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O PRINCÍPIO DA COMUNHÃO DA PROVA
1 – Introdução
Já tivemos oportunidade de expressar nossa preocupação com os princípios
processuais, em artigo escrito especificamente sobre os princípios no processo de
execução.1 Tal preocupação voltou ao centro de nossas atenções num campo
diferente da ciência processual; o do direito probatório. Essa importante área do
direito processual civil contém uma série de princípios que mereceriam atenção
pormenorizada, cada qual em um artigo específico, mas dentre todos o que nos
chamou provocou a escrever o presente artigo é o princípio da comunhão das
provas.
Devemos confessar que a curiosidade nasceu de uma dificuldade enfrentada em
nossa prática profissional, em um processo determinado. Fazemos esse
esclarecimento inicial para demonstrar que são acertadas as afirmativas de que o
professor ou acadêmico de direito se completa com a atividade jurisdicional
desenvolvida na prática.2 Em nosso caso específico, a advocacia nos fornece
desafios que nos exigem constantes estudos para serem superados, além de nos
fornecer valiosos exemplos práticos pra rechear as aulas, seminários, artigos e
livros. No caso em tela, a aridez do tratamento do assunto de forma concentrada
nos incentivou a elaboração do presente artigo.
1 Daniel Amorim Assumpção Neves, “Princípios do processo de execução”, in Revista Dialética de direito processual, vol. 27, São Paulo, Dialética, 2005, pp. 36/48. 2 Nesse sentido José Ignácio de Botelho Mesquita, em entrevista concedida ao Jornal Tribuna do Direito, nº 147, julho 2005: “O professor de Direito que não advoga conhece só metade da realidade. Conhece a teoria, mas não tem idéia da vida como ela é. Não sabe o que é estar com um cliente aflito. O professor precisa ter experiência. Na Advocacia, por sua vez, é preciso ter conhecimento de ponta, estar sempre atualizado, e a universidade proporciona isso”. Destacando a interseção entre a “academia” e a “advocacia”, Alexandre Freitas Câmara, “A banca única e as prerrogativas do advogado (ou “um advogado em defesa da banca única”), in Escritos de Direito Processual, segunda série, Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2005, p. 207.
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De forma bastante sucinta o caso concreto que enfrentamos em nossa prática
profissional de desenvolveu da seguinte maneira: autor e réu requereram
genericamente a produção de provas em sua petição inicial e contestação,
respectivamente. Pelo autor foi requerida a inversão do ônus probatório, em
virtude de alegada relação de consumo, pedido esse indeferido na audiência
preliminar. O réu, nessa mesma audiência, reiterou seu desejo na produção da
prova pericial, deferida pelo juiz. Curiosamente, entretanto, após a apresentação
dos quesitos e dos assistentes técnicos por ambas as partes, o réu desistiu de seu
pedido de produção de perícia, sendo tal requerimento deferido pelo juiz inaudita
altera parte.
Além da evidente má-fé e deslealdade processual do réu, que buscou por meio de
uma traiçoeira manobra afastar o juiz da verdade dos fatos, na esperança de que
nas águas turvas da presunção gerada pela aplicação da regra do ônus da prova
se sagrasse vitorioso, a decisão padecia de grave vício gerado pela injustificável
afronta ao princípio do contraditório, já que o autor não pode se manifestar sobre o
pedido de desistência da prova. A par de tais considerações – que deixaremos de
lado para que o artigo não assuma a forma de peça processual – o mais
importante desse problema prático que enfrentamos era se o réu, como “dono da
prova”, poderia, a seu bel prazer, desistir de uma prova já deferida, ainda que a
parte contrária não concordasse com tal desistência. Justamente a percepção de
que a resposta deve ser dada de forma negativa, à luz do direito constitucional da
prova e do princípio da comunhão das provas, nos motivou a elaboração do
presente artigo.
2 – Conceito
Num primeiro momento o conceito tradicional do princípio da comunhão das
provas não parece suscitar grandes nem complexas questões, apesar da aridez
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com que é tratado pela doutrina pátria. Dentro do já pouco cuidado tema das
provas, ao princípio da comunhão das provas é reservado lugar ainda mais
obscuro e subalterno. De qualquer forma, aqueles que se dispuseram a tratar
especificamente do tema parecem convergir para uma conceituação em comum.
Segundo a doutrina que já enfrentou o fenômeno processual ora analisado, o
princípio da comunhão das provas determina que uma prova produzida passa a
ser do processo, pouco importando se o responsável pelo requerimento ou
determinação de sua produção tenha sido o autor, réu, ou mesmo o juiz de ofício.
Na verdade, até mesmo outros sujeitos processuais poderão ter requerido a
produção de tal prova, como os terceiros intervenientes ou o Ministério Público
como fiscal da lei, que ainda assim a prova não será de A, B, ou C, mas sim do
processo. Significa dizer que não se admite que a prova tenha uma identidade
subjetiva, pouco importando quem tenha sido responsável por sua produção.
Nesse sentido já havia se manifestado com acerto na doutrina nacional o
magistrado gaúcho Rui Portanova:
“Sendo o fim da prova levar a certeza à mente do juiz, para que possa falar conforme a justiça, diz Echandia, há um interesse indubitável e manifesto em razão da função que desempenha no processo. É o princípio do interesse público na função da prova. É evidente, cada parte persegue, com suas próprias forças, um benefício próprio e imediato. Contudo, há de se considerar, ainda, o interesse público mediato que está acima dos benefícios específicos das partes. Em conseqüência, a prova nunca pertence a uma ou outra parte, mas ao juízo. Por igual, o benefício que se retira do elemento probatório não se vincula somente ao interesse da parte que produziu tal prova. É o princípio da comunhão ou comunidade da prova, também chamado da aquisição”.3
3 Cfr. Princípios do processo civil, 3ª ed., Campinas, Livraria do Advogado, 1999, p. 217. A respeito do tema, valiosa a liça de Hernando Devis Echandía, Teoria general de la prueba judicial, tomo I, 5ª ed., Bogotá Temis, 2002, p. 110: “Consecuencia de la unidad de la prueba es su comunidad; esto es, que ella no pertenece a quien la aporta y que es improcedente pretender que solo a este beneficie, puesto que, una vez introducida legalmene al proceso, debe tenérsela em cuenta para determinar la existência o inexistencia Del hecho a que se refiere, sea que resulte em beneficio de quien la adujo o de la parte contraria, que bien puede invocarla. Como el fin del proceso es la realización del derecho mediante la aplicación de la ley al caso concreto y como las pruebas
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A principal característica desse princípio diz respeito à prova produzida, embora
nos parece que seja tal princípio também aplicável à fase anterior à produção
propriamente dita da prova, ainda no plano do direito à prova adquirido
concretamente no processo em razão do deferimento pelo juiz da produção de
determinado meio de prova. Classicamente, uma vez tendo sido produzida a
prova, pouco importando quem seja o responsável pela introdução de tal prova no
processo, a mesma gerará efeitos para todos os sujeitos processuais
indistintamente, inclusive para aqueles que nada tiverem a ver com a produção da
prova.
Como idéia central do princípio encontra-se justamente a comunhão da eficácia
probatória, sendo aqui entendido o termo “eficácia”, como condição de gerar
efeitos no caso concreto. Uma prova produzida dentro do processo passa a gerar
efeitos – benéficos ou prejudiciais – para todos os sujeitos processuais, não sendo
possível ao juiz valorar uma prova de forma diferente para sujeitos processuais
diferentes somente porque um foi o responsável por sua produção e o outro não.
Apesar do sistema de livre convencimento motivado (persuasão racional), tal
postura do juiz seria até mesmo ilógica, em nada se justificando tratar o valor da
prova diferentemente para os sujeitos processuais. Ainda que tenha ampla
liberdade na valoração probatória, haverá certos limites à atuação jurisdicional –
como os resquícios de provas tarifadas (p. ex. art. 401, CPC c/c art. 227, CC) e a
constituyen los elementos utilizados por el juez para llegar a esse resultado, nada importa quién las haya pedido o aportado; desde el momento que ellas producen la convicción o certeza necesaria, la función del juez se limita a aplicar la norma reguladora de esa situación de hecho”. Com as mesmas considerações as lições de Victor de Santo, El proceso civil, tomo II, Buenos Aires, Universidad, 2000, pp. 257/258. Ainda Juan Montero Aroca, La prueba em el Proceso Civil, 3ª ed., Madri, Civitas, 2002, p. 83: “Aunque el principio tiene contenido general (si uma parte interpone el recurso de apelación, este se tramitará para las dos), es em la prueba donde adquiere mayor sentido, significando que si um hecho ha sido probado, el juzgador tiene que partir de él em la sentencia, siendo indiferente qué parte lo haya probado. Dicho de outra manera, todas las pruebas se incorporan al proceso, son del proceso em que producirán certeza, y tienen como destinatário al juez”.
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tentativa do Novo Código Civil de ressuscitar a prova plena (arts. 215 e 225, CC)4
– sendo o princípio da comunhão das provas justamente um deles. O juiz pode dar
o valor que entender a prova produzida, mas deverá fazê-lo de forma homogênea
para todos os sujeitos processuais.
A justificativa lógica de aplicação do princípio da comunhão das provas decorre da
própria função desse instituto dentro do panorama processual, qual seja,
convencer o juiz da veracidade dos fatos alegados, ainda que a veracidade
processual ou veracidade possível, em decorrência de ser a verdade absoluta um
valor meramente utópico e inalcançável.5 Seja como for, as provas servem como
instrumento para que o juiz chegue o mais próximo possível a percepção de como
os fatos realmente ocorreram, gerando-se dessa aproximação o seu
convencimento.6 Sendo a prova instrumento de convencimento, seria
absolutamente ilógico que para uma das partes a prova fosse suficiente para o juiz
acreditar que o fato ocorreu, enquanto que para outra tal fato seria considerado
inverídico, somente porque não foi ela a responsável pela produção da prova. A
homogeneidade exigida no tocante ao convencimento dos fatos é a base
justificadora do princípio da comunhão das provas, ao menos no tocante à prova
já produzida, que não é, como veremos, o campo exclusivo de aplicação do
princípio.
4 Para comentários mais aprofundados sobre o tema, consultar Fredie Didier Jr., Regras processuais no Novo Código Civil, São Paulo, Saraiva, 2004, pp. 29/35. No direito argentino, Victor de Santo, El proceso civil, op. cit., p. 668, fala na confissão e na escritura pública como exemplos de prova plena. Jaime Guasp e Pedro Aragoneses, Derecho procesal civil, tomo I, 5ª ed., Madri, Civitas, 2002, p. 364, apontam algumas disposições concretas que estabelecem previamente força probatória a determinados meios de provas. 5 Já tivemos a oportunidade de tratar do tema com maior profundidade em “Algumas considerações sobre as limitações procedimentais à busca da verdade no processo civil brasileiro”, in Revista Dialética, vol. 30. Em lição que liga o convencimento do juiz à verdade processual, Victor de Santo, El proceso civil, op cit., 2000, p. 695. 6 Nesse sentido as lições de Eduardo Couture, Fundamentos de direito processual civil, trad. Benedicto Giaccobini, Campinas, Red Livros, 1999, pp. 137/138: “Encarada do ponto de vista das partes, a prova é também, uma forma de provocar a convicção do magistrado. O regime vigente leva as partes a esgotarem os meios facultados pela lei para formar no espírito do juiz um estado de convicção acerca da existência ou inexistência das circunstâncias relevantes do processo”. Ainda Jaime Guasp e Pedro Aragoneses, Derecho procesal civil, op. cit., p. 343.
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Seria de fato inadmissível que um mesmo fato, diante de um mesmo conjunto
probatório, analisado por um só juiz, pudesse ser considerado verdadeiro para a
parte que a produziu e falso para a parte contrária - não responsável pela sua
produção - ou mesmo para litisconsortes da parte responsável pela produção.
Utilizando-nos de um brocardo popular, o fato dentro do processo, no tocante aos
sujeitos processuais é como a mulher grávida, ou seja, não existe mulher meio
grávida, ou está ou não está...7 Da mesma forma, para o fato considerado dentro
do processo, não existe fato meio verdadeiro, ou verdadeiro somente para uns; ou
o fato é verdadeiro para todos ou para ninguém, daí decorrente a exigência da
prova gerar efeitos homogêneos para todos os sujeitos processuais, responsáveis
ou não por sua produção.
Por fim, também se ampara no princípio da comunhão das provas a
impossibilidade da parte que tenha requerido a produção da prova pretender, após
sua produção e entendendo lhe ser a mesma prejudicial, impedir que o juiz a
utilize em seu convencimento. Como os advogados não têm uma bola de cristal
para antever o resultado de uma prova, muitas vezes o produto probatório acaba
por prejudicar a própria parte que requereu sua produção, o que não é raro na
praxe forense e que espelha bem o dito popular de dar um tiro no próprio pé. Caso
fosse possível se afirmar que a prova pertence a quem a produz, seria admissível
que a parte, prejudicada pela prova, simplesmente conseguisse seu
desentranhamento dos autos, impedindo o juiz de utilizá-la em seu
convencimento. Sendo “dona da prova”, se contrariado com seu resultado, a
retiraria do processo, como o menino ‘dono da bola”, que ao ser colocado no gol
pelos colegas, fica contrariado e leva a bola embora, terminando com o jogo.
7 É clássica a afirmação feita por Carnelutti que a verdade é como água, ou é pura ou não é verdade, lembrada nas lições de Santiago Santis Melendo, La prueba – los grandes temas del derecho probatório, Buenos Aires, Ediciones Jurídicas Europa-America, 1979, p. 42.
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É evidente que rumaria contra as tendências mais modernas do processo civil, em
especial a promessa constitucional de um amplo acesso à ordem jurídica justa,
atual feição do tradicional princípio da inafastabilidade da tutela jurisdicional (art.
5º, XXXV, CF), se permitir a retirada de prova do processo somente porque essa
não se mostrou favorável à parte responsável por sua produção. O princípio da
comunhão das provas, ao indicar que a prova é do processo, e não das partes e
nem do juiz, evita que tal procedimento seja adotado, não podendo a parte dispor
de algo que não é dela, e sim do processo. A prova, dessa forma, prejudicial ou
benéfica a quem quer que seja, jamais será afastada do convencimento do juiz por
“arrependimento” da parte que requereu sua produção.8
3- Direito adquirido à prova de todos os sujeitos processuais
Já tivemos a oportunidade de afirmar, em trabalho anterior específico a respeito
do tema, que uma vez deferida uma prova, tendo ela sido requerida por uma das
partes, ou determinada de ofício pelo juiz, não seria mais admissível, sem o
ingresso do recurso cabível pela parte interessada, a retratação por parte do juiz.
Em nossa visão se verificaria no caso a preclusão judicial, comumente e de forma
errônea tratada como preclusão pro iudicato, o que simplesmente impediria que o
juiz voltasse atrás em sua decisão anteriormente proferida.
A justificativa é que, embora o juiz possa – na verdade deva – indeferir as provas
inúteis e desnecessárias, uma vez deferida a produção de algum meio de prova
cria-se um direito adquirido à prova, não sendo mais possível o juiz voltar atrás em
seu entendimento anterior para indeferir a prova, ainda que passe, nesse segundo
momento, a acreditar em sua inutilidade ou desnecessidade.
8 Nesse sentido Hernando Devis Echandia, Teoria general de la prueba judicial, op. cit., p. 111: “Este principio determina la inadmisibilidad de la renuncia o desistimiento a la prueba ya practicada, pues solo si se considerara patrimonio procesal del aportante o peticionario o para su solo beneficio, podría aceptarse que la retira o dejara sin efectos”.
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Em nosso sentir, prova deferida é prova a ser produzida, ainda que a percepção
do juiz sobre ela se modifique no tempo. Em conclusão ao pensamento
desenvolvido afirmamos que:
“Assim, é correto afirmar, conclusivamente, que o art. 130 do Código de Processo Civil permite a produção de provas por parte do juiz a qualquer momento do processo, tendo essas sido indeferidas ou sendo novidades na demanda judicial. Tal artigo, entretanto, sob pena de afronta ao direito à prova que a parte vê nascer quando há seu deferimento, não permite ao juiz o indeferimento de prova por ele deferida, tenha sido ela fruto de requerimento da parte ou mesmo de iniciativa do próprio juiz, em nítida verificação de preclusão judicial”.9
Confessamos, entretanto, uma omissão cometida em nosso trabalho anterior, que
apesar de específico sobre o tema, essa questão não foi abordado de forma tão
completa quanto o necessário. Centramos naquele trabalho a atenção na parte
que requereu a prova, afirmando não ser possível que o juiz a indeferisse sem
concordância expressa da mesma. Enfrentamos ainda a questão da prova
deferida de ofício, afirmando que nesse caso ambas as partes teriam um direito
adquirido à prova, não se admitindo o indeferimento de tal prova senão mediante a
concordância de ambas as partes. Não imaginamos, entretanto, o caso específico
de desistência da prova da parte que justamente a requereu, à luz do direito
adquirido da prova da parte contrária e do princípio da comunhão das provas.
É evidente que a partir do momento em que defendemos a existência de um
direito adquirido tanto de autor como do réu à produção de prova determinada de
ofício, fica bem claro que não importa o sujeito responsável pelo pedido ou
9 Cfr. Preclusões para o juiz – preclusão pro iudicato e preclusão judicial no processo civil, São Paulo, Método, 2004, pp. 265/272. A respeito do direito adquirido à produção de prova já deferida pelo juiz, as lições de José Garberí Llobregat e Guadalupe Buitrón Ramírez, La prueba civil, Valencia, Tirant lo blanch, 2004, p. 148: “En cuarto lugar, también se deriva del derecho a la prueba consagrado em el art. 24.2 CE el derecho a que la prueba admitida por el órgano judicial sea efectivamente practicada, de forma que la admisión de la prueba no quede reducida a ser uma actuación meramente retórica al no ir acompañada de la adopción de todas medidas imprescindibles para asegurar que dichos medios probatorios admitidos a trámite sean ejecutados confore a las exigências legales”.
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determinação da produção da prova, considerando-se a própria natureza pública
do processo, conquista inafastável da ciência processual moderna. Procuraremos
expor com maior clareza tal ponto de vista, o que nos levará a conclusão de que
não basta à parte que requereu a produção da prova concordar com sua não
produção depois de seu deferimento, também sendo necessária a concordância
da parte contrária para que tal prova não seja mais produzida. È nessa conclusão
que nos parece legítimo a aplicação do princípio da comunhão das provas em
momento processual diverso do tradicionalmente enfrentado pela doutrina.
Sendo a prova do processo, e não da parte que a requereu, a partir do momento
em que a mesma é deferida pelo juiz, ela perde completamente a sua identidade
subjetiva, passando desde já a pertencer ao processo. Não há de fato qualquer
razão - acadêmica ou lógica - que reserve tal constatação somente a prova já
produzida, bastando para tanto lembrar que a fase de produção da prova é
apenas uma entre aquelas que compõe o procedimento probatório. E é justamente
o princípio da comunhão das provas, responsável pela perda da identidade pelo
seu surgimento no processo, que nos autoriza tal conclusão. Nesse tocante,
inclusive, cabe recordar as lições de Cândido Rangel Dinamarco, para quem a
propositura da prova já faz parte de sua produção.
Tomando por base as lições do processualista das Arcadas, fica ainda mais
irrefutável a idéia de que a prova, embora não tenha sido pedida por uma das
partes, passa a também lhe pertencer após seu deferimento, não se podendo
admitir a não realização da mesma a não ser mediante sua concordância. Pelo
princípio da comunhão das provas a prova é do processo, e o processo, segundo
conceituação mais moderna, é o procedimento animado por uma relação jurídica
em contraditório. A relação processual é formada pelos sujeitos processuais –
todos eles – que exercem no processo ônus, faculdades, deveres, direitos e
sujeições.
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Em última análise, os sujeitos processuais são titulares dos direitos processuais,
sendo o direito à produção de prova já deferida um deles.
Haverá, portanto, um direito adquirido de todos os sujeitos processuais – em
especial os parciais – para que a prova deferida, independentemente de quem
requereu sua produção, seja devidamente produzida. Uma eventual retratação do
juiz, indeferindo uma prova que já havia sido anteriormente deferida, somente será
admitida se, ouvidas as partes, titulares em comum do direito à produção da
prova, houver concordância de ambas no tocante à sua não produção da prova. E
aqui pouco importa qual o sujeito responsável pelo desejo de não mais produzir a
prova; sendo o juiz, ouvirá ambas as partes, e, sendo a parte que a requereu, será
ouvida a parte contrária.
É evidente que nesse caso haverá uma inversão dos ônus de adiantamento para a
produção da prova, passando esse a ser carreado à parte que se mantém
desejosa de produzir a prova. Assim, se o autor tinha pedido prova pericial e
desiste de tal produção, após o deferimento do juiz, o réu será ouvido, e se
discordar, por qualquer razão, da desistência, passará a ser o responsável pela
realização da prova, de forma que deverá, nos termos do art. 21, CPC, adiantar as
verbas honorárias do perito para que a prova possa ser produzida. O
indeferimento, entretanto, será absolutamente nulo, por inconstitucional, já que
agressor do princípio do direito à prova. É, em nosso entender, a aplicação do
princípio da comunhão das provas já em seu nascedouro, quando nasce
concretamente o direito a todos os sujeitos processuais a produzir uma prova,
independentemente de quem tenha sido o responsável pelo pedido de sua
produção. Apesar do pouco trato da matéria pela doutrina nacional, cumpre
registrar que Rui Portanova, ao tratar do princípio da comunhão das provas, tece
comentários no sentido do texto, tomando como exemplo a possibilidade aberta à
parte pelo art. 408, CPC, de substituição de testemunhas já arroladas:
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“Entendemos que no sistema brasileiro vige o princípio da comunidade da prova e que, não raras vezes, a parte-ré deixa de arrolar testemunha comum já arrolada pela parte autora. Assim, uma desistência pode causar danos à outra parte (particular) e à busca da verdade real (em geral). A melhor solução para o caso de desistência não suficientemente motivada de testemunha é colher a concordância da parte contrária e, em caso de dúvida, ouvir tanto a nova testemunha indicada com a testemunha que se tentou substituir”.10
Nos servindo da feliz lição do processualista gaúcho, e a ampliando para outros
meios de prova, nos parece que requerido qualquer meio de prova, não seria
possível à parte que a requereu desistir unilateralmente de sua produção. O
deferimento de pedido nesses termos, em discordância da parte contrária,
desejosa na produção de tal prova, afrontaria o direito à produção da prova à luz
do princípio da comunhão das provas.
4 – Aplicações práticas do princípio da comunhão das provas
Embora a doutrina nacional tenha em sua grande maioria diligenciado no tocante
ao trato específico do princípio da comunhão das provas, em alguns fenômenos
processuais sua aplicação é sempre lembrada, demonstrando a doutrina uma
preocupação mais casuística que pontual com o princípio. Não tendo feito uma
análise exaustiva do ordenamento processual brasileiro, lembramos de três
fenômenos em que o princípio ora analisado terá grande importância: (i) prova
produzida por litisconsorte; (ii) prova produzida no recurso de agravo para
comprovar a determinação do art. 526, caput, CPC; (iii) ônus da prova. Faremos
com relação a esses três fenômenos algumas considerações que nos parecem
relevantes.
a) Prova produzida por litisconsorte
10 Cfr. Princípios do processo civil, op. cit., p. 217.
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A atuação dos litisconsortes vem regulada pelo art. 48, CPC, que cria, ainda que
em termos, o princípio da autonomia da atuação dos litisconsortes. Segundo o
dispositivo legal, “salvo disposição em contrário, os litisconsortes serão
considerados, em suas relações com a parte adversa, como litigantes distintos; os
atos e as omissões de um não prejudicarão nem beneficiarão os outros”. Apesar
da clara redação do texto legal levar a conclusão de que existe uma verdadeira
autonomia de atuação entre os litisconsortes, a melhor doutrina vem flexibilizando
tal autonomia, pontuando as exceções a tal regra.11
De início é interessante frisar que a aplicação do art. 48, CPC, aos litisconsortes
no caso concreto dependerá num primeiro momento da espécie de litisconsórcio
que os une para litigar em conjunto. Das diversas classificações possíveis, nos
interessa aquele que separa o litisconsórcio em unitário e simples, tomando como
critério a possibilidade ou não aberta ao juiz para resolver o processo de forma
diferenciada para os litisconsortes. Dessa forma, havendo a possibilidade de
distintas decisões para os litisconsortes, o litisconsórcio será simples, enquanto
que a obrigatoriedade de decisão uniforme para todos os litisconsortes gera o
litisconsórcio unitário.
Da definição apresentada acima – propositalmente simples – já se pode perceber
a primeira diferença no tratamento da autonomia de atuação dos litigantes no
tocante à espécie de litisconsórcio. No litisconsórcio unitário, em que o destino dos
litisconsortes obrigatoriamente será o mesmo, resta evidenciado que qualquer ato
11 Cândido Rangel Dinamarco, Litisconsórcio, 7ª ed., São Paulo, Malheiros, 2002, p. 125: “A autonomia dos litisconsortes, que não prevalece no litisconsórcio unitário em razão da indispensável homogeneidade no julgamento do mérito, também no litisconsórcio comum constitui regra de aplicação apenas relativa. Não-obstante cindíveis as situações jurídico-substanciais a julgar e portanto comum o litisconsórcio, ocorrem situações em que o julgamento precisa convergir à harmonia, não se concebendo que uma só e única sentença venha a afirmar e ao mesmo tempo negar o mesmo fato, ou venha adotar duas teses jurídicas antagônicas. Nesses casos, certas condutas individuais d litisconsorte serão capazes de favorecer os demais”.
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de disposição de direito por parte de somente um litisconsorte, sem o
consentimento do outro, será plenamente ineficaz.
Não há como se admitir, por exemplo, que somente um dos litisconsortes
transacione com a parte contrária, porque homologado o acordo, a decisão final
será diferente para os litisconsortes. Para um, haverá uma sentença
homologatória de transação, para o outro, desde que a demanda seja julgada no
mérito, uma sentença de procedência ou improcedência.
Por outro lado, todos os atos benéficos praticados por um dos litisconsortes
certamente gerarão efeitos para os outros sujeitos que com ele litigam em
conjunto. Sendo o destino de todos o mesmo dentro do processo, qualquer ato
que auxilie processualmente um dos litisconsortes obrigatoriamente auxiliará
também a todos os demais. Assim, na hipótese de litisconsórcio unitário, de total
aplicação o disposto no art. 320, I, CPC (não presunção de veracidade dos fatos
quando um dos réus contesta a ação) e art. 509, CPC (o recurso de um
litisconsorte aproveita aos demais).
Como se percebe, portanto, não parece ser possível se afirmar que na hipótese de
litisconsórcio unitário seja efetivamente aplicada a regra da comunhão das
provas12. No litisconsórcio simples, por outro lado, se percebe uma maior
aplicação do princípio, ainda que, ao menos nos casos do art. 320, I e 509, ambos
do CPC, seja possível excepcioná-los desde que não exista entre os litisconsortes
uma comunhão de interesses, ou seja, que o ato praticado por um deles não tenha
como objeto algo que aproveite ao outro, alguma matéria que teria sido alegada
pelo próprio litisconsorte omisso.
12 A melhor doutrina afasta a aplicação da regra da autonomia do litisconsórcio unitário: Cândido Rangel Dinamarco, Litisconsórcio, op. cit., pp. 124/125; Cássio Scarpinella Bueno, Partes e terceiros no processo civil brasileiro, São Paulo, Saraiva, 2003, pp. 125/126; Ovídio A. Baptista da Silva, Comentários ao Código de Processo Civil, vol. 1, São Paulo, RT, 2000, p. 253.
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Seja como for, e nesse tocante pouco importando a espécie de litisconsórcio, a
questão da prova produzida por um dos litisconsortes passa a margem da regra –
ou princípio – da autonomia de atuação dos litisconsortes. A doutrina é uníssona
em afirmar que a prova produzida por um litisconsorte poderá plenamente
prejudicar aos demais, que em nada colaboraram para sua produção, mas que
sofrerão seus efeitos da mesma forma que os sofrerá o responsável pela
produção. Prejudicial ou benéfica, a prova produzida servirá a formar o
convencimento do juiz, e naturalmente esse convencimento será o mesmo para
todos os sujeitos processuais, o que incluiu os litisconsortes. E essa circunstância
é decorrência da aplicação do princípio da comunhão das provas.
Nesse sentido vem afirmando reiteradamente nossa melhor doutrina, como se
pode notar das lições de Humberto Theodoro Jr:
“As provas, todavia, não se consideram como pertinentes apenas ao litisconsorte que as tenha promovido, sejam favoráveis ou contrárias ao interesse comum do litisconsórcio. É que, pelo princípio da livre pesquisa da verdade material, as provas são do juízo, ao importando a quem tenha cabido a iniciativa de produzi-las. Prevalece, modernamente, o princípio da comunhão das provas”.13
Diga-se em síntese conclusiva que a aplicação do princípio da comunhão das
provas impede uma situação no mínimo surreal se permitido fosse ao juiz
considerar a prova produzida somente com relação ao litisconsórcio responsável
por sua produção. Sabendo-se que a prova serve a formar o convencimento do
juiz a respeito da veracidade de um fato, seria admitir que um mesmo fato, perante
o mesmo juiz, pudesse ser considerado verdadeiro para um litisconsorte e falso
para outro, o que logicamente é insustentável. Não custa frisar novamente, mas se
13 Cfr.Curso de direito processual civil, vol. I, 34ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 2000, p. 100. Com o mesmo entendimento: Moacyr Amaral Santos, Primeiras linhas de direito processual civil, vol. 2, 21ª ed., São Paulo, Saraiva, 2000, p. 13; Celso Agrícola Barbi, Comentários ao Código de Processo Civil, vol. I, 11ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 2002, p. 210.
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a prova não pertence nem ao autor, nem ao réu, e nem mesmo ao juiz, estão
incluídos aí também, por conseqüência óbvia, os litisconsortes.
b) A confissão e o litisconsórcio
A par da acirrada discussão a respeito da verdadeira natureza da confissão, que
para parcela significativa da doutrina não pode ser considerada meio de prova, é
notório a colocação de tal instituto entre os meios de prova arrolados pelo Código
de Processo Civil. Nos estreitos limites do presente artigo, centraremos nossas
preocupações no disposto no art. 350, caput, CPC: “A confissão judicial faz prova
contra o confitente, não prejudicando, todavia, os litisconsortes”. Conforme se nota
do dispositivo legal transcrito, a sua literalidade leva o operador a acreditar que na
hipótese de litisconsórcio um meio de prova específico – confissão – somente
geraria efeitos para um dos litisconsortes, no caso aquele responsável por sua
produção, o confitente. Seria, portanto, uma exceção ao princípio da comunhão
das provas e de aplicação da regra de autonomia de atuação dos litisconsortes.
Já nos adiantando a nossas próprias conclusões, o art. 350, caput, CPC, apesar
de sua tortuosa redação, não excepciona em nada o princípio da comunhão das
provas, e isso independentemente da espécie de litisconsórcio. Para justificar
nossa conclusão é preciso partir do pressuposto que a confissão vincula o
confitente, senão com força de prova plena, noção rechaçada pela melhor doutrina
à luz do princípio da persuasão racional do juiz14, servindo como importante meio
para seu convencimento. Significa dizer que uma confissão eficaz é aquela que
convence o juiz da veracidade de um fato, sendo justamente esse convencimento
o efeito programado da confissão.
14 Não concordamos com o pensamento de Antônio Carlos de Araújo Cintra, Comentários ao Código de Processo Civil, vol. IV, Rio de Janeiro, Forense, 2001, p. 64, para quem, apesar de expressa previsão legal, a confissão faria prova plena, escapando da valoração do juiz.
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É natural que em decorrência do atual sistema de valoração de provas que vigora
em nosso ordenamento processual civil, a confissão seja analisada em conjunto
com as outras provas produzidas, em princípio em pé de igualdade com as
mesmas, não se admitindo nenhuma espécie de tarifação prévia dos meios de
prova. Inegável, entretanto, que a confissão guarda na praxe forense lugar de
destaque dentre os meios de prova, sendo invariavelmente importante elemento
na formação de convencimento do juiz. Significa dizer que não tem força de prova
plena – nenhuma prova o tem – mas se mostra na prática como importante
elemento na demonstração da veracidade do fato alegado.
O mais importante aspecto da confissão para a análise ora feita é a questão de
sua eficácia. Há a regra de que a confissão vincula o confitente, o que significa
dizer que a confissão gera seus regulares efeitos para aquele que confessou, ou
seja, havendo a confissão o fato será considerado com verdadeiro. Esse efeito,
como já visto, somente será gerado se a confissão, diante de outras provas
produzidas, for suficiente para convencer o juiz, mas de qualquer forma é possível
se concluir que, ao menos com relação ao confitente, haverá uma vinculação.
Nesse ponto é preciso, desde já, fazer uma observação: partindo-se de uma
análise sob a perspectiva dos resultados, a confissão não vincula somente o
confitente, mas também, e naturalmente, a parte contrária, em razão da aplicação
do princípio da comunhão das provas.
Especificamente no tocante ao disposto no dispositivo legal ora enfrentado, há a
afirmação de que a confissão faz prova contra o confitente, mas não prejudica os
litisconsortes. A afirmativa não se mostra aplicável diante da própria lógica exigida
pelo sistema processual. Fazer prova só pode ser entendido como convencer o
juiz da veracidade de um fato, o que, conforme exaustivamente visto, não pode se
configurar em fenômeno subjetivo parcial, dando-se o fato verdadeiro para
somente alguns dos sujeitos processuais, e não para outros.
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Esse verdadeiro absurdo lógico – antes mesmo de se tratar de absurdo jurídico –
é exatamente o sugerido pelo art. 350, caput, CPC, ao afirmar que para o
confitente fato seria dado como verdadeiro, mas ao litisconsorte seria plenamente
possível que o fato fosse considerado falso.15 E tudo isso na mesma demanda...
Se a confissão gerar seus efeitos de convencer o juiz, todos os sujeitos sofreram
tais efeitos, considerando-se que o fato será considerado verdadeiro pelo juiz para
todos os sujeitos processuais, tenham esses participado ou não da confissão. É
justamente em virtude desse nosso entendimento que pouco nos interessa qual a
espécie de litisconsórcio para que a confissão vincule ou não o litisconsorte não
confitente. Sendo unitário ou simples, o fato será sempre um só, de forma que
sendo a confissão eficaz vinculará a todos, sendo ineficaz, não vinculará a
ninguém.16 Simples assim, a confissão pode ser plenamente eficaz ou plenamente
ineficaz, independentemente da espécie de litisconsórcio, não existindo eficácia
parcial justamente por não existir um fato que possa ser ao mesmo tempo
verdadeiro pra alguns e falso par outros.
Apenas uma consideração deve ser feita à luz da espécie de litisconsórcio, a título
de esclarecimento. Na hipótese de litisconsórcio simples, é plenamente possível
que um fato diga respeito a apenas um dos litisconsortes, o que não ocorrerá no
litisconsórcio simples. Essa realidade poderia levar um leitor mais incauto a
acreditar que nessa hipótese seria aplicável a regra da eficácia subjetivamente 15 Alexandre Freitas Câmara, Lições de direito processual civil, vol. I, 9ª ed., Rio de Janeiro, Lumen Juris, 2003, p. 182: “Considerando-se que não se poderia admitir, por contrariar a lógica, que o juiz tivesse por provado o fato em relação ao litisconsorte que confessou, e não comprovado em relação aos demais, é certo que na sentença se poderá verificar que aquela confissão produziu efeitos em relação aos demais litisconsortes”. Ernane Fidélis dos Santos, Manual de direito processual civil, vol. 1, 10ª ed., São Paulo, Saraiva, 2003, p. 454, no tratamento do tema, afirma que “não se pode considerar, no mesmo processo, um fato como existente e inexistente ao mesmo tempo”. 16 Parece ser esse o entendimento de Cândido Rangel Dinamarco, Litisconsórcio, op. cit., p. 147: “Conclusão: a confissão de um dos litisconsortes tem a mesma eficácia que teria se fosse ele litigante isolado (sem litisconsórcio), ou seja, o juiz a sopesará em face do conjunto probatório e lhe atribuirá o valor que lhe parecer, em relação a todos os litisconsortes (quer se trate de litisconsórcio comum ou unitário)”.
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parcial da confissão, prevista pelo art. 350, caput, CPC, já que somente com
relação à parte confitente, única interessada no fato, a confissão geraria seus
efeitos. Essa, entretanto, é uma conclusão enganosa. Ainda que o fato diga
respeito a somente uma das partes, a confissão será plenamente eficaz, se o juiz
no caso concreto se convencer em razão dela, e a veracidade do fato se dará a
todos os litigantes, inclusive ao litisconsorte que não confessou e que nada tem a
ver com aquele fato. A ausência de relação entre o litisconsorte e o fato narrado,
entretanto, não enseja a conclusão de que a confissão fez prova somente contra o
confitente; fez prova “contra” todos os sujeitos processuais, mas dependendo do
caso concreto no litisconsórcio simples, tal veracidade não importará em
absolutamente nada ao litisconsorte não confitente. 17
Em compasso ao entendimento exposto, reforçamos nossa crença de que o
princípio da comunhão das prova afasta qualquer possibilidade de aplicação da
regra da autonomia dos litisconsortes no tocante às provas produzidas no
processo. E isso independentemente da espécie de litisconsórcio – unitário ou
simples – ou ainda do meio de prova, incluindo-se aí também a confissão. Em
qualquer espécie de litisconsórcio, e qualquer que seja o meio de prova, se o juiz
se convencer, o convencimento será idêntico para todos os litigantes, o mesmo
podendo se afirmar na hipótese de não convencimento.
c) O princípio da comunhão das provas e o art. 526, CPC
Nas recentes reformas processuais – ao menos na mais recente onda reformista;
Lei 10.352/02 – houve uma importante modificação no tocante ao procedimento de
comunicação de interposição do agravo de instrumento perante o juízo de primeiro
grau. 17 Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart, Comentários ao Código de Processo Civil, vol. 5, tomo I, São Paulo, RT, 2000, p. 356 afirmam que “os fatos exclusivos de cada um dos consortes, embora admitidos como verdadeiros pela confissão, não importam qualquer reflexo para o interesse dos demais”.
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A partir do novo texto legal do art. 526, CPC, em especial com a inclusão de um
parágrafo único, a ausência de comunicação da interposição do agravo de
instrumento perante o juízo de primeiro grau somente será razão para a
inadmissibilidade do recurso se o agravado argüir e provar o descumprimento do
disposto no art. 526, caput, CPC. Apesar de contrariar a teoria geral dos requisitos
de admissibilidade recursal, o dispositivo legal tentou colocar fim a antiga
divergência doutrinaria e jurisprudencial a respeito de ser a comunicação um ônus
ou mera faculdade do agravante.
Apesar de superada a discussão, em razão da nova redação do dispositivo legal,
sempre entendemos que a comunicação no prazo de três dias, prevista em lei,
não se tratava de mera faculdade do agravante, mas sim de ônus processual, que
uma vez descumprido geraria o não conhecimento do recurso. E assim nos
parecia em virtude de não entendermos que a única função da comunicação era
possibilitar ao juiz de primeiro grau a retratação. Além disso, aspecto inegável de
um dos efeitos da comunicação, sempre nos pareceu que a norma prestigiava o
princípio da boa-fé e lealdade processual, já que forçando a comunicação em três
dias, o agravado, quando intimado, não seria obrigado a se deslocar até a sede do
tribunal, em alguns casos consideravelmente longe do local em que milita,
bastando para ter ciência do teor do recurso fazer uma visita ao Fórum da cidade
e analisar os autos principais. Quem sabe para aqueles que, como nós, militam
em capitais do Estado, a observação seja esquisita, mas nem só de capital vive a
atividade advocatícia desse enorme país.
Seja como for, nos parece que, a par de eventuais críticas, a nova redação do art.
526, CPC, estancou qualquer dúvida a respeito da natureza jurídica da informação
lá prevista, embora tenha criado um curioso e singular requisito de cabimento
recursal que não é tratado como matéria de ordem pública, só podendo ser
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considerado pelo Tribunal se a parte recorrida expressamente alegar o
desrespeito a exigência legal.18
Alegar e provar, segundo a segunda atividade a que mais nos interessa no
presente artigo.
Nos parece indubitável que, se o agravado não argüir o descumprimento do
disposto no art. 526, caput, CPC, o Tribunal estará obrigado a prosseguir no
julgamento do agravo de instrumento, independentemente do agravante ter ou não
informado o juízo de primeiro grau da interposição do recurso. Tal exigência,
inclusive, conota de manifesta ilegalidade a prática relativamente disseminada do
relator de exigir do agravante a comprovação da comunicação perante o juízo de
primeiro grau.19 Se à luz da redação anterior tal exigência já era deveras
discutível, atualmente é um absurdo sem qualquer respaldo na legislação,
devendo o advogado simplesmente ignorar tal requisição do juiz relator, ou ainda
lembrá-lo pacientemente que com a mudança legislativa, o ônus de, ao menos
alegar o descumprimento da comunicação prevista pelo art. 526, CPC, caberá ao
agravado, e nunca ao agravado. Goste-se ou não, é isso que determina a lei.
Se nenhuma dúvida nos resta quanto à exigência de alegação do agravado de
que o agravante não informou o primeiro grau em 3 dias da interposição do
agravo, não concordamos com a interpretação literal do dispositivo legal ora
analisado no tocante a exigência de que a comprovação de tal omissão também
seja de responsabilidade exclusiva do agravado.
18 A curiosidade já havia sido percebida por Leonardo José Carneiro da Cunha, Inovações no processo civil, São Paulo, Dialética, 2002, p. 101. A estranheza com a novidade levou alguns doutrinadores, inclusive, a rumarem contra a literalidade do texto legal, afirmando que por se tratar de matéria de ordem pública o juiz poderia conhecer a matéria de ofício. Nesse sentido Fabiano Carvalho, “Os agravos e a reforma do Código de Processo Civil”, in A nova etapa da reforma do Código de Processo Civil, São Paulo, Saraiva, 2002, p. 285. 19 Também contrários a tal prática, Luiz Rodrigues Wambier e Teresa Arruda Alvim Wambier, Breves comentários à 2ª fase da reforma do Código de Processo Civil, 2ª ed., São Paulo, RT, 2002, p.161.
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É evidente que no mais das vezes será o próprio agravado que comprovará, por
meio de certidão de objeto e pé, que o agravante descumpriu a informação, mas
não nos parece que ele seja o único responsável por tal prova.20 Em nosso sentir,
uma vez alegado o descumprimento, qualquer prova, produzida por qualquer dos
sujeitos processuais, poderá servir ao Tribunal para deixar de conhecer o recurso,
justamente em razão do princípio da comunhão das provas.
Cândido Rangel Dinamarco, amparado em lições de Paulo Cezar Pinheiro
Carneiro, já se manifestou nesse sentido, respondendo à questão a respeito da
rigidez do ônus da prova ao agravado nesse caso:
“Mas será tão rígido esse onus probandi posto a cargo do agravado? Se ele alegar a infração ao art. 526 e o agravante admitir a omissão ou silenciar, ainda assim o recurso será conhecido? Seguramente, o agravo não será conhecido se o agravado fizer a argüição, nada provar, mas as informações prestadas pelo juiz de primeiro grau derem conta de que a comunicação não foi feita pelo agravante – porque essa é uma aplicação do princípio da aquisição da prova, pelo qual a prova vinda aos autos produz seus efeitos sempre, sem importar qual sua origem ou quem a produziu.”21
Concordamos plenamente com os doutrinadores citados acima, nos parecendo
que, independentemente do sujeito responsável pela produção da prova de que a
comunicação não ocorre conforme os ditames legais, o Tribunal pode se
convencer do descumprimento – desde que alegado pelo agravado – gerando o
20 Apontando para a certidão como forma de prova, as lições de Cândido Rangel Dinamarco, A Reforma da Reforma, 2 ª ed., São Paulo, Malheiros, 2002, p. 181; José Rogério Cruz e Tucci, Lineamentos da nova reforma do CPC, 2ª ed., São Paulo, RT, 2002, p. 116; José Carlos Barbosa Moreira, Comentários ao Código de Processo Civil, vol. V, 11ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 2003, p. 507. 21 Cfr. A reforma da reforma, 2ª ed., São Paulo, Malheiros, 2002, p. 182. No mesmo sentido, lembrando que a prova pode vir nas informações do juízo de primeiro grau, Luiz Rodriguez Wambier e Teresa Arruda Alvim Wambier, Breves comentários à 2ª fase da reforma do Código de Processo Civil, op. cit., p. 162; Ricardo de Carvalho Aprigliano, Nova reforma processual civil, 2ª ed., São Paulo, Método, 2002, p. 279 e Fávio Cheim Jorge, A nova reforma processual, 2ª ed., São Paulo, Saraiva, 2003, p. 171.
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não conhecimento do agravo de instrumento. O princípio da comunhão das
provas, determinando que a prova é do processo, e não dos sujeitos processuais,
impede que o Tribunal desconsidere a prova somente porque a mesma não foi
produzida pelo agravado, bastando para o não conhecimento do recurso a
existência da prova. Assim, a informação do agravado é um ônus perfeito,
enquanto a comprovação é um ônus imperfeito.
d) Ônus da prova
Outro tema em que se constata a importância da aplicação do princípio da
comunhão das provas é o do ônus da prova, em especial no tocante a seu
elemento objetivo. Não é esse o momento para considerações mais especificas a
respeito do tema, mas sucintamente, apenas para sedimentar aquilo que
pretendemos de fato expor, nos deteremos nos aspectos objetivos e subjetivos do
instituto.
O ônus da prova é comumente encarado pela doutrina sob dois aspectos; o
subjetivo e objetivo. Pelo aspecto subjetivo do ônus da prova se estabelecem as
regras de qual sujeito processual sofrerá situação processual de desvantagem no
caso da prova não ser produzida, parcialmente ou integralmente. Nesse sentido o
ônus da prova serve como uma regra de conduta das partes durante a instrução
probatória, indicando quem é o responsável pelo convencimento do juiz dos fatos
alegados pelo autor. Pelo aspecto objetivo o ônus da prova funciona como uma
regra de julgamento, aplicada pelo juiz sempre que não exista qualquer prova
produzida ou a mesma se mostre insuficiente. Não podendo declarar o non liquet,
ou seja, estando obrigado a decidir, independentemente da prova produzida, o
juiz, tomando por base as regras que definem o caráter subjetivo do ônus da
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prova, coloca a parte que dele não se desincumbiu em situação processual de
desvantagem.22
Mas o que teria o ônus da prova a ver com o princípio da comunhão das provas?
Na verdade essa relação se cristaliza partindo-se de uma análise do ônus sob o
aspecto objetivo, sendo certo que a regra de julgamento estabelecida pelo ônus
da prova só deve ser aplicada na ausência – total ou parcial – de prova, não se
justificando sua aplicação nas hipóteses de existir nos autos elementos de
convicção do juiz. Nem poderia ser diferente, considerando-se que ao julgar pelo
ônus da prova o juiz decide baseado numa mera presunção, que poderia ser
singelamente traduzida da seguinte forma: aquele que alegou e não provou deve
ter alegado algo que não correspondia com a realidade. Por outro lado, julgando
baseado na prova, o juiz deixa de lado a presunção, se baseando na certeza a
respeito do conjunto fático que compõe o processo judicial. Resta evidente ser
preferível ao juiz decidir baseando-se na certeza gerada pela prova do que na
presunção típica da aplicação da regra de julgamento chamada de ônus da prova.
O interessante aqui, e nisso o aspecto objetivo do ônus da prova se interage com
o aspecto subjetivo, é que a regra de julgamento não se importa com quem tinha o
ônus de provar, mas sim com a efetiva produção da mesma, independentemente
de seu responsável. O juiz somente passará no caso concreto a analisar o
aspecto subjetivo do ônus da prova se for forçado a aplica-lo como regra de
julgamento (aspecto objetivo), o que só ocorrerá, conforme já afirmado, se não
houver prova suficiente para forma seu convencimento. Somente nessa situação
terá alguma importância ao processo de quem era o ônus da prova, e qual o
sujeito processual será colocado numa situação processual de desvantagem. Em
outras palavras, o juiz não investiga o caráter subjetivo da prova, quem foi o 22 Nesse sentido, por todos, consultar José Carlos Barbosa Moreira, “Julgamento e ônus da prova”, in Temas de direito processual, Segunda Série, São Paulo, Saraiva, 1980, pp. 74/75. Para uma análise exaustiva do tema, a obra clássica de Leo Rosenberg, La carga de la prueba, trad. Ernesto Krotoschin, 2ª ed., Montevideo, Julio César Faria, 2002, pp. 27/61.
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responsável pela sua produção, situando sua analise tão somente ao produto
probatório; se as provas forem suficientes ele decide baseado nelas, em caso
contrário, aplica o ônus da prova.
A nenhuma importância de quem foi o responsável pela produção da prova, mas
sim de sua efetiva produção, decorre da aplicação do princípio da comunhão das
provas. O juiz não se interessa pelo responsável pela produção da prova porque
somente lhe interessa se ela foi produzida ou não, em decorrência lógica do
princípio que determina que toda prova produzida é do processo, e não de forma
exclusiva daquele que se desincumbiu de seu ônus a produzindo ou mesmo
daquele que, mesmo não tendo tal ônus, a produziu. Assim já havia se
manifestado com precisão José Carlos Barbosa Moreira:
“Ao juiz, por conseguinte, toca ver se são completos ou incompletos os resultados da atividade instrutória. Não lhe importa, na primeira hipótese, a quem se deve o serem completos os resultados. Importar-lhe-á, sim, na segunda, a quem se deve o serem incompletos; ou, mais precisamente, a quem se hão de atribuir as conseqüências da remanescente incerteza. Se quisermos usar a terminologia habitual, poderemos dizer que o órgão judicial só tem de preocupar-se, a rigor, com o aspecto objetivo do ônus da prova, não com o seu aspecto subjetivo.”23
Não existe a possibilidade, portanto, do juiz deixar de levar em consideração uma
prova efetivamente produzida somente porque seu responsável não tinha o ônus
de produzi-la. Essa questão, na verdade, não é nem ao menos colocada,
contando que o aspecto subjetivo do ônus da prova só passa a ter alguma
23 Cfr. “Julgamento e ônus da prova”, op. cit., p. 75. No mesmo sentido as lições de João Batista Lopes, A prova no direito processual civil, São Paulo, RT, 2000, p. 43: “É que, na verdade, havendo nos autos elementos probatórios suficientes, não há razão para o juiz preocupar-se com a questão do ônus da prova, isto é, se tais elementos foram carreados ao processo pela parte a quem tocava o ônus de faze-lo. Em verdade, no momento da produção da prova, o juiz não se preocupa com a questão do respectivo ônus, isto é, não diz a quem incumbe a demonstração das alegações, tema que só será objeto de indagação por ocasião do julgamento”. No direito português, Jorge Augusto Pais de Amaral, Direito processual civil, 3ª ed., Lisboa, Almedina, 2002, p. 235: “Não é, porém, indispensável que a prova seja feita pela parte sobre a qual recai o ónus. O que importa é que a prova seja feita, isto é, que o juiz fique convencido. A prova pode ser produzida pela outra parte ou ser obtida por iniciativa do juiz”. No mesmo sentido, Andrea Proto Pisani, Lezioni di diritto processuale civile, 4ª ed., Napoli, Jovene, 2001, pp. 442/443.
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importância a partir do momento em que o juiz se vê obrigado a aplica-lo em seu
aspecto objetivo. Com prova produzida, independentemente de seu responsável, o
juiz decidirá sem qualquer remissão ao ônus da prova, pouco importando para seu
julgamento quem tinha o ônus de provar, e essa situação se justifica justamente
em razão do princípio da comunhão das provas.24
24 Falando especificamente a respeito da comunhão das prova afastando a aplicação da regra de julgamento ônus da prova, Crisanto Mandrioli, Diritto processuale civile, vol. II, 14ª ed., Torino, Giappichelli, 2002, p.188: “Come superamento dell’onere della prova si presenta innanzi tutto la c. d. acquisizione della prova che si sostanzia nella regola generale secondo la quale uma volta che la prova sia entrata nel processo, ossia acquisita, il giudice può prescindere dal fatto che vi sia entrata per iniziativa della parte onerata, oppure dell’altra parte, o, nei casi um cui ciò é possibile, addirittura per iniziativa dello stesso giudice, purché però i fatti oggetto di prova siano stati allegati dalla parte che fruisce della prova.”