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Universidade Federal de Campina Grande
Programa de Pós-Graduação em Linguagem e Ensino 1
ANAIS ELETRÔNICOS ISSN 235709765
O DISCURSO DO ALUNO NA AULA VIRTUAL: UM ESTUDO DA CONSTRUÇÃO DE SENTIDOS DO TEXTO1
Telma Cristina Gomes da SILVA - UFCG2
RESUMO
Este trabalho apresenta resultados de uma pesquisa do processo de construção de sentidos da/na aula virtual mediante a análise de enunciados discentes à luz da teoria dialógica de Bakhtin e o Círculo. Objetiva-se identificar as marcas linguístico-discursivas responsáveis pelos sentidos atribuídos ao texto pelos alunos em uma disciplina de língua portuguesa do ensino online de uma IES pública paraibana. Adotaram-se como metodologia de pesquisa: a pesquisa bibliográfica, pesquisa de campo de cunho netnográfico e a pesquisa documental. O componente curricular pesquisado possuía uma população de 535 (quinhentos e trinta e cinco) alunos participantes no ano de 2010 (momento da enunciação). Analisa-se uma amostragem com 05 (cinco) enunciados de alunos produzidos como respostas as atividades solicitadas na aula virtual, na qual foram produzidos 187 (cento e oitenta sete) enunciados entre professores, tutores e alunos em torno do texto “Diga não as drogas” de Luiz Fernando Veríssimo. Os resultados evidenciam que as interações constituídas pelos alunos na aula virtual, podem ou não favorecer a construção de sentidos do texto e/ou do tema em discussão devido à compreensão responsiva discente ser influenciada por leituras fragmentas, ou ainda, por interpretações equivocadas que provocam não somente a fuga do tema em discussão, mas também descaracterizam a aula virtual devido não haver a discussão do texto, e sim a reprodução de discursos. Esperamos contribuir com este estudo para o ensino-aprendizagem de língua portuguesa na EaD online, bem como favorecer as pesquisas sobre a compreensão leitora e os estudos do discurso nas áreas de Linguística, Letras e Educação.
PALAVRAS-CHAVE: Dialogismo. Discurso do Aluno. Aula Virtual.
1 Este trabalho é um recorte da tese intitulada “A compreensão responsiva discente em e-fóruns
acadêmicos: uma abordagem dialógica” defendida, em 2015, no Programa de Pós-Graduação em Linguística da Universidade Federal da Paraíba. 2 Doutora em Linguística (PROLING/UFPB). Mestre em Letras (PPGL/UFPB). Licenciatura Plena em Letras
(DLCV/UFPB). Atualmente, realiza o Estágio Pós-Doutoral no Programa de Pós-Graduação em Linguagem e Ensino da Universidade Federal de Campina Grande. Email: [email protected]
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Introdução
O presente artigo discute resultados parciais de uma pesquisa, em nível de
doutorado, sobre a compreensão leitora do aluno na aula virtual. O interesse, neste
estudo, surge diante do desafio dos educadores em formarem leitores responsivos
capazes de atuar efetivamente na nova realidade social, no caso, a cultura digital.
Partindo disso, analisamos o processo de construção de sentidos do texto pelo(s)
aluno(s) em uma situação concreta de sala de aula à luz da teoria dialógica da
linguagem de Bakhtin e o Círculo.
Observamos como as interações verbais realizadas pelo(s) aluno(s) em um e-
fórum/ aula virtual colaboram ou não para a compreensão do(s) texto(s), e por sua
vez, para construção do leitor responsivo ativo. Para tanto, considerarmos que o
processo de ensino-aprendizagem é constituído através da interlocução entre o “eu” e
o “outro” (professor, texto, material instrucional, aluno, etc.), sendo o sentido de uma
palavra (ou texto) construído na inter-relação entre o individual e o social.
Bakhtin/ Volochínov ([1929] 2010) entendem a língua(gem) como um
fenômeno que comporta duas faces: o conteúdo (interior) e a materialização
(exterior). Essa é formada e determinada no interior do sujeito e exteriorizada para
o(s) outro(s) sujeitos através de uma forma linguística. Nessa óptica, a noção de
interação verbal bakhtiniana é regulada por aspectos individuais, sociais e históricos,
dependendo das relações dialógicas constituídas pelos sujeitos do discurso.
Para Almeida (2013), a construção de sentidos para o/do texto engloba tanto a
produção/ recepção do discurso, como a compreensão leitora do sujeito acerca do
mundo/objeto de discurso. Essa compreensão é, conforme afirma essa estudiosa,
determinada pelas relações dialógicas constituídas pelo sujeito ao longo de sua
experiência de vida. Os discursos trazem, portanto, marcas da subjetividade e da
coletividade, sendo essencial entendermos essas particularidades no processo de
interlocução realizado em sala de aula (presencial ou virtual).
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Considerando isso, analisamos aqui uma amostragem composta por cinco
enunciados de alunos produzidos como respostas as atividades solicitadas em um e-
fórum/aula virtual de uma disciplina de língua portuguesa no/do ensino a distância de
uma IES pública. Posto isto, explicitaremos, a seguir, sobre o conceito de gêneros
discursivos bakhtiniano para definir os gêneros aula e aula virtual.
O gênero discursivo aula
Conceituamos a aula a partir da noção bakhtiniana de gênero discursivo
secundário uma vez que essa forma discursiva pode se apropriar em sua composição
de qualquer texto a exemplo do acontece com o gênero romance caracterizado por
apresentar “uma diversidade social de linguagens organizadas artisticamente, às vezes
de línguas e de vozes individuais” (BAKHTIN, [1975] 2010a, p. 74).
Na aula, um professor pode introduzir diferentes gêneros literários e não
literários que a constituem, bem como as interações realizadas entre professor-aluno,
aluno-texto, aluno-aluno. A aula resulta dessa incorporação de diferentes
textos/discursos e de interações verbais entre diferentes sujeitos para o seu
acontecimento discursivo.
Em “Gêneros textuais: configuração, dinamicidade e circulação”, Marcuschi
(2005) dividi o gênero aula em quatro categorias: 1) a aula ortodoxa centrada no
professor que expõe um conteúdo aos alunos; 2) a aula socrática centrada no diálogo
entre professor-aluno sobre um tema específico; 3) a aula caleidoscópio resulta da
participação espontânea do aluno como um condutor da discussão; 4) e a aula
desfocada conduzida a partir de diferentes temáticas.
Por sua vez, Francelino (2007) caracteriza a aula, considerando que essa
apresenta formatos diversos sem que haja predominância de um tipo sobre outro.
Partindo disso, esse estudioso define a aula como: 1) um gênero oral, interativo e
dialógico; 2) produto de vozes sociais distintas; 3) e marcado pela heterogeneidade
enunciativa e discursiva.
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Matencio (1990) caracteriza a aula presencial, considerando a interação verbal
entre “professor-aluno”. Para essa estudiosa: 1) a aula é constituída dentro das
práticas sociais institucionalizadas a exemplo das práticas escolares; 2) o professor é o
motivador, mediador, organizador e avaliador da interação em sala de aula; 3) o
discurso pedagógico está subordinado aos aspectos individuais e coletivos que
emergem no processo de interação, logo, o projeto da aula implica flexibilidade para
atender seus propósitos pedagógicos.
Almeida (2004) acrescenta que a aula resulta do planejamento e da retomada
de aulas anteriores pelo professor, tendo os deslocamentos temáticos e os
encadeamentos discursivos como suas principais características. Essa visão comunga
com o que observamos na aula virtual, onde observamos que o desvio temático resulta
das interações dos alunos com ideias fragmentos de texto motivador no
encadeamento discursivo do e-fórum/aula virtual.
O gênero discursivo aula virtual evoluiu através da interação mediada pela
Internet. Ela apresenta certas particularidades atribuídas pelo ciberespaço, tendo
características dos formatos ortodoxo e desfocado devido à ausência física do
professor e sendo organizada em ambientes virtuais de aprendizagem onde a
participação ativa do(s) aluno(s) e o objetivo de estudo pré-definido são fundamentais
para a constituição da aula propriamente dita.
Além disso, a aula virtual caracteriza-se pela inserção tanto de textos
convencionais como de gêneros digitais, como o chat, o wiki, o e-fórum, etc. Na EAD,
essa última forma discursiva digital é introduzida na aula para discussão de temáticas
diversas, possibilitando a interação verbal, sincrônica e assincrônica, entre seus
participantes (professores, tutores e alunos) com o material instrucional.
Após a caracterização da aula como um gênero discursivo complexo,
apresentamos, a seguir, como o(s) sentido(s) do(s) texto(s) é(são) construído(s) pelo(s)
aluno(s) na aula virtual.
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O sentido do/no texto: um produto do dialogismo
Para Bakhtin ([1975]2010a), a língua viva se constitui através do diálogo
continuo entre diferentes sujeitos (vozes sociais), sendo a orientação dialógica para o
discurso do outro um processo natural de qualquer discurso vivo. Nesta óptica, os
objetos de discurso são produzidos na/pela interação com os pontos de vistas e as
apreciações de mais de um sujeito social. Tal interação entre discursos é bastante
recorrente na esfera acadêmica, sendo esse lugar social ideal para o estudo da
construção de sentidos do discurso, no caso, o discurso do aluno que é povoado de
outros discursos produzidos nessa esfera social.
Considerando essas colocações, acreditamos que o estudo do discurso citado é
bastante produtivo para compreendermos a orientação sociológica, e, por sua vez, a
construção do sentido do/no texto na aula virtual. Pois, mostra-nos a relação, a
integração e a apropriação da(s) voz(es) do(s) “outro(s)” pelo “eu” na/para a
constituição do texto.
Observando esse processo dialógico da/para a constituição dos discursos dos
alunos pela inserção do discurso citado, recorremos a Faraco (2009) que analisa,
embasado no pensamento bakhtiniano, o processo de referenciação a partir de duas
operações produzidas no interior do signo verbal, o reflexo e a refração, considerando
que toda palavra carrega uma apreciação do mundo por meio do olhar do sujeito.
Assim, segundo esse estudioso, as significações não são estanques porque viverem
num processo dinâmico, social e histórico em que os signos interagem uns com os
outros atualizando sentidos.
Nessa dinâmica de orientação do discurso, Bakhtin/ Volochínov ([1929] 2010)
apresentam dois esquemas básicos de transmissão do discurso: 1) o discurso direto
como a reprodução da(s) voz(es) de outro(s) sujeito(s) pelo uso de aspas ou de
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travessão; 2) e o discurso indireto como a apropriação, maior ou menor, da
apreciação do discurso do outro pelo sujeito3.
Outra forma de apropriação do discurso alheio, segundo os estudiosos citados,
é o fenômeno do discurso não demarcado entendido como a união entre duas
entonações distintas (apreciações) num único ato enunciativo. Essas noções são
essenciais para entendermos como o sentido do discurso é constituído no processo de
interação na/da aula virtual, visto que todo discurso é uma reação ao discurso do
outro e, portanto, mantém uma a ligação com a voz do outro.
Por essa óptica, o processo de construção do texto não compreende apenas a
produção e a recepção de discursos, mas também a interpretação do sujeito do
discurso (ALMEIDA, 2013). Com isso, os sentidos de um texto são construídos pela
interação do “eu” com o “outro”, e, portanto, pressupõe a relação do sujeito com os
pontos de vista de outros sujeitos. Nessa dimensão, todo discurso reflete e refrata os
pontos de vista trazidos em outros discursos, sendo marcado pelo individual e pelo
social (VOLOSHINOV, [1926] 1976).
O linguista Voloshinov ([1926] 1976) acrescenta que o discurso do sujeito é
construído por elementos contínuos e imutáveis da língua vida, e também pelas
apreciações presumidas de sua comunidade discursiva. O presumido diz respeito à
retomada da voz do outro pelo sujeito do discurso, isto é, o discurso citado é
incorporado ao discurso do citante.
Analisemos, a seguir, os discursos dos alunos produzidos no e-fórum/aula
“Argumentação”, no qual selecionamos uma amostragem com cinco enunciados de
alunos, observando as interações sociais estabelecidas por esses sujeitos
leitores/escreventes para a produção de sentidos do(s) texto(s).
Essas interações são réplicas, diretas ou indiretas, a voz da professora da
disciplina que solicita a atividade de leitura. Basicamente, a professora orienta a leitura
do texto “Diga não as drogas”, enfatizando que os alunos não fujam da temática em
discussão. Deste modo, ela influencia a construção sintática dos discursos dos alunos e
3 Essa discussão é aprofundada na tese de Silva (2015).
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direcionando não apenas a leitura do texto, como também a réplica de diálogo entre
“aluno-aluno”, por sua vez, essa interação entre alunos prevalecerá no processo de
discussão da/na aula sendo o(s) discurso(s) do(s) aluno(s) marcado(s) discursivamente
por discurso(s) de outro(s) aluno(s).
No primeiro enunciado de aluno analisado, neste trabalho, observamos que o
enunciador A60 direciona seu discurso para outro aluno participante da aula, no caso
A32, como orientado pela professora. Vejamos o enunciado de A60:
Boa noite, A32.
É isso mesmo, como é fácil levar um amigo para o mundo das drogas,
realmente quase sempre é um caminho sem volta, podemos chegar a conclusão que
quem faz isso com um amigo não gosta nem de si mesmo, já está sem saida e quer
levar outras pessoas para o fundo do poço.
Isso nos causa um grande temor, pois como será o futuro dos nossos filhos,
será que só a orientação que nós damos vai adiantar no mundo tão perdido como esse
que vivemos, as músicas citadas no texto também nos chama atenção, pois as letras
são horríveis e estão dentro de nossas casas.
ALUNO/A – POLO (A60 –AULA02/02, grifos nossos).
Neste enunciado, a interação com a voz do outro aluno prevalece. Pois, A60
concorda com A32 sem questioná-lo acerca do texto não se tratar de uma letra de
música, mas sim de uma crítica a “droga cultural”. Embora, A60 dialogue com o texto
motivador apenas reproduz um discurso disperso com uma ideia generalizada sobre o
tema “drogas”, não trazendo contribuições para a discussão da/na aula virtual.
Temos aqui uma reprodução do discurso do outro através do diálogo de A60
com quatro vozes sociais: 1) a voz da professora motivadora da discussão; 2) a voz do
texto em discussão; 3) a voz de A32 com quem concorda; 4) e uma voz social (senso
comum) responsável pelo valor atribuído à palavra “droga” na comunidade discursiva
do enunciador.
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Essas relações dialógicas constituídas pelo aluno não favoreceram a
compreensão do texto discutido porque o aluno não aprofunda a discussão sobre a
“droga cultural” mesmo tendo mais de cinquenta enunciadores o antecedendo na
discussão do e-fórum/aula. Deste modo, o enunciado de A60 apresenta características
do discurso reproduzido4 – repetição da voz do outro – devido à apropriação da voz do
senso comum sem aprofundar a temática do texto motivador.
Além disso, o enunciador alega que o autor do texto cita letras de música,
quando, na verdade, o texto motivador não apresenta tais alusões apenas menciona
gêneros musicais. Deduzimos, então, que o aluno não leu o texto “Diga não as
drogas!”, ou ainda, se leu, não o compreendeu, visto que não traz informações que
condizem com o discurso do autor do texto.
Retomando o processo de referenciação apresentado por Faraco (2009) que
mostra duas operações do signo verbal: o reflexo (repetição e/o apropriação da voz do
outro) e a refração (a representação da multiplicidade de vozes), segundo o
pensamento bakhtiniano. O enunciado de A60 apresenta claramente essas operações
à medida que o enunciador tanto reproduz o discurso de outro aluno, como esse outro
discurso reproduzido é repleto de uma multiplicidade de outras vozes sociais que
ecoam em torno da construção de sentidos do tema “drogas”. Os feitos de sentido do
discurso do aluno resultam, então, desse confronto entre diferentes vozes sociais.
Também observamos neste enunciado marcas linguístico-discursivas que
caracterizam uma aproximação do sujeito com o tema “drogas” mediante o emprego
de elementos linguísticos na primeira pessoa do plural como “podemos”, “nos”,
“nossos”, etc., atribuindo, simultaneamente, um acento apreciativo ao tema, visto que
o enunciador trata as “drogas” como um problema de todos, inclusive dele próprio.
Concluímos assim que o discurso desse enunciador não se distanciou do tema pelo
emprego do discurso indireto, não apresentando traços do conteúdo da aula
4 O conceito de discurso reproduzido é mais bem definido em minha tese de doutorado. Vejam a
referência: Silva (2015).
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“argumentação” que trabalha aspectos da impessoalidade para o distanciamento do
locutor no tratamento de temas de opinião pública, ou polêmicos.
Também o enunciado de A60 emprega a variante analisadora do conteúdo
(VAC), como propõem Bakhtin/ Volochínov ([1929] 2010), para construir seu discurso.
Com essa variante, o enunciador apreende o tema da enunciação do outro, no caso
A32, preservando o conteúdo semântico do discurso alheio, sem necessariamente,
citar de maneira direta esse outro discurso, mas sim o tendo como seu principal
interlocutor, seja por concordar, discordar, etc. desse outro sujeito do discurso.
No encadeamento discursivo do e-fórum/aula, temos o enunciado de A63
concordando com a voz do enunciador A1. Observemos o enunciado de A63:
Oi A1 é isso mesmo, o texto de Luiz Fernando verissimo , relata um jovem que
apenas aos 14 anos, se deixa envolver nesse mundo sem volta das drogas, e
perde a alegria de viver, mas o autor também aproveita a oportunidade e faz
muitas criticas a música Brasileira.
Um abraço!
ALUNO/A – POLO (A63 –AULA02/02, grifos nossos).
Esse segundo enunciado apresenta a interação de A63 com A1, seguindo a
orientação da professora acerca da réplica direcionada ao discurso de outro aluno.
Também o enunciador faz uma referência direta ao texto motivador, como mostra o
trecho “o texto de Luiz Fernando verissimo”, porém, o tema da “droga cultural”, mais
uma vez, é trazido de maneira superficial, como mostra o excerto “mas o autor
também aproveita a oportunidade e faz muitas criticas a música Brasileira”, ou seja,
A63 não compreende que esse é o principal tema do texto.
Nesse caso, o enunciador estabelece uma relação dialógica com três vozes
sociais: a voz da professora, a voz do texto e a voz de A1, mas sem atentar para o tema
central da discussão. Podemos citar ainda uma quarta voz social, uma vez que o
discurso do senso comum a respeito das “drogas químicas prejudicarem a vida dos
jovens” predomina no discurso do aluno. Pois, embora, esse discurso perpasse o texto
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de Veríssimo, ele é apenas um ponto de partida para o autor tratar do tema “droga
cultural” e não o tema propriamente dito.
Quando A63 concorda com A1 tem seu discurso influenciado pela opinião do
“outro”, e, por sua vez, a orientação dada pelo “outro” em relação ao texto é
reproduzida. Isso favorece o desvio temático porque o enunciador se apoia em uma
ideia superficial trazida no discurso do outro/aluno, desconsiderando a substância do
texto discutido. A interação entre os alunos da aula analisada propicia, então. o
deslocamento temático porque a compreensão responsiva de “um” sujeito leitor
influencia a constituição do discurso do “outro”. Assim, os alunos dão novo
direcionamento à discussão visto que ao reproduzirem discursos fragmentados,
simultaneamente, deslocam o tema da aula, criando outra discussão voltada para os
prejuízos sociais da droga química.
Além disso, o enunciado de A63 traz marcas do discurso direto esvaziado (DDE),
visto que o enunciador transmite a voz do outro, atribuindo uma entonação própria,
seu tom apreciativo para construção do discurso. A apropriação do discurso do outro
por essa variante reduz o peso semântico das palavras do “outro”, segundo
Bakhtin/Volochinov ([1929]2010). No excerto anterior, observamos que o tema
principal a “droga cultural”, tornou-se secundário quando inserido no enunciado do
aluno. Com isso, os sentidos do texto em discussão se perdem pela apropriação de
ideias fragmentadas por seus interlocutores/ os alunos.
O enunciado de A64 revela um caso de polêmica clara entre os discursos
analisados, mostrando um posicionamento do aluno contra a opinião do autor do
texto. Destacamos que mesmo a discussão não sendo aprofundada pelo enunciador,
identificamos indícios do tema da “droga cultural” no discurso do aluno. Vejamos o
enunciado de A64:
Eu concordo com o texto, no que se refere as criticas sobre as drogas que é um
caminho fácil de se entrar e dificil de sair. Mas discordo da comparação feita
das drogas com as músicas.
(A64 –AULA02/02, grifos nossos).
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É interessante aqui o emprego do “mas” pelo enunciador A64, tendo em vista
esse termo constitui um elemento argumentativo, isto é, o aluno se apropriou de um
recurso linguístico estudado na unidade de conteúdo para produzir efeitos de sentidos
em seu discurso. Contudo, o tema “droga cultural” é tratado ainda de maneira
superficial, talvez, por essa temática não ser aceita, ou mesmo, compreendida pela
comunidade pesquisada.
Isso acontece devido ao tema “droga cultural” ser novo para os alunos, sendo
difícil eles atribuírem sentidos ao texto motivador. Nesse caso, o enunciado de A64
apresenta indícios do discurso reproduzido, porque o enunciador, basicamente,
concorda com o texto de Veríssimo em relação os prejuízos das “drogas” para a
sociedade. Mas, por outro lado, o aluno discorda do texto acerca da comparação da
música brasileira com as drogas, refratando a posição trazida pelo autor, e
consequentemente, assumindo um posicionamento diante do discurso do outro. Essa
atitude responsiva ativa do aluno produz efeitos de sentidos em seu discurso, trazendo
para a discussão o principal tema do texto motivador.
Ademais, o enunciador dialoga também com três vozes sociais para constituir
seu discurso, são elas: 1) a voz da professora motivadora do debate na aula; 2) a voz
do texto motivador com quem o enunciador concorda parcialmente; 3) e a voz social
responsável pelo julgamento de valor atribuído à palavra “droga” na comunidade
discursiva do enunciador.
O penúltimo enunciado analisado na sequência recotada do/no e-fórum/aula
“argumentação” constitui-se através da variante DDE, reproduzindo o discurso do
senso comum sobre o mal causado pelas drogas a sociedade. Esse discurso é
reproduzido sem que o enunciador mencione o tema principal do texto, ou seja, a
“droga cultural”, desviando-se assim do tema gerador da discussão na aula, como
observamos no enunciado de A65:
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O texto de Luiz Veríssimo, Diga não as Drogas, mostra claramente a vida de
uma pessoa que entra no caminho das drogas, de um caminho sem volta, relata
os desafios encontrados por essas pessoas para se livrarem delas, como é fácil
entrar nesse caminho e como é difícil sair dele.
E vejo no mundo de hoje, como são grandes as facilidades que as pessoas
encontram para entrarem nessa vida, mas não podemos julgar-las, pois não
sabemos por que motivos eles chegara a optar por esse caminho.
Estamos aptos a uma vida de grandes descobertas e de grandes revelações,
devemos está preparados, para poder superar todos esse desafios, agregar
mais valores próprios e adquirir conhecimentos que facilite essas novas
descobertas.
ALUNO/A – POLO (A65 –AULA02/02, grifos nossos).
Semelhante aos enunciados que o antecede, o enunciado de A65 retoma o
discurso do “jovem iludido pelos amigos que cai no mundo das drogas”, mostrando um
afastamento do “eu” em relação à problemática trazida pelo texto, como mostram o
emprego dos termos “vejo”, “estamos” para tratar do mundo atual e “julgar-las”,
“eles” em relação a quem utiliza drogas químicas, ou seja, o enunciador se distancia da
personagem, o “jovem iludido usuário de drogas”.
A princípio a composição sintática do enunciado transmite a ideia de que o
enunciador expressará uma situação pessoal, porém, ele se dirige ao interlocutor,
trazendo a tona um “outro”, “o jovem”, com quem não se identifica como mostra o
excerto “mas não podemos julgar-las, pois não sabemos por que motivos eles chegara
a optar por esse caminho”. Também observamos um tom apreciativo com dupla
interpretação nesse excerto: 1) o tom de compaixão pelo sofrimento do “outro”; 2) e o
distanciamento da situação na qual esse “outro” vive.
Essa estratégia é empregada não somente para se distanciar do tema, mas
também construir os efeitos de sentido para o discurso pretendido pelo enunciador.
Embora, o enunciador cite o texto de Veríssimo, novamente, identificamos um
deslocamento temático por A65 não tratar do tema “droga cultural”, limitando-se a
reproduzir o discurso da maioria dos alunos sobre o problema com a “droga química”
na sociedade contemporânea.
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Verificamos que o enunciador utiliza a variante DDE para atribuir seu próprio
tom apreciativo ao discurso do “outro”, citando apenas com quem dialoga, mas sem
trazer a voz integral desse outro sujeito para o discurso. Com isso, A65 reduz o peso
semântico do discurso do “outro”, conferindo uma significação e uma tonalidade
diferente da trazida pelo texto em discussão. Assim, o enunciador atribuir novos
sentidos ao discurso do outro, uma vez que o interlocutor do discurso do aluno
entenderá que o texto de Veríssimo trata da “droga química”, quando, na verdade, o
tema é a “droga cultural”.
Os efeitos de sentido produzidos no enunciado de A65 resultam da interação,
com as vozes de outros alunos que tratam do tema “drogas” na aula virtual. Esse
enunciado não revela indícios da interação direta com a voz da professora, já que o
aluno não interage com um aluno especifico como solicitado, nem tampouco se
posiciona acerca do texto motivador, reproduzindo apenas o discurso que eco no e-
fórum/aula de que as “drogas são prejudiciais à sociedade”.
Essa atitude do enunciador colabora para o deslocamento temático, bem como
para a reprodução da voz do outro. Pois, a leitura fragmenta sem conhecer o todo
significativo do texto, favorece a perda de sentidos desse texto e, por sua vez,
desconstrói o próprio sentido do gênero e-fórum de discussão porque os alunos não
interagem com o tema gerador do debate, restringindo-se a reproduzir discursos e não
argumentar acerca deles. Assim, esse desvio temático é um prejuízo na sequência
discursiva (encadeamento discursivo) da/na aula virtual.
Diferentemente dos enunciados que o antecede, o enunciador A66 traz
contribuições para a discussão através da observação de que o texto de Veríssimo,
inicialmente, parece tratar de um tema, mas, na verdade, aborda outro. Vejamos o
enunciado de A66 abaixo:
O título do texto nos faz pensar que o autor vai falar exatamente sobre drogas,
mas ele comparou as drogas com a música que desvalorizam o ser humano,
principalmente os jovens que tudo o que ouvem e que acontece na televisão
querem fazer igual seja bom ou ruim, por isso que o mundo está cheio de tanta
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violência, e devemos estar atento com esse tipo de coisas, procurar escutar e
assistir coisas que enriqueçam a nossa educação e nos afastem das drogas.
ALUNO/A – POLO (A66 –AULA02/02, grifos nossos).
À medida que o enunciador A66 aponta que o texto não aborda o tema que
aparenta, simultaneamente, ele constrói seu comentário através do discurso ampliado
pelo qual o enunciador não apenas dialoga com o discurso do professor, de outros
alunos e do texto motivador, mas também traz uma nova informação para a discussão,
no caso, a informação de que o texto apresenta duplo sentido introduzido pela palavra
“drogas”. Essa atitude responsiva do aluno atentando para algo que os outros
participantes não perceberam no processo de interlocução com o texto motivador
oferece novo direcionamento à discussão da/na aula e, por sua vez, os efeitos de
sentidos, até então, produzido nela.
Basicamente, esse enunciador dialoga com o enunciado da professora e do
texto para atribuir sentidos ao discurso. Essas relações dialógicas constituídas por A66
atendem os seguintes propósitos da aula: 1) a leitura do texto motivador; 2) o
questionamento ou opinião sobre esse texto. Mas, não atende a interação direta com
outro participante da aula como solicitado pela professora. Pressupomos que isso se
deva a dois motivos: 1) os outros alunos não tratam do tema “droga cultural”; 2) o
enunciador evita o confronto aberto com seus interlocutores na aula.
A interação com as vozes da professora e do autor oferecem subsídios para a
produção do discurso de A66 sobre o tema “droga cultural”. Cada voz exerce uma
função peculiar no enunciado do aluno. A voz da professora direciona o que deve ser
feito; enquanto a voz do texto traz à tona o tema em discussão que confunde,
inicialmente, o aluno devido ao autor considerar os ritmos musicais como uma “droga
cultura”. Também o enunciador emprega o recurso argumentativo “mas” para
construção de seu discurso, demonstrando não apenas uma compreensão responsiva
ativa do texto, como também uma apreensão do conteúdo da aula.
Além disso, o enunciado de A66 constitui-se pelo emprego da variante do
discurso direto preparado (DDP). Esse discurso é constituído mediante o discurso
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direto originado do discurso indireto, sendo o conteúdo antecipado pelo enunciador à
medida que retoma um já dito, produzindo efeitos de sentidos para seu discurso com
suas próprias palavras.
Algumas considerações
No e-fórum/aula “Argumentação”, os enunciados analisados revelam que os
alunos dialogam com quatro vozes sociais, são elas: 1) a voz da professora motivadora
da discussão; 2) a voz do autor do texto mesmo que de modo indireto; 3) as vozes de
outros alunos participantes do e-fórum/aula; 4) e os discursos dispersos que circulam
nas comunidades discursivas dos alunos.
Essas interações sociais são fundamentais para a produção dos efeitos de
sentidos nos discursos dos alunos, pois permitem que eles atribuam valores ao(s)
tema(s) em discussão. Dentre essas relações sociais a mais expressiva para a
construção dos discursos dos alunos acontece entre as vozes de “aluno-aluno”, sendo
essas responsáveis pelo deslocamento temático no e-fórum/aula analisado.
Pois, os alunos elaboram seus discursos baseados no senso comum de que as
“drogas são nocivas aos jovens”, sem preocuparem-se com o tema do texto em
discussão e, portanto, os enunciados são elaborados, independente, da interação
direta com o enunciado da professora e/ou com o texto.
A análise revela que os alunos desviam do tema, reproduzindo a ideia geral do
texto contida no título “Diga não as drogas”, ou ainda, reproduzindo ideias
fragmentadas dos discursos de outros alunos participantes da aula. Esses dados
evidenciam a não leitura, ou mesmo, a incompreensão do texto motivador pela
maioria dos alunos participantes do e-fórum/aula analisado.
Concluímos que as interações verbais constituídas pelos alunos da/na aula
virtual nem sempre propiciam a compressão do texto motivador, sendo necessário o
mediador pedagógico – professor pesquisador ou tutor a distância – realizar ações
mais efetivas para a formação do leitor compreensivo responsivo ativo no processo de
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ensino-aprendizagem de língua portuguesa no ensino a distância online. Portanto, não
basta oferecer condições de produção e colocar os alunos em contato com o material
instrucional para que compreendam e produzam discursos com eficácia.
Considerando os resultados desta pesquisa, acreditamos que uma maior
(frequência) intervenção do mediador pedagógico nas interações da aula virtual,
direcionando questionamentos para os alunos favorecerá a reflexão não somente do
tema em discussão bem como de posicionamentos dos outros alunos em relação ao
texto, propiciando assim a formação de leitores capazes de se posicionar diante do
discurso outro/ do mundo.
Referências ALMEIDA, Maria de Fátima. O desafio de ler e escrever: experiências com a formação docente.[recurso eletrônico] / Maria de Fátima Almeida. – João Pessoa: Ideia Editora, 2013. ________. Linguagem e leitura: movimentos discursivos do leitor na construção do sentido do texto em sala de aula de 5ª série / Maria de Fátima Almeida. – Recife, 2004. Tese (Doutorado em Linguística). Universidade Federal de Pernambuco. BAKHTIN, Mikhail. (Volochínov). [1929]. Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. [Trad. M. Lahud e Y. F. Vieira]. 13ª ed. São Paulo: HUCITEC, 2010. ________. [1975] Questões de Literatura e de Estética (A Teoria do Romance). [Trad. Aurora Fornono Bernardini; José Pereira Júnior; Augusto Góes Júnior; Helena Spryndis Nazário; Homero Freitas de Andrade]. 6ª ed. São Paulo: HUCITEC, 2010a. FARACO, Carlos Alberto. Linguagem & Diálogo: As ideias linguísticas do círculo de Bakhtin/ Carlos Alberto Faraco. – São Paulo: Parábola Editorial, 2009. (Linguagem). FRANCELINO, Pedro Farias. A autoria no gênero discursivo aula: uma abordagem enunciativa. Recife, 2007. Tese (Doutorado em Linguística). Universidade Federal de Pernambuco. MARCUSCHI, Luiz Antônio. Gêneros textuais: configuração, dinamicidade e circulação. In: Gêneros textuais: reflexão e ensino/ Acir Mário Karwoski et al (org.). Palmas e União da Vitória, Paraná: Kaygangue, 2005, p. 17-33. ________. Gêneros textuais emergentes no contexto da tecnologia digital. In: MARCUSCHI, Luiz Antônio; XAVIER, Antonio Carlos (Orgs.). Hipertexto e gêneros digitais: novas formas de construção de sentido. – 3ª ed. – São Paulo: Cortez: 2010, p. 15-80. MATENCIO, Maria de Lourdes Meirelles. Estudo da língua falada e aula de língua materna: uma abordagem processual da interação professor/alunos/Maria de Lourdes
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Meirelles Matencio. – Campinas, SP: [s.n.], 1999. Tese (Doutorado em Linguística Aplicada). Universidade Estadual de Campinas, Instituto de Estudos da Linguagem. MORAN, José Manuel. Educação inovadora na Sociedade da Informação. Disponível em: http://www.anped.org.br/reunioes/23/textos/moran.PDF Acesso em: 16/11/2013. PONZIO, Augusto. A revolução bakhtiniana: o pensamento Bakhtin e a ideologia contemporânea / Augusto Ponzio; [organização de tradução Valtemir Mioletto] / 1. ed. 2ª reimpressão – São Paulo: Contexto, 2011. PAIVA, Vera Lúcia Menezes de Oliveira; RODRIGUES JÚNIOR, Adail Sebastião. Fóruns on-line: intertextualidade e footing na construção do conhecimento. In: MACHADO, Ida Lúcia; MELLO, Renato de. (orgs.). – Belo Horizonte: Núcleo de Análise do Discurso, Programa de Pós-Graduação em Estudos Linguísticos, Faculdade de Letras da UFMG, 2004, p. 171-189. Disponível em: http://www.veramenezes.com/forum.pdf Acesso em: 10/11/2013. SILVA, Telma Cristina Gomes da. A compreensão responsiva discente em e-fórun acadêmicos: uma abordagem dialógica / Telma Cristina Gomes da Silva.- João Pessoa, 2015. Tese (Doutorado em Linguística). Universidade Federal da Paraíba. SOBRAL, Adail. Do dialogismo ao gênero: as bases do pensamento do círculo de Bakhtin/Adail Sobral. – Campinas, SP: Mercado de Letras, 2009. Série Ideias sobre a Linguagem. VOLOSHINOV, V. N. Discurso na Vida e Discurso na Arte (sobre a poética sociológica) [1926]. Tradução para o português por Carlos Alberto Faraco e Cristovão Tezza, para uso didático, com base na tradução inglesa de I. R. Titunik. Discourse in life and discourse in art – concerning sociological poetics. In: V. N. Voloshinov, Freudism. New York: Academic Press, 1976.
Anexo A – Texto “Diga não as drogas”
Tudo começou quando eu tinha uns 14 anos e um amigo chegou com aquele
papo de "experimenta, depois, quando você quiser, é só parar..." e eu fui na dele.
Primeiro ele me ofereceu coisa leve, disse que era de "raiz", "natural" , da terra", que
não fazia mal, e me deu um inofensivo disco do "Chitãozinho e Xororó" e em seguida
um do "Leandro e Leonardo". Achei legal, coisa bem brasileira; mas a parada foi
ficando mais pesada, o consumo cada vez mais freqüente, comecei a chamar todo
mundo de "Amigo" e acabei comprando pela primeira vez.
Lembro que cheguei na loja e pedi: - Me dá um CD do Zezé de Camargo e
Luciano. Era o princípio de tudo! Logo resolvi experimentar algo diferente e ele me
ofereceu um CD de Axé. Ele dizia que era para relaxar; sabe, coisa leve... "Banda Eva",
"Cheiro de Amor", "Netinho", etc. Com o tempo, meu amigo foi oferecendo coisas
piores: "É o Tchan", "Companhia do Pagode", "Asa de Águia" e muito mais. Após o uso
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contínuo eu já não queria mais saber de coisas leves, eu queria algo mais pesado, mais
desafiador, que me fizesse mexer a bunda como eu nunca havia mexido antes, então,
meu "amigo" me deu o que eu queria, um Cd do "Harmonia do Samba".
Minha bunda passou a ser o centro da minha vida, minha razão de existir. Eu
pensava por ela, respirava por ela, vivia por ela! Mas, depois de muito tempo de
consumo, a droga perde efeito, e você começa a querer cada vez mais, mais, mais . . .
Comecei a freqüentar o submundo e correr atrás das paradas. Foi a partir daí que
começou a minha decadência. Fui ao show de encontro dos grupos "Karametade" e
"Só pra Contrariar", e até comprei a Caras que tinha o "Rodriguinho" na capa.
Quando dei por mim, já estava com o cabelo pintado de loiro, minha mão tinha
crescido muito em função do pandeiro, meus polegares já não se mexiam por eu
passar o tempo todo fazendo sinais de positivo. Não deu outra: entrei para um grupo
de Pagode. Enquanto vários outros viciados cantavam uma "música" que não dizia
nada, eu e mais 12 infelizes dançávamos alguns passinhos ensaiados, sorriamos
fazíamos sinais combinados. Lembro-me de um dia quando entrei nas lojas Americanas
e pedi a coletânea "As Melhores do Molejão". Foi terrível!!
Eu já não pensava mais!! Meu senso crítico havia sido dissolvido pelas rimas
"miseráveis" e letras pouco arrojadas. Meu cérebro estava travado, não pensava em
mais nada. Mas a fase negra ainda estava por vir. Cheguei ao fundo do poço, no limiar
da condição humana, quando comecei a escutar "Popozudas", "Bondes", "Tigrões",
"Motinhas" e "Tapinhas". Comecei a ter delírios, a dizer coisas sem sentido. Quando
saia a noite para as festas pedia tapas na cara e fazia gestos obscenos. Fui cercado por
outros drogados, usuários das drogas mais estranhas; uns nobres queriam me mostrar
o "caminho das pedras", outros extremistas preferiam o "caminho dos templos".
Minha fraqueza era tanta que estive próximo de sucumbir aos radicais e ser dominado
pela droga mais poderosa do mercado: a droga limpa.
Hoje estou internado em uma clínica. Meus verdadeiros amigos fizeram única
coisa que poderiam ter feito por mim. Meu tratamento está sendo muito duro: doses
cavalares de Rock, MPB, Progressivo e Blues. Mas o meu médico falou que é possível
que tenham que recorrer ao Jazz e até mesmo a Mozart e Bach. Queria aproveitar a
oportunidade e aconselhar as pessoas a não se entregarem a esse tipo de droga. Os
traficantes só pensam no dinheiro. Eles não se preocupam com a sua saúde, por isso
tapam sua visão para as coisas boas e te oferecem drogas.
Se você não reagir, vai acabar drogado: alienado, inculto, manobrável,
consumível, descartável e distante; vai perder as referências e definhar mentalmente.
Em vez de encher cabeça com porcaria, pratique esportes e, na dúvida, se não
puder distinguir o que é droga ou não, faça o seguinte:
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* Não ligue a TV no domingo à tarde; * Não escute nada que venha de Goiânia
ou do interior de São Paulo; * Não entre em carros com adesivos "Fui....."; * Se te
oferecerem um CD, procure saber se o indivíduo foi ao programa da Hebe ou ao
Sábado do Gugu; * Mulheres gritando histericamente são outro indício; * Não compre
um CD que tenha mais de 6 pessoas na capa; * Não vá a shows em que os suspeitos
façam passos ensaiados; * Não compre nenhum CD em que a capa tenha nuvens ao
fundo; * Não compre nenhum CD que tenha vendido mais de um milhão de cópias no
Brasil; e * Não escute nada em que o autor não consiga uma concordância verbal
mínima. Mas principalmente, duvide de tudo e de todos. A vida é bela!!!! Eu sei que
você consegue!!! Diga não às drogas!!
Luis Fernando Veríssimo