NATAN BATISTA
7º SEMESTRE
Sumário: Capítulo 1 - Introdução .................................................................. Página 1
1. Lide, Jurisdição, Direito de Ação, Processo e ................. Página 1 Procedimento
2. Sujeitos Processuais ............................................................................. Página 2 2.1. Sujeitos Processuais Principais ........................................................ Página 3 2.2. Sujeitos Processuais Secundários .................................................... Página 3 2.3. Sujeitos Processuais Terciários (Terceiros) .................................... Página 4 2.4. Sistematização ................................................................................... Página 4 2.5. Prática ................................................................................................. Página 4 2.6. Comentários Específicos Acerca do Juiz ....................................... Página 6
2.6.1. Estado-Juiz e Devido Processo Legal .............................. Página 6 2.7. Lei nº 13.964/2019 (Pacote Anticrime) e as alterações ............ Página 8
do art. 3º do CPP 2.8. Das partes no direito processual .................................................... Página 12
2.8.1. Do acusado ........................................................................... Página 12 2.8.1.1. Quem pode figurar como acusado ................... Página 13 2.8.1.2. Da identificação do acusado .............................. Página 16 2.8.1.3. Do chamamento do acusado ............................. Página 17 2.8.1.4. Da condução coercitiva ........................................ Página 18 2.8.1.5. Da defesa do acusado .......................................... Página 19
2.8.1.5.1. Autodefesa ................................................. Página 19 2.8.1.5.2. Defesa técnica e espécies de .................. Página 19
defensor 2.8.1.5.3. Da ausência do defensor nas ................. Página 22
audiências processuais 2.8.2. Do assistente de acusação ................................................. Página 22
2.8.2.1. Conceito ................................................................... Página 22 2.8.2.2. Quem poderá figurar como assistente ............. Página 22 2.8.2.3. Natureza da atuação do assistente da ............ Página 25
acusação 2.8.2.4. Ingresso do assistente no processo ...................... Página 26 2.8.2.5. Da habilitação do assistente ............................... Página 26 2.8.2.6. Função do assistente da acusação .................... Página 26
2.8.3. Dos funcionários da Justiça ................................................ Página 28
Capítulo 2 – Teoria Geral da Prova............................ Página 29
1. Introdução ................................................................................................. Página 29 2. Conceitos ..................................................................................................... Página 29
2.1. Objetivo da prova ............................................................................ Página 30 2.2. Objeto de prova ................................................................................ Página 30
2.2.1. Não serão objeto de prova ...................................................... Página 30 2.2.2. Serão objeto de prova? ............................................................ Página 31
2.3. Fontes de prova ................................................................................. Página 32
2.4. Meios de prova .................................................................................. Página 32 2.4.1. Princípio da ampla liberdade da produção de provas .... Página 33
2.4.1.1. Questões de estado ...................................................... Página 33 2.4.1.2. Provas proibidas ........................................................... Página 33
2.4.1.2.1. Provas ilegítimas .................................................... Página 33 2.4.1.2.2. Provas ilícitas .......................................................... Página 34
2.5. Elementos de prova .......................................................................... Página 37
3. Classificação das provas ................................................................. Página 37 3.1. Quanto ao objeto ............................................................................. Página 37 3.2. Quanto ao valor ou efeito .............................................................. Página 37 3.3. Quanto à fonte .................................................................................. Página 37 3.4. Quanto à origem .............................................................................. Página 37
4. Da Prova Emprestada .................................................................... Página 38 5. Momentos da Atividade Probatória ................................... Página 39 6. Ônus probatório .................................................................................... Página 39
6.1. Regra .................................................................................................... Página 40 6.2. Capacidade probatória supletiva ou subsidiária ...................... Página 40
7. Princípios da Prova ............................................................................ Página 41 7.1. Princípio da autorresponsabilidade das partes ......................... Página 41 7.2. Princípio da audiência contraditória/bilateral .......................... Página 41 7.3. Princípio da aquisição ou comunhão de provas ....................... Página 41 7.4. Princípio da oralidade ..................................................................... Página 41 7.5. Princípio da concentração .............................................................. Página 42 7.6. Princípio da publicidade ................................................................. Página 42 7.7. Princípio da não autoincriminação (nemo tenetur se ............. Página 42
detegere) 7.8. Princípio do livre convencimento motivado .............................. Página 42
8. Sistemas de Apreciação da Prova ......................................... Página 42 8.1. Ordálios ............................................................................................... Página 42 8.2. Sistema da prova legal, da verdade legal ou formal .............. Página 42 8.3. Sistema da livre convicção, da prova livre ou da íntima ....... Página 43
convicção 8.4. Sistema da persuasão racional ou livre convencimento ......... Página 44
motivado
9. Das Provas Nominadas .................................................................. Página 45 9.1. Da Perícia ........................................................................................... Página 45
9.1.1. Conceito ........................................................................................ Página 45 9.1.2. Importância da prova pericial ................................................ Página 45 9.1.3. Do perito....................................................................................... Página 46
9.1.3.1. Classificação do perito ................................................. Página 46 9.1.3.2. Requisitos para ser perito ........................................... Página 47 9.1.3.3. Quantidade de peritos ................................................ Página 47 9.1.3.4. Do compromisso ............................................................ Página 48 9.1.3.5. Dos deveres do perito .................................................. Página 48 9.1.3.6. Das penalidades ............................................................ Página 48 9.1.3.7. Do perito assistente ...................................................... Página 48
9.1.3.8. Nomeação dos peritos ................................................. Página 49 9.1.4. Realização da perícia ................................................................ Página 50
9.1.4.1. Perícia no inquérito policial ....................................... Página 50 9.1.4.2. Perícia no processo ....................................................... Página 50 9.1.4.3. Divergência entre peritos ............................................ Página 51
9.1.5. Do laudo pericial ........................................................................ Página 51 9.1.5.1. Divisão do laudo ........................................................... Página 51 9.1.5.2. Prazo ............................................................................... Página 52 9.1.5.3. Do pedido de esclarecimentos e da recusa do ...... Página 52
laudo pericial 9.1.5.4. Domínio técnico ............................................................ Página 52
9.1.6. Classificação dos crimes ............................................................. Página 53 9.1.6.1. Delicta facti permanentis (crime não ...................... Página 53
transeunte) 9.1.6.2. Delicta facti transeuntes (crime transeunte) ......... Página 53
9.1.7. Do vestígio .................................................................................... Página 53 9.1.7.1. Corpo de delito .............................................................. Página 54 9.1.7.2. Exame de corpo de delito .......................................... Página 54
9.1.7.2.1. Espécies de exame de corpo de delito .............. Página 54 9.1.7.2.2. Obrigatoriedade do exame de corpo de ......... Página 55
delito 9.1.7.2.3. Da não suficiência da confissão .......................... Página 55
9.1.8. Cadeia de custódia .................................................................... Página 56 9.1.8.1. Conceito .......................................................................... Página 56 9.1.8.2. Etapas da cadeia de custódia ................................... Página 56
9.1.9. Perícias em espécie/perícias e tipos penais ........................... Página 58 9.1.9.1. Perícias cadavéricas ..................................................... Página 58 9.1.9.2. Perícia em lesão corporal ........................................... Página 59 9.1.9.3. Perícia e local do crime ............................................... Página 60 9.1.9.4. Perícia e exames laboratoriais .................................. Página 60 9.1.9.5. Perícia e destruição ou rompimento de ................. Página 60
obstáculo ou escalada no crime de furto 9.1.9.6. Avaliação ........................................................................ Página 61 9.1.9.7. Perícia e crime de incêndio ........................................ Página 61 9.1.9.8. Perícia grafotécnica ..................................................... Página 61 9.1.9.9. Perícia e instrumentos do crime ................................ Página 62
9.2. Do interrogatório .............................................................................. Página 62 9.2.1. Conceito ........................................................................................ Página 62 9.2.2. Natureza jurídica ....................................................................... Página 62 9.2.3. Necessidade do interrogatório ................................................ Página 63 9.2.4. Momento do interrogatório ..................................................... Página 63 9.2.5. Características do interrogatório ............................................ Página 65 9.2.6. Da realização e do local do interrogatório .......................... Página 67
9.2.6.1. Do local do interrogatório .......................................... Página 67 9.2.6.2. Interrogatório por videoconferência ........................ Página 68 9.2.6.3. Providências a serem tomadas pelo juiz ................ Página 69 9.2.6.4. Fases do interrogatório................................................ Página 71
9.2.7. Novo interrogatório ................................................................... Página 73 9.3. Da Confissão ....................................................................................... Página 73
9.3.1. Conceito ........................................................................................ Página 73 9.3.2. Valor probatório da confissão ................................................. Página 73 9.3.3. Classificação da confissão ......................................................... Página 74
9.3.3.1. Quanto ao local ............................................................ Página 74 9.3.3.2. Quanto aos efeitos gerados ........................................ Página 74
9.3.4. Características da confissão ..................................................... Página 75 9.3.5. Da delação ................................................................................... Página 76
9.4. Das declarações e perguntas ao ofendido e às .......................... Página 77 testemunhas
9.4.1. Do ofendido ................................................................................. Página 77 9.4.1.1. Conceito .......................................................................... Página 77 9.4.1.2. Ofendido ≠ Testemunha.............................................. Página 77 9.4.1.3. Garantias dos ofendidos .............................................. Página 78 9.4.1.4. Valor probatório das declarações do ofendido ..... Página 79
9.4.2. Das testemunhas ........................................................................ Página 79 9.4.2.1. Conceito .......................................................................... Página 79 9.4.2.2. Valor probatório das declarações das ..................... Página 79
testemunhas 9.4.2.3. Classificação das testemunhas ................................... Página 80 9.4.2.4. Características da prova testemunhal..................... Página 81 9.4.2.5. Capacidade de ser testemunha ................................ Página 83 9.4.2.6. Dever de depor ............................................................. Página 83 9.4.2.7. Dever de comparecimento ........................................ Página 87 9.4.2.8. Dever de compromisso ................................................ Página 90 9.4.2.9. Dever de informar o endereço .................................. Página 91 9.4.2.10. Finalização do estudo dos deveres ........................... Página 91 9.4.2.11. Questões importantes .................................................. Página 93 9.4.2.12. Coleta do depoimento ................................................ Página 94 9.4.2.13. Contradita e arguição de defeitos ........................... Página 96
Resumo de Direito Processual Penal III
1
Introdução
1. Lide, Jurisdição, Direito de Ação, Processo e
Procedimento
Para que possamos introduzir nos estudos do Processo Penal, é necessário
que, antes, elucidemos a significação dos elementos do título deste tópico. Pois bem:
Iniciemos com a lide, base para compreensão do Processo Penal.
Segundo o grande pensador do Direito Francesco Carnelutti, lide é o conflito
de interesses qualificado por uma pretensão resistida. A lide penal, especificamente,
surge no momento em que houver a violação de uma norma jurídica.
Norma jurídica, por sua vez, expressa uma tutela do Estado, isto é, aquilo que
o Estado busca proteger. Para tanto, notou-se que a vida humana e em sociedade é
regida por determinados bens, os quais deveriam ser protegidos pelo Estado,
mantenedor das organizações humanas.
Os bens protegidos pelo Estado são denominados bens jurídicos, elementos
essenciais, sem os quais a vida em sociedade não funcionaria. São exemplos: a vida,
liberdade sexual, patrimônio, honra, integridade física etc.
A tutela do Estado definiu como crime a ação que atenta contra os bens
jurídicos protegidos. Diante do cometimento de crime surge para o Estado o direito
de punir o sujeito ativo do tipo penal, sujeito que ocupa o lado oposto da relação
jurídica (Estado x Sujeito Ativo). Ao direito de punir do Estado dá-se o nome de jus
puniendi.
Em que pese o Estado ter o direito de punir aquele que atenta contra os bens
jurídicos, tal indivíduo possui jus libertatis, ou seja, direito de liberdade. Direito este
que também é tutelado pelo Estado como direito fundamental. Esse direito somente
é suprimido diante do devido processo legal que condene o indivíduo.
O jus puniendi, poder de punir, somente pertence ao Estado, não sendo
possível que o deleguem. Tal poder se traduz pelo poder-dever do Estado, tendo em
vista que a sua não execução gera abalos que desestruturam a sociedade. Está nas
mãos do Estado, portanto, o poder de restabelecer e manter a paz social. Ao poder
exclusivo de punir do Estado é dado o nome de jurisdição.
Portanto, ao Estado cabe a solução do conflito, alcançando a paz social por
meio da aplicação da jurisdição (Estado-Juiz), tendo por método a aplicação do direito
penal objetivo.
A jurisdição, contudo, possui uma característica marcante: a inércia. Segundo
tal elemento o Estado não pode, por si só, aplicar a jurisdição e exercer a sua função
de Estado-Juiz. Para tanto, é necessário que seja provocado. Tal entendimento é
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estabelecido, haja vista que a Constituição Federal preza pela imparcialidade daquele
que julga, isto é, não pode o julgador, no caso o Estado, possui qualquer
ligação/vínculo/relação/liame com as partes ou com os fatos.
A movimentação do Estado, portanto, somente ocorrerá por meio de
provocação. A provocação, por sua vez, se dará por meio do exercício do direito de
ação. Havendo a ação daqueles que são legítimos, não poderá o Estado negar-se a
atuar como Estado-Juiz, sendo, logo, obrigado a fazê-lo, aplicando a jurisdição, único
meio pelo qual a lide é resolvida no âmbito penal.
Contudo, quem exerce o direito de ação?
O legitimado para agir será estabelecido a depender da natureza da ação
penal. O Estado, em regra, por meio da ação penal pública incondicionada, é o titular
do direito de ação e o faz por meio do Ministério Público (art. 129 da Constituição
Federal). Nesse caso, há um maior interesse público sobre o crime, motivo pelo qual
o Estado é legitimado a agir em prol deste elemento.
Diante de ações penais públicas, o direito de ação será exercido por meio da
denúncia.
A relevância do interesse público na resolução da lide é tamanha que falhando
o Estado, é possível que o indivíduo exerça o direito de ação por meio da ação privada
subsidiária da pública.
Por outro lado, nos casos em que o interesse privado prevalece ante ao
interesse coletivo, poderá a própria vítima ou seus representantes exercerem o
direito de ação. Aqui, estaremos diante das denominadas ações penais privadas.
Tratando-se de ação penal privada, o direito de ação será exercido por meio da
queixa-crime.
Provocado o Estado, o mesmo atuará por meio do processo – mecanismo/
instrumento da atuação do Estado-Juiz para a solução das lides que lhe são
apresentadas, ou seja, é o meio pelo qual se exercerá a jurisdição.
Contudo, o processo não ocorrerá de qualquer forma. É necessário que se
observe os elementos constantes em lei (devido processo legal), isto é, é necessário
que se siga um conjunto/sequência de atos processuais específicos. Ao conjunto de
atos processuais dispostos em lei dá-se o nome de procedimento.
Desta forma, todos os indivíduos autuados pelo Estado passarão pelo mesmo
processo e pelo mesmo procedimento, criando-se maior segurança jurídica e
aplicando-se a justiça.
2. Sujeitos Processuais
Sujeito processual é todo aquele que participa/intervém no processo. Pessoas
entre as quais se desenvolve/estabelece a relação jurídico-processual.
Resumo de Direito Processual Penal III
3
São as classificações dos sujeitos processuais:
2.1. Sujeitos Processuais Principais
Entende-se por sujeitos processuais principais aqueles que integram a relação
jurídico-processual com caráter de obrigatoriedade. Destacam-se, portanto, em
decorrência de dois elementos, quais sejam: (i) integração e (ii) obrigatoriedade.
Diz-se de integração obrigatória, porquanto a relação jurídico-processual
somente estará configurada diante de sua incorporação.
São três os sujeitos processuais principais:
a) Autor: o indivíduo que figurará como autor será alterado a depender da
natureza da ação penal. Tratando-se de ação penal pública, figurará como autor o
Ministério Público; por outro lado, em se tratando de ação penal privada, figurará
como autor o lesado ou quem o represente;
b) Acusado: dá-se pelo pretenso autor da infração penal; aquele a quem se atribui
a prática criminosa;
c) Juiz: representação do Estado-Juiz.
É, portanto, a relação jurídico-processual entre os sujeitos processuais
principais:
2.2. Sujeitos Processuais Secundários
Também denominados acessórios ou colaterais, os sujeitos processuais
secundários possuem direitos tutelados no processo e, por isso, compõem a relação
jurídico-processual, juntando-se ao polo passivo ou ativo da demanda.
Contudo, diferentemente dos sujeitos processuais principais, a participação
dos sujeitos processuais secundários é facultativa, o que significa que relação jurídico-
processual estará configurada ainda que não a integrem. Sua presença é, portanto,
prescindível.
Assim, são dois os elementos que destacam tais sujeitos: (i) integração e (ii)
prescindibilidade.
Citemos alguns exemplos de sujeitos processuais secundários:
a) Assistente da acusação: como já explicado em resumos anteriores, diante de
ação penal pública é o titular da ação o Ministério Público. Nessa espécie de ação
penal, contudo, estabeleceu o legislador que é possível que se vislumbre direito do
ofendido diante do processo em decorrência dos reflexos da infração penal. Por isso,
Juiz
AcusadoAutor
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deu-lhe a oportunidade de integrar a relação jurídico-processual como assistente de
acusação. Para tanto, é necessário que assim requeira, cabendo ao juiz aceitá-lo ou
não no processo. Nesse caso, por óbvio, integrará o polo ativo da demanda,
juntamente com o Ministério Público;
b) Fiador do réu: trata-se do indivíduo responsável pelo pagamento da fiança do
acusado. Nesse caso, tendo interesse na absolvição do réu, atuará junto a ele no polo
passivo da ação penal.
2.3. Sujeitos Processuais Terciários (Terceiros)
Sujeitos processuais terciários são aqueles que intervêm no processo sem
que, contudo, integrem a relação jurídico-processual.
São duas as espécies de terceiro:
a) Interessados: ainda que não integrem a relação jurídico-processual, possuem
direitos tutelados no processo. Portanto, são dois os elementos que o destacam: (i)
não integração e (ii) não tutelam direitos. Podemos citar como exemplo o Ministro da
Justiça diante de processos sujeitos à sua representação, ou seja, diante de crimes
contra a honra do Presidente da República;
b) Não interessados: não integram a relação jurídico-processual, nem possuem
direitos tutelados no processo, ainda que interfiram nele. Atuam, logo, com total
desvinculação à causa. São dois, também, os elementos que o destacam: (i) não
integram e (ii) não tutelam direitos. Podemos citar como exemplos a testemunha, o
perito, os serventuários da justiça etc.
2.4. Sistematização
PRINCIPAIS SECUNDÁRIOS TERCEIROS INTERESSADOS
TERCEIROS NÃO INTERESSADOS
Possuem direitos tutelados no
processo, integrando a
relação jurídico-processual de
forma obrigatória
Possuem direitos tutelados no
processo, integrando a
relação jurídico-processual de
forma facultativa
Possuem direitos tutelados no
processo, não integrando a
relação jurídico-processual
Não possuem direitos tutelados no processo, não
integrando a relação jurídico-
processual. Atuam de forma
desvinculada
2.5. Prática
Olhando pelo lado prático, contudo, é possível que nos deparemos com
algumas incógnitas. Vejamos:
a) Classificação do ofendido: dependerá de alguns elementos.
Primeiramente, quanto à natureza da ação penal.
Tratando-se de ação penal pública incondicionada, sua classificação estará
sujeitada à habilitação ou não de sua atuação como assistente de acusação.
Resumo de Direito Processual Penal III
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Sendo-o, será classificado como sujeito processual secundário, tendo em vista
que integrará a relação jurídico-processual, possuindo direitos tutelados no processo.
Por outro lado, não o sendo, será classificado como terceiro interessado,
porquanto atuará no processo, contudo não integrará a relação jurídico-processual.
Tratando-se, por fim, de ação penal privada, figurará como sujeito processual
principal.
b) Classificação do Ministério Público: analisemos.
Diante de ação penal pública, sendo o autor da ação, figurará como sujeito
processual principal.
Por outro lado, tratando-se de ação penal privada, sua classificação dependerá
da natureza da ação em questão.
Em sendo ação penal subsidiária da pública, atuará como interveniente adesivo
obrigatório, conforme estabelece o art. 29 do Código de Processo Penal1,
classificando-se por sujeito processual principal.
Havendo ação penal privada exclusiva, contudo, atuará como custos legis, isto
é, fiscal da lei, defensor da correta aplicação da legislação. Portanto, comporá a
relação jurídico-processual, sendo sujeito processual principal.
Nesse caso, excepcionalmente, teremos mais um componente da relação
jurídico-processual, sendo a seguinte relação:
c) Classificação do advogado/defensor: ambos, tendo em vista atuarem como
representantes, e não em nome próprio, não configuram sujeitos processuais.
d) Classificação do Promotor de Justiça: da mesma forma que os anteriormente
destacados, não figura como sujeito processual, porquanto atua como representante
do Ministério Público, e não em nome próprio.
e) Classificação do Juiz: como já estabelecido, o juiz classifica-se como sujeito
processual principal.
1 Art. 29 do Código de Processo Penal. Será admitida ação privada nos crimes de ação pública, se esta não for intentada no prazo legal, cabendo ao Ministério Público aditar a queixa, repudiá-la e oferecer denúncia substitutiva, intervir em todos os termos do processo, fornecer elementos de prova, interpor recurso e, a todo tempo, no caso de negligência do querelante, retomar a ação como parte principal.
Juiz
Acusado
Autor
MP
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2.6. Comentários Específicos Acerca do Juiz
2.6.1. Estado-Juiz e Devido Processo Legal
O juiz, como dito, figura como sujeito processual principal, haja vista ser a
personificação do Estado (Estado-Juiz) e atuar por meio do poder jurisdicional. A ele
incumbe presidir o trâmite processual e, ao final, proferir sentença que resolva a lide.
Para tanto, utiliza-se da denominada jurisdição, isto é, ao magistrado cabe aplicar a
lei ao caso concreto, dando-lhe uma solução.
Contudo, a ele não pertence o poder de presidir o processo como bem
entender. É necessário que observe o denominado devido processual legal, ou seja,
ao magistrado cabe seguir o procedimento disposto na lei.
A lei, por sua vez, comporta quais atos serão praticados, sua forma e a
sequência que deverá ser seguida.
Não se observando tal procedimento, é possível que se oponha a denominada
correição parcial. Este instituto poderá ser interposto diante de erro in procedendo,
isto é, quando o juiz não se utilizar corretamente dos atos processuais previstos em
lei, prejudicando o bom andamento do processo.
Tanto não cabe ao juiz utiliza-se de juízos subjetivos (convicções pessoais) que
a própria sentença não deve ser proferida de acordo com seus entendimentos, mas
sim através daquilo que a lei estabelece, ou seja, é necessário que se observa a
vontade Estatal, e não a vontade do magistrado.
2.6.2. Da imparcialidade, impedimento e suspeição
Estabelece a Constituição Federal:
Art. 5º da Constituição Federal. Todos são iguais perante a lei, sem
distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros
residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
XXXVII – não haverá juízo ou tribunal de exceção;
[...]
LIII – ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade
competente;
[...]
LIV – ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido
processo legal;
LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados
em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos
a ela inerentes.
[...]
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Art. 93 da Constituição Federal. Lei complementar, de iniciativa do
Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados
os seguintes princípios:
[...]
IX – todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e
fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a
presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou
somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do
interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação.
Todos estes dispositivos têm por fim o mesmo elemento: confirmar e garantir
a imparcialidade do juiz.
Este elemento marca a principal característica da figura do juiz, sendo, como
visto, característica da própria jurisdição, porquanto deve atuar sem que haja
qualquer ligação com as partes ou com a causa. Cabe ao magistrado, portanto,
desempenhar sua função de forma adequada e exclusiva.
Além das garantias constitucionais acima elencadas, coube ao Código de
Processo Penal definir em que momentos é possível que o juiz seja acusado pela
imparcialidade. Tratam-se dos casos de impedimento ou suspeição.
Tais elementos poderão ser considerados de ofício pelo magistrado ou
arguidos por qualquer das partes por meio de exceção de impedimento/suspeição.
Vejamos cada um destes elementos:
(i) Impedimento – as hipóteses de impedimento são apresentadas como
elementos objetivos que, se constantes, geram a presunção absoluta de que o juiz em
questão é parcial, tornando seus atos nulos.
Tais hipóteses estão elencadas em rol taxativo disposto nos arts. 252 e 253 do
Código de Processo Penal:
Art. 252 do Código de Processo Penal. O juiz não poderá exercer jurisdição
no processo em que:
I – tiver funcionando seu cônjuge ou parente, consanguíneo ou afim, em
linha reta ou colateral até o terceiro grau, inclusive, como defensor ou advogado,
órgão do Ministério Púbico, autoridade policial, auxiliar da justiça ou perito;
II – ele próprio houver desempenhado qualquer dessas funções ou sérvio
como testemunha;
III – tiver funcionado como juiz de outra instância, pronunciando-se, de fato
ou de direito, sobre a questão;
IV – ele próprio ou seu cônjuge ou parente, consanguíneo ou afim em linha
reta ou colateral até o terceiro grau, inclusive, for parte ou diretamente interessado
no feito.
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Art. 253 do Código de Processo Penal. Nos juízos coletivos, não poderão
servir no mesmo processo os juízes que foram entre si parentes, consanguíneos ou
afins, em linha reta ou colaterais até o terceiro grau, inclusive.
(ii) Suspeição – de outra mão, a suspeição é configurada por circunstâncias
subjetivas, fatores externos ao processo, capazes de macular a imparcialidade do
magistrado.
Aqui, o juiz possui vínculo subjetivo com as partes ou com o objeto da lide.
Importante ressaltar, porém, que o vínculo cuja criação tenha sido forçada por
qualquer das partes não será considerada. Nesse caso, a parte que injuriar o juiz ou
interagir amigavelmente de forma proposital para que lhe seja acusada a parcialidade
não terá sucesso, porquanto estas situações são expressamente vedadas pelo
Código.
O rol em que estão dispostos é exemplificativo, diferentemente do
impedimento. Determinam os arts. 254 e 256 do Código de Processo Penal:
Art. 254 do Código de Processo Penal. O juiz dar-se-á por suspeito, e, se
não o fizer, poderá ser recusado por qualquer das partes:
I – se for amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer deles;
II – se ele, seu cônjuge, ascendente ou descendente, estiver respondendo
a processo por fato análogo, sobre cujo caráter criminoso haja controvérsia;
III – se ele, seu cônjuge, ou parente, consanguíneo, ou afim, até o terceiro
grau, inclusive, sustentar demanda ou responder a processo que tenha de ser
julgado por qualquer das partes;
IV – se tiver aconselhado qualquer das partes;
V – se for credor ou devedor, tutor ou curador, de qualquer das partes;
VI – se for sócio, acionista ou administrador de sociedade interessada no
processo.
[...]
Art. 256 do Código de Processo Penal. A suspeição não poderá ser
declarada nem reconhecida, quando a parte injuriar o juiz ou de propósito der
motivo para criá-la.
2.7. Lei nº13.964/2019 (Pacote Anticrime) e as alterações do art. 3º do CPP
Anteriormente à aprovação do denominado Pacote Anticrime o art. 3º do CPP
somente era constituído pelo caput. Hoje, porém, foi incorporado ao Código de
Processo Penal os arts. 3º-A, 3º-B, 3º-C, 3º-D, 3º-E e 3º-F. Vejamos:
Juiz das Garantias
Art. 3º-A do Código de Processo Penal. O processo penal terá estrutura
acusatória, vedadas a iniciativa do juiz na fase de investigação e a substituição da
atuação probatória do órgão de acusação.
Resumo de Direito Processual Penal III
9
Art. 3º-B do Código de Processo Penal. O juiz das garantias é responsável
pelo controle da legalidade da investigação criminal e pela salvaguarda dos direitos
individuais cuja franquia tenha sido reservada à autorização prévia do Poder
Judiciário, competindo-lhe especialmente:
I – receber a comunicação imediata da prisão, nos termos do inciso LXII do
caput do art. 5º da Constituição Federal;
II – receber o auto da prisão em flagrante para o controle da legalidade da
prisão, observado o disposto no art. 310 deste Código;
III – zelar pela observância dos direitos do preso, podendo determinar que
este seja conduzido à sua presença, a qualquer tempo;
IV – ser informado sobre a instauração de qualquer investigação criminal;
V – decidir sobre o requerimento de prisão provisória ou outra medida
cautelar, observado o disposto no §1º deste artigo;
VI – prorrogar a prisão provisória ou outra medida cautelar, bem como
substituí-las ou revogá-las, assegurando, no primeiro caso, o exercício do
contraditório em audiência pública e oral, e na forma do disposto neste Código ou
em legislação especial pertinente;
VII – decidir sobre o requerimento de produção antecipada de provas
consideradas urgentes e não repetíveis, assegurados o contraditório e a ampla
defesa em audiência pública e oral;
VIII – prorrogar o prazo de duração do inquérito, estando o investigado
preso, em vista das razões apresentadas pela autoridade policial e observado o
disposto no §2º deste artigo;
IX – determinar o trancamento do inquérito policial quando não houver
fundamento razoável para sua instauração ou prosseguimento;
X – requisitar documentos, laudos e informações ao delegado de polícia
sobre o andamento da investigação;
XI – decidir sobre os requerimentos de:
a) interceptação telefônica, do fluxo de comunicações em sistemas de
informática e telemática ou de outras formas de comunicação;
b) afastamento dos sigilos fiscal, bancário, de dados e telefônico;
c) busca e apreensão domiciliar;
d) acesso a informações sigilosas;
e) outros meios de obtenção da prova que restrinjam direitos
fundamentais do investigado;
XII – julgar o habeas corpus impetrado antes do oferecimento da denúncia;
XIII – determinar a instauração de incidente de insanidade mental;
XIV – decidir sobre o recebimento da denúncia ou queixa, nos termos do
art. 399 deste Código;
XV – assegurar prontamente, quando se fizer necessário, o direito
outorgado ao investigado e ao seu defensor de acesso a todos os elementos
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10
informativos e provas produzidos no âmbito da investigação criminal, salvo no que
concerne, estritamente, às diligências em andamento;
XVI – deferir pedido de admissão de assistente técnico para acompanhar a
produção da perícia;
XVII – decidir sobre a homologação de acordo de não persecução penal ou
os de colaboração premiada, quando formalizados durante a investigação;
XVIII – outras matérias inerentes às atribuições definidas no caput deste
artigo.
§1º. (VETADO)
§2º. Se o investigado estiver preso, o juiz das garantias poderá, mediante
representação da autoridade policial e ouvido o Ministério Público, prorrogar, uma
única vez, a duração do inquérito por até 15 (quinze) dias, após o que, se ainda assim
a investigação não for concluída, a prisão será imediatamente relaxada.
Art. 3º-C do Código de Processo Penal. A competência do juiz das garantias
abrange todas as infrações penais, exceto as de menor potencial ofensivo, e cessa
com o recebimento da denúncia ou queixa na forma do art. 399 deste Código.
§1º. Recebida a denúncia ou queixa, as questões pendentes serão decididas
pelo juiz da instrução e julgamento.
§2º. As decisões proferidas pelo juiz das garantias não vinculam o juiz da
instrução e julgamento, que, após o recebimento da denúncia ou queixa, deverá
reexaminar a necessidade das medidas cautelares em curso, no prazo máximo de
10 (dez) dias.
§3º. Os autos que compõem as matérias de competência do juiz das
garantias ficarão acautelados na secretaria desse juízo, à disposição do Ministério
Público e da defesa, e não serão apensados aos autos do processo enviados ao juiz
da instrução e julgamento, ressalvados os documentos relativos às provas
irrepetíveis, medidas de obtenção de provas ou de antecipação de provas, que
deverão ser remetidos para apensamento em apartado.
§4º. Fica assegurado às partes o amplo acesso aos autos acautelados na
secretária do juízo das garantias.
Art. 3º-D do Código de Processo Penal. O juiz que, na fase de investigação,
praticar qualquer ato incluído nas competências dos arts. 4º e 5º deste Código ficará
impedido de funcionar no processo.
Parágrafo único. Nas comarcas em que funcionar apenas um juiz, os
tribunais criarão um sistema de rodízio de magistrados, a fim de atender às
disposições deste Capítulo.
Art. 3º-E do Código de Processo Penal. O juiz de garantias será designado
conforme as normas de organização judiciária da União, dos Estados e do Distrito
Federal, observando critérios objetivos a serem periodicamente divulgados pelo
respectivo tribunal.
Art. 3º-F do Código de Processo Penal. O juiz das garantias deverá
assegurar o cumprimento das regras para o tratamento dos presos, impedindo o
acordo ou ajuste de qualquer autoridade com órgãos da imprensa para explorar a
Resumo de Direito Processual Penal III
11
imagem da pessoa submetida à prisão, sob pena de responsabilidade civil,
administrativa e penal.
Parágrafo único. Por meio de regulamento, as autoridades deverão
disciplinar, em 180 (cento e oitenta) dias, o modo pelo qual as informações sobre a
realização da prisão e a identidade do preso serão, de modo padronizado e
respeitada a programação normativa aludida no caput deste artigo, transmitidas à
imprensa, assegurados a efetividade da persecução penal, o direito à informação e
a dignidade da pessoa submetida à prisão.
Diante do exposto, nota-se ter estabelecido o legislador a figura de um novo
juiz que atuará durante a persecução penal.
Visando a manutenção da imparcialidade, entendeu o legislador que a criação
de uma nova espécie de juiz, responsável pelas atuações durante a fase pré-
processual, tornaria o processo menos suscetível à corrupção de seus julgadores.
Estabeleceu-se, portanto, a existência de dois juízes por processo.
O primeiro deles, criado pelo denominado Pacote Anticrime, ficou responsável
pelos atos praticados durante a fase pré-processual, incumbindo-lhe acompanhar as
diversas etapas da investigação criminal, principalmente no que diz respeito às
questões que envolvem diretos individuais tutelados pelo Estado cuja violação
demanda autorização judicial (ex.: prisão temporária, interceptação telefônica,
autorização de busca domiciliar etc).
Ao juiz de garantia não é conferido poder de investigação, pois somente cabe
a ele controlar os atos pré-processuais, atuando perante a necessidade da
manifestação de órgão judiciário durante a investigação criminal. Cabe a ele, como
dito, salvaguardar os direitos individuais durante essa fase, visando a manutenção de
sua legalidade, nos moldes do art. 3º-B, acima transcrito. Cumpre informar, ainda, que
o referido dispositivo apresenta rol exemplificativo, porquanto os itens nele previstos
não exaurem as possibilidades.
Interessante notar que o §2º do referido artigo foi responsável por dispor
acerca da possibilidade de prorrogação do inquérito policial em até 15 dias, desde que
o investigado esteja detido temporariamente.
Sua atuação apresenta como termo o oferecimento da denúncia ou queixa
(art. 3º-C, §1º), momento no qual entra em jogo o segundo juiz, o juiz de instrução e
julgamento, responsável por presidir o processo até o proferimento de sentença
condenatória ou absolutória.
Importante ressaltar, contudo, que as ações tomadas pelo juiz de garantias em
nada afetam/vinculam os posicionamentos adotados pelo juiz de instrução e
julgamento, porquanto possuem autonomia para atuar durante cada fase a eles
incumbida sem qualquer consideração de ato prévio praticado por outro magistrado
que tenha se manifestado na ação.
DireitoFacilitado.com.br – Natan Batista
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Em que pese todo o exposto, as disposições acima transcritas não se
encontram em vigor, haja vista o efeito suspensivo em medida cautelar2 proferido
pelo Supremo Tribunal Federal nas ADIs 6298, 6299, 6300 e 6305 até que a alteração
seja apreciada pelo Pleno da Suprema Corte.
2.8. Das partes no direito processual
De proêmio, convém anunciarmos que não se deve confundir as partes do
direito material com as partes do direito processual.
Perante o Direito Penal, os sujeitos são definidos em relação ao crime, motivo
pelo qual é a configuração:
Sujeito ativo – aquele que pratica o verbo do tipo penal, ou seja, que comete
o crime;
Sujeito passivo – primeiramente, o Estado (denominado sujeito passivo
constante). Secundariamente, aquele a quem a conduta tenha atingido, suportando
as consequências diretas da ação criminosa (nomeado sujeito passivo eventual).
Por outro lado, quando se falar em Direito Processual Penal, as partes são
definidas com enfoque no processo. Nessa senda, é a disposição:
Sujeito ativo – titular do direito de ação, alterando-se, como já vimos,
conforme a natureza da ação penal;
Sujeito passivo – aquele contra quem a denúncia ou queixa é oferecida, ou seja,
trata-se da pessoa do acusado, o pretenso autor da infração penal, a quem se atribui
a prática da ação criminosa.
Pois bem, estudemos cada uma das partes separadamente.
2.8.1. Do acusado
Nas palavras de Edilson Mougenot:
Acusado é aquele a quem a acusação imputa a prática de uma conduta toda
por criminosa. É o réu, chamado também, no processo penal, de imputado. Na
ação penal de iniciativa privada é denominado querelado.
Como dito, portanto, entende-se por acusado aquele a quem se imputa a
prática criminosa narrada na queixa ou denúncia, a depender da natureza da ação
penal, ou seja, é o pretenso autor da infração penal.
Em relação à terminologia, variará conforme a fase do processo e a natureza
da ação. Vejamos:
Investigação criminal – denomina-se investigado;
Ação penal privada – denomina-se querelado ou requerido;
Ação penal pública perante a denúncia – denuncia-se denunciado;
2 Texto disponível em: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADI6298.pdf>
Resumo de Direito Processual Penal III
13
Ação penal pública após o recebimento da acusação – denomina-se réu, acusado
ou requerido;
Após o trânsito em julgado de sentença penal condenatória – denomina-se
condenado ou executado.
2.8.1.1. Quem pode figurar como acusado
O primeiro passo para que entendamos, de fato, quem é o acusado é
identificarmos quem poderá assim ser considerado.
De proêmio, convém informarmos que a condição de acusado é
personalíssima, porquanto somente pode ser conferida a quem seja imputada a
prática da pretensa ação criminosa. Significa dizer que não é possível que outra
pessoa sustente tal condição, ainda que venha a falecer o sujeito passivo da ação
penal, conforme determina o Princípio da Instranscendência, haja vista a proibição da
sucessão da condição de acusado. Morrendo o acusado, declarar-se-á a extinção da
punibilidade do agente, nos moldes dos arts. 107, I, do Código Penal e 62 do Código
de Processo Penal:
Art. 107 do Código Penal. Extingue-se a punibilidade:
I – pela morte do agente.
• • • •
Art. 62 do Código de Processo Penal. No caso de morte do acusado, o juiz
somente à vista da certidão de óbito, e depois de ouvido o Ministério Público,
declarará extinta a punibilidade do agente.
Vamos à pergunta: quem pode ser considerado acusado? Em regra, todos
podem figurar como acusados em ação penal, ou seja, a prática de ação criminosa pode
ser imputada a qualquer indivíduo, uma vez que a norma jurídica penal, à princípio,
torna aberta a autoria do delito.
Diante de tal assertiva, surgem algumas indagações:
É possível que pessoas jurídicas figurem como acusados em ação penal?
Anteriormente à publicação da Constituição Federal de 1988, não era possível
que pessoas jurídicas figurassem no polo passivo de ações penais. Contudo, a Carta
Magna foi responsável por inaugurar a responsabilidade criminal destes entes:
Art. 173, §5º, da Constituição Federal. A lei, sem prejuízo da
responsabilidade individual dos dirigentes da pessoa jurídica, estabelecerá a
responsabilidade desta, sujeitando-a às punições compatíveis com sua natureza,
nos atos praticados a ordem econômica e financeira e contra a economia popular.
Nesse sentido, a responsabilidade penal das pessoas jurídicas foi
regulamentada pela Lei nº 9.605/95:
Art. 3º da Lei 9.605/95. As pessoas jurídicas serão responsabilizadas
administrativa, civil e penalmente conforme o disposto nesta Lei, nos casos em
DireitoFacilitado.com.br – Natan Batista
14
que a infração seja cometida por decisão de seu representante legal ou
contratual, ou de seu órgão colegiado, no interesse ou benefício da sua entidade.
Parágrafo único. A responsabilidade das pessoas jurídicas não exclui a das
pessoas físicas, autoras, co-autoras ou partícipes do mesmo fato.
Em que a possibilidade de responsabilização dos entes jurídicos, não há
previsão procedimental específica, motivo pelo qual se aplica a eles, analogicamente,
as normas previstas na Legislação Processual Civil e Trabalhista.
• • • •
Identificados os entes que figurarão como acusados, convém que informemos
haver exceções, isto é, há indivíduos que não poderão suportar a condição de
acusado, quais sejam:
(i) Mortos – como visto anteriormente, a morte causa a extinção da
punibilidade do agente. Significa dizer que não é possível que impute a indivíduo
falecido a condição de acusado, porquanto não se lhe envolve personalidade jurídica;
(ii) Menores de 18 anos – determina o art. 27 do Código Penal:
Art. 27 do Código Penal. Os menores de 18 (dezoito) anos são penalmente
inimputáveis, ficando sujeitos às normas estabelecidas na legislação especial.
Assim se entende, pois a lei presume de forma absoluta que o indivíduo menor
de 18 anos não possui capacidade para compreender o caráter ilícito do fato que
pratica, determinando-se frente a tal entendimento, ou seja, ainda que aja
ilicitamente, não possui capacidade para entender ser o ato ilícito (não possui
capacidade penal).
Por se tratar de presunção legal absoluta, não há o que falar em possibilidade
de prova em contrário.
Nesse sentido, executando ato considerado criminoso, a eles não será
imputada a prática de crime, mas de ato infracional, conforme determina o Estatuto
da Criança e do Adolescente:
Art. 103 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Considera-se ato
infracional a conduta descrita como crime ou contravenção penal.
Art. 104 do Estatuto da Criança e do Adolescente. São penalmente
inimputáveis os menores de dezoito anos, sujeitos às medidas previstas nesta lei.
Parágrafo único. Para os efeitos desta Lei, deve ser considerada a idade do
adolescente à data do fato.
Assim agindo, estará sujeito às medidas previstas nos arts. 101 e 112 do referido
Diploma Legal. Em se tratando de menor de 12 anos, estará sujeito às denominadas
medidas protetivas. Por outro lado, sendo maior de 12 anos, além das referidas
medidas protetivas, poderá ficar sujeito às medidas socioeducativas.
Resumo de Direito Processual Penal III
15
(iii) Os possuidores de imunidade diplomática – a imunidade diplomática
encontra previsão na Convenção de Viena, ratificada e incorporada ao Ordenamento
Jurídico brasileiro através do Decreto nº 56.435/65:
Artigo 31
1. O agente diplomático gozará de imunidade de jurisdição penal do Estado
acreditado. Gozará também da imunidade de jurisdição civil e administrativa, a
não ser que se trata de:
a) uma ação real sôbre imóvel privado situado no território do Estado
acreditado, salvo se o agente diplomático o possuir por conta do Estado
acreditado para os fins da missão.
b) uma ação sucessória na qual o agente diplomático figure, a título privado
e não em nome do Estado, como executor testamentário, administrador, herdeiro
ou legatário;
c) uma ação referente a qualquer profissão liberal ou atividade comercial
exercida pelo agente diplomático no Estado acreditado fora de suas funções
oficiais.
2. O agente diplomático não é obrigado a prestar depoimento como
testemunha.
3. O agente diplomático não está sujeito a nenhuma medida de execução a
não ser nos casos previstos nas alíneas “a”, “b” e “c” do parágrafo 1 dêste artigo
e desde que a execução possa realizar-se sem afetar a inviolabilidade de sua
pessoa ou residência.
4. A imunidade de jurisdição de uma agente diplomático no Estado
acreditado não o isenta da jurisdição do Estado acreditante.
(iv) Os possuidores de imunidade parlamentar – como bem sabemos, os
deputados e senadores gozam de imunidades parlamentares materiais e formais,
referentes à inviolabilidade civil e penal por suas opiniões, palavras e votos enquanto
no exercício da função, bem como ao foro por prerrogativa de função, a imunidade
para prisão, salvo diante de flagrante delito de crime inafiançável, e a possibilidade de
sustação do processo pelo voto positivo da maioria da Casa a que está atrelada.
As referidas imunidades estão dispostas no art. 53 da Constituição Federal.
Vejamos:
Art. 53 da Constituição Federal. Os Deputados e Senadores são invioláveis,
civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos.
§1º. Os Deputados e Senadores, desde a expedição do diploma, serão
submetidos a julgamento perante o Supremo Tribunal Federal.
§2º. Desde a expedição do diploma, os membros do Congresso Nacional
não poderão ser presos, salvo em flagrante delito de crime inafiançável. Nesse
caso, os autos serão remetidos dentro de vinte e quatro horas à Casa respectiva,
para que, pelo voto da maioria de seus membros, resolva sobre a prisão.
§3º. Recebida a denúncia contra o Senador ou Deputado, por crime
ocorrido após a diplomação, o Supremo Tribunal Federal dará ciência à Casa
DireitoFacilitado.com.br – Natan Batista
16
respectiva, que, por iniciativa de partido político nela representado e pelo voto da
maioria de seus membros, poderá, até a decisão final, sustar o andamento da
ação.
§4º. O pedido de sustação será apreciado pela Casa respectiva no prazo
improrrogável de quarenta e cinco dias do seu recebimento pela Mesa Diretora.
§5º. A sustação do processo suspende a prescrição, enquanto durar o
mandato.
§6º. Os Deputados e Senadores não serão obrigados a testemunhar sobre
informações recebidas ou prestadas em razão do exercício do mandato, nem
sobre as pessoas que lhe s confiaram ou deles receberam informações.
§7º. A incorporação às Forças Armadas de Deputados e Senadores, embora
militares e ainda que em tempo de guerra, dependerá de prévia licença da Casa
respectiva.
§8º. As imunidades de Deputados ou Senadores subsistirão durante o
estado de sítio, só podendo ser suspensas mediante o voto de dois terços dos
membros da Casa respectiva, nos casos de atos praticados fora do recinto do
Congresso Nacional, que sejam incompatíveis com a execução da medida.
2.8.1.2. Da identificação do acusado
Determina ao art. 41 do CPP:
Art. 41 do Código de Processo Penal. A denúncia ou queixa conterá a
exposição do fato criminoso, com todas as suas circunstâncias, a qualificação do
acusado ou esclarecimentos pelos quais se possa identificá-lo, a classificação do
crime e, quando necessário, o rol das testemunhas.
Em regra, a identificação do acusado deverá ocorrer por meio de sua
qualificação, ou seja, apresentar-se-á seu nome, endereço, Registro Geral (RG),
Cadastro de Pessoa Física (CPF), profissão, nacionalidade, endereço de email etc.
Contudo, a falta dessas informações não impede a regular composição do
polo passivo da demanda.
Exige o Código de Processo Penal que a pessoa do acusado seja certa e
determinada. Significa dizer que não se faz necessário a indicação de todas as
informações atinentes a sua qualificação, desde que sejam oferecidas informações
suficientes para se ter certeza acerca da pessoa do acusado, inclusive de natureza
física.
Em outras palavras, ainda que não haja especificação de determinados
elementos qualitativos do acusado, o oferecimento de informações características
que permitam a sua identificação exata é suficiente.
Importante ressaltar que validação das informações apresentadas está
diretamente ligada à exata identificação do acusado, não havendo qualquer dúvida
quanto a sua pessoa.
Resumo de Direito Processual Penal III
17
Nesse sentido, determina o art. 259 do CPC:
Art. 259 do Código de Processo Penal. A impossibilidade de identificação
do acusado com o seu verdadeiro nome ou outros qualificativos não retardará a
ação penal, quando certa a identidade física. A qualquer tempo, no curso do
processo, do julgamento ou da execução da sentença, se for descoberta a sua
qualificação, far-se-á a retificação, por termo, nos autos, sem prejuízo da validade
dos atos precedentes.
2.8.1.3. Do chamamento do acusado
Em regra, o acusado será convidado a compor a relação jurídica por meio de
citação, pela qual será (i) cientificado que contra ele foi oferecida denúncia ou queixa,
indicando-o todas as informações necessárias em relação à ação e (ii) chamando-o ao
processo para que apresente defesa técnica. É o que determinam os arts. 351 e 352
do CPP:
Art. 351 do Código de Processo Penal. A citação inicial far-se-á por
mandado, quando o réu estiver no território sujeito à jurisdição do juiz que a
houver ordenado.
Art. 352 do Código de Processo Penal. O mandado de citação indicará:
I – o nome do juiz;
II – o nome de querelante nas ações iniciadas por queixa;
III – o nome do réu, ou, se for desconhecido, os seus sinais característicos;
IV – a residência do réu, se for conhecida;
V – o fim para que é feita a citação;
VI – o juízo e o lugar, o dia e a hora em que o réu deverá comparecer;
VII – a subscrição do escrivão e a rubrica do juiz.
Não estando na jurisdição do juiz que preside a ação, a citação far-se-á por
meio de carta precatória, nos termos do art. 353 e 354.
Embora o magistrado seja obrigado a citar o réu, o mesmo não obrigado a
comparecer em juízo para se defender. Não se apresentando o acusado, porém, será
considerado contumaz.
Importante destacarmos a diferença entre contumácia e revelia, pois tais
elementos não se confundem:
CONTUMÁCIA REVELIA
Incorre em contumácia qualquer das partes que deixar de exercer atividade no processo em momento em que, em
tese, deveria atuar, podendo recair, inclusive, sobre a pessoa que ocupa o
polo ativo da ação
Especificamente, a revelia é espécie de contumácia que incide diante do
silêncio da parte ré quando deveria apresentar resposta à demanda inicial
DireitoFacilitado.com.br – Natan Batista
18
2.8.1.4. Da condução coercitiva
Determina o art. 260 do Código de Processo Penal:
Art. 260 do Código de Processo Penal. Se o acusado não atender à
intimação para o interrogatório, reconhecimento ou qualquer outro ato que, sem
ele, não possa ser realizado, a autoridade poderá mandar conduzi-lo à sua
presença.
Parágrafo único. O mandado conterá, além da ordem de condução, os
requisitos mencionados no art. 352, no que lhe for aplicável.
A pergunta que se faz é a seguinte: ora, se ao acusado é facultado comparecer
em juízo para oferecer sua defesa, é legal a ação do magistrado quando determina a sua
condução coercitiva? A questão aqui é entender a diferença entre a natureza de uma
e outra ação.
Enquanto a apresentação de defesa por parte do réu é ato que não prejudica
o prosseguimento do feito, o Código é claro quando determina a possibilidade de
condução coercitiva quando se tratar de ato cuja presença do réu é imprescindível
para o seu regular exercício.
Cumpre informar, porém, que o Supremo Tribunal Federal, em acórdão
proferido nas ADPFs de nº 395 e 444 decretaram a inconstitucionalidade do referido
dispositivo no que diz respeito à condução coercitiva para a procedência de
interrogatório, haja vista a violação dos direitos de locomoção e da não
autoincriminação. Segue trecho da ADPF nº 444:
1. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental. Constitucional.
Processo Penal. Direito à não autoincriminação. Direito ao tempo necessário à
preparação da defesa. Direito à liberdade de locomoção. Direito à presunção de
não culpabilidade. [...] 4. Presunção de não culpabilidade. A condução coercitiva
representa restrição temporária da liberdade de locomoção mediante condução
sob custódia por forças policiais, em vias públicas, não sendo tratamento
normalmente aplicado a pessoas inocentes. Violação. 5. Dignidade da pessoa
humana (art. 1º, III, da CF/88). O indivíduo deve ser reconhecido como um membro
da sociedade dotado de valor intrínseco, em condições de igualdade e com
direitos iguais. Tornar o ser humano mero objeto do Estado, consequentemente,
contraria a dignidade humana (NETO, João Costa. Dignidade Humana: São Paulo,
Saraiva, 2014. p. 84). Não condução coercitiva, resta evidente que o investigado é
conduzido para demonstrar submissão à força, o que desrespeita a dignidade da
pessoa humana. 6. Liberdade de locomoção. A condução coercitiva representa
uma supressão absoluta, ainda que temporária, da liberdade de locomoção. Há
uma clara interferência na liberdade de locomoção, ainda que por período breve.
7. Potencial violação ao direito à não autoincriminação, na modalidade direito ao
silêncio. Direito consistente na prerrogativa do implicado a recursar-se a depor em
investigações ou ações penais contra si movimentadas, sem que o silêncio seja
interpretado como admissão de responsabilidade. Art. 5º, LXIII, combinado com
os arts. 1º, III; 5º, LIV, LV e LVII. O direito ao silêncio e o direito a ser advertido
quanto ao seu exercício são previstos na legislação e aplicáveis à ação penal e ao
interrogatório policial, tanto ao indivíduo preso quanto ao solto – art. 6º, V, e art.
186 do CPP. O conduzido é assistido pelo direito ao silêncio e pelo direito à
Resumo de Direito Processual Penal III
19
respectiva advertência. Também é assistido pelo direito a fazer-se aconselhar por
seu advogado. 8. Potencial violação à presunção de não culpabilidade. Aspecto
relevante ao caso é a vedação de trata pessoas não condenadas como culpadas –
art. 5º, LVII. A restrição temporária da liberdade e a condução sob custódia por
forças policiais em vias públicas não são tratamentos que normalmente possam
ser aplicados a pessoas inocentes. O investigado é claramente tratado como
culpado. 9. A legislação prevê o direito de ausência do investigado ou acusado ao
interrogatório. O direito de ausência, por sua vez, afasta a possibilidade de
condução coercitiva. 10. Arguição julgada procedente, para declarar a
incompatibilidade com a Constituição Federal da condução coercitiva de
investigados ou de réus para interrogatório, tendo em vista que o imputado não
é legalmente obrigado a participar do ato, e pronunciar a não recepção da
expressão “para o interrogatório”, constante do art. 260 do CPP.
2.8.1.5. Da defesa do acusado
Determina o caput do art. 261 do Código de Processo Penal:
Art. 261, caput, do Código de Processo Penal. Nenhum acusado, ainda que
ausente ou foragido, será processado ou julgado sem defensor.
Portanto, a lei confere ao acusado o direito de apresentar defesa perante os
atos a ele imputados na denúncia ou queixa.
A defesa poderá ocorrer pelo próprio acusado, denominando-se autodefesa,
ou será feito por profissional habilitado. Vejamos cada uma delas:
2.8.1.5.1. Autodefesa
A autodefesa, como o nome sugere, é a defesa apresentada pelo próprio
acusado.
Aqui, a defesa é apresentada independentemente de qualquer capacidade
técnica, isto é, não se trata de defesa apresentada por profissional habilitado.
É consubstanciada, portanto, por outros meios que lhe garantem a defesa,
como o direito de escolher o seu defensor, acompanhar os atos do processo,
acompanhar a produção das provas, comparecer em juízo para o interrogatório,
dando a sua versão dos fatos e buscando convencer o juiz acerca da verdade dos
fatos contra ele imputados.
Conforme entendimento do Supremo Tribunal Federal, essa defesa é
facultativa, podendo o acusado, inclusive, renunciá-la.
2.8.1.5.2. Defesa técnica e espécies de defensor
A defesa técnica, por outro lado, não é facultada, mas obrigatória e
irrenunciável, devendo ocorrer por meio de profissional qualificado e habilitado. É o
que determina o caput do art. 261, anteriormente transcrito.
O caráter irrenunciável e obrigatório é conferido por disposição
constitucional.
DireitoFacilitado.com.br – Natan Batista
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Vejamos:
Art. 5º, LV, da Constituição Federal. Aos litigantes, em processo judicial ou
administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e a
ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes.
Nesse sentido, não poderá ocorrer o processo sem que o acusado esteja
acompanhado de defensor, exigindo a lei resistência à pretensão para a configuração
da lide. Assim, não havendo o acusado defensor constituído, deverá o magistrado
nomear-lhe, nos termos do art. 263 do CPP:
Art. 263 do Código de Processo Penal. Se o acusado não o tiver, ser-lhe-á
nomeado defensor pelo juiz, ressalvado o seu direito de, a todo tempo, nomear
outro de sua confiança, ou a si mesmo defender-se, caso tenha habilitação.
Parágrafo único. O acusado, que não for pobre, será obrigado a pagar os
honorários do defensor, arbitrados pelo juiz.
Definida a obrigatoriedade da presença de defensor, vejamos as espécies:
(i) Defensor constituído – trata-se do defensor da confiança do acusado,
porquanto é por ele nomeado.
A representação é firmada por meio de instrumento de mandato, ou seja, por
meio de procuração ad judicia, não sendo necessário, portanto, a determinação de
poderes específicos ao representante.
A representação pactuada por meio de procuração ad judicia et extra,
contudo, dá ao defensor a capacidade para aceitar o perdão em nome do ofendido,
arguir a suspeição do magistrado, arguir falsidade documental, arguir incidente de
insanidade mental etc.
Porém, para atuar conforme os itens acima elencados, é necessário que o
representante demonstre a ciência do acusado, haja vista que o réu será por eles
responsabilizado.
Somente há uma exceção quanto à necessidade da apresentação de
procuração. É a disposição do art. 266 do CPP:
Art. 266 do Código de Processo Penal. A constituição de defensor
independerá de instrumento de mandato, se o acusado o indicar por ocasião do
interrogatório.
Lembremos, perante o interrogatório, deverá o magistrado informar ao
acusado os seus direitos, dentre eles o acompanhamento feito por profissional
habilitado, facultando-lhe a nomeação de advogado. Nesse caso, a nomeação e
atuação do profissional prescindirá de instrumento de mandato, porquanto se
presume se tratar de pessoa da confiança do acusado, tendo em vista a natureza oral
da indicação.
Em que pese o referido dispositivo indicar precisamente o interrogatório, há
entendimento fixo no sentido de que esse não é o único momento em que o acusado
Resumo de Direito Processual Penal III
21
poderá se aproveitar da nomeação de advogado sem que seja necessário a
apresentação de procuração. Já é pacificado que poderá o acusado nomear
advogado em qualquer fase do processo sem que lhe seja exigida a juntada do
referido documento de mandato.
Importante mencionar, ainda, que já tendo ocorrido a nomeação de defensor
público pelo magistrado, a nomeação de defensor constituído não importa na
descaracterização dos atos procedimentais já praticados, recebendo o novo
representante o processo na fase e forma em que se encontrar.
Por fim, cumpre ressaltar que não há disposição contrária à atuação do
próprio acusado como seu defensor (advocacia em nome próprio), desde que
habilitado para tanto.
(ii) Defensor dativo/nomeado – entende-se por dativo ou nomeado o advogado
nomeado pelo magistrado diante da inércia do acusado.
Nesse caso, é dever do representante nomeado apresentar-se perante o juízo,
somente podendo se recusar com a apresentação de motivo relevante, sob as penas
descritas no art. 264 do CPP:
Art. 264 do Código de Processo Penal. Salvo motivo relevante, os
advogados e solicitadores serão obrigados, sob pena de multa de cem a
quinhentos mil-réis, a prestar seu patrocínio aos acusados, quando nomeados
pelo Juiz.
Para entendermos a natureza do artigo acima transcrito, é necessário que
entendamos o contexto em que foi criado. Tendo por publicação o ano de 1940,
intentou o legislador a manutenção do advogado nomeado, porquanto o número de
profissionais habilitados era escasso, evitando a necessidade de nova nomeação.
Hoje, contudo, com o aumento do número de advogados, o referido
dispositivo perdeu força, sendo possível a recusa do advogado, desde apresentada
fundamentação razoável e por motivo plausível.
Não obstante, uma vez aceita a representação, não poderá abandoná-la, salvo
por motivo imperioso, nos termos do art. 265, caput, do CPP:
Art. 265, caput, do Código de Processo Penal. O defensor não poderá
abandonar o processo senão por motivo imperioso, comunicado previamente o
juiz, sob pena de multa de 10 (dez) a 100 (cem) salários mínimos, sem prejuízo das
demais sanções cabíveis.
Inclusive, ainda que dativo, incumbe ao defensor realizar a defesa técnica de
forma fundamentada, sob pena de ser substituído, nos moldes do parágrafo único
do art. 261:
Art. 261, parágrafo único, do Código de Processo Penal. A defesa técnica,
quando realizada por defensor público ou dativo, será sempre exercida através
de manifestação fundamentada.
DireitoFacilitado.com.br – Natan Batista
22
Por fim, nomeado o advogado, é dever do magistrado fixar os honorários
advocatícios. O pagamento ocorrerá a depender da hipossuficiência do acusado. Em
sendo-o, o pagamento será dever da defensoria pública. Caso contrário, caberá ao
próprio acusado realizá-lo. É o que determina o art. 263, parágrafo único:
Art. 263, parágrafo único, do Código de Processo Penal. O acusado, que
não for pobre, será obrigado a pagar os honorários do defensor dativo, arbitrados
pelo juiz.
(iii) Defensor público – por fim, dá-se por defensor público o profissional que
ocupa cargo público perante a Defensoria Pública, tendo por atribuição representar
os indivíduos beneficiados pela assistência judiciária gratuita.
2.8.1.5.3. Da ausência do defensor nas audiências processuais
Dispõe o art. 265, §1º, do CPP:
Art. 265, §1º, do Código de Processo Penal. A audiência poderá ser
aditada se, por motivo justificado, o defensor não puder comparecer.
Tendo em vista o acima transcrito, são as situações perante a ausência do
defensor nas audiências processuais:
(i) Ausência justificada – nesse caso, sendo motivada a ausência, é possível seja
a audiência redesignada, desde que o adiamento não prejudique o regular
andamento do processo.
Significa dizer, portanto, que ainda que seja apresentada motivação, uma vez
que o adiamento prejudique o andamento do processo, não há o que se falar em
redesignação.
(ii) Ausência não justificada – por outro lado, não havendo a apresentação de
motivação para ausência ou se tratando de caso em que o adiamento prejudique o
processo, não haverá redesignação, ocasião na qual o magistrado nomeará defensor
dativo em substituição ao já nomeado.
2.8.2. Do assistente de acusação
2.8.2.1. Conceito
Como vimos quando do estudo dos sujeitos processuais secundários (vide
tópico 2.2, supra), o assistente de acusação é o sujeito integrante da relação jurídico-
processual cuja presença é facultada, ou seja, cuja presença é prescindível à regular
formação da referida relação.
2.8.2.2. Quem poderá figurar como assistente
É a determinação do art. 268 do CPP:
Art. 268 do Código de Processo Penal. Em todos os termos da ação pública,
poderá intervir, como assistente do Ministério Público, o ofendido ou seu
representante legal, ou, na falta, qualquer das pessoas mencionadas no art. 31.
Resumo de Direito Processual Penal III
23
Significa dizer, portanto, que a posição de assistente de acusação, diante da
ação penal pública, será ocupada pela pessoa do ofendido, porquanto possui
interesse direto na lide, haja vista ter sido a pessoa sobre quem recaíram diretamente
os efeitos da ação delituosa, ou, na sua falta ou faltando-lhe capacidade processual,
por seu representante legal (cônjuge, ascendente, descendente ou irmão).
Tendo isso em mente, não é possível seja o ofendido afastado da relação
jurídico-processual.
Nesse caso, permanecerá em posição aderente ao autor da ação, ao polo ativo
da ação, ou seja, ao Ministério Público, denominando-se sujeito colateral ou parte
contingente do processo.
Importante ressaltar, contudo, que a ocupação da referida posição é facultada
ao ofendido, não lhe sendo, portanto, obrigada. É necessário, para tanto, demonstre
expresso interesse na participação da relação jurídico-processual.
• • • •
Quanto aos representantes legais do ofendido, porém, insta fazermos alguns
comentários. Primeiro, é a determinação do art. 31 do CPP, ora citado:
Art. 31 do Código de Processo Penal. No caso de morte do ofendido ou
quando declarado ausente por decisão judicial, o direito de oferecer queixa ou
prosseguir na ação passará ao cônjuge, ascendente, descendente ou irmão.
De pronto, cumpre informar que o rol acima transcrito é taxativo, ou seja,
exaure em si, não admitindo interpretações extensivas ou analógicas.
Quanto à figura do cônjuge, não somente em relação àquele com quem se
contrai matrimônio é que a lei resguarda o direito de representar o ofendido,
estendendo-se tal direito, também, àquele com quem se mantém união estável.
Ademais, o rol acima elencado possui ordem vocacional, ou seja, apresenta
ordem preferencial certa que deve ser respeitada quando da representação do
ofendido. Incapacitado o ofendido, caberá primeiramente ao cônjuge lhe
representar, somente atingindo os demais indivíduos na falta dos antecessores.
Em que pese os indivíduos acima elencados, surge algumas perguntas:
(i) Poderá o inventariante atuar como assistente da acusação?
Entende-se por inventariante aquele responsável pela formalização da
transmissão do espólio do de cujus aos seus herdeiros, permanecendo como
administrador dos bens até a consolidação formal da sucessão patrimonial.
Respondendo à pergunta: não é possível que o inventariante figure como
assistente da acusação em representação ao ofendido, porquanto, como dito, o rol
apresentado no art. 31 é taxativo, não comportando a aplicação de interpretação
extensiva ou analógica, salvo se o inventariante for, ao mesmo tempo e em relação
ao ofendido, qualquer dos entes dispostos no referido artigo.
DireitoFacilitado.com.br – Natan Batista
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(ii) Poderá o Estado atuar como assistente da acusação?
A pergunta surge, pois há situações em que o Estado figura tanto como sujeito
passivo constante, como eventual. Nesses casos, é possível que atue como assistente
da acusação?
Inicialmente, a resposta é não, porquanto o Ministério Público, representante
do Estado, age em nome do interesse público, fazendo com que a presença do Estado
propriamente dito seja desnecessária.
Ocorre, contudo, que há posicionamento doutrinário recente que defende a
possibilidade da atuação do Estado como assistente da acusação.
Indicam que anteriormente à Constituição Federal de 1988 o Ministério
Público era órgão vinculado ao Estado, incumbindo-lhe agir em prol dos interesses
públicos primários (referentes à sociedade – direitos transindividuais) e secundários
(interesse do Estado enquanto pessoa jurídica).
A Constituição, porém, foi responsável por dar ao Ministério Público
autonomia, não mais exigindo-o aja em defesa dos interesses públicos secundários,
mas somente em relação aos primários.
Nesse sentido, passou a configurar órgão autônomo administrativa, financeira
e institucionalmente, compondo novo elemento dos Poderes sem que, contudo,
estivesse atrelado a qualquer um deles. O Ministério Público passou a ser um grande
defensor da sociedade, agindo, inclusive, em alguns casos, contra os interesses do
próprio Estado.
Tendo isso em mente, entendem que em que pese o Ministério Público agir
em nome do Estado, não é obrigado a fazê-lo, motivo pelo qual seria possível que o
Estado ocupasse a função de assistente da acusação, aderindo ao MP no polo ativo da
demanda.
(iii) Poderá o corréu atuar como assistente da acusação?
A pergunta se dá principalmente nos casos em que o réu é, ao mesmo tempo,
vítima do fato criminoso. É o que ocorre, por exemplo, no caso de lesões corporais
recíprocas.
Aqui, contudo, vigora o disposto no art. 270 do Código de Processo Penal:
Art. 270 do Código de Processo Penal. O co-réu no mesmo processo não
poderá intervir como assistente do Ministério Público.
Significa dizer que não é possível que o mesmo indivíduo ostente, na mesma
ação, mais de uma posição processual.
Ainda assim a dúvida permanece: havendo a absolvição de um dos corréus e a
condenação dos demais, é possível que aquele a quem foi destinada a sentença
absolutória se habilite como assistente da acusação em face dos demais condenados?
Não é possível, porquanto tal condição somente se tornará inalterável com o trânsito
Resumo de Direito Processual Penal III
25
julgado e, conforme veremos adiante, a atuação do assistente da acusação se limite à
fase processual, não sendo possível, portanto, a ocorrência da situação acima
narrada.
2.8.2.3. Natureza da atuação do assistente da acusação
Quanto à atuação do assistente da acusação, são três as posições destacadas
na doutrina. Vejamos:
(i) Afirma ter a atuação do assistente da acusação caráter indenizatório,
porquanto o indivíduo que assim atua busca um interesse próprio, consubstanciado
no alcance de justa indenização pelos efeitos que sofreu em virtude da ação
criminosa.
(ii) Por outro lado, indica que a atuação do assistente da acusação tem caráter
acusatório, buscando o indivíduo a justa condenação daquele que agiu em
desconformidade com as normas penais estabelecidas.
As duas primeiras correntes, porém, não são adotadas pelo ordenamento
jurídico, pois apresentam empecilhos práticos. Enquanto a adoção da primeira
impede a possibilidade de interposição de recurso diante da condenação do agente,
haja vista já ter sido concedida a indenização devida; a segunda corrente impediria o
ofendido de ver indenizados os sofrimentos causados pela ação delituosa.
Por esse motivo, surgiu e é adotada a terceira corrente:
(iii) Determina que a atuação do assistente da acusação tem, ao mesmo tempo,
caráter indenizatório e condenatório, ou seja, busca o assistente a justa condenação
do acusado, bem como ter seu sofrimento devidamente indenizado.
2.8.2.4. Ingresso do assistente no processo
Para que o assistente da acusação integre a relação jurídico-processual, é
necessário que, antes, seja habilitado a participar do processo.
Nesse sentido, é a disposição do art. 269 do CPP:
Art. 269 do Código de Processo Penal. O assistente será admitido
enquanto não passar em julgado a sentença e receberá a causa no estado em que
se achar.
Ora, sendo sujeito processual, o momento de atuação do assistente da
acusação é óbvio, consubstanciando-se pelo tempo em que perdurar o processo. Por
isso, é possível requeira sua admissão desde o oferecimento da denúncia ou queixa
até que transite em julgado a sentença condenatória, haja vista se tratar do fato que
encerra a referida fase.
Significa dizer, portanto, que não existe a figura do assistente de acusação
perante a fase investigatória, ou seja, diante da fase de inquérito policial, da mesma
forma que se inadmite sua participação na fase executória.
DireitoFacilitado.com.br – Natan Batista
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Importante ressaltarmos, contudo, existir uma exceção:
Art. 430 do Código de Processo Penal. O assistente somente será admitido
se tiver requerido sua habilitação até 5 (cinco) dias antes da data da sessão na
qual pretende atuar.
Nesse caso, portanto, intentando participar do Júri, é necessário que
manifeste interesse em até cinco dias da data da sessão em que pretende atuar.
2.8.2.5. Da habilitação do assistente
Para que o indivíduo atue como assistente da acusação, é necessário que
possua capacidade postulatória, ou seja, é necessário que possua ele mesmo
habilitação técnica ou se faça representar por profissional habilitado através de
instrumento de mandato.
O pedido de habilitação se dará por meio de petição escrita, devendo proceder
a oitiva do Ministério Público3 anteriormente à decisão do magistrado, que será,
inclusive, irrecorrível, nos moldes do art. 273 do CPP:
Art. 273 do Código de Processo Penal. Do despacho que admitir, ou não, o
assistente, não caberá recurso, devendo, entretanto, constar dos autos o pedido
e a decisão.
Em que pese a impossibilidade de interposição de recurso, é possível seja
impetrado mandado de segurança (ação autônoma de impugnação), tendo em vista
a violação de direito certo e líquido que o Código confere ao acusado ou ao seu
representante legal.
Uma vez admitido no processo, passará a ser intimado de todos os atos
processuais. Contudo, sua presença é prescindível, porquanto não configura sujeito
processual principal, mas secundário. Significa dizer que a sua ausência não importa
na impossibilidade de execução dos atos processuais, haja vista que sua participação
é facultativa.
Porém, sua ausência deverá ser justificada, sob pena de não mais ser intimado
dos atos processuais praticados, apesar de permanecer na qualidade de parte do
processo enquanto sujeito processual secundário habilitado. Nesse caso, ou seja, não
havendo justificativa da ausência, é necessário proceda diligências com o intuito de
conhecer acerca da situação do processo.
Por outro lado, justificando a sua ausência, continuará a ser intimado
normalmente.
2.8.2.6. Função do assistente da acusação
A função do assistente de acusação consubstancia-se em cinco direitos, quais
sejam:
3 Art. 272 do Código de Processo Penal. O Ministério Público será ouvido previamente sobre a admissão do assistente.
Resumo de Direito Processual Penal III
27
(i) Direito de propor meios de prova – conforme veremos adiante, meio de
prova é tudo quanto possa servir, direta ou indiretamente, para a comprovação da
verdade que se procura no processo. Nesse sentido, é possível que o assistente da
acusação proponha qualquer elemento capaz de comprovar a verdade dos fatos.
A dúvida que se insurge, contudo, é em relação às testemunhas: poderá o
assistente da acusação arrolar testemunhas? Há, aqui, um empecilho temporal prático,
porquanto o mesmo elemento que dá início ao período de aceitação da habilitação
do assistente da acusação é o instrumento pelo qual se arrolará as testemunhas
ouvidas durante o processo: a denúncia.
Por isso, entende a parcela majoritária da doutrina não ser possível que o
assistente da acusação proceda o arrolamento de testemunhas, porquanto não tem
capacidade para intervir no momento em que a apresentação do referido rol é
exigida.
Nesse sentido, a única possibilidade seria se o juiz, entendendo ser essencial
para o escorreito deslinde da causa, requeresse ao assistente a indicação de
testemunhas a serem ouvidas.
Contudo, vem ganhando força um segundo posicionamento, no sentido de
que, não estando habilitado o assistente em tempo hábil para apresentar
testemunhas, não deveria recair sobre ele os efeitos da preclusão do referido direito,
devendo ser permitido que complemente o rol apresentado pelo Ministério Público.
(ii) Direito de participar ativamente da produção de provas – portanto, não
somente terá direito de propor a produção de provas, mas é possível que participe
efetivamente de sua produção. Significa dizer que tem o direito, por exemplo, de
apresentar questionamentos às testemunha, pedir esclarecimentos diante da oitiva
réu, indicar assistente técnico etc.
(iii) Direito de aditar o libelo e os articulados – primeiramente, convém
esclarecer que a figura do libelo não mais existe no Direito Processual Penal. Tratava-
se de peça processual segundo a qual o Promotor de Justiça descrevia suas
pretensões perante a segunda fase do júri. Hoje, contudo, somente cabe ao
Ministério Público indicar o rol de testemunhas em tal fase.
Determina o Dicionário Jurídico Acquaviva:
Do latim libellus, diminutivo de liber, livro.
Na linguagem processual, o libelo vem a ser, conforme Hélio Tornaghi, “a
expressão articulada do fato criminoso com a indicação do nome do réu, das
circunstâncias agravantes previstas na lei penal, dos fatos e circunstâncias que
devam influir na fixação da pena ou da medida de segurança eventualmente
aplicável. Com a modificação trazida ao CP pela L. 7.209/84, medida de segurança
só se aplica ao inimputável (total ou parcialmente) e esse deve ser absolvido na
fase de pronúncia (art. 411). Esse é o conceito que se dessume do art. 417 do CPP”.
[...]
DireitoFacilitado.com.br – Natan Batista
28
Quanto aos articulados, porém, tratam-se da possibilidade de o assistente da
acusação apresentar alegações escritas durante o processo, principalmente no que
tange às alegações finais.
(iv) Direito de participar dos debates orais – sempre que prevista a
manifestação oral, tem o assistente o direito de se manifestar. Ou seja, é-lhe
garantida a palavra.
(v) Capacidade e legitimidade recursal – ao assistente da acusação é garantida
a legitimidade para interpor recursos. Essa legitimidade recursal, porém, é
subsidiária/supletiva, somente podendo ser exercida quando da desídia do Ministério
Público. Tanto o é que o prazo recursal do assistente somente se inicia após
transcorrido o prazo para a interposição de recurso por parte do Ministério Público.
Ademais, ao assistente também é garantido o direito de arrazoar os recursos
interpostos pelo Ministério Público e contra-arrazoar os recursos interpostos pelos
acusados. Significa dizer que ao assistente é garantido o direito de apresentar as
razões juntamente ao Ministério Público, podendo, também, manifestar-se por meio
de contrarrazões aos recursos interpostos pela parte contrária.
2.8.3. Dos funcionários da Justiça
Determina o art. 274 do CPP:
Art. 274 do Código de Processo Penal. As prescrições sobre suspeição dos
juízes, estende-se aos serventuários e funcionários da justiça, no que lhes for
aplicável.
Portanto, os elementos referentes à suspeição e impedimento incidirão
igualmente nos funcionários da justiça.
Resumo de Direito Processual Penal III
29
Teoria Geral da Prova
1. Introdução
Como dissemos quando da introdução deste resumo, os procedimentos que
compõem o Direito Processual Penal têm início com o surgimento da lide,
consubstanciada pelo conflito de interesses entre o Estado, que visa impor seu jus
puniendi em desfavor do suspeito de ter praticado infração penal, o qual se insurge,
defendendo seu jus libertatis.
A resolução da lide incumbe ao juiz a tarefa de recuperar o fato pretérito
ocorrido (fato criminoso), buscando conhecer todos os elementos a ele atinentes,
alcançando a verdade fática e proferindo sentença justa.
Nesse sentido, todos do atos procedimentais ocorrerão com um único e
coincidente objetivo, qual seja, fazer reviver o ato criminoso ensejador da lide, haja
vista se tratar do meio pelo qual o magistrado alcançará a verdade.
Por óbvio, portanto, é necessário que o juiz conheça acerca do fato objeto da
lide. Para tanto, é necessário que de alguma forma reproduza o fato
pretérito/passado, dando-lhe capacidade para, cada vez mais, alcançar entendimento
verossimilhante com a realidade.
O mecanismo segundo o qual se intentará reproduzir o fato pretérito é a
prova.
Nas palavras de Fernando da Costa Tourinho Filho, “prova são os elementos
produzidos pelas partes ou pelo próprio juiz, visando a estabelecer, dentro do processo,
a existência de certos fatos”. Segundo Edilson Mougenot, “prova é o instrumento
utilizado pelos sujeitos processuais para comprovar os fatos da causa, isto é, aquelas
alegações que são deduzidas pelas partes como fundamentais para o exercício da tutela
jurisdicional”.
Portanto, prova nada mais é que o mecanismos segundo o qual se busca trazer
a verdade perante o processo, reproduzindo o fato pretérito, de modo a fazer com
que o juiz conheça-0, fazendo incidir o direito no caso concreto e dando solução à
lide.
2. Conceitos
Anteriormente ao estudo aprofundado de cada um das provas, é necessário
que estabeleçamos a conceituação de alguns elementos essenciais.
Nesse sentido, afirma Edilson Mougenot:
O processo é uma atividade racional, voltada à assunção de um objetivo,
que é a aplicação do direito para obter a pacificação dos conflitos de interesse que
DireitoFacilitado.com.br – Natan Batista
30
surjam na sociedade. Nesse contexto, também a prova se pauta por regras e
princípios organizados segundo critérios lógicos.
Vejamos:
2.1. Objetivo da prova
Entende-se por objetivo da prova a finalidade da mesma, ou seja, o fim que se
busca com a sua aplicação. Portanto, a partir do raciocínio acima construído, tem-se
por objetivo da prova a formação da convicção do juiz, fazendo-o conhecer acerca do
fato pretérito objeto da lide, sobre o qual deve fazer incidir o Direito, dando-lhe
resolução adequada.
2.2. Objeto de prova
Entende-se por objeto de prova aquilo sobre o que deve o magistrado adquirir
conhecimento adequado para o escorreito deslinde da causa, ou seja, trata-se dos
fatos sobre os quais deve possuir conhecimento, entendendo-se por fato todo e
qualquer acontecimento do mundo exterior.
Nas palavras de Manzini, “objetos de prova são todos os fatos, principais ou
secundários, que reclamem uma apreciação judicial e exijam uma comprovação”.
Nesse sentido, é necessário que o magistrado saiba organizar os fatos que lhe
são noticiados, atendo-se àqueles relevantes para o conhecimento do fato criminoso
que é objeto da lide.
Tendo isso em mente, de rigor reconhecermos que nem todo fato será objeto
de prova.
2.2.1. Não serão objeto de prova
(i) Fatos inúteis ou irrelevantes – tem-se por fatos inúteis ou irrelevantes
aqueles que não são aptos a influenciar o deslinde da causa, ou seja, são os fatos cujo
conhecimento acerca dos quais é indiferente para a compreensão do objeto da lide.
Presentes ou não, não interferirão na cognição judicial.
Contudo, o utilidade ou não dos fatos somente se alcançará na análise
concreto de cada caso, devendo o juiz identificá-las e deixar de levantá-las – frustra
probatur quod probantum non relevat.
(ii) Fatos notórios – entende-se por fatos notórios aqueles cujo conhecimento
não necessita de comprovação prévia, porquanto o conhecimento dele retirado já é
certo e definido, não se tratando, portanto, de mera opinião/cognição, não se
confundindo, logo, com a denominada vox populi/vox publica – notoria non egent
probatione.
Presume-se que o conhecimento de fato notório faça parte do patrimônio
estável do cidadão de cultura média em uma sociedade.
Resumo de Direito Processual Penal III
31
(iii) Fatos evidentes, intuitivos ou axiomáticos – tem-se por fato evidente ou
intuitivo aquele cuja percepção já revela a cognição que dele se extrai, sendo,
portanto, certo e indiscutível. Basta a simples observação atenta para que dele se
tenha certeza. O fato é esclarecido por si e em si, não necessitando de explicações
adicionais.
(iv) Presunções legais – trata-se de fatos considerados presumíveis em virtude
de disposição legal que assim os considera. São duas as espécies de presunção legal:
(iv.i) Presunção legal absoluta – trata-se dos fatos presumidos por
determinação legal, não sendo possível que contra eles se faça prova em contrário,
iure et de iure. Podemos citar como exemplo a inimputabilidade dos menores de 18
anos.
(iv.ii) Presunção legal relativa – por outro lado, temos por presunção legal
relativa a qualidade que recai sobre fatos assim considerados em lei, porém sobre os
quais é permitida a prova em contrário, ou seja, presume-se desde que não haja
comprovação de situação diversa, iuris tantum. É exemplo a autenticidade de
documento emitido por órgão público.
2.2.2. São objeto de prova?
Em que pese temos indicado quais são os objetos de prova e os elementos
que não serão assim considerados, há elementos cuja consideração como objeto de
prova é uma incógnita. Por isso, cabe a nós discutir acerca de sua natureza
probatória.
(i) Fatos incontroversos – nas palavras de Mougenot, fatos incontroversos são
“aqueles alegados por uma das partes e não contestados pela outra”.
Pergunta-se: são objeto de prova?
Serão sim objeto de prova em virtude do Princípio da Verdade Real, sendo
necessário que haja diligências que busquem confirmar a sua veracidade.
(ii) Direito – ainda que com base no Direito, uma vez que dispostos em norma
específica, restrita a um Estado-Membro ou Município, por exemplo, de direito
estrangeiro ou consuetudinária, é necessário que os fatos indicados por esse meio
sejam comprovados, confirmando-se a sua regular existência e vigência.
Em se tratando de norma geral (federal), porém, não é necessário que haja a
comprovação de sua vigência, porquanto iura novit curia (o juiz conhece do Direito).
• • • •
Por fim, perguntemo-nos: quais fatos serão objeto de prova? Serão objeto de
prova os elementos indicados pelas fontes de prova.
DireitoFacilitado.com.br – Natan Batista
32
2.3. Fontes de prova
Entende-se por fonte de prova tudo aquilo capaz de indicar os elementos cuja
comprovação é imprescindível para o escorreito deslinde da causa, ou seja, é tudo
aquilo capaz de indicar os objetos de prova. Podemos citar como exemplo a própria
denúncia ou queixa ou defesa apresentada pelo acusado, capazes de elencar
elementos cuja comprovação deve ser procedida durante o processo e dos quais o
juiz intenta conhecer para lhes aplicar o Direito, resolvendo a lide e proferindo
sentença justa.
Pergunta-se: como serão provados os elementos indicados pelas fontes de
prova? A comprovação se dará através dos denominados meios de prova.
2.4. Meios de prova
Meio de prova é todo fato, documento, alegação ou objeto que possa servir,
direta ou indiretamente, para comprovar a verdade relativa ao objeto da lide, o ato
criminoso. São, portanto, mecanismos utilizados para a obtenção da prova, ou seja,
comprovam os objetos de prova indicados pelas fontes de prova.
Em outras palavras, são os instrumentos utilizados pelo juiz para formar a sua
convicção acerca dos fatos alegados nos autos.
Quanto aos meios de prova, determina o Código:
Art. 369 do Código de Processo Civil. As parte têm o direito de empregar
todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não
especificados neste Código, para provar a verdade dos fatos em que se funda o
pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz.
Trata-se da materialização do Princípio da ampla liberdade da produção de
provas ou Princípio da ampla liberdade de utilização dos meios de prova, aplicável ao
Processo Penal, igualmente.
Insta informar que há uma distinção em relação aos meios de prova. Vejamos:
(i) Meios de prova nominados – são assim entendidos os meios de prova
previstos pelo Código de Processo Penal, sendo eles:
(i.i) Interrogatório – arts. 185 a 196 do CPP e Lei nº 10.792/03;
(i.ii) Acareação – arts. 229 a 230 do CPP;
(i.iii) Depoimento do ofendido – art. 201 do CPP;
(i.iv) Depoimento das testemunhas – arts. 202 a 225 do CPP;
(i.v) Prova pericial – arts. 158 a 184 do CPP;
(i.vi) Reconhecimento de pessoas e coisas – arts. 226 a 228 do CPP;
(i.vii) Prova documental – arts. 165, 170 e 231 a 238 do CPP;
(i.viii) Busca e apreensão – arts. 240 a 250 do CPP.
(ii) Meios de prova inominados – por outro lado, entende-se por meios de prova
inominados aqueles não previstos pelo Código de Processo Penal, porém que ainda
Resumo de Direito Processual Penal III
33
assim podem ser utilizados pelas partes, haja vista a prevalência do Princípio da
Verdade Fática que rege o Direito Processual Penal.
2.4.1. Princípio da ampla liberdade da produção de provas
O acima exposto, como dito, é assim determinado em virtude da existência do
Princípio da ampla liberdade da produção de provas ou da utilização dos meios de
prova.
Contudo, cumpre ressaltar que o referido princípio não é absoluto. Conforme
determina o art. 369 do CPC, anteriormente transcrito, é necessário que os meios de
prova sejam moralmente legítimos.
Nessa senda, não serão permitidas as seguintes provas:
2.4.1.1. Questões de estado
Determina o art. 155, parágrafo único, do CPP:
Art. 155, parágrafo único, do Código de Processo Penal. Somente quanto
ao estado das pessoas serão observadas as restrições estabelecidas na lei civil.
Significa dizer que em que pese a liberdade na utilização dos meios de prova,
tratando-se de questões de estado, somente é possível que seja feita prova através
dos modelos determinados na lei civil.
Por exemplo, a comprovação de contração de casamento não suportará meio
de prova diverso, senão a apresentação de certidão que assim determine.
Na mesma senda é a Súmula nº 74 do Superior Tribunal de Justiça:
Súmula nº 74 do Superior Tribunal de Justiça. Para efeitos penais, o
reconhecimento da menoridade do réu requer prova por documento hábil.
2.4.1.2. Provas proibidas
Entende-se por prova proibida aquela que intenta contra o Direito e cuja
produção se dá através da violação de norma jurídica.
As provas proibidas são dividas em duas espécies, quais sejam:
2.4.1.2.1. Provas ilegítimas
Diz-se prova ilegítima aquela cuja proibição é constatada pela violação de
norma processual.
O legislador preocupou-se em estabelece o procedimento segundo o qual o
processo seria regido. A não observância desses critérios processuais previstos em
lei gera sanções à parte. A depender da gravidade do vício, é possível se reconheça
acerca da referida prova a irregularidade, a nulidade relativa ou absoluta ou até
mesmo ser considerada ato inexistente.
DireitoFacilitado.com.br – Natan Batista
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Podemos citar como exemplo a juntada de documentos fora do prazo
processual estipulado.
2.4.1.2.2. Provas ilícitas
Por outro lado, tem-se por provas ilícitas aquela cuja proibição reflete na não
observância de norma constitucional ou legal de natureza material. Conforme
determinam os arts. 5º, LVI, da Constituição Federal e 157, caput e §3º, do Código de
Processo Penal, devem ser desentranhadas do processo:
Art. 5º da Constituição Federal. Todos são iguais perante a lei, sem
distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros
residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes:
[...]
LVI – são inadmissíveis no processo, as provas obtidas por meios ilícitos.
• • • •
Art. 157, caput, do Código de Processo Penal. São inadmissíveis, devendo
ser desentranhadas do processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas
em violação a normas constitucionais ou legais.
[...]
§3º. Preclusa a decisão de desentranhamento da prova declarada
inadmissível, esta será inutilizada por decisão judicial, facultado às partes
acompanhar o incidente.
Interessante fazermos um comentário acerca das alterações geradas pelo
Pacote Anticrime: em que pese não estar em vigor, prevê disposição segundo a qual
o magistrado que tem acesso a prova ilícita deverá ser afastado do processo, sendo
substituído por outro para que não haja qualquer mácula no entendimento proferido
na sentença que possa ser gerado pela prova ilícita desentranhada.
O entendimento é no sentido de que o entendimento do juiz que tem acesso
à prova ilícita estaria comprometido, maculado, não mais podendo sendo possível
que profira sentença nos autos, visando a imparcialidade daquele que julga.
É a determinação do §5º do art. 157, cujos efeitos foram suspensos por decisão
liminar proferida pelo Supremo Tribunal Federal:
Art. 157, §5º, do Código de Processo Penal. O juiz que conhecer do
conteúdo da prova declarada inadmissível não poderá proferir a sentença ou
acordão.
Importante comentar que já existe posicionamento contrário à referida
substituição do juiz, porquanto, defendem, faz transparecer que o magistrado tenha
agido de má-fé, não se atendo à imparcialidade da Justiça.
Resumo de Direito Processual Penal III
35
Ademais, a substituição do magistrado pode ser movimentação processual
que acarrete na morosidade e dificuldade da prestação jurisdicional, principalmente
no que se refere às comarcas isoladas e de vara única.
• • • •
Além das provas ilícitas propriamente ditas, convém que falemos acerca das
provas ilícitas por derivação.
Entende-se por prova ilícita por derivação a prova produzida em virtude de ato
ilícito que a antecede, ou seja, a produção da prova não é, em si, ilícita, mas
decorrente de ato ilícito anterior.
Para entendermos melhor, é necessário que visualizemos duas teorias, quais
sejam:
(i) Teoria dos frutos da árvore envenenada (fruits of the poisoness tree) – a
referida teoria, adotada pelo Código de Processo Penal, determina que a prova
derivada de fato ilícito deverá ser igualmente assim entendida.
Nas palavras de Edilson Mougenot:
A denominada de teoria ou doutrina “do fruto da árvore envenenada” –
também utilizada no singular, “fruto da árvore envenenada” –, literal tradução do
inglês (fruit of the poisonous tree doctrine), diz respeito a um conjunto de regras
jurisprudenciais nascidas na Suprema Corte norte-americana, segundo as quais as
provas obtidas licitamente, mas que sejam derivadas ou sejam consequência do
aproveitamento de informação contida em material probatório obtido com
violação dos direitos constitucionais do acusado, estão igualmente viciadas e não
podem ser admitidas na fase decisória do processo penal. Vale dizer: tal teoria
sustenta que as provas ilícitas por derivação devem igualmente ser desprezadas,
pois “contaminadas” pelo vício (veneno) da ilicitude do meio usado para obtê-las.
A teoria é assim denominada, porquanto defende que se uma árvore está
envenenada os seus frutos também estarão em virtude de estarem a ela ligados e
dela derivarem.
Essa teoria, porém, apresenta exceções. São as denominadas exceção da fonte
independente, exceção da descoberta inevitável e exceção da conexão atenuada.
Afirmam que mesmo provenientes de meio ilícito, não há o que se falar em
ilicitude da prova uma vez que não seja possível estabelecer o nexo causal entre esta
e o ato ilícito que a antecede ou seja comprovado que a mesma prova seria
inevitavelmente produzida no regular andamento do processo e pelos meios lícitos
de que dispõe.
É o que determinam os §§ 1º e 2º do art. 157:
Art. 157 do Código de Processo Penal. [...]
§1º. São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, salvo quando
não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e outras, ou quando as
derivadas puderem ser obtidas por uma fonte independente das primeiras.
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§2º. Considera-se fonte independente aquela que por si só, seguindo os
trâmites típicos e de praxe, próprios da investigação ou instrução criminal, seria
capaz de conduzir ao fato objeto da prova.
(ii) Teoria da proporcionalidade – por outro lado e indo de encontro à teoria
dos frutos da árvore envenenada, a teoria da proporcionalidade. Como bem sabemos,
a todo momento nos deparamos com situações em que entram em conflito dois ou
mais princípios, ocasião na qual há a decisão que aplica um em detrimento do outro.
Grande parte das vezes utiliza-se do Princípio da Proporcionalidade para tanto,
sopesando-se as consequências da decisão.
No mesmo sentido é a teoria da proporcionalidade. Havendo conflito de
interesses, sendo um a ilicitude do meio de prova e o outro a licitude da prova que
dele deriva, defende a referida teoria que é necessário que haja o sopesamento da
violação em detrimento do valor probatório obtido com a admissão da prova
derivada, aplicando-se o entendimento que sustenta a permanência da prova, se
superior em comparação com o direito violado, ou que reconhece a ilicitude, em se
tratando de violação que não excede o valor probatório do fato.
Assevera Nelson Nery Jr.:
Se o direito à inviolabilidade da intimidade (CF, 5º, X) e das comunicações
telefônicas (CF, 5º, XIII) são garantidos pela Constituição Federal, não menos
verdade é que existem outros direitos igualmente tutelados pelo texto
constitucional, como, por exemplo, direito à vida e liberdade, mencionados como
bens jurídicos de extrema importância, já que vêm no próprio caput do art. 5º da
Constituição Federal, antes, portanto, da enumeração dos demais direitos
fundamentais. Como não pode haver incompatibilidade entre preceitos
constitucionais, é preciso que direitos constitucionais aparentemente em conflito
ou antagônicos, sejam harmonizados e compatibilizados entre si pelo intérprete
e aplicador da norma.
• • • •
Antes de encerramos o estudo acerca dos meios de prova, convém que
falemos especificamente acerca do desentranhamento.
São duas as formas de desentranhamento, quais sejam:
(i) Desentranhamento por meio incidental – ocorre quando as partes arguem
exceção de ilicitude, devendo o juiz apreciar o requerimento, desentranhando a prova
no caso de confirmação de sua ilicitude;
(ii) Desentranhamento de ofício – momento em que o magistrado, de ofício,
determina a ilicitude da prova, desentranhando-a, podendo as partes, inclusive,
acompanhar o incidente.
Resumo de Direito Processual Penal III
37
2.5. Elementos de prova
Entende-se por elementos de prova todo elemento direto da utilização dos
meios de prova, ou seja, tratam-se de todos os fatos ou circunstâncias em que
repousa a convicção do juiz.
Como exemplo, tem-se por meio de prova a testemunha, enquanto entende-
se por elemento de prova o próprio testemunho. Igualmente, a perícia é meio de
prova, sendo elemento de prova o resultado que dela provém. O ofendido é o meio de
prova, enquanto suas declarações são elementos de prova.
3. Classificação das provas 3.1. Quanto ao objeto
(i) Direta – são diretas as provas que demonstram o fato de forma imediata,
ou seja, demonstram, por si só, os fatos diretamente ligados ao crime. Dá-se pelos
fatos constitutivos do crime. Ex.: testemunha ocular.
(ii) Indireta – por outro lado, entende-se por indiretas as provas que
comprovam fatos estranhos ao objeto da lide, porém que, ao mesmo tempo, o
atingem. Nas palavras de Edilson Mougenot, afirma um fato que se busque provar. Ex.:
álibi, indícios, presunções e suspeitas.
3.2. Quanto ao valor ou efeito
(i) Plena, perfeita ou completa – dá-se pelas provas que permitem ao juiz
construir convicção plena acerca do fato criminoso, ou seja, é a prova cabal, podendo
convencer o juiz acerca do caráter condenatório ou absolutório da sentença.
Podemos citar como exemplo a prova documental, testemunhal, pericial etc.
(ii) Não plena, imperfeita ou incompleta – de outra mão, tem-se por prova não
plena aquela que é refutável, ou seja, gera dúvida no juiz, não lhe dando suporte para
criar as convicções acerca do fato criminoso. Por isso, não necessariamente será
capaz de influenciar o caráter condenatório ou absolutório da sentença. Contudo,
lembremos, in dubio pro reo. São exemplos os indícios e fundada suspeita.
3.3. Quanto à fonte
(i) Pessoal – dá-se pela prova que apresenta como origem a manifestação
humana. São elementos a prova testemunhal, pericial etc.
(ii) Real – por outro lado, prova real é aquela que se origina em virtude de
elementos físicos. Ex.: objetos do crime (arma, faca etc), produtos do crime (cadáver,
por exemplo).
3.4. Quanto à origem
(i) Originária – é a prova fornecida sem que haja intermediários, ou seja, a
prova está diretamente ligada ao fato. Ex.: testemunha ocular, pois presencia o
crime, dando informações diretas sobre ele.
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(ii) Derivada – aqui, diferentemente da classificação acima destacada, há
elemento que se põe entre a prova e o fato. Ex.: testemunho do testemunho.
4. Da Prova Emprestada
Entende-se por prova emprestada, literalmente, a prova produzida em um
processo e aproveitada em outro.
O STJ já se pronunciou no sentido de que somente é possível a adoção de
prova emprestada, desde que sua produção tenha observado as normas legais,
sendo, portanto, válida, não sendo possível seja o único elemento responsável pela
formação da convicção do juiz.
É a ementa do HC de nº 126.302/PR:
HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. REVOGAÇÃO NEGADA.
DETERMINAÇÃO DE APENSAMENTO DE PROVA EMPRESTADA. INTERCEPTAÇÃO
TELEFÔNICA. UTILIZAÇÃO. POSSIBILIDADE. SEGREGAÇÃO QUE NÃO ESTÁ BASEADA
TÃO-SOMENTE NA REITERAÇÃO DELITIVA. CUSTÓDIA JUSTIFICADA. OFENSA AO ART.
155 DO CPP AFASTADA. LICITUDE E LEGALIDADE NA COLHEITA DA PROVA APENSADA.
CIÊNCIA ÀS PARTES. POSSIBILIDADE DE CONTESTAÇÃO PELA DEFESA.
CONTRADITÓRIO RESPEITADO. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DO DUE
PROCESS OF LAW. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO DEMONSTRADO.
DESENTRANHAMENTO DA ESCUTA TELEFÔNICA QUE NÃO SE MOSTRA DEVIDO. 1. Não
estando a decisão que ordenou a preventiva embasada única e exclusivamente nos
elementos informativos colhidos através de prova emprestada – escuta telefônica
devidamente autorizada judicialmente – justificando-se a prisão também a bem da
aplicação da lei penal, diante da evasão do paciente do distrito da culpa, não há o
que se falar em desobediência ao previsto no art. 155 do CPP, até porque
devidamente motivado o decreto de custódia antecipada. 2. Permitem tanto a
doutrina quanto a jurisprudência a utilização de prova emprestada no processo
criminal, desde que tenha sido produzida legalmente, ambas as partes dela tenham
ciência e seja-lhes garantido o direito ao contraditório. 3. A prova emprestada sub
examine é lícita, porque produzida sem violação às normas constitucionais ou legais
(art. 157, caput, do CPP), e legítima, vez que obtida em respeito às regras processuais.
4. Não há ofensa ao princípio do due process of law, do qual são corolários os
princípios da ampla defesa e do contraditório, diante da juntada em apenso, por
ordem judicial, aos autos da ação penal, de cópia de interceptação telefônica
produzida através de inquérito policial em que se investigava a continuidade da
prática criminosa imputada ao paciente e demais membros de quadrilha
especialmente voltada ao cometimento de crimes de contrabando ou descaminho
de cigarros oriundos do Paraguai, pois além de não ter sido utilizada como único
subsídio para a manutenção da prisão preventiva, com tal procedimento permitiu-
se às partes ciência integral do teor das gravações, e, via de consequência, que
fossem devidamente contraditadas, antes do julgamento da apelação criminal em
curso perante o TRF da 4ª Região. 5. Ademais, a defesa do réu, bem antes de o feito
ser encaminhado à Corte originária, teve acesso à integralidade da representação
criminal impugnada, e, consequentemente, oportunidade de contestar os
elementos de prova ali contidos. 6. Ordem denegada (STJ – HC: 126302 PR
2009/0009324-4, Relator: Ministro JORGE MUSSI, Data de Julgamento:
23/06/2009, T5 – QUINTA TURMA, Data de Publicação: --> DJe 03/08/2009).
Resumo de Direito Processual Penal III
39
Como visto, portanto, é imprescindível que não seja o único elemento a
formar a convicção do magistrado, não se tratando, logo, de prova plena.
Para que seja considerada plena, elenca a doutrina alguns requisitos:
Alguns autores alegam ainda que a prova emprestada não tem a mesma
força probante que teve no processo do qual é originária. Dessa forma, para ter
eficácia plena, ela deverá obedecer a alguns requisitos apontados pela doutrina:
a) colheita em processo que contemple as mesmas partes; b) mesmo fato
probando; c) observância, no processo precedente, das mesmas formalidades
legais quando da produção probatória; d) observância do princípio do
contraditório em relação ao processo em que a prova foi originalmente
produzida.
Para finalizar, pergunta-se: é necessário que o representante do Ministério
Público seja o mesmo? Não, em virtude do Princípio da Unidade que rege o Ministério
Público, não se faz necessário seja seu representante o mesmo indivíduo em ambos
os processos.
5. Momentos da Atividade Probatória
A atividade probatória é dividida pelos seguintes momentos:
(i) Proposição – trata-se do momento em que a prova é proposta, ou seja,
momento em que a prova é requerida;
(ii) Admissão – em consequência, a admissão é o momento em que a prova
requerida passa pelo crivo do julgador, que deve admiti-la ou não. Admitindo-a,
presume entender se tratar de elemento probandi essencial para o alcance da
verdade fática acerca do fato criminoso;
(iii) Produção – admitida a prova, a mesma será produzida, isto é, realiza-se o
ato ou o procedimento por meio do qual a prova será incorporada ao processo;
(iv) Apreciação – produzida a prova e manifestando-se as partes sobre ela,
caberá ao juiz apreciá-la, conferindo-lhe o devido valor probatório em virtude da
análise em conjunto com as demais provas.
6. Ônus probatório
Determina o art. 156 do Código de Processo Penal:
Art. 156 do Código de Processo Penal. A prova da alegação incumbirá a
quem a fizer, sendo, porém, facultado ao juiz de ofício:
I – ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção antecipada
de provas consideradas urgentes e relevantes, observando a necessidade,
adequação e proporcionalidade da medida;
II – determinar, no curso de instrução, ou antes de proferir a sentença, a
realização de diligências para dirimir dúvida sobre ponto relevante.
DireitoFacilitado.com.br – Natan Batista
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6.1. Regra
A partir do acima exposto, extrai-se que a regra determina pertencer o ônus
da prova àquele que alegar o fato, ou seja, quem alega deve provar o alegado (actori
incumbit probatio).
Tendo isso em mente, é possível que delimitemos as incumbências
probatórias de cada umas das partes. Vejamos:
(i) Ônus da acusação – à acusação incumbirá a prova das imputações feitas em
desfavor do acusado, resumidas em: (i.i) fato e sua autoria; (i.ii) as causas de aumento
de pena; e (i.iii) o dolo e a culpa;
(ii) Ônus da defesa – à defesa incumbirá a prova dos elementos que
contradizem os fatos alegados em desfavor do acusado (et réus in excipiendo fit
actor), consubstanciadas em: (ii.i) causas de exclusão da antijuridicidade (excludentes
de ilicitude); (ii.ii) excludentes de culpabilidade e punibilidade por ela alegados; (ii.iii)
causas de diminuição de pena.
6.2. Capacidade probatória supletiva ou subsidiária
Além disso, determina o referido artigo a denominada capacidade probatória
supletiva ou subsidiária do juiz. Significa dizer que o juiz tem capacidade para admitir,
de ofício, a produção de provas que entende ser essenciais para o escorreito deslinde
da causa.
Pergunta-se: isso não viola a inércia jurisdicional? Não, porquanto cabe ao
julgador, diante da inexistência de elementos probatórios suficientes, busque a
produção de provas que o auxiliem a atingir a verdade fática acerca das alegações
narradas.
Portanto, é certo que a capacidade probatória supletiva do juiz somente
surgirá diante da inércia das partes no oferecimento de elementos de prova, ocasião
na qual deverá o juiz, de ofício, buscá-las.
Nesse sentido, os incisos do artigo anteriormente transcritos indicam algumas
medidas que podem ser tomadas pelo magistrado:
Inc. I – é facultado ao juiz, de ofício:
I – ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção antecipada
de provas consideradas urgentes e relevantes, observando a necessidade,
adequação e proporcionalidade da medida.
Portanto, é possível que o magistrado, notando o caráter urgente e relevante,
ordene a produção antecipada de provas, inclusive anteriormente ao início da ação
penal.
Cumpre ressaltar que para tanto é necessário seja comprovado o fumus boni
iuris e periculum in mora, confirmando o caráter de urgência e relevância e
demonstrando a possibilidade de perda da prova diante da não produção.
Resumo de Direito Processual Penal III
41
Por fim, há posicionamento doutrinário que entende se tratar de disposição
inconstitucional, tendo em vista que conferiria ao magistrado poder de investigação.
Contudo, o entendimento fixado é no sentido de que não há o que se falar em poder
de investigação, mas em poder cautelar, somente permitindo que o juiz requeira e
conserve a produção antecipada de prova que poderá se perder se não realizada e
que entende ser essencial para a formação de sua convicção.
Hoje, não fosse a suspensão dos efeitos dos dispositivos adicionados pelo
Pacote Anticrime, tal capacidade pertenceria ao juiz de garantias.
Inc. II – é facultado ao juiz, de ofício:
II – determinar, no curso de instrução, ou antes de proferir a sentença, a
realização de diligências para dirimir dúvida sobre ponto relevante.
Aqui, diferentemente do caso anteriormente narrado, a ação do juiz ocorre
após o início do processo.
Nesse caso, a lei lhe confere capacidade para exigir a realização de diligências
que extingam determinada dúvida que recaia sobre determinado fato que julga
importante para a formação de sua convicção.
7. Princípios da Prova
São os princípios que regem as provas:
7.1. Princípio da autorresponsabilidade das partes
Está diretamente ligada ao tópico anterior, uma vez que determina que cabe
àquele que alega a produção de prova que confirme o alegado, ressalvando-se,
igualmente, a capacidade probatória subsidiária ou supletiva do juiz.
7.2. Princípio da audiência contraditória/bilateral
Determina que toda prova trazida aos autos deve ser apresentada à parte
contrária para que dela conheça o teor, dando-lhe oportunidade para que exerça
devidamente o seu direito ao contraditório.
7.3. Princípio da aquisição ou comunhão de provas
Uma vez produzida a prova, como dito anteriormente, passará a integrar o
processo. A partir daí passa a integrar um conjunto unitário probatório que pertence
a todos os indivíduos que compõem a relação jurídico-processual.
Significa dizer que a prova não somente poderá ser aproveitada por quem a
produziu, servindo e podendo ser utilizada por qualquer dos entes que compõem a
lide.
7.4. Princípio da oralidade
Determina que a prova produzida por meio oral deverá ser preferida em
relação àquela que se produz por meio escrito.
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Nesse sentido, deve o juiz optar, sempre que possível, pela produção de
provas orais, permitindo-lhe analisar de forma mais apurada a prova.
7.5. Princípio da concentração
As provas, tanto quanto possível, devem ser produzidas perante o mesmo ato,
qual seja, a audiência, preferindo-se sejam realizadas o menor número possível de
audiências, prezando pela celeridade da prestação jurisdicional.
7.6. Princípio da publicidade
Para que as provas sejam produzidas, há de se respeitar a o caráter público
inerente a todos os atos do processo, salvo as exceções expressamente
determinadas:
Art. 792, §1º, do Código de Processo Penal. Se da publicidade da audiência,
da sessão ou do ato processual, puder ressaltar escândalo, inconveniente grave
ou perigo de perturbação da ordem, o juiz, ou o tribunal, câmara, ou turma,
poderá, de ofício ou a requerimento da parte ou do Ministério Público, determinar
que o ato seja realizado a portas fechadas, limitando o número de pessoas que
possam estar presentes.
7.7. Princípio da não autoincriminação (nemo tenetur se detegere)
Bem conhecido, trata-se do princípio que defende a impossibilidade de que
qualquer indivíduo seja compelido a produzir provas utilizadas em seu desfavor ou
que possam vir a incriminá-lo.
Trata-se da materialização do direito fundamental ao silêncio, permitindo que
ao indivíduo seja resguardada a não obrigatoriedade de se manifestar quando
investigado ou acusado.
Nesse sentido, entende-se que o silêncio não deverá e não poderá ser utilizado
contra aquele a quem as alegações são imputadas.
7.8. Princípio do livre convencimento motivado
Como dito anteriormente, dá-se ao juiz o direito de valorar as provas sem que
esteja submetido a qualquer parâmetro anteriormente fixado. Para tanto, contudo,
exige-lhe seja utilizado meio de apreciação adequado e racional.
Em seguida veremos quais são os sistemas de apreciação de prova.
8. Sistemas de Apreciação da Prova 8.1. Ordálios
Também conhecido como juízo de Deus, tratava-se de sistema irracional de
apreciação de provas, segundo o qual se acreditava que um ente divino intervinha
nos julgamentos, revelando a inocência ou culpa daquele que era acusado.
Resumo de Direito Processual Penal III
43
Tal sistema foi presente nos primórdios do Direito, quando da vigência das
normas exclusivamente divinas e consuetudinárias, as quais, acreditava-se, eram
confiadas pelos deuses ao rei/imperador.
Podemos citar como exemplo Hamurabi, figura entalhada em rocha onde se
encontra o primeiro Código de que se tem conhecimento, o qual recebia de uma
figura divida a cunha com a qual deveria cunhar as leis na rocha.
Nesse sistema, o acusado era submetido a uma espécie de prova, sendo a sua
condenação condicionada ao resultado da mesma, somente cabendo ao julgador
constatá-lo. À título de exemplo, jogava-se o acusado no rio, amarrando-lhe aos pés
uma enorme pedra. Sua condenação estava ligada ao fato de se salvar ou não do
afogamento.
Hoje, contudo, verifica-se a presença de sistemas racionais de apreciação de
prova, conforme veremos a seguir.
8.2. Sistema da prova legal, da verdade legal ou formal
O referido sistema não conferia ao juiz a liberdade para apreciar a prova e dar-
lhe o devido valor probatório. Aqui, vigia o denominado princípio da prova tarifada,
segundo o qual cabia ao legislador conferir previamente o valor probatório das
provas, somente incumbindo ao juiz conferi-las, realizando a soma de seus valores.
Diz-se da verdade legal ou formal, porquanto não se busca a verdade real dos
fatos, levando em consideração somente o que está disposto e valorado pela lei.
8.3. Sistema da livre convicção, da prova livre ou da íntima convicção
Antagonicamente ao sistema acima exposto, trata-se do modelo segundo o
qual se confere ao juiz total liberdade para apreciar as provas e valorá-las, não
havendo qualquer elemento que o impeça de adotar os critérios que lhe convirem.
Tendo isso em mente, entende-se que não é necessário, inclusive, que o
magistrado fundamente a sua decisão.
O referido sistema será utilizado perante o Tribunal do Júri, porquanto cabe
aos jurados a formação de sua convicção puramente através da apreciação das
provas.
Nesse sentido, estipula a lei ser necessário possuir notória idoneidade para
figurar como jurado, evitando qualquer desvio quanto à Justiça das decisões:
Art. 436, caput, do Código de Processo Penal. O serviço do júri é
obrigatório. O alistamento compreenderá os cidadãos maiores de 18 (dezoito)
anos de notória idoneidade.
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8.4. Sistema da persuasão racional ou livre convencimento motivado
Igualmente ao segundo dos sistemas expostos, dá-se ao magistrado total
liberdade para realizar a apreciação das provas. Contudo, exige-lhe seja feita em
conjunto com as demais provas produzidas no processo.
Ademais, conforme determina o art. 93, IX, da Constituição Federal, é
necessário seja a sua decisão fundamentada, impedindo a legislação que somente se
baseie em dados informativos da investigação para formar a sua convicção.
Não significa, porém, que as provas produzidas perante o inquérito policial
devam ser ignoradas. A legislação somente frisa a utilização da apreciação das provas
produzidas durante o processo, devendo o magistrado dar-lhes preferência.
É, inclusive, o sistema adotado pelo Ordenamento Jurídico brasileiro, tendo
em vista o disposto no art. 155 do CPP:
Art. 93 da Constituição Federal. Lei complementar, de iniciativa do
Supremo Tribunal Federal, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observados
os seguintes princípios:
[...]
IX – todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e
fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a
presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou
somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do
interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação.
• • • •
Art. 155, caput, do Código de Processo Penal. O juiz formará sua convicção
pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo
fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na
investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.
É possível notar, através da leitura atenta do dispositivo acima transcrito,
estabelecer, a própria lei, as exceções à vedação da decisão fundada exclusivamente
por informativos colhidos na investigação. São as exceções, possuindo valor
probatório idêntico ao das provas produzidas durante o processo:
(i) Provas cautelares – nas palavras de Mougenot, “são aquelas produzidas
antes do momento oportuno, em razão da situação de urgência”. Trata-se, portanto,
da prova produzida a partir da comprovação do fumus boni iuris e periculum in mora;
(ii) Provas não repetíveis – são aquelas produzidas perante o inquérito policial,
cuja reprodução durante o processo seria impossível. São exemplos a prova pericial,
interceptação telefônica, busca e apreensão etc;
(iii) Provas antecipadas – por fim, entende-se por prova antecipada,
ressalvando que para a maioria da doutrina são idênticas às provas cautelares,
aquelas produzidas a partir do poder geral de cautela do magistrado, ordenando-as
Resumo de Direito Processual Penal III
45
sejam produzidas de ofício em virtude do caráter urgente e relevante para o
escorreito deslinde da causa.
9. Das Provas Nominadas 9.1. Da Perícia 9.1.1. Conceito
Conforme vimos até aqui, a prova tem por objetivo fazer com que o
magistrado conheça do fato objeto da lide, de modo que a sua convicção atinja na
maior proximidade a verdade fática, possibilitando-o proferir sentença justa.
Muitas vezes, porém, o alcance da verdade fática se mostra dificultoso,
porquanto exige conhecimento técnico-científico específico, o qual, muitas vezes,
não possui o magistrado. Nesses casos, faz-se necessário que haja a intervenção de
profissional expert em área técnica relativa à natureza da prova, o qual deverá
proferir laudo capaz de auxiliar o julgador na formação de sua convicção.
A perícia, portanto, nada mais é que a intervenção do profissional expert em
área técnica, científica ou artística específica no processo, responsável pele emissão
de laudo acerca de fatos, circunstâncias ou condições inerentes ao fato punível, a fim
de comprová-los e convertê-los em matéria capaz de agregar ao exercício cognitivo
do juiz.
Nas palavras de Edilson Mougenot:
Perícia é o exame realizado por pessoa que detenha “expertise” sobre
determinada área do conhecimento – o perito –, a fim de prestar esclarecimentos
ao juízo acerca de determinado fato de difícil compreensão, auxiliando-o no
julgamento da causa.
9.1.2. Importância da prova pericial
Tendo em vista que o Direito Processual Penal adota como Sistema de
Apreciação da Prova o Sistema da Persuasão Racional ou do Livre Convencimento
Motivado, é necessário que o magistrado leve em conta a apreciação conjunta das
provas produzidas no processo para que as valore.
Nesse sentido, a prova pericial possui valoração relativa.
Contudo, é de rigor reconheçamos a sua elevada confiabilidade no
convencimento e na formação da convicção do juiz, porquanto produzida por
profissional expert desinteressado na lide, possuidor de conhecimento do qual o
magistrado, em regra, não compartilha.
Por isso, é comum seja o laudo aceito em sua integralidade, utilizando-se dele
o juiz para a formação de seu entendimento.
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9.1.3. Do perito
Entende-se por perito o auxiliar devidamente compromissado com a Justiça e,
portanto, estranho às partes, possuidor de conhecimento técnico-científico
altamente especializado.
Sendo auxiliar da justiça, lembremos, é necessário a observância quanto ao
disposto no art. 112 do CPP, não podendo atuar no processo diante da existência de
incompatibilidades ou impedimentos:
Art. 112 do Código de Processo Penal. O juiz, o órgão do Ministério Público,
os serventuários ou funcionários de justiça e os peritos ou intérpretes abster-se-
ão de servir no processo, quando houver incompatibilidade ou impedimento
legal, que declararão nos autos. Se não se der a abstenção, a incompatibilidade
ou impedimento poderá ser arguido pelas partes, seguindo-se o processo
estabelecido para a exceção de suspeição.
O não respeito ao compromisso prestado perante a Justiça, poderá fazê-lo
incidir no crime de falsa perícia, previsto no art. 342 do Código Penal:
Art. 342, caput, do Código Penal. Fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a
verdade como testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete em processo
judicial, ou administrativo, inquérito policial, ou em juízo arbitral:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.
9.1.3.1. Classificação do perito
São as classificações que recam sobre os peritos:
(i) Perito oficial – entende-se aquele que, tendo em vista a aprovação em
concurso público pertinente, é assim determinado em virtude da ocupação de cargo
público, compondo o corpo técnico de peritos do Estado;
(ii) Perito não oficial – por outro lado, perito não oficial é aquele que, apesar
da especialização em área de interesse no processo, não ocupa cargo público, não
compondo, portanto, o corpo técnico de peritos do Estado. Estes somente serão
nomeados na falta do acima citado.
Nesse sentido, determina o art. 159, caput e §§ 1º e 2º, do CPP:
Art. 159 do Código de Processo Penal. O exame de corpo de delito e outras
perícias serão realizados por perito oficial, portador de diploma de curso superior.
§1º. Na falta de perito oficial, o exame será realizado por 2 (duas) pessoas
idôneas, portadoras de diploma de curso superior preferencialmente na área
específica, dentre as que tiverem habilitação técnica relacionada com a natureza
do exame.
§2º. Os peritos não oficiais prestarão o compromisso de bem e fielmente
desempenhar o encargo.
Resumo de Direito Processual Penal III
47
9.1.3.2. Requisitos para ser perito
Além do disposto no artigo anteriormente transcrito, o art. 279 do CPP elenca
os indivíduos que não poderão desempenhar as funções de perito. Vejamos cada um
deles isoladamente.
De proêmio, são os requisitos para que o indivíduo atue como perito no
processo:
(i) Seja pessoa idônea; e
(ii) Seja portador de diploma de curso superior.
Por outro lado, determina o art. 279:
Art. 279 do Código de Processo Penal. Não poderão ser peritos:
I – os que estiverem sujeitos à interdição de direito mencionada nos ns. I e
IV do art. 69 do Código Penal4;
II – os que tiverem prestado depoimento no processo ou opinado
anteriormente sobre o objeto da perícia;
III – os analfabetos e os menores de 21 anos.
Portanto, em que pese as requisitos que admitem o indivíduo como perito,
não poderão desempenhar tais funções aqueles que:
(i) Não estar sujeito ao impedimento para o exercício de função pública ou
exercício de profissão que exija habilitação especial ou licença do Poder Público;
(ii) Não ter prestado depoimento no processo ou opinado sobre o objeto da
perícia;
(iii) Não ser analfabeto;
(iv) Não ser menor de 21 anos.
9.1.3.3. Quantidade de peritos
Como vimos através das disposições anteriormente elencadas, tratando-se de
perito oficial, basta que seja nomeado um profissional habilitado para a confecção de
laudo técnico, salvo em se tratando de perícia complexa que envolva mais de uma
área do conhecimento, ocasião na qual devem ser nomeados tantos peritos quanto
forem necessários para a formação da convicção do magistrado acerca da referida
prova. É o que determina o art. 159, §7º, do CPP:
Art. 159, §7º, do Código de Processo Penal. Tratando-se de perícia complexa
que abranja mais de uma área de conhecimento especializado, poder-se-á
designar a atuação de mais de um perito oficial, e a parte indicar mais de um
assistente técnico.
4 Art. 47 do Código Penal (Redação dada pela Lei nº 7.209/84). As penas de interdição temporária de direitos são: I – proibição do exercício de cargo, função ou atividade pública, bem como de mandato eletivo; II – proibição do exercício de profissão, atividade ou ofício que dependam de habilitação especial, de licença ou autorização do poder público.
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Contudo, tratando-se de perito não oficial, exige a lei sejam nomeados, no
mínimo, dois indivíduos.
9.1.3.4. Do compromisso
Como visto, ambos os peritos atuaram sob o compromisso de executarem
suas funções de forma idônea, sob pena de incorrerem no crime de falsa perícia.
Quanto ao perito oficial, não é necessário seja o compromisso prestado no
processo, porquanto a sua nomeação em decorrência da aprovação em concurso
público específico já inclui a realização do referido ato, presumindo-se saiba suas
obrigações, devendo agir de forma idônea.
Por outro lado, tratando de perito não oficial, é necessário seja o compromisso
prestado no processo, conforme estipula o art. 159, §2º, do CPP, já por nós transcrito.
9.1.3.5. Dos deveres do perito
São os deveres do perito:
(i) Uma vez nomeados não poderão se recusar a executar a perícia, salvo
motivo relevante, devidamente justificado;
(ii) Intimado, não poderá deixar de atender ao juízo;
(iii) Designada a data e local do exame, não poderá deixar de comparecer;
(iv) Deverá produzir o laudo nos prazos estabelecidos, não podendo agir de
modo contrário.
9.1.3.6. Das penalidades
Como dito anteriormente, não observando o seu compromisso perante a
Justiça, é possível seja o perito acusado pela prática do crime de falsa perícia, disposto
no art. 342 do Código Penal (anteriormente transcrito).
Contudo, não é somente essa a penalidade que recai sobre o perito.
A não observância de seus deveres pode acarretar em pena de multa, bem
como se intimado, mas não comparecer em juízo, em sua condução coercitiva.
9.1.3.7. Do perito assistente
Conforme vimos anteriormente, para que o perito exerça tal função, é
necessário que atenda a alguns requisitos prévios (vide tópico 9.1.3.2. Requisitos para
ser perito). Atendidos os requisitos, cabe ao juiz nomeá-lo.
Ocorre que a legislação também prevê que as partes indiquem assistentes
técnicos, aos quais incumbe, após a admissão do magistrado, apresentar questões e
impugnações ao laudo apresentado pelo perito oficial ou não oficial nomeado pelo
juízo, nos moldes do art. 159, §4º, do CPP:
Resumo de Direito Processual Penal III
49
Art. 159, §4º, do Código de Processo Penal. O assistente técnico atuará a
partir de sua admissão pelo juiz e após a conclusão dos exames e elaboração do
laudo elos peritos oficiais, sendo as partes intimadas desta decisão.
Para tanto, é possível que a parte requeira seja o material disponibilizado ao
perito judicial igualmente oferecido ao perito assistente, de modo que possa proceder
com suas análises, apresentando novo parecer acerca da prova.
É o que determina o art. 159, §5º, II, do CPP:
Art. 159, §5º, do Código de Processo Penal. Durante o curso do processo
judicial, é permitido às partes, quanto à perícia:
[...]
II – indicar assistentes técnicos que poderão apresentar pareceres em
prazo a ser fixado pelo juiz ou ser inquiridos em audiência.
Notemos, não se trata de perito nomeado pelo juízo, mas pelas partes. Nesse
sentido, não recai sobre eles a necessidade de compromisso perante o juízo, da
mesma forma que não os atinge os elementos ensejadores de suspeição ou
impedimento, nem lhes está sujeita a incriminação por falsa perícia, porquanto
nomeados pelas partes em virtude da confiança que neles é depositada.
Contudo, é possível que lhes seja imputada a prática de crimes diversos, como
a falsidade ideológica.
9.1.3.8. Nomeação dos peritos
Aqui, faremos uma breve revisão da nomeação dos peritos já explicados (vide
tópico 9.1.3.9. Classificação dos peritos, supra), adicionando conhecimento acerca da
nomeação de peritos por meio de carta precatória. Vejamos:
(i) Perito oficial - em se tratando de perito que ocupa cargo público vinculado
a órgão estatal, basta seja a requisição endereçada ao referido órgão, cabendo-lhes
a indicação de perito habilitado:
Art. 178 do Código de Processo Penal. No caso do art. 159, o exame será
requisitado pela autoridade ao diretor da repartição, juntando-se ao processo o
laudo assinado pelos peritos.
(ii) Perito não oficial – somente ocorrendo diante da ausência de peritos
oficiais, caberá ao magistrado proceder a nomeação dos dois peritos exigidos em lei,
não havendo o que se falar em intervenção das partes:
Art. 179, caput, do Código de Processo Penal. No caso do §1º do art. 159, o
escrivão lavrará o auto respectivo, que será assinado pelos peritos, e se presente
ao exame, também pela autoridade.
(iii) Nomeação por carta precatória – determina o art. 177 do CPP:
Art. 177 do Código de Processo Penal. No exame por precatório, a
nomeação dos peritos far-se-á no juízo deprecado. Havendo, porém, no caso de
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ação privada, acordo das partes, essa nomeação poderá ser feita pelo juiz
deprecante.
Parágrafo único. Os quesitos do juiz e das partes serão transcritos na
precatória.
Portanto, tratando-se de perito que se encontra em comarca diversa de onde
pertence o juízo competente, é necessário seja a intimação realizada por meio de
carta precatória, cabendo, em regra, ao juízo deprecado nomeá-lo, salvo quando se
tratar de ação penal privada, situação na qual, diante do consenso das partes, poderá
o juízo deprecante fazê-lo.
Aqui, interessante ressaltar que os quesitos serão igualmente formulados por
meio de carta precatória.
9.1.4. Realização da perícia
A realização da perícia poderá se dar tanto diante do inquérito policial, como
durante o processo. Vejamos cada uma delas:
9.1.4.1. Perícia no inquérito policial
Para que assim proceda, é necessário seja requerida pela autoridade policial,
pelo magistrado, pelo Ministério Público ou a requerimento do ofendido ou do
acusado. Ou seja, não se trata de procedimento preestabelecido, mas cuja execução
somente se dará pela manifestação daqueles que compõem a investigação.
Ademais, realizada perante a investigação, elemento de natureza inquisitiva,
será assim também entendido. Significa dizer que em face da perícia feita no inquérito
policial não há o que se falar em contraditório.
9.1.4.2. Perícia no processo
Por outro lado, a perícia realizada durante o processo poderá ocorrer em
virtude de atuação ex officio do magistrado ou a requerimento de qualquer das
partes.
Aqui, ainda que haja manifestação das partes a favor da procedência da
perícia, poderá o magistrado, entendendo não se tratar de elemento necessário para
a formação de sua convicção, negar-lhes acolhimento.
Diferentemente da perícia realizada quando da fase investigativa, a perícia
executada no processo dá às partes direito ao contraditório. Nesse sentido, compõe-
se o contraditório, basicamente, por três ações distintas, quais sejam:
(i) Formulação de quesitos – quesitos são as indagações formuladas pelas
partes anteriormente à confecção do laudo pericial, as quais deverão ser pelo perito
respondidas no referido laudo;
(ii) Indicação de assistente técnico – como vimos anteriormente, a legislação
garante às partes a possibilidade de nomear-lhes assistente técnico, responsável pela
Resumo de Direito Processual Penal III
51
criação de pareceres acerca do laudo apresentado em juízo pelo perito técnico do
juízo. Não somente isso, mas é possível que o referido assistente técnico seja inquirido
pelas partes durante o interrogatório, de modo a refutar ou confirmar fatos
apresentados no laudo;
(iii) Requerimento da oitiva do perito para que preste esclarecimentos – por
fim, é possível requeiram as partes a submissão do perito técnico do juízo a oitiva,
visando questioná-lo sobre os pontos abordados no laudo pericial acostado. Nesse
caso, respeitar-se-á o disposto no art. 159, §5º, I, do CPP:
Art. 159, §5º, do Código de Processo Penal. Durante o curso do processo
judicial, é permitido às partes, quanto à perícia:
I – requerer a oitiva dos peritos para esclarecerem a prova ou para
responderem a quesitos, desde que o mandato de intimação e os quesitos ou
questões a serem esclarecidas sejam encaminhados com antecedência mínima de
10 (dez) dias, podendo apresentar as respostas em laudo complementar.
9.1.4.3. Divergência entre peritos
Pergunta-se: é necessário que os peritos nomeados cheguem a um consenso?
Não, não é necessário. Nesse caso, ou seja, havendo divergência, poderá o
magistrado nomear tantos peritos quanto forem necessários para cessar a
divergência. É a determinação do art. 180 do CPP:
Art. 180 do Código de Processo Penal. Se houver divergência entre os
peritos, serão consignadas no auto do exame as declarações e respostas de um e
de outro, ou cada um redigirá separadamente o seu laudo, e a autoridade
nomeará um terceiro; se este divergir de ambos, a autoridade poderá mandar
proceder a novo exame por outros peritos.
Portanto, divergindo dois peritos, nomear-se-á um terceiro. Caso o terceiro
não coadune com os laudos apresentados pelos anteriores, é possível seja requerido
novo perito para a realização de outro exame.
9.1.5. Do laudo pericial
Entende-se por laudo pericial o documento produzido pelo perito habilitado,
segundo o qual expressará as conclusões a que chegou com o exame da prova, de
modo a tentar esclarecer o fato, auxiliando na construção da convicção do juiz.
Prevê o caput do art. 160 do CPP:
Art. 160, caput, do Código de Processo Penal. Os peritos elaborarão o laudo
pericial, onde escreverão minuciosamente o que examinarem, e responderão aos
quesitos formulados.
9.1.5.1. Divisão do laudo
A partir da redação do artigo acima transcrito, é possível seja o laudo pericial
secionado em quatro partes, quais sejam:
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52
(i) Preâmbulo – trata-se da introdução do laudo pericial, ocasião na qual cabe
ao perito qualificar-se, apresentando o objeto de sua perícia;
(ii) Exposição – é a seção em que adicionará tudo o que foi observado por meio
da realização da perícia;
(iv) Discussão – dá-se pela análise crítica dos fatos observados, devendo o
perito expor os argumentos, razões ou motivos pelos quais funda o seu parecer;
(iv) Conclusão – é a parte final do laudo, devendo o perito revelar seu parecer,
respondendo, ainda, todos os quesitos levantados pelas partes da relação jurídico-
processual.
9.1.5.2. Prazo
O prazo para apresentação do laudo pericial é de dez dias a contar da
nomeação do perito, nos termos do parágrafo único do art. 160:
Art. 160, parágrafo único, do Código de Processo Penal. O laudo pericial
será elaborado no prazo máximo de 10 dias, podendo este prazo ser prorrogado,
em casos excepcionais, a requerimento dos peritos.
9.1.5.3. Do pedido de esclarecimentos e da recusa do laudo pericial
De proêmio, não observando o perito nomeado as devidas formalidades ou
notando-se obscuridades, omissões ou contradições no laudo pericial, é possível que
o magistrado requerida ao perito esclarecimentos. Em se tratando de fundamentada
necessidade, poderá a autoridade requerer seja produzido novo exame por outros
peritos, inclusive.
É o que aduz o art. 181 do CPP:
Art. 181 do Código de Processo Penal. No caso de inobservância de
formalidades, ou no caso de omissões, obscuridades ou contradições, a
autoridade judiciária mandará suprir a formalidade, complementar ou esclarecer
o laudo.
Parágrafo único. A autoridade poderá também ordenar que se proceda a
novo exame, por outros peritos, se julgar conveniente.
Ademais, convém informarmos que quanto ao laudo pericial vige o sistema
liberatório. Significa dizer que o magistrado não se encontra vinculado aos elementos
descritos no laudo, podendo rejeitá-lo ou aceitá-lo no todo ou em parte, nos moldes
do art. 182 do CPP:
Art. 182 do Código de Processo Penal. O juiz não ficará adstrito ao laudo,
podendo aceitá-lo ou rejeitá-lo, no todo ou em parte.
9.1.5.4. Domínio técnico
É importante que toquemos em um ponto crucial. Como dissemos quando do
início do estudo da perícia, conceituamos o perito como o profissional habilitado,
detentor de título oficial em virtude de aprovação em concurso específico,
Resumo de Direito Processual Penal III
53
conhecedor de área técnico-científico-artística específica, cujo objetivo é auxiliar o
magistrado a formar sua convicção, esclarecendo fatos que necessitem de
conhecimentos de que não detém o magistrado.
Nesse sentido, pergunta-se: é possível que o magistrado dispense a atuação do
perito em se tratando de perícia em área técnico que detém conhecimento específico,
procedendo ele mesmo a análise da prova? Não! Ainda que o magistrado detenha
conhecimento específico necessário à análise da perícia, deve nomear perito técnico.
9.1.6. Classificação dos crimes
São as classificações dos crimes, de suma importância para a procedência da
perícia:
9.1.6.1. Delicta facti permanentis (crime não transeunte)
Assim se entendem os crimes cuja execução produz elementos/evidências
materiais externas, modificando o ambiente em que ocorreram. Significa dizer que o
cometimento do crime é claro, porquanto dele se extraem elementos que o
comprovam.
Podemos citar como exemplo a relação direta entre o cadáver e o crime de
homicídio, sendo aquele evidência desse. Igualmente está o obstáculo rompido para
o crime de furto que incide na referida qualificadora ou o cheque sem fundos para o
crime de estelionato nessa modalidade.
9.1.6.2. Delicta facti transeuntis (crime transeunte)
De outra mão, tem-se por crime transeunte o crime de cuja execução não se
produz elementos externos, ou seja, não há evidências do cometimento do crime.
É o que ocorre, por exemplo, no crime de ameaça ou em qualquer dos crimes
contra a honra, quando praticados de forma verbal e sem que haja registros.
9.1.7. Do vestígio
É de notar que o elemento diferenciador das classificações acima transcritas é
a figura do vestígio.
Vestígio nada mais é que todo o material apreensível por meio dos sentidos,
cuja produção se deu diretamente em virtude da ação delituosa. Trata-se dos
elementos externos de que comentamos no tópico anterior.
Estando diretamente ligado ao cometimento do crime, é imprescindível
ocorra uma análise minuciosa sobre ele, visando, por meios retrocedentes, alcançar
o modo como procedeu a ação criminosa. Nesse sentido, determina o caput do art.
158 e o §3º do art. 158-A do CPP:
Art. 158, caput, do Código de Processo Penal. Quando a infração deixar
vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não
podendo supri-lo a confissão do acusado.
DireitoFacilitado.com.br – Natan Batista
54
[...]
Art. 158-A, §3º, do Código de Processo Penal. Vestígio é todo objeto ou
material bruto, visível ou latente, constatado ou recolhido, que se relaciona à
infração penal.
Para que o entendamos em sua integralidade, convém que conceituemos
alguns elementos:
9.1.7.1. Corpo de delito
Entende-se por corpo de delito, nas palavras de Edilson Mougenot:
O corpo de delito é o conjunto dos vestígios – ou seja, elementos
apreensíveis por meio dos sentidos – deixados pelo crime. Não se restringe,
portanto, aos vestígios relativos ao corpo físico da vítima do delito.
Ou seja, coincide com o conceito do próprio vestígio, porquanto é a
materialização do crime por meio de elementos sensíveis.
Importante o comentário do doutrinador, de modo a relevar a não
coincidência entre o elemento corpo de delito e o cadáver da vítima. Enquanto este
sempre será parte do corpo de delito, esse nem sempre será compreendido por
aquele.
9.1.7.2. Exame do corpo de delito
Seguindo o raciocínio:
Já o exame de corpo de delito é a perícia feita nesses vestígios.
Logo, sendo o corpo de delito a própria materialização do crime, o exame do
mesmo é a comprovação, por meio de perícia, dos elementos objetivos do tipo.
É, portanto, o exame inspecional do fato, por meio do qual se busca reconstruí-
lo, almejando alcançar a verdade fática segundo a qual se executou o crime.
9.1.7.2.1. Espécies de exame do corpo de delito
São duas as espécies de exame de corpo de delito, conforme podemos
constatar quando da leitura do caput anteriormente transcrito, quais sejam:
(i) Exame do corpo de delito direto – entende-se pelo exame executado sobre
o próprio corpo de delito. Nesse caso, cabe ao perito analisar diretamente os
elementos externos produzidos quando da prática da infração penal;
(ii) Exame do corpo de delito indireto – por outro lado, trata-se do exame que
recai sobre elementos cuja produção não se deu diretamente em virtude da prática
do crime, tendo, portanto, origem diversa. Contudo, insta informar que o exame de
corpo de delito indireto é imprescindível para a realização do exame direto, porquanto
revela informações que permitem alcançar o corpo de delito, de fato.
Resumo de Direito Processual Penal III
55
9.1.7.2.2. Obrigatoriedade do exame do corpo de delito
De acordo com o enunciado no caput do art. 158 do CPP: “Quando a infração
deixar vestígios, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não
podendo supri-lo a confissão do acusado”.
Portanto, o exame de corpo de delito sempre ocorrerá quando se tratar de
crimes não transeuntes, ou seja, sempre ocorrerá diante da existência de vestígios.
O referido artigo, ainda, indica duas situações diante das quais o exame de
corpo de delito será investido de caráter urgente. Vejamos:
Art. 158, parágrafo único, do Código de Processo Penal. Dar-se-á prioridade
à realização do exame do corpo de delito quando se tratar de crime que envolva:
I – violência doméstica e familiar contra mulher;
II – violência contra criança, adolescente, idoso ou pessoa com deficiência.
Trata-se da materialização da proteção daqueles sobre os quais recai a
condição de hipossuficientes ou vulneráveis, nos termos da lei.
9.1.7.2.3. Da não suficiência da confissão
Por fim, importante destacar que a confissão não é suficiente para suprir a
necessidade da produção de prova por meio do exame de corpo de delito.
Significa dizer, portanto, que, em havendo confissão que revele informações
acerca do corpo de delito, ainda sim é necessário proceda a realização do exame.
Inclusive, a não execução do exame de corpo de delito acarretará em nulidade,
salvo diante do desaparecimento dos elementos que compõem o corpo de delito,
ocasião na qual poderá o referido exame ser suprido por meio de prova testemunhal.
É o que determinam os arts. 167 e 564, III, b, do Código de Processo Penal:
Art. 167 do Código de Processo Penal. Não sendo possível o exame de
corpo de delito, por haverem desaparecido os vestígios, a prova testemunhal
poderá suprir-lhe a falta.
[...]
Art. 564 do Código de Processo Penal. A nulidade ocorrerá nos seguintes
casos:
[...]
III – por falta das fórmulas ou dos termos seguintes:
[...]
b) o exame do corpo de delito nos crimes que deixam vestígios, ressalvado
o disposto no art. 167.
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9.1.8. Cadeia de custódia
9.1.8.1. Conceito
Define o art. 158-A, caput e §§ 1º e 2º:
Art. 158-A do Código de Processo Penal. Considera-se cadeia de custódia o
conjunto de todos os procedimentos utilizados para manter e documentar a
história cronológica do vestígio coletado em locais ou em vítimas de crimes, para
rastrear sua posse e manuseio a partir de seu conhecimento até o descarte.
§1º. O início da cadeia de custódia dá-se com a preservação do local de crime
ou com procedimentos policiais ou periciais nos quais seja detectada a existência
de vestígio.
§2º. O agente público que reconhecer um elemento como de potencial
interesse para a produção da prova pericial fica responsável por sua preservação.
Entende-se por cadeia de custódia a sistematização de procedimentos que
objetivam a preservação do valor probatório da prova pericial caracterizada, mais
precisamente, da sua autenticidade (Rogério Sanches).
Em outras palavras, de forma simplificada, tem-se por cadeia de custódia as
ações executadas com o intuito de preservar as condições dos vestígios encontrados,
procedendo o seu registro/documentação, de modo que estejam em condições de
atender ao juízo, quando necessário, até que esse determine o seu descarte, ou seja,
até que não mais sejam úteis para a formação da convicção do magistrado.
Conforme determina o artigo acima transcrito, a cadeia de custódia se inicia
quando do conhecimento da ação delituosa, ocasião na qual deve a autoridade
policial proceder a preservação do local do crime, ficando responsável por cada um
dos vestígios aquele que reconheça o potencial interesse desses para o deslinde da
causa.
9.1.8.2. Etapas da cadeia de custódia
A legislação foi responsável por estabelecer as etapas da cadeira de custódia,
bem como indicar cada uma das fases que compõem as etapas. Por isso, somente
indicaremos a divisão quanto às fases, transcrevendo a norma na íntegra.
Pois bem, é a determinação do art. 158-B do CPP:
Art. 158-B do Código de Processo Penal. A cadeia de custódia compreende
o rastreamento do vestígio nas seguintes etapas...
(i) Fase externa – é compreendida pelas seguintes etapas:
(i.i) Reconhecimento (inc. I):
I – reconhecimento: ato de distinguir um elemento como de potencial
interesse para a produção da prova pericial.
Resumo de Direito Processual Penal III
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(i.ii) Isolamento (inc. II):
II – isolamento: ato de evitar que se altere o estado das coisas, devendo
isolar e preservar o ambiente imediato, mediato e relacionado aos vestígios e local
do crime
(i.iii) Fixação (inc. III):
III – fixação: descrição detalhada do vestígio conforme se encontra no local
do crime ou no corpo de delito, e a sua posição na área de exames, podendo ser
ilustrada por fotografias, filmagens ou croqui, sendo indispensável a sua descrição
no laudo pericial produzido pelo perito responsável pelo atendimento.
(i.iv) Coleta (inc. IV):
IV – coleta: ato de recolher o vestígio que será submetido à análise pericial,
respeitando suas características e natureza.
(i.v) Acondicionamento (inc. V):
V – acondicionamento: procedimento por meio do qual cada vestígio
coletado é embalado de forma individualizada, de acordo com suas características
físicas, químicas e biológicas, para posterior análise, com anotação da data, hora
e nome de quem realizou a coleta e o acondicionamento.
(i.vi) Transporte (inc. VI):
VI – transporte: ato de transferir o vestígio de um local para o outro,
utilizando as condições adequadas (embalagens, veículos, temperatura, entre
outras), de modo a garantir a manutenção de suas características originais, bem
como o controle de sua posse.
(i.vii) Recebimento (inc. VII):
VII – recebimento: ato formal de transferência da posse do vestígio, que
deve ser documentado com, no mínimo, informações referentes ao número de
procedimentos e unidade de polícia judiciária relacionada, local de origem, nome
de quem transportou o vestígio, código de rastreamento, natureza do exame,
tipo do vestígio, protocolo, assinatura e identificação de quem o recebeu.
O entendimento é de que a referida fase é da responsabilidade dos agentes
policiais.
(ii) Fase interna – são as etapas:
(ii.i) Processamento (inc. VIII):
VIII – processamento: exame pericial em si, manipulação do vestígio de
acordo com a metodologia adequada às suas características biológicas, físicas e
químicas, a fim de se obter o resultado desejado, que deverá ser formalizado em
laudo produzido por perito.
(ii.ii) Armazenamento (inc. IX):
IX – armazenamento: procedimento referente à guarda, em condições
adequadas, do material a ser processado, guardado para realização de
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contraperícia, descartado ou transportado, com vinculação ao número de laudo
correspondente.
(ii.iii) Descarte (inc. X):
X – descarte: procedimento referente à liberação do vestígio, respeitando
a legislação vigente e, quando pertinente, mediante autorização judicial.
A responsabilidade durante esta fase é do instituto pericial.
9.1.9. Perícias em espécie/perícias e tipos penais
O legislador teve a preocupação de dispor acerca da prova pericial diante de
determinados crimes, conforme veremos a seguir:
9.1.9.1. Perícias cadavéricas
(i) Autópsias – entende-se por autópsia a perícia executada no cadáver
anteriormente ao sepultamento. Em regra, analisa-se, por primeiro, a parte externa
do corpo, levando-se em consideração elementos como a indumentária e objetos que
acompanhem o corpo, para, então, proceder a análise das partes internas do corpo,
visando, aqui, a determinação da causa mortis.
Importante salientar que a autópsia não somente possui o propósito acima
informado, porquanto também é fundamental para determinar a dinâmica do evento
criminoso, sendo capaz, por exemplo, de determinar a quantidade de lesões
relevantes para o evento morte.
Determina o art. 162 do CPP:
Art. 162 do Código de Processo Penal. A autópsia será feita pelo menos seis
horas depois do óbito, salvo se os peritos, pela evidência dos sinais de morte,
julgarem que posse ser feita antes daquele prazo, o que declararão no auto.
Parágrafo único. Nos casos de morte violenta, bastará o simples exame
externo do cadáver, quando não houver infração penal que apurar, ou quando as
lesões externas permitirem precisar a causa da morte e não houver necessidade
de exame interno para a verificação de alguma circunstância relevante.
(ii) Exumação – dá-se pelo exame realizado após o seu sepultamento. Aqui,
busca-se a obtenção de novas informações acerca do crime ou quando não se
cogitava ter ocorrido por meio violento.
Cabe a pergunta: é necessário que família autorize a realização do
procedimento? Tratando-se de ato processual, não há o que se falar em necessidade
de autorização de terceiros, porquanto prevalece o interesse público.
A preocupação do legislador, contudo, é quanto a identificação do cadáver
certo a ser examinado. Vejamos:
Art. 163 do Código de Processo Penal. Em caso de exumação para exame
cadavérico, a autoridade providenciará para que, em dia e hora previamente
marcados, se realize a diligência, da qual se lavrará auto circunstanciado.
Resumo de Direito Processual Penal III
59
Parágrafo único. O administrador de cemitério público ou particular
indicará o lugar da sepultura, sob pena de desobediência. No caso de recusa ou
de falta de quem indique a sepultura, ou de encontrar-se o cadáver em outro lugar
não destinado a inumações, a autoridade procederá às pesquisas necessárias, o
que tudo constará do auto.
Art. 164 do Código de Processo Penal. Os cadáveres serão sempre
fotografados na posição em que forem encontrados, bem como, na medida do
possível, todas as lesões externas e vestígios no local do crime.
Art. 165 do Código de Processo Penal. Para representar as lesões
encontradas no cadáver, os peritos, quando possível, juntarão ao laudo do exame
provas fotográficas, esquemas ou desenhos, devidamente rubricados.
Art. 166 do Código de Processo Penal. Havendo dúvida sobre a identidade
do cadáver exumado, proceder-se-á ao reconhecimento pelo Instituto de
Identificação e Estatística ou repartição congênere ou pela inquirição de
testemunhas, lavrando-se auto de reconhecimento e de identidade, no qual se
descreverá o cadáver, com todos os sinais e indicações.
Parágrafo único. Em qualquer caso, serão arrecadados e autenticados
todos os objetos encontrados, que possam ser úteis para a identificação do
cadáver.
9.1.9.2. Perícia em lesão corporal
Nesse caso, busca-se averiguar a natureza e gravidade das lesões sofridas pela
vítima. Para tanto, é de suma importância seja executada tão logo possível, tendo em
vista o caráter transeunte das lesões.
Em que pese o acima destacado, o legislador destacou duas situações em que
a perícia ocorrerá em momento diverso, quais sejam:
(i) Em se tratando de perícia complementar, ocasião na qual o perito terá em
mãos o laudo inicial, de modo que possa proceder a sua retificação e devida
complementação;
(ii) Tratando-se de exame que busca determinar a gravidade da lesão, nos
moldes do art. 129, §1º, I, do Código Penal5, deverá ser realizado tão logo atinja 30 dias
da data do fato.
É a disposição do art. 168 do CPP:
Art. 168 do Código de Processo Penal. Em caso de lesões corporais, se o
primeiro exame pericial tiver sido incompleto, proceder-se-á a exame
complementar por determinação da autoridade policial ou judiciária, de ofício, ou
a requerimento do Ministério Público, do ofendido ou do acusado, ou de seu
defensor.
5 Art. 129, §1º, do Código Penal. Se resulta: I – incapacidade para ocupações habituais, por mais de trinta dias. [...] Pena – reclusão, de um a cinco anos.
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§1º. No exame complementar, os peritos terão presente o auto de corpo de
delito, a fim de suprir-lhe a deficiência o retificá-lo.
§2º. Se o exame tiver por fim precisar a classificação do delito no art. 129,
§1º, I, do Código Penal, deverá ser feito logo que decorra o prazo de 30 dias,
contado da data do crime.
§3º. A falta de exame complementar poderá ser suprida pela prova
testemunhal.
9.1.9.3. Perícia e local do crime
Como vimos quando do estudo da cadeia de custódia, é de suma importância
a preservação do local do crime e dos elementos que o compõem, porquanto pode
relevar fatos essenciais na compreensão do fato criminoso, cabendo à autoridade
policial a sua conservação até que cheguem ao local os peritos criminais.
Art. 6º do Código de Processo Penal. Logo que tiver conhecimento da
prática da infração penal, a autoridade policial deverá:
I – dirigir-se ao local, providenciando para que não se alterem o estado e
conservação das coisas, até a chegada dos peritos criminais.
[...]
Art. 169 do Código de Processo Penal. Para o efeito de exame do local onde
houver sido praticada a infração, a autoridade providenciará imediatamente para
que não se altere o estado das coisas até a chegada dos peritos, que poderão
instruir seus laudos com fotografias, desenhos ou esquemas elucidativos.
Parágrafo único. Os peritos registrarão, no laudo, as alterações do estado
das coisas e discutirão, no relatório, as consequências dessas alterações na
dinâmica dos fatos.
9.1.9.4. Perícia e exames laboratoriais
Aqui, ateve-se o legislador quanto à reserva de material suficiente no caso de
ser necessário a produção de contraprova.
Art. 170 do Código de Processo Penal. Nas perícias de laboratório, os
peritos guardarão material suficiente para a eventualidade de nova perícia.
Sempre que conveniente, os laudos serão ilustrados com provas fotográficas, ou
micrográficas, desenhos ou esquemas.
9.1.9.5. Perícia e destruição ou rompimento de obstáculos ou escalada no
crime de furto
Nesse caso, a perícia deverá indicar os instrumentos que fazem presumir ter
ocorrido a incidência das referidas qualificadoras, bem como indicar a época do
evento.
Art. 171 do Código de Processo Penal. Nos crimes cometidos com
destruição ou rompimento de obstáculo a subtração da coisa, ou por meio de
escalada, os peritos, além de descrever os vestígios, indicarão com que
instrumentos, por que meios e em que época presumem ter sido o fato praticado.
Resumo de Direito Processual Penal III
61
9.1.9.6. Avaliação
A avaliação, caracterizada pela análise dos elementos que constituem ou
sejam produtos do crime, é de suma importância diante dos crimes contra o
patrimônio, porquanto permite seja aplicada diminuição de pena quando se tratar de
crime de pequena monta.
Art. 172 do Código de Processo Penal. Proceder-se-á, quando necessário, à
avaliação de coisas destruídas, deterioradas ou que constituem produto do crime.
Parágrafo único. Se impossível a avaliação direta, os peritos procederão à
avaliação por meio dos elementos existentes nos autos e dos que resultarem de
diligências.
9.1.9.7. Perícia e crime de incêndio
Nesse caso, é necessário que o perito se atenha a três elementos específicos:
(i) a causa e o lugar que iniciaram o incêndio, (ii) o perigo que trouxe à vida e ao
patrimônio de terceiro e (iii) qualquer outro elemento que interesse à elucidação do
fato.
Art. 173 do Código de Processo Penal. No caso de incêndio, os peritos
verificarão a causa e o lugar em que houver começado, o perigo que dele tiver
resultado para a vida ou para o patrimônio alheio, a extensão do dano e o seu
valor e as demais circunstâncias que interessarem à elucidação do fato.
9.1.9.8. Perícia grafotécnica
Trata-se de exame por meio do qual se busca incongruências caligráficas que
possibilitem a identificação do autor de determinado documento.
É o procedimento, nos moldes do art. 174 do CPP:
Art. 174 do Código de Processo Penal. No exame para o reconhecimento
de escritos, por comparação de letra, observar-se-á o seguinte:
I – a pessoa a quem se atribua ou se possa atribuir o escrito será intimada
para o ato, se for encontrada;
II – para a comparação, poderão servir quaisquer documentos que a dita
pessoa reconhecer ou já tiverem sido judicialmente reconhecidos como de seu
punho, ou sobre cuja autenticidade não houver dúvida;
III – a autoridade, quando necessário, requisitará, para o exame, os
documentos que existirem em arquivos ou estabelecimentos públicos, ou nestes
realizará a diligência, se daí não puderem ser retirados;
IV – quando não houver escritos para a comparação ou forem insuficientes
os exibidos, a autoridade mandará que a pessoa escreva o que lhe for ditado. Se
estiver ausente a pessoa, mas em lugar certo, esta última diligência poderá ser
feita por precatória, em que se consignarão as palavras que a pessoa será
intimada a escrever.
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9.1.9.9. Perícia e instrumentos do crime
Trata-se de perícia realizada nos instrumentos com os quais se procedeu a
execução da prática delituosa. Nesse caso, busca-se a obtenção da natureza e
eficiência dos elementos, ou seja, suas qualidades e características e sua aptidão para
produzir o resultado tal qual ocorreu no crime.
Art. 175 do Código de Processo Penal. Serão sujeitos a exame os
instrumentos empregados para a prática da infração, a fim de se lhes verificar a
natureza e a eficiência.
9.2. Do interrogatório
9.2.1. Conceito
Previsto nos arts. 185 a 196, trata-se do segundo meio de prova nominado
disposto no Código de Processo Penal.
Entende-se por interrogatório, nas palavras de Guilherme de Souza Nucci: “...
o ato processual que confere oportunidade ao acusado de se dirigir diretamente ao juiz,
apresentando sua versão defensiva aos fatos que lhe foram imputados pela acusação,
podendo, inclusive, indicar meios de prova, bem como confessar, se entender cabível,
ou mesmo permanecer em silêncio, fornecendo apenas dados de qualificação.”
Em outras palavras, interrogatório nada mais é que o ato pelo qual o acusado
tem contato direto com o magistrado, ocasião na qual lhe é conferido o direito de
narrar de forma defensiva os fatos a ele imputados. Além disso, compete ao juiz, se
conveniente, fazer-lhe perguntas, reservando-se o direito de permanecer em silêncio
o acusado sem que tal fato seja usado em seu desfavor.
9.2.2. Natureza jurídica
Não há unanimidade doutrinária quando se discute a natureza jurídico do
interrogatório. Por isso, são quatro as teorias defendidas. Vejamos:
(i) José Mariano Correio de Camargo Aranha – o referido doutrinador entende
que o interrogatório possui natureza jurídica legalista. Significa dizer que entende o
interrogatório como sendo um meio de prova, porquanto fornece ao magistrado
elementos capazes de formar a sua convicção;
(ii) Fernando da Costa Tourinho Filho – a posição defendida entende que o
interrogatório não configura um meio de prova, tendo em vista não conduzir o
magistrado, necessariamente, à verdade fática, pois é reservado ao acusado o direito
de permanecer em silêncio, bem como, inclusive, o direito de mentir ou omitir fatos.
Nesse sentido, entende se tratar de meio de defesa;
(iii) Guilherme de Souza Nucci – é a teoria mais recente, defendendo que em
que pese possuir ambas as naturezas, prevalece aquela que entende se tratar de meio
de prova;
Resumo de Direito Processual Penal III
63
(iv) Julio Fabrinni Mirabete – posição majoritária, entende que o interrogatório
possui natureza mista, sendo, portanto, tanto meio de prova, como meio de defesa.
9.2.3. Necessidade do interrogatório
Estando o acusado presente, ou seja, sabendo-se a sua localização, é
necessário seja realizado o seu interrogatório, sob pena de nulidade do processo, nos
termos dos arts. 185 e 564, III, e, do CPP. Significa dizer, portanto, que diante da
ausência do acusado e consequente não realização do interrogatório, não há o que
se falar em nulidade.
Art. 185, caput, do Código de Processo Penal. O acusado que comparecer
perante a autoridade judiciária, no curso do processo penal, será qualificado e
interrogado na presença de seu defensor, constituído ou nomeado.
[...]
Art. 564 do Código de Processo Penal. A nulidade ocorrerá nos seguintes
casos:
[...]
III – por falta das fórmulas ou dos termos seguintes:
[...]
e) a citação do réu para ver-se processar, o seu interrogatório, quando
presente, e os prazos concedidos à acusação e à defesa.
9.2.4. Momento do interrogatório
(i) Inquérito policial – é a disposição do art. 6º, V, do CPP:
Art. 6º do Código de Processo Penal. Logo que tiver conhecimento da
prática da infração penal, a autoridade policial deverá:
[...]
V – ouvir o indiciado, com observância, no que for aplicável, do disposto no
Capítulo III do Título VII, deste Livro, devendo o respectivo termo ser assinado por
duas testemunhas que lhe tenham ouvido a leitura.
(ii) Auto de prisão em flagrante delito – aduz o art. 304 do CPP:
Art. 304 do Código de Processo Penal. Apresentado o preso à autoridade
competente, ouvirá esta o condutor e colherá, desde logo, sua assinatura,
entregando a este cópia do termo e recibo de entrega do preso. Em seguida,
procederá à oitiva das testemunhas que o acompanharem e o interrogatório do
acusado sobre a imputação que lhe é feita, colhendo, após cada oitiva suas
respectivas assinaturas, lavrando, a autoridade, afinal, o auto.
§1º. Resultando das respostas fundada a suspeita contra o conduzido, a
autoridade mandará recolhê-lo à prisão, exceto no caso de livrar-se solto ou de
prestar fiança, e prosseguirá nos atos do inquérito ou processo, se para isso for
competente; se não o for, enviará os autos à autoridade que o seja.
DireitoFacilitado.com.br – Natan Batista
64
§2º. A falta de testemunhas da infração não impedirá o auto de prisão em
flagrante; mas, nesse caso, com o condutor, deverão assiná-lo pelo menos duas
pessoas que hajam testemunhado a apresentação do preso à autoridade.
§3º. Quando o acusado se recusar a assinar, não souber ou não puder fazê-
lo, o auto de prisão em flagrante será assinado por duas testemunhas, que
tenham ouvido sua leitura na presença deste.
§4º. Da lavratura do auto de prisão em flagrante deverá constar a
informação sobre a existência de filhos, respectivas idades e se possuem alguma
deficiência e o nome e o contato de eventual responsável pelos cuidados dos
filhos, indicado pela pessoa presa.
(iii) Ao final da audiência de instrução – tratando-se da regra do art. 400 do
CPP. Segundo entendimento do Supremo Tribunal Federal, através de Tese de
Repercussão Geral, a regra contida no referido artigo de que o interrogatório deve ser
o último ato da audiência se estende para toda a legislação penal especial, inclusive à
Lei de Drogas, objeto de discussão recente. É o entendimento repercutido por meio
da Tese de Repercussão Geral:
EMENTA: Interrogatório judicial. Natureza jurídica (meio de defesa). Ato
que confere essência à garantia do contraditório. Efetivação do interrogatório
como último ato da instrução processual penal (CPP, art. 400). Aplicabilidade dessa
regra legal aos procedimentos penais em geral, inclusiva àqueles disciplinados
por legislação especial, como a Lei de Drogas. Inversão do momento da realização
do interrogatório judicial, efetuado logo no início do processo penal de
conhecimento. Inadmissibilidade. Nulidade processual absoluta. Prejuízo
presumido. Função jurídica das formas processuais. Meio de preservação do
“status libertatis” do acusado. O processo penal como instrumento de salvaguarda
da liberdade jurídica do réu. Nulidade processual reconhecida no caso. “Habeas
corpus” deferido.
- Em sede de persecução penal, o interrogatório judicial – notadamente
após o advento da Lei nº 10.792/2003 – qualifica-se como ato de defesa do réu, que,
além de não ser obrigado a responder a qualquer indagação feita pelo magistrado
processante, também não pode sofrer qualquer restrição em sua esfera jurídica
em virtude do exercício, sempre legítimo, dessa especial prerrogativa. A norma
inscrita no art. 400 do CPP – que define o interrogatório judicial do réu como o
último ato da instrução processual penal – aplica-se aos procedimentos penais em
geral, inclusive àqueles disciplinados por legislação especial (como, p. ex., a Lei de
Drogas). Doutrina. Precedentes.
[...]
• • • •
Art. 400, caput, do Código de Processo Penal. Na audiência de instrução e
julgamento, a ser realizada no prazo máximo de 60 (sessenta) dias, proceder-se-
á à tomada de declarações do ofendido, à inquirição das testemunhas arroladas
pela acusação e pela defesa, nessa ordem, ressalvado o disposto no art. 222 deste
Código, bem como aos esclarecimentos dos peritos, às acareações e ao
reconhecimento de pessoas e coisas, interrogando-se, em seguida, o acusado.
(iv) No início da audiência de instrução – como visto anteriormente, aplica-se
o disposto no art. 400 do CPP a todos os procedimentos penais previstos em lei,
Resumo de Direito Processual Penal III
65
inclusive àqueles dispostos em lei penal especial, como a Lei de Drogas. Nesse
sentido, não há o que se falar em possibilidade de realização do interrogatório no
início da audiência.
(v) Plenário do júri – aqui, o interrogatório ocorrerá posteriormente às
declarações do ofendido e inquirição das testemunhas arroladas, sendo o último ato
da instrução. Posteriormente, ocorrem os debates que precedem a votação do
Tribunal do Júri, conforme definem os arts. 473 e 474 do CPP:
Art. 473, caput, do Código de Processo Penal. Prestado o compromisso
pelos jurados, será iniciada a instrução plenária quando o juiz presidente, o
Ministério Público, o assistente, o querelante e o defensor do acusado tomarão,
sucessiva e diretamente, as declarações do ofendido, se possível, e inquirirão as
testemunhas arroladas pela acusação.
[...]
Art. 474, caput, do Código de Processo Penal. A seguir será o acusado
interrogado, se estiver presente, na forma estabelecida no Capítulo III do Título
VII do Livro I deste Código, com as alterações introduzidas nesta Seção.
9.2.5. Características do interrogatório
(i) Personalíssimo – entende ser personalíssimo, porquanto somente é possível
que a pessoa do acusado fale por si, não havendo o que se falar em representação do
acusado perante o interrogatório.
Inclusive, em regra, somente estarão presentes no interrogatório o
magistrado e o acusado, acompanhado de seu defensor. A participação de terceiros,
conforme veremos, somente se dará quando se tratar de acusado surdo, mudo ou
surdo-mudo, nos moldes do parágrafo único do art. 192 do CPP.
(ii) Judicial – diz-se possuir natureza judicial, pois deve ser realizada, em regra,
conforme veremos (vide tópico 9.2.6. Da realização e do local do interrogatório, infra),
na sede do juízo e pelo magistrado, não havendo intervenção das partes, salvo pela
presença do defensor do acusado, conforme determina o caput do art. 185 do CPP,
cuja redação foi alterada pela Lei nº 10.792/2003.
A doutrina entende ter havido um enfraquecimento/flexibilização da referida
característica em virtude da alteração alhures comentada, tendo em vista possibilitar
seja o acusado acompanhado por seu defensor.
É o comentário de Edilson Mougenot:
Apontava-se como característica do interrogatório, ainda, a judicialidade.
Isso porque o interrogatório constituía um momento de contato direto entre o
juiz e o acusado, sendo, anteriormente ao advento da Lei n. 10.792/2003, vedada
a intervenção do advogado, cuja presença era considerada, em princípio,
facultativa. Entretanto, a atual disciplina do ato tornou obrigatória a presença do
advogado e acabou por flexibilizar a judicialidade do interrogatório, uma vez que
DireitoFacilitado.com.br – Natan Batista
66
a nova redação do art. 188 do Código de Processo Penal6, impingida pela Lei n.
10.792/2003, reforçou seu caráter contraditório, ao permitir às partes
manifestarem-se acerca dos fatos que restaram esclarecidos após a inquirição do
réu pelo juiz, Caberá ao julgador, então, formular perguntas correspondentes, se
as reputar pertinentes e relevantes.
(iii) Público – nos termos do art. 792, caput, do CPP (abaixo transcrito), todos
os atos processuais deverão ser públicos, salvo nos casos em que se aconselhar seja
decretado o sigilo, conforme determinação do §1º do referido artigo:
Art. 792, §1º, do Código de Processo Penal. Se da publicidade da audiência,
da sessão ou do ato processual, puder resultar escândalo, inconveniente grave ou
perigo de perturbação da ordem, o juiz, ou o tribunal, câmara, ou turma, poderá,
de ofício ou a requerimento da parte ou do Ministério Público, determinar que o
ato seja realizado a portas fechadas, limitando o número de pessoas que possam
estar presentes.
(iv) Oral – o interrogatório será realizado oralmente e em língua nacional,
sendo possível, para a observância desta regra, a intimação de tradutor, nos termos
do art. 193 do CPP:
Art. 193 do Código de Processo Penal. Quando o interrogando não falar a
língua nacional, o interrogatório será feito por meio de intérprete.
A oralidade será excepcionalmente não aplicada diante da incidência dos
casos narrados pelo art. 192 do CPP, em se tratando o acusado de surdo, mudo ou
surdo-mudo. Vejamos a exceção:
Art. 192 do Código de Processo Penal. O interrogatório do mudo, do surdo
ou do surdo-mudo será feito pela forma seguinte:
I – ao surdo serão apresentadas por escrito as perguntas, que ele
responderá oralmente;
II – ao mudo as perguntas serão feitas oralmente, respondendo-as por
escrito;
III – ao surdo-mudo as perguntas serão formuladas por escrito e do mesmo
modo dará as respostas.
Parágrafo único. Caso o interrogando não saiba ler ou escrever, intervirá
no ato, como intérprete e sob compromisso, pessoa habilitada a entendê-lo.
É, portanto, a determinação perante a referida exceção:
(iv.i) Acusado surdo – perguntas por escrito, respostas orais;
(iv.ii) Acusado mudo – perguntas orais, respostas por escrito;
(iv.iii) Acusado surdo-mudo – perguntas e respostas por escrito.
6 Art. 188 do Código de Processo Penal. Após proceder ao interrogatório, o juiz indagará das partes se restou algum fato para ser esclarecido, formulando as perguntas correspondentes se o entender pertinente e relevante.
Resumo de Direito Processual Penal III
67
9.2.6. Da realização e do local do interrogatório
Estudaremos, aqui, o local em que ocorrerá o interrogatório, bem como quais
são os elementos que deverá o magistrado providenciar para que seja válido o
referido meio de prova.
Pois bem.
9.2.6.1. Do local do interrogatório
Determinam os arts. 185, caput e §1º, e 792, caput, do CPP:
Art. 185 do Código de Processo Penal. O acusado que comparecer perante
a autoridade judiciária, no curso do processo penal, será qualificado e interrogado
na presença de seu defensor, constituído ou nomeado.
§1º. O interrogatório do réu preso será realizado, em sala própria, no
estabelecimento em que estiver recolhido, desde que estejam garantidas a
segurança do juiz, do membro do Ministério Público e dos auxiliares bem como a
presença do defensor e a publicidade do ato.
[...]
Art. 792, caput, do Código de Processo Penal. As audiências, sessões e os
atos processuais serão, em regra, públicos e se realizarão nas sedes dos juízos e
tribunais, com assistência dos escrivães, do secretário, do oficial de justiça que
servir de porteiro, em dia e hora certos, ou previamente designados.
Nota-se, portanto, que o local em que se realizará o interrogatório depende
de algumas circunstâncias.
(i) Regra – em regra, todo ato processual deverá ocorrer na sede do juízo,
incluindo-se aqui o interrogatório do acusado, conforme determina o caput dos arts.
185 e 792, acima transcritos.
Existem, porém, exceções, quais sejam:
(ii) Exceções:
(ii.i) Acusado preso – em que pese a fixação do entendimento de que sempre
está à disposição do juízo o acusado, ainda que preso, determina o §1º do art. 185
dirija-se o juiz até ele, sendo o interrogatório realizado em sala apropriada na unidade
prisional. A referida exceção busca evitar o deslocamento do preso, visando a
manutenção da segurança pública, haja vista que tal fato poderia ensejar a tentativa
de fuga do detento.
Importante ressaltar, contudo, que o acima exposto somente assim se
procederá quando estiver garantida a proteção do magistrado, do Ministério Público
e dos auxiliares da justiça. Há de se observar, também, a presença do defensor do
acusado e a publicidade do ato.
Art. 185, §1º, do Código de Processo Penal. O interrogatório do réu preso
será realizado, em sala própria, no estabelecimento em que estiver recolhido,
DireitoFacilitado.com.br – Natan Batista
68
desde que estejam garantias a segurança do juiz, do membro do Ministério
Público e dos auxiliares bem como a presença do defensor e a publicidade do ato.
Não sendo possível sejam garantidos os elementos acima elencados, deverá o
interrogatório ser realizado de acordo com a regra, ou seja, na sede do juízo, ocasião
na qual se requisitará a apresentação do réu para que exerça seu direito de
autodefesa.
Art. 185, §7º, do Código de Processo Penal. Será requisitada a apresentação
do réu preso em juízo nas hipóteses em que o interrogatório não se realizar na
forma prevista nos §§ 1º e 2º deste artigo.
(ii.ii) Interrogatório por videoconferência – segue a explicação no próximo
tópico.
9.2.6.2. Interrogatório por videoconferência
É a disposição do §2º do art. 185 do CPP:
Art. 185 do Código de Processo Penal. [...]
[...]
§2º. Excepcionalmente, o juiz, por decisão fundamentada, de ofício ou a
requerimento das partes, poderá realizar o interrogatório do réu preso por
sistema de videoconferência ou outro recurso tecnológico de transmissão de sons
e imagens em tempo real, desde que a medida seja necessária para atender a uma
das seguintes finalidades:
Inc. I:
I - prevenir risco à segurança pública, quando exista fundada suspeita de
que o preso integre organização criminosa ou de que, por outra razão, possa fugir
durante o deslocamento.
Importante notar que o presente inciso apresenta dois elementos distintos,
quais sejam:
(i) Prevenção de risco à segurança pública, consubstanciado na suspeita de que
a pessoa do interrogando participe de organização criminosa – insta reconhecer que
não é necessário seja confirmada a sua participação, mas apenas que haja fundada
suspeita;
(ii) Prevenção de risco à segurança pública em virtude da possibilidade de
tentativa de fuga por parte do interrogando – novamente, não estipulou o legislador
seja dada a certeza de sua fuga, mas apenas que haja fundada suspeita de que possa
vim a ocorrer durante o deslocamento para o interrogatório.
Inc. II:
II – viabilizar a participação do réu no referido ato processual, quando haja
relevante dificuldade para o seu comparecimento em juízo, por enfermidade ou
outra circunstância pessoal.
Resumo de Direito Processual Penal III
69
Aqui, trata-se da exceção que leva em consideração estar o interrogando
incapacitado de se deslocar em virtude de enfermidade ou qualquer outra
circunstância que lhe impeça (ex.: idade avançada).
Inc. III:
III – impedir a influência do réu no ânimo de testemunha ou da vítima,
desde que não seja possível colher depoimento destas por videoconferência, nos
termos do art. 217 deste Código7.
Aqui, há o conflito entre dois elementos: a presença do acusado interferir no
colhimento dos depoimentos das testemunhas, haja vista poder deixá-las
desconfortáveis e o direito do acusado em acompanhar todas as audiências e
produção de provas.
Nesse caso, para que sejam ambos preservados, havendo indícios de que a
presença do acusado venha a influenciar a veracidade do alegado pelas testemunhas,
faz-se videoconferência com o acusado, de modo que ele possa acompanhar a
audiência do local em que esteja detido ou de outra localidade, sem que haja maiores
interferências nos depoimentos.
Quanto a esse ponto, inclusive, trata o §4º do referido artigo:
Art. 185, §4º, do Código de Processo Penal. Antes do interrogatório por
videoconferência, o preso poderá acompanhar, pelo mesmo sistema tecnológico,
a realização de todos os atos da audiência única de instrução e julgamento de que
tratam os arts. 400, 411 e 531 deste Código.
Inc. IV:
IV – responder à gravíssima questão de ordem pública.
Por fim, sendo necessário a oitiva do acusado para responder à gravíssima
questão de ordem público, é possível seja realizado o interrogatório por meio de
videoconferência.
9.2.6.3. Providências a serem tomadas pelo juiz
Alguns dispositivos legais exigem que o juiz observe determinados elementos
quando da realização do interrogatório. São as providências que deverão ser
garantidas:
(i) Incomunicabilidade – é assegurado ao acusado que, em havendo mais de
um réu, seja interrogado individualmente, não havendo a interferência de terceiros,
salvo, como já vimos, a de seu defensor. Significa dizer, portanto, que não há o que
se falar na presença dos demais acusados ou qualquer das partes no interrogatório,
7 Art. 217 do Código de Processo Penal. Se o juiz verificar que a presença do réu poderá causar humilhação, temor, ou sério constrangimento à testemunha ou ao ofendido, de modo que prejudique a verdade do depoimento, dará a inquirição por videoconferência e, somente na impossibilidade dessa forma, determinará a retirada do réu, prosseguindo na inquirição, com a presença do seu defensor. Parágrafo único. A adoção de qualquer das medidas previstas no caput deste artigo deverá constar do termo, assim como os motivos que a determinaram.
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sendo ele, conforme destacamos anteriormente (vide tópico 9.2.5. Características do
interrogatório, supra), judicial.
Art. 191 do Código de Processo Penal. Havendo mais de um acusado, serão
interrogados separadamente.
(ii) Entrevista reservada com o defensor – Aduz o §5º do art. 185 do CPP:
Art. 185, §5º, do Código de Processo Penal. Em qualquer modalidade de
interrogatório, o juiz garantirá ao réu o direito de entrevista prévia e reservada
com o seu defensor; se realizado por videoconferência, fica também garantido o
acesso a canais telefônicos reservados para comunicação, entre o defensor que
esteja no presídio e o advogado presente na sala de audiência do Fórum, e entre
este e o preso.
É reservado ao acusado o direito de, anteriormente à realização do
interrogatório, receber de seu advogado orientação jurídica prévia, de modo privado
e, portanto, não estando presente o magistrado.
(iii) Nemo tenetur se detegere – é direito fundamental garantido pela
Constituição Federal e previsto no art. 186 do CPP:
Art. 5º da Constituição Federal. Todos são iguais perante a lei, sem
distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros
residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
LXIII – o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de
permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e do advogado.
• • • •
Art. 186 do Código de Processo Penal. Depois de devidamente qualificado
e cientificado do inteiro teor da acusação, o acusado será informado pelo juiz,
antes de iniciar o interrogatório, do seu direito de permanecer calado e de não
responder perguntas que lhe forem formuladas.
Parágrafo único. O silêncio, que não importará em confissão, não poderá
ser interpretado em prejuízo da defesa.
Sendo um dos princípios que rege a prova (Princípio da não autoincriminação),
é conferido ao acusado o direito de permanecer em silêncio, vedando seja produzida
prova em seu desfavor. Nesse sentido, não pode o silêncio do acusado ser
interpretado contra ele.
Ademais, há entendimento doutrinário de que é reservado, igualmente, ao
acusado o direito de mentir. Em que pese não se tratar de entendimento
incontroverso, não há qualquer tipo penal que preveja pena àquele que mente
perante o interrogatório.
Resumo de Direito Processual Penal III
71
Contudo, lembremos, é possível incorra o acusado nos crimes de denunciação
caluniosa (art. 339, CP) ou autoacusação falsa (art. 341, CP), caso sua dissimulação
atinja qualquer dos tipo objetivos das referidas infrações penais.
9.2.6.4. Fases do interrogatório
É a redação do art. 187 do Código de Processo Penal:
Art. 187, caput, do Código de Processo Penal. O interrogatório será
constituído de duas partes: sobre a pessoa do acusado e sobre os fatos.
Ainda que a legislação somente cite dois momentos do interrogatório,
entende a doutrina existirem três momentos, tendo em vista que divide o primeiro
dos momentos dispostos em lei em dois momentos distintos, conforme veremos,
quais sejam:
(i) Interrogatório de identificação ou qualificação – estipula o §1º do artigo
acima referido:
Art. 187, §1º, do Código de Processo Penal. Na primeira parte o
interrogando será perguntado sobre a residência, meios de vida ou profissão,
oportunidades sociais, lugar onde exerce a sua atividade, vida pregressa,
notadamente se foi preso ou processado alguma vez e, em caso afirmativo, qual
o juízo do processo, se houve suspensão condicional ou condenação, qual a pena
imposta, se a cumpriu e outros dados familiares e sociais.
O interrogatório de identificação ou qualificação, conforme entendimento
doutrinário, somente diz respeito aos elementos capazes de identificar a pessoa do
interrogando, não os excedendo.
Como é possível perceber, trata-se de momento no qual busca o julgador
certificar-se acerca do indivíduo que está sendo interrogado, indagando-lhe acerca
de elementos de sua qualificação.
Cumpre ressaltar que, a despeito do que foi informado no tópico anterior,
principalmente no que diz respeito à incidência do nemo tenetur se detegere perante
o interrogatório, não há o que se falar em sua presença neste momento do
interrogatório, porquanto o interrogando é obrigado a informar ao magistrado
acerca das informações que lhe são indagadas, não podendo, portanto, manter-se
silente, sob pena de incidir na Contravenção Penal prevista no art. 68 dessa lei.
Art. 68 da Lei das Contravenções Penais. Recusar à autoridade, quando por
esta, justificadamente solicitados ou exigidos, dados ou indicações concernentes
à própria identidade, estado, profissão, domicílio e residência:
Pena – multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis.
Parágrafo único. Incorre na pena de prisão simples, de um a seis meses, e
multa, de duzentos mil réis a dois contos de réis, se o fato constitue infração penal
mais grave, quem, nas mesmas circunstâncias, faz declarações inverídicas a
respeito de sua identidade pessoal, estado, profissão, domicílio e residência.
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72
Igualmente, é vedado que o interrogando minta acerca destes elementos, sob
pena de incorrer no crime de falsa identidade, previsto no art. 307 do Código Penal:
Art. 307 do Código Penal. Atribuir-se ou atribuir a terceiro falsa identidade
para obter vantagem, em proveito próprio ou alheio, ou para causar dano a
outrem:
Pena – detenção, de três meses a um ano, ou multa, se o fato constitui
elemento de crime mais grave.
(ii) Interrogatório de individualização – previsto no mesmo parágrafo
transcrito anteriormente, trata-se do momento em que o magistrado realizará
perguntas com o intuito de conhecer acerca de elementos sociais, familiares e
econômicos do interrogando, como se realiza atividade remunerada, qual sua
remuneração, onde mora, se é casado, se possui filhos, com quem mora.
Ademais, buscará o julgador conhecer sobre sua vida pregressa,
questionando-o sobre prisões e processos que já lhe recaíram.
Aqui entra em vigor o Princípio da não autoincriminação, podendo o
interrogando manter-se silente e, inclusive, mentir, conforme entendimento
majoritário da doutrina, porquanto não existe tipo penal que incrimina tal conduta.
(iii) Interrogatório de mérito – aduz o §2º do art. 187 do CPP:
Art. 187, §2º, do Código de Processo Penal. Na segunda parte será
perguntado sobre:
I – ser verdadeira a acusação que lhe é feita;
II – não sendo verdadeira a acusação, se tem algum motivo particular a que
atribuí-la, se conhece a pessoa ou pessoas a quem deva ser imputada a prática do
crime, e quais sejam, e se com elas esteve antes da prática da infração ou depois
dela;
III – onde estava ao tempo em que foi cometida a infração e se teve notícia
desta;
IV – as provas já apuradas;
V – se conhece as vítimas e testemunhas já inquiridas ou por inquirir, e
desde quando, e se tem o que alegar contra elas;
VI – se conhece o instrumento com que foi praticada a infração, ou
qualquer objeto que com esta se relacione e tenha sido apreendido;
VII – se tem algo mais a alegar em sua defesa.
Trata-se, portanto, do interrogatório propriamente dito, momento em que o
magistrado indagará ao interrogando acerca dos fatos que lhe imputa o autor da
ação.
Importante ressaltar que nessa fase vigora o denominado Sistema
presidencialista. Significa dizer que qualquer indagação que se pretenda fazer ao
interrogando deve ser dirigida ao magistrado que, então, fará ao acusado.
Resumo de Direito Processual Penal III
73
9.2.7. Novo interrogatório
Por fim, dispõe o art. 196 do CPP:
Art. 196 do Código de Processo Penal. A todo tempo o juiz poderá proceder
a novo interrogatório de ofício ou a pedido fundamentado de qualquer das
partes.
Portanto, quando houver pedido das partes ou entendendo o juiz, de ofício,
ser necessário novo interrogatório para o deslinde da causa, é possível que assim o
faça.
Contudo, importante ressaltar que não se trata de direito conferido ao
acusado, mas prerrogativa do magistrado para a formação de sua convicção.
9.3. Da Confissão
9.3.1. Conceito, natureza jurídica e objeto
Nas palavras de Guilherme de Souza Nucci, confessar, no âmbito do processo
penal, é admitir contra si, por quem seja suspeito ou acusado de um crime, tendo pleno
discernimento, voluntária, expressa e pessoalmente, diante da autoridade competente,
em ato solene e público, reduzido a termo, a prática de algum fato criminoso.
Em outras palavras, entende-se por confissão o ato do acusado ou suspeito em
admitir ao julgador serem verídicos os fatos a ele imputados pelo sujeito ativo da ação
penal.
Conforme determina o Código de Processo Penal, tem natureza jurídica de
meio de prova, servindo para que seja formada a convicção do magistrado acerca da
verdade do fato objeto da ação penal.
Tem por objeto o próprio conteúdo da confissão, material utilizado pelo
magistrado como elemento probatório, ou seja, tem por objeto a imputação que ao
acusado é feita pela parte autora da ação penal.
9.3.2. Valor probatório da confissão
Em que pese se tratar de ato voluntário do acusado em admitir a veracidade
dos fatos criminosos a ele imputados, não possui a confissão valor probatório
superior, mas relativo. Ou seja, assim como qualquer outro meio de prova, é
necessário seja valorado em conjunto com as demais provas.
Nesse sentido, inclusive, é a redação do art. 197 do CPP:
Art. 197 do Código de Processo Penal. O valor da confissão se aferirá pelos
critérios adotados para os outros elementos de prova, e para a sua apreciação o
juiz deverá confrontá-la com as demais provas do processo, verificando se entre
ela e estas existe compatibilidade ou concordância.
Ou seja, a valoração quanto à confissão deve ser analisada em conjunto com
as demais provas, buscando o magistrado reconhecer entre elas compatibilidade ou
concordância.
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74
Ora, ainda que se trate de confissão, é possível que o acusado reconheça a
veracidade dos fatos imputados contra si com o intuito de proteger terceiro que os
tenha cometido. Nessa situação, configurado estará o crime disposto no art. 341 do
CP (auto-acusação falsa):
Art. 341 do Código Penal. Acusar-se, perante a autoridade, de crime
inexistente ou praticado por outrem:
Pena – detenção, de três meses a dois anos, ou multa.
9.3.3. Classificação da confissão
9.3.3.1. Quanto ao local
(i) Judicial – tem-se por judicial a confissão feita durante o processo e em juízo,
sendo ideal seja realizada quando do interrogatório do acusado. Sendo colhida em
momento diverso do interrogatório, observar-se-á o disposto no art. 199 do CPP:
Art. 199 do Código de Processo Penal. A confissão, quando feita fora do
interrogatório, será tomada por termo nos autos, observado o disposto no art.
195.
Nada impede, contudo, que o juiz proceda novo interrogatório, conforme
estipula o art. 196 do CPP:
Art. 196 do Código de Processo Penal. A todo tempo o juiz poderá proceder
a novo interrogatório de ofício ou a pedido fundamentado de qualquer das
partes.
(ii) Extrajudicial – por outro lado, extrajudicial é a confissão ocorrida fora do
processo, ou seja, durante outras fases da persecução penal, como no inquérito
policial.
9.3.3.2. Quanto aos efeitos gerados
(i) Simples – é simples a confissão que admite ao acusado a autoria dos fatos
e ele imputados tais quais foram narrados na denúncia ou queixa, ou seja, o acusado
os admite em sua integralidade, nos exatos termos em que foram apresentados.
Assim o fazendo, acarretará, diante da condenação, em diminuição de pena,
porquanto é considerada circunstância atenuante, nos termos do art. 65, III, d, do
Código Penal:
Art. 65 do Código Penal. São circunstâncias que sempre atenuam a pena:
[...]
III – ter o agente:
[...]
d) confessado espontaneamente, perante a autoridade, autoria do crime.
(ii) Qualificada – nesse caso, em que pese admitir para si a autoria do fato
criminoso, fá-lo de forma inovadora, isto é, acrescenta algum elemento
desconhecido ao fato narrado na denúncia ou queixa. Em outras palavras, admite ter
Resumo de Direito Processual Penal III
75
agido da forma como consta da peça inicial, porém indica fato impeditivo ou
modificativo, responsável por excluir a antijuridicidade ou culpabilidade do crime,
isentando-o da aplicação da pena. Se admitida, leva, em regra, havendo a
condenação, à isenção ou diminuição da pena a ele imputada:
Art. 23, caput, do Código Penal. Não há crime quando o agente pratica o
fato:
I – em estado de necessidade;
II – em legítima defesa;
III – em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de
direito.
9.3.4. Características da confissão
São as características da confissão:
(i) Ato personalíssimo – por ato personalíssimo entende-se que a confissão
somente poderá ser proferida pela pessoa do acusado, ninguém por ele podendo
fazê-lo, não podendo ser representado por qualquer indivíduo, inclusive através de
instrumento de mandato;
(ii) Ato voluntário e espontâneo – significa dizer que não se admite seja a
confissão atingida por meio de coação ou qualquer espécie de constrangimento, seja
ele físico, moral ou psicológico.
Como vimos anteriormente, tratar-se-á de prova inválida, porquanto não
observa norma processual inerente à produção da prova. Nesse caso, deverá ser
desentranhada do processo.
Nos termos do Pacote Anticrime, cujos efeitos estão suspensos por liminar do
Supremo Tribunal Federal, o contato com a prova inválida faz com que o magistrado
tenha que se desligar da presidência da ação, tendo em vista ter sido maculado em
sua capacidade de isenção, não mais sendo capaz de proferir sentença justa, devendo
ser substituído por outro julgador.
(iii) Expressa – em que pese a existência da confissão presumida, vigora e é
adotada pelo Ordenamento Jurídico pátrio a teoria que determina o contrário.
Segundo ela somente é possível que a confissão se dê de forma expressa, não sendo
possível, portanto, que se presuma, por mais que existam elementos que a
possibilitem.
Nesse sentido, inclusive, determina o art. 198 do CPP:
Art. 198 do Código de Processo Penal. O silêncio do acusado não importará
confissão, mas poderá constituir elemento para a formação do convencimento do
juiz.
DireitoFacilitado.com.br – Natan Batista
76
Confessando, deverá o magistrado indagar-lhe acerca dos motivos e
circunstâncias do crime, bem como se o realizou em concorrência com terceiros,
conforme estabelece o art. 190 do CPP:
Art. 190 do Código de Processo Penal. Se confessar a autoria, será
perguntado sobre os motivos e circunstâncias do fato e se outras pessoas
concorreram para a infração, e quais sejam.
(iv) Retratável – estipula o art. 200 do CPP:
Art. 200 do Código de Processo Penal. A confissão será divisível e
retratável, sem prejuízo do livre convencimento do juiz, fundado no exame
das provas em conjunto.
Sendo retratável, é possível que a pessoa do acusado, ainda que tenha
confessado o crime, corrija suas colocações, informando elementos contrários à sua
confissão. Significa dizer que o acusado pode retirar as acusações que fez contra si,
negando posteriormente os fatos a ele imputados.
Em que pese poder retirar aquilo que disse, ambas as manifestações
permanecerão no processo, cabendo ao magistrado ponderá-las em confronto com
as demais provas produzidas.
(v) Divisível – conforme o artigo acima transcrito determina, a confissão terá
caráter divisível. Nesse sentido, é possível que a confissão seja executada em partes,
ou seja, poderá o acusado confessar partes dos fatos a ele imputados em um
determinado momento, somente vindo a revelá-los integralmente em manifestação
posterior.
De outro modo, é possível que somente confesse parte dos fatos. Nesse caso,
somente serão considerados para fins de atenuação da pena os elementos por ele
confessados.
9.3.5. Da delação
A delação é caracterizada por dois elementos distintos, quais sejam: a
confissão própria e a acusação de responsabilidade de terceiro perante o mesmo crime.
Em alguns casos, a pessoa do acusado será beneficiada pela denominada
delação premiada. Nas palavras de Edilson Mougenot, a delação “é o benefício que se
concede ao réu confesso, reduzindo-lhe ou até isentando-lhe de pena, quando denuncia
um ou mais envolvidos na mesma prática criminosa a que responde”.
Vejamos algumas disposições referentes à delação:
(i) Delação nos crimes contra o sistema financeiro – dispõe o art. 25 §2º, da Lei
nº 7.492/96:
Art. 25, §2º, da Lei nº 7.492/96. Nos crimes previstos nesta Lei, cometidos
em quadrilha ou co-autoria, o co-autor ou partícipe que através de confissão
espontânea revelar à autoridade policial ou judicial toda a trama delituosa terá a
sua pena reduzida de um a dois terços.
Resumo de Direito Processual Penal III
77
(ii) Delação nos crimes hediondos – determina o art. 8º, parágrafo único, da Lei
nº 8.072/90:
Art. 8º, parágrafo único, da Lei dos Crimes Hediondos. O participante e o
associado que denunciar à autoridade o bando ou quadrilha, possibilitando seu
desmantelamento, terá a pena reduzida de um a dois terços.
(iii) Delação nos crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as
relações de consumo – é o que aduz o art. 16, parágrafo único, da Lei nº 8.137/90:
Art. 16, parágrafo único, da Lei nº 8.137/90. Nos crimes previstos nesta Lei,
cometidos em quadrilha ou co-autoria, o co-autor ou partícipe que através da
confissão espontânea revelar à autoridade policial ou judicial toda a trama
delituosa terá a sua pena reduzida de um a dois terços.
(iv) Delação nos crimes de lavagem de dinheiro – é a determinação do art. 1º,
§5º, da Lei nº 9.613/98:
Art. 1º, §5º, da Lei nº 9.613/98. A pena poderá ser reduzida de um a dois
terços e ser cumprida em regime aberto ou semiaberto, facultando-se ao juiz
deixar de aplicá-la ou substituí-la, a qualquer tempo, por pena restritiva de
direitos, se o autor, coautor ou participe colaborar espontaneamente com as
autoridades, prestando esclarecimentos que conduzem à apuração das infrações
penais, à identificação dos autores, coautores e partícipes, ou à localização dos
bens, direitos ou valores objeto do crime.
(v) Delação nos crimes de tráfico de droga – está previsto no art. 41 da Lei nº
11.343/06:
Art. 41 da Lei de Drogas. O indiciado ou acusado que colaborar
voluntariamente com a investigação policial e o processo criminal na identificação
dos demais co-autores ou partícipes do crime e na recuperação total ou parcial do
produto do crime, no caso de condenação, terá pena reduzida de um terço a dois
terços.
9.4. Das declarações e perguntas ao ofendido e às testemunhas
9.4.1. Do ofendido
9.4.1.1. Conceito
Tem-se por ofendido a pessoa da vítima, ou seja, trata-se do sujeito passivo do
crime, aquele sobre quem recaem os efeitos da ação delituosa.
Entendeu o legislador se tratar de um meio de prova importante, porquanto é
o indivíduo que sofre diretamente o delito, possuindo, portanto, informações
relevantes para esclarecimento de como a referida ação se desenvolveu.
9.4.1.2. Ofendido ≠ Testemunha
Importante, contudo, que não o confundamos com a testemunha.
Por primeiro, há de ser reconhecido que a própria legislação dispõe acerca
desses indivíduos de forma diversa, cada qual possuindo normas próprias e
específicas.
DireitoFacilitado.com.br – Natan Batista
78
Ademais, as manifestações do ofendido se darão por meio de declarações;
enquanto às testemunhas cabe se manifestar por meio de depoimento.
Por fim, à testemunha recai o dever de compromisso (vide tópico 9.4.2.9. Dever
de compromisso, infra), devendo, portanto, manifestar-se de acordo com a verdade,
sob pena de incidir no crime de falso testemunho; já o ofendido não está sujeito ao
referido crime, tendo em vista que suas declarações não são tomadas sob o dever de
compromisso. Em que pese não prestar compromisso, é possível que o ofendido,
lembremos, incida nos crimes de denunciação caluniosa ou falsa comunicação de
crime.
A distinção acima feita é importante, tendo em vista que, como dito, a lei
dispõe de normas específicas para cada indivíduo. Por exemplo, a lei determina
número máximo de testemunhas arroladas. Não sendo o ofendido uma testemunha,
o requerimento de suas declarações não prejudica em nada a lista de testemunhas
arroladas.
Inclusive, determina a lei:
Art. 201, caput, do Código de Processo Penal. Sempre que possível, o
ofendido será qualificado e perguntado sobre as circunstâncias da infração, quem
seja ou presuma ser o seu autor, as provas que possa indicar, tomando-se por
termo as suas declarações.
Por isso, poderão as partes requerer que o ofendido dê suas declarações ou o
juiz, no uso de sua capacidade postulatória supletiva, exija que assim seja feito.
Por fim, incide sobre o ofendido, quando intimado, o dever de
comparecimento (vide tópico 9.4.2.8. Dever de comparecimento, infra). Significa dizer
que se não comparecer em juízo após intimação, poderá o magistrado determinar
seja conduzido coercitivamente, nos termos do §1º do artigo acima referido:
Art. 201, §1º, do Código de Processo Penal. Se, intimado para esse fim,
deixar de comparecer sem motivo justo, o ofendido poderá ser conduzido à
presença da autoridade.
9.4.1.3. Garantias dos ofendido
O legislador preocupou-se em determinar algumas garantias à pessoa do
ofendido, dispostas nos §§ 2º a 6º do art. 201 do CPP. Vejamos:
Art. 201 do Código de Processo Penal. [...]
(i) Direito de comunicação:
§2º. O ofendido será comunicado dos atos processuais relativos ao ingresso
e à saúde do acusado da prisão, à designação de data para audiência e à sentença
e respectivos acórdãos que a mantenham ou modifiquem.
§3º. As comunicações ao ofendido deverão ser feitas no endereço por ele
indicado, admitindo-se, por opção do ofendido, o uso de meio eletrônico.
Resumo de Direito Processual Penal III
79
(ii) Direito de garantia durante à audiência:
§4º. Antes do início da audiência e durante a sua realização, será reservado
espaço separado para o ofendido.
(iii) Direito a atendimento multidisciplinar:
§5º. Se o juiz entender necessário, poderá encaminhar o ofendido para
atendimento multidisciplinar, especialmente nas áreas psicossocial, de assistência
jurídica e de saúde, a expensas do ofensor ou do Estado.
(iv) Direito de manutenção da intimidade:
§6º. O juiz tomará as providências necessárias à preservação da intimidade,
vida privada, honra e imagem do ofendido, podendo, inclusive, determinar o
segredo de justiça em relação aos dados, depoimentos e outras informações
constantes dos autos a seu respeito para evitar sua exposição aos meios de
comunicação.
9.4.1.4. Valor probatório das declarações do ofendido
Como toda e qualquer prova, as declarações do ofendido possuem valor
probatório relativo, devendo ser valoradas em conjunto com as demais provas
produzidas nos autos.
Contudo, importante ressaltar o valor que possuem nos crimes praticados na
clandestinidade, ou seja, furtivamente, como os crimes em ambiente doméstico,
quando está sozinha a vítima.
Entende a doutrina, inclusive, que em havendo incompatibilidade entre as
declarações do ofendido e do acusado nesses casos, é preferível tenha maior valor
probatório as declarações do primeiro em detrimento do segundo.
9.4.2. Das testemunhas
9.4.2.1. Conceito
Entende-se por testemunha, nas palavras de Fernando da Costa Tourinho
Filho, “... a pessoa, distinta dos sujeitos processuais principais, que presta uma
declaração, positiva ou negativa, da verdade feita ante o juiz, sobre percepções
sensoriais recebidas por ela, a respeito de um fato passado e dirigida à comprovação da
verdade”.
Em outras palavras, tem-se por testemunha o indivíduo estranho à relação
jurídico-processual, responsável por, através de seu depoimento, buscar transmitir
ao magistrado aquilo que captou dos fatos criminosos, através de seus sentidos,
visando formar-lhe a convicção.
9.4.2.2. Valor probatório das declarações das testemunhas
É de rigor o reconhecimento do elevado valor da prova testemunha,
porquanto é o meio de prova mais comum. Contudo, lembremos, nenhum meio de
DireitoFacilitado.com.br – Natan Batista
80
prova possui valor probatório superior ao das demais provas, devendo ser valorado
conjuntamente com todas as provas produzidas em juízo.
Como dito, é o meio de prova mais frequente. Por isso, é necessário sejam
tomadas algumas cautelas. Nesse sentido, elenquemos alguns defeitos que podem
acompanhar o depoimento das testemunhas:
(i) É possível seja o depoimento alterado em virtude da moral da testemunha.
Por exemplo, a depender da bondade ou da má-fé da testemunha, a narração dos fatos
criminosos pode se dar de forma distorcida e até mesmo de forma falsa;
(ii) Muitas vezes a testemunha se trata de indivíduo que nunca se apresentou em
juízo. Por esse motivo, é comum não se sinta confortável dentro do Fórum ou perante
as autoridades judiciais, policiais e do Ministério Público, manifestando medo, o que
pode vir a alterar o seu depoimento;
(iii) Como dito anteriormente, cabe à testemunha transmitir ao magistrado os
fatos que percebeu através de seus sentidos. Tendo em isso em mente, é possível que
não seja transmitida a verdade fática dos elementos narrados em virtude de
incapacidade ou defeito na captação sensorial, imaturidade da testemunha ou na
existência de anomalia psíquica responsável por alterar a realidade;
(iv) Acompanhando o raciocínio acima criado, é possível que a testemunha
apresente dificuldades de percepção ou de memorização, o que faz com que os
elementos captados pelos sentidos se percam ou se tornem obnubilados pelo tempo.
9.4.2.3. Classificação das testemunhas
A testemunha poderá ser:
(i) Direta – entende-se por direta a testemunha que depõe acerca de fato cuja
captação se seu de forma direta, ou seja, narra fato que de fato presenciou, não o
tendo captado por intervenção de um terceiro elemento;
(ii) Indireta – por outro lado, portanto, são indiretas as testemunhas que
informem acerca de fatos que atingiram o seu conhecimento em virtude de
intervenção de terceiros, ou seja, não presenciaram o fato criminoso, mas tiveram
conhecimento desse através de terceiros;
Nesse ponto, importante diferenciarmos as denominadas testemunhas
oculares e testemunhas presenciais. Oculares são as testemunhas de fato tiveram
visualização dos fatos criminosos; enquanto presenciais são aquelas que, em que
pese se encontrarem no local do crime, não tiveram, de fato, visualização do fato,
seja por deficiência visual, falta de atenção ou qualquer outro elementos que as tenha
impedido de visualizar o delito;
(iii) Própria – própria é a testemunha cujo objeto/conteúdo do testemunho
coincide com o objeto da ação penal, ou seja, seu testemunho é caracterizado por
elementos comuns ao processo;
Resumo de Direito Processual Penal III
81
(iv) Imprópria – já imprópria é a testemunha que depõe sobre ato, fato ou
circunstâncias alheias ao objeto do processo. Tais fatos, por outro lado, dizem
respeito a atos procedimentais. São as chamadas testemunhas instrumentárias ou
fedatárias, cuja função é presenciar e dar fé sobre a execução de atos processuais
específicos. Por exemplo, é o nome que se dá à testemunha que atesta ter ocorrido
a prisão em flagrante do suspeito de ter cometido ato delituoso – é o que está
disposto no art. 304, §3º, do CPP:
Art. 304, §3º, do Código de Processo Penal. Quando o acusado se recusar a
assinar, não souber ou não puder fazê-lo, o auto de prisão em flagrante será
assinado por duas testemunhas, que tenham ouvido sua leitura na presença
deste.
(v) Numerárias – tem-se por numerárias as testemunhas arroladas em virtude
da execução da capacidade postulatória principal, ou seja, tratam-se das testemunhas
arroladas pelas partes. São assim denominadas, pois a legislação tratou de limitá-las
a depender do procedimento adotado no processo;
(vi) Extranumerárias – de outra mão, extranumerárias são as testemunhas
indicadas através do exercício da capacidade postulatória supletiva, ou seja, trata-se
das testemunhas indicadas pelo magistrado. Nesse caso, não há o que se falar em
limite de testemunhas. É o que determina o art. 209 do CPP:
Art. 209, caput, do Código de Processo Penal. O juiz, quando julgar
necessário, poderá ouvir outras testemunhas, além das indicadas pelas partes.
(vii) Informantes – como veremos adiante, em regra, é necessário que o
depoimentos das testemunhas seja colhido ocorrendo, antes, compromisso com a
verdade (vide tópico 9.4.2.8. Dever de compromisso, infra). Ocorre que há indivíduos
cujo depoimento sob compromisso não é necessário. Àqueles cujo depoimento não
exige o cumprimento do dever de compromisso dá-se o nome de testemunhas
informantes.
Podemos citar como exemplo os doentes mentais, menores de 14 anos etc.
(viii) Referidas – são as testemunhas cujo conhecimento se deu através do
depoimento de outras testemunhas. Sua previsão está contida no art. 209, §1º, do
CPP:
Art. 209, §1º, do Código de Processo Penal. Se ao juiz parecer conveniente,
serão ouvidas as pessoas a que as testemunhas se referirem.
9.4.2.4. Características da prova testemunhal
(i) Judicialidade – somente se considera prova testemunhal aquela prestada
em juízo e diante do magistrado, ocorrendo, portanto, durante o processo. Aqui, é
necessário seja presidida pelo magistrado, não sendo possível que haja qualquer tipo
de mediação;
(ii) Oralidade – em regra, o depoimento deve ser colhido oralmente, conforme
determina o art. 204, caput, do CPP:
DireitoFacilitado.com.br – Natan Batista
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Art. 204, caput, do Código de Processo Penal. O depoimento será prestado
oralmente, não sendo permitido à testemunha trazê-lo por escrito.
Importante ressaltar que não é vedado às testemunhas levarem, por escrito,
apontamentos que entendem serem imprescindíveis, nos moldes do parágrafo único
do art. 204:
Art. 204, parágrafo único, do Código de Processo Penal. Não será vedada
à testemunha, entretanto, breve consulta a apontamentos.
Em que pese ser esta a regra, há exceções. Vejamos:
(ii.i) Exceção por impossibilidade prática – é possível seja parcialmente ou
integralmente escrita em se tratando de testemunha surda, muda ou surda-muda. O
procedimento observado nessas situações está disposto nos arts. 192 e 223 do CPP:
Art. 192 do Código de Processo Penal. O interrogatório do mudo, do surdo
ou do surdo-mudo será feito pela forma seguinte:
I – ao surdo serão apresentadas por escrito as perguntas, que ele
responderá oralmente;
II – ao mudo as perguntas serão feitas oralmente, respondendo-as por
escrito;
III – ao surdo-mudo as perguntas serão formuladas por escrito e do mesmo
modo dará as respostas.
Parágrafo único. Caso o interrogando não saiba ler ou escrever, intervirá
no ato, como intérprete e sob compromisso, pessoa habilitada a entende-lo.
[...]
Art. 223 do Código de Processo Penal. Quando a testemunha não conhecer
a língua nacional, será nomeado intérprete para traduzir as perguntas e respostas.
Parágrafo único. Tratando-se de mudo, surdo ou surdo-mudo, proceder-
se-á na conformidade do art. 192.
(ii.ii) Exceção de prerrogativa de função – por outro lado, a lei confere a alguns
indivíduos a possibilidade de realizarem seus testemunhos por meio escrito e através
de ofício, em virtude de prerrogativa de função. Nesse sentido, é o que aduz o art. 221,
§1º, do CPP:
Art. 221, §1º, do Código de Processo Penal. O Presidente e o Vice-Presidente
da República, os presidentes do Senado Federal, da Câmara dos Deputados e do
Supremo Tribunal Federal poderá optar pela prestação de depoimento por
escrito, caso em que as perguntas, formuladas pelas partes e deferidas pelo juiz,
lhes serão transmitidas por ofício.
(iii) Objetividade – diz respeito ao conteúdo do testemunho, cabendo à
testemunha depor diretamente acerca dos fatos que compõem o objeto da ação
penal. Nesse sentido, não deve a testemunha realizar qualquer juízo de valor acerca
dos fatos que informará, ou seja, são vedados os subjetivismos, salvo se indissociáveis
Resumo de Direito Processual Penal III
83
do testemunho. Assim, somente lhe incumbe tratá-los de forma objetiva. Dispõe o
art. 213 do CPP:
Art. 213 do Código de Processo Penal. O juiz não permitirá que a
testemunha manifeste suas apreciações pessoais, salvo quando inseparáveis da
narrativa do fato.
(iv) Retrospectividade – como já explicamos, a prova tem por característica a
anterioridade, tendo em vista que busca reconstruir fato pretérito, ou seja, que já
ocorreu. Não poderia ser diferente com a prova testemunhal. A retrospectividade
trata justamente disso, devendo o teor do testemunho remeter a fato já ocorrido,
consubstanciado no fato delituoso passado. Nessa senda, não é possível que a
testemunha realize prognósticos, isto é, é vedado que faça juízo acerca de fato que
possa ocorrer e que, portanto, não tenha ocorrido.
9.4.2.5. Capacidade de ser testemunha
Aqui, o nosso objetivo é responder à simples pergunta: quem poderá ser
testemunha? Apresenta-nos a regra geral o art. 202 do CPP:
Art. 202 do Código de Processo Penal. Toda pessoa poderá ser
testemunha.
Tendo isso em mente, somente um ponto deve ser por nós levantado. O que
se entente por pessoa?
Nesse caso, somente será considerada pessoa para fins testemunhais as
pessoas físicas, haja vista a impossibilidade de execução da referida função por parte
das pessoas jurídicas, porquanto não lhes é possível a realização de valoração em
virtude da inexistência de condições físicas, mentais ou psíquicas que assim as
permita.
É pertinente o comentário de Edilson Mougenot:
Não há, portanto, em princípio, limitações acerca da idade, da capacidade
civil ou de outras qualidades que impeçam alguém de servir como testemunha no
processo penal.
Vale dizer, no processo penal todas as pessoas podem ser testemunhas,
mas caberá ao julgador analisar, quando da sentença, a utilidade, pertinência e
idoneidade dos testemunhos.
9.4.2.6. Dever de depor
Determina o art. 206, primeira parte, do CPP:
Art. 206, primeira parte, do Código de Processo Penal. A testemunha não
poderá eximir-se da obrigação de depor. [...]
Significa dizer que uma vez arroladas e consequentemente intimadas em
juízo, não é possível se eximam de tal obrigação, devendo comparecer em juízo.
DireitoFacilitado.com.br – Natan Batista
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Tendo em vista que a todos compete ser testemunha, a todos é atribuído o
dever de depor.
(i) Podem se recusar a depor – o próprio artigo, contudo, elenca as exceções à
referida regra. Vejamos:
Art. 206, segunda parte, do Código de Processo Penal. [...] Poderão,
entretanto, recusar-se a fazê-lo o ascendente ou descendente, o afim em linha
reta, o cônjuge, ainda que desquitado, o irmão e o pai, a mãe, ou o filho adotivo
do acusado, salvo quando não for possível, por outro modo, obter-se ou integrar-
se a prova do fato e de suas circunstâncias.
São, portanto, as pessoas a que a referida faculdade atinge: (i.i) Ascendente;
(i.ii) Descendente; (i.iii) Afim em linha reta; (i.iv) Cônjuge, ainda que desquitado; (i.v)
Irmão; (i.vi) Pai; (i.vii) Mãe; (i.viii) Filho adotivo.
Primeiramente, convém informar que o rol acima elencado é taxativo e,
portanto, não permite seja feita interpretação extensiva ou o uso de analogias.
Como é possível constatar, tratam-se de indivíduos que possuem com a
pessoa do acusado vínculo familiar. Nesse sentido, buscou o legislador preservar as
relações familiares, dando-lhes a faculdade de não depor em desfavor do acusado.
O único elemento que merece uma maior atenção é o cônjuge.
Por primeiro, a faculdade de depor em desfavor do acusado não somente
recai sobre a pessoa com quem tenha contraído matrimônio, mas também em
relação àquele com quem mantém união estável.
Ademais, há de se notar a existência da expressão “ainda que desquitado”.
Aqui, é necessária uma análise mais profunda.
Vigorou no Ordenamento Jurídico brasileiro três formas de afrouxamento do
vínculo matrimonial. Até 1977 não era possível a sua total dissolução, vigorando o
chamado desquite8. Tratava-se de instituto jurídico segundo o qual ocorria a
separação de fato, sem que, contudo, houvesse a dissolução do matrimônio.
A partir de 1977 vigora a denominada Lei do Divórcio (Lei nº 6.515/1977),
responsável pela revogação do referido instituto, acrescendo às causas de
encerramento da sociedade conjugal dois novos elementos, quais sejam: (i) a
separação judicial e (ii) o divórcio.
8 Art. 315 do Código Civil de 1916. A sociedade conjugal termina: [...] III – pelo desquite, amigável ou judicial. [...] Art. 317 do Código Civil de 1916. A ação de desquite só se pode fundar em algum dos seguintes motivos: I – Adultério; II – Tentativa de morte; III – Sevícia, ou injúria grave; IV – Abandono voluntário do lar conjugal, durante dois anos contínuos.
Resumo de Direito Processual Penal III
85
Em relação à separação judicial, entende-se pelo procedimento que põe termo
aos deveres de coabitação, fidelidade recíproca e ao regime matrimonial de bens,
como se o casamento fosse dissolvido (art. 3º, caput, da Lei nº 6.515/77).
Por outro lado, tem-se por divórcio o instituto que põe termo ao casamento e
aos efeitos civis do matrimônio religioso (art. 24, caput, da Lei nº 6.515/77).
Ocorre que a separação judicial somente será convertida em divórcio passado
um ano da sentença que o determinou, ocasião na qual é permitido que a mulher
volte a se utilizar do nome que possuía antes da contração do vínculo matrimonial:
Art. 25 da Lei nº 6.515/77. A conversão em divórcio da separação judicial dos
cônjuges existente há mais de um ano, contada da data da decisão ou da que
concedeu a medida cautelar correspondente (art. 8º), será decretada por
sentença, da qual não constará referência à causa que a determinou.
Parágrafo único. A sentença de conversão determinará que a mulher volte
a usar o nome que tinha antes de contrair matrimônio, só conservando o nome
de família do ex-marido se alteração prevista neste artigo acarretar:
I – evidente prejuízo para a sua identificação;
II – manifesta distinção entre o seu nome de família e dos filhos havidos da
união dissolvida;
III – dano grave reconhecido em decisão judicial.
Tendo isso em mente, não existindo mais o instituto do desquite, ao ser lido
“ainda que desquitado”, leia-se “ainda que separado judicialmente”, porquanto ainda
não incidentes os efeitos do divórcio.
Convertendo-se ou sendo, desde o início, executado o divórcio, não há o que
se falar em adoção da faculdade de depor, sendo o cônjuge divorciado obrigado a
fazê-lo, inclusive sob compromisso com a verdade.
• • • •
Continuando o raciocínio, como vimos, trata-se de faculdade de depor, não
sendo o indivíduo, portanto, obrigado a fazê-lo.
Dessa forma, não há o que se falar em vedações ao arrolamento de parentes
do acusado como testemunhas. Nesse caso, cabe ao juiz informar-lhes ser uma
faculdade, não sendo obrigados a prestar o depoimento.
Contudo, optando por fazê-lo, seu depoimento será colhido sem que seja
realizado o compromisso. Significa dizer que os parentes do acusado somente
poderão depor sob a condição de informantes (vide tópico 9.4.2.3. Classificação das
testemunhas, supra).
• • • •
Por fim, insta informar haver uma exceção dentro dessa exceção.
DireitoFacilitado.com.br – Natan Batista
86
Em que pese ser possível que os indivíduos elencados no art. 206 optem por
não depor, poderá o magistrado determinar a obrigatoriedade do colhimento de seus
depoimentos, uma vez que não existam outros meios capazes de produzir a referida
prova.
Nesse caso, optar-se-á pelo esclarecimento do fato criminoso em detrimento
da manutenção da harmonia do vínculo familiar. Ou seja, prevalecendo o interesse
público ante o interesse particular da família em questão.
Para tanto, deverá o magistrado fundamentar a sua decisão.
Igualmente ao caso do parente que opta por depor, os depoimentos
determinados pelo magistrado no caso aqui explicado serão colhidos sem que se
realize o compromisso, atuando os parentes como informantes.
(ii) São proibidos de depor – determina o art. 207 do CPP:
Art. 207 do Código de Processo Penal. São proibidas de depor as pessoas
que, em razão de função, ministério, ofício ou profissão, devam guardar segredo,
salvo se, desobrigadas pela parte interessada, quiserem dar o seu testemunho.
Aqui, a proibição de depor vigora em virtude da existência do denominado
dever de guardar segredo. O referido dever existe em função de ter o indivíduo
adquirido conhecimento do fato criminoso por executar função, ministério, ofício ou
profissão que o permita sabê-lo.
O que se verifica é uma disparidade entre o modo pelo qual as testemunhas
normalmente adquirem conhecimento do fato criminoso. Em que pese as
denominadas testemunhas diretas ou indiretas tenham conhecimento do crime em
virtude de o terem presenciado ou de terceiro os cientificar, aqueles sobre quem
recai o dever de guardar segredo sabem do fato, pois o labor que executam lhes
permite ter acesso a tais informações em virtude de incidir sobre eles o caráter da
confidencialidade e confiabilidade. É o que ocorre, por exemplo, com o padre a quem
o acusado se confessa e revela ter cometido ou não o crime
Nota-se, portanto, que o caso aqui analisado leva em consideração elemento
moral, pois não coaduna com a Justiça se utilizar da confiabilidade e confidencialidade
conferida a tais indivíduos para que seja o indivíduo incriminado e condenado.
Para que entendamos com maior profundidade o referido caso, convém que
esclareçamos o que se entende por função, ministério, ofício ou profissão:
(ii.i) Função – tem-se por função o cargo conferido ao indivíduo em virtude de
lei, decisão judicial ou contrato. É o caso, por exemplo, do tutor, curador,
inventariante, diretor de empresa, diretor de hospital, deputado, senador, membro do
Ministério Público etc.
Aqui, reveste a função a confidencialidade anteriormente citada, de modo que
a função lhes permita saibam de informações que a eles são confiadas.
Resumo de Direito Processual Penal III
87
(ii.ii) Ministério – trata-se do exemplo anteriormente dado. Entende-se pelo
cargo em atividade religiosa ou social. Nesse caso, o dever de confidenciabilidade é
inerente ao cargo, pois constante em instrumento normativo canônico/religioso. É o
caso do padre, sacerdote, pastor, rabino, líder espírita, pai de santo.
À título de curiosidade, determina o Cânone nº 983 do Código de Direito
Canônico:
Cânone nº 983 do Código de Direito Canônico. §1º. O sigilo sacramental é
inviolável; pelo que o confessor não pode denunciar o penitente nem por palavras
nem por qualquer outro modo nem por causa alguma.
§2º. Estão também obrigados a guardar segredo o intérprete, se o houver,
e todos os outros a quem tiver chegado, por qualquer modo, o conhecimento dos
pecados manifestados em confissão.
(ii.iii) Ofício – entende-se por ofício a atividade predominantemente mecânica/
manual. Aqui, nota-se, não é base da profissão a confidencialidade ou a confiabilidade.
Nesse caso, o dever de guardar segredo lhes atinge por extensão. Ainda que a
profissão em si não exija o referido dever, é possível que executem seu labor para
indivíduos que o possuem, ocasião na qual lhes será estendido. É o caso do
serralheiro, costureiro, manicure, técnico em informática etc;
(ii.iv) Profissão – é a atividade de natureza predominantemente intelectual.
Diante das profissões, há a existência de leis que as regulamentam, responsáveis por
lhes conferir o dever de guardar segredo. É o que ocorre, por exemplo, com os
médicos, engenheiros, construtores, advogados, psicólogos, assistentes sociais etc.
• • • •
O referido dever somente poderá ser rompido diante da cumulação de dois
elementos, quais sejam: (i) desejo de depor; (ii) existência de autorização do
interessado no segredo.
Por esse motivo, inclusive, o crime disposto no art. 154 do Código Penal
somente se procede mediante representação:
No mesmo sentido determina o art. 154 do Código Penal:
Art. 154 do Código Penal. Revelar alguém, sem juta causa, segredo, de
quem tem ciência em razão de função, ministério, ofício ou profissão, e cuja
revelação possa produzir dano a outrem:
Pena – detenção, de três meses a um ano, ou multa de um conto a dez
contos de réis.
Parágrafo único. Somente se procede mediante representação.
9.4.2.7. Dever de comparecimento
Não é possível que a testemunha devidamente intimada se recuse a
comparecer em juízo. O dever de comparecimento, portanto, consubstancia-se na
DireitoFacilitado.com.br – Natan Batista
88
obrigação que tem o indivíduo em se apresentar perante o juízo no dia e hora fixados
pelo juiz se intimado para que preste, enquanto testemunha, o seu depoimento.
Como vimos anteriormente, toda pessoa pode atuar como testemunha. Logo,
toda pessoa possui o direito de comparecimento.
Ocorre, contudo, que há exceções, quais sejam:
(i) Impossibilidade prática – determina o art. 220 do CPP:
Art. 220 do Código de Processo Penal. As pessoas impossibilitadas, por
enfermidade ou por velhice, de comparecer para depor, serão inquiridas onde
estiverem.
Significa dizer, portanto, que em se tratando de testemunha com idade
avançada ou acometida por doença grave incapacitante, não lhe será exigido o
comparecimento em juízo, sendo possível seja o seu depoimento colhido no local em
que se encontrar.
(ii) Prerrogativa de função – é a disposição do art. 221, caput, do CPP:
Art. 221, caput, do Código de Processo Penal. O presidente e o Vice-
Presidente da República, os senadores e deputados federais, os ministros de
Estado, os governadores de Estado e Territórios, os secretários de Estado, os
prefeitos do Distrito Federal e dos Municípios, os deputados às Assembleias
Legislativas Estaduais, os membros do Poder Judiciário, os ministros e juízes dos
Tribunais de Contas da União, dos Estados, do Distrito Federal, bem como os do
Tribunal Marítimo serão inquiridos em local, dia e hora previamente ajustados
entre eles e o juiz.
Por primeiro, importante ressaltar que o dispositivo acima representa rol
exemplificativo, porquanto é possível que lei ordinária o amplie, como já o fez. Além
dos indivíduos acima elencados, o dispositivo se aplica, por exemplo, aos membros
do Ministério Público9.
Além da prerrogativa que lhes permite apresentar o depoimento por meio
escrito através de ofício, se realizado de modo oral, não pode o magistrado ajustar o
dia e a hora previamente, devendo, antes, com eles ajustar tais elementos.
(iii) Residem fora do limite territorial sujeito à jurisdição do juiz – por fim, aduz
o art. 222 do CPP:
Art. 222 do Código de Processo Penal. A testemunha que morar fora da
jurisdição do juiz será inquirida pelo juiz do lugar de sua residência, expedindo-se,
para esse fim, carta precatória, com prazo razoável, intimadas as partes.
§1º. A expedição da precatória não suspenderá a instrução criminal.
9 Art. 40 da Lei nº 8.625/93. Constituem prerrogativas dos membros do Ministério Público, além de outras previstas na Lei Orgânica: I – ser ouvido, como testemunha ou ofendido, em qualquer processo ou inquérito, em dia, hora e local previamente ajustados com o Juiz ou a autoridade competente.
Resumo de Direito Processual Penal III
89
§2º. Findo o prazo marcado, poderá realizar-se o julgamento, mas, a todo
tempo, a precatória, uma vez devolvida, será junta aos autos.
§3º. Na hipótese prevista no caput deste artigo, a oitiva de testemunha
poderá ser realizada por meio de videoconferência ou outro recurso tecnológico
de transmissão de sons e imagens em tempo real, permitida a presença do
defensor e podendo ser realizada, inclusive, durante a realização da audiência de
instrução e julgamento.
Nesse caso, por óbvio, não é necessário que se apresentem perante o juízo
competente para o colhimento do depoimento, podendo ser realizado por meio de
carta precatória ou videoconferência.
No primeiro caso, as partes, acusação e defesa, serão intimadas da expedição
da carta pelo juízo deprecante, a fim de possibilitar que compareçam ao depoimento,
sob pena de nulidade relativa do ato processual. Não é necessário, contudo, que o
juízo deprecado as intime da realização da audiência. Se assim quiserem, é necessário
que diligenciem exigindo o oferecimento de informações nesse sentido.
Nesse sentido, vejamos as Súmulas que seguem:
Súmula nº 155 do Supremo Tribunal Federal. É relativa a nulidade do
processo criminal por falta de intimação da expedição de precatória para
inquirição de testemunha.
Súmula nº 273 do Superior Tribunal de Justiça. Intimada a defesa da
expedição da carta precatória, torna-se desnecessária intimação da data da
audiência no juízo deprecado.
• • • •
Ainda assim, é possível que surja a seguinte questão: em se tratando de
testemunha essencial ao deslinde da causa, é possível seja obrigada a comparecer em
juízo ainda que incidentes os casos acima narrados? Ainda que se trate de testemunha
essencial, não é possível sejam ignoradas as disposições anteriormente explicadas.
Constatando-se o fumus boni iuris e periculum in mora, porém, é possível
quereriam as partes a produção antecipada da prova, sendo a testemunha inquirida
por meio de carta precatória.
• • • •
Por fim, compete a nós estabelecer quais as consequências diante da violação
do dever de comparecimento. Nesse sentido, determina o art. 218 do CPP:
Art. 218 do Código de Processo Penal. Se, regularmente intimada, a
testemunha deixar de comparecer sem motivo justificado, o juiz poderá requisitar
à autoridade policial a sua apresentação ou determinar seja conduzida por oficial
de justiça, que poderá solicitar o auxílio da força pública.
Portanto, violando-se o dever de comparecimento é possível determine o
magistrado a requisição da testemunha à autoridade policial ou requeira seja
conduzida por oficial de justiça, podendo solicitar auxílio de força pública/policial, ou
DireitoFacilitado.com.br – Natan Batista
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seja, não comparecendo por motivo injustificado, é possível que juiz determina a sua
condução coercitiva (condução sob vara).
9.4.2.8. Dever de compromisso
É o que dispõe o art. 203 do CPP:
Art. 203 do Código de Processo Penal. A testemunha fará, sob palavra de
honra, a promessa de dizer a verdade do que souber e lhe for perguntado,
devendo declarar seu nome, sua idade, seu estado e sua residência, sua profissão,
lugar onde exerce sua atividade, se é parente, e em que grau, de alguma das
partes, ou quais suas relações com qualquer delas, e relatar o que souber,
explicando sempre as razões de sua ciência ou as circunstâncias pelas quais possa
avaliar-se de sua credibilidade.
Entende-se por dever de compromisso, portanto, o ato que precede o
depoimento, pelo qual se compromete a testemunha dizer apenas a verdade sobre
aquilo que lhe inquirir o magistrado durante a coleta de seu depoimento.
Para que entendamos melhor o referido dever, convém que expliquemos
alguns pontos importantes.
(i) Formalidade – em que pese se tratar de um compromisso prestado pela
pessoa da testemunha, a lei não dispõe de qualquer procedimento pelo qual o
mesmo deverá ser feito.
Nesse sentido, basta que o magistrado advirta a parte acerca de seu dever de
somente proferir verdades sobre os elementos que lhe foram indagados., sob pena
de lhe atingirem as consequências estabelecidas em lei.
(ii) Violação do dever de compromisso – continuando o raciocínio criado acima,
a violação do dever de compromisso faz com que a testemunha incida no crime
disposto no art. 342 do Código Penal, falso testemunho:
Art. 342 do Código Penal. Fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a
verdade como testemunha, perito, contador, tradutor ou intérprete em processo
judicial, ou administrativo, inquérito policial, ou em juízo arbitral:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa.
§1º. As penas aumentam-se de um sexto a um terço, se o crime é praticado
mediante suborno ou se cometido com o fim de obter prova destinada a produzir
efeito em processo penal, ou em processo civil em que for parte entidade da
administração pública direta ou indireta.
§2º. O fato deixa de ser punível se, antes da sentença no processo em que
ocorreu o ilícito, o agente se retrata ou declara a verdade.
(iii) Quem tem dever de compromisso?
Por fim, cabe-nos a pergunta: a quem sobrevém o dever de compromisso?
Utilizando-se do mesmo raciocínio dos demais deveres estudados, sendo possível
que todos os indivíduos executem a função de testemunha, a todos os indivíduo recai
o dever de compromisso.
Resumo de Direito Processual Penal III
91
Porém, há exceções à referida regra. Estão dispostas no art. 208 do CPP:
Art. 206 do Código de Processo Penal. A testemunha não poderá eximir-se
da obrigação de depor. Poderão, entretanto, recusar-se a fazê-lo o ascendente ou
descendente, o afim em linha reta, o cônjuge, ainda que desquitado, o irmão e o
pai, a mãe, ou o filho adotivo do acusado, salvo quando não for possível, por outro
modo, obter-se ou integrar-se a prova do fato e de suas circunstâncias.
[...]
Art. 208 do Código de Processo Penal. Não se deferirá o compromisso a
que alude o art. 203 aos doentes e deficientes mentais e aos menores de 14
(quatorze) anos, nem às pessoas a que se refere o art. 206.
Tendo isso em mente, determinemos as exceções:
(i) Menores de 14 anos;
(ii) Doentes mentais;
(iii) Ascendente, descendente, o afim em linha reta, o cônjuge, ainda que
desquitado, o irmão e o pai, a mãe, ou o filho adotivo do acusado.
9.4.2.9. Dever de informar o endereço
É o que aduz o art. 224 do CPP:
Art. 224 do Código de Processo Penal. As testemunhas comunicarão ao
juiz, dentro de um ano, qualquer mudança de residência, sujeitando-se, pela
simples omissão, às penas do não-comparecimento.
Tem em vista que pode o magistrado requisitar novamente a produção de
prova testemunhal quando entender ser necessário para o escorreito deslinde da
causa, deverão as testemunhas informarem ao juízo, durante o prazo de um ano,
eventuais mudanças de endereço.
A violação do referido dever sujeita-os às penas do não comparecimento em
juízo (vide tópico 9.4.2.7. Dever de comparecimento, supra).
9.4.2.10. Finalização do estudo dos deveres
Para finalizarmos o estudo dos deveres anteriormente explicados, convém
informarmos que é necessário sejam analisados individualmente. Por isso, montamos
a tabela que se encontra na próxima página para o melhor entendimento do todo:
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REGRA EXCEÇÃO
CAPACIDADE DE SER TESTEMUNHA
Toda pessoa poderá ser testemunha
Pessoa jurídica
DEVER DE DEPOR Toda testemunha não
poderá se eximir da obrigação de depor
É facultado ao ascendente, descendente, o afim em
linha reta, o cônjuge, ainda que desquitado, o irmão e o
pai, a mãe, ou o filho adotivo do acusado
deporem. Contudo, é possível que o magistrado
determine realizem seu depoimento, desde que não haja outros meios capazes de produzir a
referida prova
São proibidos de depor as pessoas que, em razão de função, ministério, ofício
ou profissão, devam guardar segredo, salvo se,
desobrigadas pela parte interessada, quiserem dar
o seu testemunho
DEVER DE COMPARECIMENTO
Se intimada, não é possível que a testemunha se
recuse a comparecer em juízo, sob pena de ser
conduzida coercitivamente
Não estão obrigados a comparecer em juízo
aqueles que por (i) por impossibilidade prática não
o puderem ou por (ii) prerrogativa de função assim lhes for eximido, bem como em relação
àqueles que (iii) residam fora do limite territorial
sujeito à jurisdição do juiz
DEVER DE COMPROMISSO
Todas as testemunhas estão sujeitas ao dever de
compromisso
São exceções os (i) menores de 14 anos, (ii) doentes mentais e (iii) o
ascendente, descendente, o afim em linha reta, o cônjuge, ainda que
desquitado, o irmão e o pai, a mãe, ou o filho adotivo do
acusado.
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9.4.2.11. Questões importantes
Mesmo após todas as explicações anteriores, ainda restam algumas dúvidas
acerca da capacidade de ser parte. Vejamos:
(i) Corréu – é possível que o corréu seja testemunha? Não! Primeiramente, vimos
anteriormente que não é possível que o mesmo indivíduo atue em duas funções
distintas na relação jurídico-processual. Nessa senda, já não seria possível que o
mesmo indivíduo figurasse como sujeito processual principal e sujeito processual
terciário não interessado;
(ii) Policial – nesse caso, é sim possível que atue como testemunha, porquanto
não há óbices legais ao exercício da referida função. Anteriormente à pacificação
desse entendimento, havia posição doutrinária que entendia o contrário,
defendendo que o testemunho do policial não seria voltado ao esclarecimento do
fato delituoso, mas à justificação de suas atuação. Hoje, contudo, como dito, a
possibilidade é entendimento pacificado;
(iii) Criança – crianças podem atuar como testemunhas? Sim! O art. 202 é claro
quando indica que toda pessoa pode ser testemunha. Nesse caso, porém, preza-se
pelo modo segundo o qual será colhido o depoimento, não o fazendo a criança sob o
dever de compromisso, por óbvio. Aqui, em que pese se tratar de pessoa-informação,
ou seja, pessoa da qual se intenta retirar fatos relevantes para o deslinde do caso, é
necessário sejam observadas as disposições que garantem à criança a proteção
integral, nos moldes do Estatuto da Criança e do Adolescente. Em outras palavras, é
necessário que se utilize abordagem específica e adequada nesses casos;
(iv) Adolescente coautor da infração – conforme já determinamos
anteriormente, o adolescente, inimputável, desprovido de capacidade penal, incapaz
de entender o caráter ilícito do fato e determinar-se segundo tais elementos, não
pode ser considerado acusado, porquanto responde perante o juízo da infância e
juventude. Tendo isso em mente, não há o que se falar em qualquer disposição
contrária à sua atuação enquanto testemunha.
A discussão, porém, paira sobre o fato de ser realizado sob ou sem a
observância do dever de compromisso. Para tanto, consideremos alguns elementos:
Conforme determina o ECA, entende-se por adolescente o indivíduo que tem
entre 12 e 17 anos de idade, nos moldes do art. 2º do referido diploma legal:
Art. 2º, caput, do Estatuto da Criança e do Adolescente. Considera-se
criança, para os efeitos desta Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e
adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade.
Como já vimos anteriormente, não estará sujeito ao dever de compromisso os
indivíduos que tenham menos de 14 anos de idade (art. 208 do CPP – vide tópico
9.4.2.8. Dever de compromisso, supra).
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A pergunta, portanto, incide nos indivíduos entre 14 e 17 anos. Aqui, porém,
há divergência doutrinária.
Uma das posições defende a impossibilidade da incidência do dever de
compromisso, tendo em vista que, ainda que não se enquadre nos indivíduos
elencados no art. 208, ainda estará sujeito ao juizado da infância e juventude, devendo
ser observada, portanto, a vedação à autoincriminação (nemo tenetur se detegere).
Nesse sentido, não poderia o menor, ainda que não submetido ao juízo criminal,
alegar fatos contra si.
A segunda corrente, porém, entende não haver qualquer prejuízo na
realização do compromisso, porquanto o juizado da infância e juventude somente
pode atribuir ao adolescente medidas socioeducativas, de caráter benéfico ao
indivíduo. Essa corrente vigora como entendimento majoritário.
9.4.2.12. Coleta do depoimento
Determina o art. 203 do CPP:
Art. 203 do Código de Processo Penal. A testemunha fará, sob palavra de
honra, a promessa de dizer a verdade do que souber e lhe for perguntado,
devendo declarar seu nome, sua idade, seu estado e sua residência, sua profissão,
lugar onde exerce sua atividade, se é parente, e em que grau, de alguma das
partes, ou quais suas relações com qualquer delas, e relatar o que souber,
explicando sempre as razões de sua ciência ou as circunstâncias pelas quais possa
avaliar-se de sua credibilidade.
Levando isso em consideração, chegamos à conclusão de que o depoimento
será compreendido por quatro fases distintas, quais sejam:
(i) Verificação da identidade das testemunhas – na primeira fase, caberá ao
magistrado confirmar a qualificação da testemunha, certificando que se trata, de
fato, da pessoa correta a ser inquirida.
Surge uma pergunta: é possível que o magistrado tenha dúvida acerca da pessoa
da testemunha? Sim. Nesse caso, observar-se-á o disposto no art. 205 do CPP:
Art. 205 do Código de Processo Penal. Se ocorrer dúvida sobre a identidade
da testemunha, o juiz procederá à verificação pelos meios ao seu alcance,
podendo, entretanto, tomar-lhe o depoimento desde logo.
(ii) Verificação de possível vinculação com as partes – aqui, cabe ao magistrado
determinar se existe vínculo entre a testemunha e a pessoa do acusado, buscando,
portanto, verificar se há qualquer incidência nas exceções dos arts. 206 e 207 do CPP
(vide tópico 9.4.2.6 Dever de depor, supra). Ademais, é nessa fase que deve constatar
qualquer elemento capaz de influenciar no depoimento da testemunha.
A título de exemplo, dispõe o art. 217 do CPP:
Art. 217 do Código de Processo Penal. Se o juiz verificar que a presença do
réu poderá causar humilhação, temor, ou sério constrangimento à testemunha ou
ao ofendido, de modo que prejudique a verdade do depoimento, fará a inquirição
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por videoconferência e, somente na impossibilidade dessa forma, determinará a
retirada do réu, prosseguindo na inquirição, com a presença do seu defensor.
Portanto, constatando que a presença do réu cause humilhação, temor ou
sério constrangimento à testemunha, sendo possível influenciar na veracidade de seu
depoimento, é possível que seja colhido o testemunho por videoconferência. Não
sendo possível assim proceder, poderá o magistrado ordenar a retirada do réu da
sala, acompanhando o testemunho a pessoa do defensor do acusado;
(iii) Advertência – nessa fase, cabe ao magistrado informar à testemunha
acerca de seu compromisso com a verdade, sob pena de incidir nos crimes já
explicados (vide tópico 9.4.2.8. Dever de compromisso, supra);
(iv) Objeto concreto do depoimento – por fim, a última fase engloba a
inquirição, de fato.
Importante ressaltar que o Ordenamento Jurídico adota o denominado
sistema inglês, segundo o qual devem ser observados dois elementos, quais sejam:
(iv.i) Cross examination – tal elemento informa que a testemunha não somente
será inquirida pela acusação, mas também lhe poderá direcionar perguntas a defesa
do acusado;
(iv.ii) Directo examination – determina o art. 212 do CPP:
Art. 212 do Código de Processo Penal. As perguntas serão formuladas pelas
partes diretamente à testemunha, não admitindo o juiz aquelas que puderem
induzir a resposta, não tiverem relação com a causa ou importarem na repetição
de outra já respondida.
Parágrafo único. Sobre os pontos não esclarecidos, o juiz poderá
complementar a inquirição.
Significa dizer, portanto, que cabe às partes sejam as perguntas direcionadas
à pessoa da testemunha, somente intervindo o magistrado em se tratando de
perguntas irrelevantes à formação de sua convicção ou que já tenham sido
respondidas.
Ademais, o magistrado somente formulará perguntas, uma vez que as
questões feitas pelas partes não tenham sido capazes de esclarecer os pontos
necessários, ocasião na qual deve complementá-las.
• • • •
Para finalizar as informações atinentes à coleta do depoimento, convém que
estudemos o disposto no art. 225 do CPP. Vejamos:
Art. 225 do Código de Processo Penal. Se qualquer testemunha houver de
ausentar-se, ou, por enfermidade ou por velhice, inspirar receio de que ao tempo
da instrução criminal já não exista, o juiz poderá, de ofício ou a requerimento de
qualquer das partes, tomar-lhe antecipadamente o depoimento.
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O artigo acima referido dispor acerca da produção antecipada da prova
testemunhal. Conforme aduz, são duas as ocasiões em que poderão ocorrer, quais
sejam:
(i) Sabendo que estará ausente a testemunha quando da audiência de instrução
e julgamento;
(ii) Quando a testemunha se tratar de pessoa enferma ou de idade avançada,
temendo-se que o seu falecimento anteceda a oportunidade da coleta do depoimento.
Nesse caso, portanto, é necessário que seja comprovado o fumus boni iuris e
o periculum in mora, podendo ser requerido pelas partes ou reconhecido pelo
magistrado de ofício.
9.4.2.13. Contradita e arguição de defeitos
(i) Conceito – tratam-se de meios utilizados pelas partes para arguir elementos
que acarretem na impossibilidade de agir como testemunha determinado indivíduo.
Nesse sentido, é a determinação do art. 214 do CPP:
Art. 214 do Código de Processo Penal. Antes de iniciado o depoimento, as
partes poderão contraditar a testemunha ou arguir circunstâncias ou defeitos,
que a tornem suspeita de parcialidade, ou indigna de fé. O juiz fará consignar a
contradita ou arguição e a resposta da testemunha, mas só excluirá a testemunha
ou não lhe deferirá compromisso nos casos previstos nos arts. 207 e 208.
Para que entendamos melhor, convém que as conceituemos separadamente:
(i.i) Contradita – tem-se por contradita a manifestação segundo a qual
qualquer das partes indica incidir a testemunha em qualquer dos elementos
constantes nos arts. 206 a 208 do CPP, ou seja, indica a faculdade ou a proibição de
depor ou a desnecessidade de observância do dever de compromisso;
(i.ii) Arguição de defeitos – por outro lado, a arguição de defeitos é o meio pelo
qual as partes revelam fatos que evidenciem indignidade ou falta de fé no
depoimento de determinada testemunha, tornando-a, portanto, suspeita (ex.: já ter
sido condenada anteriormente pelo crime de falso testemunho).
(ii) Momento – conforme determina o artigo acima referido, tais elementos
deverão ser manifestados anteriormente ao início do depoimento das testemunhas
a que atinjam;
(iii) Admissão da contradita – é possível que algumas situações sejam
ensejadas pela manifestação por meio de contradita:
(iii.i) Incidência nos elementos do art. 206 – nesse caso, o depoimento somente
será excluído, uma vez que a testemunha opte por não depor contra o acusado;
(iii.ii) Incidência nos elementos do art. 207 – é necessário que o depoimento seja
excluído, porquanto será o indivíduo proibido de depor, salvo quando assim o quiser,
bem como o permitir a pessoa a quem interessa o segredo;
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(iii.iii) Incidência nos elementos do art. 208 – aqui, não há o que se falar em
exclusão do depoimento, somente reconhecendo o magistrado a ausência do dever
de compromisso, atuando o indivíduo como informante.
(iv) Admissão da arguição – reconhecendo-se a indignidade ou elemento que
enseje a falta de fé no depoimento, não deverá o magistrado excluir o depoimento.
Nesse caso, a referida informação somente constará dos autos, devendo ser levada
em consideração pelo magistrado quando da valoração da prova.