Processo Administrativo Regulatório
Sessão IV
PROGRAMA DE EDUCAÇÃO CONTINUADA FGV DIREITO RIO
LL.M Litigation – Novos Desafios dos Contenciosos
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Todos os direitos reservados à Fundação Getulio Vargas.
A presente apostila tem por intuito orientar o
estudo individual acerca do tema de que trata,
antecipando-se à aula que lhe é correspondente,
com a estrita finalidade de oferecer diretrizes
doutrinárias e indicações bibliográficas
relacionadas aos temas em análise. Nesse sentido,
este trabalho não corresponde necessariamente à
abordagem conferida pelo professor em sala de
aula, tampouco tenciona esgotar a temática sobre
a qual versa, prestando-se exclusivamente à
função de base para estudo preliminar e
referência de consulta.
Organizadores
Pesquisadores: RÉMY, Alain Souto.
Professores: FIGUEIREDO, Leonardo Vizeu.
Processo Administrativo Regulatório
Atualizada em: janeiro de 2013.
Verificação de plágio pelo sistema EPHORUS �
Bibliografia, Editora FGV, Rio de Janeiro.
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SUMÁRIO Sessão IV – Processos de Regulação no Setor Valores Mobiliários .................. 4
ROTEIRO DE ESTUDO....................................................................................... 7
1 A Comissão de Valores Mobiliários – Introdução ........................................... 7
2 Atribuições e universo regulado ........................................................................ 7
2.1 Valores mobiliários .......................................................................................... 8
2.2 Disclosure e mercados primário e secundário ............................................. 10
3 Instrumentos de arrecadação e fiscalização ................................................... 14
4 Processo administrativo investigativo e sancionador .................................... 19
4.1 Prescrição ....................................................................................................... 21
4.2 Atenuantes ...................................................................................................... 22
5 Termo de compromisso .................................................................................... 22
6 Fundo de Garantia ............................................................................................ 25
QUESTÕES DE AUTOMONITORAMENTO ................................................. 26
REFERÊNCIAS ................................................................................................... 27
Bibliográficas ........................................................................................................ 27
1 Utilizadas ........................................................................................................... 27
2 Complementares ............................................................................................... 27
Eletrônicas ............................................................................................................ 29
Jurisprudenciais ................................................................................................... 30
Legislativas ........................................................................................................... 30
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Sessão IV – Processos de Regulação no Setor Valores Mobiliários
CASO GERADOR
Em virtude do Processo Administrativo nº SP-200X-XXX, a Gerência de
Acompanhamento de Mercado 2 – GMA-2, junto à Comissão de Valores
Mobiliários (CVM), apurou indícios de materialidade de intermediação irregular
de valores mobiliários e vestígios suficientes de autoria por parte de um grupo de
pessoas físicas, clientes de PAX ROMANA CORRETORA DE VALORES E
CÂMBIO LTDA., dentre os quais apontou como supostos autores CAIO TÁCITO
e TITO LÍVIO.
Diante de tais constatações, a CVM emitiu, ad cautelam, stop orders
determinando a imediata suspensão de todas as operações, objeto do Processo
Administrativo nº SP-200X-XXX, sob pena de multa cominatória diária de R$
5.000,00, com fundamento legal no art. 9º, II, combinado com o art. 11, § 11,
ambos da Lei nº 6.385/1976.
Procedida a uma inspeção na PAX ROMANA CORRETORA DE
VALORES E CÂMBIO LTDA., apurou-se que CAIO TÁCITO e TITO LÍVIO
haviam descumprido suas respectivas stop orders, uma vez que os mesmos
transferiram ações de sua titularidade posteriormente à ciência da decisão da
CVM, operando no mercado por um período de 60 dias, fato este que culminou
em aplicação de multa cominatória por parte da Superintendência de Relações
com o Mercado e Intermediários – SMI, totalizando R$ 300.000,00.
As referidas multas cominatórias foram devidamente encaminhadas à
Subprocuradoria Jurídica de Dívida Ativa – GJU-3, sendo inscritas, ajuizadas,
autuadas e distribuídas respectivamente à Justiça Federal.
Em face das circunstâncias materiais acima apontadas, instaurou-se o
processo administrativo nº SP-200Y-YYY – Termo de Acusação. Em decorrência
da instrução probatória efetuada no referido processo sancionador, foi apurado por
parte do órgão inquisidor que não se encontravam presentes os requisitos básicos
para a configuração da atividade de intermediação irregular de valores
mobiliários, a saber, habitualidade e profissionalismo, por parte de CAIO
TÁCITO e TITO LÍVIO.
Assim, a Gerência de Análise de Negócios – GMN concluiu que não havia
indícios suficientes de materialidade, tampouco vestígios de autoria que
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caracterizassem intermediação irregular de valores mobiliários por parte de CAIO
TÁCITO e TITO LÍVIO que justificasse a inclusão dos mesmos no polo passivo
do processo administrativo nº SP-200Y-YYY – Termo de Acusação.
Ao serem surpreendidos pelos respectivos processos de execução fiscal,
CAIO TÁCITO e TITO LÍVIO, na ordem de R$ 300.000,00, respectivamente,
procuram seus préstimos de advogado, a fim de orientá-los em como proceder à
melhor defesa administrativa e/ou judicial, no sentido de elidir a cobrança das
multas cominatórias.
Casos adicionais sugeridos
Além do caso gerador acima, recomenda-se a leitura da seguinte notícia
referente ao caso de insider trading por ocasião da pulverização de ações da
Embraer, que levou o Credit Suisse a pagar 19,2 milhões de reais à CVM,
disponível em:
1
<http://www.agu.gov.br/sistemas/site/TemplateTexto.aspx?idConteudo=11405>.
Subsidiariamente, sugere-se a leitura das seguintes notícias:
2) <http://www.jusbrasil.com.br/noticias/35469/claudio-lembo-e-punido-pela-
cvm-por-divulgar-fato-sigiloso-da-nossa-caixa>. Acesso em: 29 jul. 2011.
3) <http://www.prsp.mpf.gov.br/sala-de-imprensa/noticias_prsp/noticia-10987/>.
Acesso em: 29 jul. 2011.
4)
<http://www.valoronline.com.br/?online/investimentos/12/5436852/excontrolador
-da-tenda-fecha-acordo-com-cvm-para-encerrar-processo>. Acesso em: 29 jul.
2011.
5) <http://www2.pgr.mpf.gov.br/noticias/noticias-do-site/consumidor-e-ordem-
economica/mpf-go-quer-a-dissolucao-de-empresa-que-funciona-sem-autorizacao-
da-cvm>
Por fim, sugere-se a leitura da sentença proferida nos autos do processo n.º
0017585-47.2010.4.02.5101 (na numeração antiga: 2010.51.01.017585-7) pelo
juízo da 16ª Vara Federal do Rio de Janeiro, mandado de segurança impetrado
contra coação – considerada ilegal pela sentença – perpetrada por agentes da
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CVM no Processo Administrativo Sancionador nº 06/2007:
<http://www.jfrj.jus.br> (“Consulta processual”). Acesso em: 21 jul. 2011.
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ROTEIRO DE ESTUDO
1 A Comissão de Valores Mobiliários – Introdução
A Comissão de Valores Mobiliários é uma autarquia federal de regime
especial, vinculada ao Ministério da Fazenda, cuja finalidade é promover a
regulamentação, o desenvolvimento, o controle e a fiscalização do mercado de
valores mobiliários do país, regulando-o de forma técnica, independente e
apolítica. Utiliza-se de experiência reguladora importada do direito comparado
norte-americano e seu funcionamento é inspirado na Securities and Exchange
Commission (SEC), órgão congênere dos Estados Unidos.1
Na qualidade de ente público regulador de setor de relevante interesse
econômico do Estado brasileiro, a Comissão de Valores Mobiliários possui as
seguintes características que lhes são outorgadas por lei: autoridade administrativa
independente, ausência de subordinação hierárquica, mandato fixo e estável de
seus dirigentes, e autonomia financeira e orçamentária (Lei nº 6.385/1976, art. 5º).
Conquanto haja significativas opiniões no sentido de não ser a CVM uma
agência reguladora propriamente dita – uma vez que seus atos são passíveis de
revisão pelo Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional (CRSFN), no
tocante à legislação societária, e pelo Ministro da Fazenda, no tocante à Lei nº
9.613/1998 (Lei de Lavagem de Dinheiro) – mesmo a eventual procedência dessa
assertiva não interfere no objetivo destes apontamentos.
Por isso e pela desnecessidade de reiteração das noções gerais de direito
administrativo e constitucional referentes ao fenômeno regulatório e seus agentes,
remete-se às anteriores sessões do curso sobre o assunto.
2 Atribuições e universo regulado
Se todas as unidades econômicas (indivíduos, famílias, organizações e
governos) poupassem e investissem no mesmo montante, não haveria utilidade no
financiamento nem razão para ativos financeiros. Todos seriam autossuficientes.
A criação de ativos financeiros decorre da necessidade de investimento em
valores superiores à própria capacidade de poupar, por parte de uns, e da
abundância de recursos disponíveis para esse investimento, por parte de outros.
1 Para maiores detalhes, confira-se: DUBEUX, Júlio Ramalho. A Comissão de Valores Mobiliários e os principais instrumentos regulatórios do mercado de capitais brasileiro. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2006. Disponível em: <http://www.puc-rio.br/>. Acesso em: 29 jul. 2011.
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Nesse contexto, é preciso garantir que as relações de troca realizadas no
mercado financeiro sejam efetuadas de forma clara e transparente – “divulgação
plena e exata das principais informações aos investidores”2 ou “disclosure” –,
garantindo-se uma alocação eficiente de recursos para as diversas atividades
econômicas, tais como a bancária e a industrial, aliada ao retorno e pagamento do
capital aplicado pelos respectivos investidores.
Para tanto, a CVM exerce as funções de: assegurar o funcionamento
eficiente e regular dos mercados de bolsa e de balcão; proteger os titulares de
valores mobiliários; evitar ou coibir modalidades de fraude ou manipulação no
mercado; assegurar o acesso do público à informações sobre valores mobiliários
negociados e sobre as companhias que os tenham emitido; assegurar a
observância de práticas comerciais equitativas no mercado de valores mobiliários;
estimular a formação de poupança e sua aplicação em valores mobiliários;
promover a expansão e o funcionamento eficiente e regular do mercado de ações e
estimular as aplicações permanentes em ações do capital social das companhias
abertas.
O art. 1º da Lei nº 6.385/1976 dispõe quais serão as atividades reguladas:
Art. 1º Serão disciplinadas e fiscalizadas de acordo com esta Lei as seguintes atividades: I - a emissão e distribuição de valores mobiliários no mercado; II - a negociação e intermediação no mercado de valores mobiliários; III - a negociação e intermediação no mercado de derivativos; IV - a organização, o funcionamento e as operações das Bolsas de Valores; V - a organização, o funcionamento e as operações das Bolsas de Mercadorias e Futuros; VI - a administração de carteiras e a custódia de valores mobiliários; VII - a auditoria das companhias abertas; VIII - os serviços de consultor e analista de valores mobiliários.
2.1 Valores mobiliários
Para a delimitação do universo regulado, é crucial a conceituação de
valores mobiliários, cuja definição evoluiu de maneira a abranger um espectro
maior de títulos negociáveis a cada vez.
[N]osso sistema jurídico, no passado, preferiu adotar uma conceituação estrita e
até restrita de valores mobiliários, ao contrário de outros regimes presentes no
direito comparado, que se notabilizam por conferir-lhes alcance e significado
2 WALD, Arnoldo. A CVM e a Evolução do Mercado de Capitais no Brasil. In: Revista Forense. Rio de Janeiro, v. 363, pp. 3-16, set./out. 2002.
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abrangente. É o caso da legislação federal sobre valores mobiliários (securities)
nos Estados Unidos e a tendência dominante na atual legislação brasileira.
Com efeito, o art. 2º da Lei nº 6.385/1976 dispunha, originalmente, de
forma casuísta:
Art. 2º São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei: I - as ações, partes beneficiárias e debêntures, os cupões desses títulos e os bônus de subscrição; II - os certificados de depósito de valores mobiliários; III - outros títulos criados ou emitidos pelas sociedades anônimas, a critério do Conselho Monetário Nacional. Parágrafo único - Excluem-se no regime desta Lei: I - os títulos da dívida pública federal, estadual ou municipal; II - os títulos cambiais de responsabilidade de instituição financeira, exceto as debêntures.
Posteriormente, a Medida Provisória nº 1.637/1998 adotou a “Howey
definition”, originária da jurisprudência dos Estados Unidos iniciada pelo
julgamento do caso “SEC vs. W. J. Howey & Co.” pela Suprema Corte (328 US
293, 298-299, 1946), quase em tradução literal:
Art. 1º Constituem valores mobiliários, sujeitos ao regime da Lei n.º 6.385, de 7 de dezembro de 1976, quando ofertados publicamente, os títulos ou contratos de investimento coletivo, que gerem direito de participação, de parceria ou de remuneração, inclusive resultante da prestação de serviços, cujos rendimentos advêm do esforço do empreendedor ou de terceiros3
Atualmente, o art. 2º da Lei nº 6.385/1976, já com a redação dada pela Lei
nº 10.303/2001, assim dispõe:
Art. 2º São valores mobiliários sujeitos ao regime desta Lei: I - as ações, debêntures e bônus de subscrição; II - os cupons, direitos, recibos de subscrição e certificados de desdobramento relativos aos valores mobiliários referidos no inciso II; III - os certificados de depósito de valores mobiliários; IV - as cédulas de debêntures; V - as cotas de fundos de investimento em valores mobiliários ou de clubes de investimento em quaisquer ativos; VI - as notas comerciais; VII - os contratos futuros, de opções e outros derivativos, cujos ativos subjacentes sejam valores mobiliários; VIII - outros contratos derivativos, independentemente dos ativos subjacentes; e IX - quando ofertados publicamente, quaisquer outros títulos ou contratos de investimento coletivo, que gerem direito de participação, de parceria ou de remuneração, inclusive resultante de prestação de
3 A definição original sedimentada é a de que uma security (valor mobiliário) é “a contract, transaction or scheme whereby a person invests his money in a common enterprise and is led to expect profits solely from the efforts of the promoter or a third party”.
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serviços, cujos rendimentos advêm do esforço do empreendedor ou de terceiros. § 1º Excluem-se do regime desta Lei: I - os títulos da dívida pública federal, estadual ou municipal; II - os títulos cambiais de responsabilidade de instituição financeira, exceto as debêntures. (Grifo nosso)
A presença de valores mobiliários em determinado mercado ou operação é
o primeiro dos elementos necessários à fixação da área de atuação da Comissão de
Valores Mobiliários. Contudo, não basta. Para justificar o exercício do poder de
polícia pela CVM, é necessária, ainda, a negociação pública de tais valores
mobiliários, pois somente quando se atinge a poupança popular é que se justifica a
atuação do Estado, zelando pelos interesses do investidor.
Aliás, os títulos acima listados têm algumas características em comum.
Primeiro, eles representam, regra geral, um investimento de risco, visando ao
lucro e tendo por objeto um empreendimento em comum. Subjacente ao
investimento, existe uma relação jurídica direta entre o investidor (o agente
econômico superavitário, o poupador) e o gestor de recursos (o tomador de
recursos, o agente econômico deficitário), assumindo este uma posição jurídica de
fidúcia para com aquele. Essa seria uma segunda característica comum entre esses
títulos. Uma terceira característica é de serem os valores mobiliários títulos de
massa, isto é, títulos padronizados, cujos direitos e deveres são os mesmos,
independente de quem seja seu possuidor, emitidos em quantidade, passíveis de
circulação.4
2.2 Disclosure e mercados primário e secundário
É por meio de uma política de divulgação de informações (disclosure) que
determina que as companhias abertas divulguem determinadas informações
periódicas e eventuais, que se obtém a eficiência na formação do preço dos
valores mobiliários.
Tais informações devem ser verdadeiras, completas e precisas, e devem ser
divulgadas a todo o mercado de forma simultânea, permitindo que a cotação dos
valores mobiliários reflita precisamente o teor das informações disponibilizadas
ao mercado, e que todos negociem em igualdade de condições.
4 CAMARGO, João Laudo de. Comissão de Valores Mobiliários – Organização – Competência – Atuação. In: Simpósio sobre Direito dos Valores Mobiliários. Brasília: CJF, 1998. Série Cadernos do CEJ; v. 15. Disponível em: <http://www.cjf.jus.br/revista/seriecadernos/VOL15-5.htm.>. Acesso em: 9 mar. 2010.
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O Mercado Primário compreende o lançamento de novas ações no
mercado, com aporte de recursos à companhia. Uma vez ocorrendo o lançamento
inicial ao mercado, as ações passam a ser negociadas no Mercado Secundário, que
compreende mercados de balcão, organizados ou não, e bolsas de valores.
Operações como a colocação inicial, junto ao público, de grande lote de
ações detido por um acionista podem caracterizar operações de abertura de
capital, exigindo registro na CVM. Contudo, apesar da semelhança com o
mercado primário, os recursos captados vão para o acionista vendedor, não para a
companhia, o que caracteriza uma distribuição no Mercado Secundário.
O registro de companhia aberta e o registro de oferta pública de
distribuição de valores mobiliários são juntos, os principais instrumentos de
concretização da política de divulgação de informações (disclosure), que consiste
na ampla disponibilização pelas companhias das informações necessárias à
avaliação de cada oportunidade de investimento. A propósito, Júlio Ramalho
Dubeux esclarece:
Inspirado no modelo dos Estados Unidos, o modelo regulatório brasileiro não atribuiu à CVM o poder para, a partir do mérito do investimento, aprovar ou desaprovar o Registro de companhia aberta ou o Registro de oferta pública de distribuição de títulos. Nelson Eizirik nos ensina que o modelo regulatório adotado considera não caber ao Estado se substituir aos investidores na análise da qualidade das empresas e dos seus títulos, não havendo razão para se cogitar que o aparato estatal pudesse analisar melhor o mérito dos investimentos do que os efetivos participantes do mercado. Além disso, a análise do mérito da companhia ou dos seus valores mobiliários pela entidade reguladora abriria ensejo à responsabilização civil do Estado por prejuízos decorrentes de investimentos mal sucedidos, o que sem dúvida não é pretensão da regulação. […] Nesse sentido, Louis Loss frisa: “The Commission has no authority to approve any security or to pass on its merits. Its sole function is to assure that the registration statement is accurate and complete.”5
Contudo, ressalva:
Apenas excepcionalmente o registro pode ser indeferido pela CVM a partir da análise do mérito do investimento. Tão-somente na hipótese de constituição de nova companhia mediante subscrição pública, circunstância expressamente prevista pela Lei 6.404/76. Nesse particular, o pedido será denegado caso a entidade reguladora
5 DUBEUX, Júlio Ramalho. A Comissão de Valores Mobiliários e os principais instrumentos regulatórios do mercado de capitais brasileiro. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2006, pp. 43-44. Disponível em: <http://www.puc-rio.br/>.
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reconheça a inviabilidade ou temeridade do empreendimento, ou ainda caso reconheça a inidoneidade dos seus fundadores.6
As Leis nº 6.385/1976 (art. 21, § 1º) e nº 6.404/1976 (art. 4º, § 1º)
estabelecem que apenas as companhias registradas na CVM podem ter seus
valores negociados no mercado de valores mobiliários. O registro de companhia
aberta hoje é minuciosamente disciplinado pela Instrução CVM nº 480/2009. Em
suma, o registro é o que diferencia as companhias abertas das companhias
fechadas.
Embora a alta ou baixa no valor das ações de uma companhia não a afete
diretamente, por serem esses valores de propriedade dos investidores, há um
efeito indireto, consistente na facilidade e no custo com que essas empresas têm
para colocar no mercado novas ações ou outros títulos novos.
O cenário em que tudo isso se desenvolve é o das bolsas de valores e dos
mercados de balcão. As bolsas são associações de corretoras em cujo seio se
operam as transações, bem como nas quais se desenvolvem mecanismos de
autorregulação, sempre compatíveis ou mesmo fiscalizados pela própria CVM.7
Quanto ao mercado de balcão:8
O mercado de balcão é formado pelos intermediários financeiros com atuação fora das bolsas de valores. Considera-se negociação de valores mobiliários no mercado de balcão a transação feita com a intermediação de bancos de investimentos, bancos múltiplos com carteira de investimento, sociedades corretoras, sociedades distribuidoras e agentes autônomos credenciados por essas instituições. O mercado de balcão funciona fundamentalmente como mercado primário, pois é nele que é feita a negociação dos novos valores mobiliários emitidos publicamente pelas companhias. Mas pode acontecer também de no balcão dessas instituições serem negociados valores mobiliários que já estão no domínio dos investidores. Desse modo, o mercado de balcão pode servir tanto como mercado primário, quanto como secundário. Vale ressaltar, ainda, que valores mobiliários não admitidos à bolsa são negociados unicamente no mercado de balcão.9
O regime de disclosure é permanente. Assim, não obstante concedido o
registro de companhia aberta, não cessa o dever de transparência. As informações
6 DUBEUX, Júlio Ramalho. A Comissão de Valores Mobiliários e os principais instrumentos regulatórios do mercado de capitais brasileiro. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2006, p. 58-59. Disponível em: <http://www.puc-rio.br/>. Acesso em: 29 jul. 2011. 7 Instrução CVM n.º 461/2007. 8 Instrução CVM n.º 243/1996. 9 DUBEUX, Júlio Ramalho. A Comissão de Valores Mobiliários e os principais instrumentos regulatórios do mercado de capitais brasileiro. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2006, p. 47 Disponível em: <http://www.puc-rio.br/>. Acesso em: 29 jul. 2011.
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a serem prestadas, por sua vez, são consideradas periódicas – e.g., as
demonstrações financeiras, editais de convocação e atas de assembleia geral
ordinária e estatuto social atualizado – ou eventuais – e.g., os editais de
convocação e atas de assembleia geral extraordinária ou especial, convenção de
constituição de grupo de sociedades de que participe balanços intermediários,
informações sobre recuperação judicial ou falência, e os fatos ou atos relevantes.10
Apesar da importância da prestação de informações para o mercado de
capitais, deve-se atentar que, além do alto custo para produção destas
informações, a divulgação de negociações estrategicamente sigilosas pode
culminar na perda de oportunidades de negócios.
A Instrução CVM nº 358/2002, que regulamenta a divulgação de fatos
relevantes, é sensível a essa situação, excepcionando a obrigatoriedade da
divulgação de informações quando a sua divulgação colocar “interesse legítimo da
companhia em risco”, desde que não haja vazamento da informação, ocasião em
que se verifica oscilação atípica na cotação dos valores mobiliários da companhia,
e a informação deve ser imediatamente divulgada.11
O registro de oferta pública de distribuição de valores mobiliários, previsto
no art. 19, caput, da Lei nº 6.385/1976 e no art. 4º, § 2º, da Lei nº 6.404/1976,
hoje é disciplinado pela Instrução CVM nº 400/2003, havendo obrigatoriedade de
registro de toda e qualquer emissão pública, e tão somente se for pública.12
As ofertas privadas não sofrem o mesmo controle, já que a poupança
coletiva – bem jurídico protegido pela regulação em questão – não está envolvida,
senão a poupança dos específicos destinatários da oferta. A oferta se caracteriza
como pública pela indeterminação dos seus destinatários.
O pedido deve ser feito conjuntamente pelo ofertante emissor dos títulos e
pela instituição financeira líder da distribuição (underwriter), que compartem,
10 Lei nº 6.404/1976, art. 157, § 4º e Instrução CVM n.º 358/2002. Conferir entendimento manifestado no julgamento do Processo Administrativo Sancionador n.º 2006/4776 em 17/01/2007, §§ 43 a 64. Disponível em: <http://www.cvm.gov.br/port/inqueritos/2007/rordinario/inqueritos/01_17_RJ2006-4776.asp>. Acesso em: 9 mar. 2010. 11 Instrução CVM nº 358/2002, art. 6º. 12 Como assinala Dubeux, “A legislação brasileira se utiliza das expressões oferta pública, distribuição pública, colocação pública ou emissão pública com o mesmo significado, qual seja o de designar o oferecimento de valores mobiliários aos investidores. No direito comparado, o termo consagrado é placement (colocação).” DUBEUX, Júlio Ramalho. A Comissão de Valores Mobiliários e os principais instrumentos regulatórios do mercado de capitais brasileiro. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2006, p. 53. Disponível em: <http://www.puc-rio.br/>. Acesso em: 29 jul. 2011.
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ainda, a responsabilidade pela “veracidade, consistência, qualidade e suficiência
das informações prestadas por ocasião do registro e fornecidas ao mercado
durante a distribuição”.13
A CVM possui a prerrogativa de suspender ou cancelar qualquer oferta de
distribuição pública, ainda que já obtido o registro, caso se verifique estar
ocorrendo em disparidade com as informações registradas, fraudulenta ou de outra
forma ilegal. Não há, portanto, uma “preclusão administrativa”.
A CVM normatiza, ainda, os registros dos intermediários do mercado e
normatiza suas condutas; normatiza a atividade de auditoria independente;
normatiza a constituição e o funcionamento das entidades autorreguladoras; e
tipifica operações fraudulentas, práticas manipulatórias e outras práticas não
equitativas, assuntos cuja análise não cabe neste espaço.14 De todo modo, toda
área normatizada é, por definição, área a ser fiscalizada.
3 Instrumentos de arrecadação e fiscalização
A fim de garantir a autonomia financeira e orçamentária da CVM, a
própria lei lhe outorga a capacidade de arrecadar receitas que lhes são próprias, a
fim de poder realizar os gastos inerentes à consecução de suas missões
institucionais. Observe-se que o rol de receitas da autarquia encontra-se previsto
13 DUBEUX, Júlio Ramalho. A Comissão de Valores Mobiliários e os principais instrumentos regulatórios do mercado de capitais brasileiro. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2006, p. 57. Disponível em: <http://www.puc-rio.br/>. Acesso em: 29 jul. 2011. 14 V., e.g., Instrução CVM n.º 306/1999 (administração de carteira de valores mobiliários); Instrução CVM n.º 434/2006 (agente autônomo de investimento); Instrução CVM n.º 028/1983, Nota Explicativa n.º 27/1983 (agente fiduciário de debenturistas); Instruções CVM n.º 308/1999, 381/2003, Deliberação CVM n.º 466/2003, Nota Explicativa n.º 308/1999 (auditoria independente); Instruções CVM n.º 388/2003, 412/2004, 430/2006 (analista de valores mobiliários); Instrução CVM n.º 424/2005 (bancos e cooperativas de crédito); Instruções CVM n.º 116/1990 e 117/1990, Deliberações CVM n.º 20/1985, 105/1991, 372/2001 (corretoras e distribuidoras de valores mobiliários); Instrução CVM n.º 402/2004 (corretoras de mercadorias); Instrução CVM n.º 348/2001, Deliberação CVM n.º 372/2001 (intermediários não autorizados); Instrução CVM n.º 333/2000 (operações irregulares no mercado de valores mobiliários); Instruções CVM n.º 40/1984, 259/1997, 280/1998, 396/2003 (clubes de investimento); Instruções CVM n.º 409/2004, 438/2006, 472/2008, 398/2003, 186/1992, 432/2006, 356/2001, 444/2006, 399/2003, 391/2003, 406/204, 279/1998, 359/2002, 426/2005, 153/1991, 92/1988, 134/1990, 200/1993, 209/1994, 13/1980, 278/1998, 459/2007, 460/2007 (fundos de investimento); Instrução CVM n.º 317/1999 (depositary receipts, para negociação no exterior); Instrução CVM n.º 361/2002 (ofertas públicas de opções de aquisição de ações); Instruções CVM n.º 400/2003, 429/2006, 471/2008, 476/2009, Pareceres de Orientação n.º 001/1978, 005/1979 (ofertas públicas de distribuição de valores mobiliários); Instrução CVM n.º 315/1999 (procedimento de análise preliminar confidencial de pedidos de registro de emissão de valores mobiliários e de companhia aberta); Instrução 404/2004 (registro e padrões de cláusulas de debêntures).
_______________________________________________________________ Processo Administrativo Regulatório
15
no art. 7º da Lei nº 6.385/1976, que são de sua titularidade ativa exclusiva, a quem
compete a cobrança e arrecadação:
Lei n.º 6.385/1976. Art. 7º A Comissão custeará as despesas necessárias ao seu funcionamento com os recursos provenientes de: I - dotações das reservas monetárias a que se refere o Art. 12 da Lei n.º 5.143, de 20 de outubro de 1966, alterado pelo Decreto-lei n.º 1.342, de 28 de agosto de 1974 que lhe forem atribuídas pelo Conselho Monetário Nacional; II - dotações que lhe forem consignadas no orçamento federal; III - receitas provenientes da prestação de serviços pela Comissão, observada a tabela aprovada pelo Conselho Monetário Nacional; IV - renda de bens patrimoniais e receitas eventuais. V - receitas de taxas decorrentes do exercício de seu poder de polícia, nos termos da lei.
O art. 39, § 2º da Lei nº 4.320/1964 agrupa os créditos públicos em
tributários e não tributários. Especificamente em relação à CVM, podemos
identificar os seguintes:15
a) taxa de fiscalização do mercado de títulos e valores mobiliários: crédito de
natureza tributária destinado a garantir a autonomia financeira da Comissão de
Valores Mobiliários, cuja incidência decorre do exercício de poder de polícia
preventivo e repressivo sobre o setor regulado, instituída pela Lei nº 7.940/1989,
cujo procedimento administrativo-fiscal está regulado pela Deliberação CVM nº
507/2006 e parcelamento pela Deliberação CVM nº 447/2002;
b) multa: sanção administrativa de caráter pecuniário, não-tributário, aplicada em
virtude de violação à legislação ou aos comandos oriundos do poder de polícia
administrativa da autarquia, tendo como fundamento legal o art. 11 e §§ da Lei nº
6.385/1976;
c) multa cominatória: astreinte administrativo, de caráter coercitivo, no qual
objetiva-se dar cogência às condutas impostas pela Comissão de Valores
Mobiliários ao mercado de capitais e seus operadores, tendo fundamento legal no
art. 9º, II, combinado com o art. 11, § 11, ambos da Lei nº 6.385/1976, estando
regulada pela Instrução CVM nº 273/1998.
No que se refere à taxa de fiscalização do mercado de títulos e valores
mobiliários, em que pese à controvérsia inicial que envolveu a exação em
comento, a constitucionalidade e juridicidade de sua tributação restou reconhecida
e sumulada por parte do Pretório Excelso, conforme o seguinte enunciado, in
15 FIGUEIREDO, Leonardo Vizeu. Parecer MEMO/PFE-GJU-3/LVF/nº 1125/2008. Parecer elaborado em 07/10/2009 em resposta ao MEMO/CVM/SMI/GMN/n.º60/2008.
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16
verbis: “665. É constitucional a Taxa de Fiscalização dos Mercados de Títulos e
Valores Mobiliários instituída pela Lei 7.940/1989”.
A utilização da multa em caráter repressivo será efetuada quando a
autarquia detectar infrações à lei e suas normas, nos termos do art. 11, II, § 1º, da
Lei nº 6.385/1976, tais como emissão ou operação irregular com valores
mobiliários, ou, ainda, negociações anormais na bolsa ou no mercado de balcão
com a finalidade de obtenção de vantagens patrimoniais indevidas, em detrimento
do setor regulado e demais investidores, por exemplo.
Por sua vez, a sanção pecuniária de titularidade da Comissão de Valores
Mobiliários com função coercitiva assume nítido caráter de astreinte
administrativo, nos termos do art. 9º, II, combinado com o art. 11, § 11, ambos da
Lei nº 6.385/1976, traduzindo-se em medida cominatória em face do administrado
para compeli-lo ao cumprimento dos comandos da autarquia, oriunda de seu poder
de polícia administrativa, com o fito de garantir simetria informativa ao investidor
e ao mercado, mediante abertura e disponibilização de informações, para fins de
maior transparência.
A multa cominatória não é substitutiva; tem por objetivo que se cumpra
uma obrigação de fazer (positiva) ou deixar de fazer (negativa) alguma coisa, que
se revela a obrigação principal. Não se considera, como já dito, uma penalidade,
uma vez que está voltada para o futuro, com o fito de obter um resultado
predeterminado, em norma, ordem ou decisão.
Assim, sua aplicação sequer está condicionada a prévio processo
administrativo sancionador:
Lei n.º 6.385/1976. Art. 11. [...] § 11. A multa cominada pela inexecução de ordem da Comissão de Valores Mobiliários, nos termos do inciso II do caput do art. 9º e do inciso IV de seu § 1.º, não excederá a R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por dia de atraso no seu cumprimento e sua aplicação independe do inquérito administrativo previsto no inciso V do caput do mesmo artigo.
Atualmente, encontra-se disciplinada pela Instrução CVM nº 457/2007,
que classifica a multa cominatória em duas espécies, a saber:
a) multa ordinária, assim entendida a multa cominatória pelo atraso na prestação
de informações periódicas ou eventuais, cuja incidência esteja prevista em ato
normativo, com fixação de seu valor diário; e
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17
b) multa extraordinária, assim entendida a multa cominatória pelo não
cumprimento de ordem específica emitida pela CVM nos casos e formas legais.
A CVM pode examinar e extrair cópias de registros contábeis, livros ou
documentos, programas eletrônicos, arquivos magnéticos, arquivos ópticos ou de
qualquer outra natureza de todas as pessoas que estão sujeitas à sua regulação. E
por estas se entende, em última análise, quaisquer pessoas que tenham atuado no
mercado de capitais (Lei nº 6.385/1976, art. 9º, I). Pode, ainda, intimá-las a
prestarem informações, inclusive com multa cominatória diária por atraso.
Ademais, tem o poder de requisitar informações a entidades ou órgãos
públicos, bem como de firmar convênios, nacional e internacionalmente.16,17
Com relação aos próprios regulados, pode mandar que sejam republiquem
informações com retificações ou complementações, sem prejuízo de medidas mais
drásticas, como suspensão da negociação de determinados valores mobiliários.
Esse procedimento está regulado na Instrução CVM nº 297/1998, quando
ocorrerem as situações anormais de mercado descritas na Resolução CMN nº
702/1981. Pode chegar mesmo à decretação de recesso na bolsa de valores, bem
como, evidentemente, suspender e cancelar registros anteriormente outorgados.
Em especial, a CVM tem o poder de promover atos de supervisão, a
exemplo da stop order, que objetiva estancar cautelarmente o exercício de
atividade irregular no mercado de valores mobiliários, a teor do art. 9º, §1º, IV da
Lei nº 6.385/1976:
§ 1º Com o fim de prevenir ou corrigir situações anormais do mercado, a Comissão poderá: I - suspender a negociação de determinado valor mobiliário ou decretar o recesso de bolsa de valores; II - suspender ou cancelar os registros de que trata esta Lei; III - divulgar informações ou recomendações com o fim de esclarecer ou orientar os participantes do mercado; IV - proibir aos participantes do mercado, sob cominação de multa, a prática de atos que especificar, prejudiciais ao seu funcionamento regular.
Por outro lado, de maneira mais sutil, mas não menos eficaz:
A CVM tem também se valido amiúde de “manifestações de entendimento”, elaboradas por suas diversas Superintendências técnicas. As manifestações de entendimento consistem em comunicação remetida aos participantes do mercado, em princípio
16 A lista de convênios se encontra disponível, inclusive para acesso aos respectivos termos, em: <http://www.cvm.gov.br/port/redir.asp?subpage=convenioato>. Acesso em: 29 jul. 2011. 17 Cf. <http://www.cvm.gov.br/port/protinv/caderno1(new).asp>. Acesso em: 29 jul. 2011.
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18
expedidas pelas áreas técnicas da CVM, que revelam a sua interpretação sobre a ocorrência ou não de violação de normas do mercado em relação a determinado fato. Dizemos “em princípio expedidas pelas áreas técnicas”, porque contra a manifestação de entendimento das Superintendências cabe recurso ao Colegiado da CVM, cabendo assim ao Colegiado dar a palavra final sobre o assunto, ratificando ou contrariando a manifestação de entendimento das Superintendências.18
Esse recurso ao Colegiado está previsto na Deliberação CVM nº
463/2003,19 item I.
E, complementando o autor, ainda a respeito das manifestações de
entendimento:
Cabe acrescentar que as manifestações de entendimento não se confundem, em absoluto, com o processo administrativo sancionador, este que é pressuposto para a imposição de sanções administrativas contra os participantes do mercado de capitais. Muito diferentemente, as manifestações de entendimento não infligem qualquer sanção aos particulares, constituindo apenas um juízo a priori da entidade reguladora, que eventualmente pode até ser modificado em face das razões apresentadas pelos interessados. Cabe também acrescentar que as manifestações de entendimento têm se mostrado extremamente eficientes, muitas vezes evitando processos administrativos futuros, outras vezes evitando a consumação de atos que já na origem se vê serem viciados por ilegalidade.20
Certamente, o próprio processo administrativo investigativo ou
sancionador é mais vezes ainda, suficiente para coibir práticas desaprovadas no
mercado. Será visto logo abaixo.
Por fim, cabe mencionar aqui, ainda, o art. 124, § 5º, I e II, da Lei nº
6.404/1976, regulamentado pela Instrução CVM 372/2002, é um mecanismo que
confere à CVM competência para, excepcionalmente, intervir na vida societária
das companhias abertas – in verbis:
§ 5º A Comissão de Valores Mobiliários poderá, a seu exclusivo critério, mediante decisão fundamentada de seu Colegiado, a pedido de qualquer acionista, e ouvida a companhia: I - aumentar, para até 30 (trinta) dias, a contar da data em que os documentos relativos às matérias a serem deliberadas forem colocados
18 DUBEUX, Júlio Ramalho. A Comissão de Valores Mobiliários e os principais instrumentos regulatórios do mercado de capitais brasileiro. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2006, pp. 65-66. Disponível em: <http://www.puc-rio.br/>. Acesso em: 29 jul. 2011. 19 Prevê recursos de decisões dos Superintendentes para o Colegiado, inclusive quanto a efeito suspensivo, em caráter geral: “X - O procedimento previsto nesta deliberação também será aplicável às opiniões, manifestações de entendimentos e pareceres das áreas técnicas da CVM, nos quais poderá ser requerido o exame da questão pelo Colegiado.” 20 DUBEUX, Júlio Ramalho. A Comissão de Valores Mobiliários e os principais instrumentos regulatórios do mercado de capitais brasileiro. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2006, p. 7. Disponível em: <http://www.puc-rio.br/>. Acesso em: 29 jul. 2011.
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19
à disposição dos acionistas, o prazo de antecedência de publicação do primeiro anúncio de convocação da assembléia geral de companhia aberta, quando esta tiver por objeto operações que, por sua complexidade, exijam maior prazo para que possam ser conhecidas e analisadas pelos acionistas; II - interromper, por até 15 (quinze) dias, o curso do prazo de antecedência da convocação de assembléia geral extraordinária de companhia aberta, a fim de conhecer e analisar as propostas a serem submetidas à assembléia e, se for o caso, informar à companhia, até o término da interrupção, as razões pelas quais entende que a deliberação proposta à assembléia viola dispositivos legais ou regulamentares.
4 Processo administrativo investigativo e sancionador
A CVM pode aplicar o seguinte rol de penalidades:
Lei n.º 6.385/1876. Art. 11. A Comissão de Valores Mobiliários poderá impor aos infratores das normas desta Lei, da lei de sociedades por ações, das suas resoluções, bem como de outras normas legais cujo cumprimento lhe incumba fiscalizar, as seguintes penalidades: I - advertência; II - multa; III - suspensão do exercício do cargo de administrador ou de conselheiro fiscal de companhia aberta, de entidade do sistema de distribuição ou de outras entidades que dependam de autorização ou registro na Comissão de Valores Mobiliários; IV - inabilitação temporária, até o máximo de vinte anos, para o exercício dos cargos referidos no inciso anterior; V - suspensão da autorização ou registro para o exercício das atividades de que trata esta Lei; VI - cassação da autorização ou registro indicados no inciso anterior. VI - cassação de autorização ou registro, para o exercício das atividades de que trata esta Lei; VII - proibição temporária, até o máximo de vinte anos, de praticar determinadas atividades ou operações, para os integrantes do sistema de distribuição ou de outras entidades que dependam de autorização ou registro na Comissão de Valores Mobiliários; VIII - proibição temporária, até o máximo de dez anos, de atuar, direta ou indiretamente, em uma ou mais modalidades de operação no mercado de valores mobiliários.
Contudo, devem ser evidentemente, precedidas do devido processo legal.
No âmbito federal, a União disciplinou seu processo administrativo por
intermédio da Lei nº 9.784/1999, padronizando-o para todos os entes e órgãos
integrantes da Administração Pública Federal. Desnecessária a reiteração de
noções gerais, pelo que se passa às peculiaridades da CVM, registrando-se a
aplicação informadora e subsidiária desse diploma geral nos processos conduzidos
pela CVM.
A sua lei de criação outorgou-lhe poderes específicos para “apurar,
mediante processo administrativo, atos ilegais e práticas não equitativas de
_______________________________________________________________ Processo Administrativo Regulatório
20
administradores, membros do conselho fiscal e acionistas de companhias abertas,
dos intermediários e dos demais participantes do mercado” (Lei nº 6.385/1976,
art. 9º, V).
A CVM pode instaurar inquérito administrativo, o qual é conduzido por
uma Comissão de Inquérito, com membros designados pelo Colegiado da
entidade. É presidida por um dos Superintendentes da CVM e deve ter no mínimo
outros três membros, contando obrigatoriamente com um Procurador Federal, a
quem incumbirá prestar assessoria jurídica e exercer o controle interno da
legalidade dos atos praticados pela Comissão.21
A toda evidência, o inquérito administrativo da CVM se assemelha materialmente ao inquérito policial, visto que se trata de procedimento inquisitorial destinado a reunir os elementos necessários à apuração da prática ilícita e de sua autoria. A diferença básica consiste em perseguir o ilícito administrativo, e não o ilícito penal. Apenas eventualmente é que a infração pode ser ao mesmo tempo administrativa e penal. Cabe acrescentar que o inquérito administrativo pode inclusive ser conduzido sob sigilo.22
Como no processo penal, o processo administrativo sancionador da CVM
inicia-se com uma peça de acusação, que tanto pode ser um Relatório do inquérito
administrativo conduzido pela Superintendência de Processos Sancionadores
(SPS) em conjunto com a Procuradoria Federal Especializada (PFE), quanto um
Termo de Acusação elaborado por qualquer das Superintendências da CVM,
quando, no desempenho das suas atividades, encontrarem ilícitos com elementos
de autoria e materialidade suficientes.
Em ambos os casos, a formalização da acusação necessariamente deverá
indicar: (i) nome e qualificação do acusado; (ii) narrativa dos fatos investigados
que demonstre a materialidade das infrações apuradas; (iii) análise da autoria das
infrações apuradas, com a respectiva individualização da conduta dos acusados,
indicando as provas que a corroboram; e (iv) a indicação dos dispositivos legais
ou regulamentares infringidos.
No procedimento de rito ordinário (regido pela Resolução CMN nº
454/1977 e Deliberação CVM nº 538/2008), após concluído o inquérito ou
oferecido o Termo de Acusação, os autos seguirão para a Coordenação de
21 Resolução CMN n.º 454/1977; Deliberação CVM n.º 457/2002. 22 DUBEUX, Júlio Ramalho. A Comissão de Valores Mobiliários e os principais instrumentos regulatórios do mercado de capitais brasileiro. Porto Alegre: Sérgio Antônio Fabris, 2006, pp. 78. Disponível em: <http://www.puc-rio.br/>. Acesso em: 29 jul. 2011.
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21
Controle de Processo Administrativo (CCP), que encaminhará a intimação aos
acusados para a apresentação de defesa ou proposta de Termo de Compromisso,
no prazo de 30 (trinta) dias.
O julgamento dos processos administrativos sancionadores será realizado
pelo Colegiado da CVM, em sessão pública convocada com pelo menos 15
(quinze) dias de antecedência e presidida pelo Presidente da CVM, ocasião em
que se admitirá sustentação oral da defesa, com a respectiva réplica pela acusação.
Da decisão proferida pelo Colegiado e publicada no Diário Oficial da União, cabe
recurso ao Conselho de Recursos do Sistema Financeiro Nacional (CRSFN) e ao
Ministério da Fazenda, dependendo da natureza da irregularidade apreciada.
O rito sumário, por sua vez, regido pela Resolução CMN nº 1.657/1989,
com alterações introduzidas pela Resolução CMN nº 2.785/2000, e pelas
Instruções CVM nº 251/1996 e 335/2000, tem suas hipóteses de cabimento
exaustivamente listadas na Instrução CVM nº 251/1996, nas quais existe a
chamada “natureza objetiva”, termo este empregado pela CVM para casos em que
a materialidade está de plano comprovada, como, por exemplo, quando não há
publicação das demonstrações financeiras da companhia.
Nestes casos, não existe prévio inquérito e o processo é instaurado e
julgado diretamente pela Superintendência afeita ao mérito do processo, ou seja, é
a própria área técnica da CVM quem aprecia a defesa, que tem prazo de 10 dias
em vez dos 30 dias admitidos no rito ordinário, e decide o processo, podendo,
contudo, aplicar somente a penalidade de multa. Da decisão da Superintendência
cabe recurso ao Colegiado da CVM, também em 10 dias, e, se este mantiver a
decisão, o acusado poderá, ainda, recorrer ao Conselho de Recursos do Sistema
Financeiro Nacional.
Com efeito, a Lei nº 3.685/1976 admite expressamente que da imposição
de penalidades pela CVM seja interposto recurso ao CRSFN, órgão do Ministério
da Fazenda que julgará em última instância. A prática da CVM tem sido a de, nos
casos de absolvição, interpor recurso de ofício ao Conselho.
4.1 Prescrição
A prescrição é uma novidade introduzida pela Lei nº 9.457/1997. Havia
uma discussão se os ilícitos administrativos ocorridos no âmbito de mercado de
capitais seriam prescritíveis ou não. E para cessar essa dúvida, introduziu-se a
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22
figura da prescrição no Mercado de Valores Mobiliários, fixando-se o seu prazo
em oito anos, e o da prescrição intercorrente em quatro anos. Para os processos
em andamento, o início da contagem do prazo de oito anos ocorre a partir da
edição da lei.
Para aqueles que entendem que a prescrição não existia num âmbito do
mercado de capitais, a aplicação dessas normas não acarreta qualquer dificuldade.
Porém, para aqueles que entendiam que a prescrição nesse segmento era de cinco
anos, a nova lei não poderá agravar a situação jurídica anteriormente constituída.
4.2 Atenuantes
Pela mesma Lei nº 9.457/1997 foi inserido o § 9º no art. 11 da Lei nº
6.385/1976, que passou a contar, assim, com quatro circunstâncias atenuantes:
a) o arrependimento eficaz, que seria o comportamento do agente que, diante de
um ilícito mais grave e antes da sua ocorrência, se arrepende e deixa de praticá-lo:
os ilícitos que tenham sido cometidos antes do arrependimento recebem o favor de
atenuação;
b) o arrependimento posterior que seria a antecipação do agente em sanar a falta
cometida antes do início da fiscalização do órgão regulador, (neste caso, o agente
se antecipa, procurando sanar os efeitos do ato ilícito cometido);
c) confissão do ilícito; e
d) prestação de informações sobre a materialidade desse ilícito, facilitando, assim,
a evidenciação do ilícito pela CVM.
5 Termo de compromisso
Já previsto em outras normas brasileiras,23 o chamado Termo de
Ajustamento de Conduta (TAC) foi introduzido no sistema de regulação e
fiscalização do mercado de capitais pela Lei nº 9.457/1997, constituindo um
importante instrumento para a solução consensual de questões administrativas no
âmbito da atuação sancionadora da CVM:
§ 5º A Comissão de Valores Mobiliários poderá, a seu exclusivo critério, se o interesse público permitir, suspender, em qualquer fase, o procedimento administrativo instaurado para a apuração de infrações da legislação do mercado de valores mobiliários, se o investigado ou acusado assinar termo de compromisso, obrigando-se a:
23 Conferir, e.g., Lei 7.347/1985 (Lei da Ação Civil Pública) e Lei n.º 8.884/1994 (Lei do CADE).
_______________________________________________________________ Processo Administrativo Regulatório
23
I - cessar a prática de atividades ou atos considerados ilícitos pela Comissão de Valores Mobiliários; e II - corrigir as irregularidades apontadas, inclusive indenizando os prejuízos. § 6º O compromisso a que se refere o parágrafo anterior não importará confissão quanto à matéria de fato, nem reconhecimento de ilicitude da conduta analisada. § 7º O termo de compromisso deverá ser publicado no Diário Oficial da União, discriminando o prazo para cumprimento das obrigações eventualmente assumidas, e constituirá título executivo extrajudicial.
A respeito, confira-se trecho de artigo de autoria do Procurador-Chefe da
Procuradoria Federal Especializada junto à CVM:
Com efeito, após ouvida a PFE/CVM a respeito da legalidade das propostas, os autos são encaminhados ao referido Comitê, que elabora um parecer pela aceitação ou rejeição do proposto e o submete ao Colegiado da Autarquia (o Procurador-Chefe da PFE/CVM não vota no âmbito do Comitê, eis que, também ali, a sua atuação diz respeito ao controle da legalidade dos atos praticados). Previamente à emissão do seu parecer, o Comitê pode, inclusive, na forma do § 4º do art. 8º da Deliberação CVM nº 390/01, negociar com o administrado interessado. Ou seja, muito embora a decisão final a respeito da aceitação ou não do termo de compromisso proposto compita ao Colegiado, existe todo um trabalho anterior de análise e preparação que, além de facilitar o trâmite da matéria e agregar-lhe valor, busca imprimir maior uniformidade e previsibilidade sob as perspectivas de todos os envolvidos, com a emissão de opiniões coerentes, aderentes a precedentes do Colegiado e cada vez mais técnicas e apuradas. Por outro lado, zela-se para que o administrado não tenha condições de antever a exata contrapartida que lhe será exigida no caso de incorrer em desvio de conduta e, eventualmente, tentar arbitrar com o instituto do ajuste. De fato, resta sempre clara a possibilidade de, à luz das peculiaridades do caso e do próprio momento da apresentação de uma proposta de termo, o Comitê ou o próprio Colegiado exigirem algo válido apenas para a situação específica. É importante ressaltar também que, no âmbito do trabalho coordenado que ora realiza com o Ministério Público Federal (MPF), o qual é inclusive objeto de um Termo de Cooperação firmado em 08 de maio de 2008, a CVM celebrou, em conjunto com aquele órgão ministerial, dois Termos de Compromisso e de Ajustamento de Conduta com possíveis envolvidos com a prática de insider trading.24
É importante considerar que a crescente participação do Ministério Público
no TAC deve ser aprovada e incentivada. Ainda que haja independência funcional
dos membros do MP e que o próprio TAC não seja imune a controle judicial, sua
24 SANTOS, Alexandre Pinheiro dos. Por que defender os termos de compromisso no mercado de capitais? Disponível em: <http://www.bmfbovespa.com.br/juridico/noticias-e-entrevistas/Noticias/100106NotA.asp>. Conferir a íntegra para notas comparativas entre o termo de compromisso e o consent decree norte-americano. Acesso em: 9 mar. 2010.
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24
presença no acordo inibe significativa e satisfatoriamente iniciativas contenciosas
por parte da instituição.25
Mesmo que sequer esteja em curso na Autarquia qualquer procedimento
investigatório preliminar, a celebração de termo de compromisso revela-se
juridicamente viável.
Outrossim, é importante frisar que a indenização mencionada no art. 11, §
5º, II da Lei nº 6.385/1976 não se refere somente aos participantes do mercado de
valores mobiliários. O Colegiado tem o entendimento de que o ressarcimento
pode ser feito também das despesas empreendidas pelo próprio Regulador, ou
seja, a CVM. Tais despesas decorrem da implementação de investigações
adicionais e procedimentos administrativos provocados pelo administrado.
No que tange ao requisito inserto no inciso II do § 5º do art. 11 da Lei nº
6.385/1976, cumpre diferenciar duas situações fático-jurídicas que, comumente,
são submetidas à apreciação do Colegiado da Autarquia reguladora do mercado de
capitais.
A primeira, e mais simples, ocorre quando é possível extrair dos autos ou
da própria peça acusatória a quantificação de um prejuízo sofrido diretamente por
um ou mais investidores. Nesse caso, a possibilidade jurídica de aceitação da
proposta pela CVM está condicionada à apresentação de compromisso que
contemple a respectiva indenização aos investidores potencialmente lesados.
No entanto, é bastante comum que o ilícito perpetrado pelo proponente
seja daqueles que, apesar de não gerarem danos a investidores individualizados,
acarretam, em tese, danos aos interesses difusos ou coletivos no âmbito do
mercado de capitais, notadamente potencial lesão à integridade, à transparência e
à confiabilidade, que são valores essenciais no mercado de que se cuida. Assim, e
considerando que a lei exige a indenização de todos os prejuízos causados pela
suposta prática ilícita, a PFE-CVM tem opinado sistematicamente pela
juridicidade de propostas de recomposição de danos por meio de medida(s)
25 Conferir exemplos em: <http://www.cvm.gov.br/port/inqueritos/Termos/inqueritos/RJ2009-0428%20JOS%C3%89%20OLAVO%20MOUR%C3%83O%20ALVES%20PINTO%20%28TENDA%29.asp> (cuja descrição consta dos links de leitura sugerida na seção de casos geradores, supra) e <http://www.cvm.gov.br/port/infos/TERMODECOMPROMISSOEDEAJUSTAMENTODECONDUTA.pdf> (cuja descrição foi noticiada em: <http://noticias.pgr.mpf.gov.br/noticias-do-site/consumidor-e-ordem-economica/mpf-rj-e-cvm-firmam-compromisso-sobre-caso-de-venda-de-acoes-da-suzano-petroquimica-s-a/>). Acessos em: 9 mar. 2010.
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25
diretamente direcionadas ao mercado mobiliário como um todo, ou mesmo
indiretamente, na pessoa do seu órgão regulador (CVM), que tem como um dos
seus objetivos legais a promoção da expansão e do funcionamento eficiente do
mercado de capitais (art. 4º da Lei nº 6.385/1976).
A Deliberação CVM nº 390/2001 estabelece, ainda, a possibilidade de
notificação de investidores potencialmente lesados, para que forneçam
informações acerca dos prejuízos em tese sofridos (art. 10), inclusive por editais,
publicados às expensas do interessado no termo de compromisso, no caso de
investidores prejudicados em número indeterminado e de identidade desconhecida
(art. 11).
6 Fundo de Garantia
Os Fundos de Garantia das bolsas de valores têm base legal na Resolução
nº 2.690/2000 do Conselho Monetário Nacional, arts. 40 a 59 do Regulamento
Anexo, com as alterações da Resolução CMN nº 2.774/2000:26
Art. 40. As bolsas de valores devem manter Fundo de Garantia, com finalidade exclusiva de assegurar aos investidores do mercado de valores mobiliários, até o limite do Fundo, ressarcimento de prejuízos decorrentes da atuação de administradores, empregados ou prepostos de sociedade membro ou permissionária, em relação à intermediação de negociações realizadas em bolsa e aos serviços de custódia, especialmente nas seguintes hipóteses: I - inexecução ou infiel execução de ordens; II - uso inadequado de numerário, de títulos ou de valores mobiliários, inclusive em relação a operações de financiamento ou de empréstimos de ações para a compra ou venda em bolsa (conta margem); III - entrega ao investidor de títulos ou valores mobiliários ilegítimos ou de circulação proibida; IV - inautenticidade de endosso em título ou em valor mobiliário ou ilegitimidade de procuração ou documento necessário à transferência dos mesmos; V - decretação de liquidação extrajudicial pelo Banco Central do Brasil; e VI - encerramento das atividades. Parágrafo único. A negociação com os títulos mencionados no art. 33 deste Regulamento em recinto ou sistema de bolsa de valores não se encontra abarcada pelo disposto neste artigo.
O investidor lesado terá seis meses para encaminhar sua reclamação ao
Fundo de Garantia da bolsa cuja corretora participante tenha ocasionado prejuízo,
contados da ação ou omissão que tenha causado o prejuízo ou do mesmo prazo a
partir da data de conhecimento, pelo comitente, do prejuízo experimentado. Cabe
26 Ver também Instrução CVM n.º 461/2007.
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à Comissão Especial do Fundo de Garantia, no prazo de noventa dias, promover a
uma análise sumária do pleito e encaminhar relatório conclusivo ao Conselho de
Administração da bolsa, que terá, então, quinze dias para deliberar.
Se o Conselho de Administração negar o pedido do reclamante, a decisão
deverá ser submetida à CVM no prazo de dez dias. Tal procedimento não impede
o reclamante de promover seu próprio recurso à CVM, também no prazo de dez
dias corridos a partir da data em que for comunicado da decisão da bolsa de
valores. A CVM terá noventa dias corridos para exarar sua decisão sobre o
recurso. Tal decisão é proferida pelo Colegiado da Autarquia.
O prazo para pagamento, a partir da decisão e comunicação pela CVM, é
de três dias úteis para numerários e quinze dias úteis para ressarcimento em títulos
ou valores mobiliários.
O ressarcimento efetuado pelo Fundo de Garantia não impede nem
suspende eventual ação sancionadora da CVM relativa ao ilícito praticado.
Diferentemente das normas que regem o Termo de Compromisso, não há
autorizativo para que a suspensão ou extinção do Processo Administrativo
Sancionador.
QUESTÕES DE AUTOMONITORAMENTO
1. Após ler o material, você é capaz de resumir o caso gerador, identificando as
partes envolvidas, os problemas atinentes e as possíveis soluções cabíveis?
2. Quais as principais atribuições exercidas pela CVM?
3. Quais os tipos de multa à disposição da CVM para exercício de suas atribuições
e o que as diferencia?
4. Como funciona o processo administrativo sancionador na CVM?
5. Como opera o Termo de Compromisso no mercado de valores mobiliários?
6. Em que consiste o Fundo de Garantia obrigatório de bolsas de valores?
7. Pense e descreva, mentalmente, outras alternativas para a solução dos casos
geradores.
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27
REFERÊNCIAS
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Jurisprudenciais
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