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SobreaEvoluo
do
Problema
do
Direito
Natural*.
Nelson Nogueira Saldanha
(Docente-livre de Direito Constitucional na
Pac. de Direito da Univ. Federal de
Pernambuco).
SUMRIO: Liberdade e direito natural nos tempos mo
dernos:ligao entre suas trajetrias. Peripcias
do
jus-
naturalismo contemporneo: seus desdobramentos
e
suas
dificuldades. Direito natural
e
teoria
do
direito
na
tural:anotao
margem dos livros sobre direito natural.
Reflexes pouco conclusivas.
Qual o interesse, para povos na situao do brasileiro,
de questes co mo a de direito natural? primeira vista,
poderia parecer que semelhante classe de temas, cujo con
torno se acha marcado com as caractersticas de u m a origem
estranha nossa experincia
cultural,
no interessa ordem
de premncias que hoje esto necessitadas de discusso
ntr
ns;
poderia parecer que os problemas que conduziram
o desenvolvimento da teoria do direito natural, sendopro
blemas situados na histria dos povos
europeus,
no encon
tram correspondncia concreta no caso da dos povos ditos
perifricos. E m realidade, preciso convir que todopro
blema doutrinrio tem u m condicionamento histrico, e os
conjuntos de conceitos e de categorias, que formam u m
tema como o do direito natural, surgiram e cresceram sob
aquele condicionamento. Mas n e m isso impede, antes cer
tamentepermite,que a questo das metamorfoses do direito
*
Conferncia pronunciada
e m 17 de
setembro
de
1955
na
Facul
dade
de
Direito
de
Caruaru, Pernambuco.
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natural seja revista dentro dos nveis intelectuais da vida
brasileira, tal como nos propomos aqui sugerir ou tentar:
no s porque os pases como o nosso precisam sempre das
lies da histria dos
outros,
desde que lcidamente enten
didas,
como porque, onde quer que se estude o Direito, se
melhante questo se reveste de vibrante importncia.
Liberdade e Direito natural nos tempos modernos.
De certo modo, as experincias passadas da humani
dade v m tendo o seu perfil traado, ou retraado, e m
funo de experincias novas. Assim, o que se chamou de
liberdade antiga foi algo cuja descrio serviu no s
culo XIX para contraste perante a idia liberal de liberdade;
e outros elementos da vida de outras
pocas,
como o direito
ou a pedagogia, tm seus caracteres reconstrudos toda vez
que u m a gerao quer, servindo-se da histria, dar fundo
propcio ao que faz ou quer fazer.
N o caso da idia de
liberdade
que e m si m e s m a cor
responde a u m a vivncia intransfervel, a sua conceituao
durante o liberalismo utilizou, como tela ou marco arqueo
lgico,
o quadro da
polis
e m que o indivduo dizia-se
era absorvido, m e s m o na medida e m que fosse
livre,
pela
comunidade poltica e cultural. Note-se que a cincia
his
trica, que trabalhava sobre os temasclssicos,se abeberava
dos princpios daquele mes mo liberalismo moderno, a que
alimentava.
Olhando-se, agora, os componentes da gnese e da
evo
luo dessa teoria moderna da liberdade, encontramos, ao
lado do condicionante social, ou seja do predomniocres
cente da classe burguesa e de seus padres econmicos, u m a
srie de ingredientes culturais: a secularizao da menta
lidade,o
individualismo,
o
racionalismo.
Assim, a teoria da
liberdade, desenvolvida nos marcos burgueses, vinha sin
cronizada com u m racionalismo que tudo queria pr e m
princpioscorretos,e m evidncias geomtricas, e m frmulas
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universais; entretanto ela, aquela teoria, tomou gosto e m
montar comparaes histricas, e e m distinguir-se por elas
de tudo o que era antigo: democracia antiga, direitoanti
go.
Por u m lado suas matrizes clssicas a ligavam ao di
reito natural, a u m direito imutvel, desdobrvel e m di
reitos inerentes a cada
qual,
atomizados e pr-positivos; por
outro,
sua conscincia de modernidade, que descrevia seu
regime social co mo coisa nova, moldava-lhe u m a vocao
histrica.
Esse tema de suma importncia. A teoria moderna
da liberdade nasceu e m paralelo com a da democracia bur
guesa,
e ambas cresceram como oposio a regimes sociais
e
polticos,
cuja queda fz que tais teorias se generalizassem.
Mas nesse processo elas vinham levantando complicadas
problemticas, de sorte que desde o advento da democracia
liberal os movimentos polticos so ocasio, sempre, dedis
cusso,e nenhum regime pde mais dispensar a autojusti-
ficao. A teoria liberal tinha de se justificar e m cada
passo,
pondo alis com isso questes permanentes. Suce
deu ento que, de dentro me s m o dos temas que surgiram,
cresceu a oposio entre a matriz clssica universalizante e
intemporalizante da teoria liberal e sua tendncia a fazer
histria e a justificar mutaes. A matriz clssica era o
cartesianismo trazido para a poltica, a tendncia a tirar da
razo,
e s dela (ou do b o m senso c omo s vezes se dizia)
as bases das instituies; tendncia frutifiada inclusive e m
R O U S S E A U ,
na medida e m que seu ideal poltico supunha
u m a especfica razo poltica de base individual e apesar
da derrapagem comunitarista que sua vontade geral
envolvia. Era universalizante e intemporalizante, e nesse
sentido, b e m do sculo xvm, odireito naturalera u m per
feito complemento, seno u m fundamento, da idia de li
berdade. Chegou-se ao ponto e m que, n u m a certa fase,
falar de direito natural e de filosofia do direito era a m e s m a
coisa. J a necessidade de aluses histricas, que havia na
temtica das discusses como que se auto justificava o ideal
demoliberal, trazia consigo a idia de que certas mudanas
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histricas so necessrias, seno m e s m o a idia da histria
como ordem de mu dan as necessrias. Por u m tempo, fa
lou-se apenas de
PRICLES,
da democracia grega e de coisas
assim, que os ingleses do tempo deG R O T Emuito aprecia
v am; depois, porm, a filosofia assumiu o tema, e viu-se
H E G E L ,entusiasta da revoluo francesa, estabelecer a idia
da racionalidade essencial de toda transformao
real.
E
os juristas da Escola Histrica apesar da pouca simpatia
deSAVTGNYporH E G E L deram noo de direito u m tra
tamento, em que o jusnaturalismo clssico ficava mal co
locado:agora o fundamental era o conjunto orgnico da
vida do povo, como bero do direito, u m conjunto tomado
e m concreto, co mo u m a coisa
real.
Para o problema da situao histrica do conceito de
liberdade moderna, v. m e u
Liberdade moderna
e
histria da
liberdade em Anais do IV Congresso rasileiro deFilosofia
S. Paulo Fortaleza, 1962. O problema, no caso da
liberdade, ser o de situar as circunstncias institucionais,
necessrias para fazer histria, sem desligar do senti
mento
de liberdade, sinal de sua efetiva existncia. Sobre
o desencadeamento de teorizaes justificadoras de regimes
e de contra-regimes desde as revolues liberais, m eu
Notas
para unatipologia
de las
mentalidades polticas
e mEstdios
de Sociologia
n. 2, Buenos Aires, 1962. N o artigo Li
berty , na Encyclopaedia of Social Sciences(ed. de 1935,
vol. IX ), H.LASKI encontra dois grandes perodos na evolu
o da liberdade desde a Reforma: primeiro, o da luta pela
libertao do indivduo perante travas religiosas, econmicas,
polticas,com sentido negativo, por ser mais u m a luta pela
liberdade contra algo; segundo, o das lutas sociais, pe-
dindo-se u m a liberdade para todos, com sentido positivo por
ser j u m a luta por u m a liberdade para algo. O mesmo
esquema adotado por
F R O M M
em seu Medo da Liberdade
mas, apesar de sugestivo, muito simplificador e discutvel:
porque na fase do individualismo a pugna contra presses de
origem medieval era tambm impulso a favor de certos
fins,
valores ou concesses, e na fase social a referncia a
positividades visadas no dispensa o complemento, que a
necessidade de livrar-se de situaes que obstem as pre
tenses.
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Peripcias do jusnaturalismo contemporneo
A posio da Escola Histrica, porm, no foi a palavra
definitiva sobre o Direito Natural, e h hoje u m a srie de
revises dotema,a
t r
e mconta.Felizmente, alis.
H que considerar, na trajetria do direito natural du
rante o largo processo que os historiadores c h a m a m de
advento dos tempos modernos , a sua diviso e m u m a
corrente teolgica e outra secularizada. O u
antes:
o direito
natural de linha teolgica, que vinha dos claustros da Idade
Mdia,
continua a atuar literriamente depois da Reforma
luterana (e continua sobretudo entre os jesutas
espanhis),
mas agora coexistindo com u m a nova e poderosa verso do
direito natural, conduzida e m sentido secular e raciona-
lista,vinculada cultura dos pases protestantes.
0 que sucedia era algo paralelo ao caso da teoria do
contrato social; esta teoria, cultivada durante a Idade
Mdia e bastante conhecida pelos escritores dos sculos
xin a
xvi,
assume depois, com
H O B B E S , L O C K E
e
R O U S S E A U ,
u m a importncia to realada, que c omo se se tratasse
de u m a formao doutrinria inteiramente nova. Cada
u m a das grandes teorias contratualistas carregou, por
sinal,
u m a determinada concepo do direito natural e dos
direitosnaturais:u m a e m
H O B B E S ,
outra e m
L O C K E
etc.
Voltando, porm, ao ramo secularizado-racionalista do
jusnaturalismo, le informou u m a ba parte do pensamento
social nos sculos xvn e xvin, servindo orientaes dife
rentes,mas sempre marcando a temtica jurdico-poltica
por u m padro expositivo tipicamente apriorista e deduti-
vista. O jusnaturalismo moderno se generalizou, assim,
como u m momento do prprio esprito europeu e m seu
desenvolvimento, como u m elemento dentro do grande fe
nmeno da secularizao da mentalidade ocidental.
Havia,
entretanto, problemas e
percalos,
no tocante
relao entre o jusnaturalismo e a teoria da liberdade, que
viria a ser alcanada por u m a srie de reivindicaes
sociais.
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U m detalhe a que pouca gente prestou a
ateno,
foi o
fato de
que,
segundo o jusnaturalismo
clssico,
a concepo
ideal da sociedade se plasmava como u m todo unitrio e
u m tanto leibnizeanamente harmonioso. A ordem po
ltica deveria assentar-se sobre a substncia de u m grupo
social perfeitamente coeso. Isso conduzia, por conseqn
cia,
a u m a resistncia idia de partidos: e por isso eles
foram chamados, por muito tempo, de faces e seitas .
E ocorreuque,inclusive pelas necessidades e convenincias
do parlamentarismo ingls, tornado modelo, a democracia
liberal consagrou os partidos e chegou a dar-lhes o carter
de essenciais liberdade poltica: havia nisso u m a implcita
concesso parte de movimento que devia haver na vida
poltica, por cima do ideal u m tanto esttico que aquela
harmonia representava.
D e qualquersorte,o direito natural se integrou na expe
rincia democrtica. O sculo xvm, cuja ideologia segundo
C A R L B E C K E R
era u m a espcie de terrestrizao da cidade
de
Deus
agostiniana, construiu as suas reclamaes sobre
a idia de u m a ordem naturalmente desejvel, na qual a
vontade individual livre (na verdade a vontade burguesa)
era o organon e o metron para todas as dimenses. A
liberdade era u m dos direitos, ditos inatos e inalienveis,
mas
era,
antes disso e mais do que
isso,
a condio de toda
ordem. Assim as definies de direito modelo, a de
K A N T tomaram a liberdade comomarco,e a pluralizao
dela como sistema.
Talvez as conscincias daquele tempo no tenham visto
tudo assim; m a s a histria u m rever, e m que os prota
gonistas no sabem de seus espectadores futuros.
O certo que,para a compreenso que hoje se projeta
sobre tudo aquilo, a Revoluo Francesa foi u m episdio
jusnaturalista: quer dizer, u m movimento e m cujo arsenal
de idias os princpios do Direito Natural ocupavam parte
eminente, e esse arsenal de idias era, ocioso dizer, o de
todo o sculo xvm. H, porm, mais ainda: dada a exem-
paridade histrica que aquela revoluo assumiu, chegou
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a formar-se a opinio de que e m toda revoluo atua
u m a idia jusnaturalista, pois que todo embate consciente
contra u m a ordem dada implica a f e m valores superiores,
implica a opinio de
que,
acima da positividade da ordem
a derrubar, vigoram preceitos cujo valor independe da vi
gncia concreta m as que legtimo fazer vigorar por meio
daluta.J existe sobre
isso,
por
sinal,
u m vasto rosrio de
referncias, mais explcitasumas,outras menos. O que su
cede que este paralelo, entre revoluo e m geral e jusna
turalismo e m
geral,
reduz ambas as coisas e representaes
u m tanto esquemticas e bastante amplas, ficando por isso
ao alcance da crtica histrica, sempre faminta de peculia
ridades e de diferenas especficas
Retomemos,porm, a situao da teoria social da de
mocracia. Ela, tendo nascido e m bero geomtrico, insta
lada nos claros meridianos individualizantes e universali-
zantes do classicismo, adotou e m tempo as inovaes tra
zidas pelas escolas de cincia
social,
e eram as contribuies
da filologia, da etnografia, da sociologia, de permeio com as
escolas histricas de poltica, de direito e de economia.
Essas inovaes e m termos de cincia social puxavam o
iderio democrtico para terreno concreto, e m que impres
sionava antes de tudo o espetculo do varivel: as coisas
humanas,
nos grupos ou nas
pessoas,
passavam a ser vistas
como variabilidade no tempo e noespao,conforme sculos
e
pocas,
ou continentes e
climas.
Isso era propcio ao de
senvolvimento de u m a tendncia da doutrina democrtica,
mencionada
atrs,
a de pr o debate e m termos de histria.
Mas ento o direito natural, categoria tpica da forma
de pensar universalizante, ficava difcil de conciliar com
essas novas tendncias. A sociologia, desde C O M T E ,repu
diava a idia abstrata dos
direitos,
taxados de metafsicos;
as escolas histricas enxergavam por toda parte sistemas
concretos,c om contornos e condicionamentos bem situados;
a filosofia crtica impugnava todo apriorismo. Foram, por
tanto,
trs os fronts e m que se viu combatida a venervel
e j ento encanecida figura do direito natural: a) o po-
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sitivismo sociolgico, vinculado ao empirismo e m geral e aos
sociologismos e evolucionismo de toda sorte, incluindo os
etnografistas dodireito;b) o criticismo gnoseolgico e
epis-
temolgico, rejeitador de sistemas de cunho dogmtico, que
atingia justamente as matrizes pufendorfianas e wolfianas
do direito natural de at comeos do sculo xix; c) os ro-
mantismos e nacionalismos, ocupando-se com os particula-
rismos populares e co m a promoo de u m saber das naes
sobre siprprias,atravs da histria, e considerando o di
reito produto interno de cada u m a delas.
Por falar e m histria, cumpre anotar que a Escola de
SAVIGNYno foi intencionalmente antijusnaturalista, e que
no rechaou expressamente a idia de princpios jurdicos
extralegais;
o que fz foi substituir a anterior fundamen
tao da
cincia
jurdica e m preceitos ditos filosficos, por
u m a fundamentao no estudo dos costumes e da evoluo
da vida jurdica dos povos. Tanto que n u m autor como
A H R E N S
encontramos u m a conciliao n e m tanto lograda
entre jusnaturalismo e perspectiva histrica.
D e qualquer m odo, a crise do direito natural, ou do
jusnaturalismo, era patente. E como ambas as coisas
vinham sendo componentes essenciais do enraizamento do
pensar jurdico europeu no prprio cerne da vida espiritual
do chamado Ocidente, pareceu a certos autores que aquela
crise era algo grave, algo alarmante; alguns acharam
m e s m o que certas formas de negar o direito natural eram
deletrias.
Assim o famoso
E R N S TTROELTSCH,
n u m exagero
explicvel, escreveu u m ensaio dizendo que a oposio ao
jusnaturalismo ocidental, levada a cabo pelo historicismo
alemo,era u m perigo para a permanncia dos valores
culturais europeus e tinha sido inclusive u m dos caminhos
para o nazismo. Mas deixemos isso.
Para a explanao da teoria do Direito Natural, com
todos
os
seus ingredientes
e
extenses, entre
os
sculos
X V I
e X I X , v. oscaptulos clssicosde G I E R K B , traduzidospor
B A R K E R n u mvolume intituladoNaturalLaw and the theory
of
Society.
N onmero4 do 16 (p. 107ss), investigaas
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relaes entre o contratualismo e o jusnaturalismo: este
aparece acolhendo comou m dogma ahiptesedocontrato
original.
B O D E N H E I M E R
encontra trs fases
na
marcha
da
doutrinadoDireito Natural: primeira,a do protestantismo
nacionalizadoemercantilista; segunda,a doliberalismo ascen
dente;terceira,a davogadoconceito democrticodesobe
rania popular
(Teoria
dei
Derecho,F C E ,
Mxico, 1946,
cap.
VII, p. 129).Mais sobre isso tudo em
GURVITCH,
antigo
NaturalLaw naEncyclop.of S.Sciences, vol.XI, anali
sando a seqncia das diferentes verses da idia,e em
M. VnXEY,
Leonsd'Hist.de Ia Ph. du
Droit, Paris,
1957,
observando
(p. 224) que a
dita laicizao
do D.
Natural
no excluiudasobrasdossculos XVIIeXVIIIascitaes
bblicas.
Sobre
a
secularizao
da
cultura ocidental moderna,
C.D A W S U N , ProgressoeReligio,ed. A.Amado,1943 O
detalhe mencionadonotexto,e a quepoucostemdado aten
o,est salientadopor S.OOTTAnoensaio Lespartisetle
pouvoir dans lestheories politiquesdudbutduXVIIIesi-
cle
contido
na
publicao coletiva
Le
pouvoir, tomo
I, PUP,
1956; e sobre lepubliqueiuma nota no n. 3, 1963, de
Estudos Universitrios, Recife Sobreaintegraodo di-
reito natural leigo
na
teoria democrtica, lembra
A. STERN
que
ela foi
promovida pela filosofia
da
ilustrao, abrigadora
do racionalismo
(La
fil.
de Ia
hist.
y elproblema de los
valores, B.Aires,1963, cap. VI, pg.166).A aluso a
B E C K E R refere-seao seufamoso livro(LaciudaddeDiosen
el s. XVIII,trad., Mxico,1943). Sobrearelaodo
jus
naturalismodeentocom afigurados direitos (queeram
liberdades),
ver J. D.MABBOTT, The stateand the citizen,
London, 1956, cap. VII;
V H X E Y ,
op. cit.,p. 277;
T A W N E Y ,
Religionandtheriseofcapitalism,ed.Pelican, 1938,p. 167;
C.BRINTON,art. Natural Rights em
Encyclop.
ofthe Scien
ces,
vol. X I,
pgs.
299 e
segs.).
Mais sobre
o
tema
em A. L.
M A C H A D O N E T O ,Parauma sociologiadodireito
natural,
Sal
vador,1957. O rosrioderefernciasao vnculo entre
jusnaturalismoerevoluo,eu ocomeariacom um apassa
gem de RE CA S NS SICHES, toda revolucin implica uma
creencia iusnaturalista, pero especialmenteIavolucion fran
cesa,
magna apoteosis
de Ia f en el
Derecho Natural
(Vida
Humana, SociedadyDerecho,Mxico, 1945,cap. X, p. 322).
Seria de perguntar-se,mas sem levar avante agora,se a
palavra creencia vai a em sentido orteguiano. E m sen
tido anlogo h expresses em
R A D D B R U C H , T R O E L T S C H , A L F R E D
8
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W E B E R , W H I T E H E A D , L A C A M B R A , D I L T H E Y , W O L F , etc. todos
sentindo o fato de que desmantelar u m ordenamento implica
elementarmente a concepo de agir em nome de princpios
melhores.
Como ressalva, cabe porm anotar a ponderao de
KELSEN, para quem as formulaes jusnaturalistas, de ARIS
TTELES at hoje, tm u m carter conservador, porque na da
mais fazem do que remeter, atravs de regras que em si nada
ordenam de especfico, vigncia das normas efetivamente
vigorantes em cada poca Justice et Droit Naturel,no vol.
coletivo Le Droit Naturel,PUF, v. 959, pp. 23, 27 e 110).
Seria alis o caso de indagar, ainda naquele caso. se no
haveria tantos tipos de jusnaturalismo quantos de revolu
o, histrica e socialmente representveis; e ento o jus
naturalismo, mesmo ligado como u m princpio ou u m elemento
a algo de genrico, ficaria reduzido a um a varivel. D e
resto,
o prprio conceito de revoluo (revoluo autntica ,
definitiva etc.) vem sendo reivindicado por cada u m a das
revolues ocorrentes, ma s sem nenhuma conseguir monopo
liz-lo.
O ensaio de
TROELTSCH
As idiasde Direito
Natural e de Humanidade napoltica mundial,
e vem como
apndice na edio de Gierke Barker, citada atrs.
Direito natural e teoria do direito natural.
A crtica ao jusnaturalismo, por parte do sociologismo
oitocentista , toma como objeto aquilo que as teorias
cls
sicas do direito natural dizem sobre o direito. N o m e s m o
sentido, a do historicismo daquele tempo. Isto,essas
cr
ticas se opem idia de u m direito abstratamente consi
derado,de u m direito igual em toda parte, imutvel, inva
rivel,passvel de ser deduzido da mera racionalidade da
condio humana, ou da relao desta com a divindade.
Opem-se universalidade do conceito e ao impalpvel do
objeto.
Argem que aquela idia traz a marca de u m pen
samento esttico, de u m a metafsica do lugar natural , de
u m a concepo incompatvel com a positividade de todo
verdadeiro direito, ou ento com a experincia histrica,
com a evoluo, com a variao scio-cultural. Mas situam-
se sempre perante a coisa direitonatural,perante aquilo
que como tal era apresentado pelas teorias.
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Ora,
u m a crtica ao nvel do sculo xx no pode con
tentar-se comisso.Ela tem de referir-se, no s ao carter
histrico do direito, como tambm ao dateoriado direito.
N o caso, tem de ser, alm de crtica do direito natural,
crtica do jusnaturalismo, e crtica aqui significa inclu
sive compreenso e situao. preciso fazer, portanto, a
reduo histrica das doutrinas mesmas, no apenas do
objeto delas. A prpria importncia dessas doutrinas, e m
relao com os padres ticos de pensamento que as impe
liram,
ressaltar assim.
Essa portanto u m a anotao necessria. As refu-
taes
do direito natural at aqui tm sido mais ou menos
fundadas na idia da variabilidade do
jurdico.
E isso tem
ensejado sempre as mesmas respostas dos jusnaturalistas:
que aquela historicidade implica u m a idia reguladora, que
para se reconhecer algo na histria como sendo direito
exi
ge-se que se disponha de u m conceito prvio, etc. O fato
de terem os debates ficado situados nessafaixa,provm do
carter
noo dodireito
de que se disps: u m a idia feita
e m moldesclssicos,substancialista, essencialista, ligada ao
tema da justia e a
outros.
C o m
ela,
era normal que seale
gasse u m fundamento natural para o direito (e natural
ainda quemeta-fsico). Nesse sentido, a objeo consis
tente e m dizer que o jurdico, por ser conveno, no pode
sernatural,traz o problema, mas no o desdobra. E no
o desdobra, n em o resolve, porque de fato a idia antiga
de direito (ou melhor a que atribumos aos antigos sobre o
que dizemos ter sido o direito deles) podia
ser,
e
era,
natu
reza. A que talvez no seja natureza a idia moderna
do
direito.
Assim, o nuclear nu m a crtica do direito natural
e do jusnaturalismo a referncia concepo do direito,
de que historicamente se
trata.
A anlise do jusnaturalismo
deve visar a situao histrica da idia de direito que baseia
o saber jurdico dentro do qual se d a crena n u m direito
natural.
0 saber jurdico grego era mais u m a reflexo
sobre a justia; ns que fazemos dele u m saber jurdico.
O romano erajurdico,m as fundava-se, para as definies
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gerais,
no dito pelos gregos sobrefisis
e temis.
O Ocidente
moderno, porm, sob a idia de positividade c om que o
legahsmo formalizou o carter estatal das normas, sepa
rou o natural e o positivo, antes simplesmente distintos
(como e m S.
T O M S )
e separou, correlatamente, a cincia
jurdica da filosofia do direito, esta por alguns confundida,
e m
tempos,
com a teoria m e s m a do direito
natural.
E como
o direito que o saber jurdico sentia e aplicava era o
posi
tivo,
o direito
natural
ficou sendo para o pensamento con
temporneo u m . . problema : no o era para o antigo.
portanto a idia moderna de direito que no o comporta.
O saber jurdico moderno joga com a noo de um di
reito cujo conceito se capta independentemente de tempo e
espao,mas se sabe que seus contornos so afetados pela
experincia institucional e doutrinria contempornea. O
autoconhecimento dessa experincia, alis e m fase j de
transformaes e mudanas, a grande e dramtica tarefa
das geraes de hoje.
Sobre a necessidade de ser, a perspectiva histrica, apli
cada no s compreenso do jurdico mas tambm da
respectiva teoria, ou seja ao saber jurdico, pronunciei-me
no cap. III, 8, de meu O Problema dahistria nacincia
jurdica contempornea (Recife, 1964). A referncia ao
essencialismo contido na idia de direito herdada dos
cls
sicos,
feito no sentido da crtica de S A R T R E : O essencialismo
consiste em considerar a realidade cognoscvel de algo como
independente de suas inseres existenciais, como consistente
em u m molde intemporal. A anotao desdobrada nessa
parte do texto, pensada como u m a observao aos livros
sobre Direito Natural em geral, inspirou-se n a leitura do de
L E O S T RA U S S ,
Droit Naturel et Histoire,
trad., Plon, 1954.
N a verdade, so puramente sistemticas certas crticas do
Direito Natural, como a de S I C H E S (citada por C. J. Gu-
TIERREZ, e m
Riv.Internazionale di Fil dei Diritto,
nov.-dic.
63, ano X L , fase.VI, pg. 712), a de K E L S E N , a de S TE R N-
BERG, etc, isto , omitem o prisma histrico, onde se situa o
verdadeiro sentido do problema. H certos pontos, dentro
da teoria clssica, que envolvem srias aporias se mantidos
pelo pensamento moderno, e cujo sentido est nas matrizes
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antigas a que se prendem: exemplo, o tema da passagem
do
estado natural ao civil , constante da literatura seiscen-
tista sobre Direito Natural. N a realidade, tal passagem s
pode ser tomada co mo postulado; como a da pr-histria
histria, e m que, ou o processo de transio j foi histrico,
ou no haveria passagem, pois resultantes histricas impli
cam condies histricas. N o caso do natural ao civil, ou o
processo seria social e ento o problema se evapora, ou
no,
e ento h u m a impossibilidade emprica. Acerca do
cunho moderno da aura de problematicidade vestida pelo
Direito Natural, h que acrescentar, com S T E R N
(op. cit.,
p.
165) que tampouco para a Idade Mdia era le algo
problemtico. E no caso do pensamento ps-medieval, o
problema vem da antinomia entre a realidade jurdica
contempornea, em que se estriba a idia de direito mantida
pelo saber jurdico, e o apego dos pensadores idia de
direito atribuda aos clssicos, e conservada como u m
cnon
que se pretende ter continuado vlido por via intelectual, inde
pendentemente das mudan a s da experincia jurdica. Re
colhendo a idia de serem jusnaturalistas as revolues, um a
parte correta dela estaria em que elas (as grandes) podem
de cada vez refazer a concepo do direito mesmo, com o
que se faz sempre possvel retomar idias do tipo antigo e
pretendidamente permanente, inclusive a idia da justia, que
entra na temtica do direito pelo nvel dos princpios que
onde vigora o problema do Direito Natural. Valha lembrar,
contudo,
que mesmo a latejam diferenas: a justia, hel-
nica e clssica, era pensada em termos de harmonia, e
agora o em termos de reivindicaes sociais e de tcnicas
respectivas.
Reflexes pouco conclusivas.
Voltando ao assunto liberdade: vejamos a situao em
que ela ficou durante o sculo XIX, sob os diversos puxa-
vantes ideolgicos. Por u m
lado,
perigosos apogeus, desde
o princpio kantiano de que a existncia da moralidade
supe a de u m a vontade livre. Socialmente caracterizada,
a tendncia continuadora das revolues individualistas,
considerando liberdade a potencialidade de conduta lcita
existente em cada h o me m, limitada pela ordemgeral,sim,
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m a s e m ltima instncia fundamentadora desta. Igual
mente caracterizada, a inclinao conservadora, acentuando
os valores tradicionais, e dando como liberdade a aceitao
das continuidades orgnicas da nao, e m cujo seio cada
h o m e m
vive.
Nos socialismos de timbre
utpico,
u m a con
seqncia do prprio liberalismo e do jusnaturalismo, como
defesa extremada dos interesses de cada um ; no marxista,
u m a oposio ao jusnaturalismo, por burgus e ideolgico.
N o sculoxx,u m painel de combinaes e revises dos
temas do anterior. A prpria diferena entre liberdade
antiga e moderna, acentuada pelos autores do
xrx,
vai sendo
revista e reduzida A idia de liberdade, acusada por
tantos de iluso idealista, sai adotada como u m pressu
posto,tanto pelo raciovitalista
ORTEGA,
como pelo materia
listaSARTRE, Revises tambm do conceito de democracia
e das marcas individualistas que trazia. A discusso sobre
a liberdade, dantes ligada ao tema do livre arbtrio e do
determinismo, instala-se no campo social e se amarra a
conceitos sociais e econmicos, alienao, planejamento,
justia social etc. Onde se tem oportunidade de reclamar
reformas,
denuncia-se a
liberdade,
co mo v e ca; onde o
poder absorve as reclamaes, reclama-se a liberdade. Se
se quer acusar u m regime por no praticar a igualdade,
fala-se da liberdade
intil;
se se quer acusar o igualitarismo
como falso ou insuficiente, a liberdade o que se diz estar
faltando.
Enquanto isso a teoria do direito
natural,
posta na crise
j mencionada, contra a qual j lutara durante a ascenso
do neotomismo ao tempo de
TAPARELLI,
retoma no sculo xix
u m a srie de veredas pelas quais tenta refazer-se. C o m
S T A M M L E R ,
procurou-se u m a composio u m tanto artificio-
sa,com o conceito de u m direito-natural-de-contedo-vari-
vel;com G N Ye com a escola do direitolivre ,a idia de
u m a superao do direito puramente legal ensejou a valo
rizao das tendncias jusnaturalistas; e at hoje prossegue
o movimento, com filsofos e juristas os mais eminentes a
dar-lhe
impulso,
e esto no caso
D E L V E CC H I O, W E L Z E L , L E O
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S T R A U S S
etc. Fala-se,ento,de u m renascimento ou de
u m eterno retorno ( HEN RI R O H M E N ) do Direito Natural,
u m retorno meio palingensico e algo quilistico. O funda
mento do entusiasmo de seus defensores que, no s a
superao das filosofias empiristas e o advento da axiologia
requerem que se retome o tema de u m direito suprapositivo,
como tambm a sangueira das guerras e a torpeza dos re
gimes violentos pedem que se considere como jurdico algo
que paire acima do nvel dos comandos
estatais.
O direito
natural renascente seria ento u m novo basto de
T A U N H U -
SER,a reflorir na redeno.
Vejamos,porm. H u m a srie de argumentos contra
a idia de direito natural que se ma ntm, e alis para o re
pdio s mazelas do sculo o apelo a u m a moral h uma-
nstica seria bastante. Independente disso, entretanto,
preciso perguntar se se pode reeditar sem mais aquela u m a
concepo cujo molde cultural se vinculou historicamente a
u m a srie de experinciasculturais,hoje postas de lado ou
transformadas. Considero os reclamos jusnaturalistas de
hoje,
teis como advertncia contra o positivismo jurdico,
no porm bastantes para a restaurao de u m mo d o de
pensar. E hoje o acmulo de conscincia histrica, como
conscincia crtica, faz compreender que a situao de u m a
idia como a do direito natural precisamente essa: u m a
situao. de idia. U m a teoria jurdica historicamente
crtica dever considerar, no mais ou no puramente o
tema do direito dito natural, m as sim ou principal
mente o papel do jusnaturalismo como doutrina, e
portanto como fator de conduta.Nisso,a multissecularidade
da idia do direitonatural,que poderia apresentar-se com
pretenses de provas da existncia de seu objeto, pode
ser tomada e m sua perspectiva autntica: a da longevidade
de u m a idia que de vez em quando tem atuado nas
conscincias humanas, e que representa a intuio per
manente de u m a exigncia tica para o direito.
E por outro lado, parece que o que se chama de
Oci
dente tem u m a tendncia aos dualismos. Nesse
caso,
a con-
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traposio de u m direito ideal ao vigente seria u m seu coro
lrio;
m a s isso no be m direito
natural,
e o jusnaturalismo
no se reduz a essa contraposio. No escondo minha
simpatia pela possibilidade de distines entre ideais e vi
gncias,m e s m o porque as utopias so o sal dos projetos
humanos:mas resisto a admitir u m direito natural como
tal.
E se reconheo o jusnaturalismo como fora histrica,
precisamente c om esta ressalva: fora capaz de acompa
nhar-se de u m a lucidezque,ao menos depois da obra dessa
fora,veja que ela histrica, que muda, e que seus supos
tos e seus produtos so sempre mutveis.
A reviso das idias do sculo XIX sobre suas diferenas
perante a liberdade grega foi esboada porCROCEno cap. V
de seus
Elementos de
Poltica. Sobre a reposio, contida no
marxismo, do tema da liberdade hu mana e de seu regime
social,ver H A N S B A R T H , Verdad y Ideologia Mxico, 1951,
p. 101. Sobre os debates jusnaturalistas e m nosso sculo,
v. ,0 livro notvel de H.W E L Z E L ,Derecho Natural y usticia
Material(trad. Aguillar,1957).
Seria de pensar-se, ante tudo isso, que a curva do
aumento da liberdade, que subiu durante os sculos mais
recentes,vai descendo. O fato, porm, que esses sculos
deram ao h omem ocidental o hbito da lucidez, ou ao meno s
o desejo dela co mo exigncia ou critrio. Como ser lcido.
porm, se a luta dos absolutismos polticos, militares, tcnicos,
econmicos,
publicitrios, ou o que seja, reimplantar moldes
dogmticos sobre o esprito humano a pretexto de insegu
ranas sociais? Ter o liberalismo sido, alm de breve,
intil?
(5,
7 e 11 set. 65)