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O INSTITUTO DA REMISSÃO NO PROCESSO DE
CONHECIMENTO DE ATO INFRACIONAL
Mariane Mauss dos Santos
Mestranda em Direito UniRitter
Resumo:O presente trabalho busca analisar o processo de responsabilização de
adolescentes pela prática de Ato Infracional, especialmente no que concerne ao
instituto da remissão previsto nesse no procedimento. Inicialmente, por meio da
retomada da evolução histórica dos direitos da criança e do adolescente no
cenário nacional, com especial ênfase nas alterações registradas no ordenamento
jurídico pátrio após a ratificação da Convenção dos Direitos da Criança e do
Adolescente e, posteriormente, com o advento e implementação do Estatuto da
Criança e do Adolescente, pretende-se pontuar as inovações trazidas com a
implementação da Lei n° 8.069 de 13 de julho de 1990 – Estatuto da Criança e do
Adolescente, com especial atenção à doutrina da proteção integral e à proteção da
pessoa em peculiar condição de desenvolvimento. Em decorrência do
procedimento especial e célere de apuração da prática de ato infracional,
pretende-se demonstrar a violação de garantias ocorridas no curso do processo
de conhecimento, especialmente naquilo que concerne ao instituto da remissão,
traçado um paralelismo entre o que acontece no direito penal dos adultos no que
tange à oferta de transação penal.
Palavras-chave: Ato Infracional. Principio da Proteção Integral. Remissão.
1. Introdução
A implementação do Estatuto da Criança e do Adolescente consagrou
direitos e garantias extremamente inovadores no ordenamento jurídico
nacional. Isto porque, nos anos que antecederam sua vigência, não existia
quase nenhuma previsão normativa voltada especificamente para crianças ou
adolescentes em conflito com a lei.1
Dentre as modificações ocorridas em virtude da criação do Estatuto
destacam-se as diferenciações realizadas no sistema de responsabilização
juvenil, pois adolescentes autores de ato infracional passaram a receber um
tratamento diferenciado, observando sua personalidade. A explicitação do
1 PAES, Janiere Portela Leite. O código de Menores e o Estatuto da Criança e do
Adolescente: Avanços e retrocessos. Disponível em: < http://www.conteudojuridico.com.br/artigo,o-codigo-de-menores-e-o-estatuto-da-crianca-e-do-adolescente-avancos-e-retrocessos,43515.htm > Acesso em: 09 de ago de 2017.
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devido processo legal para apuração de atos infracionais somado a instituição
de um elenco de medidas jurídicas consiste em um dos principais avanços
trazidos pelo Estatuto.2
A pesquisa foi impulsionada pelo fato do tema ser de grande destaque e
objeto de constantes discussões por doutrinadores e aplicadores do direito,
tendo em vista que a Lei nº 8.069/90 trouxe profundas mudanças no trato dos
direitos da criança e o do adolescente. A técnica de pesquisa utilizada foi
baseada em referenciais teóricos, e consiste na investigação bibliográfica com
a exposição de ideias doutrinarias pertinentes ao assunto.
Assim, para um melhor entendimento e visando a construção lógica e
evolutiva do pensamento, este trabalho foi dividido em dois pontos de
abordagem que analisarão a evolução histórica dos dispositivos que
normatizam a responsabilização de crianças e adolescentes em conflito com a
lei e, posteriormente, será realizada uma análise do instituto da remissão, tanto
do ponto de vista normativo quanto comparativo, quando analisado à luz do
dispositivo da remissão previsto no Direito Penal Brasileiro.
2. De menor à cidadão: Breve retomada histórica da evolução dos direitos
infantojuvenis no Brasil
No Brasil, a preocupação com os infratores teve início no período
imperial, fossem eles maiores ou menores de idade. No período mencionado, a
repressão dava-se frente ao temor da punição, uma vez que as penas
aplicadas costumavam ser demasiadamente cruéis. Considerava-se, então,
penalmente imputável o maior de sete anos de idade, e para estes era
dispensado tratamento similar ao dos adultos, resguardada certa atenuação da
pena em razão da idade e, até atingir quatorze anos, a inaplicabilidade de pena
de morte.
2 PAES, Janiere Portela Leite. O código de Menores e o Estatuto da Criança e do
Adolescente: Avanços e retrocessos. Disponível em: <http://www.conteudojuridico.com.br/artigo,o-codigo-de-menores-e-o-estatuto-da-crianca-e-do-adolescente-avancos-e-retrocessos,43515.html> Acesso em: 09 de ago de 2017.
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Assim, os tomados por “jovens adultos”, ou seja, aqueles que contassem
com idade entre 17 e 21 anos na data do fato, já estariam suscetíveis à
aplicação da pena de morte. Excepcionando a regra etária, existia a previsão
de aplicação de pena de morte por enforcamento àqueles que cometessem o
crime de falsificação de moeda, neste caso a sanção era permitida para o
infrator que contasse com mais de quatorze anos na data do fato.3
Devido à entrada em vigor do primeiro Código Penal do Império em
1830, houve pequenas modificações no paradigma anterior. Essa legislação
fora a precursora nacional no tratamento à criança e ao adolescente,
classificando de “menores criminosos” os infratores com até 21 anos de idade.
Para este ordenamento, o critério utilizado para definir a responsabilização dos
menores de 14 anos era o da Teoria da Ação com Discernimento. Ocorre que
esse critério trazia um grau de incerteza muito grande, uma vez que a
avaliação do grau de consciência do infrator recaía exclusivamente sob a
autoridade judiciária, carecendo de um parâmetro mais seguro para o
apontamento da responsabilidade do menor em questão.4
Com a Proclamação da República em 15 de novembro de 1889, e o
surgimento do Código Penal da República ou Código Penal dos Estados
Unidos do Brasil, Decreto nº. 847, de 11 de outubro de 1890, a imputabilidade
penal restou mantida aos quatorze anos e a inimputabilidade até o computo
dos nove anos de idade5. Da mesma forma, permaneceu em vigência a Teoria
da Ação com Discernimento para os compreendidos na faixa de nove a
quatorze anos de idade, prevalecendo o critério biopsicológico e cabendo a
3 TAVARES, José de Farias. Direito da Infância e da Juventude. Belo Horizonte. Editora: Del
Rey, 2001. p. 51 4 KAMINSKI, André Karst. O Conselho Tutelar, a Criança e o Ato Infracional; Proteção ou
Punição? 1. ed. Canoas: Editora ULBRA, 2002. p.16. 5[...] Art. 30. Os maiores de 9 annos e menores de 14, que tiverem obrado com discernimento,
serão recolhidos a estabelecimentos disciplinares industriaes, pelo tempo que ao juiz parecer, comtanto que o recolhimento não exceda á idade de 17 annos. (BRASIL. Senado Federal. Decreto n. 847 - de 11 de outubro de 1890. Disponível em: <http://legis.senado.gov.br/legislacao/ListaNormas.action?numero=847&tipo_norma=DEC&data=18901011&link=s>. Acesso em: 09 set. 2017.)
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avaliação da imputabilidade exclusivamente ao magistrado. Apesar da
semelhança existente entre os Códigos de 1830 e 1890, há de se destacar que
o último se ocupou em excluir completamente a responsabilização do menor de
nove anos, independente de sua capacidade de discernir.
No período do Estado Novo, mais precisamente no ano de 1937, o
presidente Getúlio Vargas outorgou uma Constituição que contava com
dispositivos voltados aos menores carentes. Dentre outras inovações, a
Constituição previa a inserção do Serviço Social em programas de bem-estar.
Assim, no ano de 1941 foi criado o Serviço de Assistência ao Menor (SAM), por
meio do Decreto- Lei nº 3.799/41, e posteriormente alterado pelo Decreto-Lei nº
6.865/44.6
O SAM era um órgão vinculado ao Ministério da Justiça que
desempenhava atividades equivalentes a de um sistema penitenciário voltado
para menores de idade. Apesar de sua estrutura eminentemente repressiva, o
sistema preocupava-se em fazer uma diferenciação entre o adolescente autor
de ato infracional, que seria internado nas casas de correção, e o menor
carente ou abandonado, que seria direcionado às escolas de aprendizagem de
ofícios urbanos ou rurais. Na década de 1960 o SAM foi extinto, pois “este
órgão foi considerado repulsivo pela opinião pública mais politizada”. 7 Neste
cenário, foi aprovada a Lei nº 4.513/64 que cria a Fundação Nacional do Bem-
Estar do Menor (FUNABEM), tendo como órgãos executores estaduais as
Fundações Estaduais de Bem-Estar do menor (FEBEMs).
A Constituição de 1988 introduziu no ordenamento jurídico vigente o
Novo Direito da Criança e do Adolescente, art. 227 da CF,8 o qual inova o
6 VILAS-BÔAS, Renata Malta. Compreendendo a criança como sujeito de direito: a
evolução histórica de um pensamento. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11583>. Acesso em 12 ago. 2017. 7 LOPES, Jaqueline Paulino; FERREIRA, Larissa Monforte. Breve histórico dos direitos das
crianças e dos adolescentes e as inovações do Estatuto da Criançae do Adolescente – lei 12.010/09. Disponível em: <https://www.metodista.br/revistas/revistas-ims/index.php/RFD/article/view/1967>. Acesso em 15 set. 2017. 8 Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e
ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao
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cenário até então existente, assegurando diversas garantias que abrangem
desde o direito à filiação até o direito ao voto e amamentação dos filhos de
presidiárias.9
Em consonância com os compromissos assumidos pela Constituição
cidadã, no ano de 1990 o Brasil ratificou a Convenção sobre os Direitos da
Criança e do Adolescente e criou o Estatuto da Criança e do Adolescente
(ECA), Lei nº 8.069/90. O referido Estatuto tem como norteador o Princípio da
Proteção Integral10 e, dentre outras finalidades, prima por efetivar os princípios
constitucionalmente previstos de modo a garantir o pleno gozo de direitos e o
desenvolvimento das crianças e adolescentes, levando em consideração a
condição especifica de seus tutelados. Com o advento do Estatuto da Criança
e do Adolescente, o termo “menor” deixou de ser utilizado, porquanto essa
nomenclatura é dotada de um estigma negativo aos olhos da sociedade.
Referente à questão do ato infracional, o Estatuto da Criança e do
Adolescente cria um mecanismo diferenciado de responsabilização para a
criança e para o adolescente infrator. Deste modo, a criança que praticar ato
contrário à lei penal estará sujeita à aplicação das medidas protetivas previstas
no artigo 101 do ECA. A sua vez, o adolescente que pratique conduta contrária
à lei penal, responderá a um processo de apuração do ato infracional. Caso
lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (BRASIL. Senado Federal. Constituição da República Federativa do Brasil de 05 de outubro de 1988. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ constituicao/constituicao.htm >. Acesso em 12 ago. 2017. 9 KAMINSKI, André Karst. O Conselho Tutelar, a Criança e o Ato Infracional; Proteção ou
Punição? 1. ed. Canoas: Editora ULBRA, 2002. p.33. 10
A Doutrina da Proteção Integral é prevista no ordenamento jurídico brasileiro através do artigo 227 da Constituição Federal, que declarou ser dever da família, da sociedade e do Estado assegurar, à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. FERREIRA, Luis Antônio; DOI, Cristina Teranise. A proteção integral das crianças e adolescentes vítimas. Disponível em: <http://www.pjpp.sp.gov.br/2004/artigos/26.pdf> Acesso em 12 ago. 2017.
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reste comprovada a autoria e materialidade do ato, ser-lhe-á aplicada uma das
medidas socioeducativas elencadas no artigo 112 do ECA.
De certa forma, substituição do Código de Menores de 1979 pelo
Estatuto da Criança e do Adolescente, em 1990, consolidou uma verdadeira
troca de paradigma, uma revolução cultural. A sua maneira, ECA trouxe
inovações no que se refere ao acesso à justiça, visando à proteção judicial dos
interesses individuais, difusos e coletivos de seus tutelados. Ao menos
formalmente, o Estatuto da Criança e do Adolescente consolida e reconhece a
existência de um novo sujeito político e social, detentor de atenção prioritária,
garantindo-lhe o acesso à educação, a serviços de saúde, inclusive aos
adolescentes privados de liberdade.
3. Aspecto controvertido do procedimento de conhecimento de ato
infracional: A Discricionariedade da remissão versus o direito à transação
penal.
As inovações e benefícios trazidos pela Lei nº 8.069/90, Estatuto da
Criança e do Adolescente, foram as responsáveis diretas por uma acentuada
redefinição na forma de atendimento dispensada a crianças e adolescentes no
cenário nacional. Saliente-se que as mudanças ocorridas se deram nas mais
diversas esferas de seus interesses, através de um mecanismo de preceitos
que objetiva implementar a teoria da proteção integral. No entanto, em que
pese os avanços realizados, o ECA ainda comporta determinadas apreciações
díspares de inúmeros dispositivos.11
Dentre os aspectos controversos que merecem destaque, o presente
trabalho ocupou-se em analisar a discricionariedade da remissão comparada
ao direito de transação penal para réu adulto, assim como o julgamento dos
recursos provenientes de processo de conhecimento de ato infracional pelas
11
HERINGER JÚNIOR, Bruno. Algumas questões controvertidas do ECA. Disponível em:
<http://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?id=155 > Acesso em: 14 ago.2017.
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câmaras cíveis, demonstrando as referidas desvantagens contidas nesses
dispositivos.
O Estatuto da Criança e do Adolescente preconiza que, ao
representante do Ministério Público, incumbe a tarefa de decidir
fundamentadamente sobre o arquivamento, a concessão de remissão ou a
representação do adolescente pela prática de ato infracional. Em se tratando
de arquivamento ou remissão, para que surta efeito, deverá haver
homologação do ato judicialmente, consoante inteligência do artigo 181 do
ECA. 12
A remissão visa trazer agilidade à fase de apuração do ato infracional
prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente. Para Saraiva, este instituto
teve origem no texto das “Regras Mínimas Uniformes das Nações Unidas para
a Administração da Justiça de Menores”, também conhecido como “Regras de
Beijing”.13
Assim, no que concerne ao instituto da remissão, cumpre referir que o
mesmo originou-se das Regras de Beijing, especificamente no artigo 11 do
texto das Regras Mínimas Uniformes das Nações Unidas para Administração
da Justiça de Menores, em seu artigo, senão vejamos:
11. REMISSÃO DOS CASOS 11.1. Examinar-se-á a possibilidade, quando apropriada, de atender os jovens infratores sem recorrer às autoridades competentes, mencionadas na regra 14.1 adiante, para que os julguem oficialmente. 11.2. A polícia, o ministério público e outros organismos que se ocupem de jovens infratores terão a faculdade de arrolar tais casos sob sua jurisdição, sem necessidade de procedimentos formais, de acordo com critérios estabelecidos com esse propósito nos respectivos sistemas jurídicos e também em harmonia com os princípios contidos nas presentes regras. 11.3. Toda remissão que signifique encaminhar o jovem a instituições da comunidade ou de outro tipo dependerá do consentimento dele, de seus pais ou tutores; entretanto, a decisão relativa à remissão do
12
ROSA, Alexandre Morais da. Ato Infracional, Remissão, Advogado e Garantismo. Disponível Em:<http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/infanciahome_c/adolescente_em_ conflito_com_a_Lei/Doutrina_adolescente>. Acesso em: 25 jul. 2017 13
SARAIVA, João Batista Costa. Direito Penal Juvenil – adolescente e ato infracional. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2002, p.59-60.
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caso será submetida ao exame de uma autoridade competente, se assim for solicitado. 11.4. Para facilitar a tramitação jurisdicional dos casos de jovens, procurarse- á proporcionar à comunidade programas tais como orientação e supervisão temporária, restituição e compensação das vítimas.
14
Faz-se importante a ressalva de que a expressão “remissão” não
consiste necessariamente em uma espécie de perdão, haja vista a
possibilidade de ser concedida cumulativamente com medida socioeducativa.
Todavia, a remissão combinada com medida socioeducativa exige que o
adolescente seja assistido pelo seu responsável e por defensor devidamente
constituído para tanto.15
Em se tratando de remissão, evidentemente que o representante do
Ministério Público se ocupará em fazer a análise da conveniência de sua
concessão para, motivadamente, submeter seu posicionamento à
homologação judicial para que surta efeito. Quanto a “concessão” de remissão,
Saraiva assevera que “é imprópria a expressão ‘concedido’, eis que a remissão
operada perante o Promotor de Justiça tem evidente caráter de transação”.
Seguindo a linha argumentativa, Saraiva pondera que a figura da remissão
possui origem doutrinária no instituto norte-americano “pobation”, o que
nitidamente configura sua natureza de transação.16
Acerca da comparação entre remissão e transação penal, Cristino
ressalta:
A possibilidade de remissão concertada pelo Ministério Público com caráter transacional, incluindo aplicação de medida socioeducativa
14
ONU. Declaração dos direitos da criança - Resolução ONU, 20 de novembro de 1959. ONU. Regras mínimas das Nações Unidas para administração da Justiça da Infância e da Juventude – Regras de Beijing - Resolução 40/33 – ONU – 29 de novembro de 1950. ONU. Diretrizes das Nações Unidas para prevenção da delinqüência juvenil – Diretrizes de Riad - 1° de março de 1988 – RIAD. Disponível em: <http://www.dhnet.org.br/direitos/sip/onu/c_a/le x47.htm> Acesso em: 27 jul. 2017. 15
ROSA, Alexandre Morais da. Ato Infracional, Remissão, Advogado e Garantismo. ROSA, Alexandre Morais da. Ato Infracional, Remissão, Advogado e Garantismo. Disponível em:<http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/infanciahome_c/adolescente_em_conflito_com_a_Lei/Doutrina_adolescente>. Acesso em: 27 jul. 2017. 16
SARAIVA, João Batista Costa. Direito Penal Juvenil. Disponível em: <http://www.unijui.edu.br/arquivos/clinicapsicologia/informativos/falandonisso16/opiniao.pdf>. Acesso em: 25 jun. 2017
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não privativa de liberdade constitui outra interpretação prejudicial ao infrator adolescente. Uma vez comparada à transação penal prevista na Lei 9.099/1995, esta exige a presença do juiz e dos advogados, sendo aquela concedida em ato privativo do Ministério Público.
17
Dessarte, pode-se dizer que a atuação judicial limita-se apenas a
determinar o cumprimento da medida, porque de fato ela já fora aplicada pelo
parquet.
Um importante estaque a ser feito é que, uma vez aplicada, a remissão
não poderá caracterizar a figura de antecedentes na trajetória do adolescente.
Entretanto, ela poderá ser aplicada cumulativamente com uma das medidas
socioeducativas em meio aberto, previstas no artigo 112 do ECA, mesmo que
com a ausência de um defensor, sem que para isso seja realizado processo de
apuração do ato infracional.
Sobre essa possibilidade, Saraiva tece a seguinte crítica:
Evidentemente que se na remissão concertada pelo Ministério Público, de caráter pré-processual, vier proposta a aplicação de alguma medida sócio educativa, em nome do contraditório, haverá de o adolescente estar acompanhado de Defensor na audiência pré-processual realizada junto ao Ministério Público onde operou-se a transação expressa na remissão. Diz-se tal porque evidentemente quando resultar a remissão de decisão do Juiz, no curso do processo, estará o adolescente representado por defensor, eis que não se admite em juízo adolescente representado pela prática de ato infracional sem o respectivo defensor. Embora esta exigência de defensor na audiência prévia com o Ministério Público não esteja expressamente prevista no ECA, decorre de uma interpretação sistemática das garantias constitucionais asseguradas a todos. Não é possível que se pretenda reviver nesta etapa pré-processual, porém decisiva, onde pode vir a ser concertado cumprimento de uma medida sócio educativa, um novo Juizado de Menores, sem possibilidade de defesa do adolescente, posto que evidentemente, frente ao Ministério Público estão os pais ou responsáveis do adolescente em flagrante desvantagem.
18
Outro ponto controverso do instituto da remissão reside na possibilidade
de ser revista a qualquer tempo pela autoridade judicial que, inclusive, poderá
determinar sua regressão consoante o art. 122, III do ECA. Assim, essa
17
CRISTINO, Fernanda da Rosa. A ilusão da impunidade penal da adolescência: considerações sobre o direito penal juvenil. Disponível em: <https://www.jurisway.org.br /v2/dhall .asp?id_dh=657>. Acesso em: 14 jul.2017. 18
SARAIVA, João Batista Costa. Direito Penal Juvenil – adolescente e ato infracional. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2002, p.59-60.
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hipótese apresenta uma acentuada violação constitucional, pois, a medida em
meio aberto cujo descumprimento ensejou regressão pode ter sido aplicada
sem que houvesse o processo de conhecimento, logo, considerando a situação
de regressão, o adolescente poderá sofrer restrições a sua liberdade sem que
para isso haja processo, observando assim nítida afronta ao artigo 5 º da
Constituição Federal.19
No entanto, conforme destaca Beloff (apud Costa), nas situações em
que houver terminação antecipada do processo ou derivação para instâncias
não judiciais, o importante é que, em havendo alguma medida sancionatória,
seja tomada a maior cautela para que não sejam atingidas as garantias básicas
do adolescente em conflito com a lei. Assim afirma a autora:
A lógica é sempre a mesma. Se o Estado renuncia a intervenção coercitiva, então o episódio não implicará nenhuma modificação ou intervenção na vida do jovem e de sua família. Se existe alguma modificação ou intervenção estatal (no sentido amplo), então, deve-se recorrer a todas as garantias para que esta intervenção seja realizada no marco da legalidade.
20
Assim, se está diante ao princípio da necessidade da pena, segundo o
qual o monopólio da aplicação se dá pelos órgãos judiciais, além de apresentar
um avanço para a humanidade, consiste no próprio caráter instrumental e
público do direito processual penal, qual seja, o caminho para a aplicação da
pena.
Deste modo, a aplicação de remissão cumulada com medida
socioeducativa, assim como a regressão por descumprimento injustificado de
medida em meio aberto aplicada em sede de remissão, como resultado de
transação entre o adolescente e o Ministério Público, não sendo realizado o
19
SARAIVA, João Batista Costa. Direito Penal Juvenil – adolescente e ato infracional. Porto Alegre: Livraria do advogado, 2002, p.59-60. 20
BELOFF, Mary. Os sistemas de Responsabilidade Penal Juvenil na América In: MENDEZ, Emilio Garcia; BELOFF, Mary. In: MENDEZ, Emilio Garcia; BELOFF, Mary. Infância Lei e Democracia na América Latina. Vol.1.p.134 (apud) COSTA, Ana Paula Mota. As garantias processuais como limite à violência estatal na aplicação da medida socioeducativa de internação. Maio de 2004. 331 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Programa de Pós Graduação em Ciências Criminais. Faculdade de Direito. Pontifícia Universidade Católica do Rio grande do Sul (PUCRS), Porto Alegre. 2004.
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devido processo legal, consiste em uma das maiores violações à garantias
constitucionais contida no ECA.
4. Considerações Finais
Com o advento do ECA crianças e adolescentes são colocados em
situação de igualdade de direitos, independente de sua condição
socioeconômica. Ao mesmo passo que lhes impõe obrigações compatíveis
com sua peculiar condição de desenvolvimento21, assegura-lhes o desfrute de
direitos e garantias previstas no ordenamento jurídico vigente. Assim, crianças
e adolescentes tornam-se titulares de direitos fundamentais à proteção integral.
Quanto a estrutura, o ECA referencia três grande sistemas de garantia,
baseados na proteção integral e de modo a garantir às crianças e aos
adolescentes o pleno gozo das garantias previstas no ordenamento jurídico
vigente. Segundo esse tríplice sistema, quando a criança ou adolescente não
se enquadrar no sistema primário de prevenção (políticas públicas), o Conselho
Tutelar deve ser acionado como operador do sistema secundário (medidas de
proteção). Entretanto, se ao adolescente for atribuída a autoria de ato
infracional, recorre-se ao sistema terceário (medidas socioeducativas), que tem
como operador o chamado sistema de Justiça.
No entanto, em que pese os inúmeros benefícios trazidos pelo ECA, a
não observância do devido processo legal nos casos de aplicação de remissão
cumulada com medida socioeducativa, assim como a regressão por
descumprimento injustificado de medida em meio aberto aplicada em sede de
remissão, como resultado de transação entre o adolescente e o Ministério
Público, para além da nítida violações de garantias fundamentas, representa
um desrespeito ao próprio espírito da lei, bem como do princípio da legalidade
e de outros decorrentes.
21
Essa classificação reforça que toda pessoa, enquanto viva, encontra-se em permanente
desenvolvimento de sua personalidade, porém na infância e na adolescência esse desenvolvimento é mais intensoe , portanto, peculiar. (Karyna Soposato p. 105)
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Centro Universitário Ritter dos Reis Referências
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