JOSÉ RODRIGUES CAVALCANTI NETO
INVENTÁRIO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO EDIFICADO
NOVAS TECNOLOGIAS
RELATÓRIO DE VIAGEM A RIO DE CONTAS/BA
Relatório referente à disciplina ARQ-595 – Participação em Pesquisa, referente ao Mestrado do Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal da Bahia.
Professor: Arivaldo L. de Amorim
Salvador, janeiro de 2009.
INVENTÁRIO DO PATRIMÔNIO HISTÓRICO EDIFICADO
NOVAS TECNOLOGIAS
RELATÓRIO DE VIAGEM A RIO DE CONTAS/BA
SALVADOR 2009
Relatório referente à viagem a Rio de Contas/BA como parte da pesquisa
sobre o uso das ferramentas digitais no inventário do patrimônio cultural
edificado.
___________
Inventário pode ser definido de maneira genérica como “qualquer descrição
detalhada, minuciosa de algo”1. Um inventário do patrimônio cultural
edificado tem como objetivo inicial coletar os dados de um determinado
bem cultural, seja ele um pequeno edifício, seja uma cidade inteira.
Mas as aplicações do inventário vão muito além da simples coleta dos
dados. Suas funções extrapolam a importante tarefa de conhecer
minuciosamente o bem, possibilitando análises e balizando propostas,
podendo ainda ser instrumento fundamental para subsidiar as ações dos
órgãos gestores do patrimônio cultural brasileiro. É a partir do
conhecimento criterioso do nosso patrimônio que as políticas podem ampliar
sua atuação e atingir a imensa amplitude do nosso acervo cultural.
Assim concebido, o inventário poderá ser a base de uma nova
política de preservação, que, ao invés de tutelar apenas os bens
excepcionais normalmente produzidos pelas elites, buscará
administrar o patrimônio amplo e pluralista construído por todos os
brasileiros.2
Há muito tempo os inventários contribuem para o conhecimento e a
proteção do patrimônio cultural brasileiro. O IPHAN, Instituto do Patrimônio
Histórico e Artístico Nacional, sempre utilizou esse instrumento para
orientar suas ações. Outro exemplo é o Inventário de Proteção do
Inventário Cultural da Bahia, realizado na década de 1970 pelo governo
estadual, e que continua sendo uma obra de referência para muitos que
atuam na área – órgãos públicos, iniciativa privada, pesquisadores
acadêmicos, etc.
Inventários da magnitude do que foi executado na Bahia na década de 1970
demandam por grandes investimentos técnicos e financeiros e,
1 HOUAISS, Antonio. Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa. São Paulo: Objetiva, 2001.
2 AZEVEDO, Paulo Ormindo de. Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional. n. 22, 1987. p. 82.
provavelmente por isso, sua atualização e replicação acabam por não
acontecer.
No entanto, a possibilidade de utilizar os recursos computacionais
atualmente disponíveis e de fácil acesso traz a perspectiva de tornar a
realização dos inventários mais simples e rápida. Esses recursos têm
provocado uma revolução em vários meios científicos. Apesar de abrirem
grandes possibilidades, as ferramentas já disponíveis são muitas vezes
subutilizadas. Neste sentido, a relativa facilidade para a criação de novos
instrumentos exige uma reflexão sobre a melhor maneira de empregá-los.
Com o intuito de analisar e propor metodologias para dinamizar a realização
de inventários utilizando os recursos computacionais disponíveis, o LCAD –
Laboratório de Computação Gráfica Aplicada a Arquitetura e ao Desenho –
está realizando uma pesquisa na qual uma das atividades foi a de
inventariar um conjunto histórico.
Como estudo de caso, foi escolhida a cidade de Rio de Contas/BA, localizada
no sul da Chapada Diamantina e distante 650 Km de Salvador. Estagnada
economicamente por muitos anos, essa cidade que possui um valioso
conjunto urbano, tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico
Nacional (IPHAN) desde 1980 manteve preservada as suas características
arquitetônicas.
Vistas do conjunto urbano
Alguns edifícios destacam-se, como a Igreja Matriz do Santíssimo
Sacramento, a Casa de Câmara e Cadeia e a Igreja de Sant’anna (bens
tombados individualmente também pelo IPHAN desde a década de 1950).
Para estudar a aplicabilidade dos recursos computacionais no registro desse
patrimônio edificado, duas linhas de ação foram estabelecidas: cadastrar o
centro histórico utilizando os recursos convencionais (trena, nível, croquis,
etc) e os computacionais (fotos digitais e software photomodeler).
A viagem de campo foi realizada no período de 02 a 11 de agosto de 2008.
Foram definidas três equipes para trabalhar nos cadastros. A ênfase a ser
dada era na avaliação e reflexão sobre as propostas inicialmente pensadas
e na sua aplicabilidade.
No dia 03, domingo, foram feitas algumas análises da cidade e dos edifícios
a serem cadastrados, além do planejamento das atividades inicialmente
Vista externa da Igreja Matriz do Santíssimo Sacramento
propostas. Para ajudar as equipes foi contratada mão-de-obra da cidade.
Tal iniciativa se deu por:
• aumentar o número de pessoas trabalhando e, conseqüentemente, a
produtividade;
• envolver pessoas da cidade proporcionando uma maior legitimidade
das ações;
• contribuir na conscientização sobre a importância do patrimônio
cultural;
• apreender a visão e a relação que a população possui com o
patrimônio edificado.
A equipe que ficou sob minha responsabilidade era composta por mim,
Delson Lima Filho e o ajudante Ailton, morador de Rio de Contas. Nosso
principal objetivo era cadastrar, por meio do sistema convencional, um dos
três grandes monumentos da cidade. As medidas deveriam possibilitar a
montagem do levantamento nos métodos tradicionais, isto é, desenhar no
AutoCAD as plantas, cortes e elevações do edifício. Por outro lado, algumas
informações gerais obtidas em campo também seriam utilizadas para a
montagem de um modelo, utilizando-se do Photomodeler, atividade a ser
realizada posteriormente, em Salvador.
A primeira atividade, o
levantamento cadastral
da Igreja de Sant’anna,
ocorreu no dia 04,
segunda-feira. Antes de
iniciar o levantamento de
campo foi necessário
analisar o objetivo do
trabalho, e assim definir o
nível de detalhamento
desejado. Para um
projeto de restauro, por
Vista externa da Igreja de Sant’anna
exemplo, é necessário medir minuciosamente cada detalhe do edifício.
Contudo, para o exercício em questão, o nível de detalhamento necessário
não era tão grande.
O levantamento foi iniciado realizando-
se um desenho esquemático da planta
do edifício. Em seguida, foram tiradas as
medidas. O método de medição utilizado
foi o de cotas acumuladas, para diminuir
a possibilidade de erros. Uma primeira
dificuldade foi o fato de o edifício não
apresentar cantos definidos, pois as
paredes são de alvenaria de pedra
aparente. Com isto tomou-se o cuidado
de achar um ponto que representasse,
ainda que intuitivamente, a junção dos
planos verticais. Outro fator
fundamental para facilitar a posterior
montagem dos desenhos, é o cuidado de desenhar tudo da maneira mais
clara e objetiva possível. Vale salientar que uma fundamental
recomendação no trabalho de campo é o de não confiar na memória. É
preciso anotar tudo, e referenciar todas as informações. Para induzir esse
pensamento, é sempre bom imaginar que outra pessoa vai montar o
desenho, alguém que não está fazendo o levantamento de campo. Desta
maneira o desenho deverá ser claro o suficiente para permitir a sua correta
interpretação, sem necessitar consultar o autor.
Os instrumentos utilizados nessa etapa foram:
Para desenho: Prancheta e papel A4, lapiseira, borracha.
Para medidas: Trena de fibra de vidro de 30m, trena metálica de 8m, nível
de bolha, mangueira de nível, varões de bambu (encontrados no local e que
permitiram medir as alturas), escada (encontrada no local).
Nesta etapa também foram fotografados tanto os aspectos gerais do
edifício, como vários dos seus detalhes. As fotografias foram tiradas por
Delson Lima Filho.
Vista interna da Igreja de Sant’anna
Nesse mesmo dia foi iniciada a montagem do levantamento em AutoCAD.
Essa montagem priorizou o desenho da geometria geral do edifício, sem se
preocupar com detalhamentos. Essa ação é de fundamental importância,
pois caso haja necessidade, medidas podem ser complementadas ou
revistas. Fechado o desenho da geometria do edifício ainda em campo, a
complementação dos desenhos pode ser feita à distância.
Concluída a geometria, percebeu-se que para a montagem das plantas não
faltaram medidas. Na montagem dos cortes faltou uma delas e nas
elevações, faltaram as medidas que permitissem o desenho do perfil do
terreno. Com isso percebeu-se que, para os objetivos propostos para esta
tarefa, o trabalho de campo tinha sido bem sucedido, já que no dia 05 pela
manhã foram complementadas as medidas necessárias.
No dia 05, à tarde, foi iniciada a segunda tarefa, que consistia em obter
dados que permitissem a montagem do conjunto urbano utilizando-se do
Photomodeler. Essa tarefa tinha sido iniciada pela equipe chefiada por Luis
Guilherme e, considerando as dificuldades já encontradas por ele, foi revista
a metodologia a ser adotada. À noite essa questão foi discutida com o
restante da delegação. Sendo assim, foi estabelecido que seriam
desenhados os perfis das quadras, isto é, um desenho esquemático do
conjunto das fachadas. Neste desenho seriam anotadas duas medidas, uma
largura e uma altura, que permitissem a retificação das fotos, obtendo-se
assim as ortofotos. Estabelecida a metodologia foram feitos os desenhos
dos perfis das quadras e, em seguida, tiradas as medidas.
Essa tarefa se desenvolveu por
quase todo o período restante, com
exceção dos 06, período da tarde e
07, período da manha, nos quais foi
feito o levantamento do Teatro São
Carlos. A metodologia para esse
levantamento foi a mesma adotada
para a Igreja de Sant’anna. A
montagem preliminar no AutoCad
também foi executada ainda em Rio
de Contas.
Vista frontal do Teatro São Carlos
Conclusão
A constante revisão sobre as metodologias que estavam sendo utilizadas
para realização das tarefas, adequando-as ao tempo e aos recursos físicos
disponíveis, foi fundamental para que os objetivos traçados no início das
atividades fossem alcançados. A contribuição dos diversos profissionais
envolvidos foi também muito importante para que o trabalho de campo
tenha sido eficaz.
Ademais, ressaltamos a importância dessa pesquisa que, ao confrontar duas
metodologias que podem ser utilizadas no inventário do patrimônio cultural
edificado, pode tornar possível traçar as aplicabilidades específicas da cada
uma delas, e permitir uma melhor utilização dos recursos computacionais
disponíveis.
Em anexo segue o relatório do Delson Lima Filho e o que chamamos de
“memória de levantamento”, que são os desenhos produzidos no trabalho
de campo e utilizados para a montagem dos desenhos em AutoCAD.