FACULDADE DE DIREITO DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
VAGNER DE FRANÇA FERREIRA
Nº USP 5952620
NULIDADES PROCESSUAIS À LUZ DA TESE
INSTRUMENTALISTA DO PROCESSO
ORIENTADOR: PROF. TITULAR JOSÉ ROBERTO DOS SANTOS
BEDAQUE
SÃO PAULO
2011
FERREIRA, Vagner de França.
Nulidades Processuais à Luz da Tese Instrumentalista do Processo - 2011.
Orientador: Prof. Titular José Roberto dos Santos Bedaque.
Departamento de Direito Processual – DPC.
Tese de Láurea: Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.
FACULDADE DE DIREITO DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
VAGNER DE FRANÇA FERREIRA
Nº USP 5952620
NULIDADES PROCESSUAIS À LUZ DA TESE
INSTRUMENTALISTA DO PROCESSO.
Tese de Láurea para conclusão do curso de
graduação em Direito pela Faculdade de Direito da
Universidade de São Paulo.
Orientador: Prof. Titular José Roberto dos Santos
Bedaque
SÃO PAULO
2011
Agradecimentos
À minha mãe, Maria, que me possibilitou chegar até aqui.
À minha noiva Patrícia Helena, por todo o companheirismo e incentivo em todos os
momentos.
À família, enquanto instituição, pelo papel que desempenha no caráter e na formação de
todos nós.
A todos aqueles que de alguma forma contribuíram para minha formação jurídica.
SUMÁRIO
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS.............................................................................01
2. O MUNDO FÁTICO E O MUNDO JURÍDICO.................................................13,
3. NULIDADES NO DIREITO MATERIAL E NO DIREITO PROCESSUAL....15.
4. FATO, ATO E NEGÓCIO JURÍDICO.................................................................22
5. OS PLANOS DA EXISTÊNCIA, VALIDADE E EFICÁCIA E SUAS
PARTICULARIDADES NO DIREITO PROCESSUAL.....................................24
5.1 NOÇÕES INTRODUTÓRIAS..................................................................24
5.2 PLANO DA EXISTÊNCIA.......................................................................25
5.3 PLANO DA VALIDADE..........................................................................31
5.4 PLANO DA EFICÁCIA............................................................................36
5.5 A QUESTÃO DA INEXISTÊNCIA DOS ATOS PROCESSUAIS
E OS EFEITOS PRODUZIDOS...............................................................39
6. NOMENCLATURA: NULIDADE OU INVALIDADE.......................................46
7. PENSAMENTO DE IMPORTANTES DOUTRINADORES NACIONAIS
NO TEMA DAS NULIDADES...........................................................................48
7.1 A DOUTRINA DE GALENO LACERDA.............................................48
7.2 AROLDO PLÍNIO GONÇALVES............................................................50
7.3 ANTONIO JANYR DALL´AGNOL JR...................................................52
7.4 TERESA ARRUDA ALVIM WAMBIER................................................54
7.5 JOSÉ JOAQUIM CALMON DE PASSOS...............................................55
8. IMPORTÂNCIA E DELIMITALÇAO DAS FORMAS
NO PROCEDIMENTO.........................................................................................58
8.1 OS SISTEMAS DE DISCIPLINA DAS FORMAS
E DE EXTERIORIZAÇÃO DO PROCEDIMENTO...............................58
8.2 A FORMA DOS ATOS PROCESSUAIS E SUA RELAÇÃO
COM A TÉCNICA PROCESSUAL..........................................................60
9. NATUREZA JURÍDICA DAS NULIDADES......................................................69
10. SISTEMÁTICA DAS NULIDADES PROCESSUAIS.........................................72
11. ESPECIES NORMATIVAS REGENTES DO SISTEMA DAS
NULIDADES PROCESSUAIS.............................................................................81
11.1 NOÇÕES INTRODUTÓRIAS..............................................................81
11.2 A IMPORTÂNCIA DA ANÁLISE DO ALCANÇE DA
FINALIDADE DO ATO E DA AUSÊNCIA DE PREJUÍZO
NO TEMA DAS NULIDADES PROCESSUAIS...............................84
11.3 OUTRAS ESPÉCIES NORMATIVAS INTEGRANTES
DO SISTEMA DAS NULIDADES PROCESSUAIS..........................88
12. NULIDADES PROCESSUAIS NO VIGENTE CPC,
NO ANTEPROJETO E NO PROJETO DO NOVO CÓDIGO
DE PROCESSO CIVIL. ANÁLISE CRÍTICA....................................................91
13. CONCLUSÃO.......................................................................................................95
14. BIBLIOGRAFIA...................................................................................................98
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS:
É consenso entre os estudiosos do assunto que em nenhum outro momento da história
conhecida da humanidade tenhamos provocado e simultaneamente sofrido tão variadas e
profundas transformações, não apenas no meio como também em nosso próprio modus
vivendi, e em exíguo tempo quando comparado com o restante de todo o período de que
se tem registro da permanência do homem no planeta, quanto aquelas que temos
vivenciado na era pós Revolução Francesa e Revolução Industrial até os dias atuais.1
Trata-se de um processo dialético, no qual o homem, ao mesmo tempo em que é autor
dessas transformações, também se submete aos efeitos dessa sua conduta2, que é bifronte
e resultante não somente de sua interação com a natureza como do inter-relacionamento
dos próprios homens, tornando a sociedade cada vez mais complexa em seus níveis
organizacionais.
Por óbvio, a maior complexidade das relações sociais produz efeitos no Direito. Enquanto
ciência humana, que possui natureza axiológica e teleológica na sociedade, as normas
jurídicas produzidas pelo homem se constituem como um dos principais meios de
controle social3 e o único que dispõe de um ator social dotado do poder de impor uma
sanção em razão do descumprimento dessas mesmas regras. Aliás, a interação do
universo político com o jurídico é bastante ampla, valendo-se aquele da imposição de
normas jurídicas para a própria estruturação do Estado e dos meios para a obtenção e
exercício do poder político.
O Estado atua, numa das manifestações de seu poder, ora mediante a valoração e
qualificação positiva de condutas, as quais terão sua prática incentivada, ora mediante a
1 Sobre o tema, consultar a interessante obra de HOBSBAUWN. Eric J. A Era das Revoluções.
Europa1789-1848. Tradução de Maria Teresa Lopes Teixeira e Marcos Penchel, 22ªed., São Paulo, Editora
Paz e Terra, 2007. Na Introdução p. 16, o autor apresenta a seguinte afirmação que bem reflete o sentido da
afirmação apresentada: imaginar o mundo moderno sem estas palavras (isto é, sem as coisas e conceitos a
que dão nomes- referindo-se ao surgimento e ao sentido de palavras próprias do período histórico de que
trata) é medir a profundidade da revolução que eclodiu entre 1789 e 1848 e que constitui a maior
transformação da história humana desde os tempos remotos quando o homem inventou a agricultura e a
metalurgia, a escrita, a cidade e o Estado. Esta revolução transformou, e continua a transformar, o mundo
inteiro.(Texto em negrito nosso). 2 NADER, Paulo. Introdução ao Estudo do Direito, 21ª Ed., Rio de Janeiro,Ed. Forense, 2001, p. 18.
3 NADER, Paulo. Op. Cit. pp. 29-47.
valoração e qualificação negativa de comportamentos, que, eventualmente realizados,
legitima o Estado na tentativa de impor sanção ao seu agente. Aqui estamos no campo do
direito material, cuja atividade essencial consiste na regulamentação de condutas
desejadas ou toleradas por ele, porque consideradas benéficas ou ao menos não
prejudiciais ao corpo social, e, num outro grupo, aquelas condutas não desejadas, vistas
pelo centro de poder como nocivas à sociedade.4
Uma vez não cumpridas espontaneamente essas condutas, conforme àquela descrita pelo
direito material, ou materializando-se conduta negativamente valorada, à qual é prescrita
a imposição de sanção ao agente, porque considerada ilícita, temos a consubstanciação de
um conflito social que justifica o acionamento do Estado para a composição do conflito
ou para a imposição da sanção ao agente transgressor da norma, tratando-se de um Estado
democrático de Direito.
Para o legítimo exercício desse poder de compor o conflito ou impor a sanção
preestabelecida, almejando o restabelecimento da paz social e a obediência por parte dos
jurisdicionados à ordem jurídica, e uma vez acionado para tanto, o Estado oferece àqueles
que lhe são submetidos um método de trabalho, do qual se valerá para a verificação e
comprovação da transgressão às normas de direito material e realização de seu mister.
Esse instrumento de atuação do Estado para a pacificação social deve ser dotado de certas
garantias aos entes que estão diretamente envolvidos no conflito, cuja observância
confere legitimidade tanto ao método quanto ao provimento que constitui a sua razão de
ser, além de constituir-se como fator de segurança à estrutura social e também à própria
ordem jurídica, surgindo assim o Direito Processual, fruto dessa interação entre direito e
poder.
Costuma a doutrina apontar três fases da história do direito processual5: fase Imanentista,
em que o direito de Ação estaria vinculado ao próprio direito material, e daí a sua
pejorativa denominação de direito adjetivo; fase Autonomista ou Científica- caracterizada
4 Cf. BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. 3ª Ed. São Paulo,
Malheiros, 2010, p. 418 na qual o doutrinador afirma que o Direito é resultado da tipificação de
acontecimentos ou condutas e imposição de conseqüências. 5 Ver por todos, CINTRA, Antonio Carlos de Araújo, DINAMARCO, Cândido Rangel e GRINOVER, Ada
Pellegrini. Teoria Geral do Processo. 24ª Ed, São Paulo, Malheiros Editores, 2008, pp. 48-51.
pela procura da total separação entre o direito de Ação e o direito material, o que levou a
uma visão formalista do processo, que passou a ser visto como objeto de culto pelos
estudiosos desse novo ramo do direito, levando-os ao esquecimento da finalidade e razão
de ser de sua ciência; e, por último, fase instrumentalista- caracterizada pela busca de
conscientização de que o processo se constitui como instrumento para serem atingidas
determinadas finalidades que são definidas fora do processo, tendo origem nas regras do
direito material.
À medida que as relações sociais tornam-se mais complexas e cada vez mais intrincadas,
requer-se que o método utilizado por esse ente social para o cumprimento das regras do
direito material também adquira um grau de organização e efetividade capaz de atender,
em tempo razoável, aos anseios daqueles que estão direta ou indiretamente envolvidos
nos conflitos sociais sub judice.
A premissa metodológica que vê o processo como instrumento de pacificação social e de
realização da justiça, cuja legitimidade será tanto maior quanto maior for a sua
capacidade de cumprir seu desiderato, mediante a flexibilização da técnica, já que ela
constitui mero instrumento à observação e aplicação das normas de direito material, se
apresenta como uma das formas possíveis de viabilizar o atendimento aos anseios de uma
sociedade cada vez mais massificada e que exige do sistema judicial respostas seguras,
justas, céleres e adequadas.
As chamadas Ondas renovatórias do processo- tese dos juristas Mauro Cappelletti e
Bryant Garth6- refletem bem essas buscas de responder aos anseios sociais, em que
primeiro intentou-se garantir o acesso à justiça aos jurisdicionados e que nesse o
momento marcou a luta pela oferta da assistência judiciária gratuita, uma vez que muitos
membros da sociedade não poderiam arcar com os custos da litigância em juízo, sendo,
por isso, privados de tal direito.
A segunda onda renovatória do processo caracteriza-se pela busca de proteção aos
interesses metaindividuais, com a tentativa de descobrir meios de proteção aos chamados
6 CAPPELLETTI, Mauro e GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Tradução e Revisão de Ellen Gracie
Northfleet. Porto Alegre.Sérgio Antonio Fabris Editor, 1988, pp. 31-73.
direitos coletivos, difusos e individuais homogêneos7. A terceira onda renovatória é
denominada novo enfoque do acesso a justiça na qual buscam-se meios de garantir uma
prestação jurisdicional capaz de satisfazer aos interesses e pretensões dos titulares de
posições jurídicas de vantagem, ou seja, analisa a atuação do Estado pela ótica daqueles
que são consumidores dos serviços jurisdicionais, em seu grau de satisfação com os
serviços que lhes são prestados.
Nesse sentido, na feliz expressão do professor Kazuo Watanabe, busca-se não somente a
viabilização do acesso à justiça, mas do acesso à ordem jurídica justa8. Destarte,
entendemos que, embora não abranja a totalidade das necessidades que a proposta de
ampliação de acesso à ordem jurídica justa apresenta, haja vista tratar-se de atividade
complexa e que requer variadas frentes de atuação para sua implementação9, uma
mudança de mentalidade10
dos operadores do direito quanto à interpretação e aplicação
7 Sobre esses conceitos, ver as definições trazidas no art. 81 do CDC- BRASIL. Lei nº 8.078 de 11 de
setembro de 1990. Dispõe Sobre a Proteção do Consumidor e dá Outras Providências. Publicada no DOU
de 12 de setembro de 1990, edição extra, e retificada no DOU de 10 de janeiro de 2007. Esta Lei é
conhecida como Código de Defesa do Consumidor- CDC. 8
8 Expressão encontrada no ensaio “Assistência judiciária e o juizado especial de pequenas causas“,
publicado na obra coletiva“ Juizados Especiais de Pequenas Causas, coord. de Kazuo Watanabe, p. 163.
Ver também DINAMARCO, Cândido Rangel. A Instrumentalidade do Processo. 5ª ed. rev. e atual. São
Paulo, Malheiros Editores, 1996, p. 306. 9 Naturalmente a questão da ampliação do acesso à ordem jurídica justa apresenta complexidade que
transcende aos objetivos dessa monografia. Apenas com caráter exemplificativo, podemos citar a
necessidade de maior estruturação do Poder Judiciário, tanto na ordem física que envolve a modernização
das estruturas, aquisição de equipamentos necessários a maior eficiência nos trabalhos- como
computadores, impressoras, digitalização de processos e ampliação do numero de fóruns disponíveis,
visando a redução da quantidade de processos que tramitam num único Juizo; quanto na pessoal, que
abarca a melhor qualificação de pessoal e investimento no aprimoramento técnico de seus juízes.
Naturalmente, essas medidas acabam sendo inviabilizadas pelo critério econômico e isso sem falar na
própria necessidade de mudança no âmbito Legislativo para a criação de normas que facilitem o alcance
desses objetivos. A proposta aqui defendida se constitui apenas como um dos aspectos que a questão
abarca.
10 Cf. CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel e GRINOVER, Ada
Pelegrini. Teoria geral do processo. 24ª Ed. São Paulo, Malheiros Editores, 2008, p. 51 que é enfática ao
afirmar: Tudo que já se fez e se pretende fazer nesse sentido visa, como se compreende, à efetividade do
processo como meio de acesso à justiça. E a concretização desse desiderato é algo que depende muito
menos das reformas legislativas (importantes embora), do que da postura mental dos operadores do
sistema (juízes,, advogados, promotores de justiça). È indispensável a consciência de que o processo não é
mero instrumento técnico a serviço da ordem jurídica, mas, acima disso, um poderoso instrumento ético
destinado a servir à sociedade e ao Estado.
dos preceitos normativos de maneira menos apegada aos aspectos puramente formais11
,
que não cumpram uma finalidade no processo e tão somente o erige a fim de si mesmo,
constituiria-se como importante passo nessa árdua tarefa.
Essa flexibilização da técnica, ou no dizer de parte da doutrina deformalização das
controvérsias12
, ganha especial relevo quando analisada a sistematização legal e
doutrinária das nulidades processuais, tema que constitui o eixo central da presente
Monografia.
O objetivo principal deste estudo é demonstrar que a compreensão e aplicação do sistema
das nulidades processuais pautados por aspectos finalísticos, conforme preconizam os
adeptos da premissa instrumentalista do processo, se constituem como importante
ferramenta à ampliação do acesso à ordem jurídica justa, à medida que garante maior
efetividade ao processo, impedindo que a ocorrência de vícios meramente formais, que
não afetam o direito material sub judice, nem tampouco as garantias processuais ofertadas
às partes em litígio, ensejem a extinção do processo sem resolução de mérito13
, ou a
imposição do retorno do procedimento a fases já superadas do iter processual em virtude
da anulação de algum dos atos que o compõe e impõe esse retorno; essa proposta também
se apresenta como poderoso mecanismo à superação da crise por que passa o Direito
atualmente e, sobretudo, o Direito Processual.
Procurar-se-á demonstrar que é insuficiente e inoportuna a fixação pelo legislador em rol
exaustivo das situações que imponham ao juiz o dever de pronunciar a nulidade do ato ou
do próprio processo em decorrência da inadequação dos atos ao seu modelo formal, haja
11
No cap. 08 será tratada com mais vagar a questão da forma, mas faz-se necessário registrar previamente
que não combatemos o estabelecimento de formas pura e simplesmente pelo legislador, que são salutares
para o sistema, conferindo previsibilidade e segurança às partes, mas que não obstante a previsão legal do
tempo, lugar e modo da prática dos atos como meio eficiente para se assegurarem valores internos ao
sistema, eles poderão ser preservados mesmo diante de inadequações formais na prática desses atos. 12
GRINOVER, Ada Pelegrini. Deformalização do Processo e Deformalização das Controvérsias in RePro
ano 12 nº 46 abr/jun 1987, esp. p. 63.
13 Sobre esse assunto, embora em termos mais abrangentes, ver o descrito na obra de CAPPELETTI,
Mauro e GARTH, Bryant. Acesso à Justiça. Tradução e revisão de Ellen Gracie Nortfleet. Porto Alegre,
Sergio Antonio Fabris Editor, 1988, pp. 67-73.
vista a impossibilidade de conseguir o legislador prever e normatizar todas as situações
passíveis de ocorrer concretamente e que ensejariam o pronunciamento da nulidade14
.
Por outro lado, a análise do alcance da finalidade dos atos e da inocorrência de prejuízo,
permite que muitos que praticados em desconformidade com o seu modelo legal não
tenham, necessariamente, que ser invalidados. Prega-se que a decretação da nulidade do
ato processual ou até da totalidade do procedimento pelo órgão judicial deverá sempre
pautar-se pela análise das conseqüências decorrentes dessa inadequação em face dos
valores, princípios e garantias a que o legislador visava proteger mediante a
predeterminação de suas formas.
A simples inadequação na sua prática quando comparada com o seu modelo legal
preestabelecido não conduzirá, necessariamente, à pronúncia de sua nulidade, com a
conseqüente privação dos efeitos que ordinariamente possui. Tendo o processo atingido
sua finalidade, sem ocasionar prejuízo à parte, seja porque pôde obter a tutela
jurisdicional favorável ou porque o vício não inviabilizou o pleno exercício de suas
garantias processuais, não haveria razões para a decretação de sua nulidade, não obstante
a inobservância de seus requisitos formais.
Essa premissa metodológica, consentânea à visão instrumentalista do processo, permite,
muitas vezes, conquanto o vício formal na prática do ato, que o Estado cumpra seu
mister, entregando a tutela jurisdicional, em vez da determinação da extinção do processo
ou anulação de atos processuais em decorrência de meras inadequações formais em sua
prática, cuja análise pautada, não num caráter ontológico, mas ético e orientada pela
análise do alcance de sua finalidade, permitiria considerá-las irrelevantes.
Pretende-se, assim, dentro do aspecto endoprocessual, destacar a importância da mudança
de paradigmas a que se devem ater os profissionais do direito, no sentido de viabilizar
14
Sobre a insuficiência da determinação taxativa do rol das nulidades processuais, ver o cap. 10, no qual o
tema foi tratado de forma mais aprofundada.
que o processo cumpra seus escopos sociais, políticos e jurídicos15
, não obstante a
presença de determinados vícios que maculam o processo, cujo caráter meramente
instrumental que o caracteriza, permite, dentro dos parâmetros axiológicos e teleológicos
que também lhe são inerentes, sua desconsideração , haja vista a incolumidade das
garantias ofertadas às partes no processo e o alcance da finalidade a que visava o ato sem
causar-lhes prejuízos, em homenagem a princípios e valores maiores, eleitos por nosso
sistema normativo e, quiçá, do próprio sistema social.
2. O MUNDO FÁTICO E O MUNDO JURÍDICO.
Indiscutivelmente o direito pertence ao mundo da cultura do homem, sendo, pois, o
reflexo dos fatores históricos que antecederam à criação das normas que o determinam,
caracterizando-se estas como o espelho da experiência de um povo, e também dos
aspectos axiológicos que permeiam a sociedade na qual está inserido16
. É, por natureza,
fenômeno instável, cuja manifestação é determinada pelo aspecto temporal e espacial,
cujas mudanças por que passa a sociedade produzem efeitos imediatos na esfera jurídica.
Assim, o direito deve ser entendido como uma técnica, mas que não é dotada de
neutralidade, porque permeada de valores e a serviço de um fim determinado, que
constitui a sua razão de ser. Enquanto fruto da cultura, o direito é determinado pelo
princípio da imputação (Se A é, B deve ser,), cujas normas estabelecem um dever-ser,
15 Sobre o tema, ver CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel e GRINOVER,
Ada Pelegrini. Teoria geral do processo. 24ª Ed. São Paulo, Malheiros Editores, 2008, pp. 30-31.
16 No tocante à pertinencia do direito ao mundo da cultura do homem, ver PASSOS, J. J. Calmon de.
Esboço de uma teoria das nulidades aplicada às nulidades processuais. 1ª ed. 4ª tiragem. Rio de Janeiro,
Forense, 2009, pp. 07-13; BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica
processual. 3ª Ed. São Paulo, Malheiros, 2010, p. 39. REALE, Miguel. Lições preliminares de direito, 25ª
Ed., São Paulo: Saraiva, 2000, p. 09.
cujo significado deôntico consiste num obrigar, permiti ou proibir17
e que é determinado
pelo caráter teleológico. Nesse sentido, opõe-se ao mundo natural, que é o mundo do ser
e regido pelo princípio da causalidade (Se A é, B é).
Sendo criação do mundo da cultura e fruto da atuação da vontade, o mundo jurídico é
essencialmente permeado de valores, os quais podem ter como ponto de partida tanto
fatos naturais, involuntários e submetidos ao princípio da causalidade, quanto os atos
decorrentes da vontade humana, cuja normatização permite ou a predeterminação dos
efeitos da conduta ou a eventual imposição de pena imposta pelo órgão institucionalizado
para tanto ao agente da conduta valorada negativamente como nociva à organização
social, ambos os casos regidos pelo princípio da imputação.
O mundo jurídico é, portanto, um subconjunto do mundo dos fatos, ou melhor
dizendo, um subsistema do sistema social, constituindo um corte que o cientista ou
profissional do direito são obrigados a fazer para que possam determinar com precisão o
objeto de sua atuação. Mas em momento algum há desvinculação entre o mundo dos fatos
e o mundo jurídico, pelo contrário, entre eles há uma umbilical relação entre continente e
conteúdo respectivamente18
.
José Maria Tesheiner em coautoria com Lucas Baggio19
ressaltam a inexistência de um
mundo jurídico alheio ao chamado mundo fático. De nosso lado, entendemos, como
descrito anteriormente, que essa qualificação e distinção entre esses mundos fazem-se
necessárias para que se possa trabalhar com maior objetividade, mas a natureza
17 MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do Fato Jurídico: Plano da Existência, 7ª ed. atual, São Paulo,
Saraiva, 1995, p. 34. PASSOS, J. J. Calmon de. Esboço de uma teoria das nulidades aplicada às nulidades
processuais. 1ª ed. 4ª tiragem. Rio de Janeiro, Forense, 2009, pp.15-23. 18
Discorre com mestria sobre o tema, MELLO, Marcos Bernardes de. Op. cit. pp. 35- 76.
19
TESHEINER, José Maria Rosa e BAGGIO, Lucas Pereira. Nulidades no Processo Civil Brasileiro, Rio
de Janeiro, Ed. Forense, 2008, pp 5-41; Os autores asseveram que a aceitação do mundo jurídico pressupõe
também a idéia de que é o Direito quem regula a sociedade, e não a sociedade quem se auto-regula através
do Direito.
conceitual que o mundo jurídico apresenta repele qualquer contraposição entre esses
mundos.20
Destarte, a norma jurídica trabalha com a previsão de fatos (suporte fático abstrato). A
ocorrência, no mundo dos fatos, da conduta conforme o modelo abstrato previsto no
ordenamento- o chamado suporte fático concreto, faz com que a norma incida sobre ele,
qualificando-o também como fato jurídico, cabendo ao homem a verificação e as
condições determinantes da suficiência dessa incidência.
Haja vista o predomínio do caráter axiológico e teleológico existente na determinação dos
fatos hipotéticos descritos pelas normas, a atividade de verificação da subsunção do fato
concreto àquele preestabelecido pela norma apresenta papel fundamental, possibilitando
ao intérprete e aplicador do direito uma maior aproximação entre a abstração da norma e
os fatos concretos. A maior complexidade das relações humanas municia essa atividade
de requintes cada vez mais intrincados, não mais satisfazendo a verificação quase
mecânica da subsunção do fato à norma, e a riqueza de situações que se lhe apresentam,
exigem dele um olhar criativo, não apegado a critérios puramente técnico-jurídicos e uma
postura do julgador constantemente preocupada com os problemas da sociedade em que
vive e das funções que sua Ciência é vocacionada a cumprir e que constituem sua razão
de ser.21
Assim, torna-se essencial essa atividade de compreensão e qualificação jurídica dos fatos
tanto na seara legislativa, momento em que são estabelecidos os suportes fáticos abstratos
20 Cf. BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. 3ª Ed. São
Paulo, Malheiros, 2010, 480 e n. 117, em que o autor, retomando o pensamento de Pontes de Miranda,
afirma que o ser juridicamente e não-ser juridicamente separam os acontecimentos em fatos do mundo
jurídico e fatos estranhos ao mundo jurídico.
__________________
21 Essa questão é destacada por BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica
processual. 3ª Ed. São Paulo, Malheiros, 2010, pp. 417-4 nas quais o autor aconselha que não se deve
limitar à análise dogmática ao interpretar as normas do Direito, sem considerar as experiências que
antecedem à positivação das regras ou as finalidades com que são instituídas. Orienta também que é
necessário cuidado para que o resultado da interpretação não represente exclusivamente a valoração
axiológica de quem a faz.
que incidirão sobre os acontecimentos fáticos e conforme o modelo abstrato previsto pela
norma para sua qualificação como jurídicas, como também no plano judicial, no qual se
busca a aplicação dessas normas jurídicas pré-estabelecidas como meio de resolução de
conflitos e de pacificação social, enfim, da realização do direito.
Para esse mister, além da atuação da vontade que reflete os aspectos axiológicos reinantes
na sociedade, trabalha muitas vezes o legislador com conceitos jurídicos abertos e
indeterminados22
, valorizando a atuação do interprete na aplicação do direito à medida
que lhe cabe a determinação do sentido e alcance da norma, demonstrando também o
caráter fundamental dessa atividade.
À guisa de conclusão, valemo-nos dos escritos de Calmon de Passos, que sintetiza de
forma irretocável as idéias apresentadas neste capítulo:
(...) na ordem qualificada de social nada é em si mesmo e necessariamente lícito ou
ilícito, devido, proibido ou permitido, sem que sobre isso haja um dizer prévio do
homem. Destarte, é uma particular forma de compreensão da conduta o que dá ao fato
sua qualificação jurídica. Assim sendo, o jurídico não está no fato nem na conduta, sim
no modo pelo qual o homem compreende o seu agir, em sua dimensão social, com vistas
a atender ao imperativo de dar consistência, conseqüências e ordenação à convivência
humana, não submetida a fatores determinantes no mesmo nível em que isso se dá entre
animais que parecem conviver de modo organizado, a exemplo das abelhas e das
formigas23
.
22 Consultar AMARAL, Francisco. Direito Civil: Introdução. 6ª ed.; rev., atual. e aum. Rio de Janeiro,
Renovar, 2006, pp.53-106; BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica
processual. 3ª Ed. São Paulo, Malheiros, 2010, p. 431; CABRAL, Antonio do Passo. Nulidades no
Processo Moderno: Contraditório,Proteção da Confiança e Validade Prima Facie dos Atos Processuais. 2ª
ed. Rio de Janeiro. Editora Forense, 2010, p. 44. 23
PASSOS, José Joaquim Calmon de. Esboço de uma Teoria das Nulidades Aplicadas às Nulidades
Processuais, Rio de Janeiro, Ed. Forense, 2009, p. 11.
3. NULIDADES NO DIREITO MATERIAL E NO DIREITO
PROCESSUAL.
O tema das nulidades, embora pertencente à teoria geral direito24
, apresenta
especificidades em cada um dos ramos jurídicos em que é analisado. As notas peculiares
das nulidades no tocante ao direito processual torna esse tema um dos mais complexos e
intrincados para os estudiosos desse ramo jurídico.
Bem ressalta esse aspecto Moniz de Aragão25
quando afirma que o capítulo das
nulidades é um dos mais árduos do Código, sendo simultaneamente seu ponto alto, à
medida que guarda a inteireza do ato, e baixo, por servir de abusos e deformações.
Afirma também Komatsu26
a insuficiência dos métodos de transposição do
modelo das nulidades estabelecidas pelo direito material para a estruturação da disciplina
no âmbito processual. Outrossim, ressalta o autor, que a matéria não pertence com
exclusividade a nenhum ramo específico do direito, mas antes à Teoria Geral do Direito.
24 CABRAL, Antonio do Passo. Nulidades no Processo Moderno: Contraditório,Proteção da Confiança e
Validade Prima Facie dos Atos Processuais. 2ª ed. Rio de Janeiro. Editora Forense, 2010, p. 19
.DALL’AGNOL JÚNIOR, Antônio Janyr. Invalidades Processuais. Porto Alegre: Letras Jurídicas Editora,
1989, p.44 prega que entre os autores dissenso maior inexiste quanto a pertencer o tema das nulidades à
Teoria Geral do Direito, sendo, portanto, consideráveis as elucubrações, avanços e poderações levadas a
efeito neste campo ( pouco importando que, até há pouco, realizavam-se, precipuamente, pelos cultores do
Direito Civil. Entretanto, ressalta que recebe tratamento específico, na medida em que visualizada pelos
diferentes ramos do direito. Humberto Theodoro Jr em seu Curso de Direito Processual Civil. 48ª ed.. Rio
de Janeiro: Forense, 2008, vol. I.p. 330 também ressalta que a nulidade dos atos é categoria pertencente à
teoria geral do direito, obedecendo-se aos elementos e aos requisitos previsto na lei material- agente capaz,
objeto lícito e forma prescrita ou não defesa em lei. Para esse autor, no que toca à violação de forma legal, é
onde mais se mostra importante a teoria das nulidades processuais, dado o caráter instrumental do processo
e da indispensabilidade da forma para se alcançar seus designios. Ver também DIDIER JR, Fredie. Curso
de Direito Processual Civil, v. I. 6ª Ed., amp, rev. e atual.Salvador, JusPodivm, 2006.p. 238 que defende a
aplicação de todas as noções da teoria geral do direito sobre o plano da validade dos atos jurídicos ao
sistema das invalidades processuais, mas aconselha que essa tarefa deve ser efetuada com cautela em
função das especifidades existentes nesse ramo do direito e que a diferenciam dos demais.
25 MONIZ DE ARAGÃO, Egas Dirceu. Comentário ao Código de Processo Civil. v.II arts. 154-269, 1ª ed,
Rio de Janeiro. Editora Forense, 1974, p. 271.
26 Cf. KOMATSU, Roque. Da invalidade no processo civil. São Paulo, RT, 1991, pp. 17-28.
A simples transposição27
do modelo estabelecido para as nulidades do direito
material, vinculadas ao modelo privado, para o direito processual não é suficiente, sendo
necessário aquilo que a doutrinadora Teresa Wambier, de forma profícua, nomeou de
mudança de base28
para a estruturação de uma teoria das nulidades no âmbito do Direito
Público, levando-se em conta as particularidades29
e também os objetivos e valores
inerentes ao direito processual.
Nota característica que distingue os dois modelos é a inexistência de nulidade de
pleno direito no Processo. Nesse sentido, Calmon de Passos30
afirma ser contrário à
classificação estabelecida por Galeno Lacerda em absoluta e relativa no campo
processual, haja vista a necessidade de pronunciamento judicial para a constituição das
nulidades nesse ramo do direito, não havendo, assim, nulidade que não fosse decretável
de ofício e, portanto, despicienda a classificação das nulidades relativas implementada
por Galeno.
27 DEMARCHI, Juliana. Ato Processual Juridicamente Inexistente- Mecanismos Predispostos pelo Sistema
para a Declaração da Inexistência Jurídica. Revista Dialética de Direito Processual 13. São Paulo:
Oliveira Rocha, abril/2004, p. 43 aduz que concluindo-se pela existência do ato após juízo de suficiência,
em se tratando de ato jurídico lato sensu, passa-se ao exame da sua regularidade, que consiste na
conformidade do ato jurídico com as prescrições legais, ou seja, com o atendimento de todos os requisitos
exigidos para a sua validade. A autora ressalta que tal operação não consiste em mera transposição dos
conceitos consolidados pelo direito privado para a esfera processual, notadamente porque o regime das
invalidades (nulidades) nesses dois ramos é bastante distinto. DALL’AGNOL JÚNIOR, Antônio Janyr.
Invalidades Processuais. Porto Alegre: Letras Jurídicas Editora, 1989, p. 27 em que o autor também
ressalta a equivocidade da transplantação, no dizer do autor, da sistemática das nulidades do direito privado
ao direito público, e, particularmente, ao direito processual.
28 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do processo e da sentença 6ªed. rev, atual. e ampliada, São
Paulo, RT, 2007, p. 147.
29 Cf. CABRAL, Antonio do Passo. Nulidades no Processo Moderno: Contraditório,Proteção da
Confiança e Validade Prima Facie dos Atos Processuais. 2ª ed. Rio de Janeiro. Editora Forense, 2010, p.
22 na qual o autor ressalta a questão da inserção dos atos na cadeia do procedimento que conduzirá à
necessidade de análise conjunta dos atos.
30
PASSOS, J. J. Calmon de. Esboço de uma teoria das nulidades aplicada às nulidades processuais. 1ª ed.
4ª tiragem. Rio de Janeiro, Forense, 2009, pp. 141-2
Cândido Rangel Dinamarco31
, além de ressaltar a insuficiência da transposição do
sistema das nulidades no direito material para o direito processual, destaca que a
necessidade de pronunciamento judicial para a constituição das nulidades no processo
poderia levar o intérprete ou aplicador do direito à conclusão de que todo ato viciado
seria anulável e, então, não existiriam atos nulos em direito processual, mas que essa seria
uma indevida adoção de conceitos e métodos privatísticos, no campo de um ramo jurídico
que é eminentemente público.
Assim, as nulidades em direito processual decorrem necessariamente de ato da
autoridade jurisdicional com natureza constitutiva-negativa, não sendo, portanto, correto
no aspecto técnico-jurídico referir-se ao fenômeno como declaração de nulidade, mas,
sim, de decretação ou pronunciamento da nulidade para que não ocorram confusões com
os atos em que o juízo apenas reconhece situação preexistente à sua declaração.32
Ao
tratar do tema, Calmon de Passos33
observa que no CPC encontramos várias disposições
referentes a nulidades que é utilizada de forma extremamente confusa, ora falando em
declarar, ora em decretar ou ainda em pronunciar e ressalta que é falha da linguagem
técnica do legislador porque no termo pronunciar pode-se conter tanto aspecto de
declarar, quanto o de decretar, mas que a diferença entre eles não deveria ser desprezada.
Decretar é pronunciar constitutivamente, compor, estabelecer, dar vida, ser base ou parte
essencial de alguma coisa; ao passo que declarar é apenas reconhecer o já existente,
proclamá-lo, esclarecê-lo e conclui que diante do descuido técnico do legislador, a
literalidade do texto não orienta, antes confunde, impondo-se uma hermenêutica
sistemática.
31 DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil, vol. II. 6ªed. rev. e atual. São
Paulo, Malheiros, 2009, p. 608.
32 Esse aspecto é tratado com profundidade em CABRAL, Antonio do Passo. Nulidades no Processo
Moderno: Contraditório,Proteção da Confiança e Validade Prima Facie dos Atos Processuais. 2ª ed. Rio
de Janeiro. Editora Forense, 2010, p. 21. DIDIER JR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil, v. I. 6ª
Ed., amp, rev. e atual.Salvador, JusPodivm, 2006, p. 237 na qual o autor afirma que não se declaram
nulidades, mas decretam-se nulidades. Defendendo a ausência de importância à distinção entre as
expressões pronunciamento de nulidade, declaração de nulidade ou decretação de nulidade,
GONÇALVES, Aroldo Plínio. Nulidades do processo. 1ª ed, 2ª tiragem.Rio de Janeiro, Aide Editora, 2000,
pp. 55-6.
33 PASSOS, J. J. Calmon de. Op. cit. pp. 128-9.
Dessa diferença, decorre outra que em nosso entender também assume aspecto
preeminente no tocante ao tema das nulidades no âmbito processual. Trata-se da total
separação entre o vício que macula o ato ou o processo e a nulidade, que será
conseqüência do vício que se apresentam relevantes, dadas as circunstâncias do caso
concreto. Não há que se falar em nulidade, antes do exame de suficiência para sua
decretação pelo juízo, sendo que os vícios que maculam o ato e obstam o alcance da sua
finalidade são anteriores e apresentam relação causal para sua decretação. A nulidade
somente existe após esse ato constitutivo do juízo e por não perceberem tão relevante
distinção, alguns doutrinadores acabam baralhando os fenômenos.34
Calmon de Passos35
define nulidade como uma desqualificação determinada pelo
sistema jurídico, no tocante a certo suposto, por entendê-lo inapto para justificar a
imposição da consequencia que lhe seria própria, inaptidão essa derivada da atipicidade
relevante desse suposto, vista essa relevância em consonância com o enlace que a mesma
ordem jurídica estabelece entre a vontade do sujeito agente e o resultado
normativamente previsto. Desqualificação porque a nulidade não é algo ínsito à própria
conduta juridicizada, sim o resultado de um juízo constitutivo do agente político
legitimado para essa função, que retira, na espécie, a imputabilidade do suposto. Essa
desqualificação não resulta de imediato da atipicidade do suposto, ou seja, ela por si só
não acarreta a consequência da nulidade, porque a desqualificação se opera mediante
uma correlação entre a atipicidade do suposto e a função que a ordem jurídica, na
hipótese, atribuiu à vontade do sujeito agente.
34 MALACHINI, Edson Ribas. Das Nulidades no Processo Civil. In: Revista de Processo n.09, jan/mar.
1978. pp. 57-70 que em vários momentos de seus escritos parece não fazer distinção entre o vício que
macula o ato e a nulidade, que é conseqüência necessária, mas não suficiente, da existência desses vícios;
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do processo e da sentença 6ªed. rev, atual. e ampliada, São
Paulo, RT, 2007, p.196 que traz a seguinte afirmação: Em nosso entender, sentenças nulas transitam em
julgado fazendo nítida confusão entre os conceitos que não se misturam. Ora, se a sentença é nula, e em
direito processual, o nulo sempre decorre de ato desconstitutivo ou constitutivo negativo do órgão julgador
e tem como conseqüência sua remoção do mundo jurídico e se a sentença não mais integra o mundo
jurídico, há impossibilidade de acobertar-se com o manto da coisa julgada. 35
PASSOS, J. J. Calmon de. Esboço de uma teoria das nulidades aplicada às nulidades processuais. 1ª ed.
4ª tiragem. Rio de Janeiro, Forense, 2009, p.38.
Destarte, cumpre distinguir a tipicidade relevante da atipicidade irrelevante. Os
parâmetros que orientarão a diferenciação entre elas se apresentam também como nota
característica dos adeptos da premissa instrumentalista do processo, para quem o
processo é mero instrumento de atuação do direito material, cuja legitimidade está
diretamente relacionada a sua capacidade de produzir resultados justos, tanto no aspecto
material, que consistiria na oferta da tutela jurisdicional àquele amparado pela tutela
jurídica36
, quanto no âmbito processual, pautada na observância das finalidades
inspiradoras das garantias ofertadas às partes pelo legislador, que se apresentam
intimamente vinculadas à legitimidade e ao acerto da decisão a ser proferida.
Ressaltamos a necessidade da correta identificação e valorização dos fins ao que o
legislador visava proteger com a instituição das formas na prática dos atos processuais,
que possuirá, assim como o próprio processo, natureza instrumental, admitindo-se que,
não obstante a inadequação formal dos atos não lhes sobrevenha a decretação da
nulidade, se os fins a que visava proteger o legislador foram atingidos, tendo-se, assim,
que as atipicidades relevantes serão aquelas que macularem valores protegidos pelas
normas instituidoras de requisitos formais e não o simples fato de terem sido praticados
de forma distinta daquela legalmente prevista, advindo daí o conceito de prejuízo que
tangencia toda a temática das nulidades processuais.
Entendemos não haver conflito entre justiça material e justiça processual nesses casos; ao
contrário, os dois conceitos se complementam, uma vez que a justiça processual não deve
consistir na observação irracional e tão somente apegada aos requisitos formais, sem a
observância dos motivos e da conjuntura37
que levaram a sua instituição pelo legislador,
36 BAGGIO, Lucas Pereira e TESHEINER, José Maria Rosa. Nulidades no Processo Civil Brasileiro. Rio
de Janeiro, Editora Forense, 2008, pp. 08-29.
37 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. 3ª Ed. São Paulo,
Malheiros, 2010, p. 439 prega não apenas a análise finalística dos atos processuais, mas questiona,
inclusive, as formas predeterminadas pelo legislador, ou seja, efetua análise do sucesso do legislador no
estabelecimento de formas típicas para a proteção de valores no processo. Quando considerada infrutífera
essa tarefa ou vislumbra forma mais eficiente para a proteção desses mesmos valores, o doutrinador admite
a desconsideração dessas formas típicas dos atos, isto é, além da questão da atipicidade irrelevante
decorrente da ausência de prejuízo decorrente da inadequação formal do ato, Bedaque defende também a
desnecessidade de obediência àquilo a que chamou de forma inútil, em função de conferir maior
próprios de fases superadas do direito processual e da sua visão como subproduto do
direito material. Constitui excesso de zelo o apego acrítico às questões formais do
processo e a decretação de nulidades de atos viciados, mas, que quando analisados sob o
seu aspecto finalístico, revelaria a natureza contraproducente dessa atividade.
A estruturação do método estatal de solução de controvérsias apresenta nítida natureza
pública e instrumental em relação ao direito material que lhe inspira, impondo que,
embora indiscutivelmente necessária, a técnica processual deva sofrer flexibilizações para
a melhor realização do próprio direito material discutido. Há muito está superada a
necessidade de constituir-se autonomamente a Ciência Processual, e tal postura
metodológica em tempos atuais se apresenta anacrônica e pouco funcional numa
sociedade em mudança contínua e que requer do direito a fotografia o mais possível fiel
de sua realidade.
4. FATO, ATO E NEGÓCIO JURÍDICO.
Na multiplicidade de acontecimentos ou condutas possíveis no mundo, o direito seleciona
algumas sobre as quais incidirão normas e para as quais atribuirá consequências jurídicas.
Temos nesse caso o que chamamos de fato jurídico lato sensu. Dentro dos fatos jurídicos
lato sensu, àqueles que forem decorrentes de acontecimentos da natureza e para os quais
a vontade do homem seja irrelevante na sua determinação, chamaremos de fatos jurídicos
estricto sensu.
Internamente ao grupo dos fatos jurídicos lato sensu e que não pertençam aos fatos
jurídicos estricto sensu teremos a determinação de outro grupo: aquele em que a vontade
do homem se faça presente e ao qual nomeamos o gênero dos atos jurídicos lato sensu.
Intrinsecamente a este, temos duas espécies de atos: a do conjunto de atos em que a
vontade seja determinante somente para a prática do ato, sendo irrelevante para a
efetividade do processo, sem prejuízo do necessário equilíbrio entre legalidade – liberdade que as formas
preservam na prática dos atos processuais.
determinação dos seus efeitos, a que nomeamos atos jurídicos estricto sensu; e a do
conjunto de atos para os quais o ordenamento jurídico permite a determinação voluntária
não apenas para a prática do ato, como também para a determinação dos seus efeitos,
fenômeno conhecido com negócio jurídico.
Os atos processuais se inserem na categoria dos atos jurídicos em sentido estrito.38
Entretanto, é extremamente acirrada a discussão doutrinária quanto à existência ou não de
negócios jurídicos processuais, e assim, pelo fato de essa última discussão transcende aos
objetivos da presente monografia, não abordaremos o assunto com maior profundidade,
limitando-nos apenas a fazer referência a doutrinadores que trataram dessa questão39
.
Ao dissertar sobre a classificação dos atos processuais no campo dos atos jurídicos
estricto sensu, Calmon de Passos ressalta que ordenamento ao considerar a vontade
apenas para a prática dos atos processuais e não para a determinação dos seus efeitos
estaria elegendo a finalidade a que ele visa como o elemento central e não a estrita
necessidade de obediência às questões formais também preestabelecidas. São do autor as
seguintes palavras: Quando de atos jurídicos em sentido estrito se trata, opera,
decisivamente, a circunstância de que a conseqüência é imputada ao suposto,
diretamente, por prescrição do direito objetivo, prescindindo-se da adequação da
vontade do sujeito a esse resultado. Excluída do âmbito da vontade do sujeito é ela,
38 O tema é tratado por quase a totalidade dos doutrinadores que debruçou-se sobre o
tema. Ver, por todos, PASSOS, J. J. Calmon de. Esboço de uma teoria das nulidades aplicada às
nulidades processuais. 1ª ed. 4ª tiragem. Rio de Janeiro, Forense, 2009, pp. 43-70 em que o autor trata com
grande profundidade sobre o tema, inclusive com estudo sobre a questão da processualidade do ato, que
excede aos objetivos desse estudo.
39 Sobre o tema, pregando a inexistência de negócios jurídicos processuais, ver DINAMARCO, Cândido
Rangel. Instituições de direito processual civil, vol. II. 6ªed. rev. e atual. São Paulo, Malheiros, 2009, pp.
607-8; PASSOS, J. J. Calmon de. Esboço de uma teoria das nulidades aplicada às nulidades processuais.
1ª ed. 4ª tiragem. Rio de Janeiro, Forense, 2009, pp.62-3.. Defendendo a existência de negócios jurídicos
processuais, consultar WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do processo e da sentença 6ªed. rev,
atual. e ampliada, São Paulo, RT, 2007, p. 168.
conseqüência, em si mesma, que assume relevância e é a partir dela que se desqualifica o
suposto, por conseguinte se define sua invalidade.40
O art. 154 do vigente Código de Processo Civil é emblemático ao estabelecer que os atos
e temos processuais não dependem de forma determinada, senão quando a lei
expressamente a exigir, reputando-se válidos os que, realizados de outro modo, lhe
preencham a finalidade essencial. Consubstancia tal norma a instrumentalidade das
formas dos atos processuais, determinando que o aspecto formal dos atos ceda espaço
para seu fim, para o alcance de suas finalidades, implicando que seu modus faciendi41
seja suplantado pela causa finalis, inclusive por razões de economia processual.
5. OS PLANOS DA EXISTÊNCIA, DA VALIDADE E DA EFICÁCIA E SUAS
PARTICULARIDADES NO ÂMBITO PROCESSUAL.
5.1 NOÇÕES INTRODUTÓRIAS.
Retomando o pensamento pontesiano42
, há uma tripartição do mundo jurídico em planos
da existência, da validade e da eficácia. Não obstante a diversidade de entendimentos e as
divergências reinantes no assunto43
, com a conseqüente confusão na precisa distinção
40PASSOS, J. J. Calmon de. Esboço de uma teoria das nulidades aplicada às nulidades processuais. 1ª ed.
4ª tiragem. Rio de Janeiro, Forense, 2009, pp.38-9. Ver também a exposição sintetizada sobre o assunto
efetuada por TALAMINI, Eduardo. Coisa Julgada e sua Revisão. São Paulo, Editora Revista dos
Tribunais, 2005, pp. 286-291.
41 Cf. CABRAL, Antonio do Passo. Nulidades no Processo Moderno: Contraditório,Proteção da
Confiança e Validade Prima Facie dos Atos Processuais. 2ª ed. Rio de Janeiro. Editora Forense, 2010, p.
45.
42
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de Direito Privado, 4. ed.. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais. 1974, tomo I, especialmente o prefácio da obra pp. XIV- XXV.
43 Afirma KOMATSU, Roque. Da Invalidade no Processo Civil. . São Paulo, RT, 1991, p. 29 e n. 01 que
Caio Mario da Silva Pereira utiliza as seguintes palavras: “Empregamos os vocábulos ineficaz e ineficácia
entre cada um desses planos, a exata compreensão das singularidades na análise dos
planos que apresentam no âmbito processual constitui-se como pressuposto essencial para
a análise e entendimento da sistemática, em nosso ordenamento jurídico, das nulidades
processuais, ou como querem alguns, invalidades processuais44
.
Vale ressaltar que a doutrina mais autorizada no assunto prega que existência, validade e
eficácia são três situações distintas por que podem passar os fatos jurídicos e, portanto,
não seria possível tratá-las como se fossem iguais.45
Essa análise, entretanto, no direito
processual é permeada de valores que torna essa atividade dissonante daquela
estabelecida no âmbito do direito material.
5.2 PLANO DA EXISTÊNCIA
Diante da inesgotável possibilidade de acontecimentos suscetíveis de ocorrerem no
mundo concreto, o sistema jurídico preestabelece alguns em relação aos quais uma vez
ocorridos provocarão a incidência da norma e a subsequente imputação dos efeitos que
ela determina. Obviamente, em razão da relação de espécie que o mundo jurídico
desempenha em relação ao mundo fático, haverá acontecimentos nesse último que não
serão relevantes àquele e por isso Pontes para efetuar melhor distinção nomeia os fatos
relevantes ao mundo jurídico como suporte
Essa subsunção entre o suporte fático suficiente e aquele hipoteticamente previsto pela
norma, são os elementos ensejadores da incidência da norma, que qualifica esse fato
social também como fato jurídico.
com sentido genérico, reservando as palavras nulidade e nulo, anulabilidade e anulável, existência, e
inexistente para a designação de tipos específicos de ineficácia. A nosso ver, ineficácia é gênero, de que são
espécies a nulidade, a anulabilidade e a ineficácia”. 44
A questão da nomenclatura em nulidade ou invalidade será discutida no capítulo 06, no qual serão
mostradas as divergências doutrinárias a respeito do tema. 45
Esse é o pensamento de MELLO, Marcos Bernardes de. Teoria do Fato Jurídico: Plano da Existência, 7ª
ed. atual, São Paulo, Saraiva, 1995. Teoria do Fato Jurídico: Plano da Existência, 7ª ed. atual, São Paulo,
Saraiva, 1995, p. 78 e também de Roque Komatsu, op. cit. p. 31
Conforme ensina Marcos Bernardes de Mello: Ao sofrer a incidência de norma jurídica
juridicizante, a parte relevante do suporte fático é transportada para o mundo jurídico,
ingressando no plano da existência. Nesse plano, que é o plano do ser, entram todos os
fatos jurídicos, lícitos ou ilícitos. No plano da existência, não se cogita de invalidade ou
ineficácia do fato jurídico, importa, apenas, a realidade da existência. Tudo aqui, fica
circunscrito a se saber se o suporte fático suficiente se compôs, dando ensejo à
incidência. Naturalmente, se há falta, no suporte fático, de elemento nuclear, mesmo
completante do núcleo, o fato não tem entrada no plano da existência, donde não haver
fato jurídico46
.
Segundo Roque Komatsu47
, para a determinação do plano da existência, tudo fica
limitado a saber se o suporte fático suficiente se compôs, dando ensejo à incidência da
norma. A norma, ao juridicizar determinados fatos sociais, pressupõe nele a existência de
alguns elementos que seriam indispensáveis à caracterização da existência de todo e
qualquer fato, ato ou negócio jurídico. O jurista ora citado divide os elementos do ato
processual em dois grupos: elementos intrínsecos ou constitutivos e elementos
extrínsecos ou pressupostos do ato. O primeiro grupo abarcaria a forma e o objeto do ato
(além das circunstâncias negociais quando tratar-se de negócio jurídico); já o segundo
abrangeria os conceitos de agente, lugar e tempo.
De acordo com o festejado jurista, sem os citados elementos (agente, forma, objeto, lugar
e tempo), qualquer fato jurídico torna-se impensável. Bastaria a falta de um deles para
inexistir o fato, o ato ou o negócio jurídico e até a relação processual em alguns casos.
Precisando mais as situações: a) se faltarem os elementos tempo e espaço, não há sequer
fato jurídico; b) sem agente, poderá haver fato, mas não ato jurídico; e c) e finalmente,
sem circunstâncias negociais, poderá haver ato, mas não negócio jurídico48
.
46
MELLO, Marcos Bernardes de. Op. cit. p. 78. 47
KOMATSU, Roque. Op. cit. pp. 31-33. 48
KOMATSU, Roque. Op. cit. p.33.
A doutrina também se refere à materialização dos elementos essenciais do ato para a
determinação de sua existência49
como expressão equivalente à verificação do suposto
fático suficiente, expressão cunhada por Pontes.
Entretanto, a mera referência à determinação de que a existência dos atos processuais
estaria condicionada à consubstanciação de seu suporte fático suficiente ou de seus
elementos essenciais, conforme descrito anteriormente, muito pouco acrescenta ao
deslinde das aflituosas questões com que os profissionais do direito se deparam
diuturnamente sobre o tema. Isso porque esses autores não descrevem quais seriam
exatamente esses elementos essenciais dos atos, sendo essa a maior dificuldade50
na
determinação dos atos inexistentes.
Dissertando sobre o tema, Calmon de Passos51
prega a impossibilidade de
estabelecimento com fórmula geral de quais os elementos que em determinado ato são
reclamados para a sua existência ou eficácia, e quais os reclamados para sua validade,
devendo-se pesquisá-los em cada caso concreto, segundo a sua função e segundo os
elementos ou os requisitos resultem indispensáveis para tal função ou apenas sejam
reclamados para seu correto, leal e eficaz desenvolvimento.
A análise centrada apenas na constituição do ato, em seus aspectos puramente subjetivos,
propicia que ao intérprete passe despercebido o fato de que a imposição da forma dos atos
processuais se apresenta como meio para a preservação dos valores a que o legislador
49 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel e GRINOVER, Ada Pelegrini.
Teoria geral do processo. 24ª Ed. São Paulo, Malheiros Editores, 2008, p. 370 afirma que em algumas
vezes faltam ao ato jurídico processual elementos essencias a sua constituição, a ponto de ser ele
inexistente perante o direito. É que, à falta desses elementos, o próprio ato, intrinsecamente, não reúne
condições para ser eficaz, sendo, portanto, um não-ato.
50 Cf. BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. 3ª Ed. São
Paulo, Malheiros, 2010, p. 480 e n. 118 na qual afirma que é insuficiente para a caracterização a definição
da inexistência como falta de elementos constitutivos para a conformação do tipo legal porque acaba
incluindo a forma como requisito essencial de existência. À nota 119 da pág. 481 critica o pensamento de
Talamini que prega a existência de elementos essenciais em cada ato para a determinação de sua existência,
o que para Bedaque constitui a maior dificuldade na identificação da inexistência jurídica.
51 PASSOS, J. J. Calmon de. Esboço de uma teoria das nulidades aplicada às nulidades processuais. 1ª ed.
4ª tiragem. Rio de Janeiro, Forense, 2009, pp. 97-8.
visava a proteger, implicando que se eles foram resguardados, não obstante a ausência do
ato ou que ele tenha sido praticado em desconformidade com o modelo legal, não haveria
que se falar em decretação de nulidade, que em tais casos teria apenas a função de
privilegiar a forma pela forma, sem comprometimento com os aspectos éticos e com as
funções inerentes ao processo, que cabe ao julgador assegurar e proteger em cada caso
concreto.
Há que se considerar o duplo aspecto quando da análise da estrutura íntima dos atos
processuais, ou até mesmo de sua ausência, e sua correlação com o procedimento.
Considerando-se a inerente interligação, combinação e unidade de escopo que consiste
em viabilizar a prestação da tutela jurisdicional que os atos apresentam no procedimento,
em muitos casos sua inexistência fática ou jurídica não possuirá o condão de ensejar a
nulidade do processo, em decorrência da ausência de prejuízo, que teria a função, para
darmos uma nomenclatura, de convalidar o processo, não obstante o vício ou ausência em
algum dos atos de seu procedimento. Tratando-se, portanto, de fenômenos distintos.
O apego aos aspectos intrínsecos do ato e dos vícios que o atingem acaba suscitando o
pronunciamento de nulidades de casos que elas seriam desnecessárias, quando analisados
sob o enfoque do alcance da finalidade do ato, não obstante a divergência com seu
modelo legal. Explicitando melhor: o que buscamos defender é o máximo aproveitamento
do processo, mediante a redução ao mínimo tolerável pelo sistema jurídico dos casos de
inexistência e permitindo-se a incidência das normas saneadoras dos vícios formais dos
atos52
. A análise pautada no aspecto finalístico do ato poderá afastar a decretação de
nulidade de processos, não obstante a existência vícios gravíssimos no seu procedimento.
Nesse sentido, dispõe o professor José Roberto Bedaque53
ao defender que mesmo a
ausência de citação, enquanto elemento essencial ao exercício do contraditório, embora
tratar-se de caso de nulidade absoluta do processo, comporta soluções distintas e pautadas
nas circunstâncias do caso concreto- por exemplo, o comparecimento do réu, nos termos
52
Cf. BEDAQUE, Op. cit. pp. 465-6 e nota 95 na qual o autor ressalta a necessidade de restringir o âmbito
da inexistência tornando possível a preservação do ato pela ausência de prejuízo.
53 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Op. cit. pp. 476-9.
do §1º do art. 214 do CPC- ou do momento em que o vício é detectado. Assim, a ausência
de citação resolve-se no plano da eficácia da sentença proferido no processo, que
sobrevindo-lhe a coisa julgada, poderá o réu resistir pedindo o reconhecimento da
inexistência do vínculo com o autor ou se defender da pretensa eficácia da decisão.
A perfeita adequação dos atos ao seu modelo legal constitui obviamente o ideal a ser
perseguido no processo, notadamente porque afasta qualquer possibilidade de discussão
quanto à validade do ato praticado. Em função da adesão do nosso sistema jurídico ao
sistema da legalidade temperada pela instrumentalidade das formas dos atos processuais,
o julgador, não raro, deverá efetuar juízo valorativo quanto à existência, validade e
eficácia de atos processuais praticados em desconformidade com o modelo legal
preestabelecido. Nesse sentido, deverá o juízo determinar as providencias necessárias
para a regular citação do réu, não consentindo com o avanço do iter processual sem essa
providência.
Entretanto, tendo-se prosseguido indevidamente o processo, chegando a ser proferida
sentença, não obstante a ausência de citação do réu, tendo-se julgamento de
improcedência do pedido do autor, não haveria razão suficiente, até mesmo por questões
de economia processual, para a decretação de sua nulidade porque o prejudicado pelo
vício formal foi beneficiado pela tutela jurisdicional favorável, não lhe advindo prejuízo.
Em caso de julgamento favorável ao autor, a melhor técnica recomenda que o réu seja
considerado terceiro, não se submetendo aos limites subjetivos da coisa julgada. Em
ambos os casos, a celeuma é resolvida no âmbito da eficácia do ato, não sendo necessário
valer-se do conceito de inexistência, como defendido por eminentes doutrinadores
nacionais como Teresa Arruda Alvim Wambier54
e Roque Komatsu55
, por entenderem a
citação como pressuposto de existência do processo, o que constitui, data vênia,
excessivo apego à teoria da relação jurídica processual.
54 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do processo e da sentença 6ªed. rev, atual. e ampliada,
São Paulo, RT, 2007, pp. 199-202.
55 KOMATSU, Roque. Op. cit. pp. 161-4.
Para ilidir as críticas efetuadas de que essa proposta beira as raias do decisionismo56
porque amplia excessivamente os poderes do juiz, reintroduzindo-se o arbítrio judicial no
seio do processo, entendemos que a legitimação de tal posicionamento advém da
preservação dos valores imanentes ao processo, notadamente no alcance de sua maior
efetividade, sem abrir mão da observância das garantias ofertadas às partes, sobretudo o
contraditório e a ampla-defesa.
O estrito apego às questões formais do processo, sem se perquirir as finalidades
motivadoras das formas na prática do ato, em nome de uma suposta obediência à
legalidade, poderá, paradoxalmente, servir de veículo de lesão a nosso ordenamento
jurídico, em função da ausência de percepção de que a positivação é dos fins visados
mediante a imposição de formalidades e não dos requisitos formais ontologicamente
considerados. A idéia de instrumentalidade das formas, norteadora57
do sistema das
nulidades no direito processual brasileiro, traduz com muita eficiência essa questão,
viabilizando ao juízo tenha por convalidado os atos praticados de forma atípica no
processo e, assim, possa ampliar a oferta da tutela jurisdicional sem delongas e de forma
mais efetiva.
Entendimento contrário reflete a clausura de alguns juristas na torre de sua Ciência, num
apego às questões técnicas e aos dogmas que lhe são inerentes, esquecendo-se de que sua
atividade terá seu grau de legitimação diretamente proporcional a sua capacidade de
resolver os conflitos que lhes são apresentados, pacificando a sociedade, sobretudo com a
distribuição da justiça substancial. Não visa mais a Ciência Processual demonstrar o
caráter unitário e coerente de seus institutos, sendo essa visão pertencente à fase
autonomista de ramo do direito e que hoje comporta flexibilizações, sem prejuízo do
caráter sistemático que o direito processual apresenta, em função dos objetivos que ela
viabiliza na sociedade e notadamente dos conflitos a que é chamada a resolver.
56 CABRAL, Antonio do Passo. Nulidades no Processo Moderno: Contraditório,Proteção da Confiança e
Validade Prima Facie dos Atos Processuais. 2ª ed. Rio de Janeiro. Editora Forense, 2010, pp. 91-4. 57
Consultar arts. 154, 249 e 250 do CPC; art. 794 da CLT; art. 563 do CPP e art. 499 do CPPM.
5.3 PLANO DA VALIDADE.
Previamente às discussões no tocante à validade dos atos processuais, temos como
essencial uma distinção que entendemos relevante no tratamento do tema. Convém
distinguirmos entre validade dos atos processuais praticados num determinado
procedimento da questão da validade da norma que impõe os requisitos formais para a
prática desses atos.
Bem percebeu tal distinção Calmon de Passos58
ao descrever que na análise da validade
da norma estaríamos no campo da produção originária do direito, de sua constituição
(criação), ao passo que, na apreciação de validade dos atos, estaríamos no campo de
aplicação das normas (dispor prático que nos transfere do plano do pensamento
(validade) para o plano da faticidade). Aconselha o doutrinador que essa dicotomia não
seja descurada em nenhum momento da reflexão do jurista porque ela exige teorização
diferenciada.
Sem atinar com essa diferença e valendo-se dos escritos de Tércio Sampaio Ferraz Júnior,
a doutrinadora Teresa Arruda Alvim Wambier59
, ao ressaltar a necessidade de
diferenciação entre os planos da validade e da eficácia descreve: Contudo, tratando-se de
fenômenos distintos, (referindo-se a atos viciados, que a doutrinadora distingue entre atos
nulos e anuláveis- divisão com a qual também não concordamos porque a primeira
classificação encerra o conceito de nulidade inerente ao ato) pode ocorrer que um ato
nulo nunca venha a ser como tal decretado e que tenha, portanto, sido eficaz por toda a
sua vida, embora carecendo de validade, pois “valer é uma qualidade contrafática, isto
é, o valer de uma norma [ou de um ato, acrescentamos nós] não depende da existência
real e concreta das condutas que ela prescreve”. Mesmo com a inclusão do texto entre
58 PASSOS, J. J. Calmon de. Esboço de uma teoria das nulidades aplicada às nulidades processuais. 1ª ed.
4ª tiragem. Rio de Janeiro, Forense, 2009, p. 25.
59 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do processo e da sentença 6ªed. rev, atual. e ampliada,
São Paulo, RT, 2007, p. 137. Texto entre aspas e colchetes do original da obra; texto entre parêntesis
consiste em observações deste autor.
colchetes60
visando a trazer os escritos do professor Tércio Sampaio para o campo de
discussão tratado pela doutrinadora, não podemos ter como válidas suas afirmações: ora,
se a validade do ato, como buscou enfatizar a doutrinadora, independe da conduta real e
concreta que a norma prescreve equivale a afirmar a possibilidade de haver atos
inexistentes fática ou juridicamente que seriam válidos, o que encerra nítida confusão
entre os planos jurídicos ora tratados.
Em nosso entender, o que o sistema não apenas permite como também incentiva é que
não obstante a inexistência de atos do procedimento, por mais relevantes que sejam, não
havendo prejuízo aos valores que eles abrigam, não sobrevenha a decretação da nulidade
do processo, numa importante manifestação do inter-relacionamento dos atos no
procedimento e de um dos seus corolários consistente no tratamento da nulidade do ato
em si mesmo considerado ou do processo como um todo.
Estabelecida tal premissa, centremo-nos no estudo da validade dos atos jurídicos e do
aspecto peculiar que a questão apresenta no tocante aos atos processuais. É clássica na
doutrina61
a idéia de que uma vez composto o suporte fático suficiente que enseja a
incidência da norma que lhe confere juridicidade, temos o ingresso do fato no mundo
jurídico, em seu plano da existência, cabendo, em relação aos atos jurídicos lato sensu, a
análise quanto a sua validade.
Segundo Komatsu62
, a validade é qualidade que o negócio ou o ato devem ter, ao entrar
no mundo jurídico, consistente em estar de acordo com as regras jurídicas (...). Válido é
adjetivo, predicado com que se qualifica o negócio ou ato formado de conformidade com
60
Aliás, consultando a 4ª edição dessa obra, constatamos que não havia essa observação da autora.
61 DALL AGNOL JR. Antonio Janyr. Invalidades Processuais- Algumas Questões. In: Revista de Processo
n. 67. São Paulo, Ed. RT, jul/set 1992, p. 155 prega que o ato será juridicamente existente quando
estiverem presentes seus elementos essenciais, ou segundo Pontes de Miranda, seu suporte fático for
suficiente. Quanto a sua validade, deve-se analisar se além do suporte fático suficiente ele também é
eficiente- ou não deficiente.
62 KOMATSU, Roque. Da invalidade no processo civil. São Paulo, RT, 1991, p.34.
as regras jurídicas. Os requisitos, prossegue o autor, são aqueles caracteres que a lei
exige (requer) nos elementos do ato ou do negócio, para que este seja válido. São,
portanto, qualidades que os elementos devem ter.
Tendo clara essa noção de suporte fático suficiente, permitindo a incidência da norma e a
conseqüente juridicização do ato, que ingressa no mundo jurídico no plano da existência,
passa-se à analise de outra situação. É possível que o suporte fático do ato seja suficiente,
que determinariam a sua existência no mundo jurídico, mas que os elementos que o
compõem se apresentem de forma degenerada, deficitária,63
falando-se em suporte fático
suficiente, mas deficiente, ensejando-se a decretação de sua nulidade, e da conseqüente
privação dos efeitos que tiver produzido no processo64
. Entretanto, a invalidade não será
mera decorrência da inadequação do ato com seu modelo formal, impondo-se que nem
todo ato ou procedimento com vício será anulado.
Não satisfaz no processo a simples verificação da subsunção do fato à norma. O binômio
perfeição-eficácia a que se refere prestigiada doutrina65
não apresenta caráter absoluto e
sua flexibilização é não apenas necessária, nesse ramo do direito, mas também útil
quando efetuada de forma equilibrada e com bom-senso, requerendo do julgador
comprometimento com os aspectos éticos que permeiam o processo e não o apego cego
ao atendimento à forma, sem questionamento de sua razão de ser e das finalidades a que
visam amparar, em nome de um suposto legalismo66
que, na maioria das vezes,
63 Alguns doutrinadores utilizam como equivalente ao conceito de suporte fático suficiente de Pontes, a
verificação da existência dos elementos mínimos do ato como determinantes da sua própria existência,
como Dall Agnol in Invalidades Processuais- Algumas Questões In: Revista de Processo n. 67. São Paulo,
Ed. RT, jul/set 1992, p. 155 ao pregar que o ato será juridicamente existente quando estiverem presentes
seus elementos essenciais, ou no dizer de Pontes de Miranda, seu suporte fático for suficiente.
64 Cf. DALL’AGNOL JÚNIOR, Antônio Janyr. Invalidades Processuais. Porto Alegre: Letras Jurídicas
Editora, 1989, p. 18.
65 DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil, vol. II. 6ªed. rev. e atual. São
Paulo, Malheiros, 2009, p. 597 na qual é apresentada a seguinte afirmação: Há um eixo central no sistema
dos atos processuais, interligando os elementos do binômio perfeição-eficácia.
66 São esclarecedoras as palavras de BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e
técnica processual. 3ª Ed. São Paulo, Malheiros, 2010, p. 426 em que o autor afirma que a forma representa
inviabiliza a prestação jurisdicional e coloca em xeque o próprio direito material67
discutido.
Essa análise da existência e da validade do ato é vista como um dos aspectos que
diferenciam os adeptos da premissa instrumentalista do processo em relação àqueles que
a ela não aderem. O que se busca na análise do plano da existência é a não-ampliação do
rol das situações determinantes da inexistência dos atos processuais, restringindo ao
mínimo necessário que cheguemos a situações em que elas ocorram ou em razão de
desconformidades na prática do ato material, que nesse caso não seria apto a ingressar no
mundo jurídico e constituindo-se apenas num fato social ou de situações de inexistência
no próprio mundo social do ato. A análise da ocorrência de prejuízo norteia ambas as
situações, sendo a análise do prejuízo analisada no tocante ao processo como um todo e
viabiliza sua decretação de nulidade em razão da inexistência de prejuízo, não obstante a
ausência do ato em si mesmo considerado;
No plano da validade, busca-se viabilizar que atos, embora praticados em
desconformidade com o modelo legal, embora não discutida a sua existência, possam
continuar válidos68
e produzindo também seus regulares efeitos, em homenagem a
valores maiores eleitos pelo sistema e que terminam por convalidar o vício do processo,
não obstante a permanência do vício do ato em si.69
Vê-se, assim, que é diminuta a importância da distinção entre inexistência e a nulidade
dos atos processuais, porque a ordem jurídica privilegia, nesse ramo do direito, o alcance
da finalidade e admite que se ela for alcançada de forma diversa, ou não obstante a
ausência do ato instituído para sua proteção, não haveria razão justificável para o
pronunciamento da nulidade, porque deve-se pautar o critério de análise do prejuízo tanto
para alguns juristas a garantia de legalidade, motivo pelo qual, muitas vezes, eles não se preocupam em
buscar a razão de ser de determinadas exigências, que se revelam destituídas de qualquer objetivo.
67Cf. BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Op. cit. p. 428.
68 Cf. BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Op. cit. p. 424 em que o autor afirma que o aspecto finalístico
visa a conferir validade e eficácia ao ato atípico e não somente reconhecer-lhes os vícios.
69 KOMATSU, Roque. Da invalidade no processo civil. São Paulo, RT, 1991, p. 263 em que o doutrinador
também ressalta que, embora convalidado o ato, o vício permanece.
sobre o ato em si ou até de sua ausência, como também sobre a universalidade dos atos
do processo. Assim, poderá haver situações em que apesar do prejuízo decorrente da
mácula do ato em si, ou até mesmo de sua ausência na cadeia do procedimento, se não
houver esse prejuízo quando considerada a universalidade dos atos do processo, esse
vício será irrelevante. 70
Cabível ainda o aprofundamento das afirmações feitas acima. É possível que haja
prejuízo decorrente do vício do ato em si com reflexos na cadeia do procedimento e que
ainda assim não sobrevenha o pronunciamento da nulidade nos casos em que não houver
prejuízo no âmbito material à parte processualmente prejudicada, por exemplo, quando
houver decisão de mérito que lhe seja favorável, constituindo esse exemplo uma clara
manifestação da natureza instrumental do processo.
Adverte o professor Bedaque71
que talvez a única situação em que a distinção entre os
planos da existência e da validade torna-se relevante no direito processual seja no caso da
sentença, cujo vício ensejador da nulidade poderá ser convalidado pela coisa julgada, ao
passo que a sua inexistência não admitiria convalidação dela mesma, já que haveria
contradição em termos falar-se em coisa julgada, que é qualidade da sentença e de seus
efeitos72
, sendo que ela própria é inexistente. Entretanto, também não deverá o julgador
estar excessivamente apegado aos requisitos formais do ato para a determinação da
inexistência da sentença.
O artigo 458 do CPC estabelece que são requisitos essenciais da sentença seu relatório,
seu fundamento e seu dispositivo. Não obstante a primeira impressão decorrente da
leitura do texto legal conduzir-nos à conclusão de que a ausência de algum desses
70 Cf. BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Idem, p. 445 na qual ressalta que o problema está em saber se
o vício que macula o ato ou mesmo a ausência de determinado ato processual constituem óbice
intransponível a que se aceitem os efeitos produzidos, desconsiderando-se a falha. 71
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Ibidem pp. 507-8.
72 Consultar CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel e GRINOVER, Ada
Pelegrini. Teoria geral do processo. 24ª Ed. São Paulo, Malheiros Editores, 2008, p. 329; BEDAQUE, José
Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. 3ª Ed. São Paulo, Malheiros, 2010,
p.475. Do mesmo autor, consultar também Direito e processo. 2ªed., 2ª tiragem São Paulo, Malheiros,
2001, pp. 96-101.
elementos conduzira impreterivelmente à inexistência da própria sentença, uma leitura
mais acurada permite-nos afirmar que a ausência de relatório ou fundamentação encerra
caso de nulidade do ato, sendo plenamente possível sua convalidação pela eficácia
preclusiva da coisa julgada ou pela ausência de prejuízo.
Somente no caso de ausência de dispositivo estaremos diante de ato inexistente, uma vez
que nele consubstancia-se a prestação jurisdicional e sobre ele incide a coisa julgada, não
havendo hipótese de convalidação do vício do ato material praticado, mas que não se
subsume ao conceito de sentença. Fora desse caso, nada impede que a eventuais
desconformidades que inquinam a sentença sejam aplicados as mesmas espécies
normativas norteadoras do sistema das nulidades, como nos casos de sentença ultra ou
extra-petita, cujo parâmetro para a verificação do prejuízo será a plena garantia do
contraditório ter sido devidamente ofertado ao réu, exercendo-o, inclusive, quanto aos
termos que excedem ou exorbitam o pedido do autor e materializados na sentença; no
tocante à sentença infra-petita, embora também constitua caso de nulidade, a coisa
julgada somente incidirá nas questões expressamente decididas, nos termos do art. 468 do
CPC, não havendo impedimento para que o autor proponha nova Ação tendo por objeto
os eventuais pedidos não decididos naquela anteriormente proposta e sobre a qual não
houve prestação jurisdicional.
5.4 PLANO DA EFICÁCIA.
Inicialmente fazem-se necessárias algumas considerações que se apresentam deveras
elucidativas do conteúdo que será exposto a seguir. Trata-se, também, do estabelecimento
de uma separação que devemos ter muito clara em relação aos efeitos fáticos e aos efeitos
jurídicos.
Parece que a noção indistinta desses fenômenos, atrelada ao apego a questões
puramente lógicas por parte de alguns pensadores do Direito, constituem a base material
para discussões que pouco acrescentam ao entendimento e deslinde de questões
complexas a aflitivas sobre o assunto em nosso sistema jurídico.
Muito se discute se a eficácia dos atos jurídicos se constituiria como a efetiva produção
de efeitos ou como a idoneidade ou aptidão para produzi-los.
O doutrinador Roque Komatsu destaca que ao falar do plano da eficácia, que pertine à
produção de efeitos do ato, não se trata naturalmente de todo e qualquer efeito desse ato,
mas dos efeitos próprios a que o ato visa produzir. Após discutir a conceituação de
eficácia jurídica, adota o critério da efetiva produção dos efeitos regulares do ato para a
caracterização de sua eficácia73
.
Data vênia, ousamos haver nesse critério confusão entre os planos fático e jurídico. Se
efeito jurídico é toda mudança de situação precedente, conforme ressalta o próprio autor é
toda diferença entre uma situação jurídica preexistente e uma outra sucessiva temos então
que essa mudança de situação é determinada pela constituição, modificação,
desenvolvimento, conservação ou extinção de direito, obrigação, poder, dever, faculdade,
ônus, sujeição ou estado. Se o ato jurídico é idôneo para a caracterização de uma dessas
situações, podemos dizer que ele é eficaz juridicamente, independentemente de sua
atuação no plano fático, embora não ignoremos que a tutela jurisdicional é buscada para
viabilizar o exercício de direitos nesse plano.
Jamais poderíamos dizer que uma sentença condenatória não é eficaz em razão da
ausência de propositura do Cumprimento dessa sentença para que seu autor se valha dos
instrumentos estatais para a satisfação prática de seu direito. O título executivo em si é
suficiente para produção de efeitos jurídicos e elemento necessário, mas muitas vezes não
suficiente para a produção dos efeitos no mundo concreto.
Adotam o pensamento pregado aqui de que a eficácia do ato é sua aptidão ou idoneidade
para produzir efeitos no mundo fático, tendo efetivamente efeito jurídico ao estabilizar
73
KOMATSU, Roque. Op. cit, pp. 36-37.
uma situação jurídica, entre outros, Teori Albino Zavascki74
e também os eminentes
administrativistas Maria Sylvia Di Pietro75
e Celso Antônio Bandeira de Mello76
.
Outra distinção relevante que se faz em relação à ineficácia, é que poderá originar-se de
distintas situações: poderá ser decorrente da decretação da nulidade do ato, cujo objetivo
é exatamente privá-lo dos regulares efeitos77
produzidos no processo, por conter vício
intrínseco, e de outro lado, temos a ineficácia em sentido estrito, ou técnica, caracterizada
pela ausência de algum fator de eficácia do ato78
e, portando, contendo vício extrínseco,
podendo ser decorrente da natureza do negócio, como o evento morte, para a eficácia de
um testamento elaborado conforme os ditames legais, ou ser fruto da vontade dos
celebrantes do negócio, como na estipulação contratual de condição suspensiva. Nesse
último caso, o ato existe e é valido, mas ineficaz79
somente passando a produzir os seus
regulares efeitos quando da ocorrência de seu fator de eficácia.
74
ZAVASCKI, Teori Albino. Eficácia das Sentenças na Jurisdição Constitucional. São Paulo, Editora
Revista dos Tribunais, 2001, p. 20.
75
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo, 22ª ed. São Paulo, Editora Atlas, 2009, p.206 76
BANDEIRA DE MELLO, Celso Antonio. Curso de Direito Administrativo, 23ª ed. ver e atual.São
Paulo, Editora Malheiros, 2007, p. 389.
77
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do processo e da sentença 6ªed. rev, atual. e ampliada, São
Paulo, RT, 2007, p. 137 onde a autora afirma que normalmente os atos viciados tendem a ser privados de
efeitos, mas de seus efeitos típicos, isto é, daqueles a que são preordenados, nada impedindo que produzam
efeitos atípicos ou indiretos; DALL AGNOL JR. Antonio Jany, Invalidades Processuais- Algumas
Questões. In: Revista de Processo n. 67. São Paulo, Ed. RT, jul/set 1992, p. 157 cita que há atos válidos,
mas que por lhe faltar algum fator de eficácia, não produz seus regulares efeitos. Chama atenção também
para o fato de que há atos inválidos que produzem efeitos, como a citação determinada por juiz
incompetente, ou seja, os atos inválidos são impotentes para o produção de seus regulares efeitos, mas isso
não quer dizer que eles não possam produzir efeitos outros.
78
Dall Agnol in Invalidades Processuais- Algumas Questões. In: Revista de Processo, n. 67 jul/set 1992, p.
156 invocando Antônio Junqueira de Azevedo define fator como algo que concorre para um certo
resultado, sem propriamente dele fazer parte.
79 O doutrinador Freitas Câmara elenca como exemplo de ato válido, mas ineficaz o caso de fraude em
execução. Consultar CÂMARA, Alexandre Freitas. Lições de Direito Processual Civil. Atualizada pelas
Leis 113672/2008 (recursos especiais repetitivos) e 11694/2008 (impenhorabilidade de verbas de partidos
políticos). 16ª ed.; Lumen Juris Editora, 2008, vol. II, pp. 202-205.
5.5 A QUESTÃO DA INEXISTÊNCIA DE ATOS PROCESSUAIS E OS
EFEITOS PRODUZIDOS.
Tentaremos agora tratar da espinhosa questão da inexistência dos atos, podendo
ser decorrente da inexistência de ocorrência de fatos no mundo concreto ou de
acontecimentos no mundo fático, mas de forma insuficiente para torná-lo também
jurídico, sendo chamados de atos inexistentes juridicamente.
A inexistência dos atos processuais é categoria sobre a qual existe controvérsia entre os
doutos sobre sua existência, enquanto categoria autônoma. Doutrinador do tomo de
Ovídio Baptista80
entende ser muito difícil, dada a natureza instrumental da teoria das
nulidades, a categoria dos atos inexistentes em processo civil. Tece críticas à redação do
art. 37 e parágrafo único do CPC, que prescreve a inexistência dos atos praticados por
advogado sem instrumento de mandato, quando o sejam para evitar o perecimento do
direito de seu cliente, devendo ser ratificados pela oportuna exibição do respectivo
instrumento de mandato, e concluí apontando a incongruência da doutrina da inexistência
ressaltando que se o ato pode ser ratificado é porque existe.
Na verdade, insere o renomado doutrinador os chamados atos inexistentes na categoria
dos atos nulos, no que é seguido por Baggio e Tesheiner81
que afirmam a inexistência de
um plano da existência que se contraponha aos planos da validade e da eficácia e
ressaltam que a defesa da existência desse plano é corolário da incorreta separação entre
mundo fático e mundo jurídico.
80BAPTISTA DA SILVA, Ovídio Araújo. Curso de Processo Civil, 4ª ed. rev. e atual. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 1998, vol. I, pp. 218-221.
81 BAGGIO, Lucas Pereira e TESHEINER, José Maria Rosa. Nulidades no Processo Civil Brasileiro. Rio
de Janeiro, Editora Forense, 2008, p. 30
Por aderir à categoria da inexistência dos atos, Antonio Janyr Dall Agnol Jr82
tece críticas
ao entendimento de Ovídio argumentando que o ilustre doutrinador faz confusão entre
inexistência e nulidade, e invoca Pontes, ao enfatizar que somente o que existe poderá ser
nulo- e para tanto precisa ser desconstituído, ao passo que inexistente não chega a
constituir-se, e, portanto, não precisaria ser desconstituído, mas apenas declarada tal
situação de fato. Interessante ressaltar que Dall Agnol utiliza o mesmo argumento de
Ovídio para refutar sua negação da categoria da inexistência dos atos- no sentido de que
seria exatamente a inexistência dos atos que suscitaria a proteção da aparência, fundada
em princípio como o da boa-fé.
Retomando novamente o pensamento pontesiano, as normas descrevem os elementos do
suporte fático abstrato, que uma vez ocorrido no mundo concreto, enseja sua incidência e,
conseqüentemente, torna esse fato do mundo também integrante do mundo jurídico. Pode
ocorrer, entretanto, que haja dificuldades na exata determinação de seu suporte fático
suficiente, ou seja, poderão existir situações em que a conduta prática do ato não guarda
perfeita relação com o seu modelo legal, ensejando a dúvida quanto à incidência da
norma que o juridiciza.
A percepção dessas situações é clara quando estamos diante de situações extremadas,
entretanto torna-se atividade de ampla dificuldade à medida que nos aproximamos da
linha demarcatória do jurídico e do não-jurídico; aliás, é exatamente essa a tarefa do
intérprete e aplicador do direito. Ninguém ousaria chamar de sentença o escrito em papel
em decorrência da simulação de julgamento pelo Tribunal do Júri no ambiente acadêmico
de uma faculdade de Direito, mas as situações limites requerem maior atenção para a sua
exata determinação, e claro, das conseqüências que daí advêm.
Na predeterminação dos elementos dos atos que conjugam sua própria existência, dos
requisitos que deverão ser dotados esses elementos para que sejam válidos , ou dos
fatores que poderão atuar sobre sua eficácia, estamos pensando na fisiologia do ato,
82 DALL’AGNOL JÚNIOR, Antônio Janyr. Invalidades Processuais. Porto Alegre: Letras Jurídicas
Editora, 1989, p. 20
restando ao operador do Direito a simples análise do binômio perfeição-eficácia83
. No
direito romano, extremamente apegado aos aspectos formais do ato, a menor
desconformidade do ato ao seu modelo legal já se constituía como elemento
fundamentador de sua nulidade, vindo daí sua noção de identidade entre o nulo e o
inexistente.
Entretanto, em razão da tomada de consciência do papel que o Direito Processual
desempenha na sociedade, notadamente de seu caráter publicístico, de ser o método
estatal de resolução de conflitos, de pacificação social e de aplicação das normas
jurídicas, enfim, de realização do Direito, e também em função da maior complexidade e
massificação das relações intersubjetivas, já não é mais suficiente que a mera
inadequação na prática de atos processuais ao seu modelo para ensejar o pronunciamento
de sua nulidade. A simples inadequação do ato ao seu modelo já não atende aos anseios
da complexa sociedade hodierna, levando ao surgimento de novos parâmetros que
deverão ser levados em conta pelo intérprete e aplicador do direito para que tenhamos a
nulidade do ato ou do processo decretada e, nesse sentido, entendemos que o acolhimento
de nosso ordenamento ao sistema da instrumentalidade das formas, materializado na
análise do alcance da finalidade do ato e da ausência de prejuízo84
serão os balizadores da
análise implementada pelo julgador.
Assim estabelece a redação do art. 154 do vigente CPC: os atos e termos processuais não
dependem de forma determinada senão quando a lei expressamente a exigir, reputando-
se válidos os que, realizados de outro modo, lhe preencham a finalidade essencial. Não
obstante a redação dada no artigo, entendemos que a exigência da forma pelo legislador
visa a não permitir a abertura de discussões quanto à validade do ato, ou seja, diante da
identidade entre a forma descrita pelo legislador e sua ocorrência concreta, não haveria
83 DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil, vol. II. 6ªed. rev. e atual. São
Paulo, Malheiros, 2009, p. 597 afirma a existência de um eixo central no sistema dos atos processuais,
interligando os elementos do binômio perfeição-eficácia. 84
Assim estabelece a redação do art. 154 do vigente CPC: os atos e termos processuais não dependem de
forma determinada senão quando a lei expressamente a exigir, reputando-se válidos os que, realizados de
outro modo, lhe preencham a finalidade essencial. Não obstante a redação dada o artigo, entendemos que a
exigência da forma pelo legislador visa a não permitir a abertura de discussões quanto à validade do ato, ou
seja, diante da identidade entre a forma descrita pelo legislador e sua ocorrência concreta, não haveria que
se discutir a validade do ato.
que se discutir a validade do ato, estando essa análise centrada no âmbito do binômio
perfeição-eficácia.
Não permite nosso ordenamento a ilação de que os atos praticados em desconformidade
com seu modelo legal sejam nulos, requerendo-se análise concreta do julgador quanto aos
eventuais prejuízos decorrentes dessa inadequação, ou seja, a existência do binômio
perfeição-eficácia em nosso sistema processual não implica que os atos atípicos85
não
poderão produzir efeitos, ou que os efeitos produzidos devam ser desconstituídos pelo
Judiciário.
A maior complexidade e massificação das relações da vida hodierna aliada à vinculação
do direito processual à matriz do direito público geram situações que obrigam os
profissionais do direito a atuarem não na fisiologia, mas na patologia, flexibilizando o
binômio perfeição-eficácia, já que, em nome de uma suposta legalidade, o apego do
intérprete e aplicador do direito a questões formais destituídas de um juízo de finalidade
do ato não mais atende às necessidades prementes atuais, servindo muitas vezes de óbice
à prestação da tutela jurisdicional e ao próprio perecimento do direito material discutido,
além de conduzi-lo ao esquecimento de que o sistema das nulidades existe e tem sua
importância prática na preocupação com a eficácia dos atos viciados, isto é, que destoam
de seu modelo estabelecido pela lei.
A exata determinação dos parâmetros em que essa flexibilização se apresenta como
legitima, permitindo que atos, não obstante a inadequação com seu modelo legal possam
continuar produzindo seus regulares efeitos, se apresenta como um dos objetivos centrais
dessa obra, à medida que contribui para efetividade do processo e também para a
ampliação do acesso86
à ordem jurídica justa, desonerando o Judiciário e viabilizando
uma tutela jurisdicional mais célere, efetiva e justa, com o conseqüente distanciamento do
apego às questões formais que não apresentem razão teleológico-sistêmica e inviabilizam
85 CABRAL, Antonio do Passo. Nulidades no Processo Moderno: Contraditório,Proteção da Confiança e
Validade Prima Facie dos Atos Processuais. 2ª ed. Rio de Janeiro. Editora Forense, 2010, p. 23.
86 Cf. CABRAL, Antonio do Passo. Op. cit. p. 16 em que o autor acertadamente afirma que forma e técnica
não são valores excludentes, mas devem ser conjugados e coordenados no processo e que seu equilíbrio
favorece o acesso à justiça, exatamente no sentido que defendemos na presente obra.
a própria prestação da tutela jurisdicional, colocando em risco, inclusive, o direito
material discutido.
Somem-se a isso, as deficiências ou insuficiências existentes nas previsões normativas,
que por vezes geram acirradas discussões doutrinárias sobre a sua aplicação obrigando,
não raro, que a doutrina e a Jurisprudência, mediante seu labor, tenham que suprir87
tais
deficiências.
Questão relevante, nesse sentido, é a redação do parágrafo único do artigo 37 do vigente
Código de Processo Civil, que prescreve como inexistentes os atos praticados por
causídico sem procuração e que não forem ratificados no prazo de quinze dias. A taxativa
conseqüência pelo legislador acaba abrangendo situações em que a medida se apresenta
como desproporcional e de excessivo caráter formalista e excessivamente apegado ao
aspecto ontológico do ato.
De acordo com a linha de pensamento até agora apresentada, a clara determinação entre o
jurídico e o não-jurídico requer do jurista equilíbrio e bom-senso na correta avaliação da
incidência ou não das normas, notadamente em função da utilização de conceitos abertos
e indeterminados nos textos legais e, principalmente, pela insuficiência do método
gramatical de interpretação. No caso em tela, apesar do causídico ter praticado ato
desacompanhado da devida procuração e também não tê-la juntado aos autos no prazo
legal, mesmo já estando o procedimento em fases já adiantadas quando da percepção
desse fato, a decretação da inexistência desse ato e da conseqüente privação dos seus
efeitos pode se constituir como medida excessiva nas situações em que o fato for
decorrente de mero descuido, sendo que as declarações de vontade apresentadas no ato
são verdadeiramente imputáveis às partes e presumíveis por outros atos que integram o
procedimento.
Ademais, há erronia intrínseca no texto legal. Conforme ressaltado anteriormente,
a determinação dos casos de inexistência não pode e não deve ser estabelecida de forma
87 Em sentido contrário, ver CABRAL, Antonio do Passo. Op. cit. p94.
ampla e apriorística pelo legislador para abranger todas as situações possíveis, devendo-
se analisar as circunstâncias concretas, cujo intento de salvar o ato ou o processo e evitar
a decretação de nulidades deve estar presente, mas sempre legitimada pela inocorrência
de prejuízo.
Talvez aqui, o legislador, visando a evitar a ocorrência de situações em que o vício na
pratica do ato fosse convalidado, com a presunção da eficácia preclusiva da coisa julgada,
por exemplo, tenha optado pela determinação da inexistência do ato, uma vez que esses
atos não estariam sujeitos à preclusão ou convalidação, mas essa medida não se coadune
com a sistemática do ordenamento jurídico brasileiro, principalmente em razão da
necessidade de pronunciamento judicial para a constituição das nulidades.
Entendemos que no caso há excessivo apego aos aspectos formais do processo, que
passaria a apresentar caráter ontológico e não instrumental, na caracterização apriorística
da inexistência de atos praticados por procurador destituído de mandato não exibido no
prazo legal. É pouco razoável essa determinação com caráter absoluto pelo legislador,
com todos os riscos dos possíveis efeitos nocivos que ela poderia apresentar, muitas das
vezes, chocando-se com valores do sistema processual como economia, celeridade,
efetividade e justiça, e não raro, inviabilizando a prestação jurisdicional.
Se o intento do legislador foi constranger ao cumprimento da determinação formal,
entendemos que dispõe ele de ferramentas mais condizentes com a situação, cuja
utilização poderá variar conforme a fase em que se encontra o processo. Se o vício foi
percebido antes do proferimento da sentença, em vez da determinação imediata da
inexistência dos atos praticados e, por conseguinte, a extinção do processo por
desatendimento a esse pressuposto processual se concernente ao autor, ou a determinação
da revelia, se o vício é adjudicado ao réu, a determinação expressa da regularização do
ato, se possível até informalmente, atenderia à necessária economia processual e se
apresentaria mais consentânea com as finalidades do processo. Teríamos, in casu, uma
das questões mais defendidas pela doutrina hodierna no âmbito processual que consiste
no aumento da participação do juiz correlacionada à ampliação das possibilidades de
influência das partes em suas decisões88
.
Portanto, entendemos tratar-se o caso de vício cuja sanabilidade, estando o processo
ainda em curso atenderia à necessidade de certeza de que as manifestações de vontade
contidas no ato viciado seriam de fato imputáveis ao ente89
nele indicado, atendendo-se
aos mandamentos do devido processo não apenas legal, como também constitucional.
Sendo proferida sentença favorável ao réu, mesmo havendo atuação indevida de
causídico em seu favor, o processo terá existido e será perfeitamente válido e eficaz, em
função da ausência de prejuízo tanto ao sujeito vencedor da demanda, quanto à parte em
desfavor de quem a sentença foi proferida, porque exerceu regularmente o contraditório e
não conseguiu demonstrar a plausibilidade de sua pretensão.90
Uma vez publicada a sentença, ato que esgota a competência do Juízo de 1º grau,
conforme norma do art. 463 do CPC, sendo impugnada a decisão mediante Apelação,
poderia o Tribunal também determinar a regularização do ato, nos termos do art. 515, §4º
do CPC, ou simplesmente convalidar o vício, se as circunstâncias concretas assim o
permitir, ou seja, norteando-se pela noção de ausência de prejuízo em decorrência da
inadequação formal.
Sobrevindo o trânsito em julgado da decisão, sem que o vício tenha sido convalidado no
curso do andamento processual, restaria ao prejudicado oferecer Ação Rescisória da
Sentença nos termos dos artigos 485, V e 495 do CPC, no prazo de dois anos, ou o vício
será convalidado do pela eficácia preclusiva da coisa julgada descrita no artigo 474 do
CPC. Ressalta-se que no julgamento da rescisória, poderá o juízo valer-se das espécies
normativas regentes das nulidades processuais.
88 Sobre esse tema essencial da processualística moderna, ver CABRAL, Antonio do Passo. Op. cit. pp.
103-73.
89
Se essa ilação puder ser obtida mediante a comparação do ato atípico com os demais atos praticados no
processo, o vício estará convalidado.
90BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. 3ª Ed. São Paulo,
Malheiros, 2010, pp.214-8.
Transitando em julgado a sentença não impugnada ou o acórdão do Tribunal, devem-se
analisar os limites subjetivos e objetivos que possuem, não havendo que se falar em
inexistência por ausência de capacidade postulatória, devendo as discussões centrarem-se
no plano da eficácia, que será analisada em razão das circunstâncias em que a decisão foi
proferida, sendo que somente será apta a atingir a esfera de direitos daquele a quem foi
ofertada todas as garantias do devido processo legal, ou para impedir o avanço sobre a
esfera de direitos daquele que teve seu rol de garantias lesionadas, mas que não lhe
adveio, em conseqüência, nenhum prejuízo porque a decisão foi-lhe favorável no mérito,
podendo valer-se dela para impedir tal intento da contraparte.
Em ambos os casos, é plenamente possível em nosso sistema processual considerar essas
decisões válidas e eficazes, o que não seria possível no caso de excessivo apego à teoria
dos pressupostos processuais91
para manter o caráter dogmático da disciplina, como
preconiza a professora Teresa Wambier, mas que acaba sendo forçada a romper com o
rigor científico ao pregar que os casos de inexistência possam ser ratificados,92
quando o
que na verdade ocorre é a possibilidade de regularização do ato praticado de forma
irregular, não se cogitando nessa hipótese da famigerada preclusão consumativa, ou a
convalidação do vício em função da ausência de prejuízo.
6. NOMENCLATURA: NULIDADE OU INVALIDADE.
Significativa doutrina nacional adota o termo invalidade à nulidade. Essa opção é
fruto direto das premissas conceituais a que aderem no tocante ao tema das nulidades.
91 Sobre o avanço da Ciência Processual no sentido de que a ausência de pressupostos processuais não
constituiria óbice intransponível ao julgamento do mérito, ver SOUSA, Miguel Teixeira de. Sobre o
Sentido e a Função dos Pressupostos Processuais (Algumas Reflexões sobre o dogma da apreciação prévia
dos Pressupostos Processuais na Ação Declarativa). In: Revista de Processo n. 63; São Paulo: Ed. RT
jul/set 1991, pp. 74-87.
92 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do processo e da sentença 6ªed. rev, atual. e ampliada,
São Paulo, RT, 2007, p. 146.
Antonio Janyr Dall Agnol Jr93
tem a invalidade como gênero que abarca as espécies de
nulidade absoluta, relativa e anulabilidade, reconhecendo que muitos autores utilizam a
nomenclatura nulidade processual, sendo este o termo consagrado na doutrina e que
abarca a totalidade das situações, utilizado-o no mesmo sentido em que ele utiliza o termo
invalidade, mas ressalta a necessidade de purificação da linguagem jurídica, não sendo
aconselhável a utilização do mesmo nomem iuris referindo-se a fenômenos distintos.
Além de desse autor, preferem também o termo invalidade Roque Komatsu94
e
Teresa Wambier,95
embora essa eminente autora esclareça que em função de ser
consagrada a expressão Nulidade, ela a utiliza, mas sem ignorar as distinções que
fundamentam as diferentes nomenclaturas dos fenômenos.
Transparece, já na nomenclatura adotada, parte das premissas conceituais a que
adere o autor no tocante à opção pelo termo nulidade ou invalidade.em razão de que fatia
significativa doutrina é avessa à existência da categoria das anulabilidades no sistema
processual96
, por entender inexistentes as normas voltadas à proteção de interesses
eminentemente privados nesse ramo do direito, cujas normas seriam voltadas à proteção
do interesse público, esvaindo-se um dos fundamentos para a opção pelo termo
invalidade.
Sendo o direito processual um ramo do direito público, não há que se falar em
normas instituídas visando à proteção do interesse privado no âmbito do processo. Elas
sempre são voltadas ao interesse público, mesmo nos casos em que ofertam garantias às
partes, uma vez que são apenas meios para que o instrumento estatal cumpra seus escopos
93 DALL’AGNOL JÚNIOR, Antônio Janyr. Invalidades Processuais. Porto Alegre: Letras Jurídicas
Editora, 1989, p. 16.
94 KOMATSU, Roque. Da invalidade no processo civil. São Paulo, RT, 1991, p. 170 et seq.
95WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do processo e da sentença 6ªed. rev, atual. e ampliada, São
Paulo, RT, 2007, p. 141.
96 Sobre o tema ver DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil, vol. II. 6ªed.
rev. e atual. São Paulo, Malheiros, 2009, pp. 606-8; MITIDIERO, Daniel Francisco. O Problema das
Invalidades no Direito Processual Civil Brasileiro Contemporâneo, disponível em <htpp://abdpc.org.br>
acesso em 13 de julho de 2011.
de pacificação com justiça e de forma consentânea com os valores reinantes num dado
momento histórico da sociedade, estando assim, sempre comprometidas com a ordem
pública. Essa premissa faz com que utilizemos como sinônimos os termos nulidade ou
invalidade.
7. PENSAMENTO DE EMINENTES DOUTRINADORES
NACIONAIS NO TEMA DAS NULIDADES.
7.1 A DOUTRINA DE GALENO LACERDA.
Deve-se a Galeno Lacerda97
a sistematização mais difundida no direito brasileiro
no tocante ao tema das nulidades processuais. A originalidade trazida pelo autor foi o
deslocamento da análise das nulidades processuais do aspecto subjetivo e centrado no
próprio vício que macula o ato, para o aspecto objetivo, ou seja, centrando-se na natureza
da norma e de seus aspectos teleológicos98
.
Dividiu o autor as nulidades das anulabilidades em função da natureza da norma
violada, sendo que as anulabilidades seriam fruto da violação de normas dispositivas, ao
passo que as nulidades seriam decorrentes de violação de normas cogentes. Estabelece
ainda o autor uma subdivisão dentre essas violações de normas cogentes: violação à
norma cogente tuteladora do interesse público originária nulidade absoluta, ao passo que
infringência àquela voltada à proteção do interesse particular, ensejaria a nulidade
relativa.
A conseqüência dessa classificação tripartite das nulidades consistiria no fato de
que as anulabilidades não permitiriam atuação de ofício pelo juiz, devendo as partes
97 LACERDA, Galeno. Despacho Saneador, 3ª. ed.. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1990, pp.
57-98. 98
Idem, ibidem, p. 72.
interessadas reagirem a sua ocorrência para que sobrevenha a anulação. No tocante às
nulidades, em ambos os casos o juiz atuaria de ofício, mas de forma distinta, conforme a
categoria da nulidade que se lhe apresenta: no caso de nulidade absoluta, que para Galeno
tem natureza insanável, o juiz decretaria independentemente de provocação da parte essa
nulidade, ao passo que a ocorrência de nulidades relativas, o juiz atuaria de ofício para
determinar o seu saneamento, pela repetição, ratificação, ou pelo suprimento da omissão.
Dentre os cultores do modelo elaborado por Galeno no tocante às nulidades,
temos eminentes doutrinadores como E.D.Moniz de Aragão e Antonio Janyr Dall Agnol
Jr.99
De nossa parte, ressaltamos as imensas dificuldades que se apresentam aos adeptos
desse modelo para a correta diferenciação das normas que tutelariam o interesse público
ou o interesse privado, principalmente quando consideramos que o maior interesse
público existente no processo consiste na sua finalidade externa que é a supressão da
crise de direito material que o ensejou e, se para alcançar tal desiderato, houver
necessidade de flexibilização da técnica em favor do justo resultado não há que se
pestanejar, pelo contrário, há que se ter coragem, consciência e equilíbrio para a adoção
de medidas próprias de um sistema racional comprometido com os resultados a serem
produzidos e não com os aspectos ontológicos do instrumento e erige a forma como valor
absoluto no processo.
Embora tenha sido aceita a teoria das nulidades processuais elaborada por Galeno
Lacerda por grande parte da doutrina e jurisprudência nacionais, ela também sofreu duras
críticas por parte da doutrina100
que taxou de excessiva influência privatista em sua
elaboração , notadamente do Regulamento 737 de 1850 e também do Código Civil de
99
MONIZ DE ARAGÃO, Egas Dirceu. Comentário ao Código de Processo Civil. v.II arts. 154-269, 1ª ed,
Rio de Janeiro. Editora Forense, 1974, pp. 271-319. DALL AGNOL JR. Antônio Janyr. Invalidades
processuais. Porto Alegre: Letras Jurídicas Editora, 1989. Entretanto, Dall Agnol Jr. à p. 54 admite a
decretação de ofício da nulidade relativa, não obstante a preclusão para a parte em argui-la e, nesse ponto,
não foi plenamente fiel à doutrina de Lacerda, assim como também não o foi ao defender as irregularidades
dos atos processuais como categoria autônoma no processo.
100 CABRAL, Antonio do Passo. Nulidades no Processo Moderno: Contraditório,Proteção da Confiança e
Validade Prima Facie dos Atos Processuais. 2ª ed. Rio de Janeiro. Editora Forense, 2010, p. 72.
1916.101
Resta salientar ainda que o próprio Galeno Lacerda submeteu a sua própria
teoria à análise crítica, terminando por flexibilizá-la, pautando-se no conceito de
sobredireito processual, pautado por regras que orientariam o intérprete quanto à
aplicação de outras normas que compõem o ordenamento e, no tocante às nulidades,
terminariam por evitar a sua decretação.102
7.2 AROLDO PLÍNIO GONÇALVES.
O doutrinador mineiro Aroldo Plínio Gonçalves dissertando sobre o tema das
nulidades processuais103
apresenta visão frontalmente oposta àquela sistematizada por
Galeno Lacerda.
Afirma que no processo não haveria normas instituídas para a proteção do
interesse particular, mas tão somente normas imperativas que disciplinam a atuação do
juiz e garantem a participação das partes no desenvolvimento regular do procedimento, e
não havendo assim que se falar em nulidade dos atos em função de violação do interesse
privado no processo.
Distingue também o autor que o tema das nulidades dos atos processuais deverá
ser pautado em dois momentos distintos: a) a essencialidade do ato, conforme a previsão
legal das conseqüências decorrentes de sua inobservância, e nesse sentido entendemos
que o doutrinador manteve-se excessivamente apegado aos dogmas positivistas ao pregar
a concretude da lei; b) a disciplina da aplicação das conseqüências.104
102 Sobre a questão, ver COSTALUNGA, Danilo Alejandro Mognoni. A Teoria das Nulidades e o
Sobredireito Processual. Diponível em <htpp://jus.uol.com.br/revista/texto/783/a-teoria-das-nulidades-e-o-
sobredireito-processual> acesso em 07 de julho de 2011.
103 GONÇALVES, Aroldo Plínio. Nulidades do processo. 1ª ed, 2ª tiragem.Rio de Janeiro, Aide Editora,
2000.
104 GONÇALVES, Aroldo Plínio. Op. cit. pp. 45-6.
O doutrinador105
defende também que a distinção entre as nulidades cominadas,
que são aquelas textualmente previstas na lei processual, e as não-cominadas, que não são
previamente determinadas pelo legislador, mas subordinam-se a condições de
regularidade dos atos realizados no desenvolvimento de cada processo em sua concreta
especificidade, não estaria nos efeitos que sua declaração produz ou no grau de gravidade
do vício, mas apenas na legitimação do sujeito do processo para argüir a nulidade no
momento processual de sua alegação. Descreve que os critérios propostos pela doutrina
Destarte, para o autor, as nulidades cominadas devem ser declaradas de ofício
pelo juiz, a qualquer tempo, desde que não esgotada sua competência in casu, podendo-se
também, a parte que não lhes tiver dado causa, arguí-las no momento oportuno, conforme
previsão do art. 243 do nosso diploma processual. Assim, o autor faz aproximação entre a
chamada nulidade absoluta e a cominada e, por outro lado, entre as relativas e não-
cominadas106
.
Desfere também críticas107
à sistematização de princípios regentes das nulidades
efetuada em clássica obra doutrinária brasileira: causalidade, instrumentalidade das
formas, interesse e economia processual.108
Para o doutrinador, não haveria um princípio
da causalidade no processo, mas apenas condição de regularidade do ato processual que,
na estrutura do procedimento, possuir seus pressupostos que devem se configurar como
atos regulares e, no tocante à instrumentalidade das formas, que é um princípio que rege a
validade dos atos processuais em geral e da economia processual, seriam eles
subordinados aos princípios da finalidade e da ausência de prejuízo. A existência
do vício não seria suficiente para a decretação da nulidade, tanto nos casos de nulidade
105 GONÇALVES, Aroldo Plínio. Op. cit.pp. 51-2.
106 GONÇALVES, Op. cit. p. 99.
107 GONÇALVES, Aroldo Plínio. Op. cit. pp. 56-8.
108 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel e GRINOVER, Ada Pelegrini.
Teoria geral do processo. 24ª Ed. São Paulo, Malheiros Editores, 2008, pp. 368-9.
cominada como não-cominada, sendo necessário também que esteja presente o
prejuízo.109
Observa ainda que a sentença poderá ter sua nulidade alegada não somente em
função de vícios nos atos que a antecederam ou pela inobservância dos requisitos do art.
458 do CPC que descreve os elementos essenciais, mas pelo seu conteúdo, sendo esse o
caso da sentença extra petita, ou ultra petita.110
7.3 ANTONIO JANYR DALL AGNOL JR.
Na obra Invalidades Processuais,111
o autor distingue os três planos jurídicos:
existência, validade e eficácia e enfatiza que ineficácia não se identifica com a invalidade,
havendo diversos atos no processo que, embora imperfeitos, produzem seus efeitos,
falando-se, de meras irregularidades. Outra questão enfaticamente ressaltada pelo
doutrinador é a necessidade de distinção112
entre o vício do ato e a invalidade113
ou entre
viciosidade e irregularidade.114
Tem a nulidade por sanção por entender que a conduta contrária à norma cogente
configura em si ato ilícito e acarreta, por isso, as conseqüências, geralmente punitivas
109
GONÇALVES, Aroldo Plínio. Op. cit. p.64. 110
GONÇALVES, Aroldo Plínio. Op. cit. p. 108.
111 DALL’AGNOL JÚNIOR, Antônio Janyr. Invalidades Processuais. Porto Alegre: Letras Jurídicas
Editora, 1989, pp. 17-24.
112 DALL’AGNOL JÚNIOR, Op. cit. pp.. 22-3.
113 DALL’AGNOL JÚNIOR, Antônio Janyr. Op. cit. p. 16 em que o doutrinador adota o termo invalidade
primeiro por entendê-lo mais abrangente, numa relação de gênero, tendo por espécies a nulidade em sentido
estrito- absoluta ou relativa- e também a anulabilidade e segundo, por ser essa a expressão antônima de
validade.
114 DALL’AGNOL JÚNIOR, Antônio Janyr. Op. cit. pp. 38-42.
(=sanções), apropriadas para cada situação.115
Observa Dall Agnol116
que as nulidades
absolutas são insanáveis e não se submetem à preclusão, podendo ser pronunciadas de
oficio pelo juiz, ao passo que as relativas e as anulabilidades seriam sanáveis, pela
preclusão ou pela ausência de prejuízo em decorrência do vício, sendo que as
anulabilidades, por serem oriundas de regras protetivas de interesse predominantemente
privado, impediriam sua decretação de ofício pelo juiz.
O autor repele aproximação entre nulidades cominadas e absolutas e entre não-
cominadas e relativas e afirma que a confusão não resiste ao mais simples exame das
hipóteses legais, e cita a hipótese do art. 113, §2º do CPC no qual haveria concorrência de
conceitos, para usar a expressão do autor; ao passo que a ocorrência de processo
fraudulento descrita no art. 129 do CPC seria hipótese de nulidade absoluta, mas que não
vem cominada no texto legal.117
Ademais, distingue o autor prejuízo, que somente seria passível de apreciação no
caso concreto, sendo, portanto, destinado ao juiz em função da impossibilidade da
ocorrência de prejuízo a priori; ao passo que a finalidade poderá ser pensada com
antecipação e, assim, faz a lei quanto aos atos de forma vinculada118
e o não atendimento
ao modelo legal presume que o fim não foi alcançado e por entender que as nulidades
cominadas estão relacionadas a essa presunção relativa, sobre elas incidiriam as
disposições do art. 249 do CPC.119
115 Cf. DALL’AGNOL JÚNIOR, Antônio Janyr. Op. cit. p. 46.
116 Ver DALL’AGNOL JÚNIOR, Antônio Janyr. Op. cit. pp. 50-5.
117 DALL’AGNOL JÚNIOR, Antônio Janyr. Op. cit. pp. 62-66.
118
O termo foi utilizado pelo expressamente pelo doutrinador. De nossa parte, entendemos não haver forma
vinculada no processo, mas tão somente ato de forma livre ou sugerida pela lei.Consultar tratamento dado
ao tema no cap, 08 da presente obra.
119 DALL’AGNOL JÚNIOR, Antônio Janyr. Op. cit. pp. 70-2.
7.4 TERESA ARRUDA ALVIM WAMBIER
A doutrinadora120
adota, além das categorias da inexistência e da irregularidade,
também a classificação das nulidades absolutas e relativas (anulabilidades) e divide a
sistemática do tema em nulidades de forma e de fundo, afirmando que as nulidades de
forma são, em regra, relativas, somente sendo absolutas quando cominadas no texto legal.
121
A seu turno, as nulidades de fundo compõem alguns dos vícios relacionados aos
chamados pressupostos de admissibilidade de julgamento de mérito, sendo relacionados
às condições da Ação e aos pressupostos processuais, sendo que em alguns casos o vício
poderá configurar inexistência, como no caso de vício ou ausência de citação122
, que para
a autora implica a inexistência do processo e também de eventual sentença nele proferida
e, por fim, equipara sob o ponto de vista do processo as nulidades absolutas aos casos de
inexistência, porque seriam circunstâncias submetidas ao mesmo tratamento jurídico.123
Destaca que no tocante às nulidades absolutas tanto as partes têm legitimidade
para argui-las, como o juiz poderá declará-las124
de oficio, inexistindo também o
fenômeno da preclusão tanto para as partes como para o juiz, além de serem vícios
insanáveis porque maculam irremediavelmente o processo. Demais disso, as nulidades
relativas não poderão ser decretadas de ofício, mas somente levantadas pelas partes, cuja
argüição deverá ser efetuada tempestivamente, ou dar-se-á a preclusão com a
120 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do processo e da sentença. 6ªed. rev, atual. e ampliada,
São Paulo, RT, 2007.
121 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Op. cit. p. 185.
122 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Op. cit. p. 199.
123 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Op. cit. p. 188. Situação reafirmada pela autora à p. 223 da mesma
obra. 124
Utilizamos aqui a própria expressão da doutrinadora e ressaltamos que ela adota um conceito intrínseco
de nulidade, sem atentar-se para o fato de que no âmbito processual somente passa a existir a nulidade com
o pronunciamento judicial, entendimento com o qual não concordamos por entendermos tratar-se visão
privatista do processo próprio de fases já superadas na história desse ramo do Direito.
conseqüente sanação do vício125
Outrossim, afirma haver presunção absoluta de prejuízo
nos casos de nulidades formais cominadas no texto legal porque, segundo seu
entendimento, seria perigoso deixar, em parte, na dependência da iniciativa das partes
privá-las de efeito ( o que ocorreria se de anulabilidade de tratasse). 126
7.5 JOSE JOAQUIM CALMON DE PASSOS
O doutrinador baiano Jose Joaquim Calmon de Passos127
ao tratar do tema das nulidades
processuais inicialmente centra esforços nos aspectos teóricos do direito, caracterizando-
o como pertinente ao mundo da cultura do homem e da importância que nele desempenha
a vontade na qualificação dos fatos pelas normas que os tornam jurídicos com sua
incidência. Conclui essa etapa inicial de seu trabalho afirmando que no direito público,
bem como no âmbito das normas cogentes, a invalidade é correlacionada à conseqüência
antes que ao suposto normativo, falando-se na espécie, em fungibilidade das formas, ou
dos tipos. A ordem jurídica valida o comportamento atípico, tendo em vista sua adequada
instrumentalidade prática para lograr o fim perseguido.128
Ao tratar da estrutura do ato, descreve que são elementos do ato: a) pressupostos; b)
requisitos; e c) condições. Explicita que o ato, como fragmento da continuidade que é da
atividade do homem, reclama que seja considerado o que antes dele ocorreu e é
significativo para sua compreensão, e o que a ele se segue, sendo distintas essas duas
situações do que é ele mesmo especificamente. Denomina de pressupostos ao que
precede, sendo-lhe relevante juridicamente; qualifica de condição tudo quanto a ele se
segue e é exigido para a produção dos efeitos específicos que ao ato ou tipo se associam e
chama de requisitos tudo quanto integra a estrutura executiva do ato. Postas essas
125
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Op. cit. p. 218. 126
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Op. cit. p. 187.
127 PASSOS, J. J. Calmon de. Esboço de uma teoria das nulidades aplicada às nulidades processuais. 1ª
ed. 4ª tiragem. Rio de Janeiro, Forense, 2009.
128 PASSOS, J. J. Calmon de. Op. cit. pp. 07-33.
premissas, o autor descreve os planos da existência, validade e eficácia do ato, tendo-se a
existência dos atos quando atendidos seus pressupostos subjetivos, objetivos e formais,
que somada à adequação prática ao modelo legalmente previsto, ou seja, seus requisitos,
chega-se a sua validade e, normalmente, com a validade, tem-se a eficácia.
Define ato processual como aquele que é praticado no processo, pelos sujeitos da
relação processual ou do processo, com eficácia no processo e que somente no processo
pode ser praticado129
e o insere na categoria dos atos jurídicos em sentido estrito. Aqui,
vem o grande mérito do referido doutrinador na sistematização das nulidades porque em
vez de procurar a determinação apriorística dos critério intrínsecos do ato que
conduziriam a sua nulidade, ou de amparar no critério objetivo, diga-se, legal, para essa
determinação, Calmon buscou defender a análise finalística do ato, ou seja, deslocou os
parâmetros de análise para decretação da invalidade do ato para o ângulo de seus
conseqüências, por maior que seja sua desconformidade com seu modelo legal, não
havendo, assim, relação necessária entre atipicidade e invalidade.130
Em função da grande importância de seu pensamento para as idéias defendidas neste
trabalho, pedimos mais uma vez licença para transcrevê-lo: Há uma esfera do jurídico em
que as imputações autorizados pelo direito objetivo atendem ao que poderemos chamar,
para dar-lhes uma denominação, de interesse social, interesse público, interesse geral,
interesse indisponível etc. Nessa situação, o indivíduo é colocado numa posição de
subordinação no que diz respeito a sua vontade e seus interesses. Nesse campo, o
resultado previsto pelo direito objetivo é que deve predominar e ser relevante. Por isso
mesmo, o resultado logrado com a atipicidade do agente prevalece sobre a adequação
ou inadequação do comportamento concreto com determinado comportamento prescrito,
e ainda se prescinde da correspondência entre o objetivo por ele conscientemente
perseguido e o que resultou de sua atividade. Assim, a atipicidade (inadequação) não
basta para a desqualificação. Ela é apenas relevante em segundo grau. Primordialmente,
atende-se ao resultado alcançado na prática. E ainda quando o ato se tenha consumado
129 PASSOS, J. J. Calmon de. Op. cit. p. 43.
130 PASSOS, J. J. Calmon de. Op. cit. pp. 29-33.
por forma atípica, a invalidade inexiste, não é decretável nem reconhecível, em virtude
da prevalência que a ordem jurídica empresta ao resultado (conseqüência) por ela
previsto. Se foi alcançado, não pode ser descartado sob o fundamento da atipicidade do
suposto, colocado, aqui, num segundo plano.131
Calmon nomeia de eqüipolência das forma132
s àquilo a que comumente chamamos de
instrumentalidade das formas e ressalta que o legislador fê-lo valioso ao descrevê-lo no
art. 244 do CPC, tendo como perfeito, para fins de sua eficácia, o ato cumprido por forma
diversa daquela prevista em lei, destacando que a consecução do fim, apesar da
imperfeição do ato, constitui um equivalente dos requisitos que faltaram ou foram
defeituosos e ressalta que essa análise deverá ser pautada nos próprios fins que a lei
delegou à forma do ato a resguardar e proteger, devendo-se, sempre, analisá-la em cada
ato particular e concreto.
O doutrinador defende, acertadamente, a análise do alcance da finalidade ou da ausência
de prejuízo133
a qualquer espécie de vício que atinja o ato, mesmo nas ditas nulidades
absolutas ou cominadas, não admitindo em nosso sistema o princípio da preclusão para a
alegação da nulidade, em função do caráter publicístico do processo e da inexistência de
formas estabelecidas no interesse exclusivo da parte.134
131 PASSOS, J. J. Calmon de. Op. cit. pp..31-2.
132 PASSOS, J. J. Calmon de. Op. cit. pp. 129-131.
133 Consultar PASSOS, J. J. Calmon de. Op. cit. p. 132-3 em que o eminente doutrinador afirma
expressamente a perfeita identidade entre fim do ato e prejuízo.
134 PASSOS, J. J. Calmon de. Op. cit. pp. 131-136.
8. IMPORTÂNCIA DA DELIMITAÇÃO DAS FORMAS NO
PROCEDIMENTO.
8.1 OS SISTEMAS DE DISCIPLINA DAS FORMAS E DE EXTERIORIZAÇÃO
DO PROCEDIMENTO.
O método de solução de controvérsias disponibilizado pelo Estado a seus
jurisdicionados é dotado de algumas peculiaridades e garantias para que melhor possa
cumprir a função para o qual é chamado na sociedade e, dentro de parâmetros de natureza
política, o ente soberano seleciona a maneira de consubstanciação desse método e
também as garantias que lhe serão inerentes. Essa opção reflete o próprio modelo de
Estado, de sua estrutura e organização e essa relação simbiótica confere ao processo o
epíteto de Direito Constitucional Aplicado.135
Clássica obra doutrinária nacional136
afirma a existência teórica de três sistemas
de disciplina das formas do procedimento: a) sistema da liberdade das formas; b) sistema
da soberania do juiz (ou sistema de equidade); c) sistema da legalidade das formas (que
comporta variações quanto ao rigor) e afirmam seus autores que a ausência absoluta de
exigências legais quanto às formas procedimentais levaria a desordem, confusão e
incerteza.
Importante distinção que estabelecem os autores da referida obra137
pertine ao
esquema formal de exteriorização do procedimento, podendo caracterizar um sistema
rígido ou um sistema flexível. No primeiro caso, haveria o desenvolvimento do processo
135 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel e GRINOVER, Ada Pelegrini.
Teoria Geral do Processo. 24ª Ed. São Paulo, Malheiros Editores, 2008, pp. 84-6.
136 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel e GRINOVER, Ada Pelegrini.
Teoria Geral do Processo. 24ª Ed. São Paulo, Malheiros Editores, 2008, pp. 345-356.
137
CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel e GRINOVER, Ada Pelegrini
Op. cit. pag. 346.
pautado por fases e marcado pela preclusão da possibilidade de se retornar àquelas já
ultrapassadas no iter processual; ao passo que o segundo teria suas formas
procedimentais mais livres e fases mais fluidas e salientam que o tipo rígido do
ordenamento brasileiro e que o CPC dá a impressão de adotar o princípio da liberdade das
formas em seu art. 154, mas que na disciplina específica dos atos, impõe-lhes exigências
formais que melhor o vincula ao sistema da legalidade das formas.
Dissertando sobre a questão, Antônio do Passo Cabral138
também adere a tal
entendimento afirmando a multiplicidade de razões para justificar a forma rígida, própria
de um modelo de reserva legal e informa valores como igualdade, liberdade, ordenação,
segurança, previsibilidade, eficiência, ao passo que Juliana Demarchi139
assevera que a
disciplina na forma dos atos processuais justifica-se politica e juridicamente.
Politicamente porque, uma vez concentrada no Estado a exclusividade do exercício da
Jurisdição, competia-lhe estabelecer de forma pública e isonômica, o instrumento por
meio do qual se exercita esse poder jurisdicional, regulamentando-o; e juridicamente
porque é necessário que o jurisdicionado saiba quais são as formas estabelecidas para que
possa valer-se do Poder Judiciário, além do que a prévia determinação das formas atribui
maior segurança jurídica por atuar no controle de exercício do poder, como já se disse,
como também porque o procedimento previamente definido evita surpresas no curso do
feito e permite à parte melhor defesa de seus interesses.
138 CABRAL, Antonio do Passo. Nulidades no Processo Moderno: Contraditório,Proteção da Confiança e
Validade Prima Facie dos Atos Processuais. 2ª ed. Rio de Janeiro. Editora Forense, 2010, p. 13.
139 DEMARCHI, Juliana. Ato Processual Juridicamente Inexistente- Mecanismos Predispostos pelo
Sistema para a Declaração da Inexistência Jurídica. Revista Dialética de Direito Processual 13. São Paulo:
Oliveira Rocha, abril/2004, p. 44.
8.2 A FORMA DOS ATOS PROCESSUAIS E SUA RELAÇÃO COM A TÉCNICA
PROCESSUAL.
O conjunto de atos do processo, analisados pelo aspecto de sua interligação e
combinação e também de sua unidade teleológica determina o que chamamos de
procedimento. Para a realização desses atos, cujas características seriam a de não
apresentarem-se isoladamente porque integrados no procedimento, além de serem
interdependentes e ligados pela unidade de escopo, que seria a viabilização da tutela
jurisdicional e a pacificação social140
requer-se a atenção de seu agente para fenômenos
de três ordens: o tempo, o lugar e o modo.
Objeto de intensas discussões doutrinárias é a pertinência das circunstâncias de
tempo e lugar à famigerada forma dos atos processuais. Isso porque elas, por não
integrarem a estrutura íntima do ato, daí serem chamadas de circunstâncias, não poderiam
ser englobada na forma do ato, mas tão somente nas suas formalidades.141
Os adeptos da
inclusão dos aspectos tempo e lugar no conceito de forma do ato, fazem distinção entre
forma em sentido amplo, quando nela estão incluídas essas circunstâncias e forma em
sentido estrito, quando referem-se apenas ao modo de se praticar o ato.
Não obstante a ausência de consenso no tema, a maioria da doutrina adere à
inclusão das circunstâncias de tempo e lugar na forma dos atos processuais.142
140 Cf. CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel e GRINOVER, Ada
Pelegrini. Teoria geral do processo. 24ª Ed. São Paulo, Malheiros Editores, 2008, p. 345.
141 Cf. MITIDIERO, Daniel Francisco. O Problema das Invalidades dos Atos Processuais no Direito
Processual Civil Brasileiro Contemporâneo . Diponível em <htpp://abdpc.org.br>, acesso em 07 de julho
de 2011; ver também ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. Do Formalismo no Processo Civil, São
Paulo: Saraiva, 1997, p. 5 que também não vê o tempo e o lugar como pertencentes à forma do ato, mas,
antes os insere na categoria das formalidades.
142 Ver DALL’AGNOL JÚNIOR, Antônio Janyr. Invalidades Processuais. Porto Alegre: Letras Jurídicas
Editora, 1989, p. 69; BAPTISTA DA SILVA, Ovídio Araújo. Curso de Processo Civil, 4ª ed. rev. e atual.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, vol. I, p. 212; CINTRA, Antonio Carlos de Araújo;
No que toca ao lugar dos atos processuais, deverão ser praticados ordinariamente
na sede do juízo, excetuando-se os casos em que sua própria natureza ou por disposição
legal, devam ser praticados em local distinto, como ocorre nos casos da citação,
notificação, penhora ou seqüestro.
A circunstância do tempo sobressai-se no processo por dois aspectos: a época em
que devem-se exercer os atos do processo e o prazo, considerando esse como a distância
temporal entre a prática de um ato e outro. À circunstância do prazo está amplamente
correlacionada ao fenômeno da preclusão.
O modo do ato processual poderá ser analisado quanto à linguagem, à atividade e
também quanto ao rito.143
No tocante à linguagem, os atos são representados pela palavra,
sendo que a Constituição Federal144
impõe o uso do vernáculo, que poderá, ainda, ser
falada ou escrita.
A atividade refere-se à incumbência de dar impulso no procedimento, podendo ser
atribuída às partes, configurando o princípio do impulso das partes, ou ao juiz, na
manifestação do princípio do impulso oficial. No tocante ao rito, salientamos que é um
juízo de conveniência do legislador que o determina, levando-se em consideração
diversas circunstâncias para a viabilização da tutela jurisdicional.145
Quando falamos em forma, é quase intuitiva a noção que nos sobrevém à mente
como a maneira em que certo conteúdo se nos apresenta. Em obra clássica de nossas
letras jurídicas, o professor Alvaro de Oliveira esclarece que forma do ato processual não
DINAMARCO, Cândido Rangel e GRINOVER, Ada Pelegrini. Teoria geral do processo. 24ª Ed. São
Paulo, Malheiros Editores, 2008, p.346.
143
Cf. CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel e GRINOVER, Ada
Pelegrini. Teoria geral do processo. 24ª Ed. São Paulo, Malheiros Editores, 2008, pp.347-356.
144Consultar o art. 13 da CF: BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil:Promulgada em 05
de Outubro de 1988.
145
Utilizamo-nos quase que integralmente dos escritos da obra CINTRA, Antonio Carlos de Araújo;
DINAMARCO, Cândido Rangel e GRINOVER, Ada Pelegrini. Teoria geral do processo. 24ª Ed. São
Paulo, Malheiros Editores, 2008, pp.345-356.
é o mesmo que o processo como forma146
esclarecendo que a forma pode ser entendida
como a entidade que preside a totalidade do processo e também como modo como
consubstancia o ato processual, fazendo, portanto, uma separação entre aquilo que ele
denomina de forma lato sensu e forma em sentido estrito, definindo essa última como o
invólucro do ato processual, a maneira como deve este se exteriorizar. Cuida-se,
portanto, do conjunto de signos pelos quais a vontade se manifesta e dos requisitos a
serem observados na sua celebração.
Em outra sede, Alvaro de Oliveira147
torna a reiterar que o formalismo, ou a forma
em sentido amplo, não se confunde com a forma do ato processual individualmente
considerado e traça panorama que traduz com clareza hialina a importância que as formas
apresentam no processo, mas que não obstante serem essencial à estruturação do método
estatal de solução de controvérsias não deverão se apresentar degeneradas. Aduz ainda
que o formalismo processual148
diz respeito à totalidade formal do processo,
compreendendo não só a forma, ou as formalidades, mas especialmente a delimitação dos
poderes, faculdades e deveres dos sujeitos processuais, coordenação de sua atividade,
ordenação do procedimento e a organização do processo com vistas a que sejam atingidas
suas finalidades primordiais, investindo-se, assim da tarefa de indicar as fronteiras para o
começo e o fim do processo, circunscrever o material a ser formado, e estabelecer dentro
de quais linhas devem cooperar e agir as pessoas atuantes no processo para o seu
desenvolvimento.
146 ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. Do Formalismo no Processo Civil, São Paulo: Saraiva,
1997, pp. 3-9.
147 ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. O Formalismo Valorativo no Confronto com o Formalismo-
Excessivo in Leituras Complementares de Processo Civil. 8ª ed. rev.e ampl. Salvador, Juspodivm, 2010, p.
149.
148 O autor entende o formalismo, ou forma em sentido amplo, num conceito mais amplo, que abarca a
própria forma dos atos processuais. Poderiamos aqui, para fazer uma aproximação, afirmar que esse
conceito é correlato àquele a que José Roberto Bedaque nomeia de Técnica Processual na obra Efetividade
do processo e técnica processual. 3ª Ed. São Paulo, Malheiros, 2010, pp.31-4.
Para a efetivação desses múltiplos aspectos a que o formalismo ou técnica
processual visa a assegurar, vale-se, não raro, da imposição da forma na prática dos atos
que compõem o procedimento.
Há ampla vinculação entre a estatuição de formas para a prática de atos como
meio de garantir a liberdade das partes, a contenção do arbítrio e parcialidade do julgador
e até como meio de garantir a própria igualdade entre as partes. Destaca Alvaro de
Oliveira149
que Ihering, após exaustivo estudo histórico que empreendeu sobre o
formalismo concluiu suas considerações com a célebre frase: A forma é a inimiga jurada
do arbítrio e irmã gêmea da liberdade. Já o doutrinador Antonio do Passo Cabral150
,
para acentuar a importância dessa vinculação, retoma pensamento de Montesquieu, ao
afirmar que a forma é o preço que cada um paga pela sua liberdade.
Não se vinculou o modelo jurídico processual brasileiro ao sistema da legalidade
estrita no tocante à forma da prática dos atos processuais. Esse modelo originário do
direito francês151
impõe ao juiz que se limite à decretação de nulidade dos casos
expressamente cominados pela lei. O modelo apresenta inconvenientes, tanto que o
doutrinador152
recomenda: Não se deve nutrir bastantes ilusões sobre o mérito de um tal
sistema, que supõe uma lei de processo muito bem feita, que minuciosamente estude a
importância das formalidades prescritas e que, em conseqüência, preveja
judiciosamente a sanção, em virtude de sua inobservância. Ora, tal não é o caso do
Código de Processo, que, no assunto, comporta lacunas notórias. De toda evidência, a
omissão de certas formalidades deve acarretar a nulidade, quando ainda esta sanção
não está editada pela lei.
Vê-se, assim, o duplo inconveniente de um sistema vinculado à tipicidade estrita
das nulidades. Por um lado transparece ser dotado o julgador de onisciência capaz de
149
ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. Op. cit. p. 150 e n. 4.
150CABRAL, Antonio do Passo. Nulidades no Processo Moderno: Contraditório,Proteção da Confiança e
Validade Prima Facie dos Atos Processuais. 2ª ed. Rio de Janeiro. Editora Forense, 2010, p. 06
151 Ver KOMATSU, Roque. Da invalidade no processo civil. São Paulo, RT, 1991, p. 83.
152 KOMATSU, Roque. Op. cit. p. 84.
prever e impor a forma única do ato para que se tenha preservada a garantia que a enseja
e, por outro, retira do julgador a possibilidade de análise das circunstâncias concretas do
caso em que independentemente de cominação legal, tenha havido prejuízo à parte em
decorrência de inadequações formais na prática dos atos do processo.
Nem o legislador é dotado de onisciência, e muitas vezes, a forma que seu juízo
entendeu ser a melhor para a incolumidade de certas garantias, muitas vezes, não é
comprovada na prática, levando doutrina e Jurisprudência a defender a flexibilização153
também das formas determinadas pelo legislador sob pena de nulidade quando
descumpridas.
Ademais, a necessidade de decisão judicial para a constituição das nulidades
processuais valoriza o juízo de equidade efetuado pelo julgador em cada caso concreto154
na verificação da necessidade de seu pronunciamento, porque dotado o sistema jurídico
de espécies normativas que admitem a permanência da validade e eficácia do ato em
função do alcance de seus efeitos, que somente poderá ser efetuado a posteriori.
Roque Komatsu155
afirma que no tocante à forma dos atos processuais, poderá
haver atos de forma livre, autorizada ou vinculada. De nossa parte, entendemos não haver
atos de forma vinculada no direito processual civil, sendo sempre autorizada a forma
descrita pelo legislador, mas que não afasta a realização do ato concretamente de maneira
distinta do seu modelo abstratamente previsto, cujos parâmetros oferecidos pelo
legislador ao juízo para a decretação da nulidade desse ato será a análise do alcance ou
não de sua finalidade, que, em essência, constitui a razão de ser da predeterminação legal
das formas pelo legislador, advindo daí o caráter instrumental dos próprios atos
processuais, como tantas vezes já ressaltado neste trabalho.
153 CABRAL, Antonio do Passo. Nulidades no Processo Moderno: Contraditório,Proteção da Confiança e
Validade Prima Facie dos Atos Processuais. 2ª ed. Rio de Janeiro. Editora Forense, 2010, p. 69 na qual o
autor explana que a previsão exaustiva no processo dos casos de nulidade petrifica o sistema e além de não
exaurir o tema, ainda permite que atos inidôneos tenham eficácia quando não vêm cominadas sua nulidade.
155 KOMATSU, Roque. Op. cit. p.214.
Essas vicissitudes tornam prescindível, no sistema jurídico processual brasileiro, a
existência das chamadas nulidades cominadas pela lei156
porque o nulo somente existirá
após pronunciamento judicial, não havendo quaisquer óbices à incidência das espécies
normativas regentes do sistema das nulidades quando houver cominação legal.157
A adesão ao sistema da legalidade, mas temperada pela instrumentalidade das
formas e pautada num juízo finalístico, concreto e posterior à prática do ato apresenta
várias vantagens quando comparados com os demais sistemas disponíveis: permite o
aproveitamento da experiência da sociedade no âmbito do direito processual,
institucionalizando-se formas, que ao menos em tese, são suficientes para a proteção do
valor a que visa proteger o sistema jurídico, viabilizando aquilo que Alvaro de Oliveira158
chamou de utilização do tesouro da experiência colhida da história do direito processual
e também confere previsibilidade no andamento do processo, já que previamente as
partes têm consciência dos atos e também da maneira e do momento de praticá-los;
Outra característica essencial decorrente da vinculação de nosso ordenamento
jurídico ao sistema da legalidade das formas consiste no fato de que, uma vez obedecidas,
ou seja, havendo exata conformidade na prática do ato com o seu modelo previamente
estabelecido pelo sistema, o problema da invalidade não se coloca.159
Ora, é
extremamente contraproducente a constante abertura a discussões no tocante à validade
dos atos praticados no processo, perdendo-se, assim, grande quantidade de tempo,
atravancando o andamento do processo e protelando-se a prestação da tutela jurisdicional.
156 Em clássica obra de nossa literatura jurídica GOUVÊA, José Roberto F. e NEGRÃO, Theotônio.
Código de Processo Civil e Legislação Processual em Vigor. 40ª ed., São Paulo, Saraiva, 2008, p. 364
elenca que há nulidade cominada no texto legal do CPC nos seguintes artigos: 11, p.u; 13,I; 84; 113, §2º;
214; 236, §1º, 246; 618 e 1105.
157
Essa questão da inexistência de óbice a incidência das espécies normativas regentes das nulidades em
qualquer vício que macule o ato, independentemente de qualquer previsão legal será tratada com mais
especificidade no capítulo 11.
158
ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. O Formalismo Valorativo no Confronto com o Formalismo-
Excessivo in Leituras Complementares de Processo Civil. 8ª ed. rev.e ampl. Salvador, Juspodivm, 2010,
p.150.
159 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. 3ª Ed. São Paulo,
Malheiros, 2010, p. 431.
Sendo essa uma das maiores críticas ao sistema da liberdade formal e também
visando a evitar maior abertura ao arbítrio judicial do sistema da soberania do juiz, optou
nosso sistema pelo modelo da legalidade160
formal na prática dos atos, mas de forma
flexibilizada pela chamada instrumentalidade das formas. Prevendo sua própria
falibilidade e demonstrando ter consciência de que o modelo institucionalizado constitui
um dos modelos possíveis de se proteger os valores inerentes a cada um dos atos a serem
praticados no processo, sendo plenamente possível a existência de outras formas também
o façam, o legislador dotou o sistema de determinadas espécies normativas vocacionadas
a orientar o aplicador da norma no momento em que se deparar com alguma inadequação
na prática dos atos processuais.161
A multiplicidade, a complexidade, além da dinamicidade inerentes às sociedades
hodierna apresentam duplo aspecto nessa discussão: a) dificulta ainda mais a
possibilidade de que o legislador anteveja a massa dos problemas a que o Estado será
chamado a resolver e, assim, melhor possa tratar dos aspectos formais inerentes ao
método de que se valerá para tal desiderato; e b) por outro lado, faz com que o legislador
tenha que valorizar o papel do julgador, institucionalizando normas que lhe permitirão
melhor analisar a violação efetiva dos valores protegidos pelo sistema processual em
decorrência da inadequação da prática dos atos, cuja análise será sempre efetuada em
cada caso concreto, considerando-se todas as filigranas que o caso apresenta.
A instituição das formas na prática dos atos processuais demonstra os valores
assegurados pelo sistema jurídico e é a eles a que se deve voltar o julgador quando
deparar-se com o ato atípico. Embora essa análise não seja tarefa das mais fáceis,162
é
dever do julgador efetuá-la, constituindo-se, portanto, numa das garantias ofertadas às
partes e para bem realizá-la requerem-se como características dos julgadores bom-senso,
equilíbrio e, sobretudo, a consciência do papel que sua ciência desempenha nessa
sociedade.
160 Cf. BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Op. cit. p.509.
161 Essas espécies normativas serão estudadas com maior profundidade no cap. 11 da presente obra.
162BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Op. cit. p431.
Trabalha-se, quando se fala em nulidades no processo, com atos atípicos, mas não há
relação necessária entre atipicidade e invalidade, havendo atos atípicos que são
perfeitamente válidos perante o sistema. Aliás, a própria necessidade de pronunciamento
judicial para a constituição da nulidade já demonstra que o vício é inerente ao ato, mas
que a nulidade somente nasce com a sua decretação pelo juízo.163
É extremamente salutar ao sistema a previsão da forma da prática dos atos
processuais, conforme visto anteriormente, mas também é igualmente necessária a
possibilidade dessa flexibilização a ser efetuada pelo julgador, havendo ampla relação de
complementaridade entre essas atividades. A valoração efetuada pelo legislador é feita a
priori, com caráter geral e abstrato, como sói ser na estatuição das normas em geral, ao
passo que a valoração do julgador quanto à necessidade de invalidação do ato é realizada
em cada caso concreto e após a realização do ato em desconformidade com o modelo
legal.
Quer-se, com isso, demonstrar o propósito do legislador de salvar o processo,
mediante o aproveitamento do ato atípico, permitindo que ele produza todos os efeitos
que o ato típico seria apto a produzir. Quando impossível esse aproveitamento sem a
prática de qualquer ato, considerando-se o vício irrelevante porque alcançada a sua
finalidade, deverá o julgador, até em homenagem a princípios regentes do processo, como
o da economia processual viabilizar a retificação ou regularização do ato atípico,
sanando-se o vício que o inquinava e ensejava discussões quanto a sua validade e,
somente quando impossível estas atividades, é que se pronunciará a nulidade.
163 Cf. GONÇALVES, Aroldo Plínio. Nulidades do processo. 1ª ed, 2ª tiragem.Rio de Janeiro, Aide
Editora, 2000, p. 12 em que o autor ressalta o equívoco de se conceber a nulidade tanto como se fosse o
próprio vício do ato e também como se fosse consequência jurídica inerente ao ato viciado. Outra critica
feita pelo autor é à utilização do conceito nulidade suprível porque, argumenta Aroldo, suprível não é a
nulidade, mas sim a falta do ato, ou o requisito que faltou àquele atos praticado de forma defeituosa,
suprindo-se, portanto, falhas, vazios, faltas ou omissões e não a nulidade. TESHEINER, José Maria Rosa.
Pressupostos Processuais e Nulidades no Processo Civil. São Paulo, Saraiva, 2000, p. 11. Ver também
MALACHINI, Edson Ribas. Das Nulidades no Processo Civil. In: Revista de Processo n.09, jan/mar. 1978,
pp. 57-70 que em vários momentos desse seu escrito parece não atentar para a distinção entre os dois
fenômenos.
Diretamente relacionada a essa questão, está a discussão entre o aumento de
poderes do juiz e a redução da importância do princípio dispositivo e das garantias de que
seriam dotadas as partes no processo.
A doutrinadora Teresa Arruda Alvim Wambier164
afirma ser favorável ao
aumento dos poderes do juiz, já que essa é uma característica do processo civil moderno e
significa um avanço em relação à possibilidade de que se chegue a sua finalidade. Por sua
vez, Antônio do Passo Cabral165
aduz que a ampliação dos poderes do juiz, sem a
correlata ampliação das garantias dos sujeitos parciais do processo, que permanece
constante, provoca desequilíbrio porque permite o avanço judicial sobre a esfera de
liberdade das partes.
Conforme ressaltado anteriormente, a simples inadequação do ato ao seu modelo
formal não é suficiente para a decretação da nulidade, sendo necessário conceber o
problema das nulidades do ato substancialmente. As inadequações formais de sua prática
somente se tornarão relevantes quando inviabilizar o alcance das suas finalidades
especificas ou das próprias finalidades do processo. Destarte, o sistema processual
estabelece um roteiro para que o ato possa ser invalidado, sendo os atos atípicos apenas o
ponto de partida dessa caminhada, que apresenta diversas paragens que poderão obstar
sua continuação, não permitindo que se chegue ao seu ponto final. 166
A postura metodológica dos instrumentalistas do processo visa a reduzir ao
mínimo possível167
as situações determinantes tanto da inexistência, quanto da nulidade,
164 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do processo e da sentença 6ªed. rev, atual. e ampliada,
São Paulo, RT, 2007, p. 163.
165 CABRAL, Antonio do Passo. Nulidades no Processo Moderno: Contraditório,Proteção da Confiança e
Validade Prima Facie dos Atos Processuais. 2ª ed. Rio de Janeiro. Editora Forense, 2010, pp.6-8.
Discordamos, nesse ponto, do autor por entedermos que não há essa contraposição necessária entre o
aumento dos poderes do juiz implicando a redução das faculdades das partes, mas sim com a consecutiva
redução da importância do princípio dispositivo, como corolário da publicização do processo.
166
Serão tratadas minuciosamente dessas espécies normativas a que fizemos referência no cap. 11 167
A palavra possível desempenha papel importante no enunciado. Com ela quer-se transmitir que não se
abre mão do caráter técnico que o processo apresenta, mas que nessa análise também se levará em conta os
aspectos éticos que ele apresenta, sobretudo de sua natureza instrumental em relação à oferta da justiça e
realização do direito.
viabilizando que atos, por mais elevado que seja seu grau de atipicidade, mas que
lograram alcançar sua finalidade, possam ser alvo da incidência saneadora das espécies
normativas regentes do sistema das nulidades,168
e pressupõe, entendemos, não a
concessão de um mero poder ao juiz, mas de um dever-poder de atuação para a prestação
da tutela jurisdicional justa, célere e efetiva, estas, sim, constituindo garantias das partes
que poderão ser lesionadas diante do apego irracional do julgador aos aspectos puramente
formais dos atos e sem atentar-se para a finalidade à que visam assegurar no processo.
Portanto, a possibilidade de conceber o problema das nulidades no âmbito
substancial não constituiria arbítrio do julgador, lesão ou redução às garantias das partes,
pelo contrário, serviria para evitar delongas desnecessárias e o retorno a fases já
superadas do procedimento. Ademais, o as decisões do julgador proferidas que tornam
irrelevantes as atipicidades formais dos atos por inexistência de prejuízo no caso concreto
e evitam a decretação da sua nulidade, se apresentam perfeitamente controláveis pela
partes, que poderão impugná-las quando entender que houve violação de suas garantias
no processo, sobretudo o contraditório, principalmente sob a alegação de cerceamento de
defesa.
9. NATUREZA JURÍDICA DAS NULIDADES.
Amplas e acirradas discussões doutrinárias também são travadas no tocante à natureza
jurídica das nulidades, e a polêmica reside na sua classificação ou não como sanção.
Aroldo Plínio Gonçalves169
assevera que as sanções admitem diversas classificações, por
múltiplos pontos de referência e, sendo adotado o critério da finalidade, há sua separação
em duas grandes classes: a) uma que se destina a provocar o cumprimento da norma,
mediante a imposição de um evento desfavorável ao autor da violação; b) e a classe das
sanções que tendem a reparar ou neutralizar os efeitos de um conduta ou ato contrário ao
168 Sobre a questão, ver BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica
processual. 3ª Ed. São Paulo, Malheiros, 2010, pp. 465-6 e n. 95 afirmando o autor que restringir o âmbito
da inexistência torna possível a preservação do ato pela ausência de prejuízo.
169 GONÇALVES, Aroldo Plínio. Nulidades do processo. 1ª ed.,2ª tiragem.Rio de Janeiro, Aide Editora,
2000, p. 13.
direito ou irregular perante ele, visando restabelecer a situação anterior à violação, sendo
dessa última classe, no entender do autor, a sanção de nulidade.
O eminente doutrinador Humberto Theodoro Jr170
também tem a nulidade como sanção,
mas que somente advirá nos casos de atipicidade relevantes, e embora o autor adote o
critério do grau do vício do ato para a determinação das atipicidades relevantes, ponto
com o qual não concordamos por entendermos ser o alcance ou não da finalidade do ato
que as determine, assevera que embora a nulidade seja sanção, está totalmente afastada a
sua equiparação a uma pena e o que justifica a sanção de nulidade é a garantia de certos
efeitos que a lei deseja alcançar com o ato jurídico.A fileira de doutrinadores que tomam
a nulidade como sanção, além daqueles já citados, apresenta em seus quadros nomes do
tomo de José Maria Tesheiner171
e Calmon de Passos, 172
que também aderem à nulidade
como sanção.
Entretanto, há também grandes personagens do pensamento jurídico nacional que
enfileiram a corrente doutrinária contrária à classificação das nulidades como sanção,
como a professora Teresa Wambier173
que afirma que não cabe chamar de sanção à
nulidade. Para a ilustre autora, nulidade é um estado de irregularidade que leva ou tende a
levar à ineficácia.
À base destas discussões esta a classificação que o agente faz das normas regentes dos
aspectos formais do processo. Valendo-se do pensamento de Hart, o doutrinador Roque
170 THEODORO JÚNIOR, Humberto. As Nulidades no Código de Processo Civil. RePro 30. São Paulo:
RT, abr/jun 1983, pp. 38-43.
171 TESHEINER, José Maria Rosa. Pressupostos Processuais e Nulidades no Processo Civil. São Paulo,
Saraiva, 2000, p. 14. Conferir também a obra BAGGIO, Lucas Pereira e TESHEINER, José Maria Rosa.
Nulidades no Processo Civil Brasileiro. Rio de Janeiro, Editora Forense, 2008, p. 53 em que
paradoxalmente os autores afirmam que nulidade não é sanção, porque esta supõe a ilicitude.
172 Cf. PASSOS, J. J. Calmon de. Esboço de uma teoria das nulidades aplicada às nulidades processuais.
1ª ed. 4ª tiragem. Rio de Janeiro, Forense, 2009, p. 106, na qual ilustre jurista baiano afirma que a nulidade
é uma sanção, pois é a consequência danosa de comportamento que se traduziu em imperfeição de um ato,
imperfeição à qual o legislador reúne a improdutividade dos efeitos jurídicos.
173 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do processo e da sentença 6ªed. rev, atual. e ampliada,
São Paulo, RT, 2007, p. 140.
Komatsu174
explicita que na prática do ato jurídico lícito, estaria seu agente atuando na
satisfação de um ônus imposto por norma potestativa, que seria a atuação de certa forma
para a consecução de determinado fim, cuja reprodução no mundo concreto garantir-lhe-
ia a sua consecução, falando-se, aqui em validade. Já a sanção estaria vinculada ao
descumprimento de normas imperativas, que impõem deveres, cujas violações
legitimariam a imposição de sanções.
Para o doutrinador, a nulidade não se encaixa na categoria das sanções175
e sentencia:
Decisivo parece, a propósito, o relevo que vê na sanção um quid qualificável como
reação a um comportamento proibido pelo ordenamento, e especificamente, o efeito
típico ligado à integração dos esquemas do ilícito: tentar uma aproximação da
inobservância de um dever ou de uma obrigação à insatisfação de um ônus, sob o plano
dos efeitos, reconhecendo na invalidade e em cada uma de suas formas uma sanção,
constitui não apenas o desfiguramento do conceito de sanção, mas sobretudo uma
confusão entre os dois planos em tudo diversos. O ilícito, com efeito, realiza uma
fattispécie, o ato inválido não realiza nenhuma fattispécie, antes inválido justamente por
essa razão.
Também é refratário à classificação das nulidades como sanção o doutrinador Daniel
Francisco Mitidiero176
e toma por invalidade processual a conseqüência à relevante
infração de forma de um ato do processo produzido por um agente que na relação jurídica
processual em contraditório desempenhe função177
estatal, assim decretada pelo órgão
174 KOMATSU, Roque. Da invalidade no processo civil. São Paulo, RT, 1991, pp. 177-189 e
especialmente p. 183 na qual o autor afirma que a teoria de Hart, a respeito da classificação das regras ou
normas, em normas de dever (ou imperativa) e em normas potestativas, é decisiva, para aceitar-se a
afirmação e que a invalidade (e assim a nulidade) não é sanção. Ver também BAGGIO, Lucas Pereira e
TESHEINER, José Maria Rosa. Nulidades no Processo Civil Brasileiro. Rio de Janeiro, Editora Forense,
2008, pp. 51-4.
175 KOMATSU, Roque. Op. cit p.182.
176MITIDIERO, Daniel Francisco. O Problema das Invalidades dos Atos Processuais no Direito
Processual Civil Brasileiro Contemporâneo . Diponível em <htpp://abdpc.org.br>, acesso em 07 de julho
de 2011.
177 Ressaltamos que o autor retomando o pensamento de Cândido Rangel Dinamarco entende que não há
que se falar em nulidade dos atos das partes, sendo diferentes as técnicas do sistema jurídico para a
privação de efeitos dos atos das partes. Parece também adotar esse entendimento SICA, Heitor Vitor
jurisdicional competente, tendo, portanto, que invalidade não é sanção, não é penalidade,
não é pena.
A nosso ver, a discussão sobre a natureza jurídica da nulidade é de natureza pouco
relevante em tema, de per si, já demasiadamente complexo. O importante, parece, é ter a
nulidade como conseqüência decorrente somente de atipicidade relevante dos atos que
não lograram alcançar sua finalidade, que constituem sua razão de ser, devendo ter sua
invalidade decretada, após esse juízo de suficiência do julgador, sendo que a inclusão no
amplo quadro das sanções ou sua limitação a qualificá-los como conseqüência da
atipicidade relevante não transmuda sua natureza.
10. SISTEMÁTICA DAS NULIDADES PROCESSUAIS.
O estudo das nulidades costuma ser apresentado pelos tratadistas do tema como
um dos mais complexos178
no âmbito do direito processual. Isso decorre da diversidade
de entendimentos dos doutrinadores que reina no tema179
porque fundamentam seu
Mendonça. Preclusão Processual Civil- Atualizado de Acordo com a Nova Reforma Processual: Leis n
os
11.187/2005, 11.232/2005, 11.276/2006, 11.277/2006 e 11.280/2006. São Paulo, Editora Atlas, 2006, p.
179.
__________________________
178 Cf. MONIZ DE ARAGÃO, Egas Dirceu. Comentário ao Código de Processo Civil. v.II arts. 154-269,
1ª ed, Rio de Janeiro. Editora Forense, 1974, p. 271.
179 CABRAL, Antonio do Passo. Nulidades no Processo Moderno: Contraditório,Proteção da Confiança e
Validade Prima Facie dos Atos Processuais. 2ª ed. Rio de Janeiro. Editora Forense, 2010, pp. 83-7.
pensamento ou no grau do vício, ou na natureza da norma ou até na existência de
cominação ou não de nulidade.180
Chamando atenção para essa questão, Antonio do Passo Cabral181
explicita que a
confusão não apenas doutrinária, como também jurisprudencial, advém da inadequada
adesão do grau do vício do ato para sua categorização prévia e em caráter geral e abstrato,
com sua natural conseqüência de determinação também apriorística das conseqüências
decorrentes desses vícios, aliada à classificação das nulidades processuais pautada na
natureza da norma supostamente violada, se mormente protetiva do interesse público ou
do interesse particular. Essa seria uma das maiores críticas à teoria concebida por Galeno
Lacerda, seja em razão da dificuldade na determinação exata do conteúdo da expressão
interesse público,182
que dificultaria o seu enquadramento nas diversas situações, seja em
função da determinação de que as assim chamadas nulidades absolutas, por estarem
voltadas à proteção do interesse público, seriam insanáveis.
Os aspectos da insuficiência do grau do vício ou da natureza da norma infringida
para a determinação da categoria da nulidade também não passou despercebido ao
doutrinador José Roberto dos Santos Bedaque183
, para quem é contraproducente a
predeterminação em caráter geral e abstrato da insanabilidade de ato ou procedimento
eivados com as assim chamadas nulidades absolutas. Ademais ressalta que a única
importância da distinção entre nulidades absolutas e nulidades relativas consistiria no
fato do juiz poder conhecer as primeiras de ofício, em nada interferindo na possibilidade
180 Como exemplo, podemos citar GONÇALVES, Aroldo Plínio. Nulidades do processo. 1ª ed, 2ª
tiragem.Rio de Janeiro, Aide Editora, 2000, p. 99 em que o autor tem por nulidade absoluta os casos em
que vêm expressamente cominada a nulidade pela lei.
181 CABRAL, Antonio do Passo. Op. cit. pp. 75-87.
182 Sobre a dificuldade na exata determinação do interesse público, ver BEDAQUE, José Roberto dos
Santos. Efetividade do processo e técnica processual. 3ª Ed. São Paulo, Malheiros, 2010, p. 450 e
especialmente nota 64.
183 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. 3ª Ed. São Paulo,
Malheiros, 2010, p. 458.
de serem sanados esses vícios que maculam o ato ou o procedimento pelos mecanismos
predispostos pelo sistema das nulidades para esse desiderato.184
Nesse estado de coisas, a sistemática das nulidades processuais costuma ser
apresentada em nulidades absolutas, caracterizadas pela infringência de normas cogentes,
protetivas do interesse público, e que apresentariam caráter insanável, daí decorrendo a
possibilidade de o juiz delas conhecer de ofício, não havendo nesses casos preclusão,
dada sua natureza insanável.185
As nulidades relativas seriam pertinentes à violação de normas cogentes, mas
protetivas do interesse das partes, cuja omissão em argüir tais vícios na primeira
oportunidade em que a parte prejudicada se manifestar nos autos acarreta o fenômeno da
preclusão, implicando a convalidação do ato. Já as anulabilidades consistiriam na
violação de normas dispositivas e por este motivo, como o ato permanece na esfera de
disposição da parte, a sua anulação somente poderia ocorrer mediante reação do
interessado, sendo vedada ao juiz qualquer provisão de ofício.186
Essa sistematização das nulidades processuais elaborada por Galeno Lacerda187
foi estruturada seguindo o modelo188
de Carnelutti pautado na caracterização dos
184 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Op. cit. pp. 46-7.
185 Cf .LACERDA, Galeno. Despacho Saneador, 3ª. ed..Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1990,
pp. 72-3; KOMATSU, Roque. Da invalidade no processo civil. São Paulo, RT, 1991, p. 200. De nossa
parte, entendemos que a determinação in abstrato da insanabilidade do vício não se coaduna com a atual
concepção da dogmática processual e pouco contribui para a efetividade do processo, devendo a
insanabilidade ser determinada em cada caso concreto baseada sempre na análise do binômio finalidade-
prejuízo. 186
Cf .LACERDA, Galeno. Despacho Saneador, 3ª. ed..Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris Editor, 1990,
pp. 72-3; 187
Cf .LACERDA, Galeno. Op. cit. pp. 73-122.
188 A esse propósito ver BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Op. cit. p.458 que ressalta acertadamente as
imensas dificuldades no estabelecimento dos elementos necessários e úteis da construção de Carnelutti. Ver
também THEODORO JÚNIOR, Humberto. As Nulidades no Código de Processo Civil. RePro 30. São
Paulo: RT, abr/jun 1983, pp. 38-40.
elementos necessários- que produziriam vícios essenciais, e na caracterização dos
elementos úteis- que produziriam vícios não-essenciais nos atos processuais. 189
Por entendermos que o interesse público é imanente a todos as aspectos do Direito
Processual, possuindo variadas formas com que se apresenta no Procedimento, ora
protegendo mormente o interesse das partes, conferindo legitimidade ao método de
realização do direito, ora protegendo a liberdade das partes, possibilitando-lhes a
determinação da composição dos conflitos, ora afastando essa liberdade e poder de
disposição dos sujeitos processuais para que haja continuidade no iter procedimental e o
avanço pelas diversas fases que compõem o procedimento, o juiz sempre poderá conhecer
de ofício os vícios que maculam os atos, com a conseqüente decretação de nulidade, mas
nem todas as situações em que o juiz poderá conhecer independentemente de provocação
das partes estarão afastadas da incidência da preclusão, instituto também relacionado à
defesa do interesse público e correlato à impossibilidade de retrocesso no caminho já
percorrido. Destarte, o interesse público manifestado na proteção do interesse das partes
permite a incidência das normas instituidoras do fenômeno da preclusão, daí entendermos
que esse instituto não é inerente ao tema das nulidades, mas dotado de completa
autonomia, e cujas normas pertinentes têm o condão até de impedir o pronunciamento de
uma nulidade, não obstante presente as razões que a justificariam190
Desse aspecto é que decorre a chamada sanatória geral do processo191
que a coisa
julgada material apresenta, tendo por sanados os vícios192
que maculam o processo,
impedindo que possam ser reapreciados.
190Sobre os diversos sentidos que o instituto da preclusão tem adotado hodiernamente, consultar SICA,
Heitor Vitor Mendonça. Preclusão Processual Civil- Atualizado de Acordo com a Nova Reforma
Processual: Leis nos
11.187/2005, 11.232/2005, 11.276/2006, 11.277/2006 e 11.280/2006. São Paulo,
Editora Atlas, 2006, pp. 91-97. Consultar também a obra de ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. Do
Formalismo no Processo Civil, São Paulo: Saraiva, 1997, pp. 169-71 na qual o autor afirma que o referido
instituto orienta o processo principalmente para a certeza e coloca em segundo plano as exigências de
justiça.
191 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel e GRINOVER, Ada Pelegrini.
Teoria geral do processo. 24ª Ed. São Paulo, Malheiros Editores, 2008, p. 372. Ver ainda, DINAMARCO,
Conforme já ressaltado, o pronunciamento de nulidade deverá sempre ter caráter
excepcional, de modo que, constatando a ausência de prejuízo, o julgador não a
pronuncie, dada sua irrelevância e em homenagem à instrumentalidade das formas que
norteia a prática dos atos processuais. Caso não seja possível ter o vício como irrelevante
em função da equivalência substancial da situação abstratamente prevista e o caso
concreto, não obstante o vício formal inerente àquele ato ou procedimento deverá o
julgador determinar a repetição, a retificação ou ratificação dos atos, como forma de
convalidar o vício, eliminando-se o prejuízo processual existente no caso concreto.
Ressalva-se, aqui, a importância das normas preclusivas, nos casos em que o interesse
público proteja imediatamente o interesse das partes, que poderá impedir a convalidação
do vício, impondo-lhes a suportabilidade do prejuízo em deferência ao interesse público
maior e subjacente a todo o direito processual, consistente na busca do equilíbrio entre
segurança jurídica e justiça da decisão.
Somente nos casos de impossibilidade da caracterização da irrelevância do vício
ou da convalidação do ato não obstada pela preclusão é que se justificará o
pronunciamento da nulidade do ato, como forma de evitar o prejuízo relevante. É para o
cumprimento desse iter que as normas regentes das nulidades processuais são instituídas,
daí a flexibilização do binômio perfeição-eficácia, aliada à análise do prejuízo para a
decretação das nulidades no âmbito processual.
Outra construção desse tema bastante difundida na doutrina processual consiste na
divisão das nulidades em cominadas e não-cominadas.193
Ao centro dessa divisão, está a
Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil, vol. II. 6ªed. rev. e atual. São Paulo, Malheiros,
2009, pp. 620-1.
192 Excetuando-se aqueles vícios chamados pela doutrina de rescisórios e os transrescisórios. Tratando
especificamente do tema, embora com algumas divergências em relação às idéias apresentadas neste
trabalho, consultar TESHEINER, José Maria Rosa. Pressupostos Processuais e Nulidades no Processo
Civil. São Paulo, Saraiva, 2000, pp. 283-287.
193 Mais importante que o tratamento dispensado pela doutrina sobre a classificação das nulidades em
cominadas e não-cominadas, são as divergências no tocante à aplicação das normas saneadoras das
nulidades nessa categoria. Defendemos a aplicabilidade irrestrita das normas saneadoras das vícios dos
atos, independentemente da classificação de natureza abstrata que ele possua. Entre os doutrinadores que
defendem a inaplicabilidade, consutar MALACHINI, Edson Ribas. Das Nulidades no Processo Civil. In:
Revista de Processo n.09, São Paulo, jan/mar. 1978, p. 60;
previsão ou não no direito positivo da nulidade em decorrência da prática de ato em
desconformidade com seu modelo legal, sendo comum em importantes doutrinadores
nacionais a aproximação entre as nulidades cominadas com as absolutas e entre as
nulidades não-comindas com as relativas.194
De outro lado, tal visão é veementemente
criticada por boa parte da doutrina nacional por entenderem que a essência que está à
base das classificações seriam distintas, não comportando tal aproximação.195
De nossa parte, em razão da necessidade tantas vezes já ressaltada de
manifestação judicial para a constituição das nulidades processuais, a existência de
nulidades cominadas no direito positivo é medida plenamente prescindível no âmbito
processual, aliás como quaisquer adjetivações conferidas ao termo nulidade, constituindo
resquício do direito privado numa esfera do direito que é eminentemente pública.
Ademais, não obstante a divergência doutrinária, entendemos que no plano processual o
interesse público será sempre protegido,196
seja de forma imediata ou de forma mediata,
por meio da proteção imediata do interesse das partes no processo, mas sempre visando à
legitimação do instrumento, dentro da idéia que José Roberto Bedaque197
convencionou
chamar de devido processo constitucional.
.
194 GONÇALVES, Aroldo Plínio. Op. cit. p. 99 que vê como nulidade absoluta as nulidades cominadas,
permitindo ao juiz conhecê-las de ofício, em qualquer fase do processo, e a parte podendo alegá-la no
momento processual oportuno. Nesse ultimo ponto, entendemos haver paradoxo porque se o juiz pode
conhecer desses vícios em qualquer fase do processo, por qual razão a parte somente poderia argui-los no
momento oportuno.Ver também, MARQUES, Frederico. Instituições de Direito Processual.v.II, 1ª Ed.;
Campinas, MIllenium Editora, 1999, p. 371; THEODORO JR, Humberto. Curso de Direito Processual
Civil. 48ª ed.. Rio de Janeiro: Forense, 2008, vol. I, pp. 334-5.
195Dentre os doutrinadores que criticam tal aproximação, ver BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Op. cit.
p. 456; CABRAL, Antonio do Passo. Op. cit. pp. 36-40, inclusive com critica direta a Frederico Marques
por estabelecer essa correlação; DALL’AGNOL JÚNIOR, Antônio Janyr. Invalidades Processuais. Porto
Alegre: Letras Jurídicas Editora, 1989, pp. 31-3.
196 Concordamos no ponto com o ilustre professor baiano Calmon de Passos que defende a prevalência do
interesse público no processo porque trata da função da justiça que intervém soberana através do órgão
jurisdicional, para decidir a respeito dos interesses privados, no direito privado, para atuar a pretensão
punitiva do Estado, no direito penal. Consultar PASSOS, J. J. Calmon de. Esboço de uma teoria das
nulidades aplicada às nulidades processuais. 1ª ed. 4ª tiragem. Rio de Janeiro, Forense, 2009, pp. 134-140.
______________________
197 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Op. cit. 461 e n. 86.
Essa proteção constante do interesse público imperante no processo apresenta
variadas facetas, mas que em absoluto perde a sua essência. Nesse sentido há que se
conciliarem os múltiplos aspectos que ele apresenta: a) primeiro como instrumento, como
método de resolução de conflitos disponibilizado aos jurisdicionados visando à
eliminação das crises de direito material que se legitima não apenas pelo procedimento,
mas também no procedimento, cujo caráter secundário, próprio da função jurisdicional,
permite às partes certa disponibilidade no tocante ao processo, em homenagem à esfera
de liberdade das partes que é preservada no Processo Civil, mas que de forma alguma
significa atribuir- lhes o domínio sobre ele. Nesse sentido, poderão as partes estabelecer
convenção para a suspensão do processo, nos termos do art. 265, I do CPC; poderão
ainda as partes transigirem quanto ao objeto do processo; o autor renunciar ao direito em
que se funda a Ação ou o réu reconhecer o pedido do autor formulado na inicial, havendo
nesses casos resolução do mérito, nos termos do art. 269 do vigente CPC, todos em
homenagem à esfera de liberdade das partes preservada no processo, especialmente em
função do princípio dispositivo que o norteia. Especial aspecto da distinção básica do
sistema das nulidades processuais em relação àquelas previstas no direito material
consiste no estabelecimento de Ação Anulatória, nos termos do art. 486 do CPC, para os
casos em que a sentença tiver apenas caráter homologatório da composição das partes,
em homenagem ao poder dispositivo que são dotadas e à preservação de sua vontade livre
e consciente; b) um outro aspecto imperante no processo que reflete sua natureza pública,
mesmo nos casos em que essa proteção se apresente como garantia do exercício de certa
margem de liberdade no processo e que em muitos aspectos explica sua existência num
ramo do direito vinculado ao tronco do Direito Público, consiste na busca pela justiça das
decisões na eliminação das crises de direito material.
Em nosso entender esse constitui o mais importante interesse público imperante
no processo, exatamente porque explica a própria razão de ser do instrumento estatal de
solução de controvérsias, explicitando que ela reside na finalidade externa desse método,
implicando seu caráter instrumental e sobrelevando a importância do desapego aos
aspectos ontológicos do processo, com a conseqüente valorização de seu aspecto
finalístico, legitimado pela ausência de prejuízo àquele que terá afetada sua esfera
jurídica em função de decisões do Poder Judiciário.
A busca da eliminação das crises de direito material, legitimada no processo pela
ausência de prejuízo processual à parte que terá sua esfera jurídica afetada pela decisão
jurisdicional faz dessumir a pouca importância que a classificação das nulidades em
absolutas, relativas ou anulabilidades apresenta no processo. Independentemente da
categoria do vício, se possível a incidência das normas saneadoras regentes do sistema
das nulidades processuais, sua existência será irrelevante e como sua determinação
deverá ser constatada em cada caso concreto, o estabelecimento de categorias de
nulidades, principalmente na determinação em caráter abstrato da insanabilidade do
vício- nos casos de nulidades absolutas, ou da incidência da preclusão ou do princípio da
causalidade- em que seria defeso à parte que deu causa ao vício alegá-lo não seria
pertinente à temática das nulidades processuais.
A preclusão é instituto autônomo, cuja aplicação não está restrita às nulidades
relativas ou às anulabilidades. Aliás, é estranho compreendermos sua aplicação no âmbito
das nulidades relativas porque em tais casos o juiz poderá determinar de ofício a
retificação do ato, mas à parte que não a alegou na primeira oportunidade ou à parte que
lhe deu causa estarão defesas as possibilidades de alegá-la. Por outro lado, da decisão
quanto a um eventual vício ensejador da nomeada nulidade absoluta que for considerada
sanada pela ausência de prejuízo pelo julgador, poderá a parte descontente com tal
decisão oferecer Agravo, nos termos do art. 522 do CPC, impedindo a incidência da
preclusão da decisão e a impossibilidade de tornar a discutir o vício que macula o ato,
num pleno exercício das garantias que lhe são ofertadas no processo.
Reflete-se, como anteriormente afirmado, a ampla vinculação que a temática das
nulidades processuais apresenta com os diversos institutos processuais que se imbricam
em cada caso concreto. Outro reflexo desse íntimo inter-relacionamento consiste na
chamada eficácia preclusiva da coisa julgada, prevista no artigo 474 do CPC e preconiza
que havendo coisa julgada da decisão de mérito serão reputadas deduzidas e repelidas
todas as alegações e defesas que a parte poderia opor tanto ao acolhimento quanto à
rejeição do pedido, em nítida homenagem ao princípio da segurança jurídica,
convalidando alguns vícios do procedimento em que fora proferida a decisão e torna
defesa a possibilidade de que sejam rediscutidos no processo.
Entretanto, algumas espécies de vícios do procedimento não se submetem à
eficácia preclusiva da coisa julgada, restando possibilidade de que sejam rediscutidos em
sede de Ação Rescisória, nos casos em que vierem descritos no taxativo rol do art. 485 do
CPC. Essa situação faz com que alguns doutrinadores198
pregassem a transformação de
casos de nulidade em rescindibilidade, pensamento com o qual não concordamos, pois
vemos como institutos autônomos, embora possa haver alguns vícios ensejadores da
decretação das nulidades e que concindentemente também vêm descritos no rol do art.
485 do CPC, permitindo sua impugnação mediante rescisória, cuja improcedência poderá
ser fundamentada na ausência de prejuízo à parte, em mais um exemplo da estreita
relação da sistemática das nulidades processuais com as diversas técnicas e institutos
próprios do direito processual.
Outra manifestação dessa íntima relação das normas saneadoras das nulidades
processuais com os diversos institutos do direito processual refere-se à possibilidade de
sua aplicação na temática das Condições da Ação e dos Pressupostos Processuais. De
fato, há parcela significativa da doutrina nacional e alienígena199
defendendo que a
ausência de condições da Ação ou de Pressupostos Processuais não constitui óbice
intransponível ao julgamento de mérito, visão que por muito tempo foi sagrada aos
cultores da Ciência Processual, mas que não tem resistido ao pensamento crítico e
consciente do papel instrumental que o processo apresenta em relação ao direito material.
198 Cf. DIDIER JR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil, v. I. 6ª Ed., amp, rev. e atual.Salvador,
JusPodivm, 2006, p. 246.
199 Consultar sobre esse tema , consultar a obra de BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Op. cit. pp. 456-8;
e tratando de forma mais específica o tema, conferir SOUSA, Miguel Teixeira de. Sobre o Sentido e a
Função dos Pressupostos Processuais (Algumas Reflexões sobre o dogma da apreciação prévia dos
Pressupostos Processuais na Ação Declarativa). In: Revista de Processo n. 63; São Paulo: Ed. RT jul/set
1991, pp. 64-87.
11. ESPÉCIES NORMATIVAS REGENTES DO SISTEMA DAS
NULIDADES PROCESSUAIS.
11.1 NOÇÕES INTRODUTÓRIAS
Preliminarmente à introdução do estudo das diversas espécies normativas que
disciplinam o tema das nulidades no âmbito processual, sobrevém a importância de
destacarmos as noções apresentadas em relevante estudo das letras jurídicas nacional,
cuja compreensão facilitará sobremaneira o tratamento específico do objeto desse estudo.
Trata-se da obra do professor Humberto Bergman Ávila200
Teoria dos princípios- da
definição à aplicação dos princípios jurídicos, que embora possua como objeto mais
específico o Direito Tributário, quase sempre se valendo o autor de exemplos no âmbito
desse ramo específico do Direito, trata-se de obra pertencente à Teoria Geral do Direito e
que muito clarifica o entendimento das idéias defendidas a seguir.
Referido autor divide as espécies normativas 201
em três espécies: princípios,
regras e postulados. Salienta que esse tertium genus consiste nas condições essenciais
para a interpretação de qualquer objeto cultural, sem as quais o objeto não poderá ser
apreendido e afirma que os postulados poderão ser meramente hermenêuticos, destinados
à compreensão em geral do Direito ou postulados aplicativos, cuja função é estruturar a
sua aplicação correta.
Os postulados normativos aplicativos são normas imediatamente metódicas que
instituem os critérios de aplicação de outras normas situadas no plano do objeto de
aplicação e, assim, classificam-se como normas sobre a aplicação de outras normas, isto
200 ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios – Da Definição à Aplicação dos Princípios Jurídicos, 9ª ed.
ampliada e atualizada. São Paulo: Malheiros, 2009.
201 ÁVILA, Humberto. Op. cit. pp. 121-3.
é, como metanormas, advindo daí a nomenclatura de normas de segundo grau. Nesse
sentido, sempre que se está diante de um postulado normativo, há uma diretriz metódica
que se dirige ao intérprete relativamente à interpretação de outras normas, ou seja, têm
por função essencial disciplinar a aplicação de outras normas. Ávila202
destaca que os
postulados não se identificam com outras normas que também influenciam outras, como é
o caso dos sobreprincípios do Estado de Direito ou da segurança jurídica. Os
sobreprincípios situam-se no mesmo nível das normas objeto de aplicação e atuam sobre
outras normas no âmbito semântico e axiológico e não no âmbito metódico, como ocorre
com os postulados. Posteriormente, elenca as distinções entre os postulados em relação
aos princípios e às regras: a) explicita que eles não se situam no mesmo nível, uma vez
que os princípios e as regras são normas objeto de aplicação, ao passo que os postulados
são normas que orientam a aplicação de outras normas; b) essas espécies normativas não
possuem os mesmos destinatários, haja vista os princípios e as regras serem
primariamente dirigidos ao Poder Público e aos contribuintes203
ao passo que os
postulados são frontalmente dirigidos ao intérprete e aplicador do Direito; c)
relacionamento diferenciado dos postulados com as demais normas do ordenamento, ou
seja, os princípios e as regras implicam-se reciprocamente ao passo que os postulados,
justamente porque se situam num metanível, orientam a aplicação dos princípios e das
regras, sem conflituosidade necessária com outras normas.
Essas idéias, notadamente nessa terceira espécie normativa nomeada pelo autor de
postulado, termina por trazer luz aos escritos do próprio Galeno Lacerda204
posteriores à
publicação de sua obra Despacho Saneador, cuja primeira edição foi lançada em 1953 e
que por bastante tempo serviu de guia para a sistematização das nulidades processuais no
Brasil, mas que não resistiu à evolução do pensamento de seu próprio criador. Galeno
após ressaltar que a lógica do direito não se reduz à lógica formal, o que reduziria o papel
202
ÁVILA, Humberto. Op. cit. p. 122. 203
Nesta explanação transcende a influência específica do Direito Tributário nos escritos do autor, que
ressaltamos no início do capítulo. Entretanto, entendemos haver equivalência no entendimento de que os
princípios e as regras sejam dirigidos a todos os jurisdicionados, que permite sua afirmação no tocante a
quaisquer dos diversos ramos do Direito.
204 LACERDA, Galeno. O Código e o Formalismo Processual. In Revista da Faculdade de Direito da
Universidade Federal do Paraná, n. 21, 1984.
do intérprete à simples tarefa de subsunção do fato à lei pautado na interpretação literal
dos textos normativos, mas, ao contrário, passa a defender maior valorização do papel do
intérprete e aplicador do direito, salientando que o mais elevado interesse público que
inspira e justifica um Código de Processo é que sirva ele de meio eficaz para a definição e
realização concreta do direito material.205
Nessa tarefa, desempenha papel fundamental as normas constantes do capítulo das
nulidades do vigente CPC porque elas consubstanciam o interesse público superior
existente no processo e possuem o condão de flexibilizar as normas regentes das
situações em que os atos processuais são praticados com vícios. Essas normas foram
nomeadas de sobredireito processual206
porque se referem à aplicação de outras normas
do ordenamento e possuem a função de tutelar a instrumentalidade do processo.
Destarte, entendemos que as normas referentes à necessidade de análise do
alcance da finalidade do ato e da ausência de prejuízo para a decretação das nulidades no
âmbito processual se constituem como postulados normativos aplicativos, na esteira de
Humberto Ávila207
, também chamadas de normas de sobredireito processual, conforme
205LACERDA, Galeno. Op. cit. pp..15-7.
206 LACERDA, Galeno. Op. cit. p. 17. Ver também COSTALUNGA, Danilo Alejandro Mognoni. A Teoria
das Nulidades e o Sobredireito Processual. Diponível em <htpp://jus.uol.com.br/revista/texto/783/a-teoria-
das-nulidades-e-o-sobredireito-processual> acesso em 07 de julho de 2011.
207 ÁVILA, Humberto. Teoria dos Princípios – Da Definição à Aplicação dos Princípios Jurídicos, 9ª ed.
ampliada e atualizada. São Paulo: Malheiros, 2009. Ver também sobre o tema as esclarecedoras letras de
MITIDIERO, Daniel Francisco. O Problema das Invalidades dos Atos Processuais no Direito Processual
Civil Brasileiro Contemporâneo . Diponível em <htpp://abdpc.org.br>, acesso em 07 de julho de 2011 em
que o autor prega a aplicação dos postulados normativos aplicativos da finalidade e prejuízo para a
identificação das relevantes infrações de forma. Ou seja, toda vez em que as infrações de forma não for pré-
excluída pela aplicação desses princípios, haverá relevante infração de forma, ensejando a decretação da
nulidade do ato. Ressalta-se que essa verificação deverá sempre ser analisada caso a caso, albergada numa
racionalidade prática. Afirma que esse é o sentido da expressão de Sobredireito processual, cunhada por
Galeno Lacerda. Cita que Moniz de Aragão critica veementemente esse pensamento defendido por ele e
Calmon de Passos de que todo o capítulo das nulidades deverá subordinar-se fins da justiça do processo,
tachando- o de excessivamente subjetivo tal entendimento e que não possibilitaria o entendimento a
compreensão do sistema das nulidades no processo e que transparece para ele (Moniz de Aragão) que os
fins da justiça do processo constituem mais um lema a ser observado pelo legislador ao elaborar a lei
relativa às nulidades que um padrão de exegese a ser aplicado pelo juiz em cada caso concreto. Mitidiero
contra-argumenta dizendo que para Moniz a justiça não é um problema do juiz, mas do legislador, bem ao
sabor positivista. Diversamente, pregando as idéias de finalidade e prejuízo como regras, consultar
descrito por Galeno Lacerda e tratado de forma esclarecedora por Danilo Costalunga208
.
Mais importante que a nomenclatura distinta para distintos elementos é a exata
compreensão do fenômeno que subjaz à questão, com a perfeita diferenciação dessas
normas com as demais espécies normativas, em relação aos seus destinatários e ao papel
que desempenham em nosso sistema jurídico, materializando o propósito político do
legislador de salvar os processos que contenham atos viciados, fornecendo ao intérprete e
aplicador do Direito os parâmetros para a análise da necessidade do pronunciamento da
nulidade do ato em si mesmo considerado, dos atos que padeçam de vícios decorrentes do
pronunciamento da nulidade de algum ato da cadeia do procedimento anterior a sua
prática, mas cujo vício também nele apresenta projeções.
11.2 A IMPORTÂNCIA DA ANÁLISE DO ALCANÇE DA FINALIDADE DO
ATO E DA AUSÊNCIA DE PREJUÍZO NO TEMA DAS NULIDADES
PROCESSUAIS.
As normas do sobredireito processual possuem o condão de convalidar os vícios
que maculam o ato porque torna equivalente a situação concreta àquela abstratamente
prevista pelo legislador , quando considerado o aspecto finalístico do ato. Aliás, como
ressaltado alhures209
, é esse o aspecto finalístico do ato que constitui a garantia ofertada
aos sujeitos do processo, constituindo a predeterminação das formas dos atos apenas o
mecanismo mediante o qual o legislador, pautado num juízo político, disponibilizou aos
jurisdicionados para a proteção dos objetivos do instrumento, conferindo-lhe ordem,
previsibilidade e certeza, assegurando a participação das partes e sua conseqüente
BAGGIO, Lucas Pereira e TESHEINER, José Maria Rosa. Nulidades no Processo Civil Brasileiro. Rio de
Janeiro, Editora Forense, 2008, p 78 e especialmente a nota 87 da mesma página.
209
Remetemos o leitor para o capítulo 08 desta obra.
influência no juízo valorativo a ser proferido pelo julgador, sendo exatamente essa a
importância que as formas apresentam no processo.
Em razão da necessidade de análise em concreto do alcance da finalidade do ato,
não obstante o vício que o macula, torna-se plenamente prescindível no sistema
processual a cominação de nulidades nos textos normativos, porque destituídas de
qualquer sentido lógico ou finalístico no processo. A presunção de validade dos atos
processuais permite que atos praticados em desconformidade com seu modelo produzam
todos os efeitos que os atos não inquinados com algum vício também produziriam, e
esses efeitos somente serão afastados com a decretação da nulidade do ato, que afasta a
validade do ato sempre após um juízo de suficiência do juiz, sendo essa uma das notas
diferenciam o sistema das nulidades processuais em relação às do direito material.
É bastante esclarecedora a distinção efetuada por Jose Roberto Bedaque,210
no
estudo do tema das nulidades processuais, ao afirmar que nesse tema predominam duas
visões distintas porque ressalta simultaneamente a importância do papel do legislador na
estatuição de requisitos formais dos atos processuais, cuja estrita observância afasta a
análise da necessidade de sua invalidação, permitindo que o processo avance
normalmente no seu iter e, por outro, lado também destaca a importância da relevante
atuação do juiz ao se deparar com alguma inadequação formal na prática dos atos
processuais: trata-se das visões prospectiva e retrospectiva.
A visão prospectiva é pautada no controle prévio a ser exercido pelo juiz, a quem
compete obstar o prosseguimento de processo que padeçam de vícios que poderão
impossibilitar o futuro julgamento do mérito, visando ao atendimento dos mandamentos
legais dos requisitos disciplinadores das formas procedimentais, numa atividade em plena
consonância com a lógica da economia processual.
210 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. 3ª Ed. São Paulo,
Malheiros, 2010, pp. 508-514, especialmente p. 510 na qual o autor expõe com bastante clareza essas
idéias.
Ocorrendo o desenvolvimento da relação processual, apesar do defeito verificado
em fases anteriores do procedimento, outras serão as premissas por que se deve orientar o
julgador. Trata-se da visão retrospectiva do intérprete e aplicador do Direito, cuja análise
será centrada na utilização dos postulados do alcance da finalidade e da ausência de
prejuízo, não obstante o vício ou até a própria ausência de requisito de natureza
processual.
Assim, os postulados normativos aplicativos do alcance da finalidade e da
ausência de prejuízo permitem a convalidação dos atos viciados, atendendo de forma
eficaz ao postulado da economia processual e celeridade, sem implicar lesões ao princípio
da segurança jurídica, exatamente em função da inexistência de quaisquer prejuízos aos
interesses processuais das partes.
Não constitui uma garantia das partes a observação sacramental dos aspectos
formais do processo, tal qual no direito romano, que elegia as formas como fins de si
mesmas, servindo muitas vezes para a facilitação do trabalho do julgador.211
O caráter
finalístico que elas apresentam impõe a ilação da ausência de formas vinculadas no
âmbito processual e permite sua flexibilização para viabilizar o alcance do escopo maior
e imutável do processo, consistente na solução das crises de direito material do modo
mais eficiente possível, sendo que as formas dos atos processuais apresentam caráter
instrumental para as garantias magnas do processo que consistem na prestação da tutela
jurisdicional de forma célere, segura, adequada e justa.
As idéias descritas anteriormente conduzem-nos à completa negação da
determinção em caráter abstrato da existência de vícios insanáveis212
no processo e
211 ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. Do Formalismo no Processo Civil, São Paulo: Saraiva,
1997, p. 207.
212 São variados os conceitos utilizados pela doutrina para classificar os vícios dos atos processuais e suas
conseqüências. Comumente vemos afirmações de que haverá nulidade absoluta: se o defeito ofender regras
referentes aos pressupostos processuais ou condições da Ação; se violar faculdades processuais das partes;
sua potencial influência na justiça das decisões; sua desconformidade com a verdade dos fatos; se ofender o
interesse público; se ferir a ordem pública. Tratando do tema com maior profundidade e com amplos
exemplos dos diversos doutrinadores que perfilham cada um dos conceitos apresentados, conferir
também da possibilidade do estabelecimento de graus de vícios213
que maculam o ato
para a determinação, também de natureza apriorística e abstrata, de suas consequências.
Não há qualquer razão para a determinação apriorística de vícios que não possam
ser convalidados pelas normas saneadoras do sistema das nulidades processuais,
independentemente do grau do vício que o inquina. O caráter instrumental que os atos
processuais apresentam permite que esses vícios sejam vistos como irrelevantes em
função do alcance de sua finalidade, privilegiando-se valores maiores eleitos no sistema,
e que constituem a razão de ser e finalidade do próprio processo.214
Classificação daquela natureza elege a nulidade como fenômeno ontológico e
inerente ao ato, esquecendo-se do caráter instrumental que as formas215
apresentam no
âmbito processual e também da necessidade de pronunciamento judicial para sua
constituição nesse ramo do direito, empobrecendo o sistema processual e, muitas vezes,
impedindo a própria prestação da tutela jurisdicional.
CABRAL, Antonio do Passo. Nulidades no Processo Moderno: Contraditório,Proteção da Confiança e
Validade Prima Facie dos Atos Processuais. 2ª ed. Rio de Janeiro. Editora Forense, 2010, pp. 81-7.
213 Defendendo a distinção pautada no grau do vício que macula o ato na disciplina das nulidades
processuais, ver CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel e GRINOVER, Ada
Pelegrini. Teoria geral do processo. 24ª Ed. São Paulo, Malheiros Editores, 2008, pp. 365-8. 214
BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. 3ª Ed. São Paulo,
Malheiros, 2010, pp. 454-6
215Concordamos no ponto com os escritos da professora Teresa Wambier na qual a doutrinadora acentua o
caráter instrumental das formas, que não deve ser o objetivo do ato, de maneira que, em lugar de facilitar o
acesso à justiça, dificulte o acesso a ela e que está inserido em sua obra: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim.
Nulidades do processo e da sentença 6ªed. rev, atual. e ampliada, São Paulo, RT, 2007, p. 169.
11.3 OUTRAS ESPÉCIES NORMATIVAS INTEGRANTES DO
SISTEMA DAS NULIDADES PROCESSUAIS.
Além dos postulados do alcance da finalidade e da ausência de prejuízo, que
entendemos constituir o núcleo duro do sistema das nulidades processuais,216
também
outras espécies normativas orbitam nesse sistema, como comumente apontado pelos
diversos doutrinadores que trataram do assunto. Além dos citados postulados,
normalmente referidos na expressão instrumentalidade das formas, não obstante a
ausência de consenso entre os diversos doutrinadores no tocante ao tema, são amiúde
apresentados os princípios da causalidade, interesse, preclusão e economia processual.217
216 Consultar BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. 3ª Ed.
São Paulo, Malheiros, 2010, p. 427 na qual o autor afirma que a instrumentalidade das formas é princípio
fundamental à compreensão do sistema das nulidades, pois impõe seja a forma examinada segundo a
função do ato no procedimento e que analisado o problema por esse ângulo, importante é verificar a
idoneidade da exigência formal- o que se faz mediante a identificação do escopo específico do ato a que ela
se refere. Com tal fundamento chega a que as formas devem ser respeitadas na medida e nos limites em que
sejam necessárias para atingir sua própria finalidade- isto é, conferir segurança e objetividade ao
procedimento. Ausente essa função, podem ser transgredidas. À nota 21 da mesma pagina 427 cita o
exemplo de ausência de cópia de procuração dos advogados quando da interposição de Agravo de
Instrumento, em desconformidade com o artigo 525, I do CPC, mas que se for possível a identificação do
causídico por outro meio, não haveria nulidade porque viável sua regular intimação. Cita também a
inviabilidade da decretação da nulidade por ausência de citação para audiência de justificação, em afronta
ao texto literal da norma insculpida no artigo 928 do CPC, uma vez que nela o réu não poderá produzir
prova para ilidir os argumentos do autor. Ver também THEODORO JÚNIOR, Humberto. As Nulidades no
Código de Processo Civil. RePro 30. São Paulo: RT, abr/jun 1983, p. 44 em que o autor acertadamente
afirma ser a instrumentalidade das formas o mais importante dos fundamentos da atual concepção de
processo, em matéria de nulidades, figurando como critério básico do sistema das nulidades de nosso
Código de Processo Civil.
_______________________
217 Cf. THEODORO JÚNIOR, Humberto. As Nulidades no Código de Processo Civil. RePro 30. São
Paulo: RT, abr/jun 1983, pp. 47-9; BAPTISTA DA SILVA, Ovídio Araújo. Curso de Processo Civil, 4ª ed.
rev. e atual. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1998, vol. I, pp. 212-218; CINTRA, Antonio Carlos de
Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel e GRINOVER, Ada Pelegrini. Teoria geral do processo. 24ª Ed.
São Paulo, Malheiros Editores, 2008, pp. 368-9; BEDAQUE, José Roberto.Nulidade processual e
instrumentalidade do processo, RePro n.60, RT, São Paulo, out-dez.1990, p.32; BAGGIO, Lucas Pereira e
TESHEINER, José Maria Rosa. Nulidades no Processo Civil Brasileiro. Rio de Janeiro, Editora Forense,
2008, pp. 74-89; COSTALUNGA, Danilo Alejandro Mognoni. A Teoria das Nulidades e o Sobredireito
Processual. Diponível em <htpp://jus.uol.com.br/revista/texto/783/a-teoria-das-nulidades-e-o-sobredireito-
processual> acesso em 07 de julho de 2011; ALVARO DE OLIVEIRA, Carlos Alberto. Do Formalismo no
Processo Civil, São Paulo: Saraiva, 1997, p. 206.
O princípio da causalidade consubstancia as noções que o doutrinador Cândido
Rangel Dinamarco218
chama de efeito expansivo e confinamento das nulidades. O efeito
expansivo das nulidades decorre do fato de que a nulidade de um ato processual poderá
também ensejar que outros atos posteriores também devam ter sua nulidade decretada,
embora quando considerados em si mesmos, sejam sadios. Essa seria uma conseqüência
da interligação com que se apresentam os atos no procedimento, com vistas à produção
do resultado final. Já o confinamento refere-se à delimitação dos atos que foram
maculados pela decretação de nulidade de algum ato do procedimento.
Entendemos ser o referido princípio, de aplicação subsidiária em relação ao
postulado da instrumentalidade das formas, cuja verificação de prejuízo serve de
parâmetro para sua aplicação e também à hipótese de decisão favorável à parte
prejudicada. Ainda que não afastada a possibilidade de ser considerado irrelevante o
vício, seja em função da ausência de prejuízo ou pela possibilidade de decisão favorável à
parte processualmente prejudicada, numa aplicação macro do postulado da economia
processual, o princípio da causalidade, na faceta do confinamento reflete também idéia
inerente àquele postulado, embora em âmbito mais restrito que nos casos apresentados
anteriormente, dotando o sistema de racionalidade prática, impondo que apenas devam
ser refeitos os atos praticados com vícios ou que estejam maculados com vícios
decorrentes da decretação de nulidade de algum outro ato subsequente219
do
procedimento, nos exatos limites para a eliminação desse prejuízo.
No tocante ao chamado princípio do interesse, temo-lo como irrelevante no tema
das nulidades processuais, haja vista que os elementos ensejadores de sua aplicação
estariam compreendidos na aplicação do postulado do alcance da finalidade ou ausência
218 Cf. DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de direito processual civil, vol. II. 6ªed. rev. e atual.
São Paulo, Malheiros, 2009, pp. 617-8.
219 CINTRA, Antonio Carlos de Araújo; DINAMARCO, Cândido Rangel e GRINOVER, Ada Pelegrini.
Teoria geral do processo. 24ª Ed. São Paulo, Malheiros Editores, 2008, p. 368; DINAMARCO, Cândido
Rangel. Instituições de direito processual civil, vol. II. 6ªed. rev. e atual. São Paulo, Malheiros, 2009, p.
619;
de prejuízo220
ou nos casos em que a preclusão impede o pronunciamento da nulidade e
legitima a sustentação do prejuízo por algum dos sujeitos parciais, em homenagem ao
interesse público subjacente a todo o processo da segurança jurídica e da busca pela
justiça da decisão.
Por último, temos que as idéias até o momento defendidas coadunam-se
perfeitamente com o conceito de economia processual, que também apresenta caráter
autônomo em relação ao tema das nulidades processuais e conforma toda a Ciência
Processual, servindo de parâmetro para o julgador na aplicação de outras normas
processuais, dentro das noções apresentadas anteriormente de postulados normativos
aplicativos ou normas de sobredireito processual.
220 Consultar PASSOS, J. J. Calmon de. Esboço de uma teoria das nulidades aplicada às nulidades
processuais. 1ª ed. 4ª tiragem. Rio de Janeiro, Forense, 2009, p. 132-3 em que o autor prega que não
haverá situações em que o ato tenha alcançado seu fim e tenha causado prejuízo; e ao mesmo também não
visualiza situações em que não tenha alçançado seu fim e também não tenha causado prejuízo. Tem,
portanto, como equivalentes os termos, no sentido de que quando um estiver presente, o outro
necessariamente também estará e vice-versa; KOMATSU, Roque. Da invalidade no processo civil. São
Paulo, RT, 1991, pp. 253-4 também prega identidade entre alcance da finalidade e ausência de prejuízo.
DALL AGNOL JR, Antonio Janyr. Invalidades Processuais- Algumas Questões. In: Revista de Processo n.
67. São Paulo, Ed. RT, jul/set 1992, p. 160 estabelece distinção entre prejuízo e instrumentalidade das
formas argumentando que o primeiro é dirigido ao juiz, ao passo que o segundo é também dirigido ao
legislador. O mesmo autor, no livro Invalidades Processuais. Porto Alegre: Letras Jurídicas Editora, 1989,
pp. 71-2estabelece que não há prejuízo a priori, somente podendo ser verificado em concreto; ao passo que
o alcance do fim poderá ser previsto, ou seja, ser pensado com antecipação, tendo ampla vinculação com as
nulidades cominadas nas quais o legislador impõe a forma na prática do ato, sob pena de não ter aptidão
para a produção de efeito jurídico, entretanto, o próprio autor reconhece a relatividade de tal presunção,
prescindo-se o sistema da categoria das nulidades cominadas; BAGGIO, Lucas Pereira e TESHEINER,
José Maria Rosa. Nulidades no Processo Civil Brasileiro. Rio de Janeiro, Editora Forense, 2008, pp. 78-81
consta afirmação de que a idéia de prejuízo está diretamente relacionada com a de finalidade do ato, mas
sem explicitar a diferença que entende haver entre as duas.
12. NULIDADES PROCESSUAIS NO VIGENTE CPC, NO
ANTEPROJETO E NO PROJETO DO NOVO CÓDIGO DE
PROCESSO CIVIL. ANÁLISE CRÍTICA.
Centraremos esforços neste momento na análise específica do tratamento das nulidades
processuais dado pelo vigente CPC, em comparação com aquele dispensado no
Anteprojeto e no Projeto do Senado do novo Código de Processo Civil no mesmo tema,
sempre ressaltando nosso entendimento de que o tema das nulidades, por ser categoria
pertencente à Teoria Geral do Direito, 221
deverá sempre ser tratado no âmbito lógico-
jurídico, não se limitando ao texto da lei como ponto de partida ou chegada para sua
sistematização.222
O vigente CPC trata das nulidades processuais no Livro I, Título V e Capítulo V
destacando-se as normas insculpidas nos artigos 244, 249, §1 e 250 parágrafo único que
221 DALL’AGNOL JÚNIOR, Antônio Janyr. Invalidades Processuais. Porto Alegre: Letras Jurídicas
Editora, 1989, p. 44; THEODORO JR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. vol. I, 48ª ed.. Rio de
Janeiro: Forense, 2008, p. 330; DIDIER JR, Fredie. Curso de Direito Processual Civil, v. I. 6ª Ed., amp,
rev. e atual.Salvador, JusPodivm, 2006, p. 238 defende a aplicação de toda as noções da teoria geral do
direito sobre o plano da validade dos atos jurídicos ao sistema das invalidades processuais, mas adverte
que essa tarefa deve ser efetuada com cautela em função das especifidades existentes nesse ramo do direito
e que a diferenciam dos demais..
222 Defendendo a lei como ponto de partida para a sistematização das nulidades, consultar: MALACHINI,
Edson Ribas. Das Nulidades no Processo Civil. In: Revista de Processo n.09, São Paulo, jan/mar. 1978,
pp. 57-70; THEODORO JÚNIOR, Humberto. As Nulidades no Código de Processo Civil. RePro 30. São
Paulo: RT, abr/jun 1983, p. 44; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do processo e da sentença
6ªed. rev, atual. e ampliada, São Paulo, RT, 2007, p. 162; DALL’AGNOL JÚNIOR, Antônio Janyr.
Invalidades Processuais. Porto Alegre: Letras Jurídicas Editora, 1989, p. 15-6. Em sentido contrário,
MITIDIERO, Daniel Francisco. Comentários ao Código de Processo Civil. São Paulo, Memória Jurídica
Editora, São Paulo, 2005, tomo II (Artigos 154 a 269), p. 408; DIDIER JR, Fredie. Curso de Direito
Processual Civil, v. I. 6ª Ed., amp, rev. e atual.Salvador, JusPodivm, 2006, p. 239. PASSOS, J. J. Calmon
de. Esboço de uma teoria das nulidades aplicada às nulidades processuais. 1ª ed. 4ª tiragem. Rio de
Janeiro, Forense, 2009, p. 128-9; BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica
processual. 3ª Ed. São Paulo, Malheiros, 2010, p. 472 defende que mais importante que o seu texto, é o
espírito da lei, que no âmbito processual se identifica com o fim colimado.
________________________
positivam os postulados constantes da instrumentalidade das formas. O art. 244 teve
tratamento no art. 240 do Anteprojeto e 252 do Projeto de Lei do Senado 166/10223
e
acertadamente não incluíram em seu texto a referência trazida pelo art. 244 do vigente
CPC de que a análise do alcance da finalidade não seria aplicável às nulidades cominadas
no texto legal.224
Já o art. 249,§1º do atual CPC tem equivalente nos arts. 245, §1º e 250, §1º
respectivamente do Anteprojeto e do PLS 166/10, mantendo ausência de prejuízo ou a
possibilidade de decisão favorável ao prejudicado processualmente como fatos que
tornam despicienda a decretação da nulidade do processo ou a necessidade de
saneamento do vício do ato. Essa idéia de julgamento favorável também é retomada nos
artigos 470 do Anteprojeto e 475 do PLS 166/10 que determina que o juiz proferirá
sentença de mérito sempre que puder julgá-lo em favor da parte a quem aproveitaria o
acolhimento da preliminar, que no caso ora tratado poderia ter sido alegada em preliminar
de Contestação a inexistência ou nulidade da citação, conforme arts. 338,I e 327,I do
Anteprojeto e do PLS 166/10, respectivamente.
Isento de falha também foi a manutenção tanto no Anteprojeto como no PLS
166/10 da redação do art. 250 di vigente CPC, respectivamente nos artigos 246 e 258,
cujo parágrafo único desses artigos estabelecem que dar-se-á o aproveitamento dos atos
praticados desde que não resulte prejuízo à defesa.
Embora, a cabeça do art. 254 do PLS 166/10 tenha mantido a expressão é nulo o
processo em função da ausência de intimação do Ministério Publico que parece remeter à
possibilidade de existirem nulidades de pleno direito no âmbito processual,225
foi incluído
nesse artigo o §2º que aduz ser necessária a oitiva do MP sobre a existência ou
223
A referência a tal projeto será feita deste momento em diante como PLS 166/10.
224
Sobre o acerto do legislador em excluir a expressão sem cominação de nulidade do texto legal e, assim,
afastando quaisquer dúvidas quanto à possibilidade de aplicação do postulado do alcance da finalidade
também aos casos de nulidade cominada, ver MARINONI, Luiz Guilherme e MITIDIERO, Daniel. O
Projeto do CPC- crítica e propostas. São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 96. 225
Previsão com a qual não podemos concordar, conforme a já tantas vezes citadas prescindência da
classificação das nulidades em categorias, inclusive da famigerada classificação em nulidades cominadas e
não-cominadas. Tal critica também pode ser feita no tocante à manutenção da vigente redação do art. 247
do CPC, tanto no Anteprojeto, em seu art. 243, quanto no PLS 166/10 em seu art. 255.
inexistência de prejuízo em função da ausência de intimação para a decretação de
nulidade do processo,226
em redação mais apropriada que aquela trazida pelo art. 242 do
Anteprojeto do Código de Processo Civil que, além de determinar a nulidade por
ausência de intervenção do parquet dos casos que elenca, também traz a inconveniente
afirmação de que o processo não seria nulo se o MP entendesse que não houve prejuízo
decorrente da ausência de sua intervenção, sob auspiciosas críticas da doutrina de que tal
previsão elegeria o promotor ou procurador de justiça como o efetivo julgador da
questão.227
Demais disso, mantiveram-se tanto no Anteprojeto como no PLS 166/10 os
princípios da causalidade (art. 244 do Anteprojeto e art. 255 do PLS 166/10) e preclusão
(art. 241 do Anteprojeto e art.253 do PLS 166/10), embora tenhamo-las como previsões
desnecessárias ou equivocadas na sistematização da questão das nulidades processuais.228
Outra inovação importante trazida pelo Anteprojeto, em seu art. 727 e mantida no
PLS 166/10 no art. 760, em comparação com o art. 618 do vigente CPC foi a inclusão do
parágrafo único naqueles artigos estabelecendo a possibilidade do juiz pronunciar de
ofício a nulidade da execução, independentemente da propositura de embargos à
execução, refletindo, assim, a natureza pública do processo como instrumento estatal de
distribuição de justiça e pacificação social.
O PLS 166/10 excluiu a inoportuna alusão à decretação de nulidade pelo juiz em
razão da incapacidade do autor ou irregularidade de sua representação, quando não
sanado o defeito no prazo de suspensão do processo determinado pelo juízo para que
fosse extirpado o vício. A hipótese é de extinção do processo, sem resolução de mérito,
nos termos do art. 267 do CPC em vigor e não caso de pronunciamento de nulidade,
226 Consultar BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. 3ª Ed.
São Paulo, Malheiros, 2010, p. 427; o mesmo pensamento é defendido pelo autor em Nulidade processual e
instrumentalidade do processo, RePro n.60, RT, São Paulo, out-dez.1990, p.37. 227
Sobre a questão, consultar MARINONI, Luiz Guilherme e MITIDIERO, Daniel. O Projeto do CPC-
crítica e propostas. São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 97. 228
Sobre a equivocidade ou desnecessidade de tais previsões, consultar o cap. 11 que trata das espécies
normativas regentes das nulidades processuais.
como dá a entender a leitura dos artigos 13,I do Código atual ou seu equivalente no
Anteprojeto que teve tratamento no art. 61, parágrafo único e inciso I.229
Adotando o critério da instrumentalidade das formas como elemento nuclear no
tema das nulidades processuais, foi mantida a previsão legal da citação como requisito de
validade do processo, não como caso de sua inexistência como defendido por prestigiosa
doutrina.230
Destarte, havendo vício nesse ato processual ou até sua inexistência somados
à ocorrência de prejuízo à parte, deverá o juiz pronunciar a nulidade do processo, fazendo
com que se retorne à fase procedimental em que o ato deveria ter sido praticado de forma
regular. Caso o vício ou a ausência desse ato, que visa a garantir a possibilidade de reação
do interessado, garantindo-se o contraditório no processo, não tenha impedido tal
exercício, não há razão para o pronunciamento da nulidade, até por razões de economia
processual, e principalmente porque há identidade substancial entre aquela situação
abstrata prevista no ordenamento e a situação ocorrente. Essa foi a razão para a correta
manutenção da norma descrita no art. 214 do vigente CPC, em seus equivalentes 196 do
Anteprojeto e 208 do PLS 166/10, embora façamos a ressalva na redação desses últimos
que parece assumir a posição de que haveria nulidade inerente ao ato.
229 BAGGIO, Lucas Pereira e TESHEINER, José Maria Rosa. Nulidades no Processo Civil Brasileiro. Rio
de Janeiro, Editora Forense, 2008, p194.
230
Sobre a citação como requisito de existência, ver o cap. 05 e especialmente os escritos da doutrinadora
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Nulidades do processo e da sentença 6ªed. rev, atual. e ampliada, São
Paulo, RT, 2007, p 202.
13. CONCLUSÃO
O objetivo maior buscado nesta obra consiste na busca de conscientização da premente
necessidade de menor apego às questões meramente formais do processo como
mecanismo para a ampliação do acesso à justiça.
Embora não ignoremos que a questão do acesso à justiça apresenta limites que em muito
extravasam o tema ora tratado, a mudança de mentalidade aqui preconizada pode
constituir importante passo nesse sentido.
Procurou-se demonstrar que as formas têm seu papel e razão de ser no processo,
constituindo importante mecanismo para a proteção de valores no sistema processual,
notadamente a de conferir segurança, ordenação e previsibilidade ao processo,
delimitando os poderes, faculdades e deveres das partes, coordenando sua atividade-
conferido-lhes idêntico tratamento no sentido de que ser-lhes-ão ofertadas oportunidades
para a participação e influência no resultado da decisão judicial, ordenando o
procedimento, no sentido de preestabelecer cada um dos atos passíveis de serem
praticados no íter procedimental.
Entretanto, não deverá a forma ser adotada como aspecto sacramental, efetuando-se
interpretação meramente literal231
das normas que as instituem e elegendo-as como fins
de si mesmas, esquecendo-se de que mais importante que o texto da lei, é o espírito que a
informa, e que no âmbito processual se identifica sempre com a idéia de fim colimado.
As formas devem consubstanciar um valor a ser protegido no sistema e disso decorre
dupla conclusão: a primeira seria a de que se o valor, inobstante a inadequação formal na
prática do ato ainda assim foi preservado, não haveria razões suficientes para a
decretação da nulidade pelo juízo; a segunda consistiria numa constante análise crítica
que deverá ser constantemente efetuada pelo julgador no tocante às próprias formas
231Ver BEDAQUE, José Roberto dos Santos. Efetividade do processo e técnica processual. 3ª Ed. São
Paulo, Malheiros, 2010, p. 472
instituídas pelo legislador, de modo que se não preservarem um valor interno ao sistema,
são destituídas de sentido no sistema processual, podendo ser transgredidas.
Buscou-se ainda, ao tratar dos planos da existência, da validade e da eficácia demonstrar
suas especificidades no âmbito processual, notadamente na busca da redução na
determinação da inexistência dos atos, ou melhor, intentou-se a maximização da
caracterização da existência dos atos, permitindo-se, assim, a incidência das normas
saneadoras do sistema das nulidades processuais, viabilizando que procedimentos que
não apresentam perfeita adequação ao seu modelo legal fossem aptos a produzirem
efeitos no mundo concreto.
Para tanto, buscou-se dentro do ordenamento jurídico, as variadas normas que servem de
parâmetro ao julgador no cumprimento desse desiderato, e exatamente pelo fato de ser
voltada ao julgador como elemento norteador da aplicação de outras normas, chamamo-
las, para diferenciá-las de outras espécies normativas integrantes de nosso sistema, de
postulados ou normas de sobredireito processual.
Destacamos que no sistema das nulidades processuais desempenha papel fulcral o
postulado da instrumentalidade das formas, consubstanciado nos conceitos de alcance da
finalidade e da ausência de prejuízo, aliados, ainda, ao postulado da economia
processual, que norteia todo o sistema. Juntos esses postulados possuem o mister de dotar
o sistema jurídico de racionalidade prática, essencial em qualquer ordenamento da
massificação das relações intersubjetivas e da maior complexidade da sociedade
moderna.
Intentou-se também demonstrar que o sistema das nulidades processuais diverge do
modelo adotado no âmbito do direito material, notadamente em função da exigência de
pronunciamento da nulidade pelo julgador para que ela passe a existir, sendo estranha a
esse ramo do direito a idéia de nulidade de pleno direito. É nesse momento que incidem
as normas de natureza pública do direito processual, flexibilizando o binômio perfeição-
eficácia e elegendo como critério para tal função o binômio finalidade-prejuízo.
Decorre dessa premissa nosso entendimento da desnecessidade de qualificação da
nulidade e também da irrelevância de nomenclatura entre nulidade ou invalidade. O
enquadramento das nulidades em categorias apresenta inconvenientes no sistema
processual, primeiro porque dá azo à idéia de que a nulidade processual é inerente ao ato,
levando notabilíssimos doutrinadores a confundirem o vício que macula o ato com a sua
nulidade e a esquecerem da natureza constitutiva do pronunciamento judicial para a
caracterização da invalidade, ressaltando que também rechaçamos a natureza de
declaração judicial porque igualmente conduz à idéia de nulidade inerente ao ato
praticado de forma divergente com seu modelo legal.
Ademais, ressaltamos a ampla vinculação das normas regentes do sistema das nulidades
processuais com diversos outros aspectos do processo, que possibilita a aplicação dessas
normas aos chamados requisitos de admissibilidade e julgamento de mérito, inclusive
como forma de superação do dogma de que a ausência de pressuposto processual
constituiria óbice intransponível ao julgamento do mérito.
Por fim, procuramos fazer uma análise crítica do tratamento das nulidades no Anteprojeto
e no PLS 166/10 referentes à implementação de um novo código de processo civil no
Brasil.
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