et al., 2001).
A participao directa da criana no contexto creche
influenciada pelas caractersticas prprias e pela forma como cada umaexperimenta e vivencia o grupoespecfico(Harms & Clifford, 2002) num
dado cenrio face-to-face com caractersticas fsicas, sociais e
simblicas capazes de promoverem ou inibirem interaces
progressivamente mais complexas com o meio imediato
(Bronfenbrenner & Morris, 1999).
Como se pode verificar na Figura 1, existe uma inter-relao e
inter-dependncia entre diferentes aspectos (estruturais e processuais)que constituem o microssistema creche e que afectam o
desenvolvimento da criana em funo da forma como cada uma o
experimenta.
Figura 1
Elementos do microssistemado desenvolvimento da criana na creche
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A estrutura (variveis estruturais) e os processos-interaces
(variveis processuais) so aspectos-base do desenvolvimento da
criana no microssistema educativo creche que, muitas vezes, sesobrepem (Harms & Clifford, 2002), mas que so igualmente
importantes (Goelman & Pence, 1987a, 1987b). As variveis estruturais
referem-se aos aspectos estveis do contexto, nomeadamente a
organizao do espao fsico, equipamentos e materiais, proporo
adulto-criana, etc. As variveis de processo correspondem s
interaces entre educador-criana, entre os adultos (quer educador-
educador, quer educador-pais) e crianas entre si, bem como o grau deenvolvimento das crianas nas actividades educativas intencionais que
so proporcionadas (Bertram & Pascal, 1997; Dahlberg et al., 1999;
Harms & Clifford, 2002).
J os trabalhos de Skeels e Dye (1939), Spitz (1945) e Dennis
(1960) sobre a maleabilidade do desenvolvimento das crianas, os
autores evidenciam as alteraes deste desenvolvimento em funo de
caractersticas especficas do meio envolvente (Shonkoff & Meisels,1990). Porm, a importncia no reside apenas, e s, nas
caractersticas do ambiente proporcionado s crianas pequenas, mas
tambm nas potencialidades do ambiente no qual o organismo funciona
(Kagan & Klein, citado em Goldhaber, 1980).
Globalmente, a estrutura do meio fsico, os espaos e os materiais
so susceptveis de originarem diferentes padres de comportamento,
como resposta especificidade do cenrio em que a criana participa(Bronfenbrenner, 1987; Lamb et al., 1979; Portugal, 1998). Tambm
nas creches, esta organizao do espao educativo regula as
oportunidades de interaco entre companheiros e adultos, tornando-se
crucial para o desenvolvimento e aprendizagem de cada indivduo.
Os aspectos do ambiente e as potencialidades criadas na
interaco operacionalizam um outro tipo de relao com o material.
De forma natural e espontnea, a criana escolhe a actividade, com oque quer brincar incluindo a escolha de material (acessibilidade e
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quantidade) e o contedo (diversidade e qualidade) e onde quer
brincar o local (privacidade, amplitude ou local de interaces).
Simultaneamente, a prpria organizao da sala permite criana
escolher com quem quer brincar, favorecendo situaes/materiais deinteraco em pequenos grupos numa tarefa, a seleco dos seus pares
de jogo e as decises de iniciar, continuar ou terminar as prprias
actividades (Haddad, 1993).
Os espaos, equipamentos e materiais especficos em cada sala,
seleccionados com base em objectivos educativos, so tambm espelho
das opes pedaggicas e das caractersticas de cada educador
(Cataldo, 1983; Oliveira & Rossetti Ferreira, 1986; Carvalho, 1997;Portugal, 1998). Estes espaos, equipamentos e materiais reflectem o
valor e as funes que se lhes atribuem, podendo servir de imagem ou
ilustrar aquilo que se espera do desenvolvimento das crianas mais ou
menos limitados, mais ou menos condicionados (Marcho, 2003).
agindo e interagindo com os outros e com os objectos que a
criana constri o seu conhecimento, inclusivamente sobre si mesma, e
as bases para estruturar a sua personalidade. Estas interaces com omeio fsico e social, resultantes da prpria aco da criana sobre o
meio, constituem experincias de carcter fsico, cognitivo, social ou
afectivo que contribuem, de forma integrada, para o seu
desenvolvimento (Piaget, 1966). No podemos esquecer que Piaget
caracterizou a primeira fase da vida do ser humano como o perodo
sensrio-motor querendo com isto dizer que a criana recolhe
informao sobre o mundo atravs dos seus sentidos (sensrio) econstri o seu conhecimento atravs de uma abordagem directa e fsica
com esse mesmo mundo (motor).
As variveis processuais, tal como atrs referimos, que tm como
uma das unidades bsicas as relaes didicas, englobam as conexes
entre as pessoas que esto presentes no meio, a natureza destes
vnculos e a sua influncia indirecta sobre a pessoa em
desenvolvimento, atravs do efeito que produzem naquelas que serelacionam com ela directamente. A este respeito, Bronfenbrenner
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(1987) refere as limitaes de alguns estudos, nomeadamente: i)
centrarem-se mais no processoda interaco e no no seu contedo; ii)
analisarem o indivduo separadamente e no a unidade didica da
interaco; iii) conceberem o contexto em termos puramentecondutivistas (p. 69), esquecendo o contexto social mais prximo e o
mais amplo e; iv) no analisarem a actividade molar da criana, sua
complexidade e contedo como elementos que reflectem o seu
desenvolvimento. Actividade molar definida pelo autor como uma
conduta progressiva que tem um momento prprio e um significado
para os que participam no meio. Ou seja, um processo contnuo e no
momentneo que, ocorrendo num momento prprio, contribui para asua persistncia no tempo bem como para a sua resistncia
interrupo at que a actividade esteja completa. Bronfenbrenner
(1987) considera que as actividades molares variam em funo do grau
e da complexidade dosobjectivos que as motivam, seguindo parmetros
no s da perspectiva temporale meta estruturada, mas tambm esto
relacionadas com capacidade de invocarem outros elementos no
presentes no contexto imediato. Assim, as actividades molecularesdiferenciam-se das molares, porque nem todas as condutas tm o
mesmo significado como manifestao de desenvolvimento ou como
factores que o influenciam, ou seja, no so duradouras, e/ou podendo
carecer de significado para a pessoa em desenvolvimento ou para as
pessoas que participam no contexto. Um sorriso ou uma pergunta,
enquanto actos isolados, constituem actos moleculares enquanto que
manter uma conversa, construir uma torre com blocos ou participar emactividades educativas intencionais da creche so exemplos de
actividades molares.
Em suma, a primeira esfera do conjunto dos sistemas inter-
relacionados no desenvolvimento da criana o microssistema
constituda pela actividade e pelo ponto de vista da criana,
correspondente perspectiva orientada de baixo para cima(Katz, 1995,1998), esquematicamente representada na figura 2. Ou seja,abarca o
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bem-estar da criana no contexto educativo (Doherty, 1991), como ela
vive e sente as qualidades desse contexto, as experincias de
aprendizagem gratificantes que tem oportunidade de vivenciar; a
ateno, o respeito e a compreenso, a interaco social e grupo depertena; a empatia, bem-estar e segurana emocional.
Figura 2
Perspectiva orientada de baixo para cimada creche
A frequncia da creche percebida de forma subjectiva pelas
diferentes crianas e poder, tal como Katz (1998) refere, ser
equacionada em perguntas, tais como: normalmente sinto que sou bem
recebido?, sinto que tenho aqui um lugar s meu?, sinto que sou
aceite, compreendido e protegido pelos adultos?, sou aceite por
alguns dos meus pares?, falam comigo de forma sria e
respeitosa? (p. 20). Relativamente s propostas que so facilitadas na
creche, a criana poder tambm questionar a forma como as sente e
experimenta, por exemplo, se so actividades regularmente
estimulantes, atraentes e prendem a ateno, interessantes e
relevantes, ou se as suas experincias face a essas propostas so
satisfatrias. Em suma, normalmente gosto de estar aqui, ou, pelo
contrrio, no quero vir e s penso em ir-me embora? (Katz, 1998, p. 20).
Crianas
Porque vouara a creche
Questesfamiliares
Questespedaggicas
Questessociais
O que faonacreche
Satisfao dasnecessidades
Desenvolvercompetncias
Aprender"coisas"
CRESCERnacreche
Os adultosOs "outros"
Os materiaisO espao
As actividadesOs desafios
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1.1.2. Mesossistema
A partir das grandes transformaes na organizao familiar
decorrentes ou associadas revoluo industrial, a creche tornou-se
uma instituio social e assistencial que apoia as famlias. A instituio
creche passa a desempenhar um papel educativo que, at ento, era
essencialmente destinado famlia nuclear ou ampliada, partilhando
com os pais a educao dos seus filhos, sem os substituir. Todavia,
como nos refere Torrado (2002), o educador familiar no tem de
transferir atribuies, ao fazer chegar o seu filho at s mos do
educador profissional, como se lhe dissesse: Aqui lhe deixo a
encomendinha. Avenha-se voc agora com ela . E acrescenta Ei-la
transformada em pesada herana, sempre que cada chefe de estao
do novo acesso responsabiliza o chefe de estao anterior pelos atrasos
do transvia (p. 58).
Ao ser analisado o meio educativo como mais um contexto de que
a criana parte integrante, no devero ser esquecidos os diversosentornos sociais e culturais de que est dependente, e com os quais
compartilha normas e valores. Quando tal partilha no feita nas
sociedades contemporneas, a famlia, o mundo do trabalho ou a
escola, tendem a tornar-se, muitas vezes, cenrios alienados(Alvarez &
Del Rio, 1993) ou justapostos dadas as rupturas entre os diferentes
contextos em que a criana est inserida.
Na Figura 3, ilustramos os elementos do mesossistema, dandoparticular destaque s relaes recprocas entre as famlias e os
educadores, ou s interfaces representadas pelos valores e prticas
familiares. Estas relaes e percepes familiares so elementos
importantes nas tomadas de deciso sobre o projecto educativo da
criana e o currculo adoptado. Por tudo isto, so, logicamente,
elementos do mesossistema (Bergen et al., 2001, p. 144).
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Figura 3
Elementos do mesossistemado desenvolvimento da criana na creche
A dimenso interpessoal das creches inclui, assim, a teia de
relaes entre as famlias e as instituies (creches). O nmero e a
qualidade de tais relaes servem, alis, de indicador da qualidade
destes mesmos contextos educativos (Brickman & Taylor, s/d).
A necessidade de ter de confiar um filho ao cuidado de pessoas
(ou instituies) que no tm para com a criana qualquer grau deparentesco ou lao emocional mais profundo torna-se fonte de
insegurana para muitos pais. Mas, mesmo com preocupaes,
ansiedades, medos, angstias, sentimentos de culpa resultantes da
separao dos seus filhos e da partilha deste amor com algum externo
estrutura familiar, as opes tm de ser feitas, tm de ser
estabelecidos critrios de deciso e tm de ser resolvidos os problemas.
Para Bergen e seus colaboradores (2001), as famlias consideramtrs aspectos quando procuram cuidados no-parentais,
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nomeadamente: i) a satisfao das necessidades bsicas de
manuteno; ii) as experincias coerentes com os valores da famlia e;
iii) as metas de desenvolvimento e educao includas no curriculum (p.
146). Porm, outros chamam especial ateno para as caractersticasgerais dos ambientesenriquecidos (Diamont & Hopson, 2000, p. 102) e
o conhecimento dos marcos do desenvolvimento da criana nos dois
primeiros anos de vida com vista a potencializar experincias capazes e
imprescindveis para sustentar e ampliar esse crescimento.
Hoje em dia, por razes de vria ordem, parece verificar-se uma
certa tendncia para a famlia se alhear de algumas das suas funeseducativas tradicionais, o que se traduz, por exemplo, no
prolongamento da estadia diria da criana na creche. Tal facto torna o
profissional de educao um incontornvel modelo de referncia
(Estrela, 1999, p. 28) de aprendizagem social e, como pessoa, o
educador deve oferecer-se como modelo de relao a diferentes nveis
(Strecht, 1996, p. 34). Por outras palavras, o educador, antes de mais,
pessoa. Algum que tem valores; valores que pesam na sua vida social,pessoal e profissional. Enfim, valores que influenciam a sua viso de
mundo (Gonalves, 1999, p. 37).
A viso do mundo por parte dos educadores pode ser geradora de
conflitos, na medida em que a creche passa a participar nos cuidados,
na educao e na vida das crianas que, at ento, era exclusivamente
da responsabilidade da famlia. Com a frequncia da creche, a educao
das crianas pequenas, isto , a difcil tarefa de tornar humano um serhumano (Bronfenbrenner, 1995) caber a dois grupos de pessoas (pais
e profissionais). Esta partilha de responsabilidades pode ser, em si
mesma, geradora de conflitos. A confuso de papis, que emerge da
problemtica da creche como substituta da famlia e do papel dos
profissionais como substitutos dos pais, pode reforar o conflito e a
rivalidade entre pais e educadores de infncia, pois ambos se colocam
no mesmo papel, no mesmo terreno (Rosemberg, 1984, p. 90-1). Paraevitar esta confuso de papis, ou mesmo evitar problemas que podem
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surgir, importante a existncia de bons canais de comunicao entre
famlia e educadores, que permitam uma maior sensibilidade e
interaces mais encorajadoras nas interaces me-filho e educador-
criana (Owen et al., 2000).Ao mesossistema poderemos fazer corresponder a perspectiva
exterior-internaKatz (1998),que orientada pela forma como as famlias
analisam a creche (Figura 4). Este olhar sobre a creche estruturado
atravs de um conjunto de questes ou de informaes recolhidas que
lhes serve de resposta sabem tratar-me com respeito, ou, pelo contrrio,
so autoritrios e esto convencidos da sua superioridade, so
receptivos, abertos e tolerantes, ou, pelo contrrio, preconceituosos,prontos a rejeitar e a culpar?, tm respeito pelas metas e valores com
que educo os meus filhos?, so abertos aos contactos com os pais e
promovem-nos com frequncia, ou, pelo contrrio, so distantes e
contactam raramente com os pais? (p. 23).
Figura 4Perspectiva exterior-internada creche
Os profissionais de educao de infncia tornam-se componentes
vitais do sistema de apoio famlia, desempenhando, na sociedade
moderna, um papel semelhante ao da famlia alargada de anos atrs. O
Famlias
Como resposta ssuas necessidades
Flexibilidade de horrios
Adequao dascomparticipaes
Variedade de propostas
Como contexto dedesenvolvimentode com etncias
Fsicas e motoras
Cognitivas e sensoriais
Socio-emocionais
Como instituio escolar
Instrutiva
Disciplinadoracorrectiva
Pedaggicaeducativa
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profissional de educao , segundo Caldwell (1995), um verdadeiro
membro da famlia e no um inimigo ou um rival da famlia (p. 473). Por
sua vez, a complexidade dos contextos educativos para a 1 infncia
exige ao educador uma relao constante e tridica entre si, o prpriocontexto e as famlias (Marcho, 1999, p. 38).
O desenvolvimento de relaes positivas e cooperantes entre os
profissionais de educao e as famlias de estratos scio-culturais muito
diversificados tambm requer dos educadores um grande
profissionalismo baseado num misto de experincias, formao,
educao e valores pessoais (Katz, 1998, p. 26). A sua qualidade
profissional associa-se sua capacidade para compreender, valorizar erentabilizar os diversos ambientes que fazem parte da vida das
crianas. As relaes entre a famlia e os educadores, entre pais-
educadores-escola, elementos do contexto social da criana tornam-se
de inigualvel influncia (Lally, 1995; Owen et al., 2000). Para Albrecht
e Miller (2001) estas relaes devem assentar e desenvolver-se numa
base de confiana idntica que se deseja para as relaes educador-
criana.
1.1.3. Exossistema
O exossistema, tal como foi referido anteriormente, definido
pelas estruturas sociais que rodeiam e afectam o microssistema.
Diremos serem estruturas ou realidades interactivas nas quais a
criana em desenvolvimento no participa directamente.
Diferentes cenrios integram exossistema, tais como: contexto
laboral dos pais (lugar, acessibilidade, horrios, vencimentos, etc.),
contexto de trabalho do educador (vencimento e benefcios, condies
de trabalho, satisfao profissional) e os recursos educativos e
assistenciais disponveis na comunidade em que vive, nomeadamente
escolas, servios de sade, servios sociais ou transportes, entre outros
(Figura 5). Estes factores da sociedade mais ampla, para alm de
interferirem directa ou indirectamente no currculo, interferem tambm
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na forma como afectam os educadores e as famlias no desempenho dos
seus papis e na assuno das suas responsabilidades (Bergen et al.,
2001). As interaces pais-profissionais so fortemente condicionadas,
na forma e na frequncia, por estes factores condicionantes.
Figura 5
Elementos do exossistemaque influenciam o desenvolvimento da
criana na creche
Neste sentido, estendemos que o exossistema estar relacionado
com a perspectiva interior (Katz, 1998) relacionada com o contexto de
trabalho dos educadores, nomeadamente no que se refere s relaes
entre a equipa de profissionais, s relaes educadores e famlias e s
relaes com a instituio e seus representantes (Figura 6).
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Figura 6
Perspectiva interiorda creche
Os contextos de trabalho dos educadores, que englobam as
condies de trabalho, adequao e flexibilidade de horrios, progresso
na carreira e regalias sociais, so elementos importantes na satisfao
profissional. Nalguns estudos, afirma-se mesmo que os salrios
auferidos pelos profissionais constituem o melhor factor de previso de
qualidade das instituies educativas (Whitebook et al., 1990). No
entanto, outros autores enfatizam factores diferentes para explicarem a
qualidade dessas instituies. Olenick (1986), por exemplo, constatou
que o apoio na formao dos educadores est positivamente
correlacionado com a qualidade da creche. Para Demo (1998), a
principal estratgia da educao qualitativa a valorizao do educador
profissional, j que o professor competente e socialmente satisfeito a
melhor motivao para a qualidade (p. 56). Katz (1998) refere que
parece razovel considerar que, em princpio, o modo como os
educadores e outros profissionais tratam as crianas semelhante ao
modo como so tratados pela instituio (p.27), ou seus representantes.
Embora seja possvel a alguns profissionais ultrapassarem, nas
suas prticas educativas, as suas dificuldades e divergncias com as
entidades empregadoras, a avaliao da qualidade de um programa
dever dar a maior ateno ao bem-estar e ao apoio proporcionados pelos
Instituio - CRECHE
Contexto de trabalho
Vencimentos e benefcios
Condies de trabalho
Satisfao profissional
Contexto de formao
Inicial e contnua
Especializadae de guarda
Experimental
Contexto de interaces
Com as crianas
Com as famlias
Com a equipe de trabalho
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contextos de trabalho (Katz, 1998, p. 27). O bem-estar e apoio
proporcionados aos profissionais esto tambm intimamente
relacionados com o tipo de interaces entre a equipa de trabalho,
nomeadamente nas relaes de apoio, de cooperao, de aceitao, deconfiana e de respeito (Katz, 1998). Segundo esta autora, em princpio,
s se pode criar um ambiente de qualidade para as crianas, se os
ambientes forem tambm favorveis aos adultos que neles trabalham
(Katz, 1998, p. 25). Ou seja, uma creche de qualidade proporciona
tambm aos seus profissionais uma qualidade de vida satisfatria e
interessante (Katz, op. cit., p. 26).
No obstante todas estas afirmaes, o Estudo Temtico sobre aEducao Pr-escolar e os cuidados para a Infncia em Portugal
realizado pela OCDE (M.E., 2000) refere que, muito embora se note a
falta de formao especfica para os que trabalham com as crianas dos
0 aos 3 anos de idade (p. 196), visvel o calor e a tolerncia que
marcam as interaces afectivas entre o pessoal e as crianas (p.204).
Simultaneamente, os educadores que trabalham em creches, logo
trabalhadores de IPSS ou de instituies particulares tendem a tersalrios inferiores, horrios de trabalho menos favorveis e menos
oportunidades de formao contnua do que os professores que
trabalham nos outros sectores (p. 197).
Howes (2000) coloca tambm ao nvel do exossistemaa influncia
da cultura e como ela entendida e executada pelo educador da
criana (p. 93). A forma como cada educador entende, interpreta e
executa as experincias e os cuidados prestados s crianas soimportantes veculos de aprendizagem sobre a forma como os adultos
respeitam e valorizam as razes e as caractersticas culturais da criana
e que, em ltima anlise, influenciam o seu desenvolvimento social.
O regresso dos pais ao trabalho exige que todo o ambiente afectivo
e estimulador proporcionado pelos pais em casa se torne apenas uma
parte importante da experincia da criana (Diamond & Hopson, 2000,p. 101). O tipo de cuidados no-parentais alternativo seleccionado
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representa a outra parte (ibidem), pelo que o desenvolvimento ser
determinado pelas condies oferecidas nos dois contextos. Assim
sendo, caber aos pais uma anlise criteriosa dos servios educativos
para que possam, assim, optar de forma consciente e criteriosa emrelao oferta educativa para o seu filho.
Todavia, sabemos que a modalidade de atendimento a que cada
famlia recorre no , por vezes, a sua preferida, sendo a seleco
baseada em questes como os custos de atendimento, a sua localizao,
a conjugao com os horrios dos pais e a existncia de vaga, entre
outras (Howes & Hamilton, 2002). A acessibilidade e a proximidade do
lar ou do local de trabalho, os horrios de funcionamento e calendrioescolar, as actividades extra-curriculares que completem os horrios
escolares so tambm elementos de deciso. A simpatia, o carinho e
ateno, alegria e boa disposio dos adultos responsveis e as
referncias de outros pais so, tambm, alguns dos factores apontados
pelos pais no momento de seleco e tomada de deciso.
Peyton e seus colaboradores (2001) estudaram as razes que
levaram um grupo de mes a seleccionar um tipo determinado decuidados para os seus filhos de 3 anos, tendo concludo que estas
razes se agrupavam em: i) razes de qualidade (informaes de outras
pessoas acerca dos cuidados prestados); ii) razes de ordem pragmtica
(custo, horrios, localizao, entre outros) e; iii) razes de opo por um
tipo especfico de servios (creche, ama ou parente). As mes com
elevados rendimentos familiares e que trabalham poucas horas por
semana tendem a seleccionar servios baseados em critrios dequalidade e menos a usar servios prestados por parentes. Assim, as
mes que seleccionam os servios pelo tipo de servios prestados e
aquelas que escolhem centros de qualidade tendem a estar mais
satisfeitas com os cuidados prestados. Por sua vez, as mes que
seleccionam os cuidados para os seus filhos em funo de aspectos
pragmticos tendem a estar menos satisfeitas com a qualidade dos
servios prestados a seus filhos.
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1.1.4. Macrossistema
O Macrossistema constitudo por todas as instituies
abrangidas pelos sistemas econmicos, sociais, educativos, jurdicos e
polticos implcitos no micro, meso e exossistema, representantes de
uma determinada cultura ou sub-cultura da sociedade mais alargada,
em que a criana e a famlia esto inseridas. Nesta perspectiva
macrossistmica, englobam-se os pontos de vista dos seus responsveis
na direco ou coordenao designadamente no que concerne aos
factores de contexto (Doherty, 1991). Tais pontos de vista enrazam-se
em princpios e filosofias subjacentes, tais como iniciativa privada ou
pblica, regulamentos e projecto educativo, implicao dos pais nastomadas de decises, tutela, fundos e financiamentos, entre outros
(Doherty, 1991; Katz, 1995).
Do ponto de vista dos princpios e filosofias subjacentes, as
creches portuguesas, enquanto instituies particulares (com ou sem
fins lucrativos), parecem apresentar, pelo menos, duas formas de
desenvolverem e responderem s exigncias das caractersticas da
Educao da 1 Infncia. Em primeiro lugar, parece haver uma relaodialctica entre a educao e economia, ou seja, entre a instituio
creche e sua vertente econmico-financeira. A forma de organizao e
de estruturao baseada em fundamentos empresariais so
caracterizados, globalmente, por uma lgica economicista para poder
satisfazer a sua tarefa. As reduzidas propores adulto/criana, os
materiais de qualidade e em quantidade suficiente, a alimentao
adequada e seleccionada, o nmero de pessoal necessrio e competentee com formao especializada, entre outros, tornam mais caro o servio
de uma creche pautada pela boa qualidade e, consequentemente,
incompatvel com lgicas economicistas. Para Kagan e colaboradores
(2002), necessrio traar no apenas critrios econmicos que, por si
s, sendo necessrios no so determinantes, mas definir e assumir
uma perspectiva pedaggica-desenvolvimental sobre os programas e as
prticas educativas para a 1 infncia.
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Em segundo lugar, reflicta-se acerca da perspectiva que enfatiza a
funo social e assistencial. Nesta perspectiva, a organizao atende,
essencialmente, necessidade de guarda e segurana das crianas
pequenas, enquanto pais e mes esto ocupados com as tarefaslaborais. Estes centros para a infncia parecem mais preocupados com
a satisfao das necessidades das famlias, seguindo uma lgica
organizacional de acessibilidade (quaisquer que sejam as necessidades
familiares) e criando, para tal, uma estrutura de guarda das crianas e
basicamente orientadas para o alargamento e flexibilizao de horrios
de funcionamento.
As decises acerca da locao de recursos, prioridades de sade eeducao, prticas comerciais que afectam o emprego e os salrios,
bem como os planos estratgicos propostos pelas polticas
governamentais (Bergen et al., 2001) so exemplos de elementos do
macrossistema. Enquadrada no macrossistema estar a perspectiva
exterior, apresentada por Katz (1998). Em sua opinio, todas as
instituies educativas, embora determinadas explicita ou
implicitamente por polticas, leis e regulamentos, deveriam responder auma srie de consideraes, tais como,
Tenho a certeza de que os recursos da comunidade so adequadamente
atribudos proteco, assistncia e educao das crianas?
Estou seguro de que aqueles que tomam decises em nome da
comunidade adoptam polticas, leis e regulamentaes que no pem em
perigo mas, pelo contrrio, favorecem as experincias das crianas em
programas de educao pr-escolar?
Estou seguro de que os recursos disponveis para os programas de
educao pr-escolar na comunidade so suficientes para garantir
benefcios a curto e a longo prazo s crianas e s suas famlias?
Os programas de alta qualidade so compatveis com os recursos
financeiros das famlias que necessitam desses servios?
As condies de trabalho (salrio, benefcios, seguros, etc.) dos
programas que existem na comunidade so suficientemente boas de
modo a garantir uma baixa taxa demobilidade dos profissionais e assimpermitir o desenvolvimento de relaes estveis entre adultos e crianas
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e educadores e pais, e permitir tambm uma formao efectiva e rentvel
dos profissionais envolvidos?
Os profissionais possuem formao e qualificaes adequadas e so
responsabilizados pelo seu trabalho? (pp. 29-30).
Figura 7
Perspectiva exteriorda creche
Assistimos, nestes ltimos anos, a inmeras metamorfoses
sociais, econmicas e polticas. Tais mudanas influenciaram o
alargamento e a implementao de respostas e alternativas de
acolhimento para a 1 infncia fora do contexto familiar. Muito embora
a diversidade de terminologias associadas educao da primeira
infncia (creches, infantrios, amas, etc.) esteja tambm intimamente
relacionada com opes tericas e metodolgicas sobre o
desenvolvimento da criana, as responsabilidades institucionais
(sociais, paroquiais, recreativas, desportivas, etc.) e o papel ou
estatuto atribudo aos profissionais envolvidos na aco pedaggica
so elementos demarcados pelas polticas sociais e culturais vigentes
em cada sociedade. Na Figura 8, ilustramos alguns elementos do
Instituio - CRECHE
Perspectiva econmica
Organizao do ambiente
Equipe de profissionais
Rciosadulto/criana
Perspectiva social
Objectivos educacionaise pedaggicos
Objectivos sociaise de guarda
Objectivos de ensinoe aprendizagem
Perspectiva legislativa
Legislao em geral
Projecto Educativo
Regulamentos
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macrossistema que influenciam o desenvolvimento das crianas na
creche.
Figura 8Elementos do macrossistemado desenvolvimento da criana na creche
A tutela e enquadramento legal dos servios para a infncia so,
consequentemente, determinados em funo dos objectivos e
abrangncia atribudos pelas prprias filosofias polticas e
governamentais de cada sociedade. Tal como Carvalho (1997) refere:Os Direitos do Homem, formalizando os direitos educao,
so muitas vezes ceifados nos seus prprios ideais pela
subjectividade das entidades polticas e governamentais
responsveis pelo desenvolvimento e implementao da educao.
Assim se esquece ou se desvaloriza a globalidade e a diversidade
dos valores presentes em cada momento e em cada cultura.
Estado e legislao nem sempre sensveis a estas
particularidades que caracterizam os seus prprios cidados,
legitimam processos e instituies fundamentados em ideologias
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polticas margem dos conhecimentos cientficos e de uma
filosofia baseada nos valores, cultura e especificidades nacionais
(pp. 22-23).
Nos EUA, a educao e o cuidado para a infncia reflectem,
segundo Rosemberg (1998), uma soluo de compromisso entre o novo e
o velho (p. 21). O novo refere-se necessidade de ampliao destes
servios gerada pelas novas aspiraes da famlia, designadamente as
novas concepes e necessidades da infncia. O velho evidenciado
pela relutncia das foras tradicionais em aceitar que esta tarefa,
tradicionalmente atribuda famlia, seja agora assumida de forma
simultnea e complementar pela sociedade como um todo e pelo Estado
em particular (ibidem).
A importncia que dada aos contextos de educao da 1
infncia, ao nvel da poltica educativa em Portugal, apresenta-se
realisticamente diferente daquela que entendemos como ideal e
necessria (Marcho, 2003, p. 14). Os discursos das polticas nacionais
centram-se na oferta de servios infncia, assumindo que para a
maioria das pessoas, a questo continua a centrar-se, no na educao,
mas nos cuidados e nos aspectos prticos relacionados com a oferta de
servios (M.E., 2000, p. 202). A necessidade, para no dizer o direito,
de proporcionar as condies necessrias ao seu desenvolvimento
integral, criando verdadeiros caminhos de igualdade, tem sido, em
nosso entender, sub-valorizada. Alis, j em 2000, a Equipa da OCDE
considerava que, em Portugal:
A promoo de cuidados e iniciativas educativas destinadas
infncia considerada, em primeiro lugar, uma questo que diz
respeito s mulheres e em segundo lugar, uma questo econmica
para os que esto interessados em abrir os estabelecimentos. No
entanto, no considerada uma questo social e muito menos, um
direito das crianas promoverem o seu prprio desenvolvimento
(p. 205).
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Neste mesmo sentido, apontam-se, ainda, questes relacionadas
com as representaes sociais sobre a infncia e a famlia
designadamente a viso romntica e idlicada infncia e o tnue ou
inexistente reconhecimento das crianas enquanto actores sociais deabsolutos direitos (M.E., 2000; Folque, 2000). Esta viso romntica e
idlicada infncia interpenetra a relao estabelecida entre o Estado e
as famlias, desresponsabilizando ou inibindo o prprio Estado na
implementao de estratgias de apoio.
O Estudo Temtico realizado pela equipa da OCDE (M.E., 2000)
tece uma srie de comentrios sobre o papel do Estado e a educao da
1 infncia, sendo alguns dos aspectos versados de especial relevncia,dada a imagem que traduz desta realidade, nomeadamente:
O Estado parece ter relutncia em intervir em apoio de pais com
crianas pequenas, porque em assuntos relacionados com a
educao dos filhos, a famlia considerada detentora de
poderes absolutos (p. 205).
E acrescenta
A relutncia do Estado em intervir no domnio da famlia parece
ser particularmente forte, quando se trata de crianas com
idades compreendidas entre os 0 e os 3 anos de idades, as
quais, segundo a opinio de muitos dos nossos interlocutores,
devem ser criadas pelas mes ou por outros membros da
famlia. Como assinalmos anteriormente, o Estado no assume
qualquer papel educativo ou tutelar em relao a este grupo de
crianas. Contudo, os resultados de investigaes recentes
confirmam a importncia primordial desta primeira fase dainfncia, na formao de atitudes e comportamentos conscientes
que se revelam atravs de vrias competncias, tais como a
auto-organizao, a persistncia, a curiosidade em explorar o
meio que a rodeia para o compreender e encarar o seu prprio
espao (Shore, 1997). Estas atitudes e disposies tm
implicaes no desenvolvimento individual e na capacidade de
aprendizagem dos indivduos, durante toda a sua vida (p. 206).
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O conjunto de comentrios e sugestes que a equipa responsvel
por este estudo apresentou poderiam, se tivesse havido interesse e
vontade polticas, trazer benefcios acrescidos para a Educao da 1
Infncia. Mencionemos alguns destes comentrios: Os membros da equipa de estudo pensam constituir pr-
requisito essencial para o desenvolvimento e bem-estar das
crianas portuguesas, a longo prazo, a criao de servios
vocacionados para o grupo etrio dos 0 aos 3 anos de idade. O
acesso aos servios existentes no promovido numa base de
igualdade e, na generalidade, falta qualidade aos servios. A
principal responsabilidade por este grupo etrio recai sobre o
Ministrio do Trabalho e da Solidariedade Social e sobre o sector
privado. As Creches e outros estabelecimentos no so
adequadamente monitorizados e quando so feitas inspeces,
estas tendem a incidir em questes relacionadas com os
regulamentos de construo dos edifcios, para alm de
considerarem as queixas apresentadas pelos pais (M.E., 2000,
pp. 210-211).
Se as mulheres esto em nmero crescente a contribuir para
a extenso da economia atravs do seu trabalho fora de casa e
se esto a conseguir melhorar os seus nveis de educao,
justo que o Estado devote parte dos recursos adicionais que
recolhe do seu trabalho no apoio a medidas que conciliem as
suas responsabilidades profissionais e as suas
responsabilidades familiares especialmente, atravs da
criao de estabelecimentos acessveis e de alta qualidade para
as crianas dos 0 aos 3 anos de idade. Regista-se uma faltaconsidervel de vagas, para crianas deste grupo etrio e de
momento existe relutncia em atribuir prioridade resoluo do
problema (idem, p. 227).
Muito embora o desenvolvimento na 1 infncia, associado a
princpios educativos enunciados numa proposta pedaggica explcita e
clara, seja uma preocupao constante, a legislao portuguesa parece
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estar distante destas inquietaes cientficas. No mesmo documento
que temos vindo a citar, ainda referido que:
Uma oferta adequada para este grupo etrio no se limita a
servir de reforo criao de igualdade de oportunidades paraas mulheres, sendo fundamentalmente, um meio de garantir o
desenvolvimento completo do potencial das crianas e, em
ltima anlise, a valorizao dos recursos humanos da nao
(p. 211).
Cremos que estes comentrios reflectem o conhecimento sobre a
necessidade de uma estimulao adequada faixa etria compreendida
entre os 0 e os 3 anos. Com efeito, nestas duas ltimas dcadas, os
Governos tm subvalorizado, ou mesmo rejeitado, a ideia da
responsabilidade pblica em relao educao a proporcionar s
crianas mais pequenas. Se, outrora, as entidades governamentais
declinavam essa responsabilidade, entregando-a s organizaes
caritativas particulares, hoje colocam manifestamente margem das
suas prioridades a educao das crianas dos zero a trs anos,
libertando o Ministrio da Educao dos compromissos referentes 1
infncia, remetendo-a para a famlia e, em ltima anlise, para o
Ministrio da Segurana Social, da Famlia e da Criana1. Esta mesma
equipa da OCDE referia, em 2000
talvez tenha chegado a altura certa para iniciar e prosseguir
um debate alargado sobre o papel do Estado, das crianas e
das famlias na sociedade portuguesa e muito particularmente,
sobre as necessidades das crianas mais pequenas e sobre o
papel das mulheres, num estado moderno industrializado. O
governo poder desejar considerar a oferta existente para as
crianas dos 0 aos 3 anos de idade e tambm, o papel do
Ministrio da Educao na monitorizao da qualidade da
educao e cuidados prestados assim como da qualidade das
1 Muito embora o Ministrio da Segurana Social, da Famlia e da Criana tenha tido ao longo dosltimos anos diferentes designaes, opta-se neste trabalho por usar sempre a ltima designao.
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experincias conducentes ao desenvolvimento das crianas (p.
232).
Em suma, a Figura 9 sistematiza os diferentes vectoresimplicados no desenvolvimento humano, especialmente referenciado no
processo educativo na 1 infncia e que considera que dentro de uma
cultura ou sociedade, o micro, o meso e o exossistema mantm traos e
organizaes diferentes entre si, mas encontram similaridades
geralmente veiculadas ao prprio macrossistema. Embora com traos
similares, os esquemas dos sistemas divergem nos diferentes grupos,
reflectindo, assim, sistemas de crenas e estilos de vida contrastantes
que, por sua vez, sustentam e eternizam os ambientes ecolgicos
especficos de cada grupo (Bronfenbrenner, 1987, pg. 45). No entanto,
entre sociedades ou contextos histrico-culturais diferentes estes
padres diferem substancialmente mesmo ao nvel do microssistema.
Os elementos que constituem o macrossistema de uma determinada
sociedade, nomeadamente em Portugal, distanciam-se, no raras vezes,
dos aspectos mais pragmticos e especficos dos sistemas que o
constitui e a que se destina.
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Figura 9
Interfacesdo desenvolvimento humano na creche
InterfacesOlhares da Educao da 1 Infncia
Estado Creche
Funo regulamentadoracom ers ectiva social
Direco
Perspectiva econmica
Perspectiva social
Profissionais
Famlias
Contexto de trabalho
Contexto de formao
Perspectiva Educacional
Contexto de interaces
Resposta s necessidades
Contexto dedesenvolvimento
Instituio escolar
Crianas
Como me sinto
O que fao
O que aprendo
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1.2. Sentido do desenvolvimento: contributo da
perspectiva humanista
Para Eisold (2001), o desenvolvimento , em si mesmo,
extraordinrio que, sendo guiado pelas interaces entre o ser
biolgico individual com o meio, se torna ainda mais eficaz quando o ser
humano experimentar, de forma segura, riscos adequados e razoveis
sem medo da perda da sua integridade.
A perspectiva humanista aqui apresentada, e preconizada por
Guenther (1980, 1997), no uma teoria nova em psicologia, mas
apenas uma reorganizao do pensamento (1997, p. 23), j que, nesta
perspectiva, a psicologia focaliza a sua ateno na essncia da vida e
do ser humano (op. cit., p. 24). A perspectiva humanista ressalta o
conceito de ser humano como uma entidade complexa, posicionado em
relao ao mundo como um ser dualista (op. cit., p. 24), ou seja, o ser
humano tem uma natureza biolgica e social intimamente relacionado e
influenciado pelo mundo que o rodeia. O ser humano , assim, um ser
vivente e vivendo, total, complexo, no-linear, essencialmente diferente de
todos os outros seres vivos que existem, portador de uma caracterstica
que sintetiza, revela e traduz essa diferena: a humanidade (op. cit.,
p. 26).
Senlle (s/d) refere que um dos conceitos bsicos da psicologia
humanista faz aluso necessidade de um conhecimento trivalente,
ou seja, compreende conhecer o meu mundo interior; entender os outros;
compreender o crculo perceptivo que se interpe entre eu e os outros
(p.87). Neste sentido, para Guenther (1980, 1997), a
personalidade/individualidade de cada ser humano constituda por
trs dimenses auto-conceito, relao com ooutroe viso de mundoe
caracterizam o seu carcter nico e irrepetvel, porque, para alm de
abarcarem determinaes genticas, so cunhadas pelas experincias
vividas no dia a dia nas relaes consigo prprio, com o outro e com o
mundo. Neste ponto, aproxima-se da abordagem ecolgica, e da a
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nossa escolha por estas duas abordagens em face da sua proximidade e
complementaridade.
O desenvolvimento humano segue direces visveis na orientao
prximo-distal a partir de seu prprio corpo, fsico, psicolgico e social e transitando da para o ambiente ao redor, em crculos cada vez mais
amplos e abrangentes. O passar de um nvel a outro impulsionado
pela resoluo das necessidades, do primeiro grau necessidades bsicas
de manuteno e em seguida necessidades de crescimento (Maslow,
1987). Ou seja, as necessidades de manuteno englobam tudo o que a
pessoa necessita para manter em funcionamento todo o seu organismo
fsico, psicolgico e social. As necessidades de crescimento abrangemtodas as necessidades do ser humano que se situam acima da simples
manuteno do organismo, em todas as reas (Guenther, 1980, p. 138)
Maslow (1987) demonstrou que entre as necessidades naturais
esto necessidades relacionadas com o carinho, o afecto, o
reconhecimento, a aprovao, a amizade, mas tambm as de pertencer
a grupos sociais nos quais se obtenha prazer, apreo, respeito e tambm
a curiosidade que contm em si mesma a gratificao (Senlle, s/d, p.41). Assim, nas interaces emocionais na famlia ou nas instituies
educativas, o contexto social da comunidade bem como as expectativas
da sociedade so aspectos cruciais no desenvolvimento do ser humano
(Bronfenbrenner, 1987; Shonkoff & Phillips, 2000).
A contribuio de Maslow revela-se importante para a educao
por duas razes: em primero lugar, por realar a complexidade das
necessidades humanas e, em segundo lugar, por sublinhar aimportncia da satisfao das necessidades biolgicas para se poder
caminhar para as necessidades de ordem superior. Uma criana que
no tenha satisfeito as suas necessidades bsicas, nomeadamente as
fisiolgicas, o seu primeiro interesse ser encontrar a forma de as
satisfazer, no estando, por isso, interessado nas necessidades de amor
ou de auto-estima.
O educador humanista orienta a sua aco educativa por algunsprincpios-base, assim sistematizados por Guenther (1997):
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1. O ser humano, em condies normais, tende a crescer, desenvolver-se
e aperfeioar-se durante toda a sua vida e atravs de todos os seus
actos;
2. A tendncia bsica da vida humana, () mover-se em direco a
uma adequao cada vez maior, ();
3. Esse movimento impulsionado pela resoluo das necessidades
bsicas do ser, em ambos os nveis de manuteno e crescimento, e
travado, distorcido ou impedido quando necessidades bsicas vitais
no so satisfatoriamente resolvidas;
4. Para melhor compreenso do dinamismo psquico do ser humano,
consideram-se trs dimenses bsicas, que so evidenciadas no
desenvolvimento e no funcionamento da pessoa, tanto como processoexperiencial como produto da prpria experincia: (1) auto-conceito; (2)
a percepo e inter-relacionamento com o outro; (3) a compreenso e
viso do mundo;
5. O papel principal da educao, em qualquer fase da vida, facilitar
ao ser humano o seu desenvolvimento e aperfeioamento contnuos na
busca de adequao, como indivduos e como grupos, em nveis cada
vez mais elevados (p. 26).
Com estas orientaes, funo do educador possibilitar que
cada um dos seus educandos possa compreender, conduzir e organizar
a sua energia individual, seja activo e possa encontrar sistemas de
interaco, cooperao, relao e capacidade para enfrentar as
mltiplas situaes, para que se realize a premissa eu, sendo diferente
dos outros, estou bem como pessoa e os outros, sendo diferentes de mim,
esto bem como pessoas, e entre todos, companheiros e educadores,
podemos encontrar solues para a convivncia (Senlle, s/d, p. 44).
1.2.1. Desenvolvimento do Auto-conceito: O Eu na infncia
O ser humano , desde o nascimento, um ser social. A sua
experincia com o seu mundo social, formado por outros significativos,
d-lhe a percepo de ser aceitvel ou rejeitvel, amvel, bem sucedida
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ou fracassada, respeitvel ou no, de valor ou sem valor (Guenther,
1997, p. 104). , pois, no processo interactivo, que cada ser humano
forma a percepo de si mesmo. Atravs de processos de interaces
recprocas progressivamente mais complexas, regulares e contnuasentre o sujeito e as pessoas, objectos e smbolos do meio exterior
(Bronfenbrenner & Morris, 1999). O ser humano envolve-se activamente
no seu prprio desenvolvimento pessoal.
O desenvolvimento mediado, entre outras percepes, pelas
experincias de sucesso ou insucesso que o ser humano experimenta
consigo mesmo e perante o mundo e as reaces que outras pessoas
tm para com ele. O sentido de confiana est intimamente relacionadocom trs factores auto-conceito(conscincia de si prprio), auto-estima
(opinio, positiva ou negativa, de si mesmo) e auto-conhecimento
(conhecer suas foras e fragilidades) e as experincias na creche
podem influenciar poderosamente os trs factores (Dowling, 2000).
Como diz Vaz Serra (1988, citado em Cardoso & Peixoto, 1999) a
percepo que o indivduo tem de si prprio e o conceito, que devido a
isso, forma de si (p. 424) constituem as bases do Eu, ou seja, o auto-conceito. Por outras palavras, o auto-conceito construdo sobre uma
estrutura activa e dinmica que ininterruptamente interpreta e organiza
aces e experincias relevantes para o self e que, consequentemente,
medeia e regula os comportamentos e os afectos (ibidem). O
conhecimento do Eu importante para o ser humano porque, por um
lado ele processa informaes sobre si prprio e, por outro lado, actua
com base nas auto-percepes resultantes das representaes que faz.Erikson (1963) ao conceptualizar os estdios de desenvolvimento
psicossocial na vida do ser humano, considera que, no incio da vida, a
principal tarefa em termos de desenvolvimento reside no
estabelecimento de relaes seguras, ou seja, no desenvolvimento de
uma confiana bsica As investigaes de Harlow (1959, 1962)
indicam a relevncia para o desenvolvimento emocional, no apenas da
satisfao das necessidades bsicas de manuteno fsica, mas tambmda existncia de um ambiente estvel, seguro e acolhedor. Neste
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perodo, as experincias vividas pela criana na satisfao das suas
necessidades bsicas de manuteno e conforto psicolgico sero bases
determinantes na construo do sentimento de si prprio como algum
que merece confiana.Pensar na criana pequena corresponde, com muita frequncia,
em pensar na mera satisfao das necessidades bsicas de alimento e
de prestao de cuidados fsicos, menosprezando todas as outras
componentes emocionais, nomeadamente as necessidades de amor, de
segurana, ou seja, de se sentir agradavelmente prximo a algum
(Guenther, 1997, p. 132). E, exactamente este outro prximo que,
segundo Erikson, digno de confianamas tambm aquele que se tornagerador das primeiras razes de onde crescer a noo geral de todos os
outros seres humanos, desde o incio da vida (ibidem). Falamos, ento,
da vinculao segura facultada pelas interaces da me (ou do seu
substituto) com o beb num modelo dinmico e, em si mesmo, gerador
de confiana bsica enquanto que a vinculao insegura reflecte
insegurana e desconfiana.
A sensao de segurana e de confiana emergem na 1 infnciaquando as crianas tm intimidade, reciprocidade e continuidade nas
relaes com o adulto (Albercht et al., 2001). A interaco entre o beb e
as figuras de vinculao depende da capacidade de ambos responderem
de forma adequada aos sinais relativos aos estados emocionais de cada
um, capacidade a que Tronick e Gianino (1986) chamam regulao
mtua. Estas duas componentes segurana e confiana permitem
que a criana desenvolva o sentimento que o mundo um lugar seguroe aprazvel, conquistando liberdade para se aventurar na explorao
do meio, arriscando para exploraes mais complexas. As vinculaes
seguras facilitam o desenvolvimento de percepes de eficcia, ou seja,
a percepo de que pode fazer acontecer coisas no seu contexto fsico,
social e emocional, contribuindo decisivamente para a construo de
um Euprprio e diferenciado do outro.
Vrios estudos revelam que as mes de bebs com umavinculao segura tendem a ser mais sensveis e responsivas (Isabella,
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1993; NICHDEarly Child Care Research Network, 1997; De Wolff & van
Ijzendorm, 1997) e, por sua vez, as crianas que tm figuras parentais
responsivas tendem a ter uma vinculao segura (Del Carmen et al.,
1993). Os estudos de Cox e seus colaboradores (1992) referem que ospais que despendem tempo para estar com o seu filho de trs meses de
idade e que so sensveis s suas necessidades tendem a ter filhos com
uma vinculao segura aos doze meses.
De Wolff e van Ijzendorm (1997) consideram que, para alm da
sensibilidade da me, a vinculao segura engloba a interaco mtua,
a estimulao, a atitude positiva, o calor humano, a aceitao e apoio
emocional. Outros factores contextuais, como por exemplo aspectossocio-econmicos (De Wolff & van Ijzendorm, 1997), o emprego materno
(Stifter et al., 1993) ou ainda a qualidade do relacionamento conjugal
(Eiden et al., 1995) so tambm aspectos considerados. De um modo
geral, quanto mais segura for a vinculao da criana mais facilmente
ela se tornar independente e desenvolver boas relaes com os
outros, tornando-se mais socivel com os pares e com os adultos por
comparao com crianas com vinculao insegura (Main, 1983). Ascrianas com relaes seguras tendem, tambm, a tornar-se crianas
com um sentimento mais positivo do Eue a entenderem as relaes de
uma forma tambm positiva (Cassidy et al., 1996), apresentando melhor
auto-regulao emocional (Laible & Thompson, 1998).
Caldera e Hart (2004), estudando a vinculao entre mes e filhos
de 12/14 meses, e considerando as variveis da qualidade da relao
(mes mais e menos sensveis) e a quantidade de exposio a cuidados(s maternos e com diferentes horas por semana de cuidados no-
maternos), concluem que, quando os seus filhos esto expostos a mais
horas por semana a cuidados no maternais, as mes menos sensveis
demonstram scores superiores na vinculao. Os autores consideram
que estes resultados sugerem que os efeitos de estilo parental de
vinculao so atenuados pela quantidade de exposio da criana a
cuidados de outros.
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O estudo de Stipek e seus colaboradores (1990), com crianas
com idades compreendidas entre os catorze e os quarenta meses,
identificou uma sequncia no desenvolvimento do auto-conceito: (i)
auto-reconhecimento fsico e auto-conscincia, (ii) auto-descrio e auto-avaliao, e (iii) resposta emocional ao comportamento errado.
O primeiro estdio de auto-reconhecimento fsico e auto-
conscincia revela-se por volta dos dezoito meses quando as crianas
manifestam os primeiros sinais de conscincia de si prprias como
seres fisicamente distintos dos outros e se reconhecem ao espelho ou
em fotografias. As respostas e as propostas emanadas do meio,
certamente mediadas pelo adulto, so percebidas como fontes deinformao sobre o seu prprio valor enquanto pessoa ser digno de
confiana, amor, ateno susceptvel de suscitar respostas
apropriadas s suas prprias necessidades. Estas percepes sobre si
mesmo, primeiros elementos da construo do auto-conceito dependem,
ento, das experincias vividas pelas crianas com o meio fsico e com o
meio cultural. medida que cresce e se desenvolve em termos fsicos,
motores, cognitivos e lingusticos a criana adquire novas formas devivenciar, experimentar e portanto perceber o mundo que a rodeia,
tornando-se menos dependente da mediao do adulto. Comeam a ser
evidentes as manifestaes de autonomia e independncia. A
locomoo, a aquisio da linguagem e o controlo esfincteriano so
marcos fundamentais neste caminho rumo autonomia.
O segundo estdio do desenvolvimento do auto-conceitopreconizado por Spiket e colaboradores (1990) a auto-descrio surge
entre os dezanove e trinta meses, em funo da expanso das suas
capacidades representacionais e lingusticas, comeando a aplicar
termos grande ou pequeno, e em termos de auto-avaliaoaplicando
termos mais ou menos avaliativos bom ou mau, bonito ou feio,
provavelmente como uma forma de auto-descrio apreendida no
ambiente. A aquisio da linguagem, enquanto forma de comunicaoprivilegiada entre os seres humanos, permite uma maior proximidade e
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interaco com o meio fsico ou social, dando ao sujeito uma nova
dimenso do mundo e de si prprio.
Na 1 infncia a linguagem primeiramente uma linguagem das
sensaes, dos sentidos. Na 1 infncia sentir, brincar, jogar soaspectos particularmente significativos para a linguagem
desenvolvimental da personalidade, do temperamento, das relaes
emocionais e da inteligncia (Diamond & Hopson, 2000; Rizzo, 2001). A
linguagem da 1 infncia uma linguagem de emoes e afectos
expressa na procura de relaes, na conquista e na auto-construo de
competncias, mediante a prpria actividade investigatria com os
outros. Para Greenspan (1997) a habilidade inata para usar alinguagem requer um princpio emocional, impregnado de
reciprocidade, estabilidade e desenvolvimento, capaz de se tornar
suporte de relaes acrescidas de significado emocional para a
linguagem respondendo assim a experincias e estimulao dos pais e
do meio. atravs da palavra que o indivduo chega aos sentidos
partilhados pelos membros de uma mesma cultura, j que a linguagem
objectiviza a realidade e possibilita a transmisso do significado ao longodas geraes que compartem conceitos comuns (Bruner & Haste, 1990,
p. 12).
Por fim, o terceiro estdio de resposta emocional ao
comportamento errado (Stipek et al., 1990) surge quando as crianas
comeam a mostrar a sua tristeza com a desaprovao dos adultos e
param quando se sentem observados. Neste sentido, a emoo torna-seum mecanismo essencial no desencadear da tomada de conscincia e
das possibilidades de comunicao imediata dos indivduos entre si, de
uns com os outros e consigo prprios (Crespo, 1996, p. 10). Este estdio
surge lentamente e sobrepe-se ao segundo estdio tornando-se a base
da compreenso moral e do desenvolvimento da conscincia. As
crianas, com catorze meses de idade, mostram desejo de autonomia ou
auto-determinao, recusando, contrariando ou resistindo s tentativas
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de ajuda, nomeadamente no vestir/despir ou no pegar ao colo, por
exemplo
O perodo entre os dezoito meses e os trs anos de idade ,
segundo Erikson, o estdio no desenvolvimento da personalidade autonomia versusdvida e vergonha marcado de forma especial pelo
incio da mudana do controlo externo para o auto controlo. A 1
infncia marcada pelo sentido de confiana bsica no seu mundo e
pelo despertar da auto-conscincia, caminhando para o seu prprio
julgamento das situaes e substituindo, assim, os julgamentos das
suas figuras parentais. O controlo esfincteriano um grande passo no
sentido da procura da autonomia e do auto controlo. A linguagem tambm um elemento-chave na conquista da autonomia, na medida em
que permite s crianas fazerem compreender os seus desejos,
tornando-se mais poderosas e independentes.
Por volta dos dois anos as crianas, aproveitando todas as
competncias recm-adquiridas (andar, falar, controlo esfincteriano),
caminham naturalmente para a autonomia, testam constantemente as
suas capacidades e o seu controlo sobre o mundo. Queremconsequentemente experimentar suas novas ideias, exercitar suas
preferncias e decidir por si s seus desafios, recorrendo tantas vezes
aos gritos e ao no!.
Entre o segundo e o terceiro ano de vida, ou seja, aps terem
desenvolvido a auto-conscincia que emergem as emoes como a
empatia, o cime, a vergonha, a culpa ou o orgulho. Esta auto-
conscincia, a compreenso que as crianas tm de que existem comoentidades separadas das outras pessoas e dos objectos, que emerge por
volta dos dezoito meses, necessariamente anterior capacidade de
reflectir nas suas aces e avali-las em funes de regras sociais
(Kopp, 1982; Stipek et al., 1990).
A creche tem um papel determinante fase aos desafios que
proporciona. Se a creche est constantemente a cercear as tentativas
incessantes de fazer coisas tpicas das crianas nesta faixa etria, setorna pblico todos os seus fracassos, estar a mostrar-lhe que no
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capaz e, consequentemente, baixar as percepes de auto-estima.
Muitas vezes os adultos tm dificuldade em ajudar e apoiar as crianas
no seu caminho da autonomia sem interferir, substituindo-os nas suas
competncias como, por exemplo, lavar as mos, sentar na cadeira,ajudar a comer ou tirar os sapatos.
O contexto creche em que a criana cresce e se desenvolve,
atravs das suas caractersticas, promove mais ou menos interaces
significativas. As situaes e momentos marcantes das suas
experincias com o mundo ficam retidos, constituindo pilares da
construo do Eu. Experincias positivas ou negativas vivenciadas no
contexto fsico ou com os outros significativos formatam esses pilaresdo Eu em funo da forma como cada criana vivencia esses mesmos
momentos. A percepo individual de um momento nica e depende
da forma como cada um experimenta a situao e no apenas a
situao propriamente dita. Em muitas creches, o controlo esfincteriano
um exemplo concreto desta afirmao, em que todas as crianas
vivem esta situao ao mesmo tempo e a determinada hora.
Na famlia como na creche, a criana experimenta os sentimentos
de adequao/inadequao ao mundo, e de pertena ou no a um
grupo. Vrios estudos sobre os efeitos de institucionalizao (Spitz,
1945; Bowlby, 1969) mostram que as crianas negligenciadas ou
maltratadas apresentam sentimentos de inadequao face ao mundo,
alertando para as consequncias dos maus cuidados institucionais pela
importncia que a relao afectiva tem na sade fsica, emocional,social e intelectual das crianas (Brazelton & Greenspan, 2002). Ao
mesmo tempo produto e processo, o auto-conceito na criana pequena
construdo, essencialmente, nas interaces vivenciadas na famlia e
nas instituies educativas como a creche. O primeiro contexto social
em que a criana vive , por norma, a famlia, pelo que todas as
experincias a vividas se tornam relevantes na formao do auto-
conceito, como tambm nas outras dimenses da personalidade.Embora a denominada licena de parto seja varivel de pas para pas,
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o seu trmino dita, geralmente a sua colocao em contexto de creche.
A creche constitui, assim, um novo microssistema, paralelo ao da
famlia, onde aprendem, entre outros conceitos, o que so e quem so,
atravs dos processos interactivos a desenvolvidos. A forma como socuidadas e respeitadas suas necessidades, caractersticas e interesses,
a forma como so encorajados os sucessos e fracassos a forma como a
creche responde criana e sua individualidade ter efeitos
significativos para o desenvolvimento.
Sedimentados em justificativos de socializao so incorporados
na creche e na sala de actividades elementos que normalizam e
homogenezam a criana. O educador e auxiliares tornam-seelementos de relevo no processo de formao do auto-conceito. O
educador, enquanto profissional de ajuda tem como funo
proporcionar meios adequados e eficazes ao desenvolvimento de
competncias e habilidades que levem a criana a melhor se conhecer e
se relacionar com o seu mundo social e fsico.
A organizao pessoal e nica que cada ser humano d a todo o
conjunto de situaes e interaces que experiencia no contexto (social,cultural, histrico,...) e que desenvolve a sua personalidade, est,
assim, intimamente relacionada com alguns factores, designadamente:
contexto fsico, outros significativos, famlia, experincias marcantes,
valores culturais, instituies educacionais (Guenther, 1980; 1997).
Estas interaces com o meio fsico e social, resultantes da prpria
aco da criana sobre o meio formam experincias de carcter fsico,
cognitivo, social ou afectivo mas todas contribuem de forma integradapara o seu desenvolvimento.
1.2.2. Desenvolvimento da relao com o outro
O sentimento de confiana bsica preconizada por Erikson
(1963), determinante na construo do auto-conceito da personalidade
estabelece a noo do outro porque est intimamente determinada pela
mediao dos outros na resoluo das necessidades da criana.
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Acredita-se que o ser humano quando nasce, est pr-adaptado para
iniciar, manter e terminar interaces com outros seres humanos.
Desde cedo tem tendncia para manter contacto visual, para se
conservar atento e em estado de alerta face a estmulos visuais eacsticos humanos, mas tambm ambientais.
O beb nasce com capacidades integrativas, que so
predisposies magnficas para as complicadas circunstncias dinmicas
da interaco humana (Emde, 1995, p. 492). Esta relao dialctica
entre o individual e o social, entre os sistemas e os subsistemas, e entre
os sistemas e o contexto, impulsiona o desenvolvimento individual e a
prpria evoluo scio-histrica (Bruner & Haste,1990). No entanto, emfuno da cultura dominante, da qualidade e da maturidade de
contactos sociais, o ser humano desenvolve maior ou menor nmero de
oportunidades de interagir com os outros nos seus cenrios envolventes
de vida (Garton, 1994).
A entrada precoce das crianas em contexto de creche origina
uma teia de relaes com crianas da mesma idade, o que no
acontecer com a permanncia das crianas em contexto familiar(mesmo com uma fratria alargada). Alguns estudos sobre as ligaes
afectivas na infncia enfatizam, como determinante para o
desenvolvimento psicolgico da criana, a sua relao com os adultos
(Freud, 1964; Bowlby, 1969; Ainsworth, 1979), enquanto que outros
apontam a importncia das interaces entre crian