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OS PRISIONEIROS DO CAUCASO
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e ha muito se achão as montanhas doCaucaso eiicra-vadas no império da Rússia sem lhe pertencerem. Osseus feros habitantes, separados pela lingua e porinteresses diversos, formão grande numero de pe-qüenos povoados, que poucas relações políticas tementre si, porém que são todos animados do mesmoamor de independência e de pilhagem.
Um dos mais numerosos e dos mais temíveis é odos Tchetchengos, que habituo a grande e pequena Kabarda , provínciascujos elevados yalles estendem-se até ássummidades do Caucaso. Os ho-mens d'ahi são bonitos, corajosos, intelligentes , mas ladrões e cruéis,e vivem em estado de guerra quasi continua com as tropas da linha, nome
que se dá á serie de destacamentos de tropas russas entre o Cáspio e o marNegro, desde a embocadura do Terek até a do Kubau.
Foi no meio d'essas hordas, e mesmo no centro d'essa hnmensa cadeiade montanhas, que a Rússia estabeleceu uma estrada de communicaçãocom as suas possessões da Ásia. Ha de distancia em distancia reductos
que tornao segura a estrada até a Geórgia; porém nenhum viajante ousa-ria correr o risco de percorrer sozinho o espaço que os separa. Duas vezes
por semana um comboi de infantaria com peças e um destacamento con-T. VII. — Agosto de 1869. 8
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sideravel de cosacos escolta os viajantes e os despachos do governo. Um
d'esses reductos, situado na bocaina das montanhas, tornou-se uma aldeia
bastante povoada. Sua colloçação faz com que lhe chamem Wladi-Cau-
caso, o que significa que elle domina o Caucaso, visto como dominar diz-se
em russo wladeti; serve de residência para o commandante das tropas
que fazem o rude serviço que acabamos de mencionar.
O major Kascambo, do regimento de Wologda, fidalgo russo de famiiia
oriunda da Grécia, devia ir tomar o commando do destacamento de Lars
nas gargantas do Caucaso. Impaciente por ir para o seu posto e valente
até a temeridade, teve elle a imprudência de emprehender essa viagem
com uma escolta de uns 50 cosacos de que dispunha, e ainda maior im-
prudência de dar com a língua nos dentes sobre tal assumpto, e gabar-se
antes de o por por pratica.Os Tchetchengos próximos ás fronteiras, chamados Tchetchengos mafe
sos, estão sujeitos á Rússia, e conseguintemente podem entrar e sahir
livremente de Mosdok; porém a maior parte entretem relações com os
montanhezes, e muitas vezes tomão parte activa em suas rapinas. Estes,
informados da viagem de Kascambo, e até do dia da partida, puzerão-se
em grande numero de emboscada no caminho por onde devia passar o
major. A vinte verstés mais ou menos de Mosdok, ao voltar uma collina
coberta de tojo, foi elle atacado por 700 homens a cavallo. Impossivel era
a retirada; os cosacos apeárão-se e sustentarão o ataque com muita fir-
meza, esperando que os soccorressem as tropas de um destacamento que
não se achava distante.Os habitantes do Cansaço , comquanto corajosos individualmente, são
incapazes para o ataque em massa, e por isso pouco perigosos para uma
tropa que lhes faz cara; porém têm boas armas e atirão com perfeição. Na
presente conjunetura o seu grande numero fazia o combate desigual. De-
pois de muitas descargas mais de metade dos cosacos forão mortos ou
postos fora de combate; os outros restantes fizerão dos cavallos mortos
uma muralha circular por trás da qual descarregarão suas ultimas muni-
ções. Os Tchetchengos, que trazem sempre comsigo, em suas expedições,
desertores russos, de que se servem a propósito como interpretes* manda-
vão gritar para os cosacos :— Entreguem-nos o major, do contrario ntio escapa um só de vocês.
Vendo Kascambo que era certa a perda da sua gente, resolveu entre-^ar-se por si mesmo para salvar a vida dos que restavão; entregou a
uspada aos setis cosacos e adiantou-se só para os Tchetchengos, cujo fogo
cessou immediatamente, por ser seu único fim agarral-o vivo para obter
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um resgate. Acabava elle de render-se ao inimigo , quando appareceu ao
longe o auxilio que lhe mandavão; já não era mais tempo; os bandidos
afastárão-se a toda apressa. O seu deuchik ou camarada tinha ficado atrás
com o animal que trazia a bagagem do major. Escondido em um esbar-
rondadeiro, estava esperando o resultado do combate, quando os cosacos
o encontrarão e lhe contarão a desgraça do seu amo. O bom do camarada
resolveu-se logo a participar cie sua sorte, e encaminhou-se para o lado
por onde se havião os Tchetchengos retirado, levando comsigo o seu ani-
mal e dirigindo-se pelos rastos dos cavallos. Já o escuro HVos ia fazendo
perder, quando topou com um soldado inimigo retardatario, que o levou
ao ponto de reunião dos Tchetchengos.Pode-se fazer idéa do sentimento que experimentou o prisioneiro ao ver
o seu deuchik vir voluntariamente compartir a sua má sorte. Immediuta»
mente os Tchetchengos distribuirão entre si a presa que lhes trazião; só
deixarão ao major uma guitarra que vinha no seu trem , e que lhe entre-
gárão por chacota. Ivan (1) (assim se chamava o deuchik) ficou com ella,
e não quiz jogal-a fora, como lh'o aconselhava seu amo.— Para que desanimarmos ? lhe dizia elle; o Deos dos Russos é
grande (2); ó do interesse dos bandidos conservar-vos a vida; nenhum
mal vos farão.Depois de fazerem alto por algumas horas, ia a horda pòr-se de novo a
caminho, quando um dos seus, o qual os alcançara n'esse momento ,annunciou-lhes que os Russos continuavão a avançar, e que provavelmenteas tropas dos outros destacamentos se reunirião para perseguil-os. Os
chefes formarão conselho : tratava-se de esconder o lugar para onde se
recolhião, não só para conservar o prisioneiro, mas também para desviar
o inimigo de suas aldeias, e assim evitar suas represálias. Dispersou-se a
horda por diversos caminhos. Forão destinados dez homens a péparacon-duzirem os prisioneiros, ao passo que ficarão reunidos uns cem cavalleiros
e tomarão direcção diversa da que devia tomar Kascambo. Tirárão-lhe
suas botas ferradas, que terião podido deixar rastos trabidores no chão ,e obrigarão a elle e a Ivan a andar descalços parte da manhã.
Chegando junto a um ribeirão , a pequena escolta foi por elle acima,
niargeando-o por sobre a relva, e isto na extensão de meio verste, e
desceu no lugar em que as ribanceiras erão mais escarpadas, por entre
(1) Seu iioiiie todo era SmiriioiT, que çchjiyale a João o mansuj, o que contrastava
singularmente com o sou caracter, como para o diante veremos,
(2) Dito familiar dos soldados russos no momento díi perigo.
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denso tojal, evitando com o maior cuidado deixar signal de sua passagem.
Tão cansado estava o major, que para leval-o até ao ribeirão foi mister
amparal-o cora cintas. Seus pés sangrarão ; resolverão restituir-lhe o seu
calçado para poder acabar o caminbo que faltava.
Guando chegarão á primeira aldeia, Kascambo, mais molesto de pezar
do que de cansaço, pareceu tão fraco e desfeito aos seus guardas, que re-
ceiárão por sua vida , e com mais humanidade o tratarão. Fizerão-o des-
cansar umpouco e derâo-lhe cavalgadura para a marcha; porém, para
desviar os Russos de pesquizas que poderião fazer , e para impossibilitar
o prisioneiro de indicar aos seus amigos o lugar onde estava retido, trans-
porüírão-o de aldeia em aldeia e de valle em valle, com a cautela de lhe
vendar os olhos aqui e alli. Assim atravessou elle um rio considerável,
que se lhe afigurou ser o Souja. Tratárão-o bem emquanto durarão essas
caminhadas, dando-lhe abundante alimentação e descanso necessário.
Assim que, porém, chegou elle á aldeia remota onde devia ficar definiti-
vãmente preso, os Tchetchengos mudarão subitamente de tratamento para
com elle, e o íizerão passar por toda a espécie de máos tratos. Deitarão-
lhe ferros aos pés e ás mãos, e uma corrente ao pescoço, e na ponta d'esta
amarrarão um trambolho de carvalho. Menos duramente era tratado o
deuchik; menos pesados erão seus ferros, e isso permittia-lhe prestar
alguns serviços a seu amo.N'cste estado, e a cada nova vexação que solfria, vinha vél-o um sujeito
que fatiava russo e lhe aconselhava que escrevesse a seus amigos para
obter o seu resgate, que havião fixado em dez mil rublos. Não podia o
desgraçado prisioneiro pagar tão pesada quantia, e só fundava esperanças
na protecção do governo, que annos antes havia já resgatado um coronel
que, como elle, tinha cahido cm poder dos bandidos. Promettia-lhe o
interprete dar-lhe papel c fazer chegar sua carta ao seu destino; porém,
depois de haver obtido seu consentimento, levou alguns dias sem appare-
cer, e durante esse tempo recrudescerão os soffrimentos do major. Não
lhe derão comida, tirárão-lhe a esteira em que dormia e uma almofadinha
de sella de cosaco que lhe servia de travesseiro; e quando por fim veio de
novo o intermediário, annunciou-lhe este á puridade que, se não quizes-sem na linha dar a quantia pedida ou retardassem o pagamento, os Tchet-
chengos estavão resolvidos a matal-o, para se pouparem a despezas e sustos
que lhes elle causava. O fim do seu procedimento cruel era fazer com que
elle escrevesse de modo mais urgente. Derão-lhe emfim papel com um
canniço aparado á maneira tarjara; tirárão-lhe os ferros que prendiâo-lhe
as mãos e o pescoço, para elle escrever desembaraçado; logo que acabou
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de escrever, traduzirão a carta aos chefes, que se incumbirão de remet-
têl-a ao commandante da linha.Foi elle desde então tratado com menos dureza, e só lhe puzerão uma
corrente, que lhe prendia a mão e o pé direito.
O seu hospede , ou antes o seu carcereiro , era um velho de sessenta
annos, de porte gigantesco e catadura feroz, não desmentida por seu
caracter. Dous filhos seus haviâo sido mortos em um recontro com os
Russos, circumstancia que o tinha feito escolher d'entre todos os habi-
tantes da aldeia para ser o guarda do prisioneiro.Compunha-se a família d'este homem, chamado Ibrahim, da viuva de
um de seus filhos, de idade de trinta e cinco annos, e de um menino de
sete para oito annos, chamado Mamet. Sua mâi era tão má e mais capri-
chosa ainda do que o velho guarda. Kascambo sofreu muito d'elles;
porém as caricias e a familiaridade do menino Mamet servirão-lhe ao
depois de distracção, e até de arrimo verdadeiro em seus infortúnios.
Tamanha amizade creou-lhe este menino , que as ameaças e pancadas do
avô não podião impedil-o de vir brincar com o prisioneiro, assim que elle
pilhava oceasiâo. A este deu o menino o nome de koniak, que, na lingua
da terra, significa um hospede e um amigo. Elle repartia secretamente
com elle as frutas que podia apanhar, e , durante a abstinência forçada a
que sujeitarão o major, o menino Mamet,. compadecido , aproveitava-se
com geito da ausência momentânea de seus pais para trazer-lhe pão ou
batatas cozidas na cinza.Havião-se passado alguns mezes depois da remessa da carta sem sue-
cesso notável. Feste intervallo Ivan tinha sabido grangear a benevolência
da mulher e do velho, ou, pelo menos, havia conseguido tornar-se neces-
sario. Sabia elle toda a arte culinária compatível com a cozinha de um
official de destacamento. Fabricava maravilhosamente o kislitchi (bebidarussa semelhante á cerveja, porém feita com farinha), preparava salada
de pepinos e tinha acostumado os seus hospedes a esses regalos que ia
introduzindo em sua casa.Para obter mais confiança, tinha-se-lhes apresentado com capa de
gaiato, inventando todos os dias alguma nova gaiatice para os divertir ; o
de que mais gostava Ibrahim era vôl-o dansar a cosaca. Quando vinha
visital-os algum morador da aldeia, tiravão os ferros a Ivan e mandavão
que dansasse, o que elle fazia, sempre com todo o gosto , inventando de
cada vez mais alguma nova cambeta. Com este modo de proceder tinha
elle alcançado a liberdade de percorrer a aldeia, ordinariamente acompa-nhado por uma súcia de crianças attrahidas por suas pachuchadas; e,
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como elle entendia o tartaro, dentro em pouco aprendeu a linga da terra,
a qual é um dialecto muito chegado d'aquelle.
O próprio major era muitas vezes obrigado a cantar com o seu deuchik
canções russas, e a tocar guitarra, para divertir essa gente feroz. A prm-
cipio tiravâo-lhe os ferros da mão direita quando exigião que se prestasse
a isso; porém tendo a mulher percebido que algumas vezes elle tocava ,
apezar dos ferros, para se desenfastiar, não lhe concederão mais esse favor;
e o desgraçado musico mais de uma vez arrependeu-se de haver mostrado
seu talento. Então não sabia elle que sua guitarra contribuiria um dia
para dar-lhe a liberdade.Para obter-se essa liberdade desejada, os dous prisioneiros forjavão mil
projectos, cada qual mais difficil de executar-se. Logo que chegarão á
aldeia, os moradores mandavão todas as noites, e por turno, um homem
para augmentar a guarda. As vezes não vinha a sentinella , e insensível-
mente afrouxarão esta precaução. A mulher e o menino dormião n'um
quarto vizinho, e o velho Ibrahim ficava sozinho com elles; porém tomava
todo o sentido com a chave dos ferros, e despertava ao mínimo ruido. De
dia em dia era o prisioneiro tratado com mais rigor. Como não vinha a
resposta ás suas cartas, os Tchetchengos vinhão muitas vezes á sua prisão
para insullal-o e ameacal-o com os mais cruéis tratos. Privavão-o de suas
refeições, e ura dia teve o pezar de ver darem sem compaixão no pequenoMamet por causa de algumas nesperas que o menino lhe havia trazido.]
Circumstancia bem notável na posição dolorosa em que se achava Kas-
cambo, era a confiança que ii'elle tinhão os seus perseguidores, e a estima
que lhes havia elle inspirado. Ao passo que esses bárbaros lhe fazião sof-
frer continuos vexames, vinhão muitas vezes consultal-o e tomal-o porarbitro nos negócios e desavenças que tinhão entre si. Entre outras con-
testações de que o fizerão juiz, por sua singularidade merece ser citada
a seguinte :Um d'esses homens tinha confiado uma nota russa de cinco rublos a seu
camarada, que partia para um valle vizinho, incumbindo-lhe de entre-
gal-a a alguém. O encarregado perdeu seu cavallo, que morreu em cami-
nho , e metteu-se-lhe em cabeça que tinha direito de ficar com os cinco
rublos para resarcir a perda que soffrêra. Este raciocínio, digno do Cau-
caso, não foi do gosto do senhor do dinheiro. Quando o viajante voltou,houve grande barulho na aldeia. Estes dous homens haviao reunido emredor de si parentes e amigos, e a rixa degenerava em sangue a não serem
os anciãos da horda, que , depois de haverem debalde tentado accommo-
dal-os, fizerão com que submettessem sua causa á decisão do prisioneiro.
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Todos na aldeia dirigírão-se em tumulto á sua casa para saberem o mais
cedo possível o resultado d'este ridículo processo. Kascambo foi tirado da
sua prisão e levado á plataforma que servia de tecto á casa.A maior parte das habitações, nos valles do Caucaso, são em parte cava-
das no chão, e só se elevão acima do mesmo três ou quatro pés; o tecto é
horizontal e formado de uma camada de terra argilosa batida. Os mora-
dores, mormente as mulheres, vêm descansar n'estes terraços depois do
pôr do sol, e muitas vezes ahi passão a noite na boa estação.Assim que Kascambo appareceu em cima do tecto , reinou profundo
silencio. Sem duvida que era para admirar verem-se, n'este singular tri-
bunal, litigantes furiosos, armados de pistolas e punhaes, submetter suacausa a um juiz encorrentado , meio morto de fome e de miséria, queentretanto julgava em ultima instância, e cujas decisões erão sempre res-
peitadasuc
Perdendo a esperança de fazer o accusado entrar na razão , o majormandou que elle se approximasse, e, para pôr ao menos os que se rissemdo lado da justiça, fez-lhe as seguintes perguntas :
Se, em vez de te entregar cinco rublos para levares ao seu credor, oteu camarada te houvesse incumbido só de lhe dares os bons dias , o teucavallo não teria morrido do mesmo modo?
Talvez, respondeu o renitente.E n'este caso, accrescentou o juiz, o que terias feito dos bons dias ?
Não te verias obrigado a ficar com elles em pagamento , e a te contentarsó com isso ? Ordeno-te, pois, que restituas a nota, e que teu camaradate dê os bons dias.
Ouando traduzio-se esta sentença para os espectadores a ouvirem, asrisadas annunciárão ao longe a sabedoria do novo Salomão. O própriooondemnado, depois de ter disputado um pouco, vio-se obrigado a ceder,
e disse a olhar para a nota :Eu já sabia que havia de perder, se esse cão de christão se mettesse
n'isto.Esta singular confiança delata a idéa que esses povos têm da superiori-
dade européa, e o sentimento innato de justiça que existe mesmo entre oshomens os mais ferozes.
Desde que estava preso, Kascambo tinha escripto três cartas, quenenhuma resposta tiverão. O desgraçado prisioneiro sentia falta de roupae de todos os commodos da vida; via ir-se-lhe arruinando a saúde e entre-
gava-se ao desespero. O próprio Ivan tinha estado um tanto doente. En-tretanto, com assombro do major, o severo Ibrahim tinha tirado os ferros
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a esse mancebo durante o seu incommodo, e ainda o conservava em
liberdade. Interrogando-o um dia o major a tal respeito :Meu amo, lhe disse Ivan, ha muito que o quero consultar sobre um
projecto que concebi. Creio que eu faria bem fazer-me mahometano.Estás doudo, sem duvida?Não; não estou doudo. Só tenho esse meio de lhe prestar serviço.
Disse-me o padre turco que , logo que eu fôr circumciso , não poderãoreter-me mais em ferros; então eu poderei fazer-lhe algum serviço, arran-
jar-lhe ao menos boa alimentação e roupa; emfim , quem sabe? quandoeu estiver solto... o Déos dos Russos é grande ! veremos...
Mas vê lá que o próprio Deos te ha de abandonar, desgraçado, se o
trahires.Kascambo, comquanto ralhasse com o seu criado, com difficuldade se
continha para não rir-se do seu exquisito projecto; porém quando ellechegou a prohibir-lh'o formalmente :
Meu amo,lhe respondeu Ivan, já não posso obedecer-lhe, e embalde
qüizera occultar-lhe : já está feito. Sou mahometano desde o dia em queVm. me julgou doente e tirárao-me os ferros. Agora chamo-me Husseim.
Que mal ha n'isso? Não posso tornar a fazer-me christao quando quizere Vm. estiver livre? Olhe lá; já não tenho mais ferros; posso quebrar osseus na primeira occasião favorável, e tenho muita esperança que ella hade vir.
Com effeito , forão de palavra com elle ; não foi mais encorrentado, edesde então gozou de maior liberdade; mas esta mesma lhe ia custandocaro. Os principaes autores da expedição receiárão logo que o novo mu-sulmano desertasse. A sua longa estada no meio d'elles e o habito quetinha de sua língua punhão-o no caso de os conhecer a elles todos pelosnomes e dar-lhes os signaes na linha, se para lá voltasse; e isso era expôl-os pessoalmente á vingança dos Russos; elles reprovavão altamente o zeloextemporâneo do padre. Por outro lado, os bons musulmanos que o haviãofavorecido no momento de sua conversão notarão que, por occasião d'ellefazer sua oração em cima do tecto da casa , segundo o uso e conforme omollah lh'o havia expressamente recommendado , para carear a benevo-lencia publica, elle misturava muitas vezes por habito e por inadvertenciasignaes da cruz com as prosternações que fazia na direcção da Meca, paraa qual acontecia-lhe por vezes voltar as costas; isto tornava-lhes suspeitaa sinceridade de sua conversão._ Mezes depois de sua fingida apostasia, notou elle grande mudança nasrelações que entretinha com os moradores, e não podia mais duvidar da
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manifesta má vontade d'elles. Quebrava a cabeça para descobrir a causad'isto, quando alguns rapazes com os quaes se achava em relações deamizade o vierâo convidar para elle os acompanhar a uma expedição. Erao seu projecto transpor o Terek para roubarem negociantes que deviao
passar para Mosdok. Ivan aceitou o convite sem hesitação. Havia muito
que desejava arranjar armas; promettiao-lhe parte do despojo. Cuidou
que, ao verem-o voltar para junto de seu amo, os que lhe suspeitavfiovontade de desertar nao teriao as mesmas razoes de desconfiar d'elle. Eu-tretanto, tendo-se o major opposto com toda a força a este projeôto, pare-cia elle nao pensar mais irisso, quando uma manhã Kascambo vio,ao acordar-se, a esteira em que dormia Ivan enrolada á parede; elletinha partido á noite. Seus companheiros deviao passar o Terek á noiteseguinte e atacar os negociantes , cuja marcha eonheciao pelos seusespiões.
A confiança dos Tchetchengos devera ter feito nascer alguma suspeitano animo de Ivan; nao era natural que homens tilo astuciosos e descon-fiados admittissem um Russo , seu prisioneiro, em uma expedição diri-gida contra seus patrícios. Depois veio a saber-se com effeito que elles ohaviâo convidado para acompanhal-os só com o fim de assassinal-o. Comoa sua qualidade de neophyto os obrigava a algumas cautelas, tinhão feitotençao de ter-lhe sempre os olhos em cima durante o caminho , e depoismatal-o na hora do ataque, deixando acreditarem que elle havia morridono combate. Só alguns dos da expedição sabiao o segredo ; porém os sue-cessos transtornárao-lhes os planos. No momento em que se haviao em-boscado para atacar os negociantes, um regimento decosacosos sorprendeue carregou sobre elles tâo vivamente que com muita difficuldade repassa-rào o rio. A grandeza do perigo fez-lhes esquecer a trama urdida contraIvan, que os acompanhou na fuga.
Quando a tropa em desordem atravessava o Terek, cujas águas sâo muitorápidas, o cavallo de um joven Tchetchcngo afundou no meio do rio, e foilogo levado pela correnteza. Ivan, que o acompanhava, impellio o seucavallo para a corrente, com risco de ser elle próprio levado, e, agarrandoo mancebo no momento em que ia afogar-se, conseguio leval-o ate aoutra margem. Os cosacos, á claridade do dia que vinha nascendo, reco-nhecendo-o pelo seu uniforme e pela sua barretina, apontavao a armapara elle gritando :
— Desertor! Agarrem o desertor!Sua farda ficou toda crivada de balas. A final, depois de se haver batido
como desesperado, e ter queimado todos os seus cartuchos, voltou paraT. VIL 8*
JORNAL DAS FAMÍLIAS.
a aldeia com a gloria de haver salvado a vida a um dos seus companheiros,e de ter sido de proveito a toda a tropa.
Se o seu procedimento n'esta occasião não lhe careou todas as sympa-
thias, ao menos grangeou-lhe um amigo; o mancebo a quem havia salvo
o adoptou por seu koniak (titulo sagrado que os montanhezes do Causaco
jamais violão) , e jurou defendêl-o de todos e contra todos. Porém não
bastava esta amizade para amparal-o do ódio dos principaes habitantes.A coragem que acabava de mostrar, a sua dedicação ao amo, augmen-tárao os receios que lhes havia inspirado. Não podião mais têl-o em contade um bobo incapaz de qualquer empreza, como até aqui tinha acontecido ;e quando se lembravao da expedição gorada, na qual tinha tomado parte,licavão admirados de se acharem tropas russas tão a propósito n'um pontotão distante de sua residência ordinária, e suspeitarão que elle tiverameios de prevenil-às. Comquanto não houvesse fundamento real para talconjectura, vigiárão-o de mais perto. O mesmo velho Ibráhim; receiandoalguma trama para a fuga dos seus presos, não lhes permittia mais trava-rein conversa seguida, e o bom do deuchik era ameaçado , e por vezesaté apanhava, quando queria conversar com seu amo.
N'esse estado, os dous prisioneiros imaginarão um meio de conversarsem causar suspeita ao seu guarda. Gomo estavão acostumados a cantar
juntos canções russas, o major pegava da guitarra quando tinha de com-municar alguma cousa importante a Ivan á vista de Ibrahim e cantavainterrogando-o; este respondia-lhe no mesmo tom, e seu amo o acompa-nhava com a guitarra. Não sendo este expediente novidade, nunca derão
por um ardil que aliás tiverão cautela em não empregar senão rarasvezes.
Mais de três mezes se tinhão passado depois da infeliz expedição já men-cionada, quando a Ivan pareceu que se dava extraordinária agitação naaldeia. Havião chegado da planicie algumas bestas carregadas de pólvora*Os homens limpavão as armas e preparavão cartuchos. Em breve soubeelle que se preparava uma grande expedição. Devia reunir-se toda a tribu
para atacar um povoado vizinho que se havia posto sob a protecção dosRussos, a quem havia permittido que construíssem um reducto em seuterritório. De nada menos se tratava do que de exterminar o povoadointeiro, bem como o batalhão russo que protegia a construcção do forte.
Dias depois^ Ivan, ao sahir da cabana pela manhã , achou a aldeia de-serta. Todos os homens capazes de pegar em armas tinhão sahido durantea noite. Na volta que deu pela aldeia para tirar informações, colheu novas
provas das más intenções que nutrião contra elle* Os velhos evitavão fal-
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lar-llie. Um menino disse-lhe abertamente que seu pai tinha vontade de
matal-o. Por fim, quando voltava todo absorto a ter com seu amo, avistou
em cima do tecto de uma casa uma moça que levantou o véo , e , com
mostras do maior terror, acenou-lhe com a mão para fugir, mostrando-lhe
o caminho da Rússia; era a irmã do Tchetchengo que elle tinha salvadona passagem do Terek.
Assim que tornou a entrar em casa, achou o velho oecupado em revis-tar os ferros de Kascambo. Estava sentado no quarto um recém-chegado :era um sujeito a quem uma febre intermittente tinha impedido de acom-
pànhar os seus camaradas, e por isso tinhao mandado para a casa de Ibra-him para reforçar a guarda dos presos até que voltassem os moradores.iNotou Ivan essa cautela sem por isso mostrar a mihima sorpresa. A au-sencia dos homens da aldeia deparava-lhe oceasiao para a execução dos
seus projectos; porém a vigilância mais activa do seu guarda , e mor-mente a presença do doente de febre , tornavão bem incerto o bom êxitod'ella. Entretanto era inevitável a sua morte se esperasse a volta dos mo-radores; previa que não se sahirião bem da sua expedição, e que o seufuror não o pouparia. Não lhe restava outro recurso mais do que abando-nar seu amo ou libertal-o logo e logo. Mais fácil fora ao íiel criado sup-
portar mil mortes do que escolher o primeiro.Kascambo, que começava a perder toda a esperança, tinha cabido,
havia algum tempo, n'uma espécie de marasmo, e conservava-se em pro-fundo silencio. Ivan, mais tranquillo e mais alegre que de ordinário , fez
com summa pressa os aprestos da refeição, que ia fazendo a cantar can-
ções russas entremeiadas de palavras de animação a seu amo.Chegou o tempo , dizia elle ajtintando a cada phrase o estribilho
insignificante de uma canção popular russa. hai luli, hai luli, chegou otempo de acabar-se nossa miséria ou de morrermos. Amanhã , hai luli,
hai luli, estaremos na estrada de uma linda cidade, hai luli, hai luli, quenão quero nomear; animo, meu amo ! não desanimeis. O Deosdos Russosé grande.
Kascambo, indifferente á vida e á morte, não sabendo quaes os projectosdo seu deuchik, contentou-se com dizer-lhe :
Faze o que quizeres, e cala-te.Á tarde, o febricitante, que tinhão tratado generosamente para o reto-
rem, e que, além do bom jantar que havia comido, se havia divertido todoo dia a comer chislik (carne de carneiro assada aos pedacinhos na ponta deum espeto), foi atacado de tão violento accesso de febre que abandonou o
posto e retirou-se para sua casa. Deixárão-o ir-se sem muita difíiculdade,
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por ter Ivan socegado completamente o velho com a sua jovialidade. Paradesviar ainda toda a espécie de desconfiança, retirou-se cedo para o fundo do
quarto e deitou-se em cima de um banco encostado á parede á espera queIbrahim pegasse no somno; porém este tinha resolvido velar toda a noite.Em vez de deitar-se n'umà esteira perto do fogo, como fazia sempre, sen-tou-se em um cepo defronte do seu prisioneiro, e despediosua nora, quemetteu-se no quarto vizinho, onde estava seu filho , e fechou a porta pordentro.
Do angulo escuro onde se tinha collocado, Ivan contemplava attenta-mente o espectaculo que tinha diante dos olhos. Ao clarão do fogo quelabaredava de vez em quando , scintiUava um machado n'uma fenda da
parede. O velho, vencido pelo somno, deixava por vezes cahir a cabeçasobre o peito. Ivan vio que era tempo, e pôz-se a pé. O desconfiado carce-reiro immediatamente deu por isso.
Que estás fazendo ahi, hein? disse-lhe elle asperamente.Ivan, em vez de responder, foi-se chegando para o fogo a bocejar, como
quem sahe de profundo somno. Ibrahim, que também sentia se lhe fecha-rem as palpebras, obrigou Kascambo a tocar guitarra para têl-o sempreexperto. Este não queria; porém Ivan deu-lhe o instrumento fazendo osignal convencionado.
Toque, meu amo, disse elle, tenho que fallar-vos.Kascambo afinou o instrumento, e, pondo-se a cantar, começarão os
dous o terrível duetto seguinte :
KASCAMBO,
Uai luli, liai luli, o que queres dizer-me? Toma sentido. (A cada per-gunta e a cada resposta elles cantavão juntos as copias da seguinte can-tiga russa :)
Que tristeza! que afflicção !Esperando aqui sozinhaO caro amigo que vinha :Que peso no coração !
Uai luli, hai luli!Ai ! que dor sinto aqui!
IVAN.¦
Alli está um machado; mas não olhe para lá. Hai luli, haíluli, eu rachocom elle a cabeça d'esse patife.
JORNAL DAS FAMÍLIAS. 241
Parte-se o fio na mãoQuando vou fiar a lã :Que fazer?... Fio amanhã,Hoje dóe-me o coração.
Haiiuli, hai luli,Por onde andas sem mi ?
KASCAMBO.
Inútil assassinato! hai luli, como ha de ser dos meus ferros?
Como busca a mãi no vaiO amojo; o pastor afílictoO cordeiro, e o cabrito lllpEÇA NACIONALCPUBUCAQue busca a herva venial. *— i>o •-*
Hai luli, hai luli. IUG DE .TANElilUO busco aqui e alli. ' "~*-*^-~>~-
IVAN.
A chave dos ferros ha de estar na algibeira do ladrão.
Quando á fonte bem cedindoVou a minh'agua buscar,You seguindo sem pensarDa sua casa o caminho.
Hai luli, hai luli,Que lá vai por alli.
KASCAMBO.
A mulher ha de se pôr a gritar, hai luli.
Ai! que me fino esperandoO ingrato de mim distante,Nos braços de nova amanteTalvez á fé me faltando !
Hai luli, hai luli,O que será de mi ?
IVAN.
Ora ! aconteça o que acontecer, não importa; não ha de Vm, morrerdo mesmo modo, hai luli, de miséria e de inanição ?
242 JORNAL DAS FAMÍLIAS.
Ingrato, inconstante amigo,Se tens de m'abandonar,Vefeu a aldeia se queimar,Me leve o fogo comsigo!
Hailuli, hai luli,_„JP'ra que viver assi?
Como o velho ia-se tornando attento, elles redobrarão os hai luli, acom-
panhados de um arpejado ruidoso.— Toque, meu amo, proseguip o deuchik, toque a cosaca; vou dansar
em roda do quarto para me chegar ao machado; toque a bom tocar.
KASCAMBO.
Pois bem, vá lá; acabe-se com este inferno.Elle desviou a cabeça e pôz-se a tocar com toda a força a dansa pedida.Ivan começou os passos e as attitudes grotescas da cosaca , dos quaes
gostava particularmente o velho, dando saltos e cambetas, e gritando paradesviar-lhe a attençâo. Quando Kascambo via que o dansarino estava
perto do machado, seu coração palpitava de inquietação; esse instrumentode sua liberdade estava n'um armariozinho sem porta, feito na parede,porém a uma altura a que quasi Ivan não chegava. Para apanhal-o , apro-veitou-se de um momento favorável, agarrou n'elle de repente e pôl-o nochão, á sombra que formava o corpo de Ibrahim. Quando este deilou-lheos olhos, já elle estava longe e continuava a dansa. Já havia muito quedurava esta scena perigosa, e Kascambo, cansado de tocar, começava acrer que faltava coragem ao seu deuchik, ou que elle não julgava a occa-sião opportuna. Lançou-lhe os olhos no momento em que, tendo agarradono machado, o intrépido dansarino adiantava-se com passo firme paracom elle ferir o velho bandido. Foi tão forte a emoção do major, que elle
parou de tocar e deixou cahir a guitarra sobre os joelhos. No mesmo ins-tante, tinha-se abaixado o velho e tinha dado um passo para diante parachegar cavacos para o fogo ; a folhada ardeu e lançou grande clarão no
quarto. Ibrahim voltou-se para sentar-se.Se, n'esta occasião, Ivan houvesse proseguido em seu plano, inevitável
era um combate corpo a corpo; ter-se-hia dado rebate, o que sobretudoconvinha evitar; porém sua presença de espirito salvou-o. Quando deu
pela perturbação do major e vio Ibrahim levantar-se , largou o machadoatrás mesmo do cepo que servia de assento a este ultimo, e tornou a prin-cipiar com a dansa.
JORNAL DAS FAMÍLIAS. 243
— Toque , com os diabos! disse elle a seu amo; em que está pen-sando?
Reconhecendo a imprudência commettida, o major pôz-se de novo e
devagarinho a tocar. Nada suspeitou o velho carcereiro, que sentou-se de
novo; porém ordenou-lhes que acabassem com a musica e se deitassem.
Ivan foi tranquillamente buscar a caixa de sua guitarra e veio collocal-a
em cima do fogão; mas, em vez de tomar o instrumento que seu amo lhe
estava dando , agarrou de repente do machado por detrás de Ibrahim e
descarregou-lhe tão terrível pancada na cabeça, que o desgraçado nem
sequer soltou um suspiro, e cahio redondamente morto com a cara no
fogo; sua longa barba grisalha ardeu; Ivan o puxou pelosj pés e cobrio-o
com uma esteira.Puzerão-se á escuta, para saberem se a mulher tinha-se acordado ,
quando, admirada sem duvida do silencio que reinava após tanta bulha,
ella abri o a porta do quarto.Então o que estão fazendo aqui ? disse ella adiantando-se para os
presos; de que é que está cheirando á penna queimada?Acabava o fogo de ser espalhado e não fazia mais quasi claridade. Ivan
levantou o machado para feril-a; ella teve tempo de desviar a cabeça e
recebeu a pancada no peito soltando um horrível suspiro; outra pancada,mais rápida que o raio, apanhou-a na sua queda e estendeu-a morta aos
pésdeKascambo. Aterrado com este segundo assassinato com que não
contava, o major, vendo Ivan avançar para o quarto do menino, collocou-
se-lhe pela frente para detêl-o.Onde vais, desgraçado? disse-lhe elle"1, terias a barbaridade de sacri-
ficar também esta criança, que me tem mostrado tanta amizade? Se me
libertasses por tal preço, nem tua affeiçao nem teus serviços te poderiãosalvar quando chegássemos á linha.
Na linha, respondeu Ivau, o senhor fará o que quizer; aqui ó pre-ciso acabar com tudo.
Kascambo, reunindo sua força toda, segurou-o pela golla, visto quererelle forçar a passagem.
Miserável! disse, se ousares attentar contra a sua vida, se lhe toca-
res em um só lio de cabello, juro aqui perante Deos, que eu mesmo entre-
go-me ás mãos dos Tchetchengos, o tua barbaridade será inútil.As mãos dos Tchetchengos! repetio o deuchik alçando o machado
ensangüentado por sobre o cabeça de seu amo ; nunca mais elles o colhe-
ráõ á mão vivo ; eu os degollarei a elles, ao senhor e a mim, antes que tal
aconteça. Este menino pôde deitar-nos a perder dando rebate ; no estado
244 JORNAL DAS FAMÍLIAS.
era que o senhor está , bastão mulheres para o trazerem outra vez para a
prisão.Detem-te! detem-te! gritou Kascambo, de cujas mãos procurava
Ivan desenvcncilhar-se. Detem-te 1 monstro ; has de me degollar a mim
primeiro para commetteres esse crime!Porém, atrapalhado pelos ferros e fraco como estava, não pôde reter o
feroz mancebo que o empurrava, e tombou em terra rudemente, prestes adesmaiar de sorpresa e de horror. Emquanto , todo manchado do sanguedas primeiras victimas, esforçava-se por levantar-se :
Ivan, gritava elle , eu te conjuro, não o mates! em nome de Deosnão derrames o sangue d'essa innocente creatura !
Correu em soccorro do menino assim que pôde; porém ao chegar á
porta do quarto, esbarrou no escuro com Ivan que voltava.Meu amo, está tudo acabado ; não percamos tempo e não faça baru-
lho. Não faça barulho, lhe digo, respondia elle ás exprobrações desespera-das do seu amo ¦; o que está feito está feito; agora não ha mais recuar.Até ficarmos livres mato a qualquer que eu encontrar, ou então me mataelle ; e se alguém entrar aqui não reparo se é homem, mulher ou criança,ou se amigo ou inimigo; estendo-o morto alli com os outros.
Elle acendeu um cavaquinho e pôz-se a remexeria patrona e os bolsosdo salteador; não achou a, chave dos ferros; procurou-a com o mesmoresultado no vestido da mulher, n'um armário e em toda a parte ondesuppunhá que podia estar escondida. Emquanto elle dava essas buscas,o major entregava-se imprudentemente á sua dor; Ivan o consolava lá aseu modo.
Era melhor que o senhor chorasse a chave dos ferros, que se perdeu.Que pena tem o senhor d'esta raça de salteadores que o tem atormentadopor mais de quinze mezes? EUes querião dar cabo cie nós; pois bem!chegou-lhes a vez primeiro que a nós. Tenho eu culpa d'isso? Os diabosos levem a todos elles!
Entretanto, como não se achava a chave dos ferros, tornavão-se inúteistantas mortes se não chegassem a quebral-os. Com o olho do machadoconseguio Ivan abrir a argola da mão ; porém a dos pés resistia a todos osseus esforços; elle tinha medo de ferir seu amo, e não se atrevia a em-pregar sua força toda. Por outro lado, adiantava-se a noite e o perigotornava-se imminente; resolverão safar-se. Ivan amarrou fortemente acorrente á cinta do major, de sorte que o incommodasse o menos possivele não fizesse barulho. Metteu ínima saccola um quarto de carneiro, restodo jantar da véspera, ajuntou-lhe outras provisões mais, e armou-se com
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JORNAL DAS FAMÍLIAS. 24o
a pistola e com o punhal do morto. Kascambo apossou-se de sua
burka(l).Sahírão caladinhos, dando volta á casa ; para evitar-se qualquer en-
contro, tomarão o caminho dos montes, em vez de seguirem a direcçâo de
Mosdok e a estrada commum, prevendo com razão que os havião perse-
guir d'esse lado. Costeárão durante o resto da noite as eminências da sua
direita, e, quando começava a clarear, entrarão n'um matto de faias que "
coroava todo o monte e que os livrou do perigo de serem vistos de longe.
Era no mez de Fevereiro : o terreno, n'essas alturas, e mormente no
matto, estava ainda coberto de uma neve endurecida que susteve os passosdos viajantes p:|i noite e parte da manhã; porém lá pelo meio-dia, quandoamolleceu com o sol, elles afundavão a cada passo, o que tornou muito
vagarosa sua marcha. Chegarão assim com muito trabalho á encosta de
um valle fundo que tinhão de transpor, e em cujo assento tinha desappa-
recido a neve; um caminho trilhado margeava as sinuosidades do ribeiro
e mostrava que o lugar era freqüentado. Esta consideração, junta com o
cansaço do major, levou os viajantes a ficarem n'esse lugar á espera da
noite; mettêrão-se entre algumas rochas isoladas que sahião da neve.
Ivan cortou ramos de pinheiro, e com elles fez, em cima da neve, um
leito espesso em que o major se deitou. Emquanto este descansava, Ivan
tratava de orientar-se. O valle cm cuja eminência elle se achava, era cer-
cado de altas montanhas por entre as quaes não se via sahida alguma;
vio que era impossivel evitar a tal trilha e que por força tinhão de acom-
panhar o curso do ribeiro para sahirem dvesse labyrintho. Erão quasi onze
horas da noite, e já a neve começava a consolidar-se, quando descerão o
valle. Porém antes de se porem a caminho deitarão fogo ao seu posto,tanto para se aquecerem como para comerem um pouco de chislik, do
que tinhão grande necessidade. Foi a sua bebida uma mão cheia de gelo,e um trago de aguardente acabou a festa.
Atravessarão felizmente o valle sem avistar pessoa alguma, c entrarão
no desfiladeiro, onde a estrada e o ribeiro se apertavão por entre altos
montes a pique. Caminharão com toda a pressa possivel, tendo em conta
o perigo que corriâo de serem encontrados n'este estreito passo, d'onde só
sahírão ás nove horas da manhã. Foi só então que esse sombrio desfila-
deiro se abrio de repente e elles lobrigárão, além das montanhas mais
(1) Capote de feltro impermeável\ de pello comprido \ muito parecido com uma
pelle de urso. É o capote ordinário dos cosacos , fabricado mesmo na terra , corri o
qual arrostão impunemente chuvas e lamaçaes do acampamento.
246 JORNAL DAS FAMIL1A.S.
baixas que se eneruzavão diante d%lles, o immenso horizonte da Rússia
semelhando um longínquo mar. Com facilidade não é possivel fazer idéado prazer que sentio o major ante tão inesperado espectaculo.
— A Rússia!«.. a Rússia !... foi a única palavra que pôde soltar.Sentárão-se os viajantes para descansarem e prelibarem o prazer de sua
próxima liberdade. Esse presentimento de felicidade se misturava noespirito do major com a lembrança da horrível catastrophe que presen-ciara, e seus ferros e vestidos salpicados de sangue lhe recordavâo viva-mente. Pregando os olhos no termo longínquo de seus trabalhos, calculavaas clifficuldades da viagem. 0 aspecto da longa e perigosa peregrinaçãoque lhe restava fazer, com ferros aos pés e pernas inchadas de cansaço,apagou logo até a impressão do prazer momentâneo que lhe havia causadoo aspecto de sua terra natal. Aos tormentos de sua imaginação juntava-seuma sede ardente. Ivan desceu ao ribeiro que corria a pouca distancia,
para trazer água a seu amo ; ahi achou uma ponte formada de diiasarvores, e avistou de longe uma habitação. Era uma espécie de chalet^habitação de verão de Tchetchengos, a qual estava deserta. No estado em
que se achavão os fugitivos era achado precioso essa casa isolada. Ivanveio tirar seu amo das suas meditações para trazêl-o ao refugio queacabava de descobrir, e, depois de ahi o haver mettido, pôz-se logo ácata da despensa.
Os habitantes do Caucaso, que na máxima parte são meio nômadas eestão muitas vezes expostos ás incursões de seus vizinhos, têm sempre
perto de suas casas subterrâneos onde escondem seus mantimentos etrastes. Esses armazéns, da forma de um poço estreito, são fechados comuma taboa ou uma grande pedra coberta por cima cuidadosamente comterra, e sempre são collocados em sítios onde não ha relva, com medo deque a cÔr daherva denuncie o deposito. Apezar d'estas cautelas os soldadosrussos muitas vezes os descobrem; elles batem no chão com a vareta desuas armas nos lugares trilhados que estão perto das habitações e o somlhes indica as cavidades que procurão. Ivan achou uma d'ellas debaixo deum telheiro pegado á casa, e alli encontrou talhas, umas espigas demilho, um pedaço de sal-gemma e vários utensílios de casa. Correu ábusca dVagua para arranjar a cozinha; o quarto de carneiro e algumasbatatas que tinha trazido forão postos ao fogo. Emquanto se preparava asopa, Kascambo mandava assar o milho ; por fim umas avelãs, encon-tradas ainda na despensa, completarão a refeição. Logo que elle acabou,Ivan, com mais vagar e meios, chegou a desenvencilhar seu amo dosferros, e este, mais tranquillo e restaurado por uma refeição excellente
JORNAL DAS FAMÍLIAS. 247
para o caso, dormio profundamente, e quando acordou já eranoite fechada.
Apezar d'este favorável descanso, quando quiz continuar viagem as suas
pernas inchadas se tinlião entesado a pontos que ao menor movimento
sentia elle dores insupportaveis. Entretanto foi necessário partir. Encostado
ao seu fâmulo, pôz-se a caminho com tristeza, persuadido que, não che-
garía até ao termo desejado. Aplacárão-se-lhe as dores pouco a pouco com
o movimento e calor do andar. Andou toda a noite, parando mintas vezes
e pondõ-se logo de novo a caminho. Algumas vezes também, perdendo o
animo, atirava-se ao chão e instava com Ivan para abandonal-o á sua ma
sorte. O seu intrépido companheiro não só o animava com suas falas e
exemplo, como também quasi empregava a violência para o erguer e
arrastal-o comsigo. Toparão em seu caminho um passo ilifficil e perigoso
que não podião evitar. Para esperar o dia fora mister perder um tempo
precioso; resolvôrão-se a transpôl-o com risco de n'elle se precipitarem ;
mas, antes de metter seu amo no tal passo, Ivan quiz primeiro reconhecêl-o
e percorrél-o só. Emquanto elle descia, Kascambo ficou só á borda
do rochedo em estado de ansiedade difficil de descrever-se. Estava a
noite sombria; estava elle ouvindo a seus pés o murmúrio surdo de
um rio rápido que corria no valle; o barulho das pedras que se des-
pi-endião da montanha com as passadas do seu companheiro e que
cahião na água, davão-lhe a conhecer a immensa profundidade do pre-
cipicio acima do qual estava elle parado. N'este momento de angustia,
que podia ser o ultimo de sua vida, acudio-lhe ao espirito a lembrança
de sua mãi: ella o tinha abençoado com amor quando partira da fronteira.
Esse pensamento deu-lhe coragem.— Meu Deos! exclamou elle, fazei com que sua benção não tenha sido
em "vão.
Ao terminar esta curta porém fervorosa oração, Ivan tornou a apparecer.
Não era o passo tão difficil como a principio tinhâo pensado. Depois de
descer algumas toezas por entre os rochedos, era necessário, para ai-
cançar a costa praticavel, costear um banco de rochedo estreito e in-
greme, coberto de uma neve escorregadia, debaixo do qual era a mon-
tenha cortada a pique. Ivan abrio na neve com o seu machado alguns
cortes que facilitavão a passagem; elles benze rão-se.— Ora, vamos lá, dizia Kascambo; se eu morrer, que não seja ao menos
por falta de coragem; só a moléstia m'a pôde tirar. Agora atiro-me por
ahi emquanto Deos me der forças.
Safárão-se com felicidade d'este passo perigoso e continuarão sua
viagem. Os caminhos começavão a ser mais seguidos e bem trilhados;
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248 JORNAL DAS FAMÍLIAS.
nâo achavão mais neve senão em lugares situados ao norte e nas baixadasonde se tinha accumulado. Tiverão a felicidade de nâo encontrar vivaalma até amanhecer, quando, avistando dous homens ao longe, vírão-seobrigados a se deitar para não serem vistos.
Em sahindo a gente das montanhas, n'estas províncias, não encontramais matto; o terreno então torna-se absolutamente despido, e seriadebalde procurar ahi uma só arvore, a não ser a margem dos grandes rios,onde assim mesmo são raros, o que é bastante extraordinário, vista afertilidade da terra. Já havia tempo que acompanhavão o curso do Souja,que tinhão de atravessar para chegarem a Mosdok, em busca de um sitioem que a água menos rápida pudesse offerecer-lhes passagem menosperigosa, quando descobrirão um homem montado que vinha direito aelles. O lugar, totalmente descampado, nem apresentava arvores, nemmouta para os esconder. Àgachárão-se por debaixo da barranca doSouja, á beira do rio. O viajante ia passando a algumas braças doseu escondrijo. A intenção d'elles era só de se defenderem se fossematacados. Ivan puxou do punhal e entregou a pistola ao major. Vendoentão que o cavalleiro era um menino de 12 para 13 annos, atirou-se-lhe bruscamente, agarrou-o pela golla e deu com elle em cima darelva. O rapazinho queria resistir; mas, vendo o major apparecer ámargem do rio com a pistola na mão, deu ás de villa-diogo. O cavalloestava em pello com um cabresto atado á boca á guisa de rédea. Os dousfugitivos servírâo-se immediatamente da sua presa para passarem o rio.Foi este encontro grande fortuna para elles, pois logo virão que lhesteria sido impossível atravessal-o a pé, como tencionavão. A sua montaria,comquanto carregada com o peso de duas pessoas só, esteve a ponto deser levada pela correnteza rápida da água. Entretanto chegarão sãos esalvos á outra margem, que infelizmente era muito escarpadapara o cavallopoder tomar pé. Elles descerão para o alliviarem. Puxando-o Ivan comtoda a sua força para fazel-o subir á barranca, desatou-se o cabresto eficou-lhe na mão. O animal, arrastado pela corrente, após numerososesforços para tomar terra, foi engolido no rio e afogou-se.
Privados d'esse recurso, porém mais tranquillos d'ahi por diante a res-peito do perigo de serem perseguidos, dirigírào-se para um monticulo,coberto de rochas soltas, que virão de longe, com tenção de ahi se escon-derem e descansarem até a noite. Calculando o quanto havião andado,suppuzerâo que as moradas dos Tchetchengos mansos não estarião muitolonge; porém não era nada seguro confiar n'esses homens, cuja trahiçãoprovável os deitaria a perder. Entretanto, visto o estado de debilidade em
JORNAL DAS FAMILIIAS. 249
que estava Kascambo, bem ditticil lhe era alcançar o Terek sem auxilio.Tinhão-se esgotado suas provisões; passarão o resto do dia em triste
silencio, não se atrevendo a communicar um ao outro suas inquietações.Lá para o fim da tarde o major vio o seu deuchik bater com a mão na
testa soltando profundo suspiro. Admirado d'esse desespero súbito quenunca até alli o seu intrépido companheiro havia mostrado, perguntou-lhea causa d' elle. - — - — - - - ¦—-"-
Meu amo, disse Ivan, commetti grave erro!Queira Deos nol-o perdoar! respondeu Kascambo persignando-se.Pois não! retrucou Ivan, esqueci-me de trazer essa bellà carabina
que estava no quarto do menino. Que quer o senhor? Não acudio essalembrança. O senhor tanto gemeu, tanto barulho fez, que isso não me
passou pela idéa. Ili-se? Era a mais bella carabina que havia em toda aaldeia. Com ella eu presenteava ao primeiro homem que encontrarmos
para pôl-o do nosso lado ; porque não sei como diabo havemos de acabarnossa viagem no estado em que eu o estou vendo.
O tempo, que os tinha até então favorecido, mudou no decurso do dia.Soprava com violência o frio vento da Rússia e lhes atirava á cara com
granizo. Partirão ao cahir da noite, sem saberem se deviâo procuraralcançar alguma aldeia ou evital-a. Porém o longo pedaço que ainda tinhãode fazer, n'esta ultima hypothese, tornou-se-lhes impossível por novadesgraça que lhes aconteceu lá para o fim da noite. Ao atravessarem umcórrego por cima de pm pouco de gelo que estava-lhe cobrindo o leito, o
gelo abrio-se sob seus pés, e elles mettêrão-se pela água a dentro até aos
joelhos. Os esforços que fez Kascambo para se safar acabarão de molhara sua roupa. Desde que tinhão partido nunca o frio tinha estado tão pe-netrante; o campo todo estava branco de saraiva. Depois de andar um
quarto de hora, apertado de frio, cahio de cansaço e de dôr, e recusoudecididamente dar mais um passo. Vendo que lhe era impossivel chegarao termo de sua viagem, considerava barbaridade inútil reter seu com-
panheiro, que podia facilmente evadir-se sozinho.— Escuta, Ivan, disse elle, Deos é testemunha que tenho feito o quanto
hei podido, até este momento, para aproveitar-me dos soccorros que metens dado; porém estás vendo agora que }á elles não me podem maissalvar, e que minha sorte está decidida. Vai-te embora para a fronteira,meu querido Ivan; volta para o nosso regimento. Dize a meus velhosamigos e a meus superiores que aqui me largaste para pasto dos corvos,e que lhes desejo melhor sorte. Mas, antes de partir, lembra-te de novodo juramento que deste lá no sangue dos nossos guardas, Juraste que os
250 JORNAL DAS FAMÍLIAS.
Tchetchengos não me tdrnarião a agarrar vivo : cumpre a tua palavra.Ao dizer estas palavras elle estendeu-se no chão e se cobrio todo com a
suaburka.Resta ainda um recurso, lhe respondeu Ivan; é procurar uma habi-
tação de Tchetchengos e angariar-lhe o dono com promessas. Se nos
atraiçoar, pelo menos nada teremos a nos exprobrar. Veja se se pôde ar-
rastar até lá; ou então, accrescentou elle ao ver que seu amo ficava calado,
irei sozinho, procurarei angariar um Tchetchengo; e, sahir-me bem,
voltarei com elle para levar-vos; se, pelo contrario, sahir o negocio ás
acessas e eu morrer ou nao voltar mais, abi está a pistola.Kascambo tirou a mão de debaixo da burka e agarrou na pis-
tola.Ivan o tomou a cobrir com hervas e ramos seecos com medo cTelle ser
descoberto por alguém emquanto elle estivesse ausente. Quando se dis-
punha a partir seu amo o chamou.Ivan, lhe disse elle, escuta minha derradeira supplica. Se repassares
o Terek e vires outra vez minha mai sem mim... 'Meu amo, interrompeu Ivan, até logo. Se o senhor morrer, nem sua
mai, nem a minha, nunca mais me porão a vista em cima.Depois de uma hora de marcha, elle avistou, de uma pequena elevação,
duas aldeias a três ou quatro verstes de distancia; não era o que procu-rava ; queria elle encontrar uma casa isolada, na qual se pudesse mettersem ser visto, para secretamente pôr de seu lado o dono. Descobrio umaassim pela fumaça da chaminé. Para-lá foi elle immediataniente, e entrousem hesitar. O dono da casa estava sentado no chão, occupado em con-certar uma de suas botas.
Venho, disse-lhe Ivan, offerecer-te 200 rublos de lucro e pedir-teum serviço. Sem duvida ouviste faltar no major Kascambo, que está pri-sioneiro lá com os montanhezes. Pois bem! eu o roubei; elle está aqui,a dous passos, doente e em tuas mãos. Se queres de novo entregal-o aosseus inimigos, por certo elles te louvarão; mas, bem o sabes, não te re-compensarão. Se pelo contrario assentes em salval-o5 conservando-o só-mente por três dias em tua cesa, irei a Mosdok e te trarei 200 rublos emboa espécie pelo seu resgate. Se ousares mexer-te do teu lugar, accrescen-tou elle puxando do punhal, e dar rebate para me prenderem, aqui mesmote esgano. Decide já ou estás morto.
0 tom firme de Ivan persuadio ao Tchetchengo sem intimidai-o.Moço, disse-lhe elle enfiando tranquillamente sua bota, eu também
trago um punhal á cinta e o teu nao me mette medo. Se tivesses entrado
JORNAL DAS FAMÍLIAS. %U
em minha casa como amigo, nunca eu teria trahido um homem que trans-
pôz o limiar da minha porta; agora já nada prometto. Assenta-te para ahi
e dizeo que queres.Ivan, vendo com quem eslava mettido, embainhou outra vez o punhal,
assentou-se e repetio a proposta.Que penhor me darás, perguntou o Tchetchengo, da execução de tua
promessa ' 'Deixar-te-hei o próprio major, respondeu Ivan. Pensas que eu teria
soürido por espaço de quinze mezes e teria trazido meu amo á tua casa
para ahi o abandonar ?Está bem, creio em ti; porém 200 rublos é muito pouco , quero
400.Porque não pedes já 4,000? isso mio custa; mas eu, que quero cum-
prir minha palavra, oifereeo-te 200 porque sei d'onde havêl-os, e nem um
kopeck mais. Queres pòr-me em condição de te embaçar ?Pois vá lá; üquemos nos 200 rublos; c voltas só e dentro em três
dias?-— De certo, só e em três dias, clou-te palavra de honra. E tu , já me
deste a tua? É o major teu hospede ?Desde este momento, tanto elle como tu sois meus hospedes, dou-te
minha palavra.Apertarão a mão um do Q..utro, e forão de carreira buscar o major, que
trouxerão meio morto de frio e fome.Em vez de ir a Mosdok, Ivan, sabendo que achava-se mais perto de
Tcherveliauskaya-Stauiza, onde existia um destacamento considerável de
cosacos, para alli se dirigio logo. Não lhe custou ajuntar a quantia pre-cisa. Os valentes cosacos, alguns dos quaes tinhão assistido á infeliz refrega
que havia custado a liberdade a Kascambo , cotisárão-se com empenho
para completar-se o resgate. No dia determinado, Ivan partio para ir em-
fim libertar seu amo; porém o coronel commandante do destacamento,
receiando alguma nova trahição, não o deixou voltar só; e, não obstante
o ajuste feito com o Tchetchengo , mandou que alguns cosacos o acom-
panhassem.Esta cautela quasi ia-se tornando funesta a Kascambo. Assim que seu
hospede avistou de bem longe as lanças dos cosacos, julgou-se trahido;
e desenvolvendo logo a corajosa ferocidade de sua nação , levou o major
ainda doente para cima do tecto da casa, amarrou-o a um mourao, collo-
cou-se diante d'elle com a sua escopeta na mao.~ Se avança, gritou elle assim que Ivan chegou á distancia de ouvil-o e
252 JORNAL DAS FAMÍLIAS.
apontando a arma para o seu prisioneiro, se dá mais um passo, arrebento
os miolos ao major, e tenho cincoenta cartuchos para os meus inimigos e
para o trahidor que os traz.Não estás traindo, gritou-lhe o deuchik tremendo pela vida de seu
amo; obrigárão-me a voltar acompanhado; porém trago os 200 rublos e
sustento minha palavra.Afastem-se os cosacos, accrescentou o Tchetchengo, ou então faço
fogo. ;¦.Kascambo mesmo pedio ao official que se retirasse. Ivan acompanhou
um pedaço o destacamente e voltou só; porém o desconfiado bandido nao
o deixou approximar-se. Mandou que elle contasse os rublos a cem passosda casa na picada e que se retirasse.
Assim que pilhou o dinheiro, voltou para o tecto e atirou-se aos pés domajor, pedindo-lhe perdão e esquecimento dos máos tratos por que setinha visto forçado, dizia elle, a fazêl-o passar para sua segurança.
Hei de me lembrar só, respondeu Kascambo-, que fui teu hospede,e que foste de palavra; porém antes de me pedires perdão , tira-me pri-meiro as cordas.
Em vez de responder-lhe, o Tchetchengo, vendo voltar Ivan, atirou-sedo tecto, e desappareceu como um relâmpago.
N'esse mesmo dia o valente Ivan teve o prazer e a gloria de reconduzirseu amo para o seio de seus amigos, que havião perdido a esperança de otornar a ver.
EPÍLOGO.
A pessoa que recolheu esta anecdota, passando alguns mezes depois porJegorievski, á noite, pela frente de uma casinha de bonita apparencia emuito illuminada, apeou-se do seu kibick (1) e chegou-se a uma janellapara gozar do espectaculo de um baile muito animado que se estava dandono pavimento térreo. Também um tenente estava olhando muito attenta-mente para o que se esteava passando no interior da sala.
Quem dá o baile? perguntou-lhe o viajante.E o Sr. major que se casa.
(1) O kibick é um carro, ciijaéaixa, semelhante á de uma caleça feita grosseira-mente, assenta immediatamente sobre dous eixos., c no inverno sobre dous patins paraformar um trenó; é o carro de viagem ordinário na Rússia.
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JORNAL DAS FAMÍLIAS. 253
E como se chama o Sr. major?Chama-se Kascambo.
O viajante , que conhecia a historia singular (Teste oíficial, deu a simesmo os parabéns pela sua curiosidade , e pedio que lhe mostrassem onoivo, que, radiante de prazer, esquecia n'este momento os Tchetchengose sua crueldade.
Faça-me o favor, accrescentou elle ainda, de mostrar-me o valentedeuchik que o salvou.
O tenente, depois de hesitar por algum tempo, respondeu-lhe :Sou eu.
Duplamente sorprendido do encentro, e ainda mais por parecer-lhe elletão moço, o viajante perguntou-lhe que idade tinha. Ainda elle não tinhacompletado vinte annos, e acabava de receber uma gratificação com a
graduação de tenente, em recompensa de seu valor e de sua fidelidade.Este valente mancebo, depois de haver compartido voluntariamente os
infortúnios de seu amo, e lhe haver restituido a vida e a liberdade, sabo-
reava agora a sua felicidade vendo o seu casamento pelas vidraças.Porém, mostrando-se o estrangeiro admirado d'elle não fazer parte da
festa, taxando por isso seu antigo amo de ingrato, Ivan lançou-lhe um
olhar de esguelha , e entrou para dentro da casa assobiando a cantiga :Bai hili, hai luli.
D'ahi a pouco elle appareceu na sala do baile, e o curioso tornou a subir
para o seu kibick, dando parabéns á sua fortuna de não ter levado umamachadada na cabeça.
Traduzido de XAVIER DE MA1STRE.
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ECONOMIA DOMESTICA.
MOCOTÓS DE CARNEIRO COM LIMÃO.
Ponde n'uma panella um pouco de banha de porco derretida , e peda-eos de toucinho, cebolas, cenouras, salsa, cebolinhas, cravos- da índia,
alhos, sal, pimenta do reino, e uma ou duas colheresde farinha de trigo,
fatias de limão, sem casca nem caroços. Refogai tudo isto até tomar uma
côr loura , derramai-lhe em cima água quente e um bocadinho de vina-
gre. Ponde n'esse molho os mocotós de carneiro já limpos dos pellos exte-
riores e do pequeno tuffo que elles têm na separação das unhas. Quandoos ossos se destacâo com facilidade ponde n'outra panella um bocado de
manteiga, uma colher de farinha de trigo , molhai com caldo e deitai-lhe
dentro os mocotós com rodas de cebolas, salsa picada, cebolinhas idem,
sal, se ainda fôr preciso, pimenta do reino, noz moscada ralada, e deixai
ferver de vagar por espaço de meia hora. Ao mandar á mesa batei as
gemas de ovos que julgardes necessárias para a quantidade de mocotós
que tiverdes, ponde n'esses ovos um fio de vinagre e misturai-os no vosso
guisado, que está prompto.PAULINA PHILADELPHIA.
®^í^ftrt^^,^ ÍO.
/
POESIA. IBUOTHEDA MACIOMALCSWIU
ADEOS!...
a Adeos!... é renunciar numa agoniaA esperança que ainda nos palpita! »
ALY. DE AZEVEDO,
Adeos!... sonho febril!... ultima nota...Do peito desprendida !... louca esperança!,Insano stertor qu alma embota...Do lago, num abysmo, de provança!...
Adeos!... fatal anhelo... gasta iIlusão...
Que hoje reproduz discorde a lyra!...Exhausto o peito, em desejo em vão... .As cinzas quentes d'extincta pyra!...
Adeos!... silencio, coração... ias faliar?!Ás brizas .confiar loucos anceios ?!Não temes o rir d'escarneo t'affrontar?!...
s O cynismo folhear teus devaneios ?!...
IfONOP.ATA M. C. DE M.
Avuruoca, 1o de Maio de 1808.
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MODAS.
DESGRIPGAO DO FIGURINO DE MODAS.
Primeiro vestuário. — Vestido de tafetá côr de malva com tufo guarnecidocom um folho da mesma fazenda orlado com uma franja e um macheadopor cima; cabeção guarnecido da mesma maneira, com um cinto e laçoatrás. Ghapéo de filo preto, ornado com rosetas de setim preto e com umagrinalda de flores do campo.
Segundo vestuário. — Vestido de sultana de seda verde, guarnecido comdous folhos franzidos com macheados dobrados por cima. Vestimenta de pô*por cima, de grenadin preto, formando saia-tunica e cabeção. Cadapannodatúnica está arregaçado e franzido sob um pequeno macheado cfe setim preto;um macheado irmão serve de cabeça a um folho que pôde ser de renda ouguipure preta. 0 cabeção, arredondado atrás, tem abas curtas adiante; estáguarnecido com macheados.e um folho. Chapéo de filo branco, ornado comfitas verdes e boninas brancas.
MOLDE CORTADO.
Este molde é o do vestuário de grenadin de seda preta do segundo figu-rino da nossa gravura de modas d'este mez. Este vestuário consta de umasaia-tunica e de um fichú. A saia compõe-se de quatro pannos iguaes ao deque damos a metade; os de trás devem ser um pouco mais compridos. Cadapanno está franzido sobre a costura e guarnecido com um pequeno macheadoda mesma fazenda; estando franzido, forma grande recorte em baixo guar-necido com um macheado igual e um folho. Enfeita-se o fichú da mesmamaneira; cruza-se na frente sob um laço de setim preto , e a ponta acha-sepresa atrás sob o cinto. O molde do fichú compõe-se da metade do modelo,em dous pedaços. Reunindo-os, ter-se-ha cuidado de pôr os dous entalhosdo lado do hombro, e o entalho que está só, do lado do pescoço. Este mo-delo pôde ser mui utilmente usado por cima dos vestidos do anno passado.
Algumas pessoas não tendo bem comprehendido o nosso ultimo moldecortado, accrescentaremos, á descripção que d'elle havemos dado, que secorta aparte o cabeção e a aba d'esse pequeno vestuário, e que essas duaspartes só se reúnem pelo cinto.
JORNAL DAS FAMÍLIAS. 257
TRABALHOS.
VISTA E DETALHES DE UMA CARTEIRA REDE, Nos 1 E 10.
Além da vista d'este novo modelo, damos o desenho, de tamanho natural, ,do bordado com que se enfeita. Faz-se elle sobre cachemira branca, que seforra com morim e que se estende sobre um pequeno bastidor de bordar.A ave borda-se de matiz com retroz encarnado , matizado de preto. A cerca-dura faz-se de bordado Índio, isto é, de ponto russo com seda frouxa ou des-fiada, de matizes brilhantes e variados. O goslo e a fantasia têm toda a liber-dade de se desenvolverem n'estes trabalhos, o que os torna muito divertidosde fazer. Os dous lados da carteira bordão-se iguaes. A cachemira bordadaestende-se n'um papelão e todo o interior forra-se com setim ou com tafetá
acolchoado, de um lindo matiz. Prega-se o papelão sobre a armação; oslados cobrem-se com cachemira preta; prendem-se aos juncos borlas de
seda de varias cores.
DEATLHES E VISTA DE UM VIDE-POCHE, N»s 2 E 3.
Os desenhos chinezes estão muito na moda; adaptão-se a uma multidão de
modelos novos, feitos sobre cachemira branca com bordado índio, das mais
variadas cores. O desenho, de lamanho natural, que damos do vule-poche,representa as três quartas partes, que se completarão facilmente. As peque-nas figuras são de marfim e lindamente pintadas; coltão-se sobre a cache-mira com um pouco de gomma , e bordão-se os cabellos com retroz preto.As vestimentas das pequenas personagens fazem-se com retroz de cores bemmarcadas; poem-se sobre o fundo, e bordão-se por cima as pregas e as
cercaduras. Os contornos das mãos estão marcados com um risco de retroz
côr de carne. O terreno faz-se com traços compridos e irregulares de pardosmatizados e entremeados com traços verdes. Indica-se a água com linhas
horizontaes matizadas de azul e de verde azulado. A pequena ponte, cor de
madeira com traços amarellos, e toda a paizagem fantástica tem as maisviriííHíis cores'
O contorno e a cercadura fazem-se de côr de madeira ; os raios que mar-
cão a sombra, de côr de madeira escura, o pequeno ramo de amarello e as
estrellas de fio de ouro.A armação, que é muito esmerada, deve confiar-se a um artista especial.
O interior do vide-poche forra-se com setim branco franzido e guarnecido commacheados de litas ou de cordão de seda de lindíssimo effeito.
GUARMCAO DE ALVA UU DE TOALHA DE ALTAR, N° 6.t
Este trabalho faz-se sobre filet ou sobre filo grosso de malhas redondas.Póde-se fazer o desenho de applicaçãô de cassa bordada sobre todos os con-
258 JORNAL DAS FAMÍLIAS.
tornos, de cordãozinho, ou de ponto de cirzido com linha chata. A coroa deespinhos borda-se de ponto de relevo com linha de bordar, mas cumpre
previamente pòr-se cassa sobre o filo, e depois recortar á roda do bordado.A grega não passa de uma linha chata passada no filo ou no füet; as linhasda cercadura e as pequenas cruzes fazem-se de matiz, e a beira recortada,com linha grossa de ponto de rosa.
--¦v - - PONTA -DE -GRAVATA, N° ¦".- - 7
As pessoas que sabem fazer frivolidade acharáõ n'este desenho de gravatauma linda applicação do seu talento; o fundo pode ser de filo ou de cassa.Póde-se fazer também com um pequeno trancelim íinissimo de algodão oude seda.
GÜARNK1Â0 DE MIGNARDISE,
A mignardise é uma espécie de pequeno trancelim de algodão fino orladocom anneiszinhos de cada lado. Risca-se, sobre papel forrado com encerado,o desenho que se quer imitar e alinhava-se por cima a mignardise; depois,com uma agulha de aço e linha fina, fazem-se de ponto de cadeiazinha osdifferentes traçozinhos que ligão as beiras da mignardise, passando sempre aagulha nos anneiszinhos. Depois tira-se ^mignardise do papel e tem-se lindasguarnições muito fortes e facilimas de fazer.
TIRA DE APPLICAÇÃO DE PANNO SOBRE PANNO.
(N° 9 DA ESTAMPA DE MOLDES.)
lista tira, que pôde servir de cercadura para cortinados e reposteiros dereps, ou para trastes e tapetes de mesa, é de paiwio verde. Os envolucros dascastanhas entreabèrtas fazem-se de applicação de panno cor de laranja, cri-vados de pequenos pontos com retroz amarello e de espinhos com retroz corde madeira. As folhas têm unicamente os contornos e as nervuras riscadascom retroz de um verde mais claro que o fundo; as hastes bordão-se de ma-tiz com retroz pardo. Póde-se fazer a grega com contas douradas, enfiadas cmettidas sobre o panno , ou bordal-as de ponto atado com retroz preto oucòr deourOi
TAPEÇARIA COLORIDA.
t3òde servir para costas e assento de poltrona ou para moclio. Üs con-tornos da grega fazem-se com retroz , e também o matiz claro das espigas.O fundo do ramalhete, sendo para mocho, faz-se preto.
e*
EXPLICAÇÃO DA ESTAMPA DE BORDADOS.
Nü 1. — Vista de uma carteira rede. [Vide os trabalhos.)N° 2. — Detalhes de um vide-poche. (Vide os trabalhos.)
JORNAL DAS FAMÍLIAS. 259
No 3, _ vista de um vide-poche. (Vide os trabalhos.)^o 4# _ Pequeno entremeio. Ponto russo.N° 5. — Guarnição recortada com grega. Ponto russo.N° 6. — Guarnição de alva ou de toalha de altar. {Vide os trabalhos.)N° 7. — Ponta de gravata. {Vide os trabalhos.)No gf _ Guarnição de mignardise. (Vide os trabalhos.)No 9t __ vista do cabeção do ri° 1 da estampa de moldes.N<> io. — Detalhes de uma carteira rede. (Vide os trabalhos.)N° dl.- Gollarinhoi marinheira. As flores bordão-se do ponto derecorte;..
fazem-se alternadamente as folhas recortadas e cheias; nas folhas cheias
risca-se uma pequena nervura de cordâozinho.N° 12. — Punho irmanado com o collarinho precedente.N° 13. - Entremeio para roda de saia. Ponto de cadeiazinha c Hôr de
ponto de relevo. Com retroz preto ou de cor sobre fazenda de lã.N°s14 15 16 17 18 e 19. — Vários modos de fazer casas de vestidos.
Por baixo dê ca'da casa um desenho especial mostra a maneira de fazer o
ponto.N° 20. — Entremio. Ponto russo.N° 21. — L. 0. Iniciaes ornadas. Ponto de relevo.N° 22. — G. C. Iniciaes ornadas. Ponto de relevo.N° 23. — Clotildes. Cordâozinho.No 24. — iV. dobrado e P. Lettras encadeadas. Ponto de relevo.N° 25. — A. V. Iniciaes romanas. Duplo cordâozinho.No 26. _ jv. P. Lettras encadeadas. Ponto de relevo.N° 27. — Angela. Lettras inglezas. Bordado russo.N° 28. — G. C. Iniciaes romanas. Ponto de relevo.N° 29. — E. M. Iniciaes romanas. Cordâozinho e ponto d'armas.N° 30. — G. S. Iniciaes romanas. Ponto de recorte.N° 31. — L. 0. Iniciaes romanas. Ponto de relevo.N° 32. — G. C. Iniciaes romanas. Ponto de relevo.No 33, __ Fortunata, Lettras gothicas. Cordâozinho*N° 34. —Paulina. Lettras gothicas. Pesponto.N° 35. — Zoé. Lettras inglezas. Ponto de relevo.
EXPLICAÇÃO DÀ ESTAMPA DE MOLDES.
Nu 1. - Molde de cabeção (a vista acha-se no n° 9 da estampa de borda-
dos). Metade do cabeção, com um pedaço cortado á parte que a elle se liga.
N° 2. — Metade de colletinho para criança; Corta-se de um so pedaço.Fustão branco bordado com soutaché.
N° 3. — Metade da manga do colletinho.N« 4. — Metade de babadouro para criança. Gorla-se de um so pedaÇOi
Fustão, beira recortada, ponto de espinhos, grãos e flores de ponto de
recorte.N° 5. — Cobertazinha para o pés. Esta cobertazinha, que não passa dé
quadrado longo destinado unicamente a cobrir metade do leito, faz-se desetim ou de tafetá da côr dos trastes. Borda-se de ponto russo com retrozdo mesmo matiz, ou com retroz preto, ou emíim de cores variadas. Forra-sea cobertazinha com cassa leve de lã acolchoada e pespontada em rhombos.
260
N» 6.—N° 7.-N«8. —N-9.-N°10. -N° 11.N° 12.
relevo.N» 13.N° 14N» 15.N°16.N°17.
JORNAL DAS FAMÍLIAS.
Quatro guarnições differentes, recortadas. Bordado russo.Desenho para roda de saia. Ponto México.Ponta de gravata. Filet bordado.Tira de applicação de panno sobre panno. (Vide os trabalhos).
Quarta parte de um lenço. Ponto de relevo.N. P. Lettras encadeadas, para roupa de mesa. Ponto de relevo.G. C. Iniciaes para lençol, fronha ou toalha de mesa. Ponto de
L. 0. Lettras encadeadas, para roupa de mesa. Ponto de relevo.F. M. Iniciaes para lençol ou fronha. Ponto de relevo.
L. B. Iniciaes ricas. Ponto de relevo e ponto d'armas.E. M. Iniciaes ricas. Ponto de relevo e ponto d'armas.N. M. Lettras encadeadas. Ponto de relevo.
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Paris. — Typographia de Ad. Lainé, rua dos Santos-Padres 19.