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  • olhar estrangeiroLAURA SCHENKELQuais são os há-bitos brasileiros que os estrangei-ros gostariam de ver em seus paí-

    ses? Com base nessa pergunta, surgiu esta reportagem, numa proposta similar à dos “Dez exemplos que o Brasil deveria importar”, publicada em 28 de março. Os exemplos a seguir foram selecionados a partir de entrevistas com mais de 40 pessoas, que visitaram, mora-ram ou estão no Brasil, prin-cipalmente no Rio Grande do Sul. Vale lembrar, é claro, que nenhum dos hábitos é unani-midade entre os viajantes de diferentes países – assim, uma prática pode ser exemplo para uns e não para outros. Tudo de-pende das experiências de cada entrevistado. Algumas práticas citadas, inclusive, podem cau-sar um enorme estranhamento, uma vez que nós não as imagi-namos como exemplares – co-mo o depoimento de uma gre-ga, que gosta do trânsito daqui, por se buzinar muito menos do que em Atenas. Os aspectos mais lembrados estão ligados ao otimismo, riso fácil e afetivi-dade observados no país.

    – Os brasileiros, de modo geral, são alegres. Gosto do modo como encaram os pro-blemas, sempre de bom humor – afirma Elaine de La Sierna, 22 anos, administradora, nascida em Cochabamba, na Bolívia.

    – O brasileiro é afetuoso, cordial, gosta do riso, do con-tato humano, mas isso é difícil de exportar – afirma o músico uruguaio Saul Garber, 57 anos.

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    Dez exemplos que o Brasil poderia exportar

    DOMINGO, 9 DE MAIO DE 2010ZERO HORA 15Mundo

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    Em www.zerohora.com> Acesse a matéria “Dez exemplos que o Brasil deveria importar”> Confira em gráfico relatos completos de vários estrangeiros que participaram desta reportagem.

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    1 As festas no Brasil podem até começar mais tarde, mas com certeza duram mais. Em países da Europa e América do Norte, há leis

    contra vender bebidas alcoólicas de-pois de determinado horário. Há bares que abrem a partir das 2h, por exem-plo, mas esses são bem mais caros.

    –Eu adoro o horário das festas no Brasil, em que se volta para casa às 6h ou 7h da manhã. Na Grã-Bretanha, os

    pubs fecham às 23h ou 24h. Todos be-bem o máximo possível até esse horá-rio e ficam bêbados demais – comenta Harriet Francis, 32 anos, advogada.

    – Achamos ótimo não ter que se apressar para beber até as 22h45min, como nos pubs britânicos. A única ma-neira de continuar a noite é ir a uma boate, onde as bebidas são mais caras e muitas vezes se cobra pela entrada – observa Christine Gaylarde, aposen-tada, 65 anos.

    2 O abra-ço en-tre ami-gos ou

    até desconhecidos foi lembrado por muitos estrangeiros, dos mais diver-sos países.

    – É muito comum es-se hábito no Brasil. Tem o abraço entre homens e o abraço mais carinhoso, com as mulheres. Na França, é muito raro, talvez apenas entre a família. Gostei disso. Pode parecer insignifi-cante, mas muda bastante as relações entre as pessoas, seja entre familiares, amigos ou des-conhecidos. Quando voltei para a França, abracei meu pai, e ele estranhou – diz Boris Pravda-Starov, 25 anos, estudante, que

    morou em Porto Alegre. – O abraço é muito bom.

    Ele pode melhorar as relações entres as pessoas. Os chineses não costumam demonstrar emoções, especialmente no que se refere à linguagem cor-poral: ninguém se abraça nem aperta a mão. É uma grande diferença – comenta Liu Da, estudante chinês, chamado de Miguel no Brasil.

    4 O tão comentado jeitinho brasileiro não fica de fora dessa lista. Latino-ame-ricanos, europeus e um sul-africano ressaltaram o

    lado bom dessa característica. – Os brasileiros sempre acreditam

    que há um caminho para se fazer alguma coisa, e isso os leva adiante – aponta Werner Trieloff, 29 anos, contador sul-africano.

    – Quando meus pais me visitaram no Brasil, pude perceber melhor como os europeus realmente se estressam

    quando algo dá errado. Já os bra-sileiros ficam tranquilos – conta a estudante Ana González, 22 anos, da Espanha.

    O filósofo americano Allan Taylor, 26 anos, resume: – O jeitinho brasileiro explica o

    sucesso de quase todo brasileiro no Exterior. A improvisação é a gran-de arte do brasileiro. Na música, por exemplo, como no chorinho

    ou no samba, há muito espaço para improvisar. Acho que é por isso que o americano não sabe dançar samba nem jogar futebol.

    3Um dos pontos em que houve mais discórdia entre os entrevistados foi o aten-dimento ao cliente. Britâ-nicos e franceses, por exem-

    plo, não gostam de ser abordados por atendentes em lojas ou supermercados. Entretanto, o italiano Alessandro An-

    dreini, 40 anos, con-ta que uma das fra-ses que mais gostou de ouvir em toda a sua vida foi “Você encontrou tudo o que procurava?”, dita pelo caixa do supermer-cado. Franco

    Luis Scandolo, 26 anos, argen-tino que morou

    na Itália, tam-bém ressaltou esse exemplo.

    – O atendimento é um ponto forte do Brasil e se destaca pelo profissionalismo e cordialidade – opina ele.

    5 Outro costume do Brasil que poderia ser exportado é o hábito de compar-tilhar bebidas.

    – Compartilhar a cerveja, a caipirinha ou o chimarrão diz muito sobre a generosidade do brasileiro. No início, eu tive difi-culdade de me acostumar a is-so. O guatemalteco se serve no

    copo e gruda a mão nele até beber tudo – relata Martin de León McMannis, 22 anos.

    Na primeira vez em que veio ao Brasil, a francesa Mathilde le Tourneur du Breuil, 32 anos, passou por um constrangi-mento por não conhecer esse costume:

    – Eu estava com uma amiga francesa e nos deram um copo

    de caipirinha, numa festa. Nós pensávamos que era só para

    nós. Muito tempo depois percebemos que era para todos – lembra a professora de fran-cês, hoje moradora de Porto Alegre.

    – É um hábito bem legal, que funciona tanto com a cerveja, compra-da para todos, quan-to com o chimarrão

    – acrescenta ela.

    7 Os hábitos de higiene dos indígenas surpreenderam os europeus quando chegaram ao Brasil. Não se pode dizer que ainda se toma banho como os nativos do Brasil fa-ziam naquela época, mas essa característica é uma das 10 coisas da qual Graham Gertz-Romach, britânico casado

    com uma gaúcha, que viveu por 21 anos no Brasil, sente saudades:– Os brasileiros são muito limpos. Você não encontra tantos ame-

    ricanos ou pessoas do norte da Europa que tomem um banho por dia e escovem os dentes depois de cada refeição.

    A francesa Nathalie Touratier, 25 anos, também percebeu isso:– Eu fiquei surpresa ao ver todos os meus colegas de trabalho

    escovarem os dentes depois do almoço. É um hábito muito le-gal. Os franceses, quando estão no trabalho, geralmente mascam chicletes depois do almoço.

    8 Algo impressionante para estrangeiros das Américas e da África do Sul é a prática de exercícios físicos e o cuidado com a boa forma. Mas só é exemplo se não for excessivo, comenta Matthew Bender, 30 anos, tradutor, morador de Porto Alegre há cinco anos:

    – A qualquer hora da noite ou do dia, você vê pessoas cami-nhando, correndo, jogando bola ou andando de bicicleta. Os bra-

    sileiros são muito ativos nos esportes, seja em busca de saúde, seja em busca de beleza.

    A estudante Elia Arévalo, 24 anos, da Nicarágua, concorda:– Acho ótimo quando fecham ruas para as pessoas se exer-

    citarem nos finais de semana. Essa inquietude de se exercitar precisa ser exportada para vários países da América Latina. O boliviano Mauricio Uriona considera que “o culto ao corpo”

    algo bom, não importa se por motivos estéticos ou de saúde:– No meu país as pessoas não cuidam de seus corpos.6

    A alemã Katharina Ockert, 25 anos, estuda na Unisi-nos. Apaixonada pelo Brasil, “apesar da grande pobreza e criminalidade”, e fã de vá-

    rios costumes nacionais, ela avalia que os estrangeiros são bem tratados aqui e que os brasileiros esbanjam disposição na hora de ajudar:

    – Lembro uma vez em que eu estava no centro, procurando um banco para retirar di-nheiro e pedi informações para uma mulher na rua. Pensei que ela talvez poderia me explicar o caminho, mas ela pegou minha mão e me levou até dentro do banco! Fi-quei muito feliz de receber uma ajuda tão legal.

    A francesa Clémenti-ne Athanasiadis, 19 anos, ressalta a importância dessa característica:

    – Todos foram muito receptivos desde que eu cheguei à PUCRS. Isso é

    muito importante para os estrangei-ros, porque nos sentimos um pouco perdidos no começo. As pessoas sem-pre me dão informações. Com um sorriso no rosto.

    9 O engenheiro francês Manuel Gourmand, 24 anos, não teve dúvidas ao dizer qual é seu costume brasileiro preferido: o de dar (e re-ceber) carona. A prática pode ser planejada por telefone ou mesmo nos bares ou restau-

    rantes, quando se oferece uma carona inclusive para al-guém que acabou de se conhecer.

    – É uma coisa tão simples, e que, no entanto, não vi pe-la Europa. Lá cada um pega seu carro, e quem não tem carro, vai a pé. Mesmo se as pessoas vão para lugares muito próxi-mos – explica G o u r m a n d , que atualmen-te está em Pas-so Fundo.

    – Na Eu-ropa isso não ocorre lá nem entre colegas. Ninguém pensa nessa possibilidade.

    O almoço como principal refei-ção do dia é um exemplo para um britânico, um holandês e uma neozelandesa.

    – Meu país po-deria se beneficiar desse hábito. Os kiwis (neozelandeses) tendem a engolir um sanduí-che à mesa do trabalho, e ter uma refeição pesada à noite. Mas um jantar mais leve é muito mais saudá-vel – comenta Victoria Joy Winter, 28 anos, analista de marketing e moradora de Porto Alegre.

    Um sanduíche no almoço e um lauto jantar tam-bém é algo comum na Holanda.

    – Aqui é bom porque geralmente se come algo aquecido no almoço. Eu também gosto do bufê a quilo e rodízio – diz o estudante Marnix van Nierop.

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