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Ministrio da Educao
Letras Vernculas
letras vernculas | sintaxe da lngua portuguesam
dulo 4 | volume 2
MDULO 4 - VOLUME 2
SINTAXE DA LNGUA PORTUGUESA
Gessilene SilveiraKantchack
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Universidade Estadualde Santa Cruz
ReitorProf. Antonio Joaquim da Silva Bastos
Vice-reitoraProf. Adlia Maria Carvalho de Melo Pinheiro
Pr-reitora de GraduaoProf. Flvia Azevedo de Mattos Moura Costa
Diretor do Departamento da Letras e ArtesProf. Samuel Leandro Oliveira de Mattos
Ministrio daEducao
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L649 Letras Vernculas: sintaxe da lngua portuguesa EAD UESC, [mdulo 4, volume 2] / Elaborao de contu- do: Gessilene Silveira Kanthack. [Ilhus, BA] : EDITUS, [2011]. 187 p. : il. ISBN: 978-85-7455-226-2 1. Lngua portuguesa - Sintaxe. I. Kanthack, Gessilene Silveira. II. Ttulo: Sintaxe da lngua portuguesa. CDD 469.5
Ficha Catalogrfica
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Coordenao UAB UESCProf. Dr. Maridalva de Souza Penteado
Coordenao do Curso de Licenciatura em Letras Vernculas (EAD)Prof. Msc. Eliuse Sousa Silva
Elaborao de ContedoProf. Dr. Gessilene Silveira Kanthack
Instrucional DesignProf. Msc. Marileide dos Santos de OliveraProf. Msc. Cibele Cristina Barbosa CostaProf. Msc. Cludia Celeste Lima Costa Menezes
RevisoProf. Msc. Sylvia Maria Campos Teixeira
Coordenao de DesignProf. Msc. Julianna Nascimento Torezani
DiagramaoJamile A. de Mattos Chagouri OckJoo Luiz Cardeal Craveiro
Capa Sheylla Toms Silva
Letras VernculasEAD . UAB|UESC
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Sumrio
UNIDADE I: SINTAXE LUZ DA GRAMTICA TRADICIONAL
APRESEMTAO ....................................................................................................................... 13
AULA 1SINTAXE: OBJETO DE ESTUDO E PERSPECTIVA GRAMATICAL
1 INTRODUO ...................................................................................................................... 172 DEFININDO O OBJETO DE ESTUDO DA SINTAXE ....................................................................... 183 AFINAL, DE QUAL GRAMTICA E DE QUAIS REGRAS ESTAMOS FALANDO? ................................... 224 A GRAMTICA NORMATIVA DESCRITIVA? .............................................................................. 25
4.1 Anlise sinttica: um tipo de descrio ......................................................................... 254.2 As regras sintticas: prescrio X realidade ................................................................... 27
ATIVIDADES ............................................................................................................................. 29RESUMINDO ............................................................................................................................. 31REFERNCIAS ........................................................................................................................... 32
AULA 2CLASSES E FUNES
1 INTRODUO ...................................................................................................................... 372 A IMPORTNCIA DA CLASSIFICAO DAS PALAVRAS ................................................................ 38
2.1 A classificao tradicional: alguns problemas ................................................................ 403 FUNES: UMA NOO RESULTANTE DE RELAES ................................................................. 424 CLASSES E FUNES: DIFERENAS ....................................................................................... 44
4.1 Relao paradigmtica x relao sintagmtica: relembrando Saussure .............................. 46ATIVIDADES ............................................................................................................................. 48RESUMINDO ............................................................................................................................. 51REFERNCIAS ........................................................................................................................... 52
AULA 3SINTAXE TRADICIONAL: PROBLEMAS DE ORDEM CONCEITUAL E ESTRUTURAL - PARTE I
1 INTRODUO ...................................................................................................................... 572 O SUJEITO GRAMATICAL E SUAS CONCEITUA-ES: PRESCRIO X PRTICA ............................. 583 O PREDICADO VERBAL: A QUESTO DA TRANSITIVIDADE ......................................................... 60
3.1 A transitividade verbal na prtica .............................................................................. 61ATIVIDADES ............................................................................................................................. 65REFERNCIAS ........................................................................................................................... 67RESUMINDO ............................................................................................................................. 67
AULA 4SINTAXE TRADICIONAL: PROBLEMAS DE ORDEM CONCEITUAL E ESTRUTURAL - PARTE II
1 INTRODUO ...................................................................................................................... 732 A ORAO E OS SEUS TERMOS: UMA DISTRIBUIO INCOERENTE ............................................ 74
2.1 Os termos essenciais .................................................................................................. 74
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2.2 Os termos integrantes ................................................................................................ 752.3 Os termos acessrios ................................................................................................ 75
3 COORDENAO E SUBORDINAO: PROCESSOS SINTTICOS FUNDAMENTAIS PARA A FORMAO DAS SENTENAS .............................................................. 77
3.1 Coordenao ou parataxe: relaes de independncia? ................................................... 783.2 Subordinao ou hipotaxe: relao de dependncia? ...................................................... 79
ATIVIDADE ............................................................................................................................... 81RESUMINDO ............................................................................................................................. 84REFERNCIAS ........................................................................................................................... 85
UNIDADE II: SINTAXE LUZ DA GRAMTICA GERATIVA
APRESEMTAO ....................................................................................................................... 87
AULA 5GRAMTICA GERATIVA: FUNDAMENTOS EPISTEMOLGICOS BSICOS
1 INTRODUO ...................................................................................................................... 912 LINGUAGEM: UMA FACULDADE INEREN-TE AO SER HUMANO ..................................................... 92
2.1 Lngua: um sistema de representao mental ................................................................ 932.2 Gramtica interiorizada: evidncias .............................................................................. 952.3 Competncia X desempenho ....................................................................................... 97
ATIVIDADES ............................................................................................................................. 101RESUMINDO ............................................................................................................................. 102REFERNCIAS ........................................................................................................................... 103
AULA 6GRAMTICA GERATIVA: FUNDAMENTOS EPISTEMOLGICOS DE UM MODELO CHAMADO
DE PRINCPIOS E PARMETROS
1 INTRODUO ...................................................................................................................... 1072 MODELO DE PRINCPIOS E PARMETROS: PRESSUPOSTOS BSICOS ......................................... 108
2.1 A noo de princpio ................................................................................................... 1092.2 A noo de parmetro ................................................................................................ 1112.3 A aquisio da linguagem nesse novo modelo ................................................................ 114
3 A SINTAXE NA TEORIA GERATIVA: O CENTRO DE ANLISE DE UMA LNGUA................................. 115ATIVIDADES ............................................................................................................................. 119RESUMINDO ............................................................................................................................. 120REFERNCIAS ........................................................................................................................... 121
AULA 7A ORGANIZAO E A CONSTITUIO DE UMA SENTENA: COMEANDO A COMPREENDER
SINTAXE A PARTIR DE UMA PERSPECTIVA FORMAL
1 INTRODUO ...................................................................................................................... 1252 ESTRUTURA DE CONSTITUINTES ............................................................................................ 126
2.1 Evidncias para a estrutura de constituintes .................................................................. 1302.1.1 Topicalizao .......................................................................................................... 1302.1.2 Clivagem ............................................................................................................... 1312.1.3 Passivizao ........................................................................................................... 132
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2.1.4 Fragmentos de sentenas ......................................................................................... 1322.1.5 Pronominalizao .................................................................................................... 1332.1.6 Elipse .................................................................................................................... 134
ATIVIDADES ............................................................................................................................. 134RESUMINDO ............................................................................................................................. 138REFERNCIAS ........................................................................................................................... 139
AULA 8OS SINTAGMAS: TIPOS E PROPRIEDADES
1 INTRODUO ...................................................................................................................... 1432 SINTAGMA: UMA CLASSE LIMITADA ........................................................................................ 144
2.1 O sintagma nominal .................................................................................................. 1462.2 O sintagma verbal .................................................................................................... 1482.3 O sintagma adjetival ................................................................................................. 1492.4 O sintagma preposicional ........................................................................................... 1492.5 O sintagma adverbial ................................................................................................ 150
ATIVIDADES ............................................................................................................................. 151RESUMINDO ............................................................................................................................. 153REFERNCIAS ........................................................................................................................... 154
AULA 9A ORGANIZAO E A CONSTITUIO DAS SENTENAS: APRENDENDO A
PLANTAR RVORES - PARTE I
1 INTRODUO ...................................................................................................................... 1592 OS CONSTITUINTES SINTTICOS: REPRESENTAES EM RVORES ......................................... 160
2.1 Entendendo as regras bsicas para a representao das sentenas ................................... 1612.2 Conhecendo algumas estruturas dos sintagmas ............................................................. 1672.2.1 O sintagma nominal ................................................................................................ 1672.2.2 O sintagma adjetival ............................................................................................... 1682.2.3 O sintagma verbal ................................................................................................... 1692.2.4 O sintagma preposicional ......................................................................................... 1702.2.5 O sintagma adverbial .............................................................................................. 171
ATIVIDADES ............................................................................................................................. 173RESUMINDO ............................................................................................................................. 174REFERNCIA ............................................................................................................................. 174
AULA 10A ORGANIZAO E A CONSTITUIO DAS SENTENAS ESTRUTURALMENTE AMBIGUAS:
APRENDENDO A PLANTAR RVORES - PARTE II
1 INTRODUO ...................................................................................................................... 1792 AMBIGUIDADE ESTRUTURAL .................................................................................................. 1803 AMBIGUIDADE ESTRUTURAL: REPRESENTAES EM RVORES ................................................ 181ATIVIDADES ............................................................................................................................. 186RESUMINDO ............................................................................................................................. 186REFERNCIAS ........................................................................................................................... 187
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Sobre a autora
Prof. Dr. Gessilene Silveira Kanthack
Graduada em Letras, pela Universidade Federal de Viosa-MG (UFV); Mestre e Doutora em Lingustica (rea de sintaxe), pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). professora adjunta da Universidade Estadual de Santa Cruz (UESC) e atua no Curso de Letras e no Curso de Ps-Graduao em Letras: Linguagens e Representaes.
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EmentaSintaxe em diferentes teorias lingusticas. Anlise lingustica de aspectos sintticos do portugus. Organizao e estruturao das oraes do portugus. Sintaxe da orao e sintaxe do texto. Sintaxe e outros nveis lingusticos. Anlise crtica dos conceitos da gramtica normativa em confronto com a realidade da comunicao lingustica.
DISCIPLINA
SINTAXE DA LNGUA PORTUGUESA
Prof. Dr. Gessilene Silveira Kanthack
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As quatro aulas que comporo esta primeira unidade tm
como objetivo principal apresentar fatos sintticos da lngua portu-
guesa, descritos e analisados conforme pressupostos da Gramtica
Tradicional, no sentido de destacar problemas diversos que refletem
diretamente no ensino de sintaxe, tornando-o, muitas vezes, um
bicho de sete cabeas.
A priori, vale destacar a importncia da descrio normativa
para os estudos de uma lngua, pois a partir desse tipo de prtica
que podemos promover reflexes sobre os usos reais que o falante
faz de sua lngua. Enquanto estudiosos de uma lngua, temos de
reconhecer o papel e a relevncia da abordagem tradicional, sem,
contudo, deixar de lado, as contribuies que as pesquisas lingus-
ticas tm proporcionado para a compreenso e o funcionamento da
linguagem.
E, aqui, cabe um conselho: ao ensinar sintaxe, ou qualquer
outra disciplina, voc deve estar consciente dos pontos positivos e
negativos da abordagem escolhida e que isso depende de modo
fundamental de sua viso dos fatos o que por sua vez depende
de treinamento em observao, coleta e sistematizao dos dados
da lngua (PERINI, 2006, p. 12). Em outras palavras, seja qual for
a abordagem, voc deve saber observar, analisar, interpretar e
refletir sobre os postulados e os dados em questo. isso, portan-
to, que procuraremos fazer ao longo de nossas aulas. Que sejam
discusses proveitosas!
SINTAXE LUZ DAGRAMTICA TRADICIONAL
APRESENTAO
unidade 1
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1aula
Ao final desta aula, voc dever ser capaz de:
definir o objeto de estudo da sintaxe;
reconhecer que a sintaxe um dos componentes gra-
maticais e um dos nveis de anlise lingustica de uma
lngua;
diferenciar tipos de gramticas;
apontar falhas no ensino tradicional de sintaxe.
Objetivos
SINTAXE: OBJETO DE ESTUDO E PERSPECTIVA GRAMATICAL
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AULA 1SINTAXE: OBJETO DE ESTUDO E PERSPECTIVA
GRAMATICAL
1 INTRODUO
Certamente, voc j tem conscincia da
importncia de uma cincia como a Lingustica,
que muito tem contribudo para a compreenso
da natureza e do funcionamento da linguagem
humana. Nesta disciplina, voc conhecer um
pouco do que essa cincia tem proporcionado
para explicar um dos nveis de anlise de uma
lngua: o nvel da sintaxe.
Particularmente, nesta aula, voc conhe-
cer o objeto de estudo da disciplina sintaxe,
como tambm ter a oportunidade de refle-
tir sobre o ensino tradicional dessa disciplina, que, muitas vezes, encarada como um bicho
de sete cabeas, dada a postura metodolgica
adotada por professores que tm como suporte
apenas as gramticas tradicionais.
Sobre o ensino de sintaxe, vale destacar aqui as palavras de Igncio (1993, p. 45-36):
No de agora que a anlise sinttica, da maneira como tradicionalmente concebida e ensinada, tem se constitudo num terror para os alunos. Paradoxalmente, o seu ensino tem servido para provocar a averso pelo estudo da lngua ou para fomentar o preconceito de que a nossa lngua a mais difcil de todas. Esse fato, naturalmente, no se verifica por causa da matria em si, mas graas aos mtodos pedaggicos utilizados para o seu ensino. Quando deveria ser o mais importante subsdio para a compreenso e desempenho da lngua escrita, tem sido, por um lado, um mero instrumento revelador de talentos privilegiados; por outro lado, um inibidor daqueles que realmente dela necessitam para melhorar o desempenho da lngua.
19 Mdulo 4 I Volume 2 EAD
Sintaxe: objeto de estudo e perspectiva gramaticalSintaxe da Lngua Portuguesa
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2 DEFININDO O OBJETO DE ESTUDO DA SINTAXE
Tradicionalmente, sintaxe (do grego syn-taxis ordem, disposio) corresponde a um dos
nveis de anlise de uma lngua, que tem como
objetivo principal descrever as regras respons-
veis pela formao de uma sentena. Trata-se
de uma das ramificaes da Lingustica que, ao
lado da fontica, da fonologia, da morfolo-gia e da semntica (disciplinas que compem o chamado ncleo duro dessa cincia), se pre-
ocupa, basicamente, em compreender a organi-
zao e o funcionamento das estruturas e os di-
versos fenmenos gramaticais que caracterizam
as lnguas naturais. Essas disciplinas do conta
da estrutura interna de uma lngua aquilo que
a distingue das outras lnguas do mundo, e que
no decorre diretamente de condies da vida
social ou do conhecimento do mundo (PERINI,
1996, p. 50).
Embora cada uma dessas disciplinas te-
nha o seu objeto especfico de anlise (que pode
ser estudado sob diferentes pontos de vistas),
importante destacar que elas tratam de nveis
que atuam em conjunto, possibilitando a forma-
o das sentenas de uma lngua. Para entender
isso, vamos a um exemplo:
(1) Jos gosta de doce.
Analisando, primeiro, a palavra Jos,
voc deve notar que h uma regra que obriga
o falante, primeiramente, a pronunciar a slaba
jo e depois, se. A propsito da primeira slaba,
tambm h uma regra que determina a ocorrn-
cia, primeiro, da consoante j e depois, da vogal
o, que pode tanto ser pronunciada como [o] ou
como [u]. J em gosta, voc deve observar que
a vogal o no pronunciada como [u]. Percebeu?
Sobre a vogal e, em Jos, ela pronunciada de
forma aberta []; em de e doce, ela pode ser
Conforme Berlinck et al (2005),
(...) a Sintaxe como disciplina lings-tica independente data apenas do final do sculo XIX (...). Um dos primeiros indcios do interesse especfico pelos fenmenos sintticos est no trabalho de John Ries, Was ist Syntax? (O que sintaxe?) de 1894. No entanto, so-bretudo a partir das idias do lingista suo Ferdinand de Saussure, no incio do sculo XX, e das vrias aplicaes e desenvolvimentos que delas fizeram seus seguidores que a Sintaxe foi ad-quirindo o estatuto de disciplina aut-noma (p. 209).
Em Lingustica I, voc conheceu os objetos de estudo dessas disciplinas. Vamos relem-brar! Fontica e Fonologia so discipli-nas que estudam os sons de uma lngua. A primeira se preocupa, basicamente, em descrever e analisar os sons (fones) do ponto de vista da produo (articulatria, auditiva e acstica); a segunda estuda os sons (fonema) do ponto de vista de sua funo, dos aspectos interpretativos. Mor-fologia tem como objeto de estudo o mor-fema. Ela descreve e analisa a combinao de morfemas na formao de unidades maiores, como a palavra, por exemplo. A Semntica uma disciplina que se pre-ocupa com o significado das palavras, das expresses, dos enunciados etc. (CAGLIA-RI, 1997). Essas disciplinas, ao lado da le-xicologia (que tem como objetivo o estudo do vocabulrio, das palavras que formam o lxico, compreendido como um reposi-trio das informaes idiossincrticas da lngua) fazem parte do ncleo duro (do ingls hard-core) da lingustica. Conforme Weedwood (2002), essas disciplinas que compem esse ncleo (denominado de mi-crolingustica) representam boa parte do conjunto mais antigo e tradicional de estu-dos da linguagem: basta ver que boa par-te da terminologia tcnica empregada na microlingstica (...) remonta aos estudos lingsticos da Antigidade Greco-romana (p. 12).
20 Mdulo 4 I Volume 2 EAD
Sintaxe: objeto de estudo e perspectiva gramaticalSintaxe da Lngua Portuguesa
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mais fechada [i]. Estou certa? Ento, nesses casos, estamos falando
de regras fontico/fonolgicas (envolvendo a a menor unidade da
estrutura lingustica, o fonema).
Ainda em relao a 1, voc pode analisar a composio inter-
na das palavras. Por exemplo, a palavra gosta formada por mais
de um elemento (e agora estamos falando do morfema): gost + a. A
primeira forma aparece tambm em outras palavras: gosto, gos-
taram, gostinho, gostosura, gostosa etc. A segunda forma, a,
ocorre em ama, chama, anda etc. Nesse nvel de composio, h
regras que impedem, por exemplo, as construes de 2:
(2) a. *Jos gosteu de doce.
b. *Jos gostiu de doce.
A propsito, essas estruturas so rejeitadas por qualquer fa-
lante do portugus, visto que h violao de regras morfolgicas: eu
no constitui unidade com gost, embora a constitui com formas como
beber (bebeu) e comer (comeu), por exemplo. Do mesmo modo,
iu no combina com gost, embora combine com partir (partiu) e
sorrir (sorriu), por exemplo.
Voc tambm pode analisar a frase em 1 considerando a com-
binao entre as palavras. Por exemplo, voc deve perceber que h
uma relao entre Jos e o verbo gostar. Se voc substituir Jos
pelo pronome ele, a combinao no alterada. Por outro lado, se
for substitudo por eles, ter que alterar a forma do verbo: gos-
tam. Deve notar, tambm, que a posio que Jos ocupa em rela-
o ao verbo determinante para a funo que ele desempenha na
frase: a de sujeito. o Jos quem gosta, e no o doce.
Falando ainda desse nvel de anlise, voc deve observar uma
relao entre o verbo e o objeto (de doce). Quer uma prova disso?
Veja 3:
(3) *Jos gosta o doce.
Voc nota que a preposio de fundamental nessa relao?
Ou seja, o verbo gostar impe restries selecionais quanto ao tipo
de complemento, seja ele um objeto, como em 3, seja ele um sujeito,
como voc pode ver em 4:
(4) *A pedra gosta de doce.
Embora esta sentena no apresente problemas de organi-
O asterisco (*) usa-do para indicar que a sentena agramati-cal (impossvel de ser produzida pelo falan-te), como ilustram os exemplos em 2. Por outro lado, quando a sentena no apre-senta nenhum tipo de problema, dize-mos que gramatical. Guarde bem essas duas palavras: gra-matical e agramatical, pois elas so muito usadas na sintaxe! Mais adiante, explici-taremos melhor sobre essas duas noes.
21 Mdulo 4 I Volume 2 EAD
Sintaxe: objeto de estudo e perspectiva gramaticalSintaxe da Lngua Portuguesa
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zao estrutural (observe que tem a mesma forma de 1), ela sim-
plesmente no produzida (a no ser em um mundo imaginrio, no
caso de uma fbula, por exemplo), pois h incompatibilidade entre
a pedra e o verbo gostar. Estamos, neste caso, falando de outro
nvel: o da semntica. esse nvel o responsvel pela interpretao
da sentena.
Percebeu a quantidade de regras que o falante recorre para
a construo de uma sentena? Exemplificamos, aqui, algumas re-
gras resultantes da articulao dos vrios nveis na formao de uma
frase. No entanto, podemos estudar, em separado, cada um deles,
observando cada uma das regras que so aplicadas. Da a razo de
se ter as disciplinas: fontica, fonologia, morfologia, sintaxe e se-
mntica. Em cada uma delas, voc tem a oportunidade de estudar, a
partir de diferentes recortes e perspectivas tericas, os seus objetos
especficos de investigao.
Nesta disciplina, voc estudar, em particular, as regras que
caracterizam a sintaxe, o nvel responsvel pela formao das sen-
tenas de uma lngua. esse nvel que determina as regras para a
construo de 5a, e que impossibilita 5b:
(5) a. Ilhus tem praias muito bonitas.
b. * bonitas tem muito Ilhus praias.
, tambm, por meio desse nvel que podemos explicar as
sentenas abaixo:
(6) a. Joo comprou um carro novo.
b. Um carro novo, Joo comprou.
c. Comprou um carro novo, Joo.
d. Comprou Joo um carro novo.
Certamente, voc avaliar a primeira sentena (6a) como sen-
do a mais natural, a chamada ordem direta (sujeito + verbo + obje-
to). As outras sentenas (na ordem indireta), embora tenham julga-
mentos variveis, tambm so possveis. Mesmo alterando a ordem,
quem compra o carro novo Joo. E por que fazemos essa leitura
e no outra? Porque temos em 6 a aplicao de regras que permitem
a formao de algumas unidades, restringindo as relaes entre elas.
Por exemplo: voc deve notar que em um carro novo h uma rela-
o estreita entre as palavras, j que elas ocorrem juntas e sempre
na mesma ordem: artigo + substantivo + adjetivo. Mesmo alterando
a ordem da sentena (6b-d), a unidade permanece intacta. Tambm,
22 Mdulo 4 I Volume 2 EAD
Sintaxe: objeto de estudo e perspectiva gramaticalSintaxe da Lngua Portuguesa
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como voc j sabe, h uma relao entre Joo e comprar, explici-
tada pela concordncia verbal.
A propsito da ordem, ou seja, da forma como as palavras se
combinam para gerar as sentenas, ela fundamental para a consti-
tuio do significado. Para entender isso, veja 7:
(7) a. O cachorro correu atrs do gato.
b. O gato correu atrs do cachorro.
Embora essas duas frases tenham as mesmas classes de
palavras (artigo + substantivo + verbo + advrbio + preposio +
substantivo) e apresentem a mesma estrutura sinttica (sujeito +
predicado), voc reconhece que elas no significam a mesma coisa.
A mudana de posio das palavras cachorro e gato alterou com-
pletamente o significado. O falante tem conscincia de que em 7a
o gato que est em apuros, e de que, em 7b, o cachorro. Ou
seja, alterando a ordem desses elementos, troca-se tambm o papel
de cada um na interpretao da sentena.
por meio da sintaxe que, tambm, explicamos as sentenas
abaixo:
(8) a. Ontem, Joo viu Maria.
b. Ontem, Joo a viu.
c. Ontem, Joo viu ela.
d. Ontem, Joo viu .
Numa descrio em que o objetivo apresentar diferentes estruturas pro-duzidas pelos falantes de uma lngua, saiba que no so pertinentes noes do tipo certo e errado, que voc conhece bem. Por exemplo, a prop-sito de 8, voc sabe que, pela pers-pectiva da gramtica normativa, 8c totalmente errada, sendo 8a e 8b as estruturas consideradas corretas. Quanto estrutura de 8d, em que est evidente o objeto nulo, no h previso de sua ocorrncia na des-crio tradicional. Nesta, h previso de que o sujeito possa ser nulo; j, quanto ao objeto, isso no acontece. No entanto, voc j sabe que pes-quisas sociolingusticas revelam que essa uma das formas mais usadas na lngua portuguesa. A propsito, vale relembrar sobre o uso varivel do objeto consultando o artigo de Oli-veira (2007), disponvel no endereo:
Como voc pode ver, em se tratando do ob-
jeto direto (selecionado pelo verbo transitivo direto),
o falante pode represent-lo de diferentes formas:
por meio do sintagma (que ser definido e aprofun-
dado mais adiante) Maria; do cltico a (que voc
j sabe que se trata do pronome tono); do pronome
tnico ela; e do objeto nulo (que corresponde ao
apagamento do objeto). Independentemente dos jul-
gamentos que se fazem a respeito dessas sentenas,
elas so produzidas em diversas situaes.
Bem, exemplificamos, at agora, algumas
regras usadas para a formao de sentenas. Com
essa pequena descrio, voc j deve ter notado que
a sentena o objeto de estudo da sintaxe (mais
adiante ver que a sintaxe pode se ocupar de unida-
des menores os chamados sintagmas). Descrever
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Sintaxe: objeto de estudo e perspectiva gramaticalSintaxe da Lngua Portuguesa
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e explicar as regras para a formao das sentenas , portanto, um
dos principais objetivos dessa disciplina, caracterizada como um dos
componentes da GRAMTICA, que pe disposio do falante um
conjunto de regras que o habilitam a produzir frases ou seqncias
de palavras de maneira tal que essas frases e seqncias so com-
preensveis e reconhecidas como pertencendo a uma lngua (POS-
SENTI, 1998, p. 69).
Sobre a especificao de GRAM-TICA, vale destacar aqui a opi-nio de Neves (2008, p. 29):
Toda vez que se fala em gra-mtica necessrio especi-ficar-se muito claramente de que que se est falando, exatamente. possvel ir des-de a idia de gramtica como mecanismo geral que organi-za as lnguas at a idia de gramtica como disciplina, e, neste ltimo caso, no se pode ficar num conceito ni-co, sendo necessria uma in-curso por mltiplas noes, j que so mltiplos os tipos de lies que uma gramtica da lngua pode fornecer.
Em outras palavras, voc precisa ter muito clara a noo do que seja GRAMTICA, dadas as dife-rentes perspectivas tericas (seja de um modelo normativo, seja de um no-normativo) que temos a nossa disposio para explicar-mos os fatos de uma lngua.
3 AFINAL, DE QUAL GRAMTICA E DE QUAIS REGRAS ESTAMOS FALANDO?
A essa altura do curso, certamente, voc j sabe
que, quando falamos em GRAMTICA, no necessaria-
mente devamos pensar em gramtica normativa, aque-
le compndio que apresenta um conjunto de regras
que devem ser seguidas (POSSENTI, 1998, p. 64).
Para esta gramtica, a regra concebida como uma
lei, que deve ser obedecida. Se o falante a usa, ele
considerado um bom falante, pois obedece s normas
prescritas para o bem falar e escrever. Conforme Trava-
glia (2000), essa gramtica dita
(...) normas para a correta utilizao oral e escrita do idioma, prescreve o que se deve e o que no se deve usar na lngua. Essa gramtica considera apenas uma variedade da lngua como vlida, como sendo a lngua verdadeira (...) mais uma espcie de lei que regula o uso da lngua em sociedade (p. 30-31).
Infelizmente, em nossa tradio escolar, vigora essa concep-
o de gramtica. Por exemplo, saber sintaxe implica em reconhecer:
todas as classes gramaticais e funes sintticas das palavras; todas
as regras de colocao dos termos na orao; todas as regras res-
ponsveis pela concordncia e regncia (verbal e nominal); todos os
tipos de sentenas (coordenadas e subordinadas); todas as figuras de
sintaxe... Enfim, o bom falante da lngua portuguesa tem de saber
tudo isso e muito mais!!!
Todavia, voc tem conhecimento de que muitos falam uma
lngua sem nunca mesmo ter frequentado um banco escolar. E, se
falam, porque sabem muito bem o que seja regra, um aspecto
24 Mdulo 4 I Volume 2 EAD
Sintaxe: objeto de estudo e perspectiva gramaticalSintaxe da Lngua Portuguesa
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do conhecimento lingustico que tem propriedade sistemtica. Por exemplo, na seo acima, voc viu que, para a formao de uma
sentena, o falante no organiza as palavras de forma aleatria. H
regras que determinam a constituio das unidades que vo assumir
funes conforme as posies que ocupam na sentena. Isso qual-
quer falante sabe! Lembra do contraste ilustrado em 5?
(5) a. Ilhus tem praias muito bonitas.
b. * bonitas tem muito Ilhus praias.
Voc no encontrar nenhum falante da lngua portuguesa
produzindo a estrutura de 5b. Poder at observar algum tipo de vio-
lao, como a que temos em 9,
(9) Ilhus tem praias muito bonita.
ou seja, a falta de concordncia entre o nome praias e o adjetivo
bonita, mas que no interfere na constituio do significado da sen-
tena. Lembra tambm do objeto direto? Retomemos os exemplos:
(8) a. Ontem, Joo viu Maria.
b. Ontem, Joo a viu.
c. Ontem, Joo viu ela.
d. Ontem, Joo viu .
O falante pode no usar as quatro possibilidades de repre-
sentao do objeto, mas, com certeza, ele sabe que um verbo como
ver licencia um objeto, seja numa forma explcita (8a; 8b; 8c) ou
no (8d). Regra semelhante tambm se aplica ao sujeito, como voc
pode observar em 10, abaixo:
(10) a. Joo saiu apressado, pois Joo no queria perder o
avio.
b. Joo saiu apressado, pois ele no queria perder o
avio.
c. Joo saiu apressado, pois no queria perder o
avio.
Assim como o objeto direto, o sujeito pode ser representado
por formas explcitas (10a) e (10b) ou pelo chamado sujeito nulo
(10c). Ou seja, 8 e 10 ilustram um fato bastante comum na lngua
portuguesa: realizar foneticamente ou no determinado elemento
Esse tipo de conheci-mento a que estamos nos referindo, Perini (2005) o chama de im-plcito que no fruto de instruo recebi-da na escola (p.13), mas que foi adquirido de forma natural e es-pontnea, da mesma maneira informal pela qual adquirimos a ha-bilidade de andar: uma parte por imitao e uma parte atravs de capacidades mais ou menos especficas que herdamos como dota-o gentica (p. 14).
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sinttico. Trata-se de uma regra a qual o falante recorre conforme as
necessidades de comunicao.
Conhecimentos desse tipo fazem parte da chamada gramtica
internalizada, definida como o conjunto de regras que o falante do-
mina (POSSENTI, 1998, p. 69). Nesta concepo, regra corresponde
regularidade e no tem conotao valorativa. Segundo esse autor,
seguir uma ou outra regra no indica menor ou maior inteligncia,
maior ou menor sofisticao mental ou capacidade comunicativa (p.
74). Em outras palavras, o falante que produz 8c, forma no re-
comendada pela gramtica normativa, no menos inteligente que
quem produz 8b. A diferena est apenas na representao do obje-
to. Cada um desses falantes tem disposio um conjunto de regras
que acionado conforme as circunstncias. Se se trata de um falante
que nunca frequentou uma escola, e que no conhece bem a chama-
da lngua culta, certamente acionar a regra ilustrada em 8c, e no
aquela ilustrada em 8b; regra esta que se espera, normalmente, de
um falante que tem o conhecimento da prescrio tradicional.
Bem, como voc viu, falamos de dois tipos de gramtica: nor-
mativa e internalizada. Ao lado destas, encontramos tambm a cha-
mada gramtica descritiva, definida por Possenti como o conjunto de
regras que so seguidas (p. 65). Segundo ele, essa gramtica que
orienta o trabalho dos lingistas, cuja preocupao central tornar
conhecidas, de forma explcita, as regras de fato utilizadas pelos fa-
lantes da a expresso regras que so seguidas (p. 65).
Segundo Perini (1976), a gramtica descritiva resultante da
observao direta do que se diz ou se escreve na realidade. Ao lin-
guista, cabe o papel de descrever e explicar (por meio de uma teoria)
as regras responsveis pelo funcionamento da lngua. Nenhum dado
lingustico deixar de ser considerado na descrio, pois o pressu-
posto bsico : se produzido, porque o falante tem conhecimento
sistemtico de regras. Portanto, compreender e explicar o funcio-
namento dessas regras o que motiva, basicamente, os linguistas
a empreenderem diferentes propostas, como, por exemplo, a que
voc conhecer nesta disciplina: a da gramtica gerativa. Antes de
apresent-la a voc, ter a oportunidade de refletir, um pouco, sobre
o que a perspectiva tradicional nos oferece sobre o funcionamento da
linguagem no que diz respeito sintaxe da lngua portuguesa e aos
fenmenos que a envolvem.
26 Mdulo 4 I Volume 2 EAD
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4 A GRAMTICA NORMATIVA DESCRITIVA?
Como voc j sabe, a gramtica normativa
prescritiva, pois determina o que deve ser usado, pelos falantes, para falar e escrever corretamente a lngua.
tambm descritiva; porm, tem em vista apenas uma
modalidade da lngua, a variedade padro/culta. Resta,
agora, saber como se caracteriza a descrio tradicional. Basicamente, ela feita a partir de um conjunto
variado de nomenclaturas, de regras, de definies, de
exemplos que no so de usos reais etc. Por exemplo,
com relao sintaxe, alm de voc reconhecer as dife-
rentes classes e subclasses a que pertencem as palavras,
precisa tambm saber identificar as funes sintticas
desempenhadas por elas. E, para isso, necessita recorrer,
na maioria das vezes, a noes semnticas, que esto
presentes nas definies apresentadas por ela. Para en-
tender o que estamos falando, vamos fazer, na prxima
seo, uma tpica anlise sinttica tradicional.
4.1 Anlise sinttica: um tipo de descrio
Certamente, voc deve se lembrar das ativida-
des tradicionais que tm como foco a anlise sinttica
de uma sentena, considerada, por muitos, um bicho de
sete cabeas:
No que diz respeito prescri-o, veja o que argumenta Neves (2008, p. 56):
O tema prescrio tabu en-tre os lingistas. Constituindo naturalmente um dos tpicos necessrios da atividade me-talingstica (inaugurada pela cincia lingstica), entretanto a prescrio sempre foi alijada das discusses dos lingistas, a no ser para dizer-se que a questo sociocultural, e no lingstica.Ora, vejamos. Nas nossas cul-turas ocidentais modernas, antes do advento da cincia lingstica, a prescrio era simplesmente uma prtica: produziam-se as obras (as gramticas) para estabelecer-se a norma, que, independen-temente do discurso adotado (...), constitua o modelo a ser seguido.
Como voc deve ter conscincia, a prescrio continua sendo uma prtica em nossas escolas, mes-mo que os professores j tenham conhecimento de outras gramti-cas.
27 Mdulo 4 I Volume 2 EAD
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Relembrando um pouco, para uma sentena como 11,
(11) Maria visitou um amigo de infncia.
primeiro, voc deve reconhecer a classe de cada uma das pa-lavras:
Maria (substantivo);
visitou (verbo);
um (artigo);
amigo (substantivo);
de (preposio);
infncia (substantivo).
Para fazer essa classificao, voc necessita recorrer s
definies dadas a cada uma dessas classes. Por exemplo: pre-
cisa saber que um substantivo a palavra com que designamos
ou nomeamos os seres em geral (CUNHA; CINTRA, 1985, p.
171); que um verbo uma palavra de forma varivel que ex-
prime o que se passa, isto , um acontecimento representado no
tempo (p. 367); que as preposies so palavras invariveis
que relacionam dois termos de uma orao, de tal modo que o
sentido do primeiro (antecedente) explicado ou complementa-
do pelo segundo (conseqente) (p. 542); e assim por diante.
Nessa primeira etapa, em que o objetivo reconhecer as classes
gramaticais, o que se tem, na verdade, uma descrio morfo-
lgica.
Na segunda etapa, voc deve identificar as funes sint-
ticas:
Maria (sujeito);
visitou um amigo de infncia (predicado);
visitou (verbo transitivo direto);
um amigo de infncia (objeto direto);
de infncia (predicativo do objeto direto).
Novamente, para fazer isso, voc recorre s conceitua-
es. Precisa saber o que um sujeito, um predicado, um verbo
transitivo, um objeto, um predicativo. Voc nota que o que est
em jogo um critrio semntico? E o sinttico, j que se trata
de anlise sinttica?
Pois bem, esse critrio est explcito na ordenao e com-
binao dos elementos. O sujeito (que tambm o ncleo) o
Voc j deve ter ouvido falar em morfossintaxe. Estou certa? Pois bem, o tipo de descrio que apresentamos aqui nomeado de descrio morfossinttica (da o termo morfossintaxe), pois, como voc viu, um misto de anlise morfolgica e de anlise sinttica. No entanto, viu tambm que a semntica se faz presente na anlise tradicional. Portanto, o termo morfossintaxe se torna incoerente diante da anlise sinttica tradicional.
Sobre as classes de pa-lavras, saiba que elas so necessrias para podermos falar da lngua. Ou seja, sem uma metalinguagem (substantivo, adjetivo, ver-bo, advrbio, pronome, preposies, sujeito, predi-cado, orao ativa, orao passiva, orao subordi-nada, orao coordenada etc.) no temos como des-crever, com um mnimo de economia, os fenmenos que caracterizam as ln-guas. Aprofundaremos, na prxima aula, sobre essa temtica. Aguarde!
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elemento que est em relao de concordncia com o verbo (que
o ncleo do predicado verbal); o objeto sem a presena de uma pre-
posio corresponde ao complemento do verbo transitivo direto; o
predicativo do objeto mantm, por meio da preposio, uma relao
estreita com o ncleo do objeto. Observe que, agora, esto em jogo
relaes de natureza estritamente formal (que dizem respeito for-
ma das palavras que compem a frase).
Voc deve ter percebido que, por essa descrio tradicional,
temos uma mistura de noes que correspondem a diferentes mbi-
tos de uma gramtica. Ou seja, descrever sintaticamente uma sen-
tena no pressupe apenas reconhecer noes sintticas, mas tam-
bm noes de natureza morfolgica e semntica. E no para por a!
Saber fazer anlise sinttica, nessa perspectiva, implica tambm em
reconhecer e aplicar as regras sintticas prescritas.
4.2 As regras sintticas: prescrio X realidade
Dada a natureza dinmica de uma lngua, no podemos deixar
de reconhecer que as regras sintticas (assim como as que envolvem
outros nveis) esto sempre sujeitas a mudanas. Todavia, esse prin-
cpio nem sempre considerado pela descrio tradicional. Por exem-
plo, em se tratando de colocao pronominal, ela determina regras do
tipo as que ilustramos nos contrastes abaixo:
(12) a. Empreste-me o seu livro de sintaxe . b. * Me empreste o seu livro de sintaxe.
(13) a. O aluno veio interromper-me durante o seminrio.
b.* O aluno veio me interromper durante o seminrio.
Segundo ela, no se deve usar a prclise quando o verbo inicia
uma sentena (12b) e no se deve usar o pronome no meio de uma
locuo verbal (13b). No entanto, como voc sabe, essas sentenas
julgadas erradas so as que so mais produzidas pelo falante de
lngua portuguesa. Para muitos, 12a e 13a no correspondem rea-
lidade, de fato. Veja outro caso:
(14) a. Vendem-se casas.
b. *Vende-se casas.
c. Alugam-se apartamentos.
d. *Aluga-se apartamentos.
29 Mdulo 4 I Volume 2 EAD
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Para a descrio tradicional, apenas 14a e 14c esto corretas,
pois o verbo est concordando com o elemento sinttico posposto
(particularidade esta da chamada orao passiva sinttica). Todavia,
o falante de lngua portuguesa, normalmente, no reconhece essa re-
gra, pois no identifica o substantivo posposto ao verbo como sujeito,
e sim como objeto direto, funo esta que no exige o acordo do ver-
bo, e, por isso, acaba produzindo 14b e 14d. Na verdade, ao produzir
esse tipo de sentena, o falante entende que se trata de um sujeito
indeterminado: algum vende casas; algum aluga apartamentos.
Com relao regncia verbal, h inmeros casos que ilustram
o que estamos falando aqui. Veja alguns deles:
(15) a. A famlia assistiu ao filme.
b. *A famlia assistiu o filme.
(16) a. Fomos praia ontem.
b. *Fomos na praia ontem.
(17) a. Os filhos devem obedecer aos pais.
b. *Os filhos devem obedecer os pais.
Certamente, voc, assim como a maioria dos falantes, no
v nenhum problema sinttico nas sentenas ilustradas em b, que,
segundo a gramtica tradicional, estariam erradas. Afinal, qual a di-
ferena entre usar o objeto indireto (como preceitua a norma) e o
objeto direto (como determina a prtica lingustica)? Nenhuma! Me-
lhor dizendo, o que a prtica lingustica nos revela que as estrutu-
ras com este ltimo objeto so mais naturais do que aquelas com o
objeto indireto. Como voc v, a regra prescrita uma e o uso real
outro. Neves (2008, p. 29) confirma essa constatao: a gramtica
tradicional (...) no reflete a verdade das coisas.
Independentemente dos valores atribudos s diferentes sen-
tenas pela descrio tradicional, devemos ter em mente que se o fa-
lante as produz porque o sistema de sua lngua permite. Compreen-
der e explicar as regras que esto por traz das diferentes estruturas
sintticas , portanto, o objetivo dessa disciplina chamada sintaxe.
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Sintaxe: objeto de estudo e perspectiva gramaticalSintaxe da Lngua Portuguesa
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Agora, vamos s atividades!
ATIVIDADES1 Considerando o que foi apresentado nesta aula, defina o objeto de estudo da sintaxe.
2 Indique e explique o tipo de problema (morfolgico, sinttico ou semntico) que torna as estruturas, abaixo, agramaticais:
a) *Maria gosta doce abbora.b) *O menino corriu e caiu.c) * A rvore deseja sambar.d) *Mas no passou no vestibular, Joo estudou muito.e) *O meu cachorro inmorde, ele inbravo.f) *Joo entregou o livro para lhe. g) *O cachorro um mamfero animal.h) * Joo bebeu o bife.
3 Quem quer que saiba uma lngua sabe quais as sequncias de palavras que so pos-sveis (gramaticais) naquela lngua e quais seriam impossveis (agramaticais). Construa duas frases agramaticais para qualquer gramtica, sendo: uma com algum problema sin-ttico e uma com algum problema semntico; duas agramaticais apenas para a gram-tica tradicional, sendo: uma com algum problema sinttico e uma com algum problema morfolgico; e, por fim, duas gramaticais para qualquer gramtica. Depois de elaboradas as frases, explique sucintamente porque voc as julga de tal natureza. ATENO: no vale repetir as sentenas da atividade 2!
4 Leia o poema abaixo e, em seguida, faa a atividade proposta:
PRONOMINAIS
D-me um cigarroDiz a gramtica
Do professor e do alunoE do mulato sabido
Mas o bom negro e o bom brancoDa nao brasileiraDizem todos os dias
Deixa disso camaradaMe d um cigarro.
(Oswald de Andrade, 1927)
4.1 Neste poema, o autor fala de dois tipos de gramticas. Identifique-as, explicando como cada uma delas concebe a noo de regra. Para tanto, considere o aspecto sinttico que tema do poema.
5 Tendo por base os pressupostos tradicionais, procure fazer a anlise morfossinttica das sentenas abaixo:
ATIVIDADES
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a. Joo est muito feliz.b. Maria saiu da sala.c. Joo e Maria compraram uma casa nova.d. Maria gosta de doce de abbora.e. Joo deu flores Maria.
6 Apresente trs casos de regras sintticas prescritas pela gramtica normativa e que, no entanto, no so seguidas, normalmente, pelo falante de lngua portuguesa.
7 Analise a situao abaixo e, em seguida, responda as questes:
Uma professora, ao ensinar interjeies, pede que um aluno construa uma frase com a palavra Oxal:
- Oxal chova amanh, disse o aluno.
- Perfeito, disse a professora. Agora quero que um outro aluno construa uma outra frase com qualquer outra interjeio:
- Ogum faa sol amanh, responde imediatamente um outro aluno.
7.1 Que tipo de conhecimento lingustico o aluno da segunda resposta demonstra ter? Ex-plique.
7.2 O que a professora deve dizer a respeito das duas respostas?
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RESUMINDO Nesta aula, voc viu que:
a sintaxe corresponde a um dos nveis de anlise de uma lngua,
que tem como objeto de estudo as sentenas;
o objetivo principal da sintaxe descrever e explicar as regras
para a formao das sentenas;
o falante de uma lngua tem disposio um conjunto de regras
que o habilitam a produzir inmeras estruturas lingusticas, po-
dendo elas se aproximarem mais da descrio prescrita pela gra-
mtica tradicional , ou no;
a anlise sinttica tradicional, embora seja baseada numa mistura
de noes morfolgicas, sintticas e semnticas, corresponde a
uma descrio lingustica de uma das modalidades da lngua: a
lngua culta/escrita;
nem sempre as regras prescritas pela descrio tradicional corres-
pondem, de fato, aos usos concretos feitos pelos falantes.
LEITURA RECOMENDADA
Para complementar esta nossa aula, recomendo a leitura do livro de: FRANCHI, C.
Mas o que mesmo Gramtica? So Paulo: Editorial, 2006.
RESUMINDO
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Sintaxe: objeto de estudo e perspectiva gramaticalSintaxe da Lngua Portuguesa
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REFERNCIAS
BERLINCK, R. de A.; AUGUSTO, M. R. A.; SCHER, A. P. Sintaxe. In: MUSSALIN, F.; BENTES, A. C. (Orgs.). Introduo Lingstica: domnios e fronteiras. v. 1. So Paulo: Cortez, 2001, p. 207 - 244.
CAGLIARI, L. C. Alfabetizao & Lingstica. So Paulo: Scipione, 1997.
CUNHA, C.; CINTRA, L. Nova Gramtica do Portugus Contem-porneo. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1985.
FRANCHI, C. Mas o que mesmo Gramtica? So Paulo: Edito-rial, 2006.
IGNCIO, S. E. Por exemplo, o ensino de anlise sinttica. In: Alfa. So Paulo, 1993, p. 33 - 41.
NEVES, M. H. de M. Que gramtica estudar na escola? norma e uso na lngua portuguesa. So Paulo: Contexto, 2008.
PERINI, M. A. A gramtica gerativa: introduo ao estudo da sinta-xe portuguesa. Belo Horizonte: Viglia, 1976.
PERINI, M. A. Gramtica descritiva do portugus. 2. ed. So Pau-lo: tica, 1996.
PERINI, M. A. Sofrendo a Gramtica. 3. ed. So Paulo: tica, 2005.
PERINI, M. A. Princpios de lingstica descritiva: introduo ao pensamento gramatical. So Paulo: Parbola Editorial, 2006.
POSSENTI, S. Por que (no) ensinar gramtica na escola. Cam-pinas: Mercado de Letras, 1998.
TRAVAGLIA, L. C. Gramtica e interao: uma proposta para o en-sino de gramtica no 1 e 2 graus. 5. ed. So Paulo: Cortez, 2000.
WEEDWOOD, Barbara. Histria concisa da lingstica. Traduo de Marcos Bagno. 5. ed. So Paulo: Parbola Editorial, 2002.
REFERNCIAS
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Suas anotaes
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-
aula
Ao final desta aula, voc dever ser capaz de:
reconhecer a importncia da classificao das
palavras;
apontar problemas que envolvem a classificao de
palavras proposta pela gramtica tradicional;
identificar funes sintticas e semnticas;
diferenciar classe de funo, bem como eixo
sintagmtico de paradigmtico.
Objetivos
CLASSES E FUNES
2
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AULA 2CLASSES E FUNES
1 INTRODUO
Na aula passada, voc viu que, ao fazermos uma anlise
sinttica tradicional, basicamente, procuramos identificar as clas-ses e as funes das palavras que formam as sentenas. Nesta aula, voc estudar sobre a importncia dessas noes para a
prtica da descrio lingustica, pois por meio delas que pode-
mos falar, com um mnimo de economia, sobre como as unidades
lingusticas se comportam e se relacionam dentro das estruturas.
Observe que essa afirmao no se restringe apenas a um nvel
de anlise lingustica. Em qualquer um deles precisamos recorrer
s noes de classe e funo.
Nesta aula, em particular, daremos nfase ao nvel da sin-
taxe, claro! Alm de aprender sobre a importncia dessas duas
noes, voc ver, tambm, algumas confuses presentes nas
gramticas tradicionais, envolvendo a classificao e as funes
das palavras.
Voc sabia que os exer-ccios de reconhecimen-to das classes e das funes sintticas ocu-pam boa parte das aulas de lngua portuguesa? Neves (1990) e Pinilla (2007) confirmam isso. Esta ltima completa: apesar de ser bastan-te abordado na escola, o tema no parece ser criteriosamente tratado: ora ocorre mistura de critrios, ora faltam cri-trios (p. 170).
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Classes e FunesSintaxe da Lngua Portuguesa
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A preocupao com a classificao das palavras vem desde a Antiguida-de. Conforme Azeredo (1995, p. 17), Plato dividira a unidade do discur-so, que ele intura no esforo de apre-ender os mecanismos de expresso do pensamento em dois componen-tes: noma (nome), e rhma (ver-bo). Depois, Aristteles acrescentou os syndesmoi (unidades gramati-cais) e os esticos propuseram sepa-rar as formas variveis (pronomes e artigos) das invariveis (conectivos e advrbios). Dionsio da Trcia, autor da primeira gramtica da lngua gre-ga, a tekhn grammatik, ampliou e sistematizou a distribuio das pala-vras em oito categorias: nome, ver-bo, conjuno, artigo, advrbio, pre-posio, pronome e particpio. Como voc v, foram essas categorias que serviram de base para a diviso que encontramos em nossas gramticas tradicionais. Voc deve se lembrar que, atualmente, so dez as classes gramaticais: substantivo, artigo, ad-jetivo, verbo, conjuno, advrbio, preposio, pronome, numeral e in-terjeio.
2 A IMPORTNCIA DA CLASSIFICAO DAS PALAVRAS
Em qualquer cincia, em qualquer tipo de descri-
o, a classificao (dos objetos, das coisas, dos seres, das entidades, das aes, das caractersticas etc.) uma
propriedade necessria e muito importante, pois , a par-
tir dela, que podemos nos referir aos objetos de nossos
estudos.
Para entender o que estamos falando, vamos a
um exemplo prtico!
Atualmente, voc faz parte de um meio acadmi-
co, onde se encontram vrias pessoas exercendo funes
diferenciadas: reitor, pr-reitor, chefe de departamento,
coordenador de colegiado, professor conteudista, pro-
fessor formador, tutor, aluno, por exemplo. Como falar
dessas pessoas se no recorrermos a esses nomes es-
pecficos? Ou seja, por meio dessas nomeaes (feitas,
por exemplo, a partir das funes desempenhadas) que
podemos falar de cada uma delas.
Com a linguagem, tambm no diferente! Ao
lidarmos com a estrutura de uma lngua, seja em qual
nvel for, h necessidade de recorrermos a um grande
nmero de categorias para, de fato, podermos falar da
lngua. Como voc j sabe, no nvel da sintaxe, falamos
em: sujeito, predicado, predicativo, objeto... no nvel da
morfologia, falamos em: substantivo, verbo, adjetivo,
pronome, preposio... Voc percebe que, sem essas no-
meaes, no temos como falar da lngua? Como voc se
referiria a uma palavra como estudar se no houvesse
a palavra verbo? Como se referiria a estudante, se no
houvesse a palavra substantivo?
Classificamos as palavras para podermos falar de-las com um mnimo de economia. A propsito disso, Peri-
ni (2008, p. 79-80) exemplifica:
Nenhum sistema de conhecimento pode funcionar sem um subsistema de categorizao. Uma razo para isso que o mundo complexo demais para caber literalmente na memria de uma criatura. Eu, no momento, estou sentado em um objeto que chamo de cadeira, e h outras cadeiras pela casa, no meu gabinete
A propsito da classificao, Perini (2005, p. 39) afirma:
Grande parte do labor cientfico consiste em classificar entidades e elaborar justificativas para essa classificao. A cincia no se limita a isso, evidentemente: uma cincia muito mais que uma classificao de objetos. Mas, em geral, depende de classificaes, at mesmo para possibilitar o dilogo entre os cientistas.
Para entender um pouco mais sobre a classificao de palavras, recomendo a leitura do ensaio O adjetivo e o ornitorrinco: dilemas da classificao das palavras de Perini (2005), publicado no seu livro Sofrendo a gramtica.
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Classes e FunesSintaxe da Lngua Portuguesa
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e em vrios lugares que freqento. No entanto, h ntidas diferenas entre essas cadeiras: podem ser estofadas ou no, feitas de madeira, de metal ou de plstico, com braos ou sem braos, confortveis ou desconfortveis, claras ou escuras e assim por diante. No entanto, para mim so todas cadeiras, se meu objetivo distingui-las de outros objetos que no servem para sentar. (...) Seria totalmente impossvel ter uma palavra para designar cada tipo de cadeira ou, pior, cada cadeira individual, j que nunca h duas realmente idnticas em todos os detalhes. E, acima de tudo, seria intil, porque meus objetivos comunicativos no exigem essas distines todas. Em vez disso, criou-se uma categoria, atribuindo-se a ela um nome, cadeira. Dizemos ento que a noo de cadeira esquemtica, no sentido de que representa uma multido de conceitos particulares, que so elaboraes do conceito esquemtico bsico.
Entendeu a importncia da classificao? Sem ela no temos
como descrever e analisar as estruturas de uma lngua. Portanto, sai-
ba que todas as nomenclaturas que voc encontra na gramtica tra-
dicional correspondem, na verdade, a um sistema de categorizaes,
necessrio para voc tratar objetivamente da lngua.
Voc pode, ento, perguntar: como feita uma classificao?
Primeiro, saiba que ela feita para atender a um objetivo especfico.
Se voc muda o objetivo, muda tambm a classificao. Para enten-
der isso, considere os pares de sentenas abaixo:
(1) a. Maria fizera o trabalho de sintaxe.
b. Maria tinha feito o trabalho de sintaxe.
(2) a. Joo estudar para a prova de lingustica.
b. Joo vai estudar para a prova de lingustica.
Se o objetivo falar das formas destacadas a partir de uma
perspectiva semntica, podemos afirmar que os pares de sentenas
so sinnimos: em 1, a ideia de tempo passado, em 2, de tempo fu-
turo. Nesse caso, as duas formas de cada par de sentenas pertencem
mesma categoria: passado e futuro, respectivamente.
Por outro lado, se o objetivo descrever a composio das
duas formas (e a estamos falando de uma perspectiva morfolgica),
elas precisam ser separadas em outras categorias. Fizera e estu-
dar so formas simples (constitudas por uma s palavra) e tinha
feito e vai estudar, formas compostas (constitudas por duas pala-
vras).
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Classes e FunesSintaxe da Lngua Portuguesa
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Com o objetivo definido, parte-se para a classificao, que,
basicamente, feita a partir de critrios que determinam o potencial
funcional de uma palavra; ou seja, agrupam-se as palavras que tm
propriedades semelhantes. Por exemplo, agrupamos fizera e ti-
nha feito numa mesma categoria, porque ambas denotam o tempo
passado. De outro lado, agrupamos estudar e vai estudar, pois
denotam o tempo futuro. Todas as quatro formas so agrupadas, por
sua vez, na categoria verbos, pois partilham propriedades de mesma
natureza: so palavras que flexionam em tempo, modo, nmero e
pessoa.
Voc percebeu que a definio do objetivo crucial para a
classificao de uma palavra? Voc a classifica observando proprie-
dades em comuns, a partir de uma determinada perspectiva. Como
voc j sabe, no nvel da sintaxe, classificamos as palavras conforme
as relaes estabelecidas entre elas: sujeito e verbo mantm uma
relao estreita; verbo e seus complementos tambm. O tipo de re-
lao , portanto, um critrio adotado para se falar em sujeito e pre-
dicado, por exemplo.
2.1 A classificao tradicional: alguns problemas
Dentre os problemas que envolvem a classificao tradicional,
vamos destacar, aqui, trs, conforme Perini (2008, p. 83): o uso de
sistemas simples de classificao; a falta de critrio nas subclassi-
ficaes; e classes do tipo cesta de lixo (por exemplo, advrbios e
pronomes). Vamos entender cada um desses problemas!
Quanto ao uso de sistemas simples de classificao, a gra-
mtica tradicional, quando apresenta a sua proposta de descrio,
subestima a riqueza e a complexidade da lngua. Para entender o que
estamos falando, veja os exemplos abaixo:
(3) a. Maria foi at o porto da casa do vizinho.
b. Maria continua estudando at agora.
c. Joo prefere acreditar at na Maria do que na prpria
me.
A que categoria gramatical pertence o item at? Pelo conheci-
mento que voc j tem de gramtica descritiva, sabe que at clas-
sificado como preposio, que expressa a noo de limite espacial e
temporal, como ilustram, respectivamente 3a e 3b. Mas, e em 3c, que
noo est sendo expressa pelo at? Certamente, voc percebe que
Como voc est vendo, a definio do objetivo o primeiro passo para a classificao. Feito isso, as classes propostas precisam seguir critrios pertinentes, coerentes com a descrio a ser apresentada. isso que falta, normalmente, na descrio tradicional. A propsito, Perini (1996, p. 319) afirma: as clas-ses tradicionais no so estabelecidas segundo critrios de coerncia e relevncia gramatical.
Se voc no conseguir identificar a funo de at em 3c, recomendo que leia o artigo de Christia-na Loureno Leal, intitu-lado A gramaticalizao do item at, disponvel no seguinte endereo:< http://www.filologia.org.br/xicnlf/12/index.htm>Trata-se de uma abordagem bastante interessante, pois a autora mostra ou-tras funes de uma pa-lavra como at, que no so abordadas tradicio-nalmente.
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Classes e FunesSintaxe da Lngua Portuguesa
http://www.filologia.org.br/xicnlf/12/index.htmhttp://www.filologia.org.br/xicnlf/12/index.htm
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no nem a de espao nem a de tempo. E agora, como fica a nossa
classificao? Esse tipo de problema se verifica, tambm, nos dados
abaixo:
(4) a. Joo deu flores Maria.
b. Joo deu um azar que no conseguiu encontrar a
Maria.
(5) a. O gato bebeu o leite.
b. O gato j bebeu.
Como voc sabe, um verbo como dar , tradicionalmente,
descrito como bitransitivo (que seleciona um objeto direto e um indi-
reto), como ilustra 4a. E em relao a 4b, como ele classificado? Na
verdade, no h previso para esse tipo de ocorrncia, como tambm
no h para 5b, j que, pela gramtica tradicional, um verbo como
beber tipicamente transitivo direto (5a). Percebeu o problema
que est sendo ilustrado? A descrio tradicional tenta ser simples na
sua classificao; no entanto, as coisas se complicam porque ela se
baseia em critrios que no do conta de todas as ocorrncias.
No tocante falta de critrio nas subclassificaes, Perini
(2008, p. 85) exemplifica com a seguinte descrio:
Os substantivos so divididos em prprios e comuns e tambm em primitivos e derivados. A primeira diviso tem algum significado gramatical, porque os substantivos prprios ocorrem com artigos em condies diferentes dos comuns. Mas a segunda diviso no tem nenhuma importncia gramatical, porque substantivos primitivos e derivados funcionam exatamente da mesma forma na lngua (...).
Considerando que as palavras (no caso, os substantivos) tm
comportamentos gramaticais diferentes, percebe-se que as subclas-
sificaes devem tambm levar em conta as propriedades inerentes
a cada uma das situaes em que as palavras so empregadas. Pelas
palavras de Perini, a descrio tradicional no leva em considerao
essas diferenas.
O outro problema que esse autor chama a ateno envolve as
chamadas classes do tipo cesta de lixo (por exemplo, advrbios e
pronomes). Como voc deve se lembrar, a categoria tradicional dos
advrbios e dos pronomes encobre uma srie de classes, cada
uma com propriedades e comportamentos particulares:
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Classes e FunesSintaxe da Lngua Portuguesa
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PRONOMES: pessoais (retos), pessoais oblquos
(tonos e tnicos), de tratamento, possessivos, de-
monstrativos, relativos...
ADVRBIOS: de lugar, modo, tempo, negao, afir-
mao, dvida, intensidade, interrogativo...
Com essa descrio, a gramtica, de alguma for-
ma, reconhece a natureza heterognea e as potencialida-
des funcionais dessas categorias; no entanto, no d conta
das mesmas, e, por isso, coloca tudo num mesmo lugar, ou
melhor, como diz Perini, numa cesta de lixo.
Apesar desses problemas que destacamos aqui,
saiba que a classificao apresentada pelas gramticas
tradicionais muito importante, pois o que elas apresen-
tam , na verdade, uma descrio da lngua. E, qualquer
estudo gramatical/lingustico que voc venha fazer, voc
deve ter como parmetro esse modelo de descrio, mes-
mo que ele tenha vrios defeitos. Portanto, mesmo que a
classificao no seja perfeita, saiba que ela feita a partir
de determinados critrios. E so esses critrios que tornam
a classificao insuficiente.
Para confirmar a importncia das classes, vale destacar aqui as palavras de Perini (2006, p. 135): sem a definio das clas-ses (...) uma gramtica seria proibitivamente complexa e, ao mesmo tempo, deixaria de ex-pressar muitos traos importan-tes da lngua (...). Ou seja, a classificao um importante mecanismo que usamos para li-dar com as informaes que nos permitem falar de uma lngua. Portanto, embora a gramtica tradicional apresente problemas no tocante classificao, saiba que a partir dela que pensa-mos os fenmenos que carac-terizam, por exemplo, a sintaxe da lngua portuguesa. E mais: a prpria comunicao entre os lingistas depende de um vocabulrio que inclui os nomes tradicionais das classes: temos que falar de substantivos, ad-vrbios e pronomes para nos entender entre ns (PERINI, 2006, p. 135).
3 FUNES: UMA NOO RESULTANTE DE RELAES
Como voc j sabe, numa anlise sinttica tradicional, catego-
rizamos as palavras conforme as funes gramaticais que elas exer-
cem nas sentenas: sujeito, predicado, objeto direto, objeto indireto,
predicativo do sujeito etc. So funes determinadas pelas relaes
entre dois ou mais elementos presentes em uma estrutura senten-
cial. Saiba que essa a noo fundamental para se caracterizar uma
funo, seja ela de natureza formal (morfolgica e sinttica), seja ela
de natureza semntica. Para que voc entenda esses dois tipos de
funes, considere os exemplos abaixo:
(6) a. Joo matou a ona.
b. A ona matou Joo.
Como voc diferencia uma frase da outra? Certamente, obser-
vando que, em 6a, Joo ocorre antes do verbo e a ona, depois;
que, em 6b, justamente o contrrio. Portanto, a ordem das palavras
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Classes e FunesSintaxe da Lngua Portuguesa
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(Joo e ona) em relao ao verbo determinante
para a identificao das funes sintticas: numa, Joo
o sujeito; na outra, objeto. Tambm pode dizer que o
sujeito estabelece uma relao de concordncia com ma-
tou. A prova que, se voc substituir Joo por eles,
ter que alterar a forma do verbo (eles mataram a ona).
Observe que definimos o sujeito em termos pura-
mente formais, e no a partir de uma noo semntica,
tais como: ser que pratica ou sofre ao; elemento do
qual se declara alguma coisa.
claro que, em 6a, voc sabe que quem pratica a
ao de matar Joo, e em 6b, a ona. No entanto,
saiba que nem sempre o sujeito (que tem uma relao
formal com o verbo) pratica ao, como voc pode perce-
ber nos exemplos abaixo:
Quando um falante pronuncia uma frase, do tipo Maria gosta de doce, ele tem plena conscincia do potencial funcional das pala-vras. Ele sabe, por exemplo, que Maria o nome de uma pessoa, e sabe que essa palavra pode ocupar determinados lugares na sentena, ou seja, quais so as funes que Maria pode desempenhar no a funo que est desempenhan-do no momento, mas a funo ou funes que pode desempenhar (PERINI, 2006, p. 138). Veja, por exemplo, outras situaes em que Maria pode ocorrer: Joo gosta de Maria; o filho de Maria passou no vestibular; Maria, ela muito inteligente; Joo deu o livro para Maria... Muda-se o contexto es-trutural, muda-se a funo. Isso fato!
(7) a. Joo apanhou da Maria.
b. Joo muito gordo.
c. Joo mora em Ilhus.
Em 7a, Joo, embora seja o sujeito, no o agente da ao,
afinal, quem bate Maria. Em 7b, por sua vez, no h ao ne-
nhuma, e, no entanto, temos um sujeito presente: Joo. Em 7c,
tambm no podemos afirmar que Joo pratica ao. Percebeu que
nem sempre possvel correlacionar significado com funo sintti-
ca? Conforme Perini (2006, p. 107),
(...) necessrio separar sempre bem nitidamente
esses dois tipos de funo. Sujeito uma funo
formal, e tem a ver com a ordem das palavras e com
a concordncia; agente uma funo semntica, e
tem a ver com o papel que um ser desempenha den-
tro do evento descrito por uma sentena. Sujeito
uma das funes que podem ser desempenhadas
por um sintagma nominal; agente um papel de-
sempenhado por uma pessoa, um animal etc.
O que o autor sinaliza que, dependendo do objetivo, aspec-
tos de natureza formal devam ser separados de aspectos de natureza
semntica. Esse tipo de separao se justifica, por exemplo, quando
se tem em vista advrbios como sim e no. Veja as suas ocorrncias
a seguir:
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(8) a. O txi est livre? Sim.
b. O txi est livre? No. (PERINI, 1996, p. 313).
Como voc sabe, as duas palavras destacadas so classifica-
das como advrbios, pois exprimem noes relacionadas (...) ser-
vem para atribuir um valor de verdade frase interrogativa (PERINI,
1996, p. 313). Nesse caso, a perspectiva semntica e, por isso, elas
so classificadas numa mesma categoria.
Todavia, essa realidade muda quando se tem vista os seguin-
tes contrastes (cf. PERINI, 1996, p. 314):
(9) a. O txi no est livre.
b. * O txi sim est livre.
(10) a. Os no-convidados levaro crach especial.
b. * Os sim convidados levaro um crach espe-
cial.
Voc percebe que no e sim, nesses exemplos, tm compor-
tamentos diferenciados? A palavra no pode formar unidade com o
verbo (est) e com o substantivo (convidados). Por sua vez, a pala-
vra sim no partilha dessa mesma propriedade, o que justifica as
agramaticalidades de 9b e 10b. Mesmo que elas exprimam valores
de verdade (negao e afirmao), no desempenham as mesmas
funes, do ponto de vista sinttico.
Ficou clara a diferena entre funo sinttica e funo se-
mntica? importante compreender isso porque, de modo geral, a
gramtica tradicional mistura essas duas funes, comprometendo,
assim, a sua descrio. Na prxima aula, voc compreender melhor
sobre essa problemtica.
4 CLASSES E FUNES: DIFERENAS
Como voc viu acima, a funo de uma palavra definida pe-
las relaes estabelecidas entre dois ou mais elementos. O mesmo
no se aplica s classes. Enquanto uma funo definida em termos
de um contexto estrutural, a classe, por sua vez, definida a partir
da estrutura da lngua, independentemente de contextos especficos
(PERINI, 2006). Isso pode ser testado a partir de perguntas como:
A que classe pertence a palavra gato?
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Qual a funo sinttica da palavra gato?
Mesmo que o falante no saiba dizer que gato um substan-
tivo (cf. a prescrio tradicional), ele tem a noo de que essa palavra
do mesmo tipo que cachorro ou casa, por exemplo, e de um tipo
diferente de palavras como comprar, comprou, compraria. Ou
seja, qualquer falante sabe que um item lexical como gato pertence
a uma determinada classe gramatical e no a outra.
Por outro lado, responder segunda pergunta no to fcil
assim! Fora de um contexto voc no tem como identificar a funo
de gato, j que essa propriedade resultante da relao estabe-
lecida entre outros elementos. A palavra gato pode ter diferentes
funes sintticas e semnticas, como voc pode ver nos exemplos
abaixo:
(11) a. O gato correu atrs do rato.
b. O cachorro comeu o gato.
c. Joo um gato.
Como voc pode ver, em 11a, gato o sujeito (agente), em
11b, o objeto (paciente), em 11c, o predicativo do sujeito (qualida-
de). Mesmo desempenhando funes distintas, gato continua sendo
substantivo, pois a classe se define por potencialidades, no por
realidades presentes do contexto (PERINI 2008, p. 94). Segundo o
autor, a concluso a ser retirada desse raciocnio que cada unidade
pertence a uma (e s uma) classe (p. 94).
Incoerentemente, na descrio tradicional, encontramos afir-
maes de que determinadas palavras tm sua classe definida a par-
tir de um contexto. Segundo Perini, isso no deve ser feito. Para
entender o que estamos falando, veja os exemplos abaixo:
(12) a. Joo encontrou um amigo de infncia.
b. Joo um mdico amigo.
(13) a. O velho estava com a camisa rasgada.
b. Joo um homem velho.
Na perspectiva tradicional, a palavra amigo substantivo
em 12a e adjetivo em 12b; velho substantivo em 13a e adjetivo
em 13b. Claramente, voc percebe que elas desempenham funes
distintas, dadas as posies e relaes que contraem na sentena; no
entanto, continuam pertencendo classe dos substantivos. Na viso
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de Perini (2008),
(...) esse uso em diversas funes (nunca diversas
classes) no constitui inovao por parte do falante,
mas est codificado na lngua atual, e aprendido
como parte da estrutura lxico-gramatical da lngua.
Isso vale para todas as classes: cada palavra (ou
unidade em geral) pertence a uma delas, e uma pa-
lavra no pode ter mais de um potencial funcional.
Uma palavra pode, claro, ocupar mais de uma fun-
o, em diferentes contextos (p. 96-97).
Agora voc j sabe que classe e funo so noes que se
definem de formas diferenciadas: as classes se definem fora de con-
texto e as funes, dentro do contexto em que ocorrem. Estamos
falando, portanto, de relaes paradigmticas e sintagmticas, res-
pectivamente. Vamos relembrar isso!
4.1 Relao paradigmtica x relao sintagmtica:
relembrando Saussure
Voc se lembra que paradigma e sintagma constituem uma
das famosas dicotomias apresentadas por Saussure? Na perspectiva
do autor, a descrio de um estado de uma lngua pode ser feita a
partir das relaes que se estabelecem em dois eixos: o eixo paradig-
mtico (associativo) e o eixo sintagmtico (combinaes).
Do eixo paradigmtico (onde voc encontra o conjunto de uni-
dades suscetveis de aparecer num mesmo contexto), voc busca
uma palavra como gato, que pode alternar, por exemplo, com pala-
vras como amigo, mesa, cadeira, cachorro, homem, rosa... j
que todas tm propriedades em comum: so substantivos. Uma vez
selecionada a palavra gato e colocada na cadeia sintagmtica, ter
as funes estabelecidas, que so constitudas a partir do contraste
que se estabelece entre os elementos que a precedem e os que a
sucedem, como voc viu nos exemplos em 11, retomados aqui:
(11) a. O gato correu atrs do rato.
b. O cachorro comeu o gato.
c. Joo um gato.
Como voc v, em 11a, gato (formando unidade com o arti-
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go o) assume a funo de sujeito porque se posiciona antes do ver-
bo ( o gato que corre atrs do rato); em 11 b, o gato desempenha
a funo de objeto, dada a posio que ocupa: depois do verbo; e,
por fim, em 11c, juntamente com o artigo um exerce a funo de
predicativo.
Segundo Perini (2008), a oposio entre essas duas relaes
(paradigmticas e sintagmticas) se correlaciona, respectivamente,
com o produto da atividade lingstica (sintagmas, frases, enuncia-
dos) e com as regras e princpios que governam a construo desse
produto (p. 97). Em outras palavras, o falante de uma lngua tem
conscincia de como deve construir as sentenas: primeiro, recorren-
do aos paradigmas, onde esto disponveis as palavras conforme as
propriedades que lhes so inerentes; segundo, combinando-as den-
tro de um contexto. Dessa combinao, resultam-se, assim, as dife-
rentes funes das palavras.
Portanto, basicamente, vimos que existe diferena entre clas-
se e funo, no podendo, por esse motivo, serem confundidas, a
ponto de dizer que uma classe adquire uma outra funo em outro
contexto. Que fique claro! A palavra contexto determinante para a
noo de funo e no de classe!
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Classes e FunesSintaxe da Lngua Portuguesa
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ATIVIDADES1 Voc viu que a classificao das palavras feita a partir de critrios especficos. Identique, nas definies abaixo, os critrios (morfolgicos, sintticos ou semnticos) adotados pela descrio tradicional:
Substantivo a palavra com que designamos ou nomeamos os seres em geral.(CRITRIO: _________________________________).
Adjetivo a palavra que, junto de um substantivo (CRITRIO: ______________________________), indica uma qualidade, modo de ser, aspecto ou aparncia ou estado. (CRITRIO: _____________________________).
Advrbio uma palavra invarivel (CRITRIO: ______________________________) que , fundamentalmente, um modificador do verbo, do adjetivo e de um advrbio (CRITRIO: _________________________________), exprimindo uma circunstncia de tempo, modo, lugar etc.(CRITRIO: _________________________________).
Verbo uma palavra de forma varivel (CRITRIO: _________________________________), que pode indicar uma ao, um estado ou fenmeno. (CRITRIO: _________________________________).
Artigo a palavra que se antepe ao substantivo (CRITRIO: _________________________________), que indica o seu gnero e nmero (CRITRIO: _________________________________), individualizando-o ou gene-ralizando-o. (CRITRIO: _________________________________).
Pronome a palavra que desempenha as funes equivalentes s exercidas pelos nomes. (CRITRIO: _________________________________).
Numeral a palavra usada para indicar uma quantidade exata de pessoas ou coi-sa (CRITRIO: _________________________________), que pode fle-xionar em nmero. (CRITRIO: ______________________________).
Preposio uma palavra invarivel (CRITRIO: _________________________________) que relaciona dois termos de uma orao (CRITRIO: _________________________________), de tal modo que o sentido do primei-ro (antecedente) explicado ou completado pelo segundo (consequen-te). (CRITRIO:_________________________________).
ATIVIDADES
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Conjuno um vocbulo gramatical, invarivel, (CRITRIO: _________________________________), que serve para relacionar duas oraes ou termos semelhantes da mesma orao. (CRITRIO: _____________________________________).
Interjeio uma palavra invarivel (CRITRIO: _________________________________), usada para expressar emoo ou sentimento. (CRIT-RIO:_________________________________).
2 Considere os elementos destacados e, em seguida, identifique a que classe pertence e as funes que esto desempenhando:
a) Joo jogou na loteria e ganhou o premio.b) O e uma conjuno.Classe: __________________________________________________________________Funo sinttica em a: ______________________________________________________Funo sinttica em b: ______________________________________________________
c) Joo foi at a padaria.d) O at uma preposio.Classe: __________________________________________________________________Funo sinttica em c: ______________________________________________________Funo sinttica em d: ______________________________________________________
e) Maria vai cantar na festa.f) O cantar dos pssaros me emociona.Classe: __________________________________________________________________Funo sinttica em e: ______________________________________________________Funo sinttica em f: ______________________________________________________
g) Maria foi festa? Sim.h) O sim da Maria no foi forte.Classe: __________________________________________________________________Funo sinttica em g: ______________________________________________________Funo sinttica em h: ______________________________________________________
i) Maria comprou banana e ma.j) Maria comprou banana-ma.Classe: __________________________________________________________________Funo sinttica em i: ______________________________________________________Funo sinttica em j: ______________________________________________________
k) Joo, ele disse que se casar com Maria.l) Joo, Maria disse que viu ele.Classe: __________________________________________________________________
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Funo sinttica em k: _________________________________________________Funo sinttica em l:__________________________________________________
3 Complete as sentenas, considerando o seu conhecimento subjacente:
a) Joo tira leite. Joo _______________________________.b) Aquele rapaz dana. Aquele rapaz _______________________________.c) Pedro trata os dentes. Pedro _______________________________.d) Jos cuida do porto do prdio. Jos _____________________________.e) Maria cozinha para vrias pessoas. Maria _________________________.
3.1 Ao completar as sentenas, qu