UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO
INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS
DEPARTAMENTO DE EDUCAÇÃO
MESTRADO EM EDUCAÇÃO
OS ESFORÇOS FAMILIARES E AS PRÁTICAS EDUCATIVAS DE FAMÍLIAS
POPULARES:
O caso de Bocaina, Ouro Preto-MG
JULIANA DE MATOS XAVIER
MARIANA
2016
JULIANA DE MATOS XAVIER
OS ESFORÇOS FAMILIARES E AS PRÁTICAS EDUCATIVAS DE FAMÍLIAS
POPULARES:
O caso de Bocaina, Ouro Preto-MG
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em
Educação – Mestrado da Universidade Federal de Ouro Preto
como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em
Educação.
Linha de pesquisa: Desigualdades, diversidade, diferenças e
práticas educativas inclusivas
Orientação: Profa. Dr
a. Rosa Maria da Exaltação Coutrim
Coorientador: Joel Windle
MARIANA
2016
Dedico esta dissertação à Professora Doutora Rosa da Exaltação Coutrim, que, com sua
delicadeza, me incentivou por todo o tempo e permitiu, através de seus ensinamentos, que eu
chegasse até aqui. À minha Grandiosa Mãe, Diva Xavier de Matos, pelo amor incondicional e
apoio durante todo o meu percurso. Ao meu querido amor, Bruno César Dinali, pela amizade,
ensinamentos, paciência e carinho. À minha sogra, Rosa Dinali, por compartilhar
experiências, teorias e ensinamentos. À direção da escola pesquisada, pela disponibilidade,
confiança e acessibilidade. Aos queridos alunos moradores da localidade de Bocaina, em
especial suas mães e familiares, por terem me recebido tão bem em suas casas e me confiado
as suas histórias de vida
e, acima de tudo, ao meu poderoso e bom Deus!
AGRADECIMENTOS
Agradeço aos gestores da escola pesquisada, pelo apoio, disponibilidade e confiança.
Aos familiares dos jovens moradores de Bocaina (Ouro Preto-MG), pela recepção, confiança e
ensinamentos.
Aos alunos dos 1º anos, por serem verdadeiros e autênticos em seus relatos.
À minha querida orientadora, Profa. Dr
a. Rosa da Exaltação Coutrim, pelo carinho
especial, amizade, paciência e dedicação.
Aos professores, em especial à Profa. Dr
a. Marlice de Oliveira e Nogueira, por estar
sempre disponível nos momentos de dúvidas e desesperos.
Às minhas irmãs orientandas, em especial à Lucinéia, sempre amiga, meiga e presente,
sua delicadeza me tranquilizou por todo o tempo.
À revisora de redação, Elodia Honse Lebourg, pelo carinho e incentivo nos momentos
em que quase desisti.
Ao meu esposo, por abrir mão de tantos momentos sociais para que eu não perdesse o
foco de minha pesquisa. Pelas noites me ensinando a fazer gráficos e por sempre se sentar ao
meu lado quando estou estudando, mesmo que seja para fazer outras coisas. Por ser paciente e
sempre me esperar quando vou aos congressos.
À minha mãe, por estar presente por todo o tempo, por entender que, muitas vezes, me
ausentei de seus braços para me focar nos estudos. Por saber que meus momentos de estresse
são passageiros e por perdoá-los sempre.
Aos familiares, irmãos, cunhadas e sobrinhos, por entenderem a minha ausência.
Aos amigos, por alegrarem os meus dias e sempre me fazerem sentir bem, por me
mostrarem um sorriso a cada encontro, pelo abraço de saudade e pelas palavras que sempre
consolam, pelo “até logo” com a certeza de que sempre estaremos juntos.
Aos meus colegas de trabalho, pelas trocas de turnos, amizade e lealdade.
Ao meu Deus, por estar sempre presente em minha vida e por, a cada dia, me mostrar o
quanto posso ser capaz!
“Tenho a impressão de ter sido uma criança brincando à beira-mar, divertindo-me em descobrir
uma pedrinha mais lisa ou uma concha mais bonita que as outras, enquanto o imenso oceano da
verdade continua misterioso diante de meus olhos”.
Isaac Newton
RESUMO
Esse estudo teve como proposta investigar como os pais moradores da Bocaina, uma pequena
localidade da cidade de Ouro Preto-MG, desenvolvem suas práticas de apoio familiar aos filhos
em situação de mudança de espaço escolar ao ingressarem em uma escola pública localizada
em outro distrito. A pesquisa seguiu o aporte analítico da Sociologia da Educação com
aproximação da Sociologia da Família. Dentre o referencial teórico, destacam-se os
autores Lahire (1994;1997) e Thin (1998; 2006; 2010), e brasileiros, como Portes (1998),
D’Ávila (1998), Viana (1998), Nogueira et al. (2011), Nogueira e Nogueira (2007), Nogueira
(1998; 2004). Trata-se de uma investigação de caráter qualitativo e quantitativo e para a coleta
de dados, foram aplicados 134 questionários a todas as turmas do turno matutino, que no
momento do trabalho de campo cursavam o 1º ano do Ensino Médio da escola selecionada. A
partir da análise dos questionários foram escolhidas cinco famílias de estudantes que vivem em
Bocaina e realizadas entrevistas semiestruturadas com os responsáveis por estes jovens, a fim
de analisar através do perfil de configuração e histórias de vida, as práticas educativas
desenvolvidas por elas. As categorias de análise foram estruturadas de acordo com os eixos
temáticos: Estratégias familiares no processo de escolarização dos filhos, a importância da
escola para a família e representação do local de moradia para as famílias. Os principais
resultados demonstram que as famílias pesquisadas possuem baixo capital escolar e econômico
e as profissões dos chefes familiares se caracterizaram por ocupações de pouco prestigio e
remuneração. Também foi possível identificar que, embora tenham pouca escolaridade, existe
um forte desejo e mobilização das famílias para que os jovens alcancem a longevidade escolar.
Em todos os depoimentos observou-se que os jovens vivenciaram alguma ruptura familiar, seja
através de casos de viuvez, separação ou reconstituição de famílias, ou ainda, casos de doenças
graves. Foi constatado também, que os pais têm uma relação de afetividade com o local de
moradia, embora reconheçam que a distância dos centros urbanos dificulta a socialização e o
processo de escolarização dos jovens. Espera-se contribuir, com esse estudo, para a
compreensão das práticas familiares que propiciam a longevidade escolar das camadas
populares, de modo a ampliar os conhecimentos e a literatura sobre a temática dentro da
perspectiva da Sociologia da Educação e da Sociologia da Família.
Palavras-chave: Família-escola; Práticas educativas familiares; Camadas populares.
ABSTRACT
This study aimed to investigate howthose resident parents of a small town in the city of Ouro
Preto develop as a manner of family support practice to their children in school changing
situation as the children join a public school located in another district. The research followed
the analytical contribution of Education Sociology approaching Family Sociology. Among the
theoretical framework, we highlight the authors, Lahire (1994; 1997), Thin (1998; 2006; 2010),
and Brazilians such as Portes (1998), D'Ávila (1998), Viana (1998), Nogueira et al . (2011),
Nogueira and Nogueira (2007), Nogueira (1998, 2004). This study is a qualitative research, and
for data collection were applied 134 questionnaires to all classes of the morning shift, which at
the time of the field work, were enrolled in 1st year of the selected high school. From the
analysis of the questionnaires, five families of students living in Bocaina were chosen, and
semi-structured interviews were conducted with those responsible for the children in order to
look through the profile configuration and life stories and school practices. The analysis
categories were structured according to the themes: "family strategies in the children learning
process ", "the importance of school for the family", and "the importance of the place of
residence to the family". The main results show that the surveyed families have low educational
and economic capital from their ascendants, and the occupations of the family heads were
characterized as occupations of little prestige and remuneration. It was also possible to identify
that although the school base is low, there is a strong desire and family mobilization so that the
chindren reach school longevity. In all analyzed school stories, young people experienced some
kind of family breakdown, either through cases of widowhood, separation or family
reconstitution, and even cases of serious diseases. It has also been found that the change in
school environment for these youngsters was a remarkable transition in their lives, because at
this stage they initiated a new network of relationships in an unknown space, which required a
redistribution of schedule and greater attention from their parents. This study's expectation is to
contribute to the understanding of the family practices that promote school longevity of the
popular layers of society, in order to expand the knowledge and literature on the subject within
the perspective of Education Sociology and Family Sociology.
Keywords: Family-school; Family educational practices; popular layers.
LISTA DE SIGLAS
IBGE: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IVF: Índice de Vulnerabilidade das Famílias
SIMADE: Sistema Mineiro de Administração Escolar
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 – Número de jovens por local de residência que atendem aos critérios de seleção para os
familiares participarem das entrevistas .................................................................................................40
Gráfico 2 – Número de irmãos mencionados pelos jovens estudantes do 1º ano do Ensino Médio em
uma escola pública de Cachoeira do Campo (2015) .............................................................................44
Gráfico 3 – Nível de escolaridade alcançado pelo pai, de acordo com relatos ......................................45
Gráfico 4 – Nível de escolaridade alcançado pela mãe, de acordo com relatos .....................................46
Gráfico 5 – Renda familiar média mencionada pelos jovens estudantes do Ensino Médio de uma escola
pública de Cachoeira do Campo (2015) ...............................................................................................47
Gráfico 6 – Disponibilidade de acesso à informação na residência, segundo relatos .............................49
Gráfico 7 – Local de residência (distrito/localidade) dos jovens estudantes do 1º ano do Ensino Médio
na escola de Cachoeira do Campo investigada (2015) ..........................................................................52
Gráfico 8 – Acesso à informação na residência dos jovens estudantes do ............................................54
Gráfico 9 – Locais de lazer mais mencionados pelos jovens que vivem longe da escola e cursam o
Ensino Médio em uma escola de Cachoeira do Campo (2015) .............................................................55
Gráfico 10 – Tempo médio em que os jovens estudantes do Ensino Médio de uma escola de Cachoeira
do Campo residem no atual local de moradia (2015) ............................................................................57
Gráfico 11 – Meios de transportes utilizados para o deslocamento dos jovens que estudam em uma
escola em Cachoeira do Campo até suas residências (distritos e localidades) (2015).............................58
Gráfico 12 – Proximidade entre a residência e escola, de acordo com a percepção...............................59
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Mapa político do município de Ouro Preto e seus distritos com as relações de
distância entre os distritos e da sede ....................................................................................... 33
Figura 2 - Características gerais das famílias entrevistadas de Bocaina ................................................61
LISTA DE TABELA
Tabela 1 – Relação da população do município de Ouro Preto e distritos/ localidades
envolvidos na pesquisa com famílias de Bocaina .................................................................... 35
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .................................................................................................................... 15
1 FAMÍLIAS POPULARES E A ESCOLA .................................................................. 20
1.1 Breve histórico sobre a relação família-escola no campo da Educação........................... 20
1.2 Mudanças das configurações da relação família-escola .................................................. 24
1.3 Entendendo a importância das práticas educativas familiares......................................... 28
2 BOCAINA, QUE LUGAR É ESSE?................................................................................. 32
2.1. Os distritos, a infraestrutura e a (não) presença do poder público ..................................... 36
2.2 Percursos metodológicos .................................................................................................. 38
2.2.1 O perfil geral dos jovens que estudam no 1º ano em Cachoeira do Campo ........... 43
2.2.2 O espaço em que vivem os sujeitos da pesquisa .................................................... 48
2.2.3 O perfil dos 39 jovens que vivem em territórios afastados da escola ..................... 51
3 MORANDO NO INTERIOR: REFLEXÕES SOBRE A VIDA DOS JOVENS
ESTUDANTES DE BOCAINA ........................................................................................... 60
3.1 A visão dos moradores de bocaina: quem somos nós?....................................................... 61
3.1.1 Entrevista da Família 1: Iraci, a avó da jovem Raiara.......................................... 62
3.1.2 Entrevista da Família 2: Rosana, mãe de Poliane, cunhada de Raiara ................. 66
3.1.3 Entrevista da Família 3: Mariana, a irmã mais velha ........................................... 69
3.1.4 Entrevista da Família 4: Ana, a mãe protetora de Raissa e Renato ....................... 70
3.1.5 Entrevista da Família 5: Geralda, o trauma de infância ....................................... 72
4 ANÁLISE DOS DADOS: A mobilização familiar ..................................................... 75
4.1 Esforços familiares no processo de escolarização dos filhos .......................................... 76
4.2 A importância da escola para as famílias de Bocaina ..................................................... 84
4.3 A representação do local de moradia para as famílias de Bocaina .................................. 90
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................... 93
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................ 97
APÊNDICES ...................................................................................................................... 103
15
INTRODUÇÃO
Ao longo dos anos 1980 e 1990, houve um grande processo de reorientação no campo
da Sociologia da Educação, com a emergência de novas formas de abordagem na discussão das
relações entre a família e a escola. Esse processo foi caracterizado por um deslocamento do
olhar sociológico, que deixou de focar as macroestruturas, nas quais a classe social
transformava a família numa mera cadeia de transmissão, para se voltar para novos enfoques
nas pequenas unidades de análises, como as práticas pedagógicas cotidianas e esforços
individuais familiares (NOGUEIRA, 1998).
Foi nesse período que a Sociologia da Educação se ocupou mais intensamente de
pesquisas sobre a trajetória escolar de indivíduos e sobre os esforços realizados pelas famílias
no decorrer da escolarização. Assim, a posição social dos pais e a performance escolar dos
filhos deixaram de ser o objeto principal das pesquisas e deram lugar também para o desejo dos
pesquisadores de conhecer os processos e as dinâmicas educativas intrafamiliares, com novos
olhares e instrumentos de pesquisas, como a abordagem antropológica, que utiliza os estudos
etnográficos, a observação participante, e os estudos históricos realizados através da historia de
vida familiar e de biografias escolares (NOGUEIRA, 1998).
Tais mudanças aproximaram a Sociologia da Educação e a Sociologia da Família. Esse
diálogo trouxe significativos avanços para o campo da Educação, através do surgimento de
novas produções originadas do pensamento de Bourdieu, como as de Singly (1987; 1993;
1996), Montadon (1987), Lahire (1997; 2008), Portes (1997; 1998; 2006), Nogueira e Nogueira
(2007), Cunha (2007), Setton (2005), Viana (2003) e Nogueira et al. (2011), que tratam das
desigualdades escolares e contribuem para novas análises sobre a escola, a família e a
comunidade.
Embora os elos entre a família e a escola sempre tenham sido uma preocupação para os
sociólogos da Educação, houve uma transição da sociologia das desigualdades para uma
sociologia que se interessa pelas práticas familiares, como uma forma de compreender como
são criados e reproduzidos os padrões educacionais no interior das famílias. Para isso, foi
preciso levar em consideração as modificações vividas pelas famílias contemporâneas e pela
escola, decorrentes das transformações políticas e sociais, como o crescimento populacional
acelerado, a concentração de renda e empobrecimento, a feminização do mercado de trabalho e
o desenvolvimento de novas tecnologias, que se refletem nas configurações familiares e nas
16
relações entre pais e filhos intermediadas por outras instituições, como a escola, por exemplo,
seja no meio rural, seja no meio urbano.
Para as famílias do meio rural, a escola é um dos principais instrumentos de preparação
para a ida à cidade e ao trabalho urbano, e as suas articulações no mundo social acontecem
também de acordo com os bens materiais e sociais familiares, que favorecem o acesso aos
conteúdos e, consequentemente, aos outros capitais, como o capital social1 e o escolar
(RANGEL; CARMO, 2013). Segundo Portes (2006), os pesquisadores devem compreender as
famílias rurais para além de uma oposição às famílias urbanas, levando em consideração os
movimentos de expansão, processos culturais, políticos e tecnológicos que vêm se instalando
no Brasil. O autor também destaca que é preciso considerar, nessas famílias, as suas
simbolizações, formas de vida e as possibilidades do contato com a televisão, parabólica, rádio,
telefone celular e internet, tendo em vista que o meio em que as famílias vivem também pode
interferir em suas dinâmicas. Hoje, as fronteiras entre o urbano e rural não são tão demarcadas,
pois a melhoria da disposição dos recursos, como transporte, possibilita a circulação dos
sujeitos entre o rural e o urbano, completa Portes (2006).
Esta pesquisa se propõe a conhecer melhor a prática de escolarização de famílias
populares que vivem em uma localidade de Ouro Preto-MG, denominada Bocaina, no qual os
estudantes, assim como os de outras localidades da região de Ouro Preto, são levados a se
deslocar para um distrito maior, Cachoeira do Campo, para cursar o Ensino Médio. Assim,
inspirados nos estudos de Bourdieu e dos outros autores mencionados anteriormente,
procuramos investigar as relações sociais que são tecidas entre os diferentes campos que
compõem o mundo social, em específico no interior das famílias moradoras do distrito
selecionado.
Vale ressaltar que não se propõe, neste estudo, demonstrar as diferenças entre o meio
rural do urbano. Embora a localidade de Bocaina tenha fortes traços rurais, a mesma possui
elementos urbanos, como, por exemplo, acesso à informação. Em relação à sociabilidade, no
entanto, muitos moradores saem pouco da localidade e constroem sua rede de relações
basicamente no local onde moram.
Tendo em vista a complexidade que compõe a vida social, seja em áreas urbanas ou
rurais, e as mudanças do contexto familiar e escolar ao longo dos anos, nossa pesquisa tem
como principal objetivo investigar quais são os esforços familiares adotados pelas famílias de
1 Segundo Bourdieu (1998), o capital social pode ser entendido como um conjunto de relações duradouras e úteis
estabelecidas pelos indivíduos, no sentido de garantir ganhos materiais e simbólicos. Tais relações podem ser a
curto ou longo prazo e se relacionam, por exemplo, com os tipos de interações que os sujeitos estabelecem com
determinados indivíduos no trabalho, na vizinhança, na família, amigos, dentre outros.
17
Bocaina para manter seus filhos na escola, mesmo diante de tantas dificuldades, como a
distância da escola e o acesso restrito a bens públicos, como unidades de saúde, escolas e
bibliotecas. Por sua vez, com os objetivos específicos, espera-se conhecer qual a relevância da
escola para os pais que precisam matricular seus filhos em outro distrito e, também, investigar
o perfil das famílias pesquisadas e dos jovens que estudam no 1º ano do Ensino Médio na
escola selecionada.
Com objetivo de responder à questão principal desta pesquisa, procuramos compreender
quais esforços são realizados pelas famílias que vivem distantes da escola para manter seus
filhos estudando até a conclusão do Ensino Médio.
Trata-se de um estudo original, pois discute o processo de escolarização de jovens em
um espaço distinto das grandes cidades, que se concentra em um espaço rural com fortes
ligações com o espaço urbano. Além disso, a pesquisa contribui para a Sociologia da Educação,
ao auxiliar na compreensão da reprodução da desigualdade social, um fenômeno mundial, e das
características da educação familiar e escolar de jovens de camadas populares moradores da
Região dos Inconfidentes, em específico de Bocaina, bem como das dificuldades vivenciadas
por essas famílias no processo de transição para o Ensino Médio.
Embora existam inúmeros estudos sobre a relação família e escola, estes ainda são raros
na região de Ouro Preto-MG. Sabemos que as duas instituições, família e escola, estão sujeitas
a conflitos de diferentes ordens, principalmente em bairros ou localidades afastadas do centro
urbano, que são espaços marcados, muitas vezes, pelo isolamento espacial e tecnológico, pela
pobreza, pela falta de saneamento básico e mobilidade urbana.
Minha relação com o objeto de pesquisa surgiu a partir da minha vivência no distrito de
Cachoeira do Campo, quando atuei como enfermeira na Unidade de Pronto Atendimento e
professora na escola selecionada para este estudo, em anos anteriores à pesquisa, pude observar
que os moradores de distritos afastados que recorrem a estas unidades enfrentam constantes
dificuldades para se manter, principalmente na escola. Tais obstáculos estão relacionados, com
frequência, a problemas de acesso, mobilidade, horários limitados de ônibus, ausência de meios
de comunicação, como internet e telefone, e pouco contato com outras realidades, a não ser
com o próprio local de moradia e vizinhança.
Quanto à metodologia, esta pesquisa é de caráter qualitativo, pois possibilita buscar
significados, motivações, valores e crenças na procura de respostas para questões particulares
(BONI, QUARESMA; 2005), embora também tenha traços da pesquisa quantitativa ao se
utilizar de questionários. Para a sua execução, foi elaborado o desenho metodológico, que
consistiu, primeiramente, em conhecer a região estudada, no que diz respeito à localização
18
geográfica da escola e ao local de moradia das famílias. Essa pesquisa inicial foi feita por meio
de documentos da prefeitura sobre os distritos de Ouro Preto e o transporte escolar. Tal
mapeamento possibilitou caracterizar o campo de pesquisa e nos permitiu apresentar os
caminhos percorridos no processo de seleção, coleta e análise dos dados. Acreditamos que
conhecer o campo da pesquisa e aproximar-se dessas famílias nos permitiria compreender as
especificidades vividas por elas, bem como os seus modos de ser e estar no mundo.
A coleta de dados baseou-se em quatro momentos: a) pesquisa bibliográfica e
documental; b) aplicação de questionários com os jovens; c) observação do espaço de moradia
dos jovens; e d) coleta de dados através de entrevistas semi-estruturadas com os pais, conforme
detalhado no Capítulo 2.
Primeiramente, como ferramenta metodológica para a compreensão do perfil dos jovens
e suas famílias, foi elaborado um questionário composto por 23 questões semi-estruturadas e
aplicado aos 134 alunos na faixa etária de 15-18 anos, matriculados no 1º ano do Ensino Médio
em uma escola pública de Cachoeira do Campo, do turno da manhã e que estavam presentes em
sala de aula durante a segunda semana de junho de 2015. Os alunos do turno da noite (apenas
nove) não participaram da pesquisa devido aos compromissos da turma com a realização de
provas.
Este questionário permitiu verificar que existem 39 jovens que vivem em distritos e
localidades rurais mais afastadas, distantes, pelo menos, sete quilômetros, da escola e que
utilizam o ônibus escolar ou vans para ir estudar. Esse parâmetro de distante foi estabelecido
através da percepção dos jovens. Entre esses 39 jovens, foram selecionadas cinco famílias da
localidade de Bocaina para um estudo mais aprofundado, por meio de entrevistas e de uma
observação mais detalhada.
Para melhor apresentação da discussão sobre a realidade investigada, esta dissertação
foi estruturada em quatro capítulos, além da introdução. Optou-se por fazer dessa forma, para
que, primeiramente, seja possível situar o leitor em relação à localização geográfica em que se
insere a escola e o local de moradia das famílias, para, posteriormente, discutirmos as
representações que estas famílias têm do local de moradia e quais são as práticas empreendidas
pelas mesmas no processo de escolarização de seus filhos.
No Capítulo 1, o leitor encontrará um breve levantamento histórico sobre as famílias
populares e a escola no campo da educação. Este capítulo tem o objetivo de apresentar as
mudanças das configurações família-escola ao longo dos anos e procurou possibilitar a
compreensão da importância das práticas familiares no processo de escolarização ou mesmo na
formação dos sujeitos.
19
O Capítulo 2 trata da descrição e apresentação do campo de pesquisa e dos caminhos
metodológicos percorridos para a elaboração da dissertação. Procuramos, neste capítulo,
descrever onde vivem os sujeitos da pesquisa, conhecer qual é o perfil dos jovens que estudam
na escola selecionada, principalmente daqueles que vivem em localidades ou distritos afastados
e, por fim, apresentar a infraestrutura disponível para essas famílias.
Com o objetivo de melhor compreender os esforços familiares de apoio aos jovens
durante a transição para o Ensino Médio, o Capítulo 3 vem apresentar o perfil dos jovens do
distrito de Bocaina e traz os resultados dos questionários respondidos por eles. Já no capítulo 4,
a proposta é trazer os resultados das entrevistas com os responsáveis pelos jovens e possibilitar
ao leitor, através da análise dos dados a compreender as práticas de apoio familiar dessas
famílias moradoras de Bocaina, a fim de apresentar a relevância dos estudos para os pais
moradores dessa localidade durante essa importante etapa de transição para os jovens.
20
1 FAMÍLIAS POPULARES E A ESCOLA
Este capítulo tem como objetivo apresentar dados teóricos sobre os temas norteadores
desta pesquisa, que são as práticas educativas familiares e as camadas populares durante o
processo de escolarização de jovens do Ensino Médio.
Inicia-se, na primeira seção, com um breve histórico sobre a relação entre família e
escola no campo da Educação, seguido da apresentação de teorias de alguns autores que
contribuíram para o tema ao longo dos anos. Assim, abordamos a importância da educação
escolar, familiar e das gerações transmitirem suas heranças, através da influência
intergeracional no seio familiar, o que consideramos importante para o clima educativo e a
transmissão de um capital escolar.
Na seção 1.2, apresentaremos as principais mudanças e evoluções ocorridas nas
configurações familiares e os impactos nos desdobramentos do percurso social e escolar dos
jovens estudantes, pois estas duas instituições, família e escola, são fundamentais para o
processo de constituições de identidades.
Finalizaremos o capítulo com a seção 1.3, cujo objetivo é nos permitir compreender a
importância das práticas educativas familiares, principalmente nas classes populares, que são o
foco de nossa pesquisa, a fim de nos preparar para a análise dos próximos capítulos, nos quais
apresentamos o perfil dos jovens pesquisados e de suas famílias e as principais práticas de
escolarizações empreendidas por elas para garantir o sucesso escolar desses jovens.
1.1 Breve histórico sobre a relação família-escola no campo da Educação
A temática família-escola vem sendo discutida há, pelo menos, cinquenta anos, mas, nas
últimas décadas, inúmeras pesquisas no campo das Ciências Sociais e da Educação vêm sendo
produzidas, resultando em uma ampla literatura que, hoje, demonstra as correlações entre a
origem social dos alunos com o sucesso e o fracasso escolar.
A escola e a família possuem realidades distintas, embora essas duas instituições se
encontrem intrinsecamente ligadas há séculos em função da necessidade de cada geração
21
transmitir aos seus sucessores o que é considerado fundamental. Esta também é uma forma de
garantir a preservação e a continuidade da sua herança (TOMIZAKI, 2010).
De acordo com Thin (2006), a forma de educação escolar foi elaborada a partir dos
séculos XVI e XVII, na França, e, hoje, passou por muitas transformações. No século XVII, os
valores, conhecimentos e práticas já eram passados no interior da família através dos membros
mais velhos, de forma que se garantiria a sobrevivência e a perpetuação dos costumes no grupo.
Ainda naquela época, surgiu a necessidade desse método de educação familiar se associar com
a educação escolar (CAMPOS, 2010). A educação propriamente familiar assegura a
transmissão de um patrimônio simbólico, ao mesmo tempo em que regula as relações entre os
membros do grupo familiar (GHEORGHIU et al., 2008).
A transmissão intergeracional vem ocorrendo desde a pré-História, porém os primeiros
estudos nas Ciências Humanas sobre o tema ocorreram nos séculos XIX e XX (TOMIZAKI,
2010). Nesta época, os filósofos e homens de religião cristã no Brasil e no mundo já falavam
sobre a Educação e as práticas educativas intrafamiliares. A partir do século XX, inseriram-se,
nesse campo, as discussões teóricas promovidas pelos psicólogos, antropólogos e sociólogos,
que passaram a investir maciçamente nos estudos sobre a natureza da educação parental e,
principalmente, sobre as interações entre a família e a escola, por entenderem que estas são
fundamentais para compreender o processo de socialização de crianças e jovens de diferentes
camadas sociais (MONTANDON, 2005; CAMPOS 2011).
Ainda no século XX, o sociólogo francês Pierre Bourdieu trouxe inúmeras
contribuições para as pesquisas do campo da Educação. Através de sua análise de como os
indivíduos incorporam a estrutura social, legitimam e a reproduzem, e os conceitos de campo,
habitus e capitais, Bourdieu possibilitou a compreensão de fenômenos sociológicos e o
entendimento de alguns episódios do meio escolar e familiar vivenciado pelos jovens.
Para Bourdieu (1998b), o processo educacional possui múltiplas interfaces que
necessitam da interação entre diferentes capitais, como o capital econômico (riqueza material e
bens e serviços a que ele dá acesso), o capital social (permeia as relações sociais estabelecidas
pela família), o capital cultural institucionalizado (formado por títulos escolares), e o capital
cultural em seu estado incorporado (elemento da herança familiar), sendo este último o
elemento central e de maior impacto para a definição do destino escolar.
O capital cultural se configura, no ambiente escolar, como um elemento de herança
familiar com grande potencial para a definição do destino escolar de alunos de diferentes
camadas sociais, uma vez que o mesmo possibilita a interação social e a decifração dos códigos
impostos pela escola e sociedade contemporânea (CUNHA, 2007).
22
Ainda sobre o capital cultural, Cunha (2007) afirma que os espaços sociais são
entendidos como espaços de luta em caráter de dominação e relações de poder de classes, por
isso, o conceito de capital cultural não pode ser dissociado dos efeitos da dominação. O capital
cultural presente nas famílias de camadas médias altas e altas, então, se destaca como um
importante instrumento de legitimação de alguns grupos sobre os outros.
Nos espaços sociais onde se inserem as instituições família e escola, encontramos pessoas
com diferentes habitus. Esses habitus estão enraizados nas histórias coletivas e sociais de
grupos ou nas classes a que os indivíduos pertencem. Sendo assim, isso nos remete à ideia de
que todas as pessoas que vivem em um determinado grupo possuem disposições que permitem
pensar, sentir e agir de forma semelhante (habitus semelhantes). Através do habitus, o
indivíduo possui a capacidade de progredir socialmente, ou produzir disposições para a
manutenção da posição social ou ainda ter a ascensão social, através da ação ou práticas
semelhantes aos de seu grupo, que de acordo com Bourdieu (2006), acontece como um sistema
de disposição para a ação, porém de forma inconsciente.
O capital escolar e o clima educativo no qual as crianças e os jovens estão expostos no
domicílio, por meio da influência dos pais e demais familiares, oferecem maiores ou menores
recursos educativos e podem potencializar o posicionamento desses jovens na estrutura de
oportunidades educacionais (CORRÊA; RODRIGUES, 2010). Sendo assim, algumas famílias
são mais ou menos favorecidas do que as outras, tanto no contexto escolar quanto no mercado
de trabalho e, consequentemente, a oportunidade de aprendizagem de seus filhos é
experimentada diferentemente em casa, na escola e na sociedade.
De acordo com Thin (1998), nas instituições socializadoras família e escola existe uma
confrontação desigual entre os modos de socialização, ou seja, entre o modo escolar e
dominante e o modo popular e dominado. O autor evidencia que, para se conhecer as relações
entre as famílias populares e a escola, deve-se considerar as diferenças de capitais, associando-
as às posições sociais. Muitas vezes, nas famílias populares, percebemos que os pais possuem
baixos recursos culturais e escolares que podem influenciar no processo de escolarização dos
filhos.
Partindo do pensamento de Bourdieu, um autor que nos ajuda a compreender a
reprodução da desigualdade pela escola, ao analisar as diferenças entre classe e escola com a
sua teoria de capital cultural, já nas últimas décadas, diversos autores se debruçaram nos
estudos sobre o tema da desigualdade escolar e da relação família e escola, como é o caso de
autores franceses, como Lahire (1994; 1997) e Thin (1998; 2006; 2010), e brasileiros, como
23
Portes (1998), D’Ávila (1998), Viana (1998), Nogueira et al. (2011), Nogueira e Nogueira
(2007), Nogueira (1998; 2004) e Piotto (2014).
No caso das famílias de camadas populares brasileiras, Portes (2000) enfatiza que as
práticas educativas ocorrem em um tempo próprio, sendo que, frequentemente, esses trabalhos
são estabelecidos pelas condições materiais das famílias (capital econômico) e pela constituição
histórica dos membros (capital cultural), além de serem marcados pela falta de conhecimento
do sistema escolar e pelo baixo capital escolar dos membros familiares. O autor também afirma
que o trabalho escolar é um importante fator de interação entre família-escola, mesmo quando a
autonomia dos jovens e o empenho individual possa negar o trabalho escolar da família. Nesse
sentido, Portes (2011, p. 63) define o trabalho escolar dos pais como:
As ações desenvolvidas e organizadas pelas famílias no sentido de assegurar a entrada
e permanência dos seus filhos na escola, podendo, então, variar de família para família
de acordo com os capitais existentes no seu interior e as circunstâncias atuantes na
rede de seus entrelaçamentos concretos.
Ou seja, é justamente nos enfrentamentos e questionamentos que surgem no cotidiano
dessas famílias que o trabalho escolar dos pais se encontra presente.
Portes et al. (2012) constatou, através de vários estudos com diferentes perfis de
famílias, que as práticas intrafamiliares estão relacionadas com um conjunto de circunstâncias
atuantes, como: Condições socioeconômicas da família; níveis de escolarização dos membros
das famílias; relações sociais entre os membros da família e da família com outras pessoas; e o
modo como a família conduz o processo de escolarização dos filhos, sendo essas
representações positivas para uma comunidade ou povoado.
Os espaços formais de educação, como a escola, são fronteiras estabelecidas que podem
incluir ou excluir os jovens. Muitas vezes, eles são recebidos na escola como dotados de uma
educação legítima, sem considerar a realidade vivida na região. Por isso, o território é um
elemento importante na Sociologia da Educação e deve ser considerado ao estudar as famílias
de um determinado espaço, pois possibilita conhecer, para além do lugar, as transformações e
as dificuldades que nele acontecem.
No entanto, Thin (2006) chama a atenção para que as práticas e fazeres dos pais não
sejam desvalorizados em relação à escolarização de seus filhos. Diante da diversidade de
pessoas, culturas e padrões familiares envolvidos no processo educativo, acredita-se que uma
maior participação da família na vida escolar dos filhos possa melhorar o desempenho dos
24
jovens e, consequentemente, influenciar na longevidade escolar através da transmissão de
capitais, como o cultural e o escolar (LAHIRE, 1997; BOURDIEU, 2006).
1.2 Mudanças das configurações da relação família-escola
No século XIX, surgiu a necessidade da implantação de um novo modelo educativo
baseado nas especificidades da infância e no conhecimento científico. Posteriormente, em
meados das décadas de 1920 e 1930, o movimento da chamada Pedagogia da Escola Nova
entrou em cena para redefinir as práticas educativas das crianças. Este movimento foi apoiado
pela Associação Brasileira de Educação (ABE), no Rio de Janeiro e defendia melhorias no
campo da Educação (CAMPOS, 2010; SAVIANI, 2014). Nesse momento, surgiram muitos
questionamentos familiares, pois os pais não compreendiam as novas mudanças impostas e os
novos métodos de ensino.
Outros movimentos estiveram presentes no campo da Educação do país, como o
Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, de 1932, e o Movimento Sanitarista, que propunha
a melhoria nos hábitos higiênicos da população, uma vez que eram elevados os índices de
mortalidade infantil, destacando, além deles, a oferta de um curso ministrado pela Seção de
Cooperação da Família, que abordavam temas para conscientizar as mulheres das famílias
sobre como criar crianças entre 0-14 anos. Esse curso foi chamado de Curso Mãezinhas
(CAMPOS, 2010).
Mediante a massificação da educação pública e dos programas de combate ao
analfabetismo nas décadas de 1960 e 1970, o tema do fracasso escolar tornou-se uma das
preocupações centrais de educadores e do Estado (LORDÊLO et al., 2009).
Nas Leis de Diretrizes e Bases Educacionais da Educação Nacional, de 1996, já se
apontava para a importância da articulação entre a família, comunidade e Estado no processo
de integração entre sociedade e escola, além das responsabilidades do Estado para o
fortalecimento dos vínculos com a família para o desenvolvimento da sociedade. Mas apenas
agora, no início do século XXI, vem sendo, de fato, reconhecido, entre essas duas instituições,
família e escola, a necessidade de cooperação para o desenvolvimento educacional do país. Até
os dias de hoje, embora exista um discurso de que a família e a escola necessitem caminhar
juntas, estas parecem andar para lados opostos (FAIDLEY; MUSSER, 1991 apud MEGUIRE;
BALL, 2007).
25
Sabe-se, contudo, que a LDB de 1996 não foi a única medida dos anos 1990 voltada
para o bem-estar das crianças e dos jovens. A Lei nº. 8.069/1990, conhecida como o Estatuto da
Criança e do Adolescente, garante a proteção integral dessa porção da população brasileira.
Mais uma vez, nesta lei, é reforçado o dever da família, da comunidade, da sociedade em geral
e do poder público de assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à
vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à
dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além do direito à
matrícula e acesso à educação (BRASIL, 1990).
Assim, com o crescimento acelerado do processo de urbanização, da crescente
necessidade de proteção e educação das gerações mais novas e da formação para o mercado de
trabalho cada vez mais exigente, a legislação brasileira se volta para as reformas no sistema de
proteção e de ensino, como a elaboração do Plano Nacional de Educação na tentativa de
reestruturar a oferta educacional do Brasil (LORDÊLO et al.; 2009).
As transformações recentes ocorridas no mercado de trabalho e na sociedade como um
todo influenciaram diretamente a organização familiar. O conceito de família e de composição
familiar sofreram algumas mudanças em relação àquela considerada, até então, como padrão.
Ao longo das últimas décadas, houve muitas mudanças no interior das famílias ocidentais,
influenciadas pelo declínio do casamento, pela baixa fecundidade (centrada na família nuclear)
e pela aceitação do divórcio (SINGLY, 2007). Tais mudanças causaram efeitos importantes
para a sociedade, principalmente na família nuclear, através de um intenso controle de
natalidade, da inserção da mulher no mercado de trabalho e da queda da mortalidade, o que
aumentou a expectativa de vida dos membros familiares (CAMARANO, 2014).
Ainda segundo Camarano (2014), embora pareça que essas mudanças tenham
ocasionado um enfraquecimento da família contemporânea, o que ocorreu foi o surgimento de
novos modelos familiares que, hoje, são caracterizados pela mudança das relações entre sexo e
gerações. As relações passaram a ser menos hierarquizadas entre casais, pais e filhos, as
atividades sexuais deixaram de ser regidas pelo matrimonio e os sujeitos passaram a ter mais
autonomia referente à esfera conjugal, dentre outras transformações.
O modelo familiar, já há algumas décadas, vive transformações graduais, mas
extremamente profundas, dado que a inserção da mulher no mercado de trabalho e o
aumento dos níveis de separação de casais contribuem para a emersão de um novo
padrão de convivência e referência identitárias (SETTON, 2005, p. 5).
Essas mudanças, ocorridas no interior da família, na segunda metade do século XX, de
acordo com Camarano (2014, p.111), ocorreram concomitantemente ao aumento da
26
escolaridade da população brasileira; ao incremento da participação da mulher no mercado de
trabalho; às mudanças nos arranjos familiares, especialmente na nupcialidade e nos contratos
tradicionais de gênero; à redução no número de cuidadores familiares; à diminuição do tempo
passado pelas mulheres na maternidade; à menor duração das uniões conjugais; à redução nos
diferenciais por gênero na vida privada e social; ao incremento da qualidade na criação dos
filhos; ao secularismo; ao aumento do individualismo e do consumismo; às mudanças no perfil
epidemiológico; e ao aumento da preocupação com o meio ambiente e com a finitude dos
recursos naturais.
Nesse período, a entrada da mulher no mercado de trabalho veio a reorganizar o
cotidiano e as configurações familiares. Da mesma forma, o crescimento econômico acelerado
redefiniu o mercado de trabalho, gerando a necessidade da formação de mão de obra
qualificada e uma maior aproximação com o ambiente escolar (SAVIANI, 2014).
Assim, observa-se que, com a introdução de novos costumes e valores, a
internacionalização dos direitos humanos, a globalização e o respeito ao ser humano, impôs-se
o reconhecimento de novas modalidades de família ou arranjos familiares (MALUF, 2010).
Nesses novos arranjos, percebe-se inúmeras variações de composição familiar, como as
mulheres que vivem sozinhas, as viúvas, separadas, as famílias reconstituídas, monoparentais,
uniões consensuais, uniões formais, a homofetividade, dentre outras, respeitando-se as
intrínsecas diferenças que compõem os seres humanos (CAMARANO, 2014).
Complementando o pensamento de Camarano (2014), Maluf (2010) ressalta a
importância das últimas décadas para o reconhecimento legal das novas organizações
familiares. Segundo a autora, embora a constituição básica da família moderna tenha se
baseado no modelo nuclear (marido, esposa, filhos), as transformações ocorridas em seu
interior provocaram deslocamentos dos modelos que se julgavam fixos e contribuíram para
efeitos no campo social da vida e no campo simbólico. Desta forma, através dos princípios
constitucionais e da interferência legislativa, são reconhecidos os direitos familiares a todos os
cidadãos, levando-se em consideração a rica diversidade nessas novas configurações.
Certamente, as mudanças na estrutura familiar influenciam na educação escolar dos
filhos. Montandon (2005), com base em outros autores, demonstra que o número de filhos, a
ordem de nascimento e sexo, ou características, como separações, divórcio, viuvez ou reposição
familiar, podem influenciar nos modos de educação de jovens estudantes, nas suas práticas e
em seu comportamento escolar.
27
Nesse sentido, Lahire (2008, p. 26) aponta para a importância das formas de autoridade
impostas pelos pais (ou pessoas encarregadas da educação das crianças) no desenvolvimento
escolar dos estudantes.
São importantes elementos da composição familiar a moral doméstica e as formas de
autoridade impostas pelos pais, pois as crianças constituem os seus esquemas
comportamentais através das formas que assumem relações de interdependência com
as pessoas que convivem, além de ser na primeira infância a construção da sua
personalidade através das configurações familiares e convívio social.
Sendo assim, acredita-se que através do simbólico da ordem material doméstica a
família consegue organizar uma estrutura que facilita o processo cognitivo e,
consequentemente, a trajetória de escolarização dos filhos. Com base nestas considerações,
Setton (2005) afirma que a existência de uma figura de autoridade no ambiente familiar, seja
materna ou paterna, pode proporcionar um aprendizado familiar através da legitimidade da
autoridade, o que, futuramente, poderá se refletir em uma aceitação das autoridades escolares
pela criança, que será capaz de decifrar os códigos aprendidos no ambiente familiar.
De acordo com Bourdieu (1998, p.48):
É o nível cultural global do grupo familiar que mantém a relação mais estreita com o
êxito escolar da criança. Ainda que o êxito escolar pareça ligado igualmente ao nível
cultural do pai ou da mãe, percebem-se, ainda, variações significativas no êxito da
criança quando os pais são de nível desigual.
Nota-se, nas colocações de Lahire a importância da família no processo de
escolarização dos jovens e de construção de sua personalidade durante a primeira infância,
sobretudo por meio da regulação dos pais. Para o autor, a instituição familiar é responsável pelo
sucesso escolar dos filhos e a interação com as diferentes redes sociais, como a proximidade
com a escola, por exemplo, possibilita aos familiares compreenderem a importância da escola
para a vida dos jovens.
Já nas colocações de Bourdieu, percebemos a valorização da escola como um dos meios
de um sujeito se sobressair em relação aos níveis sociais. A escola é considerada, pelo autor,
como uma das formas da criança obter o capital cultural.
Complementando o pensamento dos autores trazidos nesta seção, Zago (2003) ressalta
que, para compreender o processo educativo na sociedade brasileira contemporânea, é
fundamental considerar as mudanças ocorridas nas esferas pública e privada, com a aceleração
da urbanização e industrialização. Diante de tais transformações no campo econômico, social e
familiar, fica claro que a criança e o jovem devem ser considerados como importantes agentes
28
do desdobramento do seu próprio percurso social, seja na escola, na família ou em qualquer
campo de socialização e interações (ZAGO, 2003).
1.3 Entendendo a importância das práticas educativas familiares
Conforme mencionado anteriormente, a partir principalmente da segunda metade do
século XX, as sociedades ocidentais passaram por constantes transformações em diferentes
campos e setores, com o fenômeno da globalização, as oscilações da economia mundial, a
aceleração nas criações tecnológicas, a diversificação da produção, dentre outras, o que levou a
uma intensa luta pelo poder e por um espaço social consolidado. Assim sendo, quanto mais
industrializado é o país, maior a exigência na formação de jovens para um mercado de trabalho
extremamente seletivo. Nesse contexto, a escola tem ocupado posição cada vez mais
importante na vida das gerações mais novas, porém nem todos conseguem ter um percurso
escolar de sucesso.
A Sociologia da Educação vem discutindo os modos de constituição das desigualdades
educacionais e o peso da vantagem cultural no destino acadêmico. Acredita-se que esforços
familiares, como a ajuda nos deveres de casa, a organização do espaço doméstico e do tempo
aliados à transmissão de capitais familiares e escolares em condições adequadas, podem
influenciar os resultados escolares dos seus descendentes juntamente com um intenso trabalho
de apropriação do herdeiro (NOGUEIRA et al.; 2011).
O capital cultural se configura, no ambiente escolar, como um elemento de herança
familiar com grande potencial para a definição do destino escolar de alunos de diferentes
camadas sociais, visto que possibilita a interação social e a decifração dos códigos impostos
pela escola e sociedade contemporânea (CUNHA, 2007).
Ainda segundo Cunha (2007), em um contexto de desigualdade, as classes populares
desprovidas de capitais necessitam esforçar-se em dobro para ascender a uma cultura e
aperfeiçoar as suas habilidades para, assim, acompanhar os demais alunos que já se
apropriaram dos códigos presentes no seio familiar e valorizados pela escola. Nas classes
favorecidas, o prestígio cultural é muito próximo ao escolar. Devido ao fato destes sujeitos
saberem jogar as “regras do jogo”, os alunos se sobressaem em relação às demais classes,
devido a uma herança cultural legítima transmitida na primeira infância através da família.
29
Nesse sentido, segundo Lahire (1997), as instituições família e escola se destacam como
redes de interdependência estruturadas por formas de relações sociais específicas. De acordo
com o autor, ainda na primeira infância, as crianças assumem seus esquemas comportamentais,
cognitivos e de avaliação de acordo com as relações de interdependência estabelecidas com as
pessoas que os cercam com mais frequência e, normalmente, essas pessoas são as do seio
familiar. No entanto, a tendência dessas crianças não é de reproduzir os comportamentos e as
formas de agir da família, mas, sim, através do convívio familiar, tornarem-se capazes de
encontrar a sua própria modalidade de comportamento.
Sendo assim, para dar conta das desigualdades escolares de crianças de diferentes
camadas sociais, é preciso reconhecer que as práticas de escolarização familiares são
fundamentais para a compreensão do sucesso e da longevidade escolar. Lahire (1997) ressalta
também que, para compreender os resultados e as relações escolares dos jovens, é preciso
reconstruir as redes de interdependência familiares nas quais as crianças constituíram seus
esquemas de julgamentos.
Para Lahire (2008), a moral doméstica e as formas de autoridade exercidas pelos pais
são importantes elementos da composição familiar, pois as crianças constituem os seus
esquemas comportamentais através das relações de interdependências que estabelecem com as
pessoas em que convivem. Nesse contexto, segundo o autor, são importantes elementos da
composição familiar, além da moral doméstica, as formas familiares adotadas na cultura
escrita, as disposições econômicas e também as formas de esforço pedagógico no seio familiar,
pois é na primeira infância que acontece a construção da sua personalidade, através das
configurações familiares e do convívio social.
Com base nas constatações de Lahire (2008) e de outros autores que orientaram esta
dissertação, percebe-se que a organização moral e material da família reflete-se na escolaridade
das crianças e dos jovens, por serem fatores cognitivos indissociáveis. Neste sentido, Setton
(2005) afirma que, através da existência de uma figura de autoridade no ambiente familiar, seja
materna ou paterna, será proporcionado um aprendizado familiar por meio da legitimidade,
que, futuramente, poderá se refletir na aceitação, pela criança, das autoridades escolares
impostas, pois as mesmas já serão capazes de decifrar os códigos aprendidos no ambiente
familiar.
Já Bourdieu (1998) afirma que o aprendizado começa em casa, sendo os costumes, a
cultura e o gosto pelo aprendizado transmitido através da instrução de seus pais, de forma que o
interesse pela cultura será despertado aos poucos e o interesse pelo aprendizado ocorrerá pela
presença da influência de certo capital cultural. É importante mencionar a interdependência das
30
condições sociais em que as famílias se inserem e as formas de relações que as mesmas
estabelecem com a escola, pois tais relações não podem ser vistas de forma dissociada das
condições socioculturais.
Apesar de existirem variações, como as financeiras, escolares e sociais entre as classes
populares, médias e altas, é importante verificar a realidade social em que as mesmas se
encontram e estabelecer estratégias para a continuidade do processo educacional de forma
igual. Então, para que ocorra a transmissão de capitais familiares, deverá haver um processo de
apropriação do herdeiro sem que haja interrupções (NOGUEIRA et al., 2011).
Percebe-se, então, que as práticas familiares de escolarização e a organização familiar
podem levar aos casos de sucesso ou fracasso escolar. Alguns fatores, como a escolha do
ambiente escolar, critérios de escolhas, relações extraescolares e interações culturais, podem
influenciar muito no desenvolvimento escolar dos alunos.
Hoje, verifica-se o aumento da procura pela educação formal e elevação do nível escolar
para responder aos processos de transformações do país e do mercado de trabalho (ZAGO,
2003). Contudo, no cenário educacional, a escola tem sido um dos maiores campos produtores
de desigualdades, visto que os professores reproduzem conceitos “códigos” que não são
entendidos por todos os alunos. Nesta mesma linha de pensamento, Setton (2005) aponta para
os mecanismos perversos presentes na escola, responsáveis pelas desigualdades de estudantes
de diferentes grupos sociais. Apoiando-se, principalmente, na discussão sobre o capital cultural,
Setton (2005) elucida vários fatores que implicam diretamente no desempenho escolar, como o
perfil da família, a formação cultural dos antepassados, o local de residência, a trajetória social
familiar, dentre outros fatores extraescolares, econômicos e culturais associados.
Assim, em um país de grande desigualdade social e escolar, os filhos de famílias de
camadas populares têm chances muito menores dos que os das camadas média e alta de
ingressar na universidade e concluir os estudos. Contudo, isso não significa que não existam
exceções. Viana (2003) assinala, a partir de seus estudos empíricos baseados em Lahire (2008),
que os alunos de camadas sociais populares e médias também podem alcançar o sucesso escolar
e chegar à universidade, mas isso dependerá de algumas condições particulares, como dos
esforços familiares e de fatores cognitivos do aluno progressivamente construídos para isso.
Pode-se considerar, a partir dos estudos de Viana (2003), Lahire (2008), Setton (2005),
Portes (2006) e Lacerda (2006), que a longevidade escolar de camadas sociais desfavorecidas
não só acontece através da influência direta dos pais, mas por um conjunto de interações e
acúmulos de capitais. Este fato se dá devido às formas de aprendizado nem sempre pré-
existentes, mas que podem ser adquiridas por aprendizado precoce na primeira infância
31
(família) ou tardio na escola. Sendo assim, a aquisição de cultura por familiaridade é
considerada como a cultura legítima e, devido a esta distinção provável, alunos que têm contato
com tal cultura apenas na escola têm mais dificuldades em relação aos outros para
decodificarem situações cotidianas (SETTON, 2005).
A desigual distribuição de capitais configura-se na luta pela dominação do poder entre
os sujeitos de diferentes campos, seja na vida cotidiana, social ou escolar. Para compreender as
lutas pela legitimação de diversas classes sociais em termos de práticas sociais e culturais, ao
longo dos anos, inúmeras pesquisas, como as de Nogueira (2005), Coutrim (2007) e Coutrim et
al. (2011), vêm sendo realizadas em relação às influências das gerações precedentes na vida
dos jovens, tanto em suas escolhas no contexto social, quanto escolar e acadêmico.
Assim, cada indivíduo está caracterizado por uma bagagem socialmente herdada através
de componentes externos a ele e que podem ser mediadores do sucesso escolar. A escola traz
mecanismos de legitimação da cultura dominante, como é o caso da avaliação. A avaliação e o
desempenho escolar vão muito além das questões de verificações de aprendizagem. Em outras
palavras, ao avaliar o aluno, a escola também avalia sua família e a cultura trazida por ele, por
meio dos valores morais, sociais e de convívio familiar.
No entanto, quando pensamos em práticas educativas das famílias populares devemos
nos lembrar dos desvios e das diferenças de socialização em função dos pertencimentos, assim
como as trajetórias sociais e tensões vivenciadas por essas famílias. Essas realidades, entre a
lógica escolar e práticas, serão descritas nos próximos capítulos, sobretudo com relação ao
perfil das famílias pesquisadas, sua região de moradia, as redes de relações e as relações de
interdependências que estabelecem com a escola. No Capítulo 2, iniciaremos a discussão acerca
da realidade vivida pelos sujeitos desta pesquisa, a fim de compreendermos as especificidades
de jovens que vivem em regiões afastadas do centro escolar e quais são as práticas educativas
empreendidas sobre eles.
32
2 BOCAINA, QUE LUGAR É ESSE?
Este capítulo possibilitará ao leitor conhecer a localização de Bocaina, local de moradia
dos sujeitos desta pesquisa. Além da Bocaina, apresento os distritos vizinhos, a localização da
escola em que esses jovens estudam, em Cachoeira do Campo, e a cidade de Ouro Preto, que é
o município desses distritos.
O objetivo deste capítulo também é apresentar os percursos metodológicos utilizados
para chegar aos principais sujeitos da pesquisa, traçando o perfil destes jovens e, assim,
demonstrar a realidade em que vivem.
Este capítulo foi dividido em cinco partes. Iniciamos com uma breve apresentação dos
distritos, a infraestrutura e a (não) presença do poder público, pois foi evidenciada a
precariedade das condições de moradia e manutenção do acesso das vias e aos bens públicos.
Em seguida, apresenta-se a metodologia de pesquisa, que visa englobar as três categorias de
análises propostas: a) Esforços familiares no processo de escolarização dos filhos; b) A
importância da escola para a família; e c) A representação do local de moradia. Estes primeiros
dados, conforme mencionado na metodologia, foram coletados através de questionário aplicado
aos jovens que estudam no Ensino Médio em Cachoeira do Campo. Em seguida, apresenta-se
Bocaina, local de moradias das cinco famílias entrevistadas. Depois disso, será apresentada a
realidade dos jovens que estudam no Ensino Médio, em Cachoeira do Campo, incluindo os
jovens que moram neste distrito e aqueles vivem nos distritos vizinhos, e, por fim, o espaço em
que vivem os sujeitos da pesquisa: os jovens que vivem em distritos ou localidades afastados de
Cachoeira do Campo e o perfil destes 39 jovens que responderam os questionários. O perfil das
famílias será apresentado no Capítulo 3.
Para situarmos a localidade de Bocaina, na qual se encontram as famílias pesquisadas,
precisamos compreender as suas dimensões socioespaciais. Para isso, a partir de agora,
apresentaremos brevemente a cidade de Ouro Preto, o distrito de Cachoeira do Campo (local da
escola) e a localidade de Bocaina, que se situa no distrito de Rodrigo Silva.
A proposta é facilitar a compreensão do caráter histórico em que estão envolvidas essas
famílias e, assim, possibilitar ao leitor conhecer melhor as proximidades e distanciamentos
entre a sede, a escola e o local de moradia dos jovens.
Podemos, então, caracterizar o nosso campo da pesquisa conforme demonstrado na
Figura 1:
33
Fonte: Portal de Turismo de Ouro Preto (2014)
Conforme demonstrado na Figura 1, Cachoeira do Campo faz fronteira com vários
distritos. A região em que as famílias estudadas moram subdivide-se em Bocaina de Cima e
Bocaina de Baixo, uma pequena localidade com fortes traços rurais. Como mencionado
anteriormente, a localidade pertence ao distrito de Rodrigo Silva, que também sofre com a
distância do centro urbano, pois, embora a distância em quilômetros não seja muito grande, a
população não possui horários regulares de ônibus durante todo o dia. Cachoeira do Campo,
devido ao crescimento econômico e populacional, se sobressai em relação aos demais distritos
e conta com facilidades para o acesso às escolas e maior oferta de transporte, meios de
comunicação, biblioteca e meios de sociabilidade mais facilitado.
O caso da maioria dos distritos de Ouro Preto não é único. No Estado de Minas Gerais
existem muitas cidades que apresentam elevados índices de desproteções e privações sociais,
principalmente quando se trata do Índice de Vulnerabilidade das Famílias, IVF (MINAS
GERAIS, 2013).
A partir da análise do Censo 2000-2010, o Índice de Vulnerabilidade das Famílias
revelou que, embora tenha havido uma redução média de 19,3% da vulnerabilidade no Brasil, e
em Minas Gerais, de 21,5%, os piores desempenhos do Estado foram em relação ao acesso ao
entre os distritos e da sede Figura 1 - Mapa político do município de Ouro Preto e seus distritos com as relações de distância entre os distritos e da sede
34
conhecimento (educação), com índices de (-11,7%), e em relação à vulnerabilidade (-10,7%);
em seguida, as condições habitacionais (-17%) e o desenvolvimento infanto-juvenil (-18,9%).
Os seis índices analisados foram condições habitacionais, desenvolvimento infanto-juvenil,
escassez de recursos, acesso ao trabalho, acesso ao conhecimento e vulnerabilidade social
(MINAS GERAIS, 2013).
Ouro Preto se caracteriza por ser uma cidade de origem colonial de grande relevância
para a memória nacional. Alguns de seus distritos, mesmo considerados urbanos, possuem uma
ruralidade enraizada, e as pequenas localidades são consideradas como rurais, mesmo nem
sempre tendo características fortes para isso. Nesses locais existe uma variada carga cultural e
tradições. Em alguns distritos, tais características são menos evidentes, mas podem ser
percebidas através das relações sociais da população, da gastronomia e nas festividades, no
estilo de trabalho adotado e nas relações familiares com os jovens.
Atualmente, o município de Ouro Preto possui doze distritos com características
bastante heterogêneas entre si e se percebe a presença do urbano e do rural. Destacam-se, com
origens coloniais, os distritos de Cachoeira do Campo, São Bartolomeu, Glaura (Casa Branca),
Amarantina, Antônio Pereira e Lavras Novas2.
Além desses distritos e subsdistritos, Ouro Preto possui pequenas localidades como
Maciel, Arrozal, Soares, Serra do Siqueira e Bocaina, que se fizeram importantes nesta
pesquisa, pois são as localidades de moradia de muitos estudantes sujeitos da pesquisa.
Segundo a Lei Complementar da Prefeitura Municipal de Ouro Preto, Lei nº. 93, de 20
de janeiro de 2011, as áreas externas aos perímetros urbanos e de expansão urbana são
consideradas áreas rurais não sendo admitido o uso e a ocupação para fins urbanos. O
município se caracteriza por estar em uma região montanhosa, com a presença de ocupações
irregulares. Nos distritos, encontramos um perfil diferenciado de limitações geográficas, como
rios, córregos, uma extensa mata e estradas sem pavimentação.
Conforme mencionado anteriormente, os sujeitos desta pesquisa são provenientes da
localidade de Bocaina e, para estudar no distrito de Cachoeira do Campo, utilizam o transporte
público oferecido pela prefeitura. Sendo assim, para conhecermos melhor a distribuição
geográfica e populacional de Ouro Preto, foi elaborada a tabela a seguir.
2Art. 2º - Constituem áreas urbanas e de expansão urbana do Município de Ouro Preto aquelas compreendidas
pelos perímetros urbanos do núcleo urbano de Ouro Preto, Distrito Sede, das sedes dos Distritos de Amarantina, de
Antônio Pereira, de Cachoeira do Campo, de Engenheiro Corrêa, de Glaura, de Lavras Novas, de Miguel Burnier,
de Rodrigo Silva, de Santa Rita de Ouro Preto, de Santo Antônio do Leite, de Santo Antônio do Salto e de São
Bartolomeu, e das localidades da Chapada, da Bocaina, da Caiera, da Serra do Siqueira, do Vale do Tropeiro, do
Rio Mango (St°Ant° Leite/Engenheiro Corrêa), do Soares e do Mota (OURO PRETO, 2009, p. 1, grifo nosso).
35
Tabela 1 – Relação da população do município de Ouro Preto e distritos/ localidades
envolvidos na pesquisa com famílias de Bocaina
População da cidade de Ouro Preto e dos distritos/localidades envolvidos na pesquisa
(Censo IBGE/2010)
Município População
Ouro Preto – Município 40.583
Distritos Localidade População
Amarantina Coelhos 3.545
Cachoeira do Campo
(sede da escola)
-----
8.857
Engenheiro Correia 380
Glaura Soares 1373
Miguel Burnier 779
Rodrigo Silva Bocaina de cima e Bocaina de
baixo (local de moradia das
famílias investigadas)
1070
Santo Antônio do Leite Chapada 1.683
São Bartolomeu Maciel 729
Fonte: Elaborado pela autora a partir de dados do Censo IBGE (2010)
As localidades da Chapada, da Bocaina e Serra do Siqueira estão afastadas do centro
urbano e seus moradores sofrem com o isolamento espacial, tecnológico, de comunicação, de
transporte e de acesso aos equipamentos urbanos e públicos. São espaços que, muitas vezes,
não possuem serviços de assistência à saúde, segurança e acesso a serviços de mobilidade
urbana, o que pode acarretar dificuldades aos moradores para assegurarem seus direitos
básicos.
A localização dos distritos distantes da sede tende a desafiar o dia a dia dos jovens e
chama a atenção para a conexão que existe entre as pessoas e os lugares (ROBERTSON, 2013).
A moradia em distritos mais afastados e a distância social dos jovens podem desempenhar um
papel de reprodução de desigualdade, pois alunos com baixo capital cultural, econômico e
social, ao conviverem com os demais alunos, podem sentir constrangimento ou um sentimento
de orgulho por morar em uma área rural privilegiada (NOGUEIRA; NOGUEIRA, 2007).
Em relação ao índice de pobreza e desigualdade social, a cidade de Ouro Preto possui
um alto índice, que chega a 28,54% em seus distritos, o que pode se refletir negativamente no
36
campo da Educação. Esse índice coloca a cidade em 316º lugar em uma escala de 1 a 853 no
mapa de pobreza e das desigualdades brasileiras, embora a cidade possua um patrimônio
cultural riquíssimo (IBGE, 2003). Em relação ao padrão de Gini3, cálculo utilizado para medir
a desigualdade, esse dado representa, em média, que cerca de 20.052,2 moradores se
enquadram em situação de pobreza em Ouro Preto.
Em relação aos riscos e ocupação do solo, a população do município vive em situação
de vulnerabilidade quando se trata das condições de moradia, exposição a inundações,
escorregamentos e à ação de esgotos a céu aberto em algumas áreas, devido à ocupação
desordenada e indevida em encostas (ZANIRATO, 2010).
Em 2015, a Escola, localizada em Cachoeira do Campo, tinha 875 alunos matriculados
durante os turnos da manhã, tarde e noite. Desses, 209 estavam matriculados no 1º ano do
Ensino Médio. No entanto, apenas alunos do 1º ano do Ensino Médio utilizam o transporte
escolar, o que equivale a 33,14% dos alunos matriculados neste ano.
2.1. Os distritos, a infraestrutura e a (não) presença do poder público
Na realidade brasileira, observa-se a formação de extensas periferias urbanas, o que, até
trinta anos atrás, era considerado um fenômeno restrito apenas às grandes cidades. A população
da região sudeste de Minas Gerais tende a se concentrar nas aglomerações urbanas e, muitas
vezes, em áreas rurais próximas às áreas urbanas (SILVA, 2011).
O rural e o urbano estão cada vez mais próximos, embora observemos que as condições
de moradia nas áreas rurais continuem precárias devido à dificuldades estruturais, econômicas e
sociais (GUARANÁ, 1999). Na região de Ouro Preto, onde foi realizada esta pesquisa, mais
especificamente na localidade de Bocaina, nos deparamos com o desejo dos familiares em que
seus filhos estudem, embora os esforços não tenham sido muito visíveis.
De acordo com Guaraná (1999), ao pensarmos nas distâncias entre o rural e o urbano,
no que tange à educação, o contexto e a localização onde o espaço rural esta inserido deve ser
levado em consideração, pois uma das principais limitações e tensões encontradas pelas
famílias que vivem em áreas rurais é a inexistência de escolas que ofereçam para além do
3 Índice de Gini: medida do grau de concentração de uma distribuição, cujo valor varia de zero (perfeita igualdade)
até um (a desigualdade máxima) (IBGE, 2015).
37
ensino fundamental. Observamos também, que a integração estabelecida com o município é
muito importante para essas famílias, tendo em vista que nos dias de hoje a população é muito
dependente da infra estrutura urbana, quando se trata de troca comercial e de lazer.
Hoje, em cidades pequenas e médias, como Ouro Preto, já se evidencia um processo de
periferização, presente em todo o território nacional. Denota-se, em seus distritos, a
precariedade, a ausência do Estado e de políticas públicas que auxiliem no desenvolvimento da
infraestrutura, de equipamentos e serviços, como saneamento básico, habitação, mobilidade,
saúde e educação.
A qualidade de vida, seja no campo ou na cidade, está intimamente ligada às políticas
públicas voltadas para o bem-estar social, ou seja, o levantamento de necessidades básicas da
população que habita a localidade em questão e o estabelecimento de prioridades de
infraestrutura, equipamentos e serviços a serem instalados, dentre outros (SILVA, 2011).
A cidade e o processo de urbanização são elementos essenciais na reestruturação e
reterritoriarização do espaço, além de se classificarem como elementos centrais nas políticas de
desenvolvimento regional, pois é na cidade em que se concentram o comércio, os hospitais, as
escolas e os equipamentos de lazer. Os moradores de distritos e regiões afastadas do centro
urbano sofrem com o peso do isolamento espacial, tecnológico, de transporte e de acesso à
escola (SILVA, 2011).
Esse isolamento dos meios de comunicação e a dificuldade de acessibilidade aos
recursos tecnológicos, muitas vezes, acarretam uma desigualdade de oportunidades e a seleção
de posições sociais. Segundo Bartholo e Costa (2014), a pobreza se caracteriza como
importante tema no campo da Educação e da justiça social e, para superar as desvantagens
educacionais de segregação escolar, é necessário reduzir a distância entre os estudantes em
condições de pobreza e o restante da população.
Muitas vezes, o retraimento das oportunidades de inclusão social se manifesta sobre os
alunos que se encontram em maiores desvantagens, no entanto, é importante levar em
consideração o condicionante no plano das oportunidades educacionais, as características e as
experiências vividas por cada um e o estilo de vida familiar (COSTA; KOSLISNSKI, 2006).
Esses lugares são constituídos por relações sociais e surgem de significados particulares
no espaço, podem ser entendidos, aqui, como “a minha casa” ou a “minha escola” e as relações
estabelecidas e vividas entre elas. O “lugar” é considerado o resultado dos esforços para conter
e reivindicar que algo é de alguém, estabelecendo fronteiras e garantindo identidades. No
entanto, o mesmo não deve ser visto como um espaço fechado e descontínuo, pois é
38
materializado por redes (integrantes de comunidades, rede de moradores), escalas, territórios
sobrepostos e relações espaço-tempo (ROBERTSON, 2013).
É nesse “lugar”, do qual fala Robertson (2013), em que as famílias estudadas se situam
e do qual se apropriam. Constroem suas moradias e tecem suas relações de vizinhança e de
trabalho. Esse espaço faz parte da história de cada uma delas, pois várias gerações criaram e
criam seus filhos, apesar de todas as dificuldades enfrentadas pelos problemas de deslocamento
para o centro urbano mais próximo.
2.2 Percursos metodológicos
A escola estadual de Cachoeira do Campo4, selecionada para a pesquisa, está localizada
em região urbana, no centro do distrito de Cachoeira do Campo, um distrito da cidade de Ouro
Preto-MG, cujo Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), no ano de 2013, foi
de 5,1. Esta escola se caracteriza por receber alunos de vários pequenos distritos e localidades
do município, prevalecendo, em alguns deles, características rurais5.
Esta escola recebe, diariamente, jovens moradores dos distritos de Engenheiro Correia,
Glaura, Rodrigo Silva, Santo Antônio do Leite, São Bartolomeu, do subdistrito de Serra do
Siqueira, e das localidades de Arrozal e Bocaina.
A seleção desses jovens para responder os questionários foi realizada através da análise
do cadastro de alunos que utilizam o transporte escolar, disponível no Sistema Mineiro de
Administração Escolar (SIMADE) e do número de alunos matriculados no 1º ano do Ensino
Médio. Esta busca foi realizada com a autorização da gestão escolar.
Antes da aplicação dos questionários aos jovens, foram feitas visitas devidamente
agendadas e autorizadas pelo diretor na escola selecionada, sendo realizada, por ele, uma
análise prévia do questionário, a fim de verificar se as perguntas poderiam causar algum
constrangimento aos alunos. A vice-diretora acompanhou a pesquisadora na aplicação dos
4 Em 2015, constatou-se, através de busca ativa na escola estadual de Cachoeira do Campo, que 875 alunos estão
matriculados durante os turnos da manhã, tarde e noite. Desses, 209 estão matriculados no 1º ano do Ensino
Médio. No entanto, apenas alunos do 1º ano do Ensino Médio utilizam o transporte escolar o que equivale há
33,14% dos alunos matriculados nesta série. 5Segundo Portes (2012, p.8), o termo “famílias rurais” é uma discussão atual no campo da Sociologia Rural e nos
estudos demográficos, pois, observando-se os movimentos de expansão dos processos de modificação do campo,
os processos culturais, políticos e tecnológicos que vêm se instalando no Brasil e produzindo sentimentos e
compreensões múltiplos nas famílias mais distantes dos centros urbanos, somos obrigados a procurar entender as
famílias rurais para além de uma oposição a famílias urbanas.
39
questionários nas salas das sete turmas de 1º ano6, após a apresentação da proposta da pesquisa
para cada uma das turmas do turno matutino. Todos os 134 jovens presentes nos dias de visitas
aceitaram responder os questionários, sendo que um não se identificou. O critério de seleção
dos jovens para responder os questionários não fez distinção de gênero, raça, cor ou idade.
Através da aplicação desses questionários foi possível identificar os jovens que vivem em
regiões afastadas do distrito no qual se localiza a escola, totalizando 39 alunos. Desses, cinco
jovens são moradores da localidade de Bocaina.
A escolha do uso do questionário se deu pela sua versatilidade em situações em que o
pesquisador se propõe a fazer um perfil, ou conhecer algumas características mais gerais de
uma população ou de uma amostra. Assim, questionários semiestruturados permitem atingir
várias pessoas ao mesmo tempo, obtendo maior número de dados, respostas rápidas e precisas
(BONI; QUARESMA, 2005). A partir da sua aplicação foi possível traçar o perfil dos jovens
que vivem em distritos da Região dos Inconfidentes, selecionar aqueles que atendem aos
critérios estipulados pela pesquisa para a aplicação da entrevista, além de demonstrar a
composição familiar, renda e redes de relações.
O questionário coletou dados em relação à composição familiar, características
sociodemográficas, socioeconômicas, socioculturais e em relação ao acesso a informações que
permitiram refletir sobre a estrutura das famílias pesquisadas em termos de composição,
localização de moradia, escolaridade dos membros (capital escolar), renda familiar média,
mobilidade, formas de sociabilidade (redes de relações) e recursos culturais disponíveis.
Nesse questionário também foram abordadas perguntas estruturadas de múltipla escolha
ou de respostas curtas, como: nome, sexo, local de moradia, se possuem vizinhos, renda
familiar, número de pessoas que vivem na mesma casa, escolaridade dos pais, tipo de formação
familiar, tempo de residência na comunidade, se os irmãos frequentam a escola, se a casa é
própria, se alguém da família possui algum meio de transporte, meios de comunicações
disponíveis.
Após análise dos questionários, na segunda fase da pesquisa, foram realizadas
entrevistas com os pais (pai ou mãe) ou familiares dos alunos, com o objetivo de conhecer, com
maior profundidade, as práticas educativas familiares e o que representa, para essas famílias,
morar nesse distrito.
6 A escola estadual selecionada para a pesquisa oferece turmas de 1º ao 3º ano do Ensino Médio nos turnos
matutino e noturno. No matutino, estão matriculados 194 alunos e 134 responderam ao questionário, e, no turno
noturno, estão matriculados apenas nove alunos no 1º ano. Destes, até o momento, nenhum respondeu o
questionário.
40
Para dar continuidade à pesquisa e formalizar o convite para participação das entrevistas,
um Termo de Consentimento Livre Esclarecido (TCLE) foi apresentado em duas vias idênticas
e assinados pelos pais dos jovens, pela pesquisadora e pela orientadora da dissertação. Neste
documento estavam contidos dados relevantes à pesquisa, seus objetivos e critérios, além de
dados referentes à ética e ao sigilo das informações com dados pessoais dos jovens e das suas
famílias.
A aplicação de entrevistas se restringiu a uma amostra de cinco famílias da localidade
de Bocaina, selecionadas a partir dos seguintes critérios:
a) Estar cursando o Ensino Médio;
b) Não ter acesso à internet e outros meios de comunicação em casa;
c) Que se desloque para a escola a pé ou pelo transporte público;
No Gráfico 1, a seguir, podemos visualizar as localidades e distritos que atenderam aos
critérios propostos na pesquisa, as barras em vermelho indicam estas localidades.
Gráfico 1 – Número de jovens por local de residência que atendem aos critérios de seleção para
os familiares participarem das entrevistas na escola pesquisada de Cachoeira do Campo, 2015
Fonte: Elaborado pela autora
41
Bocaina foi selecionada para a aplicação das entrevistas por apresentar um número
maior de famílias populares que moram em uma mesma localidade e por este grupo sofrer
diariamente com o deslocamento para Cachoeira do Campo para estudar devido a oferta restrita
de horários de ônibus em comparação com as demais localidades. As entrevistas possibilitaram
levantar dados relevantes sobre a história de vida dos pais e alunos, as formas de transmissão
do capital cultural e escolar, bem como permitiu conhecer os costumes das famílias e dos
jovens na localidade, fornecendo um material para a análise do cotidiano e da relação das
famílias com o espaço.
Através da aplicação de entrevistas com o responsável pela educação dos jovens
selecionados pretendeu-se conhecer as rotinas domésticas e os esforços educacionais das
famílias populares que moram em Bocaina, além dos projetos e dificuldades vividas e as
diferentes práticas adotadas no interior dessas famílias em busca da escolarização.
As entrevistas foram efetuadas em situações informais e previamente agendadas com os
familiares. Foram feitas visitas prévias à localidade para conhecer o espaço. Os depoimentos
coletados foram gravados em forma de áudio e posteriormente transcritos, tendo como
informação complementar o diário de campo.
O roteiro da entrevista se configurou a partir dos seguintes eixos temáticos: a)
composição familiar; b) cotidiano da família; c) redes de relações; d) vínculo com a vida
escolar do filho; e) o que pensa a família em relação à escola de Cachoeira do Campo; f)
representação do local de moradia (o que pensam de Bocaina).
Como recurso periférico complementar, foram realizadas pesquisas bibliográficas em
base de dados científicas, como artigos, teses e demais publicações que envolvam o tema
família-escola e que sejam capazes de fornecer dados relevantes e atuais (BONI; QUARESMA,
2005).
A pesquisa documental foi realizada no sistema de cadastro de transporte escolar e no
arquivo escolar.
A observação do campo também foi uma importante técnica de coleta de dados utilizada
na pesquisa, e ela pode ser denominada também de observação assistemática, segundo a qual o
pesquisador procura recolher e registrar os fatos da realidade sem a utilização de meios técnicos
especiais, ou seja, sem planejamento ou controle (BONI; QUARESMA, 2005).
Buscou-se, através dessa observação, conhecer um pouco mais sobre a realidade dos
indivíduos selecionados pela pesquisa, das ações inconscientes desses jovens e da relação entre
família e escola. Além disso, a observação possibilitou conhecer quais são as formas de
socialização desses jovens e, ainda, como é a representação do local de moradia pelas famílias,
42
quais são as práticas empreendidas pela família em relação à escolarização. Possibilitou,
portanto, que o pesquisador tenha um contato direto com a realidade vivida pelas famílias,
auxiliando na produção e interpretação dos dados. Facilitou a triangulação das fontes, ao
relacionar as informações dos questionários com os depoimentos, a observação das expressões
e comportamentos dos indivíduos e as manifestações simbólicas durante as entrevistas.
No primeiro momento da elaboração desta dissertação, foi realizado um breve estudo
histórico da região de Ouro Preto e da localização da escola, que se situa em Cachoeira do
Campo, na qual os jovens de distritos e localidades vizinhas se matriculam para cursar o Ensino
Médio. Este estudo foi realizado através da análise de documentos que trazem dados sobre o
município e sobre a localização geográfica da escola em relação ao local de moradia dos
alunos, do perfil socioeconômico, da breve análise geográfica do território em que eles vivem e
de documentos escolares, como o Regimento Interno da escola pesquisada.
Durante as visitas à Bocaina, pude vivenciar momentos únicos que puderam
complementar os dados coletados nos questionários e entrevistas. Ao andar pelas pequenas
ruas, que se transformam em labirintos, pude chegar às casas dos sujeitos da pesquisa. As casas
eram sempre muito simples, sem acabamentos e pequenas, um quintal sobre outro quintal e
famílias diferentes vivendo bem próximas.
Durante o percurso, a cada esquina, um grupo de pessoas conversando, algumas ao lado
da capela, outras nas janelas de suas casas, observando as ruas paradas e sem muitos atrativos.
Pude encontrar, também, pessoas atravessando a ponte em direção ao asfalto que liga Rodrigo
Silva à Ouro Preto e à Cachoeira do Campo, essas pessoas se deslocavam a pé para pegar
ônibus ou, muitas vezes, carona.
As ruas não são muito conservadas, nota-se a pouca presença do poder público nessa
região. Em algumas dessas ruas, o esgoto corre a céu aberto. Nas próximas seções, poderemos
conhecer mais a fundo detalhes sobre a vida dos jovens, iniciando pelo perfil geral dos jovens
que estudam em Cachoeira do Campo, incluindo os que moram próximos da escola. Em
seguida, serão analisados o espaço em que vivem e, finalmente, o perfil dos jovens que vivem
em distritos e localidades afastadas da escola.
43
2.2.1 O perfil geral dos jovens que estudam no 1º ano em Cachoeira do Campo
Conforme mencionado no item 2.2, que discutiu a metodologia da pesquisa, foram
aplicados questionários aos jovens estudantes do 1º ano do Ensino Médio na escola investigada.
Por meio dos questionários pôde-se conhecer melhor o perfil desses jovens e os resultados
serão discutidos neste primeiro momento de análise. Foram aplicados e analisados 134
questionários (79 moças e 55 rapazes), incluindo os que vivem próximo e distantes da escola.
No perfil geral desses jovens, observa-se que a grande maioria (86%) está na faixa
etária de 15 a 16 anos, 10% possuem de 17 a 18 anos, 3% têm mais de 18 anos, e apenas 1%
não informou a idade. A maioria dos jovens não possui atraso no processo de escolarização,
conforme foi estabelecido pela Lei de Diretrizes e Bases (LDB), de 1996, pois o acesso ao
Ensino Médio pode ocorrer a partir dos 15 anos. Acredita-se que os 13% de jovens que
possuem mais de 17 anos sejam os que tiveram alguma reprovação na trajetória escolar ou
casos de interrupção dos estudos, conforme será demostrado.
Grande parte desses jovens (84%) não trabalha, e apenas 16% deles afirmaram trabalhar
para ajudar nas despesas de casa, normalmente, são trabalhos informais com carga horária de
meio dia.
Em relação à família, foram identificados diferentes arranjos familiares, prevalecendo
aqueles em que os jovens moram com a mãe, pai e irmãos, em famílias nucleares (65 casos), o
que equivale a 48,5% dos casos. Os demais arranjos variam entre 9,7% dos jovens que moram
com a mãe e irmãos (13 casos); onde 9,7% moram com pai e irmãos (13 casos); em que 6,7%
com pai e mãe (9 casos); e os demais, 25,3%, com pai e madrasta, mãe e padrasto, avós, tios e
primos em famílias extensivas (34 casos). Apenas um jovem relatou ter a presença de um
amigo compartilhando moradia.
Em relação ao número de integrantes da família, 79 jovens (59%) afirmaram morar com
quatro a cinco pessoas; 27 (20,1%) dos jovens com até três pessoas; 19 (14,2%) com mais de
cinco pessoas; e 9 (6,7%) jovens afirmaram morar com apenas mais duas pessoas. Através
desta análise, percebe-se que grande parte dos jovens tem o quadro familiar composto por mais
de quatro pessoas, sendo consideradas famílias com mais de quatro pessoas, que, em muitos
casos, contam com a presença dos pais, irmãos, avós, tios e primos compartilhando o domicílio.
Desses 134 jovens, 117 (87%) possui irmãos, 5% não responderam e 8% não possuem
irmãos. Dos 117, o que equivale a 87% de jovens que possuem irmãos, 72% afirmaram que
44
eles ainda estudam; sendo que os demais, 22,2%, responderam que têm irmãos, mas que eles
não estudam; e 6% não possuem irmãos, podendo essa variação ser decorrente da evasão da
escola ou devido ao fato de já terem concluído os estudos. Dos 117 jovens que possuem irmãos,
60% relataram possuir de um a dois irmãos; 20% jovens possuem de três a cinco irmãos; e 10%
mais de cinco irmãos; apenas 10% não possuem irmãos e seis não responderam.
Gráfico 2 – Número de irmãos mencionados pelos jovens estudantes do 1º ano do Ensino
Médio em uma escola pública de Cachoeira do Campo (2015)
Fonte: Elaborado pela autora
A escolaridade dos familiares (pai e mãe) foi mensurada a partir dos questionários
preenchidos pelos estudantes e variam, na maioria dos casos, entre o Ensino Fundamental e
Médio. Neste sentido, observa-se que a maioria dos jovens respondeu que seu pai possui
escolaridade em nível fundamental incompleto, sendo poucos os que tiveram a longevidade
escolar para além do Ensino Médio, conforme demonstrado no Gráfico 4.
45
Gráfico 3 – Nível de escolaridade alcançado pelo pai, de acordo com relatos
dos jovens estudantes do 1º ano do Ensino Médio em uma escola pública de
Cachoeira do Campo (2015)
Fonte: Elaborado pela autora
As profissões mais mencionadas do pai foram: 26,11% atuando como
operadores/motoristas (35 casos), 14,2% como operários em construção civil (19 casos), 6%
fazem trabalhos informais (8 casos), 4,5% são funcionários de comércio (6 casos), 3,8% são
trabalhadores rurais (5 casos), 3% são mecânicos (4 casos), 2,25% fazem serviços
administrativos (3 casos), 1,5% são frentistas (2 casos), 3% fazem segurança privada (4 casos),
dentre outras profissões com nível médio. Foram encontrados apenas 3 casos de pais que atuam
como comerciantes/empresários, o que equivale a 2,25% dos pais.
Em relação à escolaridade das mães, foi constatado que 41,8% delas possuem a
escolaridade de Ensino Fundamental incompleto (56 casos); 23,12% têm Ensino Médio
completo (31 casos); 8,2 % têm Ensino Médio incompleto (11 casos); 3,75% possuem Ensino
Fundamental completo (5 casos); e, sobre 23,14%, não foi informada a escolaridade. A maioria,
assim como os pais, não atingiu além do nível médio.
Percebe-se, na análise dos questionários, que as mães estudaram mais que os pais,
destacando 11 mães com Ensino Superior completo (8,2%) e um caso com Ensino Superior
incompleto (0,75%). Por outro lado, observa-se que 103 mães (77%) estudaram até, no
máximo, o Ensino Médio.
46
É interessante ressaltar que se encontrou um número expressivo de jovens (39 casos,
correspondendo a 29% da amostra) que não souberam classificar a escolaridade de seus pais.
Com relação à escolaridade das mães, apenas 19 não souberam responder. As representações
referentes à escolaridade das mães estão expressas no gráfico a seguir.
Gráfico 4 – Nível de escolaridade alcançado pela mãe, de acordo com relatos
dos jovens estudantes do 1º ano do Ensino Médio em uma escola pública
de Cachoeira do Campo (2015)
Fonte: Elaborado pela autora
As profissões das mães mais mencionadas foram as de empregada doméstica (23),
funcionária de comércio (16), auxiliar (12), trabalhos informais (11), educação (10), serviços
administrativos (7), empresárias comerciantes (4), motorista (3), executiva (2), aposentada (1),
segurança privada (1), “do lar” (sem remuneração) (26), além das 18 cujos filhos não souberam
ou não quiseram responder.
Na renda familiar geral, foi observado que 13% dos jovens possuem uma renda familiar
menor que um salário mínimo, 10% entre um e dois salários mínimos e 51% entre dois e três
salários mínimos, normalmente para garantir o sustento de uma composição familiar de mais de
quatro pessoas, como foi mencionado anteriormente. Observa-se que 74% das famílias
possuem renda familiar de até três salários mínimos, para garantir o sustento familiar, os
demais (13%) não souberam responder a questão. Por último, apenas 13% dos jovens
afirmaram possuir uma renda maior entre quatro e seis salários mínimos, conforme
demonstrado no gráfico abaixo:
47
Gráfico 5 – Renda familiar média mencionada pelos jovens estudantes do Ensino Médio de
uma escola pública de Cachoeira do Campo (2015)
Fonte: Elaborado pela autora
Os dados relativos à renda, escolaridade e profissão dos pais demonstram que a maioria
dessas famílias encontra-se em situação de vulnerabilidade, seja em relação à distância
(mobilidade), acesso à informação e situação econômica. Apenas 18 jovens (13%) responderam
que a renda familiar ultrapassa quatro salários mínimos, 18 (13%) não souberam responder, e
os demais (74%) possuem a renda familiar de menos de um salário mínimo a três salários
mínimos, representando uma parcela significativa.
Desses jovens, 30 (3%) afirmaram receber algum auxilio financeiro de programas do
governo, e 16% não souberam responder. Apesar de haver muitos casos em que a renda
familiar é baixa em relação ao número de pessoas no domicílio, a grande maioria, 95 famílias
(71% dos casos), não recebe nenhum auxílio financeiro externo.
48
2.2.2 O espaço em que vivem os sujeitos da pesquisa
Grande parte dos 134 jovens reside nas localidades pesquisadas desde o nascimento e
muitas das suas experiências são as vividas e realizadas em seu território de origem. De acordo
com os questionários aplicados, 101 jovens vivem por mais de cinco anos no local atual de
residência (75,5%); 9 jovens vivem de três a cinco anos no atual local de residência (7%); 5
jovens vivem de um a dois anos (4%); e apenas 8 jovens vivem a menos de um ano na
comunidade (6%). Além disso, 8% dos demais não souberam responder.
Quanto ao tipo de pavimentação das ruas dos locais de moradia dos jovens, 51%
afirmaram ser de calçamento; 29% vivem em lugar sem pavimentação (ou seja, estradas de
terra); 17,1% das famílias contam com pavimentação por asfalto; e 3% não responderam. As
ruas de terra, sem pavimentação, são caraterísticas fortes dos bairros e distritos afastados do
centro urbano de Ouro Preto.
A maioria desses jovens (85%) vive em casas próprias e as características que melhor
descrevem estas casas são: a maioria tem acabamento e possuem condições de saneamento
básico, como chuveiro, fossa ou rede de esgoto, banheiro, água encanada e luz.
O tipo de cobertura dessas casas varia entre telha e cobertura por laje. O piso, na maior
parte dos casos, é de cerâmica ou cimento (sem acabamento). Em relação à quantidade de
cômodos das casas, a grande maioria dos alunos (67%) respondeu que suas casas possuem de 5
a 8 cômodos, ou seja, caracterizaram as suas casas como pequenas; e 33% disseram que suas
casas têm de 9 a 12 cômodos7.
Nos distritos, existe a coleta de lixo, mesmo que em dias reduzidos. Assim, apenas 4%
dos jovens afirmaram que, no seu local de moradia, não passa o caminhão de coleta de lixo.
Nessa situação, os sacos de lixo devem ser levados a um ponto no qual exista a coleta quando a
família tem condições para isto ou torna-se necessário queimá-los no quintal.
Os meios de comunicação mais utilizados pelos jovens são a televisão, telefone celular
ou fixo, rádios e computadores. O acesso à internet, de acordo com as respostas dos
questionários, é o menos usado, pois, dos 134 jovens, 30% relataram não possuir internet em
suas casas, o que, muitas vezes, dificulta a realização dos trabalhos escolares, a possibilidade de
se manter atualizado ou a socialização através da participação em grupos em redes sociais. Essa
7Alguns jovens não responderam questões em relação às condições de moradia, como se possuem acabamento nas
casas (2%); presença de fossa ou esgoto (2%); presença de banheiro (4%); chuveiro (4%); água encanada (3%) e
luz (3%), não sendo possível mensurar se possuem ou não esses serviços e condições de moradia.
49
limitação ao acesso dos meios de informações pode estar associada aos recursos financeiros
limitados para adquirir um bem, à localização geográfica da moradia, a não priorização desse
bem, dentre outros.
Gráfico 6 – Disponibilidade de acesso à informação na residência, segundo relatos
dos jovens que estudam no Ensino Médio em uma escola pública de Cachoeira do Campo
(2015)
Fonte: Elaborado pela autora
O local de moradia mais mencionado pelos jovens foi Cachoeira do Campo: 65% dos
jovens afirmaram morar no distrito em que se localiza a escola e relatam ter o acesso facilitado
à escola. O restante dos alunos que responderam o questionário (35%) são moradores de
distritos e localidades distantes da escola.
Foram identificados jovens que vivem em distritos afastados da escola, como Santo
Antônio do Leite (13%), Bocaina (4%), Glaura (3%), Engenheiro Correia (2%), Rodrigo Silva
(2%) e Serra do Siqueira (2%). Os distritos e subdistritos de Amarantina, São Bartolomeu,
Soares, Arrozal, Maciel, Miguel Burnier não representaram mais de 1% cada do total de
questionários. Três jovens não informaram o local de residência.
Em realidades diferentes dos jovens que vivem próximos à escola, 39 jovens (35%) que
cursam o 1º ano vivem em distritos ou comunidades afastadas e enfrentam dificuldades devido
à distância da escola. Diante dessas afirmações, percebe-se o elevado número de jovens que
precisam se organizar de forma diferente dos demais diariamente para conseguir cumprir suas
rotinas escolares, pois precisam acordar mais cedo, deslocar-se até o ponto de ônibus, que, em
50
muitos casos, está distante de suas casas, para conseguirem chegar no horário de início das
aulas. Muitos deles, ao sair da escola, precisam resolver algumas pendências no comércio local
antes de ir embora no ônibus escolar.
Em relação à mobilidade, 73% dos respondentes afirmam possuir transporte público
próximo à residência, mas essa não é a realidade de todos, pois 26% dos jovens que vivem em
locais afastados não possuem nenhum ponto de transporte público perto da residência e ainda
sofrem com a distância e limitação da mobilidade (1% não respondeu a questão). Os jovens que
vivem em Cachoeira do Campo e em Amarantina possuem mais mobilidade no que se refere ao
acesso aos transportes públicos, pois a principal via de acesso à Ouro Preto e Itabirito corta
esses distritos. Os demais possuem um posicionamento geográfico mais afastado do centro
urbano.
Essa ausência do transporte público que dificulta a mobilidade, muitas vezes, se torna
uma limitação para que esses jovens tenham contato com outros territórios e outras realidades,
pois, embora muitos possuam carro em suas famílias, às vezes, não possuem condições
socioeconômicas para mantê-lo, assim como realizar passeios frequentes fora do local de
moradia.
A sociabilidade desses jovens na comunidade se dá através de visitas na casa de
vizinhos e brincadeiras de rua e em casa, porém nem todos frequentam a casa de seus vizinhos.
Apenas 60% afirmaram realizar essa prática; 40% relataram não receber seus vizinhos em casa
e cinco não responderam.
As atividades de lazer mais realizadas por esses jovens são: assistir televisão, navegar
na internet, realizar atividades com familiares (relato muito presente nos questionários das
meninas), dormir, praticar esportes, estudar, trabalhar, dentre outros. As atividades
extraescolares, para alguns, são estudar e ler.
Apenas 18% dos jovens relataram que, quando não estão na escola, costumam ler ou
adiantar as tarefas escolares para não acumular no dia a dia. Os demais, 82% (ou seja, a
maioria) variaram entre as outras opções, ocupando o tempo com o lazer e o trabalho.
Sem considerar o trajeto para a escola, foi mensurado o número de vezes que esses
jovens saem do seu território de moradia, a fim de verificar quais são os contatos que estes
estabelecem com outras realidades e a frequência com que estabelecem essas relações com
outras localidades. Os dados evidenciam que 13% dos jovens saem menos de uma vez ao mês
de seu distrito sem fins escolares, 11% saem até uma vez ao mês e 26% até três vezes ao mês,
demonstrando que 50% desses jovens que vivem em distritos ou subdistritos possuem pouco
contato com outras realidades a não ser do território em que vivem.
51
O contato desses jovens com outros contextos territoriais se dá através das relações que
estabelecem no ônibus escolar, na escola e nas poucas oportunidades que têm de viajar para a
casa de parentes, além das relações estabelecidas na própria família, no território em que vivem
e na comunidade.
As últimas questões do questionário aplicado possibilitaram aos jovens se expressarem
em relação a como os mesmos se veem na escola em relação às faltas e reprovações e, ao final,
fizeram uma autoavaliação. Optou-se por deixar esta questão aberta, para que se sentissem à
vontade para responder de forma mais próxima à suas realidades e vivências.
A grande maioria não se expressou na opção em aberto, mas pretende-se, aqui,
demonstrar um pouco dessa análise.
Segundo as respostas dos jovens, 39 faltam frequentemente às aulas, destacando
diversos motivos, como problemas particulares, como para ir ao médico, preguiça, dentre
outros. Cem jovens afirmam não faltar às aulas para não perderem a matéria e saírem
prejudicados no andamento do bimestre.
Para realizar as tarefas escolares, 71% dos respondentes afirmaram receber auxilio por
algum componente familiar, os outros 29% não recebem nenhum auxílio. As reprovações e
abandonos escolares estão presentes na trajetória de 25% dos jovens, os motivos não foram
expostos por eles. Os demais 75% dos jovens não tiveram reprovações ou abandono escolar.
Já em relação às recuperações bimestrais, 31% dos jovens afirmaram ficar em
recuperação em mais de duas matérias no bimestre. O restante, 68%, não ficou de recuperação.
Percebe-se que, nesta escola, os jovens pesquisados ficam mais de recuperações bimestrais do
que reprovam.
Diante de todas as dificuldades vividas por esses estudantes para manter-se no ambiente
escolar e na sociedade, a grande maioria, representada por 85% dos sujeitos, se considera bons
alunos, por frequentar as aulas, fazer as tarefas rotineiramente e se dedicar aos estudos. Apenas
15% não se consideraram bons alunos, não expressando os motivos.
2.2.3 O perfil dos 39 jovens que vivem em territórios afastados da escola
Após conhecer o perfil geral dos 134 jovens que estudam no 1º ano do Ensino Médio da
escola pública de Cachoeira do Campo, conforme o item 2.2.2, não houve distinção do local de
moradia, ou seja, foram incluídos, na primeira análise, alunos que vivem em distritos e
52
localidades afastadas da escola e alunos que vivem em Cachoeira do Campo, próximo à escola.
Agora, na seção 2.2.3, selecionamos apenas os jovens que vivem afastados da escola, sendo
assim, foram excluídos aqueles que moravam em Cachoeira do Campo e selecionados para
analisar apenas 39 jovens (14 rapazes e 25 moças) que vivem em pequenos distritos e
localidades de Ouro Preto para uma investigação mais aprofundada, que será realizada através
de uma breve comparação entre os que vivem em Cachoeira do Campo e os que vivem em
outras localidades, conforme demonstrado na discussão abaixo.
Os 39 jovens escolhidos moram em Santo Antônio do Leite, Bocaina, Glaura, Rodrigo
Silva, Serra do Siqueira, São Bartolomeu, Maciel e Miguel Burnier, conforme demonstra o
Gráfico 8, abaixo. Após está análise, foram selecionados cinco jovens que vivem na localidade
de Bocaina para uma discussão mais intensa, que será demonstrada e analisada no Capítulo 3.
Fonte: Elaborado pela autora
No perfil desses jovens, observa-se que, dentre os que vivem em distritos afastados da
escola, 90% estão na faixa etária de 15 a 16 anos, com apenas 3% dos jovens entre a faixa
etária de 17 a 18 anos, ou seja, grande parte dos jovens está dentro da faixa etária estabelecida
pela Lei de Diretrizes e Bases (LDB), de 1996, da mesma forma que acontece em Cachoeira do
Gráfico 7 – Local de residência (distrito/localidade) dos jovens estudantes do 1º ano do
Ensino Médio na escola de Cachoeira do Campo investigada (2015)
53
Campo. Diferentemente da análise total de dados, a taxa de jovens com a faixa etária de 17 a 18
anos é menor nos distritos afastados da escola, levando-nos a considerar que a taxa de
reprovações e abandonos escolares nesses territórios isolados é menor em relação aos jovens
que vivem no próprio distrito em que se localiza a escola.
A composição familiar nos distritos afastados não se difere muito dos demais, 69% dos
jovens informaram que moram com mais de quatro pessoas, destacando os quadros familiares
mais diversos, como aqueles que moram com os pais e irmãos, pais irmãos, avós e tios, pai ou
mãe, madrasta ou padrasto, além de outros familiares e amigos.
No quadro familiar desses 39 jovens, a maioria possui irmãos, destacando somente um
que não possui. Em relação à quantidade, houve 62% de afirmações para a opção de um a dois
irmãos; 4% de afirmações para três irmãos; e, para as demais, quatro a cinco irmãos, 2,5%
afirmações; para a opção mais de cinco irmãos, 1,5% de afirmações, demonstrando que grande
parte das famílias que vivem nesses distritos isolados tem uma estrutura familiar em número de
filhos menor em relação aos que vivem próximos à escola.
Na categoria de análise referente à renda familiar, percebe-se que apenas 8% recebem
mais de três salários mínimos e que a condição socioeconômica dessas famílias não é alta. No
entanto, 10% dessas famílias recebem menos de um salário mínimo; 18% entre um e dois
salários mínimos; 44% de dois a três salários mínimos; e 24% dos jovens não souberam
informar. Nesses distritos e localidades afastadas da escola, 26% dos jovens, o que equivale a
10 famílias, recebem algum tipo de auxílio do governo para complementar a renda familiar.
Comparando estes dados com a análise de todos os jovens pesquisados, incluindo os que vivem
em Cachoeira do Campo, observa-se que está concentrado em Cachoeira do Campo o maior
índice de famílias que recebem auxílios do governo, o que remete a pensar que os jovens que
vivem em camadas populares nos distritos podem não saber da existência desses recursos
financeiros ou como obtê-los.
Em relação aos meios de informações disponíveis nos distritos é demonstrada uma
grande limitação do acesso à internet em relação aos outros recursos. Apenas 38% dos jovens
possui internet em casa, número reduzido e significante em relação aos jovens que vivem em
Cachoeira do Campo, que, na sua maioria (70%), possuem internet em suas casas. Os recursos,
como a televisão, estão presentes na casa de todos os jovens moradores desses distritos,
possuindo pelo menos uma, conforme demonstrado no Gráfico 9:
54
Gráfico 8 – Acesso à informação na residência dos jovens estudantes do
Ensino Médio da escola investigada moradores de distritos e localidades afastadas de Cachoeira
do Campo (2015)
Fonte: Elaborado pela autora
Além da ausência de internet acessível para todos, observa-se que o computador
também é um bem que não está presente em todos os lares, apenas em 51% dos domicílios nos
distritos afastados da escola e, em Cachoeira do Campo, a prevalência do computador nos lares
é de 81%, o que diferencia esses jovens na hora de fazer os seus trabalhos escolares. No
entanto, prevalece como mais habitual a utilização de outras fontes de informações na casa
desses jovens, como a televisão, rádio e o telefone fixo ou celular.
Através desta análise, observa-se que os primeiros laços de sociabilidade estabelecidos
pelos jovens são em casa e na vizinhança. Nos distritos afastados da escola, a taxa de
frequência de visitas aos vizinhos é maior em relação à Cachoeira do Campo, demonstrando
que 69% dos jovens frequentam a casa de seus vizinhos.
Também foram apontados como os principais locais de lazer nas localidades afastadas,
a rua, com 56% de afirmações, a casa (18%) e outros (23%), aspecto muito característico de
cidades pequenas e ambientes rurais, enquanto que, na análise geral dos jovens, que inclui os
alunos de Cachoeira do Campo, 41% dos principais locais de lazer foram a rua (valor inferior
aos dos distritos) e 18% a casa (valor igual ao dos distritos afastados). O Gráfico 10, a seguir,
apresenta estes dados de forma sistematizada.
55
Gráfico 9 – Locais de lazer mais mencionados pelos jovens que vivem longe da escola e
cursam o Ensino Médio em uma escola de Cachoeira do Campo (2015)
Fonte: Elaborado pela autora
Em relação às tarefas escolares, a maioria desses jovens que vivem em localidades
afastadas da escola, 82%, recebem algum auxílio de familiares para realizá-las e o grau de
escolaridade dos pais demonstrou ser em alta prevalência no máximo ao nível fundamental e
médio, com algumas exceções; e 18% relataram não receber auxílio dos pais. Já os alunos que
vivem em Cachoeira do Campo, próximos à escola, apenas 70% recebem algum tipo de ajuda e
30% relatam não receber ajuda dos familiares.
No nível de escolaridade do pai dos jovens que vivem afastados da escola, observa-se
que a maioria dos pais estudaram menos: 31% estudaram apenas até o Ensino Fundamental e
5% não o concluíram. Em relação aos pais no perfil geral, quando incluímos Cachoeira do
Campo, verifica-se que 37,5% estudaram até o Ensino Fundamental sem o concluir; e que 3%
dos pais que não concluíram o Ensino Fundamental em Cachoeira do Campo, valor
considerável nesta análise. No Ensino Médio completo, 8% dos pais que moram em distrito
completaram esta etapa; e 8% não conseguiram alcançar o término. Em relação à Cachoeira do
Campo, 19,5% dos pais tiveram a longevidade escolar por alcançarem o término do Ensino
Médio e 6% não o concluíram. Percebemos, assim, que o pai que mora afastado teve menos
longevidade do que os que vivem próximo a escola em Cachoeira do Campo.
Outro valor que me chamou atenção foi o número de pais que vivem nos distritos
afastados que concluíram ou estão cursando o Ensino Superior: apenas 3% possuem curso
56
superior completo e, em Cachoeira do Campo, 5% possuem curso superior ou em andamento.
Os demais variam entre Fundamental incompleto e Médio completo.
As mães que vivem em localidades afastadas possuem pouca escolaridade, na maioria
dos casos, o Ensino Fundamental incompleto, com 38% dos casos, valor bastante elevado e que
nos indica a baixa escolaridade. No Ensino Fundamental incompleto, encontramos 3% das
mães. Em relação à Cachoeira do Campo, 4% não concluíram o Ensino Fundamental e 1% o
completou apenas. O Ensino Médio nos distritos teve valores próximos aos do perfil geral, que
inclui Cachoeira do Campo, sendo que aquelas mães que moram afastadas, 21%, completaram
o Ensino Médio; e 5% não o completaram. Já incluindo Cachoeira do Campo no perfil geral,
23% das mães concluíram o Ensino Médio e 8% não o concluíram. Podemos dizer que as mães
dos distritos, 31%, alcançaram a longevidade escolar enquanto que, no perfil geral, 32%
também o alcançaram. Em relação aos pais, as mulheres estudaram mais do que os homens, nos
distritos, 11% dos pais alcançaram a longevidade através da conclusão do Ensino Médio e do
curso superior e 24,5% em Cachoeira do Campo alcançaram a longevidade escolar, sendo
através da conquista do Ensino Médio, Superior completo ou incompleto.
Quanto ao perfil profissional dessas mães, destacam-se as seguintes profissões:
doméstica, funcionaria do comércio local, motorista, aposentada, dentre outras, sendo a maioria
caracterizada como “do lar”.
As condições de moradia, nestas regiões afastadas, são representadas por ruas sem
pavimentação, normalmente, são estradas de terra ou calçamentos. As casas são em 90%
próprias e 8% alugadas, apenas 2% não responderam. Essas casas foram caracterizadas como
possuindo acabamento em 85% dos casos, sendo 10% não possuem acabamento e 5% não
responderam. Segundo informações fornecidas pelos jovens, 80% dessas casas possuem rede
de esgoto ou fossa, 79% possuem banheiro, 97% têm chuveiro e água encanada, 92% têm luz e
3% não responderam. Grande parte das casas que não possuem acabamento está na localidade
de Bocaina.
Os tipos de cobertura dessas casas afastadas da escola são por telha ou laje e o piso é de
cerâmica ou cimento grosso, na grande maioria. A quantidade de cômodos considerados pela
maioria foi de cinco a oito cômodos, com 77% das afirmações, e apenas 5% descreveram suas
casas como menores, possuindo de um a quatro cômodos.
Por morarem nas comunidades há mais de cinco anos, 77% desses jovens possuem um
vínculo com o local de moradia, muitos escreveram que moram em suas casas desde o
nascimento. Foram registrados poucos casos em que as famílias se mudaram há pouco tempo
para o distrito, como demonstra o Gráfico 11, abaixo:
57
Gráfico 10 – Tempo médio em que os jovens estudantes do Ensino Médio de uma escola de
Cachoeira do Campo residem no atual local de moradia (2015)
Fonte: Elaborado pela autora
A questão da mobilidade, nessas localidades afastadas da escola de Cachoeira do
Campo, demonstrou ser um componente importante para a pesquisa. Diferentemente dos alunos
que moram neste distrito, 85% consideram suas casas distantes da escola, por isso, 92% deles
utilizam o ônibus escolar ofertado pelo município, 5% usam van e apenas 3% dos jovens
relataram ir à escola a pé, conforme demonstra o Gráfico 12, abaixo:
58
Gráfico 11 – Meios de transportes utilizados para o deslocamento dos jovens que estudam em
uma escola em Cachoeira do Campo até suas residências (distritos e localidades) (2015)
Fonte: Elaborado pela autora
Apesar de o transporte urbano ser acessível a 90% dessas famílias, os ônibus escolares
possuem horários bem limitados saindo de uma a duas vezes por dia para outras localidades. O
Gráfico 13 referente à proximidade entre a residência e escola, demonstra o número de jovens
que consideram morar perto ou longe da escola. Para isso levou-se em consideração a distância
entre o local de moradia e a escola, levando em consideração que não há transporte disponível
durante todo o dia8.
8 Nesta pesquisa foi priorizada a fala dos alunos a respeito do que eles consideram em relação à
morar "longe" ou "perto" da escola.
59
Gráfico 12 – Proximidade entre a residência e escola, de acordo com a percepção
dos jovens que moram em distritos e localidades afastados da escola de
Cachoeira do Campo (2015)
Fonte: Elaborado pela autora
Muitas dessas famílias possuem carro, mas 44% dos jovens relataram sair pouco do
território de moradia durante o mês, a não ser para fins escolares. Desses 44%, 8% saem menos
de uma vez, 5% até uma vez e 31% de duas a três vezes, demonstrando que possuem pouco
contato fora do local de moradia. Os outros 54% afirmaram sair mais de três vezes ao mês e 3%
dos 39 jovens não responderam à questão.
Por fim, ao se auto avaliarem em relação à vida escolar, 67% consideram não faltar com
frequência às aulas e apenas 15% relataram já terem abandonado os estudos ou sido
reprovados. A maioria fica de recuperação em, pelo menos, duas matérias no bimestre (77%
desses jovens), mas, por outro lado, 92% se consideram bons alunos, devido aos esforços para
se manterem na escola, garantindo a frequência nas aulas.
60
3 MORANDO NO INTERIOR: REFLEXÕES SOBRE A VIDA DOS JOVENS
ESTUDANTES DE BOCAINA
Bocaina é uma localidade pequena e com poucos moradores. Aqueles que ali residem
são, normalmente, nativos de longa data e escolheram criar suas famílias lá por não terem como
se assegurar em outra localidade. O local de moradia dessas famílias, segundo relatos nas
entrevistas, foi adquirido por meio de heranças deixadas de pais para filhos.
Ao chegar à localidade, logo vemos uma pequena capela e um pequeno trevo que nos
leva à rua principal, que divide Bocaina em Bocaina de Cima e Bocaina de Baixo. A rua
principal é de calçamento e as demais tratam-se de pequenas estradinhas sem pavimentação que
dão acesso às casas que, em sua maioria, são sem acabamento.
As famílias residentes em Bocaina são, em grande parte, extensivas e possuem um
vínculo muito forte com a terra, alguns sobrevivem da agricultura e criações, outros trabalham
na região urbana próxima. Esses moradores passam a maior parte de seu tempo por lá, mas
precisam se deslocar para estudar, fazer compras, ir a bancos ou procurar uma unidade de
saúde, pois esses serviços não são oferecidos na localidade, onde percebo pouca presença do
poder público.
Neste capítulo, apresentaremos a visão dos moradores de Bocaina, quem são essas
pessoas e o que pensam sobre a escolarização de seus filhos. Esses dados foram coletados
através de 5 entrevistas com familiares dos jovens, em específico com suas mães, irmã mais
velha ou avó, e serão apresentados como perfis de configuração a visão dos moradores de
Bocaina sobre o processo de escolarização de seus filhos. A proposta da seção item 3.2 será de
refletir sociologicamente sobre as informações obtidas nos relatos das mães ou familiares dos
jovens, cujas falas foram transcritas e editadas na íntegra e acrescidas com minhas
interpretações. Por fim, utilizarei o suporte teórico para as análises dos fatos relatados e
observados durante as entrevistas a fim de atender aos objetivos propostos nesta pesquisa.
61
Abaixo demonstro através da figura 2 as características gerais das famílias entrevistadas de
Bocaina:
Figura 2 – Características gerais das famílias entrevistadas de Bocaina
Fonte: Elaborado pela autora
3.1 A visão dos moradores de bocaina: quem somos nós?
Nesta seção, apresento a visão dos moradores de Bocaina, em específico a visão de
mães e familiares dos jovens moradores da localidade, sobre o processo de escolarização dos
jovens que estudam em Cachoeira do Campo.
Esta apresentação tem o objetivo de conhecermos as dinâmicas familiares e as práticas
educativas adotadas por estas famílias para manter os seus filhos na escola.
De certa maneira, esses jovens já alcançaram o sucesso escolar por estarem cursando o
Ensino Médio, mas proponho identificarmos, através de suas falas, quais são as perspectivas
futuras dessas famílias em relação aos estudos.
Conforme descrito na metodologia de pesquisa, no Capítulo 2, foram selecionadas cinco
famílias moradoras de Bocaina que tinham jovens que cursavam o Ensino Médio em uma
escola estadual em Cachoeira do Campo para uma análise mais aprofundada. Participaram
62
destas entrevistas uma avó e quatro mães. Conforme descrito no TCLE, os nomes dos
entrevistados e dos alunos não serão identificados, a fim de preservar suas identidades, por isso,
serão substituídos por nomes fictícios.
Nas próximas seções, procuro demonstrar, de forma mais próxima à realidade dessas
famílias, os aspectos mais marcantes das entrevistas e, ainda, interpretar os dados observados e
obtidos durante o contato mais próximo com eles.
Por fim, na seção 3.2 será realizada a análise dos dados embasada nas teorias utilizadas
para que possamos compreender a realidade dessas famílias durante o processo de
escolarização de seus filhos. Assim sendo, serão utilizadas, como eixos centrais, as categorias
de análise: a) Esforços familiares no processo de escolarização dos filhos; b) A importância da
escola para a família; e c) A representação do local de moradia para essas famílias.
3.1.1 Entrevista da Família 1: Iraci, a avó da jovem Raiara
A mãe dela morreu, ela ficou com oito anos, né, oito ou sete? Oito. Com oito anos, até
hoje, ela vai fazer 16 anos, graças a Deus. Ajudo e eu tô cuidando dela, até quando
precisar de mim eu tô aí (Iraci, avó de Raiara).
Raiara é uma jovem de 15 anos que reside em Bocaina de Baixo, região localizada no
distrito de Rodrigo Silva, na cidade de Ouro Preto. A sua história de vida neste local se iniciou
aos oito anos de idade quando sua mãe faleceu e a jovem foi morar com seus avós, tia e dois
primos em uma casa humilde que possui criação de bodes, peixes e gansos.
No caminho, enquanto procurava a casa da jovem, fui perguntando às pessoas que via
pela rua se conheciam a jovem e todos me direcionaram ao caminho correto, pois se trata de um
lugar pequeno, onde a vizinhança nativa é muito antiga e todos se conhecem. Ao chegar à
porteira indicada por uma senhora, vi um senhor capinando e juntando lenha na beira da estrada
e o perguntei se conhecia a jovem. O mesmo logo abriu a porteira e me chamou para entrar, era
o avô da garota. Mesmo sem me conhecer, demonstrou muita hospitalidade. Apresentei-me e
disse a ele que gostaria de conversar com o responsável pela Raiara, pois ela estava
participando de uma pesquisa e gostaria de convidá-la para a entrevista. O senhor desceu o
morro comigo e, por um instante, pediu para que eu esperasse parada enquanto espantava os
bodes. Passamos, então, por uma lagoa, por gansos e alguns bodes, até chegar à casa onde
estava Raiara. Ele disse que chamaria a avó, pois ela estava na colina buscando lenha.
63
Raiara me recebeu e ficamos conversando no jardim. No primeiro momento, ela não se
lembrou de mim. Houve períodos de silêncio da jovem, que ficou um pouco acanhada. Fomos
conversando, mostrei o questionário respondido por ela na escola e, assim, ela se lembrou da
ocasião em que fui à escola para a aplicação do questionário, no ano passado. Como sua avó
estava demorando, Raiara assobiou bem alto, como um sinal de comunicação, por trás do
bambuzal sua avó gritou: “Já estou chegando!”.
Então, após uns dez minutos de conversa com Raiara no jardim, ela foi se soltando e me
perguntando sobre a pesquisa. Enquanto isso, observei o pomar que tinha pés carregados de
frutas e as criações soltas pelo terreiro. Logo pude imaginar que esta família parecia viver da
agricultura familiar, mas ainda sem esta certeza.
Nesse tempo de espera, Raiara foi me mostrando as plantações, e disse para eu esperar
para não ter que voltar depois. Finalmente, se aproximou de nós uma senhora com um lenço na
cabeça, com uma roupa um pouco suja devido ao fato de estar carregando lenha, além de uma
moça mais nova e desconfiada e de um rapaz que olhava despistadamente, sem entender quem
era “eu”, esta moça que nunca havia passado por ali.
Logo que sua avó e sua tia chegaram mais perto, me apresentei a elas. O rapaz seguia de
lado, um pouco acanhado (este rapaz se trata do pai de Raiara). Fui convidada, então, a sentar-
me junto com a avó na sala simples, onde tinha dois sofás, uma parede bem descascada e já
sem pintura, mas bem arejada. Dona Iraci, muito comunicativa, disse que aceitava conversar e
participar da entrevista e que responderia o que soubesse responder. A tia de Raiara ficou por
alguns minutos sentada conosco, mas não foi de muita conversa, apenas observava e
rapidamente se ausentou. Muito me admirou que o pai de Raiara foi se aproximando, primeiro
apareceu na porta, ficou rodeando, até que eu perguntasse para Dona Iraci quem era aquele
rapaz, e, então, me apresentei a ele. Foi assim que ele se assentou na janela e, entre as falas da
avó, completava com algumas informações. Ele se demonstrou muito envolvido com a filha,
embora não morasse ali com elas. Raiara, mesmo morando afastada da cidade e não saindo
muito da região em que vive, parece ser uma menina feliz e muito amada.
Dona Iraci, avó de Raiara, tem 65 anos e é casada. No momento da entrevista, todos os
moradores de sua casa encontravam-se desempregados. A avó contou que sempre morou em
Bocaina e, em relação à composição de sua família, falou com muito orgulho de seus quatro
filhos, sendo duas mulheres e dois rapazes, um deles o pai de Raiara. Quando pergunto sobre o
seu esposo e sobre o trabalho formal, ela logo disse:
64
Sou casada. Mora aqui também. É aquele que tá lá. É aquele que te recebeu que é meu
marido. Não, nesse momento, eu não tô não. Ele também não. Não. Já trabalhei.
Trabalhei quatro anos na escola, mas tem muitos anos. Depois trabalhei na Cachoeira
ali, na Aldebaram, numa casa, 11 anos (Iraci, avó de Raiara).
Para conhecer um pouco mais sobre a história de vida da jovem Raiara, procuramos
entender como foi a vida escolar de sua avó, considerada a principal figura materna dela, após o
falecimento de sua mãe. Para isso, realizamos uma conversa sobre o passado, sobre as práticas
familiares empreendidas pelos pais de Dona Iraci a fim de entender como essas práticas
familiares são, hoje, empreendidas com Raiara.
Então, iniciamos a conversa falando sobre a escolaridade de Dona Iraci, e comecei
perguntando sobre até quando havia estudado, como era, para ela, estudar e por quais motivos
tinha parado de estudar. Pela sua fala, percebi o quanto foi difícil a sua infância, tendo que
conciliar os estudos com o trabalho doméstico e os cuidados com os irmãos mais novos, já que
teve pouco apoio do pai em casa.
Na fala a seguir, tenho a impressão de que Dona Iraci quer recuperar aquilo que não
teve a oportunidade de fazer, através das realizações de seus filhos. Por saber a dificuldades
enfrentadas em sua infância e em sua vida adulta com a baixa escolaridade e baixa
oportunidade de trabalho, ela disse que:
Eu parei, eu ajudei muito mamãe, entendeu, mas não continuei a escola também não.
Agora, meus filhos, eu quero que eles continua. Meus filhos (Iraci, avó de Raiara).
Quando falamos sobre os incentivos de seus pais durante a sua escolarização, ela disse
que passou muitos “apertos”. Perguntei, então, se alguém ajudava nos deveres de casa e como
eram seus professores, e ela respondeu, pensativa:
Ah, aquela época, quase não, quase não tinha não, né. Naquelas época não, era só a
gente só e era muito aluno, mas são todos legal entendeu, todos legal mesmo (Iraci,
avó de Raiara).
Percebe-se que Dona Iraci vem de uma família com baixo capital escolar e, quando
perguntei se seus pais estudaram, ela disse que: “Não, a minha mãe, eu não lembro. Eu só sei
que eles não sabiam ler. Não”. A sua aprendizagem foi através de sua vivência, apesar de ter
estudado pouco, é uma senhora muito ativa e comunicativa, sente muito por não ter apreendido
a ler, mas sabe que, naquela época, tinha que ter forças para ajudar a sua mãe, que passou por
dificuldades em seu relacionamento e, principalmente, de ordem financeira, por ter perdido o
seu marido logo cedo, com crianças ainda em idade escolar. Ao tratarmos do assunto “leitura”,
65
ela se confundiu quando perguntei se ela gostava de ler e se tinha livros em sua casa. Pensou
por instantes e disse:
Não. Não sei ler direito não. Conheço tudo quanto é letra, ajunto e sei o que que é
entendeu. Sei tudo quanto é letra direitinho, mas não sei juntar. [riso] Ai, ai. Nayane
me ajuda. Todos eles, minha caçula também tá com 19 anos (Iraci, avó de Raiara).
Dona Iraci contou que seus pais incentivavam os estudos, mas não tinham condições
para manter os filhos na escola. Assim, ela e seus irmãos passavam apertos para fazer as tarefas
escolares.
Quando falamos dos estudos de sua neta, ela disse que espera o melhor, que continue
estudando, apesar da sua casa ser longe da escola. Hoje, a neta precisa acordar muito cedo para
pegar o ônibus no ponto e a avó relatou que Raiara só falta as aulas quando está doente.
Observando as mudanças ocorridas, ela relatou que, antigamente, tinha que andar
quilômetros para chegar à escola a pé, e, hoje, com a facilidade dos ônibus escolares, está tudo
bem melhor. Chamou a atenção para os cadernos de hoje em dia e para as mochilas bonitas,
pois, antigamente, carregavam seus poucos pertences em saquinhos de arroz.
Hoje, Raiara não trabalha fora, fica por conta apenas dos estudos e da casa, por isso, é
muito cobrada pelo seu pai, que, apesar de não morar junto e ter pouco estudo, apenas até a
sétima série, sempre está presente.
Dona Iraci também contou, com muito orgulho, que tem um filho que está no seminário
estudando para ser padre, e que este é o “cabeça” da casa, quem incentiva a todos, inclusive a
Raiara. Este filho atingiu a longevidade escolar até o Ensino Superior, cursou Biologia. Ela fala
que, “graças a Deus”, ele se salvou entre os demais filhos.
A avó de Raiara contou, entristecida, que não pôde dar atenção e carinho para seus
filhos durante a infância, e que isso pode tê-los prejudicado. Esse carinho é dado, hoje, à sua
neta. Por fim, ela e o pai da jovem demonstram muita preocupação com seu futuro, e
acompanham de perto a sua vida escolar, suas amizades e o namoro, embora seu pai não aprove
este relacionamento por ela ser muito nova. Acreditam que não adianta bater nem reprimir, o
que precisam é de muita conversa. Eles contaram que a garota passou no Instituto Federal
Minas Gerais – Campus Ouro Preto, mas, devido à falta de internet, não viram a tempo e ela
perdeu a vaga, isso com muito pesar.
66
3.1.2 Entrevista da Família 2: Rosana, mãe de Poliane, cunhada de Raiara
Poliane é uma jovem de 16 anos, moradora de Bocaina de Cima desde o seu
nascimento. Ela é filha de mãe solteira, Dona Rosana, que teve oito filhos: seis homens e duas
mulheres, que já estão, em sua maioria, casados e morando fora.
Em relação à composição familiar, moram dois irmãos e um amigo em sua casa, mas
não foi detalhado o vínculo e os motivos para este último morar lá. Fui encaminhada até a sua
casa através do apoio de Poliane, que é cunhada de Raiara. As duas moram bem próximas.
Raiara me apresentou, então, para a sua sogra, a Dona Rosana, uma senhora emagrecida e com
um lenço sobre a cabeça, e perguntou se ela podia me receber. Rosana, muito disponível e
simples, me convidou para entrar. Logo em sua sala, encontrei Poliane deitada no sofá
assistindo à televisão.
Sua casa é bem pequena e de tijolo à vista. Então, a jovem se espremeu no sofá e
sentamos, as três, para iniciar a entrevista. Mostrei para Poliane o questionário respondido por
ela e, bem tímida, ela se recordou do momento. Ela participou da entrevista como ouvinte, e
ressalto que gostaria de ter realizado apenas com a sua mãe, mas ela não tinha para onde ir.
Apesar disso, observei que a jovem não prestou muita atenção, pois estava cuidando de seu
sobrinho pequeno, que lhe desviava o foco por todo o tempo. Durante a entrevista, por vezes,
entravam algumas galinhas pela sala.
Inicialmente, Dona Rosana se apresentou e falou sobre a sua profissão com muito amor
ao que fazia. A senhora trabalhou como auxiliar de limpeza em uma empresa terceirizada da
mineradora Vale, em Vargem Grande, por cinco anos, mas, no momento da entrevista, estava
desempregada. Ela estudou até a 4ª série do Ensino Fundamental em Bocaina, onde nasceu e
morou por toda a vida.
Em relação à escolaridade de Dona Rosana, começamos a conversar para compreender,
hoje, como isso se reflete na escolaridade de sua filha. Ela disse que parou de estudar para
trabalhar e ajudar a sua mãe, que ficou viúva muito cedo. Sua mãe não trabalhava fora e não
tinha ganho nenhum para sustentar a família. Relatou ter sido uma fase muito difícil de sua
infância. Não soube dizer se todos os seus sete irmãos estudaram até o Ensino Médio, mas
garantiu que estudaram mais do que ela.
Ó, eu aprendi um pouquinho só, sabe, mas, depois que eu parei de estudar, eu não
peguei mais um livro pra estudar nem nada. Eu pegava mais era caderno pra escrever.
67
Adorava. Agora não. Muita coisa eu não sei ler não. Alguma coisinha eu sei (Rosana,
mãe de Poliane).
Quando pergunto se seus pais incentivaram a ela e aos seus irmãos a estudarem, ela
disse que sim. Seus pais não foram estudados e não sabiam ajudá-los nas tarefas escolares, que
eram feitas em casa. Quando tinham dúvidas, era necessário recorrer aos vizinhos, pois, em
casa, ninguém era escolarizado. Assim, Dona Rosana fez uma relação, na fala abaixo, com os
dias de hoje, se posicionando quanto à escolarização de seus filhos.
Incentivava. Mandava a gente pra escola, não deixava a gente faltar de aula à toa de
jeito nenhum. Não deixava não. Bom, se tivesse doente, aí sim, mas, do contrário, não
deixava não. A mesma coisa hoje com esses menino: se tiver doente, não vai na escola
não, agora, se não tiver, tem que ir estudar. Tem que estudar. Que hoje em dia, pras
pessoas ter as coisa, tem que estudar. Mesmo muitas que tem estudo tá difícil, imagina se não estudar né, é complicado (Rosana, mãe de Poliane).
Hoje, na casa de Dona Rosana, quem ajuda os irmãos a fazerem as atividades escolares
é a irmã mais velha, ela estudou até o Ensino Técnico e, atualmente, mora em Belo Horizonte,
onde trabalha. A única que está estudando, no momento, é a Poliane, a filha caçula, pois o seu
irmão abandonou os estudos.
Ah, lá, aquele lá parou, ó. Parou na 5ª. Ah, diz que esse ano ele vai voltar, né, não sei.
Eu espero que ele volte a estudar, né. Ah, tem que estudar, mas ele gosta mais de
trabalhar, estudo ele não... Não, por enquanto, ele tá parado, mas gosta de trabalhar,
trabalhar é com ele, agora estudar... (Rosana, mãe de Poliane).
Segundo a mãe, quando tem que fazer pesquisas, Poliane vai à Ouro Preto de ônibus e
utiliza a internet pública da Câmara Municipal dos Vereadores, paga apenas a passagem para ir.
Dona Rosana falou que ela “não é muito de fazer trabalhos em grupo”, mas, sempre que tem,
ela deixa ir fazer, porém sempre com horário para voltar para a casa. Ela parece ser presente e
regula as ações da filha. Completou dizendo:
Não sou não. Não sou mansa, né. Eu gosto de corrigir, também não sou de bater
também não. Gosto de chamar atenção, conversar, explicar. Com certeza (Rosana,
mãe de Poliane).
Durante o percurso da escolarização da filha, sua mãe acha difícil acordar muito cedo,
mas disse que logo eles se acostumam. Até o momento, não teve problemas escolares com a
sua filha, costuma ir à escola quando tem que buscar as notas, mas não frequenta os eventos,
vai em outro dia.
68
Percebe-se que a sua maior preocupação é a filha desviar se dos estudos e seguir
pessoas mal intencionadas. Ela falou que a melhor coisa que uma pessoa pode ter é os estudos
e, por isso, gostaria que seus filhos tivessem aquilo que ela não teve, a oportunidade de ter.
Dona Rosana completou a afirmação com a fala:
Ah, ela melhorou bastante, eu acho. Principalmente, né, nos estudo, ela deu uma
caminhada boa. É. A escola, lá, os aluno tudo com uniforme, igual os professor lá falou que tem menino que, às vezes, sai de casa pra estudar, mas dentro da sala não
entra. Fica na rua. E eu já falei com ela, se eu souber que ela ficou na rua, ela vai
tomar um coro, e aí eu bato (Rosana, mãe de Poliane).
69
3.1.3 Entrevista da Família 3: Mariana, a irmã mais velha
Talita é uma jovem de 15 anos que reside em Bocaina de Cima. Ela morava na
localidade desde o seu nascimento, há 15 anos, com seus pais, três irmãos, o namorado, o
cunhado e a sobrinha. A visita a esta família foi diferente de todas as outras, porque tive um
pouco de dificuldade de encontrar a sua casa, pois era em uma região mais alta de Bocaina, e
foi preciso entrar em terrenos de vizinhos para chegar até lá.
Ao chegar ao local indicado por alguns moradores, me deparei com uma camionete e
com quatro pessoas ajeitando móveis e pertences dentro dela. Perguntei se ali era a casa da
jovem Talita e fui informada, por ela mesma, que sim e que estavam de mudança. Pedi para
conversar com a sua mãe ou responsável, mostrei o questionário respondido por ela e disse que
ela foi selecionada para continuar na pesquisa. Ela, muito surpresa, então, subiu a rua, chamou
a sua irmã mais velha e me apresentou a ela, pois sua mãe estava trabalhando em uma empresa
e só chegaria à noite, pois trabalha em turnos.
Conversei com as duas e disse que, se não fosse uma boa hora, retornaria em outro
momento. Logo, sua irmã disse que não estava incomodando e que poderia me receber. A
conversa iniciou-se ali mesmo, do lado de fora da pequena casa sem acabamento e com quatro
cômodos, com nós três sentadas em uma beirada de pedra.
Expliquei à sua irmã mais velha sobre a pesquisa e a mesma se interessou em participar.
Ela disse ser responsável pela irmã, pois sua mãe passa muito tempo fora. Contou que sua mãe
era casada, estudou até completar o Ensino Fundamental, mas que parou os estudos, pois teve
que trabalhar para se sustentar e, logo após, se casou e teve que cuidar dos filhos.
A mãe de Mariana e Talita, atualmente, trabalha na área da empresa Vale. Em relação
ao seu pai, Mariana relatou que ele também não terminou os estudos e que estavam de
mudança, pois seus pais se separaram recentemente e os filhos acharam melhor acompanhar a
mãe para o distrito de Amarantina, para onde estavam se mudando.
A irmã mais velha de Talita, então, contou que se formou no Ensino Médio, com
orgulho por ter conseguido, mas não demonstrou gostar de estudar. Contou que não teve
dificuldade para ir para a escola em Cachoeira do Campo, pois já tinha o ônibus escolar
ofertado pelo município.
Quando perguntei se existia alguém na família que acompanhava a vida escolar de
Talita, ela disse, imediatamente, que sua mãe sempre cobra e que o pai, por mais que não tenha
estudado, é bom em Matemática e ajuda nos trabalhos escolares.
70
Contou também da tristeza da mãe por seu irmão não ter concluído o Ensino Médio.
Quando falamos sobre os irmãos que ainda estudam, ela disse que apenas a Talita continua na
escola e que as outras irmãs se formaram no Ensino Médio.
Os trabalhos escolares de Talita são feitos sozinha, pois ela mora longe dos colegas. Sua
irmã contou que, quando tem trabalhos em grupo, Talita divide as tarefas com os colegas e que
cada um se organiza em sua casa e, quando chegam à escola, apresentam juntos.
Mariana, a irmã mais velha, falou o quanto está difícil, hoje em dia, ficar sem estudar,
pois não se consegue um bom serviço. No momento, ela está desempregada e fica encarregada
de cuidar da casa e de Talita. Talita apenas estuda, agora terá que utilizar o transporte pago,
pois não existe ônibus escolar gratuito entre Cachoeira do Campo e Amarantina. Mariana
relatou não ter internet em casa e que, quando precisa utilizar, tem que colocar crédito no
celular e ir para algum lugar que pegue bem o sinal ou, ainda, ir para uma lanhouse.
Mariana comentou que gostava de morar em Bocaina, porque não tinha outro lugar e
nem motivos para sair de lá, mas que agora tem.
Ah, gostava, né, não tinha outro lugar, agora tem, agora nós sai daqui. É que não tinha
outro lugar, não tinha motivo pra sair daqui, agora tem (Mariana, irmã de Talita).
Quando perguntei o que ela desejava para a sua irmã após o término do Ensino Médio,
demonstrou, neste momento, com seriedade em suas palavras, que desejava que sua irmã
fizesse um curso após o Ensino Médio, coisa que nenhum de seus outros irmãos e irmãs
puderam fazer.
3.1.4 Entrevista da Família 4: Ana, a mãe protetora de Raissa e Renato
Dona Ana, tem 43 anos, é solteira e, há 25 anos, mora em Bocaina. Estudou em Bocaina
até a 4ª série e não concluiu o Ensino Fundamental. No momento, relatou ser cuidadora no asilo
de Ouro Preto e trabalha em dias alternados em uma escala de 12 x 36 horas. Ela tem quatro
filhos e todos estudaram e já trabalham, apenas Raissa a terceira filha e Renato, filho caçula
ainda estudam em Cachoeira do Campo e ainda não trabalham. Relatou que seus filhos
estudaram o Ensino Fundamental em Bocaina.
Quando conversamos sobre seus estudos, Dona Ana relatou ter abandonado a escola,
pois precisou trabalhar durante a sua infância e começou a ajudar os seus pais com 14 anos. Ela
71
tem quatro irmãos e falou, com dúvida, que apenas o mais novo chegou a se formar no 3º ano e
concluir o Ensino Médio. Contou o quanto passou dificuldades, principalmente para estudar,
pois morava no alto de uma colina e tinha quer descer a pé para estudar.
Naquela época, ela não tinha ninguém para ajudá-la nas tarefas escolares, “tinha que se
virar”, como ela mesma contou. Às vezes, alguns amigos a ajudavam na escola, mas em casa
não. Comentou que seus pais não tinham a noção da importância dos estudos e que não davam
muita importância para isso, e que, apenas hoje, ela consegue enxergar isso.
Por isso, Ana não se cansava de dizer, durante a entrevista, que o que mais quer é que os
filhos estudem que apenas isto bastava para ela. Ela disse que sempre ajuda nos trabalhos
escolares, até aonde ela sabe e que, quando são em grupo, eles são feitos na escola, após a aula,
então os filhos deixam de voltar no ônibus escolar para casa e utilizam o transporte pago.
Dona Ana demonstra ser uma mãe presente e reguladora. Em sua casa, há “horário para
tudo”, apesar de não ter muito tempo para “ficar de cima”, diz estabelecer horários,
principalmente, para os jovens voltarem para casa quando saem.
Segundo a mãe, Raissa e Renato tinham dificuldade para utilizar a internet, mas, no mês
da entrevista, havia sido colocada uma antena popular em Bocaina. Relatou que ela ainda não é
boa, mas já vinha ajudando bastante. Em relação à mobilidade, a família mora perto do ponto
de ônibus e da rodovia.
Quando perguntei se seus filhos são bons alunos, ela disse não saber, apenas agradece a
Deus por tê-los. Mas afirmou, em seguida, que “pega muito no pé deles para estudarem”, e
relatou nunca ter passado por problemas com eles na escola, que sabem quando têm que
estudar.
Dona Ana disse que costuma sair de Bocaina apenas para trabalhar em Ouro Preto, em
dias alternados, e afirmou passar a maior parte do tempo em Bocaina. Quando saem em família
é para comer pizza, mas isso não é muito comum para eles.
Fico a maior parte do tempo aqui mesmo (Ana, mãe de Raissa e
Renato).
Ao final da entrevista, relatou que não gosta de morar em Bocaina e que já pensou,
muitas vezes, em se mudar, mas não tem para onde ir. Ao mesmo tempo, tem medo do
desconhecido, de uma nova vizinhança que não conhece, de ficar desamparada, pois é apenas
ela para cuidar da família.
Outro medo manifestado, por ela, foi o de seus filhos irem para Cachoeira do Campo
estudar e se envolverem com drogas, fora isso, acha a rotina tranquila. Não costuma frequentar
as reuniões da escola, pois, muitas vezes, ela está trabalhando. A festas e comemorações não
72
gosta de ir. Embora falte tempo para a mãe acompanhar os filhos, relatou que, em suas folgas,
está sempre perto e conversa muito.
Por fim, ela disse que percebeu o desenvolvimento de seus filhos quando saíram para
estudar em Cachoeira do Campo, porque foram amadurecendo e, agora, precisa confiar neles.
3.1.5 Entrevista da Família 5: Geralda, o trauma de infância
Geralda é mãe de três filhas, casada e moradora de Bocaina de Cima há 22 anos. Suas
filhas, Amanda e Ana Paula, são estudantes da escola de Cachoeira do Campo. Atualmente,
trabalha fichada como auxiliar de serviços em Cachoeira do Campo e seu esposo trabalha
fazendo “bicos” em Bocaina, pois ele tem deficiência após ter um Acidente Vascular
Encefálico.
Ela estudou em Belo Horizonte, em um orfanato, até a 5ª série e não concluiu o Ensino
Fundamental. Relatou que seu esposo estudou até a 7ª série e também não concluiu esta etapa
da escolarização. Sua história de vida é muito comovente e, durante as nossas duas conversas,
me surpreendi com a sua confiança por me contar detalhes tão fortes de sua vida. Fui ao seu
trabalho no primeiro dia para convidá-la a participar da entrevista e, no outro dia, a sua casa.
Ela, então, me pediu para realizar a entrevista em seu trabalho, pois se sentiria mais à vontade.
Geralda parou de estudar porque a sua irmã foi expulsa do orfanato na época e, por isso,
não chegou a conviver com ela nem por três meses. Ela não me contou o motivo deste
incidente. Relatou que foi colocada no orfanato por sua madrinha e que, de 15 em 15 dias, saía
do orfanato e ia para a casa – mas não para a casa da sua mãe, ia para a casa da sua madrinha,
que, em pouco tempo, faleceu, e, assim, ela passou a não sair mais. Em seguida, por volta dos
nove anos, a sua mãe a tirou de lá também. Ela contou o quanto gostava de estudar lá, pois
tinha horários para tudo, livros e era bem supervisionada. Comentou, com orgulho, que
acordava às 5 da manhã e iniciava as suas rotinas, tudo bem regulado.
Contou que tem dois irmãos e que todos se formaram, apenas ela não. Falou que seus
pais não a incentivaram a estudar, que foi para o orfanato com dois anos por ter sido abusada
em casa, e que não teve contato com sua família de sangue. Quando perguntei se recebia
alguma ajuda em casa para realizar as atividades escolares, ela disse:
Não, porque, assim, como eu não fui criada por ela, com dois anos e meio meu pai me
estuprou, aí, a partir daí, eu não fui criada por ela, ela me largou lá no IML (Geralda,
mãe de Amanda, Ana Paula e Vitória).
73
Por toda a entrevista, me inquietei em ouvir a sua história de vida, me perguntava os
motivos pelos quais ela não ia para a casa de sua mãe, fui, então, entender após o relato
mencionado acima. Iara foi abandonada em sua infância após abuso sexual, sua mãe se revoltou
contra ela e sempre disse que ela acabou com o seu casamento e, então, preferiu continuar com
o marido e deixa-la em um orfanato. Ela dizia também que não teve pai, como na passagem
abaixo:
Hum, eu não tive pai não, só mãe, até, quer ver, até uns, até os nove anos mais ou
menos... (Geralda, mãe de Amanda, Ana Paula e Vitória).
Então, o tempo se passou e Geralda se casou e se mudou para Bocaina, onde vive até
hoje e onde teve suas filhas, Amanda, Ana Paula e Vitória. Suas filhas estudaram o Ensino
Fundamental em Bocaina e cursam o Ensino Médio em Cachoeira do Campo.
Quando iniciamos a conversa sobre as suas filhas, pude sentir o quanto isso a abala, pois
todas elas possuem problemas gravíssimos de saúde. Sua filha caçula teve que parar várias
vezes os estudos por estar em tratamento médico contra leucemia, a do meio teve um tumor no
cérebro e a mais velha um câncer na mama.
Ao tratarmos do assunto “escola”, me falou que sempre esteve perto de suas filhas, mas,
com as atividades escolares, nunca pôde ajudá-las, então elas faziam as tarefas sozinhas,
segundo Geralda, porque a distância é longe da casa dos outros colegas. Quando se tratava de
trabalhos escolares em grupo, elas faziam sozinhas, pois eram excluídas na sala de aula,
principalmente, a mais nova, que perdia cabelo devido ao tratamento forte de saúde que está
realizando. Em relação aos meios de comunicação, como a internet, ela nunca teve em casa.
Quando precisavam pesquisar algo, Geralda ia, junto com as filhas, para a biblioteca pública de
Ouro Preto, e então, ficava por perto até que elas terminassem suas tarefas.
Geralda se preocupa muito com as filhas por serem sensíveis à doença. Relatou que elas
não saem de casa, apenas para a escola ou para o hospital. Contou que a rotina diária não é fácil
depois que foram estudar em Cachoeira do Campo, pois precisam acordar mais cedo e chegam
mais tarde em casa. Após chegarem, todos os dias, almoçavam e vão fazer a lição de casa.
No início, foi meio difícil, mas, depois, elas viram que era pro bem delas que eu tava
explicando, né. Que aí, como se diz, que aí sofre menos. Isso (Geralda, mãe de
Amanda, Ana Paula e Vitória).
74
A mãe das jovens nos contou sobre as dificuldades que passou com as filhas na escola,
pois eram reprimidas pelos colegas. Muitas vezes, suas filhas chegavam chorando em casa e aí
tinha que conversar muito com elas. De acordo com Geralda, Vitória perdia muito o conteúdo
e, quando tinha avaliações, às professoras repetiam para ela, conforme demonstrado na fala
abaixo:
Teve problema de saúde. Faltava muito com problema. Perdia, mas aí levava atestado
e o professor ia lá e repetia (Geralda, mãe de Ana Paula, Amanda e Vitória).
As mudanças observadas nas jovens após irem estudar foram as já mencionadas:
repressão, sentimento de inferioridade e impotência perto dos colegas. Segundo a sua mãe,
a diferença, assim, que elas não tinham muitos amigos, né. Não. Ah, talvez por
problema delas mesmo. Ah, acho que sim. E pelos outros também, porque, muitas vezes, né, coordenador, diretor já me chamou na escola. Que, às vezes, algum colega
falava alguma coisa, né, que chateava (Geralda, mãe de Amanda, Ana Paula e
Vitória).
Hoje, as garotas aprenderam a lidar com a situação, elas têm uma tia em Belo Horizonte
que ajuda a cuidar delas quando estão em tratamento. Ela é enfermeira e entende melhor o que
fazer. Geralda fala que um ano é diferente do outro, que sempre tem mudanças, seja na escola
ou na vida particular, que espera que suas filhas se recuperem e prossigam os estudos.
Relatou que gostam de morar em Bocaina. A casa é herança da família e possui seis
cômodos. Recentemente, ficaram sem telhado, pois as telhas de amianto se quebraram em uma
chuva de granizo, em 2015, ela contou.
Por fim, Geralda falou que os pais têm que ajudar a educar os filhos e não devem deixar
a responsabilidade somente para a escola, como foi a sua história. Ela acredita que a educação
vem de casa e a escola é só um complemento. Relatou também que, se tivesse o Ensino Médio
em Bocaina, preferiria que as meninas estudassem por perto, pois fica muito preocupada com a
estrada e se as meninas estão sempre em sala de aula.
75
4 ANÁLISE DOS DADOS: A mobilização familiar
Conforme mencionado no início do capítulo 3, as histórias de vida aqui apresentadas
foram construídas através das falas das cinco entrevistadas durante o percurso desta pesquisa,
essas entrevistas foram feitas com mães, avós ou irmãs responsáveis pela escolarização dos
jovens moradores de Bocaina.
Em relação ao perfil dessas famílias, se caracterizam por famílias de composição
extensivas, somente a família 5: Geralda (mãe de Iara) é considerada nuclear, onde a figura
paterna é mais presente. As famílias extensivas eram bastante comuns principalmente no meio
rural, onde cada um dos membros do grupo tinha papel claramente definido na produção da
vida cotidiana. Porém, de acordo com estudos de Camarano (2014) na contemporaneidade
surgiram novos modelos familiares que acarretaram mudanças e transformações no seio
familiar, tornando as relações menos hierarquizadas entre os membros da família. Com tal
flexibilização das relações e com as dificuldades econômicas encontradas pelos mais jovens
para constituir família em novo domicílio, atualmente é significativo o número de famílias
extensivas tanto no meio rural quanto no meio urbano.
Na família 1, quem é responsável pela Raiara é a sua avó paterna, Dona Iraci. A jovem
precisou ir morar com a sua avó ainda na primeira infância após o falecimento da sua mãe. De
acordo com Coutrim et. al (2007), o papel das avós no domicilio vem mudando de acordo com
as transformações da família contemporânea e os mais velhos ocupam importante função na
organização da casa e no cuidado de crianças e jovens em idade escolar.
A familia 2, é uma família extensiva, sem a presença da figura paterna. Na família 3
houve uma separação recente dos pais e moram na mesma residência cunhados e sobrinhos. Já
a família 4 se caracteriza por ser uma família monoparental, onde tem-se a presença apenas da
figura materna responsável pela educação e criação dos filhos e por fim, a família 5 é nuclear,
com a presença de pai e mãe no meio familiar.
Ao iniciarmos esta análise começaremos pela a escolarização dos ascendentes destes
jovens, para que assim, possamos compreender melhor as práticas educativas empreendidas
pelos pais ou responsáveis. Conforme mencionado anteriormente, as trajetórias escolares desses
jovens e as práticas educativas familiares foram analisadas a partir de três categorias que nos
76
auxiliam a tecer estas histórias: a) Esforços familiares no processo de escolarização dos filhos;
b) A importância da escola para a família e c) A representação do local de moradia para essas
famílias.
Essas categorias possibilitaram nortear as visões que as famílias têm sobre o tema e
facilitaram a reflexão sobre os esforços aplicados na vida cotidiana dos jovens. As conversas
com as entrevistadas foram orientadas por perguntas que foram instigando a memória dos
depoentes buscando conhecer desde a vida escolar de seus pais e irmãos, a sua vida escolar até
chegar aos dias de hoje, na vida escolar de seus filhos, momento que trouxe emoção para os
relatos.
Os dados da pesquisa demonstram um perfil familiar de baixo capital escolar que vem
desde os avós dos jovens pesquisados até a suas mães. Coutrim et al. (2007), considera que o
nível de escolarização dos avós no Brasil ainda é baixo, embora venha melhorando. Assim
como nas pesquisas de Lahire (1997; 2008), o nível de renda e nível de escolarização são
bastante próximos em famílias de camadas populares, o que se difere de uma família para outra
são as diferenças secundárias vividas no seu interior.
As avós das depoentes são descritas como provenientes do meio rural e analfabetas, mas
mesmo sem nunca terem frequentado a escola, eram dotadas de saber prático que possibilitava
a elas lidar com a vida social na época. As depoentes, por coincidência todas as mulheres, não
tiveram a oportunidade de continuar a estudar ainda durante a infância, concluindo até no
máximo a 7ª série, algumas sabem escrever pouco mais que o seu próprio nome e apenas uma
domina a leitura e a escrita.
4.1 Esforços familiares no processo de escolarização dos filhos
Inicio este item contando um pouco da história dia vida das mães, irmã e avó
responsáveis pela a escolarização das jovens pesquisadas. Em seguida abordamos os esforços
familiares de escolarização realizadas por essas famílias.
As histórias de vida dessas depoentes não foram fáceis, vieram de famílias grandes e
pobres, com baixo capital escolar, cultural e econômico. Conforme demonstrado nos estudos de
Bourdieu (1998) para o processo educacional acontecer é preciso da interação de vários capitais
77
como o capital cultural, econômico e escolar e essa interação começa em casa. Foram crianças
criadas em roça sem recursos para se manter na escola e muitas vezes sem condições de arcar
com as próprias despesas.
Através dos relatos, percebemos que foram criadas em sistema rigoroso de trabalho
durante a infância, apesar dos pais cobrarem que estudassem não davam condições para isso.
Dona Iraci (Avó de Raiara), família 1, conta que a figura paterna não foi muito presente
na sua casa e que teve que parar os estudos ainda criança para ajudar nas despesas, conforme o
seu relato abaixo:
Parei de estudar porque nós tinha que ajudar muito mamãe entendeu, que o pai da
gente assim, nunca ligou. É, mas ele nunca ligou mesmo, papai tem mais de 40 anos
que morreu, mas nunca ligou, mamãe que sofreu pra cuidar de nós, nós fomos
crescendo pra ajudar ela então... (Dona Iraci, Avó de Raiara)
Raiara (família 1), não teve vínculo com a sua mãe devido o seu falecimento ainda na
primeira infância, então foi criada por sua avó, Iraci. Dona Iraci, conta que não teve muita a
presença de seu pai na infância e relata ter parado de estudar para ajudar a sua mãe no trabalho
e nas despesas, conforme demonstrado abaixo:
Ah, eu no primeiro ano, eu saí fora. É. Só. Ah, trabalhei demais, Nossa Senhora, tô
trabalhando até hoje. Nós somos cinco: quatro moças e um homem. O homem que é o
mais caçulinha, que é o pequeno e nós tinha que cuidar deles tudo. Ah não, porque nós
tinha que ajudar muito mamãe, entendeu, que o pai da gente, assim, nunca ligou. É,
mas ele nunca ligou mesmo, papai tem mais de 40 anos que morreu, mas nunca ligou,
mamãe que sofreu pra cuidar de nós, nós fomos crescendo pra ajudar ela, então...
(Iraci, avó de Raiara).
Mesmo sendo considerada analfabeta Dona Iraci demonstra forte interesse e
preocupação quando se trata da escolarização da sua neta. Neste caso a avó tenta através de sua
história de vida, fazer diferente com a sua neta, para que Raiara tenha mais oportunidades
escolares e possa sobressair nos estudos. É importante ressaltar que embora o pai de Raiara não
tenha continuado os estudos, esse esforço de dona Iraci em prol da escolarização da neta
também foi observado na trajetória escolar dos filhos, uma vez que dois deles possuem nível
universitário, sendo que um tem diploma de Universidade Federal.
Rosana (família 2) a mãe de Poliana, também relata a ausência da figura paterna em sua
infância devido falecimento e por este motivo, teve que trabalhar para ajudar nas despesas da
casa, conforme demonstrado em seu relato.
Bom, na época que eu parei de estudar eu saí pra trabalhar pra ajudar minha mãe,
minha mãe ficou viúva, não tinha ganho nenhum, então eu parei de estudar. (Rosana,
mãe de Poliane).
78
Sobre o processo de escolarização das mães, demonstram através de suas falas motivos
muito parecidos para ter abandonado os estudos ainda no Ensino Fundamental, seja para ajudar
nas despesas de casa (Mariana, irmã mais velha de Talita – família 3) ou para cuidar dos filhos
( Ana, mãe de Raissa – família 4), apenas (Dona Geralda a mãe de Vitória – família 5) teve um
motivo diferente para ter sido retirada da escola pela a sua mãe, conforme ela relata:
Porque eu saí da escola (...). Porque minha irmã foi expulsa na época. Aí minha mãe
me tirou também. É. Tive que parar. Mas depois aí arrumei minha primeira menina e
não voltei mais (Geralda, mãe de Vitória).
De acordo com Lahire (1997), o divórcio, a morte, a situação de desemprego ou
qualquer fragilização familiar pode inviabilizar a projeção do futuro familiar, principalmente
quando envolve o “chefe familiar”. Sendo assim, as entrevistadas das famílias 1,2,4 e 5 relatam
que na época da infância para elas estudar era muito difícil. Apenas na família 3, Mariana (irmã
de Talita) relata não ter passado por dificuldades, pois estudou em época diferente dessas mães
e avó. Dentre as entrevistadas, a representante da Família 5: Geralda (mãe de Vitória), se
destacou dentre as outras quando conta o que representava para ela estudar:
Eu gostava muito porque lá tinha horário pra tudo né, era orfanato então tinha horário
pra tudo. A gente acordava 5 horas todo dia aí depois tomava banho e tomava café
depois ia, escovava os dentes, trocava uniforme e ia pra escola, depois voltava. Tudo
bem regulado (Geralda mãe de Vitória).
Embora tenha vivenciado uma história conturbada no interior de sua família e tenha
sido criada no orfanato, percebemos na história de vida de Geralda uma forte presença do
autocontrole e das normas de comportamentos em que foi criada no orfanato. Lahire (2008) e
Portes (2008) enfatizam a importância de diferentes formas de exercício da autoridade familiar,
que hoje são aplicadas por Geralda em sua casa durante a escolarização de suas filhas.
Já as entrevistadas das famílias 2 (Rosana) e 4 (Ana) argumentam as suas dificuldades,
em relação a mobilidade, falam que já foi muito pior do que as dos dias de hoje, pois tinham
que atravessar montanhas para estudar e correr diversos riscos, que nem sabiam na época.
Era muito difícil. A gente morava lá em cima. Tinha que vir a pé todos os dias né.
Hoje é bem mais tranquilo pra eles. Não tinha não. Com certeza. Tem. Uhum. Não.
Não. Pelo contrário. Hoje é bem melhor. Ajuda. Com certeza. (Ana mãe de Raissa)
Diante dessas dificuldades, a prática da leitura não foi muito presente no cotidiano
dessas mães e avó por falta de escolaridade, pessoas para incentivar e tempo para se dedicarem.
Já a Mariana da família 3, relatou não ler porque não gosta, mas é a única dentre as
entrevistadas que aprendeu a ler na escola e Geralda lia enquanto criança, pois no orfanato
tinha muitos livros. Contudo, atualmente não tem mais essa prática.
79
Dona Iraci, conta com ajuda das netas e filhas que aprenderam a ler, conforme
demonstra em seu relato.
Não. Não sei ler direito não. Conheço tudo quanto é letra, ajunto e sei o quê que é entendeu. Sei tudo quanto é letra direitinho, mas não sei juntar.[riso] Ai, ai. Raiara me
ajuda. Todos eles, minha caçula também ta com 19 anos. Iraci (Iraci, avó de Raiara)
Embora seja mais nova que Dona Iraci, Rosana também conta a dificuldade que passa
para conseguir ler com o pouco que aprendeu, e que ao longo do tempo, por falta de prática foi
se perdendo. Hoje ela lê muito pouco e com dificuldades.
Ó, eu aprendi um pouquinho só sabe, mas depois que eu parei de estudar, eu não
peguei mais um livro pra estudar nem nada. Eu pegava mais era caderno pra escrever. Adorava. Agora não. Muita coisa eu não sei ler não. Alguma coisinha eu sei. (Rosana,
mãe de Poliane)
Para o autor Bernard Lahire (1997), a escola é considerada o “universo da cultura
escrita”, ele considera que entre as famílias populares, como as entrevistadas nesta pesquisa,
possam existir diferentes formas e representações da escrita e da leitura e afirma que os filhos
estabelecem uma relação afetiva através da prática da leitura. Nos seus estudos o autor também
traz dois importantes pontos para a incorporação da linguagem dos filhos, sendo que para a
transmissão da cultura escrita são necessárias também às condições e as disposições
econômicas, além da ordem moral e doméstica.
Outro fato interessante sobre a história dessas mulheres é que em suas famílias a
maioria dos irmãos e irmãs que saíram de Bocaina chegaram a estudar mais do que elas, com
exceção de Mariana, que não respondeu à questão. Podemos visualizar melhor em seus relatos:
Estudou. Estudou tudo (...). Terminou. Só nesse terceiro ano só. Só o terceiro só. Era
mais difícil né menina. Hoje graças a Deus tá tudo fácil né. Graças a Deus, tudo fácil
mesmo. (Iraci, Avó de Raiara)
(...) eu acho que muitos já formou, que estudou mais do que eu né. (Rosana, mãe de
Poliane)
Parece que meu irmão mais novo ele chegou a formar o terceiro. O resto não. Ou foi
oitava, eu não lembro mais. Em Ouro Preto. Eles estudaram aqui e em Ouro Preto.
(Ana, mãe de Raissa)
Estudavam. Todos 2 formou. Só eu que não. É. Não. Porque é meio difícil né.
(Geralda mãe de Vitória)
Os relatos também demonstraram que o incentivo aos estudos sempre existiu, na
maioria das famílias (1, 2 e 3), mesmo que de forma indireta. Rosana fala que seus pais
mandavam seus irmãos e ela para a escola e não os deixava a faltar de jeito nenhum, somente
80
em casos de doença. Ana, por sua vez, relata que seus pais não tinham muita noção da
importância dos estudos, conforme demonstrado abaixo:
Acho que não tinha noção não, né, as pessoas de mais de idade eles não tem noção das coisas. Nem o que é melhor pros filhos né. Hoje eu falo muito pros meus filhos igual
eu falei com meu filho de 17 anos. Eu quero que ele estuda. Só isso pra mim já tá bom
demais. Com certeza. (Ana, mãe de Raissa)
Bem direta ao assunto, Geralda surpreende com sua resposta, ao relatar que seus pais
não a incetivaram a estudar, o que ela aprendeu foi consequência de sua trágica história. Como
não foi criada pela mãe, viveu interna em um orfanato e no tempo em que esteve lá, foi
escolarizada.
Não, porque assim, como eu não fui criada por ela, com 2 anos e meio meu pai me
estuprou, aí a partir daí eu não fui criada por ela, ela me largou lá no IML. Não, aí
quem me criou foi minha madrinha. (Geralda, mãe de Vitória).
Para melhor compreender os esforços familiares das mães, irmã e avó no processo de
escolarização dos jovens de Bocaina foi preciso conhecer a trajetória dos seus antecedentes.
De acordo com Lahire (1997) a estrutura do comportamento de um indivíduo depende da
estrutura de relações estabelecidas com outros indivíduos com quem convive.
Na família 1 apenas Raiara está em idade escolar, seu pai não concluiu o ensino médio e
alguns de seus tios se formaram e a sua avó não concluiu os estudos. Já na família 2, Poliane
está em idade escolar e o seu irmão que abandonou os estudos também. Além dos dois irmãos
também há uma 3ª irmã, que concluiu o ensino médio. Na família 3 apenas a Talita ainda está
em idade escolar e tem duas irmãs que concluíram o ensino médio e um irmão que abandonou
no segundo ano. Raissa e seu irmão Renato (família 4) estudam e os irmãos mais velhos
concluíram o ensino médio, e na família 5 Vitória é a única que ainda estuda, as outras duas
irmãs concluíram o ensino médio. Nota-se que nenhum dos jovens que concluíram o ensino
médio está cursando o ensino superior ou algum curso técnico. Até o momento apenas a Raiara,
conseguiu ser aprovada em um curso técnico na cidade de Ouro Preto, mas perdeu a matrícula,
pois não viu que havia passado, por não ter internet em casa.
Ó o ano passado ela fez uma Escola Técnica, passou e não quis, foi na segunda
chamada e eu nem sabia, a segunda chamada. Agora esse ano... A Escola Técnica é
uma coisa boa, nosso Deus!(Iraci, avó de Raiara)
Todos os jovens das famílias pesquisadas cursaram a primeira etapa do ensino
fundamental em Bocaina, em seguida foram para Rodrigo Silva (outro distrito) e no ensino
médio foram para Cachoeira do Campo, uma transição um pouco diferente de suas realidades
vividas na Bocaina. Eles vivenciaram um momento em que tiveram que estabelecer novos
81
vínculos e redes de relações. Contudo, não as dificuldades vivenciadas não são apenas na
criação de novos relacionamentos e redes de amizades. Eles enfrentam problemas concretos,
relacionados à estrutura para os estudos.
Quando os jovens têm trabalhos escolares as famílias precisam se organizar, pois nem
sempre se tem os recursos em casa. De acordo com os relatos, cada família tem uma figura
principal que ajuda nas tarefas, na família 1 Iraci conta que a neta consegue fazer as atividades
sozinha, pois é muito dedicada, mas quando precisa recorre ao pai (que não terminou o ensino
fundamental) ou aos tios (que têm nível universitário, mas que não vivem na localidade), pois a
avó não sabe ajuda-la.
Já na família 2, Rosana diz que quem ajuda a filha é a irmã.
A irmã dela ajudava ela né, a que tá pra BH, que ela formou em Técnico né, aí ela
sempre ajuda nas matéria. (Rosana, mãe de Poliane)
Assim como a família 1, Poliane, quando precisa de ajuda recorre ao pai, embora ele
não tenha se escolarizado, a avó diz que é muito bom em matemática. Apenas na família 4 as
atividades são realizadas com o apoio dos amigos, talvez pelo motivo da mãe trabalhar fora e
os filhos não terem à quem recorrer. Já na família 5, Geralda diz que ajudava quando as filhas
não sabiam fazer o dever, mas que nem sempre ela sabia as respostas.
Percebo que o momento mais difícil para estes jovens é aquele em que são necessários
trabalhos em grupo, pois a maioria mora longe dos colegas, longe da biblioteca e, além disso,
não possuem internet em suas casas. Partindo deste tema da entrevista, cada uma falou sobre a
estratégia usada por seus filhos, como por exemplo a Mariana, como sua irmã realiza os
trabalhos em grupo:
...é difícil porque Talita estuda sozinha, que não tem ninguém que ela conhece, e então
faz com os meninos e eles dividem, então cada um faz uma parte. É. Aí chega junto e
apresenta. (Mariana, irmã de Talita)
Já a mãe de Poliane conta que sua filha vai para a casa dos vizinhos para fazer trabalhos
escolares.
Fazem na casa do vizinho. Dentro de casa mesmo não tinha não. Sempre tinha um
vizinho pra ajudar a gente né (Rosana, mãe de Poliane).
Acho importante a fala da Ana, mãe de Raissa, jovem da família 4 relata que os
trabalhos em grupo são feitos na escola depois da aula, mas nesse caso, não podem contar com
o transporte público.
Faz na escola. Depois da aula. Transporte. Tem ônibus pago. É (Ana, mãe de Raissa).
82
Já na família 5, Geralda relata que suas filhas não faziam os trabalhos em grupos,
apenas sozinhas, devido a distância da casa das colegas. Conforme demonstrado em sua fala:
Elas fazia mais sozinha. Porque a distância era longe né. É. Saía não. Era só de casa
pra escola e voltava (Geralda, mãe de Vitória).
Para cumprir a rotina escolar, essas famílias precisam se organizar. Lahire (1997) afirma
que para os pais colocarem “ordem em casa” se faz necessário por ordens nas suas ideias.
Tratando a regularidade das atividades, horários e regras como importantes ordenamentos
domésticos capazes de ordenar e organizar as rotinas dos filhos em idade escolar. Essa certa
ordem domestica referida pelo autor facilita o cumprimento das regras da escola, como uma
forma de preparar os jovens para cumpri-las.
Esse ordenamento aparece na fala das mães quando se trata do controle dos horários de
saída e chegada em casa. Apesar de já serem adolescentes, apenas na família de Talita não
existem horários estabelecidos para voltar para casa quando ela sai, nas demais famílias,
existem horários para sair e retornar quando saem sozinhas ou com amigos. Em todas as
famílias foram relatados que saem pouco de casa em família, normalmente quando tem
dinheiro vão à Cachoeira do Campo ou Amarantina, em alguma lanchonete fazer um lanche.
Iraci (Avó de Raiara), revela que a jovem não trabalha justamente para poder se
organizar em relação aos horários para estudar, quando ela chega da aula, após o almoço
normalmente arruma a casa e à tarde fica por conta dos estudos, a avó diz que Raiara gosta
muito de ler e que fica horas em seu quarto lendo livros. A avó e o pai não se preocupam muito
com isso, pois “não precisam ficar cobrando a jovem para estudar”, pois a mesma já tem o
hábito de forma autônoma. Conforme Lahire (1997; 2008) está presente nesta jovem a
autodisciplina. Dona Iraci comenta que a jovem está namorando, mas deixa claro que fiscaliza
e conversa com ela sobre isso, conforme demonstra em sua fala, que repete por várias vezes:
Primeiramente é estudo, pra depois namorar, mas a gente falou, mas é, menino você já
viu né, quando quer uma coisa... Ela tem que ouvir a gente falar porque namorar é
uma coisa simples, ela tá novinha né. Agora os estudos dela que é o primeiro.
Primeiro é o estudo, mas arrumou namorado, eu falei com ela foca a cabeça nos
estudos, namorado pra depois, esquenta a cabeça não. É o que eu falo, eu acho que mulher independente é a melhor coisa da face da terra, mulher ser sustentada por
homem não...Você entendeu? Namorar não faz falta não, o que faz falta é o estudo.
(Iraci avó de Raiara)
Rosana (mãe de Poliane), não estabelece uma rotina para os estudos em sua casa, ela diz
que cobra verbalmente a jovem para estudar, mas que ela apenas faz os deveres de casa,
demonstra em seu relato abaixo:
83
De vez em quando ela pega um livro aí, mas ela não é muito chegada a ler não, muito
não, aqui em casa não, Pega mais é dever pra fazer. Agora a minha outra menina que
formou, que ta lá pra BH, nossa, vê ela lendo dia e noite com um livro na mão. Ela lê
mais, a outra já é mais... (Rosana, mãe de Poliane)
Mariana (irmã de Talita), diz que não existe uma organização estabelecida em relação
aos estudos em sua casa, a sua mãe não passa muito tempo em casa, devido a necessidade de
trabalhar por turnos e afirma não gostar de leitura, conforme transcrito abaixo:
Eu nunca gostei. Nunca gostei. (Mariana, irmã de Talita).
Ana (mãe de Raissa) relata que em sua casa não têm uma organização em relação aos
estudos, mas cobra resultados, apesar de não estar muito presente em todos os dias para poder
acompanha-los. Segundo Ana, sempre que possível conversa com os filhos para saber como
andam os estudos.
Em relação à organização familiar para cumprir as rotinas escolares, na família 5
Geralda (mãe de Vitória) relata que quando está em casa consegue cobrar de perto, mas que
sozinhos seus filhos não param para estudar, sendo necessária muita conversa, conforme sua
fala:
Bom, eu pego muito no pé deles pra estudar, entendeu, só isso... Nem muito tempo eu
tenho, mas eu cobro muito deles. Tem que ficar pegando no pé. Falta muito tempo, é
oportunidade, mas ah sei lá é bom pra gente conversar, saber o que ta acontecendo né,
com certeza (Geralda, mãe de Vitória).
Os trabalhos de Lahire (1997; 2008) e Portes (2008) demonstram que muitas vezes os
pais se sacrificam pelos filhos para que eles cheguem aonde gostariam de ter chegado ou
mesmo para que saiam da condição social em que vivem. Também discute as formas de
mobilização realizadas pelas famílias, afirmando que elas podem ser mais ou menos rigorosas,
de acordo com a família. Muitas vezes esses esforços podem operar de forma menos adequada,
isso dependerá da capacidade familiar para ajudar a criança ou jovem a alcançar os objetivos
que são fixados.
Em todas as famílias pesquisadas, foram relatados pelas depoentes que os jovens são
bons alunos, não tiveram casos de reprovações e nem motivos para castiga-los, embora os
incentivos da maioria das famílias presentes em relação a escolarização não sejam muito
transparentes. Em consonância com os autores pesquisados Portes (2012), Viana (2011),
Nogueira (2011), Thin (2006) e Lahire (1997), os esforços e práticas de escolarização dessas
famílias se caracterizam essencialmente na atenção das famílias voltadas para a escolarização,
não existindo um projeto delimitado, mas sim uma intenção familiar em ver os jovens
alcançando a longevidade escolar.
84
4.2 A importância da escola para as famílias de Bocaina
Em todas as famílias as entrevistas foram realizadas com mulheres, não por escolha,
mas por estarem mais tempo, seja com sua neta, filha ou irmã e participarem de perto de suas
dinâmicas escolares, ou mesmo pela composição familiar.
Quando nos referimos ao significado que as entrevistadas atribuem aos estudos, todas
relatam pontualmente a importância dos estudos nos dias de hoje, demonstrando ser a maior
realização para elas a conclusão do Ensino Médio pelos jovens da pesquisa. Na fala de
algumas mães podemos perceber que muitas esperam que seus filhos concluam os estudos, ou
seja, espelham os seus desejos nas realizações de seus filhos, como demonstrado no relato de
Dona Rosana:
Ah é bom demais nó, eu acho ótimo, porque ela ta tendo oportunidade que eu nunca
tive, entendeu? Então eu gosto de incentivar ela. Que eu nunca tive oportunidade de
estudar não, igual tem hoje não. (Rosana, mãe de Poliane)
Já a Dona Iraci acha fundamental que os jovens façam esforços para se manter nos
estudos, pois acredita fazer todo o possível para manter sua neta na escola, demonstra também
forte presença na crença em Deus “para que tudo dê certo na vida da jovem”. Iraci fala que
Raiara é tão inteligente quanto à falecida mãe. De acordo com Coutrim et. al (2007) os avós,
embora tenham baixa escolaridade, transmitem valores e oferecem apoio emocional às crianças
sob sua guarda, e isso se reflete no desempenho escolar das crianças.
Quero todos os estudos pra ela. Tudo, mais tudo mesmo, com fé em Deus. Tudo que eu puder fazer pra ela. Ah é boba, hoje tudo é estudo mesmo. Difícil até pra ela que é
novinha. A gente já ta de idade, então... Porque a gente dá tudo. Agora eles tem que
fazer esforço (Iraci, avó de Raiara).
Para Lahire (1997), Viana (2011) e Portes (2008) são importantes recursos periféricos
familiares de intenção positiva a moral do bom comportamento, da conformidade às regras, a
moral do esforço, sendo que esses recursos inconscientemente podem preparar os jovens de
camadas populares a encaminharem para uma boa escolaridade.
Mariana a irmã de Talita, associa a sua falta de escolaridade ao trabalho, já Ana (mãe de
Raissa) e Geralda (mãe de Vitória) acham gratificante ver os filhos estudando. Mariana afirma
que nos dias de hoje as pessoas precisam se qualificar, pois não tem sido fácil se manter no
mercado de trabalho. Ela demonstra esse pensamento muito bem em sua fala:
85
Ah é bom né, ela formar, fazer um curso, porque hoje em dia arrumar serviço tá osso
né, tem que tá, tem que ser cursado, mesmo sendo cursado ta difícil imagina sem né. É
bom estudar né. (Mariana, irmã de Talita)
A literatura utilizada nesse estudo destaca a importância do apoio moral e afetivo da
família durante a escolarização. Em muitos casos esse apoio pode acontecer de forma
autoritária ou através de uma confiança benevolente. Assim, a intervenção positiva das famílias
em relação as práticas escolares, não se restringe apenas ao domínio escolar, mas também a
outros domínios que cercam a vida dos jovens.
Essas famílias acham importante manter seus filhos na escola, mas como mencionado
por Dona Rosana, isso não tem sido fácil, principalmente por causa do desemprego. Conforme
observado nos estudos de Portes (2008) e Viana (2011), as famílias fazem grande esforço pela
educação dos filhos. A fala de Dona Rosana sobressaiu dentre as demais, por sua família estar
dentre as mais carentes financeiramente. Nem por isso Dona Rosana deixa de valorizar os
estudos, ou medir esforços para a sua filha sobressair, assim como a mais velha que fez o curso
técnico. Existe em sua fala uma persistência em alcançar a escolarização e longevidade escolar
de sua filha caçula, Poliane, conforme demonstrado no relato abaixo:
Quer dizer fácil não tá não né, mas a gente dá um jeitinho que consegue. Tem que ter
boa vontade. Com certeza. Pra aprender mais né, aprender e formar. Pra fazer um
outro curso pra frente né, que Deus abençoa, que igual o que eu faço pra um eu gosto
de fazer pra todos né. Então vamos ver né. Com certeza. Se eu puder, tiver ao meu
alcance eu vou ajudar com certeza. Um cursinho que ela quiser fazer se eu tiver
condições eu ajudo. Com certeza! (Rosana, mãe de Poliane)
Nessas famílias sempre tiveram pessoas que incentivaram os jovens a estudar, na
família 1 Iraci (Avó de Raiara) possui uma presença fortíssima do seu tio que está no seminário
estudando para ser padre. Este filho de Dona Iraci é exaltado em relação aos outros em termos
de conhecimento e referência de escolarização, embora um outro filho também tenha estudado,
ela parece valorizar mais a cultura religiosa e o status que isso traz na pequena localidade. De
acordo com Lahire (1997) existem famílias “operária militante”, ou seja, através do
militantismo (religioso, sindical ou político), cria-se um interesse cultural que inclui o interesse
pelos livros e pela vontade de escolarizar-se que muitas vezes pode explicar o sucesso escolar
dos filhos através do capital cultural adquirido, isso independente do capital escolar inicial de
base.
Já na família da Dona Rosangela, existe a presença de um irmão mais velho que estudou
e foi morar fora, apesar de não estar presente todos os dias, sempre que tem oportunidade
incentiva a jovem.
86
Ah tem, tem os irmão dela nó, Nossa Senhora, fala a melhor coisa que você tem é
estudar. Ninguém tira. Ninguém tira. (Rosana, mãe de Poliane)
Nas famílias 3 Mariana (irmã de Talita) e 4 Ana (mãe de Raissa) são as mães que
incentivam os estudos, mas nem sempre estão presentes, devido ao trabalho e as rotinas diárias.
Essas mães cobram verbalmente os estudos, mas não com uma prática especifica, conforme
demonstrado na fala de Ana...
Sou eu mesmo. Sim. Às vezes. Nem muito tempo eu tenho, mas eu cobro muito deles. Sim. Tem que ficar pegando no pé. (Ana, mãe de Raissa)
Já a mãe da família 5, relata que atualmente está morando longe de suas filhas e que a
educação de suas filhas está por conta da tia delas que mora em Belo Horizonte, ela confia, pois
é uma tia que estudou mais, então poderá dar um bom exemplo para as meninas, conforme
demonstra em sua fala:
Tem pessoas que incentivam. Os tios. As tias. Não. Não. Só tem minha irmã, mas que
era enfermeira, mas agora também, coitada, ta bem doente. (Geralda, mãe de Vitória).
No período de transição do Ensino Fundamental para o Médio, sabe-se que estão
implicadas várias mudanças, tanto de comportamentos quanto psicológicas nos jovens, nesse
sentido, cada jovem sofreu uma transição particular, por isso todas as participantes relataram
ter conversado muito com os jovens quando saíram de Bocaina para estudar em Cachoeira do
Campo.
O maior medo relatado por estas famílias foi dos jovens se envolverem com drogas, ou
pessoas que segundo elas “as drogas não são do bem”. Apenas Mariana a irmã de Talita,
família 3, disse que não conversou muito com ela sobre o assunto, que quem conversava era
sua mãe, mas não deu muitos detalhes. A família 4, Ana (mãe de Raissa) apenas afirmou ter
conversado, mas também sem detalhes. Já a avó de Raiara, Dona Iraci relata:
Antes dela ir pra lá, a gente conversava muito, conversou muito com ela entendeu, pra
ter cuidado, com quem conversa, amizade que tem entendeu, que hoje em dia a escola
tem muita droga, muita bagunça, briguinha de rua. Muito cuidado né. (Iraci, Avó de
Raiara)
Na mesma linha de pensamento de Iraci, Rosana, mãe de Poliana relata sobre as conversas a
respeito de drogas:
Conversei. Conversei demais. Nó, muito. A minha maior preocupação era juntar com
pessoas que não é conveniente, que hoje em dia os meninos adolescente mexe com
muita porcaria. Então eu ficava com muito medo. Mas Deus. Converso até hoje. Eu e
ela conversa né, que tem que saber lidar com os colega, entendeu, isso tudo eu explico
pra ela, pra não mexer com certas pessoas, que tem gente que não dá mesmo. (Rosana,
mãe de Poliane),
87
Ainda sobre o assunto, Geralda mãe de Vitória, se aflige com a timidez das filhas, além
da preocupação com essa transição, pois muitas vezes as filhas foram excluídas na escola
devido ao problema de saúde e da aparência. Ela deixa clara a preocupação com a rotina,
horários para sair e chegar em casa, mas preocupa-se mesmo com a integridade das filhas,
principalmente emocional, pois em Bocaina todos já as conheciam e em Cachoeira do Campo
não.
Conversava muito. Que assim nem um ano é igual os outros, sempre tem uma
mudança, às vezes tem uma matéria mais difícil que a outra. Filha sentiu. As meninas sentiram. Ah falo assim, mais ou menos assim o horário de pegar o ônibus né que é
um pouquinho mais cedo e chegava um pouco mais tarde. A diferença assim que elas
não tinham muitos amigos né. (Geralda, mãe de Vitória)
Conforme mencionado anteriormente, Lahire (1997), Portes (2008) e Viana (2011)
analisam o espaço doméstico como um reduto para as famílias de camadas populares. A partir
desses autores podemos explicar o relato de Dona Geralda, demonstrando que, em muitos
casos, as famílias podem transformar as suas casas como uma espécie de santuário, onde se
fecham para se protegerem dos “perigos do exterior”, evitando as rejeições da sociedade, do
bairro, ou mesmo como uma forma de se privarem de influências negativas.
No que diz respeito aos hábitos de leitura, os relatos foram bastante diferentes. A leitura
é considerada uma das coisas mais importantes para dona Iraci, ela relata não ter aprendido
muito bem a ler e por isso sabe a falta que faz para uma pessoa. Dentre as famílias pesquisadas
a jovem Raiara parece se sobressair dentre os demais jovens, pois possui o gosto e o hábito pela
leitura, assim como o seu tio.
Nossa senhora, demais! A coisa mais importante é leitura. Demais da conta. Ah tem
vez que ela fica trancada nesse quarto dela aí, ela fica lendo livro, revista, essas coisas,
ela fica mais trancada no quarto dela. (Iraci, Avó de Raiara)
As mães das famílias 3, 4 e 5 relatam que acham importante a leitura, mas que os jovens
não têm o hábito de ler em casa, de acordo com Ana (mãe de Raissa) “tem que ficar pegando
no pé”. Já a Rosana (mãe de Poliane) classifica a leitura como a primeira coisa que se deve
aprender e após as contas. Acredito que pela sua história de vida marcada pelos obstáculos,
essas tenham sido as suas maiores dificuldades durante a vida prática, manifestadas na hora de
ler algum documento ou pagar suas contas, sem saber soma-las ou subtrai-las.
De vez em quando ela pega um livro aí, mas ela não é muito chegada a ler não, muito
não, aqui em casa não, Pega mais é dever pra fazer. Ah eu acho. Eu acho. Muito
88
importante. A leitura é primeiro lugar né, depois vem as conta. (Rosana, mãe de
Poliane)
O envolvimento dos pais na escolarização dos filhos também se manifesta na
participação na escola. Um aspecto importante analisado nos relatos das famílias foi em relação
à participação das reuniões escolares. A maioria das mães relatam ir à escola pegar as notas dos
filhos, porém quando tem algum tipo de evento como “Café Com a Família” e em seguida a
entrega das notas elas não participam. Elas parecem ter dificuldades em se socializar nesses
eventos, e por isso relatam não gostar.
Participo. Muito importante o que eles falam lá. Lá em Cachoeiro? Sou eu mesmo.
Nas reunião eu gosto de ir. Agora festa eu não gosto de participar não. Igual foi
sábado, sábado teve o café familiar lá eu não fui. Esses trem assim eu não gosto de
participar não. Diz que foi bom. Que é bonito. Mas todos os anos tem. Mas eu fui lá só
uma vez só. Ah eu não muito chegada a ir em festa não. Ah não, se for só pra buscar a
nota eu vou lá e busco. (Rosana mãe de Poliane)
Quando pergunto se participam das reuniões escolares ou se procuram saber das notas
de suas filhas, a irmã de Talita e a mãe de Raissa manifestam ter problemas em ir na escola nas
datas estipuladas, pois trabalham fora e não têm como faltar para essas finalidades, conforme
demonstrado nas suas falas:
Não muito porque ela trabalha né, ela trabalha horário de reunião ela não pode ir. É.
Mas aí quem ia era meu pai, meu pai sempre ia. Pegar nota, essas coisas meu pai ia.
Eu não participava não. Eu nunca gostei. Nunca gostei. Mariana (irmã de Talita),
Sendo assim, identificamos que essas famílias não interagem com os aspectos culturais
da escola em que os jovens estudam, como os eventos de consciência negra, quadrilhas ou
comemorações, eles parecem não se interessar. Preocupam-se em manter os jovens na escola e
garantir que eles sejam aprovados. Participam mais de perto quando têm algum problema ou
quando são chamados na escola. Essas famílias precisam assegurar o trabalho, acima de tudo,
como demonstrado nas pesquisas de Lahire (1997; 2008), Nogueira et. al (2011) e Portes et. al
(2012) muitas vezes desenvolvem nos filhos as disposições que os preparem para o trabalho,
para que no futuro possam lidar com a sobrevivência no mundo. Também podemos observar
esta preparação no cotidiano diário em que os meninos ajudam os pais nas funções masculinas
e as meninas se encarregam das funções femininas, como a de doméstica da casa e são
preparadas para uma atividade doméstica remunerada ou ocasamento.
Às vezes. Esse ano, igual eu falei com a Raissa, eu não fui nem uma vez ainda mesmo
porque às vezes o dia da, bate no meu trabalho, então não tem como eu largar porque
é eu que cuido deles né, então não tem jeito. Não. Não. Porque igual eu to te falando,
eu trabalho sábado, domingo, dia sim, dia não, mas caiu ali tem que ir né, às vezes a maioria das vezes é no sábado que eu to trabalhando né. (Ana, mãe de Raissa)
89
A importância de se conhecer a escola em que os filhos estudam e os professores e
pautada por todas as famílias, apenas a família 3 representada por Mariana (irmã de Talita) que
não demonstrou muito interesse em conhecer melhor a escola e os professores. Ana mãe de
Raissa reclama que “Falta muito tempo, e oportunidade, mas ah sei lá, é bom pra gente
conversar, saber o que ta acontecendo né? Comcerteza.” Já Dona Geralda, refletiu sobre relação
as instituições família e a escola. E percebe que muitas famílias vêm transferindo as suas
responsabilidades para a escola, talvez devido ao fato de ela ter sido criada em um orfanato,
pode perceber o que acontece com muitos outros jovens, conforme demonstrado em sua fala
abaixo:
Acho importante conhecer a escola. Acho até mesmo pra gente ajudar também, porque
eu acho assim, que muitos pais às vezes foca tudo na escola que a escola tem que
responsabilizar pelos seus filhos, mas não, a educação vem de casa, a escola é só
complemento. É. (Geralda, mãe de Vitória)
Essas famílias manifestam um desejo enorme dos seus filhos prosseguirem os estudos e
alcançarem o sucesso escolar. Consideram a escola valiosa para a vida das pessoas e valorizam
o conhecimento como algo que nunca possa ser tirado deles. Dona Iraci, avó de Raiara fala o
que espera de sua neta após concluir o ensino médio:
Ah pra gente é tudo estudar né. Porque é de onde vem a sabedoria da pessoa né. Como
tratar as pessoas, o que tem que falar, a maneira que conversa, entendeu, a maneira
que age. Porque a escola, como que fala, a escola da vida, um trem assim que eles
falam lá, mas a pessoa dentro da escola estudando é a melhor coisa da face da terra,
mais pra frente pode ser um advogado, alguma coisa entendeu, é de onde a pessoa
cresce. E eu acho é isso, é a minha maneira de pensar né.
Já as famílias 3, 4 e 5 esperam que suas filhas continuem estudando e na família 2,
Rosane deposita as suas esperanças na jovem, porém não admite que sua filha perca o foco dos
estudos, conforme a sua declaração abaixo:
[O que você espera da sua filha após concluir o Ensino Médio?]Ser uma moça muito
inteligente que eu não fui, ter bastante inteligência pra aprender gravar as coisa na
mente, que a minha mente é meio fraca, a minha é, agora espero que a deles encaixe tudo na cabeça deles, mas coisa boa, coisa boa. Isso aí ela crescendo, se for pra fazer
um curso eu dou todo apoio. Pra estudar, trabalhar dou tudo quanto é apoio, agora pra
bater perna não [riso]
Existe nessas famílias uma forte esperança dos pais em relação ao futuro dos filhos, de
acordo com Zago (2011) eles visualizam a escola como uma instituiçãomuito importante para
os filhos conseguirem algo na vida e por isso valorizam e participam do sucesso escolar dos
filhos, mesmo que de forma indireta. Apesar de ser claro nessas famílias a esperança do
sucesso escolar, assim como nos estudos Viana (2011) percebemos que não há um projeto
previamente elaborado para esses jovens alcançarem a longevidade escolar. Portanto, mesmo
90
que e forma inconsciente, as práticas de escolarização dos pais são construídas de acordo com o
alcance cultural e material dessas famílias populares e ainda, de acordo com Portes (2011)
através dessas práticas essas podem propiciar uma longevidade escolar para jovens.
4.3 A representação do local de moradia para as famílias de Bocaina
De acordo com Portes (2012) e Thin (2006) é preciso considerar as famílias de camadas
populares nas suas simbolizações e formas que estabelecem vínculos com o meio (social) em
que vivem e suas formas de subsistência para além do seu isolamento urbano. O local de
moradia para as famílias pesquisadas demonstra ter grande importância e representações em
suas vidas, pois normalmente é lá que os jovens passam a maior parte do seu tempo. As
famílias da Bocaina possuem fortes raízes com a localidade e laços afetivos que se construíram
durante várias gerações por ser muitas vezes onde seus pais e avós viveram.
De acordo com os relatos, Bocaina é considerada pela maioria, como um lugar tranquilo
para se criar os filhos, principalmente por possuir um contato com a natureza. Outras acham
ruim pela falta de privacidade, característica de lugares pequenos. O maior problema
identificado nesta localidade segundo relatos das mães dos estudantes é à distância em relação à
suas casas dos centros comerciais, escola, bancos e recursos para a saúde, como demonstrado
na fala de Rosana, mãe da jovem Poliane, e Geralda, mãe de Vitória.
Considero longe dos recursos, tudo muito demorado (Rosana, mãe de Poliane).
(...) se você quiser não tem uma padaria, não tem uma mercearia, tudo tem que fazer
fora, o posto às vezes tem um posto aí, mas costuma você marcar uma ficha, você leva
lá 2, 3 semanas pra fazer uma consulta, então fica difícil, mas pra viver eu acho bom,
eu acho (Geralda, mãe de Vitória)
Dona Iraci, avó de Raiara explica os motivos pelos quais gosta de morar em uma
localidade afastada, para ela essa distância não atrapalha na escolarização da jovem, pois
acredita ganhar no aspecto da qualidade de vida. Em sua fala transparece a sensação de que ter
uma casa própria propicia à família segurança e proteção, como as autoras Nogueira e Nogueira
(2007) afirmam, isso se remete a sensação de orgulho por morar ali.
Ah eu adoro. Aqui pra nós é tudo. Eu prefiro roça, eu não gosto de cidade não. Roça é
tudo, aqui os menino fica livre, leve e solto. Na rua você tem que prender menino,
aqui não, aqui graças a Deus, roça é, eu não troco roça por lugar nenhum, eu nasci
aqui, vou morrer aqui mesmo. Eu nasci aqui, tenho que ficar aqui mesmo. Eu não
91
gosto não. Eu gosto é de roça. (...) Bastante né. Bastante.É da gente mesmo. Não é
grande não, mas... Tem. Tem graças a Deus. (Iraci Avó de Raiara)
Mas Iraci fala também sobre os seus medos, conforme demonstrado abaixo:
Assim, que menino de roça tem aquela questão né, pra começar andar sozinha de
ônibus primeiro tem que frequentar algum lugar com as colegas entendeu, agora ela já
vai sozinha pra lá e pra cá entendeu. Também ela já tá com 16 anos também, se não
andar sozinha também pode esquecer... (Iraci avó de Raiara)
Rosana, a mãe de Poliane, faz uma ligação da Bocaina com os seus ascendentes e sua
história de vida. Porém, isso não a impede de destacar as dificuldades enfrentadas pela falta de
recursos disponíveis:
Bom, aqui é, como diz, aqui é o lugar que a gente vive né. Foi criado e nascido e
vivido. Só que aqui é ruim que não tem o recurso. Ó não tem, se você quiser não tem
uma padaria, não tem uma mercearia, tudo tem que fazer fora, o posto às vezes tem um posto aí, mas costuma você marcar uma ficha, você leva lá 2, 3 semanas pra fazer
uma consulta, então fica difícil, mas pra viver eu acho bom, eu acho. (Rosana mãe de
Poliane)
Já a Mariane se confunde ao falar do seu gosto por morar no distrito. Comum
sentimento ambíguo oscila entre o gostar e o não ter para onde ir. Segundo a irmã mais velha
de Talita, ela ficou o tempo necessário em Bocaina por não ter motivos para sair e nem outro
lugar para viver, agora a sua família tem motivos para se mudar devido à separação de seus
pais. Com isso tornou-se necessário providenciar um novo local de moradia.
Ah, gostava né, não tinha outro lugar, agora tem, agora nós sai daqui. É que não tinha
outro lugar, não tinha motivo pra sair daqui, agora tem. É. (Mariana, irmã de Talita),
Apenas a Ana mãe de Raissa não gosta de morar naBocaina, demonstra ter vivido
traumas na região, mas não falou muito sobre eles. Ao mesmo tempo em que pensa em sair da
localidade, apresenta medos e tem insegurança por não conhecer ninguém em outro lugar, ou
seja, demonstra que morar em uma região pequena como Bocaina, pode ter os seus benefícios
como a facilidade de acesso aos vizinhos e uma certa segurança por eles estarem lá.
Bom, eu pra mim eu não gosto daqui, se eu pudesse mudar daqui eu mudaria, mas
normal né. Tem que viver né. Mas às vezes sair pra outro lugar é pior, você não
conhece ninguém, não conhece nada então. É. Com certeza. (Ana, mãe de Raissa)
Por fim, Geralda mãe de Vitória, com poucas palavras afirma que gosta de viver na
Bocaina, herança de sua tia, ela descreve a sua casa e a divisão dos cômodos. Iara possui um
vínculo muito forte com a sua casa, pois é lá dentro que sua vida passa com as filhas de poucos
amigos e doentes. Constroem a sua própria realidade em torno do que têm e não costumam sair
da região onde moram. Sentem-se protegidas lá.
92
Gosto. Veio de herança. Você fala os cômodos? A sala, dois, dois não, três quartos,
cozinha e banheiro. (Geralda, mãe de Vitória).
93
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esta pesquisa foi motivada pelo desejo de conhecer melhor como os pais lidam com o
processo de escolarização de seus filhos, moradores de Bocaina, uma pequena localidade
próxima à Ouro Preto. Seu objetivo principal foi o de investigar quais são os esforços
familiares adotadas pelas famílias do distrito para manter seus filhos na escola, mesmo diante
de tantas dificuldades, como a distância da escola e o acesso restrito a bens públicos, como
unidades de saúde, escolas e bibliotecas.
Através dos objetivos específicos, foi possível conhecer o perfil das famílias
pesquisadas e qual a relevância da escola para os pais, além das suas dificuldades e lutas
diárias.
Para a realização da pesquisa, apliquei 134 questionários aos jovens que frequentavam
em 2015 o 1º ano do ensino médio em Cachoeira do Campo no período diurno. A partir dos
questionários, selecionei cinco famílias desses jovens moradores da Bocaina para entrevista.
Com base nos objetivos propostos, as entrevistas foram realizadas a partir de três eixos: a)
Esforços familiares no processo de escolarização dos filhos; b) A importância da escola para a
família e c) A representação do local de moradia para essas famílias.
Com o fim de compreender os esforços e práticas de escolarização empreendidas pelas
famílias moradoras da Bocaina se fez necessário perpassar pela trajetória educacional de seus
ascendentes e conhecer a base familiar desses jovens. Para isso, foi preciso recorrer à literatura
a respeito das relações entre a família e a escola.
Para os jovens da localidade de Bocaina alcançarem a longevidade escolar precisam se
deslocar da região, pois ali possuem poucas oportunidades de trabalho e escolares. Isso me
levou a refletir a partir dos resultados da pesquisa, que cada família participa da construção do
sucesso escolar dos filhos de forma diferenciada, sendo que nem todas desenvolvem práticas
especificas de escolarização que vão além de manter os seus filhos na escola. Nem sempre
essas práticas são visíveis, mas apesar de todas as dificuldades enfrentadas, os jovens
participantes da pesquisa já alcançaram a longevidade escolar se comparados com seus
ascendentes. Podemos analisar também, através dos dados de escolarização dos pais, que assim
como no âmbito nacional, a dificuldade de escolarização no meio rural a partir da segunda
etapa do ensino fundamental é difícil para essas famílias, tendo em vista que necessitam se
94
deslocar da região em que moram para dar continuidade aos estudos e muitas vezes esses
esforços são limitados devido as necessidades de trabalhar e se sustentar.
Sabemos também que dessas famílias de camadas populares não se pode esperar as
mesmas práticas e ações empreendidas pelas famílias de camadas médias educógenas devido
aos recursos econômicos e culturais necessários para isso. Para essas famílias a escolarização é
importante, mas tem igual ou maior grau de importância para os entrevistados a proteção dos
jovens dos distritos do que chamam de perigos da rua, como as drogas, a violência, o mau
comportamento, etc. É notória a proteção simbólica do corpo e também a presença da
Religiosidade nas falas dos responsáveis pelos jovens, principalmente na família de Iraci e
Geralda.
A casa desses jovens é considerada em muitas vezes, como um santuário. Foi possível
perceber também na pesquisa a importância da religião para a Dona Iraci, quando relata que o
“filho se salvou” dentre os outros, pelo fato de estar no seminário estudando para ser Padre,
sendo que ela possui outros filhos escolarizados e graduados na universidade.
Uma das motivações familiares observadas na pesquisa para manter os jovens na escola
parece ser a necessidade de prepará-los para o mundo do trabalho remunerado, como uma
forma de garantir o seu próprio sustento no futuro.
Não é uma tarefa fácil refletir sobre os esforços educacionais dos pais que trabalham e
raramente estão em casa. Conhecendo a rotina dessas mulheres moradoras da Bocaina, é
impossível afirmar que as famílias entrevistadas participam pouco da educação dos seus filhos,
ou ainda que as mães menos escolarizadas e que não trabalham não transmitem capital cultural
aos mesmos.
O que podemos concluir a partir da pesquisa de campo e da literatura consultada é que
existem mobilizações familiares diferentes, e que através delas, os jovens podem alcançar
estilos de sucessos diferentes. Podemos observar que a escola não ocupa lugar central na vida
dessas famílias e que não existem práticas específicas que garantam o sucesso escolar de seus
filhos. O lugar de moradia muitas vezes pode influenciar nessas centralidades, pois sabemos,
que a intenção familiar e os projetos para os filhos são normalmente construídos a partir das
oportunidades que surgem e das projeções familiares. Por isso, as práticas educativas dessas
famílias são realizadas de acordo com o alcance financeiro e cultural das mesmas.
Percebe-se aí o forte desejo das mulheres ouvidas nessa pesquisa em realizar o sucesso
escolar das filhas, neta ou irmã, como uma forma de vencer as dificuldades. O que não foi
possível em suas vidas. Por isso, a longevidade escolar para as famílias de Bocaina está
95
associada a uma história de superação. Oriundas do meio rural e moradoras antigas do distrito,
as cinco famílias pesquisadas possuem baixo capital escolar e econômico, e o mesmo ocorreu
com seus pais e avós. As profissões dos (das) chefes dessas famílias se caracterizam por
ocupações de pouco prestigio e remuneração, sendo que muitos (as) deles (as) encontram-se
desempregados (as).
Para as famílias de camadas populares, uma grande dificuldade enfrentada é a falta de
tempo para acompanhar os filhos nas tarefas escolares e de atender às suas necessidades
básicas. Em muitos casos as fragilidades e rupturas vividas no interior dessas famílias, seja nos
casos de viuvez, separação, reconstituição familiar, ou ainda, de doenças graves, podem, de
alguma forma, fragilizar a escolaridade e afetar a longevidade escolar.
A trajetória educacional dos pais, avós e tios dos jovens pesquisados, foram marcadas
pela precariedade de acesso aos bens públicos, culturais e de lazer. As mulheres entrevistadas
relatam que as dificuldades vivenciadas hoje, principalmente em relação à escolarização dos
filhos, estão muito distantes daquelas vividas há poucas décadas, pois são notáveis os avanços
dos serviços públicos e privados no local, como a disposição do transporte público e do
transporte escolar, telefone e televisão. Para as entrevistadas, hoje as informações são melhor
difundidas, porém, sentem falta do acesso à internet, ainda mais os jovens.
Outro aspecto relevante que deve ser pontuado é a localização da moradia que muitas
vezes também podem influenciar nas relações sociais, mobilidade e acessibilidade, devido às
dificuldades estruturais, econômicas ou sociais.
No processo de transição escolar, observei que a mudança de espaço escolar para esses
estudantes foi uma dificuldade marcante em suas vidas, pois nesta etapa iniciou-se uma nova
rede de relações em um lugar desconhecido, que requer uma redistribuição de horários e maior
atenção dos familiares.
Foram identificados os medos das mães em relação a este processo de transição, pois ao
mudar de escola, os jovens ficaram mais distantes de casa e fora dos olhares dos pais. Para a
maioria deles, ir para Cachoeira do Campo se caracterizou como o primeiro momento longe da
proteção do local de moradia e do conforto de casa. Nesse período a possibilidade de desvios
de conduta e envolvimento com drogas e com a criminalidade se torna a maior preocupação
dos pais.
A rede de interdependência entre a família e a escola foi reconhecida por todas as
depoentes, porém as formas de como essas famílias se organizam é bem diferente da escola,
96
com a presença de muitas contradições entre a logica escolar e a familiar. Com base nisto,
acredito que as instituições família e escola devem trabalhar juntas para garantir o sucesso
escolar dos jovens que vivem em outras realidades, como as provenientes de camadas
populares, a fim de minimizar os impactos das desigualdades escolares, sociais e culturais.
Certa de que existem variações internas no mesmo grupo social, esses jovens
apresentam diferenciações singulares no interior de cada família, sendo assim,
independentemente da situação econômica dessas famílias, percebeu-se a mobilização dos pais,
irmã e avó quanto a importância da escola para a vida de seus filhos e a presença do diálogo foi
muito ressalta danos depoimentos como uma estratégia para fortalecer o vínculo com os
estudos, demonstrando a importância do diploma para o futuro dos jovens.
Pode-se concluir, portanto, que os objetivos dessa pesquisa foram atingidos e espera-se
que esse estudo tenha contribuído para a compreensão das práticas familiares que propiciam a
longevidade escolar das camadas populares, principalmente no caso de famílias que vivem fora
dos centros urbanos, de modo a ampliar os conhecimentos e a literatura sobre a temática dentro
da perspectiva da Sociologia da Educação e da Sociologia da Família.
97
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
COUTRIM, Rosa Maria da Exaltação; Maria Amália de Almeida. Escolha ou destino? A
influência intergeracional na vida dos jovens egressos do Ensino Médio. Revista
Contemporânea de Educação, n. 12, p. 173-194. Ago./dez. 2011.
COUTRIM, Rosa Maria da Exaltação; et. al. Gerações - Entre Solidariedades e Conflitos O
que os Avós Ensinam aos Netos? A influência da Relação Intergeracional na Educação Formal
e Informal. Congresso Brasileiro de Sociologia 29 de maio a 1 de junho de 2007 UFPE, Recife
(PE) GT12: Gerações - Entre Solidariedades e Conflitos.
BARTHOLO, Lisboa; COSTA, Márcio da. Turnos e segregação escolar: Discutindo as
desigualdades intraescolares. Cadernos de Pesquisa. 2014,vol.44, n. 153, pp. 670-692 jul./set.
2014. Disponível em: < http://www.scielo.br/pdf/cp/v44n153/a10v44n153.pdf>. Acesso em: 01
de dezembro de 2014.
BATISTA, Antônio Augusto Gomes; SILVA, Hamilton Harley de Carvalho. Família, escola,
território vulnerável. 1ª edição. São Paulo: CENPEC, 2013.
BONI, Valdete Boni; QUARESMA, Sílvia Jurema Quaresma. Aprendendo a entrevistar: como
fazer entrevistas em Ciências Sociais. Revista Eletrônica dos Pós-Graduandos em Sociologia
Política da UFSC.Vol. 2 nº 1 (3), janeiro-julho/2005, p. 68-80. Disponível em:
<https://periodicos.ufsc.br/index.php/emtese/article/view/18027/16976>; Acesso em: Abril de
2015.
BOURDIEU, Pierre, (1998). A escola conservadora: as desigualdades frente à escola e à
cultura. In: NOGUEIRA, Maria Alice, CATANI, Afrânio (orgs. Escritos de educação: Pierre
Bourdieu. Petrópolis: Vozes 6 edição, Cap. 2, p. 41-64.
BOURDIEU, Pierre, (1998. b). Os três estados do capital cultural In: NOGUEIRA, Maria
Alice, CATANI, Afrânio (orgs.) Escritos de educação: Pierre Bourdieu. Petrópolis: Vozes 6
edição, Cap. 2, p. 71-80.
BOURDIEU, P. A escola conservadora: as desigualdades frente à escola e à cultura. In:
NOGUEIRA, M. A.; CATANI, A. (Orgs.). Escritos de educação. Petrópolis: Vozes, 1998c. p.
39-64.
98
BOURDIEU, Pierre. A distinção: crítica social do julgamento. Editora Zouk, 2006.
BRASIL, LDB. Lei 9394/96. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Disponível
em<http://portal.mec.gov.br/arquivos/pdf/ldb.pdf>. Acesso em: 02 de março de 2015.
BRASIL. LEI Nº 8.069, DE 13 DE JULHO DE 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do
Adolescente e dá outras providências.
CAMARANO, Ana Amélia. Novo regime demográfico: uma nova relação entre população e
desenvolvimento? / Ana Amélia Camarano (Organizadora). – Rio de Janeiro : Ipea, 2014. 658
p.: il.
CAMPOS, Alexandra Resende. Família e escola: um olhar histórico sobre as origens dessa
relação no contexto educacional brasileiro. Programa de Pós-Graduação em Campus do
Gragoatá – São Domingos 24.210-350 Niterói, RJ – Brasil. Recebido em 2010. Aprovado em
2011.
CORRÊA, Filipe Souza; RODRIGUES, Juciano Martins. O clima educativo domiciliar e sua
distribuição territorial na região metropolitana do Rio de Janeiro: Conceituando o clima
educativo. In:RIBEIRO, Luis César de Queiroz; KOSLISNKI, Mariane C; ALVES, Fátima;
LASMAR, Cristiane. Desigualdades urbanas e desigualdades escolares. Rio de Janeiro: Letra
Capital, p. 298-235, 2010.
COSTA, Marcio da; KOSLINSKI, Mariane Campelo. Entre o mérito e a sorte: escola,
presente e futuro na visão de estudantes do ensino fundamental do Rio de Janeiro. Revista
Brasileira de Educação, v. 11, n. 31, p. 133-154, 2006.
CUNHA, Maria Amália de Almeida. O conceito “capital cultural” em Pierre Bourdieu e a
herança etnográfica. PERSPECTIVA, Florianópolis, v. 25, n. 2, 503-524, jul./dez. 2007.
Disponível em: <http://www.perspectiva.ufsc.br>.
D'AVILA, José LuisPiôto. Trajetória escolar: Investimento familiar e determinação de
classe. Educ. Soc., Campinas, v. 19, n. 62, p. 31-63, Apr. 1998. Available from
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-
73301998000100003&lng=en&nrm=iso>.access
on 12 May 2015. http://dx.doi.org/10.1590/S0101-73301998000100003
GHEORGHIU, MihaïDinu; GRUSON, Pascale and VARI, Judit.Trocas intergeracionais e
construção de fronteiras nas experiências educativas das classes médias. Educ. Soc. [online].
99
2008, vol.29, n.103, pp. 377-399. ISSN 1678-4626. Disponível em:
<http://dx.doi.org/10.1590/S0101-73302008000200005>
GUARANÁ, Elisa. A escolarização nos assentamentos rurais: uma caracterização
comparada. Estudos Sociedade e Agricultura. 12 de abril de 1999: 80-103.
IBGE. Censo Demográfico 2000 e Pesquisa de Orçamentos Familiares – POF 2002/2003.
Disponível
em:http://www.cidades.ibge.gov.br/xtras/temas.php?lang=&codmun=314610&idtema=19&sea
rch=minas-gerais%7Couro-preto%7Cmapa-de-pobreza-e-desigualdade-municipios-brasileiros-
2003. Acesso em: 01 de agosto de 2015.
LAHIRE, Bernard. Sucesso escolar nos meios populares: as razões do improvável. São Paulo,
Editora Ática, 2008.
LAHIRE, Bernard. Sucesso escolar nos meios populares: as razões do improvável. São Paulo:
Ática, 1997.
LORDÊLO, JAC.,and DAZZANI, MV., orgs. Avaliação educacional: desatando e reatando
nós. Salvador: EDUFBA, 2009. 349 p. ISBN 978-85-232-0654-3.Available from SciELO
Books <http://books.scielo.org>.
MEGUIRE, Meg. BALL, Stephen J. Discursos da reforma educacional no Reino Unido e nos
Estados Unidos e o trabalho dos professores. Práxis Educativa, Ponta grossa, PR, v. 2, n.2,
p.97-104, jul.-dez 2007.
MINAS GERAIS. Secretaria de estado de desenvolvimento social. Boletim do observatório de
desenvolvimento social. Observatório de desenvolvimento social/ sedese. Belo horizonte, 2013,
23 p. Disponível em: < http://webcache.googleusercontent.com/search?q=cache:pl4-
hfxlwdmj:www.social.mg.gov.br/images/documentos/boletim_observat%25c3%2593rio_2%25
c2%25ba%2520trimestre.docx+&cd=1&hl=pt-br&ct=clnk&gl=br>. Acesso em: 02 de junho de
2015.
MONTANDON, cléopâtre. As práticas educativas parentais e a experiência das crianças. Educ.
Soc., Campinas, vol. 26, n. 91, p. 485-507, Maio/Ago. 2005. Disponível em: <
http://www.scielo.br/pdf/es/v26n91/a10v2691.pdf>. Acesso em: 20 de abril de 2015.
100
NOGUEIRA, Maria Alice. Relação família-escola: Novo objeto na sociologia da educação.
Paidéia. FFCLRP-USP, Ribeirão Preto, p. 91-103, Fev/ago 98. Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/paideia/v8n14-15/08.pdf>. Acesso em: 31 de outubro de 2015.
NOGUEIRA, Maria Alice; Nogueira, Cláudio M. Martins. Bourdieu & a educação. – Belo
Horizonte: Autêntica, 2004.
NOGUEIRA, Maria Alice; NOGUEIRA, Cláudio M. Martins. Bourdieu & a Educação. 2007.
NOGUEIRA, Maria Alice; ROMANELLI, Geraldo; ZAGO, Nadir. Família e Escola:
Trajetórias de escolarização em camadas médias e populares. Vozes. 6ª ed. Petrópolis, RJ,
2011.
NOGUEIRA, Maria Alice. A relação família-escola na contemporaneidade: fenômeno
social/interrogações sociológicas. Análise Social, v. 40, p. 563-578, 2005.
PIOTTO, Débora Cristina. Trajetórias escolares prolongadas nas camadas populares. Cadernos
de Pesquisa, São Paulo, v. 38, n. 135, p. 701-707, dez. 2008.
OURO PRETO, Lei Complementar da Prefeitura Municipal de Ouro Preto, Nº 93 de 20 de
Janeiro de 2011, Estabelece normas e condições para o parcelamento, a ocupação e o uso do
solo urbano no Município de Ouro Preto.
PORTES, E. A.; SILVA, P.; CAMPOS, A. R.; SANTOS. Na cozinha de famílias rurais:
práticas de escolarização de mães com filhos em idade escolar. In: VII Congresso português de
sociologia - sociedade, crise e reconfigurações, 2012, porto - pt. VII 2012. v. 01. p. 01-14.
CAMPOS, A. R.; PORTES, É. A. O perfil de famílias rurais do povoado de Goiabeiras com
filhos em idade escolar, São João del-Rei, Minas Gerais. In: SEMINÁRIO DE INICIAÇÃO
CIENTÍFICA, 14., 2006, São João del-Rei. Anais... São João del-Rei: UFSJ / CONGRESSO
DE PRODUÇÃO CIENTÍFICA DA UFSJ, 5., São João del-Rei, 2006. Anais... São João del-
Rei: UFSJ, 2006.
PORTES, Écio Antônio. O trabalho escolar das famílias populares. In: NOGUEIRA, M. A.;
ROMANELLI, G.; ZAGO, N. (orgs). Família e escola: trajetórias de escolarização em
camadas médias e populares. 2ª ed. Petrópolis: Vozes, 2000, p. 61-97.
101
ROBERTSON, Susan L. “Espacializando” a sociologia da educação: pontos de vista, pontos de
acesso e pontos de observação. In: APPLE, Michael W.; BALL, Stephen J.; GANDIN, Luís
Armando (Orgs.) Sociologia da Educação: Análise internacional. Porto Alegre: Penso, 2013.
Cáp.1, p. 32-44.
SAVIANI, Demerval. Sistema Nacional de Educação e Plano Nacional de Educação:
Significados, controvérsias e perspectivas. Campinas, SP. Ed. Autores associados. Coleção
Polêmicas do Nosso Tempo, 2014.
SETTON, Maria das Graças Jacintho. Um novo capital cultural: pré-disposições e disposições à
cultura informal nos seguimentos de baixa escolaridade. Educ. Soc.. Campinas, vol. 26, n. 90,
p. 77-105, jan./Abr. 2005. Disponível em: <
http://www.fundaj.gov.br/geral/educacao_foco/jacinto_setton.pdf>.
SILVA, José Borzacchielloda. Discutindo o rural e o urbano. Revista da ANPEGE, v. 7, n. 8, p.
3-11, ago./dez. 2011. ISSN 1679-768 X © 2003 Associação Nacional de Pesquisa e Pós-
Graduação em Geografi a. Todos os direitos reservados.
SINGLY, François de. Sociologia da família contemporânea. Trad. Clarice Ehlers Peixoto. Rio
de Janeiro: Editora FGV, 2007. 208 p. (Família, geração& cultura).
TOMIZAKI, Kimi. Transmitir e Herdar: o estudo dos fenômenos educativos em uma
perspectiva intergeracional . Educ. Soc., Campinas, v. 31, n. 111, p. 327-346, abr.-jun. 2010
327 Disponível em:< http://www.scielo.br/pdf/es/v31n111/v31n111a03.pdf>. Acesso em: 20 de
agosto de 2015.
VIANA, Maria José Braga. Longevidade escolar em famílias de camadas populares: Algumas
condições de possibilidade. In: NOGUEIRA, Maria A.; ROMANELLI, Geraldo; ZAGO, Nadir
(org.). Família e escola: trajetórias de escolarização em camadas médias e populares.
Petrópolis: Vozes, 2 ª edição, 2003, p. 45-60.
VIEIRA, Sofia Lerche; TERRIEN, Jacques; CARDOSO, Ana Paula Lima. Educação em um
território de pobreza: achados de pesquisa.VII Seminário Regional de Política e
Administração da Educação do Nordeste.Centro de Educação UFPE. Comunicações orais GT
2, dia 21. 20 a 22 de agosto de 2012, publicado em 2011.
102
ZAGO, Nadir. Processos de escolarização nos meios populares: As contradições da
obrigatoriedade Escolar. In: NOGUEIRA, Maria A.; ROMANELLI, Geraldo; ZAGO, Nadir
(org.). Família e escola: trajetórias de escolarização em camadas médias e populares.
Petrópolis: Vozes, 2 ª edição, 2003.
ZANIRATO, Silvia Helena. Avaliação da vulnerabilidade socioambiental em cidades
brasileiras. Um estudo sobre a cidade de Ouro Preto. Anais XVI Encontro Nacional dos
Geógrafos Crise, práxis e autonomia: espaços de resistência e de esperanças - Espaço de
Socialização de Coletivos. Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010.
ISBN: 978-85-99907-02-3
RANGEL, Mary; CARMO, Rosângela Branco do. Memórias e Representações de pais domeio
rural sobre a escola. Revista de Educação – Educere et Educare. Vol.8 nº 15 jan./jun. 2013,
p.59-74.
OURO PRETO. Mapa politico dos municípios e seus distritos. Disponível em
http://www.ouropreto.mg.gov.br/portal_do_turismo_2014/dados-geograficos. Acesso em: 08
de novembro de 2015.
103
APÊNDICES
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO –TCLE
Diretor
Sou mestranda do Programa de Pós Graduação em Educação da UFOP e venho através
deste, solicitar a autorização da gestão escolar para a realização da pesquisa intitulada “OS
ESFORÇOS FAMILIARES E AS PRÁTICAS EDUCATIVAS DE FAMÍLIAS POPULARES:
O caso de Bocaina, Ouro Preto-MG ” desenvolvida no Departamento de Educação da UFOP.
Essa investigação está sendo realizada com estudantes matriculados no 1º ano do ensino
médio da escola pública de Cachoeira do Campo nos períodos diurno e noturno e seu objetivo
principal é realizar um estudo sobre a influência do território nas práticas educativas familiares
de alunos provenientes de distritos da região de Ouro Preto. A idéia é compreender como essas
famílias que vivem em distritos afastados do centro urbano se organizam para cumprir as
rotinas escolares dos jovens criados em um espaço socialmente vulnerável.
A identificação dos alunos no questionário é opcional eos que decidirem identificar-se,
poderão fazê-lo apenas com o primeiro nome. Ao se divulgar os resultados, os depoimentos
inseridos nos artigos e trabalhos apresentados em congressos serão identificados por números
ou nomes fictícios.
Após a análise dos questionários as famílias dos alunos selecionados (cerca de 10) serão
convidadas a participar de entrevistas que acontecerão fora do ambiente escolar. Ao final da
análise dos dados de questionários e entrevistas serão comparadas as notas dos alunos
selecionados para conhecer os casos de sucesso escolar de alunos que vivem em regiões
afastadas da escola e sofrem com a distância e com a condição vulnerável e de alunos que
residem próximo ao centro escolar
Os resultados servirão para se detectar os principais pontos de conflitos e disposições
sociais e familiares que interferem nas escolhas profissionais dos jovens e no seu desempenho
escolar. Os dados numerados, tabulados e arquivados pela pesquisadora, que garantirá o sigilo
das informações contidas nesses documentos que têm o uso exclusivo para tal pesquisa.
Garante-se que não serão feitasimagens e os nomes dos integrantes serão mantidos em sigilo.
Os resultados da pesquisa serão divulgados por meio de artigos em revistas científicas e
congressos na área de educação.
Estamos à disposição para maiores
esclarecimentos antes e durante o curso da
pesquisa.
Profa. Dra. Rosa Maria da Exaltação
Coutrim- Coordenadora do Projeto
Instituto de Ciências Humanas e Sociais -
Departamento de Educação. Rua do
Seminário s/n – Centro, Mariana
Fone: 3557-9410e-mail:
Mariana, / /2009.
__________________________________ Rosa Maria da Exaltação Coutrim/ Juliana de
Matos Xavier (Mestranda). Rua Cachoeira do
Campo, 185. Aldebaram, Cachoeira do
Campo/MG. [email protected]
________________________________
Diretor da Escola Pública Selecionada
104
I QUESTIONÁRIO APLICADO AOS ALUNOS DO 1 º ANO DO ENSINO MÉDIO
OS ESFORÇOS FAMILIARES E AS PRÁTICAS EDUCATIVAS DE FAMÍLIAS
POPULARES: O caso de Bocaina, Ouro Preto-MG
QUESTIONÁRIO – COLETA DE DADOS I
Nome (opcional):_________________________________Idade__________sexo _____
Você e sua família residem no distrito: ________________________Série: 1º ano ____
Você trabalha?:( ) sim ( ) não
1.Composição familiar: Quantas pessoas da sua família moram com você?
( ) 1 ( )2 ( )3 ( ) 4 ( )5 ( ) Mais de 5.
2. Quadro familiar: Abaixo devem ser lançados dados da sua família de origem.
Inclusive você.
Quem mora com você?
______________________________________________________________________
_____________________________________________________________________.
Até qual ano seu pai estudou?____________. Qual a profissão dele?________________
Até qual ano sua mãe estudou?____________.Qual a profissão dela?_______________
Você tem irmãos (ãs)? ( ) Sim ( ) Não Se sim Quantos (as)? ________________
Eles estudam? ( ) Sim ( ) Não
3. Renda familiar: Qual a renda familiar (juntando o salário de todos que trabalham em
casa)?
( ) Menos de 1 salário mínimo ( ) entre 2 e 3 salários mínimos ( ) entre 4 e 6 salários
mínimos.
4.Você ou alguém da sua família é beneficiário de Programas Sociais como (Bolsa
família, Benefício de assistência social) ou outro?( ) sim ( ) não
5. Condições de Moradia: A sua rua é ?( ) asfaltada ( ) de terra ( ) de pedra
6. Você e a sua família moram em?( ) casa própria ( ) casa alugada
7. Marque as características que melhor descrevem a sua casa. Pode marcar mais de
uma opção. ( ) Residência com acabamento. ( ) Residência sem acabamento (sem reboco,
pintura, piso, banheiros inacabados, etc.) Possui: ( ) Rede de Esgoto ( ) Fossa ( ) Banheiro ( )
Chuveiro ( ) Água ( ) Luz Cobertura: ( ) Laje ( ) Telha ( ) Outros. Piso: ( ) Cimento ( ) Taco ( )
Cerâmica ( ) Outros.
105
Número de Cômodos: _______________
8. No seu bairro passa o caminhão de coleta seletiva semanal (lixeiro)?
( )Sim ( ) Não
9. Há quanto tempo mora na comunidade? ________________________________.
10. Mobilidade: A sua casa fica distante da escola? ( ) sim ( )não
11. Como você vai para a escola?
( )ônibus escolar ( ) van ( ) a pé ( ) carro ( ) outros:_____________________
12. Existe algum ponto de ônibus perto da sua casa? ( ) sim ( ) não
13. Alguém da sua família possui automóvel? ( ) sim ( )não
14. Meios de informação: Na sua casa possui: (pode marcar mais e uma opção).
( ) Televisão - Quantas?___ ( ) Computador-Quantos?___( )Rádio-Quantos?___
( ) Acesso a internet ( ) telefone celular ou fixo.
15. Sociabilidade: Os seus vizinhos frequentam a sua casa?( ) sim ( ) não
16.Quando não tem aula o que costuma fazer?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________.
17. Você costuma se divertir com os amigos:( ) na rua ( ) em casa ( ) outros_____
18. Alguém te ajuda nos trabalhos escolares?( ) sim ( ) não
19. Quantas vezes por mês você sai do seu distrito (sem considerar o trajeto para a
escola)?
( ) menos de uma vez ao mês ( ) uma vez ao mês
( ) de duas a três vezes ao mês ( )mais de três vezes ao mês
20. Você costuma faltar à aula? ( ) sim ( ) não
Por qual motivo?____________________________________________________
______________________________________________________________________
21. Você já reprovou ou abandonou os estudos? ( ) sim ( ) não
22. Você fica de recuperação em mais de 2 matérias no bimestre? ( ) sim ( ) não
23. Você se considera um bom aluno? ( ) sim ( ) não
Por que?
______________________________________________________________________
106
II TERMO DE LIVRE ESCLARECIDO AOS PAIS OU RESPONSÁVEIS PELOS ALUNOS
Prezados pais ou responsáveis,
Você e o aluno (a) do 1º ano do ensino médio estão sendo convidados, a participar da pesquisa intitulada OS ESFORÇOS FAMILIARES E AS PRÁTICAS EDUCATIVAS DE
FAMÍLIAS POPULARES: O caso de Bocaina, Ouro Preto-MG, desenvolvida no Programa de Pós Graduação em Educação da UFOP. Nesta etapa serão realizadas entrevistas com os responsáveis pelos jovens que estudam no 1º em
uma escola pública de Cachoeira do Campo e em um segundo momento será realizado aplicações de
questionários com os alunos selecionados para conversarmos sobre os esforços escolares de jovens
que vivem em territórios (distritos) afastados da escola e como suas famílias fazem para mantê-lo na
escola, conhecendo assim o perfil dos jovens que vivem em distritos.
A duração do encontro dura em média 1 hora e 30 minutos e você poderá recusar a responder as
questões que lhe gerem constrangimentos ou mesmo desistir sem nenhuma penalidade. A
identificação nas entrevistas é opcional, precisaremos apenas de realizar de uma a duas visitas no
local de moradia ou em local combinado como no salão comunitário.
O objetivo desta pesquisa é de Investigar a influência do território nas práticas educativas familiares
de alunos provenientes de distritos da região de Ouro Preto e compreender como essas famílias que
vivem em distritos afastados do centro urbano se organizam para cumprir as rotinas escolares dos
jovens criados em um espaço socialmente vulnerável.
Os dados fornecidos pelos indivíduos pesquisados por meio de entrevista com familiares e
grupos focais com os alunos serão numerados, tabulados e arquivados pela pesquisadora, que
garantirá o sigilo das informações contidas nesses documentos que têm o uso exclusivo para
tal pesquisa. Nesta pesquisa, não serão disponibilizadas imagens e os nomes dos integrantes
serão mantidos em sigilo. Os resultados da pesquisa serão divulgados por meio de artigos em
revistas científicas e congressos na área de educação.
Para participar da pesquisa, será necessário assinar este termo e encaminha-lo para a escola
através do aluno. Estamos à disposição para maiores esclarecimentos antes e durante o curso da
pesquisa.
Profa. Dra. Rosa Maria da Exaltação Coutrim-
Coordenadora do Projeto
Instituto de Ciências Humanas e Sociais -
Departamento de Educação
Rua do Seminário s/n – Centro, Mariana
Fone: 3557-9410, e-mail:
Juliana de Matos Xavier,(Mestranda). Rua
Cachoeira do Campo, 185. Aldebaram, CC.
Responsável pelo estudante
Data: ____/______/________.
107
III ROTEIRO DE ENTREVISTAS COM MÃE DOS ESTUDANTES QUE VIVEM EM
BOCAÍNA-MG.
I – PERFIL DOS PAIS
Nome: Opcional_____________________________________________________
Idade:_____________________Estado civil:____________________________
Profissão:___________________Escolaridade:_______________________
Número de filhos:________Local de moradia:________________________
II – PRÁTICAS FAMILIARES
Você estudou até qual série?
Por qual motivo parou de estudar? Caso tenha parado.
Como era para você estudar?
Alguém te ajudava nos deveres de casa?
Você gostava de ler?
Na sua casa tinha livros?
Você tinha irmãos? Eles também estudavam?
Seus pais incentivavam vocês a estudar? Como eles faziam?
Você possui filhos em idade escolar? Quantos?
Eles estudam ou estudaram?até qual série?
Onde eles estudaram no ensino fundamental?
Alguém ajudava seus filhos nos trabalhos escolares?
Como eram feitos os trabalhos escolares em grupo?
Existe um horário para seus filhos voltarem para casa?
O que significa para você ter um filho estudando no Ensino médio?
Vocês vivenciam alguma dificuldade em relação à acesso à informações, mobilidade ou
outros? Fale sobre
Como vocês se organizam para os jovens cumprir a rotina escolar? Fale sobre essa
rotina da saída dos jovens para escola até a volta.
Vocês consideram seus filhos (as) como bons alunos? Por quê?
Você tem alguma dificuldade com seu filho na escola?
108
Vocês costumam sair de casa juntos? Por qual motivo?
Qual a frequência que vão à Ouro Preto? Por quê?
III - A IMPORTÂNCIA DA ESCOLA PARA A FAMÍLIA
O que significa para você ter um filho estudando no Ensino Médio?
Você acha importante manter o seu filho na escola? Por quê?
Existe alguém na família que incentiva seu filho a estudar? Como?
Você conversa com seu filho sobre a escola? Ou conversava com os outros filhos?
Você acha importante ler? O que seus filhos gostam mais de ler?
Quando não tem reuniões na escola, vocês procuram saber como o seu filho esta na
escola?
Você acha importante conhecer a escola em que seu filho estuda e os professores? Por
quê?
Como você se sente com seu filho estudando em outro distrito?
O que você espera de seu filho após concluir o ensino médio?
Vocês consideram o local de residência, longe da escola? Fale sobre.
Fale como é para vocês morar em um distrito ou localidade afastada da escola.
109