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Odontovet Mini Curso Básico de Odontologia

Medicina Veterinária em Evidência

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Dr. Oscar Rodríguez Serrano

Odontologia Veterinária

Recife, 2002

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Odontologia Veterinária

HISTÓRIA

A história da odontologia tanto humana como a veterinária é muito parecida. Tiveram um

começo muito intenso e importante, sendo depois quase que esquecidas e só voltando a ter um

interesse maior no último século.

Hoje sabemos em documentos achados (papiros de Ebers), que os egípcios no ano de

1550 a.C., tratavam dos dentes contra abscessos e gengivites, usando cominho e mel. Outros

achados foram próteses dentárias.

Na antiga Grécia já aparece o primeiro instrumental odontológico, uma pinça de metal

utilizada para extrações chamada de “odontagra”.

Archigene 100 a.C. utilizou o trepano para perfurar os dentes chegando até a polpa e

obturando a perfuração com uma massa à base de excremento de rato e fígado de lagarto. No

ano 30 a.C., Celso descreve a utilização de chumbo nas obturações.

Na Idade Média a odontologia sofre uma parada no seu desenvolvimento, devido ao fato

de que todo descobrimento da ciência deveria ser aprovado pela igreja (Inquisição). No século

XIII e XIV, os monges iniciaram a cirurgia dentária porém não vão longe e deixam isto para

pessoas despreparadas como os barbeiros, que além de cortar o cabelo, tomavam conta das

extrações, pois esse era o único tratamento realizado nessa época. Os barbeiros mais

importantes eram aqueles que moravam nos castelos, pois cuidavam das famílias reais.

No século XIV, Guy de Charliac, utiliza pela primeira vez a anestesia, exatamente num

procedimento odontológico.

No inicio do século XVIII, Pierre de Fouchard, escreve “O Cirurgião Dentista e seu

Tratado de Dentes”, criticando os charlatões e dedicando especial atenção à endodontia.

Os eqüinos foram os primeiros animais a serem tratados na medicina veterinária. Um

motivo muito importante foi que estes animais ajudaram muito no desenvolvimento do homem,

seja trabalhando como lutando para conquistar novas terras e povos. Na veterinária o primeiro

documento achado foi o “Zuo Zhuan” (Livro dos Animais), livro chinês que expressa como

diferenciar um cavalo pela boca. Os chineses também acreditavam que os dentes tinham relação

com os órgãos internos como rins, fígado e órgãos da reprodução.

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Página do Livro doa Animais (Zuo Zhuan)

Hipócrates, descreve na antiga Grécia, como realizar uma extração dentária. No livro

”Indicus” explica como efetuar a extração dentária e amputação da língua para melhorar a

oclusão nos eqüinos.

Pelagonius no ano 350 a.C., descreve varias doenças dentais, assim como o tratamento

em dentes dos cavalos no capítulo “De Dentibus”.

Aristóteles (384–322 a.C.) fala sobre a periodontite no seu livro ”Animaliu”, como um

sintoma e não como síndrome, destacando que se a doença não desaparecesse

espontaneamente, esta seria incurável.

Durante o Império Romanos, por este ter um grande exército, foram realizados grandes

avanços na medicina veterinária. Estes descreveram a anatomia e morfologia dos dentes.

Acredita-se como forma de evitar a falsificação e troca de animais.

Novamente a odontologia mergulha numa fase obscura onde não se conhece avanço

significante. Unicamente no século XIII voltamos a escutar por meio de Jordanus Ruffus, o

tratamento de eqüinos, porém sem nenhum embasamento científico, provocando um

aparecimento de charlatões que tomam conta dos tratamentos odontológicos veterinários,

geralmente sendo realizado pelos ferreiros. Estes provocavam tratamentos desumanos cheios

de crueldade. A doma dos cavalos era realizada de forma irracional, sendo assim retirados

dentes e colocados vidros quebrados para tornar a boca dos animais mais sensível.

A primeira faculdade de Veterinária foi fundada em Lyon na França no ano de 1762 por

Claude Bourgelat, porém ainda neste tempo a odontologia não despertava interesse na classe

médica. Com o inicio dos zoológicos, acontece um caso que chamou a atenção das pessoas. Na

Inglaterra um elefante foi sacrificado em 1826 pela sua agressividade e só após a morte foi

descoberto que isto era provocado por um colmilho fraturado e infeccionado. No ano de 1862,

cem anos depois do inicio da primeira faculdade, Edward Mayhew publica “O Ilustrado Doutor de

Cavalos”, onde descreve a necessidade do trato das doenças odontológicas. Porém unicamente

no século XX é que Freddie Milne (1867-1942), começa a dedicar-se à odontologia eqüina em

1924 nos hipódromos da Europa. Em 1930 já aparecem varias publicações de odontologia

veterinária, e em 1945 cria-se o Instituto Dental Veterinário em Viena, destacando o

prof. Karl Zetner.

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Porém foi nos Estados Unidos que a odontologia veterinária chegou no seu auge, sendo

criado o primeiro dentifrício para animais em 1975 e em 1977 a American Veterinary Dental

Society, e logo depois, o American Veterinary Dental College.

Na Europa foi formado a European Veterinary Dental Society em 1992 e em 1996 a

European Veterinarian Dental College.

No Brasil, um dos pioneiros na odontologia veterinária, tem sido o Dr. Marco A. Gioso,

atualmente professor da USP e diplomado pelo American Veterinary Dental College. Este tem

incentivado muito a odontologia veterinária em especial dos pequenos animais. Hoje contamos

com varias clínicas especializadas em odontologia especialmente no estado de São Paulo. Entre

estas destacam-se a Odontovet entre outras.

MORFOLOGIA DENTÁRIA

Tipos de Dentes

Os dentes variam em número, volume e tamanho, dependendo das espécies e sua

função.

A dentadura dos animais pode ser classificada de varias maneiras. Podemos classificar

os dentes de acordo a sua anatomia e função como:

Dentes deciduais ou de leite, dentes permanentes, dentes incisivos, dentes caninos,

dentes pré-molares e dentes molares.

Divisão dos dentes nos caninos

Os dentes incisivos são 12 (doze) e se dividem em três tipos diferentes: central

(pinças ou 1º), intermediário (central ou 2º) e lateral (cantos ou 3º). Estes dentes servem para

roer e ajudam na limpeza do corpo.

Os caninos são 04 (quatro), estes retém a pressa e servem para rasgar os alimentos.

Os pré-molares e molares são cortantes e trituradores do alimento. Os últimos molares

assemelham-se aos dos humanos.

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CÃES Incisivos Caninos Pré-molares Molares

Maxila 3 1 4 2

Mandíbula 3 1 4 3

Fórmula dentária nos cães

FELINOS Incisivos Caninos Pré-molares Molares

Maxila 3 1 3 1

Mandíbula 3 1 2 1

Fórmula dentária nos felinos

Podemos classificá-los de acordo com as mudanças que estes sofrem, por exemplo:

Dentadura Heterodonte: dentadura dos mamíferos. Há diversos tipos de dentes como incisivos,

caninos, pré-molares e molares.

Dentadura Homodonte: achado em peixes, répteis. Todos os dentes são iguais.

Dente Monofiodonte: são os dentes que nunca sofrem muda, por exemplo os dentes

permanentes (molares, colmilhos dos elefantes).

Dente Diofiodonte: são os dentes que sofrem uma muda no curso da vida. Por exemplo, nos

mamíferos, os dentes de leite são substituídos por dentes permanentes (incisivos, caninos, pré-

molares).

Dentes Polifiodonte: são aqueles que têm uma reprodução continua, como os dentes dos

peixes, anfíbios, répteis.

Dentes Secodontes: são aqueles que têm as bordas cortantes. Geralmente comprimidos

lateralmente com aspecto de faca. Por exemplo os pré-molares dos carnívoros.

Dente Bunodonte: Estes possuem cúspides de esmalte justapostas que formam uma superfície

trituradora. Por exemplo os molares do ser humano.

ANATOMIA

Os dentes podem ser divididos em 03 (três) estruturas diferentes: Coroa, Colo

Dentário e Raiz.A Coroa é a parte do dente que podemos visualizar normalmente. Ela está

coberta pelo esmalte. Este é o tecido mais duro do corpo, formado de 98% de substância

inorgânica.

A Raiz é clinicamente a parte invisível do dente. Por sua vez está coberta pelo cemento,

que é um tecido conectivo calcificado. A divisão da Coroa e da Raiz chama-se Colo Dentário e a

linha visível desta divisão é chamada de linha cervical.

Na parte interna achamos um tecido conectivo calcificado chamado de dentina. É um

material poroso igual ao osso, que se encontra em constante renovação. No meio desta dentina

encontramos a Cavidade Pulpar. Esta parte do dente é onde se encontra a polpa, tecido

ricamente inervado e vascularizado, que forma e nutre a dentina. Pelo canal pulpar passam os

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vasos sangüíneos e nervos que nutrem e dão a sensibilidade ao dente. Este canal pulpar é

diferente nos animais que nos humanos.

Canal Pulpar de um cão

Os dentes podem ter uma, duas ou três raízes, de acordo com seu posicionamento. Na

tabela seguinte podemos mostrar como estão formados:

Dente Nº de raízes.

Incisivos, Caninos e 1º Pré-molar superiores

1

Pré-molar 2 e 3 superiores 2

Pré-molar 4, molares 1 e 2 superiores

3

Incisivos, Caninos e 1º Pré-molar e molar 3 inferior

1

Pré-molares 2 , 3 e 4 Molares 1 e 2 inferior

2

As outras estruturas que circundam os dentes são as seguintes: Gengiva, Ligamento

Periodontal (Fibras de Sharpey) e Osso Alveolar. Estas estruturas junto com o cemento

formam o Periodonto.

A gengiva é parte da mucosa oral que cobre o osso alveolar formando uma prega

chamada de borda gengival. Anatomicamente é dividida em 03 (três) formas: marginal,

aderida e interdental. A primeira é a parte livre da gengiva formando a margem e o sulco

gengival; a segunda é a mais importante pois é a primeira linha de defesa contra a periodontite,

protegendo o osso e os tecidos de suporte do dente, estando aderida ao periósteo do osso

alveolar. A terceira está sempre em continua renovação e forma um colar ao redor do colo do

dente, unindo-se ao esmalte. O ligamento periodontal é formado por tecido conectivo que

penetra no cemento de um lado e no osso alveolar do outro. É formado por fibras de colágeno

tendo elasticidade para suportar o mecanismo da mordida. Esta estrutura segura o dente na

arcada dentária.

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O osso alveolar (placa cribiforme) é uma placa fina que cobre o dente formando um

alvéolo.

Os dentes dos herbívoros apresentam diferenças em relação aos dos caninos e felinos.

Por exemplo: a coroa dos dentes dos herbívoros apresenta várias dobras do esmalte paralelas

ao eixo do dente, formando um cilindro oco aberto (cavidade adamantina). Em alguns molares

do cavalo e do boi este se encontra fechado pelo lado oral, e as depressões na coroa e nas

fissuras exteriores do esmalte estão cobertas pelo cemento. As fissuras no esmalte na superfície

trituradora dos molares se formam devido ao rápido desgaste do cemento e da dentina, que são

macios. Enquanto a maioria dos dentes possui unicamente uma polpa dentária estes podem

estar presente em vários canais.

No homem, no cavalo e nos suínos, o crescimento do dente finaliza com a formação da

raiz, logo depois de ter acontecido a erupção. A perda longitudinal que acontece com o desgaste

de fricção é insignificante e vai ser compensada parcialmente pela involução da parede alveolar.

O maior desgaste é dos herbívoros com aproximadamente 2,2 mm por ano.

Por isso da importância do desgaste com relação à determinação da idade do animal. A

superfície dentária ou mesa dentaria sofre mudanças na sua forma, sendo estas formas

características de acordo com as diferentes idades.

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NOMENCLATURAS

Existem vários tipos de nomenclaturas utilizadas para que possamos nos localizar na

boca de um animal, classificando de forma abreviada cada dente, o que facilita o diagnóstico. Na

medicina veterinária se tem utilizado as nomenclaturas da odontologia humanas, sendo estas

adaptadas e modificadas para uso na odontologia veterinária.

Podemos mencionar as seguintes nomenclaturas: Anatômica, Triadan (modificada),

Sistema da Federação Internacional, Haderup, Palmer, Zsigmondy ou de ângulo, entre outras.

Anatômica:

Cada dente é identificado por uma letra que descreve a sua função. Por exemplo:

I: para os incisivos; C: para os caninos; P: pré-molares e M: molares.

No caso para os dentes decíduos estas letras são escritas com letra minúscula (i, c, p,

m, respectivamente). Para identificar o tipo de incisivo, pré-molar ou molar se designa um

número a cada um de acordo com a sua posição. Para determinar o seu quadrante se colocam

estes números na parte superior ou inferior, direita ou esquerda da letra do dente. Exemplo:

I1 : primeiro incisivo superior direito

3 P : terceiro pré-molar decíduo (de leite) superior esquerdo

2M : segundo molar inferior esquerdo

TRIADAN (modificada):

Muito utilizada na odontologia humana e transformada para a odontologia veterinária.

Esta nomenclatura separa a arcada dentária em 04 quadrantes e identifica cada dente por meio

de 03 (três) dígitos. O primeiro número descreve o quadrante superior direito (este é o

quadrante 100), seguindo em sentido horário pelo superior esquerdo (quadrante 200),

terminando no quadrante inferior direito com o número 400. Os dentes decíduos são descritos

como a numeração 500 até 800, também no sentido horário. O segundo dígito numera os dentes

individualmente, a partir da linha média distal. Por exemplo:

101: Primeiro incisivo superior direito.

308: Quarto pré-molar inferior esquerdo

604: Canino superior esquerdo decíduo

Sistema da Federação Internacional:

Este sistema é muito parecido ao anterior identificando com o primeiro número o

quadrante (de 1 a 4 para os permanentes, e de 5 a 8 para os decíduos), e separando por uma

vírgula os outros dígitos que descrevem o dente. Por exemplo:

1,4: Canino superior direito

7,6: Segundo pré-molar inferior esquerdo decíduo

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2,1: primeiro incisivo superior esquerdo

Zsigmondy ou ângulo:

Utiliza os braços de uma cruz para identificar o quadrante. De acordo com o seu

posicionamento mostra se é superior ou inferior ou esquerda ou direita. Exemplo:

Γ8: quarto pré-molar inferior esquerdo

∟4: Canino superior esquerdo

Г7: terceiro pré-molar inferior esquerdo

DIVISÃO DO DENTE

Para poder localizar as lesões nos dentes é importante saber as faces dos mesmos. Os

dentes possuem 06 (seis) faces:

Mesial: é a superfície do dente orientada à linha média. É a sua parte anterior;

Distal: é a superfície posterior ou caudal do dente, oposta à superfície mesial;

Apical: é a parte que se refere à raiz do dente;

Oclusal: é superfície mastigatória ou de oclusão, oposta à apical;

Lingual ou palatal: face que está em contato com a língua ou palato;

Labial ou vestibular: parte externa dos dentes em direção aos lábios e bochechas.

oclusal

Descrição das faces dos dentes

ERUPÇÃO DENTÁRIA

É a denominação que se dá quando o dente atravessa a superfície epitelial e inicia a sua

função. O inicio da erupção varia de acordo com cada indivíduo. Cães e gatos nascem

edentados (sem dentes) surgindo os primeiros dentes a partir da terceira ou quarta semana de

vida. Geralmente em raças grandes a erupção ocorre antes que nas raças pequenas, podendo

sofrer alterações devido a causas nutricionais. Os dentes decíduos são menores e mais afilados

que os permanentes. Conforme os dentes definitivos se desenvolvem, ocorre a reabsorção da

porção superior da cripta óssea e das raízes dos dentes decíduais, acontecendo a exfoliação

(desprendimento) dos mesmos. Os primeiros a serem trocados são os incisivos, depois os pré-

molares (o primeiro pré-molar não é substituído) e por últimos os caninos. Os molares não

trocam e são as últimas peças permanentes que erupcionam.

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Dentes CANINOS FELINOS

Decíduos Permanentes Decíduos Permanentes

Incisivos 3-4 semanas 3-5 meses 2-3 semanas 3-4 meses

Caninos 3 semanas 4-6 meses 3-4 semanas 4-5 meses

Pré-molares 4-12 semanas 4-6 meses 3-6 semanas 4-6 meses

Molares ----- 5-7 meses ----- 4-5 meses

Tabela de erupção dos dentes decíduos e permanentes em caninos e felinos

Alguns transtornos no desenvolvimento ou na troca dos dentes podem aparecer, tais

como:

Anomalias de Volume - Chama-se macrodontia quando o dente é maior que o normal, e

microdontia quando é menor que o normal. Isto pode afetar no fechamento da arcada dentária,

afetando a mastigação, respiração, retenção de alimentos, entre outros.

Problemas em Relação ao Número de Dentes - Polidontia, quando há um número maior de

dentes do que o normal. Geralmente é unilateral e aparece mais na maxila do que na mandíbula.

Oligodontia ocorre quando há um número menor de dentes. É freqüente nas raças

braquicefálicas, onde por falta de espaço faltam alguns dos molares na mandíbula.

Persistência dos Dentes Deciduais – É um problema ainda pouco conhecido. Acredita-se que

ocorra devido a não absorção da raiz, associada à falta de dilaceração da membrana

periodontal. Estes não devem ser confundidos com a polidontia. O tratamento aconselhado é

sempre a extração.

Má Posição Dentária - Os dentes podem girar no seu eixo podendo ser conhecidos como

torção, rotação ou versão.

Hipoplasia do Esmalte - É um processo de perda do esmalte na coroa, com coloração

amarelada. Não se sabe o que provoca esta patologia, porém se acredita que sejam processos

infecciosos entre as idades de 2 e 4 meses, época em que o esmalte se encontra em

desenvolvimento. Outro motivo pode ser a administração de tetraciclinas, carências minerais e

vitamínicas na dieta. O esmalte se torna fraco e desgasta ou quebra deixando o dente exposto a

infecções.

PROBLEMAS DE POSIÇÂO

Nos cães e gatos a forma do cabeça interfere na posição dos dentes, e, por serem

carnívoros, isto afeta muito anatômicamente, podendo provocar até algumas doenças. Nos cães

existem muitas raças diferentes, cada uma apresentando particularidades na formação do

crânio. Podemos classificar três tipos de crânios:

Dolicocéfalo: O diâmetro ântero-posterior é relativamente longo(cabeça estreita). Ex: Collie,

Doberman, Greyhound, Borzoi, Gatos orientais, etc.;

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Braquicéfalo: Cabeça achatada da frente para atrás (cabeça larga). A mandíbula é maior em

relação ao crânio. Ex: Pequinês, Shih-Tzu, Bulldog, Lhasa-Apso, Gatos Persas, etc.;

Mesocéfalo: Intermediário entre os tipos supracitados. Aproximadamente 75% dos cães estão

classificados nesta categoria. Ex: Labrador, Pastor Alemão, Spaniels, etc.

Além destas formas anatômicas, podemos achar defeitos na oclusão originados

geneticamente. As raças mesocefálicas quando em normoclusão, o dente canino mandíbular

encaixa entre o 3º incisivo e o canino superior; o 4º pré-molar inferior encaixa entre o 3º e 4º pré-

molares superiores. Os dentes não se tocam. O contato pode acontecer unicamente nas raças

braquicefálicas.

O Braquignatismo ocorre quando o maxilar ultrapassar a mandíbula, sendo freqüente nas raças

dolicocefálicas. O prognatismo ocorre quando a mandíbula ultrapassa o maxilar, sendo

observado nas raças braquicefálicas.

EXAME GERAL

No exame geral começamos pela identificação do animal, seguido pela anamnese do

paciente. Aqui escutamos a queixa principal, assim como fazemos um levantamento do histórico

odontológico e clínico do paciente, tais como: idade, tipo de alimentação que possui, seus

hábitos, tempo que apresenta os problemas, etc.

Após isto procedemos a execução do exame extra-oral. Observamos a parte externa da

boca, bochechas, linfonódos, presença de sialorréia, fístulas, secreções nas narinas e olhos,

halitose, etc. Só após a completa observação é que vamos prosseguir com a abertura da boca e

efetuar o exame intra-oral. Levantamos os lábios para inspeção dos mesmos, assim como dos

dentes, inspecionamos o aparecimento de tumores; lesões labiais, línguais, bucais; salivação,

etc. Unicamente depois, é que abrimos as arcadas dentarias para uma visualização interna. Este

procedimento é muito importante pois é neste momento que teremos uma completa visão da

cavidade bucal, tanto no seu interior como no exterior. Podemos avaliar a gravidade da

periodontite, gengiva (inflamação, retração), cálculo dentário (tártaro), fraturas, mobilidade,

hipoplasias de esmalte, cáries, perda de dentes, lesões de palato, halitose, laringe, etc.

Em relação ao instrumental utilizado para este exame, podemos destacar a sonda

periodontal, o explorador dentário, e o revelador de placa que tinge a placa bacteriana. Se

necessário, devemos realizar uma sedação para uma melhor contenção do animal e inspeção da

cavidade.

Para maior facilidade nesta avaliação se utiliza um odontograma, onde podemos anotar

todos os achados do exame. Como exame complementar podemos utilizar o rádio- diagnóstico e

exames laboratoriais.

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NEOPLASIAS

Geralmente são malformações volumosas de tecido e que se originam de problemas no

desenvolvimento das estruturas celulares que constituem os dentes ou tecidos adjacentes.

Dentro da cavidade oral encontramos varias neoplasias malignas e benignas. Estas podem-se

apresentar no início como lesões não cicatrizadas e ulcerações infectadas, podendo passar

desapercebidas pelo proprietário até atingirem um tamanho avançado. Um exame minucioso é

fundamental. A biópsia ou a remoção cirúrgica têm por objetivo a realização do exame

histopatológico para determinação do tipo de tumor e a sua gravidade. Não é recomendado a

realização de exames citológicos ou por aspiração, pois muitas vezes não se obtêm resultados

corretos.

Na maioria das vezes, a recomendação é a retirada do tumor junto com um margem de

segurança, para evitar a recidiva assim como metástases. Tem se utilizado quimioterapia,

crioterapia e radioterapia nos tratamentos porém os resultados não têm sido satisfatórios.

As neoplasias orais estão em quarto lugar em aparecimento nos caninos. Os tumores

malignos representam quase que 50% das neoplasias encontradas nos cães, e, dentre os

encontrados com maior freqüência, descrevemos: melanoma maligno (30-35%), carcinoma

escamoso (20-30%) e fibrossarcoma (1-20%). Entre as neoplasias benignas podemos

encontrar com maior freqüência os epúlis (representando aproximadamente 25% das neoplasias

orais), que são lesões não neoplásicas ou tumores odontogênicos (aumento excessivo das

gengivas).

Benígnos Malígnos

Épulis Fibromatoso

Épulis ossificante

Adenomas

Fibroma

Hemangioma

Lipoma

Osteoma

Condroma

Histiocitoma

Carcinoma escamoso

Melanoma Maligno

Fibrossarcoma

Épulis Acantomatoso

Adenocarcinoma

Carcinomas

Linfossarcoma

Mastocitocitoma

Osteossarcoma

Tipos de neoplasias malignas e benignas em cães

ENDODONTIA e ORTODONTIA

A odontologia veterinária procura evitar a perda, promovendo a correção dos problemas

dos dentes, sendo o seu maior objetivo manter uma dentição sadia e completa. Neste campo

temos notado um avanço muito grande nos tratamentos veterinários nos últimos anos utilizando

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técnicas de última geração. Na endodontia procuramos solucionar todos os problemas pulpares

dos dentes (polpa e cavidade pulpar), assim como a restauração de traumatismos que podem

resultar em fraturas dentárias que chegam a afetar a cavidade pulpar. Por outro lado, com a

ortodontia queremos eliminar as anomalias no posicionamento dos dentes, para fornecer uma

melhor oclusão da arcada dentária e evitar assim problemas como falta de aproveitamento

alimentar, problemas respiratórios, etc. Para estes procedimentos são necessários

equipamentos e materiais específicos que possam ajudar na trepanação do dente, retirada do

material infectado ou necrosado e a sua obturação. Para a ortodontia é necessário um

conhecimento sobre anatomia, medição correta da arcada para não agravar o problema

presente.

PERIODONTITE

A periodontite é a inflamação do periodonto. Este é formado pelas seguintes estruturas:

cemento do dente, gengiva, ligamento periodontal e osso alveolar.

Esta é a patologia que mais afeta os animais. Cerca de 85% dos cães acima de 5 anos

já tem algum problema relacionado à periodontite. Um fator muito importante para isto se deve à

falta de limpeza oral e a presença de bactérias na cavidade bucal.

As bactérias (algumas saprófitas) proliferam, formando a chamada placa bacteriana.

Esta placa é transparente, pegajosa e difícil de ser removida. Ela começa a eliminar resíduos do

seu metabolismo provocando uma reação inflamatória da gengiva. Quando a gengiva aumenta,

acontecem alterações circulatórias, o que serve de proteção para a própria placa bacteriana

proliferar, aumentando o número de bactérias. A placa quando começa a mineralizar por meio

de sais que vêm junto com a saliva (especialmente cálcio), inicia um processo de rigidez,

tornando-se assim o chamado cálculo dentário ou tártaro.

Dente sem cálculo dentário Dente com cálculo supragengival Dente com cálculo supra e sub- gengival lesando o periodonto

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Existem dois tipos de cálculo dentário: supragengival e o subgengival. O primeiro é o

visível na boca dos animal, o segundo é aquele que penetra abaixo da gengiva e vai alterando

as estruturas de sustentação dos dentes, provocando assim após certo tempo, a queda precoce

do dente. O cálculo subgengival é mais perigoso pois a sua localização, não só provoca danos

graves assim como evita os processos autolimpantes da boca. Apesar do cálculo supragengival

colaborar com a proteção da placa, aumentar a gengiva e causar halitose, este não chega a ser

tão perigoso como o subgengival..

O tratamento mais correto para evitar este problema seria a remoção profilática. Certas

alterações, se tratadas na sua fase inicial, têm caráter reversível. Porém após algum tempo, se

não corrigidas corretamente, podem produzir lesões permanentes.

O primeiro passo é a identificação da placa por meio de reveladores químicos. Estes

tingem a placa mostrando onde esta se posiciona para assim iniciar a sua completa remoção.

Esta pode ser realizada com fórceps odontológicos, tendo-se o cuidado para não fraturar o

dente. O aparelho de ultra-som ou remotar, e as curetas manuais são necessárias não só para

tirar o cálculo como para raspar a placa bacteriana (principal objetivo da profilaxia). Após a

remoção se faz a raspagem radicular, também chamada de aplainamento. Com isto vamos

retirar qualquer resíduo de cálculo na superfície dentária tanto na coroa como na raiz, assim

como alisamos a superfície dentária, para retirar ao máximo as superfícies rugosas do dente.

O terceiro passo é o polimento da superfície dentária que vai evitar que a placa adira

novamente por um tempo. Deixando a superfície rugosa, facilitaria que a placa se instalasse com

maior rapidez.

Superfície do dente antes e após o polimento

Este procedimento não é realizado na maioria das vezes pelos médicos veterinários o

que provoca uma recidiva dos problemas rapidamente. O polimento é muito simples, porém

precisa de equipamento adequado.

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Uma vez realizado o polimento, se efetua a irrigação com solução anti-séptica. Segundo

estudos realizados, esta placa tende a reinstalar-se no sulco gengival após a profilaxia. Não é

recomendado a utilização da agulha de pressão de jato de água, pois isto poderia aderir com

maior facilidade à placa. Então o mais indicado é com uma seringa de 20 ou 50 ml realizar a

irrigação da cavidade para eliminar os remanescentes bacterianos.

Como último passo temos as medidas profiláticas que vão evitar o acúmulo da placa por

mais tempo. Estas são de total responsabilidade do proprietário/a, pois será ele/ela quem vai

realizar estes procedimentos. Estas medidas significam metade do sucesso da prevenção da

periodontite. Entre algumas que podem ser mencionadas estão: o tipo de alimento que os

animais vão ingerir (ração concentrada, biscoitos, ossos, etc.), escovação dentária, brinquedos

específicos para remoção da placa, entre outros.

Destacamos que, para realizar estes procedimentos mencionados, é necessária a

sedação ou anestesia do animal para poder realizar a correta limpeza, tanto externa como

internamente. Se este tratamento fosse realizado com o animal acordado poderia

provocar grandes danos à estruturas do periodonto, assim como não poderia ser limpa a

cavidade bucal na sua totalidade.

Se o animal apresentar uma gengivite severa é indicado realizar uma cirurgia

periodontal onde se retira parte da bolsa gengival para esta não proteger a placa bacteriana.

Após este tratamento é recomendado a utilização de antibióticos para evitar infecções

secundárias. Este é um dos procedimentos mais sépticos realizados na cirurgia. O maior perigo

da periodontite esta no fato destas bactérias poderem penetrar na circulação sangüínea e

provocar infecções em outros órgãos como coração, fígado, rins, articulações, etc.

A odontologia veterinária esta iniciando e avançando muito ultimamente. Hoje em dia

não existe entidade específica que forneça uma especialização nesta área da medicina

veterinária aqui no Brasil. Os estudos e aprendizados são efetuados em clínicas particulares e

em algumas faculdades onde se ensina este tipo de tema e estudo de forma empírica. Está em

vias de formação a primeira Sociedade Brasileira de Odontologia Veterinária, possivelmente

chamada de SOBOV, que está sendo formada em São Paulo. Torcemos para que este sonho

seja realizado, pois teríamos um órgão que possa controlar, ensinar, avaliar e estudar melhor os

casos da odontologia veterinária no Brasil.


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