Download - Integra Brasil V. II
20140204_cic_int_brasil_capa_41,8x21cm_VolumeII_CURVAS.indd 1 04/02/14 15:35
Volume II
PresidenteVivian Nicolle Barbosa de Alcântara
1o Vice-PresidenteRicard Pereira Silveira
Vice-PresidentesRoberto Sérgio Oliveira FerreiraVerônica Maria Rocha PerdigãoCarlos Roberto Carvalho FujitaLauro Fiuza Júnior
Diretor AdministrativoRicardo Nóbrega Teixeira
Diretor Administrativo AdjuntoFrancisco de Assis Philomeno Gomes Jr.
Diretor FinanceiroRicardo Pereira Sales
Diretor Financeiro AdjuntoFelipe Soares Gurgel
Diretores JurídicosCid Marconi Gurgel de SouzaRaul Amaral Júnior
Diretor de Relacionamento com AssociadoMarcos Silva Montenegro
Diretor de IntegraçãoCarlos Ernesto Albuquerque de Holanda
Diretor de Relacionamento InstitucionalFrancisco Fernando Rocha Novais
Diretor Especial da Copa 2014Régis Nogueira de Medeiros
Diretor TécnicoFrancisco Francílio Dourado da Silva Filho
Diretor OuvidorDrauzio Barros Leal Neto
DiretoresElias Sousa do CarmoFrancisco Eulálio Santiago CostaHerbert da Costa VelhoJosé Dias de Vasconcelos FilhoLuiz Eugênio Lopes PontesLuiz Francisco Juaçaba EstevesPedro Jorge Joffily BezerraRafael Arcanjo Soares Araújo Neto
DIRETORIA BIÊNIO 2012-2014
SecretáriaCláudia Lima
Auxiliar AdministrativoHanderson Café
Assessoria JurídicaLaerte Castro Alves
Assessoria de ComunicaçãoSuzete Nocrato
ConsultoresCláudio Ferreira LimaFirmo de Castro
Diretor ExecutivoLeonardo Bayma de Rebouças
Fotógrafo OficialMarcelo Rolim
Ricardo Barcelar PaivaVanessa Valente de Oliveira
Conselheiros EstratégicosRoberto Proença de MacêdoFernando Cirino GurgelJorge Alberto Vieira Studart GomesAlexandre Pereira SilvaFrancisco de Queiroz Maia JúniorFrancisco Assis Machado Neto
Conselheiros Fiscais TitularesCláudio Sidrim TarginoLuis Eduardo Fontenelle BarrosJosé Ricardo Montenegro Cavalcante
Conselheiros Fiscais SuplentesAntonio Marcos Ribeiro do PradoEdilson Teixeira JúniorEduardo Lima de Carvalho Rocha
Conselheiro da PresidênciaCarlos Prado
Diretora Delegada da Zona SulPatrícia Neri Coêlho Machado
Diretor Delegado da Zona NorteRaimundo Inácio Ribeiro Neto
Coordenação GeralNicolle Barbosa
Coordenação TécnicaCláudio Ferreira LimaFirmo de Castro
Comitê PolíticoCarlos PradoLima MatosNicolle BarbosaCláudio Ferreira LimaFirmo de Castro
Coordenação de EventosYHR Eventos | Yáskara Oliveira
Coordenação de ComunicaçãoAD2M | Ana Maria Xavier
ColaboradoresAntônio Nilson Craveiro Holanda - BrasíliaTânia Bacelar de Araújo - PernambucoArmando Avena - Bahia
Apoio InstitucionalBanco de Nordeste do Brasil (BNB)Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES)Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresa (SEBRAE)Petrobras Transporte S/A (Transpetro)Centro Insdustrial do Ceará (CIC)Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf)Ministério da Integração Nacional do BrasilGoverno Federal do BrasilGoverno do Estado do CearáGoverno do Estado de PernambucoGoverno do Estado do PiauíConfederação Nacional da Indústria (CNI)Confederação Navional dos Jovens Empresários (CONAJE)Federação das Indústrias do Estado de Alagoas (FIEA)Federação das Indústrias do Estado do Ceará (FIEC)Federação das Indústrias do Estado do Maranhão (FIEMA) Federação das Indústrias do Estado da Paraíba (FIEP)Federação das Indústrias do Estado de Pernambuco (FIEPE)Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Norte (FIERN)Federação das Indústrias do Estado de Sergipe (FIES)Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Ceará (FAEC)Federação das Associações do Comércio Indústria e Agropecuária do Ceará (FACIC)Federação das Câmaras de Dirigentes Lojistas do CearáCâmara de Dirigentes Lojistas de FortalezaFórum Empresarial da BahiaAssociação Industrial do PiauíFecomércio AlagoasFecomércio CearáFecomércio BahiaFecomércio Maranhão Fecomércio Paraíba Fecomércio Pernambuco Fecomércio PiauíFecomércio Rio Grande do NorteFecomércio Sergipe
AgradecimentoGrupo de Comunicação O PovoJornal Diário do NordesteJornal O Estado
Projeto Gráfico e EditorialE2 Estratégias Empresariais
Coordenação GeralNicolle Barbosa
Coordenação EditorialFrancílio Dourado Filho
Consultoria EditorialCláudio Ferreira Lima
Direção de ArteKeyla Américo
Capa, Design e DiagramaçãoAugusto Oliveira
TranscriçãoImelda Souza
JornalistaVanessa Lourenço
Copyright © 2013 by Centro Industrial do Ceará - CIC
Esta obra é uma publicação do Centro Industrial do Ceará - CIC, produzida pela E2 Estratégias Empre-sariais. Sua distribuição é gratuita. Todas as ilustrações apresentadas são de uso restrito à publicação e fazem parte do arquivo CIC.
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação
Centro Industrial do Ceará - CICRelatório Integra Brasil / Centro Industrial doCeará - CIC . - Fortaleza: E2 Editora, 2013
______ xx p. :Il.ISBN: 978-85-xxx-xxxx-x1. Gestão Empresarial I. Título
CDD: xxx.xxx
SUMÁRIO
SEMINÁRIO INTEGRA BRASIL
SOLENIDADE DE ABERTURA ................................................................... 13
Painel 1 . Reorientação da Economia Nordestina ........................................49
Painel 2 . Infraestrutura para o Desenvolvimento
do Nordeste: Recursos Hídricos e Energia ...................................................75
Painel 3 . Infraestrutura para o Desenvolvimento
do Nordeste: Transportes, Logística e Telecomunicações..........................141
Painel 4 . Transformações Social, Urbana e Ambiental do Nordeste ........177
Painel 5 . Educação, Ciência, Tecnologia
& Inovação e Cultura para o Desenvolvimento do Nordeste ......................245
Painel 6 . A Questão Político-Institucional
e o Desenvolvimento do Nordeste...............................................................335
Painel 7 . Uma Estratégia para o Desenvolvimento do Nordeste ..............425
Solenidade de Encerramento .................................................................... 537
CONSIDERAÇÕES FINAIS .........................................................................551
ANEXOS ......................................................................................................555
SEMINÁRIO INTEGRA BRASILFortaleza, Ceará, de 27 a 29 de agosto de 2013
15RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
SOLENIDADE DE ABERTURA
Cerimonialista: “Para transmitir o sentimento de alegria em recebê-los
neste evento e acolher a todos que nos honram com suas presenças,
convido neste momento ao palco o músico, compositor e sanfoneiro, Wal-
donys.”
(Seguiu-se a apresentação musical de Waldonys)
“Senhoras e senhores: “Quando um rio corta, corta-se de vez / o discur-
so rio de água que ele fazia. / Cortado, a água se quebra em pedaços, / em
poços de água, em água paralítica. / Em situação de poço a água equivale
/ a uma palavra em situação dicionária: / isolada, estanque no poço dela
mesma, / porque assim estancada, muda. / E muda porque com nenhuma
comunica, / porque cortou-se a sintaxe desse rio, / o fio de água por que ele
16
descorria. / O curso de um rio, seu discurso rio, chega raramente a se reatar
de vez; / um rio precisa de muito fio de água / para refazer o fio antigo que
o fez. / Salvo a grandiloquência de uma cheia, / lhe impondo interina outra
linguagem, / um rio precisa de muita água em fios / para que todos os poços
se enfrasem: se reatando, de um para outro poço, / em frases curtas. Então,
frase e frase, / até a sentença-rio do discurso único / em que se tem voz a
seca ele combate.”
Com estes versos do poema “Rios Sem Discurso”, do escritor e poeta
pernambucano João Cabral de Melo Neto, publicado no livro “A Educação
Pela Pedra”, os organizadores do Integra Brasil sentem-se honrados em re-
ceber a todos os presentes nesta cerimônia de abertura do Seminário Inte-
grA Brasll - Fórum Nordeste no Brasil e no Mundo.
O Integra Brasil surgiu do Centro Industrial do Ceará - CIC e, em par-
ceria com a Federação das Indústrias do Estado do Ceará, tornou-se um
movimento de todo o setor produtivo do Nordeste, visando a redução das
desigualdades regionais do Brasil, mediante a integração econômica para
o fortalecimento do mercado interno e o aproveitamento das oportunidades
do mercado externo.
O movimento, que prima pela união de esforços, tem conquistado par-
cerias de diversas frentes, da economia, política e academia, e defende
que o desenvolvimento do Nordeste é oportunidade que não pode ser
perdida. Para isso, exige-se coordenação de políticas, quer entre si, quer
entre níveis de governo, no contexto de um projeto de longo prazo que
17RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
dará continuidade aos avanços da última década, atraindo investimentos
e criando novos mercados dentro e fora da região. Um projeto, sobretudo,
originado e compartilhado no próprio Nordeste, cuja negociação com o
resto do país desembocará em um pacto federativo à altura de uma nação
do porte do Brasil.
Enriquecendo a programação neste seminário, as senhoras e os senhores
terão a oportunidade de visitar a Exposição Celso Furtado - Vocação Nordeste,
que resgata um dos períodos mais importantes da vida política nacional e
da região nordestina, entre 1958 e 1964. Na época, o Brasil avançava em seu
processo de industrialização e modernização. O Governo implantava “cin-
quenta anos em cinco”, construía Brasília e criava a SUDENE. Desde já,
os agradecimentos pelo imprescindível apoio do Centro Internacional Celso
Furtado, que tornou possível a montagem da mostra.
O Integra Brasil é uma iniciativa do setor produtivo do Nordeste e conta
com o patrocínio da Confederação Nacional da Indústria - CNI, Sistema
FIEC, Centro Industrial do Ceará - CIC, TRANSPETRO, governo federal,
Banco Nacional de Desenvolvimento Social - BNDES, Banco do Nordeste
do Brasil - BNB, Companhia de Desenvolvimentos dos Vales do São Fran-
cisco e do Parnaíba - CODEVASP, Ministério da Integração Nacional, Go-
verno do Estado do Ceará, Federação das Indústrias do Estado de Pernam-
buco, FECOMÉRCIO - Federação do Comércio de Bens Serviços e Turismo
do Ceará, da Bahia e Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Em-
presas - SEBRAE.
18
O Integra Brasil tem, ainda, o apoio das Federações das Indústrias dos
Estados de: Alagoas, Paraíba, Maranhão, Sergipe e Rio Grande do Norte. Da
Federação da Agricultura e Pecuária do Estado do Ceará, do Fórum Empre-
sarial da Bahia, da Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo dos
Estados do Maranhão, Piauí, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco,
Alagoas e Sergipe. Da Federação das Associações do Comércio, Indústria,
Serviços e Agropecuária do Ceará - FACIC, da Confederação Nacional dos
Jovens Empresários - CONAJE, da Associação de Lojistas e Líderes Femini-
nas do Ceará - ALFE, da Associação Industrial do Piauí, da Federação das
Câmaras dos Dirigentes Lojistas do Ceará, da Câmara dos Dirigentes Lo-
jistas de Fortaleza, do Governo do Estado de Pernambuco, do Governo do
Estado do Piauí e, também, já repetido aqui, a a CONAJE.
Em nome das instituições co-anfitriãs, os agradecimentos a todos que
nos honram com suas presenças. E, neste momento, convido os co-anfi-
triões deste evento para juntos, aqui no palco, recepcionar as autoridades
que irão compor a mesa.
Convido, portanto, a senhora presidente do Centro Industrial do Ceará e
Coordenadora do Integra Brasil Nordeste, Nicolle Barbosa, e o senhor vice-
-presidente da Confederação Nacional das Indústrias e presidente da Fede-
ração das Indústrias do Estado do Ceará - FIEC, Roberto Macêdo.
Convido à mesa, o senhor presidente do Conselho Estadual de Desenvol-
vimento Econômico do Ceará, Alexandre Pereira, que neste ato representa
Sua Excelência, o senhor governador Cid Ferreira Gomes; o senhor presi-
19RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
dente da TRANSPETRO, Sergio Machado; o senhor presidente do Banco
do Nordeste, Ary Joel Lanzarin; o senhor Chefe do Departamento Regional
Nordeste do BNDES, Paulo Ferraz Guimarães; o senhor Diretor da SUDE-
NE, Henrique Jorge Tinoco de Aguiar, aqui representando o Superintendente
Luiz Gonzaga Landim; Representando a Federação das Indústrias dos de-
mais estados do Nordeste, convido a senhora Diretora da Federação das In-
dústrias do Estado da Paraíba, Juliana Maria Dantas; o senhor presidente
da Federação do Comércio do Estado do Ceará - FECOMÉRCIO, Luiz Gastão
Bittencourt da Silva, o senhor presidente da Federação da Agricultura e Pe-
cuária do Estado do Ceará, Flávio Sabóia; o senhor presidente da Federação
das Câmaras dos Dirigentes Lojistas do Ceará, Honório Pinheiro; o senhor
Diretor da Confederação Nacional dos Jovens Empresários, Carlos Ernesto
Holanda; Neste momento, convido a todos para, em posição de respeito, ou-
vir o Hino Nacional.”
(Execução do Hino Nacional)
Cerimonialista: “Senhoras e senhores, neste momento, convido a fazer
uso da palavra o senhor vice-presidente da Confederação Nacional da In-
dústria e presidente da Federação das Indústrias do Estado do Ceará, Ro-
berto Macêdo.”
Roberto Macêdo “Boa noite a todos. É um prazer e uma honra estar aqui
abrindo este evento e gostaria de saudar os membros da mesa, inicialmente
20
na pessoa da nossa querida presidente do CIC, Nicolle Barbosa, realmente
vitoriosa, tenho certeza, depois de quinze meses de trabalho, chegarmos no
dia de hoje aqui coroando o início do processo que está começando realmen-
te pra valer. Até agora foi só o aquecimento. Vamos ver isso ao longo dos dois
dias que estaremos juntos.
Amigo Alexandre Pereira, presidente do Conselho do Desenvolvimento
Econômico, ou seja, secretário do Desenvolvimento Econômico, represen-
tando nesse ato o nosso governador Cid Gomes, que foi chamado a Brasília
e não pôde estar conosco agora aqui.
Também, o amigo Sergio Machado, presidente da TRANSPETRO, que
muito nos tem prestigiado, estivemos juntos semana passada no BNDES, no
Rio de Janeiro. Está hoje conosco aqui, mostrando apoio e que acredita nes-
te programa. presidente do Banco do Nordeste, Ary Joel Lanzarin, que tenho
certeza que depois do tempo que já está aqui no Ceará é um dos cearen-
ses, ou nordestino, que mais acredita na região e também está nos apoiando
neste projeto. Paulo Ferraz Guimarães, Chefe do Departamento Regional
do BNDES, bem-vindo; Henrique Jorge Tinoco Aguiar, Diretor da SUDENE,
representando o seu Superintendente, Luiz Gonzaga Landim, obrigado pela
presença; Juliana Maria Dantas, Diretora da Federação das Indústrias do
Estado da Paraíba, representando o nosso presidente Gadelha, que está em
Brasília, onde eu também deveria estar numa reunião da CNI hoje, com um
jantar oferecido pelo presidente da Federação de Goiás. Mas tenho certeza
que aqui está muito melhor; Luiz Gastão Bittencourt da Silva, presidente da
21RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
FECOMÉRCIO; Flávio Saboia, presidente da FAEC, Federação da Agricultu-
ra; amigo Honório Pinheiro, presidente da FCDL; e Carlos Ernesto Holanda,
jovem Diretor da Confederação Nacional dos Jovens Empresários.
Demais convidados, vice-presidente da Federação do Piauí, estou vendo
que o senhor chegou há pouco tempo, então, de viagem, muito obrigado pela
presença. Diretores da nossa federação, do CIC, e amigos, enfim. Não daria
neste momento para nominar todos que eu gostaria, que nos honram com a
presença.
É grande a minha satisfação de estar aqui no Centro de Eventos do Cea-
rá, abrindo este Seminário do Integra Brasil - Fórum Nordeste no Brasil e no
Mundo, que é o ponto culminante de mobilizações ocorridas nos últimos me-
ses em vários estados brasileiros. Observamos os primeiros frutos de tantos
esforços despendidos. Recordo-me dos nossos sentimentos de preocupa-
ção quando o CIC, braço político da nossa federação, trouxe a ideia dessa
iniciativa para a FIEC, pelo tamanho e responsabilidade desse desafio. No
entanto, o desejo de fazer algo efetivo para contribuir com a correção dos
desequilíbrios regionais do desenvolvimento do nosso país superou, e muito,
todos os obstáculos que realisticamente visualizávamos.
Para o sucesso desse evento, foi decisiva a disposição e a competência
da equipe montada pelo CIC, sob a coordenação da sua presidente, Nicolle
Barbosa, na conquista de apoios e na mobilização dos mais diversos agen-
tes econômicos, políticos e sociais, nas esferas regional e nacional. O entu-
siasmo manifestado pelos participantes dos eventos ocorridos em todos os
22
estados nordestinos expressou o quanto é forte a vontade de união de forças
ativas do Nordeste, para integrar a região no contexto nacional numa pers-
pectiva de federação cooperativa em prol do desenvolvimento equilibrado
do país. Viu-se, em todas as partes, empresários, parlamentares, membros
dos poderes executivos e acadêmicos, propondo soluções para problemas,
estratégias para aproveitamento de oportunidades e alternativas para o de-
senvolvimento integrado.
A ação do setor produtivo como motor econômico do país e da região é
indispensável para a superação de tendências isolacionistas e dispersivas,
tradicionalmente retardadoras do progresso. Esta ação é também crucial
para que a mobilização iniciada tenha um caráter permanente, evitando-se
que todo o esforço se esgote na realização dos eventos e na elaboração de
documentos. O verdadeiro produto deste movimento é a ação conjunta re-
sultante de uma articulação sistemática e continuada dos agentes da inicia-
tiva privada, do estado e da sociedade, para a promoção do desenvolvimento
regional como parte indispensável do desenvolvimento nacional. À medida
que avancemos neste processo, descortinando horizontes, aumentaremos a
força que nos fará cada vez mais reconhecidos e respeitados.
É natural que em uma região estados concorram pela atração de novos
investimentos e pela conquista de recursos. Mas é um desperdício de opor-
tunidade quando não percebem os ganhos que poderiam resultar das con-
vergências de interesse. Se a cooperação é possível entre nações sobera-
nas, como no exemplo da União Europeia com seus vinte e sete países, vinte
23RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
e cinco línguas oficiais e quinhentos milhões de pessoas, por que não seria
no caso do Nordeste com nossos nove estados, uma só língua e cinquenta
e oito milhões de brasileiros e habitantes? Eu lanço mão da referência à
União Europeia, tendo em conta o seu desempenho no enfretamento da sua
atual crise socioeconômica, que pôs à prova os seus propósitos básicos de
mais eficiência, mais democracia, mais transparência, mais união e mais
segurança. Diferenças à parte, estou convencido de que o Nordeste, não
como um bloco, mas como parte integrante do continente Brasil, utilizando
instrumentos de cooperação supraestaduais e suprapartidários, será uma
região desenvolvida de um país desenvolvido.
O sucesso do Integra Brasil depende do entendimento, da contribuição,
do esforço e da atuação de cada um e de todos nós. Depende, na verdade,
de todos juntos criarmos uma nova situação para nossa região. Que esse
encontro tenha o sucesso que nós esperamos para que possamos dar con-
tinuidade, como disse no início, é o início de uma etapa que o Nordeste vai
passar no sentido de programar o seu futuro numa visão de longo prazo.
Nicolle, parabéns. Muito obrigado a todos.”
Cerimonialista: “Senhoras e senhores, convido neste momento a fazer uso
da palavra o senhor presidente da TRANSPETRO, Sergio Machado.”
Sergio Machado “Boa noite a todas e a todos. Eu queria saudar, em primeiro
lugar, nossa presidente do CIC, Nicolle Barbosa, e na pessoa dela saudar
24
toda essa brava mulher nordestina, que tem coragem e disposição para en-
frentar o novo. Eu tive oportunidade, Nicolle, de conversar com você bas-
tante no Rio, e rejuvenesci. Eu voltei aqui lembrando de trinta anos atrás,
quando aqui eu estava nessa casa com vocês sonhando pelo um país dife-
rente, sonhando pelo um estado diferente, vendo as adversidades e com a
consciência que ou a gente mudava de rumo ou de ramo.
Meu caro presidente Roberto Macêdo, um prazer ouvir as suas palavras,
o seu entusiasmo por esse processo de mudança, porque necessariamente
nós do Nordeste temos que passar. Meu caro companheiro de longas da-
tas, aqui representando o governador Cid Gomes, nosso amigo Alexandre
Pereira, é um prazer muito grande lhe reencontrar num fórum como esse do
Integra Brasil. E num momento em que a gente está juntando forças e com a
vontade de sair da corda do elefante. Acho é que não se pode ficar girando
na corda do elefante porque não vai levar a gente a lugar nenhum.
Meu caro presidente do Banco do Nordeste, Ary Joel Lanzarin, querer
dizer, Ary, que o Banco do Nordeste tem um papel importante, que é che-
gada a hora do grande salto do desenvolvimento, que o Banco do Nordeste
sempre marcou e esteve presente. A gente tem que ser hoje mais visionário
do que pragmático, para que a gente possa chegar ao futuro, e o Banco do
Nordeste sempre foi esse visionário do Nordeste.
Queria saudar aqui, representando nosso querido Luciano, o Paulo Fer-
raz Guimarães, que é outro companheiro que tem estado lado a lado com
a gente nessa luta, tem apoiado bastante a TRANSPETRO no programa
25RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
de modernização da frota de petroleiros do Brasil, sem o BNDES isso não
seria possível, e é acreditando nessas coisas que a gente vai construindo
o mundo.
Queria saudar o companheiro Henrique Jorge Tinoco de Aguiar, aqui re-
presentando a nossa grande SUDENE, e todos nós nordestinos devemos
muito a SUDENE pelo papel que ela desempenhou, pela história que ela
tem, pelo seu fundador, que foi meu amigo pessoal, o dr. Celso Furtado, com
quem eu tive uma convivência enorme, aprendi bastante e que, graças a sua
inovação, colocou o Nordeste naquele momento na vanguarda do processo
de planejamento do Brasil.
Queria saudar Luiz Gastão Bittencourt, presidente da Federação do Co-
mércio, Flávio Saboia, presidente da Federação de Agricultura, Honório Pe-
reira, Joaquim Gomes, enfim. Não queria cansá-los com tantas saudações e
dizer que para mim é um momento muito importante.
Eu não estou aqui como presidente da TRANSPETRO, eu estou aqui
como ex-presidente do CIC. E é nesse papel que eu vim aqui e vim pensando
no avião, lembrando tudo aquilo que a gente passou, que foi um fórum como
esse que deu um novo impulso, que uniu, que foi capaz de a gente descobrir
outros caminhos. A gente vive um momento muito importante no Brasil. Em
junho, o Brasil mudou. Em junho, a população foi à rua dizendo que não acei-
tava mais o modelo político que estava aí, que queria participar, que queria
melhor qualidade de serviços, e que a gente tem que compreender muito
bem a mensagem que veio. Foi uma mensagem de milhões de pessoas que
26
foram à rua para dizer que é a hora de mudar, de buscar novos caminhos,
de buscar novos rumos, e quem não entender essa mensagem vai ficar fa-
zendo parte da história do passado. E quem não compreende os valores do
seu tempo, ou vai para o cemitério ou para o museu. E o momento não é
nem de cemitério nem de museu. O momento é de construção. E então, há
de me perguntar: o que tem isso igual com o CIC? E foi exatamente do final
de setenta, oitenta, que começou aqui no Ceará um movimento semelhante
a esse que foi à rua, através de jovens, naquela época todos com menos de
quarenta anos, que bom, que saudade; todos com menos de quarenta anos,
e com consciência que não dava para continuar como estava, que a gente
fazia uma grande mudança no modelo; não é questão de aperfeiçoar, não
é questão de andar num velho caminho, porque quando a gente anda num
velho caminho a distância mais longa onde se pode chegar é onde alguém já
chegou. E esse caminho onde alguém já chegou no Nordeste a gente sabe
onde é que vai dar. Já fizemos diversas experiências. Já tivemos FINOR, já
tivemos incentivo, já tivemos a guerra fiscal entre os estados, já tivemos
incentivo, e o nosso Nordeste cresceu. Não podemos dizer que o Nordeste
não cresceu; cresceu 165% nos últimos dez anos, a renda do Nordeste. Mas
nossa posição relativa no Brasil não mudou.
O mesmo discurso que eu fazia trinta anos atrás; que a gente fazia um
discurso que era qual? Naquela época o Nordeste tinha 30% da popula-
ção e 12,5% do PIB. Hoje nós temos 28% da população e 13,5% do PIB. O
que isso quer dizer? Que as coisas avançaram, sim, a qualidade de vida
27RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
melhorou, mas nós na mudamos estruturalmente. Então, se nós não tiver-
mos coragem de buscar uma nova estrada, um novo desafio, uma nova
união, e nesse momento que o Nordeste tem força política. Se a gente
pegar as duas últimas eleições, quem elegeu os últimos dois presidentes
da República foi o Nordeste. Já a vitória da presidente Dilma, 89% foi aqui
do Nordeste. E nós temos que transformar isto numa unidade, num fórum
que representa as lideranças nordestinas. Agora, num projeto comum, ou
nós nos perdemos um pouco nisso. Hoje a gente vive num individualismo
bastante grande, cada estado passou a cuidar de si, o nosso grande fórum
da SUDENE deixou de as pessoas comparecerem, deixou de a gente dis-
cutir, deixou de a gente ver, o Nordeste passou a ser tratado isoladamente
e isoladamente nós representamos 13,5% do PIB do Brasil. E o que acon-
tece? Se a gente continuar com 60% da nossa indústria, a uma indústria
tradicional, vamos continuar fora. Se nós só tivermos 7% de indústrias de
vanguarda, de indústrias agregadoras, de indústrias criadoras, vamos fi-
car fora. Se nós não tivermos a coragem, o quê que muda esse sistema? O
quê que muda essa história? É o investimento em educação e tecnologia.
E o quê que tem acontecido com o Nordeste nessas duas áreas, ultima-
mente? Apenas 11,4% do gasto do governo federal em educação foi gasto
no Nordeste. Enquanto o Centro-Sul teve 60,1%. Em ciência e tecnologia,
o Nordeste, que tem 13,5% do PIB, tem 5% do investimento em ciência e
tecnologia. Enquanto isso, o Sudeste tem 73%, com um PIB de 55%. Só São
Paulo tem 50%.
28
E aí está a raiz da diferença entre e nós e o resto do Brasil, e aí está a
razão pela qual a gente passou esse tempo todo e continuamos nos mesmos
13%. Porque nós ficamos fazendo o tradicional. E o mundo hoje é o mundo
do conhecimento, é o mundo da inovação, é o mundo de quem quer ser vi-
sionário, mas tem que perder aquela visão de ser um crítico, porque o críti-
co olha para trás, trata do passado, o passado cuidou dele e nos deu esse
13,5%, e a gente tem que cuidar do futuro. Este é o nosso grande desafio.
Esta é a nossa grande história e esta é a grande oportunidade desse fórum
Integra Brasil. Nós estamos trazendo as lideranças para conversar sobre um
novo Ceará, um novo Nordeste, um novo Brasil, e como o Nordeste vai poder
se integrar nessa nova situação. Porque essa é a grande questão. Porque o
Nordeste recebe muitas transferências. Pra você ver, em termos de infraes-
trutura o Nordeste tem recebido 17-18% acima do PIB. No PAC tem 26% de
investimento para o Nordeste. Então, não é questão de investimento, é ques-
tão de mudar a cultura, de mudar o modelo, de mudar a visão, e que a gente
possa pensar num futuro diferente.
Se a gente pegar o nosso número do Ceará; eu tinha um número antigo
que era de 2002, quando disputei o governo, que eu fiz; eu tentei atualizar, e
o número mais novo que consegui foi 2006, mas não deve estar diferente. O
Ceará tem um déficit com o resto do Brasil de 5,9 bilhões de reais por ano,
num déficit da balança de pagamento. Quer dizer, a gente importa 5,9%, isso
em 2006; hoje deve estar 8 ou 10. Esse número em 2006 representava o quê?
Representava 140% de tudo que o Ceará arrecadava. Então, de toda arreca-
29RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
dação do Estado do Ceará, a gente manda para fora 140% mediante o déficit
que a gente tem na balança de pagamento. Se a gente juntar a arrecada-
ção do Estado mais Fundo de Participação dá 93%. Se a gente ver quanto
é que representa a aposentadoria e a bolsa família, relativo a nossa arreca-
dação, ela representa mais de 80% do que o estado arrecada como imposto,
mais o Fundo de Participação. Isso dá uma dimensão da nossa economia. A
gente cresceu? Cresceu. A gente avançou? Avançou. O Nordeste cresceu?
Cresceu. Mas nós queremos sair dessa situação de atraso, nós queremos ir
para a vanguarda e há condição, porque há a abertura do governo federal,
há desejo. Agora, ninguém ajuda se você não quiser ser ajudado. Não há
nenhum analista que resolva o problema de alguém se o paciente não quiser
ser curado. E só nós, nordestinos, unidos, deixando de lado as questões ad-
jetivas, deixando de lado as questões secundárias, deixando de lado as ques-
tões que nos dividem. Porque se a gente for pensar friamente, a gente pode
ter alguma divergência no quarto tempo. A gente vai ter o primeiro, o segun-
do, o terceiro tempo juntos, todos os estados do Nordeste. Agora, a gente
tem que dividir e decidir o que cada um vai fazer, qual é o papel que cada
um vai desempenhar, qual a linha que cada um vai seguir, para que a gente
possa pensar num futuro diferente nessa hora que o Brasil tem tudo para
ser potência. Tem reserva de 370 bilhões de dólares, tem uma matriz energé-
tica limpa fantástica, vai ser o quarto maior produtor de petróleo do mundo,
tem energia de todo tipo, tem 14% da água doce do mundo, tem 334 milhões
de hectares de terra para produzir comida para o mundo. Veja o exemplo da
30
China; o que era a China há 15, 20 anos atrás? A China, mesmo crescendo
esse ano 7%, vão gerar três vezes mais renda para o mundo do que vai gerar
os Estados Unidos. Então, são exemplos que estão aí desse novo mundo, e é
desse novo mundo que devemos fazer parte. E a nossa sorte de ter nascido
no Brasil é que hoje a gente escuta a dor daqueles que estão sofrendo na
derrocada, como na Europa. E a dor dos partos, dos que estão nascendo, dos
novos emergentes e onde, entre eles, está o Brasil.
Então, nós do Nordeste, não podemos perder essa oportunidade, nós
não podemos estar fora. Agora, nós temos que criar uma nova estrada. Não
adianta usar modelos já existentes, porque esses modelos nos levaram aos
13,5% do PIB, o que era há 35 anos, não mudou. Quer dizer, que a gente cres-
ceu, cresceu, mas outros cresceram mais do que a gente. Então, a gente tem
que começar a entender porque os outros cresceram. Porque nós vivemos na
sociedade da informação, a sociedade do conhecimento, se a gente só tem
5% de investimento em ciência e tecnologia, nós só vamos conseguir desen-
volver 5% e vamos ficar atrás, ou fazendo o que é tradicional, e no mundo
globalizado da concorrência só tem lugar, não é só para quem fala inglês
ou francês, é para quem fala a língua da competência, e essa é a língua que
nós queremos falar no Nordeste. É a língua da eficiência, é a língua de criar
o novo, é a língua de ousar, a gente não tem que ter medo de nada, tem que
pensar no futuro e no compromisso que temos com essa geração de brasi-
leiros que esperam da gente uma posição importante. E essa posição, minha
cara presidente Nicolle e Roberto, vocês têm que desempenhar, novamente,
31RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
aquele velho sonho, e a grande oportunidade foi num seminário como esse
que começou uma grande transformação e uma grande mudança. Então,
aproveitem esse momento.
Eu vim para cá com esse espírito, para dar essa força, de quem já viveu
isso e sabe que dá certo. Sabe que é possível mudar, sabe que é possível
transformar, muitos dos que estão aqui presentes hoje talvez não tivessem,
porque naquela época que a gente assumiu o governo, no Ceará por cada
mil nascidos, 115,5 morriam. Talvez muitos daqui não estivessem hoje vivos,
porque estariam nessa taxa de mortalidade. A gente foi, o Ceará foi o que
mais diminuiu a taxa de mortalidade no Brasil, já diminuiu em 80%, e hoje
estão aí vários dos que talvez não estivessem vivos, e é com orgulho que a
gente sabe que pôde contribuir para construir isso.
Então, é meu estímulo, é minha torcida, para que a gente aglutine, para
que deixe de lado as vaidades, os egos, a gente guarde os egos e as vaidades
nos armários, e possamos nos unir para construir esse grande Nordeste,
para aproveitar esse grande momento do Brasil.
O Brasil ninguém segura mais. Pode ser pessimista, pode olhar pelo olhe
que quiser, pode dizer o que quiser, a gente está mais crítico do que visioná-
rio, mas a vida é essa. Vão uns fazendo e outros criticando, mas o importante
são os que vão fazendo, vão construindo e vão fazendo o novo. E o homem é
do tamanho do seu sonho. E a gente tem que sonhar grande para que a gente
tenha um Nordeste grande.
Muito obrigado, parabéns, e continue em frente nesse seu trabalho.”
32
Cerimonialista: “Senhoras e senhores, com a palavra o senhor Chefe do De-
partamento Regional Nordeste do BNDES, Paulo Ferraz Guimarães.”
Paulo Ferraz Guimarães “Boa noite a todos e a todas. Eu queria saudar a
Presidenta Nicolle e o presidente do Conselho de Desenvolvimento, Alexan-
dre Pereira, e através dele cumprimentar toda a mesa, todas as autoridades
aqui presentes, empresários, e a sociedade aqui mobilizada.
Vou ser bastante breve, rápidas palavras; eu queria apenas iniciar fazen-
do um agradecimento, Nicolle, porque o Integra Brasil para o BNDES é uma
oportunidade. Essa mobilização e esse projeto se traduzem para o Banco do
Desenvolvimento como uma oportunidade.
O Banco tem tido uma atuação bastante significativa na região nos últi-
mos anos. O desembolso do BNDES cresceu de forma expressiva, saltamos
aí de patamar. Saltamos da casa de 7 bilhões de reais em 2008, cinco, seis
anos atrás, para 21, 22 bilhões, comportamento, inclusive, semelhante do
Banco do Nordeste aqui presidido pelo presidente Ari. Mas esse patamar
reflete hoje, exatamente, presidente Sergio Machado, o patamar que repre-
senta a economia. Hoje eu fiz o cálculo, vindo para, o Banco saiu de 8% e
atingiu em 2012, agora no primeiro semestre de 2013, 13,5% dos seus desem-
bolso no Nordeste. Então, tem um teto que a gente precisa transpor, e esse
tipo de transposição, de elevação, o BNDES não faz só. Nenhum banco de
desenvolvimento faz isso sozinho. Então, é nesse tipo de movimento, com
esse tipo de projeto mobilizador da região, procurando uma coordenação,
33RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
procurando uma integração, que a gente consegue enxergar políticas de de-
senvolvimento, estratégias de desenvolvimento, que possam tornar oportu-
na a atuação de um banco de desenvolvimento, seja ele um banco nacional,
seja um banco regional como no caso do BNB.
O que ocorreu nesses últimos anos, tanto por parte do BNDES como por
parte do Banco do Nordeste, foi um ciclo importante na região, uma con-
tratação de projetos significativos, que elevou o patamar de financiamento.
Mas se a gente olha no longo prazo, como disse o presidente Sergio, a gente
não enxerga um ciclo com uma continuidade que garanta a região saltar de
patamar e reduzir desigualdades históricas dessas aqui já narradas, que são
representadas pelo produto e são representadas pela renda.
Eu sou filho, Nicolle, de professor universitário, um doutor especialista
em desenvolvimento regional. Então, tem mais ou menos uns trinta anos que
escuto essa mesma conversa, que a gente está tendo aqui hoje, e essa per-
cepção de que um dia a gente chega lá. Mas sou otimista, não perdi ainda
as esperanças.
Eu queria finalizar mencionando aqui um parágrafo, (que vou pedir per-
missão para ler esse parágrafo), que diz o seguinte, Nicolle: “A ideia básica,
por conseguinte, é a de que o governo terá uma só política de desenvolvi-
mento em relação ao Nordeste. Para este fim, a SUDENE deverá congregar
os dirigentes das agências governamentais mais importantes na área, coor-
denando planos de todas elas, a serem feitos em cooperação com técnicos
do órgão integrador.”
34
Essa frase é de 1959, do Mestre Celso Furtado. Eu retirei da última pu-
blicação do Instituto Celso Furtado, O Essencial da Operação Nordeste. Eu
não trouxe essa frase, não com caráter saudosista, acho que essa frase tem
uma representação, presidente Sergio e Nicolle, secretário Alexandre, tenho
ouvido repetidamente palavras como coordenação, integração, congregar,
ou seja, tudo a ver com o que a gente está discutindo aqui hoje e com esse
projeto, a que esse projeto se propõe. Eu acho que é um processo de coor-
denação, um processo de integração, que vai nos trazer força, e eu queria
deixar aqui os votos de sucesso e dizer que o BNDES está junto nesse proje-
to, participamos de todas as etapas, a última, inclusive, o workshop realizado
no Rio de Janeiro, e estamos aqui nesses três dias com vocês, enfim, para
o que der e vier, e para os nossos próximos passos, como disse o presidente
Roberto, que agora é que o jogo começa. Obrigado.”
Cerimonialista: “Senhoras e senhores, convido neste momento a usar da
palavra, a senhora presidente do Centro Industrial do Ceará e Coordenadora
do Integra Brasil Nordeste, Nicolle Barbosa.”
Nicolle Barbosa “Boa noite a todos. Obrigada pela presença de cada um dos
amigos que aqui estão presentes. Quero dizer que essa hora da saudação
é sempre muito difícil, porque são tantos os apoios que temos recebido ao
longo dessa caminhada à frente do CIC, que me sinto sempre em falta com
todos. Mas hoje vou saudar a mesa e o auditório nas pessoas de quatro pre-
35RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
sidentes do CIC, que nos enchem de orgulho por suas trajetórias de vida e
estão presentes aqui: Sergio Machado, Fernando Cirino, Alexandre Pereira e
Lima Matos. E dizer que vocês são um exemplo para a nova geração.
Senhoras e senhores, estamos aqui reunidos para fazer política. Mas, fiquem
tranquilos. A prática política que iniciamos nesta acalorada noite nordestina
nada tem daquela que alguns profissionais do ramo teimam em metamorfo-
sear entre os holofotes dos palanques e a penumbra de palácios.
Com o Integra Brasil, estamos reunindo alagoanos, baianos, maranhen-
ses, potiguares, sergipanos, paraibanos, pernambucanos, piauienses, cea-
renses e demais nordestinos de todo o país para construir uma nova prática,
assentada no que nos ensina Milton Santos, para fazer política como a arte
de pensar as mudanças e de criar condições para torná-las efetivas. E este
novo fazer política exige uma mudança verdadeiramente histórica da reali-
dade ora vivenciada pelo povo do Nordeste e pelo Brasil.
Nestes últimos quinze meses, o Integra Brasil nos tem convencido de que
esta mudança somente provirá daqueles que, de fato, experimentam cotidia-
namente o viver, o conviver, o produzir, o partilhar, nesse território. Por isso,
temos trabalhado intensamente para fazer emergir dentre nós uma nova
política, fruto da interação entre os mais diferentes atores sociais que por
aqui habitam. Entendemos que somente juntos, a múltiplas mãos, a múlti-
plas cabeças, conseguiremos pensar em construir dialogicamente um outro
Nordeste e um outro Brasil.
36
Desde o começo, temos insistido na necessidade de dissipar de vez a
crença comum de que o Nordeste é, o que a olhos diversos tem parecido
ser, um pedinte. E, para tanto, buscamos considerar discutir e questionar
as diferentes visões do ser e do fazer nordestino. Nessa busca, facilmente
encontramos uma visão que expõe ao mundo um Nordeste frágil, dependen-
te, incapaz de construir a sua própria história. A outra, que retrata o Nor-
deste como ele foi, e até então tem sido, provedor de mão de obra barata
e consumidor submisso do que se produz ao largo de suas fronteiras. Mas,
acreditamos na força de uma terceira visão, que projeta o Nordeste como
ele pode ser: um celeiro de riquezas, repleto de ideias, de lógicas e soluções
para um outro Brasil, um Brasil com sotaque e modo de viver e ser bem mais
nordestino.
E hoje, após todos esses meses de intensas atividades com o Integra Bra-
sil, nos parece cada vez mais claro que as mudanças necessárias à con-
cretização deste país que tanto queremos, não virão dos poderes políticos
aí estabelecidos do modo como estão, viciados a uma droga que teima em
permanecer visceralmente entranhada na corrente sanguínea da sociedade,
em suas mais diferentes instâncias: a corrupção.
As mudanças necessárias suscitam um novo poder, bem mais transpa-
rente e consequente, bem mais comprometido com sustentabilidade em seu
sentido lato.
Um poder que sabiamente e anarquicamente, as massas já começaram a
formar de modo espontâneo nas ruas, nas praças e nos parques desse país
37RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
inteiro. E aqui, abro um parêntese para um alerta: é preciso, presidente Ser-
gio Machado, que estejamos abertos para aprender com as massas, pois se
não tivermos a sabedoria de ouvir o eco que delas emana talvez estejamos
fadados a mais uma vez perdermos o bonde da história.
Senhoras e senhores, o modelo pensado no Integra Brasil entende que
as mudanças desejadas, efetivamente, deverão sair de cada um e de todos
os estados nordestinos. E, em respeito à diversidade regional, o Integra Bra-
sil pede que cada estado elabore, a partir de suas características próprias,
alternativas de desenvolvimento que contemplem suas preocupações de
ordem social, ecológica, cultural e econômica. Isto feito, o movimento se
compromete a articular e integrar estas alternativas em um projeto único
de afirmação regional.
Ao longo do processo, há que se considerar o fato de que precisamos dei-
xar de agir como uma região passiva, que aceita e obedece cegamente aos
desígnios da natureza, como a seca. E aos ditames das políticas federais,
que há tempos se mostram travestidos de caráter pseudo-regionais. Preci-
samos passar a agir como uma região ativa, articulada e dinâmica, ciente o
que e do quanto comparece eficazmente na contabilidade nacional, valori-
zando o peso de sua participação nesta seara, para assim saber reivindicar
e, se preciso impor as suas demandas.
A densidade e factibilidade histórica do Integra Brasil, hoje, depende da
maneira como iremos empreender as nossas discussões, e como faremos
para conduzir a conjunção de esforços e ideias aqui presentes nesta noite
38
e nos dois dias que se seguirão. O Integra Brasil hoje chega a um ponto de
inflexão.
Após discutir o conteúdo político e institucional do Nordeste, debater sua
situação atual e as transformações recentes, questionar as influências das
desigualdades intra-regionais, questionar os aspectos estratégicos para o
seu desenvolvimento e buscar entender como a região é vista de fora, é che-
gado o momento da síntese.
Neste seminário estamos reunindo, a um só tempo, à classe política, que
deveria inclusive estar aqui presente (se estiver algum, eu peço que levante
a mão, por favor). Por aí vocês vejam o tamanho do nosso desafio: mas nós
estamos aqui e vamos fazer. Não temos as canetas na mão para assinar,
mas vamos cobrar de quem tem.
Neste seminário estamos reunindo, a um só tempo, a classe política em
suas instâncias legislativa e executiva, tanto no contexto local quanto esta-
dual, regional e nacional. A classe empresarial, a academia e a sociedade
civil organizada, para debater questões essenciais para a promoção do Nor-
deste à condição de protagonista do cenário político e econômico nacional.
Nestes dois dias, discutiremos e proporemos soluções que considerem
uma reorientação econômica regional, uma revisão da infraestrutura que
precisamos, as transformações sociais urbanas e ambientais, educação,
ciência, tecnologia, inovação e cultura. Enfim, todos os fatores que exigem
de nós um novo olhar. Um olhar com foco na consolidação de um desen-
volvimento que se possa dizer, de fato, sustentável para o Nordeste e, por
39RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
extensão, para o Brasil. Daqui, haverá de nascer uma agenda comum que
una verdadeiramente o Nordeste, tanto internamente quanto em relação ao
resto do país, que aproxime de forma coerente e consequente os parlamen-
tos e os governos da sociedade. Fato este, aliás, que exigirá um envolvimento
direto de todos os governadores e de toda a bancada federal e estadual. Sim,
pois o Integra Brasil, apesar de ter nascido do setor produtivo, hoje integra
literalmente toda a sociedade. São professores, estudantes, profissionais li-
berais, empresários, religiosos, enfim, trabalhadores de todas as áreas, que
através deste movimento se propõem a oferecer à classe política uma ampla
e eficiente ferramenta de trabalho, uma verdadeira agenda estratégica para
o Nordeste. Porém, a eficácia da implementação desta agenda dependerá,
visceralmente, do envolvimento e comprometimento dos senhores, que não
estão presentes: governadores, senadores e deputados. Afinal, são eles que
detêm a voz e são eles que manuseiam as canetas. Mas somos nós, a socie-
dade, que detemos a energia provedora e renovadora do desenvolvimento,
seja ele político, econômico, ecológico, cultural ou social. E entendemos que
somente da sincronia entre estes poderes, o poder político e o poder da so-
ciedade, é que haveremos de conseguir dar ao Nordeste o papel que acredi-
tamos que lhe é devido.
E me permitam, mais uma vez, relembrar que os movimentos que emer-
gem das ruas querem nos falar bem mais do que pode parecer. Eles recla-
mam um outro modo de fazer política, um outro modo de promover desen-
volvimento. A política reclamada já esteve nos palanques, nos pré-planos
40
de governo, aqueles que foram expostos durante as campanhas. Aqueles
planos que falavam de educação, de saúde, de segurança, de saneamento,
de fomento à dignidade econômica presente no trabalho, com a veemência
pedida pelo voto.
O modelo de desenvolvimento reclamado nos parece guardar as caracte-
rísticas do modelo pregado por Amartya Sen, em sua obra “Desenvolvimen-
to como Liberdade”. As ruas pedem que se removam as principais fontes de
privação de liberdade: pobreza e tirania, carência de oportunidades econô-
micas e destituição social sistemática, negligência dos serviços e intolerân-
cia, ou interferência excessiva dos estados repressores. Acreditamos, ainda,
que o desenvolvimento clamado não pode prescindir do amplo uso dos mer-
cados, sem a exclusão, é claro, do papel do custeio social, da regulamenta-
ção pública, nem tampouco da boa condução dos negócios do estado, de
modo a enriquecer ao invés de empobrecer cada vez mais as possibilidades
de vida da população.
As ruas falam das mesmas liberdades propostas por Sen, que, mais que
fins primordiais do desenvolvimento, são seus principais meios. Falam das
liberdades políticas que ajudam a promover a segurança econômica. Das
oportunidades sociais que facilitam a participação econômica. Das facilida-
des econômicas que ajudam a gerar abundância individual e coletiva. Expli-
citam claramente que, somente com as oportunidades sociais adequadas,
os indivíduos serão capazes de, efetivamente, moldar seu próprio destino e
ajudar uns aos outros.
41RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
E para que estas oportunidades clamadas abundem, precisamos ter par-
lamentos e executivos repletos de políticos que pratiquem a arte da coerên-
cia ética, entre o falar e o fazer, entre o prometer e o realizar.
Para que as populações futuras vivam um outro Nordeste e um outro Bra-
sil, precisamos de uma outra prática política, capaz de mostrar as pessoas
algo que os verdadeiros educadores chamam de pedagogia do exemplo.
Senhoras e senhores, quero encerrar minhas palavras relembrando mais
uma vez Amartya Sen, quando nos diz que: expandir as liberdades que te-
mos razão para valorizar, não só torna nossas vidas mais ricas e mais de-
simpedidas, como permite que sejamos seres sociais mais completos, pon-
do em prática nossas volições, interagindo com o mundo em que vivemos e
influenciando esse mundo.
Por tudo que disse até aqui, acredito ser lícito concluir afirmando que o
futuro do Nordeste são muitos. E resultarão de arranjos diferentes, segundo
o nosso grau de consciência e coerência, entre o reino das possibilidades e
o reino das vontades. Acredito ser assim que as iniciativas do Integra Brasil
deverão ser articuladas. E que os tradicionais e novos obstáculos serão su-
perados, permitindo a nós contrariar as forças das estruturas dominantes,
sejam elas presentes ou herdadas. Ao contrário do que possa parecer a
muitos, a história do Nordeste do Brasil não acabou, ela apenas começa.
Que sejamos nós os responsáveis diretos por sua longa e rica escritura.
Vamos construir todos juntos um país realmente forte, porque o Brasil pode
muito mais.
42
Boa noite a todos. Muito obrigada. Não vale me emocionar demais. Eu
queria pedir a permissão de vocês para quebrar o protocolo e chamar aqui,
na tribuna, uma pessoa muito importante nesse movimento Integra Brasil;
uma das pessoas muito importantes, porque são muitas. Mas ele, meu con-
selheiro na presidência do CIC, vice-presidente da FIEC, tem emprestado
sua sabedoria, seus conhecimentos e sua força em tudo que vocês possam
imaginar; inclusive, financeira, quando o dinheiro não tem ele tira do bolso,
vai lá e coloca. Quero chamar aqui, com muita honra, Carlos Prado.”
Carlos Prado “Como o protocolo foi quebrado, eu não sou obrigado a res-
peitá-lo, não é? Mas, eu começo corrigindo a nossa presidente Nicolle, por-
que ela citou vários nordestinos: o piauiense, o cearense, o maranhense,
enfim, todos eles. Mas se esqueceu de um. Esqueceu-se do nordestino com
sotaque do interior de São Paulo. Esse nordestino que, na próxima semana,
honrosamente, recebe o título de Cidadão Cearense, concedido pela nossa
Assembleia.
Mas, minha gente, a minha indignação é realmente muito grande. In-
dignação de quem vive aqui há quarenta anos, que vive aqui trabalhando
o Semiárido dessa região, Semiárido da Bahia, do Piauí e aqui do Ceará,
Semiárido onde nós conseguimos produzir frutas da melhor qualidade para
o Brasil e para o Mundo, e nessas experiências a gente aprende como é duro
empreender, como é duro fazer alguma coisa aqui no Nordeste. Se é difícil
ser empresário no Brasil, imagine no Nordeste. O empresário que consegue
43RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
fazer alguma coisa aqui no Nordeste, ele está preparado para fazer qualquer
coisa em qualquer lugar do mundo.
E nessa caminhada foi que a gente foi se indignando cada vez mais, par-
ticipando de vários seminários que acabavam terminando num simples rela-
tório. Isso durante quarenta anos, desde o CIC, do nosso presidente Sergio
Machado, até os dias de hoje. E essa indignação é que faz com que a gente
pense que algo tem que ser mudado. E aí é que eu ressalto a grande impor-
tância de que esse movimento não perca o seu foco. E qual é o foco? Nós
precisamos sair do pires da mão e partir para uma atitude mais negocial. É
ver aquilo que nós temos de valor e que pode ser colocado numa mesa de
negociação, com relação ao restante do Brasil.
Não se mantém um país, não se mantém uma união federativa com tan-
ta desigualdade entre suas regiões. Uma desigualdade que se eterniza por
mais de setenta anos, segundo o próprio IBGE, que nas suas estatísticas
mostra que nesses últimos setenta anos o Nordeste nunca conseguiu um
PIB per capita que passasse de 50% com relação à média nacional. Isso com
SUDENE, com Banco do Nordeste, CODEVASP, DNOCS, todas essas insti-
tuições que nós vimos serem criadas para desenvolver esta região. Ora, se
todas essas tentativas não deram certo; porque o Nordeste não deixou de
se desenvolver, mas ele mantém a distância, mantém a desigualdade com
relação ao restante do Brasil. É isso que nós temos que mudar. Só que essa
mudança não depende de quem está fora da região, ela depende primeira-
mente de uma atitude de nós, nordestinos, de nos sentirmos inconformados
44
com isso, sair da nossa passividade e começar a pensar que alguma coisa
pode ser mudada. E pode ser mudada? Como não? Se nós pensarmos que o
Nordeste é responsável por 65% do superávit comercial do Sudeste, quando
nós compramos nossos carros, quando nós compramos os produtos indus-
trializados do Sudeste, que já vêm carregados de impostos; produtos que
se nós fossemos comprar num outro país, nós pagaríamos um preço que
talvez fosse a metade. Isso significa o mercado cativo. Nós somos o mer-
cado cativo da zona mais desenvolvida do país; isso tem um valor. Aqui nós
temos vários empresários que sabem o quanto vale um mercado, o quanto
vale um cliente, que merece ser tratado na palma da mão. E qual é o trata-
mento que o resto do Brasil nos dá? Isso tem um valor. Então, vamos colocar
isso na mesa de negociação. Para manter esse mercado cativo, o que essa
região mais desenvolvida pode dar em troca? Não existe país que se man-
tenha com uma desigualdade como essa. Só que para resolver o problema
da desigualdade, nós precisamos que haja uma política central que possa
fazer esse trabalho político. E essa colocação, essa conclusão a que chegou
essa equipe que trabalha o Integra Brasil foi de que o único caminho era que
nós procurássemos levantar os dados, que já existem nas gavetas, nas pra-
teleiras, começássemos a pinçar aquilo que realmente tem de valor aqui no
Nordeste, para que nós pudéssemos assumir uma atitude negocial.
E esse é o foco que nós temos que levar nessas reuniões que nós vamos
ter durante esses dois dias, para que a gente encaminhe os questionamen-
tos, o material que nós teremos para trabalhar, de uma forma que a gente
45RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
coloque uma nova situação, uma nova abordagem, para discutir essa de-
sigualdade do Nordeste. Essa região tem um potencial extraordinário. Um
potencial que só vai se realizar no momento em que nós tomarmos uma ati-
tude. Porque não é lá fora que vão acreditar no Nordeste, primeiro nós nor-
destinos temos que acreditar em nós mesmos. Uma boa noite.”
Cerimonialista: “Encerrando esta solenidade, ouviremos agora a palavra do
Excelentíssimo senhor presidente do Conselho Estadual de Desenvolvimen-
to Econômico do Ceará, Alexandre Pereira, que neste ato representa Sua
Excelência, o senhor governador Cid Ferreira Gomes.
Alexandre Pereira “Boa noite a todos. Eu, como bom cearense, vou começar
fazendo aqui uma propaganda de um filme, não sei se os senhores assisti-
ram o “Cine Holliúdy”, que está passando, que fala da saga do cearense. E lá
tem o ator principal que é o Francisgleidson, que tem uma mulher que para
mim é a atriz principal, porque é a heroína do filme, mostra a tenacidade da
mulher cearense, a leveza, a decisão. E eu passei o filme todo tempo me lem-
brando de uma pessoa. E era exatamente da Nicolle. Comentei com a minha
mulher, falando, olha, Bebel, essa menina parece demais com a Nicolle. Mas
parece pela decisão, pela leveza, pelo charme. Então, Nicolle, você repre-
senta exatamente, você e a Graciosa, que é a mulher do Francisgleidson no
filme, representam exatamente a mulher cearense. Parabéns por tudo que
você tem feito pelo nosso Ceará.
46
Meu caro Roberto Macêdo, nosso presidente da nossa Federação das In-
dústrias. Meu caro Sergio Machado, que eu gostei muito quando ele falou
que estava aqui não como presidente da TRANSPETRO; o Senador Sergio
Machado, ex-deputado federal, que estava aqui como ex-presidente do CIC.
Eu também, Senador, estou aqui também não como secretário, mas como
ex-presidente do CIC. E esse idealismo que move os ex-presidentes do CIC e
a atual presidente do CIC. Aqui tem o Fernando Cirino que é um apaixonado
pelo Ceará; o Fernando Cirino sempre que pode está trabalhando pelo Cea-
rá. Não só pelas empresas, mas de uma forma geral.
Antes de ontem, o Lima Matos, que também foi presidente do CIC, estava
no Governo discutindo logística; parecia que ele era também presidente do
CIC, secretário da Fazenda que foi há vinte e poucos anos atrás. Então, as-
sim, essas lideranças, eu me incluo nelas, somos verdadeiros apaixonados
pelo nosso estado. Eu acho que é isso que move essa vontade de mudar o
nosso Ceará.
Permita à mesa saudar todos os integrantes na pessoa do presidente do
Banco do Nordeste, o Ary Joel, pelo adiantado da hora, e trazer aqui um
abraço e um pedido de desculpas do governador Cid Gomes. Até hoje de
manhã estava na sua agenda, e ele empolgado em vir para o evento, pela im-
portância do evento, e ele foi chamado pelo ministro Mercadante, que tinha
uma reunião amanhã à tarde, e antecipou a reunião para o início da manhã,
e ele teve que viajar agora à noite. Infelizmente, ele não pôde estar aqui, mas
ele foi um dos grandes entusiastas, a Nicolle sabe disso. No início, quando
47RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
um grupo junto da Nicolle e Carlos Prado, enfim, tantos que estiveram lá,
e ele na mesma hora ligou para o presidente do BNDES, ligou para o presi-
dente do Banco do Nordeste, para os Ministros, empolgado com esse novo
momento do Estado do Ceará.
Eu quero também saudar os empresários aqui presentes, todos na pessoa
do meu querido amigo Beto Studart, esse nosso líder empresarial aqui pre-
sente, um exemplo também de cearense.
E dizer a vocês que o Estado do Ceará vem fazendo o seu papel. Nós esta-
mos, por exemplo, com um equipamento que mostra a ousadia do cearense.
O Governo do Estado do Ceará tem feito as grandes obras de infraestrutura
que o nosso estado precisa para o grande crescimento dos próximos dez
anos. Os senhores que conhecem o Complexo Industrial Portuário do Pe-
cém, que não é só o Porto do Pecém, mas toda uma estrutura de retroporto
que existe e um plano diretor já definido, com uma siderúrgica que está sen-
do montada. Mas isso é pouco, isso é muito pouco. Nós precisamos de mais
apoio do governo federal, nós precisamos de mais Integra Brasil, de mais
estrutura de discussão.
O Nordeste precisa ser tratado de forma desigual. Nós não podemos tra-
tar os desiguais de forma igual. E, evidentemente, hoje eu estava de ma-
nhã em Brasília, no Conselho Nacional de secretários de Desenvolvimento
Econômico - CONSEDIC, que é a reunião de todos os secretários de desen-
volvimento econômico do Brasil, e tem uma discussão que paira hoje no
Conselho Nacional de Política Fazendária - CONFAZ que é a questão dos in-
48
centivos fiscais. Eu não gosto de falar de guerra fiscal, porque guerra fiscal
foi o nome que os nossos irmãos do Sudeste colocaram; o que eles chamam
de guerra fiscal eu chamo de oportunidade de emprego, eu chamo de desen-
volvimento, de melhoria de IDH, de combate ao Semiárido.
Não dá para gente pensar em trazer uma grande indústria de lá, do Su-
deste, se nós não tivermos incentivos fiscais aqui para dar. E o presidente do
nosso CONSEDIC, que é de Goiás, hoje discutia comigo, conversando, para
que nós começássemos a pensar em um plano de incentivos fiscais que fos-
se inversamente proporcional ao PIB de cada estado. Claro, essa pode ser
uma grande discussão. Nós não podemos prescindir de dar os incentivos
fiscais para as empresas virem para o Ceará. Um paulista, hoje cearense,
como Carlos Prado, que hoje está aqui conosco, mas quando ele veio pra
cá, ele veio com os incentivos que o estado poderia lhe dar. Então, nós não
podemos tratar os desiguais de forma igual.
Eu tenho comentado muito da importância que um apoio do governo
federal, por exemplo; nos últimos oito anos, no governo Lula, foi dado um
apoio muito forte para o Estado de Pernambuco. Sem aqui fazer nenhum
tipo de crítica, absolutamente. É importante, mas o Ceará também precisa.
O Estado do Maranhão também precisa, não é Robson, nós precisamos da
refinaria. E esse trabalho da refinaria, por que eu tenho discutido, que o
governador Cid Gomes tem tanto batalhado, depende exclusivamente da
boa vontade do governo federal, exclusivamente da boa vontade da PE-
TROBRÁS. E agora está muito bom com essa elevação do câmbio, porque
49RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
o déficit da importação de combustíveis que o Brasil precisa fazer ainda
ficou maior.
Então, é importante que aqui no Integra Brasil também nós possamos dis-
cutir a importância desses grandes projetos para o nosso estado. E finalizando,
quero dizer que o que será discutido aqui, Nicolle, a importância do documento
final que será discutido aqui no Integra Brasil, e que vem sendo discutido nos
outros fóruns, nos outros estados, que ele sirva sim de pauta em 2014.
2014 será um ano diferente de eleições. O movimento das ruas está mos-
trando isso. Mas, se nós, empresários, profissionais liberais, estudantes, po-
líticos, cobrarmos dos candidatos a governadores em 2014, dos candidatos a
presidente em 2014, que eles tenham um compromisso para um tratamento
diferente para o Nordeste, então, a importância desse momento é rica. Até
porque, eu estive em Pernambuco no último seminário, e lá o governador
Eduardo Campos estava presente e se comprometeu, em sendo candidato
ou não, mas o que a pauta do que o Integra Brasil definisse seria levado para
discussão em 2014.
Então, deixo aqui o apoio irrestrito do Governo do Estado do Ceará, Nicol-
le, o apoio do governador Cid Gomes, e lhe da os parabéns por essa sua lide-
rança, e parabéns a todos que estão juntos pensando um Ceará, pensando
um Nordeste, pensando um Brasil melhores.
Obrigado. Boa noite.”
Painel 1: Reorientação da Economia Nordestina
Moderador
Roberto Proença MacêdoPresidente da Federação das Indústrias do Estado do Ceará - FIEC
Expositores
Jorge Saba ArbacheAssessor Econômico da Presidência do BNDES e professor de Economia da Universidade de Brasília - UnB
Armando AvenaEconomista, professor da UFBA e mestre em Planejamento Global pela CEPAL
Augusto TogniGerente Adjunto de Desenvolvimento Territorial do SEBRAE Nacional e Coordenador Nacional do Programa SEBRAE nos territórios da Cidadania
Relator
Adriano SarquisDoutor em Economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ e diretor de Estudos Econômicos do Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará - IPECE
53RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
PAINEL 1
REORIENTAÇÃO DA ECONOMIA NORDESTINA
QUESTÕES A SEREM RESPONDIDAS PELOS EXPOSITORES
Quais os caminhos para uma integração produtiva virtuosa da econo-
mia nordestina na economia nacional e internacional?
Como poderá o Nordeste transformar as vantagens comparativas em
vantagens competitivas em nível nacional e internacional?
Como tornar o Nordeste atrativo para o investidor nacional e internacional?
Que vantagens poderá tirar o Nordeste da nova configuração econômica
mundial que decorre do processo de globalização?
Que setores de atividade – tradicionais, modernos ou inovadores – pode-
rão garantir o desenvolvimento auto sustentado do Nordeste?
Como construir uma economia moderna, inovadora, competitiva e adap-
tada ao meio ambiente no Semiárido nordestino?
54
Por que se tem aproveitado tão pouco o potencial do Semiárido nordesti-
no, notadamente quanto a fruticultura, piscicultura, avicultura, ovinocapri-
nocultura, entre outras atividades econômicas?
Cerimonialista: Abrindo a nossas programação desta manhã neste auditó-
rio assistiremos em instante o painel que nos trás o tema Reorientação da
Economia Nordestina.
Para exercer a função de moderador, convido ao palco o senhor presi-
dente da Federação das Indústrias do Estado do Ceará, Roberto Proença
de Macedo. Convido ao palco os expositores desta manhã, senhor Jorge
Saba Arbache assessor, econômico da presidência do BNDES e professor
de economia da UnB. Senhor Armando Avena, economista, professor da
Universidade Federal da Bahia e Mestre em Planejamento Global pela CE-
PAL. Senhor Augusto Togni, gerente adjunto de Desenvolvimento Territorial
do SEBRAE Nacional e Coordenador Nacional do Programa SEBRAE nos
territórios da cidadania. Para exercer a função de relator, convido ao palco
o doutor em economia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, Adriano
Sarquis que é diretor de estudos econômicos do Instituto de Pesquisa Estra-
tégica e Econômica do Ceará.
Roberto Macêdo: Bom dia a todos, eu gostaria de cumprimentar a mesa, o
Jorge Abache, que é assessor econômico da presidência do BNDES, pro-
fessor de economia, que tem nos ajudado também na Federação das Indús-
55RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
trias. Dr. Armando Avena, economista, professor da Universidade Federal
da Bahia e Mestre em Planejamento Global pela CEPAL, está aqui, muito
obrigado. Augusto Togni, gerente adjunto de Desenvolvimento Territorial do
SEBRAE Nacional, muito obrigado pela presença, e dr. Adriano Sarquis, que
está como nosso relator, doutor em Economia da Universidade Federal do
Rio de Janeiro. Espero que tenhamos aqui uma manhã profícua, e tenhamos
respostas. Conversando com Jorge Arbache, ele disse que não vai respon-
der e sim irá dar palpites, portando, que tenhamos bons palpites para o bom
encaminhamento do nosso trabalho.
A todos que já tiveram oportunidade de conhecer um pouco desse pro-
grama no nosso Integra Brasil, o nosso foco é realmente ter o Nordeste como
projeto, ter o Nordeste como objetivo em avançar e se integrar ao Brasil
de uma forma bem diferente do que vem acontecendo até agora e princi-
palmente encontrarmos caminhos, ideias, programas que sejam abraçados
por todos os Estados nordestinos numa união indispensável para que esse
programa avance e dê o resultado esperado.
De modo que os que estão vindo de outros estados e estão aqui levem de
volta para suas bases ideias que aqui ouviram e o material que será produzido e
colocado à disposição de todos os participantes, de toda a comunidade, de todo
o Nordeste, de todas as instituições, universidades, setor político, governo cen-
tral, enfim, tudo que saia daqui seja usado como ferramenta para orientar essa
nossa integração do Nordeste no cenário nacional. Que sejamos colocados
mais em vista e que tenhamos realmente outra posição perante a nossa nação.
56
Ontem, na abertura, nós tivemos aqui as palavras do Carlos Prado, onde
ele já abriu suas palavras dizendo da sua indignação de como nós estamos
estagnados há quarenta anos, que ele completou agora no mês de agosto
como tendo Ceará como seu estado, essa indignação com certeza tocou a
todos que estavam presentes, não dá mais para nós ficarmos achando que
os outros irão resolver os nossos problemas, temos que buscar e indicar as
soluções que queremos e necessitamos para nossa região. Desta forma e
com esse espírito, gostaria de passar a palavra para nosso primeiro exposi-
tor, Jorge Arbache.
Jorge Arbache: Bom dia a todos, eu queria agradecer por esse honroso
convite. Para mim é uma grande alegria estar aqui nesta manhã tratando
de um assunto tão relevante, não só para o presente mas também para o
futuro do Brasil, que são as questões que podem contribuir para o avan-
ço da região Nordeste. Irei falar mais na minha condição de professor de
economia e menos na minha condição de BNDES para que o presidente
Luciano, que estará aqui amanhã, traga a mensagem oficial do banco. Irei
tentar levantar questões que poderão ser úteis para responder três das
várias perguntas que foram colocadas para os expositores, e as perguntas
são: Quais são os caminhos para uma integração produtiva virtuosa da
economia nordestina na economia nacional e internacional? Que setores
de atividades são tradicionais, modernos ou inovadores poderão garantir o
desenvolvimento autossustentado do Nordeste? Como poderá o Nordeste
57RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
transformar as suas comparativas por vantagens competitivas em nível
nacional e internacional?
Então, eu vou tentar colocar elementos no debate do que tentar respon-
der a essas perguntas. Bom, antes de começar a levantar esses elementos,
vamos contextualizar o mundo em que vivemos. A gente vive num mundo
em que muitas coisas extraordinárias estão acontecendo. Uma delas, claro,
é a globalização das informações, tecnologias e muito maior conectividade
que existe entre as pessoas, entre as economias, os estados, as empresas.
Mas, muito mais importante do que a globalização, é um dos efeitos desta
globalização que é a crescente interdependência que existe entre pessoas,
empresas e países, o que tem o efeito extremamente importante em termos
de redução do espaço de manobra que empresas e governos têm para fazer
suas políticas públicas e privadas e, por conta dessa crescente interdepen-
dência, o preço de se fazer algo errado, ou de se deixar de fazer algo que seja
importante, é pago um preço maior que o preço que se paga hoje, é muito
maior do que era ontem e o preço que se pagará amanhã será ainda maior, e
essa questão é fundamental para nossa discussão.
Uma segunda questão importante é uma crise econômica e todos os ter-
mos de incerteza que ela tem criado no mundo; uma crise sem precedentes
com grande impactos no mercado financeiro, no acesso ao crédito, que tam-
bém ajuda a determinar o presente e o futuro. Uma terceira questão são as
políticas no campo da política monetária, 85 bilhões de dólares de emissão
de moeda mensalmente por parte dos Estados Unidos, políticas que eram
58
impensáveis há pouco tempo atrás, que se fossem colocados em prática
por um país latino americano, digamos, seria super condenada por todo o
mundo, mas hoje está aí na praça e ajudando a determinar o futuro e moldan-
do o presente. Uma quarta questão é a dos países emergentes que mudam
toda a configuração, não só econômica mas também do balanço, questões
demográficas, questões tecnológicas, inovação e a distribuição dessas tec-
nologias e dos respectivos impactos.
Outra questão, claro, é a China, um elemento absolutamente novo não só
no ponto de vista econômico, mas o ponto de vista da pobreza, da contabili-
zação da pobreza, do ponto de vista do comércio internacional, do ponto de
vista também do balanço, e do ponto de vista do impacto que a China tem
não só nas economias maduras, mas também nas economias emergentes.
Veja, por exemplo, que o Brasil tem uma relação bilateral com China que
lembra uma relação Norte e Sul dos anos sessenta e tem muito pouco a ver
com o que se chama relações saudáveis, nada a ver, uma relação de depen-
dência se criando do Brasil com a China, Indonésia com a China, Malásia
com a China, de países da África com a China etc..
Temos a primavera árabe, tudo isso que estamos vendo, a Síria, Líbia, Egi-
to, e como isso ajuda a mudar não só as questões de preço de petróleo mas
também questões associadas, questões de incerteza no mercado financeiro,
impactos nos investimentos, nos fluxos de capitais, mudando a noção de
risco e segurança, e isso tem impactos profundos, de uma forma generali-
zada. Tem reduzido a diversificação da economia brasileira uma crescente
59RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
exposição a choques que é exatamente o que estamos vendo hoje, a desa-
celeração da China provocando profundos impactos na economia brasileira.
E o setor de commodities não resolve o problema do Brasil, ele é uma fonte
importante, mas está longe de resolver um problema de um país de duzentos
milhões de pessoas, mesmo toda a suposta panaceia da produção de grãos
que tem no sul do Piauí, leste da Bahia, oeste da Bahia, parte de Rondônia,
Mato Grosso, isso é muito bom e queremos isso tudo, e não queremos só
isso por várias razões: é que isso aí não emprega, a elasticidade da agricul-
tura é negativa, quanto mais ela cresce, mais ela desemprega por conta da
tecnologia.
A segunda razão é que esse setor é muito bom, mas demanda muitos
bens públicos e custa muito caro para a coletividade, ao mesmo tempo em
que o pagamento de impostos do setor de commodities é mínimo, é o mais
baixo de todos os setores; ele custa muito e paga pouco, e emprega pouco,
queremos industrializar a agribusiness, queremos a produção de tecnologia,
máquinas e equipamentos de GPS, engenharia, de tudo que tem em volta
para fazer o negócio funcionar com a alta tecnologia, é daqui que irá sair
a geração de emprego, impostos e o futuro do país, e não da produção de
grãos. Isso é uma grande bobagem em que podemos cair, queremos o grão,
sim, mas trans industrializar o sistema, que é muito mais do que isso.
O problema é que corremos o risco de perder importantes movimentos de
transformação que estão ocorrendo na economia do mundo: a revolução da
manufatura digital, a participação do Brasil, e também da região Nordeste,
60
nas cadeias internacionais de valor. Isso é uma questão séria e que requer
muita atenção. O que isso tudo tem a ver com nós todos, com o Brasil e o
Nordeste? Porque para crescer e ser competitivo é cada vez mais difícil, a
disputa pelo mercado ela está cada vez maior, estamos concorrendo com a
África, agora que entra em um processo de industrialização.
Roberto Macêdo: Iremos para o nosso segundo expositor, Armando Avena,
professor da Universidade da Bahia, Mestre em Planejamento Global pela
CEPAL.
Armando Avena: Bom dia a todos, é uma satisfação muito grande de estar
aqui discutindo as questões do Brasil e do Nordeste, especialmente neste
programa, nessa proposta do Integra Brasil, que eu creio ser a iniciativa mais
importante dos últimos tempos no Nordeste. O que nos faz unir a região Nor-
deste é o Semiárido. É preciso uma ação regional vinda do governo federal,
não pode ser uma política de cada Estado, tem que ser uma política regiona-
lizada, federal e com muito recurso; quanto mais recurso, melhor, mas não
pode, de repente, criar o plano safra do Semiárido, que não vai resolver, tem
que ser um programa de longo prazo, uma política regional, por isso tem que
ser uma ação efetiva do governo federal.
O PIB agropecuário da Bahia caiu ano passado 9%. Em um ano cair 9%
é dramático, imagine se fosse isso nos laranjais de São Paulo, na cana de
açúcar de São Paulo, então é preciso olhar a seca com outros olhos, a seca
61RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
precisa voltar a ser prioridade nacional. Mais não é só a seca, eu tenho regis-
trado um processo crescente de reconcentração dos recursos públicos da
União. A Constituição de oitenta e oito descentralizou a receita, mas, desde
então, e não é um governo, são vários, vem concentrando de novo os recur-
sos. As receitas em 1988 eram 76% compartilhadas com os Estados, ou seja,
IPI, imposto de renda, essas coisas eram compartilhadas com os Estados,
vinham através do Fundo de Participação. O município despenca, tem uma
pequena melhora e volta a despencar, as receitas compartilhadas, caia de
76% para 33%, enquanto que as receitas não compartilhadas, ou seja, con-
tribuições, Confins, essas contribuições toda, elas terminam, saindo de 24%
para 67%, então há nitidamente uma concentração.
Os gastos públicos, embora regionalizados, não mantêm a mesma pro-
porção. A concentração dos recursos é outro ponto. Aqui, além da lógica da
concentração, hoje o Nordeste tem 13,5% de PIB, esse é o último dado que
eu tenho disponível, pode estar até errado, mas não mudou ainda a lógica do
Brasil e do BNDES. É preciso quebrar a lógica, e quem quebra a lógica do
mercado é a política de desenvolvimento regional. Então, eu reconheço que
o BNDES avançou muito, mas ainda joga todos os anos 50% dos recursos de
financiamento e, por mais que tenha melhorado (eu quero frisar, aqui, a Bah-
ia se beneficiou muito com o estaleiro, com a energia eólica) mas a lógica
ainda concentra o sistema.
A concentração regional do investimento em ciência e tecnologia, se há
um futuro para esta região é se ela investir em ciência e tecnologia, e não
62
há nada de investimento na região, não há nada de investimento em relação
ao montante, porque se nós não quebrarmos essa lógica, eu insisto em di-
zer, se o governo federal não tiver uma política de desenvolvimento regional
para quebrar a lógica do mercado, nós seremos eternamente atrasados em
relação ao Sudeste do país.
É preciso fortalecer a região urbana, não há melhor forma de fazer isso
que colocando universidades, isso concentra a malha urbana, mas, enquan-
to não concentrar, enquanto não fizer cidades médias, que é onde ocorrem
as negociações, é preciso concentrar a malha urbana, ser um grande local
onde se faz negócios. A concentração das cidades está no eixo sudeste do
país, a gente tem pouco lá em cima, então é fundamental estabelecer um
programa de adensamento das cidades médias, eu digo isso há quinze anos.
Com ofertas de serviços básicos, a educação, a saúde têm melhorado por-
que essas políticas de fazer universidade, isso tudo não há qualquer duvida,
que é o melhor.
A concentração da infraestrutura no Sul e Sudeste do país, a divisão re-
gionalmente desequilibrada é obvia, a infraestrutura logística é voltada para
a conexão das demais regiões brasileiras ao Sudeste. É no Sudeste que está
o maior mercado, se eu quero reduzir a desigualdade regional eu tenho que
inverter essa lógica. Obrigado!
Roberto Macêdo: Vamos então agora dar continuidade com a palavra do
Augusto Togni, gerente adjunto de Desenvolvimento Territorial do SEBRAE
63RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Nacional e Coordenador Nacional do Programa SEBRAE nos territórios da
cidadania.
Augusto Togni: Bom dia a todos. Agradeço por estar compondo esta mesa,
participar deste debate. Cumprimento os demais expositores da mesa. A
intenção aqui é trazer um pouco do retrato e da participação das micro e
pequenas empresas brasileiras, os pequenos negócios brasileiros no cená-
rio do Nordeste, como um dos mecanismos catalisadores do processo de
desenvolvimento da região. Já tivemos a oportunidade de escutar esses nú-
meros do Nordeste; aqui já foi dito que vale destacar a questão de a região
representar o segundo colégio eleitoral brasileiro. Seja como sistema, força
e poder de capacidade de consumir. Políticas públicas, iniciativas que po-
dem viabilizar todo o respaldo, a responsabilidade identificada aqui na re-
gião. A questão do PIB, que representa 13,5% ao nacional, são dados de 2009,
terceira economia entre as regiões do país e tem quase um milhão e meio de
empresas existentes na região.
Temos dados de progresso dos últimos anos, podemos ver desde 2000 até
o presente momento. A evolução do IDH; temos um histórico, o último índice
apresentado foi em 2008 que representa 0,71; dentro dessa lógica, um pe-
queno decréscimo de 2005 a 2008, listei alguma, políticas públicas que vêm
sendo implementadas ao longo da ultima década. Com destaque do cres-
cimento da própria região não é suficiente, precisamos pensar ainda mais
em como despontar frente as demais regiões do Brasil, mas ele existe e é
64
fruto do que tem subsidiado esse debate, as proposições de que possamos
crescer cada vez mais, enfim, e trazer as soluções para as questões mais
problemáticas do Nordeste.
Dentro das políticas, temos o PAC, as grandes obras em andamento, o
programa Bolsa Família, o PRONAF, que é uma excelente alternativa para
virar crédito no meio rural, o próprio programa Território da Cidadania, que é
um mecanismo de organização das iniciativas ofertadas pelo governo fede-
ral, analisadas pelo Estado, onde há uma participação extremamente repre-
sentativa por parte dos comitês territoriais, que têm como responsabilidade
construir um plano de desenvolvimento a partir das suas necessidades, vo-
cações, ter um papel relevante nesse processo. Políticas como Brasil Maior,
Brasil sem Miséria, Minha Casa, Minha, Vida todas essas que, no fundo, tra-
balham com o propósito de gerar novas oportunidades de emprego, gerar
renda e, por consequência, expandir o próprio consumo, resultando num
processo de inclusão produtiva, que é um dos caminhos de produção para a
região Nordeste.
O que os pequenos negócios têm a ver com isso tudo? Nossa abordagem
sobre o futuro, fazendo uma prospecção das alternativas de inserção da eco-
nomia nordestina no Brasil e no mundo, ela é fruto de uma série de trabalhos,
e vou tentar desenvolver os trabalhos a partir de uma visão bastante realista
dos projetos que estão sendo desenvolvidos, e isso eu vou contar logo. Eu
também vou tratar de aspectos mais estruturantes do processo de desenvol-
vimento, eu não vou tratar de algumas políticas especificas desse processo,
65RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
mas aquilo que tem a capacidade de reestruturar o espaço da economia nor-
destina, e a Bahia em particular, que eu vou falar muito pouco aqui.
Vamos tentar identificar o que está em curso, aquilo que pode apontar
para possíveis conformações ou reconformações dessa economia e do es-
paço nordestino. Uma abordagem mais teórica, mas com efeitos práticos im-
portantes para que a gente possa pensar como é que podemos fazer alguma
analise e prospecções, pensar algumas alternativas para o desenvolvimento
do Nordeste e quais são os pré supostos que nós precisamos para não cair
no futurismo, fugir da análise mais cientifica. Depois, eu vou mostrar como
é que os investimentos ou quais são os investimentos que têm capacida-
de de formular, digamos, um novo processo de desenvolvimento. Esses que
estão sendo anunciados eu vou fazer aqui uma leitura da realidade, eu não
vou defender uma tese não vou dizer que tipo de desenvolvimento a gente
acha que seja o mais adequado, estou buscando dados da realidade, usando
uma abordagem teórica para fazer prospecção, então eu não estou falando
daquilo que deveria ser, que poderia ser, estou falando daquilo que está se
esboçando há algumas décadas, não é pouco tempo, porque são elementos
estruturais. Levantar duas alternativas radicais que podem ter meio termo
de inserção dessa economia e falar muito rapidamente sobre os desfrutes,
quem tira e quem poderá tirar proveito disso, quais são os espaços, setores
da economia e digamos setores sociais.
Como pressupostos, estou partindo do principio de que eu preciso de
uma base explicativa para o processo de desenvolvimento capitalista e
66
mundializado, preciso compreender que algumas coisas que aconteceram
nas ultimas décadas, no início da década de noventa, com abertura dos mer-
cados, mas isso vem acontecendo no mundo há muito mais tempo que é um
processo de descentralização das unidades de produção incentivados pela
forte presença da informática, dos meios de comunicação que permitiram
que esses fluxos de capitais pudessem se instalar em diversas regiões do
mundo, e que essas diversas unidades pudessem ser linkadas, articuladas
por essas redes de comunicação, por essa gestão de negócios, que normal-
mente tendema acontecer nessas grandes metrópoles, para compreender
esse processo numa escala mundial. Significa dizer o seguinte: quando você
expande, descentraliza esse projeto de produção, você vai para diversas re-
giões do mundo, não todas as regiões, esse processo também é concentra-
do em algumas regiões, e em alguns espaços dessa região é extremamente
competitivo e ele tende à concentração espacial e isso pode ser visto em
alguns setores. Tem acontecido na Ásia com a intensidade de investimentos;
têm acontecido fugas em outras regiões do mundo e articulando um setor
financeiro que é fortíssimo e também concentrando as bolsas de Salvador.
Esse processo concentra também setores em espaço, o que significa dizer
que ele anda com uma velocidade muito grande, e tudo que anda com velo-
cidade marginaliza espaços e pessoas; este processo de concentração faz
com que o desenvolvimento regional seja diferente de antes, a unidade de
produção fala mais, pulsa mais com o território, tem menor relação com o
espaço do entorno, tem menor relação com as pessoas, com as repercus-
67RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
sões. É muito comum você fazer estudo de impacto ambiental, estudo de
impacto socioeconômico, prever repercussões importantes e, na realidade,
essas repercussões acontecem com muito pouca intensidade: significa di-
zer que nós estamos falando de uma escala mundial, que é extremamente
competitiva, e com reduções muito fortes de custos, concentrador. Para as
regiões que são mais pobres, eles tendem a ficar marginalizados do proces-
so, então, isso é uma tendência que, apesar de existir um leque de oportuni-
dades para você tentar incluir, a presença da gestão pública passa a ter uma
importância bastante significativa. Mas quero dizer também que a gente
sente, de forma muito clara, que essa capacidade de gerir esse processo do
ponto de vista da administração pública, há décadas, a gente vem perdendo
de forma sistemática, ou seja, nós estamos desaprendendo a fazer, e o que
precisa ser feito é muito mais complexo para ser feito hoje do que era antes,
hoje precisamos ter informações em uma escala mundial para saber lidar
com questões locais, algumas mundiais. Nós perdemos absolutamente a ca-
pacidade de pensar, de controlar ou até de ver, mas o que torna difícil fazer
hoje é que nós também estamos desqualificados para fazer.
Bom, é preciso que a gente identifique que alguns fatores exportadores
do futuro de suas lógicas especificam dos seus fluxos, é preciso a gente
perceber que hoje tem uma questão básica para esse novo processo de de-
senvolvimento que são as relações entre as regiões, os investimento em in-
fraestrutura. Era isso que eu tinha para dizer.
Muito Obrigado!
68
Adriano Sarquis: Eu acho que está na cabeça de todo mundo ainda, está
bem quente aqui, eu vou tentar só sumarizar os principais pontos levantados
pelos expositores, desde o dr. Jorge Arbache do BNDES, do dr. Avena pela
Bahia e o representante do Sebrae, Augusto Togni.
Jorge Abache: Na verdade houve um encadeamento das apresentações,
ele abordou muito a questão das mudanças, das grandes transformações
mundiais e nacionais, as mundiais estão impactando a nível nacional e eu
destacaria a questão da crise financeira internacional e as políticas adota-
das pelos países ricos, ele chamou atenção para isso, e os impactos, isso
ao nível dos demais países. Levantou a questão dos bricks, a mudança no
balanço de poder da geopolítica mundial, a mudança na China em termos de
comércio internacional, do balanço de poder e os impactos que essa mudan-
ça da economia chinesa, que tornando-se mais capitalista e influenciando
as economias emergentes, e citou os casos de vários países, a dependência
econômica de vários países em relação à China. Também mencionou a ques-
tão da energia, a descoberta de novas fontes de energia, o gás de xisto nos
Estados Unidos, outras fontes, a parte ocidental da África, o petróleo, des-
cobriram muito petróleo. Ele discorreu também sobre a questão da profunda
transformação na geografia, da produção e da inovação mundial, essa nova
lógica de produção, uma relação entre a manufatura e o setor serviços. Des-
tacou que uma das maiores fontes de recuperação da economia americana
tem sido o setor industrial e, então, ele entrou muito nessa questão da pro-
69RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
dutividade, quer dizer, esses países provavelmente tem uma produtividade
elevada. A China, ao contrário do que se imagina, não produz só produtos de
baixa tecnologia, está produzindo produtos de alto conteúdo tecnológico e
está entrando, de forma importante, tanto ela quanto a China, na geografia
da inovação mundial. Isso seriam as grandes mudanças mundiais.
Em termos das transformações nacionais, ele destacou a emergência da
classe média e os impactos que isso tem em termos de mercado e na eco-
nomia brasileira, a possibilidade de desenvolvimento tecnológico decorren-
te da descoberta do pré-sal. Falou também, deu destaque e enfatizou uma
questão extremamente importante, que é a questão demográfica, o Brasil já
está praticamente esgotando, e se esgota daqui a dez anos, basicamente,
em 2023 o bônus demográfico, e destacou a nossa estrutura da economia, a
estagnação da produtividade; a gente te uma estrutura econômica baseada
fortemente em commodities e isso empobrece a nossa inserção internacio-
nal a inserção internacional do país, e aumenta também a exposição a cho-
ques em termos de troca. E, então, ele entrou na questão do indicador, que
ele citou, de densidade industrial, a gente tem uma baixa participação da
indústria em termos do PIB e também em termos de densidade industrial.
Mostrou que a produtividade por trabalhador é baixa, o Brasil na verdade
cresceu de sessenta para dois mil e doze 121%, e na verdade outros países
cresceram muito mais em termos de produtividade. Então, o Brasil tem uma
produtividade, tanto em nível de valores anuais, quanto em termos de cres-
cimento, muito baixo, e em nível de região também é baixa e cresce pouco
70
também. No caso do Nordeste, que é 47% da produtividade nacional, e au-
mentou, comparou dois anos que eu terminei não anotando, passou de 47
para 49% da produtividade, isso no caso do Nordeste.
Então, em nível de país, ele chamou atenção que o Brasil perdeu com-
petitividade e condições de concorrência com as economias mundiais, e o
Brasil corre o risco de perder espaço nessa integração, nesse novo contexto
de integração mundial, dado que a disputa por mercado é cada vez maior
e o espaço para se fazer políticas está diminuindo, e também tem a emer-
gência de novos atores, tanto na indústria como em vários outros setores.
Chamou atenção para a necessidade de buscar soluções sistêmicas para os
problemas tanto de natureza setorial e diversos outros problemas a nível de
setor público. É preciso adotar-se políticas mais inteligentes, com interven-
ções mais inteligentes. O crescimento requer hoje muito mais intensidade
de tecnologia, de inovação e de organização. Tem que saber o que se quer,
como ser competitivo, que ações sistêmicas são necessárias para tornar o
país mais competitivo. O governo deve facilitar a vida do empresário, as em-
presas têm que ser mais ambiciosas, mais ousadas, os empresários mais
empreendedores. Falou da necessidade de melhorar a produtividade das mi-
cro e pequenas empresas e a produtividade do setor de serviços, e principal-
mente aqui no Nordeste onde a proporção é maior.
E, então, dentro da proposta, ele mostrou a visão otimista de ascensão da
classe média, novos grupos demográficos que estão gerando novos negó-
cios, muitos investimentos na agenda de infraestrutura, em termos de estra-
71RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
da, portos, aeroportos. Falou da questão da agroindústria, da importância,
e dos programas das políticas públicas, o PAC, as PPP’s, e a explosão da
economia de muitas cidades do interior. A necessidade de modernização da
administração pública e a importância dos fundos de pensão. E, no caso
do Nordeste, como reorientação que era a questão básica que foi colocada
para os expositores, é preparar para aproveitar essas novas oportunidades
que estão sendo geradas por esse novo contexto de transformações, de mu-
danças, dentro do que ele mencionou, adaptar-se às mudanças e de reduzir
os riscos a essas mudanças, ser ousado, sair do convencional. As soluções
convencionais, aí ele deu destaque várias vezes na questão dos incentivos
fiscais aqui para o Nordeste, já não são capazes de resolver esses desafios
ou os problemas. Então, tem que construir atalhos, ser ousados.
Então, isso seriam os pontos mais importantes do dr. Jorge Abache.
O professor Armando Avena, ele foi bastante otimista na apresentação
dele, até para ser mais rápido aqui, eu acho nos citou vários números que
mostram os dados de forma eloquente, que o Nordeste vem realmente tem
passado por um grande dinamismo, vem apresentando avanços significati-
vos e aí citou vários dados para mostrar que o Nordeste não está paralisado,
há um dinamismo econômico industrial, a expansão industrial, ele deu des-
taque à formação de parques industriai de porte, citou o caso da indústria
da Bahia, mencionou vários exemplos no caso da Bahia e destacando que
a indústria no Nordeste, de qualquer forma, é pujante. Falou da moderniza-
ção da agropecuária, citou o caso de Mapitoba, Maranhão, Piauí, Tocantins
72
e Bahia, onde tem um destaque, uma vocação agrícola muito forte para a
agricultura irrigada. A ampliação do comércio e serviços, que tem gerado
transformação de renda e elevação decorrente, no caso, das transferências
de renda e elevação do salário mínimo. A distribuição do VTI passou de 5,7
em 70, para 9,3 no Nordeste, então, para mostrar que o Nordeste cresce, mas
permanece, em termos de participação tanto de emprego, de VTI nacional,
ele tem uma participação baixa.
No caso do setor agropecuário, ele comentou sobre a modernização loca-
lizada especialmente, você tem um setor agropecuário muito concentrado
na fruticultura e produção de grãos, destacou que a seca é um fenômeno
bastante negativo porque ela desorganiza a produção regional e o Brasil se
acostumou a essa convivência com a seca, todo ano, toda vez que ela ocor-
re termina o governo adotando aquelas medidas emergenciais, que termina
esterilizando o capital, recursos públicos, que são direcionados para essas
atividades relacionadas com a seca e que deixam de ser aplicados em ati-
vidades mais produtivas. O Nordeste, enfim, tem tido uma redução no valor
agregado pelo setor agropecuário, passou de 18% em 70 para 14% em 2010, e
destacou que os programas de transferência de renda têm ajudado bastante
na melhoria do Nordeste, até mesmo porque ele em influenciado outras ati-
vidades que estão se implantando na região Nordeste.
Então, na visão dele, o bolsa família é um bom programa, tem permitido
gerar essas mudanças a nível de comércio e outros serviços que tem se de-
senvolvido em cidades do Nordeste. Mas, ele não resolve, ele ajuda, mas não
73RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
resolve, principalmente porque os recursos do bolsa família vazam de volta
para o Sudeste, porque a maior parte do produtos que são consumidos, de
bens de consumo duráveis, vêm da região Sudeste. Então, o Nordeste tem
um déficit nas contas de comércio por vias internas, o que faz com que o
bolsa família se torne um programa paliativo, não é transformador. O Nor-
deste, enfim, não cresce o suficiente para reduzir a desigualdade. De 2000 a
2010, ele teve uma taxa maior do que a do Brasil, mas é incapaz de reduzir a
questão da desigualdade.
Em resumo, ele mostrou que houve crescimento, mas a participação do
PIB permanece baixa e a gente ainda tem o PIB per capita metade do nacio-
nal. O que explica a desigualdade regional, a persistência? Então, ele desta-
cou os dez fatores: a manutenção do hiato educacional, do hiato da renda
domiciliar per capita, da regionalização das políticas públicas, sem política
nacional de desenvolvimento regional que estimulou a guerra fiscal, o es-
vaziamento da representação política a nível nacional, as secas que desor-
ganizam a produção, a reconcentração dos recursos públicos na União, a
concentração dos financiamentos, a concentração da malha urbana no Sul
e Sudeste e a concentração dos investimentos em infraestrutura. E, então,
ele saiu revendo cada item; aí talvez dispensem comentários para a gente
acelerar aqui. Para cada um desses itens ele fez comentários interessantes,
colocando informações sobre cada um desses pontos que mencionou.
Ele destacou também e reforçou sobre a concentração dos recursos do
BNDES, investimentos produtivos, na região Sudeste, chamando atenção
74
para essa lógica bancária da aplicação dos recursos, que terminam sempre
indo para as áreas mais dinâmicas do país. E a concentração regional dos
investimentos em ciência e tecnologia, ele mostrou dados que realmente o
Nordeste tem uma pouca participação dos investimentos em ciência e tec-
nologia.
Na conclusão, ele chamou atenção que precisa-se de uma política nacio-
nal com viés regional, ele deu destaque também a uma política setorial de
infraestrutura e uma política creditícia com viés regional, a regionalização
do orçamento público da União, a estratégia de longo prazo de convivência
com a seca e criar mecanismos que pare ou estanque a reconcentração de
recursos da União. Destacou também a necessidade de mudar o Semiárido.
Já o terceiro expositor, Augusto Togni, do Sebrae, falou no início nos mos-
trando números do Nordeste, o papel dos pequenos negócios, logicamente
ele comentou de forma bastante o papel do Sebrae nesse contexto, mencio-
nou algumas políticas públicas, destacou que 99% dos negócios no Brasil,
52% são micro e pequenas empresas, que respondem por 99% dos negócios
e 52% das empresas, e responde por ¼ do PIB nacional. Então, entrou em as-
pectos mais regulamentares do simples nacional e a formação dos microem-
preendedores individuais, e destacou a importância dos microempreende-
dores individuais para a economia do Brasil e do Nordeste. O Nordeste, em
termos de empreendedores individuais, ele ocupa o segundo lugar em nível
nacional, com 19% do país, e a taxa de sobrevivência deles no Nordeste é o
terceiro do país, é em torno de 71%.
75RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Destacou o mercado de trabalho, que os micro e pequenos empreende-
dores têm gerado mais ocupações do que as médias e grandes empresas. A
ênfase dele foi sobre os empreendedores individuais. No Brasil, até 2015, há
uma expectativa de mais de três milhões de novos empreendedores indivi-
duais. Falou também da questão das compras públicas do governo federal,
que em 2010, que termina beneficiando os microempreendedores e gerou
uma renda de cinquenta e sete bilhões em 2010. No caso das micro e peque-
nas empresas, já ampliaram a sua participação entre 2002 e 2010.
Dos caminhos para o desenvolvimento, ele destacou a questão do desen-
volvimento setorial, é um trabalho que o SEBRAE tem feito em termos de or-
ganizar setores empresariais prioritários, a criação de uma rede de agentes
de desenvolvimento, usar o poder de compra público e privado, monitorar e
avaliar os resultados, conhecimento e informação qualificadas sobre o ter-
ritório e formação de redes. Então, esses são os caminhos, e ele comentou
cada um desse, para o desenvolvimento territorial. Aqui também eu vou dis-
pensar esses comentários.
Depois, ele falou dos serviços de desenvolvimento empresarial como o
Programa Nacional SEBRAE – Territórios da Cidadania, são cento e vinte
territórios de cidadania e, então, discorreu também sobre o desenvolvimento
econômico territorial, com foco direcionado para três grandes áreas, que
são os territórios onde ocorrem os grandes investimentos, as regiões urba-
nas de baixa renda e as regiões de catástrofes naturais, seja com enchentes,
seja com seca. E aí o trabalho do Sebrae, que o Sebrae tem desenvolvido.
76
Falou da inclusão produtiva, a importância do bolsa família, e o SEBRAE
também tem trabalhado justamente ajudando as pessoas que recebem bol-
sa família a criar atividades produtivas, o Sebrae tem dado apoio principal-
mente aos empreendedores individuais. E, no Nordeste, ele falou que há uma
inclusão produtiva importante, principalmente pelos beneficiários do bolsa
família. Também comentou a importância das ações de monitoramento dos
indicadores, com foco no desenvolvimento dos territórios. Falou da dimen-
são de análise, que são os pequenos negócios, o mercado local e as finanças
públicas, que são os três indicadores que eles utilizam para monitoramen-
to. Falou da questão da mão de obra e da importância, que os investimen-
tos retém mão de obra localmente, retém recursos humanos localmente, o
acesso ao crédito, a geração de oportunidades de negócios, o aumento da
competitividade e sustentabilidade dos pequenos negócios, a formalização,
o estímulo ao empreendedorismo e a rede de cooperação.
Então, em geral, foi isso. A síntese foi muito breve do que foi tratado aqui
na mesa.
Painel 2: Infraestrutura para o Desenvolvimento do Nordeste: Recursos Hídricos e Energia
Moderador
Jurandir Marães Picanço JúniorConsultor da Federação das Indústrias do Estado do Ceará - FIEC
Expositores
Hypérides MacedoDiretor-presidente da IBC - Engenharia Consultiva
Francisco de Queiroz Maia Jr.Ex-Vice governador do Estado do Ceará, Empresário e Engenheiro Civil
Relator
Carlos Eduardo MarinoDoutor em Economia pela Universidade Federal do Ceará - UFC
79RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
PAINEL 2
INFRAESTRUTURA PARA O DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE: RECURSOS HÍDRICOS E ENERGIA
QUESTÕES A SEREM RESPONDIDAS PELOS EXPOSITORES
Recursos Hídricos
Que estratégia e que projetos fundamentais deve contemplar a política
de recursos hídricos do Nordeste? Que papel terá o projeto de Inte-
gração do São Francisco para o desenvolvimento do Nordeste?
Energia
Por que não se avança mais na utilização do potencial de energia solar e
eólica do Nordeste? Quais as reais perspectivas da exploração de novas fon-
tes de energia no Nordeste e da contribuição destas para o desenvolvimento
regional no futuro?
80
Infraestrutura em Geral
A União Europeia, visando ao seu fortalecimento, quando da admissão
de novos países, realiza neles, por meio da “assistência financeira de pré-a-
desão”, grandes investimentos em infraestrutura. Por que não se adota no
Brasil essa prática para reduzir as desigualdades regionais, fortalecendo, ao
mesmo tempo, a economia brasileira?
O presidente do BNDES, Luciano Coutinho, afirmou no workshop do In-
tegra Brasil “O Nordeste visto de fora”, realizado no Rio de Janeiro, que o
Nordeste deveria ser líder em tecnologias que poupam água e energia. Favor
comentar.
Cerimonialista: “Dando início à programação desta manhã, assistiremos
em instantes ao painel que traz como tema: “Infraestrutura Para o Desen-
volvimento do Nordeste: Recursos Hídricos e Energia”.
Para exercer a função de moderador dos trabalhos, convido à mesa o dr.
Jurandir Marães Picanço Junior, Consultor da Federação das Indústrias do
Estado do Ceará.
Convido à mesa os senhores expositores, dr. Hipérides Macedo, diretor-
-presidente da IBC Engenharia Consultiva; dr. Francisco de Queiroz Maia Jú-
nior, ex-vice governador do Estado do Ceará, empresário e engenheiro civil.
Como relator deste painel, convido à mesa o dr. em Economia pela Universi-
dade Federal do Ceará, Carlos Eduardo Marino.
81RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Jurandir Picanço Júnior “Bom dia a todos. Foi uma grata satisfação ter sido
convidado para participar dessa mesa, em que dois expoentes aqui do Es-
tado do Ceará, nas suas áreas, vão fazer suas as apresentações. Espero,
então, que tenhamos aqui um bom proveito, nessa manhã que será dedicada
à infraestrutura para o desenvolvimento do Nordeste, focando em recursos
hídricos e energia.
Então, já para darmos prosseguimento a esse evento, vamos convidar o
primeiro palestrante, o dr. Hipérides Macedo, para fazer a sua apresentação.
Hipérides Macedo “Bom dia. Inicialmente eu agradeço a honra do convite na
pessoa da Nicolle Barbosa, que nos encaminhou a comunicação deste evento,
Integra Brasil, para que a gente pudesse aqui participar desse painel que abor-
da a questão da água e a questão da energia. Praticamente me deterei sobre o
problema dos recursos hídricos do Nordeste, usando um pouco a referência do
Ceará, que é a minha terra e onde eu montei a experiência que, por sinal, o Nor-
deste também vem utilizando bastante, e o Ceará é uma referência nessa área
de recursos hídricos. Isso me deu até a oportunidade de expandir um pouco as
ideias que nós experimentamos aqui e que nós desenvolvemos no Ceará para
alguns estados do Nordeste, principalmente na região do Semiárido.
Esse painel é um painel que historicamente se repete, uma vez que a
questão muda de abordagem com o tempo, mas de forma muito pequena,
pois o eixo principal da política de água a ser perseguida pelas ações de
governo e pela sociedade, já está bastante definido.
82
Com o diagnóstico básico da região, bastante do conhecimento geral das
pessoas que se debruçam com relação a essa questão do Semiárido, não é
enfadonho repetir, os principais fatores físicos que influenciam os recursos
hídricos. O Semiárido, o trópico equatorial, a geologia cristalina e a base
física territorial heterogênea. Eu acho que essa nova visão do Nordeste, cria
uma nova agenda no desenvolvimento das novas políticas de água. Havia
uma visão anterior, calcada no século XX, que o Semiárido era uma região
semidesértica e que a questão da água decorria da escassez de chuva, o que
não é verdade.
O Semiárido é uma das regiões de muita chuva. Um estudo da Universi-
dade de Stanford da Califórnia, já no começo do século passado, dizia que
são poucas as regiões do mundo que chove mais de mil milímetros.
O Ceará é uma delas. O posto de Meruoca, na região de Sobral, chove mil
e duzentos milímetros. A Ibiapaba também, tem uma pluviosidade acima de
mil milímetros. O Cariri chega quase a novecentos e cinquenta milímetros,
o Maciço de Baturité também. Então, nós não podemos dizer que a questão
do Semiárido é escassez de chuva. A quantidade de chuva no Nordeste é
bastante grande, não é uma quantidade limitada, nem reduzida, é grande.
O problema do Semiárido é a irregularidade que vem do trópico equa-
torial. Nós somos uma transição entre o trópico e o equador, isso dá uma
instabilidade temporal e espacial muito grande. Aqui dificilmente se conse-
gue ter uma disciplina sobre as questões do tempo. A memória do tempo é
guardada pela atmosfera quarenta e oito horas. Quem guarda a memória do
83RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
tempo por seis meses é o oceano, sobretudo as temperaturas do fundo do
mar. Nós temos poucas observações de boias do Atlântico.
As boias do Atlântico Sul foram montadas na década de noventa, e ainda
não estão perfeitamente funcionando e operando no sentido do monitora-
mento. E por isso é que nós temos poucas informações da memória do nosso
tempo. Uma região altamente dinâmica como é o trópico equatorial, é difícil
fazer previsão meteorológica, e é uma região instável, de variação temporal
e espacial muito grande.
A geologia cristalina é de fato o maior problema. O problema do Nordeste
é a base física territorial. É quase aflorante a nossa rocha. 70 a 75% do terri-
tório do Ceará é de base cristalina, o que significa que nós não teremos rios
intermitentes. Se o Nordeste não tivesse essa base geológica, os rios eram
permanentes. Tanto que o Salgado foi permanente até Icó durante muitos
anos. Até 1918, está registrado no trabalho de Thomaz Pompeu de Souza
Sobrinho, o Salgado era permanente porque vinha de uma região sedimen-
tar calcária, que é o Cariri. Então, a questão de não ser mais permanente,
primeiro, é o grande uso de água naquela região e o desmatamento, a ero-
são e outros fatores que a influência antrópica do homem vem reduzindo a
contribuição subterrânea da sub-base nos rios do Cariri. Mas, na verdade, o
Ceará só tem aquele pedaço sedimentar, o resto é todo cristalino. Se o Ceará
fosse sedimentar os rios eram permanentes, porque a quantidade de chuva
é bastante. Na região em que chove quatrocentos milímetros, quatrocentos
e cinquenta, tem rios permanentes. No Marrocos tem rios permanentes. Ali,
84
na região do Magreb, chove muito menos do que no Ceará. A Alemanha, por
exemplo, tem grande parte das regiões que chove seiscentos milímetros em
média, e nem por isso os rios não são permanentes.
É que o Nordeste tem essa base física territorial que é praticamente o
mosaico desta sala. Chove, nada fica no terreno. Nós não somos uma espon-
ja que guarda a chuva no interior da terra, nós somos uma sala cimentada
que quando chove a água sai pela porta. Por isso que o Nordeste não tem
perenidade nos seus rios.
Esse caráter novo, dessa nova agenda que se estabeleceu no conceito do
Semiárido, acaba com esse complexo de que aqui chove muito pouco e tam-
bém acaba com esse complexo de seca. A seca é um fenômeno suave, um
fenômeno conservador, ela vem muito devagar. Ela é diferente da enchente,
que surpreende todo mundo de madrugada, carrega o guarda-roupa, o patri-
mônio, leva o fogão, destrói a casa. A geada também prejudica a plantação
numa madrugada. Enquanto que a seca, tendo água e tendo irrigação, você
consegue conviver com ela. O Nordeste já era para ter aprendido a conviver
com a seca. É um fenômeno vagaroso, ele chega muito devagar, dá para sa-
ber quando ele vai se aprofundando. Fazendo reserva em rios e forragem, e
ensilagem, quer dizer, tendo reserva de forragem; qualquer fazendeiro aqui
do Ceará que teve reserva de forragem não perdeu o rebanho. Porque o Nor-
deste não aprendeu ainda, culturamente, a conviver com esse fenômeno que
não é dos grandes, sobretudo aqui no Semiárido não é um fenômeno, que eu
diria, um fenômeno destruidor. É um fenômeno conservativo, ele não destrói
85RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
nada. A seca não destrói o poste, a seca não destrói a estrada, a seca não
destrói a ferrovia, a seca não destrói nada. A seca só faz a frustração da
safra agrícola. Esse é que o problema maior da seca.
E a questão da água. Se a gente fizer uma boa reserva de água, uma
transferência formal no território, bem planejada, e uma reserva de alimen-
to, como se faz em todo mundo; o Canadá também tem oito meses sem cho-
ver, aliás, sem uma folha, um fruto, uma flor, e tem reserva de feno. A Europa
toda tem reserva de feno. O Nordeste era para ter reserva de feno.
O inverno é muito mais rigoroso do que a seca e nem por isso os povos
temperados do Norte deixam de conviver com isso.
As características decorrentes dessa questão estão aí, a pluviosidade, a
alta taxa de evaporação e os rios não permanentes.
Rapidamente, eu não quero me alongar nessas questões, mas tem o valor
do ponto de vista de planejamento. O açude é um copo fundo que guarda
água numa bacia rasa. É um conceito do mundo árabe. Os árabes, na época
tinham grande sabedoria do alfabeto, do algoritmo, conseguiram sintetizar
a barragem. Açude é uma palavra de origem árabe e que é baseada nisso,
um copo com fundo que guarda a água que chove numa bacia rasa. Por quê?
Porque a evaporação não é proporcional ao volume, é proporcional à super-
fície do copo.
Se a evaporação não é proporcional ao volume, você pode guardar a água
diminuindo a superfície. E, então, o açude, chove numa bacia hidrográfica e
guarda numa bacia hidráulica menor. É aí o conceito de açude.
86
Se você deixar o açude da esquerda sem usar, só evaporando, a superfície
da evaporação é sempre maior. Se você usar o açude produzindo, a superfície
da evaporação é menor. Como a perda de evaporação é muito grande, chega
a 25-30% do açude, que ele é um tronco de cone inverso, é melhor você tirar
água logo, produzir, do que ficar deixando, guardando água no açude. Isso faz
com que o nordestino faça uma má gestão da política de recursos hídricos.
Quer dizer, quanto mais você guardar água, mais você perde por evaporação.
E se você tem medo de liberar água para produção, você está fazendo uma
gestão medíocre. O Semiárido tem uma fórmula antiga, clássica, do século
passado, que trabalha com uma média regularizada. Ele só solta a média es-
tabelecida pela produção do açude, que é um salário de um caixeiro viajante;
o caixeiro viajante não gasta mais do que a média do que ganha. Se ele gastar
mais do que a média ele fica devendo. Um mês ele ganha mais, outro mês ele
ganha menos. Como o salário é incerto, ele gasta a média.
Do mesmo jeito é o inverno do Semiárido. Como o inverno do Semiári-
do é incerto, ele só gasta a média, e quem administra a média administra
de uma forma medíocre, você faz uma gestão medíocre. Então, o correto é
fazer uma gestão com mais eficiência. Como é que se faz uma gestão com
mais eficiência? Com mais garantia, com mais movimentação de água no
território, canais e adutoras, e mais integração de bacias. Se você não tiver
essa matriz que corrige, coloca água de um lugar no outro, transfere água
da fonte para o consumo, tira água do açude que está evaporando e coloca
num tubo condicionado, que é a adutora, que não evapora, ou coloca num
87RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
canal, que sai de 25% de perda para 2%, num canal, isso você vai adminis-
trando de forma mais eficiente a água, para poder fazer uma melhor gestão
dessa água no Semiárido.
Eu aproveito a oportunidade para falar do São Francisco. Considere um
carro com quatro pneus. Se você quer fazer uma viagem pequena, de oito
quarteirões, você pode até fazer com quatro pneus. Mas você não faz uma
viagem até Sobral sem o pneu sobressalente. Seria essa reserva, então, o
São Francisco. É preciso compreender o que é o verdadeiro sentido da trans-
posição do São Francisco. Ninguém vai encher açude com bombeamento.
Tem muita gente que não entende bem a transposição de água e acha que
a água vem do São Francisco para encher o Castanhão; e vai encher. Água
com bomba, gastando energia com bombeamento.
O São Francisco é o pneu sobressalente. A grande vantagem do São Fran-
cisco é que o Ceará, a Paraíba, o Rio Grande do Norte, o Nordeste têm um
socorro hídrico sobressalente de vinte e seis a trinta metros cúbicos por
segundo, que é o bastante para todo mundo beber. Tanto que a ANA, com
sabedoria, deu uma outorga de beber, água para beber. O Nordeste calculou
quanto a população tem e estabeleceu um volume para garantir a água do
consumo das pessoas. Isso fez com que o administrador do Nordeste possa,
não vou dizer secar o Castanhão, mas usar muito mais o Castanhão, usar
muito mais o Orós, usar muito mais os açudes do Semiárido. Por quê? Por-
que ele perde o medo, acaba com essa história de trabalhar com a média,
se ele sabe que tem um socorro hídrico na fronteira; porque antigamente
88
não se gastava mais o açude porque havia aquela preocupação de guardar
água; podia ser seco, podia haver uma seca no próximo ano, eu tenho que
guardar água. Essa preocupação transformou a gestão do Semiárido numa
gestão ineficiente, o sol bebia a maior parte da nossa água. Praticamente,
o sol bebia, não diria a metade, mas 30 a 40%. Daí o São Francisco ganhar a
chamada sinergia.
O que chamam de sinergia? Sinergia é essa nova política de gerencia-
mento, que a gente faz com que a água fique driblando o efeito do sol para
evitar que a gente use a água com mais eficiência. Se você fizer uma conta
qualquer, e nós já fizemos isso várias vezes, o sujeito solta água do açude
Santo Antônio de Russas, solta água do açude Umari, se você fizer a conta é
melhor soltar do que ficar evaporando. Você ganha muito mais soltando, pro-
duzindo alguma coisa; agora, solta racionalmente, calculando direito, mas
de forma que é muito mais eficiente soltar e produzir do que ficar com espe-
lho d’água. Vocês já viram que o açude é um tronco de cone inverso. Quanto
mais cheio maior o espelho. Então, você tem que reduzir o espelho.
Então, com esse step hídrico, que é o São Francisco, faz com que o admi-
nistrador do Nordeste tenha mais coragem de utilizar as águas de reserva
para a produção de grãos, de forrageira e perenização dos rios. Então, essa
é a grande vantagem do São Francisco. É preciso entender; a água não preci-
sa ser muita, nós não precisamos gastar energia demais transferindo muita
água, é tanto que só vão transferir mais água se o Sobradinho estiver numa
cota acima de 70%, ou sangrando. Porque, na verdade, você tem que econo-
89RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
mizar, fazer uma boa gestão, um consumo de energia compatível com a rea-
lidade, com o poder aquisitivo das indústrias, das populações, sobretudo do
consumo humano, e a irrigação tem que ser subsidiada. Portanto, você não
pode estar pensando que vai transferir água para encher açude. Você vai
usar esse step e, através, disso vai usar melhor os seus açudes. Quer dizer,
nós vamos usar muita água do Castanhão, nós vamos usar muita água do
Armando Ribeiro. Como? De forma que a gente sabe que tem um socorro na
fronteira, que é a transposição do São Francisco. Esse é o conceito básico
que era importante relatar aqui.
Bom, a transposição tem dois eixos: o eixo norte e o eixo leste. O eixo
norte vai para o Ceará, cruza o sertão pernambucano, tem um braço que vai
para a região do alto sertão, ali entre montes, segue na Paraíba, penetra na
Paraíba por três fontes: pelo Rio Piancó, pelo Rio do Peixe e pelo Rio Pira-
nhas. Atravessa a Paraíba e vai até o Rio Grande do Norte, e pereniza a bacia
do rio Apodi e vai para Mossoró, lá na frente. Quando ele entra na Paraíba,
no rio do Peixe, ele pereniza o Piranhas, que vai até o Armando Ribeiro Gon-
çalves, na região do Açu. Quando ele entra no Ceará, ele pereniza o Jagua-
ribe, através do Salgado, e vai até o Orós. Agora com o CAG, o cinturão das
águas, na entrada do Ceará, ele arrodeia e passa pelo Orós, beneficiando as
várzeas de Iguatu. Então, na verdade, a transposição é bastante abrangente.
O eixo leste vai para Pernambuco, ali na região de Moxotó, consegue pe-
netrar no agreste, através do rio Ipojuca, e faz a grande adutora do agreste, o
ramal do agreste, da região desenvolvida do ponto de vista de agropecuária,
90
mas que tem problema de água de qualidade, que é muito salina, e também
de quantidade, e ao entrar na Paraíba, ali na região de Monteiro, vai até o
açude Boqueirão e abastece Campina Grande, que é uma capital com muita
dificuldade de água hoje. Ele continua pelo rio Paraíba do Norte e abastece
o eixo vertente que se liga ao rio Mamanguape, já no sopé da Borborema, na
planície costeira da Paraíba, que é onde tem muito solo bom.
Vocês vão notar que o litoral, ali na região do Apodi, do Açu, Mossoró, são
as grandes regiões beneficiadas com manchas de solo sedimentar. Algumas
povoam o sertão pernambucano na região de Araripe, algumas povoam o
sertão da Paraíba na região do Rio do Peixe, mas a maior parte das áreas irri-
gadas está no sedimento de Tabuleiro do Litoral. E uma parte, na Paraíba, na
região do litoral, vocês vão ver que também permite uma boa irrigação, na
região de Sapé, onde produz abacaxi. Guarabira, Marinho, ali perto daquela
região que desce a serra da Borburema. Indo para João Pessoa, região boa
também de irrigação. Então, esse é o grande projeto da transposição do São
Francisco. Fora disso, ele vai alimentar grandes sistemas de adutoras, gran-
des adutoras. O Nordeste agora está fazendo o seu grande projeto contra a
seca. O maior instrumento e o mais poderoso contra a seca é a adutora.
A adutora é um elemento que transfere água da fonte de reserva para o
consumidor, distribui de forma condicionada a água no território, ramifica,
dá capilaridade ao sistema e não evapora, porque a água está dentro da tu-
bulação condicionada. Então, também não polui porque não recebe dejetos
externos, porque está isolada por uma tubulação de aço, de ferro fundido, ou
91RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
de plástico, de fibra de vidro. Então, há grande vantagem na adutora, e o Nor-
deste está fazendo muitas adutoras. O Ceará foi o pioneiro em adutoras de
grande porte, quando fez a adutora da Ibiapaba; foi a primeira grande adu-
tora do Nordeste, duzentos quilômetros. Naquele tempo ninguém fazia adu-
tora de duzentos quilômetros, o Ceará foi o primeiro. A Ibiapaba é a região
mais confortável de água no Ceará, basta dizer que só tem um carro-pipa.
Dos oitocentos e trinta e seis carros-pipa do Ceará, a Ibiapaba só tem um. E
eu telefonei para saber por que tem um carro-pipa na Ibiapaba, e o prefeito
de Viçosa avisou que é porque naquele bairro elevado que tem em Viçosa, a
pressão da água do sistema de distribuição não previa aquele conjunto habi-
tacional que foi feito em cima daquela capela alta, e foi preciso ter um carro
pipa para tirar água tratada do sistema e colocar nessas casas elevadas.
Mas não foi porque está faltando água na Ibiapaba.
Agora, a Ibiapaba é confortável porque tem trinta e oito quilômetros de
adutora por mil quilômetros de território. O Nordeste precisa em torno de
trinta quilômetros de adutora por mil quilômetros quadrados de território.
Esse que é o parâmetro mais significativo.
Nós saímos da Secretaria de Recursos Hídricos, deixamos o Ceará com
mil e quinhentos quilômetros, mas é muito pouco. Eu me lembro que quando
nós começamos a trabalhar só existiam cem quilômetros de adutoras no
Ceará. A adutora de Acarape com setenta e a adutora do Crato, Cariri, de
Batateira, com trinta quilômetros. Então, tivemos aquela primeira doação
de quinhentos quilômetros de tubulação de aço carbono de duas bases ame-
92
ricanas na Europa, que foram desativadas, são quinhentos quilômetros de
tubo. Depoi,s nós fizemos uma grande adutora na Ibiapaba, mais duzentos,
então começamos a trabalhar em adutora, deixando o Ceará com mil e qui-
nhentos quilômetros, e ainda é pouco. O Ceará, nos últimos anos, podia ter
feito muito mais adutora, e a situação estava bastante confortável.
Se você olhar as reservas, mesmo dos açudes médios, nós estamos no
segundo ano de seca; grande parte dos açudes médios, os açudes de ter-
ceira ordem chamados, ainda está com cinquenta, quarenta, trinta e cinco.
O que significa? Se tivesse mais adutoras estava atendendo muito melhor o
território e estava tirando a água do sol, as adutoras estavam fazendo com
que a população estivesse mais abastecida e mais confortável.
Então, é fundamental ampliar a quantidade de adutoras. O grande projeto
dessa seca era para ser de adutora, infelizmente eu notei que não houve
essa sensibilidade. Vieram até umas máquinas, que apareceram para resol-
ver o problema da seca, mas de fato essas máquinas não vão ter muito o
que fazer, porque numa seca dessa nem açude você pode fazer, porque não
tem água para compactar. E você não vai voltar àquele sistema sonrisal do
passado. Você tem que evoluir. Então, o certo mesmo era ter vindo muita
tubulação para fazer muita adutora no Ceará. Esse era o objetivo maior, que
devia ter sido perseguido, fazendo mais adutora para transferir água.
Na região do Piranhas e Açu, onde eu estou trabalhando, o eixo de inte-
gração do São Francisco tem três entradas na Paraíba: a entrada do Pian-
có, a do Piranhas e a entrada do Rio do Peixe. E lá na região do Seridó, na
93RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
construção da barragem do Oiticica, tem um girador verde. Aquele girador
verde faz com que a água transponha a serra da Garganta, caia no Rio São
José, Seridó, e faça um giro pelo Seridó, uma região de muita cultura, é onde
o povo é mais preparado. A melhor política de saneamento que nós temos
no Nordeste é na região do Seridó. Mas falta água, tem dificuldade de água.
O eixo de integração interna é muito importante para essa região do Rio
Grande do Norte. O Ceará já tem seu eixo de integração interna, o eixo Cas-
tanhão-Pecém. Está fazendo mais outro. E tem outros eixos pequenos, tem
o Orós-Feiticeiro, que é um eixo importante. Então, quanto mais eixo de inte-
gração interna e mais interligação com a transposição, muito maior a trans-
posição, muito mais eficiente a transposição. Não adianta você trazer água
do São Francisco na fronteira e não ter um sistema de ramificação que faça
a água chegar nos dedos das mãos. A água tem chegar nas pontas dos de-
dos. A transposição é só o braço, mas a água só vai beneficiar as populações
se ela chegar nos dedos das mãos, nas pontas dos dedos das mãos. Então
você tem sistema ramificado de capilaridade para melhorar o território.
Quem faz planejamento no Nordeste tem que ter base. Qual foi a grande
dificuldade de planejamento do Nordeste? Isso aí é São Paulo, Minas Gerais,
Rio Grande do Sul. Você vê que essa mancha verde é homogênea. As regiões
do Sul, do Sudeste, são todas um cerrado só, é um queijo, é uma região só.
É praticamente 80% sedimentar. Sedimentar significa que é um solo pro-
fundo, que guarda a água que chove e que é um solo irrigável, porque é um
solo franco-arenoso, ou franco-argiloso, que é o cerrado vermelho que vocês
94
têm lá em Brasília, uma grande amostra. Aquilo é amostra do que nós temos
de melhor no território e no planeta. Talvez a maior mancha homogênea do
planeta, ou seja, o cerrado.
Esse cerrado tem uma vantagem, ele é homogêneo. Então, se você fizer
uma estrada no cerrado, de um lado você tem milho, do outro você tem
café. De um lado você tem soja, do outro você tem laranja. Então, o cer-
rado, é como diz Washington Luís, governar basta abrir estrada, porque
onde você abre uma estrada você abre uma fronteira agrícola. Se você co-
loca uma rede elétrica numa estrada do Sudeste, você tem produção e tem
energia consumida. Se você coloca uma rede elétrica no Nordeste, você
só tem poste, mas não tem transformador. Porque o Nordeste não tem ho-
mogeneidade na base física. As estradas passam pelas regiões cristali-
nas pela linha de cumiada do terreno. Pode examinar que as grandes redes
elétricas da COELCE, que passam vizinho às BR’s e vizinhas às CE’s, não
produz em nada no meio do caminho. Porque onde se faz estrada, se faz
na cumiada do terreno. A cumiada do terreno no Sul é o eixo de sedimento,
no Nordeste é o espinhaço do cristalino. Então você não pode ter água no
espinhaço do cristalino.
Então, o que acontece? As estradas do Nordeste têm uma rede elétrica
ao lado delas, que não consegue produzir muita energia, porque ninguém
precisa. Não tem uma forrageira, uma máquina ligada, uma rede elétrica
no cristalino. Quando César Cals fez a estrada da confiança, eu me lembro
demais, foi o primeiro projeto do polo Nordeste que funcionou no Ceará. Por
95RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
quê? Porque a estrada da Confiança era em cima de sedimento. Todas as
regiões da Ibiapaba estão em cima de um latossolo.
Um latosolo é um cerrado, é um sedimento vermelho. Então, quando ele
fez a estrada, ele eletrificou aquela estrada em cima de um sedimento. En-
tão, chove no sedimento, que na Ibiapaba chove muito, tem solo, tem estra-
da, tem energia e tem água.
Então, quando você consegue, no Nordeste, juntar água, energia, estrada
e produção, você desenvolve o Nordeste, o que você não conseguia nunca.
Todas as políticas da SUDENE e do DNOCS fracassaram porque os açudes
são cristalinos; e gerar um açude é no cristalino porque o boqueirão é ro-
choso, não tem solo. As áreas de irrigação não estão perto dos açudes, as
estradas estão fora do eixo do sedimento das áreas irrigadas, a energia ao
lado das estradas. Então, você tinha água, não tem solo, você tem energia
e não tem água, e você tem estrada e não tem produção. Esse é que era o
grande dilema do Semiárido.
Então, os planejamentos, por maior esforço que se fizesse, tinham um
desenvolvimento incipiente, pequeno, reduzido, por conta dessa heteroge-
neidade da base física.
Está aí o Nordeste. O Sudeste é só uma mancha verde. O Nordeste só tem
umas bolas verdes, umas pequenas manchinhas, umas ilhas verdes. Então,
você tem que passar água por essas manchas verdes. Por isso é que tem o
canal de integração. Se você não fizer os canais, você não consegue levar
água para as manchas verdes. Se não levar água para as manchas verdes,
96
você não tem irrigação. Agora, você tem que levar energia para perto do ca-
nal também; por isso que os canais também estão eletrificados agora. Você
tem que colocar o canal, a estrada e a energia, porque o canal já sabe que vai
passar pelas manchas verdes. Se não fizer isso, você não integra o Nordeste.
Um retrato do Jaguaribe. O rio Jaguaribe, o Banabuiu e o Pirangi são os
três grandes rios que formam a região de Jaguaribe. As redes elétricas es-
tão completamente divorciadas da água e das manchas de produção. Quer
dizer, a energia passa por um lugar branco, esse branco é o cristalino. Então,
a energia passa por essa base física cristalina ao lado da estrada, a estrada
naturalmente não tem produção. Vocês podem dar uma olhada numa estra-
da do Semiárido, que é jurema preta do lado e jurema preta do outro. Não
estou exagerando muito, mas é isso mesmo, a verdade é essa. Você chega
no Sul, é cana de açúcar de um lado, laranja do outro, café de um lado, soja
do outro; você vê muito no triângulo mineiro, tudo região sedimentar. Mas,
aqui você passa numa estrada é jurema preta de um lado, jurema preta do
outro, não tem saída, que é a planta mais resistente à região cristalina e ao
Semiárido.
Então, o quê que se faz? Só tem um jeito de integrar, que é o que o Nor-
deste tem feito há muito tempo. Isso não começou agora. Quando os planos
diretores do DNOCS, na década de 70, começaram, eles tiravam água do
açude Araras e colocava no platô do Arara, que é uma mancha sedimentar
descoberta pelos alemães. Tirou a água do Pereira de Miranda e colocou no
platô de Paraipaba, que é uma mancha descoberta pelos judeus, pela missão
97RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
de Israel. Depois, colocou água do Tabuleiro de Russas; tirou do Banabuiu
e do Orós, do Castanhão e colocou no Tabuleiro de Russas, uma mancha
descoberta pelos franceses, pela missão francesa, o antigo Grupo do Vale
do Jaguaribe.
Então, isso já começou a pensar, mas agora veio uma política mais agres-
siva que é a integração das bacias. Você tira água do Castanhão, vai até Pe-
cém, passando por essas manchas verdes. Eu posso até dar o nome dessas
manchas: a primeira mancha que tem logo depois do Castanhão, azul, essa é
a chamada São Braz, é onde fica Jaguaribara, e onde estão os projetos Man-
dacaru, Xique-Xique e Curupati. A outra mancha, o Roldão, não foi irrigada
ainda, mas é uma grande mancha. A água passa por Roldão. Outro é Tabu-
leiro de Russas, Ibicuitinga com Morada Nova, Arisco do Mariano, perto do
sopé de Guaramiranga, por ali. Então, você vai levando água para uma por-
ção de manchas importantíssimas no plano de irrigação do Nordeste. Então,
você tem que juntar a água com o solo, a grande vantagem do canal é essa.
Se você eletrifica o canal, agora você tem água, produção, energia e estrada
no mesmo lugar.
O retrato de um tabuleiro, o ipê roxo. Isto é uma região sedimentar. Se não
fosse não tinha ipê. Se não fosse sedimentar o tronco não era reto. O tronco é
reto porque caracteriza uma região de profundidade, que é exatamente a man-
cha São Braz, onde foi colocada a cidade de Jaguaribara. Essa que é a chamada
bola verde do Ceará. Nós só viemos descobrir isso nos anos 60, lamentavelmen-
te, porque o Departamento Nacional de Obras Contra as Secas construía as
98
barragens; fizeram um esforço muito grande, juntamente com o Instituto José
Wilson Trindade da Paraíba. Naquele tempo, não tinha Paulo Afonso, ninguém
nem sabia se teria Paulo Afonso. Também ninguém sabia que tinha bombea-
mento. Também ninguém sabia que teria aspersão, a política de colocar água
em local de relevo acidentado. A gente só queria saber de gravidade; a planície
aluvial em que a água descia em sulco, foi inundado. A gente nunca esperou que
fosse inundar o tabuleiro arenoso, que a água se infiltra toda, irrigando por gote-
jamento; isso foi coisa nova. Tudo isso apareceu nos anos 60, a aspersão, o bom-
beamento, Paulo Afonso, a eletrificação e a possibilidade de sair dos aluviões.
Então, os açudes dominavam aquelas ribeiras e beneficiavam os proprie-
tários na beira no rio, com a gravidade das galerias. Depois foi que chega-
ram os bombeamentos e nós saímos dos aluviões para os tabuleiros; foi nos
anos 70 já. Então, nós descobrimos os tabuleiros. O Ceará saiu dos aluviões,
Morada Nova, Lima Campos, e passou para os tabuleiros. A Paraíba, todo
mundo; o Rio Grande do Norte, também: o baixo Açu é um tabuleiro. Então,
nós saímos para os tabuleiros onde está esse ipê roxo.
Isso foi uma grande mudança, que ninguém nem talvez tenha percebido,
todo mundo, mas foi uma grande mudança na cultura da irrigação no Nordes-
te. Se não fosse feita essa mudança, a gente não tinha saído do lugar. Então foi
isso que nós fizemos, colocar água nessas áreas sedimentares de tabuleiro.
O outro é o planejamento hídrico. Eu estou usando o Ceará, mas nós es-
tamos fazendo isso na Paraíba e no Rio Grande do Norte; em Pernambuco
menos, porque não tem a rede hidrográfica do Ceará, mas o Piauí, sim.
99RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Mas também os açudes de primeira ordem. São aqueles que barram o rio
principal, o Jaguaribe, o Araras, o Acaraú. Já os açudes de segunda ordem,
eles barram o afluente do rio principal; o açude Banabuiu, o açude Edson
Queiroz, que barra o rio Groaíras, é um açude de segunda ordem.
O DNOCS, como era um órgão federal, estudou as barragens de segunda
ordem e de primeira. Ele era uma ação federal, pontual, primou sua expe-
riência de reserva estratégica, primeira e segunda ordem. Muito bem, fez
um trabalho estratégico. Agora, acontece que as cidades estão atrás da se-
gunda ordem, as cidades estão na terceira ordem, que são os rios de terceira
ordem. É o riacho do Navio. Vocês conhecem aquele poema de Luiz Gonzaga
que diz assim: “Riacho do Navio, corre pro Pajeú, o rio Pajeú despeja no São
Francisco, o rio São Francisco vai bater no meio do mar”? Quer dizer, se Luiz
Gonzaga não sabia, mas criou a terceira ordem hidrológica. O que é a tercei-
ra ordem hidrológica? É o rio do rio, do rio principal. É o afluente do afluente
do rio principal. Então, o Ceará fez um projeto que eu podia chamar hoje de
“Riacho do Navio”, o Ceará fez o Riacho do Navio. Os açudes verdes são os
riachos do navio e foram esses riachos do navio que melhoraram muito a
mortalidade infantil; deu adutora para muitas cidades. Só no Salgado, nós
temos o Ubaldinho, em Cedro, o Olho D’água, em Várzea Alegre, o Cachoei-
ro, em Aurora, o Rosário, em Lavras. Então, vieram muitos açudes, Umari,
em Acaraú, todos açudes de terceira ordem.
O açude de terceira ordem é mais na cabeceira da bacia, fica entre a ser-
ra e a primeira cidade. É bom porque muita cidade não tem esgoto na outra.
100
É a serra, por exemplo, o açude Ubaldinho fica entre a serra Negra e a cidade
de Cedro. O açude Cachoeiro fica entre a serra de São Pedro e a cidade de
Aurora. A cidade de Aurora tinha um hospital que tinha setecentas ordens
de internamento hospitalar por mês. Em seis meses, a população de Aurora
passava pelo hospital de Aurora. Por quê? Porque bebia a água do esgoto do
Cariri. O esgoto do Cariri vinha com esgoto hospitalar, matadouro de gado,
dejeto de esgoto sanitário das casas; quer dizer, praticamente, Aurora só
bebia esgoto. E Aurora vivia com doenças permanentes, era conhecido pelo
secretário de saúde da época, o dr. Lavor. Eram setecentas ordens de inter-
namento hospitalar por mês. Quer dizer, uma população de três mil e alguma
coisa, em seis meses passava a população de Aurora pelo hospital, porque o
melhor hospital de uma cidade ainda é uma adutora de água tratada.
Por sinal, se você olhar a quantidade de jovens que tem nesses hospitais,
nos corredores; a gente, que é mais civilizado, mais preparado, vai para hos-
pital com sessenta anos, é quando a gente começa a andar com aqueles
envelopes grandes, A3. Quando a gente é jovem é com aquele envelope A4,
que é do currículo, quando a gente vai ficando mais velho é com aqueles
envelopes A3, que é a tomografia, etc., etc. Mas a pessoa mais civilizada,
educada, só vai para o hospital com sessenta anos, a não ser um ato de
doença assim, um acidente. Mas muita gente jovem no hospital, ali está a
componente educação e falta de saneamento básico. É saneamento bási-
co e falta de educação, duas coisas fundamentais que a gente tem que ter
cuidado. Outra coisa, nós não vamos transferir água do São Francisco para
101RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
misturar com esgoto, não tem cabimento. Uma água que vem bombeada
para misturar com esgoto. Temos que tratar os esgotos das Cidades do Cea-
rá também, é importante.
Então, esses açudes de terceira ordem têm pelo menos uma vantagem,
é uma água mais universal, mais limpa, um padrão melhor, e a falta de sa-
neamento do Ceará foi corrigida um pouco com essas barragens de terceira
ordem. A outra vantagem é que atingiu muitas cidades e distribuiu água no
território. Foram cinquenta barragens que foram feitas e distribuiu água no
território.
O canal de integração, só para mostrar, é importante, porque ele vai per-
correndo o território e integrando as áreas produtivas.
Esse eixo não é o eixo esquemático, é o eixo do Ceará. Ele sai do Casta-
nhão, carregando a água pelas regiões produtivas.
Se for feita a integração, passando a água, a energia e a estrada pelas
manchas verdes, você tem mais ou menos esse retrato. As áreas, a água, a
energia, a estrada e a produção no mesmo lugar. Parece que você está no
Sudeste, na região de Piracicaba, mas não é. Seria no Ceará se tivesse per-
seguido esse plano há mais tempo.
Aí você tem uma reforma “agrária”, porque reforma agrária no Ceará sem
água não adianta para nada. A reforma de Canindé; o pessoal distribui mui-
ta terra em Canindé. O sujeito já é pobre e ainda distribuem uma terra que
não tem serventia nenhuma, regossolo, aí o sujeito não pode desenvolver
reforma ali. Isso é uma demonstração da política de água, que ela conseguia
102
reassentar pessoas perto da água e em solo bom. Sempre que você maneje
pessoas no Nordeste, coloque perto da água e em solo bom. Não faça mais o
que o nordestino por falta de cultura fez; inventou distrito e lugar insusten-
táveis. Então, a gente tem que colocar em lugar sustentável.
Outro retrato bonito e ou uma adutora. Interessante é que o mandaca-
ru é para roubar a água da adutora. Quando você vê um pé de mandacaru
plantado vizinho a uma adutora, isso quem me disse foi o presidente do Tri-
bunal de Contas da Paraíba, dr. Catão; ele disse que, quando tem um pé de
mandacaru plantado vizinho a uma adutora, a criatividade do nordestino, ele
coloca um cano por dentro do mandacaru, fura a adutora e tira água da adu-
tora. Isso é quase um exemplo, é uma criatividade muito grande. Ele planta
o mandacaru vizinho a adutora, e dentro do mandacaru tem um tubinho rou-
bando água da adutora. Mas esse é o instrumento mais poderoso com água
no sertão, é a adutora.
A adutora de Várzea Alegre, para mostrar nós fizemos não só o tratamen-
to, como fizemos a adutora. Não há tratamento de água de esgoto ainda,
mas de água, tem muita água tratada. O Nordeste hoje, com o São Fran-
cisco, tem hoje vinte sistemas desses grandes como o açude Olho D`Água,
esse é o ramal do Agreste. São seiscentos quilômetros de adutora, parece o
metrô de São Paulo; quem olha assim pensa que é o metrô de São Paulo. Isso
é a adutora do Nordeste, que vai ser interligada com o sistema São Francis-
co no eixo leste. Esse sistema tem vários: sistema Pajeú, sistema Congo,
sistema do canal do sertão alagoano, tem vários sistemas agora de grandes
103RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
adutoras do Nordeste. O Nordeste não é mais aquele lugar que o pessoal do
Sul não sabe, mas o Nordeste tem grandes sistemas de adutoras. Por sinal,
vai melhorar muito a situação do Nordeste, porque está previsto vinte siste-
mas desse tipo, adutora do Sabugi, o sistema Seridó.
Um carro pipa na Ibiapaba. Quando estou falando que trinta e oito quilô-
metros de adutora por mil quilômetros de território é confortável, está aí a
Ibiapaba. Trinta e oito quilômetros de adutora por mil quilômetros de territó-
rio, região confortável, só tem um carro pipa.
Está aí mais ou menos do que o Ceará precisa, e de que outros estados
precisam; isso serve para o Nordeste todo. É uma base de trinta quilômetros
por mil quilômetros de território, seria o número ideal para fazer uma con-
fortabilidade na questão da água.
Bem, eu me preocupo e aqui queria terminar falando sobre doenças por
falta de saneamento. Eu acho que o Brasil não está andando em saneamen-
to. A meta do milênio foi alcançada por um bilhão de pessoas com água
e esgoto. Quem deu esse pontapé foi a China com quinhentos milhões. A
Índia com quatrocentos e cinquenta milhões, a Indonésia com trinta milhões
de pessoas e mais alguns países asiáticos. O Brasil contribuiu com quase
nada, quase zero a contribuição do Brasil.
E aqui eu queria fazer uma crítica à política da Caixa Econômica. A Caixa
Econômica leva quase quatro anos para fazer um quilômetro de adutora. Nisso
eu tenho experiência porque eu trabalho nessa área e faço questão de afirmar
isso aqui. Enquanto a Caixa Econômica dominar essa política de saneamento
104
do Brasil, o Brasil não sai do lugar. Ele parece que já não vai bem nesse Minha
Casa, Minha Vida, mas muito menos em saneamento. E houve um erro grave
aqui no Nordeste, da política de governo, colocou toda a política de recursos
hídricos na Caixa Econômica, o PAC Seca. Houve uma decisão da Ministra de
colocar toda a política de açudagem na Caixa Econômica. Para quê eu não sei,
porque a Caixa Econômica não entende dessa área, nem de transiente hidráu-
lico, nem de estação de bomba, nem de golpe de ariete, nem de válvula; quem
não entende de barragem não entende dessas coisas. Não sei por que coloca-
ram na Caixa Econômica. Está emperrado, faz dois anos aguardando parecer,
rodando, parecer um, parecer dois; a Caixa Econômica não tem muito interesse
em liberar esse negócio, porque é colocando dificuldade garante o emprego.
O Brasil tem hoje um problema de engenharia. A lei do engenheiro é a Se-
gunda Lei de Newton, mas os engenheiros não estão usando a Segunda Lei
de Newton. Os engenheiros viraram promotores, estão todos advogados. Os
pareceres que estão aí, dos ministérios, os engenheiros já começam dizendo
assim: “a proposta será objeto e tal...”, virou advogado. Não tem mais pare-
cer de engenharia, não tem mais o engenheiro dando parecer assim: pega
a teoria da energia específica e mostra que a ponte não muda o regime do
rio, pega um parecer hidráulico e mostra que precisa fazer uma complemen-
tação de sangradouro; ninguém tem mais coragem de fazer isso. Tem que
perguntar o promotor, o advogado e o jurista.
Então, a Caixa Econômica está no mesmo rumo, e ninguém anda, não tem
mais decisão, ninguém assina mais nada. E há a transposição também; o
105RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
dr.Teixeira está lá com a maior coragem, fazendo um esforço, fazendo todos
os aditivos, ele mesmo assinando, com muita coragem, desafio, para poder
tirar esse imbróglio do São Francisco. Mas, na verdade, é que a engenharia
brasileira, o CREA, apesar de ter sido fundado junto com a OAB na mesma
legislação, resolveu ficar à mercê do Ministério Público.
Hoje, em uma ponta é o promotor que decide, o viaduto é o promotor que
decide; uma fundação de uma barragem é o promotor e o procurador que
decidem. A engenharia está completamente refém de toda essa inoperân-
cia que está hoje a burocracia brasileira. E eu estou aqui reclamando como
engenheiro, nos meus setenta anos que completo hoje, e muitos anos de
profissão, para dizer que a política de saneamento, que é fundamental para
política de recursos hídricos, não suja a água com bactéria.
Aí diz que cianobactéria, que é um negócio; você não sabe, mas a tilápia,
por exemplo, está contaminada. Você vai comer tilápia de açude, sabe que
a cianobactéria está presente no peixe. Porque no Armando Ribeiro Gonçal-
ves, que é uma grande barragem, já tem cianobactéria. Estão aí uns açudes
do Rio Grande do Norte, que eu estou fazendo um estudo lá de qualidade
de água, todos estão com cianobactéria. Você veja que é cinquenta mil este
número, por mililitro, todos estão acima. Não tem um açude que não esteja
acima do padrão da Organização Mundial de Saúde. Então, está errada essa
questão de poluir as águas do Semiárido, que já são poucas. Eu acho que
como a política de PCH não se coagulou com a gestão da água no Semiári-
do, porque precisa de uma energia firme, eu acho que nós instalamos duas
106
turbobombas no Ceará e vamos instalar outras na Paraíba. Isso aí é uma
turbobomba, uma máquina com uma bomba de baixa rotação ligado num
sistema à turbina. Essa daí é a adutora, o Orós-Feiticeiro, isso aí é o canal
que vai para Feiticeiro.
Então, nesse sistema que tira água dessa válvula do Orós, ele coloca a
água a cinquenta metros de altura e a trinta e cinco quilômetros de distân-
cia. Então, pela primeira vez, aquela região de Jaguaribe muito seca tem
água sem conta, não há conta para o governador pagar, é a própria energia
hidromecânica do açude Orós. Então, ele coloca água nesse canal, abastece
o açude Feiticeiro, que fazia vinte anos que não abria a comporta, a compor-
ta do Feiticeiro está aberta depois dessa integração; a gente tinha a válvula
do Orós e o açude Feiticeiro sem passar pela COELCE. Porque se você colo-
ca uma turbina, tem que injetar na rede, aí vai pela Espanha, passa por Má-
laga, quando volta olha o tamanho da conta. E aí não tem esse problema da
conta, porque não tem poste, você transforma energia hidráulica em energia
hidromecânica, e você consegue; é só um registro que eu quero fazer. Está
funcionando há mais de um ano já. Muito obrigado.
Jurandir Picanço Júnior “A palestra do dr. Hipérides realmente atendeu os
objetivos dos promotores desse evento, em que ele apresentou as estraté-
gias principais da política de recursos hídricos do Nordeste, e também falou
sobre importância da Integração do São Francisco no desenvolvimento do
Nordeste, atendendo, então, basicamente o que foi solicitado.
107RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Vamos agora, então, para a segunda parte do nosso painel com a palestra
na área de energia, a ser apresentada pelo dr. Francisco Queiroz Maia Júnior,
ex-vice governador do Estado do Ceará, ex-secretário de Infraestrutura e,
agora, empresário de grande sucesso:
Francisco Queiroz Maia Júnior: “Bem, pessoal, meu bom dia a todos. Eu
gostaria de agradecer aos promotores do evento esse convite, essa opor-
tunidade. Eu procurei montar uma palestra em função de um estudo que
a gente fez sobre o Nordeste, juntamente com outros amigos da região, no
caso o professor José Arlindo, que foi secretário de Planejamento de Per-
nambuco, com o Armando Avena que inclusive vi, palestrante aqui também
em outro painel, também secretário de Planejamento da Bahia, e com a con-
tribuição do professor Marcos Holanda, na época presidente do IPECE, aqui
do Estado do Ceará.
Essa abordagem surgiu dentro de um contexto mais amplo de infraes-
trutura, para dar uma visão de como a gente entendia que o Nordeste po-
deria tratar essas suas diferenças em uma política de desenvolvimento.
Essa abordagem tem um contexto forte de infraestrutura; a gente entende
que o Nordeste carece há muitos anos de um projeto e de uma proposta de
transformação. Muitas dessas propostas que estão aí, acho que vêm desde
o então economista, Superintendente da SUDENE, no caso o Celso Furtado,
que sempre foi um dos líderes pujantes, que buscou incessantemente uma
transformação da nossa região. Infelizmente, não só por aspectos burocráti-
108
cos, como no final da sua palestra colocou o amigo Hipérides Macedo, mas,
sobretudo, por aspectos políticos, o Nordeste nunca se uniu em torno de um
grande projeto de transformação da região. Essa região foi tratada sistema-
ticamente como uma região problema para aqueles que dirigiram o país, até
hoje. E não venham dizer que essa minha pontuação se refere a questões
ideológicas, pelo contrário; eu nunca fui ideológico e sou sempre uma pes-
soa muito pragmática. Mas, isso tem algumas dezenas de anos, que eu acho
que, nós nordestinos, sonhamos com um projeto de desenvolvimento que
possa vencer as suas desigualdades.
Então, essa nossa apresentação traz um pouco desse bojo, porque sem o
conceito dos fundamentos de um projeto de transformação é difícil equali-
zar em cima de problemas apenas pontuais. E Isso fica norteando o trabalho
que, em alguns momentos, salvou-se brasileiros, nordestinos e nós cearen-
ses aqui. Eu tenho muita honra de estar nesta mesa porque são pessoas
muito caras aqui para mim, o Hipérides, com quem tive a oportunidade de
fazer uma dobradinha com ele, como secretário de Infraestrutura do Ceará
durante oito anos; as áreas de infraestrutura, uma foi comandada por mim, a
outra foi comandada por ele, e dividimos essa parceria, e conheço bem essa
visão dele, trabalhamos muito juntos e integrados. E o Picanço, que também
trabalhou conosco na Presidência da COELCE.
E essa concepção é fruto desse aprendizado e dessa indignação que eu
carrego como nordestino. Não me conformo em ver uma região de tantas
oportunidades ser tratada como uma região problema,essa é que é a verda-
109RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
de. E nós estamos cansados de soluções pontuais, resolvidas em cima de
crises. Se a crise é uma crise como a desse ano, uma crise de seca, de falta
d’água, aparecem obras emergenciais e a gente volta a ouvir as mesmas
cenas da história como a que o Hipérides colocou, a do carro pipa. Graças
a Deus, a Ibiapaba só tem um, solitário, mais ainda representativo de uma
política clientelista e assistencialista existente ainda hoje, nos modernos
tempos do século XXI. Isso sempre me deixou bastante indignado.
Eu acho que o Ceará venceu muitas dessas adversidades, aqui estou
olhando, diante do secretário Cláudio, que teve um papel fundamental
de integrar essas políticas nessa equipe de governo que orgulhosamen-
te participei, juntamente com o Hipérides, tivemos grandes debates para
construir um projeto de estado e, Graças a Deus, eu acho que talvez nos-
so maior orgulho como profissionais, que participamos dessa era aqui no
Estado do Ceará, a gente não tem dúvida que ao Estado do Ceará a gente
deu um projeto de estado. Mas, lamentavelmente, o Ceará não existe den-
tro de um contexto isolado. O Ceará tem que existir dentro de um contexto
regional e nacional e, por conta disso, fica difícil se fazer um projeto mais
acelerado de transformação para resolver o seu principal problema, que é
a desigualdade.
Agora mesmo, saíram os recentes números do IDH do Nordeste, nós es-
tamos melhorando do ponto de vista do bem-estar social, melhorando a ex-
pectativa de vida, melhorando também a mortalidade infantil, melhorando
os níveis de presença na escola, mas a desigualdade vai aumentando, vai se
110
distanciando de uma região mais equilibrada e mais igual. Pelo contrário, o
índice de Gini não mostrou comportamento na mesma direção do IDH.
Então, a minha palestra traz um pouco disso, isso é um trabalho que a
gente vem aperfeiçoando ao longo do tempo, e eu gostaria de mostrar aqui
a vocês porque eu acho que ela traz um novo contexto de discussão sobre o
Nordeste.
Bem, a primeira abordagem, eu falo o novo Nordeste, vivo sonhando que
a gente viva o novo, eu acho que a gente tem que estar sempre buscando o
novo. O Nordeste brasileiro, sobretudo a porção semiárida, requer uma aten-
ção diferenciada do governo federal, baseada em ações firmes e inovadoras,
ao contrário do que hoje se verifica. Em primeiro lugar é preciso romper com
uma visão ultrapassada, que só enxerga os problemas na região e se resig-
na a propor ações assistencialistas que jamais avançam na superação dos
desafios. É imprescindível quebrar este paradigma e contemplar a região de
uma maneira realmente nova e construtiva, na qual se sobressaiam suas
vocações e potencialidades.
Com o manancial de conhecimento hoje disponível, investimentos bem
focados e determinação, não há nada que impeça o Nordeste de experimen-
tar um desenvolvimento pleno. Nosso compromisso é com a construção de
um futuro de desenvolvimento para a região, com a consolidação de um novo
Nordeste. Eu acho que essa é a base desse evento, o Integra Brasil, que está
aqui sendo discutido em Fortaleza através de uma liderança do CIC, no caso
o trabalho que a Nicolle e o Roberto Macêdo estão tentando, de aglutinar as
111RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
figuras da região para discutir uma proposta de desenvolvimento, e também
buscando instrumentos políticos de viabilizar esse desenvolvimento.
A questão chave desse desafio, na minha opinião, é responder essas três
perguntas: qual é o desequilíbrio regional a ser atacado? Que proporção de
desequilíbrio nós queremos reduzir em relação não só à média brasileira,
como em relação a outras regiões do Brasil, que estão bem adiante da mé-
dia brasileira e dos indicadores principais da nossa região? O que é que nós
queremos superar dessas diferenças? Eu acho que essa é uma pergunta que
o Integra Brasil tem que partir e procurar uma resposta. O segundo é qual é a
meta de redução desse desequilíbrio? Em quanto tempo a gente quer tornar
o Brasil mais igual, do ponto de vista regional?
A região Nordeste hoje tem indicadores dentro de uma cesta que nós si-
mulamos, de uma diferença da ordem de 30%, nessa média de indicadores,
comparado com indicadores da região Sudeste e da região Sul. Nós esta-
mos 30% atrás dos principais indicadores socioeconômicos compostos em
relação à região Sudeste e em relação à região Sul ainda um pouco mais.
O Norte do Brasil está 13% defasado em relação a essas outras regiões.
O Centro-Oeste em torno de 8%. Quer dizer, é grande a diferença que nós
temos que reduzir em relação a essas outras regiões. Se a gente quer fazer
uma política de desenvolvimento, quer tornar o país mais igual, quer apro-
veitar as potencialidades e gerar riquezas para que a gente possa reduzir
essas desigualdades, em primeiro lugar a gente tem que colocar o Brasil no
mesmo patamar.
112
E essa diferença, se for medir, basicamente, ela está em dois vetores:
capital humano; há uma diferença abissal entre a estrutura de qualificação
do capital humano do Nordeste; e infraestrutura. A grande diferença está
nestes dois vetores. Enquanto não se equalizar essas diferenças de capital
humano e essas diferenças de infraestrutura entre as regiões do Brasil, vai
ser difícil se solucionar os problemas.
Como disse o Hipérides, na época da seca se lembra que tem que ter
política de recursos hídricos, na época dos apagões de energia se lembra
que tem que ter políticas de energia, e infelizmente o Brasil, o Nordeste,
não gera riquezas suficientes para a gente dizer que também faltam estra-
das, para a gente dizer que também falta estrutura portuária, aeroportuária.
Essas, com um pouquinho de movimento e de crescimento; está aí, vocês
realisticamente estão vendo como estão os aeroportos da região, todos sa-
turados. E não tem aviação regional. Quer dizer, se você hoje desejar ir ao
Piauí e de lá desejar ir ao Maranhão, você tem que voltar ao Ceará para ir ao
Maranhão. É essa a estrutura aeroviária da região.
Então, tem que quebrar alguns desses paradigmas, e nós não vamos que-
brar esses paradigmas sem uma união da classe política nordestina. Como
ela não se une, como a política dela é uma briga de balcão para saber para
onde vão os recursos da união de forma mais preponderante; a disputa é
financeira, ela não é política, ela não é de projetos, ela não é de um progra-
ma de investimentos para a região, dificilmente a gente vai equalizar esse
problema de uma forma rápida. E, então, vai passando o tempo, dezenas de
113RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
dias, de meses, de anos, e a gente na encontra esse caminho. E não encon-
tra pela desunião da classe política. Faz muitos anos que, até na mesa da
SUDENE, não se juntam mais os governadores do Nordeste, até porque a
SUDENE foi extremamente fragilizada ao longo dos anos. Interessa a esse
regime federativo um instrumento de coesão fraco e não de coesão forte.
Isso é uma questão que precisa ser discutida.
Bem, qual é o desequilíbrio a ser atacado? Eu vou passar aqui muito rá-
pido, mas a nossa proposta é que o desequilíbrio regional seja primeiro defi-
nido através de um índice objetivo. E, ao contrário do que existe, uma cesta
de índices imensa e sem foco, e sem finalidade, a gente aqui propôs mais ou
menos uma estrutura de índice que tivesse três focos, três vetores impor-
tantes: o econômico, PIB per capita, grau de abertura, percentual de empre-
gos acima de dois salários, porque a região está crescendo com empregos
de baixíssimo valor agregado. Há taxa de desemprego nunca vista. Qual é
valor desta renda gerada? Que tipo de emprego nós estamos revelando e
disponibilizando na região? O emprego de valor agregado não está na região
Nordeste. Por isso a gente não retém capital humano. Nem incentiva que o
capital humano que a gente está migrando para se formar em outras regiões
de melhor qualificação, retorne ao Nordeste. O primeiro grande problema
seria trazer esse capital humano de volta. Vocês já mensuraram o desperdí-
cio de um estado como o Ceará, que é o que mais aprova no ITA e não tem
esses talentos de volta? E esses talentos estão distribuídos nas tesourarias
dos bancos em São Paulo, quando poderiam estar trabalhando no desen-
114
volvimento do Nordeste ou no nosso próprio estado. O quanto custa isso?
Quanto está custando ao estado formar esses talentos em outras praças e
não trazer esses talentos, essas inteligências de volta. Ou acham que a gen-
te vai construir esse desenvolvimento sem talentos? Essa é outra questão.
Os vetores de pobreza, não podemos nos afastar deles; o Gini, como eu
digo, a gente está cada vez mais distante, a desigualdade está cada dia maior,
a renda domiciliar per capita e o percentual da população pobre. Existem 25%
da população ainda sem acesso ao bem-estar, que esta sendo proporciona-
do a outros segmentos da população nordestina. Existem pessoas que ainda
passam fome no Nordeste. Existem pessoas que ainda vivem com menos
de metade de um salário mínimo, do ponto de vista de renda familiar. Essas
políticas que estão aí são políticas de alívio, esses programas de bolsas são
políticas de alívio, de compensação. Mas não são políticas duradouras, nem
a gente tem que eternizar essas pessoas vivendo de bolsas de combate à
pobreza.
E um outro vetor, que é o social. A questão da educação. Eu acho que
não vai haver transformação também na região com os níveis de educação;
acabei de falar da questão dos talentos.
Eu não vou me deter muito, até porque o tipo de palestra aqui não pedia.
Estou apenas colocando aqui os rumos que eu acho que teriam que ser dis-
cutidos dentro desse projeto, que está sendo construído aqui nesse encontro.
Bem, a última pergunta, qual é a meta de redução desse desequilíbrio?
O Nordeste reduzirá sua disparidade social em um ritmo superior ao cres-
115RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
cimento econômico nacional. Com certeza, muitos vão se levantar, o Ceará
cresce mais do que o Nordeste. É verdade; isso já faz aí, não é Cláudio,você
que acompanhou isso de perto, já se fazem quase trinta anos, e onde esta-
mos com esse crescimento? Avançamos, é verdade, mas resolvemos os gra-
ves problemas e os graves desafios que a gente tinha há trinta anos atrás?
Ou eles ainda estão aí se perpetuando?
Então, a nossa concepção, a gente sabe que ninguém vai instrumentalizar
uma guerra no balcão de distribuição de recursos nacional, que é o Congres-
so Nacional. Mas, que o país, que vem crescendo, destine pelo menos um
percentual relativo e diferenciado desse crescimento que está acontecendo
para as regiões mais pobres. E discutir a distribuição da riqueza nacional,
disponibilizada por um orçamento anual de 2014, que com certeza já deve
estar quase pronto para chegar ao Congresso, é muito difícil, nessa política
de repartição existente. Como é que eu vou chegar lá e dizer: ó, São Paulo, vai
perder tantos por cento de repartição porque o Nordeste a trinta, quarenta,
cinquenta anos, só recebe 13% desses recursos. Esse carimbo dos 13% é bem
emblemático em tudo. A nossa população é em torno de 13, 14% da nacional,
os recursos do BNDES só vem para cá 13%, os recursos da união só vem para
cá 13%, e a distribuição agora até da Rede Globo, nos recursos do campeo-
nato brasileiro, também é em torno disso. Quer dizer, já está carimbado, para
o Nordeste 13%. O quê que vai acontecer? Perpetuar essa diferença, vai se
perpetuar essa desigualdade. Nós vamos viver aí mais trinta, quarenta, cin-
quenta, mais um século e essas diferenças vão continuar existindo.
116
Se não houver uma decisão firme, uma luta política forte para conquistar
esse compromisso federal de destinar uma boa soma dos recursos nacio-
nais, fruto do crescimento da sua riqueza, como foi no passado, para essas
regiões que hoje são privilegiadas, na direção das regiões mais desiguais; se
todos os anos, eu reparto os mesmos recursos, o que é que eu vou querer?
Se eu tenho três filhos dentro de casa, todos os anos eu reparto o mesmo
tipo de recurso, lógico que os três não são iguais, algum recebeu um tipo
de qualificação melhor, começou a crescer, a melhorar, mas eu pego e re-
parto os recursos da família de forma igual com todos. Claro que aqueles
que tiveram um patamar num determinado momento privilegiado da minha
vida, que pude qualificar o melhor, mandar estudar fora do Brasil, o que for,
esse vai estar na situação perpetuadamente melhor do que do último, que
não conseguiu acesso às mesmas condições que eu beneficiei o primeiro.
Então, essa disparidade entre eles, do ponto de vista da geração da riqueza,
da construção dessa riqueza familiar do ponto de vista individual, vai conti-
nuar se perpetuando,porque você não tem como compensar isso. Agora, se
a partir do momento, aquele que já andou, aquele que já se tornou autossu-
ficiente, eu começar a direcionar na direção do outro, eu vou equilibrar um
pouco para que os meus filhos possam ter mais ou menos a mesma renda, o
mesmo padrão de vida, a mesma qualificação.
Isso é o que acontece com a região. Os recursos continuam os mesmos.
Nós não participamos dessa riqueza nacional. Agora mesmo o congresso
comete aí um tremendo engano, com esses recursos do pré-sal destinados
117RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
à educação pela distribuição da mesma proporcionalidade. Onde se preci-
sariam colocar mais recursos numa proposta como essa, do ponto de vista
da qualificação, do capital humano? Era no Nordeste, era no Norte, era no
Centro-Oeste? Ou distribuir igual, como se fosse uma distribuição per capita
por cada brasileiro? Então, essa proposta desses recursos do pré-sal para
a educação vai perpetuar o mesmo modelo. Não tem outro caminho. Se eu
estou fazendo a distribuição dessa forma, eu não estou procurando privile-
giar? O Sul já tem padrões de qualificação do nível X, o Nordeste tem 30%
a menos, vamos colocar mais recursos no Nordeste para que a gente possa
elevar o nível do capital humano do Nordeste, para que ele possa vencer
seus desafios.
Ninguém discutiu isso no Congresso. Não teve um político do Nordeste
que questionou essa distribuição. Pelo contrário, a briga era só tirar a fatia,
do ponto de vista federativo, para a educação; um grande gesto, louvável
gesto. Mas era só isso? A discussão que tinha que ser travada era só essa?
Ela é extremamente maniqueísta, porque ela perpetua o modelo. Nós vamos
ficar eternamente vivendo em um Brasil desigual e não um Brasil que possa
se aproximar de um processo de igualdade.
Bem, quais os instrumentos para alcançar essa meta? Primeiro, como
coloquei aqui, tem que ter uma estratégia de governo. E nós, do Nordes-
te, temos que ter uma estratégia. Qual é a estratégia que nós vamos usar,
num movimento como esse, para fazer uma mudança, uma transformação
do atual modelo para um novo modelo? Temos que definir diretrizes. E as
118
diretrizes hoje, sem dúvida nenhuma, estão em cima da competitividade, e
a competitividade não se fará sem inovação, e não se fará inovação sem
talentos, e não se fará inovação sem pesquisa. E não se fará inovação com
uma nova universidade focada no desenvolvimento regional, como eu já vi
em vários lugares do mundo. Para citar dois centros que resolveram muito
bem esses problemas dentro dessa lógica, Israel e Coreia do Sul. Para quem
não conhece, acompanhe e veja que houve uma mudança em cima dessa
plataforma. Inclusão social, quer dizer, não pode se conceber um projeto do
Nordeste sem uma diretriz firme, compromissada de resolver essa questão
de incluir mais um Nordeste tão desigual, se a gente continuar perpetuando
esse modelo. Então, tem que ter inclusão, e essas pessoas não podem ser
condenadas definitivamente a viver numa renda familiar baixa e compen-
satória. Nós temos que formar uma outra geração de nordestinos. Não dá
mais, no século XXI, a gente pensar em políticas assistencialistas como a
gente está vendo. E, logicamente, investimentos, políticas de atração e de-
senvolvimento que possam fazer um acelerado crescimento econômico.
O Ceará vem crescendo mais do que o Nordeste há mais de vinte anos. A
que taxa? Em vinte anos a Coreia mudou completamente. A China vem mu-
dando rapidamente, apesar dos desafios ainda enormes que tem o povo chi-
nês. Mas as taxas lá são muito diferentes das nossas. Essa velocidade nossa
é muito lenta. Nós conseguimos ter um estado que cresce continuadamente,
uma região que cresce continuadamente, mas em cima de espasmos, não
é uma coisa forte, não é uma rampa acelerada e continuada em patamares
119RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
elevados, acima de dois dígitos, pelo menos em alguns anos, como aconte-
ceu com a China, como aconteceu com a Coreia, como aconteceu com o
Estado de Israel.
O Hipérides falou aqui, falou muito em recursos hídricos; eu vou até me
abster, que tem uma parte que eu toco na parte de recursos hídricos tam-
bém, que o maior desafio é o Semiárido.
Israel, acho que muitos cearenses que já tiveram oportunidade de conhe-
cer, viram o que é tirar leite de pedra. Mas se tirou leite de pedra por um
único fator: inovação forte,universidades comprometidas e fortes se inter-
-relacionando com os setores produtivos públicos e privados.
A relação entre a nossa universidade, do ponto de vista de desenvolvi-
mento, com os governos e com a sociedade produtiva; o Roberto está lide-
rando pela FIEC um grande trabalho nesse sentido, inclusive está trazendo
pessoas de Israel no sentido de aplicar um pouco do modelo que foi lá, mas
aqui ainda há barreiras intransponíveis nessa relação. São muito distantes
os papeis de cada um. E se é um papel integrado, definido, comprometido,
não com causas personalistas, corporativas, como a gente tem visto. Isso é
uma das coisas que eu, aos poucos, a luta no serviço público é muito grande.
Não é só essa da burocracia que piorou, não é Hipérides? Ela hoje está muito
pior do que na nossa época. E o pior, que eu acho que está vindo uma gera-
ção que está chegando ao serviço público e não recebeu a troca de bastão.
Houve uma demora grande em se fazer essa transferência de conhecimento
e a velha guarda do serviço público foi embora sem entregar o bastão. Isso
120
é ainda mais complicado, porque as pessoas estão saindo da universidade
com a cabeça, como disse o Hipérides agora, de promotor público; aí fica
difícil. Uma discussão estéril que a gente está vendo na cidade, envolven-
do o Prefeito, o governador, a sociedade, por causa de um viaduto. Eu fui
presidente do COEMA; não existe nada para ser construído que não tenha
agressão ambiental em qualquer nível, inclusive a sua casa. Compre um lote
de terreno e vá construir uma casa; quem é que não teve que derrubar uma
árvore para alocar a casa. Mas, existe compensação pra isso. E essas auto-
ridades não têm na liderança de sentar numa mesa e negociar uma compen-
sação? A regra da compensação. Vai ter um viaduto aqui e o quê que o meio
ambiente e nós vamos ganhar em troca de uma outra área que a gente vai
ganhar para cobrir essa perda? Porque perda tem em qualquer intervenção.
Uma barragem, que o Hipérides falou aqui várias vezes, uma adutora, tem
um intervenção e agressão ambiental. Então, daqui pra frente não se cons-
trói mais barragem, não se constrói mais estrada, não se constrói mais linha
de transmissão. E aí? Vamos frustrar o desenvolvimento? Vamos matar as
pessoas de fome por falta de renda? Vamos manter as pessoas nesse pata-
mar que está aí? É essa a proposta? É isso que tem que ser discutido num
encontro como esse.
Bem, então tem que sair um projeto, eu não acredito numa proposta de
discussão como esta ser um projeto, e tem que se compromissar esse proje-
to. Instrumentos importantes que eu acho num projeto como esse que estão
procurando construir: política institucional. Qual é o arranjo político desse
121RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
projeto? Como é que vai ser esse arranjo? Isso tem que estar bem estrutu-
rado. Segundo, já vi muitas promessas aqui. Aqui já se construiu toda uma
rede de recursos hídricos, de terminais de regaseificação, de produção de
gás no Nordeste, de refinarias. Essas promessas estavam, quando coloca-
das no orçamento público; porque promessa sem orçamento público o quê
que vira? Papo de eleição, papo de eleição. Então, se o Nordeste quer uma
plataforma nova, primeiro é não se enganar. Bacana, presidente, vamos co-
locar no orçamento esse compromisso? Ele já está no orçamento esse com-
promisso? Porque sem orçamento como é que se faz a promessa? Então, a
questão orçamentária é outro ponto fundamental da discussão num projeto
como esse.
Políticas e programas. Não vamos passar quatro anos, cinco anos, não
fizemos nada. Foi a Caixa Econômica que agora tem que tomar conta de
barragens, de adutora, com certeza desvirtuada aí a lógica. E me perdoem
os petistas; quem fez essa lógica, Hipérides, foi o Fernando Henrique Car-
doso que, por força de desconfiança da aplicação dos recursos no Nordeste,
começou a transferir os recursos da União via Caixa Econômica. Não foi só
para casa popular. Então, passou os recursos de saneamento, depois come-
çou a passar os recursos de recursos hídricos. Então, criaram um canal num
funil, que não estava estruturado para fazer esse acompanhamento, nem
do ponto de vista técnico, nem do ponto de vista operacional. Por isso esse
problema que o Hipérides levanta. E nem esse é o meio de se combater cor-
rupção, criando dificuldades. Se combate corrupção auditando os proces-
122
sos e punindo devidamente. Agora, auditando de forma correta, com gente
preparada para auditar, que não confundam uma laranja com uma banana e
ache que é o mesmo tipo de obra, como está sendo feito com essa geração
atual de promotores. Laranja e banana são coisas diferentes, na engenharia,
sobretudo. E na engenharia é tão fácil,porque a engenharia é lógica, é muito
fácil acompanhar uma obra de engenharia; só não acompanha quem não
quer. E é muito fácil saber formar um preço na engenharia. Agora, comparar
um tipo de alvenaria como essa com a alvenaria de uma casa popular; olha o
tamanho dessa parede aqui, olha o pé direito dessa parede aqui. E está mon-
tada essa parede em cima de quê? De uma laje que é flexível ou não? Ela
trabalha ou não trabalha? Que tipo de amarração tem que ter uma parede
dessa natureza? Daí o engenheiro da Caixa chega para fiscalizar um centro
de eventos como esse, olha lá a planilha de custos de alvenaria das casinhas
populares e do Minha Casa, Minha Vida,e diz: - Está superfaturada a alve-
naria do centro de eventos. Pelo amor de Deus, estou desaprendendo o que
eu aprendi na engenharia. Parece que esses engenheiros mais novos vêm
muito mais sabidos do que nós. Agora, por baixo deles, por baixo da grande
competência deles, passa um rio de corrupção que eles não conseguem en-
xergar, porque não conhecem projetos e não conhecem a relação comercial
e jurídica existente nos contratos. O problema maior está aí.
Então, precisa-se de políticas e de programas, porque não podemos fazer
a obra do ponto de vista espasmódico, não é? Começa uma obra, para por-
que não tem projeto. Licitar obra com projeto básico, isso é um grande equí-
123RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
voco da sociedade moderna, do ponto de vista público e privado. Esses erros
não são cometidos só na área pública; o Eike Batista que o diga. O grande
problema do Eike Batista foi só um: projetos de péssima qualidade. Orça-
mentação em cima desses projetos. E qualquer projeto ruim se pronuncia na
hora da execução. Fez um projeto ruim, na hora da execução só se faz com
aditivos e aditivos elevados. Ainda não rasguei meu diploma de engenharia
por incompetência não, Graças a Deus. O que eu aprendi ainda está muito
sólido e cada dia que passa eu procuro aperfeiçoar. O grande problema da
engenharia nacional está na qualidade dos projetos que são elaborados, no
nível de investigação preparatória desses projetos. E a consequência é tudo
que a gente está vendo aí. E a gente ainda tem que aguentar, aqui e acolá,
uma calúnia de um jornalista que não sabe coisíssima nenhuma sobre isso.
Se o Ministério Público e o Tribunal de Contas não sabem, imagine a gente
querer que um jornalista também saiba. E tome insinuações. E, por conta
disso, Hipérides, é que ninguém quer mais ir para o serviço público assi-
nar coisa nenhuma. Para quê? Para se constranger? Para estar submetido a
esse tipo de juízo? Essa é que é a discussão.
Bem, propostas prioritárias definidas e programas, uma boa governança.
Sem governança, sem uma gestão, sem um bom planejamento estratégico,
tático, operacional, sem uma gestão executiva, é difícil se implantar esses
projetos. Graças a Deus, do serviço público já me afastei faz sete anos. Pas-
sei uma época maravilhosa, de um aprendizado para mim muito rico. Mas
o nosso patrão exigia outros comprometimentos, não era Hipérides? Se a
124
gente não planejasse direitinho, não gerenciasse as obras direitinho, lá tinha
quem cobrasse. Lá tinha quem acompanhasse a gente todo dia, não era dr.
Cláudio? O dr. Cláudio estava todo dia lá, vamos Hipérides, o pessoal do
BIRD está chegando aí, cadê os cronogramas dos projetos? Vamos prestar
contas com os homens. O dr. Cláudio se lembra disso, não é? O Larry, não
era Larry, não é, Franzé? Estava lá no colozinho do Hipérides atrás de saber
se esses projetos do Hipérides estavam andando, e se eram de boa qualida-
de, eram julgados pelo próprio Banco Mundial. E o Cláudio reunia a gente
sistematicamente nos comitês de cobrança. Hoje a gente já não vê isso.
Um secretário de Planejamento, o que faz nesse país hoje? Orçamen-
to, empenho, o quê mais? Quem empenha essas políticas? Quem coordena
e afunila os programas dentro dessas políticas? Dentro da estratégica go-
vernamental? Não era assim, não. Na minha época, secretário não chegava
lá: - Cláudio, empenha tanto para obra tal; espera aí rapaz, nem autoriza-
mos a obra tal, vamos discutir; essa aqui está fora, Maia, essa não está no
programa; essa aqui está, vamos em frente. E é porque o Cláudio era ex-
tremamente dócil e generoso com a gente. A gente tinha uma equipe bem
entrosada. A gente tinha que discutir na Secretaria de Planejamento se os
projetos e os programas estavam dentro do objetivo finalístico da estratégia
governamental, e eram acompanhados na Secretaria de Planejamento. Ela
pensava políticas, ela acompanhava essas políticas, ela mensurava e busca-
va resultados. Hoje, não. Os secretários de planejamento são elaboradores
de orçamentos ruins, porque não têm um nível de assertividade adequado,
125RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
de programas distantes dos resultados. É uma dispersão de produtos, frag-
mentando os poucos recursos, e o que é que se obtém? A gente fala em seca
hoje; uma das primeiras lições que o Hipérides me disse, ele deve se recordar
disso; Maia, você sabe qual foi o meu primeiro emprego? Eu disse não, Hipé-
rides; eu fui trabalhar numa frente criada numa época de seca, no DNOCS, e
meu trabalho era gerenciar uma carpintaria. Eu digo, carpintaria, Hipérides?
Preparar, Maia, caixões de defuntos para enterrar os mortos da seca. Lembra
disso, Hipérides? Eu digo, foi mesmo Hipérides? Foi meu primeiro emprego,
Maia, em 1970. Não é muito longe não, fazem aí um pouco mais de cinquenta
anos; um pouco menos de cinquenta anos, quarenta e três anos.
Olhem os parâmetros de uma seca em 1970 e olhem os parâmetros dessa
seca, grave seca, desse ano aqui no Ceará. Alguém está vendo pedinte no
meio da rua? Isso foram políticas públicas, programas e projetos acertados,
de forma continuada. Quando se faz bem feito a resposta vem. Morte, come-
dor de calango no Nordeste, na Rede Globo, acho que faz tempo que a gente
não vê. Hoje, a dificuldade é outra. Como disse o Hipérides, muitos dos pro-
blemas, inclusive os de abastecimento d’água, ele acabou de dar uma gran-
de aula aqui, aqui no Ceará se acabaram. Tem que se acabar também com
o Nordeste, mas antes precisa-se acabar com essa visão assistencialista
da seca, porque ela ainda predomina na região, ainda tem briga de vereador
para alocar carro-pipa numa época dessas. Isso precisa mudar.
Em termos de propostas, uma é transformar o Nordeste num eixo de
oportunidades; outra, numa região, como disse o Hipérides muito bem, que
126
convive com suas características climáticas; o problema daqui ainda é falta
d’água, o Hipérides já falou sobre isso, colocou muito bem; é aprender a
conviver, esse é um eixo importantíssimo num projeto de desenvolvimento
do Nordeste; um eixo que, também não vou falar aqui de inclusão social, e
um eixo de uma região de governança moderna.
E aqui eu vou apresentar algumas propostas. A primeira: sem um órgão
planejador, monitorador dessas políticas fortes, competentes, feito e cons-
truído como foi no passado, na base do mérito, da ascensão profissional
pelo mérito de seus profissionais, agregador de inteligência, não vai haver
essa transformação. Então, o primeiro ponto importante para fazer uma
mudança, eu acho que era a nova SUDENE, que foi amplamente discutida,
essas propostas aqui fazem parte de um programa de discussão dessa re-
criação da SUDENE já no governo Lula e, infelizmente, não implantaram. Eu
vou passar mais rápido aqui por causa do tempo.
Bem, outra proposta desafiadora, essa tem que ser muito bem construí-
da e negociada politicamente, é o que eu chamo a regra do plas orçamentá-
rio. Investimentos do governo federal e estatais, vinculados ao tamanho do
desequilíbrio regional do Nordeste. Ou seja, se o Brasil tem um orçamento
esse ano com uma base de riqueza x, se para o ano, esse orçamento, fruto do
crescimento econômico, vai crescer 5%, a maior parte da fatia desse cres-
cimento é para investimentos do governo e de suas estatais, que cresceram
esse plas nas regiões mais desiguais, no caso, o Nordeste. Não alterará o
nível atual de investimentos, como hoje eles são repartidos e executados em
127RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
todas as regiões. Ninguém vai perder nada. Apenas do plas do crescimento
futuro vai haver uma distribuição diferenciada. O plas só será aplicado sobre
o volume extra de investimentos federais, que acontecerá a partir de 2014.
Quer dizer, isso se a gente conseguisse negociar nesse orçamento desse
ano. Acho que como isso está em montagem, esse encontro é uma monta-
gem de um projeto para o Nordeste, provavelmente essa proposta poderia
entrar, se esse projeto ganhasse coesão política e institucional, poderia en-
trar no orçamento de 2015.
Na medida em que o desequilíbrio regional for diminuindo, à medida que
essa distância vai se aproximando e o país se torna mais igual, se acaba
com essa regra. Essa regra é decrescente. Se aplicou durante determinado
tempo, aconteceu o equilíbrio, ela é extinta. Então, todos iguais, a partir daí
a regra do jogo é a mesma. Essa é a proposta. Ou seja, o plas é temporário e
possui uma regra de saída automática. Qual é a regra de saída automática?
O Brasil é igual. Na hora em que as regiões forem iguais, do ponto de vista
dos indicadores, ele não precisa continuar. Tem que ser operacionalizado nos
instrumentos orçamentários da União: plano plurianual, LDO e orçamento.
Se não for aí, como eu disse no início, é papo de político.
Outra proposta para poder subsidiar um programa de intervenção de in-
fraestrutura e de capital humano; o Hipérides falou sobre os recursos hídricos,
eu vou falar sobre o restante, com ênfase em energia. Primeiro, é criar as es-
truturas de financiamento como foi feito em outras regiões. O FNE, do BNB,
continuar e ser direcionado ao setor privado, setor produtivo, para atrair inves-
128
tidores para a região. O FNDE, da nova SUDENE, seria direcionado ao financia-
mento de infraestrutura regional; por exemplo, um projeto de transposição do
São Francisco seria financiado através desse fundo; o fundo da reforma tribu-
tária seria direcionado ao financiamento de infraestrutura local nos estados. O
Hipérides acabou de dizer, é muito importante fazer as intervenções primárias,
que ele disse que são as preferenciais da União, as grandes adutoras, os gran-
des canais regionais,mas se não fizer as terciárias e as secundárias, como ele
colocou, não vai se resolver o problema de recursos hídricos.
O que adianta chegar com a água do São Francisco, se a gente não puder
irrigar e distribuir essa água em todo o território cearense? Então, esse fun-
do da reforma iria financiar os estados a construir as infraestruturas locais.
E criar um fundo de capital de risco, como tem no BNDES, o BNDESPAR,
no BNB, para que o BNB utilizasse na região o mesmo instrumento de de-
senvolvimento que está sendo utilizado nas regiões ricas. Por que só lá? Por
que só as grandes corporações têm acesso a essa participação de tomada
de risco? Bem, e um fundo garantidor de parceria público-privada. Outro
dia, eu ainda estava no governo, o Senador Eunício Oliveira fez uma reunião
para discutir essa questão de PPP na casa dele, com os políticos do Ceará,
e eu fiquei pasmo. Porque eu vi político cearense de esquerda defendendo
que as parcerias público-privadas, elas eram viáveis no Sul porque no Sul
a União, ou os estados do Sul, entravam apenas com 20-30% das parcerias
público-privadas, o resto era capital privado, que a lógica era tomar risco.
Eu disse, bacana, então, nós do Nordeste estamos “fodidos”; não tem outra
129RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
expressão. Por quê? Eu digo, não tem volumetria para financiar mais do que
30% de participação de capital privado, quem vai bancar os outros 70? Está
aqui o Alencar, que conhece bem, na área de transportes; como é que eu
vou viabilizar uma estrada no Nordeste se a volumetria é baixa, em parceria
público-privada? Como é que eu vou exigir um capital privado e tomar um
risco acima de 70%? Não tem projeto.
Bem, o novo Semiárido o Hipérides já falou bastante. Eu vou também
passar rápido. Então, seria, dentro do que ele falou, um plano decenal de
recursos hídricos para a região. Fundamental essa conquista. O restante
são políticas agressivas de inovação e empreendedorismo, políticas de ca-
pacitação da população local, política de crédito diferenciado, política de
infraestrutura específica, etc.
Aqui nos recursos hídricos, eu tinha apontado aqui, mas o Hipérides já
mostrou; eram os projetos de canais que seriam necessários para a região.
O Hipérides tocou muito no eixo norte, no eixo leste, mas do ponto de vista
regional também tem uma demanda para o oeste da Bahia, atender o oeste
da Bahia, e também atender regiões de Sergipe, um outro eixo para atender
regiões de Sergipe e Alagoas. A demanda do Hipérides, ela contempla muito
mais esse Nordeste setentrional. É preciso olhar esse restante também do
Nordeste, dentro dessa política decenal e dentro dessa proposta também de
aproveitamento dos recursos hídricos do São Francisco.
Outra coisa importante é o desenvolvimento de cidades polo. Não vamos
pensar que a gente dispersando a população e mantendo essa dispersão, e
130
sem construir uma rede de cidades fortes, concentrando, que a gente vai
resolver todas essas demandas em que a sociedade está. Você já pensou em
cada um dos cento e oitenta e quatro municípios do Ceará, dos duzentos e
pouco que tem em Pernambuco e aí vai, a gente ter que construir toda uma
infraestrutura dessas de equipamentos. Que custo? Que riqueza tem que
se gerar para pagar isso? Aterros sanitários, redes de esgotos, tratamento
dessas redes, como falou o Hipérides, polos geradores de energia, equipa-
mentos, hospitais, universidades; é preciso se pensar no Nordeste como foi
feito no Sul, a concentração de regiões de desenvolvimento, de cidades polo,
de cidades que vão nuclear esse crescimento econômico.
Uma outra proposta importante é uma política de equalização de custos
de investimentos privados. Gente, essa história do incentivo, tão discutida,
o PT discutia isso com um maniqueísmo tremendo quando estava no gover-
no. O incentivo que a região Nordeste está dando, tirando do seu osso para
poder dar um incentivo desse, é a diferença de capital humano e de infraes-
trutura que existe de uma região para outra. Os governantes nordestinos
estão fazendo isso para compensar essa falta de capital humano, senão a
indústria que está lá no Sul não vem pra cá, para se tornar atrativo. E o ou-
tro é infraestrutura. O investimento vem nessa direção, o incentivo. Então,
tem que ter uma política, porque senão todas as indústrias vão se direcionar
pra lá. Tem uma rede de capital humano disponível agora; passei seis meses
entrevistando para contratar um diretor de recursos humanos para minha
empresa. Afunilei esses seis meses e todos que eu entrevistei no fim: eu vou
131RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
morar onde? Eu digo, no Ceará, o meu centro corporativo é em Fortaleza. Ah
não, eu tenho preferência de ficar em São Paulo. O problema não é o salário,
o problema é que eu não vou sair de um centro como São Paulo. Quer dizer,
pra gente empresariar aqui tem essas limitações. Tem determinados profis-
sionais que não querem deixar o eixo Rio-São Paulo, Minas, para vir pra cá.
Então, as empresas para virem pra cá têm muita dificuldade. Manter centro
corporativo aqui é uma luta. Você centralizar todo o processo de gestão e
controle dos seus negócios no seu estado de origem, como nós estamos
fazendo, é perverso, do ponto de vista do capital humano.
Bem, inovação e empreendedorismo, falei muito que não vai haver essa
transformação sem inovação.
Agora, eu entro dentro do que a gente colocou, e o objetivo principal do
que eu tinha que falar aqui, uma logística de infraestrutura integrada. Eu
estou passando rápido, no capital humano, inclusão social e outras coisas
que eu poderia conversar com vocês,eu vou me centrar num dos grandes
problemas da região: a logística de infraestrutura. O Hipérides falou sobre
recursos hídricos, muito bem. Essa aí eu já vou passar rapidamente. Mas,
primeiro, ampliar e modernizar a consolidação de uma rede de portos con-
centradores. Dos cinco melhores portos nacionais, o Nordeste tem três,e a
Bahia está construindo um quarto. Isso é um potencial diferenciado. Pecém,
Suape, o do Maranhão, o Itaqui e o que Salvador está construindo, podem
fazer uma grande diferença pra gente, se bem trabalhado e transformar es-
ses portos em grandes hubs. A mesma coisa tem que se fazer no aeroporto.
132
Natal está conquistando esse aeroporto hub, isso vai fazer muita diferença.
Isso a gente lutou muito no Ceará para trazer pra cá. Infelizmente, fizemos
muito no governo que participamos, mas não conseguimos trazer esse pro-
jeto. Mas acho que cabem pelo menos dois grandes hubs no Nordeste de ae-
roportuário, e o Brasil precisa repensar isso, e criar também os aeroportos
concentradores, e criar e fortalecer a aviação regional.
Modernização de uma nova rede ferroviária. Está aí a TRANSNORDESTI-
NA, andando a passos muito lentos; a gente soube que começou, mas quan-
do vai terminar e começar no Ceará a gente está por saber. A gente sabe que
está bem avançado no Estado de Pernambuco; no Piauí parou, não é? Olha
aí. Então, é uma rede que integrasse toda a região.
Como é que eu clico aqui para abrir esse mapa do Nordeste? Eu queria
clicar em cima desse azul, rede ferroviária, mostrar um pouco.
Essa é a rede, nossa, do Nordeste, eu procurei aqui integrar os portos,
Salvador, Suape, Pecém, Itaqui; aqui é uma rede que vem de Carajás, no Ma-
ranhão, a rede de estreite entre o Ceará e o Maranhão. Aqui é a TRANSNOR-
DESTINA que está em construção, que vai ao Piauí, mas ela devia prosse-
guir para integrar com o eixo Norte-Sul. Aqui em Barreiras também está
sendo construído um ramal até Brumado, que também teria que se integrar
com a Norte-Sul, para completar essa rede ferroviária, esse era um grande
desafio pra nós, integrada aos portos. Definir isso nas prioridades propostas
era muito importante.” Bem, outra é uma rede de estradas, já construíram
até o Rio Grande do Norte e tinham que levar até o Maranhão.
133RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
A malha de gasodutos, essa foi a grande evolução dos últimos anos. Cli-
que aqui nessa malha de gasodutos; vou passar também bem rápido, e a
matriz energética, e encerrar.
Essa era a rede desejada pelo Nordeste; Essa era a situação em 1999 des-
sa rede, tinha esse buraco aqui entre o Espírito Santo e a Bahia, e logica-
mente ao Nordeste. Essa em 2007; foram iniciadas essas redes em vermelho
e lá no Amazonas também.
Essa é a rede atual, em 2012; quer dizer, houve uma grande evolução na
rede de gasoduto, o problema agora é produção de gás, disponibilidade de
gás, rede para transportar tem.
E aí é o grande pleito restante da região, que é a integração desse gaso-
duto a região Meio-Norte.
Bem, essa é a rede de gasodutos existentes, quer dizer, uma evolução
grande do ponto de vista não só da extensão, como também da capacidade
de transferência. E os dois terminais de regaseificação que estão aí através
de uma barca importada, uma no Ceará e outra no Rio de Janeiro, e estão
prevendo um terceiro na Bahia.
Bem, a matriz energética, houve também uma evolução grande; clique aí
rapidamente, aqui, são duas transparências rápidas para mostra e encerrar.
Essa é a disponibilidade hídrica da região, a capacidade instalada no Nor-
deste, nós temos limitações daqui pra frente de geração de energia; o Pican-
ço estava colocando para mim a preocupação dele com a questão térmica, a
prioridade do governo em construção de térmica sem gás natural.
134
Essa é a malha de integração em 2007.
Essa é a malha integrada hoje. As pontilhadas estão em construção, o
Brasil hoje está interligado, isso é outra grande vantagem competitiva. O
Nordeste está bem servido nessa questão. Esse é o sistema de transmissão
previsto para estar pronto no final de 2014. Pode retornar.
E aqui eu encerro, em função do pedido da mesa, do moderador, cumprin-
do aqui minha obrigação e me colocando à disposição de vocês.”
Jurandir Picanço Júnior “O dr. Maia foi muito dentro do objetivo aqui do
Integra Brasil, acho que ele já apresentou praticamente uma proposta, um
modelo de desenvolvimento para o Nordeste, dentro dessa visão de integra-
ção. Não adianta uma região estar nesse desequilíbrio que nós temos.
Com relação à energia, eu gostaria apenas de complementar, que aqui
no Nordeste nós temos realmente potenciais de energia muito importantes.
E o potencial eólico, que é o potencial que já está sendo explorado e que
demonstra que já tem uma viabilidade econômica, deveria ter participado
de integrar do planejamento. Hoje nós temos no setor elétrico um plane-
jamento hidrotérmico, são reservatórios hidráulicos complementados por
energia térmica. No momento em que a energia eólica passou a ser viável,
esse planejamento deveria ter sido refeito para possibilitar a maior partici-
pação da energia eólica no sistema. A energia eólica está crescendo, mas é
como sendo uma coisa consentida, marginal, não é dentro de um programa
pela importância que ela tem.
135RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
O potencial eólico é equivalente ao potencial hidráulico, e realmente a
possibilidade desse desenvolvimento vai se dar principalmente no Nordeste,
como já tem acontecido nos últimos leilões, porque aqui nós temos as me-
lhores condições para exploração dessa forma de energia. E, evidentemente,
um dos fatores importantes para contribuir com essa redução do desequi-
líbrio.
Eu vou passar agora a palavra para o nosso relator, dr. Carlos Eduardo
Marino, que é doutor em Economia pela UFC.
Carlos Eduardo Marino “Obrigado. Parabenizo aqui os dois palestrantes,
realmente enriqueceram muito a questão desenvolvida nesse painel.
“Uma questão que foi explorada logo no início da exposição do dr. Maia
Júnior, que ele identificou muito bem, as principais causas dos nossos de-
sequilíbrios regionais, quando apontou a nossa divergência em relação a ca-
pital humano com o Centro-Sul do país, e a nossa divergência em relação à
infraestrutura.
Uma questão que eu acho que é pouco explorada, tanto na literatura
acadêmica, como na elaboração de políticas públicas, é a possibilidade de
atrair capital humano para as regiões, não é? E me parece, uma impressão
baseada em alguns fatos que eu tenho nesse momento, é que o Ceará tem,
nesse momento histórico de desenvolvimento, ele vem captando capital hu-
mano, tanto nacional como estrangeiro. Eu acho que isso no futuro poderá
ser, se bem conduzido pelas políticas públicas, pode vir a ser um grande
136
vetor de desenvolvimento para a Região Nordeste. Porque a questão da in-
fraestrutura é uma questão que pode ser resolvida num horizonte de tempo
mais rápido, mas, em relação à questão de capital humano, nós estamos fa-
lando de gerações, nós não podemos pensar em política de capital humano
como uma política de curto prazo ou de médio prazo, é sempre uma política
de longo prazo. Eu acredito que importação de mão de obra qualificada, para
a Região Nordeste, talvez seja uma solução que possa ser conduzida num
curto prazo. Isso não é explorado; pelo menos eu não tenho conhecimento
que isso esteja sendo explorado, nem pelo governo federal nem pelo Gover-
no Estadual. Então, só essa questão para gente refletir.
Em relação à questão dos recursos hídricos, a palestra realmente foi
mais; na realidade, eu captei muitas informações; é um assunto que pratica-
mente eu não conheço em profundidade e foi muito interessante observar a
potencialidade do Ceará. Nós esquecemos a agricultura, esquecemos muito,
no projeto do desenvolvimento do estado nós não enfocamos as possibilida-
des de desenvolver o estado via agricultura e, realmente, a gente percebe
que é possível, que existe possibilidade de a gente conseguir algum desen-
volvimento por essa área que, embora tenha pouca participação no produto
econômico; em relação ao percentual populacional, é bem representativa
hoje no Estado do Ceará.
Jurandir Picanço Júnior “Passaremos agora aos debates, mas eu queria re-
gistrar a presença nesse auditório da dra. Nicolle Barbosa, que é realmente
137RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
a grande condutora de todo esse processo, e do dr. Carlos Prado, que vem
também com o entusiasmo dele conduzindo todo esse projeto do Integra
Brasil.
Nós temos aqui os questionamentos que foram colocados pela organi-
zação, que, em meu entender, foram respondidos com a apresentação das
palestras: Por que não se avança mais na utilização do potencial de energia
solar e eólica do Nordeste, e quais as reais perspectivas da exploração de
novas fontes de energia no Nordeste e de contribuição destas para o desen-
volvimento regional do futuro?
Então, são as perguntas da organização que eu repasso ao dr. Maia para
respondê-las. Com relação às de recursos hídricos, elas foram integralmen-
te respondidas durante a palestra do dr. Hipérides.”
Francisco Queiroz Maia Júnior: “Bem, o problema do avanço das energias
alternativas no Nordeste está, sobretudo, em infraestrutura. Em infraestru-
tura não só de conexão, como também de redes de transmissão. Inclusive,
tem uma série de projetos prontos para começar a operar e, lamentavelmen-
te, houve um atraso na construção dessas redes, nas ICG’s, e esses projetos
não estão sendo disponibilizados em tempo hábil. E foi o grande limitador
do leilão que aconteceu na sexta-feira recente, onde, na contratação de mil
e quinhentos megawatts, no caso do Ceará, por exemplo, nós tivemos uma
participação de apenas 7% dessas energias que serão compradas e introdu-
zidas nos próximos anos.
138
As reais perspectivas de exploração de novas fontes de energia, essa eu
acho que é uma grande preocupação. Como o Picanço colocou, que duran-
te alguns anos nós exploramos todos os potenciais hidráulicos existentes e
disponíveis para geração de energia. Hoje são pequenos potenciais disponí-
veis. Na crise de 2002, no apagão de 2002, se construiu uma rede de back-up
montada em cima de termoelétricas a gás natural. Lamentavelmente, esses
programas de termoelétricas continuam sendo priorizados em detrimento
do de energias alternativas, que já estão se viabilizando no Nordeste, a prio-
ridade é contratar projetos térmicos, ou a gás, ou a carvão; o Ceará acabou
de implantar quase mil e cem megawatts de energia térmica a carvão, e
nós temos um grande desafio como eu mostrei, não é mais com a rede de
transporte, do ponto de vista interestadual na região, é para transportar gás
natural. Nem o desafio de ter gás, o problema nosso, do ponto de vista de
produção sim, porque nós estamos suprindo essas demandas dessas ter-
moelétricas, quando acionadas através de gás importado que é muito caro.
Essa barcaça que está aqui no Pecém e outra que está no Rio de Janeiro,
complementando a produção de gás existente e disponível no país, é um
grande limitador. Surgiu e o Brasil tem potenciais de gás de xisto, que é a
grande transformação nesse atual momento, ultrapassando os Estados Uni-
dos e diminuindo seu grau de dependência e de modificação de sua matriz
energética. O Brasil podia também pensar nisso.
A grande preocupação, acho, desse projeto, é discutir qual será a pro-
dução e o preço desse gás que vai garantir essas energias de back-up no
139RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
futuro ou se direcionar para outras prioridades de outras alternativas. No
caso, energia eólica, pelo potencial, como disse o Picanço, muito superior
ao parque instalado de geração, e também as disponibilidades que têm para
construção de usinas nucleares em forte reação ambiental no Brasil, mas
que hoje, têm tecnologias hoje bastante modernas e capazes de garantir a
sustentabilidade ambiental.
Outra pergunta que foi respondida, a questão da União Europeia, a ques-
tão de como resolver esse problema das desigualdades, fortalecendo ao
mesmo tempo a economia brasileira; eu acho que foi amplamente respon-
dida na minha exposição. E a pergunta do presidente do BNDES, se não de-
veria ser o Nordeste líder de tecnologias que poupam água e energia. Eu
gostaria de dizer o seguinte: desde que eu estava no governo, por diversas
vezes discutimos isso internamente e levamos essa questão do desenvol-
vimento econômico, foi uma das propostas que encaminhei ao então eleito
governador Cid Gomes, que me convidou para uma conversa, que era dotar
o Ceará, a visão pode ser regional, não só dos grandes projetos de inovação
em tecnologias de água e energia, sobretudo na redução de consumo, pelas
limitações dos nossos potenciais, mas como ser o Nordeste o grande centro
de inteligência através de suas universidades, nessa questão dos recursos
hídricos, os grandes centros de pesquisas, de inovação, e um grande centro
produtor de bens de capital. Não só hoje, o Ceará conseguiu fazer isso, im-
plantamos a primeira fábrica de geração de bens de energia eólica, que foi
a Wobben, e hoje o Ceará tem, salvo engano, três indústrias nessa direção.
140
Mas o Ceará poderia ser grande produtor de bombas, de válvulas, tecnolo-
gias existem em Israel, para suprir todos esses programas de infraestrutura
hídrica e energética da região. Acho que isso era uma cadeia de valor imen-
sa, não só para que os governos explorassem e montassem um programa
em comum com as universidades, agregando inovação, agregando pesquisa
e agregando produção de bens. Mas eu acho que esse é um desafio, inclusi-
ve, que a própria FIEC tem de criar uma nova cadeia econômica no Estado
do Ceará, que é a produção de bens na área de energia e na área de água.
Acho que isso seria um desafio extremamente interessante. E se essa é a
proposta liderada pelo próprio presidente do BNDES, ele seria uma grande
fonte para liberar um projeto como esse. Eu cheguei a conversar sobre um
projeto como esse com o então, era o presidente do PMDB, era o Carlos; do
BNDES na época do, foi o primeiro presidente do BNDES com o Governo
Lula. É professor, muito ligado aquela Maria da Conceição, ele foi presidente
do BNDES; ele discutiu isso. Ele conheceu esse projeto aqui liderado pelo
Ceará, na área de energias alternativas, na área de água do Hipérides, e ele
ficou maravilhado, e achava que isso era a grande fonte de transformação
da região, essa ideia que está aqui proposta pelo Luciano Coutinho. Eu acho
Cláudio, devia se levar adiante uma proposta como essa. Carlos Lessa, o
nome do presidente do BNDES; discuti várias vezes, ele ficou maravilhado
com esse projeto do Ceará e, para ser sincero aqui com a plateia, foi a últi-
ma pessoa, ou talvez a única pessoa, do ponto de vista federativo, que eu vi
enxergar o Nordeste como região de oportunidades, não um problema. Ele
141RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
tinha uma verdadeira fascinação, ele dizia muito pra mim: meu sonho é fazer
do Nordeste uma Califórnia do Brasil. Infelizmente, essas pessoas idealistas
foram sendo eliminadas em troca do pragmatismo.”
Painel 3: Infraestrutura para o Desenvolvimento do Nordeste: Transportes, Logística e Telecomunicações
Moderador
João Alencar Oliveira JúniorDoutor em Engenharia de Transportes pela Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ, superintendente da Diretoria de Infraestrutura de Mobilidade, Trânsito e Tráfego da Autoridade Pública Olímpica - APO
Expositores
Sergio Machadopresidente da TRANSPETRO
Renato Casali PavanPresidente da Macrologística Consultoria LTDA.
Gustavo Maurício Filgueiras NogueiraSecretário de Planejamento e Gestão do Estado da Paraíba e presidente do CONSEPLAN
Relator
Pedro Jorge VianaProfessor Titular da Universidade Federal do Ceará - UFC e coordenador do Instituto de Desenvolvimento Industrial do Ceará da Federação das Indústrias do Estado do Ceará - INDI/FIEC
145RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
PAINEL 3
INFRAESTRUTURA PARA O DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE: TRANSPORTES, LOGÍSTICA E TELECOMUNICAÇÕES
QUESTÕES A SEREM RESPONDIDAS PELOS EXPOSITORES
Transporte e Logística
Que ações logísticas básicas e indispensáveis devem ser implementa-
das para aumentar a competitividade do Nordeste nos planos nacio-
nal e internacional?
Em que direção devem ser operadas as transformações na logística de
transporte atualmente prevalecente no Nordeste?
Que papel terá a TRANSNORDESTINA no desenvolvimento do Nordeste?
Que proveito o Nordeste poderá tirar do transporte marítimo? De que forma?
O investimento governamental em logística e transporte no Nordeste,
comparado com o que se realiza no Sul e Sudeste, além de acanhado, anda
146
a passos de cágado, haja vista a TRANSNORDESTINA, tão vital para o de-
senvolvimento regional. Isso tem prejudicado sensivelmente a integração do
Nordeste em termos intra e interregional. Como mudar essa realidade?
Telecomunicações
Como situar as telecomunicações no processo de desenvolvimento do
Nordeste?
Infraestrutura em Geral
A União Europeia, visando ao seu fortalecimento, quando da admissão
de novos países, realiza neles, por meio da “assistência financeira de pré-a-
desão”, grandes investimentos em infraestrutura. Por que não se adota no
Brasil essa prática para reduzir as desigualdades regionais, fortalecendo, ao
mesmo tempo, a economia brasileira?
Cerimonialista: “Na sequência de nossas atividades, assistiremos ao painel
“Infraestrutura para o Desenvolvimento do Nordeste: Transporte, Logística
e Telecomunicações”.
Para exercer a função de moderador deste painel, convido ao palco o dou-
tor em Engenharia de Transportes pela Universidade Federal do Rio de Ja-
neiro, João Alencar Oliveira Júnior, superintendente da Diretoria de Infraes-
trutura de Mobilidade, Trânsito e Tráfego, da Autoridade Pública Olímpica.
Convido ao palco, os senhores expositores:
147RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
O senhor presidente da TRANSPETRO, Sergio Machado.
O senhor presidente da Macrologística Consultoria Ltda., Renato Casalli Pavan.
O Excelentíssimo senhor secretário de Estado do Planejamento e Gestão
da Paraíba, e presidente do CONSEPLAN, Gustavo Maurício Filgueiras No-
gueira.
Para exercer a relatoria deste painel, convido à mesa o professor Titular
da Universidade Federal do Ceará, Pedro Jorge Viana, Coordenador do Insti-
tuto do Desenvolvimento Industrial do Ceará, da Federação das Indústrias
do Estado do Ceará.
João Alencar Oliveira Júnior: “Boa tarde a todos. É sempre um prazer vol-
tar à terra, como cearense e professor por quatorze anos aqui na Universi-
dade Federal do Ceará, privo da amizade de várias pessoas aqui presentes e
também das autoridades aqui da mesa.
É um grande desafio discutir infraestrutura de transportes, infraestrutu-
ra e logística na nossa realidade nordestina. Mais desafio ainda é entender
o que é que essa rede de transportes pode ser uma alavanca para o nosso
desenvolvimento. Não se pode compreender que transportes, enquanto uma
condição necessária, não é suficiente para provocar esse desenvolvimento.
Então, quais são os outros elementos que têm que estar junto à questão da
infraestrutura de transportes. Esse é o grande desafio que nós, nordestinos,
temos que provocar, uma discussão entre nossos pares, entre os nossos ir-
mãos nordestinos, para que possamos ter uma proposta comum, enquanto
148
região, para fazer face ao desafio, fazer com que esse desequilíbrio interre-
gional histórico que temos aqui na região Nordeste, em relação país, possa
ser eliminado no mais curto espaço de tempo.
Eu vou passar a palavra agora para o dr. Sergio Machado, que, como ele
bem falou ontem na solenidade de abertura, não é apenas o presidente da
TRANSPETRO, mas também o ex-presidente do Centro Industrial do Cea-
rá, senador da República, secretário de Governo em várias gestões, então a
pessoa mais do que capaz de trazer essa provocação, como bem fez ontem
na fala de abertura, e para que possamos agora usufruir um pouco mais des-
sa sabedoria que alavancou, junto com outros interlocutores aqui do Ceará,
o que nós hoje somos aqui no Estado e também o que nós somos na região
Nordeste e no Brasil.
Sergio Machado: “Saudar, inicialmente, o meu companheiro, presidente da
Federação das Indústrias do Ceará, Roberto Macêdo, que, junto com a Ni-
colle, tem feito um trabalho muito importante em um seminário como esse
Integra Brasil.
Eu acho que nós vivemos um momento, Roberto, essencial para que se
possa pensar o novo. É hora de a gente buscar novos caminhos. Nós já tenta-
mos diversos caminhos, diversas alternativas, já se colocou incentivo fiscal,
já se mudou incentivo fiscal, e a nossa posição continua a mesma. Então, ou
nós mudamos de caminho ou não vamos a lugar nenhum. E eu sou daqueles
que acredita que o impossível só existe hoje, amanhã a gente dá um jeito.
149RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Gostaria de saudar o João Alencar Oliveira Júnior, nosso conterrâneo,
ele que vai moderar aqui os debates; meus colegas palestrantes, Gustavo
Nogueira, que é secretário de Planejamento da Paraíba, tem um grande
desafio pela frente, que é encontrar caminhos para o desenvolvimento da-
quele estado, de conseguir uma parceria regional; o Renato Casalli Pavan,
que é o nosso outro palestrante; o Pedro Jorge Viana, que é o nosso amigo
de muitas datas, desde aquele velho CIC, não é, Pedro?, que a gente tenta
sonhar, que a gente tenta mudar, e eu acho que esse é o objetivo desse
seminário.
O Brasil mudou em junho. Mudou porque as pessoas foram à rua dizer
que esse modelo político que está aí, esse modelo administrativo não con-
vém mais aos brasileiros. Porque nós crescemos muito, isso é uma coisa que
acontece em todo o mundo. Na hora que se melhora de vida, se quer mais.
E se quer mais serviço, se quer mais qualidade, se quer mais pro-atividade,
se quer mais competência, e foi isso que foi o recado das ruas. As pessoas
têm que entender que ou muda, ou serão mudados. Não há opção de confor-
mismo nesse momento. Não há possibilidade de a gente querer, nem com
Coramina, aquele remédio bem antigo, reviver o passado. Porque quem se
opôs às mudanças, quem tentou se opor às mudanças, ou foi parar num ce-
mitério ou num museu. Num museu foram para os dinossauros, que não se
conformaram com o fato de que o mundo tinha mudado, e no cemitério, das
cem maiores empresas americanas de cinquenta anos atrás, tinham doze,
vivas até agora, agora só onze porque a Kodak quebrou, exatamente pela
150
arrogância de não compreender as mudanças, de ter que se adaptar aos
novos tempos.
Nós, do Nordeste, temos que ter coragem de mudar. E é isso que eu vou
tentar na minha palestra, mostrar e demonstrar que a gente já fez tanta ex-
periência, desde 1958 a gente faz experiências, tenta modelo, tenta, e a nos-
sa posição relativa não muda. E aí a gente tem que tentar entender o porquê
disso e tentar participar. Porque nós não aceitamos com 28% da população,
ser só 13% do PIB do Brasil. Isso não é destino. Isso é vontade de mudar, de
buscar novos caminhos, entender novos caminhos, de entender novas dire-
ções e de ter coragem da consequência. Porque o nosso momento, que a
gente vive, é um momento que não permite conveniência. Conveniência o
passado dava guarida, esse momento não dá direito a conveniência. Neste
momento, a gente tem que fazer o que é certo, e é bíblico.
O caminho que leva à sustentabilidade não são as largas estradas. Como
diz a Bíblia, a larga estrada leva ao inferno. O caminho que leva ao paraíso é
o caminho estreito, difícil, agora tem que ser enfrentado para que você pos-
sa ter sustentabilidade. E este é o grande desafio que nós temos no momen-
to no Nordeste e temos que enfrentá-lo com a maior coragem, com a maior
determinação, para que a gente possa chegar ao nosso objetivo.
Então, eu vou começar falando sobre como é que se encontra nesse mo-
mento a situação mundial. O mundo mudou, os velhos ricos hoje estão ran-
gendo os dentes, mas é de dor, e os novos ricos estão sentindo dor, mas é
a dor do parto, a dor da vida, a dor do nascimento. Só aí a gente vê como é
151RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
que encontra a renda no mundo, como é que era e como é que é. Na década
de 1940, os Estados Unidos tinha quase a metade do PIB do mundo, era a
nação toda poderosa, era a nação que dominava o mundo, e o mundo nesse
último momento mudou, mudou completamente. Hoje, quem controla, quem
tem o maior PIB do mundo, não é mais os Estados Unidos nem a Europa, são
os emergentes que somados controlam 30% do PIB do mundo. Mesmo com
o crescimento de 7% que a China vai ter este ano, ela agrega mais riqueza
para o mundo, ela agrega três vezes mais riqueza para o mundo do que os
Estados Unidos. E a China, sozinha, agrega mais riqueza do que o Japão,
Alemanha, Estados Unidos, França e Inglaterra, somados.
Então, esse é o novo mundo. Esse é o mundo; ontem tem oportunidade
para os novos. Esse é o mundo que tem oportunidade para os emergentes. E,
graças a Deus, nós estamos vivendo num país que tem todas as condições
de aproveitar esse momento, que é o nosso Brasil. Nós vivemos o século de
sorte do Brasil. O que é sorte; o que é azar? Azar é quando a oportunidade
aparece e você não está preparado, a sorte é quando a oportunidade apare-
ce e você está preparado. E o Brasil está preparado. Porque o que acontece
no mundo hoje é que a gente está vivendo num processo de urbanização su-
peracelerada na Índia e na China. Quem está vivendo, que são as economias
onde o consumo está aumentando, porque o consumo não está aumentando
nos ricos, não, os ricos estão se tornando mais eficientes. Por exemplo, o pe-
tróleo. Os Estados Unidos têm um consumo per capita de vinte e quatro bar-
ris por habitante/ano. A Índia tem um e pouco, a China dois e pouco. Onde
152
é que vai crescer o consumo do petróleo? É nos Estados Unidos? Não, são
nesses países. E, como o petróleo, é comida, enfim, é onde a renda está se
transformando, onde a renda está mudando. E o Brasil dispõe de todos os
requisitos para que isso possa acontecer. Nós temos população, nós temos
riquezas naturais de todos os tipos, vou demonstrar, e temos um fator que
é absolutamente essencial: isso se chama democracia, respeito ao cidadão,
respeito à vontade coletiva, garantia de estabilidade, que nem tem a Índia,
que é uma sociedade democrática média com castas, nem tem a China, nem
tem a Rússia, que são os principais, que disputam espaço com a gente. Ago-
ra, em compensação, eles não têm recursos naturais; só tem a Rússia, e nós
temos. Então, nós temos recursos naturais e temos democracia.
A gente tem, por exemplo, energia de todos os tipos, e quem venceu a
guerra no mundo foi quem tinha energia, foi o carvão com a Inglaterra, foi o
petróleo com os Estados Unidos, e a energia sempre está associado com os
meios de comunicação. Quando foi o carvão, quando foi a revolução indus-
trial, ela veio impressa, escrita. Com o petróleo, veio o rádio e a televisão, e
com os renováveis veio a rede social. Então, esse é o novo mundo que a gente
está vivendo e que a gente está construindo, e que nós estamos completa-
mente preparados para ele.
O Brasil tem todos os recursos energéticos que a gente pode imaginar.
Energia eólica, solar, nuclear, hidrelétrica, e agora, com o pré-sal, que tem
exatamente uma área do tamanho do Ceará, são cento e quarenta e nove
quilômetros quadrados, e que vai colocar o Brasil como o terceiro ou o quar-
153RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
to maior produtor de petróleo do mundo. Basta ver esse campo de Libra,
que vai ser agora leiloado, que é uma das maiores reservas de petróleo do
mundo. Ela vai render para o país mais de um trilhão de reais, que vai acres-
centar à nossa riqueza. Então, é um momento superespecial.
Além da energia, que é um bem fundamental, o Brasil tem 14% da água
doce do mundo, que será uma riqueza tão importante quanto à energia, para
essa época. Essa é uma vantagem enorme. Temos 334 milhões de hectares
de terra, dos quais um terço a gente não usa, agricultáveis que eu estou fa-
lando, 90 milhões é de pastagem com uma cabeça por hectare, a gente pode
facilmente, com a tecnologia, e quem é do ramo sabe, chegar a uma e meia
com facilidade. Então nós temos abundância de produção de comida.
Nós, brasileiros, tivemos um pouco de preconceito, porque para nós ri-
queza era só indústria, falar em industrialização, industrial era o rico. Mas,
isso era no século passado. Hoje o rico é quem produz riqueza. E o agrone-
gócio é uma grande oportunidade de produção de riqueza, e é o setor que
mais gera, se você considerar a cadeia inteira, que mais gera riqueza não
é a construção civil, não, é o agronegócio. E esse é um negócio que o Bra-
sil domina, e domina não só pela produtividade, sobretudo, pela tecnologia
que nós temos disponível e que foi desenvolvida com muita propriedade pela
EMBRAPA. Então, nós temos um país que tem um mercado consumidor
enorme. Nós tivemos uma mudança de classe desde os últimos governos, do
presidente Lula, da presidente Dilma, houve um crescimento, uma ascensão
enorme, de quase uma Argentina, e brasileiros que ascenderam à classe
154
média. Então, nós temos um mercado consumidor enorme no Brasil, que é
outro patrimônio maravilhoso.
Nós temos os juros em queda, e vai cair, necessariamente, pela realidade.
Temos reserva de 370 bilhões de dólares; estamos vivendo em pleno empre-
go, nosso desemprego está variando entre 5,8% e 6%.
Agora, nós temos uma alta dose de pessimismo. As pessoas querem ver
uma situação ruim onde não tem. Às vezes, eu leio os pensamentos e acho
que estou vivendo na Europa, sou habitante de Portugal, lendo sobre Portu-
gal, e não sobre o Brasil. Nós vivemos um momento especial. Agora, tem que
ter o quê? Desenvolvimento e ousadia. Ninguém muda, porque é o seguinte:
a grande chance nossa que pato novo só coloca a cabeça de fora quando
está na crise, fora de crise pato velho não deixa pato novo colocar a cabeça
de fora, não. E esse momento é um momento que a gente pode efetivamen-
te aproveitar para colocar a cabeça de fora, e essa é a nossa hora, a nossa
geração. Nós temos uma sorte enorme em nossa geração. Porque normal-
mente você lê a história. Quando você vê a história, você já é um privilegiado.
Agora, escrever a história, como a nossa geração está tendo o direito, como
nós aqui do Nordeste estamos tendo direito de escrever a nova história do
Nordeste, isso é um privilégio para poucos. Poucas gerações no mundo tive-
ram esse privilégio e nós temos esse privilégio.
O país está se preocupando bastante com investimentos em instrutura.
Nós temos um investimento de quase um trilhão e trezentos nos próximos
anos. O Nordeste é a segunda região que mais investe em instrutura, e nós
155RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
temos que nos preocupar com ela porque uma coisa que eu aprendi traba-
lhando com logística, e foi uma experiência muito interessante, é que, desde
que o homem gerou o excedente econômico, o fator que ti dá maior compe-
titividade é logística, porque o que agrega valor não é produzir nem fabricar,
é movimentar. É quando o produto chega ao mercado que ele agrega valor.
Foi por isso que as especiarias só tiveram valor quando Vasco da Gama des-
cobriu o caminho para as Índias. As especiarias estavam lá, mas não tinham
comprador, não tinha preço, então sem preço não vale. Então, é na logís-
tica, é por isso que países pequenos como a Holanda, Portugal, Espanha
e Inglaterra, tiveram um poder no mundo, por quê? Porque dominaram os
mares; foram vias piratas, dominaram os mares e tiveram esse poder e essa
força. Daí a importância da logística no desenvolvimento. Então, o tamanho
de um mercado em qualquer país, qual é? É quão longe ele pode levar seus
produtos a preço competitivo. E o que é que movimenta esse produto? É
logística. Daí esse painel ser importante, daí essa questão do Nordeste ser
fundamental em discutir a logística, porque a logística do Nordeste, infeliz-
mente, você, tirando a movimentação de minério, é praticamente toda feita
no lombo do caminhão, chega a quase 100% no lombo do caminhão, e isso é
uma coisa que onera, porque o transporte rodoviário custa o dobro do ferro-
viário, que custa o dobro do aquaviário, e esse também é um problema que
acontece no Brasil.
Então, é importante a gente ver que dos investimentos totais o Nordeste
é o segundo. E do nosso investimento, estão concentrados em duas áreas:
156
saneamento, que é medicina preventiva, é muito bom para quem tem uma
população em condição de trabalhar, em condição de viver, o nosso próprio
estado, em 1987, era um dos campeões em mortalidade infantil no Brasil;
a gente tinha 115,5 mortos por cada mil nascidos vivos, e isso foi possível
resolver por quê? Porque teve vontade, e o quê? Mudança de paradigma,
buscar novos caminhos e novas alternativas. E foi agente de saúde, foi
mudar o critério, foi pensar na saúde preventiva, foi a campanha de va-
cinação, e hoje o Ceará, hoje vários cearenses vivem e estão vivendo, por
causa de uma decisão política e uma coragem de mudar o paradigma. Você
imagina naquela época em que eu fui secretário de Governo, a gente foi
contratar agente de saúde. Não tem um cabo eleitoral melhor do que um
agente de saúde, e a gente contratou agente de saúde por concurso. Ora,
foi uma briga que você não pode imaginar. Meu corpo está cheio de marcas
desta luta, mas vale a pena se lutar pelo que você está acreditando, no que
está fazendo.
Das mil maiores empresas do Brasil, segundo o Valor Econômico, somen-
te 7% estão no Nordeste. Nosso PIB é 13%, nas mil maiores empresas do
Brasil, só 7% estão no Nordeste. Então, dá o tamanho da nossa defasagem,
dá o tamanho do nosso atraso. Estou vendo aqui o companheiro Osmundo,
que já escreveu muito sobre isso, eu bebi muito conhecimento nos livros
dele. Se ele pegar o Osmundão, e ver os números do Osmundão, você vai ver
que a nossa situação relativa está igualzinha, igualzinha, não mudou nada.
Se você pegar os números que estão no Osmundão, está igualzinho, hoje,
157RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
com pequena diferença. E é isso que a gente tem que entender por que é o
que a gente tem que mudar. Você veja, o Nordeste cresceu? Cresceu muito.
Nos últimos anos, o Nordeste cresceu 165%, cresceu mais do que o Brasil. O
Brasil cresceu 155%. O Nordeste cresceu, melhorou os índices de vida, me-
lhorou o padrão de vida, tudo isso é verdade. Só que, a nossa posição, relati-
va ficaram igual, ficou os mesmos famosos 13%. Então, os 13% é a variação,
Osmundo, entre os 12 e os 13 que a gente vem vivendo há muito tempo. Daí
nós tivemos incentivo fiscal, tivemos FINOR, tivemos não sei o quê, tivemos
tudo e por que a gente não consegue sair da economia tradicional? Por que a
gente não consegue sair da economia que não agrega valor? Por que a gente
continua dependente de importação? Eu tentei atualizar um número sobre o
Nordeste, mas não consegui, consegui sobre o Ceará, e o número que tem é
o do BNDES, de 2006, mas não deve ter mudado muito.
O Ceará tem um déficit com o resto do Brasil de 5,8 bilhões de reais por
ano. Só com São Paulo é 3,5 bilhões. O comércio representa 8 bilhões de dé-
ficit . O que esse 5,8 representam? Quase 150% da arrecadação do estado.
Então, o dinheiro vem e volta. Se você somar com o Fundo de Participação dá
noventa. Não deve ser diferente na Paraíba, não sei os números da Paraíba,
mas tenho certeza que não deve ser diferente disso de jeito nenhum. Então,
o que acontece? É como se a gente fosse morar na beira do rio, pegasse uma
caneca d’água e quando o rio fosse passando, bebendo, nunca iria morrer
de sede, mas nunca a gente iria ficar rico. E o que a gente tem que almejar
e aspirar para a nossa população é ser rica, e para isso nós temos que gerar
158
riqueza, nós temos não que beber a água, mas usar a água para poder pro-
duzir riqueza, e isso com a tecnologia é possível.
Ainda, ontem, na abertura do seminário, o Waldonys mostrou como é pos-
sível inovar até em sanfona. Ele fez, usando tecnologia, ele cantou junto com
Dominguinhos aqui pra gente. Colocou Dominguinhos para cantar com ele
como se fosse ao vivo usando o quê? Tecnologia; inovação, um fazer diferen-
te, um pensar diferente. E esse é o caminho. Agora, onde é que está o gar-
galo do Nordeste? Na indústria e na atividade econômica tradicional. Você
veja, na indústria, 86% do valor agregado da indústria do Nordeste vêm de
quê? De baixa intensidade tecnológica ou de média e baixa intensidade tec-
nológica. De alta intensidade tecnológica, menos de 8%. E aqui você começa
a entender as razões por que a gente não consegue mudar.
A gente vai ver mais adiante onde é que investido o recurso de ciência
e tecnologia no Brasil. Ele está proporcional ao PIB? Não. Ele é investido
onde? Ele é 73% investido no Centro-Sul. São Paulo tem 52%. Não é pro-
porcional ao PIB. O Nordeste tem 4,8% de investimento. Nós temos um PIB
de 13%, estamos atrasados, e aí a gente começa entender por que a gente
tem feito incentivo; incentivo não é solução, incentivo só pode ser usado,
não como prótese, incentivo não pode ser uma coisa permanente, incenti-
vo tem que ser uma coisa provisória. Tem que ser como muleta, para você
recuperar a perna e poder correr sozinho. E incentivo não pode ser dado
para empresa nova, incentivo tem ser dado para setor, ainda tem que definir
quais são os setores prioritários, e dar para o novo, para o velho e para o
159RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
caquético. O que foi que a gente fez no Nordeste? A gente fez uma política
de dar incentivo para o novo. Quem era o novo? Eram empresários de fora
e mataram todos os empresários locais, quer dizer, diminuíram bastante o
poder dos empresários locais em função disso. E aquela vantagem que o
incentivo gera, é quando o incentivo tem que ser uma exceção. Na hora em
que todos os estados dão incentivo, que exceção é essa? É igual a você ir
ao varejo e começar a vender alguma coisa mais barata. Na hora que você
está vendendo sozinho, você ganha. Na hora que está todo mundo vendendo
igual, você não tem nenhuma vantagem, não atrai cliente por causa disso e
está distribuindo seu lucro. É o que a gente está fazendo com os incentivos
fiscais neste momento: distribuindo, entregando. E tem mais o seguinte, o
que a gente atraiu? Não atraiu a cadeia, a gente atraiu o emprego de chão
de fábrica. E, por isso, a gente vê as indústrias que vieram para o Nordeste
com base no incentivo, foram todas indústrias tradicionais, têxtil, calçado,
não sei quê, e não conseguiram nem trazer a cadeia porque só trouxeram
a fabricação, a produção de insumo não veio junto. O que arrasta valor não
veio junto. E daí fica esse número que não sai do lugar. É a tecnologia, você
vai ver o investimento em educação no Nordeste, o investimento do governo
federal é 11,4%, enquanto no Centro-Sul é 60%. Então, nós ficamos brigando
pelo que não é fundamental numa sociedade de conhecimento. Nós ficamos
brigando para o quê? Para cuidar do passado. E a gente tem que ser visioná-
rio. O passado cuidou de si, o futuro depende de nós. E nós, latinos, somos
críticos, a gente não gosta de discutir coisa concreta, e coisa concreta para
160
nós o passado, e passado não muda nada, e o objetivo desse seminário, des-
sa discussão, é construir um novo caminho, construir um futuro. E o futuro
só vai ser feito com uma lente nova, você vendo os valores novos e tendo
coragem, porque o mundo de hoje não é de frouxo, quem tiver medo fica em
casa. Porque é difícil, é duro; agora, é completamente viável. Nós mesmos
já fizemos uma experiência no Ceará, e sei que é viável; aliás, a minha vida
tem sido disso.
Eu estou acabando de viver uma experiência, que eu vou contar um pou-
co para você, eu não posso deixar de contar o que estou fazendo na indús-
tria naval, que era um negócio desacreditado. Quando eu falar num auditório
como esse o que iria fazer na indústria naval, as pessoas me olhavam como
se eu fosse um E.T., vindo de outro planeta, falando de uma coisa impossível.
Não tem a menor condição de um cara bem intencionado, menino não, que
menino era na época do CIC (mas que menino bem intencionado), pensando
numa coisa que é impossível de fazer. Impossível, gente, só existe para o
frouxo. Porque quem tem medo de liderar, de buscar novos caminhos; por-
que a vantagem do cão que lidera o grupo é que escolhe o caminho, ver as
melhores paisagens, não precisa ficar vendo o rabo do outro a vida toda.
Então, é esse o desafio que nós temos. Agora, se nós não tivermos disposi-
ção, coragem, de peitar, de enfrentar, de mudar o status, de mudar a coisa,
vai continuar essa mesma história, esse mesmo discurso. Esse discurso que
eu estou fazendo aqui, eu faria com palavras diferentes, eu faria não, eu fiz
com palavras diferentes quando eu fui presidente do CIC, acho que em 1982.
161RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Era muito parecido com o que eu estou falando aqui agora. Era a questão
da diferença, a questão do desnível, o famigerado 13%, que o habitante do
Sudeste vale dois nordestinos, hoje a relação da renda do nordestino para
Brasília é 26% da renda do brasiliense, então aquele mesmo discurso, e o
que houve? O dinheiro veio, o incentivo veio, infraestrutura está aí, e porque
a gente não conseguiu sair, se mexer do lugar? Crescemos, não podemos ne-
gar que crescemos, crescemos até recentemente mais do que o Brasil, mas
não mudamos estruturalmente. E se a gente não tiver coragem de mudar es-
truturalmente, de ir para a nova economia, de ir para a economia do futuro,
de sair do nosso poço e olhar para o mar, de olhar as experiências dos outros,
daqui a vinte anos quem for presidente do CIC vai fazer um discurso igual ao
que eu estou fazendo hoje e que eu fiz há, não vou nem dizer o tempo porque
assim vocês vão saber a minha idade e eu não gostaria. E é isso, a gente vai
ter que ter coragem.
Um seminário como esse, minha querida Nicolle, que provocou naquela
época que a gente estava começando no CIC, que foi um seminário que a
gente fez junto com o Jornal do Brasil, que provocou um grande debate,
trouxemos as grandes cabeças, inclusive o nosso querido Celso Furtado, que
se tornou amigo, o Rômulo e etc., e que, a partir daí, a gente ganhou uma
densidade para poder nos impormos. A gente não pode ter medo de cara
feia porque a gente está fazendo o certo. A gente não pode ter medo de nada
porque a gente está querendo o certo. E nós estamos em consonância com o
que as ruas estão querendo. As ruas cansaram desse modelo que está aí, as
162
ruas cansaram dos processos que estão aí e estão querendo o novo. Então,
é uma oportunidade de lideranças, como vocês, começarem a sair por um
caminho novo e, se as pessoas não quiserem, vão ter que, essa questão é
aquela história: você vai entrar numa festa, – se perguntar para o porteiro se
pode entrar você não entra nunca –. Boa noite, e vai entrando, e vai fazendo,
e vai transformando. Se isso, em festa é assim, imagina em política, em po-
der como é que a coisa é. E olha, e hoje, mais do que nunca, o Nordeste tem
sido definitivo para a vitória do presidente da República. A presidente Dilma
teve 89% da sua maioria aqui no Nordeste, 89%, e nós temos que sabermos
unir. Agora, o que está acontecendo com o Nordeste? E é até bom que está o
nosso amigo da Paraíba. É que a gente está desunido, nós estamos divididos.
É o coração, a gente fala desse assunto, fica tão indignado, não estou
nem falando como presidente da TRANSPETRO, estou falando como ex-CI-
Cano, como cearense, como nordestino eu estou falando.
Então, eu vou falar sobre logística, rapidamente, quer dizer, eu peço des-
culpas porque eu ia falar sobre logística, mas me perdi na logística e fui na
logística mais importante que é a logística do desenvolvimento do Nordeste
e a música do novo caminho, que nós temos obrigação de levar esse pessoal
a ser feliz.
Então, a logística do mundo, o que difere e a logística do Brasil é a logísti-
ca do mundo. Para quem está me seguindo aqui agora vai ficar louco, porque
eu vou começar a pular uma porção de coisa. Vocês vão me perdoar. Então,
o que existe de diferente da logística do Brasil para a logística do mundo?
163RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
O Brasil tem um custo de logística de quase 13%. Os Estados Unidos têm
8%. Por quê? Porque nós somos um país continental, com 7.500 quilômetros
de costa, com 50 quilômetros de rios navegáveis e, no entanto, a nossa lo-
gística é baseada em quê têm caminhão, que é o mais caro. Então, se você
vir a matriz de transporte no mundo, dos países continentais, o caminhão
não tem papel. Vocês estão vendo o quadro, Rússia, Canadá; você vê que o
básico não é o caminhão. É o aquaviário, é o hidroviário. E aí que nós temos
grandes oportunidades.
E no Brasil, por razões históricas, até conheci porque eu tive o privilégio
de viver no exílio com o presidente Juscelino, escutei dele algumas histórias
sobre a indústria automobilística, e até compreendo porque foi. Isso vem
desde o Império, quando as estradas de ferro não foram construídas por
interesse econômico, com bitolas diferentes, para não deixar o Brasil cres-
cer, enfim, tudo aquilo que a gente sabe e que nos levou a essa logística ao
contrário.
Então, o que acontece? A gente passou a usar a logística mais cara; ima-
gina você trazer arroz no lombo de um caminhão do Rio Grande do Sul para
o Ceará. E nós, que somos importadores, é mais grave ainda, porque a gente
paga o custo da logística. Quem paga o custo da logística é o consumidor.
Então, o produto para a gente fica mais caro ainda por causa dessa logística
distorcida. Daí, a gente tem que pensar uma nova logística para o Brasil
e para o Nordeste. E essa logística passa pelo aquaviário, passa pelo fer-
roviário, e é nisso que o governo federal está investindo, e está investindo
164
muito em estrutura, muito na questão da indústria naval, muito na questão
da ferrovia, exatamente para poder mudar, e a gente buscar os modais mais
competitivos, como vocês vêem aí, tanto em termo de implantação como em
termos de custo, como em termos de poluição, que é um grande desafio que
a gente tem hoje.
Para dar um exemplo, na hidrovia (e nós estamos construindo agora), a
gente vai economizar nessa hidrovia do rio Tietê 80 mil viagens de caminhão.
Nós temos aqui o nosso Velho Chico, que podia ser uma excelente opção de
transporte para o Nordeste, no entanto, a gente usa pouquíssimo. Como no
Brasil todo, não é só privilégio do Nordeste. O Tietê a gente só usa 15%, e é
no coração do estado mais rico do mundo; vai dobrar agora com a questão
do etanol.
Então, nós, do Nordeste, estamos fazendo um trabalho bom, a TRANS-
NORDESTINA ligando o Piauí a SUAPE e ao Pecém vai dar uma oportuni-
dade muito grande. O Nordeste tem os três melhores portos do Brasil, hoje,
que estam aqui: SUAPE e Pecém. Então, isso dá uma vantagem compara-
tiva, na nossa localização, nós temos que tirar vantagem dessas questões
que estão aí, que estão colocadas, e que representam vantagens bastante
grandes e que a gente tem que tirar proveito. Temos que acabar a TRANS-
NORDESTINA, temos que pensar no aproveitamento do rio São Francisco e
pensar de sair de quase 100% (se a gente tirar a movimentação de minério)
de transporte rodoviário, porque as pessoas querem mobilidade social, e as
estradas estão atopetadas e com custo bastante alto. E, lamentavelmente,
165RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
o Ministério de Transporte, ao longo dos últimos tempos, foi o Ministério das
Estradas, não o Ministério dos Transportes. Isso tem que mudar. A gente tem
que pensar, e o governo federal está pensando nisso, está pensando numa
mudança, e isso é absolutamente essencial.
O que precisa é decisão e coragem para poder enfrentar. E fico orgulhoso
de ver o CIC, de ver a Federação, hoje, com esse entusiasmo de tentar fazer.
Não é fácil começar, quando você está fazendo um trabalho difícil a ade-
são só vem à medida que o resultado vem aparecendo. E não tenho dúvida.
Quando semeia boa semente a árvore cresce. Eu não tenho dúvida que esse
Integra Brasil vai produzir enormes frutos para nós, do Nordeste, e muito
orgulho.
Bom, mas vou fazer um pouco do meu comercial também, porque as-
sim não tem graça. Vou falar um pouco agora da minha experiência, já que
eu acho que para mudar a matriz de transporte nós temos que mudar os
modais, e uma coisa mais importante é a questão do aquaviário. 95% do co-
mércio externo do Brasil é feito com navios. 80% do comércio externo do
mundo é feito com navios. E o Brasil tinha desaparecido como player nessa
área. Nós fomos, na década de 1970, o segundo maior produtor de navios do
mundo...
Então, a indústria naval, que era a segunda maior do mundo, deu alguns
problemas, precisavam ser corrigidos. E resolveram o problema matando a
indústria e, com isso, o Brasil ficou dependente e hoje ele esta gastando por
ano com transporte marítimo cerca de 18 bilhões de dólares.
166
O presidente Lula com muita coragem e com muita forca, resolveu que
poderíamos ter a indústria naval no Brasil e me deu o desafio de reconstruir
a indústria naval no Brasil. E foi a essa epopeia que eu me dediquei nesses
últimos anos da minha vida. E não foi fácil, porque, primeiro, havia uma des-
crença enorme, quando íamos visitar um estaleiro no exterior, éramos re-
cebidos pelo segurança da indústria, pois ninguém conhecia o Brasil. Hoje,
somos recebidos pelo dono, com tapete vermelho, e não fui eu que cresci e,
sim, o Brasil. Hoje, o Brasil é respeitado no mundo inteiro.
E aí fizemos um estudo de como criaríamos esta indústria naval, que la-
titude e longitude que a gente estava, quais eram as diferenças, quais eram
gargalos. Os gargalos eram custos de mão de obra, e não era pelo valor de
mão de obra e, sim, pela baixa produtividade. Nós estávamos na segunda
geração, todo mundo passava da quarta para a quinta geração.
E tínhamos o custo de aço. Embora o Brasil seja produtor de minério de
ferro e tenha uma indústria siderúrgica bastante forte, o preço do aço ven-
dido para o estaleiro brasileiro custava 40 a 50% mais caro do que os dos
estaleiros asiáticos pagavam.
Eu disse para os donos das siderúrgicas que ou eles vendiam o aço ao
preço internacional ou iria importar. Importei! O aço representa 20% a 30%
do meu custo, e eu não poderia ter uma indústria nascente que não fosse
competitiva.
Nosso programa não é fabricar navios a qualquer preço, é ter uma indústria
naval competitiva, ter uma indústria naval que fala a língua da competência.
167RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Nossos três pilares eram: 1, fabricar no Brasil, o que já conseguimos; 2, atingir
um índice na “solidificação” de 65%, porque não tem sentido a gente construir
e importar tudo, o que já conseguimos, e estamos agora brigando pelo 3º pilar,
que é, após a curva de aprendizado, ser competitivo a nível mundial.
Essa é a luta e isso não dependo só de infraestrutura. Isso também foi
um exemplo para o Nordeste. Porque construção de estaleiro moderno não
é só demanda, não é só dinheiro para financiar que isso seja igual a navio.
O que é igual a navio é gestão, é administração correta, é planejamento, é
projeto acabado, projeto de acabamento avançado, é controle de qualidade,
é entrega just in time, é formação, treinamento de gente e isso estamos per-
seguindo para chegar à produtividade.
Trouxemos inteligências de fora, 10 coreanos, e formamos na TRANS-
PETRO, juntando com mais brasileiros, um centro de acompanhamento de
produção, exatamente para poder tirar os empresários da zona de conforto.
Agora, nós, brasileiros, somos muito apressados, queremos que tudo dê
certo de primeira e só quem acredita em fada madrinha ou em história da
carochinha, que acha que vai fazer alguma coisa nova, e é o primeiro: o pri-
meiro que o tradicional diz que você não deve fazer porque vai fazer mais
caro. Então, fica comprando de mim que é muito melhor. Vamos continuar
importando que é muito melhor, é mais barato... E, mas isso representa uma
perda de renda.
Por exemplo, a cada R$ 1 milhão investido na indústria naval, ela gera 82
empregos, R$ 1,9 milhões de renda para o Brasil e R$ 700 milhões de impos-
168
tos. Então, convém ao País ousar e começar a produzir aquilo que se perde.
Foi o que o presidente Lula decidiu. Tudo aquilo que fosse uma necessidade
do país ele queria transformar numa oportunidade para mudar a vida dos
brasileiros. E foi isso que foi feito com a indústria naval.
A indústria de petróleo não podia ser a maldição, como é no mundo, fator
de concentração de renda, ela deveria ser um fator de geração de emprego
e renda no Brasil.
E aí fomos para frente, atrás de parceiros, fomos inovar. O Brasil está cheio
de novos estaleiros. Hoje nós temos 12 navios em construção. Já entregamos
nestes últimos 18 meses 5 navios. Este ano entregamos mais dois; lançamos
um recentemente. E, lamentavelmente, nesse meu programa, o Ceará não
pode ter nenhum estaleiro. Quase que tinha um, que está sendo inaugurado
em Pernambuco. Mas, com certeza, terá oportunidade de ter outros.
A indústria naval gera hoje 70 mil empregos, nós criamos 3 novos estalei-
ros. O Brasil hoje, em petroleiros, é a terceira maior carteira do mundo, é a
quarta maior carteira em geral. Hoje a Noruega é que mais compra. Compra
37 milhões de dólares. Depois vêm os EUA com 31; Depois, vem a Grécia
com 24 e, depois, o Brasil com 23,8.
Agora, foi possível isso porque teve vontade, determinação, a cada passo,
tinha uma tocaia, a cada passo, tinha um para atrapalhar, e você tem que ser
teimoso, Nicolle, se não for teimoso e persistente, não faz.
Está aí a indústria naval viva. A TRANSPETRO é a empresa logística da
PETROBRÁS. Nós temos hoje 62 petroleiros: teremos 120 daqui a 4 anos.
169RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Temos 15 mil km de dutos, temos 58 terminais e, hoje, nós somos as artérias
que movimentam a energia para este pais; levamos combustível a todos os
recantos deste país.
O Nordeste, com a ligação dos gasodutos, dos oleodutos, hoje, está ligado
a um sistema só do Brasil, hoje não temos problema de falta energia, pois
temos o gás natural. Enfim, é a logística como movimentação da economia.
Para encerrar, gostaria de dizer que foi uma honra participar deste fó-
rum, isso me vez rejuvenescer, me fez voltar há 30 anos com a mesma garra,
e dizer: olha, vamos persistir, vamos nos unir, vamos guardar nos armários
os egos, as arrogâncias e vamos, juntos, construir o futuro que está aí. Há 30
anos atrás, era difícil porque o Brasil era pobre, naquele momento, o Brasil
não tinha oportunidade, era o mundo dos ricos, agora é o mundo dos emer-
gentes, é a nossa vez, agora o Brasil vai. Agora, o que não pode acontecer é
a gente ver o Brasil ir, e mais uma vez a gente vai ficar tocando na banda e
vai ficar assistindo.
Isso não pode continuar. O que vai acontecer? O que vai fazer diferença?
Qual é a diferença entre o fracasso e o sucesso? É a biografia, é o empenho,
é a coragem, é a determinação, é tudo que não falta a essa gente nordestina.
Mesa Diretora: Vou fazer a fusão de duas intervenções para o dr. Sérgio
responder: Que proveito o Nordeste poderá tirar do transporte marítimo?
De que forma? E a outra: que o investimento governamental em logística e
transporte no Nordeste, comparado com o que se realiza no Sul e Sudeste,
170
além de acanhado, anda a passos de cágado, haja vista a TRANSNORDES-
TINA, tão vital ao desenvolvimento regional. Isso tem prejudicado sensivel-
mente a integração no Nordeste em termos intra e intra-regional. Como mu-
dar essa realidade?
Sergio Machado: Eu gostaria de fazer uma provocação ao auditório. Logís-
tica é um instrumento de estabelecer competitividade. E nós do Nordes-
te somos muito mais importadores do que exportadores, e quando a gen-
te pensa logística, a gente tem que pensar o que dá mais competitividade
para o Nordeste. Se você abre uma boa estrada numa região que não tem
competitividade, você vai fazer uma drenagem de recursos, porque o que é
produzido naquela região deixa de ter competitividade, e aí você inviabiliza
a atividade econômica.
A gente tem que pensar a matriz logística do Nordeste, primeiro, no que
vai dar mais competitividade, mais competitividade no Nordeste no que
mais a gente produz aqui. O que vai facilitar a nossa competitividade? O que
vai nos dar ganho de custo? O que vai reduzir o custo? A gente tem que fazer
uma análise bem mais profunda.
Nós temos a teoria – dê-me a infraestrutura que eu dou o desenvolvimen-
to. Nada é mais falso do que isso. Isso é brincadeira de menino rico. Você
tem que fazer a infraestrutura concomitante com o projeto de desenvolvi-
mento, de forma de quando o projeto de desenvolvimento acabar, a logística
esteja pronta para desenvolver.
171RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Por que estrada para coisa nenhuma? Logística para coisa nenhuma? As-
faltar onde não se precisa? Tudo isso somente serviu para fragilizar o nosso
interior. O que se vê na Europa hoje? Por que a Portugal, Espanha, Sul da
Itália, Grécia, Irlanda estão nesta situação? Porque elas não têm condição de
competir com outros países da Europa, então eles saem do jogo.
Tem que pensar a matriz de logística do Nordeste no sentido de forta-
lecer e dar competitividade à região. O que vai reduzir de custo nos produ-
tos que fabricamos aqui? Se nós somos mais exportadores e tornamos a
logística mais eficiente, a competitividade diminui. Quando eu era criança,
a galinha que a gente comia em Fortaleza vinha em geral do interior. Hoje,
ela vem toda de Santa Catarina, que é muito mais barato, porque é muito
mais barato importar carne, do que transportar milho, que você tem muito
desperdício.
A logística é um dos principais instrumentos de competitividade. A gente
está vivendo um momento excepcional no Brasil. Agora, a gente não pode
pensar pequeno, a gente não pode pensar dividido, a gente tem deixar de
lado o que nos separa e pensar no que nos une. Tem que pensar no que vai
fortalecer a economia do Nordeste. A gente em que ter uma visão muito
clara disso, e a gente não tem. Vamos fazer aqui uma estrada, qual o benefi-
cio econômico que essa estrada vai trazer? Qual a competitividade que ela
acrescentar? Ela vai fazer com que a gente fique mais competitivo no Nor-
deste ou fique mais competitivo para importar, para piorar, para transferir
renda?
172
Tem que colocar esse viés nessa discussão. Porque, se não botar, a gen-
te viu esse filme que eu já vi, que a gente já viu. O que mais fragilizou o
interior do Nordeste foram as boas estradas. Quando não tinha estrada,
bem ou mal, a economia circulava ali, o dinheiro circulava ali, e não saía.
Na hora em que você colocou a boa estrada e trouxe produtos com grau
de produtividade e competitividade maior, você esvaziou a atividade eco-
nômica da região.
E quem pode se beneficiar da indústria naval, para não perder a pergun-
ta, é o Brasil. Como bem disse o professor, os modais mais baratos são o hi-
droviário e o ferroviário. Quando a gente começar a pensar no programa de
logística para o Nordeste, e aí eu gostaria de dar a minha contribuição, tem
que pensar qual o efeito que vai ter na economia da região? Nós estamos
facilitando a importação ou estamos facilitando o nosso produto, estamos
ganhando produtividade ou estamos perdendo? Estamos fazendo com que o
nosso dinheiro vá mais para fora ou fique aqui?
Temos que colocar esse viés, quando for pensar esta questão regional e
de integração.Temos que pensar em conjunto, temos que voltar a ser uma
região, que hoje nos não somos.
Hoje, bem disse o Gustavo, existe essa disputa interna, é verdade, não
tem mais fórum regional, não tem mais fórum de união. Olha, casa que falta
pão, todos gritam e ninguém tem razão. E não adianta gritar porque não vai
resolver coisa nenhuma, temos que colocar nesse viés de logística como
redução de custo no Nordeste para que o Nordeste fique mais competitivo
173RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
naquilo que ele produz. Essa tem que ser a prioridade quando se pensar em
matriz de transporte para o Nordeste.
O que tem faltado ao Nordeste é poder de competição, é tecnologia, e a
gente tem uma visão de que fortalece a região, porque dinheiro vem muito,
transferência vem muito para cá, só que ele passa por aqui e vai embora,
não fica, e não gera riqueza aqui. O velhinho quando recebe o dinheiro dele
no banco, ele vai para a feira e compra tudo de outro lugar, e não fica nada
aqui. Essa visão de reter é o que vai melhorar a economia da região. E a lo-
gística é um ponto muito importante.
João Alencar Oliveira Júnior: A integração Brasil-África pode trazer opor-
tunidades de negócios para o Nordeste e para o Ceará, em que áreas? E
pergunta como o Ceará poderá explorar a vantagem? Gostaria de trocar a di-
mensão Ceará, para a dimensão Nordeste. E uma outra questão com dimen-
são internacional: A União Europeia, visando seu fortalecimento, quando da
admissão de novos países, realiza neles por meio de assistência financeira
de pré-adesão grandes investimentos de instrutura. Por que não se adota no
Brasil esta prática para reduzir as desigualdades regionais, fortalecendo ao
mesmo tempo a economia brasileira?
Sergio Machado: O que a gente tem, e é bem presente, a gente só consegue
participar no mundo, se falarmos a língua do mundo, que não é chinês, nem
francês, nem inglês e nem português. É competência. E que a gente só vai
174
conseguir enveredar pelo mundo se a gente tiver competitividade. Enquanto
o nordestino não avançar em termos de setores (e sair do tradicional, para
ir para nova economia), a gente vai continuar falando e fazendo o discurso
dos 13 %. Então a gente tem que ter coragem de romper, porque estamos nos
13% não é por falta de infraestrutura. Não estou dizendo que a infraestrutu-
ra do Nordeste seja uma beleza, mas este não é o gargalo, o gargalho está
longe de ser este.
O gargalo do Nordeste não é a infraestrutura. Agora, o mundo hoje está in-
terconectado, está aberto. Agora, quem tem competitividade, é quem tem custo
de competição. A logística é um ponto importante? É, porque a logística é que
vai fazer com que seu mercado se amplie e que você possa ser competitivo.
Hoje no Brasil tem muitos setores onde você é competitivo dentro da cer-
ca e que, quando sai da cerca, você perde a competitividade, porque hoje
se abre um negocio e é muito comum fechar as portas. Nós estamos tendo
outro pais, mas antigamente tínhamos um pais que a faixa do PIB e da popu-
lação era concentrada em 80km da costa. Hoje nós temos a nova economia
que está interiorizando e para isso, temos que ter uma nova logística, com
competitividade. Então essa chance do mundo da África, da localização es-
tratégica do Nordeste, do ponto de vista da logística, é excepcional, mas
isso tem que vir junto com competitividade em termos empresariais. Com
custos competitivos.
E, hoje, no Brasil a gente tende a universalizar, no pleno emprego, o sa-
lário. Tende a igualar no país inteiro, e isso tem que ser compensado por
175RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
produtividade. Hoje o nosso desafio do Nordeste é sair do setor tradicional
e ir para o setor que agrega valor; é ousar sair dos 70% a 80 %, que estão no
setor convencional, para ir para o setor que agrega valores.
Agora, para isso, tem que ter vontade política da sociedade, tem que ter
vontade, união, não pode ter divisão e nem pensar que o fulano está mais
rico que eu. Tem uma piada que é muito falada que diz assim “quando se
vai fazer negocio com o paulista – quanto nós vamos ganhar? Com o cario-
ca – quanto vou ganhar? E com o nordestino quanto você vai ganhar?”. Não
podemos ser assim, temos que pensar no coletivo, essa é a mudança. O que
podemos ganhar? O que podemos mudar? Agora para isso é necessário a
gente esquecer o que fez até agora e pensar no novo caminho a seguir. Por-
que esse caminho que a gente vem perseguindo há 40 anos, dá incentivos,
tira incentivos, bota SUDENE, tira SUDENE, bota Banco do Nordeste, tira
Banco do Nordeste, bota DNOCS, tira DNOCS nos levou aos 13% de partici-
pação do PIB, com 30% da população.
Temos que pensar como o Nordeste vai ser competitivo, qual é a área
econômica que tem que sair. Como é que a gente foge da economia tradicio-
nal? Por que a gente fica aqui com as indústrias tradicionais-se estão aca-
bando em outro lugar? Por que a gente não entra em uma nova economia?
Nós temos toda e qualquer condição, temos que ter força de vontade, temos
que ter ousadia e isso é o que não falta no Nordeste. Nem teimosia, porque
se nós tivéssemos medo a gente nem sobrevivia, porque o Nordeste é bravo,
tem coragem, nós vemos nordestino sobrevivendo em todos os pontos. Nós
176
temos que pensar no futuro, e logística é importante para trazer vantagens
competitivas para produtos que são feitos Nordeste.
Nós temos que ter essa visão, e essa visão não existe, nós somos meninos
pobres, temos que fazer algo que nos traga riqueza e competitividade para a
região, pois o que falta para o NE não é competência, é oportunidade.
E essa oportunidade temos que criar, fazer, ninguém pense que vão abrir
a porta e pôr tapete vermelho. Nós temos que arrombá-las. Nós temos que
entrar e exigir por aquilo que nós representamos na nossa política. Pelo nos-
so ponto político, na nossa vontade, na nossa competência, na nossa res-
ponsabilidade, o Nordeste já teve vez quando?
Quando a gente foi vanguarda no processo, pois tivemos a experiência
na SUDENE. Nós tivemos um momento aqui no Ceará que nós fomos exem-
plos de reforma fiscal no Brasil e éramos admirados em todo lugar. E qual a
vantagem do Nordeste? É que nós temos muito talento, é que a gente está
é disperso, nós temos que juntar os talentos, porque nada se faz de forma
virtual. Tudo que é bom na vida é epidérmico, porque para tudo que envolve
mudança, desenvolvimento, tem que haver conversas, troca de ideias para
que isso possa acontecer.
E esse seminário, Nicolle, foi uma oportunidade ótima para a gente se
juntar. Isso foi a espoleta, a centelha, a chama que vai se espalhar por esse
novo Nordeste, por esse novo Brasil, por esse novo Nordeste que nós que-
remos.
Painel 4: Transformações Social, Urbana e Ambiental do Nordeste
Moderador
Luis de Gonzaga Fonseca MotaEx-governador do Estado do Ceará e consultor Sênior da Plena Consultoria e Estudos
Carlos MansoDoutor em Economia pela Universidade Federal do Ceará - UFC e coordenador do Núcleo de Inteligência Industrial do Instituto de Desenvolvimento Industrial da Federação das Indústrias do Estado do Ceará - INDI/FIEC
Maurício Gonçalves e SilvaGerente de Regionalização da Coordenação de Geografia do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE
Evangelina OliveiraPesquisadora colaboradora do Programa de Computação Científica da Fundação Oswaldo Cruz - PROCC/FIOCRUZ
Rafael dos Santos da SilvaProfessor do Instituto Superior de Estudos e Pesquisas Acadêmicas e Tecnológias - ISEPAT
Relator
Leonardo de Bayma RebouçasDiretor do Centro Industrial do Ceará - CIC, ex-vice-presidente da Confederação Nacional de Jovens Empresários - CONAJE e ex-Coordenador-Geral da Associação dos Jovens Empresários de Fortaleza - AJE
179RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
PAINEL 4
TRANSFORMAÇÕES SOCIAL, URBANA E AMBIENTAL DO NORDESTE
QUESTÕES A SEREM RESPONDIDAS PELOS EXPOSITORES
Transformação Social
A atual política social do governo federal, de cunho essencialmente as-
sistencialista, que veio determinar a extinção da tradicional aborda-
gem regionalista, produz efeitos duradouros e estruturantes no tocante à
construção de uma sociedade nacional economicamente integrada e regio-
nalmente menos desigual? Como avançar na política de transferência de
renda? Que tendências e implicações maiores decorrerão do crescimento
demográfico do Nordeste, sobretudo com relação a emprego e incremento
da longevidade?
180
Transformação Urbana
A crescente metropolização dos principais espaços urbanos e o conse-
quente distanciamento socioeconômico destes em relação aos espaços re-
manescentes, sobretudo rurais, têm agravado as disparidades intrarregio-
nais no Nordeste.
De que maneira se poderá mitigar os efeitos desse processo? Como as
cidades do Nordeste poderão tirar o melhor proveito possível em seu plane-
jamento urbano do estudo do IBGE Região de Influência das Cidades?
Investir fortemente nas cidades médias, aproveitando as vantagens com-
petitivas interiores, não seria um bom caminho para o desenvolvimento re-
gional, sobretudo no interior do Nordeste?
Transformação Ambiental
Que restrições socioambientais se impõem ao futuro desenvolvimento da
Região, em especial no tocante ao Semiárido?
Que ameaças pairam sobre o Nordeste quanto ao fenômeno das mudan-
ças climáticas?
Cerimonialista: “Assistiremos a seguir ao painel “Transformações Social,
Urbana e Ambiental do Nordeste”. Para exercer a função de moderador dos
trabalhos, convido ao palco o ex-governador do Estado do Ceará, Luiz de
Gonzaga Fonseca Mota, consultor sênior da Plena Consultoria e Estudos.
Podem acolher com aplausos, por gentileza.
181RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Convido à mesa, os expositores:
Carlos Manso, doutor em economia pela Universidade Federal do Ceará e
Coordenador do Núcleo de Inteligência Industrial do Instituto de Desenvol-
vimento Industrial do Ceará - INDI/FIEC.
Senhor Maurício Gonçalves e Silva, gerente de Regionalização da Coor-
denação de Geografia do IBGE.
Senhora Evangelina Oliveira, pesquisadora-colaboradora da FIOCRUZ.
Para exercer a função de relatoria, convido o senhor Francílio Dourado
Filho, diretor técnico do Centro Industrial do Ceará - CIC.
Luiz de Gonzaga Fonseca Mota: “Boa tarde, senhoras e senhores. Fico agra-
decido à presidente Nicolle, ao meu amigo e ex-secretário Firmo de Castro,
ao meu ex-aluno Cláudio Ferreira Lima, ao presidente da FIEC, meu parti-
cular amigo Roberto Macêdo, em terem me convidado para moderar este
debate.
É com muita satisfação que aqui estou e quero dizer aos senhores e se-
nhoras, principalmente aos nossos expositores e ao relator, que essa inicia-
tiva do CIC e da FIEC merece todos os nossos elogios. Realmente, o Nordes-
te vem há algum tempo fora da agenda de debates neste país. Os problemas
são tantos, evidentemente, que o Nordeste está fora da agenda de debates.
Esvaziamento da SUDENE, esvaziamento do DNOCS. O BNB perdeu, diga-
mos assim, bastante em termos, meu BNB, meu querido BNB, minha casa,
a sua função de estudos econômicos. Mas por isso é que eu louvo, meu caro
182
Cláudio, você como um dos coordenadores, essa iniciativa de vocês. Eu te-
nho certeza, digo isso aos senhores e senhoras expositores, ao relator e ao
distinto auditório, que eventos como este realmente vão fazer com que o
Nordeste possa ser, possamos levar o Nordeste novamente para o debate.
Digo isso porque, há 30 anos, quando fui governador (sou velho mesmo, es-
tou com 60 anos); há trinta anos, quando fui governador, tínhamos um gran-
de fórum político, que era a SUDENE; não sei nem se ainda existe, Cláudio,
aquele fórum de governadores da SUDENE, não sei. E lamento, porque na-
quele fórum nós tratávamos de assuntos não só inerentes ao Nordeste, mas
inerentes ao Brasil, e muito.
Então, quero deixar aqui registrado, meu caro relator, esta minha ale-
gria de participar de um encontro desta natureza. E o painel quatro, que
eu vou participar, refere-se a transformações social, urbana e ambiental
no Nordeste. Temos pessoas altamente qualificadas, pessoas que vão nos
ensinar e vão mostrar, estrategicamente, como é que nós, técnicos, e os
políticos, uma vez que eu não sou mais político; sou político: não sou polí-
tico militante, não tenho mais partido político. Aliás, meu partido político
eu tenho, é o PEC; qualquer um pode se inscrever no PEC. PEC é partido
virtual que eu criei.
Não precisa ser registrado no TRE, nem no TSE, nada. É o Partido da Edu-
cação e Cultura. Então, é um partido virtual, e quem quiser tomar parte é
só se conscientizar de que sem educação e cultura nós não vamos a lugar
nenhum.
183RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Mas, retornando aqui ao nosso tema de debates, gostaríamos de ter,
como primeiro expositor, o professor Carlos Manso, doutor em economia
pela Universidade Federal do Ceará, UFC, minha querida UFC, Coordenador
do Núcleo de Inteligência Industrial do INDI/FIEC. Eu vejo que o dr. Carlos
Manso poderá nos dar uma contribuição substancial acerca de tão impor-
tante tema. Com a palavra, o nosso professor dr. Carlos Manso.”
Carlos Manso: “Boa tarde a todos. Muito obrigado senhor ex-governador.
governador, não é? Sempre a autoridade pelo título maior, governador Gon-
zaga Mota, trinta anos é uma geração. Às vezes eu fico pensando assim,
trinta, quarenta anos, o tempo, se o Nordeste faz a receita, toma a receita da
educação, como o senhor falou, talvez os frutos, talvez não, com certeza, os
frutos serão frutos ainda melhores.
Muito da evolução social, das transformações sociais que o Nordeste
vem tendo nos últimos anos deve-se, logicamente, ao avanço da escolari-
dade obtido justamente há décadas, com um processo que se inicia atrás,
porque a colheita de educação é uma colheita certa, mas é uma colheita que
existe um tempo para acontecer.
Bom, eu acho que seguir aqui o conselho de Aristóteles em que ele dizia
que era melhor falar em pé, porque o sangue ficava melhor distribuído. En-
tão, por favor, coisa de professor não tem jeito.
Nós temos, no painel, as transformações sociais, urbanas e ambientais,
que o Cláudio nos colocou até algumas questões aqui que devem ser trata-
184
das, respondidas, pelos expositores e, logicamente, a minha formação é uma
formação em economia, eu estudei economia em pós-graduação na UFC e
sou um dos criadores do Laboratório de Estudos da Pobreza da UFC, que é
um laboratório de estudos relacionados à pobreza, à desigualdade, desen-
volvimento econômico, e esse laboratório é junto do curso de pós-graduação
em economia da UFC, o CAEN. Então, acho que seguramente há contribui-
ção acerca das questões das transformações sociais, um pouco também da
questão do debate sobre as transformações urbanas e, muito menos, um
pouco, sobre as questões ambientas. Mas nós temos aqui um painel multi-
disciplinar, com certeza, a gente vai fazer no final que o Francílio Dourado
Filho vai fazer aqui, uma relatoria e seguramente essas questões, algumas
orientações, para nos nortear sobre essas questões aqui, com certeza esse
evento vai produzir.
E, nesse sentido, eu agradeço o convite do CIC e parabenizo essa inicia-
tiva, faço também minha todas as palavras que o Gonzaga Mota colocou
no início, da importância desse tipo de fórum, desse tipo de discussão. O
Nordeste é sempre uma região que precisa muito dessas discussões; Às
vezes, a gente peca pela inércia, algumas coisas deveriam ter uma veloci-
dade maior em termos de transformações, por nós sermos sempre aquela
região mais esquecida, região com maiores atrasos, mas a verdade é que
esses tipos de discussões sempre pautam muito; às vezes, a gente tem
até uma percepção, a gente subestima muitas vezes. Por exemplo, no caso
especificamente do laboratório de estudos da pobreza, a gente começou o
185RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
laboratório, hoje, eu coordeno também um núcleo de inteligência do INDI,
eu estou colocando aqui só um histórico porque a minha inserção nessa
questão da transformação social e por causa desse histórico lá no labora-
tório. E quando nós iniciamos o laboratório, há uma geração também, dr.
Gonzaga Mota, o professor Flávio Ataliba, que hoje é Diretor do IPECE, foi
fazer um pós-doutorado em Harvard, ele viu um laboratório de estudos da
pobreza em Harvard, achou a ideia muito boa e tentou replicar essa ideia
aqui. No início sofremos diversas críticas, as pessoas não entendiam que
se estava se preocupando com pobreza no núcleo de estudos de economia.
Na verdade, era pouca percepção, porque o crescimento a ser buscado
em sociedade de alta desigualdade e alta pobreza é um crescimento que
parte, ou que se determina, pelo aumento de produtividade das pessoas
mais pobres, porque nós temos uma massa de pessoas nessa condição
muito grande. Então, se tiver um aumento de produtividade a partir dessas
pessoas, então é uma forma também de dinamizar a economia do esta-
do a partir disso. E, logicamente, que depois as pessoas compreenderam
melhor, até muitos anos depois a gente foi chamado pela ministra de De-
senvolvimento Social, Tereza Campelo, que o Projeto Brasil Carinhoso, do
governo federal, que ampliou o bolsa-família, passou de três para cinco
filhos de atendimento, segundo as palavras da ministra, também influen-
ciado por muitos dos estudos que a Universidade Federal fazia. Então, quer
dizer, a gente não pode subestimar nunca esse tipo de iniciativa, e para-
béns a todos.
186
Na verdade, se olharmos a evolução de 1995, a partir do plano real, para
2011, da renda média, da renda per capita, imediatamente, percebemos que
em 2003, o ano de 2003, ele é um ano importante porque houve uma inflexão
da renda das famílias no Brasil. O que é isso? O rendimento pessoal vinha se
mantendo numa certa estagnação ou caindo. Mas, a partir de 2003, há uma
recuperação, ou seja, há um crescimento da renda no país a partir de 2003. A
motivação para isso? Qual foi a explicação para esse aumento? O mercado
de trabalho, em primeiro lugar? O mercado de trabalho se recuperou a par-
tir de 2003, houve um aquecimento do mercado de trabalho, ampliação dos
programas de transferência e as valorizações seguidas do salário mínimo,
foram as três fontes os determinantes mais importantes para explicar esse
movimento de ascensão da renda a partir de 2003. Outras afirmações que a
gente pode fazer a partir daí: distância enorme, ainda, em termos de renda
per capita, do Nordeste para o Sudeste.
No Brasil, há dois clubes que os economistas chamam de “clube de con-
vergência”, são dois clubes de renda, um de renda alta, como a gente sabe,
que é o formado pelo Centro-Oeste, Sudeste e Sul, e o de renda baixa, for-
mado pelo Norte e Nordeste. Nesse período, houve uma ligeira aproximação
do grupo de renda baixa para o de renda alta, uma ligeira, pequena, e uma
ligeira aproximação do Nordeste em relação ao Norte, em relação à região
Norte. Então, o Nordeste se aproximou do Norte lá na parte de renda baixa,
e na parte de renda alta as três regiões Sudeste, Centro-Oeste e Sul, com
rendas praticamente no mesmo nível.
187RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Com que velocidade isso aconteceu? Se eles tivessem começado igual
em 95, estivesse todo mundo, a gente está chamando de base fixa, fixamos a
base ali em 95. Então, no final do período de 2011, o Nordeste começou com
uma renda de 100, hipotética, e terminou com 151,98, o que quer dizer que o
Nordeste ampliou sua renda per capita em 51,98%. É um fantástico aumento
de renda que o Nordeste apresentou, a partir do Plano Real até o ano de
2011, que é o ano da última pesquisa do IBGE. O Brasil cresceu 29,25% em
termos de renda, e o Sudeste 19,73. Ou seja, em termos de renda, o desem-
penho do Nordeste foi bem superior ao Brasil e ao Sudeste. De novo, é traba-
lho, programa de transferência e as valorizações do salário mínimo, sempre,
as explicações para esse crescimento da renda.
Só comparando o Nordeste com ele mesmo, em termos de rural, urbano
e metropolitano, só para informação adicional, é que foi o Nordeste rural, as
zonas rurais da região Nordeste que impulsionaram esse aumento da renda.
E aí uma quarta explicação, já que eu venho falando de mercado de trabalho,
programa de transferência, valorização de salário mínimo, uma quarta ex-
plicação aí no Nordeste rural bem clara, a ampliação das aposentadorias e
pensões, notadamente, rurais. Houve um maior acesso, uma ampliação des-
sas aposentarias e pensões. Então, o Nordeste rural que impulsionou mais
do que os outros.
Se nós pegarmos do mais pobre até o mais rico em termos de nordestino,
pegarmos a população do Nordeste, distribuírmos em dez partes, sendo os
10% mais pobres até os 10% mais ricos, poderemos saber se esse aumento
188
da renda, que foi tão bom, eu falei, 52% de aumento de renda, como esse
aumento se deu em termos das pessoas, em termos da classificação. Ou
seja, da condição de pobreza dessas pessoas. E o que a gente percebe é que
no Nordeste temos o crescimento do primeiro décimo da população, que
são os 10% mais pobres. E depois, até o décimo momento mais rico. Como
todos são positivos, todos são acima, significa dizer o seguinte: que todas
as partes da população, todos os décimos da população tiveram aumento de
renda no Nordeste. Então, quem teve aumento de renda no Nordeste? Todos
os décimos. Os 10% mais pobres, os 20% mais pobres, os 10% mais ricos.
Observem que o Nordeste, fica parecendo uma parte estagnada, enquanto
que o Sudeste cai bastante. Isso quer dizer que há dois padrões de desen-
volvimento, de crescimento de renda. Quer dizer o quê? Que no Sudeste,
o crescimento da renda foi menor do que no Nordeste, porém, proporcio-
nalmente, beneficiou mais os mais pobres. No Nordeste houve benefícios
aos mais pobres, mas à diferença não tão grande, por isso que é uma curva
praticamente estagnada, praticamente constante. O Brasil também teve a
curva decrescente. A ideia dela ser decrescente é que o décimo mais pobre
cresceu mais do que o segundo décimo, que cresceu mais que o terceiro,
que cresceu mais que o quarto, que cresceu mais que o quinto. Então, assim,
por isso que ela é decrescente porque, à medida que você vai andando na
população, andando em direção aos mais ricos, você vai diminuindo o cres-
cimento na renda, entendeu? Então, os 10% mais pobres tiveram maiores
crescimentos.
189RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Onde é que a gente quer chegar com essa questão da explicação da ren-
da, para saber o padrão de crescimento? Quem que se beneficiou disso, e
quem que se beneficiou mais fortemente? Nós já temos uma indicação de
que no Sudeste o crescimento foi mais em direção aos mais pobres. Os mais
pobres tiveram crescimento proporcionalmente maior do que no Nordeste, o
que é surpreendente para alguns. Sim ou não? Nós temos observado que o
Nordeste teve ganhos, etc., etc.. Mas, vamos seguir.
Notícias que a gente já sabe, mas que fazem parte desse roteiro: a desi-
gualdade de renda. Muitas vezes, na televisão, a gente tem ouvido falar que o
Brasil tem experimentado quedas sucessivas na desigualdade, o que é uma
verdade. Desde 2001, são todos os períodos, a partir de 2001, são períodos de
queda da desigualdade. O Brasil está mais homogêneo em termos de renda,
isso foi verificado praticamente em todos os estados da federação. Então,
a queda foi maior no Sudeste. Vamos contar a história de novo. O Nordeste
teve a maior ampliação da renda, mas foi o Sudeste quem caiu, que teve a
maior queda da desigualdade. Isso beneficiou, proporcionalmente, mais os
mais pobres do Sudeste.
Proporção de pobres, aí o índice de pobreza, a linha de pobreza adotada,
simplesmente determinada pela Organização Mundial de Saúde, que ela
calcula que são duas mil e duzentas calorias para um adulto ficar vivo, e
então os economistas criam uma cesta de consumo que desse essa quan-
tidade de calorias, e o quanto é o valor disso em cada região do país é
chamado de linha de pobreza associada à questão de sobrevivência. O Nor-
190
deste é o de cima, teve uma queda de proporção de pobre de 49% da popu-
lação para 24,7%. Em 95, na metade da população do Nordeste, a renda era
suficiente apenas para questão de sobrevivência. Esse percentual baixou
para um quinto da sociedade, para 25%. Em termos de Brasil, o Brasil saiu
de 27% para 12,5%. E o Sudeste, de 16,2% para 6,4%. Então, pelas pesqui-
sas do IBGE, nós podemos afirmar que apenas 6% da população do Sudes-
te vive com esse rendimento suficiente para questão de sobrevivência. É
quase um resíduo. Se a gente pensar em 3-4% como residual, a questão de
pobreza, então, no Sudeste está-se caminhando para se tornar residual a
questão da pobreza extrema na região. O Nordeste ainda tem alguns pas-
sos para seguir.
Mas as notícias são boas até agora, porque teve ampliação de renda e
teve queda de desigualdade. Quando a gente compara, e é sempre impor-
tante comparar, talvez o desempenho relativo do Nordeste não tenha sido,
ficou atrás do Sudeste em termos de beneficiar os mais pobres. Mas, fo-
cando mais especificamente no Nordeste. Nos censos de 1991, de 2000 e de
2010 ficou comprovado que nós melhoramos o índice de desenvolvimento
humano dos municípios em todas as décadas. Nós ganhamos em termos de
desenvolvimento humano dos municípios.
O atlas do desenvolvimento humano mostra que em IDH, a maioria dos
nossos municípios no Nordeste estava em torno de 0,2 a 0,4 do IDH. Só para
vocês terem uma ideia, 0,4 em termos de IDH, é África, 0,3, são os países
mais pobres do mundo. Os países mais ricos do mundo têm IDH acima de
191RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
0,8, de 80% de índice de desenvolvimento humano. Então, o Nordeste estava
em 91 ali, a curva mostra que a grande massa dos municípios, a maior par-
te estava no IDH entre 0,2 e 0,4. Ou seja, nós éramos realmente bastante,
nós tínhamos realmente dificuldades em termos de desenvolvimento huma-
no nos municípios. A curvinha verde veio depois e no ano 2000 já houve um
avanço para a direita, então nós ficamos ali entre 0,3 e 0,5. Melhoramos. E
agora, com os resultados de 2010, o censo de 2010, recentes, nós estamos
com vários municípios já chegando em 0,8, exatamente o índice dos países
mais desenvolvidos do mundo. O que em 2000, não chegava nem no 0,6, mas
já está chegando a 0,8. E a grande massa já está chegando em 0,6. Então, há
um desenvolvimento humano, sem dúvida alguma, transformação social nos
municípios do Nordeste, sem dúvida alguma.
Se olharmos para as pessoas vulneráveis à situação de pobreza, veremos
que, desde de 1991, 2000 e 2010, a curva vem caindo. O que é bom porque
significa que há menos pessoas vulneráveis à pobreza. Há que se comemo-
rar também isso. Lá, nós tínhamos vários municípios com quase 100% da
população vulnerável, ou seja, vulneráveis à pobreza. Então, hoje há menos
vulnerabilidade em termos de pobreza. Ou seja, nós temos vários municípios
que estão em torno de 20% de vulnerabilidade; até menos, alguns perto do
zero. Então, há municípios nordestinos que estão com 5% de vulnerabilidade,
ou seja, só 5% da população ainda está vulnerável à situação de pobreza.
Isso é só para corroborar a ideia de que há ganhos, sem dúvida alguma, em
termos de desenvolvimento humano.
192
Alguns pontos adicionais em termos dessas transformações no Nordes-
te. Há muito que se fala em termos de mídia, principalmente, em relação
à expansão da classe média. A região Nordeste foi a região que mais con-
tribuiu para expansão da classe média no Brasil, um aumento em torno
de vinte pontos percentuais. O Nordeste contribuiu com isso. Muitas pes-
soas se inseriram na classe média. Depois, a gente vai colocar algumas
questões sobre isso, mas vamos lá. Em termos, ainda, de um sentimento
mais otimista, há um potencial aumento de consumo. O nordestino ainda
tem uma propensão a consumir muito grande; natural, concordam? Se a
gente está num processo de transformação de desenvolvimento social, é
natural que muitas pessoas que não adquiriram, não tinham condições de
adquirir determinados bens, passem a adquirir esses bens, porque as nos-
sas necessidades humanas são necessidade ilimitadas. Então, o nordesti-
no, agora (foi feita uma pesquisa recente sobre o que o nordestino), ainda
deve consumir, e tem casa, tem apartamento. Adorei saber, por exemplo, a
questão de cursos profissionalizantes, a questão bancária, a inserção ban-
cária com cartão de crédito. Então o Nordeste ainda está vivendo, isso para
muitas pessoas ainda é uma coisa recente, é algo recente ainda. Então,
ainda, tem um potencial muito grande de consumo dentro desse mercado.
Por isso que é bom o crescimento, por isso que é boa a redução das desi-
gualdades, porque quando você reduz as desigualdades e cresce a renda
significa mais pessoas se beneficiando do processo de desenvolvimento
econômico, significa mais mercado, significa mais consumo, maior dina-
193RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
mismo, maior renda, maior distribuição. Há muitas carências ainda não
atendidas para o nordestino, logicamente, e o nordestino, segundo a pes-
quisa, é o que está mais aberto a experimentar marcas novas, o que é na-
tural também porque você não adquiria essas marcas e passa a adquirir,
então, logicamente, são produtos que são novidades, você está aberto a
testar as marcas que você ainda não conhece.
O Programa Bolsa da Família vai injetar em 2013 R$ 25 bilhões de reais
na economia do país, vinte e cinco bilhões de reais. Desses vinte e cinco
bilhões, em torno de metade vem para o Nordeste. No Nordeste, nós temos
ainda 43% das famílias no programa Bolsa da Família, 43% das famílias. Há
vários pontos de vista dessa discussão, logicamente, mas o fato em termos
de renda na economia, você tem logicamente um acréscimo na economia
por conta dessa injeção desses R$ 25 bilhões de reais, que vão ser colocados
na economia, dos quais se espera aí em torno de R$ 12 bilhões e meio para o
Nordeste, para os 43% das famílias do Nordeste.
Logicamente que estou colocando aqui já o ponto adicional, em termos
de urbanização, nós estamos crescendo. Há uma massa muito grande de
municípios do Nordeste que praticamente aumentaram suas taxas de ur-
banização. As pessoas estão migrando para as cidades do interior. O fluxo
migratório para as regiões metropolitanas, pelos pesquisadores, não está
sendo tão grande, mas o fluxo da zona rural para as cidades de porte médio
do interior. Isso é algo também importante para a gente discutir aqui, se
esse não é um possível caminho em termos de aumentar os serviços essen-
194
ciais nessas cidades, aumentar a infraestrutura, aumentar a qualificação,
para a atração de novos negócios.
Eu denominei de vitórias recentes, porque é lógico que é vitória, porque
você tem crescimento de renda, você tem redução da desigualdade, que é
um padrão de crescimento que os economistas chamam de “crescimento
pró-pobre”, crescimento inclusivo, então houve isso no Nordeste; houve uma
melhora significativa no IDH na sua questão de renda, houve ampliação do
acesso a serviços básicos como saneamento, água, energia, principalmente
energia. Então, são vitórias recentes do Nordeste, sem dúvida alguma. Mas,
há vitórias assim que são mais fortes do que outras, são vitórias de golea-
das. Por exemplo, eu considero uma das grandes vitórias recentes o aumen-
to fantástico de escolaridade que o Nordeste teve. O Nordeste teve mais
de 50% de aumento de escolaridade nesse período de dezesseis anos. Isso
não é pouca coisa, nós aumentamos dois anos e meio em média em anos de
estudo. Houve uma ampliação do acesso ao nível superior. É claro que nós
estamos distantes, muito distantes ainda em termos de tudo, em termos de
todas essas variáveis que a gente está colocando, nós estamos ainda na
metade a renda do Sudeste, nós estamos na metade da produtividade do
Sudeste, nós ainda estamos tentando formar uma geração de ensino médio.
Nós temos aí, tateando, 40% dos jovens frequentando o ensino médio. Nos
Estados Unidos, por exemplo, a sociedade americana tem 65% de pessoas
com, pelo menos, o ensino médio. Há espaço muito grande em termos de
desenvolvimento, mas essa vitória do acúmulo da educação e claro que há
195RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
preocupações em termos da qualidade dessa educação. No Nordeste, em
pesquisa recente, em termos de pesquisa de educação básica, tem demons-
trado que, numa escala de até doze, o nordestino tem em matemática e em
português nível 3 a 4. Os meninos do ensino fundamental em matemática
têm dificuldades enormes com frações, com porcentagem, são dificuldades
básicas em matemática, como geometria, e é claro que essas dificuldades
presentes são inteiramente importantes para determinadas escolhas futu-
ras. Então pode haver, logicamente, como já se percebe, um afastamento
de determinadas carreiras como as engenharias. Então há um déficit , uma
lacuna muito grande, e isso é muito prejudicial logicamente ao desenvol-
vimento industrial, ao desenvolvimento da economia. Quando a gente fala
indústria, a gente fala indústria porque a indústria é o motor, é o celebro da
questão econômica. Porque é na indústria, principalmente, que há a inova-
ção, que há a tecnologia, e tecnologia é o grande motor do desenvolvimento
econômico de uma sociedade. E é claro que, para haver tecnologia, tem que
haver conhecimento.
Então, ao final das contas, o grande motor do desenvolvimento econômico
de qualquer sociedade é o ser humano. Muitas das nossas mazelas históri-
cas do Nordeste podem também ser explicadas porque por muito tempo a
gente pensou em desenvolver o Nordeste, mas não se deu devida atenção a
se desenvolver o nordestino. A figura mais importante nesse processo todo
é o nordestino. No momento em que ele se qualificar, no momento em que as
suas habilidades, as suas características individuais forem fortalecidas, se-
196
guramente, o processo de desenvolvimento econômico estará garantido pela
inserção, desde que a gente se preocupe também com o complexo que existe.
Em termos dessa complexidade, hoje eu estava falando com um jornalis-
ta e eu dizia: eu quero uma receita para uma indústria se instalar no interior.
Então, o jornalista pensou e disse, infelizmente eu gostaria de te dizer essa
dica, mas não existe; existe uma dica de várias coisas, existem um ambiente
muito grande, a complexidade é muito grande; você tem que ter qualifica-
ção, você tem que ter infraestrutura física, você tem que ter um ambiente,
você tem que ter questões culturais, como o dr. Gonzaga Mota colocou, o
que os economistas chamam, dr. Gonzaga Mota, alguns economistas estão
chamando de amenidades. Mas é muito importante para uma indústria, por
exemplo, se instalar, que a cidade onde vai se instalar também dê condições
de teatro, cinema, para os seus executivos, senão eles não se instalam. Você
pode chamar de amenidades, mas também são coisas importantes. Na ver-
dade, há um conjunto de coisas muito importantes, não há uma coisa só.
Então, essa questão de vitórias futuras.
Eu não sei como está a visibilidade, mas é um mapa que a Confederação
Nacional das Indústrias lançou há pouco tempo, chamado “mapa estratégi-
co da indústria”, que na verdade se aplica ao desenvolvimento econômico. É
só pra que a gente cite e veja a complexidade que é para garantir a compe-
titividade do Nordeste, inserção maior da economia do Nordeste, represen-
tando a economia brasileira. O Nordeste que tem 13% do PIB do Brasil e tem
28% da população, então ainda há um espaço muito grande.
197RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Em termos de ambiente macroeconômico, questões de câmbio, questões
de estabilidade, questão de investimento, questão de taxa de juros. As taxas
de juros muito altas, ela inibem logicamente as pessoas a investirem em
suas empresas, em seus negócios. A eficiência do estado, em termos da
gestão do gasto público, que é muito importante o governo saber gastar.
Nós temos, hoje, déficit hoje em contas, por conta exatamente dessa má
qualidade dos gastos públicos, infelizmente, o governo deveria estar gas-
tando com infraestrutura, que é tão necessária, desenvolvimento de mer-
cado, acesso ao mercado, internacionalização. Há muitos economistas que
defendem fortemente que indústria tem que ser exportadora. No Sudeste,
por exemplo, essa discussão está bastante atual, o Sudeste provocando as
suas indústrias para exportarem. Mas, uma coisa naturalmente é verdade;
que há uma economia globalizada, e que é necessário se inserir nesses mer-
cados internacionais e, para isso, seus produtos precisam ser bastante di-
ferenciados, sem dúvida alguma, em relação a isso. As cadeias produtivas
globais, que você só se insere também, também precisam de ajuda do go-
verno. Temos os acordos internacionais de comércio, esses acordos que às
vezes o Brasil patina tanto, por conta até de certa, esse casamento com o
MERCOSUL que impede, por exemplo, outros acordos, isso também precisa
ser revisto. A questão de segurança jurídica e burocracia que ainda é muito
grande, no Brasil ainda há determinadas cidades que você ainda leva cento e
poucos dias para abrir uma empresa. Por exemplo, a Nova Zelândia abre uma
empresa em um dia. Há um grande caminho, ainda, uma grande evolução em
198
termos de burocracia. A questão dos tributos, por exemplo, que tem afetado
tanto a competitividade das empresas que pagam uma carga tão grande.
Não é problema pagar uma alta carga tributária. O problema é a gente ter
essa alta carga tributária sem ter os serviços fundamentais, esse é que é o
grande problema. A gente poderia até ter uma carga tributária maior, como
outros países mais ricos, mas o problema é que nós não temos, em contra-
partida, os serviços de educação, saúde, de transporte público.
A questão de infraestrutura em que o Nordeste tem avançado, recente-
mente mais ainda, há muito que se fazer em termos de infraestrutura, princi-
palmente energia, energia trifásica, energia trifásica que garanta produção.
Hoje houve lá no INDI, por exemplo, relato de empresários que gastam qui-
nhentos mil dólares com equipamento, esse equipamento não é instalado
porque não há rede trifásica no local onde a indústria está, com a dificulda-
de técnica da COELCE. Enfim, esse é um entrave.
As questões de relação de trabalho, que precisam ser modernizadas,
questão de financiamento, ampliação desse crédito; há muito crédito no
Brasil, mas o crédito ainda continua sendo para as grandes empresas. O
BNDES tem essa consciência, quando tenta ampliar para as pequenas e mé-
dias empresas.
E a questão principal, que é a questão de inovação e da produtividade.
Agora, é claro que para você ter inovação você precisa ter aquilo, que eu
citei há pouco tempo, que era a questão do capital humano, a questão das
habilidades humanas.
199RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Gostaria aqui de encerrar a minha participação, colocando aquilo que o
dr. Gonzaga Mota chamou a atenção no início, a questão do partido dele ser
da educação e cultura. Em termos econômicos, se ele é economista, acredito
que tenha isso. Mas a educação, ela é importante, ela é transversal a toda
uma sociedade para ser melhor em termos de tudo, e ela é fundamental nesse
processo, então, o que se espera realmente, é um grande avanço em todos
esses pilares aí, mas o básico é a ali, é o laranjinha ali do começo que é princi-
palmente a educação básica. Vários pesquisadores dessas questões cogniti-
vas, determinam claramente que a criança bem educada até os seis, sete, oito
anos, essa educação básica é extremamente importante, determinando para
o futuro dela em termos de educação, por conta do desenvolvimento cognitivo.
A questão da educação profissional, nós temos um alento do governo do
estado sinalizando com mais de cem escolas técnicas profissionalizantes no
interior, isso é um certo alento, vamos ver a qualidade, a gestão dessas esco-
las, vamos ver a sequência, mas de qualquer forma é uma grande notícia. E
a questão de formação de nível superior, ou seja, a educação ela está como
um pilar básico de tudo isso.
Dr. Cláudio, a gente tem um debate para inserção dessa aula, ou eu já pos-
so tecer comentários? Isso vai ficar pra depois, não é? Então, eu encerro por
aqui, agradecendo mais uma vez a atenção de todos vocês. Muito obrigado.”
Luiz Gonzaga de Fonseca Mota: “Eu agradeço ao professor Carlos Manso,
sua brilhante exposição, que muito nos estimula a continuar nessa luta pelo
200
Nordeste. Parabéns, professor. Dando continuidade, nós teremos agora a
exposição do Maurício Gonçalves e Silva, e da querida Evangelina Oliveira.
O debate ficará, conforme a orientação que eu recebi, ao final das três ex-
posições.”
Evangelina Oliveira: “Bom dia. Eu quero agradecer muito o convite que me
foi feito para falar aqui, por vários motivos, e o primeiro deles é que eu estou
de volta ao Ceará! Preciso dizer que, mais ou menos, enganei vocês ao dizer
que sou colaboradora em um grupo de pesquisa da FIOCRUZ – na verdade,
estou aqui, porque fui trinta e tantos anos do IBGE, e a última coisa que fiz lá
foi coordenar o estudo das Regiões de Influência das Cidades. Então, a gen-
te hoje fala aqui de Regiões de Influência das Cidades, e de um fruto desse
trabalho, do qual Maurício vai falar um pouco.
Eu queria começar, só para orientar a questão, marcando a diferença en-
tre regiões e redes:
As regiões são resultantes de um processo de formação histórica, têm
uma coesão territorial, laços culturais, e temos, por exemplo, uma identida-
de nordestina, e estariam relacionadas às características naturais e sociais.
Por outro lado, quando estudamos as redes de cidades, olhamos as redes; o
espaço dos fluxos não é exatamente o espaço do chão, físico. Os fluxos po-
dem manifestar-se fora dessa articulação, organizam o território com o pro-
cesso econômico, conectando de maneira desigual, pois existem áreas onde
até parece que existe um túnel, um ponto aqui, outro ali, e no meio, nada! E,
201RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
certamente, as redes podem ser usadas para transformar o território. Então,
quando conhecemos os pontos de alavanca, é interessante usar esse proces-
so. As cidades, em si, são os lugares onde se instalam os serviços e, portan-
to, têm toda a estrutura para serem os nós para onde convergem as pessoas,
os materiais, os recursos. E elas não podem ser entendidas isoladamente. As
cidades precisam ser entendidas em suas relações com as outras cidades,
elas comandam o abastecimento da sua própria área de influência, e estão
conectadas, em rede, a todas as demais cidades. Dito isso, a rede urbana é
uma rede síntese: há várias redes, e todos nós temos na cabeça exemplos
dessas várias redes, e a rede urbana materializa uma síntese dessas redes.
As redes podem ser materiais (como uma estrada) ou não materiais (como
uma ligação de internet), e podem também ser hierárquicas ou não hierár-
quicas. Na hierarquia, temos uma estrutura de comando, de controle; nas
relações não hierárquicas podem acontecer trocas e complementaridades.
São esses os conceitos iniciais que usaremos para falar da rede de cidades.
Fizemos a atualização das regiões de influência das cidades em 2007 (na
verdade, o trabalho foi lançado em 2008, mas a data de referência dos da-
dos da pesquisa é 2007). A hierarquização dos centros urbanos do Brasil e
a delimitação das suas regiões de influência visam exatamente subsidiar o
planejamento e as decisões de localização das atividades econômicas, de
produção, de consumo, de equipamentos sociais, educação, saúde, onde se
vai estudar, onde se vai internar... E chegamos a ter quatro níveis de cen-
tralidade, começando pelas metrópoles, que são os doze principais centros
202
urbanos do país, com uma enorme área de influência e muito integrados,
conformando o topo da hierarquia.
Vemos, no mapa, que as metrópoles estão classificadas em três níveis: a
grande metrópole nacional, que é São Paulo, as metrópoles nacionais, Bra-
sília e Rio de Janeiro, e as demais metrópoles. Antigamente, em estudos
anteriores do IBGE, estas eram chamadas metrópoles regionais, mas, exata-
mente por causa da diferença que estabelecemos entre rede e região, hoje,
as metrópoles não estão limitadas a uma região. Assim, por exemplo, aqui no
Nordeste, Fortaleza, Recife e Salvador têm relacionamentos que ultrapas-
sam de longe os limites da região Nordeste; então, achamos que não cabia
continuarmos falando de metrópoles regionais.
Abaixo delas, temos as capitais regionais, que, como as metrópoles, tam-
bém estabelecem relacionamentos com o nível superior da rede urbana.
Elas têm uma área de influência, essa sim, mais regional, e a população de
muitos outros lugares vem a elas.
E, a seguir, estão os centros sub-regionais, um estrato de centralidade
de médio para baixo, onde vemos uma atuação de extensão mais reduzida,
e relacionamentos externos basicamente com as metrópoles nacionais,
não estabelecendo outras ligações com o resto do país. O próximo nível é
o dos centros de zona, cidades de menor porte que vão atender às funções
de gestão elementar. E, por fim, os centros locais, todas as demais cidades
do país, que atuam como centro apenas para sua própria população rural
e urbana.
203RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Vamos ver agora o mapa da rede urbana do Brasil, tal como foi classifica-
da na pesquisa de 1985. Afinal, o professor Márcio dizia que economista sem
gráfico não tem graça, e eu completo: geógrafo sem mapa também não...
Então, quero comparar esse quadro com o de 2007. A primeira coisa que
vemos é que cada uma dessas cores representa a rede comandada por uma
das metrópoles. Aqui no Nordeste, vemos em azul a área de Recife, em ama-
relo a de Fortaleza e, em verde, a área de Salvador. Vemos também a área
de São Paulo que, em outro tom de verde, estende-se até a região Norte. O
que eu queria chamar atenção, inicialmente, é que, no Nordeste,se conside-
ramos os centros regionais, representados em laranja, a distribuição é mais
esparsa; no Sul e no Sudeste, ao contrário, vemos muitas capitais regionais
atuando. E vemos que estas linhas em laranja, se concentrarmos o olhar no
Nordeste, temos basicamente as capitais estaduais e alguns centros como
Imperatriz, Crato, Juazeiro, Barbalha, Sobral e Barreiras, que passou a ser
um centro. Assim, existem centros no interior, mas seria preciso haver mais
cidades desempenhando as funções de capital regional para promover uma
melhor distribuição de serviços à população.
Eu vou falar muito rapidamente como fizemos esse trabalho, porque,
quando compararmos as alterações no tempo: como era, e como ficou de-
pois, quero chamar atenção para um ponto.
Então, em termos metodológicos, o primeiro passo foi definir os centros
de gestão de território, e isso foi feito com base nas atividades de gestão –
federal e empresarial – e na distribuição de equipamentos e serviços.
204
Na gestão federal, a regionalização do atendimento da gestão federal em
relação ao poder executivo, os três organismos que têm função de extração
e de atendimento ao público são o INSS, a Secretaria da Receita Federal, e
o Ministério do Trabalho e Emprego, que estão presentes em grande núme-
ro de municípios. Também o Poder Judiciário está presente e distribuído
no território.
Interrupção devida à falta de energia.
Boa tarde, eu tinha pensado em dizer “como eu ia dizendo...”, e retomar do
ponto em que paramos, mas não sei se todos os presentestambém estavam
aqui ontem. Então, contando com a paciência de vocês, talvez seja melhor
repassar rapidamente os pontos já levantados. Eu comecei estabelecendo a
diferença entre região e rede, que são dois objetos diferentes. A região é ter-
ritorialmente coesa, ela tem uma identidade, e a rede é um espaço de fluxos
que se ligam de forma desigual, e que estruturam um território. Então, são
dois enfoques e, quando estudamos as regiões de influência das cidades,
um trabalho que o IBGE já faz desde a década de 60 (na verdade, o primeiro
estudo – Regiões Funcionais Urbanas é referido como de 1972, que é a data
de sua publicação, mas a data de referência do questionário que deu origem
ao trabalho é 1966), estamos enfocando a questão das redes.
Então, esse já é um estudo tradicional das cidades, e por quê? Porque
as cidades são os locais onde se podem instalar os serviços para atender a
uma população, onde se pode prover os serviços de saúde, de educação, e
205RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
onde o governo pode também exercer suas demais funções. Então, temos
um modo de vida urbano desde a pré-história (não é, Cláudio?). Uma coisa
que é muito característica das cidades é que você só pode entende-las em
conjunto, através de suas relações com outras cidades: elas são francamen-
te dinamizadas por dois processos – comandam e abastecem a sua área de
influência, e conectam-se com outras cidades. A rede urbana, então, é uma
rede síntese: das redes materiais e das redes imateriais, e de redes hierár-
quicas, por onde são transmitidos comandos através das diferentes escalas,
e de redes não hierárquicas, organizadas por trocas não diretamente rela-
cionadas com a hierarquia.
Quando fizemos o estudo da região de influência das cidades, em 2007
(publicada em 2008, mas a data de referência das informações é 2007), es-
tabelecemos a hierarquia dos centros urbanos, e delimitamos a região de
influência de cada um deles, com o objetivo exatamente de subsidiar o pla-
nejamento, para saber onde colocar determinadas funções para que sejam
mais facilmente acessíveis à população. E, com isso, geramos uma hierar-
quiadas metrópoles, das capitais regionais, dos centros sub-regionais, dos
centros de zona, e dos centros locais, mantendo a tradição do estudo.
As metrópoles são os grandes centros caracterizados pelo grande porte,
e por terem fortes relacionamentos entre si. Elas são, de fato, as cabeças
da rede urbana nacional, e têm uma área de influência muito extensa. As
capitais regionais, como diz o nome, têm uma função mais regional. Elas se
ligam com as metrópoles, e têm áreas de influência relativamente extensas.
206
O centro sub-regional já apresenta menos funções de comando, de contro-
le, menores áreas e, fora da sua área de influência, liga-se, além da capital
regional, com as metrópoles nacionais. O centro de zona atende a uma área
ainda mais imediata, e os demais municípios foram classificados como cen-
tro local, porque sua centralidade, no fundo, atende apenas à própria popu-
lação do município, urbana e rural.
As doze metrópoles foram classificadas em: grande metrópole nacional,
que é São Paulo, duas metrópoles nacionais, que são o Rio de Janeiro e Bra-
sília, e as demais metrópoles, Manaus, Belém, Fortaleza, Recife, Salvador,
Belo Horizonte, Curitiba, Porto Alegre e Goiânia. Aliás, quero ressaltar que
essa ordem de nomes das metrópoles nada tem a ver com hierarquia. No
IBGE, temos o hábito de referir as cidades, estados, na ordem dos ponteiros
do relógio: Norte, Nordeste, Sudeste, Sul e Centro-Oeste. Na ocasião da di-
vulgação do estudo, um repórter de Porto Alegre perguntou por que a sua
era praticamente a última das metrópoles, a menor? E tive de esclarecer
que não; nada disso! Algumas ordens são “cacoetes” nossos. Então, como
eu dizia, nessa classificação, a grande metrópole nacional é São Paulo, se-
guida das duas metrópoles nacionais (o Rio não perdeu sua majestade...) e
cada uma das demais comanda a sua região, mas sema projeção nacional
das primeiras.
No Nordeste, fazendo um foco mais estreito aqui no mapa, podemos ver
as capitais regionais, esses quadradinhos laranja, que estão ligados às três
metrópoles da região. Então, Fortaleza polariza São Luís, Teresina, Juazeiro
207RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
do Norte, Natal; Recife polariza Maceió e João Pessoa, e também Natal; e
Salvador, que polariza Aracaju.
Para fazer este estudo, investigamos primeiro os centros de gestão de terri-
tório, aqueles onde são tomadas decisões. Para isso, olhamos a gestão federal
e a gestão empresarial, e pontuamos equipamentos e serviços (vocês vão ver
mais tarde porque mencionamos algumas noções da metodologia empregada).
Examinamos a localização dos principais orgãos do Poder Executivo que têm
projeção territorial nacional: INSS, Secretaria da Receita Federal e Ministério
do Trabalho e Emprego, e do Poder Judiciário: Justiça Federal comum, Justi-
ça Eleitoral e Justiça do Trabalho. Selecionamos os novecentos e seis municí-
pios que tinham pelo menos um dos órgãos do Poder Executivo, e pelo menos
dois do Judiciário.(A Justiça Eleitoral está muito mais amplamente distribuí-
da e, portanto, não dava essa noção da hierarquia). Além disso, como critério
complementar, localizamos a direção das agências, dos conselhos nacionais,
fundações e institutos, para também compor a noção da hierarquia. Assim foi
classificada a gestão federal. Na gestão empresarial, verificamos no cadastro
de empresas do IBGE, quais as empresas que têm pelo menos três unidades
locais (filiais) situadas em outros municípios, e consideramos o local das sedes
dessas empresas, como centro de gestão empresarial. Como critério comple-
mentar, usamos também as informações das revistas Exame e Valor Econômi-
co, sobre a localização das sedes das maiores empresas nacionais.
Em relação a equipamentos e serviços, estudamos a diversificação e o
volume de alguns setores: comércio e serviços, instituições financeiras, en-
208
sino superior de graduação e de pós-graduação, internet, redes de televisão
aberta, conexões aéreas, e serviços de saúde.
Para delimitar a região de influência, trabalhamos em duas escalas: para
os centros de gestão de território, identificados segundo os critérios já fa-
lados, e que são as cidades maiores, usamos dados secundários; para as
demais cidades, fizemos uma pesquisa direta, uma pesquisa quase impres-
sionista, como costumo dizer, respondida pelo agente de coleta do IBGE.
O agente do IBGE é quem visita e conhece toda aquela área em que faz os
questionários das pesquisas regulares; então ele pergunta onde a popula-
ção vai... não é que ele pergunte, mas, conhecendo aquele município de
no máximo 10-15 mil habitantes, ele sabe onde essa população vai quando
sai do município para fazer compras, para onde vão os transportes públi-
cos,para que outros lugares aquele município tem ligação de ônibus, que
aeroporto utilizam para voos, onde vão estudar, onde compram bens, pro-
curam serviços de saúde e de lazer, de onde vêm os jornais que são vendi-
dos nessa cidade. Além disso, em relação à produção agrícola, onde são
comprados os insumos, para onde vai a produção; e, finalmente, se há ser-
viços comerciais de internet banda larga. Então, essas foram as perguntas
respondidas pela rede.
Apresentamos alguns mapas para exemplificar as informações dessas
duas fontes: dados secundários e questionário. Para a gestão federal, temos
aqui um exemplo da distribuição das agências e a hierarquia das agências
do INSS, onde estão as regionais do INSS, e onde estão as agências. O mapa
209RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
seguinte, da Justiça do Trabalho, também mostra sua organização hierár-
quica. E para a gestão empresarial, mostramos um exemplo de onde estão
as filiais das empresas de São Paulo. Então, fica muito claro: ela é a grande
metrópole nacional, porque tem ligações em todo o país pela presença das
filiais de suas empresas.
Para o questionário, temos aqui só alguns mapas para exemplificar: aque-
le é dos transportes regulares, esse é de compras, esse é de cursos supe-
riores e esse é do deslocamento para lazer. Então, você vê que as ligações
convergem para os centros. E assim, somando esses dois níveis da rede e
sua articulação, delimitamos as regiões de influência dos centros. Embora o
mais comum seja a existência de uma ligação principal, dominante, há casos
em que as ligações são compartilhadas. É o que acontece, por exemplo, na
região Norte, a área de Rondônia e do Acre está ligada ao mesmo tempo a
Brasília e a São Paulo, isto é, tem uma dupla ligação. No caso do Rio Grande
do Norte, Natal está ligada a Fortaleza e também a Recife. Então, são liga-
ções compartilhadas, que acontecem nesse nível superior da rede e tam-
bém nos níveis inferiores.
Em relação às transformações ocorridas na rede urbana, aqui está um
mapa da rede de 1966 (Regiões Funcionais Urbanas de 1972). Vemos uma
grande extensão em azul, a área comandada pelo Recife; em amarelo, a área
que está ligada a Fortaleza e, em verde, a área de Salvador. No mapa da
rede em 2007, vemos uma redução na área em azul. Isso tem a ver com o
que aconteceu nesse período de quarenta, cinquenta anos: os estados assu-
210
miram o controle de seu território. E, de fato, hoje, em todos os estados do
Brasil, as capitais tomaram o poder, e são o centro da rede urbana em seu
estado. Com isso, aquela área de Maranhão e Piauí que, via Floriano, estava
polarizada por Recife, passa a estar polarizada, no Maranhão, por São Luís.
Então, isso explica este aumento da área de Fortaleza em relação à área de
Recife, porque as ligações são mediadas pelas capitais estaduais. Ocorreu
um adensamento no interior da Bahia, a ligação de Barreiras, agora é dupla,
com Brasília e Salvador. É mais uma das ligações compartilhadas, como é
o caso também de Petrolina - Juazeiro, que, até por razões óbvias, ligam-se
a Recife e a Salvador. Como já mencionado, o Rio Grande do Norte também
tem dupla polarização. Então, houve essa articulação: controle estadual e
ligações compartilhadas.
Também surgem centros nesse período, ocorre a ascensão de Imperatriz,
Santa Inês aparece ali no Maranhão, e há casos como o da zona ali naquele
entroncamento Pará-Maranhão-Tocantins, que é muito confusa. Aqui, por
exemplo, temos Balsas, que consegue estar na rede de Araguaína no Tocan-
tins, na rede de Imperatriz e também está ligada a Teresina. Então, esta é
uma área ainda muito fluida em termos de organização, não dá para separar
bem essas ligações.
Também aparece, na Bahia, Teixeira de Freitas como centro, há uma as-
censão de Crateús e do Quixadá, aqui no Ceará, são variações que vêm ao
longo do tempo. Mas acho que entre as coisas mais marcantes, os dois pon-
tos a ressaltar seriam o fato de que os estados assumiram o controle de seu
211RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
território e de que, em relação às cidades, existe uma grande estabilidade
dos centros, não há grandes “invenções” nesses cinquenta anos, as grandes
cidades de hoje já eram as grandes cidades, aqui no Ceará, por exemplo,
Sobral e Juazeiro mantém seu posto.
Em relação ao que podemos tirar de ideias desse estudo para planeja-
mento, se olharmos a região de influência de São José do Rio Preto, que é
uma capital regional de segundo nível em São Paulo, vemos que ela comanda
uma série de centros sub-regionais. Então, se é preciso ter acesso a algum
tipo de serviço, você não precisa ir nem ao menos a São José do Rio Preto,
quanto mais a São Paulo. Se a gente pensar que aqui temos a região de in-
fluência de Feira de Santana, do mesmo nível hierárquico, e esse mapa está
na mesma escala do de São José do Rio Preto, as distâncias que as pessoas
têm que transpor para chegar aos serviços são muito mais extensas. Claro
que temos uma densidade de ocupação mais rarefeita do que naquela área
do oeste de São Paulo, mas, de qualquer maneira, uma das coisas necessá-
rias é investir nos centros intermediários, não só para criar oportunidades
de trabalho, mas também para fazer com que as pessoas tenham acesso
aos serviços de uma maneira mais direta. Outro exemplo, podemos compa-
rar as regiões de duas capitais regionais de nível três, Criciúma e Arapiraca.
Elas estão na mesma escala, o que quer dizer que, visualmente, as distân-
cias representadas em uma e outra são a mesma.
Uma das questões proposta pelo Integra Brasil é a de quais são as rela-
ções das metrópoles. Essa é a região de Fortaleza, e vemos que as ligações
212
de Fortaleza para fora da sua região se dão com Belém, Recife, Brasília,
Goiânia, Belo Horizonte, Rio e São Paulo. E todo esse emaranhado de linhas,
vejam que as ligações não procedem apenas de Fortaleza, vêm das cidades
intermediárias que estão na região de Fortaleza, são ligações que existem.
Mesmo raciocínio para região de Recife. Todos esses centros estão ligados
(deixa eu acertar um jeito de falar ao microfone e apontar no mapa) prefe-
rencialmente com as metrópoles nordestinas e com as metrópoles nacio-
nais. Da mesma forma, na rede de Salvador, temos ligações internas, que
estruturam a rede, e ligações externas. Uma ligação com a área de Recife,
com a área aqui, ao Norte, que é, nem consigo ver mais qual é o nome, é uma
cidadezinha lá do Pará que no momento não consigo ler. E também as liga-
ções com as três metrópoles do Sudeste, além de Brasília, e Vitória.
Eu queria mostrar a vocês as mesmas informações para outros centros,
mas o tempo não permite, mostro rapidamente apenas os mapas relativos
às capitais regionais do Nordeste. E passo a palavra para Maurício, que tem
novidades em relação ao trabalho que fizemos no IBGE para definir isso.”
Maurício Gonçalves e Silva: “Bem, o que nós fizemos depois que REGIC foi
lançado? Veio um período de censo, mas a gente continuou trabalhando, só
que diminuiu um pouco o ritmo. E, então, a gente conseguiu lançar esse ano
o que nós chamamos de “divisão urbano-regional”. Qual é o objetivo? O nos-
so objetivo foi simplificar um pouco. Você tem um ganho e uma perda, você
simplifica para ajudar a visualizar determinadas informações. Agora, perde
213RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
porque você simplificou, então, dependendo do teu objetivo, é melhor você ir
no Região de Influências de Cidades e pegar o dado lá. Olhar o dado, olhar
os fluxos. Mas para outras aplicações, um dado com menos detalhe te passa
informação mais rápido: foi isso que a gente derivou. E há outra questão,
também: quando você pega, por exemplo, um município que está vinculado
a outros dois, quando você vai tirar a estatística, é difícil você desfazer, qual
é o 100%, porque você tem que computar tanto esse município para essa
área quanto esse município para esta área. Então, você tirar a estatísticas,
percentuais, fica um pouco mais complexo. Com essa visão, a gente conse-
gue tirar as estatísticas de uma forma mais rápida e começar a ter algumas
visões.
Deixa eu continuar aqui. Então, pegando um exemplo, o principal do es-
tudo foi isso: transformar o monte de linhas e classificando essas áreas, e
resolvendo as intercessões. Nós criamos três níveis. O que nós chamamos
de primeiro nível são as regiões ampliadas de articulação urbana, geral-
mente as regiões das metrópoles; o nível dois, as regiões intermediárias de
articulação urbana, geralmente ligada à capital regional ou ao centro sub-
-regional; e o nível três, as regiões imediatas de articulação urbana, regiões
ligadas geralmente a um centro sub-regional ou centro de zona. No caso,
as regiões imediatas tendem a ser, em geral, as áreas mais do cotidiano, da
vivência do cotidiano, não um cotidiano tão diário, mas desde um cotidiano
semanal ao mensal, de busca às vezes de algum centro de maior hierarquia
para usufruir de algum bem ou serviço.
214
Então, eis o resultado: A gente sabe que existem as duplas vinculações,
mas para a gente chegar a esse resultado a gente teve que criar critérios
para saber. Tudo bem, essa cidade se liga tanto a essa, quanto àquela, mas
se liga mais com quem? Então, para nós chegarmos a esse resultado final
foram criados vários critérios para a gente poder chegar e dizer: tudo bem,
a gente tem exceções, mas o mundo flui um pouco mais para esse lado
do que para o outro lado das intercessões. Então, no primeiro nível nós
chegamos a quatorze regiões, ampliadas, as metrópoles que a Evangelina
comentou, e nós ainda trabalhamos com Cuiabá e Porto Velho porque se
pensar São Paulo e todas as outras metrópoles, elas têm uma atuação
nacional. Ter atuação nacional, significa pintar o país numa cor só. Ah,
mas São Paulo é diferente de Porto Alegre e tal, mas a gente está falando
de intensidade. Mas todas as metrópoles têm uma atuação nacional em
intensidades diferentes. Então não adianta pensar desse ponto, a gente
baixou um pouco a bola para começar. Tudo bem, como é que a gente
vai dividir isso? Começando de serviços não tão complexos, de atuações
não tão complexas, e aí a gente chegou nesse resultado. O interessante
é que, como está baseado em gestão e procura de bens e serviços, nós
não nos limitamos aos limites estaduais, o que dá uma característica a
essa divisão regional. Ela é mais baseada em relações econômicas, que
motivam essas articulações urbanas. Então, aplicações econômicas fun-
cionam bem para esse tipo de divisão, mas você pode utilizar dados so-
ciais. A questão é que o teu substrato está mostrando essas articulações,
215RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
esse movimento da população, mesmo que você analise dados sociais,
não existe um problema nisso.
Aqui, são as regiões intermediárias, aqui o limite das regiões ampliadas,
aqui com os limites estaduais e as 482 regiões imediatas de articulação ur-
bana. Por que criar então regiões em três escalas diferentes? Bem, falando
conceitualmente as regiões vão dar essa noção de coesão. E as escalas?
Cada escala vai atender a um objetivo. É muito comum, no IBGE, a gente
querer o dado tal, a gente recebe o e-mail. Tudo bem, mas em que escala?
A resposta é praticamente a mesma em todos os casos: o mais detalha-
do. E não é, necessariamente, o mais detalhado que o teu fenômeno se
reflete. Então, você ter as regiões em diversas escalas para determinados
estudos, você vai precisar de uma; para outro, de outra, e aí você consegue
atender uma gama maior de situações. Pegando, por exemplo, a população
em 2010, dá para ter uma noção bem interessante de como, quer dizer, a
área dessas metrópoles, das regiões ampliadas, onde se concentram. Se
você pensar assim, na área direta de São Paulo, ela vai ter essa população,
quarenta e sete milhões. Tudo bem, não está totalmente espalhada aqui,
mas já há um potencial diferente das outras regiões. Agora, quando você
vai para as regiões imediatas, você começa a ver as concentrações. Então,
dependendo do que você instale, dependendo do que você quer, essa aqui
é melhor, essa aqui é melhor ou essa aqui é melhor. Cada uma vai refletir,
cada uma dá subsídios a um apoio a decisão. Então, eu vou fazer o se-
guinte: vou tirar o limite porque ele também pesa. Tirando o limite, vocês
216
conseguem ver várias coisinhas. Mas, cadê os padrões? É mais difícil de
ver os padrões.
Então, nem sempre o detalhe é mais interessante, por isso que a gente
cria essas escalas. Uma coisa muito, muito importante a ser dita é que o di-
visão urbano-regional não substitui as médias e microrregiões, nem as gran-
des regiões, Sul, Sudeste, Norte. Cada divisão regional acaba sendo mais
apropriada como conjunto de estudos. O divisão em média e microrregiões
tem um caráter mais geral, atende uma gama maior, mas acaba tendo uma
limitação por atender a uma gama maior. A Divisão Urbano Regional, por
tratar da articulação das cidades, vai ser melhor nesses estudos de fluxo e
da hierarquia, provavelmente para saber onde posicionar um equipamento
de saúde ou de educação. Então, essa divisão regional é melhor para esses
casos, e as duas convivem. A gente não tem problema em ter vários divisões
regionais. Por quê? O mundo é muito complexo para se comportado num
modelo só. Tudo que a gente faz é um modelo, é um estudo, ele sintetiza a
realidade. Então, você ter vários divisões regionais é poder contemplar me-
lhor o que você quer, dependendo do teu estudo.
Como foi feito? Basicamente, a gente pegou o REGIC final que a Evange-
lina mostrou, e simples: Essa aqui é uma capital regional ligada à metrópole
A, todo mundo da sua rede vai ser ligado à metrópole A. O outro ali, todo
mundo da sua rede vai ser ligado à metrópole B. E a intercessão, a gente
deixou para depois. Para resolver a intercessão nós criamos todos esses cri-
térios, que eu não vou focar aqui porque é uma questão metodológica que
217RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
demoraria muito tempo, mas a gente utilizou todos esses critérios para ir
posicionando cada município; tudo bem, ele é para os dois lados, mas para
que lado ele é mais? Aplicações que a gente pode ter, sempre olharem para
o Nordeste, e não custa olhar para o restante porque o restante também não
é tão diferente, o que é diferente mesmo é aqui. O que eu quero dizer com
isso? Sempre é muito concentrado nas capitais. No interior de São Paulo é
que você tem uma abrangência maior.
Então, vamos continuar. Pessoas que trabalham em outro município ou
retornam diariamente, isso é muito importante porque mostra um movimen-
to entre municípios muito grande. Isso é esperado nas regiões metropolita-
nas. Mas, no interior de São Paulo você tem esse movimento. Então, quando
a gente pensa na interligação das cidades médias, como na área de São José
do Rio Preto cuja rede é bem estruturada, com vários centros de hierarquias
diferentes distribuídos. Isso se reflete nesse movimento. Quer dizer, a pes-
soa tem opção de morar em São José do Rio Preto ou numa cidade de menor,
pois ela se comunica, às vezes trabalha lá. E no restante do país e também
no Nordeste, o que aparecem mais são as próprias regiões metropolitanas,
mais ligadas às capitais.
Nas regiões imediatas, que significa um polígono onde existem vários
municípios, que é o percentual médio dos municípios, temos um padrão bem
concentrado, na parte de rendimento domiciliar per capita também. O per-
centual médio dos municípios, a concentração aqui; mais ainda, tendo con-
centração, maiores centros...
218
E o número de empresas de outras organizações. Esse é um dado que
vale a pena ver. Porque, se você está falando da atuação de cada capital,
é interessante saber a quantidade de empresas que existe. Então, a área
de São Paulo está bem diferente, bem acima de todo o resto. O interessan-
te também de uma divisão regional assim, passando dos limites estaduais,
Belo Horizonte sempre é enquadrado, só que grande parte de Minas é pego
por São Paulo, está mais articulada com São Paulo.
Olhando numa outra escala, novamente o fenômeno da concentração,
mas aí é o que eu vou falar para vocês, tem uma intensidade de número de
unidades de empresas, de outras organizações, vindo para o interior; quer
dizer, essa estrutura urbana suporta esse número de empresas. E isto no
Nordeste isso é bem mais acentuado.
Continuando. Para ter acesso a esses dados, na página principal do IBGE,
a gente tem área de download. Entrando nessa página, tem a parte de geo-
ciências e a parte do divisão urbano-regional. E na parte dos dados, tem
muita informação aqui na parte do SIDRA, que é um dos bancos de dados
do IBGE. E em que o IBGE pode apoiar nisso tudo? Ajudar na identificação
de quais dados utilizar, porque, pelo que eu sei, o IBGE é um dos ou o maior
banco de dados da América Latina. Tem muita informação. A gente trabalha
todos os dias com esses dados e, vira e mexe, a gente descobre uma infor-
mação nova. Isso foi levantado agora, isso agora está assim. Então, realmen-
te, ter conhecimento desse banco de dados do IBGE não é uma coisa tão tri-
vial, e apoio nisso é interessante. E, definindo melhor as escalas de análise,
219RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
como eu falei, geralmente se pede o mais detalhado. E apoio na criação de
metodologias. Às vezes querendo levantar um dado específico, o IBGE tem
experiência na parte operacional e na parte estatística, que é importante
levantar, como fazer o trabalho? Essa logística e análise em geral, porque a
gente só consegue levantar dados se a gente conhece o tema. Então, com
isso, a gente tem que estar constantemente analisando as informações para
poder ter crítica e saber quais dados levantar. É isso. Eu concluo aqui.”
Luiz Gonzaga de Fonseca Mota: “O dr. Rafael é professor do Instituto Supe-
rior de Estudos e Pesquisas Acadêmicas e Tecnológicas.”
Rafael Silva: “Boa tarde. Gostaria de cumprimentar a mesa na figura do Ex-
celentíssimo ex-governador Gonzaga Mota, e dizer a todos que é uma satis-
fação imensa estar aqui debatendo esse assunto, um pouquinho espinhoso,
de que vim tratar.
Então, se faz um fórum para discutir a integração da cidade do ponto de
vista econômico e convidam um ambientalista para fazer as suas exposi-
ções, os seus impactos, nesse processo que lhes parecem não se encontrar
muito. Eu acredito que isto se torne, então, um momento muito oportuno
para a gente trocar ideias, para a gente aprendermos, para a gente encami-
nhar algumas questões e, sobretudo, é um processo também de ampliação
do debate. Você fazia um debate de crescimento econômico há dez anos;
atrás, você vai levava em consideração o meio ambiente. Hoje, esse assunto,
220
portanto, é de extrema oportunidade. Senhores, eu não tenho como iniciar
um debate sobre meio ambiente sem antes manifestar o meu pessoal e ir-
restrito apoio às pessoas que agora, nesse momento, estão acampadas lá
no Parque do Cocó, fazendo com que a cidade rediscuta alguns modelos e
alguns pontos importantes para a mobilidade urbana. Nesse sentido, queria
deixar dois registros; um, ao Prefeito da cidade, no sentido de que amplie e
abra o debate, e dialogue com as onze alternativas que se têm ao viaduto. A
outra, ao governador, que legalize aquele sistema ambiental de fundamental
importância para a cidade. Tendo deixado esses registros, eu devo abrir en-
tão o debate do ponto de vista de educação ambiental.
Muito tem-se falado e, há algum tempo, o Clube de Roma, na década de
1960, abriu esse debate, e foram avançando sobre os relatórios dos limites do
crescimento econômico, até chegar no que, no final da década de 1980: foi
chamado de “Relatório de Brundtrand”, onde foi desenhada uma pequena e
abstrata definição sobre desenvolvimento sustentável, onde ele dizia de for-
ma bastante aberta, bastante ampla, que o desenvolvimento era aquilo que
atendia às necessidades do presente sem comprometer as necessidades
futuras. O próprio limite precisava ser muito ampliado, muito aproximado
da realidade. E aí outras instituições, outros movimentos foram avançando.
Nós tivemos um exemplo, o grande fosso da Rio 92, e a Rio 92 gera dois gran-
des documentos, um mais do ponto de vista de políticas públicas, que seria
a Agenda 21, e o outro, um pouco mais aberto para o contexto social, que
seria a Carta da Terra. Da Agenda 21, nós encaminhamos, por exemplo, os
221RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
objetivos do milênio, em que cada estado, cada município ficou responsável
por atingir algumas metas até 2014. Da Carta da Terra sairia alguns outros
movimentos, como a Cúpula dos Povos, e recentemente nós tivemos a Rio
+20, então, rapidamente, esse foi um arcabouço de movimentações feitas da
década de 1960 até aqui, cheios de propostas absolutamente amplas, ricas,
e ainda por ser levadas às suas consequências; o protocolo de Kyoto é um
exemplo forte disso, que tem tido várias rodadas e, sobretudo em Copenha-
gen, em Andorra, esses movimentos estão em curso. Não é que seja uma
proposta fechada, mas estão em curso desde a década de 1960.
Então, nós chegamos em dois movimentos importantes das questões am-
bientais. Nós fazíamos, então, um debate ambiental onde se discutia a fauna
e a flora, e aí a gente estava numa questão muito mais próxima do Guiota, e
nós discutíamos também as questões de pobreza e desigualdade, onde as re-
lações físicas e o ambiente antrópico seriam pautados de forma mais clara.
O professor Carlos Manso, por exemplo, trouxe alguns dados relativamente
importantes nesse avanço contra a pobreza e contra a desigualdade. E nes-
ses termos, nós avançamos um pouquinho sobre três perspectivas, o que
seria desenvolvimento sustentável. Ou melhor, o que daria sustentabilida-
de a esse desenvolvimento. A priori, eu não vou perder aqui a oportunidade
“professoral”, digamos assim, e queria discutir minimamente essa palavra
“desenvolvimento”, criada no século XVIII para dar impulso à exploração, ao
período pré-industrial. Na prática, ela significa “negação do envolvimento”.
Portanto, era uma possibilidade de que a indústria falava para os operários,
222
que eles não precisariam se envolver entre eles para, negando este envol-
vimento, aumentar a produção. Por isso que se justificava um avanço, um
tempo de produção de dezoito e até mais tempo na fábrica. Portanto, era ne-
gação de envolvimento familiar para poder justificar o avanço dos padrões
de produção e de consumo naquela época. Portanto, no século XX, esta pa-
lavra veio ganhar exatamente o seu oposto, ela veio legitimar justamente o
que queria dizer anteriormente.
Então, desenvolvimento para nós hoje significa avanço, significa pro-
gresso, significa um passo adiante. As propostas, se a gente for dar uma
olhada nas propostas modernizantes que pautaram o Estado do Ceará na
década de 1970 até hoje, que são exatamente as mesmas, elas vêm forte-
mente imbuídas desse projeto, projeto desenvolvimentista, projeto até que
Celso Furtado fala muito bem do desenvolvimento do Nordeste. E esse de-
senvolvimento deveria se dar em pelo menos três correntes, ele precisaria
ser socialmente correto: portanto, ter um amplo apoio da base social; ele
precisava ser ambientalmente sustentável, em que pesem o tripé da pala-
vra ambiental, e precisava ser economicamente viável. Esta palavra, “eco-
nomicamente viável”, acabou pautando toda a sorte do desenvolvimento,
de modo que tanto os governos como as empresas, costumam dizer mais
ou menos assim: “olha, se for economicamente viável, está bom, a gente
faz”, esquecendo um pouquinho desses lados ambientais e sociais. Não é a
toa, não é sem razão que boa parte das empresas quebram antes de com-
pletar o seu segundo ano de vida, porque elas não observam as variáveis
223RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
que estão ao redor, por alguma razão ou outra optam pelo desenvolvimento
economicamente viável.
O que acontece nesse processo? A CEPAL, diz mais ou menos assim:
deve haver duas grandes razões para a geração da vulnerabilidade social.
Uma delas é a degradação dos ecossistemas, desflorestação, perda da flo-
resta vegetal e da diversidade biológica. Associa-se, ainda, à adoção de
tecnologias e infraestruturas ou equipamentos territoriais inadequados ao
contexto social. Quando a CEPAL fez essa leitura, ela estava dizendo o
seguinte: nós precisamos avançar, nós precisamos crescer sim, mas nós
precisamos observar as outras duas variáveis, tanto a social quanto a am-
biental. Não se justifica, portanto, a partir desta ótica, você trocar árvore
por concreto. Quais foram os resultados deste progresso, deste processo,
digamos assim? Recentemente, um grupo chamado “350.org”, reaproxima
o cálculo de CO2 havido na atmosfera. Esse cálculo diz que nós precisa-
mos pelos menos de 350 partículas por milímetro de CO2 para sobreviver-
mos de forma tranquila, para nos adaptarmos bem. Hoje, esse cálculo se
aproxima de quatrocentos. Então. Nós estamos num limite muito extremo,
muito próximo daquilo que havia de CO2 nas eras glaciais, isso é explica-
do pelos físicos. Qual o resultado prático desse processo? Nós vamos ter
mais Petrópolis e mais Tauás, por exemplo. Nós vamos ter acentuamentos
aos extremos climáticos, nós vamos ter muitas chuvas, muitos problemas
com frio, onde se faz frio, e vamos ter muitos problemas com seca, onde
se faz seca. Vamos viver, então, épocas extremas, períodos extremos, se
224
nós alcançarmos esse limite máximo de quatrocentos bpm’s, que nós não
estamos muito longe.
Alguns movimentos têm sido feitos com relação à proximidade dessa ex-
ploração de CO2, que ela se dá em média, em base, por consumo exagerado
de petróleo, carvão e gás. E aí vem o grande hiato entre os ambientalistas e
os economistas, digamos assim. Os economistas com toda a sua, eu peço
licença aos economistas da mesa e também me coloco no debate, mas os
economistas vão buscar o crescimento, é função deles, e os ambientalistas
vão fazer exatamente o processo ao contrário. Que caminho nós devemos
seguir? Portanto, esse debate é fundamental. Esse debate que nós estamos
realizando aqui é fundamental para a sociedade, por quê? Ora, são eu sei
que Petróleo, carvão e gás, aumentam a concentração de CO2, o que dizer
então da exploração do pré-sal? A exploração do pré-sal vai potencializar de
tal modo a capacidade brasileira, que nós teremos daqui há 5, 10 anos, a ca-
pacidade dobrada da PETROBRÁS. Então, serão mais combustíveis, fósseis
sendo queimados e mais aceleramento de CO2 sendo jogado ao processo.
Eu vou dar uma passadinha no Ceará. Aquele processo modernizante da
década de 1960, hoje chega com laivos de renovação, por isso que nós es-
tamos propondo uma ponte em cima do único parque ecológico da cidade,
uma ponte estaiada; estamos propondo um viaduto, tirando um pouco desse
mesmo parque, e nós estamos fazendo um aquário em época de seca. Tudo
isso vai potencializar o crescimento, não resta dúvida, eu não estou questio-
nando isso. Vai trazer retorno, vai trazer desenvolvimento, vai trazer, enfim,
225RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
todo crescimento que é necessário para a cidade e para o estado. Agora, a
outra conta, quem vai pagar? A impressão que dá é que hoje a gente tira um
pouquinho do pulmão da cidade, aí, amanhã a gente tira mais um pouquinho,
depois mais um pouquinho. Daqui a pouco, a gente vai ter que ter realmente
um balão de oxigênio para caminhar e, então, a gente vai ter que encontrar
um meio termo para fazer esse processo. Rouanet uma vez disse o seguinte:
“o projeto civilizatório da modernidade entrou em colapso”. Isso parece ter
alcançado o projeto cearense. Por quê? E aí eu trago o mestre Celso Furta-
do quando ele diz o seguinte: “A modernização na America Latina guarda
traços muito fortes de subdesenvolvimento: este subdesenvolvimento, por
sua vez, se assemelha ao deus Janus, lá dos Romanos, este, sem orientação
exata, tanto olha para a frente como olha para trás”. Um processo de moder-
nização sem estar pautado realmente nos três pilares do desenvolvimento
vai, necessariamente, ser conduzido a um processo de subdesenvolvimento,
que não tem orientação exata. Então, você olha para frente, olha para trás e
não vai caminhando.
Eu já estou me aproximando do fim e eu queria trazer, mais uma vez, o
processo que foi dado, a acentuação desse processo dado. Veja só, na dé-
cada de 1980, eu acredito, inclusive, que o senhor participou, foi criado um
fundo no estado chamado FDI, Fundo de Desenvolvimento da Indústria. Este
fundo dava incentivo para as indústrias para que elas se aproximassem da
cidade. O resultado foi o seguinte, as indústrias vieram, mas se concentra-
ram, vejam onde está a seta; se concentraram em até 60% na região me-
226
tropolitana de Fortaleza. E aí a turma do IBGE que está aqui vai dizer com
mais precisão do que eu, que isso vai gerar um outro problema, o problema
da densidade humana, a concentração humana na mesma situação. Mais
uma vez eu recorro à CEPAL quando ela diz o seguinte: “A vulnerabilidade é
incrementada, dentre outras coisas, pelo crescimento econômico associa-
do à concentração populacional”. Veja só, o crescimento econômico, o FDI,
não é problema; o problema é que ele traz, quando ele traz uma concentra-
ção populacional. Foi exatamente o que aconteceu com o projeto do FDI: ele
concentrou as pessoas no eixo da região metropolitana em até 60%. Este
projeto trouxe investimentos de até 83% na região metropolitana. Mais um
dado aqui para fortalecer a ideia; o custo médio, se nós pegarmos de 1995
a 2003, isso segundo a Secretaria de Desenvolvimento Econômico, o Estado
deu de incentivo, aproximadamente, 12 bi e gerou 73 mil empregos. Claro que
a gente precisa fazer cruzamentos de dados, mas se eu pegar os números
absolutos, do jeito que eles estão postos, dividir um pelo outro, R$ 12 bi pela
quantidade de empregos, eu vou chegar a um cálculo de que cada emprego
gerado o Estado aportou 86 mil reais para gerar um único emprego nesse
modelo de investimento de atração de indústrias, que teve suas consequên-
cias, claro. Não há como negar, eu não vou contrariar aqui os números dados
pelo colega economista de ontem, de que o Estado avançou. Avançou muito.
Eu mesmo vivi muito essa fase difícil da periferia de Fortaleza e hoje eu volto
lá na periferia e percebo que há uma mudança magistral. Nós precisamos só
identificar qual é essa conta, como é que isso vai chegar. Veja só, este dado
227RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
já é recente, de 2010, agora dado pelo IBGE, onde mostra a concentração
de renda, que vai trazer para a gente, sobretudo em Fortaleza, aquele slide
anterior; esse daqui, a associação e a concentração populacional. Isso vai
gerar vulnerabilidade social.
A vulnerabilidade social é exatamente um dos frutos da concentração
da renda. A periferia de Fortaleza possui um alto nível de concentração de
renda. Ou seja, poucos têm muito e muitos têm pouco. Nesse sentido, eu
acabo tendo um gap a ser resolvido, urgente, necessariamente, seja para o
governo, para a sociedade, para a indústria. Eu tenho dados aqui, por exem-
plo, que o Ceará tem 9,7% dos pobres, quando comparado ao Brasil. Tinha
muito mais. Tinha muito mais antes daqueles projetos de industrialização, é
verdade, mas estes esforços não foram suficientes para nos mover de po-
sição. Nós, naquela época, éramos o terceiro estado mais pobre, hoje nós
continuamos na mesma posição, apesar de nós termos reduzido a quanti-
dade de pobres internamente. Hoje nós ficamos atrás somente da Bahia e
do Maranhão. Deixa eu dar outro dado interessante, nós temos um milhão e
meio de pessoas pobres, uma razão de um para cada cinco, os nossos ricos
detém 40% da renda; em contraste, dos 40% dos mais pobres, detém apenas
10% da nossa renda, esse é o índice de desigualdade, que aí eu trago uma
ideia do professor Amartya Sen, a qual eu tive oportunidade de ser aluno, e
ele dizia o seguinte: “o problema não é ser pobre, o problema é ser desigual”.
Nosso problema é desigualdade, nós temos que avançar nisso, nós temos
que atacar isto como grande mal.
228
E, então, antes que venha a placa do fim, eu apresento aqui nove, digamos
assim, resultados desta ampliação da desigualdade. Eu estava querendo
atualizá-lo, cochichei ali um pouquinho com os colegas do IBGE, e o econo-
mista para saber se existia atualização do IDH por bairro; parece que ainda
não saiu. Eu também pesquisei bastante para vir aqui, mas não consegui
encontrar. Mas o IDH por bairro, de 2000, diz o seguinte, o terceiro pior IDH,
considerando o bairro, da América Latina era, na época, o Bom Jardim, e o
segundo melhor IDH da América Latina era o Meireles. Se você coloca isso
em linha reta, você conhece a cidade, não conhece? Se você colocar em
linha reta dá menos de dez quilômetros de um lugar para o outro. Do melhor
para o pior. Isso é um Apartheid social. Eu espero que esses números te-
nham-se modificado, eu tenho esperança. Apesar dos números que eu estou
colocando, eu sou um otimista. Que suba o Bom Jardim. Ninguém é contra
riqueza aqui, nós somos contra a desigualdade, que suba o Bom Jardim. En-
tão, nós vivemos verdadeiros Apartheids.
Quando é que isso chega à sociedade? Quando é que isso encontra a
nossa realidade? Bem, de janeiro a julho deste ano nós tivemos mil cento
e seis assassinatos. Isso não é pouca coisa. Dos quais, até 2006, Fortaleza
era a décima oitava cidade em termos de índices de homicídio; em 2006,
recente, nós somos a segunda cidade do Brasil em termos de homicídio.
O ser humano é movido pelo querer, não é verdade? Então, eu vou tentar
explicar rapidamente de um ponto de vista social. Não estou justificando,
estou tentando explicar. Se eles querem, se a periferia quer ter acesso a um
229RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
bem de consumo que o pessoal mais rico tem, então eles vão ter que tomar
isso de alguma forma. Como você não consegue isso via mercado de consu-
mo, porque você não tem trabalho. Não tem trabalho por quê? Você não tem
qualificação, foi negada escola, foi negada uma por série de fatores que o
contexto social está aí para explicar. Então vai gerar índices de assalto, vai
gerar índices de roubo, de furto, de assassinato. Isto não sou eu quem está
dizendo. Os grandes centros de estudos da sociologia e da economia política
dizem isso, que o grande problema da desigualdade é justamente o conflito
social havido entre essas classes.
Para finalizar, uma média de 5,2 pessoas morre por dia, geralmente na
periferia. Nós temos um trânsito caótico, em que a gente acha que vai re-
solver construindo viaduto, nós temos a segunda cidade mais desigual do
país e uma taxa de concentração de renda muito elevada. Nós temos baixa
expectativa de ascensão profissional. Por quê? Porque nós não tivemos um
processo educacional completo. Os senhores que têm empresas sabem da
dificuldade. Eu estou mais na academia, mas eu sei muito da realidade dos
senhores, vocês têm muita dificuldade de encontrar mão de obra qualifica-
da. Talvez seja o grande gargalo do Estado, porque vários fatores se forma-
ram e que a gente não conseguiu fazer esse contraste.
E, depois, nós temos o índice de déficit habitacional. Esse índice de défi-
cit habitacional, eu fiquei sabendo que ele influenciava na violência urbana.
Esses dias, fazendo pesquisa para vir aqui com vocês, na minha mente, não
fazia muito sentido você não ter acesso a casa e por isso fazer o fluxo na
230
sociedade. Mas, segundo dados da CEPAL e também de outros organismos,
como a própria ONU, você ter um grande gargalo de déficit habitacional na
cidade é em si um problema gerador de desigualdade social.
Para finalizar, o que nós devemos fazer, olhando para esses números, o
que devemos fazer para que ele não se acentue, nós devemos retornar àque-
la ideia de desenvolvimento sustentável, trazer à tona essa discussão do tri-
pé. Por isso, que eu achei fundamental colocar um ambientalista no meio de
uma discussão de desenvolvimento. Eu acho que isso é um grande passo,
mas nós devemos também, além de observar o ambientalmente sustentável
e socialmente correto; Amartya Sen, que é um dos grandes teóricos da área,
inclusive, foi um dos precursores do IDH, diz o seguinte, “não basta ser so-
mente social, nós precisamos que as instituições sejam capazes suficiente-
mente capazes, de potencializar as necessidades mínimas do seu público”.
Se essas instituições não são capazes (Instituições que a gente fala aqui no
contexto é o governo), é a empresa, é a família, é a religião, é a educação,
todas nesse contexto. Não estou aqui fazendo uma acentuação em uma ou
outra, mas uma instituição, ela precisa ser fortemente capaz.
O que nós vemos hoje? Uma crise institucional. Uma atrás da outra. Por-
tanto, nós precisamos olhar para esse contexto. O que a gente chama aqui
de “Teoria da Sustentabilidade” no modelo “quatro panos de fundo”, se vo-
cês quiserem pesquisar na internet a gente coloca “four”, coloca on line, aí
vocês vão encontrar facilmente essa tradução. E nós precisamos, enquanto
indústria, enquanto empresa, enquanto governo, enquanto sociedade, en-
231RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
quanto pai, mãe, professor, nós precisamos observar esse modelo. Por isso
que nós precisamos urgentemente rediscutir a cidade, rediscutir o pacto so-
cial e rediscutir esse contrato social.
Eu deixei com vocês um livreto, no qual eu escrevo sobre meio ambien-
te e empreendedorismo. Na realidade, trata-se de uma cartilha feita pela
Secretaria de Desenvolvimento Econômico, que o nosso colega está dei-
xando aqui, vai ter que ir para o aeroporto. E este material foi feito pensado
para uma pequena empresa, pensado como é que se faz gestão ambiental
em uma revenda de batatas fritas. A partir daí, a ideia é explorar esses
conceitos de desenvolvimento sustentável para o pequeno, para o peque-
no produtor. Enfim, está aí a minha contribuição, estou aberto para o de-
bate, acredito que eu tenha colocado alguns elementos que possam nos
deixar um pouco animados, pelo menos para criticar. Pelo menos assim,
você está errado professor, não é assim não. Mas estou aqui para o debate.
Obrigado, boa tarde.”
Luiz Gonzaga de Fonseca Mota: “Eu combinei aqui com o nosso Leonardo,
com o nosso relator, que tentaremos abrir o debate e, depois o dr. Leonardo
faria um apanhado geral. Antes, porém, eu gostaria de tomar a liberdade de
fazer, já que eu ouvi muita coisa ontem e hoje, e tudo é interdependente, há
uma interdependência muito grande entre o político, o social, o econômico,
a questão ambiental etc., eu gostaria de fazer aqui algumas observações,
também para estimular o debate e para reflexão.
232
O primeiro ponto é realmente voltar a agradecer e enaltecer essa iniciati-
va do CIC e da FIEC. Acho que isso foi fundamental. Hoje recoloca-se o Nor-
deste na agenda de debates, isso é muito importante. Um ponto aqui para
reflexão, dentro deste ambiente de interdependência, que aqui nós tratamos
da área social, da área ambiental, da área urbana, lá nos outros painéis tem
vários outros assuntos (Infraestrutura, logística e etc.), que eu não assisti,
apenas li aqui o roteiro. Como ex-técnico, como ex-político, sou apenas um
curioso hoje. Eu acho que nós devemos colocar na cabeça que, por mais
frágil que seja a democracia, é melhor do que qualquer ditadura, seja ela de
direita, seja de esquerda, seja de centro. Porque, dentro de uma perspectiva
de longo prazo, e dentro de uma perspectiva de justiça. E, dentro de uma
democracia, nós precisamos ressaltar e devemos buscar o poder, claro, os
partidos, as pessoas, as pessoas querem o poder, mas esse poder deve ser
alcançado, deve ser conseguido, conquistado, para servir e não para domi-
nar. Isso é muito importante para reflexão. O poder deve ser conquistado
para servir e não para dominar. Eu digo isso com muita tranquilidade, por-
que na época do problema da reeleição, eu era do PSDB na época, e fiz um
texto, entreguei ao próprio presidente Fernando Henrique, contrário ao pro-
cesso da reeleição, mas não teve sucesso e houve a reeleição, está havendo
reeleição e vai haver reeleição. E eu não sei se vai acabar.
Uma coisa que está sendo muito interessante neste painel, e acho que
nos outros painéis também, é como nós estamos ressuscitando o planeja-
mento estratégico. Neste país, Leonardo, você que é relator, eu acho que o
233RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
dr. Rafael andou falando mais ou menos sobre isso, o planejamento estra-
tégico, o planejamento de longo prazo, aquele planejamento profundo, in-
felizmente foi substituído pelo planejamento de marketing. Hoje você não
discute num debate político, você não discute num debate. Aqui a gente
está discutindo, graças a Deus. Mas, se não se discute num debate político,
isso que o dr. Rafael falou, que a professora falou, o que o dr. Carlos falou
ontem, não se discute isso. Se discute quem roubou aquilo, quem fez aquilo,
não sei quê, não sei quê e tal. E figuras bonitas passando na televisão e tal,
e etc. Então, o planejamento estratégico, infelizmente, no Brasil, foi substi-
tuído pelo planejamento marqueteiro. Não sou contra o marketing, não. Mas
o marketing tendencioso continua levando esse país para uma situação de
dificuldade. De todos os lados, tem o marketing do A, o marketing do B, o
marketing do C, o planejamento de marketing, infelizmente, substituiu o pla-
nejamento estratégico.
Um aspecto que eu gostaria de ressaltar, o dr. Carlos falou, o professor
Albert Fischer, conhecido de todos nós, tem uma frase muito interessante
em que ele diz o seguinte: “Investir na educação é a forma mais eficiente
para se conseguir uma melhor e mais justa distribuição de renda”. Dr. Fis-
cher, Albert Fischer. Distribuição de renda tanto do ponto de vista pessoal,
como do ponto de vista regional. Outro ponto que eu defendo e isso eu venho
defendendo há bastante tempo, Carlos, eu acredito que a educação no nos-
so país, não sei nos outros, mas a educação no nosso país deveria ser um
programa de estado e não de governo. De estado e não de governo. Isso eu
234
defendo, falo, falo, e não me canso de falar, mas o Carlos falou em educação
ontem, ele falou também, o outro falou, então eu estou falando em educação
aqui. Um programa do estado, então sai governo, entra governo, aí muda
tudo, muda até o nome. No meu tempo era primário, ginasial e científico.
Hoje é fundamental, médio e superior. Muda até a nomenclatura.
Para reflexão também. Uma reflexão, a que ele se referiu bastante,
Amartya Sen, e eu sou um leitor assíduo do Amartya Sen, e no seu livro
“Desenvolvimento como Liberdade”, e aí é que eu digo, professora, da in-
terdependência do que a senhora e os senhores falaram aqui e estão fa-
lando lá nas outras salas, o Amartya Sen diz o seguinte: “A privação da
liberdade econômica pode gerar privação da liberdade social, assim como
a privação da liberdade social, ou política, pode da mesma forma gerar
privação da liberdade econômica”. Então, Amartya Sen quis mostrar aí a
interdependência do politico, do econômico e do social. Vocês me descul-
pem estar falando isso, eu sou político aposentado, mas tenho que falar
e mostrar essa interdependência. Então, essa frase do Amartya está lá
no livro dele, “Desenvolvimento Como Liberdade”, um livro sensacional.
Aconselho.
Outro aspecto que eu gostaria de ressaltar, para reflexão, também, é
que não só no Brasil, mas em várias partes emergentes subdesenvolvidas,
até desenvolvidas, a não conexão entre a teoria socioeconômica e ambien-
tal e a realidade educacional, isto não é Amartya Sen, é Gonzaga Mota, e a
realidade educacional e cultural é o motivo do impasse futuro. Não só aqui.
235RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Então, se você pega a não conexão entre a teoria socioeconômica e am-
biental lá na Síria, é o impasse do futuro, no Egito é impasse do futuro, aqui
é o impasse do futuro, e aí vai. E, por fim, eu não vi lá a parte institucional
que se discutiu, a parte político institucional. Houve um painel nesse sen-
tido, não houve? Hoje pela manhã, eu não participei.
Então é outro assunto que eu venho discutindo há muito tempo, em
qualquer palestra, até noutro dia eu fui fazer uma palestra para jogadores
de futebol, o “cabra” discutindo esse negócio de arena, me levaram para
falar sobre a importância das arenas, ou não. Eu vejo, isso tem material
meu publicado nos anais da Câmara, o Ulnan Souza foi meu colega na Câ-
mara, pode ter fácil acesso a esse material; eu acho que chegou a hora de
nós colocarmos também na agenda de debates, não só o Nordeste, mas o
estado democrático de justiça. Eu disse isso uma vez num debate na CNI,
e o jornalista que estava fazendo a palestra zangou-se comigo, eu fiquei
calado, tudo bem, não tem problema.
O que é o estado democrático de justiça, dr. Rafael? Nós vivemos, su-
postamente, nós e outros países, num estado democrático de direito. Por
que num estado democrático de direito? Mas o estado democrático de di-
reito é um estado injusto, ele concede privilégios, ele concede benfeitorias
para uns e não para outros, o estado democrático de direito.
Todo mundo fala, ah! Por que o estado democrático de direito, ah! por
que o estado democrático de direito; antes, minha gente, vocês que estão
aqui vão ficar bem mais tempo do que eu por aqui, isso não é assunto
236
para uma semana, um mês, dois anos, uma década, é assunto para se
colocar numa agenda estratégica antes que apareçam tentativas de dita-
dores, de ditaduras, no estado democrático de direito, que vão aparecer
mais cedo ou mais tarde, vão aparecer ditadores, vão aparecer pseudo-
-democratas, vão aparecer. Se o estado democrático de direito, que é um
estado que concede privilégios, é um estado que concede, permite des-
níveis significativos, então antes que apareçam esses ditadores ou pseu-
do-democratas, vamos colocar cada um para pensar. Rapaz, o Gonzaga,
o estado democrático de justiça; eu não sou advogado, não sou jurista,
mas leio sobre isso. Isso não é ideia minha não, isso é ideia do Cícero há
milhares de anos atrás.
O estado democrático de direito aqui e em qualquer lugar, digo isso em
qualquer auditório de juristas, é um estado tendente a promover a injustiça
social, porque, na medida em que ele promove o privilégio, ele promove a
injustiça social. Então, vamos pensar num estado democrático de justiça,
antes que venham os ditadores ou pseudo-democratas.
Então, eram essas as colocações que eu queria fazer como moderador,
mas dada a interdependência dos painéis, a interdependência dos assun-
tos e dos assuntos tratados, então era isso que eu queria colocar para que
vocês possam refletir. E abro o debate a todos os senhores e senhoras. Eu
peço apenas que se identifique. Eu peço a gentileza para se identificarem e
dirijam a palavra ao expositor.”
237RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Patrícia Brandão1: “Boa tarde. Antes de mais nada quero parabenizá-lo pe-
las palavras realmente, apesar de ser um político aposentado e curioso, o
senhor está no caminho certo, os seus pensamentos.”
“Como estudiosa e filha de um dos seus grandes, como o senhor mesmo
talvez ressalte, eu sou Patrícia Brandão, filha do Brandão, seu aluno, seu
ex-aluno, no caso.
Rafael, você citou a questão do deus hindu e eu entro aqui com uma pes-
soa com o pensamento seguinte: “A vida só pode ser compreendida olhando-
-se para trás, mas só pode ser vivida olhando-se para a frente”, Soren Kier-
kegaard, eu acho que ele é alemão ou dinamarquês. O que ele quer dizer? Eu
sou, por formação, administradora, mas também sou pedagoga, e para for-
mar uma nação, eu escutava, quando pequena, muito aquela palavra que era
o jargão do Brasil: a sua geração é o futuro do Brasil, a nossa geração; era
o jargão da época. Final de ditadura, entrada do Figueiredo, Fernando Collor,
e toda essa geração que eu acompanhei na política. Pequena, mas acompa-
nhava. Então, o que é que eu quero dizer? é importante? É, mas eu concordo
com o professor Gonzaga Mota. Antes de mais nada, eu olhei os erros para
trás, mas como administradora, hoje, eu tenho que plantar as sementes para
o que eu vou ter amanhã. O seu posicionamento não está errado, tentar tirar
da gaveta projetos antigos pode não ser a solução. Talvez seja o que todos
nós estejamos tentando fazer aqui, integrar o conhecimento para que ele
1. Administradora e Pedagoga.
238
avance de maneira, como foi dito noutro painel, por meios de atalhos, porque
a gente tem que correr. Realmente temos que correr.
E a pergunta eu dirijo à minha querida professora geógrafa. Vocês ado-
ram mapas e também trabalham muito com a demografia, mas por que é tão
complicado para nós, que somos de outras áreas, chegarmos a uma lingua-
gem de conseguir esses dados, até mesmo nas fontes como o IBGE, o IPEE,
e outros órgãos? Por que vocês ainda mantêm uma certa, essa questão da
interdisciplinaridade, que muitas vezes se perde quando você não é da área.
Eu não tenho esse problema, mas as gerações mais novas, que têm defa-
sagens na matemática, na geografia, na química, na física, ela têm. Então,
muitas vezes, nós (Novamente a questão do poder), tem que descer para
servirmos como educadores e não mais ficamos como professores apenas.
Aqui, todos nós temos olhos e enxergamos, e os que não enxergam? O que a
gente faz para abrir os olhos deles?”
Rafael Silva: “Obrigado, pelo comentário e talvez eu tenha colocado no meio
de uma palestra uma fala, uma leitura, do Celso Furtado, que é formação
econômica do Brasil. Lá no prelo dele, ele diz exatamente isso. O problema
não é que você, eu também sou administrador por formação, toda a minha
graduação, da graduação ao doutorando agora, é nesta área de administra-
ção. O problema não é você olhar para trás, fazer os seus cálculos, ver o que
errou e olhar para frente, para o acerto, isso é o planejamento estratégico,
da nossa área. O problema é que você olha para os dois lados ao mesmo
239RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
tempo, e aí você perde completamente a noção do ir e vir. Você sai de uma
perspectiva planejada para um simples avanço, porque vai ter que aconte-
cer, o próprio processo do tempo vai te levar a um avanço natural. Então,
esta é a colocação que a metáfora que ele utiliza no livro, e eu acredito que
serve muito para a nossa forma de fazer política; porque, veja só, vai entrar
muito, vai cruzar todas essas searas. Esse senhor com quem eu divido a
mesa agora foi governador quando eu tinha quatro anos de idade. Não estou
lhe chamando de velho não, eu estou lhe dizendo que as gerações vão se
cruzando, elas vão se encontrando e vão amadurecendo, de uma forma ou
de outra, elas vão ter que fazer esse processo.
O grande problema é como nós vamos fazer esse processo. Qual é a
coordenação que nós vamos dar a isso? Como é que nós vamos encontrar
um futuro sem ter olhado para o passado? Como é que faz um olhar para o
passado e para o futuro num mesmo “time”, num mesmo tempo? Então, eu
acho que a nossa sociedade e as nossas instituições precisam realmente ter
esta capacidade de olhar, é cíclico, essa capacidade de fazer esse gerencia-
mento, e não ver o que foi que aconteceu e tentar acertar lá no futuro, nós
não temos mais esta condição, o processo democrático da gente é muito
novo. Nós vivemos um processo democrático ainda infantil, eu posso dizer
assim. Nós precisamos amadurecer muito para avançar muito. As nossas
instituições são pouco republicanas, são pouquíssimo republicanas, sejam
elas quais forem, porque ainda precisamos amadurecer. O aceitar a opinião
contrária nos impõe certo desconforto, a gente precisa aprender essa malí-
240
cia de algumas democracias que avançaram. Mas deixa eu passar aqui para
a colega, senão a gente avança muito.”
Evangelina Oliveira: “Eu estava tão angustiada que estava já pegando o mi-
crofone, porque eu ia perguntar se não tinha uma perguntinha mais fácil.
Como é que a gente faz para ensinar? Eu não sei o que dizer, a gente tenta...
No nosso caso, do IBGE, a gente tem deixado a informação o mais disponível
possível e em toda a oportunidade que oferecem a gente vai e diz: “olha, a
gente tentou “tirar leite de pedra” e armar, foi assim, e os blocos que a gente
usou para montar o raciocínio foram esses”, porque, de fato, nessa linha do
passado e do presente, as estruturas têm uma força muito grande, e se você
consegue ir no sentido delas é mais fácil do que ir contra elas. Fica compli-
cado você querer criar uma cidade onde não tinha nenhuma, é complicado, e
depois, saindo por essa via, o esforço é grande, mesmo em áreas de povoa-
mento rarefeito, onde a rede ainda está por se articular...
Então, se você tem uma rede, você vê onde é mais fácil intervir para ca-
minhar nesse processo. No fundo, é isso, a gente tenta deixar disponível, e
temos quase uma cruzada de dizer “olha, tem essa informação, usa aqui”. O
Maurício quando trouxe aquela série de dados era um pouco assim, dizendo,
“olha, vê como é rico olhar com focos diferentes, de formas diferentes”. Mas
a resposta, eu não tenho, não.”
241RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Maria José Chaves2: “Eu acho que o professor dr. Gonzaga Mota, que eu
conheci quando entrei no Banco do Nordeste aos dezesseis anos, já era ex-
poente do planejamento; então, eu acho que ele deu a fórmula para aquele
sonhado desenvolvimento, que considera as vertentes social, ambiental e
econômica. Eu acho que damos graças a Deus, parece que nós estamos re-
tomando o planejamento estratégico, o planejamento profundo que analisa,
que reflete, que pensa, mas que integra as coisas e faz, e faz acontecer. A
gente está vendo nesse seminário a soma, o setor privado, o público, estou
vendo com tristeza a ausência das instituições regionais, elas não estão
aqui fortemente representadas nas mesas, nas palestras, então os técni-
cos, como eu, mas eu acho iniciativa fantástica e acredito que a fórmula, o
jeito de fazer é via planejamento estratégico. E, então, esta aí o professor
doutor, ex-governador, eu posso também dizer ex-colega, obrigada dr. Gon-
zaga Mota.”
Nan Souza: “Ouviu, Carlos, tem uma palavra nova no mercado que é uma tal
de “mobilidade urbana”, que está angustiando todo cidadão brasileiro que
trabalha ou não trabalha.
Mas é uma alegria estar revendo meu querido e estimado amigo Gonzaga
Mota e dizer que, neste laboratório de reflexões que nós estamos passando
aqui, nós estamos aprendendo também uma coisa que eu espero convidá-
2. Funcionária do Banco do Nordeste.
242
-los a fazer. Primeiro, se falou muito de descontinuidade de governo; na ver-
dade, o governo é descontínuo por natureza. O estado é que está entrando
na onda dos governos e dos governantes, está perdendo a sua unidade e está
perdendo, sobretudo, a sua lógica de atender as demandas sociais. Esse é
um ponto. E por que há descontinuidade? Porque não há o exercício da po-
lítica, não se faz política no Brasil, se fazem eleições de dois em dois anos,
a um custo financeiro alto, e um custo moral muito mais alto ainda. Então,
essa equação não fecha à medida que você tem demandas que vieram de
tantos anos e não se faz porque não é prioridade daquela nova gestão, que
tem uma nova ou velha cabeça, e aí não bate.
E o que é que eu estou recomendando ultimamente? Tem um, que se tor-
nou amigo também, que é Mário Sergio Portela. É um filósofo que aparece na
televisão, barbudo, fala feito doido; “Política Para Não Ser Idiota”, é um dos
últimos livros dele, e ele está exatamente dizendo: ou nós fazemos política, ou
alguém faz a política invertida em nosso nome. E nós criamos procuradores,
representantes, que não nos consultam para fazer o exercício de uma pro-
curação, de uma delegação, as realizações e os planejamentos estratégicos,
por aí que se vai. Talvez, o Gonzaga, comigo está acontecendo isso. Eu nunca
havia feito, depois de ser vereador, deputado estadual, deputado federal duas
vezes, quase trinta anos nessa brincadeira, esse negócio da precocidade nos
incomoda, não é Gonzaga? Com essa história toda, mas eu nunca havia feito
tanta política como eu estou fazendo agora, nesses dez anos que eu estou
afastado da vila partidária. Estou na cultura, estou na Associação Comercial,
243RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
estou na aliança francesa, eu participo de vários coletivos diariamente, estou
na minha empresa, que é um hotel, que me dá a alegria de ter gente lá toda
hora para me alimentar o outro lado, então é isso que nós devemos fazer.
Fazer o exercício da política permanente, não se ter vergonha de dizer “não,
eu estou fazendo política porque eu estou fazendo”. No que nós estamos
fazendo; já se falou de educação, se falou de ciência e tecnologia, se falou de
tudo que a política, só ela, resolve. Como não se faz política, não se resolve o
problema da educação, há quinhentos anos não se resolve.
Nós estamos ainda, no Maranhão por exemplo, não importa se é primeiro
ou se é segundo, mas somos um estado, com toda aquela virtuosidade da
natureza, a segunda pior educação. Como coisa que se tenha educação ruim
ou boa. A educação, ou ela é boa ou então não educa. Como diz o Gonzaga,
o direito só é direito se é justo, se não for justo não é direito. Como a justiça
aqui retarda ou atrasa, não é justiça porque ela chega fora do tempo. Então,
essas coisas, essas contradições, a política dá jeito. Agora, é política en-
quanto ciência, enquanto improvisação aí nós estamos realmente com um
futuro inseguro. Mas, maravilha este debate, a gente já vai levar, o Gonzaga
já vai estar um dia lá em São Luís para replicar lá, e a gente vai construindo
essa cadeia.”
Luiz Gonzaga de Fonseca Mota: “Por isso que eu citei aqui o Amartya Sen.
Isso diria aqui nesse livro do Amartya Sen; quer dizer, quando ele considera
a interdependência da política com a economia, com o social, com tudo.
244
Carlos Laranjeira3: “Boa tarde. Meu nome é Carlos Laranjeira, também sou
administrador, eu queria só parabenizar a fala do governador e a todos, que
todos reconhecemos, sabemos o que fazer. O que eu acho é o seguinte, pre-
cisamos colocar em prática, e logo, e essa busca que é a integração, todos
unidos buscar essa força. E o governador, ressaltando o que o governador
disse, é preciso a gente buscar conquistar o poder mais para servir à nação,
ao povo, ao cidadão, principalmente aos nordestinos, que todos falam que
sofrem, que existem as dificuldades, mas a ação está longe. Mas nós conhe-
cemos um caminho. E outra, é o direito democrático que tanto se fala, mas,
acima de tudo, está a palavra do governador que é a justiça, e buscar o direi-
to de cada cidadão também, e fazer a justiça acontecer, que todos tenham
direito a essa justiça que a gente não vê no dia a dia.
Eu quero agradecer, foi muito bom, até os esforços porque foram duas
vezes, tivemos que voltar a ouvi-los. Muito obrigado.”
Sra. Hilda Gouveia de Oliveira4 “Eu não pertenço a essas agremiações
técnicas, como a grande parte, mas eu acho que o grande problema. Um
momento, vou me apresentar, eu sou Hilda Gouveia de Oliveira, escritora,
professora de letras da faculdade do Rio de Janeiro, quer dizer, Universidade
Federal de Letras do Rio de Janeiro, UFRJ.
3. Administrador.
4. Escritora e professora de Letras da UFRJ.
245RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Como eles estavam falando aqui, eu acho que o problema maior está na
educação. Porque começa com a educação doméstica, depois a educação...
Leonardo Bayma: Por fim, nós acreditamos e temos que lutar para que eles
estejam aqui no nosso próximo fórum, porque o Integra Brasil não termina
aqui, nasce nesse seminário. Ele nasce desse Seminário Integra Brasil, e vai
ser um fórum permanente. Daqui nós vamos ter um plano de ação, um plano
de ação política, porque sem a política nós não vamos conseguir atingir os
nossos objetivos. E quando nós não temos os políticos aqui, nós temos que
nos organizar enquanto sociedade para impor uma pauta de discussão sobre
o desenvolvimento do Nordeste, e é isso que nós queremos e é isso que nós
vamos conseguir.
E, assim, quero fechar minha fala parabenizando aqui todos da mesa, é
um prazer estar aqui com o dr. Gonzaga Mota, que foi governador deste es-
tado, que foi o primeiro movimento pró-Tancredo no Brasil e que foi quem
abriu a possibilidade de um movimento nascido no Centro Industrial do Cea-
rá, que foi reorganizado em 1977, e fez um fórum como esse em 1981 sobre o
estado do Ceará, sobre o desenvolvimento do estado; ter podido ter a opor-
tunidade de pôr jovens para dar um novo rumo, para fazer um novo projeto
que naquele momento era necessário para esse estado.
Então, hoje nós estamos num novo momento, talvez um momento de
efervescência da sociedade parecido com o que a gente vivia naquela rea-
bertura. Para o novo momento a gente precisa de novas lideranças, seja de
246
esquerda, seja de centro, seja entre os trabalhadores, entre os estudantes,
entre os empresários, para se fazer um novo pacto social para esse país, um
novo pacto federativo para esse país, para que governadores e prefeitos não
tenham que ir à Brasília, praticamente semanalmente, para estender o pires
e pedir a esmola do governo federal.
Então, nossa missão, ao sair desse seminário, é disseminar as ideias que
foram ouvidas aqui, é continuar a discussão seja na instituição onde você
trabalha, na universidade onde você estuda, no sindicato que você faz parte.
E criar um fórum lá também, porque outros fóruns desse virão pela frente.
Agradeço aos que participaram aqui desse painel, que ontem foi atra-
palhado pelo apagão do Nordeste; isso aí até tem um efeito simbólico se a
gente pensar bem. E dizer que nós temos que animar, nós temos que animar
os que estão próximos de nós, mostrar que existe um momento antes de
junho e um depois de junho nesse país, e que aqueles que têm maturidade
tem o dever de trazer aqueles que estão alienados nesse momento. Muito
obrigado.”
Painel 5: Educação, Ciência, Tecnologia & Inovação e Cultura para o Desenvolvimento do Nordeste
Moderador
Helena Maria LastresPós-doctor em Inovação e Sistemas Produtivos Locais pela Université Pierre-Mendès-France e assessora do presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES
Expositores
Aristides Monteiro NetoDoutor em Economia Aplicada pela Unicamp e Técnico em Planejamento e Pesquisa da Fundação Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA
Hélio BarrosConsultor e ex-secretário de Ciência e Tecnologia do Estado do Ceará
Claudia LeitãoDoutora em Sociologia pela Université de Paris V e professora do Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas e Sociedade da Universidade Estadual do Ceará - UECE
Relator
Carlos MansoDoutor em Economia pela Universidade Federal do Ceará - UFC e coordenador do Núcleo de Inteligência Industrial do Instituto de Desenvolvimento Industrial da Federação das Indústrias do Estado do Ceará - INDI/FIEC
249RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
PAINEL 5
EDUCAÇÃO, CIÊNCIA, TECNOLOGIA & INOVAÇÃO E CULTURA PARA O DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE
QUESTÕES A SEREM RESPONDIDAS PELOS EXPOSITORES
Educação
Como o Nordeste poderá superar, de forma mais acelerada, o enorme
atraso educacional?
Como em curto prazo resolver o impasse da qualificação da mão de obra
para os grandes empreendimentos que se implantarão nos próximos anos no
Nordeste?
Que exemplos bem-sucedidos em outros lugares quanto à resolução, de
forma mais acelerada, da questão educacional poderão ser aplicados no
Nordeste?
250
Ciência, tecnologia e Inovação
Como o Nordeste deverá preparar-se para a nova era do conhecimento e
do desenvolvimento acelerado da tecnologia e da inovação?
Por que se mantém essa diferença abissal entre o Nordeste e o Sul e
Sudeste na criação de universidades e parques tecnológicos, na distribui-
ção dos recursos dos Fundos Setoriais e nas aplicações da FINEP - Agência
Brasileira de Inovação?
Cultura
Como conceber a Cultura como fundamento para o desenvolvimento re-
gional?
O que pode a economia criativa fazer pelo desenvolvimento do Nordeste?
Questão de ordem geral
O presidente do BNDES Luciano Coutinho, no workshop do Integra Brasil
realizado na sede daquele Banco, no Rio de Janeiro, afirmou: “O Nordeste
deveria ser líder na inovação e na sustentabilidade”. Comentar.
Cerimonialista: “Abrindo a programação desta manhã, assistiremos em
instantes ao painel “Educação, Ciência, Tecnologia, Inovação e Cultura para
o Desenvolvimento da Nordeste”.
Para exercer a função de moderadora, convido à mesa a dra. Helena Ma-
ria Lastres, que tem Pós-Doctor em Inovação e Sistemas Produtivos Locais
251RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
pela Universidade Pierre Mendès-França, e é Assessora do presidente do
Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - BNDES.
Convido à mesa os senhores expositores:
Doutor em Economia Aplicada pela UNICAMP, Aristides Monteiro Neto,
Técnico em Planejamento e Pesquisa da Fundação Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada - IPEA; professor da Universidade Federal do Ceará,
Hélio Barros, Consultor e ex-secretário da Ciência, Tecnologia e Educação
Superior do Estado do Ceará; Para exercer a função de relatoria, convido
o dr. em Economia, Carlos Manso, Coordenador do Núcleo de Inteligência
Industrial do Instituto de Desenvolvimento Industrial da Federação das In-
dústrias do Estado do Ceará.
Senhoras e senhores queiram sentar-se. Estamos aguardando a chegada da
dra. Cláudia Leitão, que também é uma das nossas expositoras convidadas. Em
aqui chegando, ela deverá se dirigir a mesa para a continuidade dos trabalhos.
Neste momento, para a saudação especial a todos que fazem parte desta
plateia, para apresentar os nossos expositores e, dessa forma, dar início às
atividades técnicas pertinentes a este painel, convido a usar da palavra a
moderadora dos trabalhos, a dra. Helena Maria Lastres.”
Helena Maria Lastres: “Bom dia a todos. Eu agradeço a coordenação desse
evento pelo convite e parabenizo pelo mesmo.
Para o BNDES tem sido uma prioridade recorrente essa necessidade e
esse compromisso com o desenvolvimento equilibrado, coeso, do país. O pre-
252
sidente Luciano Coutinho, em particular, desde que assumiu a presidência do
banco vem envidando esforços muito grandes nessa direção, e os senhores
que tiveram oportunidade de participar da abertura e que vão ter oportunida-
de de estar hoje aqui no final dessa reunião tão importante, já devem ter visto
e virão ainda mais o nosso chefe do departamento, aqui do Nordeste, o Paulo
Guimarães mostrar os dados de como o BNDES alterou significativamente
seu desembolso, sua atuação em prol desse equilíbrio, dessa coesão nacional.
Dito isso, também gostaria de mencionar que, no próprio BNDES, estamos fa-
zendo um esforço de olhar cada região, no caso, o Nordeste também, e tentar
discutir como podemos avançar, como podemos descortinar a oportunidade
de refinar nossas políticas para chegar melhor, mais e melhor, nessa região.
Fizemos, inclusive, uma reunião, uma das rodadas dessa reunião, do Progra-
ma Integra Brasil, no Rio de Janeiro, no dia 19 de agosto agora passado. Hos-
pedamos o Integra Brasil com o workshop “Nordeste Visto de Fora”, discutindo
oportunidades para o desenvolvimento futuro. Alguns dos senhores tiveram
oportunidade e nos deram o prazer de estar conosco nessa reflexão. Portan-
to, é reafirmar o compromisso e a importância que o BNDES, a partir da sua
diretoria (eu mencionei o presidente Luciano Coutinho, mas toda a diretoria),
inclusive, naquela oportunidade, no Rio de Janeiro, contamos com vários cole-
gas, superintendente; chefe de departamento e outros executivos, e também
com o nosso vice-presidente que foi quem abriu a reunião.
Dito isso, eu tenho que dizer também que é com muita satisfação que eu
sou moderadora dessa mesa, até porque toda a minha bagagem é como eco-
253RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
nomista da inovação, e até os colegas do Banco do Nordeste que encontra-
mos aqui fora conversavam sobre os APL’s, e dizer que o próprio conceito de
“arranjo e sistema produtivo local” partiu dessa ideia que a inovação se dá,
maiormente dessas relações entre ator e diferentes funções dentro de um
arranjo e sistema produtivo, uma estrutura, chamemos como entendamos
melhor. Até eu queria referir que o secretário Sergio Castro, que está aqui
apresentando na mesa paralela à nossa, infelizmente, ele também é um espe-
cialista nesse tema e, numa das reuniões, ele dizia sobre aquela confusão: é
cadeia produtiva, é complexo, é arranjo, é cluster, é sistema, ele disse: “olha,
chame de onça, mas faça a política adequada”. E qual é a política adequada?
É entender que ninguém faz nada sozinho, seja um copo d’agua, um copo,
um desses microcomputadores de bolso, celulares com milhões de funções
sofisticadas que temos. Existe uma série de atores na produção dos insumos
de todos os equipamentos, de todos os materiais. Como é que aquilo é monta-
do? Que bens e serviços são mobilizados? Que capacitações são mobilizadas?
Como é que aquilo é comercializado. Tenta olhar, entender esse sistema, e não
faça política para um só porque você vai desequilibrar esse sistema. Faça po-
lítica para os elementos. Quem é que está faltando, quem é que pode agregar
novos conhecimentos, novas capacitações a esse sistema? E aí (aproveitando
que a gente já está vendo a secretária Cláudia chegando); e isso serve para
qualquer atividade produtiva, inclusive a cultura. A própria Rede de Pesqui-
sa em Sistemas e Arranjos Produtivos e Inovativos Locais - REDESIST, tem
uma série de estudos sobre arranjos produtivos de base cultural, que tenta
254
descortinar, e isso é muito importante, quebrar a invisibilidade para que entre
na agenda de política todo tipo de atividade, na esteira de um enfoque tão im-
portante não só para os arranjos produtivos do desenvolvimento econômico,
mas para os arranjos produtivos também mobilizadores do desenvolvimento
social, tendo como eixo a saúde, a educação e vários outros.
Dito isso, eu acho que a gente pode continuar; e essa satisfação enorme
minha, então, de estar nessa mesa encontrando colegas de vários tempos.
E eu tenho também que introduzir o painel “Educação, Ciência, Tecnologia
e Inovação, e Cultura para o Desenvolvimento do Nordeste”, colocando as
questões que os organizadores me pediram que apresentasse.
O item 1, Educação, as questões que foram arroladas são:
• Como o Nordeste poderá superar, de forma mais acelerada, o enorme
atraso educacional?;
• Como, em curto prazo, resolver o impasse da qualificação da mão de
obra para os grandes empreendimentos que se implantarão nos próxi-
mos anos na região?.
Que exemplos bem sucedidos em outros lugares, quanto à resolução, de
forma mais acelerada da questão educacional, poderão mostrar caminhos
possíveis para o Nordeste?
Ciência, Tecnologia e Inovação:
• Como o Nordeste deverá preparar-se para a nova era do conhecimento
e do desenvolvimento acelerado da tecnologia e da inovação?
255RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Por que se mantém essa diferença abissal entre o Nordeste, o Sul e o
Sudeste, na criação de universidades, parques tecnológicos, na distribuição
dos recursos dos fundos setoriais, nas aplicações da FINEP, que é a nossa
agência brasileira de inovação?
No quesito cultura, as questões são:
• Como conceber a cultura como fundamento para o desenvolvimento
regional?
O que pode a economia criativa fazer pelo desenvolvimento do Nordeste.
Questões de ordem geral, nos colocaram uma em função de um destaque
dado pelo presidente do BNDES, professor Luciano Coutinho, no workshop
que foi realizado no Rio de Janeiro, na nossa sede, quando ele afirmou: “o
Nordeste deveria ser líder na inovação e na sustentabilidade.
A nossa perspectiva é olhar para o futuro, descortinar oportunidades de
como avançar”. E aí, portanto, a questão que se coloca a todos nós a res-
ponder.
Para começar, então, a endereçar esses aspectos e outros, eu convidaria
o dr. Aristides Monteiro, que já foi apresentado, dr. em Economia Aplicada
pela UNICAMP e, atualmente, exerce a função de técnico em Planejamento
e Pesquisa do IPEA. Mas eu queria fazer uma ponte aqui com os dois cole-
gas que eu tenho na mesa, ambos foram secretários de ciência e tecnologia
nos seus estados de origem, Pernambuco e Ceará, mas antes eu acho que,
256
não sei se o nosso cerimonial vai convidar a secretária. Eu mesma posso
convidar a secretária. Por favor, secretária Cláudia Leitão, para compor a
mesa. Obrigada.
Aproveito, enquanto a secretária se chega a nós, para anunciar a chegada
da nossa professora eminente, Tânia Bacelar.”
Aristides Monteiro: “Bom dia a todos, a todas. Antes de mais nada, eu gos-
taria de agradecer à coordenação do Integra Brasil pelo convite, na verdade
um segundo convite, porque na semana passada estivemos na discussão, no
Rio de Janeiro; agradecer ao Centro das Indústrias do Ceará, que está ca-
pitaneando essa discussão no Nordeste, mas no Brasil, pela iniciativa mais
do que na hora. É sempre importante repensar uma questão tão cara ao de-
senvolvimento brasileiro, que é a questão regional, e para o qual o cenário
atual, em certo sentido, mudou muito do que a gente tinha no passado, e eu
pretendo falar um pouco sobre isso.
Quero agradecer a todos os meus colegas da mesa, Helena Lastres do
BNDES, e a todos os demais.
O tema que nos foi suscitado, muito amplo, educação, ciência, tecnolo-
gia e cultura, eu quero me centrar obviamente na ciência e tecnologia, onde
eu trabalhei mais proximamente no governo e onde poderei fazer algumas
reflexões e que quero trazer para vocês. Antes disso, entretanto, eu quero
resgatar de algum modo a discussão que eu fiz semana passada no BNDES,
que tinha um conteúdo um pouco diferente, que como lá a discussão era o
257RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Nordeste visto de fora, quer dizer, por atores, vamos chamar assim, de fora,
e eu, sendo nordestino, mas estando em Brasília agora fui chamado para fa-
lar. Naquele momento, eu fazia algumas avaliações do crescimento recente
no Nordeste: quais eram as suas principais tônicas, a dinâmica atual, um
pouco do retrato, as dificuldades que nós ainda nos encontramos quando
nos deparamos com os cidadãos e com a performance econômica e cultura,
e de CTI, de todos os indicadores, nós sempre estamos um pouco mais atrás.
No entanto, o filme, a projeção do filme foi boa, ela tem sido boa. Se ela
terá continuidade, isso precisamos estar alertas para esta situação. Isto vai
depender de políticas, do empenho das políticas de governo. Eu vou querer
tratar um pouco disso até chegar propriamente em algumas discussões de
ciência e tecnologia.
Então, vocês vêem aí o crescimento econômico do Nordeste nesse gran-
de período, desde 1960, que cobre isso que é a experiência regional clássica,
a criação da SUDENE, e várias outras. Aí eu teria um quadro bem geral de
como cresceram, em taxas anualizadas, nesse longo período de cinquenta
anos, o Nordeste e o Brasil, que, a despeito de todo esforço, nós cresce-
mos a taxas muito parecidas. Obviamente que, ao longo e dentro de alguns
subperíodos específicos desse grande período, o Nordeste cresceu mais,
às vezes cresceu menos. Mas, então, a grande mensagem aqui é que nós
conseguimos acompanhar o crescimento da economia brasileira. Isso traz
algumas reflexões. Então, a política de desenvolvimento regional que nós
construímos, desde então, conseguiu articular a economia nordestina e bra-
258
sileira de tal modo que elas crescem com a mesma intensidade. Então, o
Nordeste deixou de ser aquela economia que ficava atrás, ela estava atrás
na sua dinâmica e conseguiu engatar nesse trem nessas últimas décadas.
Mas não foi nada espetacular, não foi tão à frente assim, de maneira tal que
nós pudéssemos dar saltos mais adiante, que nossa posição relativa pudes-
se mudar.
De todo modo, então quais as implicações desse crescimento e desse
modelo de integração ao mercado nacional? Fundamentalmente, foi isso
que nós fizemos. A região cresce, vêm os estímulos do resto do país, o que
é bom, algumas outras características, essa grande indústria que nós con-
seguimos arquitetar nesse período é uma indústria eminentemente regional.
E, então, os atores da indústria, remanescentes, eles ocupam determinadas
posições, determinados nichos, se articulam com os outros, então isso, ob-
viamente, interfere na dinâmica e no papel que eles terão e que eles têm tido
na economia regional.
A relevância, obviamente, das fontes públicas para o financiamento do
investimento, então uma parafernália de instrumentos que, ao longo do pe-
ríodo, foram mais ou menos acionados, e alguns, obviamente, foram criados
mais recentemente, não foram criados ainda nos anos 60.
A relevância do gasto público direto no investimento. A despeito das re-
flexões que nós temos feito dos mecanismos da política regional explícita,
os mecanismos de incentivo, mais recentemente os fundos constitucionais,
o que contou mesmo para o desenvolvimento regional foram os grandes in-
259RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
vestimentos do governo federal ainda nos anos 1960, mais nos anos 1970 com
os planos nacionais de desenvolvimento realizaram na região. Eles de fato
criaram uma estrutura, modificaram a cara da região, o que deu impulso,
obviamente, para àquela indústria que veio com os incentivos. Então, essa
relevância do gasto direto é muito importante de ser citada, porque durante
um certo período esse gasto direto minguou, e míngua justamente, claro, na
orientação da crise fiscal do estado brasileiro e quando a política regional
apresenta resultados mais pobres, a política regional clássica dos instru-
mentos.
No quadro dessa integração nacional, uma outra característica é o débil
comércio externo da região. A região se articulou com o Brasil e sua capaci-
dade de competitividade externa ficou relativamente esquecida, comprome-
tida. Então, em resumo, mais do que qualquer outra região, o Nordeste está
atado ao crescimento do resto do Brasil e isso permanece como um dado
que nós precisamos tomar.
Para crescer, como é que nós pensamos nos instrumentos, nas formas de
crescimento? Se pudéssemos listar alguns mais recorrentes, os mais clás-
sicos, que as teorias do desenvolvimento ou do crescimento colocam, nós
precisaríamos de capital humano, investimento em capital humano, capital
físico, instituições e tecnologia. Na maior parte dos indicadores relativos a
qualquer um desses ingredientes, o Nordeste está aquém das médias na-
cionais. A foto, a foto, embora o filme seja positivo. E como crescer para
se desenvolver? Nós precisamos de uma combinação especial entre esses
260
ingredientes, que têm a ver com a história, com os componentes históricos,
com as oportunidades que se abrem e com a ênfase que se dá a cada mo-
mento do tempo.
O que nós fizemos no Brasil e no Nordeste? Eu quero só trazer rapida-
mente um esforço institucional dos anos 1950 e 1960; várias coisas aconte-
ceram antes e várias coisas acontecem depois também. Mas eu quis pinçar
esse momento porque é um momento em que a política regional no Brasil,
na forma mais concebida, ela é criada e é levada adiante, e esse momento,
um momento rico da história nacional, muitas das instituições que nós con-
cebemos foram criadas, então eu listei algumas: CNpQ, CAPES, IMPARH,
BNDES, PETROBRÁS, INPE, o próprio IPEA, o Banco Central, a FINEP, a
EMBRAPA um pouco depois, e essas são instituições mais de caráter nacio-
nal. As instituições regionais, por exemplo, a FUNDAJ, o BNB, a SUDENE,
a SUDAN, o BASA, a SUDECO. Então, se nós olharmos para este aparato
institucional relevante, e aí eu quero dizer o seguinte, neste momento histó-
rico do Brasil, dos anos 50 e 60, foi criado este aparato que sustenta e que
deu forma ao desenvolvimento brasileiro moderno, contemporâneo. São es-
sas instituições, inclusive, que estão aqui nessa mesa, que estão no debate.
Depois disso, é claro que essas instituições mudaram no tempo, cresceram,
expandiram objetivos, elas se modificaram. Do mesmo modo, as instituições
regionais.
Neste caso, das instituições regionais, aí um reflexão precisa se colocar,
é que essas sofreram mais. Quer dizer, a questão regional nos anos recen-
261RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
tes perde autoridade, ela perde importância e relevância no pacto político
nacional, e muitas delas ficaram bem avariadas. Nós reconhecemos isso,
em parte, por isso que nós estamos aqui nessa grande discussão. Então, as
instituições nacionais sofreram, mas elas estão aí, as regionais estão mais
frágeis.
Um elemento, que nós podemos dizer que foi comum a essas duas por-
ções, nacional e regional, e adiantando o que eu quero falar, é a ampliação,
o fortalecimento do ambiente universitário, da formação de quadros, que ele
é nacional, mas é regional. Eu não coloquei aí, mas ele afeta os dois quadros
e isso é uma riqueza importante que a sociedade brasileira criou. Então, po-
lítica, ainda tentando pensar, o que nós fizemos no Brasil e no Nordeste?
Qual foi o modelo? Então, essa política regional tinha alguns motivos mais
explícitos, que estava embasado numa discussão que na época era muito
moderna e era viável, e possível, ela via o desenvolvimento como crescimen-
to econômico, isso deveria ser realizado pela industrialização, e daí o apoio
prioritário ao sistema empresarial, a modernização produtiva. Basicamente,
foi isso que nós fizemos de forma clássica no Brasil. E o mundo fazia isso
também. As discussões eram poucas nesse sentido. Então, esse foi o nosso
modelo.
Os resultados, alguns dos resultados, nós tivemos crescimento acelera-
do, eu mostrei um pouco os dados, tivemos, entretanto, industrialização es-
pacialmente concentrada, no caso da política regional, principalmente nas
três grandes regiões metropolitanas do Nordeste, concentração pessoal da
262
renda, que foi um aspecto regional, mas foi também nacional, do processo
de industrialização mais geral do Brasil. No Nordeste, agudizado já pela fra-
tura social, que era mais intensa, e desregionalização do capital produtivo; a
indústria era incentivada.
Alguns resultados sociais. Pobreza metropolitana crescente, pobreza
rural inatacada, elevada desigualdade da renda e da propriedade, relativa-
mente baixos investimentos em recursos humanos e educação nunca foi
prioridade.
Muito bem. Esses elementos conformaram, então, um modelo da política
regional daquele período. Chegam os anos 1980, então vem um desgaste. Um
desgaste do estado brasileiro, crise fiscal do estado com paulatina perda
da substância da política regional, tanto das instituições como os recursos,
que vão minguando; desperdício de recursos que era muito perceptível já
naquele momento, e a crise de legitimação política. Nos anos 1990, um pou-
co em seguida, nós temos um quadro, aí sim, de abertura para o exterior,
globalização. Abertura que é comercial, que é produtiva e financeira, que
vem para dar uma nova dinâmica à economia nacional, mas que a economia
regional, que era integrada, que tinha seus elementos todos atados à grande
figuração nacional, ela se ressente. Então, era o momento. Desde então, a
pergunta que se coloca é essa: para que serve, então, a política regional e a
quem se destina?
Teríamos um retorno, depois desse ocaso, dos anos 1980 e 1990, do des-
gaste. Eu diria que, particularmente, a crise de legitimação política dessa
263RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
política regional. Nós temos, ainda, um infraestrutura deficiente que impede
maior captação de recursos pelo setor privado; eu estou pensando agora
ainda na retomada, usando um pouco dos estudos e das afirmações da pro-
fessora Tânia, Nordeste e Nordestes, quer dizer, o Nordeste mudou, ele não
é mais o único, a situação, entretanto, é melhor na faixa litorânea e pior no
Agreste, Sertão; nós continuamos ainda com o crédito público, ao investi-
mento, se destinando ao barateamento do capital privado, e menos à cons-
trução de potenciais competitivos dinâmicos.
Em suma, o modelo, esse modelo ainda vigente, é um modelo de velha
geração e que vem se exaurindo pouco a pouco. Na última década, para nos
enganar, outros elementos da política federal, em particular a social, deram
um sobrefôlego enorme, criaram um efeito sistêmico ainda muito importan-
te. O que poderia nos dar alguma preguiça para que não fizéssemos mudan-
ças, felizmente estamos num debate para fazer mudanças. Então, é isso.
Então, eu querendo começar a pensar em mudanças, no meio dessa cri-
se fiscal do estado brasileiro. Nós saímos dela, que era uma crise fiscal,
mas era uma crise dos pactos da democracia, do pacto político, e nós saí-
mos dela com uma nova constituição. E, dessa nova constituição, resulta
um federalismo muito já fortemente assentado, desde então, no bem estar
social. E é isso que nós estamos. Então, desde então, a percepção de que a
política regional, no sentido mais clássico, deu baixa contribuição à redução
da pobreza no Nordeste. Era o momento da feitura desse novo pacto. Tenta-
tivas de alterar um modelo concentrador, lastreado na redução do custo do
264
investimento ao capital privado. Então, era preciso mudar isto, nós temos
realizado isso.
Então, eu quero apontar novamente: nós temos, desde então, na saída da
crise do estado brasileiro, na construção de um modelo de bem estar social,
uma consciência mais geral, uma consciência política da deslegitimação da
política regional. Isso vai precisar enfrentar. Agora, novamente, isso é forte,
isso é muito importante, quem vive em Brasília, quem sabe a desimportân-
cia que as estruturas do estado brasileiro, e, em certo sentido, o enfado com
que se trata a questão regional, porque ela é vista como um fardo mesmo
muito grande, e uma política que se viciou e que é preciso retomar, e não
encontra ainda atores para fazer a mudança.
Então, o que esse federalismo realizou? Tem um gasto social federal im-
portante, que aí vai ter rebatimentos: eu não vou trazer rebatimentos no
Nordeste. Mas esse pacto tem realizado mudanças importantes no Brasil,
que tem impactos regionais fortes, mas não estão endereçados à política
regional clássica, tal como nós concebemos. Então, aí são números mais
gerais, do que eu chamo desse gasto social, e como ele tem se expandido
ao longo do tempo. Esse gasto social corresponde ao gasto de vários se-
tores que estão colocados aí, os ministérios, as áreas de saúde, educação,
trabalho e emprego, desenvolvimento social e combate à fome, previdência
social, desenvolvimento agrário, cultura, cidades, o arquivo nacional, o fundo
nacional da criança e do adolescente, a secretaria da questão racial, o SEPI,
a Secretaria das Políticas das Mulheres e a de direitos humanos. Então, é um
265RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
conceito que o IPEA tem usado para juntar várias áreas federais, relaciona-
das com o tema do social, e compor, então, o que se chama do gasto social
federal. Então, esse tem crescido firmemente, tem sido crescente.
Do outro lado, também o investimento, ou crédito ao investimento, tem se
expandido. Veja dados do somatório de uma década, 2000 a 2012, para atua-
ção do BNDES, alguns recursos do fundo constitucional. Entretanto ainda
não tão relevantes naquilo que se espera para mudar. E alguns dados, no
sentido mais clássico, do investimento público, que, obviamente, aí também
tem investimentos do BNDES; quer dizer, esses dados incluem a lâmina an-
terior. Aí tem o governo central, tem os governos estaduais, e a gente vê
claramente a trajetória importante. Tem um esforço de ampliação do inves-
timento público no Brasil, ao longo da década, que é realizado mais forte-
mente pelas empresas estatais, tal como era no passado também. Porque
há questões de legislação, etc., é mais fácil que as empresas gastem. Mas,
no passado, mesmo antes da crise dos 1980, foram as grandes empresas,
ELETROBRÁS, PETROBRÁS, todos os sistemas BRÁS, TELEBRÁS, que
levaram adiante os grandes pacotes de investimento no território. Eles co-
meçam a ser acionados de novo nessa nova década. De todo modo, veja os
investimentos do governo central e, mesmo dos governos estaduais, como
eles são crescentes. Mas eles têm dificuldades de crescer como proporção
do PIB. Veja os governos estaduais, por exemplo, que são um item em geral
relegado, mas que tem crescido bastante. Eles são importantes para a mon-
tagem e a colagem dos investimentos que vêm, da direção do que o governo
266
central dá a várias políticas. Então, nós temos uma situação, que se não é
radicalmente diferente, mas ela é positiva. Nós temos o investimento públi-
co em geral, temos um gasto social, dizendo que esse modelo recente tem
uma outra qualidade.
Os meios. No caso do Nordeste, recursos públicos, ainda o aparato de
estado, são relevantes. O que eu quero dizer é que, nesse novo pacto, con-
solidada a política social, está exigindo então uma trajetória sustentada de
expansão da renda. Esse modelo que está sendo definido pelo pacto exigirá
uma reorientação do que a gente pretende como política de desenvolvimen-
to regional. Ele já está avançando fortemente, mostra resultados, retornos
excepcionais. No caso do Nordeste, redução da pobreza, redução da desi-
gualdade, coisa que a política regional clássica ou aquela apenas de indução
do investimento privado não foi capaz de fazer. Então, esse novo pacto traz
esse novo perfil do crescimento, que vai exigir, então, que a região deva re-
pensar uma nova política, seus instrumentos, também a partir desse novo
enquadramento.
A percepção por parte da população é de que os avanços (isso no momento
recente), alcançados devem ser consolidados e expandidos, o que demanda,
por sua vez, uma reavaliação das potencialidades regionais locais. Então, eu
acho que há de novo entrada para o regional nesse pacto social. Mas ele terá
que ser de outro modo, ele terá que partir, colocar no centro da região o capi-
tal humano, a infraestrutura, a rede de cidades e a revisão das estratégias de
concessão de crédito subsidiado ao empreendimento privado.
267RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Eu quero então entrar no sistema nacional de C,TeI, então depois desse
longo preâmbulo, esse quadro mais geral, para dizer um pouco o que está
acontecendo com esse sistema nacional de C,TeI, como é que nós estamos
no Nordeste, nesse quadro; recurso orçamentário, recursos humanos, al-
guns desafios.
Então, vejam, o dispêndio nacional da ciência e tecnologia se expande
consideravelmente, como proporção do PIB; a proporção do setor público
vem dirigindo, orientando o gasto privado, ele amarra, na verdade, o gasto
privado, isso que chama de proporção do gasto empresarial, na verdade, o
gasto empresarial privado, eminentemente privado, é menor que isso por-
que nesse item empresarial tem empresas públicas, então o comando do
gasto em ciência e tecnologia no Brasil é feito pelo setor público, é induzido
pelo setor público. É um grande debate, uma discussão, porque que o setor
privado não encontra motivos para o empreendimento e para a inovação. Por
que o empresário brasileiro não é “schumpeteriano”, não é Helena?
Mais adiante, então, recursos alocados na pós-graduação. Eu trouxe al-
guns elementos. O quadro regional melhora ao longo da década, no bojo
desse grande novo federalismo social, dessa nova dimensão; ele melhora,
não muito, mas melhora. Nós precisamos alterar mais essa participação.
Vejo que as três grandes regiões, que são objeto de política regional mais
explícita, ainda participam, em 2011, com 36%, depois de um avanço.
Educação superior. Aqui são matrículas, não são recursos. Aqui há uma
importante modificação, essas matrículas são públicas e são privadas, são
268
universidades, faculdades, centros universitários, tudo, faculdades confes-
sionais, públicas e privadas. Então, de fato, nós avançamos mais aqui, vejam
que os números embaixo, o Brasil, o vermelho, é o número absoluto de matrí-
culas, os outros são proporções. Então, nós saímos de um milhão e quinhen-
tas mil matrículas na educação superior em 1990, fomos para dois milhões e
seiscentos, ou seja, algo como um milhão a mais na década, e saltamos para
cinco milhões e meio, aproximadamente, em 2010. Nessa expansão absoluta
enorme, o Nordeste alterou sua participação para mais, isso é muito inte-
ressante, para 19% do total das matrículas na educação superior do Brasil
e, pela primeira vez, ultrapassa a parcela da região Sul. Então, o estoque
de matrículas na educação superior no Nordeste, hoje, é maior do que o da
região Sul. Então, tem coisas se movendo. A foto ainda é desfavorável, mas
o filme é bom.
Bolsas de pesquisa. Nós estamos andando, podemos andar mais forte-
mente, ainda não é suficiente; a participação da população do Nordeste: é
de 28 a 29% da população do país, então tem um espaço ainda muito grande
para a gente crescer todos esses números. Mas, então, melhora.
Grupos de pesquisa. A mesma coisa, mantém a mesma correspondência
com o quadro anterior das bolsas de pesquisa, apesar dos números absolu-
tos estarem se movendo. Então, eram onze mil em 2000, passam para vinte
e sete mil em 2010.
Desafios da inovação. E aí alguns dados da distribuição nacional das em-
presas que realizam isso; são dados da Pesquisa de Inovação Tecnológica
269RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
- PINTEC (pelo IBGE), aí eu coloquei um dado mais antigo, 1998 e 2000, e os
dados mais recentes, 2006 e 2008, e aí mostram como, primeiro: nas empre-
sas que inovam com processo e produto no conjunto das empresas pesqui-
sadas, ele é muito reduzido em cada um dos anos ainda, e a participação do
Nordeste, por exemplo, em ambas as colunas não se alteram qualitativa-
mente, o quadro não se altera ao longo de uma década.
Agenda de desenvolvimento. Aí eu quero falar rapidamente, já me disse-
ram que tem cinco minutos, sobre uma experiência que já está acumulada,
de que participei em certo sentido dela, a do Inova Nordeste, de dois do-
cumentos que já foram realizados pelo Centro de Gestão e Estudos Estra-
tégicos - CGE, do Ministério da Ciência e Tecnologia, e que já trazem uma
reflexão muito importante de um diagnóstico inovador e de uma agenda de
ciência e tecnologia para a região. Nessa grande agenda, o que está sendo
posto? Primeiro, a discussão de ciência e tecnologia no Brasil. Aí vocês vi-
ram dados, eu mostrei um certo painel de melhoras das condições gerais, do
que se chama de ser e ter no Brasil. O Nordeste vem acompanhando, a seu
ritmo, um pouco isso, exceto as matrículas, quer dizer, a parte da educação,
que melhorou mais.
Então, de todo modo, há um conjunto de indicadores e um quadro da for-
mação técnica na ciência e tecnologia, no aparato de ciência e tecnologia, e
do conhecimento, importante, mas mora, aí reside um problema: ele não tem
conexão com as atividades produtivas, com o setor produtivo. Isso não é ex-
clusivo do Nordeste, isso acontece no Brasil como um todo. E essa é a gran-
270
de agenda que tem sido posta ao longo dessa última década para ciência e
tecnologia, para a agenda do ministério e para a agenda da nação, no quesito
de C,TeI. Então, é preciso colocar o território como referência para articular
as bases produtivas. E, ao colocar o território, você foge, necessariamente
(os meus colegas vão falar um pouco mais depois), da ideia da empresa, no
foco na empresa. É a empresa dentro de um tecido produtivo, é onde ela se
instala. Para nós levarmos adiante uma agenda, que é nova, para uma po-
lítica regional no Nordeste, uma política regional brasileira no Nordeste, o
território tem que ser levado em conta de forma diferente.
Esses estudos apontam também que a base técnico-científica está desi-
gualmente distribuída na região, impondo que a agenda seja considerada,
portanto, uma agenda que venha a ser levada adiante e considerada em dois
planos: o metropolitano, onde o conhecimento (a ciência), está instalado de
forma mais concentrada; e um articulado às perspectivas da interiorização,
o que significam também levar a agenda de ciência e do conhecimento. Isso
tem sido feito. Por exemplo, eu não quis trazer os números, mas eles estão
aí: criação de algumas universidades novas no interior do Nordeste, criação,
desde então, de meados da década passada, das escolas técnicas federais
que vêm sendo acompanhadas também em vários estados. Eu sei que aqui
no Ceará por escolas técnicas estaduais. Então, tem um quadro novo de in-
teriorização dessa base de conhecimento.
Nós temos algumas limitações reconhecidas nesses estudos. Condições
socioeconômicas desfavoráveis para ampla difusão da cultura da inova-
271RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
ção, isso precisa ser superado. Base produtiva ainda predominantemente
tradicional, que apresenta pouca relação com a inovação. Base científica
e tecnológica limitada e concentrada, repetindo, no litoral e, mais forte,
pouca interação entre essas bases e os reduzidos esforços de cooperação
e integração.
Então, na verdade, a proposta se coloca no seguinte sentido: para que
levemos adiante uma agenda, nós precisamos articular três grandes frentes:
a dos que demandam a ciência e tecnologia; o sistema produtivo; os que
ofertam, as instituições de pesquisa, as universidade, E, portanto, reduzir
a separação, o apartamento entre essas institucionalidades que já existem
e que estão avançando, mas que estão interagindo pouco; e os elementos
que são os fomentadores da ciência e tecnologia. Como esse, por exemplo,
e como outras instituições que articulam a demanda e a oferta, que podem
ser também privadas, mas podem ser governo.
Então, este elemento do centro, que há interação entre os três, ele preci-
sa se expandir, se possível as três bolas têm que tentar se fundir o máximo
possível, e aí criar uma base que a demanda trabalha com a oferta e que os
elementos promotores articulam esses dois lados. Por ora, nós temos um
sistema produtivo, que recebe recursos e estímulos da política regional para
as empresas, e os desenvolvimentos da inovação do conhecimento nas uni-
versidades separados.
Então, esses estudos apontavam para algumas iniciativas, chamadas, uma
delas, transposição do conhecimento, que era justamente isso, criar uma base
272
em que (junto com, hoje menos, eu acho que já se mudou os nomes, mas na
época eram centros vocacionais tecnológicos, os CVT’s, que em alguns esta-
dos eles têm outros nomes, alguns se mantiveram, outros não), mas era juntar
escolas técnicas ou as experiências das escolas técnicas estaduais, e o saber
construído nelas, junto com a base produtiva local. Então, isso era a transposi-
ção do conhecimento, era a junção de oferta e demanda. E, de outro lado, isso
de um plano mais horizontal, o outro lado, apoio a segmentos específicos da
estrutura produtiva que estão a demandar mudanças. Então, no caso de apoio
a segmentos específicos, havia até algumas sugestões de alguns que foram es-
tudados, segmentos que representam atividades tradicionais e que precisam
se modernizar. Estão aí alguns deles e que têm forte aderência com a base
produtiva no Nordeste, e que não encontram, por seu turno, encontram na ver-
dade dificuldades em se apropriarem do conhecimento produzido localmente.
Então, fechando agora, conclusões desse novo quadro e da ser e ter. A
ideia é a força de uma nova política e, no caso da incorporação de ser e
ter numa política regional. É que a região deveria se redefinir, então, pelo
conhecimento e pela inovação, e com as implicações que isso acarreta. Por
exemplo, buscar uma relação mais incessante, mais recorrente, das empre-
sas com a inovação, o que não tem sido fácil, haja vista os dados, por exem-
plo, da PINTEC, da pesquisa das empresas que realizam inovação. Como a
taxa de inovação nas empresas no Brasil é baixa. E, de todo modo, a agenda
de ciência e tecnologia não pode ser apenas federal, ela tem que ser incor-
porada aos governos estaduais e nos governos municipais.
273RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Eu queria fazer um pequeno parêntese. Quando eu estive na pasta da
ciência e tecnologia, uma das coisas mais difíceis que um secretário en-
contra é o seguinte, ele vai num município e vai falar de ciência e tecno-
logia, o que ele vai falar para um prefeito de um município pequeno, de
quinze mil habitantes, no interior de Pernambuco? O que é ciência e tecno-
logia para esta localidade? Como a gente vai fazer essa tradução, de uma
política que para nós é relativamente clara, nós estamos falando a ciência,
tecnologia e inovação, mas como é que a gente desce lá e diz para ele o
que é isso? Em geral, ciência e tecnologia é um laboratório na universidade
com químicos ou físicos realizando experimentos. Essa é uma figura que
está na imagem de quem pensa em ciência e tecnologia. A gente precisa
desmistificar isso para chegar no arranjo produtivo, no tecido, embaixo. E,
mais que isso. Nós estamos recorrendo num certo engano, talvez, e que
uma agenda sofisticada, e que o Brasil precisa ser sofisticado em ciência
e tecnologia, é apenas software, coisas que é a fronteira. E não é isso. Eu
dizia em alguns momentos, no governo em Pernambuco, para fazer contra-
ponto a algumas outras posições que se instalavam, que o grande momen-
to ou grande evento da ciência e tecnologia em Pernambuco é a feira de
artesanato que ocorre anualmente em Recife, que é a maior do Brasil, por-
que é de uma riqueza do artesanato impressionante. Todos os municípios
estão lá, stands dos estados do Brasil, do exterior, mas tem uma riqueza
da produção material e imaterial, que será apropriada depois pela colega,
que nós precisamos trabalhar melhor. Era ali que estava o embrião para a
274
ciência e tecnologia, é naquele saber fazer de pessoas que já estão ali; não
é que elas vão abandonar de fazer o seu artesanato, seus utensílios, suas
coisas, mas tudo aquilo precisa ser repensado: a universidade, o pessoal
do design precisa estar lá, junto, trabalhando para que aquelas pessoas,
sim, elas encontrem novas. Isso é ciência e tecnologia.
Então, esta aproximação entre o que ela produz e o que é a base local, em
algum momento nós abandonamos pela desregionalização, que era em certo
sentido, inevitável, mas pela desregionalização do capital produtivo.
Eu acho que termino aqui. Aí, eu digo: as instituições tradicionais preci-
sarão reorientar-se para um novo enfoque, o que significa, por exemplo, o
crédito público deverá ser reorientado para um sistema, uma combinação
diferente, com o tecido inovativo, e mesmo o planejamento regional pode-
ria se ocupar de pensar estratégias de potencializar essas sinergias entre
sistema produtivo e sistema inovativo. Isso não é pouco, isso é muito. E nós
avançaríamos muito na esteira de um novo pacto político que quer um de-
senvolvimento social mais avançado. Não dá para querer o mesmo modelo
do passado, apenas crédito às empresas, tem que ser crédito de um deter-
minado modo. Muito obrigado.”
Helena Maria Lastres: “Nós agradecemos ao dr. Aristides por essa tão rica
apresentação e estímulo às nossas discussões, às nossas reflexões, aos
nossos debates, e aí eu vou lembrar que a mesa já está recebendo questões
e, enfim, convido a todos a nos enviarem também.
275RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Ele inicia lembrando que, realmente, a questão do desenvolvimento re-
gional saiu da pauta, saiu da pauta e lá, no Rio de Janeiro, nós estávamos
discutindo até da formação do pensamento das escolas, das universidades,
o espaço desapareceu e, claro, das políticas também. A boa novidade é que
muitos estão nos lembrando: os países que hoje estão tendo maior capaci-
dade de enfrentar a crise internacional, que não foi gerada nos nossos paí-
ses, foram nos países chamados de mais desenvolvidos, e quem está apre-
sentando maiores taxas de crescimento também são os chamados menos
desenvolvidos. Vários deles, todos eles, com dimensões territoriais e com
níveis de desigualdades que vão exigir a recolocação na agenda central, não
só do pensamento, como das políticas do tratamento das desigualdades
regionais. Então, a boa notícia é de que se espera que essa agenda tenha
voltado para nunca mais nos abandonar. Essa ideia que podemos esquecer
a dimensão espacial, e a história e geografia, porque, como foi apresentado
o território, como espaço econômico, social e politicamente construído, é
essa visão que nos traz a palestra dentre as várias que nos provocam, que
nos colocam à reflexão, é essa a lembrança de voltarmos a pensar no ter-
ritório e que, portanto, as políticas têm que ser contextualizadas. Qual a
inovação? Qual o desenvolvimento? Qual política para o desenvolvimento
e para o desenvolvimento produtivo inovativo? E, então, ele nos lembra da
necessidade de articular quem gera conhecimentos com quem utiliza esse
conhecimento, conhecimentos entendidos de forma ampla. É lógico que hoje
a nossa política mobiliza nossos pesquisadores, nossos professores, para
276
estarem articulados com a fronteira do conhecimento científico e tecnoló-
gico, mas não menosprezar os conhecimentos tradicionais tácitos e como
articulá-los. É o nosso grande desafio e a nossa grande oportunidade.
Eu acho que essa mesa vai ter condições de avançar, e muito, nesse tema.
Mas, lembrar também que a ideia de olhar as nossas estruturas positivas,
os nossos sistemas produtivos regionais e locais, e adensá-los, não só pen-
sando em diminuir as desigualdades, de diminuir todos os produtos que são
produzidos fora da região, para que eles possam ser produzidos agora nesse
novo contexto, não só por isso, mas porque este sistema, é ali que são fortes
as capacitações e a criação de capacitações produtivas inovativas. A grande
diferença é que a apresentação dele, que o Aristides faz, entre uma coisa é a
invenção, novas ideias, conhecimento de como fazer algo novo; outra coisa é
como assimilar e incorporar esses conhecimentos no sistema produtivo. Nós
estamos falando de política de invenção ou de política de inovação? Se a gente
está falando de política de inovação, a gente deve olhar as nossas estruturas,
sistemas, de novo, chamemos com o termo que a gente ficar mais confortável,
eu gosto de arranjos de sistema produtivo. Vamos olhar quem são esses ele-
mentos, e eles devem estar ali articulados, porque é dessas articulações que
nasce a força das inovações, não as inovações de fronteira científica que talvez
a gente não consiga usar, mas aquelas que nós precisamos e que nós vamos
ser capazes de ir aos nossos municípios explicar para os prefeitos e para a
sociedade local do que a gente está falando, porque isso é tão importante para
agregação de qualidade, de valor, a qualquer atividade que seja ali produzida.
277RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Dito isso, eu passo aqui a palavra para o nosso próximo expositor, dr. Hé-
lio Barros, consultor, não só ex-secretário de Ciência e Tecnologia do Estado
do Ceará, mas do Ministério da Ciência e Tecnologia, que foi ali que eu o co-
nheci. Meu colega do Ministério da Ciência e Tecnologia, secretário, que, te-
nho certeza, vai ter também uma riqueza muito grande de experiência para
nos trazer aqui para nossa reflexão de hoje. Por favor.”
Hélio Barros “Bom dia a todos. Este seminário traz novamente à discus-
são nacional o tema Regionalismo, com uma proposta ambiciosa de colocar
o Nordeste no Brasil e no Mundo. Esse é o título. Tema que se repete com
as novas gerações, que perceberam que, no passado, apesar dos grandes
avanços, esses avanços foram suficientes ou simplesmente se esvaíram em
parte em algum tipo de retórica inconsequente. E é exatamente esta a mi-
nha preocupação, a de saber por que caminhamos tão devagar e quando nos
livraremos dessa retórica. Portanto, há muito a discutir, mas eu creio que
há mais a propor. Isso porque, se não estou errado, estamos num momento,
no Brasil, de baixa capacidade de coordenação e elevada incapacidade de
execução. Pretendo limitar-me a falar sobre inovação, até pelo tempo, mas,
certamente, ao falar inovação, é impossível desconhecer os outros elemen-
tos, os outros temas que estamos discutindo aqui: educação, ciência e tec-
nologia, cultura.
As minhas dúvidas são muitas e, por isso mesmo, quando me pediram
para colocar títulos, eu quis me limitar apenas a secretário de Ciência e Tec-
278
nologia do Estado do Ceará, porque eu quero falar sobre coisas reais e fugir
da retórica, e gostaria de saber os motivos por que não temos avançado. Diz
o Geraldo Vandré que “eu vim do sertão, não sei se vou agradar, aprendi a
dizer não”. Não pretendo fazer daqui nenhum palanque, por favor, longe dis-
so, não é ideia trazer nenhuma reclamação, até porque reconheço sempre,
em qualquer governante, méritos que, por mais dificuldades que tenha, eles
sempre são pessoas que têm méritos e que procuram fazer bem as suas
coisas. Mas eu gostaria de focar exatamente, objetivamente, os fatos reais
do nosso atraso.
Já que estamos falando em inovação, eu diria que inovação está em alta,
em muita alta. O presidente Obama tem dado um exemplo disso, e estou
citando o presidente Obama por razões óbvias, por dois motivos: primeiro,
porque é presidente dos Estados Unidos, o maior país, a maior economia
do mundo, obviamente, hoje, com a China mordendo o calcanhar, mas, no
momento, nos Estados Unidos a discussão sobre inovação ganhou enorme
força; não é sem motivos que, no dia 17, eu li um artigo do Robert Shiller, um
dos cem mais influentes economistas do mundo, considerado um dos cem
influentes economistas do mundo pela Escola de Yale, em que ele chamava
a inovação de “a queridinha do capitalista” ou “a estrela do capitalismo”,
dependendo da forma como você queira traduzir, livre a expressão. O pre-
sidente Obama, além de falar sobre inovação, tem feito uma coisa que me
surpreende muito em se tratando dos Estados Unidos: uma política de re-
gionalismo. Eu tenho lido uma quantidade crescente de textos produzidos
279RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
pela Academia Nacional de Ciências, exatamente discutindo regionalismo
de ciência e tecnologia e o desenvolvimento de ciência, tecnologia e inova-
ção nos estados americanos. Eu acho que esse é um dado significativo e eu
gostaria de explorar um pouco, ao final, algumas das indicações vindas da
Academia Nacional de Ciências, na área estadual, de como proceder para o
desenvolvimento da inovação da ciência e da tecnologia.
As críticas ao Obama têm surgido e, naturalmente, parte delas tem a
ver com o credo capitalista que considera que a ação regionalista do presi-
dente Obama fere os fundamentos do empreendedorismo americano, indi-
vidualista, e que é cultura na medida em que entende, na linha weberiana,
a capacidade individual de empreender e criar, e que, portanto, está aí o
fundamento da inovação. Naturalmente, o presidente Obama parece que
não está muito preocupado com isso, porque acaba de aumentar o núme-
ro de institutos de high-tech que está criando nos estados americanos.
Propôs quinze e, já na discussão do orçamento, em abril, aumentou para,
se não me engano, quarenta e seis o número de institutos de high-tech,
praticamente um por estado, na expectativa de que cada estado america-
no se torne um estado inovador. Esse é um dado que, eu repito, considero
extremamente relevante na medida em que emprego é o problema ame-
ricano, como é o problema na Europa, certamente um pouquinho menos
que o nosso, mas também é importante para nós. Cabe emprego na área
de high-tech; ele gera, no mínimo, cinco empregos adicionais no mesmo
ambiente em que ele se realiza.
280
São muitos os autores citados, eu vou saltar essas coisas, até porque eu
pretendo diminuir o tempo para provocar um pouco mais a discussão.
Vários estudos têm mostrado exatamente a força, o vigor do emprego
produzido pela inovação em diferentes situações no mundo todo. O fato des-
sa preocupação com o regionalismo nos Estados Unidos sempre me chamou
atenção, porque, no passado, nas discussões que nós tínhamos no Ministé-
rio da Ciência e Tecnologia, lembro-me muito que aqueles que reclamavam
do “assédio regionalista”, entre aspas, exatamente para confirmar o que o
Aristides acabou de mencionar, o incômodo que é a política regional, e mui-
tos daqueles que convivem com isso sabem o que significa isso na discus-
são central do Brasil, em Brasília principalmente, sempre se dizia que nos
Estados Unidos três estados consumiam mais de 35% de todo o orçamento
nacional em ciência e tecnologia. E a metade dos estados consumia, pra-
ticamente, 100%, 96 e alguma coisa desse tipo. E, de uma hora para outra,
estamos assistindo, então, uma preocupação com essa disseminação do re-
gionalismo e que, obviamente, nos convém discutir mais ainda porque o nos-
so quadro é bem diferente do americano e vai exigir que os nossos estados
aumentem a competência, até porque a centralização dos estados no Brasil
é maior do que nos Estados Unidos.
Eu diria que, em relação à inovação, o Brasil cresceu bastante. A expres-
são, a palavra inovação está correndo os textos oficiais brasileiros desde os
anos 60, 70, final dos anos 60, mas especialmente nos anos 70, e todos os
documentos do CNPQ e da FINEP, no início dos anos 70, falavam em inova-
281RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
ção e eu diria que 99,9% das pessoas que liam não entendiam exatamente
o que aquilo significava. Entendiam inovação como uma palavra de inovar,
de uma maneira mais literal e nunca com as conotações que, à época, já
com o conhecimento científico baseado em primeiro lugar, nas empresas, ou
pensando na influência do estado, à la Sabato, que já traziam a construção
de uma teoria elegante, importante, que terminou frutificando no Brasil. Eu
participei de um seminário na Rio +20 sobre inovação e me surpreendeu a
quantidade e a qualidade dos textos e das discussões. Quer dizer, o Brasil
já tem uma estrutura elegante para discutir, para construir, uma teoria da
inovação, e essa elegância, que nós sabemos, tanto isso em matemática
quanto na própria língua, tem a ver com coerência e tem a ver com conheci-
mento. Quer dizer, hoje nós dominamos isso.
O fato que me preocupa, e é onde eu, obviamente, quero chegar, é exata-
mente a transformação dessa retórica elegante em alguma coisa que seja
real. Chegamos, fazemos, construímos, produzimos inovação. Nesse aspec-
to, gostaria de me concentrar aqui num pequeno texto, que vou fazer ques-
tão de ler, que diz o seguinte: “Um dos gargalos mais graves para a trajetória
do crescimento do Brasil reside na mão de obra qualificada. A contratação
de engenheiros cresceu nos últimos anos a uma taxa média de 9% ao ano e,
apesar de haver avaliações que descartam esse problema, a realidade das
empresas mostra que a lacuna entre a oferta de mão de obra qualificada e a
formação profissional está crescendo, o que, em parte, está sendo ameniza-
do com a vinda de profissionais do exterior. O perfil na formação profissional
282
no Brasil é inadequado para uma ênfase forte na inovação. Apenas 5% dos
egressos de nossos cursos superiores se graduam em engenharia e apenas
6% se formam nas chamadas ciências duras”. Eu gostaria de ser um pouco
mais otimista, se eu não soubesse que, no final dos anos 70, o percentual
dos egressos de educação superior em engenharia era 14%. Eu vivia intensa-
mente esse assunto porque eu trabalhava no Ministério da Educação, numa
das diretorias da CAPES, e convivia com esse número. E leio agora que são
5%. Esses percentuais são significativamente mais elevados em outros paí-
ses, situando-se em geral acima de 20% e chegando a 40% na China e na Co-
reia do Sul, quando se somam as duas áreas, engenharia e ciência. A Coreia
está começando a perder porque nos anos 90 era 54%, está em 40, mas 40 é
muito bom. Eu gostaria que nós tivéssemos pelo menos os nossos 14, que,
nos trabalhos iniciais de Longo, de Iva Rocha, detectavam como sendo o per-
centual brasileiro, e não 5%. Portanto, falar em inovação com a engenharia
em torno de 5% é alguma coisa que precisa ser refletido.
O mais grave para o Brasil é que o percentual de jovens que frequentam
o ensino superior é reduzido para qualquer padrão internacional, e é eleva-
díssima a evasão, notadamente em ciências e engenharia. Ou seja, é baixa
a escolaridade, é inadequado o perfil de formação e poucos concluem seus
cursos. Além disso, os mecanismos de incentivos à inovação oferecem pou-
co apoio à formação e manutenção dos quadros necessários para gerir e
operacionalizar a inovação nas empresas. Essa é uma tarefa de longo prazo,
mas são necessárias ações urgentes para corrigir essa trajetória, isso é que
283RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
é a grande ênfase no ensino técnico e programas emergenciais de forma-
ção de recursos humanos, em especial para a engenharia e tecnologia da
informação. A situação na engenharia no Brasil pode ser assim resumida,
segundo o autor: “Há uma forte e crescente demanda para os profissionais
de engenharia. A formação em engenharia tem impacto amplo sobre muitos
setores de atividades, principalmente no empreendedorismo, e não se res-
tringe apenas a atividades típicas de engenharia de cada setor e atividade.
Esse problema está relacionado à deficiência quantitativa de formação de
engenheiros, em especial da graduação, mas muito possivelmente também
se relaciona com a qualidade dos egressos em engenharia. A situação bra-
sileira em termos de engenheiros por habitantes é especialmente precária e
insustentável, comparativamente com qualquer país desenvolvido ou mes-
mo com o estado de desenvolvimento do Brasil. O quadro brasileiro se ex-
plica pela baixa escolaridade superior, mas também é fortemente agravado
pelo perfil dos egressos, em que o percentual de engenheiros é baixo e a
evasão muito elevada”.
O texto que eu acabo de ler é do atual reitor do ITA, Américo Pacheco,
professor da Unicamp e um experiente formulador e executor da política
brasileira em ciência e tecnologia. O Pacheco teve uma longa experiência
em formulação de projetos nacionais, até para o governo, e conheceu de
perto a política de ciência e tecnologia durante anos. Se o quadro nacional
é esse que o Pacheco descreve, eu me perguntaria como está o quadro no
Nordeste. Que, pretendemos, melhore, e pretendemos falar em sofisticações
284
como inovação, mesmo que seja puramente inovação, sem inovação tecno-
lógica que se permita para incrementar os “breaking-trues”, seja o que for.
O que eu vejo com grande tristeza é que quando, em 1976, a Capes realizou
o primeiro Projeto Nordeste de Pós-Graduação, um período extremamente
rico em que criou todas as pró-reitorias de pesquisa e pós-graduação do
país, na época não existiam, e que criou o Plano Institucional de Capacita-
ção Docente - PICD, que foi o instrumento de enorme expansão da educação
pós-graduada no Brasil, os dados que nós tínhamos do Nordeste em relação
ao Sul eram muitos próximos. Cada vez se distanciam mais. Portanto, o qua-
dro é de distanciamento, o que é preocupante.
Uma das coisas que mais me preocupam, e aí eu começo a tocar nos
problemas reais dos estados do Nordeste brasileiro, é que nós estamos
falando em engenharia, mas nós não falamos em ensino técnico que, aqui
para nós, tem havido um movimento gigantesco, aparentemente com gran-
des resultados, mas absolutamente ineficaz, na minha opinião. Principal-
mente, quando o técnico foi manipulado e, de certa maneira, atingido, eu
diria até quase que mortalmente, não chegou a morrer, mas está com ris-
cos, com o tecnólogo que, aqui para nós, está muito mal definido. E o pior,
além de termos esse pluralismo e essas mudanças, transformações dos
CEFET’s em universidades, temos uma indefinição clara do que faz o tec-
nólogo em nosso país. Como secretário, experimentei, vivenciei esse pro-
blema no Ceará e o que eu vi foi uma formação excepcionalmente boa, que
conseguiu penetrar o interior, até mesmo para que os prefeitos soubessem
285RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
o que a gente faz. Porque quando se toca em inovação dentro de institui-
ções tecnológicas, o prefeito entende. O estado do Ceará tinha um agente
de inovação, em várias regiões, produzindo pequenos projetos absoluta-
mente simples na área de agricultura irrigada e em diferentes segmentos,
que estava explicando ao homem, ao prefeito ou ao empresário local, o que
aquilo significava, e ele entendia. E, de uma hora para outra, eu estou as-
sistindo no Brasil um batido de ombro que eu não estou entendendo nada,
com ameaças, inclusive, ao que pode acontecer no sistema SENAI. Então,
alguma coisa que, eu não estou conseguindo entender, é exatamente um
grande estímulo, um grande investimento, a meu ver muito mal definido.
Então, nós temos carência de ensino técnico, um tecnológico mal definido
e, pior, é que lamentavelmente as políticas públicas brasileiras continuam
com aquele terrível malefício da descontinuidade. Enquanto a educação e
ciência entrarem nessa agenda eleitoreira (não é política, política ela está
dentro), nós não conseguiremos avançar. Eu tenho sido testemunha, não
pretendo aqui e não tenho nenhuma intenção de fazer referência a nenhum
governo, nem no passado, nem no presente, mas o fato é que essa descon-
tinuidade está no tecido político da nossa federação. E são destruídos sis-
temas estaduais. Por exemplo, o Ceará tinha um sistema estadual compa-
rável somente a São Paulo, que tem um excelente sistema estadual de rede
de instituições técnicas e tecnológicas, e simplesmente foi desmantelada
sem motivo, não há motivo. Agora, se houve a intenção de desmantelar, eu
diria que não. Não posso acreditar que nenhuma das autoridades maiores
286
do governo; eu acho que está na própria forma de funcionar a nossa admi-
nistração pública brasileira.
Eu gostaria de, admitindo que naturalmente algum passe de mágica
que, certamente, não vai acontecer, que as coisas pudessem melhorar. E
aí, eu gostaria de mencionar, um estudo do IET, que eu suponho que aqui
os senhores conheçam, que é de 2012, portanto, já tem bastante tempo, em
que analisou, entrevistou cinquenta grandes executivos nacionais, quaren-
ta empresas nacionais e dez subsidiárias, empresas internacionais, e cujos
resultados mostraram, se eu posso simplificar até para ficar dentro do meu
tempo, diz o seguinte: no curto prazo, falar em inovação não tem muita coi-
sa. Quer dizer, todos reconheceram que inovação é importante: portanto,
a retórica da inovação já está ganha, não precisa mais discutir isso. Todos
dominam a informação, portanto, além desta pura retórica, há um conheci-
mento real de como se faz, pelo menos das grandes linhas dos impactos e
da forma de construir um projeto inovativo para uma empresa, um centro
de P&D e etc., mas no curto prazo ninguém foi otimista, todos diziam o se-
guinte: “não, nós estamos devagar porque é difícil...” e aí tem a ver talvez
com aquela preocupação do Aristides sobre o “schumpeteriano” do nosso
empresário, que parece que não investe em P&D.
Eu acho que a coisa fica interessante na pesquisa do IET, quando joga-se
para dez anos depois, o que será, aí todos eles dizem “ah não, nós vamos ser
líderes em inovação...”. Me pergunta, como? Com 5% do nosso alunado de
ensino superior em engenharia? Sem formação técnica e tecnológica corre-
287RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
ta, além do mais, batendo nos outros, batendo cabeça? Uma discussão, isso
aqui não, eu vou dar isso aqui a essa instituição, eu vou dar para o governo
federal, nunca vi. Quer dizer, porque está havendo uma falta de coordenação
absolutamente estranha e que, certamente, eu acredito e, portanto, louvo a
existência deste fórum, já estava na época de se retomar o assunto, porque
é um assunto que não pode nem parar. Tânia Bacelar sabe disso porque já
investiu, ao longo da vida dela, muito trabalho, entende, e tem sido um traba-
lho heroico. E não só ela, muitas outras pessoas em torno do assunto.
Então, nós estamos a esta altura com uma pergunta: como é que vai real-
mente existir desenvolvimento regional se os dados do país são esses? Ob-
viamente, o otimismo, se eu quiser fazer um discurso otimista, não é difícil.
Os dados mostrados aqui, nacionais, são bons. Quem conheceu o Brasil dos
anos 60, 50, sabe que nós avançamos anos luz. Hoje a capacidade técnica da
consultoria, aquilo que o passado da FINEP, que nasceu a FINEP, que Pelúcio
sonhava, em fortalecer a consultoria nacional aconteceu. Nós temos uma
riqueza de consultoria nacional fantástica e a tecnoburocracia também. An-
tigamente você conversava com a tecnoburocracia brasileira que não tinha
a menor formação. Hoje, não, são pessoas muito bem formadas, você chega
aos ministérios e encontra pessoas com discurso, do que eu chamei, elegan-
te. Porque são pessoas bem formadas, sabendo exatamente o que querem.
Agora, por que aqui não acontece?
Bem, senhores, eu verifiquei num estudo americano que a Academia Na-
cional de Ciências selecionou três itens que considerou relevantes exata-
288
mente no projeto estadual de desenvolvimento estadual da ciência e tecno-
logia da inovação. Primeiro deles, investimento sustentável dos estados em
fundos públicos. Eu pergunto: quantos estados brasileiros criaram fundos
para apoiar a inovação? O Ceará criou um, o Fundo de Inovação Tecnológica
- FIT, o fundo com participação dos recursos do estado, portanto, dinheiro
que veio dos empresários para o estado. É um tipo de renúncia fiscal, não
deixa de ser, e eu sei que está com 100 milhões de reais. Eu conversei com
uma pessoa, por sinal, uma pessoa que eu tenho uma relação muito boa, até
porque foi meu aluno, e ele me disse: “não, é porque o empresariado do Cea-
rá não sabe o que é isso não, não vamos gastar dinheiro com...”. Ora, meu
cidadão, a minha pergunta foi o seguinte: como é que uma comunidade aca-
dêmica brasileira, nos anos 70, sabia sequer pedir uma bolsa de estudo? Eu
me lembro quando, em 2003, eu vim para o Ceará, o meu esforço foi exata-
mente centrar todo o trabalho da secretaria sobre os empresários. Eu dizia, o
acadêmico já sabe, eu estou com ele tranquilo, com o acadêmico eu dialogo
fácil. O empresariado, não. Tanto que no primeiro projeto Programa de Au-
xílio a Projetos Institucionais - PAPI, executado em 2003 para 2004, com os
empresários, muitos pediam coisas que obviamente a gente já sabia o que
era, ele estava louco para ganhar dinheiro de graça. Então, eu chamei cinco
pessoas do BNB, pessoas que trabalharam no BNB e estavam já aposen-
tadas, excelentes economistas, e eu mesmo passei três dias reunido com
eles para explicar o que era investimento em ciência e tecnologia, em P&D.
Não era uma conta bancária, não era um pedido de empréstimo ao Banco
289RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
do Nordeste, era outra coisa. E deu certo. Tanto assim, que alguns projetos
de sucesso, alguns que inclusive resultaram em empresas que ganharam o
prêmio FINEP, chegaram a ir à secretaria cinco vezes para aprender a fazer.
Não era por outro motivo não, porque também o contador da empresa que
estava metido não sabia, não tinha a menor ideia do que era. Como chegava-
-se do passado, nos anos 70, eu fui algumas vezes a algumas pró-reitorias do
Brasil e via que o professor não sabia o que era. Eu me lembro que, no estado
do Maranhão, o pró-reitor me disse que não queria nenhuma bolsa do Plano
Institucional de Capacitação Docente - PICD, porque eu ia criar desempre-
gados e devolveu as bolsas. Obviamente, na mesma hora eu passei para a
Universidade da Paraíba, para o reitor Linaldo, que o Linaldo era ávido por
tudo que era bolsa. Então, rapidamente ele consumiu.
O que eu quero dizer é o seguinte: do mesmo jeito que dentro da aca-
demia nós tivemos problemas de formação para este ambiente, do qual se
fertiliza com inovação, com desenvolvimento científico e etc., é preciso fa-
zer com o empresário, é preciso conversar com o empresário. O empresário
brasileiro não é pior, e aí o “schumpeteriano” é universal. Ele investe, se ele
souber que vai ganhar ele investe. E quando eles migram para Portugal ou
para os Estados Unidos, lá eles sabem fazer, por quê? Não é a mudança do
ar, porque atravessou o Atlântico que alguém melhorou os seus neurônios.
O que eu quero, portanto, dizer é o seguinte: é que existe um formato, os
estados precisam criar fundos para inovação, essa é uma recomendação
americana, que, por sinal, evidente.
290
O segundo ponto, apoio dos estados ao sistema educacional, é muito im-
portante. Absolutamente, essencial, que o estado chegue próximo daquilo
que ele pode fazer. E educação ele pode fazer. Agora, claro, o estado que
tem várias universidades públicas pagas pelo estado, que foi o caso do Cea-
rá, não tem sustentação, então, resultado: as universidades não funcionam.
Tem, mas não existe. Uma universidade que quando chega o mês de junho
recebeu dois milhões para o seu custeio, não existe isso. Então, não funcio-
na, você não vai ter universidade. Então, esse é o ponto que estão batendo
cabeça. Eu entendo, por exemplo, que você ter um sistema de ensino téc-
nico para o estado é essencial, isso deve ser feito, devemos estimular. Eu
não quero, obviamente, dizer que a receita é única, mas, da mesma maneira
como os americanos estão sugerindo para os estados americanos, eu convi-
vi com um estado que tinha uma estrutura de ensino técnico e tecnológico,
do próprio estado, portanto, beneficiado pelo recurso próprio que não era
muito, agora vivendo com muitas universidades. Obviamente, outros esta-
dos tinham universidades federais à mão-cheia, seis, sete. Porque, em algum
momento, o presidente da República beneficiou os seus estados, e por aí vai.
Então, eu acho que o que está faltando no Brasil é alguma coisa que diga o
seguinte: para onde nós vamos? Eu sei que por mais que a gente discuta de
forma elegante a teoria do regionalismo e possamos dizer como deveria ser,
nós vamos cair novamente no engodo da realidade objetiva, e quando chega
no final não acontece. Então, eu preferi me localizar nestes aspectos e, cer-
tamente, deixar um pouco mais de tempo para plateia, até para perguntas,
291RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
e muitas das quais eu poderei elaborar um pouco mais em cima daquilo que
foi escrito pela organização do seminário. Muito obrigado.”
Helena Lastres: “Nós é que agradecemos, também, esse rico aproveitamen-
to dessa experiência tão densa, em várias estruturas do governo federal e
até estadual.
Dr. Hélio nos traz de volta à questão por que o empresariado brasilei-
ro não inova e juntamente com os nossos políticos e cidadãos sequer con-
seguem entender a importância da educação, da ciência, da tecnologia, da
inovação para o desenvolvimento. E aí, de novo, o nosso debate sobre qual
inovação nós estamos falando. Aquela que é instrumental ao nosso desen-
volvimento, tendo em vista a especificidade territorial, continuamos reafir-
mando. E aí, nos lembra que é muito importante o entendimento que a gente
tem de inovação, mais uma vez. Se a gente pensar em inovação, com os ócu-
los dos outros, com o contexto dos outros, e aplicarmos isso para as nossas
políticas, nós vamos estar moldando uma agenda de política e também de
pesquisa, de geração de conhecimento em todos os níveis, onde vão caber
apenas aqueles atores, aquelas atividades, aqueles objetivos, aquelas partes
do mundo que mais se assemelham ao modelo copiado, deixando de fora, eu
não vou falar em resto porque no caso do Brasil é quase que o Brasil inteiro,
que não replicam, que não têm a mesma dinâmica do modelo copiado. Então,
as oportunidades pra gente desenvolver uma agenda de política realmente
nossa, adequada às nossas dificuldades, que a gente consiga. Esse foi um
292
tópico muito debatido na discussão do Rio de Janeiro, como é que as nossas
estruturas de ensino e pesquisa, a começar pelo mais baixo, e ele releva, não
vamos falar só de universidade, o ensino técnico é importantíssimo.
A educação básica, desde o início, vários autores falam da injustiça cog-
nitiva. Nós, como um país colonizado, aprendemos nos moldes de um co-
nhecimento que é de outro contexto; a gente tem que usar isso como uma
potencialidade, a gente usa, conhece os óculos dele, mas também temos
que conhecer a nossa realidade, avançar com o nosso conhecimento, e aí
a gente pode descortinar as melhores opções, as melhores possibilidades
não deixar aquilo nos cegar para quem nós realmente somos. Oportunidade
enorme, ele nos fala como que os Estados Unidos colocaram isso, a questão
da educação, da ciência, da tecnologia, da inovação, como estrela do desen-
volvimento capitalista praticado ali. Nós temos que fazer a mesma coisa,
como é que essa estrela pode iluminar o desenvolvimento brasileiro? Porque
é diferente, é completamente diferente.
De novo, antes de começar essa sessão, eu estava conversando com vá-
rios colegas do Banco do Nordeste e outros da Federação da Indústria, mas
como é que o BNDES usa esse enfoque de sistema de arranjo produtivo, e o
colega falava do porto de Pecém, a preocupação, e eu disse, olha o BNDES
está tentando olhar todos os empreendimentos que apóia, e os de infraestru-
tura em particular, esse é o grande eixo dentro das políticas que o BNDES
é chamado à financiar, os programas do PAC. A gente olha, pode ser uma
hidrelétrica, pode ser um porto sim, como centro de um arranjo produtivo
293RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
inovativo que demanda muitos bens e serviços, que podem ser produzidos
localmente. Que tipos de conhecimento nós somos capazes de gerar? E, ele
nos lembra, o problema é que a gente tem outro conceito de inovação e, en-
tão, não consegue usar esse rico potencial. Mas, seja no caso de Suape, de
Pecém, a gente está fazendo um esforço de pensar a TRANSNORDESTINA
como o eixo de um arranjo de um sistema produtivo, demanda uma série
de bens e serviços e conhecimentos. Sim, para sua implantação, para sua
operação, e vai propiciar a localização, a criação de vários outros que ainda
nem existem, porque agora tem esse eixo estruturante de desenvolvimen-
to. Como é que as políticas nossas podem estar antenadas para isso? Tudo
bem, vamos pensar o que o mundo está fazendo na fronteira, não vamos
esquecer, mas temos que tratar primeiro do que é a nossa necessidade, é a
nossa oportunidade. Aí, de novo, esse conceito é instrumental. Que elemen-
tos estão faltando? Que conhecimentos para mobilizar essas capacitações?
Desde os níveis mais primários até os mais sofisticados. Que tipo de estru-
turas produtivas e inovativas precisamos mobilizar?
E aí, por falar em estrela, em luz, é lógico que temos que vincular isso com
a nossa cultura, com as nossas grandes oportunidades, que nos trazem essa
nossa riqueza que quando a gente está falando do social, é lógico que a gente
está falando da cultura também. E, então, para aproveitar e lembrar que conos-
co está a secretária Lúcia, que também é professora Lúcia Falcón, secretária
de Sergipe e professora da Federal de Sergipe, ela participa de um esforço que
eu acho da maior importância e que o BNDES está querendo entrar, participan-
294
do de novo, estávamos conversando ali fora, de olhar os eixos mobilizadores do
desenvolvimento social também com esse enfoque. A política de capacitação
produtiva e de inovação não é patrimônio do setor manufatureiro. Se o Brasil
hoje coloca como prioridade o desenvolvimento inclusivo, terminar com a mi-
séria absoluta, vamos olhar como é que a educação colocada em um centro
de um arranjo produtivo, que também demanda uma série de bens e serviços,
não é dos uniformes aos mobiliários, ao sistema de informação e comunica-
ção, e educação, saúde. E é importantíssimo esse trabalho que a academia
faz, quebrando as invisibilidades. Que tipo de bens e serviços são necessários
para fazer um posto de saúde funcionar, um hospital público funcionar, e que
inovações, que conhecimentos são ali necessários, importantíssimo.
Nos eventos culturais, a economia criativa, que riqueza. Com isso eu já
introduzi a secretária e também professora. Cláudia Leitão, que é dra. em
sociologia pela Universidade de Paris V, professora do Programa de Pós-
-Graduação em Políticas Públicas e Sociedade, da Universidade Estadual
do Ceará. secretária, professora, por favor.”
Cláudia Leitão: “Bom dia a todos. Eu vou pedir para a Helena, então, medir
o tempo e não me deixar passar.
Eu trouxe uma apresentação, mas ela é longa, então eu acredito que a
gente não vai vê-la inteiramente.
Meu Deus do Céu, é tanta coisa que a gente ouviu, tanta coisa importan-
te, e me deixaram aqui nesse lugar da reflexão sobre a cultura, na verdade a
295RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
reflexão sobre o simbólico, sobre aquilo que é intangível e que, na verdade,
acaba sendo fundamental para essa discussão dessa mesa, onde a gente
tem aí falas tão lúcidas e tão importantes nessa perspectiva da discussão da
ciência e tecnologia, e da inovação.
Se eu fosse fazer uma equação, viu professor Hélio Barros, colega que-
rido, sobre o que é essa economia criativa, eu vou dizer para vocês que, se
o empresariado precisa ser sensibilizado, Hélio, você não imagina qual é
a tarefa hoje de uma secretaria nacional de economia criativa, porque, na
verdade, ninguém entende o que é isso. É uma expressão profundamente
obscura e que deixa todo o mundo muito nervoso, inclusive os ministros,
ou as ministras, especialmente as ministras. Mas, muito bem, eu tentei
fazer isso lá. Eu estou saindo do Ministério da Cultura, mas toda a minha
grande experiência nesses dois anos e meio, e eu devo muito à professora
Tânia Bacelar, eu queria dizer que Tânia Bacelar é a mãe da Secretaria da
Economia Criativa do Brasil. Foi graças a ela e com a presença dela que,
há dois anos e meio atrás, eu reuni um grupo de pessoas, de pensadores do
desenvolvimento brasileiro e, na perspectiva da visão regionalista de Celso
Furtado, que, para nós, foi a nossa grande árvore frondosa, foi, sob esse
pensamento furtadiano, que nós resolvemos construir uma secretaria no
Ministério da Cultura, onde nós pudéssemos formular políticas públicas
em que a cultura fosse considerada uma espécie de quarto pilar do de-
senvolvimento, onde a cultura fosse estratégia de desenvolvimento local
e regional.
296
Aí vocês podem me perguntar: e deu certo? A secretaria foi criada. A
secretaria existe, portanto; ela tem aí quinze meses de vida, eu espero que
ela tenha longa vida. Nada garante, em nome da descontinuidade das polí-
ticas públicas brasileiras, de que ela continuará. Agora, o que me anima é
que a sociedade brasileira parece compreender do que eu estou falando.
E, se há uma compreensão da sociedade, está tudo bem, o estado que cor-
ra atrás da sociedade, afinal a sociedade, como diz Helena Lastres, inova,
nem que ela não saiba do que está falando. Um dia, eu ouvi, no Pará, esta
frase: “secretária, o tecnobrega é inovação?”. E eu disse: “da mais pura, da
mais brilhante inovação numa indústria completamente quebrada, que é a
indústria no mundo”. E aí o Pará consegue descobrir isso muito facilmente,
ninguém ensina lá para eles, mas eles entendem que o cd não vale mais
nada, não se vende mais cd, as lojas de cd estão se acabando. Então, se o cd
está se acabando o quê que se faz? Aí você compreende que há um arranjo
produtivo, nesse arranjo produtivo não é mais o cd o produto, mas são todos
os elos que vão ser construídos em relação a esse arranjo produtivo, onde o
espetáculo, a rádio do Pará, é que toca as músicas: é o ouvinte da rádio que
escolhe o que vai ser colocado no cd, e cd é distribuído de graça. Porque o
cd não tem mais valor, o valor está na cadeia de shows e de espetáculos que
fazem que haja um mercado no Pará para um tipo de música. Gabi Amaran-
tos não existia, nem nasceu com a Globo, na novela das domésticas. Ela já
vem trabalhando há muito tempo no mercado musical que está completa-
mente deslocado de São Paulo.
297RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Eu disse essa história para a presidente Dilma Roussef, em outubro de
2011, e ela disse: “E existe mercado fora de São Paulo?”. Existe, Presidenta.
O problema é que ninguém vê, ninguém sabe, ninguém viu. Eu estou falan-
do de uma economia criativa, que é completamente, grande parte dela, in-
formal, subterrânea. Milhões de brasileiros trabalham com essa economia,
no entanto, essa economia não tem apoio para praticamente nada. Não há
políticas que possam dar respaldo, amparo, incentivo e fomento a esses pro-
fissionais. Eu vou deixar a apresentação, quem quiser depois pode levá-la e
pode ler, porque é um pouco essa explicação do que é esta economia. Mas,
eu estou falando de uma economia do circo e, quem me disser que o Circo
du Soleil não é um negócio importantíssimo no mundo, estaria enganado.
Então, eu estou falando que o circo é um setor criativo. Mas, os softwares, os
aplicativos em que eu baixo música no meu celular também são; também é
um setor importantíssimo para essa economia do simbólico. Eu estou falan-
do da moda, da moda brasileira que, puxa a vida, era para ser uma referência
no mundo. Como é que o Brasil, sendo o que é na sua grande diversidade
cultural, não tem uma moda que represente essa riqueza de imaginários. É
brincadeira, os franceses chamam “c’est tangachi”, é uma coisa lamentável,
é um desperdício. E o design brasileiro, é um setor criativo.
E aí eu me lembro da Lina Bo Bardi que, na década de 60, resolveu andar
pelo Nordeste brasileiro, já que nós estamos falando de Nordeste, foi para a
Bahia, para um projeto belíssimo, final dos anos 50, década de 60, onde, na
verdade, ela fez uma expedição saindo da Bahia, e chegou ao Ceará. Essa
298
expedição sabe-se pouco dela, alguns artigos de jornal, algumas crônicas,
contando que Lina Bo Bardi vem de São Paulo, arquiteta italiana, e vai co-
nhecer a cultura tradicional popular do Nordeste. E ela começa a andar. Sor-
te eu tive quando eu fui secretária de Cultura do Ceará, porque o secretário
Hélio tinha que levar políticas de inovação, mas no meu caso era muito fácil,
a cultura estava lá, eu não tinha que levar absolutamente nada, na verdade
eu só tinha que ir lá para compreender o que se fazia e dar àquilo uma po-
tencialidade a partir de políticas. Então, meu trabalho era fácil, fácil, fácil. O
do secretário Hélio era mais difícil. E eu acho que foi tão fácil que o ministro
Gilberto Gil se apaixonou pelo Ceará. E ele fazia que nem a Lina Bo Bardi
fez na década de 60, ele andava comigo pelo interior do Ceará. Nunca esti-
ve com o ministro Gilberto Gil numa sala com ar condicionado, como essa.
Nunca, Helena. Era tão impressionante, andávamos pelo Nordeste. Às vezes
eu estava em outro estado com ele, mas no Ceará ele andava no sertão, an-
dava na serra, andava nas praias, e dizia: “Precisamos colocar essa cultura
brasileira em movimento”. E, na verdade, essa cultura pode nos salvar. É
por ela que a gente pode construir um caminho de desenvolvimento. Cláu-
dia, você acredita nisso? Eu dizia: “Ministro, eu sou sua primeira discípula,
eu vou andar pelo Ceará para construirmos o sistema estadual de cultura
e vamos instalar sistemas municipais, com o apoio dos prefeitos, em cada
município”.
Ora, fazer isso no Ceará, numa terra onde quase não chove, onde as pes-
soas passam imensas necessidades, poderia parecer um absurdo. Porque,
299RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
afinal de contas, cultura, na visão de alguns, é tão supérfluo; o importante
é comer e é beber água. Mas, vocês sabem, a gente não quer só comida, a
gente também quer outras coisas. E foi aí que eu entendi que, nessa cami-
nhada, e é aí que o real aparece, diz o Guimarães Rosa, não é na entrada nem
na saída dos processos de andança, é no real, é no caminho que as coisas se
fazem. Nós fomos criando, em cada município do Ceará, um departamento
de cultura, um sistema municipal, um conselho municipal, um fundo mu-
nicipal, e um dia nós chegamos a ter cento e oitenta e quatro conselhos,
cento e oitenta e quatro fundos, cento e oitenta e quatro departamentos ou
secretarias de cultura, e o Ministro não acreditava. Ele dizia: “Como você
conseguiu fazer isso no Ceará, e eu não consigo fazer em São Paulo?”. Eu
digo, exatamente, porque o Ceará é o Ceará, e São Paulo é São Paulo. É tão
claro, ministro. Porque, na verdade, há no Nordeste brasileiro uma absoluta
aderência a uma compreensão de que cultura pode, sim, fazer a diferença.
Agora, quando Lina Bo Bardi andava da Bahia, e aí ela reuniu peças in-
críveis, os textos que ela escreve são magníficos. Ela diz assim: “Vamos,
então, criar uma grande escola, uma escola para o Nordeste brasileiro, onde
o artesanato, o produto da cultura tradicional popular vai se encontrar com
a inovação e com o design, e aí o Brasil vai ser uma referência para o mundo
de uma grande escola, que vai se multiplicar em todo o país, de desenho
industrial, onde as escolas de artes e ofícios serão papel fundamental, onde
o artesanato brasileiro vai dialogar com o design”. Puxa, ela disse isso na
década de 60, ela levou uma belíssima exposição dessas peças para Milão, e
300
aí nós chegamos em 64. Essa exposição nunca aconteceu, ela foi suspensa,
anulada, pela ditadura militar brasileira, e a exposição da Lina Bo Bardi so-
bre o Nordeste brasileiro nunca aconteceu.
Eu estou contando essa história porque acho que a economia criativa
também não aconteceu. E eu fico pensando o tempo das coisas. A minha re-
flexão aqui com vocês é sobre o tempo das coisas. O tempo do plantio, talvez
o tempo da colheita. Hélio diz assim: “Na retórica da inovação, todo o mundo
já está convencido. Precisamos agora, portanto, de políticas contínuas que
permitam essa inovação florescer”. Talvez, na retórica da economia criativa,
nem sequer tenhamos chegado aí. Nós estamos dizendo que é uma econo-
mia que agrega valor a bens e a serviços e que o Brasil poderia ser exporta-
dor; é uma pena que seja a China.
Eu fiz, uma vez, uma brincadeira com a Helena, que me convidou, tam-
bém, gentilmente, a participar de um grande debate em Recife, liderado pelo
BNDES, e eu levei um Padre Cícero chinês. Até hoje, Helena ri dessa histó-
ria, porque eu quis levar o Padre Cícero chinês um pouco para desconcertar
o meu público. Imaginar que hoje, no Cariri nordestino, circula Padre Cícero
“made in China”, e eles têm chip; se ele está fazendo milagre, não sei, Hélio,
você que está dizendo. Então, eu não duvido de nada, milagre da China, isso
é que é chato, essa é a parte chata. Mas, imaginem como nós temos aí um
potencial interessante para agregarmos valor aos nossos produtos.
A Secretaria se construiu em cima de quatro grandes desafios. O de-
safio da pesquisa. Eu concordo inteiramente quando o Hélio diz aqui, nós
301RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
não podemos construir políticas públicas nas perspectivas dos mandatos
eleitorais. Nós precisamos enfrentar um problema grave no Brasil, que eu
acho que é completamente ainda pouco compreendido pelos nossos go-
vernantes, que é o problema de dados confiáveis, de produção de dados
confiáveis. Eu estou agora muito interessada, inclusive em participar, na
UNESCO, porque houve uma mudança do relatório da economia criativa
da UNCTAD, Conferência das Nações Unidas para o Comércio e para o
Desenvolvimento. Esse relatório agora está se deslocando para a UNES-
CO. O relatório é importante, mas é muito problemático. Nós temos dificul-
dades de produção de indicadores, nós temos dificuldades de termos mé-
tricas. Nesse momento, eu estava, olha o ato falho aqui, eu estava metida
com o IBGE porque nós estamos construindo a conta satélite da cultura.
Nós precisamos entender quanto é que dessa economia formal, que é um
pedaço dela, um pedaço do iceberg, ela está para baixo, mas quanto dessa
parte formal nós temos de produção de riqueza para o PIB brasileiro, para
o PIB do Brasil. E esses setores (eu falei do circo ao software, da moda, do
design, da arquitetura, da propaganda, da música, dos shows, da cultura
tradicional popular, do turismo cultural, do lazer, dos esportes, isso tudo
é, portanto, segmento cuja dinâmica econômica é o que nós chamamos,
portanto, de uma economia da cultura, de uma economia do simbólico, de
uma economia criativa, enfim), de uma economia onde sem informação
não dá. Então, passando do desafio da produção de dados confiáveis, eu
estou falando do desafio da educação, o desafio da educação é essencial e
302
nós sabemos que ele também não se dá em mandatos políticos, nós preci-
samos, no entanto, ter uma estratégia.
Eu estive na Austrália, em julho de 2010, e me lembro, conversei muito
com o Hélio, ele estava em Cabo Verde, e eu dizia, “eu mandei um projeto de
pesquisa para o CNpQ e depois”, hoje, eu tenho uma ótima relação com o
presidente Glaucius Oliva, e ele ri muito, porque eu disse “uma professora
que trabalha na área da cultura e que tenta tratar das questões de desenvol-
vimento, a partir da cultura, nunca terá apoio de CAPS, de CNpQ; isso não
entra nem no Lattes, não tem nem onde colocar”. O tal do currículo Lattes
coloca a cultura na área da extensão, como a porta dos fundos da produção
de conhecimento. Lástima, grande lástima brasileira, por não entender que
Celso Furtado falava num livrinho fundamental, chamado “A Criatividade e
Dependência das Sociedades Industriais”, ele dizia o papel da criatividade
para o desenvolvimento regional e para o desenvolvimento nordestino. En-
tão, assim, nós temos instituições que ainda não compreendem isso, então
eu estou numa fase pré-histórica, professor Hélio, nem cheguei na idade
do fogo, mas estou muito animada porque acho que nós temos que sair da
pedra lascada e avançarmos, inclusive, para as instituições de formação em
educação (compreenderem do que nós estamos falando?), de um desenvol-
vimento onde cultura é estratégia. Porque eu estou falando de uma econo-
mia que não polui, eu estou falando de uma economia que está aqui.
Aí vou passar para o segundo desafio. Nós, inclusive, desenhamos uma
formação para a economia criativa brasileira junto ao MEC, e espero que
303RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
aconteça. Porque nós não conseguimos, como os australianos fazem, juntar
empresa, estado e universidade. Se esse triângulo não se reúne, não é pos-
sível falar em modelo de desenvolvimento para o século XXI. Os australianos
estão fazendo isso lá, eu fui com bolsa, consegui o recurso, acabei chegando
à Austrália e fiquei encantada de ver um país que se chama de criativo. Mas,
a palavra não é um adjetivo vazio. O sentido do criativo é exatamente uma
estratégia para os próximos anos, eles trabalham sempre com vinte anos,
ninguém trabalha mais nem com dez anos. O planejamento da cidade de
Brisbane, do qual eu participei, era um planejamento de vinte anos. O quê
que a cidade de Brisbane, no estado de Queensland, quer ser daqui a vinte
anos? Uma cidade inovadora, uma cidade que trabalha com uma economia
que não polui, que tem grande sustentabilidade ambiental, econômica e so-
cial. Então, toda a construção da produção de conhecimento da universi-
dade está a serviço da formulação das políticas públicas, que trazem as
empresas para incubar dentro da universidade, e isso cria um círculo extre-
mamente virtuoso, e a Austrália acaba hoje sendo, as pesquisas mostram,
um dos estados cujo desenvolvimento é dos mais interessantes do planeta.
O terceiro desafio é o desafio do fomento. Outro grande problema. Por-
que, se nós estamos falando de um fomento para empreendedores desses
setores, e eu vou falar da pequena estilista de moda ou do chefe de cozinha,
porque gastronomia é por excelência um segmento criativo, aí eu vou dizer
que nós vamos ter grandes problemas também. Porque é muito complicado
para os bancos brasileiros compreenderem que esses indivíduos não têm
304
qualquer contrapartida para dar, a não ser uma grande ideia na cabeça. E,
então, é complicado, porque nós não vamos ter créditos orientados que per-
mitam a essa economia fluir e se libertar de dois jugos que o Ministério da
Cultura, na sua história, criou: o jugo da lei Rouanet, que é uma perversão a
toda política de financiamento que nós poderíamos ter nesse país. Imagine
uma legislação de incentivo à cultura, que sai do departamento de marke-
ting das empresas, onde alguns escolhidos (vocês sabem quem são), con-
seguem. Todo mundo aprova o projeto na KNIK, aprovar não é complicado,
difícil mesmo é conseguir captar o recurso. Aí você vai entrar e vai competir,
se você tem um projeto inovador com a indústria da música, a indústria cul-
tural, aí não dá para competir com a Ivete Sangalo. Não dá, ela vai levar. Ou
a peça da Globo; vai levar, lógico. Então, vejam a perversão de uma legisla-
ção. Coitado do ministro Rouanet. Ele diz que leva o nome da lei, mas ele não
quer nem saber dessa legislação, ele tem toda razão. Não estou dizendo que
a legislação não é boa, eu estou dizendo que ela virou a política de financia-
mento, então isso é a grande perversão.
A legislação de incentivo à cultura no Brasil não foi criada pelo ministro
Rouanet, ela vem do tempo de Celso Furtado, foi ele quem pensou a primeira
legislação de incentivo, ou seja, o papel do empresariado local apoiando a
iniciativa cultural do local. Não sei se vocês sabem que Celso Furtado foi mi-
nistro da Cultura, e foi convidado pelo presidente Sarney. Passou dois anos
no Ministério e tem gente que nem sabe que ele foi Ministro da Cultura.
O pensamento cultural de Celso Furtado é importantíssimo; ele entendia a
305RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
relação regional, e ele queria exatamente juntar empresa, fomento, finan-
ciamento, uma visão brilhante que foi completamente apagada. O outro as-
pecto terrível são os editais. Imaginar que um criativo, que um profissional
dessas áreas que eu estou me referindo tem que viver de editais. A gente
não come edital, a gente não tem uma vida sazonal. A gente precisa dar aos
indivíduos empreendedores a possibilidade de que eles possam realmente
se tornar empreendedores. Isso significa, portanto, uma terceira via onde eu
tenha microcréditos orientados, onde eu tenha fundos garantidores para es-
ses pequenos, onde eu possa avançar com as startups, com as aceleradoras,
os anjos, nós temos que pensar porque essa economia é colaborativa, nós
precisamos, saber portanto, de que forma os grandes podem financiar os
pequenos, porque o Brasil é um país de pequenos, de uma economia da pe-
quena empresa. No entanto, a gente fala isso, mas a retórica é muito maior
do que são as políticas e as nossas praxes.
Eu acho que há momentos que é preciso dizer que o rei está nu. Ele está
ali andando, a gente fica dizendo que ele está bonito, bem vestido, mas, às
vezes, é preciso que a gente, exatamente na chance de estarmos nessa
mesa tão qualificada, com um público também tão qualificado, termos algu-
mas indignações. Se perdermos isso, perderemos o jogo, e o jogo do Brasil.
Quando estive com a presidente Dilma, eu disse para ela: “Presidenta,
temos um plano, habemus um plano. Um plano que vai além do Brasil sem
miséria. E um plano que se coaduna com um Brasil Maior. Nós estamos fa-
lando de competitividade, de inovação, de profissionalização. Mas, nós te-
306
mos um Brasil criativo, e esse Brasil criativo é quase uma síntese, meio
Hegeliana, desses dois planos primeiros”. E ela me disse: “Faça”. Esse plano
foi feito. Ele envolve quatorze ministérios, porque a economia criativa, para
caminhar aqui para o final da minha fala, não é uma economia monopólio
do Ministério da Cultura, de forma alguma. Nós estamos falando de uma
economia criativa que está no desenvolvimento agrário brasileiro, e o MDA
é um parceiro fundamental.
A Ciência e Tecnologia, nesse momento, graças ao conjunto, começa a tra-
balhar com CVT’s, Hélio, voltados para os arranjos produtivos intensivos em
cultura, e nós vamos agora inaugurar o primeiro CVT da cadeia produtiva do
carnaval, no Rio de Janeiro. Porque a cadeia produtiva do carnaval envolve do
chapeleiro à costureira. A inovação dos carros alegóricos, que precisam de
engenheiro, um engenheiro que não tem. Então, nós estamos falando de uma
economia que envolve iluminadores, sonoplastia, direção de arte, é imenso e
nós os profissionais que nós precisamos; vocês acham que nós temos esses
profissionais? Não. São Paulo, hoje, não pode fazer dois longas metragens ao
mesmo tempo, porque não há profissionais que garantam a rodagem de dois
longas metragens na cidade de São Paulo. Então, há carência de profissionais,
e por que a gente não forma esse pessoal, Hélio? Eu queria realmente enten-
der, eu tenho muitas perguntas, eu voltei do Ministério cheia de dúvidas, com
muito mais perguntas do que respostas, mas eu estou dizendo isso, por quê?
Talvez a minha última reflexão seja pensar no que o ministro Gilberto Gil,
em 2003, quando andou o Brasil inteiro e chegou logo no início do governo
307RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Lula (que grande encontro foi aquele!). Ele dizia: “Nós temos que pensar a
cultura a partir de três dimensões”. E foi uma formulação brilhante; que ele
já vinha, na sua própria vida artística, ele também que foi um administrador
de empresas, ninguém sabe do lado científico do Gilberto Gil, mas ele é um
homem que sempre se preocupou com essa mudança de parâmetros men-
tais, que a ciência e tecnologia nos levaria, o que na verdade é isso.
O mundo do software livre o Gil já estava discutindo em 2003, há dez anos
atrás. Então, quer dizer, para onde vai, inclusive, a minha própria criação,
pensava ele, Gilberto Gil. Então, ele dizia: “Há três dimensões importantes
na cultura. A primeira é a dimensão simbólica. Bens e serviços que não têm
dimensão simbólica são commodities. E o Brasil vai passar a vida exportan-
do ferro gusa, suco de laranja, soja? Complicado. Até os chineses já estão
comprando menos. Onde vamos, para onde vamos nos próximos vinte anos?
Qual é o potencial e a vocação do Nordeste brasileiro, por exemplo?
Nós precisamos dos portos, nós precisamos das refinarias e das side-
rúrgicas. Nós precisamos melhorar nosso sistema de mobilidade, nós preci-
samos de estradas, nós precisamos de autoestradas, mas nós precisamos
daquilo que nós mais temos, que é exatamente essa criatividade. Um lugar
onde chove pouco, onde o céu é azul, onde há um grande potencial para o
turismo, onde nós temos que melhorar a qualidade do nosso serviço, onde
nós temos um artesanato pujante, onde nós temos uma riqueza de imaginá-
rios. O nosso Cariri é um vale inca do Peru, no sentido da concentração de
imaginários e de produção de riquezas. Aquilo ali não tem valor nenhum no
308
sentido turístico; não é destino de nada. O Brasil é lanterninha como destino
turístico no mundo. Então, nós temos aí, por que nós não conjugamos o des-
tino cultural ainda como a base de um turismo, que não é só do sol da praia,
tem que ser um turismo mais qualificado. Temos aí muitos desafios.
Mas, o Gil dizia: “A dimensão simbólica é fundamental. É ela que dá o
vigor e a força do que a gente produz, e essa é a grande marca país”. A se-
gunda dimensão é a dimensão cidadã. É a dimensão dos direitos culturais.
É que não é possível se construir cidadania nesse país se nós não nos apro-
priarmos e não formos protagonistas da nossa própria cultura. Se nós for-
mos sempre consumidores passivos da cultura exógena, nós vamos ser um
fracasso como projeto de país. Então, nós precisamos criar a figura do pro-
sumidor, o que produz e consome. O Brasil tem que ter mercados regionais
e vocações definidas, conhecidas e reconhecidas. As biojóias da Amazônia,
as paneleiras do Espírito Santo, o porto digital de Recife, o Instituto Sapiens
Parque de Santa Catarina, puxa vida, isso junto. Eu vi a montagem do pri-
meiro filme de animação do Brasil, chamado “Minhocas”. Olha, vocês não
imaginam o que é aquilo, soluções de tecnologia, caríssimas nos Estados
Unidos, que os professores da universidade, em Santa Catarina, resolvem,
baratíssimamente falando. Então, o Brasil podia ser um polo de audiovisual,
um dos maiores exportadores de games, jogos eletrônicos, do mundo. O Bra-
sil podia ser uma referência de audiovisual; como é que o Brasil não é? A
gente tem que se perguntar isso, para a gente responder por que não é. E aí
a gente vai avançar.
309RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Mas, a terceira grande dimensão de cultura do ministro Gilberto Gil, dita
aqui no Dragão do Mar, numa noite estrelada, era a dimensão da economia.
E ele dizia, em 2003, dez anos se passaram: “A cultura precisa assumir
sua dimensão econômica”. E eu me perguntei, quando cheguei ao minis-
tério, por que essa dimensão não avança? Por que ela não avança? E a
minha hipótese é a seguinte: há uma certa resistência, e aí eu fico pensan-
do que essa resistência tem a ver também com traços culturais e com os
nossos imaginários do século XX. No mundo das artes, nós somos sempre
atacados pelo fantasma frankfurtiano, onde falar de economia e falar de
arte significa a mercantilização, o capitalismo selvagem, a exploração das
artes e o fim delas, como dizia, o Adorno, lá em Frankfurt, nessa escola
importantíssima. Nós precisamos enfrentar, como dizia o Gil, a discussão
de políticas de economia da cultura, exatamente porque, se nós não fizer-
mos nós estamos liberando essa economia só para a indústria. E, aí sim,
veremos o final, a decadência, a anulação dos nossos bens culturais. Hoje
a gente vê a nossa expressão das nossas artesanias, o professor Renato
Ortiz diz que nós temos hoje um tal de “folclore internacional popular”,
que está presente em todas as nossas feiras, onde a gente acha os mes-
mos objetos, e eles vão do Oiapoque ao Chuí iguais. É a pasteurização da
nossa diversidade. É a anulação do que nos torna diferentes e isso é fruto
do esvaziamento do simbólico, e do não enfrentamento da discussão da
economia. Porque se nós não enfrentamos essa economia, o que acontece
com ela? Ela vai ser exatamente ignorada e, por isso, entregue aos grandes
310
monopólios, aos grandes grupos de comunicação, a uma tv que é fechada
e que não mostra o Brasil, a ausência da nossa possibilidade de termos
uma diversidade cultural e, então, todos perderemos ao final. Não basta
proteger o mico-leão dourado, nós temos que proteger a nossa expressão
cultural nordestina, gaúcha, amazônica, do Serrado, tudo isso está em vias
de extinção, tudo isso carece de política pública.
Então, acho que o Ministério ainda tem um olhar que é interessante, que
é um olhar “eu entendo da proteção das artes?”. Mas, nós não podemos nos
omitir da discussão da economia, por isso eu torço que a Secretaria conti-
nue, e avance, exatamente para que nós possamos intervir nesse mercado.
Porque deixá-lo e fingir que ele não existe é entregar o campo cultural brasi-
leiro às feras, aos poucos, à figura do indivíduo que faz, que é o atravessador,
que é aquele que compra a arte do Cariri, lá do espaço do mestre Espedito
Seleiro e que leva essa produção para a Alemanha, que leva para a França,
e aí nós vamos perdendo o que de mais importante temos. Isso perdido, não
há depois como reclamar ou como lamentar, perdido estará.
Então, eu espero; eu fiquei até feliz, Helena, porque eu andei procurando
outros padres cíceros para comprar, eu queria dar uns presentes para umas
pessoas, e soube que ele anda meio desaparecido. Me deu uma alegria gran-
de, eu queria te contar isso, que esse Padre Cícero, eu espero que ele não vi-
gore. Mas, não haveria nada mais simbólico do que imaginar que nós temos
já, hoje, no Nordeste brasileiro, Padre Cícero chipado; ele tem um chip e ele
canta benditos que foram gravados em baixo, exatamente, do horto onde
311RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
está a estátua do padre. Então, são simbólicas importantes que são muito
metafóricas dos nossos desafios.
Eu deixo a apresentação para quem tiver interesse em conhecê-la, os
desafios estão aí postos, eu não falei dos últimos que são os desafios dos
marcos legais, nós precisamos de marcos legais tributários, civis, constitu-
cionais, públicos, trabalhistas, previdenciários, autorais, para essa econo-
mia, porque hoje essa economia nem consegue avançar porque nós temos
problemas de aduana, de alfândega, nós temos problemas de circulação,
nós temos tributação de produtos que deveriam ter desoneração. Enfim, são
muitas as questões que envolvem essa economia. Eu espero que tenha podi-
do contribuir com essa discussão do olhar da economia criativa, e sou uma
entusiasta de que essa economia, como diz Tânia Bacelar, é uma economia
tão nordestina, embora a secretária não seja uma nordestina, que ela conti-
nue “lá” e que tenha longa vida. Muito Obrigada.”
Helena Lastres “professora, nós é que agradecemos essa competência e
esse seu estímulo tão contagiante.
A professora Cláudia salientou, reforçou a necessidade de articular
ciência, tecnologia e cultura com o desenvolvimento, assim como suas ins-
tituições, suas políticas, seus recursos, seus atores. Reforçou, dada a expe-
riência que acumulou, a necessidade de coordenar, que já vinha sido aqui
destacado pelos secretários anteriores, de coordenar, articular e dar conti-
nuidade às políticas.
312
E particularmente, nos fez lembrar da necessidade de entendermos que
há certos modelos de política que embutem decisões e ficam invisíveis como
se fosse aquele modelo o único e o neutro, mas que, na verdade, eles elegem
por definição seu campo de atuação. Atores, um conjunto muito restrito de
atores, de atividades e regiões, e, por outro lado, excluem os demais da pos-
sibilidade de apoio.
A secretária, professora, também nos alerta para a urgência e também
a grande oportunidade de avançarmos na contextualização, adequação, ga-
rantia de confiabilidade das nossas informações, dos nossos dados e, por-
tanto, dos nossos conceitos e modelos de compreensão da nossa realidade.
O que ela nos traz é esse reforço à necessidade de pensarmos um outro
desenvolvimento, o nosso desenvolvimento.
Qual é a nossa programação agora? Nós temos o nosso relator e já rece-
bemos uma série de perguntas, e convidamos, incentivamos aos senhores e
senhoras a enviarem novas perguntas. Então, depois de ouvirmos o relator,
nós vamos passar a cada um dos apresentadores, para responderem às per-
guntas que lhes foram dirigidas.
Nosso relator, o Carlos Manso, é dr. em economia pela Universidade Fe-
deral do Ceará e é Coordenador do Núcleo de Inteligência Industrial do Ins-
tituto do Desenvolvimento Industrial do Ceará, o INDI, da FIEC. Por favor, dr.
Carlos Manso.”
313RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Carlos Manso: “Bom dia a todos. Poucas vezes me foi dado uma missão as-
sim de uma atividade de relatoria e poucas vezes essa missão foi tão simples
de ser feita, porque uma mesa de palestras altamente claras, muito claras,
muito informativas e com uma moderação que pontuou cada palestra, quer
dizer, já deu a dimensão dos pontos mais relevantes, se fez uma costura
muito racional e muito correta dos temas aqui desenvolvidos. Então, o papel
de relator aqui está um papel bastante simplificado.
Eu só queria pontuar algumas coisas que eu imagino que sejam de com-
plementariedade, porque, logicamente, que enfatizar os pontos que foram
colocados aqui seria altamente desnecessário até também pelo adiantado
e, também, porque o foco maior é na questão das perguntas que vocês fize-
ram, que nós todos estamos curiosos para ouvir os expositores falando.
Na primeira palestra, o Aristides fez um brilhante resgate daquele mo-
delo, que a gente precisa sempre lembrar para poder fazer diferente, que é
um modelo em que se apostou muito em capital físico, o modelo de salvação
do Nordeste através dos incentivos para determinadas empresas e a aposta
no capital físico. O que era até natural porque era assim que a economia
imaginava. Na década de 50, os modelos de redoma, apostavam muito nes-
sa questão de que é capital físico, que é elemento transformador e que é o
motor do desenvolvimento. Essa história é uma história bem anterior até
aparecer um economista americano, chamado Solow, que mostrou que não.
Espera aí, não é exatamente o capital físico não, é uma combinação de ca-
pital, mas, principalmente, de tecnologia. E muito depois a economia coloca
314
“a tecnologia é importante, mas é importante quem faz a tecnologia, quem
inova, afinal das contas é o conhecimento que é relevante”. E aí, mais recen-
temente, os economistas estão colocando, “tudo bem, são as pessoas num
determinado ambiente que provocam externalidade, pesquisadores juntos,
com incentivos, mas eles precisam ter um ambiente institucional favorável,
marcos regulatórios corretos, etc.”. Então, essa é a história do desenvolvi-
mento, e o Aristides colocou algumas coisas muito relevantes para nós.
Nós ficamos, então, assim, se é o momento em que se cria a inovação que
é relevante, então, no final das contas, quem é realmente relevante para o
desenvolvimento de qualquer economia é o ser humano, é o indivíduo. E é no
indivíduo que deve estar o foco de todas as políticas públicas. Se é no indi-
víduo que tem que ser dado todo o foco das políticas públicas, então, sem
dúvida alguma, a gente volta para o discurso de educação. Por que educa-
ção? Sem dúvida alguma, é o elemento mais transformador que o indivíduo
tem. Nesse sentido, a defesa da educação é a defesa de toda uma melhora
dos arranjos institucionais e do próprio desenvolvimento econômico. Sobre,
eu não posso deixar de mencionar que, em termos de educação, a nossa
região Nordeste obteve ganhos expressivos nas últimas décadas num pro-
cesso que, infelizmente, a gente demorou a fazer esse dever de casa, que
era apostar na educação. Até pessoas geniais como, por exemplo, Celso Fur-
tado, a obra dele, você lê a obra inteira do Celso Furtado e você percebe que
ele ficou à margem, ele fez uma defesa tímida da educação, quase uma não
defesa. Você vê, então era questão de pensamento mesmo.
315RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
O Nordeste, apesar de ter tido, ele demorou, ou seja, se pensou muito
em desenvolver o Nordeste, sem desenvolver o nordestino, que era uma fa-
lha terrível. Mas, aos poucos, a gente vem correndo atrás de resolver esses
determinados problemas, tem gente que teve ganhos recentes de escolari-
dade. Nós hoje já nos aproximamos. Por exemplo, o Ceará, só para você ter
uma ideia, era um estado que tinha, há vinte anos, uma média de quatro
anos de estudo, sem ensino fundamental do primeiro ciclo. Hoje nós esta-
mos com uma média perto de sete anos, nós ganhamos três anos em média,
o Nordeste ganhou, o que não é pouca coisa. Mas, estamos longe ainda dos
países desenvolvidos e até longe das nossas outras regiões ricas do país.
Temos ganhos de escolaridade, mas veja uma preocupação que o Aristides
colocou, eu anotei aqui, que o Nordeste tem, ele colocou num gráfico, 19,3%
das matrículas de nível superior do país, mas, como ele mesmo enfatizou,
o Nordeste tem 28% da população. Ora, nós temos 28% da população e em
termos de nível superior nós respondemos por 19% das matrículas de nível
superior. Em termos, por exemplo, de pobreza a gente responde por quase
metade da pobreza do país.
Então, para a história ficar mais complicada, aquilo que o professor, dr.
Hélio Barros colocou, da preocupação com a formação de engenheiros e de
cientistas, que ele colocou o percentual que, com certeza, nos impactou. E,
professor Hélio, infelizmente, os dados recentes de avalições da educação
básica, eu acho que o senhor não vai ver esse aumento do percentual tão
cedo, infelizmente. Por quê? Nos exames nacionais de avaliação, o último
316
exame que teve de avaliação da educação básica, os nossos alunos na re-
gião Nordeste, numa escala de 13, numa escala que vai até 13, tem nível em
matemática em torno de 3 a 4; está ali por volta do quarto nível. Os alunos de
ensino fundamental têm grandes dificuldades com geometria, têm grandes
dificuldades com qualquer coisa que envolva abstração. Mas, é exatamente
esse desenvolvimento cognitivo que é fundamental para o aluno no futu-
ro entender e se apaixonar por ciências exatas, por matemática. Então, a
matemática causa ainda uma repulsa, há um pouco nível de apreensão da
matemática; isso nos força a repensar o modelo de educação. Nós sempre
falamos em gastos, o Nordeste tem 60% do gasto por aluno do Sudeste, por
exemplo. Então, nós realmente precisamos ainda de mais gastos em edu-
cação. Mas, nós precisamos ir além dos gastos. Nós precisamos de gestão
educacional, precisamos da gestão, inclusive, pedagógica. Será que esse
modelo de atendimento de aluno (os Estados Unidos repensaram; por exem-
plo, Nova York está com um sistema de ensino que os ensinos são, ou indivi-
dualizados, ou em dupla, ou em grupo, atendendo às necessidades de cada
aluno, quer dizer, eles passaram a pensar nisso é uma coisa para a gente
discutir no nosso modelo).
Então, nada nos garante que a gente vá ter o aumento de percentual de
incentivos a engenheiros com essa base, isso eu estou falando de escola
pública e privada, esse nível aí. A escola particular está um pouco acima,
mas também não é nada grande coisa. Então, essas escolhas, as escolhas
no nível superior parecem que já são determinadas, porque, infelizmente, a
317RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
educação é cascata. O professor Hélio fez um diagnóstico muito preciso do
nível superior de nível tecnológico. A professora Helena também colocou a
questão do básico, mas os nossos problemas aqui no nível médio tecnológi-
co e no nível superior podem muito bem estar sendo criados aqui, no nível
básico, com a falta de escolas integrais, com a falta de creches, naquela
parte do desenvolvimento cognitivo tão importante, que os neurocientistas
já provaram que é tão importante.
E falando, especificamente, assim, a questão da inovação, só queria pon-
tuar, Aristides, que é assim, o Brasil não está preparado para inovação tam-
bém porque inovação se perde dinheiro; nós só vamos fazer inovação se nós
tivermos o direito de errar, ninguém acerta inovação na primeira, às vezes
você precisa de vários experimentos até conseguir uma solução para um
determinado problema da indústria ou da sociedade. Então, o problema com
as nossas fontes financiadoras de tecnologia de inovação também é esse,
nós não estamos preparados para o erro. Quando o industrial erra, quando o
empresário aposta em inovação e ele erra, perde o crédito para a vida inteira,
ele é marginalizado inclusive. Então, é preciso repensar isso também nesse
sentido. Nós devemos ter o direito de errar em inovação.
E, só para uma questão de ponta, eu não poderia deixar de fazer grandes
elogios também à defesa apaixonante que a professora Cláudia fez da in-
dústria criativa. Eu já tinha lido vários artigos, nunca tinha visto uma pales-
tra dela, e é tão importante isto. Eu só queria colocar um ponto que eu acho
que a indústria criativa deve ser colocada assim como um dos motores, um
318
dos possíveis canais de dinamismo, até para tirar o peso de ela ser a respon-
sável. Ela vai ser um dos ingredientes nessa receita inteira.
E para finalizar, só convidando vocês, na questão da indústria criativa, a
visitar os eventos de choro e cachaça, chorinho, da cidade mais bonita do
mundo. Eu fiz uma pesquisa e cheguei a essa conclusão que é a cidade mais
bonita do mundo e que se chama Viçosa do Ceará. Então, visitem, levem bas-
tante dinheiro para lá e ajudem a dinamizar a economia. Muito obrigado.”
Helena Lastres: “Agradeço ao nosso relator, Carlos Manso, e vamos fechar
o recebimento de perguntas. Já recebemos ótimas questões para debate, e
eu acho que, como a gente tem meia hora, em meia hora, dez minutos para
cada um dos expositores responderem.
E, como faltam dois minutos para o meio-dia, eu vou pegar uma caro-
na aqui na fala do Carlos, muito rápida, para lembrar, reforçar essa ne-
cessidade, sim, de aprendermos com erros e acertos, e é um processo de
aprendizado, e nada como colocar a mão na massa. E lembrar também
que, do mesmo jeito que a secretária Cláudia mencionou os vieses de al-
guns tipos de apoio à cultura, na área de inovação a gente ainda tem essa
grande barreira a avançar. Em geral, quando a gente fala em inovação,
todos os indicadores se referem à pesquisa e desenvolvimento, a chamada
P&D. Pesquisa e desenvolvimento se der bom resultado, em geral é uma
nova ideia, é uma invenção, que para ser incorporada pelo sistema produ-
tivo, e aí, sim, virar inovação, precisa de muita coisa no caminho. Inclusive
319RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
tem literaturas clássicas desde os anos 50 que discutem porque algumas
invenções jamais se transformaram em inovações. Ou seja, foram incorpo-
radas pelo sistema produtivo, sistema produtivo sem preconceito, olhando
da agricultura mais tradicional, do artesanato indígena até os serviços de
cultura mais sofisticados, passando pelo setor primário, secundário, ter-
ciário, como um todo. Mas, essa contribuição clássica discute por que que
algumas demoraram anos, outras foram mais rápidas, enfim, e algumas
nunca se realizaram.
Então, o que eu gostaria de chamar atenção é que do mesmo jeito que
essa mesa colocou de várias formas essa necessidade de a gente entender
os nossos parâmetros, eles são orientadores. Se a gente pensar em P&D, a
gente vai ter que chegar à conclusão também que só quem faz pesquisa e
desenvolvimento são grandes, megaempresas. Se a gente tiver uma políti-
ca pautada por isso, a gente está excluindo micro e pequenas empresas da
possibilidade de ter apoio.
Possivelmente, quando a gente está pensando em pesquisa e desenvol-
vimento, a gente está maiormente mirando nas tecnologias de ponta, nas
de fronteira, e estamos colocando de fora também todas aquelas inovações
incrementais que são da maior importância para a sobrevivência, para o de-
senvolvimento dos nossos arranjos e sistemas produtivos de todo o tipo que
existem no Brasil.
Bom, enfim, dito isso, eu dei tempo a vocês de mandarem mais algumas
perguntas e já vou ler algumas delas, que foram enviadas à mesa, de forma
320
mais geral. Enquanto eu estou pedindo apoio ao meu colega, eu vou ler a
primeira, que foi enviada pela Maria José, Técnica do BNB:
“O que o Integra Brasil, com seus eminentes estudiosos, gestores públi-
cos, líderes empresariais, poderia fazer pela atualização das instituições
regionais e para as novas políticas do desenvolvimento do Nordeste aqui
apontadas?”.
A outra pergunta foi encaminhada pelo Felipe Scarcela, que é presidente
da JPS Ceará e Acadêmico de Ciências Sociais da UFC:
“Quais os maiores desafios em interiorizar essa percepção de cultura
como economia e construir políticas de incentivo à economia criativa, dan-
do uma solução viável e limpa para o desenvolvimento dessa região?”.
Pergunta de João Pratagil, da EMBRAPA, ele pergunta, entre outras coi-
sas à reflexão:
“Por que há tanta descontinuidade das políticas públicas? Que razões
explicam tanta descontinuidade? O que precisa mudar nos três principais
agentes, governo, academia e empresas, para termos esperança no futu-
ro?”. E pergunta, ademais: “Onde entra a inovação social?”
O mesmo João Pratagil, da EMBRAPA, enviou uma outra questão: “Por
que a prioridade está colocada em inovação, cuja aplicação enfrenta várias
barreiras? Por que não promover a imitação criativa, como fez a Coreia e o
Japão?”.
Eu vou dar a palavra por ordem, mas já vou chutar um pouquinho, encami-
nhar essa questão que foi colocada agora pelo Pratagil.
321RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Tudo depende do conceito que você tem de inovação. O conceito que eu,
em particular, prefiro usar é aquele que diz que inovação é incorporação,
pelo sistema produtivo, de novo olhar, de forma ampla, de uma nova ideia. In-
dependentemente, uma nova forma de produzir alguma coisa, o que ou como
produzir alguma coisa, bens e serviços, independentemente se aquilo é novo
para o resto do mundo ou para o seu vizinho. Eu acho que essa é a definição
mais ampla. Aí me perguntam: “Ah, mas a política fica uma coisa enorme”.
Não, uma coisa é definição de inovação, que tem que ser ampla, não pode
embutir escolhas políticas, colocar, pela própria definição, de fora da agen-
da de política uma série de atividades, atores e regiões. O que vai orientar a
estratégia daquele governo, daquele governo de estado, daquele governo fe-
deral, daquele banco de desenvolvimento, enfim, daquela instituição pública
ou privada, naquele momento é outra coisa. Nesse período, eu vou estimular
as inovações que permitam a erradicação da miséria. Suportar o desenho de
um plano como um Brasil Maior. É isso que vai fazer a delimitação da agenda
de prioridades de apoio à inovação, não é o conceito que tem que fazer essa
escolha, tá certo? Eu acho que isso é uma mensagem que ficou muito clara
nas várias falas dessa mesa.
Dito isso, é lógico que a imitação criativa, inclusive, é vista como a mais
sólida fonte de informação para a inovação, que chamam de engenharia re-
versa, de cópia, enfim. Mas é isso, é você pegar uma ideia que já existe, e o
conhecimento é assim, um conhecimento novíssimo, radical, é muito raro.
Em geral, as inovações, e mesmo as radicais, elas se constroem em cima
322
de um conjunto de conhecimentos que foi acumulado ao longo dos anos, ao
longo dos tempos. Inclusive, tem muita gente que discute toda a questão de
propriedade intelectual porque restringe, apropria, e restringe e sim, embar-
reira uma série de outras inovações ao conceder à propriedade privada da-
quele tipo de uso daquele conhecimento que, na verdade, nunca é individual,
o conhecimento é coletivo. Vamos, então, usar esse poder do conhecimento
coletivo dando a palavra para os nossos expositores. Aristides, por favor.”
Aristides Monteiro: “Então, eu vou responder isso, João, que você pergun-
ta primeiro, ‘por que tanta descontinuidade nas políticas e que razões ex-
plicam?’. Eu acho que nós estamos num momento do Brasil que é preciso
já ter algumas ponderações acerca desse tipo de afirmação. Temos mesmo
descontinuidade políticas, acho que sim em níveis tópicos ou até de refor-
mulação, o que é importante. Agora, eu tratei, ao longo da minha apresen-
tação hoje, por exemplo, de algo que eu venho falando mais, organizando
meu pensamento e minha leitura do Brasil, sobre a ideia do pacto. Então,
nós temos um pacto, que eu chamei o federalismo, por exemplo, o social, o
federalismo do bem-estar social. E nós estamos construindo isso já há duas
décadas. A sociedade se mobilizando, o governo fazendo políticas que, no
atacado, estão orientadas por isso, por esse norte. Não há descontinuida-
des. É preciso olhar para esses grandes movimentos e olhar os da conjuntu-
ra, os que andam, políticas que são pensadas no seio desse grande pacto,
desse grande movimento, e que não dão certo. E que precisam ser refeitas.
323RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Elas são contingentes, elas têm o seu momento histórico, elas servem para
um determinado estado da federação, não servem para o outro. Por exemplo,
nós fomos muitos, nas últimas décadas, e terminou refluindo, contaminados
pelas ideias, por exemplo, pelas boas práticas de governo. Então, haveria um
modelo mais geral de boas práticas; isso está meio que se acabando, porque
é verdade que algumas guardam similaridades, mas nem todas, porque os
agentes são locais, porque o contexto histórico é outro, é isso.
Então, eu não vejo desse modo. Eu não vejo com essa, “Ah, o Brasil tem
tanta descontinuidade política”. Eu acho que, no geral, a gente está acer-
tando e tem uma série de pequenas coisas. Eu acho que isso é mais visível
na política municipal ou na política até mesmo estadual, isso é verdade.
Mas, há direção dos grandes movimentos, quer dizer, os governos esta-
duais, os governos municipais, constitucionalmente estão sendo instados
a investir cada vez mais em educação, em saúde. A gente sabe muito bem,
por exemplo, que se não houvesse esse pacto e essas restrições para uso
dos recursos públicos, os agentes públicos, os governadores e os prefeitos
usavam recursos para outros fins, para construção de obras que se esva-
ziavam em si próprias. Então, nós estamos agora num outro momento, que
a nação decidiu que quer trilhar um caminho, esse caminho tem custos.
Então, eu não vejo tanta descontinuidade, mas entendo que há algumas de-
las. Isso é um problema cultural, político, que a gente não vai resolver, mas
a gente talvez, os pesquisadores, todos nós cidadãos, a classe empresaria
tenham uma capacidade enorme de influenciar o definido da política ou
324
aquele que executa a política, para que, se ela é correta, que ele não a des-
trua. Então, esse é um papel da cidadania. Precisamos criar mecanismos
para isso? Precisamos.
Com isso, eu quero dizer que não vejo problema tanto quanto você vê,
com pessimismo, mas algumas razões estão na cultura. Por exemplo, preci-
samos, ainda, estamos no meio do caminho, da criação de uma cultura da
burocracia estatal permanente, aquela que os governos passam, os gover-
nantes passam, e eles ficam, eles guardam memória, e eles podem ser o ins-
trumento que torna estável a política, as dimensões da política. Então, nós
estamos ainda no meio do caminho disso, precisamos ainda ir mais adiante,
constituir essa burocracia motivada, pública, que permanece.
Então, eu acho que poderíamos caminhar. Eu tenho algumas outras per-
guntas, essa era mais geral, que serve para todos, e tinha algumas outras
que indagam se os empresários não deveriam estar nos conselhos das agên-
cias de fomento. Sim, deveriam. Em vários casos, eles estão. Eu lembro per-
feitamente que os avanços da política de ciência e tecnologia da década
recente, que incentivou para a criação de leis de inovação, de conselhos
estaduais de ciência e tecnologia, eles têm o assento do empresariado, da
academia, mas do empresariado local. Isso deve permanecer e deve ser acir-
rado. Então, assim, estão sendo criados fóruns pelo Brasil inteiro, já existe
uma certa institucionalidade; talvez, ela não esteja ainda fortalecida e visí-
vel o suficiente, porque a agenda talvez não tenha, da ciência e tecnologia da
inovação, não tenha ganho a dimensão que é necessária. Então, eu concordo
325RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
sim, devem estar nos conselhos das agências de fomento sim, para colocar,
inclusive, as suas dificuldades.
A FINEP bate cabeça porque lança editais, os famosos editais, que eu
quando estava na secretaria achava uma loucura porque isso obrigava, por
exemplo, as secretarias de ciência e tecnologia a ter uma pessoa que fica
junto de um computador, abrindo a internet, para saber se o MCT vai abrir
um edital. E, então, a gente tem que tirar imediatamente um projeto da ga-
veta, em algum momento do ano, para competir com o edital. Então, esse
formato foi pensado para umas realidades, ele tem méritos, mas ele precisa
ser aperfeiçoado. As empresas no Brasil que, em geral, não têm grupos de-
dicados de forma permanente para inovação, ou empresas pequenas, por
exemplo, que não podem arcar com esse custo, não podem concorrer a edi-
tais. Mas, isso poderia ser um papel em que as federações de indústrias, os
centros de indústria, da indústria mas da agricultura, poderiam estar, quer
dizer, o sistema empresarial poderia estar próximo para ser capaz de contri-
buir na definição do edital, da proposta, mas também da qualificação dele.
Então, é isso. Quando eu falava que a agenda precisa de interação daquelas
três partes, é disso que se trata, é um aprendizado. E eu sei que o sistema
empresarial brasileiro está nesse caminho.
Alguém tinha comentado, um colega, se há possibilidade, visando redu-
ção das diferenças regionais, de políticas de execução ainda, de políticas
protecionistas agressivas. Eu não creio, eu acho que esse momento passou,
ainda mais que, no caso regional, no território nacional isso não é possível.
326
Quando eu falo que o Nordeste cresceu, que nós montamos uma política
regional desde os anos 60, que isso tinha uma clara adesão e recebia es-
tímulos e, obviamente, recebe também oposição, do sentido da integração
nacional, não se é mais possível barrar, fechar, mercados do Nordeste. Isso
não é mais possível. As grandes empresas, que são extrarregionais já estão
aqui, contribuem para o desenvolvimento. A discussão é outra. A discussão
é como uma agenda como essa, de ciência e tecnologia e de inovação, pode
contribuir. Se isso não é possível, no caso do Brasil, numa região dentro do
Brasil, não é mais possível também no mundo. Cada vez esse raio de ma-
nobras diminui, pela entrada do Brasil nos acordos comerciais, que foram
feitos por governos eleitos, democraticamente. Quer dizer, os empresários
aqui não estão assustados e não viram isso acontecer; viram tudo isso acon-
tecer. Nós firmamos acordos internacionais para podermos exportar frutas,
exportar ferro, o que quer que seja. Nós abrimos mercados para poder ter
acesso a outros mercados.
Então, os países desenvolvidos, e para eles, cada vez mais há política. E a
agenda de ciência e tecnologia e inovação é o diferencial para romper com
a repressão dos mercados. Quer dizer, você consegue mercados outros se
você inova. Então, é disso que se trata. No caso do Nordeste, nós precisa-
mos tratar.
Eu fui provocado pela mesa, eu ouvi atentamente as colocações dos
meus colegas e eu fico com muitas dúvidas, eu queria dividir ainda. Aí veio
a brilhante discussão da economia criativa e de novos potenciais que advêm
327RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
da cultura, da inteligência, que nós não vemos, que nós ainda nem somos
capazes de perceber. E, então, essa discussão que, para mim, eu acho meio
anacrônica, eu vi muito isso na secretaria, eu vi muita gente reclamar, quer
dizer, essa coisa de engenheiro. É a discussão se falta engenheiro, mas é
uma discussão também, por exemplo, em Pernambuco, se faltava pessoas
para software, para não sei o quê. Eu acho isso uma coisa meio, que é pre-
ciso tratar disso e formar, é verdade. Agora, é preciso colocar tudo isso em
contextos históricos que nós paramos em algum momento de formar porque
não havia mercado para essas pessoas. Não é porque tem uma mente que
resolveu que não quer mais ter engenheiros no Brasil, mas é porque forma-
mos e eles não foram mais.
A outra coisa, é que eu não sei se numa estratégia mais, a que o Brasil
vai seguir, que certamente ela inclui a inovação na indústria, a inovação ma-
nufatureira, mas ela é uma inovação de um tipo diferente, da Amazônia, da
biotecnologia, dos fármacos, que há outras contribuições. E mesmo da eco-
nomia criativa, que não é apenas um engenheiro. Eu vejo essa discussão do
engenheiro, ainda, a formação do sistema nacional de ciência e tecnologia
nos anos 1950 e 1960, a preocupação se íamos ter engenheiros, físicos, não
sei quê. Mas, hoje, o tecido se ampliou. Nós precisamos sim, de engenheiro,
mas precisamos de outras dimensões: os sociólogos para dizerem coisas
diferentes para nós; por exemplo, por que nós não temos ao lado da indústria
de fruticultura que precisa construir. Um empresário, na semana passada,
no Rio, estava dizendo, um empresário daqui do Rio Grande do Norte, que
328
a fruta tem um grau de um dia de maturação; rapidamente tem que ir para
um frigorífico, ir para a Europa, não sei quê. Por que, ao lado disso que é im-
portante, por exemplo, nós não temos frutas desidratadas? Uma produção
maior para exportação, para as merendas das escolas, para que o sistema
público da educação compre e que as pessoas possam comprar frutas de-
sidratadas. Quer dizer, esse tipo de coisa, talvez um engenheiro preocupado
não dê conta, é preciso ter outras.”
Helena Lastres: “Obrigada. Houve uma provocação aqui. Pela organização
do evento, eu estou pedindo para informá-los que as entregas de certifica-
dos vão ser concedidos após o painel de encerramento na secretaria, hoje à
tarde. E que, às 13 horas, por isso que eu estou aflita e peço desculpas, nós
vamos ter o painel que ontem foi interrompido por conta da falta de ener-
gia. O painel “Transformações Sociais, Urbana e Ambiental” às 13 horas e o
almoço às 12:30. Dito isso, eu passo imediatamente, para as suas palavras
finais, o secretário Hélio Barros.”
Hélio Barros: “Com relação à matemática, que foi objeto de uma provoca-
ção sua, bastante conhecida por sinal, porque os dados estão aí, o problema
é o seguinte: é que nós estamos com um ensino fundamental aumentando
escolaridade, isso não há a menor dúvida. o Brasil aumentou a escolaridade,
o Brasil não tem é professor do ensino fundamental, esse é que é o proble-
ma. Nós estamos com uma enorme deficiência nesta área. E não haverá nem
329RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
engenharia, nem ciência, grande em amplitude, porque eu estou falando em
amplitude, é aumento da quantidade e da qualidade. Porque qualidade nós já
temos, qualidade para fazer os engenheiros que nós temos hoje, os cientis-
tas, nós temos. Nós temos coisas excepcionais, inclusive para fazer inova-
ção de muito boa qualidade. Eu não estou, obviamente, querendo competir
com os centros tradicionais, não é isso. Eu reuni aqui no Ceará há alguns
anos atrás, em 2004, o Silvio Meira e mais um grupo, trazendo os cientistas
e os empresários. Nos fechamos durante vinte e quatro horas de discussão,
entrou noite adentro. Eu disse, você traz os seus melhores empresários de
Pernambuco, e eu vou trazer uns dois ou três do Ceará. Vamos empatar em
número para não ficar desequilibrado e vamos conversar sobre o que a gen-
te pode fazer. Tem muita qualidade. Eu tenho aqui uma lista de centros den-
tro da Universidade Federal do Ceará, que pouca gente conhece, fazendo
excelente trabalho na área da física, na área da eletrônica e em várias áreas,
fármacos, coisa de muito boa qualidade. Portanto, isso aí, nós estamos indo
bem, ninguém tenha dúvida, o grande problema é o resto, e o resto é o maior,
e é muito grande. O resto é maior e é muito grande. Eu não posso estar feliz
num estado ou numa região, porque isso é média, é coisa muito parecida,
em que você tem ainda, por exemplo, só no Estado do Ceará entre duzentas
mil crianças fora da idade na sala de aula, faixa etária fora da sala de aula.
Então, resultado, isso ninguém recupera. Não é fácil recuperar isso, não.
Nós precisamos de dinheiro é para empreendedorismo, não é só para fazer
engenheiro de alta qualidade não, é empreendedorismo. E esse engenheiro
330
que eu estou colocando aqui pode ser tecnólogo, pode ser tecnólogo, não
precisa ser o engenheiro formal da universidade. O tecnólogo que também
é ensino superior.
Não vou entrar, obviamente, nem tenho tempo para discutir isso. O que
eu quero dizer claro é o seguinte, é que as políticas no Brasil estão muito
demoradas, porque você não consegue fazer muitas correções e isso tem
a ver com decisões erradas de governo, tem a ver com decisões erradas de
governo. Vou dar um exemplo bastante simples. Eu estou aqui hoje, porque
eu moro no exterior, eu estou aqui hoje no Ceará porque eu dou um curso de
matemática, de português e de ciências para professores africanos. Em cin-
co anos, eu trouxe ao Ceará todos, quando eu digo todos não estou falando
99% não, é 100 e mais de 100%, porque tem gente que vem duas vezes, to-
dos os professores de Cabo Verde. E a ideia é de fazer isso em várias outras
áreas e em outros países. Esse projeto nasceu para fazer no Ceará, não foi
para fazer em Cabo Verde. Quando nós começamos, o Cristóvam, na época
Ministro da Educação, se entusiasmou tanto que me financiou tudo de que
eu precisei. Só que aconteceu o seguinte, o governo federal gostou tanto do
projeto que copiou o projeto e acabou com o do Ceará. Só que copiou erra-
do, copiou a festa, não copiou a substância. Copiou a olimpíada, não copiou
a formação do professor pós-olimpíada. A olimpíada é um instrumento que
detecta fragilidades, ele mobiliza, ele estimula, mas detecta fragilidades.
Uma olimpíada diz ao professor o que ele não sabe, porque o aluno dele não
foi capaz de responder. E essas olimpíadas mostram exatamente isso. Em
331RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
olimpíada nacional, o presidente Lula até ficou encantado, me honrou muito,
porque foi uma ideia que era nossa, daqui, lançou, recebi um belo ofício, da
época, o Ministro da Ciência e Tecnologia, o atual governador de Pernam-
buco, e mais um outro ministro, dois, agradecendo a colaboração do Ceará
nesse projeto. Só que a cópia foi errada. Então, nós não temos matemática
no país, nós temos excelente matemática no IMPA. Nós temos excelente
matemática localizada em algumas universidades; você tem em Pernambu-
co, um nucleozinho pequeno, pequeno, não é muito grande não. Quando a
gente diz assim “é porque tem quarenta doutores”, o que é isso, um núcleo
pequeno.
Então, o que nós estamos vendo é o seguinte, é que nós estamos com um
país crescendo sem matemática. Ninguém tenha dúvida disso. Eu agradeço
muito e lamento não poder fazer os outros comentários, inclusive umas per-
guntas, mas o tempo não permite.”
Cláudia Leitão: “Deixa eu ser mais rápida ainda, porque nós já acabamos o
tempo. Eu queria agradecer imensamente.
As perguntas aqui dizem um pouco a respeito às mesmas questões, o pa-
pel dessa economia do simbólico no Nordeste. Eu também queria concordar
com o meu colega do IPEA, quando ele fala: “é importante nós não sermos
messiânicos com visões de desenvolvimento. Nenhuma visão de desenvol-
vimento salvará, a curto prazo, um país nem uma região”. Eu tenho muito
medo disso. Houve um tempo que no Ceará se dizia que o turismo ia salvar o
332
Ceará. Isso é uma ilusão, é uma bobagem. Então, nós precisamos é aprofun-
dar e dar complexidade a um discurso que envolve várias variáveis. Agora,
não colocar essa questão também seria um desperdício. O meu papel é pro-
vocar, nessa perspectiva de um desenvolvimento, onde se possa tratar esse
grande potencial; cultura nordestino, para um projeto de desenvolvimento.
Eu estava vendo aqui no meu facebook uma reunião que vai acontecer
no Pará, agora, hoje ou amanhã, sobre a situação da Ilha do Marajó. Eu acho
que é muito simbólico imaginar o arquipélago da Ilha de Marajó, que é a
maior ilha fluvial do mundo, é formado de dezesseis municípios. Esses muni-
cípios têm o menor IDH do Estado do Pará. Eu estou dizendo para vocês que
a Ilha do Marajó tem o menor IDH do estado, que já miserável, que é o Estado
do Pará. Eu fico pensando se essa ilha e tivesse na Austrália, porque o quê
que acontece? Como há uma compreensão e uma decisão, e política de um
outro desenvolvimento, ter uma Ilha do Marajó, que vai da apropriação do
leite do búfalo às festas populares, às cerâmicas marajoaras, é brincadeira
que a indigência dessa ilha seja uma coisa expressionista. Então, nós esta-
mos adiante disso. Acho que, reunindo aqui nossa conversa, nós estamos
dizendo que estamos montados em cima de uma galinha que tem ovos de
ouro; agora esses ovos podem ficar dentro da galinha e até nunca serem
desovados. Mas, que esse debate nos apontou aí, não é, Helena, a chance
de estar nessa mesa, também, os colegas com os quais eu dividi essas ques-
tões, é porque todas elas estão conectadas à formação dos professores em
matemática, à questão dos engenheiros, que vão bater lá nos carros alegó-
333RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
ricos da Marquês de Sapucaí, do carnaval brasileiro, tudo está ligado. Essa
conexão é que talvez nos falte.
Tivemos uma formação que é muito de uma educação compartimenta-
da, temos hoje um estado brasileiro que é todo em caixinhas, as caixinhas
não podem conversar e não há interesse que elas dialoguem. Então, nós não
temos políticas que atravessem ministérios, que atravessem secretarias.
A pergunta, portanto, é: que desenvolvimento nós queremos e qual estado
nós precisamos ter para esse desenvolvimento? O estado brasileiro que aí
está não vai realizar esse novo desenvolvimento. Então, precisamos de uma
reforma do estado. Nossa última reforma do estado foi do Bresser Perei-
ra. Precisamos pensar sobre isso. Nos últimos anos, a gente vem fazendo
gambiarras, gatos institucionais para resolvermos problemas. É um estado
fragilizado, a estrutura do estado não dá mais conta de dialogar com a so-
ciedade; pelo contrário, viramos as costas para a sociedade. Hoje não pode-
mos mais nada em termos de direito público, de direito administrativo. Hoje
o estado só pode repassar recurso com o próprio estado, nós não podemos
mais. As ONG’s foram diabolizadas. A situação, hoje, do direito administra-
tivo brasileiro é dramática, meus caríssimos.
Então, essas reflexões são fundamentais pra gente pensar como pode-
mos avançar, senão ficaremos só nos lastimando. Mas, temos hoje um poder
judiciário que precisa entrar nessa discussão, um Ministério Público que
tem que estar presente, uma controladoria geral que tem que dar as solu-
ções, porque gestor público hoje no Brasil vai preso, especialmente se ele
334
for honesto. Então, nós temos aí várias questões para resolver, uma gestão
paralisada em função de um estado paralisado, fragilizado, que não con-
segue responder às demandas do século XXI. São essas as questões que a
gente veio falar aqui hoje. Muito obrigada.”
Helena Lastres: “A moderação dessa mesa é que agradece a oportunida-
de de estar moderando expositores que trouxeram à nossa discussão essas
reflexões tão importantes e, para encerrar, eu gostaria de retomar as co-
locações da secretária Cláudia, que temos muitos desafios sim. E tem um
economista, que nos deixou há dois anos atrás, Fábio Hebert, que dizia que
não adianta só um belo projeto de desenvolvimento, a gente tem que ter um
mínimo de base político-institucional que os apoie. Eu entendo, e endereçan-
do particularmente à questão que foi enviada à mesa pela colega do Banco
do Nordeste, a nossa aflição. Todos nós temos muita aflição de ver as coi-
sas funcionarem mais rapidamente, mas eu queria aqui reafirmar que, como
uma pessoa que já passou, e muito, dos cinquenta, eu já vi outro país, eu já
trabalhei no governo brasileiro em outras fases, e a minha satisfação, a mi-
nha alegria de ver um governo que trabalha pela democracia. É muito mais
difícil trabalhar construindo consensos numa democracia. Eu já trabalhei no
governo numa época de ditadura e era muito mais fácil. A gente tinha pro-
grama, a gente tinha meta, todo mundo fazia, ai de quem não fizesse. Mas,
a gente sabe o que tinha de efeito colateral dessa época também. Eu prefiro
enfrentar as dificuldades. E acho que esse seminário contribui muito para o
335RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
que todos nós queremos, como foi colocado aqui, a construção dessa base
que coloque no centro propostas, que suporte, que tenha condições de enca-
minhar, de construir consensos, de forma a suportar essa nossa expectativa
de um desenvolvimento maior.
Eu também não posso deixar de falar, que eu concordo com relação a
perguntas sobre protecionismo que o colega já colocou, e a gente tem uma
nova fase na geopolítica, na economia mundial, os tempos mudaram. Mas,
também, a gente tem um outro poder de barganha e tem uma coisa que eu
não chamaria de protecionismo, mas eu chamaria de política justa, de tratar
desiguais como desiguais. E nós temos, no Brasil, ainda adotado formas que
tratam elementos, atores, oportunidades, completamente desiguais como
se iguais elas fossem. E isso tem muito a ver com as nossas discussões so-
bre o desenvolvimento regional.
E então, de novo, eu acho que a mensagem poderosa que essa mesa toda
deu é que a gente ter conceitos mais nossos, perspectivas mais nossas, mo-
delos de política nova ajuda muito a tratar essa desigualdade como uma
questão de justiça, não de proteção, mas de justiça. Então, uma nova forma
de política que seja capaz de abordar sim.
A mesa inteira falou de como caminhar mais rápido e de forma vigoro-
sa, avançando na superação de retórica, mistificações, e ancorando a nos-
sa cultura às nossas formas de pensar, aos nossos modelos de política. A
mesa mostrou como é que a educação, ciência e tecnologia, e cultura, como
grandes estrelas guias do nosso desenvolvimento brasileiro, podem iluminar
336
caminhos de desenvolvimento para o Nordeste, que foi a questão que trou-
xeram aqui, nas palavras do meu atual presidente, Luciano Coutinho, no BN-
DES, e que consiga o Nordeste realmente ter essa capacidade de mostrar
ao Brasil inteiro como ganhar o jogo; como disse a secretária Cláudia, não
ganhar o jogo da competição com alguém, mas de nós mesmos, nas nossas
amarras que nos impedem de avançar. Ou seja, de revelar para o resto do
país as oportunidades de uma forma de desenvolvimento, não só dinâmica,
mas, ao mesmo tempo, realmente adequado às nossas condições, ao apro-
veitamento das nossas oportunidades, inclusive coeso.
Com isso, mais uma vez, eu agradeço o convite e parabenizo os meus
colegas de mesa, e o relator, pelas grandes sugestões, reflexões, que deram
aqui hoje, e a todos vocês que estiveram aqui hoje e contribuíram com essas
questões da mais alta relevância. Muito obrigada.”
Painel 6: A Questão Político-Institucional e o Desenvolvimento do Nordeste
Moderador
Filomeno MoraesProfessor titular do Programa de Pós-Graduação em Direito Constitucional da Universidade de Fortaleza - UNIFOR
Sérgio Duarte de CastroSecretário de Desenvolvimento Regional do Ministério da Integração Nacional
Fernando Antonio Rezende SilvaProfessor da Fundação Getúlio Vargas - FGV
Pedro Eugênio de Castro Toledo CabralDeputado Federal (PT/PE) e coordenador da Bancada do Nordeste
Relator
Alcimor Rocha NetoProfessor de Direito Constitucional da Universidade de Fortaleza - UNIFOR e doutorando em Direção pela Universidade de São Paulo - USP e Universidade de Coimbra
339RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
PAINEL 6
A QUESTÃO POLÍTICO-INSTITUCIONAL E O DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE
QUESTÕES A SEREM RESPONDIDAS PELOS EXPOSITORES
Em um país continental, com acentuadas diferenças e disparidades re-
gionais de renda, é fundamental a intervenção do Estado no sentido de
promover o desenvolvimento nacional de forma integrada e tanto quanto
possível equilibrada, como tem o mesmo se comportado no caso brasileiro?
Tomando-se por base a distribuição regional da receita pública nacional,
a renúncia fiscal federal, a atuação do sistema bancário oficial e os investi-
mentos públicos da União e das estatais federais, o que se pode dizer sobre
o papel do governo federal em favor do desenvolvimento regional e do com-
bate às desigualdades regionais de renda no Brasil?
Como fortalecer a Federação brasileira e conferir maior poder político às
regiões? Haveria a necessidade de se recriar um fórum político regional nos
340
moldes que foi o Conselho Deliberativo da SUDENE em seus primórdios?
Se a resposta for sim, como fazer para que os governadores o valorizem de
fato?
Na medida em que o governo federal tem, cada vez mais, substituído o
tratamento regional pelo social, ainda haveria lugar para os organismos re-
gionais. Se for sim a resposta, como reposicioná-los?
Como convencer o restante do País de que, para se manter a unidade fe-
derativa, evitando-se a fragmentação da Nação, é imprescindível reduzir as
desigualdades regionais?
Há uma corrente que defende que, para se fazer cumprir os dispositivos
constitucionais referentes à questão regional, sabidamente letras mortas – o
critério populacional na distribuição dos investimentos públicos, por exem-
plo –, a solução residiria nos movimentos político-sociais, organizados pela
própria sociedade, que pressionariam os agentes políticos a concretizarem
os objetivos e metas traçados na Carta Magna. Peço comentar a respeito.
Cerimonialista: “Dando início às atividades técnicas desta manhã, neste
auditório, assistiremos em instantes ao painel que traz como tema “A Ques-
tão Político-Institucional e o Desenvolvimento do Nordeste”.
Para exercer a função de moderador, convido ao palco o dr. em Direito
Constitucional, Filomeno Moraes, professor Titular do Programa de Pós-Gra-
duação em Direito Constitucional da Universidade de Fortaleza.
Convido à mesa, os senhores expositores:
341RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
• Senhor Sérgio Duarte de Castro, secretário de Desenvolvimento Re-
gional do Ministério da Integração Nacional;
• Senhor Fernando Antônio Rezende Silva, professor da Fundação Getú-
lio Vargas;
• deputado federal Pedro Eugênio de Castro Toledo Cabral, Coordena-
dor da Bancada do Nordeste.
Estamos aguardando a chegada do professor Alcimor Rocha Neto; infe-
lizmente, houve um ruído de comunicação em sua agenda, mas ele já está
em deslocamento e, aqui chegando, já ocupará o seu lugar à mesa para exer-
cer a função de relatoria.
Senhoras e senhores, honra-nos também com a sua presença neste re-
cinto o excelentíssimo senhor deputado federal pelo Estado do Ceará, Rai-
mundo Gomes de Matos.
Para proceder a sua saudação à plateia, apresentar aos insignes convida-
dos expositores desta manhã e, desta forma, dar início aos trabalhos técni-
cos pertinentes a este painel, convido a usar da palavra o senhor moderador
dos trabalhos, dr. Filomeno Moraes.
Filomeno Moraes: “Bom dia a todos; é com muita satisfação que eu recebi
o convite, e aceitei, para moderar este painel, um painel de extrema rele-
vância, intitulado “A Questão Político-Institucional e o Desenvolvimento do
Nordeste”.
342
À temática, por sua vez, a sua relevância é acrescida pela presença dos
expositores. O primeiro expositor, Sergio Duarte de Castro, secretário do
Desenvolvimento Regional do Ministério da Integração Nacional; o pro-
fessor Fernando Antônio Rezende Silva, professor da FGV; e “last, but not
least”, o deputado Pedro Eugênio de Castro Toledo Cabral, deputado federal
pelo PT de Pernambuco e coordenador da Bancada do Nordeste.
Eu queria agradecer o convite a mim dirigido e eu o faço aqui na pessoa
do economista Cláudio Ferreira Lima, que é um homem muito dedicado às
grandes questões nacionais. Queria saudar a todos da plateia e eu o faço
aqui em nome do deputado Pedro Gomes de Matos e do economista Pedro;
cumprimento a todos em nome desses dois.
Me foi pedido pela organização do evento que, inicialmente, colocasse as
questões que devem ser, de algum modo, inferidas aqui pelos expositores e,
depois durante os debates, eu vou ler aqui essas questões.
“Em um país continental, com acentuadas diferenças e disparidades
regionais de renda, é fundamental a intervenção do estado no sentido de
promover o desenvolvimento nacional de forma integrada e, tanto quanto
possível, equilibrada como tem o mesmo se comportado no caso brasileiro?”
“Tomando-se por base a distribuição regional da receita pública nacional,
a renúncia fiscal federal, a atuação do sistema bancário oficial e os investi-
mentos públicos da União e das estatais federais, o que se pode dizer sobre
o papel do governo federal em favor do desenvolvimento regional e do com-
bate às desigualdades regionais de renda no Brasil?.”
343RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
“Como fortalecer a federação brasileira e conferir maior poder político às
regiões? Haveria necessidade de se recriar um fórum político regional nos
moldes que foi o Conselho Deliberativo da SUDENE em seus primórdios? Se a
resposta for sim, como fazer para que os governadores o valorizem de fato?”
“Na medida em que o governo federal tem, cada vez mais, substituído
o tratamento regional pelo social, ainda haveria lugar para os organismos
regionais? Se for sim a resposta, como reposicioná-los?”
“Como convencer o restante do país de que para se manter a unidade
federativa, evitando-se a fragmentação da nação, é imprescindível reduzir
as desigualdades regionais?”
“Há uma corrente que defende que para se fazer cumprir os dispositivos
constitucionais referentes à questão regional, sabidamente letras mortas, o
critério populacional na distribuição dos investimentos públicos, por exem-
plo, a solução residiria nos movimentos políticos sociais, organizados pela
própria sociedade, que pressionariam os agentes políticos a concretizarem
os objetivos e metas traçados na carta magna?”
São estas as questões formuladas, evidentemente que os expositores
têm a liberdade para tratar o assunto como desejarem.
Então, nós convencionamos aqui, por conta do atraso que está sendo con-
siderado, de dar a cada expositor trinta minutos, evidentemente com tole-
râncias. Obrigado.
Passo a palavra, então, ao primeiro expositor, o dr. Sérgio Duarte de
Castro.”
344
Sérgio Duarte de Castro: “Muito bom dia a todos. Quero agradecer e cum-
primentar aqui os organizadores do Integra Brasil (acho que é uma impor-
tante iniciativa a promoção desse fórum de debates), especialmente a Fe-
deração das Indústrias e o Centro de Indústrias do Ceará - CIC, que tem
liderado esse processo; cumprimentar meus colegas de mesa, o deputado
Pedro Eugênio e o professor Fernando Rezende, que é nosso colaborador,
tem contribuído muito no Ministério da Integração, no nosso esforço de re-
pensar a política nacional de desenvolvimento regional.
A primeira questão que eu gostaria de colocar é sobre a necessidade
de o país pensar seriamente, nesse momento, em termos, efetivamente, de
construir um projeto nacional de desenvolvimento de médio e longo prazo.
Essa é uma discussão que o Brasil, em alguns momentos da sua história,
levou a sério. Nós podemos pensar no segundo governo Vargas, no governo
JK e, mesmo durante o regime militar, nos planos nacionais de desenvolvi-
mento, o primeiro e segundo PNDs. Quer dizer, naqueles momentos, havia
um certo esforço de visão de longo prazo, de para onde se queria chegar
com o país, que era o projeto nacional que nós precisávamos. E é funda-
mental pensar isso porque é dentro desse projeto nacional que tem que se
situar a questão regional.
Eu acho que o Brasil vem com uma série de ações, redirecionando seu
processo de desenvolvimento; em certo sentido, apontando para um novo
modelo de desenvolvimento, que precisa ser pensado, explicitado, imediata-
mente para orientar o desenvolvimento do Brasil nos próximos anos. Acho
345RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
que está colocado aqui esse esforço, que o Brasil vem fazendo; eu coloca-
ria como referência disso, desde a Constituinte de 88, um esforço em que o
Brasil consegue um pouco retomar o seu processo de crescimento. Há preo-
cupação com inovação como elemento-chave nesse processo de desenvol-
vimento. Vem aparecendo com o esforço de aumentar os recursos na área
de ciência e tecnologia no Brasil, de criação dos Fundos Setoriais, enfim, no
esforço de colocar, de maneira mais importante, a questão da inovação, da
sustentabilidade, que não há como se pensar um novo modelo de desenvolvi-
mento sem considerar seriamente a da sustentabilidade. E, sobretudo, acho
que o Brasil conseguiu e tem conseguido avançar de maneira significativa
em torno da equidade social, que é um dos que considero dos pilares desse
novo projeto. Sem dúvida alguma, desde a Constituinte de 88, com uma sé-
rie de instrumentos que foram colocados ali, foi se constituindo no país um
grande pacto nacional, ainda que não explicitado, em torno desse esforço de
combater essa chaga, essa dívida social que o Brasil tem, de ser uma das na-
ções mais desiguais do mundo. E, nesse período, seja os governos estaduais
criando uma série de programas e medidas, toda uma engenharia social de
programas, no sentido de reduzir a pobreza, reduzir as desigualdades no Bra-
sil. O governo federal, que trouxe essa questão para o centro da agenda po-
lítica. Se nós olharmos hoje o slogan do governo é “Brasil rico é Brasil sem
miséria”, e nós demos passos importantes nesse caminho. O Brasil, em 95,
tinha 25%, um quarto da sua população, vivendo em condições abaixo da li-
nha da extrema de pobreza. Esse número hoje é de menos de 6% e, até o final
346
de 2014, com as últimas medidas do Bolsa Família, praticamente, do ponto de
vista de renda, a pobreza não é só renda, mas do ponto de vista de renda, a
gente leva para níveis residuais a pobreza extrema no Brasil.
O índice de Gini também diminuiu sensivelmente no Brasil, nos últimos
anos, em função de um grande esforço que se traduziu em aumento dos
gastos nessa área, gastos nos diversos níveis de governo. Quer dizer, a par-
ticipação nos gastos sociais no PIB saiu de alguma coisa como 19% para
cerca de 24%, agora, quer dizer, mostrando que esse esforço se traduziu
concretamente num volume de gastos, e o Brasil faz uma inflexão na sua
trajetória histórica.
Vocês podem observar que o Brasil teve um grande dinamismo no pós-
-guerra, crescendo a 7,5% ao ano entre 47 e 80, mas a curva de elevação do
índice de Gini, de aumento das desigualdades, acompanhou pari e passu; são
curvas que andaram paralelas ao longo da história brasileira. Depois de todo
esse longo período de crise, de ausência de crescimento, as desigualdades
se estabilizaram no Brasil. E, agora, pela primeira vez na história do Brasil,
nós temos uma inversão importante nessas curvas; quer dizer, o Brasil re-
toma, ainda com limitações importantes, a sua trajetória de crescimento e
com uma queda expressiva nos índices de desigualdade, mostrando, então,
esse elemento importante que tem sido a tônica da ação do governo federal
nos últimos anos, a busca por maior equidade social.
É um elemento importante, mas não é o único e não se sustenta se não
for acompanhado dos outros elementos desse tripé de um novo projeto na-
347RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
cional, como a questão da competitividade, e essa discussão está hoje em
curso no Brasil, é preciso aumentar o volume de investimentos, é preciso
atacar de maneira firme o que nós conhecemos sinteticamente como as
problemáticas do custo Brasil da infraestrutura; quer dizer, a questão da
competitividade precisa vir para o centro da agenda e, juntamente com a
questão da competitividade, a questão do equilíbrio regional. A questão do
equilíbrio regional enquanto uma política de coesão, que é esse é um ele-
mento central na política regional.
A política de desenvolvimento regional é, sobretudo, uma política de coe-
são política, social, econômica e territorial. Esse é um componente impor-
tante num momento em que o pacto federativo está esgarçado.
Existe uma grande necessidade de se rever o pacto federativo para que as
diversas regiões do país se enxerguem enquanto uma nação, dentro de um
projeto de desenvolvimento. Esse é um elemento importante da ideia do equi-
líbrio regional, mas não é a única; a própria questão do desenvolvimento re-
gional hoje conversa com a questão da competitividade e da equidade social.
A sustentabilidade desse processo de equidade social depende, hoje, de
se avançar concretamente na transformação das estruturas produtivas das
regiões menos desenvolvidas, porque boa parte da pobreza que está mudan-
do o seu patamar no Brasil, está avançando na escala da pirâmide social
com políticas de transferência de renda. Isso só vai se consolidar e se tornar
efetivamente sustentável, se a economia das regiões como o Nordeste, por
exemplo, que concentra mais de 50% dessa pobreza no Brasil, for capaz de
348
gerar emprego de qualidade para sustentar esse processo de inclusão social
ao longo do tempo.
Além disso, a questão da competitividade. Se nós olharmos o mundo hoje,
quem são os países que estão dando dinamismo na economia mundial? Não
são os países centrais, são exatamente os países periféricos. Vamos olhar
o Brasil hoje; quem é que está puxando o crescimento do PIB brasileiro?
Não é São Paulo. Existe um dinamismo claro, e nessas novas regiões que
representam uma grande oportunidade, tratam isso do ponto de vista que
incorpore na lógica de competitividade essa estrutura produtiva regional,
explorando a diversidade brasileira com inovação, explorando as potenciali-
dades no campo da sustentabilidade, é fundamental para suportar também
um processo de nova competitividade no Brasil, do ponto de vista regional.
Então, uma das perguntas que aparecem aqui é importante, porque como o
governo e o esforço nacional estavam muito focados no campo da equidade
social, quando nós olhamos boa parte do que se vem fazendo como polí-
tica regional e política territorial no Brasil, muitas vezes assume mais um
caráter de política de compensação social do que propriamente política de
desenvolvimento econômico. É importante fazer compensação social, mas
é importante que nós tenhamos, do ponto de vista regional, política de de-
senvolvimento, de competitividade, obviamente, com inserção social, com
inclusão social.
Dito isso, passemos aqui a essa outra dívida histórica do Brasil, que é a
questão regional, que é uma questão nacional, não é uma questão só do Nor-
349RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
deste. Mas, obviamente, que o Nordeste representa uma questão bastante
diferenciada na problemática regional brasileira. Por que essa questão tão
diferenciada no caso do Nordeste? Por sua ocupação antiga. Aqui estava a
primeira capital do Brasil. Durante anos, você teve uma concentração po-
pulacional nessa região em função da sua história. Então, nós temos aqui
quase 28% da população brasileira concentrada nessa região que perdeu o
dinamismo ao longo da sua história e, ao perder dinamismo, deixou aqui uma
situação, escandalosa em termos regionais por qualquer indicador que se
olhe no mundo. Uma região que tem 28% da população brasileira, com 13%
do PIB do país. Mesmo que se olhe e considere que a questão regional brasi-
leira hoje não se limita à questão macrorregional, não é um problema só de
Norte e Nordeste, e um pouco ainda de regiões do Centro-Oeste, você tem
hoje um grande problema de diferenciação intrarregional em todo o Brasil,
inclusive dentro do próprio Nordeste.
Nós vamos ter em todo o país problema regional e intrarregional que pre-
cisa ser enfrentado. Mas, sem dúvida, para a questão do Nordeste, que é
não só menos da metade do PIB per capita nacional, ou um terço do PIB per
capita de São Paulo, é preciso ter um olhar e um tratamento diferenciado es-
pecial. Ao longo do tempo, essa participação do Nordeste no PIB brasileiro,
já foi, ainda nos anos 30, quase 17% do PIB nacional e, exatamente, na medi-
da em que vai avançando o desenvolvimento industrial do Brasil, em que o
centro vai sendo deslocado para o Sudeste, especialmente para São Paulo,
quer dizer, ele perde participação ao longo do tempo, mas, desde os anos
350
50, a região está estacionada em torno de 13% do PIB brasileiro. Dá as suas
movimentadas em torno disso, mas lá se vão mais de 40 anos, na verdade,
mais de 50 anos em que a região não sai desse patamar. Ultimamente, já se
vê, ela dá uma embicadinha para cima.
Esses momentos, esses últimos dez anos que se está vivendo, que são
momentos relativamente favoráveis a essa viradinha na curva, nós vamos
ver que o Nordeste na última década tem crescido um pouquinho acima da
média nacional, o que tem se traduzido numa melhoria na sua participação;
não é uma coisa isolada no Nordeste. O Centro-Oeste, Nordeste e Norte,
tanto do ponto de vista do PIB, quanto especificamente do ponto de vista do
PIB industrial, aumentam a sua participação na última década no PIB e no
PIB industrial brasileiro. Isso demonstra um movimento de desconcentra-
ção, mas, como nós vamos ver à frente, ainda muito limitado e insuficiente.
Uma coisa importante, também, falei aqui de desigualdade intrarregio-
nal. É muito importante nesse momento quando se olha o Nordeste, pensar-
mos nos dois Nordestes que se articulam e que são bem diferentes do ponto
de vista de potencial e de estrutura industrial, e de capacidade de desenvol-
vimento, que são o Nordeste representado pela Bahia, Pernambuco e Cea-
rá, e pelo restante dos estados do Nordeste. Então, procurávamos em olhar
também, pois temos acompanhado com cuidado esse movimento e há um
certo entendimento de que estaria havendo uma reconcentração no âmbito
do Nordeste. Os dados mostram que isso não é verdade; quer dizer, apesar
do dinamismo importante de Bahia, Pernambuco e Ceará, nos últimos anos,
351RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
a participação relativa desse bloco em relação à participação do outro bloco
no PIB do Nordeste, não se altera de maneira importante nessa última déca-
da. Ela se mantém. Antes de 2000, tem-se uma pequena concentração, mas
a partir de 2000 ela se mantém.
Se se olhar do ponto de vista do PIB per capita dos vários estados nordes-
tinos, em relação à média do Nordeste, nota-se, inclusive, uma pequena con-
vergência, há uma pequena convergência também ocorrendo no âmbito do
próprio Nordeste. E uma notícia boa nesse processo, é que o problema não
é só o problema de crescer, é um problema de crescimento com mudança
estrutural, com mudança do padrão industrial do ponto de vista de uma es-
trutura um pouco mais inovativa, com inclusão de conhecimento. E quando
olhamos a participação do VTI, do valor da transformação industrial do Nor-
deste, vê-se o crescimento dessas duas áreas mais ou menos semelhantes e
o próximo aqui, que é então o que eu estava querendo me referir com maior
cuidado, é a questão do valor da transformação industrial nos segmentos de
alta e média tecnologia.
Então, o que a gente observa, olhando desde 96 para cá, os estados me-
nores, têm um aumento mais do que proporcional, um aumento importante
no VTI da região dos segmentos de alta e média tecnologia, o que mostra
um movimento de certa mudança da estrutura industrial interessante, que
precisa ser entendida mais setorialmente, no sentido de ser fomentada. Se
se olha isso de maneira mais detalhada, nos segmentos como os de mais
alta e média intensidade tecnológica que estão puxando esse movimento,
352
tem-se ali a questão de máquinas e equipamentos, de veículos automotores,
máquinas e equipamentos elétricos; isso aí tem a ver com essa subida de
investimentos da PETROBRÁS e os seus desdobramentos na região.
Mas, quando se olha em perspectiva, o que está acontecendo? Se se vê
de 95 para cá, existe um certo movimento de desconcentração regional que
acompanha o movimento de desconcentração social. Eles estão muito rela-
cionados, quer dizer, as ações de combate à pobreza têm sido um elemento
que alimenta um pouco essa redistribuição regional. Não é só isso, algumas
decisões de investimento importantes do governo federal de, por exemplo,
que eu já me referi aqui, dos estaleiros na região Nordeste, das refinarias
da PETROBRÁS; quer dizer, são ações que têm peso nesse processo. Mas,
quando olhamos esse movimento ao longo do tempo, aparece um dado muito
preocupante; se se projetar simplesmente o ritmo de desconcentração des-
ses últimos anos para frente, se não fizermos nada, se a política continuar
como está, nós só chegaríamos no Nordeste, não estou dizendo a média
nacional, estou dizendo a 75% da média da renda do PIB per capita nacional,
que é algo que a União Europeia, A OCDE, consideram como minimamente
civilizado do ponto de vista de desigualdades regionais, quer dizer, nós só
chegaríamos lá em 2074. Quer dizer, a pergunta aqui é se o Nordeste está
disposto a esperar mais de 50 anos para se colocar como, no limite do máxi-
mo de desigualdade civilizada que se admite no mundo.
O que fica claro aqui é que se tem avançado do ponto de vista de política
regional no Brasil, mas é absolutamente insuficiente. É preciso dar um sal-
353RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
to e construir no âmbito desta questão regional esse acordo nacional, esse
acordo dentro do Congresso, o acordo com os estados, com a Federação,
com relação à importância dessa questão, não como uma questão do Nor-
deste, nem como uma questão do Norte, mas como uma questão do Brasil,
que é fundamental para o progresso do Brasil.
Acho que essa é a grande questão que está colocada nesse momento.
Existem oportunidades aí colocadas, sobretudo aqui para a região Nordeste,
que são importantes. Quer dizer, é esse processo de desconcentração de
renda que continua; ele gera uma demanda crescente aqui que abre oportu-
nidades para investimentos na indústria de bens-salários; e se se olha, por
exemplo, a venda no varejo do Nordeste crescendo bem acima dos níveis
nacionais, isso abre oportunidades do ponto de vista do avanço da estrutura
produtiva.
As oportunidades, sobretudo, associadas aos investimentos em infraes-
trutura, quer dizer, um dos grandes déficit s hoje da economia brasileira. São
exatamente os investimentos em infraestrutura que estão muito travados
por uma série de problemas de ordem burocrática, legal, e da incapacidade
fiscal, da incapacidade de se ter um marco regulatório que consiga de fato
atrair os investimentos privados para essa grande oportunidade que o Brasil
abre, que são os investimentos em infraestrutura. Mas, com todas as medi-
das que vêm sendo tomadas, o nível de investimento em infraestrutura no
Brasil certamente deve crescer muito nos próximos anos. A expectativa do
governo federal é de duplicar a participação dos investimentos em infraes-
354
trutura no PIB, nos próximos anos, e isso tem um enorme efeito multiplica-
dor se aproveitado do ponto de vista de política industrial. Se associarmos
aos investimentos de infraestrutura um esforço de política industrial, que se
traduza em atração de investimentos, em desenvolvimento para as regiões.
Tenho dado muito o exemplo aqui do Ceará, no caso agora do VLT. O de-
safio da mobilidade urbana é um desafio que está colocado para todas as
capitais do Nordeste. Qual foi a decisão do governo no Ceará ao enfrentar
a questão do VLT? Certamente, apareceram propostas de VLT chinês mui-
to interessantes para serem feitas, mas a decisão que houve foi de fazer
uma ação organizada de atrair e viabilizar uma indústria de VLT no Ceará. O
VLT que está sendo colocado aqui, e em Sobral é com uma empresa que foi
criada, constituída por ação do poder público, de articulação para viabilizar
os investimentos nessa área. Esse tipo de política de maneira organizada,
coordenada, no que se refere à mobilidade urbana. Vou dar um exemplo sim-
ples para vocês. O “Minha Casa, Minha Vida” acaba de aprovar, inclusive
por demanda do Ministério, uma medida extremamente importante: de hoje
em diante, não se constrói nenhuma casa no “Minha Casa, Minha Vida” sem
placa solar, no mínimo para aquecimento de água para banho; é uma exi-
gência que está colocada para o Brasil. Imaginem o que isso representa em
termos de demanda de compra privada das empresas, do ponto de vista de
placa solar? Se não houver política, quem é que vai abastecer essas placas
solares? São os chineses que são os grandes produtores de placas solares,
mas isso permite se ter uma ação estruturada, organizada, no sentido de
355RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
colocar exigências de que as empresas sejam regionais, que atendam cri-
térios de investimento em inovação, enfim. É preciso ter política pública de
aproveitamento dessa enorme oportunidade que está sendo colocada agora,
do ponto de vista dos investimentos em infraestrutura, para promoção do
desenvolvimento regional.
Temos oportunidades, mas temos também enormes desafios a serem
enfrentados nessas regiões, para que essas oportunidades sejam respon-
didas. E esses desafios implicam em enfrentar com políticas públicas con-
sequentes algumas questões fundamentais. A primeira delas é a questão
da educação e da capacitação profissional nessas regiões, a questão da
infraestrutura, a questão da ciência e tecnologia e inovação, a questão da
política industrial. Pensar o desenvolvimento da estrutura produtiva articu-
lada, integrada à estrutura produtiva nacional, a universalização de acesso
a serviços básicos, mesmo serviços elementares, como água para consumo,
por exemplo, ainda são um desafio que estão colocados para a região, e,
obviamente, sustentabilidade, perpassando tudo isso. E uma questão mais
geral atrás disso, que eu vou insistir, é que é a questão, também, federativa,
que está envolvida em toda essa discussão.
Então, diante desses desafios, nós estamos nesse momento discutindo
uma nova política nacional de desenvolvimento para o Brasil. Nós estamos
chamando de PNDR2. E nessa nova política, tem uma mudança muito im-
portante do ângulo da concepção, da visão da política. Ora, nós temos, e
o Brasil vem construindo desde o pós-guerra, uma série de instrumentos
356
que são instrumentos clássicos, do que nós chamamos de “política regional
stricto senso”. São fundos de desenvolvimento, os nossos fundos constitu-
cionais foram previstos lá na Constituinte de 46, depois vão ser efetivamente
regulamentados viabilizados a partir da Constituinte de 88. Temos, também,
além dos fundos constitucionais, no caso do FNE, os fundos de desenvolvi-
mento, o FDNE, que é outro fundo que nós temos aqui, temos o FDA para a
Amazônia. Nós temos também instrumentos clássicos como os incentivos
fiscais. Tudo isso tem sido utilizado e há um esforço de aprimorar esses ins-
trumentos para fazer a política regional.
Mas, a grande conclusão quando nós olhamos a situação, a gravidade
da situação regional brasileira, é que esses instrumentos são muito impor-
tantes, mas se eu comparo esses instrumentos, que são instrumentos es-
pecíficos de política regional, com os recursos das grandes políticas seto-
riais com impacto no território, nós vemos que o desbalanço foi enorme. Por
exemplo, os investimentos do BNDES, só o BNDES. Os investimentos do
BNDES no período, que são muito baixos no Nordeste, proporcionalmente,
são maiores que o FDNE e o FNE juntos; quer dizer, não adianta eu ficar dis-
cutindo apenas os nossos fundos constitucionais se eu não discuto qual é a
participação, de que maneira esses fundos conversam com os recursos do
BNDES e como é que os recursos do BNDES podem ser mais importantes
na área. Se eu coloco o PAC, do PAC Nordeste 2007-2010, foram comprome-
tidos aqui cento e quatorze bilhões de reais; é muito mais do que os fundos
setoriais. A questão é se essas obras do PAC estão pensadas numa estraté-
357RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
gia regional, dentro de uma estratégia que aumente a competitividade sis-
têmica regional: As obras priorizadas são as obras dentro de uma estratégia
de desenvolvimento regional? Não estão. Você tem uma política setorial que,
a partir da demanda dos governadores, etc., acabam tendo e têm tido um
efeito de desconcentração efetivo, porque hoje há uma intenção no PAC de
atuar no sentido de melhorar o desenvolvimento regional; a participação dos
recursos do PAC das regiões menos desenvolvidas é mais do que proporcio-
nal à sua participação no PIB, portanto, há essa intencionalidade, mas falta
coordenação no sentido de visão estratégica com relação ao PAC. E não é
só com o PAC.
Então, no fundo, o que nós estamos colocando como elemento-chave
nesse momento de se trazer a questão regional para o centro da agenda
política e de pensar a questão regional, não apenas com o fortalecimento
das ações típicas de desenvolvimento regional, mas também de coordenar
no âmbito territorial a partir de uma visão estratégica os grandes planos
nacionais, que têm forte impacto regional. Aí nós estamos falando do PAC,
aí nós estamos falando do Brasil Maior, da política industrial que tem hoje
basicamente um corte setorial, ela não se territorializa, de fato. Estamos
falando da estratégia nacional de ciência e tecnologia, estamos falando do
Plano Nacional de Educação, enfim, de um conjunto de planos nacionais
que estão colocados aí. Se você ler, há em cada um desses planos a in-
tencionalidade de redução de desigualdades ali presente, mas isso não se
coordena, em torno de uma visão estratégica. Por isso que nós estamos
358
chamando o grande instrumento dessa nova política de um pacto de me-
tas, de um elemento de pactuação no âmbito do governo federal, mas não
apenas do âmbito do governo federal. Se nós não fizermos isso, aí volta a
discussão do pacto federativo, em acordo com as entidades subnacionais,
com os estados, num pacto em torno daquelas grandes temáticas, como
infraestrutura. Quais são as grandes metas nos próximos dez anos e como
é que nós vamos nos acordar para fazer com que recursos, de quem, do
ponto de vista federal e estadual, esse acordo construído, que obviamente
remete para tratamento de temas, que certamente o professor Fernando vai
explorar, é mais aqui que hoje comprometem essa solidez do pacto fede-
rativo brasileiro, que é a questão da distribuição do FPE, do FPM no Brasil,
enfim. Temos questões estruturais a serem enfrentadas, mas ao mesmo
tempo em que nós enfrentamos essas questões estruturais, é possível se
construir um pacto com um horizonte de tempo definido em torno de metas
muito concretas, de ações muito concretas, nos diversos ministérios.
Para isso, nós temos que voltar ao tema da nossa mesa, que é a questão
da institucionalidade da política regional brasileira. E aqui estamos propon-
do também um novo modelo de governança da política. Já, desde a criação
da PNDR1, foi criado no Brasil algo extremamente importante, que é uma
Câmara de Coordenação de Políticas de Desenvolvimento Regional. Essa
câmara é coordenada pela Casa Civil, integram essa câmara dezoito mi-
nistérios; são secretários executivos dos ministérios, os principais ministé-
rios setoriais, e o papel dessa câmara era exatamente fazer a coordenação
359RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
das políticas. Acontece que isso foi criado lá atrás; depois, com o programa
Territórios da Cidadania, isso acabou se perdendo um pouco, enfim, essa
câmara não ganhou estofo político, não se viabilizou, apesar de que, ela
existe hoje formalmente.
Estamos propondo na lei da nova política a reestruturação dessa câma-
ra, a criação de um Conselho Nacional de Desenvolvimento Regional acima
dessa câmara, presidida pela Presidenta da República, ou pelo presidente
da República, com a participação dos ministros, como existe na área de
ciência e tecnologia, um conselho mais estratégico, que empodera o tema,
e essa câmara, como câmara mais executiva, com comissões, com estru-
turação executiva capaz de viabilizar, no âmbito do governo federal, essa
mobilização, com a participação, que nós achamos muito importante, não
só dos estados, mas também do Congresso Nacional, das comissões de de-
senvolvimento regional, da Câmara e do Senado.
Eu conversava mais cedo com o deputado Pedro Eugênio; a comissão
de desenvolvimento regional hoje da Câmara é a Comissão de Desenvol-
vimento Regional e da Amazônia. Quer dizer, na verdade, não é uma co-
missão de desenvolvimento regional, é uma comissão da Amazônia, sequer
temos, dada a gravidade da questão regional brasileira, uma comissão de
desenvolvimento regional da Câmara que esteja, de fato, organizada, com
uma bancada. Temos uma bancada ruralista no Brasil, mas não temos uma
bancada mobilizada em torno da questão regional do Brasil. Eu tenho a
bancada do Nordeste, eu tenho a bancada do Norte, mas a questão regional
360
como uma questão nacional importante depende de uma revisão da própria
Comissão na Câmara. Senado, a Comissão de Desenvolvimento Regional é
desenvolvimento regional e turismo. Ou seja, nós precisamos ter essa ques-
tão do próprio Congresso envolvida.
Com relação a uma questão concreta que foi apresentada aqui pela or-
ganização, do seminário, se refere à necessidade de revisão dos órgãos re-
gionais de desenvolvimento e a possibilidade de termos a necessidade de
estruturar um novo conselho junto, no caso, aqui da SUDENE. Na verdade,
existe um esforço nesse momento de reconstrução, de fato, da SUDENE, e
tinha os seus quadros envelhecidos, está sendo feito agora um concurso
público para renovar todos esses quadros da SUDENE; é preciso, de fato,
pensar o novo papel dessa nova SUDENE diante desse novo momento.
Quer dizer, o papel da SUDENE deveria ser não só de planejamento, mas
também de capitalizar essas várias políticas regionais e nacionais no terri-
tório. A questão concreta que se levanta aqui é que se é preciso criar um
outro conselho; eu acho que não, pelo contrário, o conselho deliberativo da
SUDENE é composto exatamente pelos governadores e as principais insti-
tuições de representação aqui da região, isto é, federação de indústria, de
comércio, de trabalhadores, etc. E aqui é um dos poucos conselhos em que
os governadores participam de fato. Aliás, no primeiro momento, diante do
enfraquecimento da SUDENE, esse fórum de governadores passou a se re-
unir à parte, ele passou a ser a representação política da região. Os gover-
nadores entenderam essa necessidade reforçar a SUDENE e, hoje, o fórum
361RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
de governadores acontece dentro do conselho da SUDENE. Quase todas as
reuniões que tem do conselho aqui, desde 2003, acontecem não só com a
participação dos governadores, mas do presidente da República, primeiro
do presidente Lula e agora da presidenta Dilma. Então, a representativida-
de do ponto de vista regional está aí, a questão é você estruturar melhor a
própria SUDENE e trabalhar melhor esse papel. Como é que essa Câmara
de Coordenação de Políticas Regionais, por exemplo, se traduz dentro da
SUDENE também, no sentido de que a SUDENE possa cumprir esse papel
de articulação regional e de vinculação entre essas várias políticas, a partir
de uma visão estratégica.
Estamos, nesse momento, além de trabalhar um texto da nova política
que deverá ir ao Congresso Nacional, tentando construir esse pacto, cons-
truir com os diversos ministérios, com os estados, esse grande pacto que
tem uma meta nacional geral, que é de não termos nenhuma microrregião
brasileira com menos de 75% do rendimento domiciliar per capita nacional
de perseguirmos isso como uma meta estratégica, que é a média que orien-
ta as demais metas, e estamos construindo esses pactos em torno daqueles
grandes temas. Essa é questão da educação, por exemplo. Estão aí os indica-
dores, por exemplo, isso é gravíssimo do ponto de vista estrutural de futuro
para a região esses números, essa diferença entre os níveis do Sudeste e do
Nordeste em termos de educação. Veja, por exemplo, o número de matricu-
lados na educação profissional por habitante no Nordeste e no Sudeste, 7 no
Sudeste, 2,5 a 2,9 no Nordeste. Então, quer dizer, nós estamos sentando com
362
o MEC e com os diversos atores dizendo: bom, vamos colocar esses indica-
dores, vamos colocar em dez anos como é que vamos diminuir isso, em que
percentual, com que recurso e de que maneira. É esse o tipo de pacto que
nós estamos falando. E, então, nós temos que entrar naquela discussão ali.
Houve um estudo do IPEA que olhou os gastos federais em educação em
2010. O resultado dado: quanto foi investido no Nordeste - 11,4% do orça-
mento do MEC; quanto foi investido no Sudeste no mesmo período – 60,1%.
Isso, por quê? Há algum problema no MEC? Não, não há. Isso é a estrutura
do sistema educacional brasileiro. Onde é que estão as universidades? Isso
aí reflete o custo das universidades, do ensino superior etc. Mas, não vamos
alterar esses números se não olharmos aquilo ali. Não tem cabimento, dis-
cutimos aqui que os recursos federais em educação no Nordeste sejam me-
nos que a participação dele no PIB. É preciso olhar esse número e, quando
nós olhamos isso, isso eu estou falando em transferências obrigatórias, isso
não se refere só à educação. Esse estudo IPEA mostra as transferências nos
vários segmentos. Isso se repete, esse número se repete. Se a gente olhar
também as transferências obrigatórias, que aí nós entramos na discussão
do FPE, do FPM, e olhamos o número que temos ali é de que a capacidade
de arrecadação tributária no Nordeste é em torno de 50, de metade da média
nacional, a capacidade de arrecadação própria, e mesmo quando se colo-
cam todas as transferências, aí se consideram as transferências nos níveis
estaduais, municipais, e ainda chega ali numa situação em que a receita
disponível por habitante no Nordeste, para fazer toda a política pública, é
363RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
de dois mil e quatrocentos reais, enquanto a média no Brasil é de três mil
reais. E, se pegarmos um caso ali extremo, nós vamos ver que Paulínia, por
exemplo, conta com um recurso de nove mil reais per capita, enquanto que
Campo Alegre, em Alagoas, tem setecentos e dezenove reais per capita para
fazer toda a sua política. Então, volta a questão federativa como questão de
fundo de toda essa discussão.
Mas, enfim, a mesma coisa que nós estamos fazendo com a educação,
nós estamos fazendo com as transferências voluntárias de todos os setores,
que mostram também toda essa desigualdade. Nós estamos trabalhando
igualmente a questão da ciência e tecnologia, a construção de um pacto im-
portante que envolva, inclusive, a necessidade de se fazer algumas escolhas
estratégicas do ponto de vista produtivo. Aqui, por exemplo, a questão da
energia renovável como uma grande aposta produtiva e tecnológica, está se
construindo através de oficinas etc., esse esforço no pós-Conferência Na-
cional. A questão também da infraestrutura, da estrutura produtiva, na rede
de cidades. Era isso, gente. Muito obrigado.”
Filomeno Moraes: “Queria registrar a chegada a esta mesa do professor Al-
cimor Rocha Neto, que funcionará como relator dos trabalhos. O professor
Alcimor é professor da Universidade de Fortaleza, de Direito Constitucio-
nal, e atualmente é doutorando em Direito pela Universidade de São Paulo
e Universidade de Coimbra. Permita-me dizer, eu acompanho a trajetória do
Alcimor, foi meu monitor na Universidade de Fortaleza da cadeira de Direito
364
Constitucional, meu aluno no Programa de Pós-Graduação, mas já tem voos
muito mais altos do que o seu professor.
Queria também registrar a presença, entre nós, do deputado Constituinte
Firmo de Castro e, de imediato, passar a palavra ao professor Fernando An-
tônio Rezende Silva.”
Fernando Antônio Rezende Silva: Bom dia a todos. Queria cumprimentar
aqui os meus colegas de mesa, na pessoa do nosso coordenador, e todos os
presentes. É a segunda vez que eu tenho oportunidade de vir e acompanhar
um pouco essa importante iniciativa do Integra Brasil.
O tema que esteve fora da pauta dos debates nacionais, pelo menos nos
últimos vinte anos, a discussão da integração regional e, no momento onde
está, o problema da integração sofre de novos desafios, que eu pretendo
comentar aqui rapidamente.
Eu tinha, por dever de ofício, feito uma longa exposição de slides, mas eu
vou cortar como dizem os espanhóis, vou reduzir um pouco esse nosso es-
paço, para tratar do tema que felizmente à mesa aqui é proposto como uma
das primeiras perguntas aos expositores.
Vou comentar rapidamente sobre três coisas: o que eu estou chamando
aqui de lições do passado, algumas boas, outras nem tanto, as indefinições
do presente e caminhos do futuro. Caminhos do futuro eu vou deixar para
vocês, obviamente, apresentarem, já que eu não sou do Nordeste. Mas, an-
tes de passar essa longa sequência dos slides, eu queria resumir essas três
365RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
questões, as lições do passado, as indefinições do presente e os caminhos
do futuro, na verdade como se fosse uma, vamos imaginar, uma peça teatral
que se desdobra em quatro atos.
O primeiro ato remonta as origens da nação brasileira, que tem a ver com
todo o embate entre federalistas e centralizadores que ocorreu durante o
processo da Independência, ocorreu com intensidade em 1834, depois da
renúncia de Pedro I, de novo na República e em alguns momentos futuros, o
processo que um general brasileiro chamou de “sístoles e diástoles da Fede-
ração brasileira”, onde a assunção de regimes autoritários era simplesmen-
te acompanhada por um processo de centralização do poder, e o retorno à
democracia por um processo de descentralização e fortalecimento da Fede-
ração. E todo esse episódio, na verdade, embutia uma questão que, de certa
maneira, o Sergio trouxe aqui ao debate, que era a defesa que os defensores
do centralismo, da centralização faziam, que a centralização era necessária
para promover as reformas sociais, que não seriam feitas pelas elites provin-
ciais conservadoras. E, não por acaso, alguns estudiosos da política social
brasileira mostraram que este fenômeno, de verdade, historicamente ou em-
piricamente, se comprovou como uma das primeiras mudanças importantes
da política social feita no governo Vargas, em 30, e depois em 37, e daí por
diante. Então, esse embate entre política social e descentralização sempre
foi um embate importante na história brasileira. Então, esse é o primeiro ato.
O segundo ato vem com a Constituição de 88. Em 88, esse tema não foi
tanto quanto eu possa ter percebido, por ter acompanhado um pouco os de-
366
bates da Constituinte, já explicitado. Correu, vamos dizer assim, em raias
paralelas. O movimento da Federação numa das comissões da Constituinte,
o Firmo de Castro estava lá, pode me corrigir, e o movimento da chamada
“demanda da equidade social” numa outra raia. Então, isso levou que, no
primeiro momento, a demanda por descentralização ganhasse. Pelo menos
ganhou a escolha do lado do jogo em que ia jogar, então houve um processo
grande de descentralização das receitas públicas e das competências cons-
titucionais. Mas, no segundo momento, perdeu a partida, porque o outro
movimento que se consolidou em seguida, por motivos que eu vou explicar
rapidamente na sequência dessa exposição, acabou significando um certo
esvaziamento da Federação. E, na sequência, contribuiu para que o terceiro
ato mostrasse o reverso do primeiro. No primeiro, o que aconteceu? O es-
forço de planejamento que veio de 30 e se consolidou com Juscelino, depois,
em parte, no regime militar, caminhou no avanço da integração nacional, e
eu posso mostrar aqui. Mas, como mostrou o Sergio, houve uma integração
econômica com o aumento da disparidade social. Então, houve um descom-
passo entre a convergência econômica e a convergência social, chamemos
assim.
Já nesse terceiro ato, que se seguiu à Constituição de 88, em razão das
demandas da sociedade, da mudança de políticas, de uma nova percepção
da importância da equidade social, ocorreu o contrário. Houve uma conver-
gência social, mas não acompanhada da convergência econômica. Daí, a
média do Nordeste permanecer na situação em que estava há 40 anos atrás,
367RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
em termos de participação no PIB nacional. Isso desaguou no quarto ato,
que eu estava chamando das indefinições do presente, onde, em razão de
todas essas deformações e transformações que se acumularam ao longo da
história dos últimos 20 ou 30 anos, o estado brasileiro saiu deste processo
relativamente fragilizado na sua capacidade de investir na infraestrutura,
de melhorar a qualidade da gestão pública, de conduzir um processo de de-
senvolvimento baseado numa visão estratégica do projeto nacional. E essa
peça não termina. Ela termina com uma grande interrogação que vamos
apresentar ao final.
Escrevi um texto interessante, que eu gostei muito de fazer, recente-
mente, que foi discutir a história do planejamento brasileiro. Eu marco essa
construção entre 39 e 79, foi o primeiro plano de industrialização pelo gover-
no Vargas, 79 foi mais ou menos o final do período militar. Daí para frente,
houve um processo de desconstrução do planejamento e de esvaziamento
dessa necessidade de olhar o Brasil num horizonte de políticas estratégicas
para o futuro.
O que eu chamei de “avanço da convergência econômica” na história bra-
sileira está refletida, entre 43 e 79, e um pouco em 85; quando cresceram as
relações comerciais do Nordeste com o resto do Brasil. Isso são estatísticas
do comércio interregional, que dizem o seguinte: neste período, compras e
vendas interregionais do Nordeste em relação ao total das compras e vendas
interestaduais de todos os estados brasileiros, do Nordeste com todos os
estados brasileiros, cresceu de quase nada para algo que chegou ali em 70-
368
80%. Significa o seguinte, houve um fortalecimento dos laços econômicos e
comerciais entre as regiões brasileiras neste período. Para acertar a política
de industrialização da SUDENE, de outras políticas que o governo adotou,
dos incentivos fiscais ao desenvolvimento industrial, de uma série de polí-
ticas que foram concebidas com uma visão clara de que a construção da
nação brasileira e a coesão do território nacional, era uma política de manter
o processo de desenvolvimento brasileiro baseado na industrialização e no
avanço da modernidade da infraestrutura, das comunicações, e assim por
diante.
A reforma de 88 foi elaborada, todo o processo Constituinte, num mo-
mento muito particular da história brasileira, como todos sabem. Havia um
acúmulo de ressentimentos, muito bem fundamentado, de grande parte da
sociedade brasileira, traduzida na expressão, que se tornou célebre, de um
milagre econômico excludente, que excluiu grande parte da população bra-
sileira dos benefícios desse milagre. Então, havia dois movimentos muito
fortes, que eu percebi no trabalho da Constituinte: um, o movimento da fede-
ração. A demanda de estados e municípios por recuperar a autonomia finan-
ceira, a autonomia constitucional, para poder exercer a autonomia política
que tinham recuperado em 82, com a primeira eleição direta para governa-
dores pós-fim do regime militar. Isso caminhou num processo que terminou
numa substancial revisão das competências tributárias e dos mecanismos
de transferência de renda. Então, no primeiro momento, estados e municí-
pios ganharam uma forte autonomia para desempenhar as suas políticas.
369RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Em paralelo, corria o movimento da chamada “sociedade organizada”,
movimentos sociais, principalmente a saúde, a previdência, os sindicatos, a
educação, que demandavam o quê? Demandava recursos cativos para im-
plementar essas políticas. E isso refletia uma realidade daquele momento,
onde havia toda uma denúncia de que o dinheiro da chamada “área social”,
leia-se previdência, era desviado para outras coisas, para construir Brasília,
construir Itaipu, em função de que naquele momento a Previdência era su-
peravitária. Então, isso levou à criação do regime de financiamento da segu-
ridade social. Uma palavra que não é muito amigável na língua portuguesa,
na verdade a seguridade social é um termo espanhol, mas que nós incorpo-
ramos e demos um nome diferente, porque seguridade em espanhol é previ-
dência. Então, nós incorporamos e demos previdência, saúde e assistência,
porque é aquilo que a antiga previdência fazia, e criamos um regime cativo
de seguridade.
Agora, o problema é que isso, com puras e melhores intenções, acabou
gerando uma série de consequências que não só engessaram o estado bra-
sileiro, como contribuíram para acentuar os desequilíbrios e os conflitos
entre os componentes do estado brasileiro. Por quê? Alguma coisa que eu
chamei aí de “dualidade tributária e efeito cremalheira”. Não vou explicar
isso em detalhes, se quiserem, durante os debates, me aprofundo nisso.
Porque é o seguinte, quando o Brasil quebrou em 98 e teve que fazer um
forte ajuste das contas públicas para salvar o Real, podia fazer de duas
maneiras: cortando gastos ou aumentando a arrecadação. Cortar gasto é
370
sempre mais complicado e demora mais. Aumentar a arrecadação era mais
fácil. Mas, obviamente, por qualquer um que estivesse reunido na mesa do
ministério da Fazenda naquele momento, mas, qual imposto iremos aumen-
tar? Se fosse aumentar o Imposto de Renda e o IPI, não iria ter que passar
mais da metade para os estados e municípios? Então o governo federal fi-
caria com a metade. O que quer dizer que para gerar o mesmo superávit
precisaria aumentar duas vezes mais a carga tributária. Então, lógico, au-
menta as contribuições, as contribuições não são compartilhadas. Ora, mas
alguém deve ter lembrado, mas as contribuições são constitucionalmen-
te vinculadas à seguridade social; não é problema, fazemos uma Emenda
Constitucional, desvinculando 20%. Isso, num primeiro momento, alguns
aqui vão lembrar, chamou-se de “Fundo Social de Emergência”, para ficar
mais agradável. Depois, virou mesmo desvinculação das receitas da União.
O que significou na prática? Para gerar um superávit de vinte, você pre-
cisava arrecadar cem. Então, estava desvinculando só vinte e ficava oi-
tenta. Isso abriu um enorme espaço fiscal para ampliação dos programas
de transferência de renda. Não estou discutindo o mérito. Que trouxeram
inegável benefício, inegável vantagem para a população. Isso gerou o que
eu chamei de “efeito cremalheira”, que mostra um crescimento da despe-
sa com a seguridade social, acompanhando o crescimento da arrecadação
das contribuições. Isso gerou, como consequência, a inversão do processo
que falei anteriormente. Quer dizer, houve uma melhoria da convergência
social com a expansão dos programas de transferência de renda, que não
371RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
foi acompanhada, agora, da convergência econômica. Entre outras coisas,
a rigidez que o estado foi-se acumulando em função de todas as questões
que aconteceram nesse período, levaram a um esvaziamento da capacida-
de de investimento, porque isso ocorreu simultaneamente a um processo
de privatização das estatais, que também retirou capacidade do estado de
financiar o desenvolvimento regional, afora o esvaziamento dos incentivos
fiscais, que também ocorreu no mesmo período. Então, eu não vou entrar
em muitos detalhes aqui, vou pular isso senão eu vou ficar falando aqui por,
pelo menos, uma hora.
O perfil do estado foi transformando muito significativamente, ao longo
de todo esse período. Isso, nos últimos anos; não estou dizendo que os úl-
timos anos são os anos de agora, isso nos últimos dez anos, que esse pro-
cesso começou, na verdade em 98, levou a algo que está criando uma situa-
ção muito difícil de administrar, que é o acúmulo de despesas represadas,
principalmente investimentos, sob a forma dos chamados “restos a pagar”.
Restos a pagar hoje já não são restos, o volume de restos a pagar represa-
dos já é da ordem de duzentos bilhões de reais, o que significa que é duas
vezes mais a parcela do orçamento que é de livre utilização pelo estado,
descontadas as despesas obrigatórias, e essa situação gera um enorme
conflito entre as três agendas principais do governo: a agenda que eu cha-
mo de macroeconômica, a agenda social e a agenda política. Isso se refle-
te, inclusive, nos recentes embates entre Executivo e Legislativo em torno
de liberação de emendas parlamentares e na pressão do Legislativo para
372
aprovar o chamado “orçamento impositivo das emendas parlamentares”. E
não é por acaso, porque cada vez que se necessita ou tenciona aumentar o
investimento, isso repercute nas demais agendas; para aumentar uma tem
que haver escolhas, outros vão ter que ser, de certa maneira, prejudicados
naquele momento. Essa é a questão que está posta e, particularmente, os
investimentos, e mesmo os investimentos do PAC que têm prioridade, têm
dificuldades em avançar no ritmo que o governo pretende dar. À medida
que o Estado foi acumulando esses problemas, a Federação foi acumulando
desequilíbrios e, como chamou a atenção aqui muito bem o Sergio, duas
coisas não são compatíveis com a necessidade de você ter uma visão de
que como vamos lidar com isso no futuro. E, particularmente, as enormes
disparidades na capacidade de atendimento das demandas das suas popu-
lações.
O movimento das ruas está mostrando o quê? Está mostrando que a so-
ciedade, sentindo um efeito de um processo de urbanização por que o Brasil
atravessou, inédito no mundo, na velocidade em que aconteceu no Brasil,
hoje tem mais brasileiros vivendo em cidades com mais de um milhão de ha-
bitantes do que toda a população rural. E os problemas urbanos cresceram
na medida em que não houve dinheiro para fazer investimento em melhoria,
da infraestrutura urbana, dos transportes, da habitação, do saneamento, e
por aí afora. Sem os orçamentos dos estados ou orçamento federal, não tem
dinheiro para investir nessas questões. O governo vem tentando contornar
essa dificuldade expandindo o crédito da Caixa Econômica, que é uma saída,
373RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
no momento, a única possível, mas não é sustentável no longo prazo. Os es-
tados e municípios normalmente estão aumentando o seu endividamento, o
que gera uma outra consequência se se pensar mais adiante. Então, nesses
desequilíbrios federativos, há o ônus político que está sendo imposto aos
governantes, está cada vez mais claro na perda de popularidade dos gover-
nadores, qualquer que seja sua orientação política partidária, e dos prefei-
tos das grandes capitais, que é onde o problema das áreas metropolitanas
se manifesta.
Aqui está um ponto muito essencial da discussão da convergência social
e a convergência econômica. São as enormes disparidades fiscais entre os
estados e entre os municípios. E o que acontece? A Constituição diz que
cada estado e cada município tem que aplicar 25% em educação, 13%, os
estados, 18%, os municípios em saúde, percentual uniforme. Quando você
faz isso se diz o quê? O cidadão ali do Pará, aqui tem, não estou olhando o
número daqui, mas acho que é cerca de oitocentos reais per capita de orça-
mento, ele vai ter 25% de oitocentos para investir em educação, se ele vive
no Pará, se ele nasceu no Pará e vive no Pará. Se ele nasceu no Acre ou em
Roraima, que tem quase três mil reais per capita, ele vai ter 25% de três mil
para investir em educação.
Então, obviamente, o estado brasileiro não garante aquilo que em outras
federações é uma cláusula constitucional. O estado deve garantir a isono-
mia de oportunidades sociais a todo cidadão, independentemente de onde
ele nasceu ou de onde ele vive. E a isonomia de oportunidade depende de
374
quê? Do sujeito ter acesso ao mesmo padrão de educação, de saúde, de
segurança, que é oferecido em qualquer parte do território nacional. E isso
não se verifica no Brasil em função deste problema, que nós não corrigimos
na reforma constitucional.
O caso dos municípios é igual ou pior. Está aí a curva por tamanho de mu-
nicípio e por receita per capita, eu não vou explicá-la senão eu ultrapasso o
tempo. Mas, simplesmente, diz o seguinte: do lado esquerdo do gráfico tem os
pequenos munícipios e na ponta direita tem os grandes municípios. Qualquer
município, muito pequeno, lá em baixo, tem o orçamento por habitante, muito
maior do que os municípios com mais de duzentos e cinquenta mil habitantes,
se não me engano, é a estatística. E o pior, isso aí é um gráfico de Gini ao in-
verso, que diz o seguinte: 2% da população da população brasileira vive nos
10% dos municípios com maior receita por habitante, que é o caso de Paulínia,
o caso de qualquer cidade grande de região metropolitana que tenha um orça-
mento por habitante enorme porque acumula cota-parte do ICMS com receita
do FPM, e assim por diante. Isso resulta de quê? Resulta de que o processo de
transferências na federação brasileira foi acumulando uma transferência em
cima da outra, cada uma constituída num momento, por uma razão específi-
ca e, hoje em dia, esse conjunto de transferências faz com que a distribuição
delas no território seja totalmente aleatória. Não há uma visão de uma política
nacional de transferências que tenha sentido conexão com a nova visão de
política de desenvolvimento regional; isto é, o território não foi trabalhado e
não foi contemplado em todas essas mudanças que aconteceram.
375RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Os novos desafios. Esse é o ponto central do nosso terceiro ato. O Brasil
passou por muitas mudanças desde, na verdade, o início de 90. Privatização
a toda força no governo Collor de Melo, com esvaziamento da capacidade do
estado que se seguiu ao desmonte da administração pública feita naquele
momento, pelo abandono do planejamento a partir da necessidade que o
Brasil teve, é verdade, de enfrentar a crise macroeconômica que se instalou
no final da década de 90, que pôs a política do superávit primário como uma
estratégia fundamental para ressuscitar e salvar a estabilidade da moeda,
e por outras questões que mudaram a realidade, a abertura da economia, a
globalização do mercado financeiro, novas tecnologias que permitiram en-
curtar a geografia, e transportar mercadorias hoje do extremo oriente para
o porto brasileiro ficou extremamente fácil e, às vezes, mais barato do que
você trazer do Sul para o Norte; isso desaguou recentemente no episódio
da chamada “guerra dos portos”, que foi um dos motivos de acirramento do
conflito federativo.
Então, tudo isso significou que esses novos desafios encontraram um es-
tado brasileiro, eu diria, para ser uma palavra assim um pouco provocativa,
despreparado para lidar com isso. Despreparado por quê? Despreparado
pela ausência de uma tentativa de construir um novo projeto de desenvolvi-
mento que tente lidar com essa nova realidade. Por isso que a nova realidade
não permite você simplesmente tentar lidar com elas com os mesmos ins-
trumentos que no passado funcionaram satisfatoriamente. Então, elas le-
varam a essa situação que eu estou chamando de um descompasso entre o
376
avanço da convergência social e a interrupção do processo de convergência
econômica; o que, como foi dito aqui muito bem, não é sustentável. Porque
se você fizer simplesmente a convergência social, melhora o nível de educa-
ção de parte da população urbana do Nordeste, se não tiver oportunidade do
cidadão viver aqui com melhores empregos e melhores rendas, ele vai embo-
ra. Ele vai ou para o Sul se tiver possibilidade, ou vai para o exterior. Então,
pior, porque se esse cidadão que ficar melhor qualificado sair da região, a
situação da região piora ainda mais do era anteriormente. É um processo
perverso. Então, as duas coisas tem que caminhar par e passo, a convergên-
cia social tem que acompanhar a convergência econômica e vice-versa.
Fenômeno da urbanização, não podemos ignorá-lo. E aí temos uma outra
questão complicada para lidar com o problema. E, de novo, a constituição
de 88 reforçou a autonomia dos municípios, mas não criou os instrumentos
necessários para assegurar a cooperação dos entes federados na gestão
dessas políticas. Nós vemos o programa metropolitano no Brasil hoje, é um
horror. É um horror porque o município é que é o titular da competência para
regular o saneamento básico, o transporte intermunicipal, e o estado não
tem condições de coordenar essas ações. E a dificuldade de você implemen-
tar a gestão da política pública no território se manifesta com clareza na
região metropolitana. Então, nos estamos discutindo há dez anos“gestão
pública é ruim”, é ruim. Mas, não é um problema de que o gestor público é
ruim, o problema é que as condições institucionais para melhorar a gestão
pública não estão dadas, não há possibilidade de você cooperar e os orça-
377RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
mentos se tornaram, vou usar uma palavra modesta, muito pouco úteis para
exercer essa função. Se quiserem, eu posso explicar isso em detalhes.
E outra coisa, que eu acho que já foi mencionada aqui também na mesa
antes, que me chamou atenção, é a fragilização da mobilização política que
se manifesta nesse esvaziamento da comissão de desenvolvimento regio-
nal. Eu me lembro que no passado a comissão de desenvolvimento regional
da câmara dos deputados era muito ativa, estava toda hora fazendo audiên-
cias públicas, provocando debates e, nos últimos anos, eu, pelo menos, não
vi uma movimentação maior nesse sentido.
Aí tem uma série de dados que não vou, fica para a coordenação do even-
to, de repente, aproveitar, mas a questão do investimento em infraestrutura.
Não estamos falando aqui necessariamente, como eu ouvi um pedacinho
da reunião de ontem à tarde, que o investimento em infraestrutura significa
apenas fazer rodovias; não é só isso. Se tivermos pensando na Amazônia,
pode ser que uma infraestrutura de fibra ótica para uma comunicação mo-
derna larga e à distância seja mais importante do que melhorar o sistema
rodoviário. Cada situação tem a sua peculiaridade. Então, o investimento em
infraestrutura tem que se adaptar, qual a infraestrutura é adequada para
aproveitar as vocações regionais de desenvolvimento de cada quadro do
Brasil. No Centro-Oeste, certamente, é preciso escala para movimentar o
agronegócio, já em outras regiões o problema é diferente, a infraestrutura
de ciência e tecnologia pode ser muito mais importante do que a rodovia
moderna. Mas, enfim, é uma questão fundamental e aí nós temos um déficit
378
importante. A queda dos investimentos em infraestrutura é um problema
que a gente precisa solucionar. O governo vem tentando melhorar as condi-
ções da regulação, mas ainda é pouco.
O arrefecimento do processo de integração regional se dá na esteira
desses novos desafios. O que impulsionou o Centro-Oeste? O Centro-Oes-
te não tem mais nada a ver com Norte e Nordeste, só tem a ver para fins
de discussão do ICMS, porque a realidade econômica do Centro-Oeste é
outra, completamente diferente. O Centro-Oeste está mais conectado hoje
com a Ásia do que com o resto do Brasil. E boa parte do Sul brasileiro, se o
Mercosul funcionasse, ainda bem que para o Nordeste não funciona, porque
se o Mercosul funcionasse e a Argentina estivesse num processo de desen-
volvimento acelerado, boa parte do Sudeste já teria se conectado mais com
o Mercosul do que com o Nordeste brasileiro. Então, essas novas conexões
que se fazem na esteira dessas mudanças todas que aconteceram no mun-
do não estão sendo estudadas, eu acho, com a profundidade necessária e
como elas estão repercutindo aqui dentro.
Não é por acaso que o tema do estado está aqui na primeira pergunta
que foi formulada pela organização do evento. Em um país continental, a
intervenção do estado como tem se comportado no caso brasileiro? Acho
que esse é o problema, para mim, central. O estado adquiriu fragilidades
financeiras, fragilidades operacionais, que dificultam extremamente o es-
tado avançar. Numa expressão que eu costumo utilizar, o estado adquiriu
uma forte miopia, não consegue enxergar dois metros adiante. O estado
379RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
está administrando os problemas do cotidiano. E, no caso dos investimen-
tos, administrando cada vez mais os investimentos que foram previstos em
orçamentos de três ou quatro anos atrás, não o orçamento do ano corrente,
por força daquela acumulação de restos a pagar que eu mencionei ante-
riormente. Não é uma questão de discutir o mérito do que foi feito, é uma
questão de discutir os fatos; fatos que se acumularam, boa parte deles, por
profundas razões, e tem a ver com barreiras, logística e eficiência da gestão
pública. No caso da eficiência da gestão pública, o problema orçamentário
é fundamental. É fácil ver que o gestor que está lá na ponta para executar
qualquer ação na área de infraestrutura, ou na área social, ele não conhece
o seu fluxo de caixa. Ele sabe que tem um crédito orçamentário a receber,
agora ele não sabe se vai receber, quanto vai receber, quando vai receber e,
se quando ele receber, tem tempo de cumprir com todas as formalidades le-
gais para executar despesas. Não por acaso, os projetos de investimentos se
arrastam, não terminam. Então, é um problema que precisa ser enfrentado
também o da reforma orçamentária que, na minha perspectiva, é a reforma
esquecida.
Nós acabamos de fazer um trabalho na Fundação Getúlio Vargas, num
livro que teve esse título, exatamente, da reforma esquecida, porque nós dis-
cutimos no Brasil, nos últimos, todas as reformas possíveis, tributária, pre-
videnciária, política, trabalhista; ninguém falou da reforma orçamentária.
Parece que é um assunto que não interessa a ninguém, quando o orçamento
público é por excelência o instrumento de gestão do estado. É estranho es-
380
cutar a turma falando do estado e que a gente não discuta o orçamento, o
esvaziamento, a fragilização da mobilização política. Quer dizer, na verdade
o Brasil está fazendo hoje menos do mesmo. Menos do mesmo, no sentido
de que os incentivos estão encolhendo, a capacidade de investimento desa-
pareceu, então é preciso mudar talvez o foco da nossa atenção.
Tem uma série de informações, quer dizer, só um gráfico que vale a pena,
talvez, chamar atenção, acho que eu já estou chegando ao final. Mas, esse
aqui é mais interessante para falar das transferências federativas.
A base tributária das transferências entre os estados e municípios em
1989, eu acho que é o ano certo, era 75% da receita federal. Aquilo ali é IPI
mais imposto de renda sobre o total da arrecadação. Caiu para 40%, mais ou
menos a metade. Não por acaso, os estados e municípios estão nessa briga
de disputar como quem vai dividir um bolo que é cada vez menor. E aí, ob-
viamente, não tem como dar acordo porque o bolo reduziu a metade, como é
que você vai redividir a metade? Então, fica essa confusão.
Fragmentação do crédito público, eu acho que o secretário Sergio Duarte
já falou nisso, esse tema, vários programas, mas os programas não são arti-
culados dentro de uma lógica nacional de política regional.
A perda de espaço da renúncia fiscal, eu coloquei apenas um dado. A
renúncia do SINT foi de trinta bilhões de reais em 2012 e do desenvolvimen-
to regional foi de cinco, quase seis bilhões. Só para dar uma dimensão do
esvaziamento também da renúncia fiscal do Nordeste. Isso piora ainda se
você olhar a renúncia fiscal agora para fins de crescimento. A desoneração
381RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
da folha, em dados recentes que me passaram, em 2012 já foi de quarenta e
cinco bilhões e poderia alcançar oitenta e oito bilhões em 2014, do jeito que
a coisa vai. Por isso que eu estou chamando de menos do mesmo, cada vez
é menos do que se fazia na política regional.
Dado interessante, renúncia fiscal dos estados. Eu não vou comentar,
essas transparências vão ficar aí, porque eu não tenho tempo.
Então, as indefinições do passado, as lições do passado e as indefinições
do presente, passado naquele período em que a integração econômica fun-
cionou, visão estratégica e planejamento. Essa é a questão para mim, fun-
damental. E, no presente, é essa questão da necessidade de rediscutir os
instrumentos, o que eu chamo aí no futuro de em busca de uma nova agenda
para a política regional.
Foco da política regional tem que ser a coesão. Coesão nas suas várias
dimensões, coesão territorial, coesão econômica, coesão social, coesão fe-
derativa. Sem equacionar esses conflitos vai ser muito difícil o Brasil en-
contrar espaço de negociação política para conceder uma nova estratégia.
Enquanto todo mundo está brigando com todo mundo, a possibilidade de
você construir qualquer entendimento fica muito complicado. A coesão fe-
derativa, como nós mostramos, é fundamental para a convergência social.
E algo que nos últimos anos nós viemos discutindo política regional como
se fosse uma questão subsidiária da reforma do ICMS. Interessante, não é?
Devia ser o contrário, você devia discutir a política regional e, depois, como
é que você precisa reformar o ICMS para ele ser coerente com política; mas,
382
não, fizemos o contrário. Estamos escorregando nesse equívoco já, pelo me-
nos, há 15 anos. Isso é alguma coisa que eu tinha proposto no trabalho que
andei fazendo com o Ministério da Integração, é menos, questão de reverum
pouco os instrumentos, adaptar à nova realidade.
E a minha interrogação, no final desses quatro atos dessa peça teatral, é
simplesmente esta interrogação que está aí. Não é que isso seja uma fatali-
dade, mas é uma possibilidade. Se nós não desenharmos uma estratégia na-
cional olhando vinte anos à frente, como é que nós vamos manter a coesão
territorial, a coesão da nação brasileira, que na época da independência foi a
grande preocupação; na época da independência, a grande preocupação era
como nós vamos manter a coesão nacional num contexto onde as ameaças
de desintegração são enormes. É claro que nós não estamos falando agora
de desintegração política, nem os gaúchos hoje mais que o conheço defen-
dem separar do Brasil, mas há coesão nacional no território. Se a Amazônia,
cada vez mais, vai estourar sua biodiversidade conectada com o resto do
exterior, o Centro-Oeste com a China, o Sul com o Mercosul, se ele vier a ser
ressuscitado, o Nordeste foi pra onde? Essa é uma preocupação que eu acho
fundamental neste debate. É preciso um projeto nacional de integração re-
gional. E acho que esta iniciativa aqui do Integra Brasil, meu juízo se encaixa
muito bem nessa provocação, digamos assim. Obrigado e desculpe.
Filomeno Moraes: “Em nome da organização do evento, agradeço muito
penhoradamente as palavras do professor Fernando Rezende,sobretudo no
383RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
sentido de mostrar as deficiências no cumprimento do Artigo 3º da Consti-
tuição Federal, que são os objetivos da República Federativa do Brasil.
De imediato, passa a palavra agora ao deputado Pedro Eugênio de Castro
Toledo.”
Pedro Eugênio de Castro Toledo: Bom dia a todos e a todas. Quero saudar a
todos vocês aqui presentes, aqueles que fazem a mesa, os nossos colegas de
debate, a começar pelo nosso coordenador moderador, professor Filomeno,
ao nosso Fernando Rezende, ao Sérgio de Castro. Quero saudar também
aqui o nosso relator Costa Neto e, aos que estão aqui na plateia, gostaria de
abraçar a todos nas pessoas do nosso querido Firmo de Castro e do nosso
colega Raimundo Gomes de Matos, e nosso Jocildo, colega de departamento
de economia da Universidade Federal de Pernambuco.
Meus amigos, achei providencial, não sei se planejado, mas na ordem
das apresentações, estar aqui agora para ser o derradeiro a fazer as minhas
considerações, o último dos três. Há uma conexão interessante, e não é por
acaso com certeza, entre as observações, entre as manifestações e as apre-
sentações aqui feitas. Eu quero começar citando uma frase de um texto que
escrevi aqui para esse seminário, pensando em lê-lo, e já decidi que não vou
fazê-lo para poder me comunicar melhor com vocês, porque toda vez que a
gente vai ler perde muito a capacidade de comunicação. Vou deixar aqui o
texto com a coordenação do encontro. Aliás, havia deixado de referir-me ao
Integra Brasil, a todos aqueles que tomaram essa iniciativa e agradecê-los
384
pelo convite, e ressaltar a importância desse momento, desse debate, até
porque não é um momento, é um processo, é algo que já vem se acumulando
em várias discussões e que pretende ter continuidade, e isso é fundamental.
Mas, a frase que eu destaquei aqui é a seguinte: “A desigualdade ofen-
de mais o interesse do desenvolvimento geral do país do que os da própria
região”. Essa reflexão me parece que se conecta exatamente com, talvez, a
última frase que o Fernando colocou, de que há, inclusive, a possibilidade de
uma desagregação nacional se nós não olharmos o desenvolvimento regio-
nal como algo necessariamente parte de um processo de desenvolvimento
nacional. O nosso processo histórico, pela sua própria natureza, gerou pro-
fundas desigualdades no nosso país. A nossa política de terras, por exemplo,
de propriedade da terra, e o arranjo do poder nacional fez, por exemplo, que
uma reforma agrária, que uma distribuição de terras produtivas, não se fi-
zesse aqui como foram feitas em outros países.
As nossas regiões se quedaram num processo de desigualdade que
acompanhou toda a nossa história, e o nosso planejamento, quando realiza-
do de forma mais consistente, não foi capaz de reequilibrar o processo de
desigualdade que caracteriza a nossa nação. Na medida em que esse pro-
cesso evolui, a partir do momento em que há uma retomada, não explicitada,
de políticas de desenvolvimento regional nos últimos dez anos, ao longo já
do governo Lula e do governo Dilma, e eu digo não explicitada porque quan-
do nós temos políticas sociais, por exemplo, repercutindo e fazendo efeito
mais forte na região Nordeste, por conta de termos aqui um maior índice de
385RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
pessoas e de famílias abaixo da linha de pobreza, isso não nasceu dentro de
uma política explicitamente de desenvolvimento regional. Trata-se de uma
política nacional que tem um rebatimento diferenciado no Nordeste. Quan-
do a PETROBRÁS descentraliza um pouco mais os seus investimentos e
decide realizar investimentos em novas refinarias, depois de décadas sem
realiza-las, pratica uma política de desenvolvimento regional, mas que não
nasceu de uma concepção de um desenvolvimento regional estruturado,
nasceu de decisões políticas, aliás, bem tomadas, como foi o caso também
da indústria naval, como foi o caso das decisões da TRANSNORDESTINA,
de fazer a TRANSNORDESTINA e a transposição do Rio São Francisco, ve-
lhas aspirações do Nordeste, seculares. Mas, não se tratou de um processo
pensado, elaborado previamente dentro de uma política nacional de desen-
volvimento. Isso acontece em face de um Brasil absolutamente diferente
daquele Brasil que foi capaz de gerar uma mobilização no Nordeste, que
obteve a, nós estamos aqui vendo a exposição do Celso Furtado no governo
de Juscelino, a SUDENE e uma política de desenvolvimento regional propos-
ta por Celso Furtado. Naquele momento, sem dúvida dentro de um marco
conservador muito ligado às elites dos estados, das chamadas oligarquias
regionais, mas o Nordeste teve a capacidade de vocalizar um determinado
rumo e fazer-se ouvir.
Hoje, o Brasil está absolutamente mudado, a urbanização que foi referida
aqui explodiu, surge uma classe média que é contada a nova classe média
aos milhões. Essa classe média nasce de um processo de redistribuição de
386
renda, a partir de um modelo de desenvolvimento com distribuição de ren-
da, que lastreou-se profundamente no crédito e em programas sociais. Esse
modelo que gera essa nova classe média, gera também uma configuração
política absolutamente distinta, o que acontece também nos arranjos eco-
nômicos e políticos da industrialização que se faz. Em torno, por exemplo,
dos projetos da PETROBRÁS no Nordeste surgem novas indústrias. Essas
indústrias não têm a história de indústrias tradicionais, as chamadas indús-
trias tradicionais nordestinas; estão conectadas onde? Quais os interesses
imediatos e para o futuro desse conjunto de pensamento “industrial”, que
se coloca muito praticamente como um fornecedor de equipamentos e de
matérias primas para uma indústria petrolífera. Qual a visão regionalista, ou
regional, que esses novos atores passam a ter? O que representam hoje os
governadores? Falo em nome de que interesses, exatamente?
Esse quadro é um quadro de extrema complexidade, que se reflete e seria
bom, meu caro colega Raimundo, que estivéssemos aqui com toda a ban-
cada nordestina discutindo isso, se reflete claramente, e aqui eu gostaria
de me fixar mais, se reflete na nossa discussão lá no Congresso Nacional.
O que tem de mais consequente no Congresso Nacional sobre esta ques-
tão, em termos institucionais, são as reuniões que nós fazemos da chama-
da “Bancada do Nordeste”. E nós fazemos uma reunião grande por mês, e
convidamos autoridades, geralmente gestores públicos, como o presidente
do Banco do Nordeste, o presidente da EMBRAPA, como o diretor de pro-
dução da PETROBRÁS que foi lá representar não a diretoria dele, mas a
387RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
presidente Graça Foster, O ministro Pepe Vargas, e fazemos uma discussão
sobre os recursos que estão sendo aplicados e os investimentos que estão
sendo levados lá, que estão sendo levados para o Nordeste, trazidos para o
Nordeste. E o que acontece? No momento do debate, Raimundo, por favor
discorde de mim se for o caso. Mas, nós assistimos a uma forte propensão a
que a discussão não enverede, se reflete em reivindicações de mais recursos
para os seus estados. Então, chega lá o pessoal do Maranhão e diz: “olha, os
poços maduros da PETROBRÁS lá no Maranhão não estão sendo licitados
e precisa aumentar, anote aí que tem que acelerar esse negócio”. O pessoal
da Bahia, diz: “mas, o investimento da PETROBRÁS na Bahia está menos do
que era no passado”. Porque está mesmo, descentralizou.
A Randulpho Alves, a refinaria lá, o nome é esse? Não foi expandida para
permitir que haja expansão nas refinarias novas, na que está acontecendo
em Pernambuco; Pernambuco está até nesse caso, não reclama porque o
investimento lá está tocando. Ceará, Rio Grande do Norte e Maranhão ficam
cobrando, cadê a premium daqui que não começou ainda? Não, está plane-
jando, tal e tal, na fase de planejamento estratégico, o projeto está sendo
feito; mas, a obra não começou. Evidentemente, que cada parlamentar está
cumprindo a sua tarefa de reivindicar recursos para as suas regiões, para os
seus municípios e seus estados, mas isso evidentemente não toca no âmago
da questão, que aqui foi tão bem ressaltada pelos que falaram antes de mim.
Qual a pauta, portanto, que nós temos discutido? Nós temos tentado, na
bancada, realizar alguns passos que procurem fazer convergir o debate des-
388
se espaço de reivindicação para um espaço mais estruturante. Definimos a
realização de um seminário para final de setembro e, inclusive, conversando
com a Nicolle e também com o presidente Ary Joel, para que nós já levásse-
mos para aquele seminário a síntese das discussões realizadas neste aqui
e no que o Banco do Nordeste realizou há coisa de um mês atrás. Estamos
fazendo uma discussão sobre o Semiárido e essa discussão aponta clara-
mente para a necessidade de termos uma nova política produtiva para o
Semiárido Nordestino, essa nova política exige que haja a difusão de novas
tecnologias, exige que a assistência técnica seja o carro-chefe do crédito e
não o contrário, o crédito foi na frente e a assistência técnica não chegou, e
é fundamental que a assistência técnica esteja na frente para falar do nosso
Semiárido, e nós temos instrumentos para isso numa lei aprovada, que defi-
ne como deva ser a metodologia da assistência técnica comprometida com
metas, com objetivos bem factíveis e cotificáveis, nessa linha, Sérgio, que
você citou na sua exposição.
O Banco do Nordeste nos entregou, por solicitação da bancada, há coisa
de uma semana atrás, um estudo sobre os perímetros irrigados do Nordes-
te, enorme ociosidade, cerca de, se não me falha aqui a memória,cento e
cinquenta mil hectares passíveis de entrarem em produção, mas, por muito
tempo de não uso, evidentemente precisando de investimentos adicionais
para poderem se tornar operacionais. Passamos para o ministro Pepe Var-
gas uma proposta de produção de feijão num momento de escassez, utili-
zando-se da ociosidade desses perímetros, algo que nós não temos instru-
389RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
mento técnico para saber se é algo que é factível, devido a essas fragilidades
dos próprios perímetros que demandam que se faça uma nova modelagem
para os mesmos. A discussão sobre os assentamentos que precisam ser es-
truturados e reordenados, e colocados a produzir efetivamente e não ape-
nas sendo disponibilização de terras para quem não as tem. Acompanhando
os investimentos e as ações do Ministério da Integração no caminho de se
prover água, numa linha de universalização da água, mas olhando com gran-
de preocupação a desestruturação dos órgãos que são voltados para essa
tarefa, de que é exemplo mais evidente o DNOCS, havendo uma subcomis-
são especial para discutir o DNOCS, a reestruturação do DNOCS junto ao
Ministério da Integração; há um projeto em andamento, mas os recursos
não existem e o DNOCS não tem capacidade operacional para fazer aquilo
que precisaria estar fazendo. E algo que eu ouvi do presidente da EMBRAPA
e hoje ouvi de novo do nosso Fernando Rezende, a preocupação com a au-
sência de um método de gerenciamento territorial das ações que possam,
efetivamente, serem feitas no Semiárido. O presidente da EMBRAPA, dis-
se: “Nós temos tecnologia estocada, disponível, para realizar, responder a
muitos dos desafios”. Nós temos que ter, aí digo eu, e nós temos discutido
isso lá, nós temos que ter um modelo produtivo no Semiárido que não faça
com que um produtor diga o seguinte: “Infelizmente, tivemos dez anos sem
seca”; isso eu ouvi demais de um produtor. Mas, que incoerência é essa?
Porque ao ter dez anos sem seca, as propriedades expandiram o seu rebanho
acima da sua capacidade de sustentação. Propriedades que desde o avô, o
390
bisavô, tinham dez animais, passaram a ter cem, cinquenta, oitenta, e a seca
reduziu pela mortalidade e não por um processo de comercialização, porque
se tivessem adivinhado teriam vendido ainda quando o preço estava mais ou
menos, mas a maioria tentou segurar e aí ou foram vendidos a preço vil, ou
foram sacrificados.
Essa falta de sintonia entre a base produtiva, a capacidade de resistência
à seca da base produtiva, e a possibilidade de expandi-la em momentos de
não seca, exatamente pela existência de linhas de crédito importantes, que
foi um dos vetores aqui que vêm sendo utilizados para fomentar o nosso
desenvolvimento, como o Fernando chamou atenção, isso leva à necessida-
de de uma revisão drástica do modelo produtivo no Nordeste. Tem que ter
gerenciamento territorial no Semiárido, tem que ter crédito associado e su-
bordinado à difusão de tecnologia através da assistência técnica, e tem que
ter, evidentemente, técnicas de resistência de ensilagem, de conservação de
água, de utilização de água. Nós não temos um gerenciamento, por exemplo,
dos nossos recursos hídricos, há mil e quinhentos poços, o Ministério da
Integração levantou isso, mil e quinhentos poços perfurados no passado e
que não foram instalados, que agora serão, nesse momento, agora. Mas, que
evidentemente teriam que ter sido perfurados e instalados imediatamente.
Esses desafios aqui e esse tipo de discussão fogem do debate reivindica-
tório, mas eles não são o centro do nosso debate, não é Raimundo? Não são
o centro do nosso debate. Isso fica sim nas palestras que nós temos ouvido,
nas reflexões que nos chegam, e nós temos feito um esforço de traduzir isso
391RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
em documentos e vamos procurar colocá-los de uma forma que nos dê um
instrumento político, que possa ser um instrumento de ação. Vou falar um
pouco mais sobre isso daqui a pouco.
Mas, eu quero falar também de alguns outros desafios que nós temos
pela frente, ou ameaças. Nós temos que considerar os gargalos do investi-
mento público para o Nordeste como sendo um dos pontos de preocupação.
Quando a PETROBRÁS explicita os investimentos que estão sendo feitos no
Nordeste, que são muito maiores do que já tinham sido feito antes, mas ao
mesmo tempo o pré-sal está aí. Ele vai sugar e direcionar um volume mui-
to maior de recursos para fora do Nordeste do que para o Nordeste. E por
que nós não seguimos o que o Marcelino, presidente lá da refinaria Abreu
e Lima, vem dizendo há muito tempo? Fazer no Nordeste uma grande base
de produção de máquinas, de equipamentos, para exportação no setor de
equipamentos voltados para o setor petrolífero e fazer essas exportações
exatamente com a Venezuela e com outros países do mundo. Se nós ficar-
mos só no Nordeste com a exploração do petróleo, nós jamais poderemos
competir com o pré-sal, o jogo já está feito. Este movimento, como ele ganha
forma? Que eu acho que é o centro deste debate aqui. Como institucionali-
zar essas propostas, como garantir que as parcerias público-privadas, que
tendem para o Sul, naturalmente; o que é parceria público-privada? É um
investimento público, parcialmente público, que capta investimento privado
em cima de uma realidade de mercado. Onde é que as estradas, as rodovias
nordestinas vão competir com as rodovias do Centro-Sul, onde o trânsito, o
392
tráfego é muito maior, muito mais intenso, e a renda é muito mais concentra-
da ali. Como contornar essa questão num quadro de restrição orçamentária
financeira, aqui descrita pelo Fernando? Como realizar essa ação política
institucional? Com certeza, lutar pela estruturação do DNOCS, lutar pelo
fortalecimento da SUDENE, isso tudo vira frase de efeito. Isso não acontece
a partir da própria região, na minha opinião. Nós, no Nordeste, temos sim a
capacidade de, tendo esta visão da necessidade de uma política nacional de
desenvolvimento regional, puxarmos o debate e tomarmos a iniciativa polí-
tica da articulação. Agora, nós não vamos a lugar nenhum se imaginarmos
que, por exemplo, no Congresso Nacional a bancada do Nordeste, ali entrin-
cheirada, defendendo mais recursos para o Nordeste, vai conseguir alguma
coisa, porque estará malhando em ferro frio em cima de uma realidade de
dificuldade e de restrição orçamentária. Se consegue uma coisa, se conse-
gue outra, mas não se muda o escopo geral do modelo de desenvolvimento.
Essa discussão tem que ser feita no quadro nacional, nós temos que pro-
curar alianças estratégicas com outras regiões, com outros atores, dentro
do governo, fora do governo, principalmente fora do governo e na sociedade.
Na minha opinião, esse é o nosso grande desafio. É o desafio de darmos vida
a uma proposta que seja importante para a região Nordeste, mas que seja
importante para o Brasil. Achei muito importante a sua observação, Fernan-
do, de ameaça de desintegração. Evitar essa desintegração é interesse do
Nordeste? É interesse do Centro-Oeste? Do Sul, do Sudeste? É do interesse
do Brasil. Que país é esse, que improbabilidade é essa que aconteceu?
393RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Bolívar, nas suas lutas, sonhava por uma América unificada de língua
espanhola, América espanhola, lutou para isso, e era muito desconfiado, ele
dizia para o General Abreu e Lima, que dá nome à nossa refinaria, que não
queria muita conversa com o Brasil porque desconfiava muito desse negó-
cio lá de Dom Pedro e tal, que não ia levar a nada, que era uma coisa muito
subordinada a Portugal, e que queria fazer uma independência. E quando a
coisa foi se concretizar, houve a balcanização de todos os países que ini-
cialmente iriam formar a grande nação cujo nome agora me falha, a grande
Colômbia, alguma coisa assim. E, no entanto, a unidade se fez aqui. Não foi
fácil, não foi harmônica, teve muita violência, movimentos nativistas e liber-
tários foram esmagados duramente, desde o contestado, do Sul até os ca-
nudos nos sertões da Bahia, até Juazeiro; enfim, esses movimentos sempre
reprimidos e essa unidade, portanto, não foi uma coisa cordial, foi uma coisa
forjada, a ferro e fogo, por interesses centrais. Aí tem toda essa discussão
muito importante do federalismo, da descentralização versus a centraliza-
ção. Nós estamos no meio dessa batalha agora. E, politicamente, nós temos
que envolver a todos e os partidos políticos têm uma responsabilidade muito
grande nisso aí. A nossa representação política no Congresso Nacional tem
que atuar fortemente, é ilusão imaginar que isso possa ser feito tecnicamen-
te. Tem que ter uma reforma política, tem que ter uma reforma tributária, a
reforma esquecida a qual se refere o Fernando, essas reformas precisam
acontecer, mas jamais acontecerão no âmbito do Congresso Nacional, se
ele estiver lá, isolado, e atuando como se fosse um ator descolado da socie-
394
dade. Nós temos que realizar esse processo de construção de uma política
nacional de desenvolvimento regional, realizando alianças profundas de ca-
ráter nacional, e eu entendo que isso é possível de se fazer.
No âmbito dessa discussão, discutirmos reestruturação dos órgãos, dos
mecanismos de desenvolvimento regional, discutirmos a institucionalização
da ação administrativa do governo sobre o território, tudo isso passa a fa-
zer sentido. Sem esse grande pacto, e esse é um condicionamento que eu
sei que não é simpático, porque alguém vai dizer: “Mas, vamos esperar isso
acontecer quando? Tem que acontecer agora”. Nós temos que ter a capa-
cidade de levantar esse debate agora como está sendo levantado e dar-lhe
consequência prática, factual, objetiva. As ações que estão sendo propostas
pelo Ministério da Integração são todas muito bem colocadas e numa dire-
ção correta, mas não ganharão vida se forem apresentadas como mais um
projeto de lei a ser aprovado e sem o respaldo e articulação política neces-
sária no âmbito da sociedade. Portanto, esse é o nosso desafio e eu tenho
certeza que esse encontro ajuda em muito a caminharmos nessa direção.
Muito obrigado.
Filomeno Moraes: “Então, a mesa está absolutamente em consenso de que
nós vamos prosseguir com os trabalhos e passar à discussão. Então, agora
receberemos as questões e a mesa deve dissertar sobre elas. Eu sugiro que
nós fizéssemos blocos de três questionamentos para uma melhor ordenação
da discussão.
395RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
João Alencar: “Bom dia, meu nome é João Alencar, eu tenho formação em
Engenharia de Transportes e também sou advogado, fui professor da Univer-
sidade Federal do Ceará por quatorze anos e, atualmente, estou no Ministé-
rio do Planejamento e, mais recentemente, na Autoridade Pública Olímpica
no Rio de Janeiro, trabalhando com o tema “Mobilidade Urbana”.
Eu fiquei deveras preocupado, dr. Fernando, que nós estamos numa sinu-
ca de bico, como a gente diz aqui no popular. Nós temos desafios enormes
em termos de país e nós temos desafios enormes em termos de demandas
sociais, que estão se posicionando nesse tabuleiro complexo desse país, di-
gamos, continental. Mas, eu gostaria de traçar alguns paralelos e trazer a
discussão para a nossa realidade aqui, digamos, nordestina. Eu até vou su-
gerir ao Cláudio, colocar mais uma palavra no título do movimento que seria
“Integra Nordeste, Integra Brasil”. Porque eu acho que está ficando claro
que nós ainda não fizemos o dever de casa do ponto de vista da integração
Nordeste.
O acumulado desses dois dias de discussões, e quem conhece um pouco
da nossa realidade nordestina observa isso. Acabou de ter o depoimento
do deputado Pedro Eugênio, dizendo que é um debate das representações
federais do congresso em relação aos estados. É uma discussão de quem
puxa mais brasa para a sardinha, por falta dessa visão, digamos, do integra
Nordeste. E, também, foi dito aqui nas outras falas o esvaziamento do que
seria o papel do governo federal na discussão do desenvolvimento regional e
aí está muito patente o esvaziamento da própria SUDENE. Então, na realida-
396
de, é um elemento de reflexão o que nós, antes de querer chamar os outros,
temos que fazer como dever de casa.
Eu acredito muito em duas questões, podia até somar três. Uma se cha-
ma “vontade política”, outra se chama “decisão política” e outra se chama
“capacidade de sentar à mesa e discutir interesse público”. E aí eu remeto
essa discussão para a questão relacionada com alguns instrumentos jurídi-
cos que já estão postos na legislação como, por exemplo, a lei dos consór-
cios. Por exemplo, na questão metropolitana trazendo agora o assunto da
questão de transportes. Se os senhores olharem na constituição federal, eu
não tenho a competência do estado, distada na constituição federal, que
a competência do transporte urbano metropolitano é do estado. Nós faze-
mos isso por exegese constitucional, por exclusão, porque está definida a
competência do município, que é o municipal, a competência do federal, en-
quanto união, que é o interestadual de passageiros e o internacional, e por
exclusão a gente chega à conclusão que é competência do estado a questão
do transporte urbano metropolitano. Todavia, o estado nunca compareceu
nessa discussão. O estado é um grande ausente, há estado ente federati-
vo, Ceará, Pernambuco, etc..Na questão do desenvolvimento urbano, quais
são os estados brasileiros que têm uma política de desenvolvimento urbano,
com estratégia de vocações regionalizadas no espaço intraestadual. Então,
essa questão se rebate também na questão de Nordeste.
Então, nós temos sim instrumentos jurídicos, como a lei dos consórcios,
que permitem pactuações, que permitem coesões, que permitem uma dis-
397RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
cussão entre mais de um ente federativo ou diversos entes federativos. En-
tão, eu posso tanto aplicar a questão da lei dos consórcios numa gestão me-
tropolitana, mas, para isso, eu preciso sentar à mesa, para isso eu preciso
perder poder. Aí é onde entra a vontade política, aí onde entra a decisão
política. Pernambuco fez isso lá em Recife, com a herança da MTU, que hoje
administra o grande Recife a questão do transporte metropolitano. Goiana
também caminha nesse sentido. Então, na realidade, nós temos sim os ins-
trumentos.
Então, eu fiz ontem uma provocação na outra sessão que tive o privilégio
de moderar, que é justamente utilizando esse instrumento, que são as leis
dos consórcios, por que nós não substituímos a SUDENE e não esperemos o
governo federal, no sentido de recapitalizar, do ponto de vista do papel insti-
tucional da SUDENE, e criemos uma SUDENE do B que seja com a coalisão
dos estados nordestinos, dentro de uma lei de consórcios, dentro de uma
pactuação e dentro da constituição, um órgão pensante e até com capital
de autonomia financeira para captar esses recursos, para definir o que é
prioridade nesse Integra Nordeste.
Então, fica uma provocação para a mesa nesses dois sentidos, que é essa
discussão do papel do estado enquanto ente do planejamento do seu es-
paço territorial, que é o papel da política urbana com visão estratégica de
desenvolvimento regional, a questão metropolitana que é a questão que eu
acho que é atendida sim pela lei dos consórcios e como é que nós podemos
utilizar esses instrumentos para poder nos integrar, e que os nordestinos
398
definam o que querem na região para que possa pautar e levar para a mesa
de discussão, o Integra Brasil, com uma visão nossa, de nordestinos.Muito
obrigado.”
Filomeno Moraes: “Passamos, então, à segunda.
Ernesto Batista: “Bom dia. Meu nome é Ernesto Batista, eu sou da Fede-
ração das Indústrias do Maranhão, e a gente tem acompanhado muito de
perto a questão da discussão do ICMS e, já nessa discussão, se levantou a
necessidade de uma rediscussão mais ampla do pacto federativo. Mas, me
parece, que existem alguns obstáculos para serem vencidos em relação à
construção de uma agenda que atenda minimamente todos os estados da
federação. A pergunta, e eu vou fazer essa pergunta mais especificamente
ao dr. Rezende, é possível se montar uma agenda de discussão hoje? Que
obstáculos a gente precisaria vencer e como a gente pode fazer isso?”
Lima Matos: “Bom dia a todos, sou Lima Matos, sou originário do Banco do
Nordeste, já fui secretário da Fazenda e, portanto, acompanhei essas ques-
tões que a gente vive no Brasil, de gestão pública, muito de perto, e também
estou participando da coordenação desse evento, que realmente é um mo-
mento extraordinário.
Eu, inicialmente, quero dizer que fiquei muito feliz com as apresentações
aqui do dr. Sergio Duarte e Fernando Rezende, inicialmente, caro dr. Alcimor
399RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
também, todos que estão aqui na mesa são excelentes. Mas, eu estava muito
preocupado em levantar dados para que o Brasil pudesse conhecer, todo o
nosso grupo estava muito preocupado, para que o Brasil pudesse conhecer
os grandes problemas, quais são as obrigações, quais são as metas que nós
temos que ter, quais são os grandes obstáculos, quais são até os caminhos
que a gente tem que mostrar que era preciso acabar com a história do “pi-
res na mão”, e a gente vir mostrar o Nordeste como uma opção realmente
para o Brasil ou para o exterior. Mas, essas duas exposições deixaram claro,
de uma maneira contundente, informações suficientes, e a gente ver, por
exemplo, o Ministério de Integração, basicamente do governo federal, com
uma clareza de informações de que é preciso de fato fazer uma revolução no
mérito de gerenciar o país como um todo, para que a gente possa aproveitar
esse Brasil continental. Senão, realmente, nós caminharemos para um se-
paratismo, digamos, direto ou indireto, não tem alternativa.Então, só essas
duas palestras, do ponto de vista de informações, para mim já completaram
o seminário.
Agora, eu penso que a gente precisa só tocar um pouco numa outra ques-
tão, que a gente tem transformado quase o Nordeste numa ficção científica,
que é na questão financeira. Então, eu perguntaria por que a gente tam-
bém não dá um pouco de ênfase na questão dos instrumentos financeiros
de mercado de capitais; era muito importante, bolsa de valores, mercado
de debêntures. Cada vez mais, como estava dizendo o Fernando Rezende,
nós estamos diminuindo o que tínhamos antes. Tínhamos bolsa em vários
400
estados, estamos eliminando, até Rio e São Paulo, ficou só São Paulo, mer-
cado de debêntures também, área de captação de bancos, os bancos todos
centralizados, em uns 30, 40 anos, nós centralizamos brutalmente todos os
bancos, então você perde os instrumentos de trabalho. Qualquer poupança,
qualquer dinheiro depositado por qualquer pessoa do Nordeste, no outro dia
ele estará no Rio e em São Paulo, não tem alternativa, porque os bancos
captam e vão aplicar lá.
E, no passado também, eu não sei se isso não será mais necessário ou
tem outros instrumentos novos, que é a questão da equalização. Nós tive-
mos durante muito tempo políticas de equalização, por exemplo, de depósito
compulsório. Se eu tenho a velocidade da moeda no Nordeste e uma neces-
sidade de desenvolvimento bem diferente do que eu tenho no Sul e Sudeste,
porque não ter um depósito compulsório diferenciado que faça com que os
bancos pensem na região um pouco mais. A questão do salário mínimo, a
equalização do preço do aço que aconteceu durante muito tempo, os esto-
ques regulatórios. Então, essas políticas todas estão sendo perdidas, nós
não estamos trabalhando com elas e não substituímos por outras, o que faz
com que a região enfraqueça muito mais enquanto capacidade de crescer.
Ela vive, a região, em função de incentivos pontuais que vão e voltam, como
a questão dos incentivos fiscais que é excelente para trazer grandes indús-
trias para cá, para o Nordeste, mas não é excelente para perpetuá-la no pro-
cesso da economia. É preciso que a gente crie um sistema inteiro outra vez,
recoloque e mostre. Por isso que eu gostaria que fosse debatido um pouco
401RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
sobre essa questão. Como ficamos nessa questão da equalização e os ins-
trumentos financeiros de mercado de capitais, porque se nós não trabalhar-
mos nas regiões esse processo, nós realmente teremos grande dificuldade;
pelo menos, é o que eu percebo.
Portanto, quero mais uma vez parabenizar os palestrantes pela clareza de
todas as questões e sugiro apenas esses pontos para integrar o processo do
Integra Brasil. Quanto à questão do integra Nordeste, só dando já uma meia
informação, nós fizemos a mesa redonda em Campina Grande com essa preo-
cupação. De fato, é preciso integrar também dentro do Nordeste. É preciso
discutirmos os crastas, cadeias. Lamentavelmente, quem é subdesenvolvido
não gosta de falar entre si, essa é uma questão cultural normal, a gente não
trabalha, nós não temos praticamente nenhuma empresa aberta no Nordeste,
nós somos individualistas mesmo por princípio e pela cultura. Então, o Brasil
como um todo tem que entender que é preciso quase que nos obrigar a nos
unirmos e trabalharmos em crastas, trabalharmos em grupo, trabalharmos
em cadeia. Isso é um processo brasileiro que tem que acontecer. Ou acontece
isso, ou, de fato, nós não vamos desenvolver as regiões. Muito obrigado.”
Filomeno Moraes: “Antes de passar à mesa, ouviremos ainda a intervenção
do deputado Raimundo Gomes de Matos.”
Leonardo Bayma: “É bem rápido. É uma pergunta que eu gostaria de diri-
gir ao dr. Sergio, na mesa. Meu nome é Leonardo Bayma, sou Diretor Exe-
402
cutivo do Centro Industrial do Ceará. Eu sei que o ministério tem pensado
no PMDR 2, e a gente viu no BNDES, em Recife, uma fala de um membro
do ministério, nos falando que dentro desse pensamento do PMDR 2, tem
sido pensado um fundo de desenvolvimento regional não reembolsável que
possa corrigir os entraves competitivos da região Nordeste. Eu gostaria de
saber como tem sido pensado esse fundo pelo ministério, quem iria gerir na
visão de vocês um fundo como esse. Queria que o senhor falasse um pouco
mais sobre esse fundo não reembolsável de desenvolvimento, que tem sido
pensado pelo Ministério da Integração.”
Raimundo Gomes de Matos: “Eu creio que esse momento é importantíssi-
mo para o Nordeste. É complexa a situação, o nosso coordenador, deputa-
do Pedro Eugênio, falou muito bem da individualidade que existe naquele
parlamento, o deputado Firmo vê, com certeza, as mudanças que ocorrem
hoje em termos de planejamento regional. Agora, nós temos primeiro que
convencer o restante do país, essa é a minha preocupação. Além de nós
tentarmos convencer internamente nós mesmos; porque o que a gente vê é o
Ceará disputando espaço internacional. Voo Ceará-Milão, voo Ceará-França,
Paris, e o deputado Pedro Eugênio vai ter dificuldade em sair daqui para ir
para Recife, em termos de voo. Quer dizer, nós não temos nem integração
pra gente ir ao Rio Grande do Norte, pra gente ir à Bahia, pra gente ir a Per-
nambuco, é a maior dificuldade, mas para você ir para o exterior o governo
fica lutando, fazendo publicidade para nós buscarmos.
403RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Então, esse momento se torna importante, eu creio que com a conclusão
do Integra Brasil, nós temos que fazer o “integra Nordeste”, ou até o “Acorda
Nordeste”, para que com todas essas potencialidades nós buscarmos essa
integração, que não é fácil. A comissão de desenvolvimento regional está lu-
tando por uma questão de emancipar dois mil municípios brasileiros. A PEC,
a normatização no Ceará, criar mais tantos mil municípios.
Eu fui prefeito na época de 90 e nós tínhamos aqui, em Maranguape, nós
tínhamos a Autarquia Metropolitana de Fortaleza. Nós tínhamos um plane-
jamento das regiões. E não existe, abandonou-se o planejamento do nosso
país. Infelizmente, mau consórcio em termos de planejamento. A gente vê
com gravidade toda uma normatização que temos de resíduo sólido, aí vem
a política de resíduo sólido, consórcio. Nos municípios ninguém quer os con-
sórcios. Aí vem um consórcio saúde; ninguém quer consórcio saúde, porque
recebe o ônus e não recebe o bônus. A gente vê no estado do Ceará inú-
meros prédios construídos para consórcios que não são operacionalizados.
São as UPA’s, são as delegacias, são as escolas profissionalizantes, têm uns
cem prédios aqui no estado do Ceará, não sei os demais estados, que es-
tão construídos e que não existe a corresponsabilidade do financiamento
da operacionalização. Se você for ali a Cascavel, tem UPA pronta há mais
de seis meses, mas não existe o financiamento. Tem delegacias prontas; a
questão da territorialização. Então, esse planejamento e como fazer com
que haja realmente esse planejamento, essa execução nesse planejamento,
é de suma importância.
404
A gente vê aqui os termos usados, nós precisamos ter pacto nacional,
coesão política, que é complexa coesão política, harmonia em termos dos
entes federativos, a revisão do pacto federativo. É gravíssima a situação, a
fragilidade hoje dos poderes constituídos. O deputado Pedro Eugênio deve
concordar comigo, a briga hoje é do senado com a câmara. Aí vota matéria,
volta para a câmara, a câmara vota, a gente desfaz o que o senado fez; quer
dizer, isso fragiliza o pacto federativo. Já, já, nós vamos ter duas, três outras
votações, as APAE’s, nós votamos, apresentamos propostas, o senado vai
modificar, vem para a câmara. O desastre, ontem, na questão do supremo
julgar um parlamentar e a câmara. Então, ninguém sabe qual é o rumo, e isso
é gravíssimo. E a gente não sabe o clamor das ruas, o que vai dar nisso tudo.
Eu acredito que essa iniciativa do Integra Brasil precisa ganhar mais
musculatura, ganhar não só as instituições, mas os demais segmentos, de
universidades, de sindicatos, de corporações, para que nós possamos ter
realmente todos esses avanços e todas as propostas, com certeza, sairão
daqui.
A gente observa também que o problema da reforma tributária, a gente
vê adições nas comissões de finanças, é como o professor Rezende falou,
é o ICMS só. A reunião que o povo faz é ICMS. E não existe uma pauta dos
governadores com as bancadas, isso é grave também. Quer dizer, é um des-
prestígio dizer “a refinaria vai para o Maranhão e não vem para o Ceará”.
Determinado investimento vai para um estado e não vai para o outro, é como
se fosse perda de poder, de credibilidade, de prestígio. Então, não se pensa
405RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
o planejamento. Infelizmente, as bancadas, o deputado Pedro Eugênio falou
muito bem, na hora que a presidente Graça Foster vai lá nós vamos cobrar
a refinaria do Ceará. O do Maranhão cobra a refinaria do Maranhão. A ban-
cada de Pernambuco cobra, porque não existe uma consciência política de
uma visão regional. Então, o planejamento de ações regionais e, praticamen-
te, as vias até a gente desconhece, o que o Integra Brasil vai facilitar uma
discussão de um debate, de uma pauta do congresso nos segmentos para
que nós possamos ter esses avanços.
Agora, a questão da territorialização do município é fundamental. Não
existe na instância, a gente que anda muito nos municípios cearenses a gen-
te observa, não existe apoio para os gestores municipais em montarem as
estratégias. Às vezes, é aquela tal história, um dia desses, eu estava num
debate e um parlamentar disse: “é igual ao Silvio Santos, quem quer mé-
dico?” Todo mundo quer. Quem não quer? Quem quer patrol? Todo mundo
quer. Quem quer porto? Todo mundo quer. Quem quer indústria? Todo mundo
quer. Agora, esse planejamento, dizer “não, eu vou ganhar o meu consórcio
aqui, vou ter aqui a minha unidade risisólido, você vai ser compensado”.
Pois é, aqui na minha cidade de Maranguape foi feita uma barragem, ocu-
pou quatrocentos hectares, uma barragem para conter as enchentes de For-
taleza, e toda a área sem utilidade nenhuma. Perdemos quatrocentos hec-
tares, que poderia ser uma área para outros programas. E o município não
foi nem consultado, o estado foi lá, fez a barragem, ocupou, desapropriou, e
está o problema social. Então, essa instância de termos um planejamento de
406
médio e longo prazo, eu creio que o Integra Brasil vai fortalecer essa visão
de termos e, com isso, se lutar pela reforma tributária, a questão da reforma
fiscal, quer dizer, de uma pauta. Porque a gente fica às vezes lá, a pauta do
dia, não tem uma pauta do Nordeste assim, uma bancada. As reuniões são
feitas pela coordenação da bancada do Nordeste, finda ser uma coisa pon-
tual. Quando o Ministro da Agricultura vai lá, é cada um puxando a brasa
para a sua sardinha. Quando o Ministro da Integração vai lá, é cada um pro-
curando pelos seus projetos de água para todos, mais perfurações de poços,
a transposição, e tal; quer dizer, não tem esse planejamento.
O deputado Pedro Eugênio falou do DNOCS. Mesma coisa, DNOCS e
SUDENE. Ou se revitaliza de uma vez por todas, ou vamos tirar do pa-
pel, vamos esquecer que existe. E tem a SUDENE, que não tem uma certa
força de competência deliberativa, fica todo esse impasse em termos de
Nordeste.
O orçamento dispositivo foi mais uma coisa de autoafirmação dos de-
putados, do que uma coisa que vai resolver. É minha visão, um orçamento
dispositivo não vai resolver. Quer dizer, era preferível nós desfazermos algu-
mas ações de outras matérias no aspecto de orçamento, como o professor
Rezende falou, a reforma orçamentária, do que ficar com a questão do orça-
mento dispositivo que dá um desgaste aqui, outro ali, a imagem do congres-
so já é ruim e ainda fica pior.
Então, essas são as nossas observações, e parabenizar a todos. Muito
Obrigado, vamos começar com o professor Rezende.”
407RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Fernando Antônio Rezende Silva: “Na verdade, todas essas questões que
eu ouvi aqui refletem uma questão que é fácil expressar e difícil de resolver.
Você tem duas realidades que caminham a ritmos e a passos diferentes. A
dinâmica socioeconômica e territorial é muito rápida e muda muito facil-
mente. A configuração político-constitucional é rígida. Isso faz com que todo
esse processo que ocorreu acentuadamente nos últimos quarenta anos, da
urbanização brasileira, você tem um enorme descompasso entre a concen-
tração do perfil e da dimensão das demandas que são exercidas sobre o es-
tado brasileiro, e a igual distribuição no espaço territorial da capacidade dos
entes do estado lidarem com essa realidade. Então, isso se manifestou com
clareza na região metropolitana exatamente por conta disso. Você tem um
município aqui que tem uma refinaria de petróleo e tem um orçamento por
habitante trinta vezes, quarenta vezes maior que o município vizinho, que é
uma cidade dormitório.
Então, quando você quer falar em consórcio, tem a norma, mas não tem
os instrumentos. E aí, tem o outro vício de 88; a constituição de 88 fez outra
coisa equivocada a meu ver, que foi o seguinte, “não, dá autonomia política
ao município”, tudo bem. Na verdade, isso já era só sancionar uma coisa que
já é histórica no Brasil, o município sempre teve importância na vida nacio-
nal. Agora, ao mesmo tempo, transfere para o estado a competência para
instituir a região metropolitana, isso é incoerente. A regulamentação da re-
gião metropolitana devia ser ainda objeto de lei federal e não ser transferido
para. Vai ser a reforma constitucional agora. Você tirou do governo federal
408
a capacidade de ordenar o espaço metropolitano em coordenação com o
governo estadual, mas transferir para o governo estadual foi um equívoco.
A lei do consórcio pode ter a norma, mas não tem os instrumentos para im-
plementar. É como disse o deputado, o município recebe lá o problema e não
recebe o dinheiro, aí ninguém quer ficar sujeito a essa situação. Fora, a tran-
sitoriedade desses acordos que mudam em razão das divergências políticas
que estão manifestadas no mesmo território.
Se nós tivéssemos construído um sistema de transferências de recur-
sos na federação, que fosse ajustado dinamicamente a isso, que tirasse
os incentivos, a cooperação, nós podíamos fazer isso. Se, por exemplo, o
financiamento do BNDES ou da Caixa Econômica contemplasse o conjun-
to dos municípios e dissesse o seguinte, “Não, nós vamos emprestar sim,
mas desde que haja um plano regional padronizado”, tudo bem. Mas, não é
assim. E até juridicamente não é possível, pelo que eu sei das leis. Então, a
questão é mais profunda. Porque, tem toda razão, é necessário avançar, mas
é preciso criar as condições para isso. E isso se reflete na outra questão que
foi mencionada pelo colega do Maranhão, por que não avança a discussão
do ICMS? Não avança porque os estados brasileiros se empenharam agora
numa questão que é inédita no Brasil. No Brasil discutia-se muito, no pas-
sado, nós vamos crescer para distribuir? Ou vamos distribuir para crescer?
Isso era o debate. Os estados brasileiros inventaram uma coisa nova, redis-
tribuir para encolher. Porque estão redistribuindo investimentos, pela briga
fiscal, para encolher, o investimento é cada vez menor. Estão distribuindo o
409RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Fundo de Participação, que é a metade do que era há trinta anos atrás. E,
nesta briga, você não consegue um acordo em torno do ICMS, é impossível.
Porque o ICMS, que era o maior imposto brasileiro quando foi criado em
1965, já é o segundo e vai caminhando para ser o terceiro. A participação dos
estados no chamado “bolo tributário nacional” encolheu de cerca de 40%
para algo que está em torno de 25%, mais ou menos. Então, não dá; quer di-
zer, o cobertor encurtou e você quer que ele seja redistribuído de novo. Não
dá para distribuir os mesmos pedaços de uma coisa que é quase a metade
do que era anteriormente.
O Lima Matos levanta uma questão que, de fato, eu acho que está ausen-
te desse debate, eu concordo inteiramente com você, a questão do sistema
financeiro. Como é que o mercado financeiro poderia entrar neste debate
como uma nova perspectiva de política? Isso é complicado, isso esbarra
de novo numa discussão maior da questão da liberalização do mercado fi-
nanceiro, das conexões internacionais disso, mas você tem razão, é possível
rediscutir, de novo isso tem que ser visto como uma prioridade do estado
brasileiro, do Banco Central, criar regras que permitam fazer com que o
spread das operações bancárias fique mais barato nas regiões que precisam
de recursos. O governo vem tentando fazer isso de que forma? Transferindo
dinheiro para o BNDES? Com subsídio orçamentário razoável para poder
emprestar a taxas mais baratas. Mas, isso tem limitações óbvias da dívida
pública, que não vai ser possível continuar. Então, eu acho que é uma ques-
tão importante, com certeza, o debate.
410
Antigamente, nós conhecíamos as estatísticas do Banco Central, que
você deve saber disso, você conseguia saber os fluxos financeiros entre os
estados; hoje em dia, essas estatísticas não existem tanto quanto eu saiba.
Mas, seria importante talvez pleitear numa em uma movimentação que fos-
sem divulgadas essas estatísticas, de que como o dinheiro foi para lá e volta
para cá, dentro da federação brasileira.
Para finalizar, eu queria fazer uma referência à terceira pergunta, aqui
apresentada pelo fórum. Como fortalecer a federação brasileira e conferir
maior poder político às regiões? Eu acho que o problema da regional é, entre
outras coisas, um problema do enfraquecimento da posição dos estados bra-
sileiros na nossa federação, não é só um problema dos estados do Nordeste.
Os estados brasileiros, sob qualquer perspectiva, perderam espaço e perde-
ram poder. Os estados brasileiros perderam poder tributário, o ICMS eu disse
o que perdeu; perderam poder orçamentário, o orçamento dos estados não
tem nenhum espaço para que o governador decida onde vai colocar o dinheiro,
quase 90%, ou mais, está previamente definido pelas vinculações e por outras
questões; o poder legislativo estadual esvaziou completamente, pela ausên-
cia de espaço para exercer a sua competência residual na regulamentação de
uma série de áreas; e os estados brasileiros, em função desse processo todo,
se engalfinharam numa situação de conflitos e antagonismos que não conse-
guem se juntar para defender uma posição uniforme no Congresso Nacional.
Então, talvez, eu nem diria que a questão é só tentar reunir os estados do
Nordeste, a questão é reunir os estados brasileiros, porque a discussão do
411RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Nordeste, Norte e Centro-Oeste, qual é a realidade de sustentar essa coali-
são regional hoje, por exemplo, na discussão do ICMS? Eu não vejo nenhuma.
Porque o Centro-Oeste já não tem nada a ver com identidade regional, nem
da Amazônia, nem do Nordeste. E nem a identidade da Amazônia tem nada
a ver com a identidade do Nordeste. E o próprio Nordeste tem identidade
diferente. Então, talvez, se a gente pensar numa discussão que diga, “bom,
como é que a gente reconstrói um mínimo de mobilização dos estados, na
discussão da questão nacional”.
Nós não assistimos no Brasil reuniões periódicas de governadores, auto-
convocadas, para discutir o problema. Quando os governadores se reúnem
no Brasil é por convocação do governo federal, o que é completamente dife-
rente do que a gente assiste em outras federações, onde há um movimento
de governadores se reunindo periodicamente para discutir o problema fede-
rativo, como é que ele se põe dentro da agenda nacional.”
Filomeno Moraes: “Muito obrigado professor. Eu passo agora ao professor
Sérgio de Castro.”
Sérgio de Castro: “Obrigado. Vou começar aqui pela provocação da SUDE-
NE do B. Eu acho que não é o caminho, não é um bom caminho. Não é um
bom caminho porque primeiro que a própria organização, a soma dos es-
tados, no caso do Nordeste, não representa, na verdade, necessariamente
uma visão regional. Bem disse o deputado aqui, das dificuldades, por exem-
412
plo, na reunião da própria bancada, e cada vez mais a gente tem sentido isso.
Mesmo quando reúne o CONDEL, da própria SUDENE, onde estão presen-
tes os governadores e os representantes dos vários estados, cada vez mais
as pautas estaduais, essa discussão, por exemplo, entre os estados, eu fiz
questão de colocar os números aqui, os estados que não são os três maiores,
os demais, enfim; cada vez mais, a visão local se sobrepõe a uma visão efe-
tivamente regional. Eu acho que o momento em que nós estamos, primeiro
é de deixar muito claro essa questão da pauta regional, para além da pauta
estadual. Agora, mais do que isso, é preciso pensar como a gente falou aqui,
todos nós, na pauta regional como parte de uma pauta nacional. Se a gente
não consegue dar esse passo, e aí eu acho que essa ideia do Integra Brasil
é perfeita nesse aspecto, nessa ideia de você não isso enquanto construir
uma pauta nacional. São Paulo precisa entender esse movimento, não como
um movimento que é contra, por exemplo, São Paulo, mas como algo que
é a favor do Brasil e, portanto, a favor de São Paulo. Esse entendimento de
que a questão nacional, a questão regional, a questão da coesão, a questão
da competitividade, passa por um país mais integrado, que eu acho que é o
grande desafio.
Então, eu acho que, regionalmente, tem esse esforço de reconstrução da
SUDENE. Nós tivemos inicialmente esse debate muito forte com os gover-
nadores, porque aqui, no Nordeste, porque tem essa tradição, o fórum de go-
vernadores estava se reunindo mesmo sem o chamado do governo federal;
pelo contrário, estava se reunindo chamando o governo federal, inicialmente
413RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
fora do próprio âmbito da SUDENE, agora veio para dentro da SUDENE fa-
zer isso. É claro que isso não basta, você precisa ter não só a reestruturação
do quadro, mas ela ter esse novo papel, qual é mesmo o seu papel nesse
novo quadro. Mas, eu acho que nós devíamos unir forças nesse sentido de
fortalecer e não de criar um segundo instrumento, baseado numa ideia de
consórcio, etc., eu acho que não seria um bom caminho para a questão re-
gional brasileira hoje.
O outro ponto que eu acho muito importante é esse levantado com rela-
ção à essa questão do financiamento. Sem dúvida, essa é uma questão muito
pouco estudada, muito pouco conhecida e de enorme impacto regional. A
gente está com uma parceria com o IPEA, tentando estudar isso de maneira
mais fina, quer dizer, entender essa questão dos fluxos de financiamento em
nível nacional, essa de que como é que a poupança, que hoje acaba sendo ge-
rada aqui, está sendo centralizada, e essa questão de nós buscarmos novas
formas, a criatividade das inovações financeiras que estão aí nos permitem
pensar novos modelos, novas formas para a questão regional. É claro que
ela esbarra nessa questão maior da liberalização financeira, etc. e etc., que
não consegue pensar a estruturação do setor bancário como algo que tem
que estar vinculado a um projeto nacional de desenvolvimento. É como algo
que tivesse que seguir o seu curso de mercado, e o curso de mercado é esse,
centralização e integração internacional. É isso que está acontecendo. Para
você ver, isso é uma medida relativamente simples; simples, mas ao mesmo
tempo, o que aparentemente é simples, politicamente é muito complexo.
414
Por fim, rapidamente, essa questão do fundo. De fato, eu acabei colocan-
do o centro aqui, que eu acho que, na verdade, a questão central não é mais
um fundo, a questão central é de nós levarmos a política para uma ação de
coordenação do conjunto das políticas públicas no território. Mas, nós te-
mos uma questão também na política regional de que os fundos que foram
criados de desenvolvimento aqui, diferentemente da experiência europeia e
de outros países, os fundos nossos constitucionais, os fundos de desenvolvi-
mento, eles apareceram aqui mais como uma forma de corrigir as limitações
dos instrumentos de financiamento de longo prazo brasileiro, e com fundos
que são na verdade fundos de financiamento. Fundos de financiamento que,
na medida em que as taxas de juros, que o diferencial de financiamento fazia
muita diferença quando as taxas de juros eram muito elevadas no Brasil, na
medida em que as taxas de juros vão caindo, se você olha, por exemplo, o di-
ferencial do FME para as linhas do BNDES hoje, quer dizer, você vai ver que
quase não faz mais sentido a gente pensar os fundos regionais meramente
do ponto de vista do financiamento. Hoje, de certa forma, os nossos fundos
concorrem com o BNDES.
Nós estamos, por exemplo, trabalhando nesse momento para dar con-
vergência para isso, para nós trabalharmos juntos para resolver. Então, a
questão do financiamento, os fundos para financiamento não precisariam,
na verdade, ser revistos. Agora, nós precisamos, e não temos, de um fundo
não reembolsável para funções mais específicas, não é só para o Nordeste,
é um fundo nacional, é isso que nós estamos propondo à política, um fundo
415RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
nacional de desenvolvimento regional que possa ser um fundo para bancar,
por exemplo, projetos, que é algo que esse país não tem, é recurso a fundo
perdido para que você tenha estruturação de projetos de boa qualidade, que
você possa bancar infraestrutura complementar. Por exemplo, nós temos
as obras do PAC que são obras importantíssimas, grandes obras. Mas ali,
às vezes, em função da dificuldade fiscal financeira dos estados, pequenas
obras complementares no entorno não são feitas e aquela obra perde a sua
capacidade de; vou dar um exemplo, no caso da água, a transposição, nós
temos a transposição passando por uma obra extremamente importante, e
comunidades, às vezes, a duzentos metros dali sem água e sem o recurso, às
vezes, para fazer a pequena adutora que vai levar a água até aquela pequena
comunidade. Isso acontece em quase todas as obras do PAC.
Então, o fundo também teria esse foco no financiamento de pequena in-
fraestrutura complementar, na capacitação das prefeituras, na montagem
de apoio à estruturação de consórcios de prefeituras para que elas pudes-
sem ter mais. Então, essa proposta está sendo, vai vir do fundo a ideia de
que esse fundo inicialmente seja um fundo em torno de oito bilhões de reais.
Agora, obviamente, isso passa por uma enorme discussão no âmbito da fa-
zenda, por quê? Porque os fundos de desenvolvimento regional estavam sen-
do discutidos basicamente no âmbito da reforma do ICMS. Vocês vêem, in-
clusive, chegou a ser encaminhado agora no início do ano para o congresso
uma medida provisória, que já caducou, criando dois fundos, uma proposta
do Ministério da Fazenda, totalmente no âmbito daquela discussão do ICMS,
416
fundos retornáveis. Aquilo morreu, porque chegou lá e não chegou nem a ter
repercussão; quer dizer, é preciso tirar essa coisa da discussão meramente
da questão do ICMS, coloca-la numa discussão maior do desenvolvimento
regional para viabilizar o fundo. Agora, eu digo, nós estamos propondo, mas
o fundo só sai se isso que o deputado falou com toda razão, a nova política
vier acompanhada de um amplo processo de articulação nacional, para que
ela se coloque empoderada o suficiente para viabilizar, porque senão, assim
como a proposta de fundo estava presente desde a primeira PMDR, prova-
velmente nós não vamos conseguir ter fundo nenhum. É isso. Obrigado.
Por isso, essa coisa do projeto, que eu acho que é essa grande ênfase na
capacidade. Porque não é nem, por exemplo, no caso dos fundos setoriais,
não é nem a capacidade econômica que não teria espaço para absorver es-
ses recursos, tem perfeitamente. O que ela não tem hoje é capacidade de
gerar projeto para demandar. E as regras do nosso sistema de ciência e tec-
nologia que ainda estão muito presas à lógica acadêmica. Concordo com
você. É isso, então, obrigado gente.”
Filomeno Moraes: “O deputado.”
Raimundo Gomes de Matos: “Começando por essa coisa dos fundos seto-
riais, já que está exatamente aqui quente, a informação que eu tenho é que
não vem mesmo E eu lembro que, em 2002, o Banco do Nordeste financiou
duzentos e cinquenta e quatro milhões para todo o Nordeste, hoje está finan-
417RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
ciando alguma coisa em torno de vinte bilhões, eram duzentos e cinquenta
milhões, hoje está financiando vinte bilhões e, naquela época, se dizia que
o Nordeste não tinha capacidade de gerar projetos. Essa era a justificativa
do travamento da utilização do FNE para financiar a indústria, o comércio,
serviços, a agricultura nordestina. Portanto, apesar de haver esse desequi-
líbrio entre as universidades, é verdade, mas com certeza as universidades
nordestinas têm capacidade sim de apresentar projetos.
Certa vez, eu fiz um projeto de lei obrigando o Ministério da Ciência e
Tecnologia a colocar na composição dos comitês, que fazem a gestão e a
decisão desses projetos, paridade regional. E foi naquela época que tive a
alegria de receber o telefonema de um ministro na minha vida, que eu não
tinha recebido nunca, dizendo que não podia de jeito nenhum, que ia enges-
sar, e não sei que e coisa e tal.
Então, é possível. Eu acho que essa é uma discussão relevante. Inclusi-
ve, a proposta de que o Banco do Nordeste pudesse fazer a gestão desses
fundos, descentralizar; o Ministério da Ciência e Tecnologia não quer nem
ouvir falar nisso. E não é só aqui no nosso governo, isso é uma coisa antiga.
Os governos mudam, mas esse apego a esses recursos é muito forte. Então,
esse é um ponto relevante, que eu acho que tem que ser discutido.
Por outro lado, para dar um exemplo de possibilidades de alianças, eu es-
tou lembrado aqui, estou fazendo um esforço para lembrar o nome do meu
colega, então deputado federal pelo Rio de Janeiro, hoje ele é prefeito, é
do PSB, é prefeito de uma cidade da baixada fluminense; me fugiu agora o
418
nome dele, eu queria fazer justiça a ele, citando, mas é quem apresentava,
na ocasião, lá na bancada há coisa de doze anos ou mais, as estatísticas de
utilização dos depósitos nos municípios e da drenagem desses depósitos
para outros centros. E ele estava lá no Rio de Janeiro. Então, nós temos Nor-
destes e Nordestes. Vocês do ministério têm esses estudos. Eu me lembro
que a Tânia fez um estudo desse e vocês vêm atualizando com essas man-
chas, eu acho até que você apresentou hoje aí de áreas dinâmicas, áreas
deprimidas, áreas estagnadas, e isso está em todo Brasil.
Então, isso facilita a aliança nacional sobre a qual nós estamos falando;
porque, com certeza, quando a gente fala na cultura; eu sou relator de um
projeto do pró-cultura; quando a gente fala da concentração dos recursos
para a cultura, que são poucos, no eixo Rio-São Paulo, você vai ver que não
é no eixo Rio-São Paulo, estados do Rio, estados de São Paulo, não. É ali,
no centro de São Paulo, na área onde se concentram os grandes institutos
e tudo o mais, e no Rio de Janeiro, onde tem os teatros e tal. Tem uma coisa
extremamente concentrada dentro dos respectivos estados. Então, há um
clamor em São Paulo e no Rio de Janeiro por descentralização, dentro dos
próprios estados.
Então, apesar de ser muito difícil essa ação política de articulação para
propor modificações profundas na política nacional de desenvolvimento,
isso é possível de se fazer e é possível de se construir alianças. Eu não co-
nheço o que esteja debruçado sobre isso como um esforço de construção
genuíno. As coisas estão sendo faladas, sendo ditas; vejam que nessa mesa
419RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
aqui a gente não combinou antes não, a gente tem uma perfeita conver-
gência. Isso não foi uma mesa previamente estruturada para chegar a um
ponto previamente combinado, essas ideias estão muito fortes, estão pai-
rando, estão sendo disseminadas e nós precisamos dar concretude política
a essas ideias.
Eu concordo, quero fazer aqui o registro, essa coisa de condicionar fun-
dos, um novo fundo, na reforma, que no final do governo Lula quase foi apro-
vada, mas acabou não sendo, reforma tributária; se criava um fundo que
agregava todos os fundos, constitucionais e não constitucionais, em um só
e condicionava isso à adesão aos estados para acabar com a guerra fiscal.
Eu acho que isso é um erro estratégico. Nós temos que ter fundos que sejam
caber, eu acho que um fundo único é uma boa ideia, mas isso tem que ser
parte de uma política nacional de desenvolvimento, colocá-los, inclusive, a
serviço de todas as regiões deprimidas e ter esse caráter móvel, que eu acho
foi o Fernando que falou aqui sobre, não exatamente sobre fundos, mas so-
bre uma outra questão, de que nessa distribuição, ele falou acho que foi uma
coisa do Fundo de Participação, tem que ter uma possibilidade permanente
de adaptação de revisão; à medida que os indicadores de desenvolvimento
vão mudando, esses repasses vão mudando, e isso se for feito de forma per-
manente fica suave. Agora, quando você junta isso e deixa passar dez anos,
e aí quer mudar de repente, então você destrói um determinado município,
como eu já vi acontecendo em situações pontuais. Você tem que ter uma
transição suave, fazendo essa situação permanentemente.”
420
Participante não se identificou: “Só um depoimento aqui, colocando essa
questão de como esse tema, apesar das dificuldades, ele também está co-
locado, ele está muito vivo, o que é muito favorável, por outro lado, a esse
esforço de construção de uma política nacional, nós tivemos a experiência
da realização, pela primeira vez na história do Brasil, da conferência na-
cional de desenvolvimento regional. Nós fizemos vinte e sete conferências
estaduais, no ano passado, em todos os estados. Estávamos diante do se-
guinte dilema: bom, vamos convocar, vejam que o ano passado foi um ano de
eleição municipal; nós chamamos os estados para fazer essas conferências
regionais, dizendo o seguinte: o governo do estado convoca e paga a confe-
rência, o ministério não tinha dinheiro para fazer, com uma proposta quase
indecorosa aos estados; quer dizer, eu quero que façamos uma conferência
estadual, vocês banquem a conferência e em véspera da eleição municipal.
Todos nos disseram: vocês estão malucos, nós vamos ter um grande fracas-
so. E nós tivemos um enorme, um estrondoso sucesso. Tivemos conferência
nos vinte e sete estados da federação com a participação de mais de treze
mil pessoas, mais de 50% desses participantes com pós-graduação. Depois,
não foi planejado, e nos preocupava a coisa de como seria, por exemplo,
a conferência em São Paulo, uma conferência macrorregional do Sudeste,
porque, depois das estaduais, nós fizemos cinco macrorregionais, o Sudes-
te, se reuniu cinco estados do Sudeste para debater a questão regional. E a
questão regional está muito viva nessas regiões, as contradições intrarre-
gionais, mesmo num estado como São Paulo.
421RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
A FIESP promoveu no final do ano anterior um evento sobre desenvolvi-
mento regional em São Paulo, de altíssimo nível; é claro que a questão da
desconcentração em São Paulo se coloca num nível completamente dife-
rente do restante do Brasil, mas a pauta está lá e, à medida que você con-
segue, nessa política e no fundo, dizer: nós estamos fazendo uma política
nacional, a política não é para o Nordeste, esses recursos do fundo são para
o Vale do Ribeira em São Paulo, esses recursos do fundo são também para a
metade sul do Rio Grande do Sul; o sul, por exemplo, enfrenta, não tem muito
problema de renda per capita, mas tem um problema de perda de população
absurda hoje que precisa ser enfrentada. Então, esse caldo e como essa coi-
sa despertou a comunidade nos vários estados mostram que nós temos aí
uma oportunidade,e essa oportunidade exige capacidade nossa de coorde-
nação para, de fato, ser capaz de construir uma política nacional.
E, aqui no Nordeste, é preciso pensar muito isso, porque muitas vezes
quando a gente coloca isso eu sinto resistências, às vezes; não, vão tirar
instrumentos que são do Nordeste, quer dizer, como se o fato de nós trans-
formarmos a política numa política nacional, nós estivéssemos dividindo re-
cursos que deveriam estar vindo pra cá. Não, ao contrário, nós precisamos
ganhar essa coisa como uma questão nacional para que, de fato, nós possa-
mos ter mais recursos para o próprio Nordeste.É isso, obrigado.”
Participante: “Aliás, a questão política nacional e regional, a gente tem que
ter muito cuidado, e eu fiquei, como eu lhe disse, muito feliz com a palestra
422
do dr. Sergio, mas vou lhe dar um exemplo só para o senhor, digamos assim,
discutir com os seus pais, e a gente poder incluir nesse processo nacional.
O Banco do Nordeste é um banco regional, basicamente, e nós temos
aqui no Nordeste energia eólica que está crescendo. O que o governo federal
fez? Concentra no Banco do Nordeste energia eólica, mas não porque são
grandes financiamentos; vamos transferir para o BNDES. E transfere, por
títulos federais, para o BNDES trezentos milhões de reais. Então, você deixa
de ter uma política regional com um banco fortalecido, o deixa mais com
a micro e pequena empresa, e faz o BNDES agir numa das poucas partes
econômicas que o Nordeste está crescendo. Do ponto de vista de usinas,
realmente, eólicas, o Nordeste conseguiu ser até, o Ceará hoje é autossu-
ficiente, só falta, digamos, linhas de transmissão estão faltando. Mas, na
hora que você faz uma política nacional com o BNDES tem que ter muito
cuidado, para saber se ele não massacra as regiões pela definição de para
onde o dinheiro vai.
Os trezentos milhões que você tem no BNDES transferidos, duzentos e
oitenta milhões, duzentos e noventa milhões, via títulos federais, na verdade
foram concentrados 90-95% no Sul e Sudeste. E uma energia eólica, que era
muito melhor pegar esses títulos federais e uma parte vai para o Banco do
Nordeste, para poder aplicar na energia eólica do Nordeste.
Então, é muito importante ficar atento a esse giro das questões, em que
você transforma simultaneamente um BNDES e uma Caixa Econômica para
aplicar nas microempresas no país inteiro e transfere as grandes empresas
423RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
concentradamente no BNDES. É um problema que tem que ter um cuidado
grande.
No caso, por exemplo, da política petroquímica, criaram duas empresas:
a Braskem e a Unipar. Como o BNDES financiou fortemente a Braskem, a
Unipar não pôde acabar, fechou a Unipar, que era uma política petroquími-
ca regional. Ficou só a Braskem, com a visão de ser internacional, e acabou
com a política regional. Então, essas questões de financiamento entram no
cerne no processo. Na hora em que todos os bancos captam, eu centralizo
numa política durante quarenta anos nos bancos no Sul e Sudeste, eu deixo
de captar aqui, principalmente se eu __________ diferenciado. Então, às ve-
zes, não tem relação, mas um órgão como o Ministério do Interior, Ministério
da Integração, pode realmente olhar um pouco isso, porque o Ministério da
Fazenda quer saber do dinheiro que está lá, tentando, que é o superávit pri-
mário que mal dá para cobrir a questão de pagamento da dívida. Então, ele
está muito preocupado com aquela razão, não dá para ele trabalhar o resto
do processo porque ele é míope mesmo nisso, porque ele está sobrevivendo
tentando escapar na questão da dívida brasileira, que está cada vez maior.
Saímos de sessenta bilhões para dois a três trilhões de dívida, portanto
como quase chegar num mercado como o europeu. Obrigado.”
Filomeno Moraes: ”O nosso tempo, infelizmente, terminou e antes de agra-
decer eu gostaria de dar alguns avisos. Em primeiro lugar, passar aqui os
certificados ao dr. Sergio Duarte Castro, professor Fernando Antônio Rezen-
424
de Silva, deputado Pedro Eugênio, o nosso relator professor Alcimor Rocha
Neto.
A organização do evento pede que eu formule as seguintes informações:
às 13 horas se reiniciará o painel “Transformação Social, Urbana e Ambien-
tal do Nordeste”, que foi interrompido ontem por conta do apagão. A entrega
do certificado será após o último painel do período da tarde.
A organização do evento convida a todos e todas para um almoço na sala
7, a partir das 12 horas e 30 minutos.
E, para terminar, eu agradeço aqui o convite que me foi formulado e que-
ria lembrar um pouquinho o grande pensador político, da segunda metade
do século XX, Norberto Bobbio, no seu livro “A Era dos Direitos”, diz que:
depois de uma conferência, um jornalista lhe perguntou se diante de tantas
desgraças das quais o mundo participava, a possibilidade de um desastre
nuclear, o aumento da miséria entre países, enfim, os desrespeitos maio-
res cada vez aos direitos humanos, se ainda havia alguma esperança para
o mundo. E ele diz que respondeu na hora, que havia uma esperança para
o mundo, é porque mais e mais aumentavam os seminários nacionais e in-
ternacionais, onde acadêmicos e lideranças políticas discutiam os grandes
problemas do mundo.
Eu quero crer que este evento e este painel especificamente tam-
bém nos traz essa esperança, de que os grandes problemas brasilei-
ros, na medida em que nós aqui discutimos seriamente, com muita
responsabilidade, políticos, acadêmicos, decisores públicos de um
425RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
modo geral, inclusive aqui presente o nosso zeloso membro do Tribu-
nal de Contas do Estado do Ceará, eu acho que esta é a nossa grande
esperança. Eu fico muito satisfeito em ter estado aqui nesta reunião
e, em nome da organização, agradeço a presença de todos os mem-
bros da mesa e de todos os participantes. Boa tarde.”
Painel 7: Uma Estratégia para o Desenvolvimento do Nordeste
Moderadores
Firmo de CastroConsultor do Integra Brasil
Tânia Bacelar de AraújoDiretora-presidente da Ceplan
Maria Lúcia de Oliveira FalcónSecretária de Estado de Desenvolvimento Urbano do Estado de Sergipe
Paulo Ferraz Guimarães Chefe do Departamento Regional Nordeste do BNDES
Antonio Rocha MagalhãesDoutor em Economia pela Universidade de São Paulo - USP e Assessor do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos - CGEE
Relator
Cláudio Ferreira LimaConsultor do Integra Brasil
429RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
PAINEL 7
UMA ESTRATÉGIA PARA O DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE
QUESTÕES A SEREM RESPONDIDAS PELOS EXPOSITORES
Como promover a integração do Nordeste à economia nacional e internacional,
de modo a potencializar o seu desenvolvimento e o do País como um todo?
Qual a política industrial, nesse processo de integração, mais adequada
ao Nordeste?
Como tirar o melhor proveito possível da posição geográfica do Nordeste
em relação aos grandes mercados mundiais e à África? Quais benefícios o
Nordeste terá com o alargamento do Canal do Panamá?
Que estratégia adotar para reduzir as desigualdades intra-regionais de
renda do Nordeste?
Como vencer o desafio do Semiárido Nordestino, que, contraditoriamen-
te, é, ao mesmo tempo, o grande bolsão de pobreza do País com reconhecido
430
potencial na fruticultura, piscicultura, avicultura, ovinocaprinocultura e ge-
ração de energia solar e eólica?
Lúcia Falcón, no workshop do Integra Brasil “O Nordeste visto de fora”,
realizado no BNDES, afirmou que, hoje, temos todas as ferramentas neces-
sárias ao planejamento e indagou: por que não se faz? Favor comentar.
Em entrevista ao jornalista Nilo Gomes, publicada no Jornal dos econo-
mistas do Rio de Janeiro em julho de 2005, Ignacy Sachs afirmou: Tivemos
no passado a SUDENE. Não temos mais. Planejamento hoje se reduz à pro-
dução do orçamento. O IPEA faz alguns estudos interessantes, mas não está
empenhado em uma visão global. As universidades, eu diria com franqueza,
dado o seu potencial intelectual, se omitem. Não conheço nenhum fórum na
UFRJ, Unicamp, USP, onde sistematicamente se trabalhe uma visão do que
poderia ser o Brasil, no longo prazo.
Comentar a seguinte afirmação do presidente do BNDES, Luciano Cou-
tinho, no wokshop do Integra Brasil “O Nordeste visto de fora”, no Rio de Ja-
neiro: “Não há por que o Nordeste não se reposicionar no sistema brasileiro
como oportunidade generosa de desenvolvimento com inovação, sustenta-
bilidade, produtividade, competitividade e equidade social”
Cerimonialista: Bem, senhoras e senhores, conforme anunciado anteriormente,
vamos, então, dar início à nossa programação apresentando o painel que marca o
encerramento das atividades técnicas do Integra Brasil. Damos início, portanto,
ao painel intitulado “Uma Estratégia para o Desenvolvimento do Nordeste”.
431RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Para exercer a função de moderador, convido à mesa o professor da Uni-
versidade Federal do Ceará, economista, do Banco do Nordeste, Firmo de
Castro. Ele que foi secretário da Fazenda do Estado do Ceará, deputado fe-
deral Constituinte, e que é consultor do Integra Brasil.
Convido ao palco nossas convidadas expositoras:
Professora Tânia Bacelar de Araújo, dra. em Economia Pública pela Uni-
versidade de Paris I, professora da Universidade Federal de Pernambuco e
sócia-diretora da CEPLAN Consultoria;
Convido a engenheira agrônoma, Maria Lúcia de Oliveira Falcón, Mestre
em Economia, dra. em Sociologia pela Universidade de Brasília e, atualmen-
te, secretária de Estado de Desenvolvimento Urbano de Sergipe;
Convido o economista Paulo Ferraz Guimarães, mestre em Gestão Pú-
blica pela Universidade Federal de Pernambuco e chefe do Departamento
Regional Nordeste do BNDES;
Convido, também, o professor e dr. em Economia pela USP, Antônio Ro-
cha Magalhães, assessor do Centro de Gestão e Estudos Estratégicos;
Como relator deste painel, convido ao palco o economista Cláudio Fer-
reira Lima, técnico aposentado do Banco do Nordeste, ele que também foi
secretário de Planejamento do Estado do Ceará e coordenou a Assessoria
Técnica da Bancada do Nordeste na Constituinte.
Deputado federal Artur Bruno, os agradecimentos por sua presença.
Para saudar as autoridades que integram a presente mesa, para também
deixar aqui a sua mensagem de boas vindas à plateia que nos honra com
432
suas presenças e, desta forma, dar início aos trabalhos deste painel, convido
a usar da palavra o senhor moderador dos trabalhos, economista e profes-
sor, Firmo de Castro.
Firmo de Castro: Boa tarde a todos e a todas. É um prazer estar aqui à mesa
na função de moderador desse painel. E já, de início, cumpro a obrigação de
agradecer a presença de todos, pessoas ilustres, já mencionadas, que vêm
acompanhando os nossos trabalhos e que muito enriquecem esse painel.
À mesa, nós reunimos nossos especialistas, já nominados, que conferem
prestígio a esta iniciativa e que com toda certeza vão contribuir efetivamen-
te para elevar a qualidade dos trabalhos realizados.
Eu não poderia também deixar de ressaltar a importância desse painel,
em particular, para o Integra Brasil como um todo. O Integra Brasil é um pro-
cesso de estudo, de análises, de formulação, ao final, de um projeto de um
novo Nordeste e da operacionalização desse próprio projeto, que vem com-
preendendo a execução de um conjunto de eventos ao longo desses últimos
cento e vinte dias.
Foram realizados workshops em Fortaleza, em Recife, em Salvador, por
último, agora, no Rio de Janeiro, com o apoio do BNDES; fizemos uma me-
sa-redonda com todos os estados da região em Capina Grande, visita aos
estados de uma maneira geral e estamos agora, nesses dois dias, realizando
sete painéis sob a bandeira do seminário. Isso significa dizer que, em todos
esses eventos, (quatro workshops, uma mesa redonda e sete painéis), nós
433RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
vamos conseguir reunir quase quatro dezenas de exposições. Exposições de
pessoas de diversas origens e com atuação destacada na sociedade, não só
na área da economia, que prepondera, na área da academia, mas na área do
setor produtivo, da área oficial; enfim, pessoas especialistas que têm uma
longa experiência no trato da questão regional. Essas cerca de quarenta ex-
posições permitirão a elaboração de transcrições, as mais diversas, pois, os
temas são amplos e complexos, para que a sociedade como um todo alcance
essa discussão. Além disso, de cada um desses eventos, quatro workshops,
uma mesa-redonda e sete painéis, nós vamos ter relatórios, sínteses, ela-
borados por especialistas indicados pelo Integra Brasil; cada um é objeto,
portanto, de um relato especial. Ao lado das exposições, serão gerados doze
relatórios setoriais, a exemplo deste, que vamos ter quatro exposições, que
vão ser objetos, naturalmente, de captação e de divulgação como um relató-
rio, que será preparado pelo dr. Cláudio Ferreira Lima.
Após todo esse conjunto de estudos e análises, proposições, nós vamos
viver uma nova etapa dentro do Integra Brasil, a se iniciar em setembro, agora,
já a partir do primeiro dia, que será a sintetização de tudo isso dentro de um
projeto de novo Nordeste, por assim dizer. E um projeto que tenha um apên-
dice objetivo de ordem operacional, para que não corramos o risco de deixar
nas prateleiras tudo àquilo que nós vamos captar, nós vamos obter, após esse
longo processo de discussão e de análise. Vamos ter, portanto, através de uma
comissão de sistematização, que operará a partir de setembro, a formulação
dessa síntese e de um projeto operativo para, a partir daí, passarmos a uma
434
fase seguinte de defesa, de negociação, de reivindicação, sobretudo de ordem
política, junto aos poderes, junto a todas as entidades que, de uma forma ou
de outra, terão que ser mobilizadas ou partícipes do próprio processo de de-
senvolvimento que se vai propor numa perspectiva de longo prazo.
Então esse, dos painéis, talvez seja aquele que já nos aproxime mais de
uma proposta concreta, que virá com a síntese que vai ser feita em seguida.
É o painel que propõe o que seriam as grandes estratégias para o desenvol-
vimento regional numa perspectiva de longo prazo. É como que o painel que
servirá como ponto de convergência para toda a munição que foi proposta,
que foi preparada, que foi discutida, em todos os outros eventos, em todas
as outras oportunidades.
Assim, a nossa responsabilidade aqui é uma responsabilidade muito
grande dentro do contexto do Integra Brasil, e por isso é que nós estamos
lançando mão de especialistas que vão, com toda a certeza, bem cumprir
com essa função de aqui apresentar suas observações, suas análises, acer-
ca da questão regional numa perspectiva de âmbito nacional e mundial.
Dra. Tânia dispensa apresentação, sem sombra de dúvida. Ela é emble-
mática hoje na discussão da questão regional. Talvez seja a especialista que
ao longo de todos esses anos esteja mais presente, cada vez tenha dado
mais qualificação à discussão desse tema. Dispensa apresentação. Os ou-
tros, eu falo em seguida, quando chegar a vez deles.
Então, para iniciar, com muita honra, eu vou passar a palavra à professora
Tânia Bacelar.
435RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Tânia Bacelar: Eu quero dar boa tarde a todos e a todas, começar agrade-
cendo aos organizadores do Integra Brasil o convite para estar com vocês
nesse seminário. Dizer que é muito importante que o movimento que orga-
niza essas discussões venha dos empresários da região, sinal de que eles
estão meio inquietos e toda inquietude é criativa. Dizer que também é uma
honra participar dessa mesa com Paulo Guimarães, representando aqui o
BNDES, com a Lúcia e com o Magalhães, e dizer que quando eu recebi o
título da nossa mesa, que é “Uma Estratégia para o Desenvolvimento do
Nordeste”, eu comecei subvertendo o tema. A gente não pode deixar de ser
subversivo, senão morre.
Então, minha primeira subversão é colocar tudo no plural. Como eu não
queria colocar o nome “Nordeste” no plural, eu coloquei esse mapa aí do
lado para nos lembrar que, embora exista na verdade uma identidade gran-
de entre esses estados, existe também uma diversidade muito grande en-
tre eles, a própria natureza nos lembra isso; aquele Nordeste pintadinho de
azul é o do Litoral Mata, esse Nordeste mais amarelinho claro e escuro é o
Semiárido, mas cortado pelo São Francisco, que faz uma diferença enor-
me; o Nordeste mais amarelinho é o do Cerrado e aquela manchinha verde é
para lembrar que ainda tem um outro, uma outra diversidade naquela porção
norte lá do estado do Maranhão, pegando um pouquinho do Piauí. Então, a
própria natureza está nos lembrando que estamos diante de uma realidade
diversa, mas que, ao longo da história, foi possível ir construindo laços de
identidade importante entre todo esse conjunto e que dá para a gente falar
436
de Nordeste. Mas, a partir daí, eu coloquei tudo no plural, oportunidades,
ameaças e estratégias, porque acho que não existe uma única estratégia
para o desenvolvimento do Nordeste. A gente vai ter que queimar massa
cinzenta para criar várias estratégias porque nossos desafios são grandes.
No meu roteiro, eu tentei separar dois momentos da minha reflexão: um pri-
meiro momento, olhando para o Brasil, e, a partir de algumas tendências que
eu identifico no Brasil, pensar estratégias para o Nordeste. E, no segundo mo-
mento, olhar mais para dentro do Nordeste e tentar identificar algumas opor-
tunidades e desafios que são mais específicos da nossa região, e que também
vão requerer estratégias especiais, não vão estar na agenda nacional. Ou a
gente coloca, ou ninguém vai colocar; é um pouco isso que eu estou querendo
destacar. Então, eu vou começar olhando o Brasil, identificando alguns desa-
fios e oportunidades, do que eu considero ser um novo momento do Brasil.
Eu acho que o Brasil está vivendo um outro momento. A gente, no começo
do século XXI, aprofundou esse momento que o Ricado Lewandowski tentou
resumir nesse gráfico, de que eu gosto muito porque eu acho que ele é muito
claro. Foi o momento em que a gente combinou políticas sociais com políti-
cas econômicas, de um jeito muito consistente e que conseguimos mudar o
padrão de crescimento do Brasil. Até o século XX, o Brasil era um país que
tinha taxas de crescimento, antes da crise, bastante elevadas, mas quanto
mais a renda crescia mais ela se concentrava. Qual foi a novidade do período
recente? É que a gente experimentou crescer desconcentrando a renda. E
essa opção estratégica foi muito favorável às regiões mais pobres do Brasil,
437RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
não só foi favorável à classe C, foi favorável ao Norte e ao Nordeste, que en-
gataram nesse tipo de padrão bastante bem, tanto que, por exemplo, Norte e
Nordeste são quem lideram as taxas de venda no varejo, que lidera a criação
de emprego formal, que lideram as taxas de crescimento da renda; então, vá-
rios indicadores mostram que esse jeito de crescer teve impactos regionais
positivos nas regiões mais pobres do Brasil. Então, é desse momento que a
gente está saindo.
Eu acho que o momento atual é um momento de transição, não só pela
crise mundial e pelos desdobramentos que a crise está tendo. Uma coisa era
esse movimento até 2008, outra coisa é esse mesmo movimento pós-2008.
Tem um elemento externo que bate com força, porque parte do que foi pos-
sível fazer no começo dessa década inicial do século XXI, tinha a ver com o
momento externo razoavelmente favorável. E o ambiente externo mudou. E,
depois de 2008, a gente tem um outro momento lá fora, com desdobramentos
internos importantes; e é nesse momento que a gente está, nessa fase de
desdobramento da crise, com o próprio crescimento da economia brasileira
desacelerando pós-2010. E o governo tentando segurar a estratégia anterior,
manter o consumo aquecido, mas já preparando uma outra estratégia. Acho
que a gente está numa fase onde a própria política federal prepara uma nova
estratégia. Foi muito significativo o Banco Central ter reduzido a SELIC de
12% para 7,5%, para sinalizar essa mudança, porque como o juro é uma taxa,
é um preço muito importante da economia, então a mudança ali era um si-
nal de que “ôpa, podemos caminhar numa outra e devemos caminhar numa
438
outra direção”, combinando agora uma prioridade importante, que é estímu-
lo à competitividade brasileira e um patrocinado aumento do investimento.
Então, essa variável, “investimento”, está ganhando força na nossa aposta;
estamos apostando agora em combinar mais investimento com a manuten-
ção do dinamismo do consumo interno.
Acho que essa é uma opção estratégica, e nessa opção estratégica acho
que a gente também está fazendo uma mudança importante. É que no Bra-
sil, digo, primeiro, a gente está fazendo do limão uma limonada. Por que do
Limão? Porque a gente passou duas décadas, desde a crise de 80, sem in-
vestir em infraestrutura econômica. Basta olhar os dados que a gente fica
compreendendo do que eu estou falando. E isso prejudica o desenvolvimento
do Brasil. Portanto, temos que transformar este problema numa potenciali-
dade. Qual é a opção estratégica? Investir com força em infraestrutura eco-
nômica. Diante de que realidade? De uma realidade em que o setor público
não tem poupança suficiente para bancar essa mudança e, portanto, a expe-
riência que a gente vai viver é diferente da que a gente viveu no século XX.
No século XX, quem patrocinou a montagem da infraestrutura básica eco-
nômica do Brasil foi o governo brasileiro; porto, aeroporto, estrada, ferrovia,
o que não prestava o governo comprava, investia e modernizava; foi assim
que a gente fez com as telecomunicações, por exemplo.
Agora, não vai ser assim. A herança da crise financeira ainda não per-
mite uma taxa de poupança suficiente para isso, portanto tem uma outra
opção estratégica passando por dentro. Vamos fazer isso, mas vamos fazer
439RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
com o setor privado. Não é simples fazer essa mudança num país com uma
cultura de que “quem faz isso é o setor público”, num governo do PT, com
uma presidente do PT, a gente fazer essa macroopção estratégica, e dizer
“é importante para o país”, não podemos fazer, vamos ver se o setor privado
assume esse desafio. É nessa transição que a gente está. Portanto, esta-
mos naquele momentinho do gráfico do Lewandowski, onde a dimensão
da variável “investimento” precisa ganhar corpo para que a gente continue
rodando a maquininha da economia brasileira.
Qual é a minha primeira preocupação, a partir do Nordeste? Como bra-
sileira, assino embaixo dessa macroopção. Como nordestina, eu estou tra-
zendo aqui uma preocupação. É que este é o primeiro mapa que saiu a
partir desta macroopção, é o mapa das concessões de rodovias. Ele para
onde? Na Bahia. Então, do lado do nosso debate, tem uma discussão a ser
feita. Porque, se é essa é a opção que é boa para o Brasil, ela tem que ser
lida também na dimensão regional e, na dimensão regional, entregou ao
setor privado, a discussão hoje é taxa de retorno. Por que é que não deslan-
cha? Porque ainda estão discutindo taxa de retorno. E, quando a discussão
é taxa de retorno, o mapa que sai é esse daí. Então, eu acho que tem dois
debates a serem feitos na nossa discussão. Primeiro: o Nordeste precisa
discutir essa opção; será que a gente não tem oportunidades no Nordeste
para entrar nessa estratégia? Será que a taxa de retorno tem que ser única
para o Brasil inteiro? Vamos tratar os desiguais igual? Eu acho que esse é
o eixo da discussão. E o segundo eixo é: onde não couber concessão, onde
440
não der retorno, vai ter investimento público? Cadê o mapa do investimento
público? Ele vai para onde está o outro mapa ou ele vai complementar o
outro mapa? Então, tem uma agenda nova que interessa profundamente
à região, porque infraestrutura econômica é elemento de competitividade
sistêmica, todo economista aprende isto na primeira aula de economia, e é
uma das desvantagens competitivas do Nordeste.
Estou olhando ali para o secretário do Piauí. O Piauí tem uma imagem
deformada no Brasil, ele é visto pelo Brasil como um estado pobre; não
tem mentira maior. O Piauí é um estado rico, agora não tem infraestrutura.
Como é que vai explorar a potencialidade econômica sem infraestrutura?
Então, acho que esse é um debate que está na nossa agenda, porque o ou-
tro mapa, que é o das concessões das ferrovias, também precisa ser discu-
tido. A gente está até melhor nele, mas ele também está muito concentrado
no Sul e Sudeste, a espinha dorsal do futuro sistema ferroviário brasileiro
é Norte-Sul, e as duas iniciativas que estão para o Nordeste, que são estra-
tégicas, não chegam na Norte-Sul, ficam no meio do caminho. A TRANS-
NORDESTINA não pode parar em Eliseu Martins, me desculpem. Por quê?
Porque quando a gente for olhar onde é que está o grosso da produção que
vai ser levada pela ferrovia, ela está no entorno da Norte-Sul, e nós estamos
longe da Norte-Sul. E está pontilhadinho ali porque aquilo não está no PAC;
está no PAC pela metade.
Eu acho que esse tipo de debate é uma das nossas agendas importantes,
porque a gente sabe que infraestrutura é elemento estratégico de qualquer
441RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
estratégia. Não dá para pensar uma estratégia de desenvolvimento do Nor-
deste sem colocar isso, de saída, na discussão; são investimentos estratégi-
cos, portanto, requerem planejamento. O Nordeste tem que se juntar para
saber quais são as infraestruturas estratégicas para os nossos próximos cin-
quenta anos, trinta anos. Foi isso que a SUDENE fez quando foi criada. A
SUDENE que acabou ficando com a imagem dos incentivos. Mas a SUDENE
de Furtado, se você olhar o primeiro e o segundo plano diretor da SUDENE, o
grosso do investimento, nem tinha incentivo, incentivo ele negociou no Con-
gresso para aprovar o plano diretor; o grosso do investimento era em dois
lugares, aliás, em três: primeiro, infraestrutura econômica. Na época, o Cea-
rá não tinha energia. Infraestrutura econômica com um plano estratégico
da infraestrutura viária federal, negociando com os estados a infraestrutura
estadual. Tinha planejamento de longo prazo e quais eram as intervenções
estratégicas, onde o governo federal ia fazer, e chamava os estados para
fazer juntos. E o segundo eixo era gente, criar quadros técnicos na região,
que, na época não tinha, era um Nordeste diferente do que a gente tem hoje.
Não tinha economista, não tinha agrônomo, não tinha geólogo, e a SUDENE
financiou, era o CNPQ da época. Ela dava bolsa de estudo para o cara sair lá
do interior do Ceará e estudar geologia em Recife, que era onde tinha uma
escola boa, e financiava o cara para fazer isso, para formar quadros técnicos,
porque ninguém faz desenvolvimento sem gente qualificada.
Então, é disso que se trata, a nossa discussão hoje é essa, temos que ter
planejamento estratégico para fazer isso. Temos que olhar essa oportuni-
442
dade para saber onde dá, onde não dá PPP e concessão aqui. Pernambuco
tem alguns trechos hoje em PPP, de estrada, sinal de que dá, ali pertinho de
SUAPE dá. Então, se dá, por que não? Pernambuco está fazendo saneamen-
to em PPP, então tem coisa que dá. Não podemos ficar fora da discussão.
E segundo: onde não dá, queremos o mapa do investimento público. Do in-
vestimento público em rodovia, em ferrovia, em aeroporto. Aeroportos nas
nossas cidades médias, que é um elemento importante; cidade média, daqui
a pouco eu volto. E fibra ótica, tudo que for infraestrutura econômica.
Segunda discussão: olhando para o Brasil. Qual é, nessa transição tam-
bém, o debate que está se instalando no Brasil? É o debate da continuida-
de da nossa industrialização. O Brasil está discutindo isso, e a agenda é
correta. Nós apostamos em ser um país industrial no século XX e estamos
claudicando. E esses dois gráficos aí atestam isso. O primeiro é olhando
para o mercado interno, o segundo olhando para o mercado externo. No do
mercado interno, a curvinha mais fina é a curva do consumo, e a curva mais
forte é a curva da produção industrial. E a boca do jacaré está se abrindo;
significa que o mercado está mais dinâmico do que a nossa indústria. E aí
também não tem espaço vazio não, não é só na política não, aí também não
tem espaço vazio. Quem preenche o espaço chama-se importação de bens
industriais e a China está adorando esse espaço. Do lado do setor externo, a
gente tem a mesma preocupação, o gráfico é preocupante; porque o azul é
exportação de bens industriais, e o vermelho é exportação de commodities,
e abre de novo a boca do jacaré. Nós estamos comparecendo no mercado
443RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
externo como país produtor de commodities e, que eu saiba, não é isso que
a sociedade brasileira deseja para o seu futuro. Portanto, está na agenda, e é
correto discutirmos a questão da continuidade do processo de industrializa-
ção brasileiro, e quem está sendo mais afetado são as chamadas “indústrias
de maior valor agregado”. Falou a brasileira, agora vai falar a nordestina.
Quando eu acho onde é que está essa indústria que precisa ser apoiada, o
mapa fala por si só. Se formos ter um esforço consistente para salvar a nos-
sa indústria de maior valor agregado, ela está nestes pontinhos vermelhos
do território brasileiro. E nós estamos fora da agenda. Portanto, o Nordes-
te tem uma outra agenda. Devemos patrocinar no Brasil indústrias de alto
valor agregado, sim, mas no Nordeste também. Quais são as oportunida-
des que existem no Nordeste para a indústria de mais alto valor agregado?
Não podemos ficar fora dessa agenda, isso é uma estratégia importante e
me preocupa quando eu vejo o Brasil Maior, porque é a primeira iniciati-
va do governo federal na direção da resposta a esse problema. Quando eu
vejo o esboço de como está construído, ele está construído setorialmente,
com algumas dimensões transversais, e lá no finzinho do gráfico tem assim:
“ações especiais em desenvolvimento regional”. Quem é do ramo sabe que
quando coloca ações especiais é o mesmo que dizer “porque não falei de
flores, vou colocar aqui”. Então, não se trata de ações especiais, se trata
de ter a dimensão regional implícita, embutida dentro de um programa de
valorização da indústria de maior valor agregado do País. Então, eu acho
que este debate está equivocado e nós estamos fora do debate. Se a gente
444
se contentar com ações especiais, vocês vão ver o resultado daqui a dez,
quinze anos, não quero mais nem estar viva para ver.
Terceiro grande desafio, ainda falando de indústria. Qual é a indústria
que mais cresce no Brasil hoje? Petróleo e gás. Podem olhar a tabelinha,
não sei se dr. Paulo trouxe, a tabelinha dos investimentos industriais no Bra-
sil é de longe petróleo e gás. Então, petróleo e gás, num marco regulatório
de duas coisas muito importantes, que como brasileira também assino em-
baixo. Não vamos exportar petróleo bruto, queremos derivados do petróleo,
petroquímica, por exemplo. E queremos usar o dinamismo desse segmento
para apoiar indústrias dentro do território nacional, queremos a cadeia de
petróleo e gás.
Este mapinha aqui, do refino e petroquímica, já diz onde está o grosso do
investimento nesses dois segmentos. E o mapinha do lado é meu. O primeiro
é do PAC, o do lado é meu. Porque qual é a cadeia para trás? Quem é que
vende a petróleo e gás? É a indústria eletro-metal-mecânica. Aí eu só fiz
essa pergunta: e onde fica a indústria eletro-metal-mecânica do Brasil? Está
aí pintadinho de amarelo; nem preciso falar. Portanto, qual é a tendência? É
o segmento mais dinâmico de investimento da indústria arrastar uma ca-
deia que está lá embaixo. A gente está morto de feliz porque conseguiu três
refinarias. Aliás, conseguiu uma na vera, porque duas estão só anunciadas.
Então, não podemos ficar encantados porque anunciaram três; é muito im-
portante, conseguimos o estaleiro, mas isso é muito pouco diante do bloco
de investimento que isso vai trazer. Portanto, tem que ter uma estratégia de
445RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
integração do Nordeste na cadeia de petróleo e gás, não pode deixar isso
aqui: “Ah, isso é indústria do século XX”. É, é indústria do século XX. O gran-
de problema do Nordeste é que a gente tem que estar com o olho no século
XX, às vezes no século XIX, e um olho no século XXI. Nossa estratégia, por
isso que não pode ser no singular, nossas estratégias têm que ter olhares
em vários momentos, essa aí é olhando para o século XX mesmo, porque o
Brasil ainda vai ser importante na economia do petróleo, no fim da era do
petróleo, tudo bem, mas vai ser importante. Então, eu acho que aí tem ou-
tra agenda importante para o Nordeste. A petroquímica, a gente conseguiu
umazinha, num bolo de vinte e três bi a gente conseguiu uma de um e oito-
centos; estamos morrendo de felizes.
Segunda observação, ainda do lado da indústria: uma indústria que tende
a crescer muito no Brasil é a automotiva. Eles escolheram o Brasil como
um dos países para crescer, porque essa indústria é mundial. O bloco de
investimentos anunciado no PAC é trinta e três bi. Das cinquenta e poucas
fábricas de automóveis do Brasil, o Nordeste tem duas: a Ford na Bahia e
a Fiat se instalando em Pernambuco. E vamos ser sinceros, aqui entre nós,
essas indústrias vieram também por decisão política. A da Bahia é resultado
da articulação de ACM com FHC, e a de Pernambuco é resultado da articula-
ção de Eduardo com Lula. Então, felizes coincidências, mas peso político do
governo federal para tomar decisão final, senão não tinha saído. Essa é uma
coisa que nos interessa. As que estão anunciadas no PAC vão para onde es-
tão as outras. Vamos nos contentar com as duas? Então, acho que tem uma
446
agenda aí; é do século XX? É do século XX, mas vem para o Brasil? Então, se
vem para o Brasil, o Nordeste tem que estar olhando para elas também. A
siderurgia tem a mesma tendência, e eu vou ficando por aí.
Qual é a minha hipótese, então, gente? Na retomada da indústria brasi-
leira, que eu acho que devemos patrocinar, a tendência é reconcentrar no
Sudeste o investimento; portanto, tem que estar na estratégia do Nordeste
fazer esta discussão da consolidação do processo de ampliação da indústria
aqui, que nós conseguimos avançar no período recente. Não ficamos para-
dos, conseguimos avançar.
Terceiro ponto: energia renovável. Essa é do século XXI. Qual é a ten-
dência? Fim da era do petróleo e hegemonia da energia renovável. Energia
renovável no Brasil, uma das lideranças é etanol. Bom, vamos patrocinar
o etanol ou vamos patrocinar o etanol; nenhuma dúvida. Do ponto de vista
de estratégia nacional, nenhuma dúvida. Embora tenha claudicado bastan-
te a política de apoio ao etanol, no período recente. Por exemplo, a gente
está subsidiando gasolina e estamos terminando por importar gasolina.
Mas, deixando isso de lado, olhando isso estrategicamente, é claro que
etanol é uma escolha estratégica importante que a gente fez lá na crise,
na primeira crise do petróleo. Quando eu olho os dados, o Nordeste perde
peso relativo na produção de etanol; era 12% em 2001 e é 6,5% agora. Per-
deu metade do peso relativo, porque o mapa do etanol é esse aí, o mapa do
etanol tem endereço. O endereço é São Paulo, Mato Grosso do Sul, Goiás e
Minas. E o Nordeste está perdendo peso no mapa do etanol. E aí é econo-
447RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
mia do século XXI. Então, esse é um debate que nos interessa porque já é
olhando para frente.
Quarta grande oportunidade do Brasil: ser um grande produtor de alimen-
tos. Por quê? Porque o mundo está carente de alimentos. Na China está cres-
cendo a renda, na Índia está crescendo a renda, só aí tem uma parte funda-
mental da população mundial, na África está crescendo a renda, a América do
Sul está crescendo a renda, então tem uma pressão mundial por aumento da
oferta de alimentos porque a demanda está crescendo. Como a gente não está
atendendo, quem é que está respondendo? O preço. Não é à toa que o preço
de alimento está crescendo no mercado mundial. Acabamos de sair de um
período recente, onde o grande debate do Brasil era pressão inflacionária vin-
da do comportamento dos preços de alimentos. Então, isto vai estar na nossa
agenda porque o Brasil tem um grande potencial para isso.
Mas, quando eu olho o Nordeste nesta tabelinha, por exemplo, que fala de
grãos, o Nordeste perdeu posição na produção de grãos, de 12% para 8% , e o
Nordeste tem uma característica importante que nós não podemos esquecer,
é que a gente produz 14% da produção agrícola, aquele segundo número ali
é produção de valor agregado da produção agropecuária; o Nordeste caiu de
18% para 14%, e aumentou o peso na ocupação; tem 45% das pessoas ocu-
padas na agropecuária do país. Tem uma agricultura de baixa produtividade;
portanto, de baixa renda. E é a única região que tem esse perfil. Então, aqui,
essa discussão é importante. O endereço da produção de grãos é esse daí.
Esse mapinha é o mapa da soja, mas o resto que vem junto com a soja está
448
por aí. Por isso que a Norte-Sul é estratégica, a gente engatou ali só um pou-
quinho.
E esses dois mapas mostram o seguinte: o mapa do lado é da base patro-
nal, porque o Brasil tem dois tipos de agricultura, uma agricultura patronal e
uma agricultura familiar. A nossa cultura patronal é mais voltada para fora,
e a nossa agricultura familiar é mais voltada para dentro. A agricultura pa-
tronal está ali onde está mais escuro nesse mapa do lado de cá, porque ela
gera um valor agregado muito elevado, então ela predomina ali no Centro-
-Oeste. A agricultura familiar predomina em três lugares do Brasil: no Sul,
no Nordeste e no Norte. E são três agriculturas completamente diferentes.
A do Sul é herdeira da imigração europeia, uma agricultura de pequeno pro-
dutor, sempre voltada para o mercado, é diferente da nossa que é embutida
dentro do latifúndio, com baixa produtividade, e por aí vai. Então, a nossa
discussão nessa oportunidade estratégica do Brasil, de ser um produtor sig-
nificativo de alimentos no mundo, ela precisa ser vista com as característi-
cas que a gente tem, e nossa estratégia não pode ser uma estratégia única,
nacional, porque a realidade do país é diversa e do Nordeste tem essas duas
particularidades de que eu falei.
A última oportunidade estratégica é consolidar as mudanças que nós
fizemos no quadro social. Nós não vamos querer andar para trás. Da rede-
mocratização para cá, o Brasil avançou do ponto de vista social, é uma con-
quista da sociedade brasileira, e isso não pode parar. Então temos que ter
isso como macro-opção estratégica do país. Na trajetória que a gente fez,
449RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
o Nordeste se saiu bem. Esse gráfico aí é da redução da pobreza absolu-
ta e ele mostra que a gente teve um ótimo desempenho. A curva azul é do
Nordeste, ela caiu com muito mais intensidade, e o hiato que nos separava
da região que tem a melhor condição, que é o Sul, diminuiu. O hiato aqui no
começo do meu gráfico é muito menor do que no fim do meu gráfico, então
o Nordeste teve uma situação favorecida neste conjunto de políticas que a
gente implementou. A gente liderou o crescimento do rendimento domiciliar
entre os dois últimos censos, que são os dados que eu peguei, mas, aten-
ção, o rendimento médio do Nordeste ainda é 55% do observado no Sudeste.
Melhorou? Melhorou, agora, somos um pouquinho mais de metade da renda
média do Sudeste, não podemos esquecer isto.
Do lado do rendimento domiciliar rural, teve uma mudança muito impor-
tante. Vejam a taxa de crescimento da renda rural no Nordeste: 7,2% na dé-
cada; é taxa chinesa, 7,2%. É visível, quem conheceu o Nordeste do final do
século e vê o Nordeste do interior hoje, é visível que aquela miséria dura que
existia antes foi atenuada, dá para ver a olhos nus esse número que está aí.
Então, são conquistas importantes que a gente foi fazendo, e a tendência
agora não é andar para trás, é andar para frente. As manifestações de ju-
nho disseram isso ao país que a gente quer andar para frente e temos uma
agenda; a agenda para frente chama-se educação de qualidade, saúde de
qualidade, habitação de qualidade, e tem um bocado de avanços para serem
conquistados, ampliando essa conquista que foi feita. E o Nordeste? O Nor-
deste tem que estar nessa agenda, temos que ter estratégias para este de-
450
safio que o Brasil vai viver nas próximas décadas e dar continuidade a isso.
E temos um grande argumento: é que o hiato social ainda é grande quando
a gente olha o Nordeste comparado, ou com a média nacional, ou com as
regiões mais ricas do Brasil. Aí eu coloquei vários dados; por exemplo, o
quadro rural melhorou, mas veja ali o analfabetismo rural do Nordeste. Qual
é a média do analfabetismo brasileiro? 9%. E a média do analfabetismo rural
do Nordeste? Quase 30%. Então, esta é a realidade, dado do censo de 2010.
Tem uma outra coisa muito importante que mudou do Nordeste, que já
apareceu na mesa da manhã, foi o esforço que a gente fez em educação.
Dentro dessa agenda nova, a gente tem uma vantagem: é que, no que o Bra-
sil apostou um pouquinho em educação, o Nordeste engatou nessa trajetó-
ria. Esse mapa, o verdinho, é o que é novo de CEFET e de escola técnica, e
esse outro mapa é maravilhoso, a gente tem de pensar o Nordeste a partir
daí. Esse mapa anterior, a gente tinha quarenta e três campi, é o mapa do
REUNI; a gente tinha quarenta e três campi das universidades federais, pas-
samos para duzentos e trinta. Mais importante do que o número é o mapa.
Por quê? Porque a gente colocou novos campis onde não tinha. Então, esta
é uma novidade no Nordeste, porque o Nordeste está cheinho agora, ali no
miolão do Nordeste, de escolas de ensino superior, isso é uma realidade
nova em cidades médias da região, dando oportunidade, a gente que não
teria essa oportunidade se isso não tivesse chegado. A gente ainda não sabe
quantificar o impacto que isso vai ter em muitas das nossas estratégias de
desenvolvimento, olhando mais para o interior do Nordeste. Então, isso é
451RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
uma vantagem importante porque, vejam, a gente ampliou muito o número
de jovens no ensino superior. Vejam, que o Brasil passou de 11% para 22%;
gente, 22% é muito pouco ainda. A Argentina e o Chile têm um terço dos
jovens no ensino superior há décadas, há décadas. O Brasil agora que está
chegando em 22%, é muito pouco. O Nordeste passou de 6% para 15%, teve
um excelente desempenho. Passou de 6% para 15%, mais do que dobrou o
peso; mas, 15%? A média brasileira é 22%, estamos longe da média brasilei-
ra, tem que fazer um esforço muito maior do que a gente fez, e é isso que os
dados estão nos dizendo aí.
E o que a gente não avançou é estratégico, que é o investimento em CT.
Hoje, na mesa da manhã, foram mostrados os dados de Aristides, e os da-
dos dos demais participantes mostraram que teve um avanço significativo
no nosso sistema de CT e nós reconhecemos isso. Uma coisa era o Brasil
dos anos 80, outra coisa é o Brasil dos anos 90 para cá; em termos de sis-
tema de CT, demos passos enormes. E o tamanho do gasto aumentou sig-
nificativamente. Agora, a distribuição regional do gasto não mudou, o que
não apareceu de manhã foi a distribuição regional do gráfico. O Sudeste,
que é o azul escuro, e o Sul, que é o azul claro, continuam levado a fatia do
leão do gasto em CT. Então, esta é uma realidade; a gente avançou, mas
regionalmente não. E, ora, inovação, se é o novo componente estratégico do
desenvolvimento, como é que fica? Se as nossas estruturas de promoção do
investimento em CT continuam concentradas e sugando o recurso adicional
que aparece. Então, isso tem que estar na agenda do Nordeste, faz parte do
452
eixo central da nossa estratégia de desenvolvimento futuro, senão a gente
não sai de onde está.
Com isso, eu encerro meu olhar nacional e passo para olhar o Nordeste.
Vou olhar o Nordeste rapidinho.
Primeiro, eu acho que educação, claro, tem que estar no coração da estra-
tégia brasileira e, mais do que nunca, no coração da estratégia regional. Não
há o que discutir isso. Tivemos avanços, são insuficientes e temos que em-
purrar nessa tecla. Acho, aliás, muito interessante o que a nossa presidente
está dizendo. Ela está dizendo: “Vou entregar a infraestrutura ao setor priva-
do, agora vou colocar o pré-sal todinho na educação”. Não conseguiu colocar
todo, colocou 75%, mas é uma conquista. Quer dizer, o Estado tem que estar
na educação, os aeroportos podem ser privados. É uma rediscussão do papel
do Estado, qual é o papel do Estado no desenvolvimento brasileiro do século
XXI. Educação é tarefa do Estado e, portanto, a gente tem que disputar a po-
lítica nacional de educação, porque ela é fundamental da nossa estratégia.
Segundo, eu já falei, que é a indústria. Tem aquele debate mais geral, mas
tem uma outra tarefa de casa no Nordeste que é muito interessante. É que,
bem ou mal, a gente conseguiu trazer um bloco de investimento muito in-
teressante; está muito concentrado na Bahia, Pernambuco, Ceará e Mara-
nhão, está muito concentrado nesses quatro estados, mas tem muita coisa
nova. Tem segmentos novos que não eram do DNA da indústria do Nordeste,
e a gente vai ter que conviver com essa oportunidade. Qual é a oportuni-
dade em que isso aparece? É uma estratégia para articular a base antiga
453RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
com esta base nova. Senão, isso tudo vaza para fora. Quando vem, vem tudo
agarrado de fora, os fornecedores já vêm prontos, a dona Fiat está chegando
em Pernambuco com os seus cinquenta sistemistas, já todos articulados.
Mas, nós temos que disputar a segunda geração, temos que nos preparar
para fornecer os vidros que eles vão precisar, Pernambuco tem uma boa in-
dústria de vidro. Então, temos que ter isto como opção estratégica, desdo-
brar dentro da região aquilo que a gente conseguiu trazer na fase recente e
colar uma na outra. Isso tem a ver com o Integra, porque, ou os empresários
já existentes na região tomam consciência disso, e eles vão patrocinar essa
ligação, ou não é política pública sozinha que faz isso. Tem um lado que é
decisão empresarial, de investir nos seus negócios, de arriscar mudar para
colar no que é novo, que está vindo. Então, é muito próprio a gente fazer essa
discussão nesse fórum, porque eu acho que se só vier de governo, de cima
para baixo, não vai.
Outros desafios especiais. Primeiro: o desmonte da base produtiva do
Semiárido. Eu vou ousar falar disso aqui na frente de Magalhães, mas vou
ousar. A base, o tripé básico do Semiárido ruiu, ruiu com o fim do algodão.
Uma coisa era o Semiárido com o algodão, outra coisa é o Semiárido sem
algodão. Estamos diante de outra realidade. A própria atividade pecuária
sofreu. Não foi só o pequeno produtor, cuja a única fonte de renda monetária
era o algodão. Ainda bem que o Constituinte estendeu a previdência rural na
década de 80 para o Nordeste; para o Brasil, mas bateu muito no Nordeste.
Porque eu fico pensando o que seria de Fortaleza, de Recife, de Teresina,
454
se não tivesse a previdência rural, se a renda monetária do algodão tivesse
faltado e não tivesse nada para colocar no lugar. O tamanho da imigração
rural que a gente tinha experimentado, e os desastres das nossas cidades.
Então, essa é uma mudança de grande significado, tem que ter uma outra
estratégia para o Nordeste Semiárido, não é mais pensar no mesmo tema,
até porque a pecuária também sofreu. Quem melhor me explicou isso foi um
pecuarista do Rio Grande do Norte; eu sempre gosto de contar essa história.
Eu fui fazer uma entrevista com ele, e ele disse: “Ó, minha filha, eu vou lhe
contar a minha história para lhe explicar qual foi o impacto. A fazenda que
eu tenho hoje foi do meu avô. Meu avô tinha duas famílias, quinze filhos, e
todos estudaram no Rio de Janeiro. Na mesma fazenda, eu só tenho uma
família, eu só tenho dois filhos, e não consigo tirar de Natal”. Então, ele me
contou assim, com a história familiar dele, qual era o tamanho do impacto
na pecuária da região. Então, nós não estamos falando de uma mudança
irrelevante, bateu nos pobres e bateu nos ricos também.
Então, temos que repensar essa estrutura. Repensar com a consciência
de que tem uma grande parte da agricultura familiar do Nordeste aí, portan-
to tem que ter um eixo da estratégia que é voltado para esse pequeno produ-
tor, e tem o eixo da estratégia que tem a ver com uma nova potencialidade,
que é a ousadia de ter feito o projeto da interligação de bacias. Uma coisa
é o Semiárido sem a interligação de bacias, outra coisa é o Semiárido com
interligação de bacias. Basta olhar as manchas férteis que tem lá, e não tem
água, e que agora vai ter água. Então, tem que ter uma outra discussão sobre
455RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
a nossa estratégia para o século XXI do Semiárido, porque as mudanças não
são insignificantes.
O peso relativo do sucro-alcooleiro. Eu falei do etanol, mas não é só o
etanol, está perdendo peso no açúcar e está perdendo peso na produção de
cana. Então, um dos pilares do Nordeste Oriental rural está afundando e não
tem volta. Portanto, tem uma coisa que é nossa, que é: qual é a estratégia
de reestruturação produtiva para a Zona da Mata do Nordeste. Vamos deixar
ruir e assistir só o pessoal especular com terra? Essa é a nossa proposta?
A que está em curso é essa. Eu acho que aí tem uma discussão importante,
que tem muita gente também que está ligada a isso.
Outra coisa importante para o Nordeste é o dinamismo das cidades médias,
que exige uma estratégia especial para isso. O Brasil precisa, e o Nordeste
mais do que o Brasil, porque é uma novidade. O Brasil do século XX pulsava
nas grandes cidades. O Brasil do começo do século XXI começou a pulsar nas
médias cidades. Eu confesso a vocês que eu passei cinco anos sem ir a Crato
e Juazeiro. E o ano passado eu fui lá; tomei um susto, que cidade é essa minha
gente? Mudou a cidade completamente. Duas universidades de saúde, uma
pública, outra privada, dois hospitais novos, não sei quantas revendedoras de
automóveis, eu digo: estou chegando onde? Supermercado, não sei quê, que ci-
dade era aquela? Completamente transformada por aquele padrão de dinamis-
mo que a gente viveu nessa década. Essas cidades têm que ter hoje prioridade
na nossa estratégia, para a gente ter cidades médias diferentes das velhas. As
velhas a gente vai ter que consertar, as novas dá para fazer certo. E aí eu vou
456
ousar fala isso na frente de Lúcia; eu acho que se precisa de três políticas aí:
planejamento urbano do bom, transporte coletivo de qualidade e saneamento.
Se fizer essas três, nós teremos cidades médias saudáveis no século XXI, no
interior do Nordeste. E não custa caro fazer isso. Custa caro fazer isso em
Recife, custa caro fazer isso em Fortaleza, custa caro fazer isso em São Paulo.
Sabe qual é o precinho do trem-bala? Coloca o preço do trem-bala nesses três
investimentos, em várias cidades, e veja a consequência dessa opção.
Outra coisa, potencial turístico do Nordeste. Saiu da nossa agenda. Por
que saiu? Então, o povo vai dizer: “mas, você, falando isso?”. Porque, no final
da década de 90, quando o Nordeste aparecia no debate, eram duas coisas
que apareciam: fruticultura e turismo. E eu sempre me rebelava contra isso:
“gente, o Nordeste não é só fruticultura e turismo”. Agora o Nordeste é,
também, fruticultura e turismo. Eu já falei da fruticultura e agora vou falar
do turismo. É evidente que esse é um potencial enorme da nossa região e
cria muito emprego, cria mais emprego do que a indústria. Então, tem que
ser prioridade, tem que voltar para a nossa agenda, tem que voltar a investir
com força nisso. Então, é uma outra agenda que tem que ser feita.
A outra, ligada com essa, também passou na mesa da manhã, quando
a Cláudia falou de um grande potencial do Nordeste, que é a economia
criativa. E eu estou falando do século XXI. Estou falando do século XXI.
Não tem nenhuma região do Brasil que tenha a capacidade para a econo-
mia criativa que o Nordeste tem. Não tem. Desafio a vocês a me provar
que qualquer outra região brasileira tem o potencial do Nordeste para eco-
457RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
nomia criativa. Isso aqui é um poço sem fundo de potencial para econo-
mia criativa, que gera também muito emprego e traz capacidade criativa,
requer inovação, tudo de bom, na receita de apoio a ela. Então, isso tem
que estar na nossa agenda, é uma estratégia de apoio firme a isso. É fácil
fazer? Não. Cláudia mostrou aqui que é difícil; o marco regulatório não
presta, o sistema de financiamento não é adequado, são muitos desafios.
Agora, o potencial é evidente. Quem ficou encantado com isso foi Manga-
beira Unger, que traçou num documento o segundo eixo estratégico que
estava na fala de Aristides, hoje de manhã. Ele disse: “a gente precisa ter
uma estratégia específica para esse tecido de pequena dimensão, porque,
somado, esse pequeno tecido é de um enorme potencial no Nordeste”, e a
gente tende a olhar somente para os grandes investimentos, a concentrar
nossa habilidade em trazer empresa de fora. A gente fez isso, ele mostrou
aqui, a gente fez isso e o resultado não foi tão grande. Não é que a gente
deva deixar de fazer; ao contrário, eu comecei dizendo que a gente tem
que continuar fazendo, mas não pode ser só isso. Tem o outro pedaço da
estratégia que a gente abandonou.
Portanto, o segundo grande eixo estratégico, Mangabeira Unger tem ra-
zão, tem que olhar para essa capacidade empreendedora do pequeno e mi-
croinvestidor da região, inclusive das mulheres que têm exemplos maravilho-
sos da capacidade empresarial da população feminina, isso é um potencial
fantástico para o Nordeste.
Já terminei meu tempo, vou fechando.
458
Energia renovável já falei, a gente teve avanços importantes na matriz
eólica e temos tudo para dar avanço importante no solar, portanto estamos
na agenda da energia renovável, temos que ter estratégia para ela.
E temos que colocar na nossa agenda a desigualdade intrarregional. O In-
tegra Brasil nos leva a fazer a discussão do Nordeste com as outras regiões,
mas o mapinha está mostrando que, dentro, a gente é diferente, e os dados
mostram que não é só diferente não, a gente é desigual. O litoral é diferente
do interior, Pernambuco, Bahia e Ceará, e agora Maranhão, são diferentes
de Piauí, Rio Grande do Norte, Sergipe, Alagoas. Para esses estados a gente
tem que olhar a uma lupa mais apurada, tem que trazer o debate para esses
estados, que tem ter um tratamento diferenciado na nossa estratégia.
Qual é o nosso grande calcanhar de Aquiles, gente? Só para terminar.
É que a visão do Nordeste morreu. Eu estou dizendo morreu porque estou
sendo mais pesada. Mas, o grande desafio do Nordeste é manter essa visão
que, apesar das desigualdades, apesar das diferenças, tem muita coisa que
une essa região. Eu não vejo nenhum paulista dizer que é sudestino, nenhum
carioca dizer que é sudestino, mas eu vejo o cearense dizer que é nordestino,
o piauiense dizer que é nordestino, um baiano, meio para lá, meio para cá,
porque tem hora que eles têm crise de identidade, mas quando vêm do lado
cultural eles têm que se reconhecer como nordestinos. E a guerra fiscal nos
dividiu, a estratégia recente, ao invés de nos unir, nos dividiu, e divididos nós
ficamos fracos. Nós ficamos fracos porque esse conjunto de estados só dá
13% do PIB. 13% do PIB é muito pouco para ter peso no debate nacional. Já
459RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
viram qual é a estratégia de São Paulo? Tudo que é de São Paulo é discussão
que interessa ao país. Tudo que vem do Nordeste é regionalismo. E Aristides
já disse aqui como é que Brasília trata o regionalismo. Então, não dá para
ficar dividido. Se a gente não tem mais, enfraquecer nossos órgãos regionais
é uma estratégia equivocada, nós temos que fazer a outra, fortalecer nos-
sos órgãos regionais. Não precisa repetir o modelo, que era, agora que o va-
zio, a dispersão, a briga interna, não leva a nada, eu acho que está provado.
Portanto, esse tipo de articulação que o Integra Brasil fez está correta. Eles
foram para os estados, juntar o povo nos estados para poder chegar nesse
seminário aqui; é assim que tem que fazer. Muito obrigada.
Firmo de Castro: Agradecemos a professora Tânia que, mais uma vez, nos
brinda com uma exposição de alta qualidade e muito didática. Com certeza,
será muito bem aproveitada essa exposição, esteja certa professora, nas
etapas seguintes do Integra.
Desejaria anunciar a presença do deputado Danilo Forte que, junta-
mente com o deputado Artur Bruno, já anunciado pelo cerimonial, vem nos
prestigiar com a sua presença. O deputado Danilo tem mostrado, desde
a primeira hora, um parceiro importante para a Federação e CIC, na con-
dução de matérias e de assuntos de interesse do estado do Ceará e do
Nordeste como um todo. Muito obrigado pela presença, deputado Danilo.
Sem mais delongas, passo a palavra também para a dra. Maria Lúcia Fal-
cón, cujas qualificações já foram realçadas. Ela que, hoje, é secretária de
460
Estado do nosso querido Sergipe, voltada para a área de desenvolvimento
urbano, mas que tem todas as qualificações para dar uma contribuição mui-
to além do que seria esse tema específico.
Maria Lúcia Falcón: Boa tarde a todos os senhores e senhoras que nos hon-
ram aqui com a presença, um agradecimento à organização do evento, aos
empresários e lideranças que tiveram a iniciativa de promover um espaço
e um fórum de debates como esse; ao nosso coordenador de mesa o nosso
agradecimento também, e é uma honra estar fazendo parte de uma mesa
tão qualificada e, particularmente, professora Tânia, eu sou sua eterna fã e
é uma coisa muito boa lhe ouvir, faz bem para o espírito, é um alimento espi-
ritual escutá-la, e dá coragem também para gente; isso é muito importante.
Eu queria deixar um abraço especial à Nicolle, aqui na organização do In-
tegra Brasil, e ao BNDES na pessoa da professora Helena, que estava aqui,
embora Paulo esteja na mesa conosco, que também tem promovido muitos
espaços como esse, relevantes.
Eu fiquei pensando muito nessa subversão que a professora Tânia falou,
em relação ao tema da nossa mesa. E eu fiquei em dúvida entre, se eu colo-
caria assim, viu professora: “Nordeste e Brasil, um caso de amor e ódio?”.
Que seria uma coisa mais mexicana, uma novela mexicana, ou se eu fazia
um pouco de história de menino pequeno: “Quem tem medo do lobo mau”.
E terminei ficando: “Quem tem medo do desenvolvimento do Nordeste?”.
Quem é que tem medo do desenvolvimento do Nordeste? Porque alguma
461RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
coisa está acontecendo com essa região. E é secular. Tivemos um papel inte-
ressante na origem da nação brasileira, baiana de nascimento, sergipana de
adoção, eu tenho esse defeito que a professora Tânia falou, dos baianos, às
vezes a gente se sente bastante nordestino e, às vezes, lembra do tempo do
Império e da Colônia, que a gente foi capital, que teve a capital na cidade da
Bahia que, na verdade, é Salvador. E foi pensando nessas dúvidas que foram
levantadas aqui, eu assisti um pouco da mesa da manhã, assisti um wor-
kshop que foi no Rio de Janeiro, não assisti aos demais. Mas, ouvindo, lendo,
escutando as pessoas, essas dúvidas que foram tratadas aqui na mesa da
manhã, que foi Ciência e Tecnologia, e Cultura, eu acho que vai bater, tudo
vai convergir exatamente nessa pergunta, de quem tem medo do desenvol-
vimento do Nordeste.
No Brasil Colônia era a nobreza, que veio da Europa para tomar conta das
capitanias aqui, depois nós viramos associados ao Império, depois nós vira-
mos Império em si, e fomos reproduzindo uma relação entre poder central
e o poder nos estados nordestinos que levou a um confortável, eu diria, laço
político econômico e social, que deságua na realidade que nós temos hoje.
Então, nós nordestinos somos, em grande parte, responsáveis por optar pela
opção que foi feita por esse caminho, da condição subalterna e dependen-
te da região nordestina em relação à economia brasileira. “Ah, você está
sendo muito radical em tratar os nordestinos assim”. Mas, lembrando Celso
Furtado, nós temos que assumir nossa parte da responsabilidade. Uma par-
te é realmente um problema do papel do Brasil na divisão internacional do
462
trabalho; você explica pelos movimentos do grande capital no mundo, você
explica pela inserção da nossa indústria como indústria periférica, de um
fordismo periférico, com todas as suas características. Mas, a outra parte,
professora, só se explica com economia política. Nós temos que recorrer a
instrumentos e elementos que não estão nos manuais da faculdade de eco-
nomia, pelo menos não no que é comum. Talvez nos mestrados e doutorados
se chegue a tanto.
Então, meus amigos e minhas amigas, eu vou propor esse desafio de ten-
tar responder a pergunta: quem tem medo do desenvolvimento do Nordeste?
Então, vamos em frente.
No sumário, eu estou colocando cinco aspectos para discutir. Primeiro,
eu preciso explicar para todos os conceitos fundamentais que eu estou utili-
zando para construir esse meu pensamento.
O segundo é o problema das escalas. As relações federativas foram tra-
tadas aqui de várias maneiras, mas sempre é um drama para nós brasileiros
o nosso pacto federativo, União, Estado e Município, esses três níveis de
governo que têm que se harmonizar e, às vezes, não se consegue fazer isso
da melhor maneira.
Estratégias e horizontes de eventos, planejando as mudanças e os resul-
tados esperados.
Então, os conceitos fundamentais. Eu vou pedir a paciência de todos, de-
pois eu acelero mais, para falar de quatro coisas que são muito importantes
para entender o meu raciocínio. O primeiro, eu vou falar muito em institui-
463RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
ções, eu não estou falando aqui em instituições no sentido que a gente usa
mais comumente, a instituição da universidade, a instituição da federação
da indústria; eu estou falando instituição no sentido que a sociologia tra-
balha, e a instituição tem muito mais a ver com regras do jogo, como é que
a gente se comporta, como é que a gente se relaciona. Pode ser uma regra
formal, por exemplo, um edital de licitação com recurso para cultura ou uma
regra de ascensão de uma determinada indústria ao crédito do Fundo de
Desenvolvimento do Nordeste, e podem ser, e na maioria das vezes que eu
vou falar aqui, instituições informais, regra do jogo que não está escrita em
lugar nenhum, a não ser na cabeça e no coração dos brasileiros. Nós sabe-
mos como as coisas funcionam muitas vezes e não está escrito no papel, na
maioria das vezes, por sinal.
A outra coisa é território. Eu vou falar muito de território aqui. E aí é uma
questão de espaço geográfico físico, mas é também uma questão de iden-
tidade cultural. No final da sua fala, a professora Tânia levantou aqui, todos
nos declaramos nordestinos; isso é um carimbo de identidade e que muitas
vezes você nem consegue esconder. Até os baianos que queiram se disfar-
çar não conseguem, porque na hora que abrem a boca e falam está lá liqui-
dada a conta, o sotaque impede qualquer tentativa de fuga.
O horizonte de eventos é um conceito que eu roubei da física, que é o
seguinte: todo mundo já ouviu falar naquele troço chamado “buraco negro”,
quando tem uma estrela que implode, ela fica tão densa que implode, ela
absorve, ela puxa toda a luz ao redor dela, nem a luz escapa da força gravi-
464
tacional que o buraco negro tem. Então, quando a gente olha o universo com
aqueles telescópios maravilhosos, você vê a luz até um certo ponto, mas
onde tem um buraco negro você não vê nada. Então, o horizonte de eventos,
eu estou puxando isso para a sociologia e dizendo assim: “o que nós, socie-
dade, cidadãos, enxergamos dos nossos processos evolutivos?”. Têm coisas,
eu vou mostrar aqui para vocês, que a gente consegue ver, todo mundo vê.
Têm coisas que uma parte consegue ver e têm coisas que muito poucos
vêem. E é aí que está o começo da nossa resposta.
E o último conceito é de desenvolvimento. A gente tem falado nisso, tem
batido aqui sobre isso, e eu queria lembrar que desenvolvimento, para mim,
não é crescimento de PIB. Não basta fazer infraestrutura, não basta trazer
indústria, não basta construir as coisas, é preciso investir nas pessoas. Foi
falado muito isso aqui, de manhã, a professora Tânia reforçou aqui, agora
de tarde. E o lado intangível, quando a gente fala investir nas pessoas é só
dar um diploma? Eu diria que é preciso muito mais do que dar um diploma, a
gente precisa ter uma relação de cooperação e de confiança na sociedade,
que exige, por sua vez, mudar as instituições. Tivemos vários exemplos aqui,
de manhã para agora, de fala das pessoas, contando inúmeros casos em
que você precisaria aportar recursos para determinadas coisas, mas não
tem confiança de fazê-lo; então, aumenta a burocracia, aumenta a regra do
jogo, aumenta a exigência, barreiras à entrada. O Estado não confia na So-
ciedade, a sociedade não confia no Estado, o empresário não confia no seu
consumidor e vice-versa, no seu fornecedor. Isso é uma característica do
465RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
subdesenvolvimento. A relação de confiança entre as pessoas e a relação de
confiança institucional é o lado intangível do desenvolvimento, que não se
escreve em nenhum manual de economia, professora, mas que a gente tem
que absolutamente resgatar.
E, aqui, eu vou falar muito de meu estado, Sergipe, onde eu trabalho, onde
eu moro há muitos anos, porque a gente tentou lá, no governo do Marcelo
Déda, colocar em prática, fazer acontecer, muitos dos princípios e das ideias
que eu vou falar aqui. E o que aconteceu lá não foi porque a gente acordou
iluminado de manhã e disse: o céu é roxo, não é azul. Nós tivemos ajuda, nós
tivemos acúmulo de conhecimento, de manhã foi falado isso, inovação no ar,
da eureka, da maçã caindo na cabeça é muito raro, a professora Helena fa-
lou isso aqui, então a gente tem um acúmulo, inclusive aqui na mesa, eu te-
nho bons professores que escreveram sobre isso e, graças a Deus, aos quais
a gente teve acesso, e bons políticos que construíram também propostas
diferentes para o Brasil, e bons empresários que também trouxeram as suas
contribuições em movimentos como o “Brasil Competitivo”, e por aí vai.
Isso aqui é o mapa de Sergipe dividido em oito territórios de planejamen-
to. Lembra que eu falei de território, isso é um exemplo. O que eu chamo
“território”? Territórios construídos pela identidade cultural. Mais do que
economia, mais do que a questão do clima da geografia ou do que seja, terri-
tórios que foram validados do ponto de vista da identidade cultural. E ali é só
para ilustrar, uma linda manifestação de relação de confiança num folguedo
popular, na cidade de Laranjeiras, e que são pessoas de um pequeno grupo
466
folclórico, mas que confiam uns nos outros e são capazes, sem ajuda do Es-
tado, de fazer sua manifestação anualmente.
Aqui é um pouco do desenvolvimento que o economista trabalha tradicional-
mente. Está aqui o parque eólico, presidenta Dilma, o Déda ainda inaugurando
as coisas, aqui inaugurando ponte. Então, o PAC chega ao Nordeste com algu-
mas, não é professora, algumas falhas no mapa em algumas coisas, mas está
chegando. Mas, essa parte aqui, não está no PAC. Essa parte aqui ninguém
manda fazer. Essa parte aqui nem BNDES vai me cobrar num contrato que eu
faça. Essa parte aqui é a construção de relações de confiança estado-socieda-
de, essa é a parte da democracia direta, é onde o povo nos territórios se reúne
para discutir o que quer fazer, que cadeia produtiva incentivar, que investimen-
to é mais necessário, é um resultado de uma experiência de orçamento partici-
pativo. Quando você sai do problema de uma prefeitura, do buraco da rua e da
praça, para um nível maior de desenvolvimento territorial, é assim que a gente
consegue pactuar as coisas, e aí vai se construindo relações de confiança que
vão mudando as coisas e vão mudando as instituições, que é o principal.
Os planos, eles são também regras que a gente escreve, formaliza; às
vezes, são executados na íntegra, às vezes são executados parcialmente.
Sergipe fez planos, Sergipe fez um atlas da cultura para poder buscar esses
elementos concretos de identidade, que hoje a professora Cláudia estava
aqui, de manhã, falando que tem que ter indicador para a cultura. Eu dizia:
na contabilidade nacional, na matriz, no insumo e no produto tem que ter
contabilidade para a cultura, que hoje não tem, na economia criativa.
467RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Então, com essa parte eu apresento meu panorama de fundo, em que eu
me apoio para construir as ideias que eu vou trazer.
Então, o problema das escalas das relações federativas são basicamente
o seguinte: todo brasileiro sabe que no nível local, que a gente pode trazer
para o nível municipal, o município como nossa unidade federativa mais bá-
sica, é onde acontece o que o Michel Foucault, falou da microfísica do po-
der. E eu coloquei aí a brincadeira que nós nordestinos entendemos, talvez
o povo de fora não entenda, que é o coronel e o lobisomem. Nós saímos do
coronelismo do tempo do Brasil da Velha República, que veio, por sua vez, do
Brasil imperial, e hoje nós temos uma coisa chamada liderança local; tem
as suas manifestações, mas é um tipo de lobisomem, porque ele não é mais
o coronel, as instituições hoje não permitem que seja. Às vezes, o sonho de
consumo deles é ser um coronel, mas nem sempre conseguem mais ser;
virou esse troço, por isso que coloquei o lobisomem, porque é algo que nin-
guém sabe bem o que é. Está se reinventando, tem lideranças maravilhosas
novas surgindo na política nordestina, mas tem muita coisa ainda disforme.
Então, a microfísica do poder é aquele coronel antigo, ou lobisomem atual,
ou a nova liderança, eu fui injusta em não colocar, que manifesta, ele é o
preposto do poder do Estado naquela cidadezinha, naquele povoadozinho,
naquele recanto mais afastado da capital e da metrópole. E é lá que o poder
se exerce. Não vai falar para um camarada que mora no povoado de Sítios
Novos, no sertão de Sergipe, perto de Xingó, que o Estado é, por exemplo,
o BNDES. Que BNDES? Até eles já estão conhecendo, depois vocês vão ver
468
por quê. O Estado lá é o líder regional, que chega e nomeia o delegado, ou
que intervém e consegue manipular um pouquinho as coisas e põe uma pes-
soa sua como diretor de escola, então é o poder local; é o cara que, às vezes,
quando falta ambulância do SUS, ele pega e paga para levar uma pessoa
para um hospital regional, é isso, é a microfísica do poder.
No nível estadual, vem uma outra herança histórica das oligarquias e do
clientelismo. Eu não vou ficar perdendo tempo em explicar oligarquia, todo
nordestino sabe o que são famílias tradicionais que continuam mandando nas
políticas dos estados. Agora, o clientelismo, o Brasil está deixando para trás. A
professora Tânia e outras pessoas já falaram aqui, como nós estamos andan-
do rápido, nós estamos melhorando muito, o problema é que não é suficiente o
que já se andou. Então, o clientelismo é aquela velha troca de favores, o empre-
sário quer se instalar no Nordeste, fica devendo um “favor” a uma liderança
dessa oligarquia, por que meu Deus? Graças a Deus, com os editais, com as
regras do jogo das instituições mais estabelecidas, o Brasil avançou muito
neste aspecto, mas eu tenho que lembrar isso, porque a estrutura, professora
Tânia, de indústria que nós temos é consequência da política oligárquica e da
política do clientelismo. O Nordeste é o que é porque as elites locais assim o
quiseram, o pacto foi esse. E por isso que no Rio eu falei, vamos tirar as más-
caras, se a gente quer mudar vamos começar a trabalhar com seriedade. Eu
devo estar ficando doida para falar isso tudo, mas é assim mesmo.
No nível regional, professora Tânia já falou, perdemos a visão estratégi-
ca. Precisamos urgentemente de estratégias regionais, assumirmos nossa
469RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
condição de nordestinos em conjunto. Hoje a localização das firmas, eu as-
sisti coisas lindas no Rio de Janeiro, no workshop, grandes empresas nacio-
nais que dão orgulho à gente, se implantando aqui no Nordeste, lideranças
carismáticas, maravilhosas, empresariais, mas o que eu percebi é que elas
estão vindo por aglomeração, os economistas sabem o que é isso, teoria de
localização da firma por aglomeração, ou terrível mal da guerra fiscal, das
duas uma. Nós precisamos um pouco mais, eu quero que esses empresários
venham, e venham com força, agora eles têm que vir porque nós temos ca-
deias produtivas para arrumar. Vamos ver? Daqui a pouco eu chego lá.
E no nível federal? Eu estou no problema das escalas federativas; o que
acontece com o nível federal? Eu fico às vezes me colocando no sapato, no
pé da pessoa para ver como é que está apertando o calo. Não é mole plane-
jar o Brasil num mundo globalizado, a pressão dos grandes movimentos de
capital internacional, das grandes multinacionais, dos interesses, o mundo
é nossa moldura. Nós não estamos em Marte, nós estamos no planeta Terra,
com um baita sistema globalizado de capitalismo avançado e que todos têm,
inclusive a África, atrasadíssima, têm um papel nesse trabalho também. En-
tão, nosso planejamento tem que levar isso em conta e não é fácil fazer uma
política desenvolvimentista independente, soberana, num mundo com es-
sas condições, de tão avançada globalização. Então, hoje nós podemos dizer
sem medo de que nós estamos focando na macroeconomia, nesse controle;
vocês estão vendo a guerra do câmbio recentemente, o ministro Mantega se
virando para proteger o Brasil no sentido melhor do termo. Então, foco na
470
macroeconomia, nos grandes fluxos de capitais. Nós temos uma tecnobu-
rocracia em Brasília, que a maioria dos estados e municípios não tem, pla-
nejadores, não tem profissionais para fazer esse trabalho, mas Brasília tem,
e tem uma tradição de não funcionar como uma tecnoburocracia de estado
weberiana, ela se associa com agrupamentos políticos. Quer dizer que o téc-
nico de estado não é para ter voto? Não, voto é cidadão, mas a gente precisa
de política de estado e hoje, às vezes, fica difícil.
Nós temos ainda um outro probleminha, um detalhezinho, que é a inclu-
são social, que foi começada, eu chamo de etapa um, professora; a etapa um
é o seguinte: nós estamos incluindo os brasileiros, e o Nordeste se benefi-
ciou disso como a senhora mostrou, mas é pelo lado da renda, nós estamos
muito no lado do consumo, de dar dinheiro para as pessoas até comerem;
o problema número um de Lula foi um prato na mesa, nunca me esqueço
que começou com o Fome Zero, Bolsa Família começou com o Fome Zero.
Precisamos urgente ir para a inclusão da etapa dois e a três. A etapa dois é
pela educação e a etapa três é formar as redes de cooperação local. Arranjo
produtivo local só vira verdade se tiver, basicamente, gente sem fome, gente
com o mínimo de educação codificada para poder entender um manual ou
escrever um método e precisa de rede de cooperação social.
Bem, sendo a nossa federação essa beleza que eu contei para vocês, ago-
ra, as estratégias e os horizontes de eventos. E aí eu associo com um filme,
que foi “Um ensaio sobre a cegueira”, porque o que eu vou falar agora são de
diferentes graus de miopia e cegueira, que eu peço para usar a sua ideia do
471RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
óculos daqui a pouco. O que é que todo mundo consegue ver? Não tem brasi-
leiro, instruído ou não, que não enxergue isso: o ciclo eleitoral e as batalhas
táticas. Isso todo mundo vê, todo mundo sabe que de dois em dois anos vai
ter uma disputa eleitoral, todo mundo identifica os blocos que estão em dis-
puta, não tem problema nenhum, e as propostas, muitas vezes propostas no
município é a praça, é o buraco da rua, aquela bem do tipo circunstanciado, e
quando você vai para o nível estadual e federal, as coisas começam até a ter
propostas um pouco mais trabalhadas. O ciclo de gestão, que é a execução
do governo, todo mundo também vê, haja visto agora, recentemente, essas
manifestações cobrando melhores condições de transporte, melhores con-
dições de saúde. Então, quando esquenta muito a panela de pressão, acon-
tece uma manifestação como essa, mas no dia a dia todo brasileiro é igual a
técnico de futebol, avalia o governo, avalia a seleção brasileira. Agora, uma
parte dos brasileiros fica fora e não consegue perceber, mas os empresários
que, por exemplo, estão promovendo essa instância do Integra Brasil vêem
isso com muita clareza, é o ciclo das mudanças econômicas que muda a
estrutura da economia. São batalhas estratégicas, que tipo de desenvolvi-
mento a gente quer para o Nordeste, vai continuar subserviente, subalter-
no, com uma inclusão periférica na economia brasileira e mundial? Ou nós
vamos tomar a rédea da situação e vamos ser empresários à frente de seu
tempo, digamos assim? Governo, a mesma pergunta. Universidade, a mes-
ma pergunta. Vamos continuar subalternos e mandando os nossos melhores
cérebros para o Sudeste, porque é lá que está o dinheiro e o laboratório da
472
pesquisa? Ou a gente vai segurar nossos meninos aqui, professora Tânia?
Como eu vejo todo ano saindo os meus alunos e a senhora deve ver também,
vai todo mundo para a USP, para São Paulo, porque aqui não tem perspecti-
va, não entra na rede, nos colégios invisíveis da ciência e tecnologia. Então,
esse nível da batalha estratégica é um ciclo que pouca parte da população
consegue ver. É um ciclo de dez anos. E muito poucos conseguem ver o ciclo
da mudança institucional, em que a regra do jogo informal, os costumes, a
cultura, muda. Eu achei muita graça hoje de manhã, quando a professora
Cláudia falou aqui que foi para a Austrália e viu que eles estavam planejando
as coisas lá para vinte anos, aí eu olhei para o pessoal da minha equipe que
está aqui e dei uma risadinha; eu não fui à Austrália, mas eu também acho
que tem que planejar para vinte anos. Então, é o ciclo mais longo, porque tem
que mudar o costume, tem que mudar a relação institucional.
Vamos ver como é que se planejam as mudanças, então, para sair dessas
armadilhas. Eu fiz três cenários, só para manter a praxe. O cenário provável;
por que eu o chamo de provável, porque ele já está de alguma maneira tra-
çado, e mesmo com aqueles mapas que a professora Tânia mostrou aqui, a
ferrovia que não chega lá, a rodovia que não vai ser priorizada, mesmo com
aquelas falhas no mapa, mas tem um cenário já traçado para o Nordeste
hoje, com o PAC e tudo. Grandes investimentos hídricos, haja vista transpo-
sição, grandes investimentos logísticos multimodais, industrialização com
adensamento de algumas cadeias produtivas, tem estaleiro, tem refinaria,
tem fábrica de automóveis, enfim, têm algumas coisas selecionadas que es-
473RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
tão acontecendo já, tem geração de energia com fontes renováveis, e nin-
guém vai retirar o programa de renda mínima que é o Bolsa Família e que
isso vai manter o mercado aquecido. Então, isso é um cenário provável, que
para mim, vocês vão ver, não muda muito a nossa relação subalterna.
O cenário possível é o que eu acho que ainda dá para fazer. Como é que
dá para fazer? Se a gente se juntar, terminar esse evento aqui do Integra
Brasil, gerar esse relatório que o senhor Firmo falou aqui, a Nicolle com a
equipe dos empresários tomar a frente desse troço com mais com quem
puder juntar, e outras instâncias, levar uma proposta de inversão de priori-
dade política e geográfica, no mapa, com investimento em educação e cul-
tura tomando a frente, aí vem universidade, escola técnica, museu, centro
de pesquisa, CVT, que foi falado aqui de manhã, saúde nem se fala, que está
na rua a reivindicação, mas médicos já está acontecendo, e a formação dos
APL’s, arranjos produtivos locais, ou sistemas produtivos inovativos locais,
no Semiárido, olha a inovação aí, professora, construindo em cima das suas
ideias, vai um colocando o tijolinho; aí nós temos toda uma bagagem, da
rede que existe, do pessoal que trabalha com arranjo produtivo há muito
tempo. O que eu estou “inovando” só, que isso não é inovação coisa ne-
nhuma, é dizendo “muda o mapa”, tem que fazer isso no Semiárido, tira do
litoral, vamos pegar aqueles lugares que a gente não tinha colocado como
prioridade e vamos trabalhar, levando desde universidades, escolas técni-
cas, ao lado da escola técnica e da universidade, coloca o distrito industrial,
para atender o arranjo local.
474
Isso aqui é um exemplo em Sergipe. Daqui a pouco eu vou falar desse
programa, já que eu sei que eu só tenho dez minutinhos, mas vou tentar
correr. Isso é um complexo empresarial integrado no município de Tobias
Barreto, em Sergipe, que produz confecção, feito com recursos de um fi-
nanciamento junto ao BNDES, depois eu vou falar desse programa. Aqui já
é o presidente Lula com o nosso governador Déda inaugurando o campus
de saúde de formação de sete a oito profissões médicas em outras cidades,
Lagarto e Laranjeiras, e assim vai, escola profissionalizante em petróleo e
gás em Carmópolis, onde a gente produz petróleo. Saúde, o hospital regional
construído do lado da universidade, que é o campus de saúde, para poder
ter residência médica e o cara sair formado, médico hoje é um elemento
crítico no país. Olha o mapa, olha os investimentos em saúde feitos levando
para o interior essas oportunidades. Então, são oito hospitais regionais, além
daquelas unidades básicas. O que eu quero que vocês vejam não é a minha
propaganda de Sergipe, é o mapa. Vocês vejam que tem que levar para inte-
rior o investimento.
Aqui é o mapa da cultura, eu já falei.
Aqui são os museus; Sergipe praticamente não tinha museu, agora tem.
E terceiro e último cenário. Eu estava no possível, agora é o desejado.
O desejado é o mais difícil, Nicolle, de conseguir. Por quê? Porque depen-
de de esforço de planejamento e cooperação, mais difícil do que planejar é
cooperação para executar. A palavra mágica; onde eu vou estou parecendo
aquelas missionárias de igreja, onde eu vou eu estou falando “cooperação”,
475RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
“cooperação” e “cooperação”, e o que eu mais gostei de ouvir hoje foi Tânia
que falou: cooperação, cooperação e cooperação. É isso. Primeiro, estrutu-
rar e qualificar uma rede de planejamento a partir de uma rede de cidades.
A gente está pegando cada território de Sergipe e trabalhando três tipos de
centralidade urbana. O tipo um, que é tipo uma cidade-polo regional que já
tem um distrito industrial ou universidade, alguma coisa que seja um atra-
tivo; a centralidade tipo dois, a cidade tipo dois, que é uma intermediária, e
a centralidade tipo três, que são aqueles municipiozinhos mais desprepara-
dos, carentes, que não têm receita própria e tal. Para cada um desses tipos
de centralidades tem um pacote de investimento se integrando no território.
O planejamento tem que ter uma característica, não pode ser burocrático,
tem que ser um planejamento participativo, territorializado, claro, e estraté-
gico. Isso significa ter pactuação entre os entes federados e entre estado e
sociedade. Destaque: por que entre os entes federados? Não adianta fazer
um planejamento lindo em Sergipe, no território, quando bater na porta de
Brasília, quando bater na porta do BNDES, quando bater na porta do Banco
do Nordeste, aquele planejamento ser absolutamente ignorado, e as pes-
soas, as tecnoburocracias desses órgãos olharem para o deles e dizer “não,
não é isso que eu vou financiar não, é aquilo”; poxa, cara, mas eu fiz esse
trabalho inteiro aqui, está pactuado, a população está esperando; isso não
pode ser desprezado, isso tem que valer alguma coisa. É intangível, eu sei,
mas é a única salvação da lavoura que nós temos.
476
E aqui eu estou mostrando a propaganda mesmo agora. Luciano Coutinho
com mais de três mil pessoas e Déda, no dia que assinou o contrato de um
financiamento chamado Sergipe Cidades. Hoje a marca do BNDES está nos
cafundós do Judas lá de Sergipe, no povoado mais distante você tem terminal
rodoviário numa área turística, que é Canindé de São Francisco, é Xingó, você
tem a orla de Gararu, na beira do São Francisco, mas tem uma praça no povoa-
do, tem um centro de bombeiros para socorrer um território lá noutro povoa-
do, noutra cidade, quadra em povoado, e por aí vai. O Estado está chegando
onde ele nunca chegava, onde tinha que ser o pires na mão do clientelismo, a
troca de favor, deputado me dê isso senão..., isso vocês sabem como funcio-
na. Então, é assim que tem que ser. A gente teve um parceiro federal, que foi
o BNDES, que foi um interlocutor maravilhoso e oportuno. E com isso tudo, o
que eu acho que se a gente conseguir fazer a pactuação em quatro anos, tem
uma coisa muito simples, sustenta o crescimento do PIB, mantém essa distri-
buição da renda, interioriza o crescimento e forma essa rede de planejamento
participativo; em quatro anos dá para fazer isso. Agora, em dez, a gente co-
meça a mudar. A elevação da participação do Nordeste na produção e expor-
tação brasileira, elevação e distribuição mais consistente da renda, não com
base em Bolsa Família, mas com base nos arranjos produtivos, diversificação
da produção, economia verde, por exemplo, diversificação dos mercados para
exportar e comercializar, e o fluxo intra e interregional.
Eu não sei se vocês já viram, existe um instrumento de economia que
ninguém gosta de falar, mas ele é importantíssimo, e os países ricos usam
477RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
tal planejamento, que é a matriz de insumo-produto; ela relaciona compras
e vendas, quem compra de quem, por setores e por espaço geográfico se
quiser. Aqui é o resultado final da matriz de insumo-produto. Foi feita para o
Nordeste pelo Banco do Nordeste, minhas homenagens aqui para quem fez
isso porque é de um valor maravilhoso, e se vocês olharem bem, eu não te-
nho como ficar apontando aqui, mas vocês estão vendo quatro quadrantes,
onde está bem cheio é o Nordeste/Nordeste ou Brasil/Brasil. Onde está bem
vazio, lá em cima, é o Nordeste vendendo para o Brasil, ou seja, muito pouco.
E onde está na média, mais ou menos cheio, cheio de montanhazinhas, é o
Nordeste comprando do Brasil. Deu para entender agora, não é? Os econo-
mistas, os planejadores, têm que abrir essa matriz e trabalhar as cadeias
produtivas a partir daí, onde é que eu tenho que fazer, que indústria, que
coisa eu tenho que fazer para adensar e o Brasil começar a comprar do Nor-
deste também. A Bahia é a economia, professora Tânia, mais aberta para as
relações para os fluxos com o Brasil, ela está em quase 20% de trocas com
o Brasil, para o próprio Nordeste está pouco, está quase 3%. Vocês estão
vendo pela grossura ali das linhas, como a Bahia vende para o Nordeste,
mas ela está mais aberta ainda para o Brasil. Olha o Ceará, o Ceará já está
com quase 6% de vendas para o próprio Nordeste. E olha Pernambuco, que
é o campeão de atendimento ao mercado regional nordestino com mais de
7%. Então, eu diria que a economia da Bahia hoje está aberta para o Brasil, a
de Pernambuco está atendendo o Nordeste, e a do Ceará está no meio, está
para escolher para que lado ela vai. São as três mais pujantes economias da
478
região. Por que ninguém mostra isso? Os políticos têm que conhecer isso, os
políticos têm que trabalhar com isso para formular suas propostas também.
Não somos só os acadêmicos que tem que ter acesso a essas coisas, isso
também é democratização da ciência. O cientista não pode estar calado
guardando as suas coisas não, tem que trazer para o político usar, porque o
político é o que nos representa na democracia, merece todo o suporte e todo
apoio para que ele tome a decisão certa e pactue certo.
E, em vinte anos, aí a visão estratégica de longo prazo regional e local, aí
nós chegaremos a ter rede social de cooperação, nós vamos ter esse povaréu
todo nessas universidades e nas escolas técnicas, com conhecimento técnico
capaz de se adaptar a mudanças econômicas e ambientais, e nós vamos ter
o fim do clientelismo, a cidadania republicana, as novas instituições a que eu
me referi o tempo todo. Aí a pergunta, que o vício de secretário de estado é ser
prático, porque a gente trabalha, trabalha, e o governador pergunta, “sim, e aí,
vai fazer como? Está muito boa a sua história, e aí?”. Aí eu não tenho bola de
cristal, nem todas as respostas, mas uma pequena sugestão: existe um conse-
lho de desenvolvimento econômico social para o Brasil, CDES, Tânia faz par-
te, que Lula criou lá atrás e que ajudou muito nas formulações estratégicas
até do PAC, de tudo isso. Por que nós não criamos um CDES Nordeste que os
empresários, academia, todo mundo tenha assento. O fórum de governadores,
que começou a acontecer em 2007, não pode ser perdida essa instância. E a
SUDENE? Também não tem motivo para se desprezar, eu acho que tem que
revigorar a SUDENE com esse CDES regional, que seja o seu conselho, diga-
479RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
mos, consultivo, e o fórum dos governadores seja secretariado pela SUDENE,
digamos assim, formando a rede de planejamento. A grande responsabilidade
da SUDENE era formar essa rede de planejamento, ela tinha que virar uma
universidade, se é que você me entende, Tânia, universidade do setor público,
uma enapezinha regional, e que ela forme técnicos de prefeituras, técnicos do
estado, para trabalhar com esse método. Agora, a estratégia não é o técnico
quem dá, a estratégia é o político, o empresário, todo mundo lá no conselho
de desenvolvimento, e é o fórum dos governadores, porque afinal, eles são
eleitos para isso. E, finalmente, os bancos federais. E o Orçamento Geral da
União não pode mais ser assim aleatório. Depois de feito todo esse trabalho,
todo esse plano, você tem que financiar aquilo que o Nordeste escolheu, e
ponto. Isso dá credibilidade ao processo, porque se todo mundo se reunir e, no
fim, for financiar um projeto que não passou por lá, então você diz, para que
eu fui? E resolutividade, que é um termo da saúde, os médicos usam; resolu-
tividade é o seguinte, você está com febre, entrou num posto de saúde, você
tem que sair sem a febre; está com dor, você tem que sair sem a dor; é reso-
lutividade, se tiver médico na plateia até me ajude depois. E com isso eu faço
uma homenagem à cultura sergipana, aos Parafusos que ontem estavam lá na
Conferência Estadual das Cidades, celebrando conosco mais um espaço de
convivência democrática. Muito obrigado e desculpe ter passado do horário.
Firmo de Castro: Agradecendo a contribuição da dra. Lúcia Falcón, vamos
de imediato passar a palavra aqui ao representante do BNDES, dr. Paulo
480
Ferraz Guimarães, que aqui representa o presidente Luciano Coutinho. Nós
gostaríamos de lembrar por sua contribuição ao Integra Brasil, pessoal, na
medida em que já participou de dois dos nossos eventos, um realizado em
Recife e outro realizado no próprio Rio de Janeiro, onde o BNDES, mais do
que participar, nos ajudou a programar e assumiu toda a responsabilidade
pela própria operacionalização daquele evento. E aqui vale registrar o apoio
do BNDES através da professora Helena Lastres e do Walsey Magalhães,
que, desde o primeiro momento, se integraram à coordenação do Integra
Brasil e têm colaborado e contribuído para que se torne uma iniciativa de
sucesso. Com a palavra o dr. Paulo, que é representante regional do BNDES
e tem também, desde o primeiro momento, acompanhado o Integra Brasil.
Paulo Guimarães: Muito boa tarde todos e a todas. Queria iniciar agrade-
cendo o convite ao Banco para participar desse importante painel, reforçar
as palavras do Firmo, do apoio do Banco, desde, o início do movimento, ao
programa Integra Brasil, o Banco participou de todas as últimas etapas, o
workshop aqui em Fortaleza há cerca de um mês e meio atrás, fomos a Sal-
vador, Campina Grande, Recife e estivemos semana passada no Rio de Ja-
neiro. Recife e Rio tiveram a presença do presidente da Instituição.
Primeiro, iniciar dizendo que falar num painel com esse tema, “Uma Es-
tratégia Para o Desenvolvimento do Nordeste”, ladeado da professora Tânia
Bacelar, da professora Lúcia Falcón e do professor Magalhães, como diz o
nordestino, “pense num desafio”. Mas, eu procurei (amanhã, dia 30, estou
481RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
completando seis anos que estou chefiando o departamento Nordeste do
BNDES, num instante passou, não é?), procurei trazer aqui uma apresenta-
ção baseada em dois momentos: primeiro, um destaque focado na atuação
do Banco recentemente na região Nordeste; e um segundo momento, mais
provocativo, de um observador de certa forma privilegiado desses movimen-
tos recentes, para a gente pensar junto uma estratégia de desenvolvimento
regional. Quero dizer logo de início que não combinei nada, nem com a pro-
fessora Tânia, nem com a professora Lúcia, mas existe uma convergência
aqui relevante de ideias.
Então, para iniciar eu queria destacar o movimento recente do Banco na
região. Os números já apresentam por si só uma mudança relevante de pa-
tamar do Banco na região Nordeste. O Banco tinha aproximadamente há
cinco, seis anos atrás, um patamar de desembolso regional que girava na
casa entre cinco e sete bilhões de reais, com b de bola. Esse patamar supe-
ra hoje os vinte bi; isso aconteceu desde 2009, foi reforçado em 2010, 2011,
e ainda mais em 2012, e a perspectiva desse ano se repete. O último dado,
o mais recente, de janeiro a junho de 2013, revela o desembolso de R$ 11,6
bilhões. Ou seja, a perspectiva é que a gente novamente ultrapasse os vinte
bi. Vocês podem perceber no somatório, 2002-2008, que o banco desembol-
sou trinta e um bilhões na região. De 2009 a 2013, já noventa bilhões. Então,
realmente é uma mudança de patamar já constatada aqui em todos os de-
bates, o crescimento da Região, da presença de novos projetos, da presen-
ça de investimentos estruturantes, enfim, é uma mudança recente, é uma
482
mudança de ritmo de desembolso também no caso dos financiamentos. O
mesmo comportamento ocorreu com o número de operações; esse dado
para mim é até mais relevante do que o desembolso, porque poderia ocor-
rer uma elevação de desembolso concentrada em alguns grandes projetos,
como ocorreu, mas percebe-se também a evolução do número de operações
que se aproxima do número de empresas atendidas. Em 2008, percebam que
era aproximadamente dezenove mil operações realizadas pelo BNDES, nós
chegamos em 2012 com cento e quarenta e sete mil operações, aproxima-
damente, e devemos repetir ou, talvez ultrapassar esse dado. Perceba no
cálculo acima que é um crescimento, talvez pela característica do tecido
produtivo, de um evolução em taxas até superiores à nacional. Então, esse
número, eu digo que ele é mais significativo porque indica uma pulverização
maior do crédito na Região, uma possibilidade de chegar inclusive às empre-
sas de menor porte. Esse movimento fez com que o Banco ganhasse uma
participação relativa significativa. O BNDES tinha em 2008 aproximadamen-
te 8% do seu desembolso para a região Nordeste, ou seja, muito aquém do
que a economia representa regionalmente; em 2012, conseguimos alcançar
aí pelo menos o que representa o PIB nordestino no PIB nacional. É bom? É,
e sem ressaltar que esse movimento de ganho de aproximadamente cinco
pontos percentuais foi num cenário onde o desembolso nacional do BNDES
saiu de noventa bilhões para cento e sessenta bilhões de reais. Ou seja, é
um crescimento relativo dentro de um volume expressivo de crescimento do
desembolso nacional. Basicamente, quando a gente fala em números des-
483RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
sa magnitude, a gente percebe que projetos de maior envergadura é que
nos dá, pelo menos em números absolutos, números de valores em reais,
a possibilidade de aumento de participação, e foi isso que a gente mapeou
recentemente, sendo já mencionado aqui pela professora Tânia e pela pro-
fessora Lúcia, e por outros painéis, de novos investimentos localizados na
região Nordeste.
Eu queria, antes de ir para a próxima lâmina, fazer a primeira provocação
de um observador recente desse movimento e deixar uma interrogação no
ar. Perguntar o que vocês acham de qual foi a influência da atuação do BN-
DES em toda essa evolução, ou seja, qual é o poder que o Banco tem hoje de
atuar de forma que melhore a sua participação regional? Mais na frente, eu
vou tentar elaborar essa pergunta e tentar responder, vou ajudar a raciocinar
com vocês sobre esse tipo de movimento.
O Banco não só apoia o setor produtivo de empresas privadas, mas tam-
bém tem uma atuação, mostrada aqui pela professora Lúcia Falcón, apoian-
do os governos estaduais. Esse é o mais recente programa de investimento
dos governos de estado. O Proinvest tem um orçamento de vinte bilhões de
reais, dos quais 7,5% foram destinados a estados do Nordeste, conforme o
somatório aí apresentado. Dito isso, eu encerro a parte de grandes números
de atuação do BNDES na Região. Ou seja, uma evolução crescente, signifi-
cativa, uma mudança de patamar, que se deu a partir da presença de proje-
tos estruturantes, projetos de relevância, como colocado no mapa anterior,
também na presença do financiamento para pequenas e microempresas.
484
Essa é uma situação econômica nacional, mas que regionalmente também
foi efetiva. Enfim, esse é o retrato recente do Banco na região.
Então, vamos para algumas tentativas de provocações ou estratégias
que a gente percebe mais recentes do desenvolvimento regional. O quadro
de perspectivas e desafios que a gente percebeu nesses últimos dez anos.
Uma mudança no ritmo do padrão de crescimento da Região, uma elevação
do patamar do volume de financiamento. Queria ressaltar para os senhores
que o somatório em 2012 da participação do BNDES, somadas ao Banco
do Nordeste na Região, foi de aproximadamente quarenta e três bilhões de
reais. É importante ressalvar que não existe a intercessão entre os dois pon-
tos de financiamento atualmente, é muito reduzida, está aqui o Fernando
que depois pode até ajudar no debate. Mas, desses quarenta e três bilhões,
a intercessão, acredito eu, que está na casa dos cem, duzentos milhões,
pouca coisa de intercessão entre essas duas contas, então são realmente
financiamentos que se somam na Região. A melhoria expressiva no quadro
social, embora os indicadores aqui já apresentados, de renda e de produti-
vidade sejam inferiores, e aí eu trago uma observação do professor Leonar-
do Guimarães, num debate no Rio de Janeiro, quando apresentou dados de
produtividade e ressaltou que a produtividade do Nordeste é quase 50% da
brasileira. A população nordestina possui uma baixa qualificação e é mal
remunerada, e a conclusão dele é que o avanço foi grande, mas ainda falta
muito. Expressivo crescimento de segmentos ligados a consumo e constru-
ção civil, já debatido também nesse evento. E o último item, que eu queria
485RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
me deter a ele, investimentos em projetos estruturantes com destaque para
petroquímica, naval, siderurgia, ferrovia, refinaria, celulose, automobilísti-
ca, geração de energia, novos segmentos industriais. Eu queria me deter aí
exatamente para tentar responder com vocês aquela pergunta lá do começo.
Eu acredito, professora Lúcia, que o Banco tem um carimbo muito forte,
um orçamento poderoso, ou seja, é um senhor canhão, mas é necessário que
se tenha estratégia regional, é necessário que se tenha uma visão estratégi-
ca na região. O vazio apresentado aqui dos órgãos regionais pela professora
Tânia Bacelar é muito ruim para o BNDES. A nossa atuação pode ser não
só aqui em volume, mas em qualidade melhorada, se a gente tiver um plano,
tiver um olhar de longo prazo, se a gente tiver condições de apoiar ainda
mais projetos bem elaborados, com visão de longo prazo, vindos da própria
Região e trabalhando as competitividades locais; é possível o Banco apoiar.
Foi muito feliz a professora Lúcia ao falar anteriormente e mostrar o projeto
do Sergipe Cidades, esse foi um exemplo de possibilidade de planejamento,
de apoio do BNDES, foi um projeto que a gente chama no departamento
Nordeste de emblemático: nós começamos a dialogar sobre ele, professora
Lúcia, em 2008, e eu lembro que, nesse período, na agenda do planejamento
participativo de Sergipe, eu fiz uma visita provocada aqui pela professora
Tânia, na época que eu cheguei no departamento Nordeste. Ela falou: “dá
uma ligadinha para a Lúcia Falcón lá em Sergipe, que eu acho que ali tem
um jogo bonito”. Nós fizemos uma visita a Sergipe, assim que eu cheguei eu
participei de uma dos eventos finais dos delegados regionais na agenda do
486
planejamento participativo; cheguei lá estava Lúcia de boné e tinha mais ou
menos umas três a quatro mil pessoas reunidas. Eu estava brincando com a
professora Tânia aqui, dizendo, na época, eu olhei assim e disse olha eu não
sei se vai dar certo, mas que é divertido, é divertido. A partir dali, a gente
começou um diálogo com um planejamento de um projeto que a própria se-
cretária apresentou à equipe técnica do Banco e iniciou dizendo o seguinte:
“a gente quer apoiar de Aracaju para o interior. Aracaju não vai entrar para
esse plano, porque Aracaju tem outras possibilidades, tem outras fontes,
tem outras condições. E a gente quer apoiar esse tipo de estrutura”. E apre-
sentou aqueles mapas que os senhores viram. A equipe técnica do Banco
quase que enlouquece. O BNDES não tinha tradição de chegar a tantos lu-
gares distantes e pequeninos, no caso de Sergipe nem tão distante. Mas, en-
fim, não foi fácil, o diálogo foi complicado, porque a análise não estava acos-
tumada a isso, mas o que nós recebemos foi um projeto com o planejamento
a partir de escolhas do Estado, escolhas da população, e que puderam trazer
elementos de melhoria de condições de vida e de competitividade naquele
estado. A partir daí, a gente começou a dialogar, com muita dificuldade foi
aprovado, e o resultado foi apresentado aqui rapidamente pela professora
Lúcia. Foi perfeito? Não. Temos que avançar ainda? Temos, sim. Mas foi dado
um horizonte, planejamento de longo prazo, uma visão estratégica escolhida
pelo Estado.
Então, reportando aquela pergunta que eu fiz, o que eu queria dizer era
isso: o Banco tem uma atuação, é possível ser proativo, mas ele não é exa-
487RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
tamente o mandatário das escolhas estratégicas da Região. Eu acho que a
lâmina que a professora Lúcia colocou, do conselho do desenvolvimento,
tem um item final que é fantástico; a partir do conselho do desenvolvimento,
da atuação de órgãos regionais, os bancos e OGU financiam os projetos, é
possível, sim. É evidente que, como já foi destacado aqui anteriormente em
outros painéis, (o professor Avena, por exemplo, falou da lógica bancária e
ele tem razão, e alguns projetos que de imediato não tem viabilidade, e existe
essa lógica bancária), eu queria lembrar aos senhores que, tanto no caso do
BNDES como do BNB, nós somos banco, nós temos uma série de critérios
definidos desde Basiléia até Banco Central, órgãos reguladores, que nos dão
o famoso marco regulatório que rege a nossa atuação. Mas existe a possi-
bilidade de a gente trabalhar junto numa estratégia regional e fazer com
que esses quarenta e três bilhões não só aumentem, como atinjam o que
a Região escolheu, lembrando aos senhores que aqueles projetos recentes
que eu mostrei ali no mapa, o grau de influência do Banco em termos das
escolhas ou, pelo menos, do apoio, ele existe de um diálogo, ele existe de
um território onde vai se localizar; do ponto de vista ambiental o banco faz
suas exigências, tem suas regras. Mas, enfim, eu vou dar um exemplo aqui
que eu pesquisei hoje. Nós temos um estado, Estado do Maranhão, que, nos
últimos dois anos, vem-se destacando fortemente no desembolso regional.
Eu vou dar os números de janeiro a julho de 2013; no ano passado, janeiro a
julho de 2012, o Maranhão recebeu quinhentos e quarenta e quatro milhões
do BNDES, esse ano um bi, novecentos e cinquenta e sete, faltaram três
488
milhões para completar dois bilhões de reais. E eu pedi ontem que nossa
equipe em Recife pesquisasse quais são as motivações. E eu só vou dar dois
nomes, professora Lúcia: Vale e Suzano. Aí eu repeti a pergunta, a escolha
locacional foi por conta da possibilidade de financiamento ou taxa negocia-
da com o BNDES? Não. Agora, é possível o Banco desenhar numa região
estratégias para que esse tipo de investimento tenha localização no Nor-
deste, mas tenha um diálogo local com uma camada produtiva que possa
ser fornecedora, que participe da política que o Banco hoje tenta dialogar
em torno de grandes projetos, verificando que municípios estão recebendo,
como é que esses municípios têm sua gestão e sua estrutura, como é que a
comunidade local vai se inserir no projeto, como é que indústria local vai ser
fornecedora desses grandes players. É possível sim, eu acho que o Banco
junto com as autoridades locais, pode elaborar planos de desenvolvimento
no entorno desses grandes projetos que eu mencionei anteriormente, para
que eles não sejam apenas enclaves com diálogo com o Sudeste do país ou
até mesmo com o exterior. Nós estamos falando aqui, nesse caso, desses
dois grandes projetos no Maranhão, no que a professora Tânia colocou an-
teriormente, commodities, minério e celulose. Eles vão ter diálogo só com
exterior? Tudo bem. Vão ser para exportação? Está bom. A gente vai agregar
valor, a gente vai fazer com que a indústria local participe desse processo?
São algumas perguntas que eu deixo aqui para nossa discussão.
E aí, colocando o olhar para o futuro, em termos de desafios, eu queria re-
forçar algumas coisas já mencionadas aqui pela professora Tânia. Primeiro,
489RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
a tendência de aumento da desigualdade econômica intrarregional; a gente
sempre olha da região para o resto do país, mas às vezes esquece de olhar
internamente como é que estamos com o nosso vizinho. Se a gente olhar os
próprios dados do BNDES ou os dados do valor da transformação industrial,
nós estamos aí destacando quatro estados, no caso do Banco, que concen-
tram aproximadamente 75% do desembolso do BNDES, e o VTI está eviden-
temente concentrado nos três grandes, na ordem, Bahia, Pernambuco e
Ceará. O segundo ponto é a baixa ou pouca capacidade de gestão e de inves-
timento dos municípios-sede e adjacentes dos grandes projetos. Eu chamei
atenção para os sedes e adjacentes, Lúcia, mas esse é um quadro nacional,
mas que regionalmente é muito desafiante. O Banco tem-se deparado com
uma localização de grandes projetos financiados pelo BNDES, em localida-
des que não têm capacidade de gestão para dar condições àquele volume de
investimento e àquela velocidade que na maioria dos investimentos privados
é muito maior do que o setor público, que são os casos de Suape, são os
casos de Pecém, são os casos de Goiana com a chegada da Fiat, colocado
por professora Tânia. Goiana tem sessenta mil habitantes, setenta mil ha-
bitantes, aproximadamente, para receber investimento da Fiat da ordem de
quatro, cinco bilhões de reais, com mais um bilhão e meio de sistemistas;
vai mudar a realidade daquela cidade, e o município não só de Goiana, como
do entorno, não tem nenhum tipo de capacidade de planejamento urbano,
reduzindo o volume dos investimentos relacionados à cadeia produtiva de
petróleo e gás a que eu não vou precisar me deter, a professora Tânia já
490
mostrou em mapas, enfim. E a necessidade de investimentos para aumento
da competitividade regional, também já apresentado pela professora Tânia,
o caso das concessões, PPP’s, e a necessidade de um fundo regional.
Eu queria me deter só neste último ponto, com algumas provocações. É
possível também se desenhar modelos em que, caso não tenha inviabilidade
imediata, quem sabe um fundo não entra em contrapartida, por exemplo,
com financiamento do BNDES ou do BNB para inviabilizar inicialmente essa
estrutura, ou a gente vai ficar aguardando até ter mercado?
Uma agenda de oportunidades. Repetir aqui o adensamento das novas ca-
deias produtivas presentes na Região, a possibilidade de que a gente tem de
que aqueles projetos lá do mapa tenham interlocução local, tenham partici-
pação local, não é possível que o estaleiro Atlântico Sul, no porto de Suape,
com vinte e cinco, trinta navios de carteira, vá comprar até os equipamentos
de implantação individual fora da Região: fardamento, bota, a gente vai com-
prar tudo de fora? Uma agenda de planejamento estadual e metropolitano,
já colocado pela professora Lúcia. A questão da rede de cidades médias é
possível o banco apoiar sim, tendo planos, tendo uma visão estratégica e uma
coordenação regional desse processo. Se possível, investimento em energia
eólica, solar, e o desenvolvimento das cadeias produtivas ali relacionadas.
Hoje, a carteira de energia eólica do BNDES na Região, acredito eu, está na
casa dos seis, sete bilhões de reais. Eu vou dar mais um exemplo, professora
Lúcia, o município de Caetité, lá no sertão baiano, e mais três no entorno, re-
ceberam um desembolso do banco em parques eólicos de 1,2 bilhão de reais;
491RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
quando é que Caetité imaginou que teria? Qual foi a margem de influência do
BNDES nisso? Eu acho que foi papai do céu que colocou um bocado de ven-
to lá. Eu não estou repetindo isso, gente, quero ressaltar, tirando o BNDES
dessa falta não, porque ele tem responsabilidade já colocada pela direção
do Banco na figura do presidente. O Banco já ressaltou, junto com o Firmo e
com a Nicolle, que nós estamos juntos; eu não o estou tirando aqui de forma
alguma, mas há que ter uma coordenação e uma visão estratégica regional
que possa nos ajudar, ajudar o Banco do Nordeste também, aqui representa-
do pelo Stélio.
Economia criativa, depois da aula da secretária Cláudia aqui, eu não vou
me atrever a fazer nenhum comentário, mas quero reforçar as palavras da
professora Tânia. Tem região mais criativa? Não tem. Nos motores atuais do
financiamento do setor criativo, o BNDES tem um departamento de cultura,
para quem não conhece o DECULT, mas, pelo modelo atual financia, restau-
ra o patrimônio histórico, financia algum tipo de produção audiovisual e teve
recentemente a possibilidade de uma parceria com o BNB para financiar,
junto com o BNB, um projeto de cultura para micro e pequenos produtores;
acho que o BNB já tinha a iniciativa, e a gente conseguiu chegar lá na ponta,
mas é possível a gente fazer um plano específico para isso.
E em relação ao Semiárido, só para fechar, antes de ir para a última lâmi-
na, eu queria ressaltar a necessidade de um plano de investimento em P&D,
com foco no Semiárido, para identificação dos seus diferenciais. Chamou-me
muita atenção no Rio de Janeiro, e fiquei muito impressionado também con-
492
versando com o dr. Carlos Prado aqui, da atuação, por exemplo, da Itaueira no
Semiárido, do dr. Carlos Prado. Tanto o dr. Carlos Prado, como o Luís da Agrí-
cola Famosa, iniciaram as suas colocações ressaltando que sol e ausência
de chuva para eles são fundamentais; eles controlam a água com irrigação, e
têm o sol que ajuda na produção de frutos. Esses dois empresários estão com
alta produtividade e com capacidade instalada no Semiárido de grande pro-
dução de frutas, exportando, enfim. Será que não é possível a gente replicar
e trazer novas tecnologias para que essa região seja favorecida?
Dito isso, eu chego à minha última lâmina. Como setembro é mês de pro-
moção do BNDES, eu tenho que citar o chefe; é brincadeira, gente, eu não
estou concorrendo a nenhum tipo de promoção. Eu tentei, Nicolle, buscar
nas palavras do presidente, tanto em Recife como no Rio de Janeiro, alguns
recados que eu considerei fundamentais. O primeiro, ele ressalta que, em-
bora o ciclo seja favorável, esse ciclo que a gente mostrou do Banco atingin-
do vinte, vinte e dois bi na Região, ele pode se esgotar e não é o suficiente
para dar conta de um projeto de longo prazo e continuidade nos avanços da
Região. Pensar os vinte anos para frente, qual a nova geração de projetos,
atividades e políticas que podemos apoiar, financiar ou induzir. É importan-
te a presença de parceiros nacionais e atores locais, já que a maioria das
vezes o Banco não é mandatário das ações em curso. A formulação de um
plano dessa envergadura não deve vir de fora para dentro. Então, eu queria
encerrar minhas colocações novamente reforçando (chamei atenção aqui
das possibilidades do BNDES em apoiar o desenvolvimento regional, cha-
493RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
mei atenção de que a ausência e o vazio de órgãos regionais é ruim para o
Banco, ruim para atuação do Banco), e ressalvar para vocês, que, de forma
alguma, eu estou aqui retirando a possibilidade de o Banco apoiar qualquer
iniciativa como essa, muito pelo contrário, repito que o Integra Brasil é uma
oportunidade para o BNDES. Acredito, Stélio, que também para o BNB, e
eu queria deixar aqui a nossa contribuição e nossa ressalva de que estamos
juntos para as novas etapas. Obrigado.
Antônio Rocha Magalhães: Muito obrigado, Firmo, um grande prazer, uma
grande honra fazer parte dessa mesa com figuras que têm uma história na
questão não só nordestina, como brasileira, mas sempre com a visão daqui,
com a visão nordestina. Eu gostaria de iniciar dizendo que estou lamentando
muito não poder ter estado aqui o tempo todo, porque eu vi realmente que
aqui aconteceram apresentações e debates do mais alto nível e contribui-
ções muito importantes para o entendimento da nossa questão nordestina,
brasileira e para as saídas que nós temos.
Estava, e estou ainda, vou retornar, em Sobral, e eu quero citar isso por-
que foi uma das prioridades, das recomendações saídas daqui, sobretudo na
apresentação da Lúcia; estava em Sobral num evento e nós trouxemos pes-
quisadores e cientistas de toda a América Latina, Caribe e alguns da Europa,
também, para debater a questão de ciência e tecnologia sobre Semiárido,
sobre desertificação na América Latina e Caribe. Com essa preocupação de
tirar resultado das coisas, nós conseguimos que esse grupo de pessoas lan-
494
çasse um programa chamado ÁRIDAS LAC. Depois eu vou falar um pouco
do ÁRIDAS na minha apresentação, mas chamou-se de ÁRIDAS LAC por-
que é uma tentativa exatamente de se construir uma rede de pesquisadores
na América Latina e Caribe, para se conhecer melhor o problema das terras
secas na nossa Região: a quantificação, as diferenças e as alternativas que
existem ou que têm sido praticadas, e também as lições que podem ser in-
tercambiadas. E esse é um programa que vai ser coordenado pela CEPAL e
que contará com uma participação aberta, várias instituições aderiram na
hora, do Brasil, da América Latina, e esperamos levar isso à frente. O evento
lá continua amanhã, eu estou voltando ainda para Sobral, para o calorzinho
de Sobral. Como disse o prefeito, lá não é quente, quente é o sol, a cidade é
calorosa, calorosa em todos os sentidos. Mas, o que eu achei interessante é
uma cidade, um município que encontrou uma saída de dinamismo econô-
mico que não depende da precipitação. Mesmo com dois anos de seca, a ci-
dade continua sendo economicamente um lugar exuberante, com muito em-
prego, com muitas pessoas trabalhando, isso significa que 90% da atividade
econômica acontece na zona urbana, embora tenha uma grande zona rural.
Quer dizer, permanece também a questão do Semiárido, a questão da zona
rural; nós vamos voltar a isso também no decorrer da minha apresentação.
Uma segunda coisa que eu também gostaria de dizer no início é que eu
quero saudar o trabalho do CIC, o Centro Industrial Cearense, e da FIEC,
Federação das Indústrias do setor privado cearense, mas regional, por esta
iniciativa e pela história. Nós sabemos que o que está acontecendo aqui é
495RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
a retomada de uma tradição do CIC, que num certo momento conseguiu,
inclusive, transformações políticas de grande importância para este Estado,
transformações políticas essas que repercutiram em vários outros estados,
em várias outras instituições e permitiram o acontecimento de transforma-
ções importantes na administração pública e na sociedade do Estado do
Ceará. Então, eu saúdo esse trabalho do CIC e digo que estou muito feliz por
vê-lo sendo retomado e, uma vez retomado, desejando que ele continue por-
que esse também é um assunto que pretendo desenvolver um pouco mais na
frente, porque a questão da continuidade é uma questão fundamental. O CIC
tem ajudado na mobilização de atores da sociedade civil, do setor privado,
e esse é um trabalho muito importante, que tem sido feito também em ou-
tras instâncias. Aqui no Ceará, por exemplo, nos últimos anos, a Assembleia
Legislativa liderou um processo, produziu o Pacto das Águas, os estudos
para o Pacto do Semiárido, então experiências semelhantes aconteceram
em outros estados, eu fiquei muito feliz de ver o que está acontecendo em
Sergipe, e então temos que apoiar, incentivar e fazer com que essas expe-
riências tenham uma continuidade. Nós temos que repensar continuamente
os desafios e potencialidades para o desenvolvimento da nossa região. Não
podemos fazer um evento, e parar, fazer uma pesquisa, e parar, pensar numa
atividade qualquer, e parar. A questão é como realmente manter a mobiliza-
ção, isso é uma questão fundamental que vai ter repercussão também em
algo que teremos que discutir um pouco mais na frente, sobre a questão da
496
institucionalização, institucionalização da sociedade para o planejamento,
para a construção de visão do futuro e assim por diante.
Eu gostaria também de dizer que é fundamental a produção de novos co-
nhecimentos. Nós temos visto, às vezes, discutindo as questões do Nordes-
te, do Brasil, nós nos deparamos com afirmações que fazem sentido de cer-
ta forma, afirmações do tipo “nós já sabemos o que fazer, não precisa mais
estudar, é só mandar o dinheiro que a gente faz”. Ora, se isso fosse verdade
não haveria pesquisa nos países desenvolvidos, não haveria mais ciência,
não precisaria, eles sabem mais, têm muito mais informações do que nós
temos. Então, essa atividade de disseminação do conhecimento precisa ser
reforçada e precisa ser incentivada o tempo todo, até mesmo porque se não
houver essa continuidade, o conhecimento é esquecido, muitas vezes você
tem uma experiência que é de sucesso ou não é de sucesso, e daqui a pouco
ninguém se lembra mais e daqui a alguns anos alguém vai e repete os mes-
mos erros. Então, é preciso que haja a contínua criação de conhecimento e
divulgação de novas informações e, ao lado disso, a construção de visões
compartilhadas. Eu creio que o que vimos aqui, nas apresentações da Tânia,
da Lúcia, do Paulo, são apresentações muito ricas, até que alguns pontos
emocionam a gente que está nisso. Mas é isso mesmo, por que a gente não
faz? Por que começa a fazer e não continua? Então, temos que pensar o que
é necessário fazer para que essas coisas se tornem realidade. E eu penso
que uma delas é essa questão de encontrar uma forma de ter continuidade
nisso tudo, mas a outra é de compartilhar isso, de ter visões compartilha-
497RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
das, com compromissos por todos os atores que são importantes, do setor
público, do setor privado, da sociedade civil, e assim por diante. E, nesse
contexto, precisamos também rediscutir a questão de certos dogmas, de
soluções simplistas, visões parciais. Não é muito comum nas discussões al-
guém chegar e dizer “olha, só precisa fazer isso e pronto, nós resolvemos o
problema”, nós temos que reconhecer que é complexo; se não fosse comple-
xo, já estaria resolvido, com certeza, porque alguém já teve alguma ideia e já
tentou. A questão do desenvolvimento do Nordeste e do estado não é uma
questão simples, é uma questão complexa e por isso exige que a gente una
esforços e associe o conhecimento o tempo todo.
O segundo ponto que eu gostaria de discutir, já que o nome do nosso even-
to é Integra Brasil, eu gostaria de discutir um pouco a questão da integração
do Nordeste no Brasil e o que isso pode significar. De um lado a gente sabe
que o processo de integração já existe, o Nordeste é completamente integra-
do, não existem barreiras tributárias, desde a década de 50 temos a ligação
rodoviária, transportes, e quando a SUDENE começou com o sistema de in-
centivos à industrialização, havia muitas críticas dos economistas, dizendo
que estávamos repetindo aqui no Nordeste o modelo do Brasil de substitui-
ção de importações, que o Nordeste estaria substituindo importações do Sul
e isso era uma crítica totalmente infundada. Houve uma pesquisa do Banco
do Nordeste no final dos anos 80, onde ficou claramente que a indústria do
Nordeste era uma indústria totalmente aberta e continua sendo aberta. É
uma indústria que se tiver oportunidade, não tem nenhuma barreira para ex-
498
portar para o resto do país ou para o exterior, e assim por diante. Ela precisa
competir nacionalmente, senão ela não sobrevive. Então, esse processo de
integração que aconteceu, a integração econômica, a integração de merca-
dos, ele teve muitos significados porque, de um lado, essa integração cria um
incentivo para aumentar a produtividade aqui na Região, que é uma questão
fundamental; sem produtividade não tem crescimento econômico. Mas, por
outro lado, destrói atividades de baixa produtividade aqui, isso nós sentimos,
por exemplo, nas cidades do interior. Aqueles de nós, que vieram de cidades
do interior, lembram que, nem todo mundo é tão velho assim para se lembrar,
mas eu lembro que se conseguia numa cidade do interior adquirir todas as
suas necessidades de sobrevivência com produtos feitos localmente. A in-
dústria de farinha, a produção de grãos, doces etc. Hoje não, se a gente vai
numa feira de qualquer município do interior ou no comércio, os produtos
importados estão lá da mesma forma. Então, isso levou a uma transforma-
ção muito grande na economia local e à destruição de muitas atividades de
baixa produtividade. Não quero dizer, de forma nenhuma, que isso é uma coi-
sa ruim, claro é ruim para quem perdeu o emprego, para quem perdeu suas
oportunidades, mas é uma parte normal do processo de desenvolvimento.
Apesar dessa integração, as desigualdades econômicas persistem e já
foi mencionado aqui. Desde quando se começou a medir isso, na década de
30 do século passado, a participação do PIB do Nordeste e no PIB Brasileiro
não tem variado muito. Com todo o processo de políticas de desenvolvimen-
to, a partir do Banco do Nordeste, a partir da SUDENE na década de 50, e
499RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
o que veio depois com os incentivos fiscais, com a modernização industrial,
com tudo que aconteceu, a participação econômica do PIB do Nordeste no
do Brasil não variou muita coisa, continua 13%-14%. Então, por que isso?
Quer dizer, de um lado mostra o fracasso das políticas, talvez, mas, de ou-
tro lado, mostra que o Nordeste cresceu da década de 30 para agora, são
oitenta anos, no mesmo nível pelo menos do Brasil; continua crescendo, não
é que não tenha crescido, continua crescendo e, de certa forma, o cresci-
mento do Nordeste é um pouco anticíclico, quando o Brasil cresce muito
pouco, o Nordeste está crescendo um pouco acima, quando o Brasil cresce
mais rápido, por alguma razão o Nordeste cresce um pouco abaixo, mas,
na média, tem mantido a participação. Então, não quer dizer que não tenha
crescido, continua crescendo, mas precisaria crescer muito mais rápido do
que cresce o Brasil para que essa desigualdade econômica se reduzisse. Ao
lado disso, as desigualdades sociais, que são as que nos preocupam mais, e
nessas nós temos visto alguma mudança nos últimos anos, pelo menos, em
educação, saúde, no IDH, como já foi também mencionado aqui. Também já
foi mencionado, nós falamos muito em desigualdades interregionais, mas já
foi bastante debatido; não vou aprofundar a questão das desigualdades in-
ternas, o meio rural em relação ao meio urbano, as três metrópoles da região
versus o restante do território do Semiárido.
E uma coisa, em particular, que nós devemos nos perguntar muito é qual
a estratégia para o município típico do meio rural nordestino, do Semiárido?
Por exemplo, aparentemente Sobral, onde eu estava, encontrou uma voca-
500
ção, é uma cidade industrial, tem muito emprego industrial, emprega não
só a população da cidade como a dos municípios vizinhos, e esse modelo
aqui no Ceará, por exemplo, tentou se levar a outros municípios, através do
sistema de incentivos estaduais, mas ele não se aplica a todos os municí-
pios, ele acaba beneficiando um conjunto pequeno e, em alguns casos, com
iniciativas que não dão certo. Na prática, a maioria dos municípios do Se-
miárido não tem uma base econômica, depende de uma agricultura que está
desestruturada, como a professora Tânia falou no início, quer dizer, desde a
derrocada do algodão a estrutura produtiva que tinha uma certa consistên-
cia, que tinha uma certa continuidade, aquele arranjo boi, algodão e feijão,
milho, etc., ela foi destruída, porque o que garantia uma certa segurança
monetária era o algodão, mas ao nível de produtividade muito baixo, quer
dizer, aquele modelo também não servia, assim do ponto de vista de desen-
volvimento. Então, de que integração nós estamos falando? Achamos que a
integração de mercado já existe, nós não temos nenhuma barreira, se tiver
uma oportunidade, mas o que nos preocupa realmente é a integração social
(nossa região continua abrigando a maior parte da pobreza do Brasil), que
forma a nossa pobreza e que, em parte, exporta também essa pobreza para
o resto do País. Se a gente vai na periferia de Brasília, na periferia de São
Paulo, do Rio de Janeiro, vai nos bairros mais pobres, nas favelas, está lá, a
gente encontra a origem: o meio rural do Nordeste. Então, essa é uma ques-
tão importante, nós temos que nos preocupar nessa questão da criação de
oportunidades para as pessoas mais pobres. As desigualdades sociais e, so-
501RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
bretudo, a questão do acesso a oportunidades; quer dizer, a pessoa do Nor-
deste, do interior, não tem as mesmas oportunidades que tem uma pessoa
que está em Brasília, que está em São Paulo. Então, como melhorar o acesso
da população às oportunidades de crescimento, de realização?
Eu já mencionei que, ao longo desse tempo, o Nordeste não se estagnou,
ele continuou crescendo, mas que precisaria crescer mais rápido do que o
Brasil, e aí nós teríamos que começar a pensar em estratégias, quer dizer,
como construir vontade política, o arranjo político necessário para que se
possa fazer no Nordeste grandes coisas, grandes estratégias, grandes in-
vestimentos. Não é só manter ou fazer uma coisa que está pressionando na
hora. Se queremos crescer mais do que o Brasil, nós temos que, efetivamen-
te, tentar induzir grandes decisões. Dessa discussão, por exemplo, a gente
pode concluir que as desigualdades econômicas continuam e, efetivamente,
nós temos um desafio muito grande para superá-las, mesmo que se faça um
grande esforço, talvez consiga melhorar de alguma forma, mas nós temos
que reconhecer que vimos um dado aqui, que é a produtividade média do
Nordeste, a metade da produtividade na região Sudeste do País, então há um
problema de competitividade que tem a ver com a base de recursos que tem
a Região, com a base de recursos naturais, recursos humanos, investimen-
tos e assim por diante. Então, é muito difícil mexer nessa parte, no entanto, o
que nos preocupa muito, que são as desigualdades sociais, eu creio que elas
não dependem, elas podem ser eliminadas ainda que persistam as desigual-
dades econômicas. Se o Nordeste continua a crescer igual ao Brasil, e se faz
502
esforço para crescer um pouco mais e realizar investimentos importantes,
ainda assim as desigualdades sociais poderão ser eliminadas, como já vem
diminuindo, mas é preciso fazer um esforço maior nesse sentido.
Então, o Nordeste não é mais o mesmo, já há mais integração, mas preci-
samos saber o efeito disso. Nós sabemos que a integração induz aumento da
produtividade, induz transformação econômica, abre novas oportunidades,
porém ela destrói atividades locais e baixa a produtividade como já falamos
aqui. E, nesse contexto, a integração pode ter um primeiro efeito de gerar
desemprego. E, se não há oportunidades, isso pode ser um efeito permanen-
te que vai forçar a população a migrar, como ela faz, é uma estratégia, que é
exatamente mudar de lugar. Aí tem duas coisas, se a pessoa que migra teve
a oportunidade de se capacitar ou tem recursos, migra para estudar ou coisa
assim, é uma coisa, mas se migra em busca de oportunidades sem ter ne-
nhuma especialização, então isso vai engrossar a pobreza de outras regiões
ou das cidades da nossa região.
Outra coisa que eu queria mencionar é que a Tânia já deu o primeiro
toque quando falou sobre a questão da destruição do sistema da agricul-
tura tradicional. É que a sociedade também não é mais a mesma, nem a
sociedade urbana, mas, sobretudo, a sociedade rural. Nós às vezes ainda
ouvimos o discurso, aquele discurso tradicional, mas não é mais a mesma
coisa. Quer dizer, na década de 50, 60, você tinha uma sociedade no meio
rural onde as pessoas tinham uma certa proteção do dono da terra, eram
moradores, em pequenas crises tinham assistência, em grandes crises não
503RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
tinham, e tinham que sair ou morrer, enfim, aquelas histórias das secas
que estão aí. Hoje, essa situação é muito diferente; então, acabou o siste-
ma de vinculação das pessoas com os donos da terra, o sistema de mora-
dores não existe mais, o campo, de certa forma, se esvaziou, as relações de
trabalho mudaram totalmente e, de certa forma, o nível de produtividade
nas atividades tradicionais não é suficiente para bancar um sistema de re-
lações formais de trabalho. Em alguns lugares ainda permanece o sistema
de dia de trabalho, é possível, mas, em geral, não é mais suficiente. Então,
esse sistema mudou totalmente. Isso trouxe consequências políticas, por-
que, no sistema de moradores, a relação de poder do dono da terra com a
população local era total, hoje ainda existe alguma, mas não é mais como
era. Então, as pessoas estão, de certa forma, mais livres e, ao lado disso,
se criaram sindicatos rurais, formas de representação das comunidades,
então há uma complexidade na atividade política que é muito maior do que
era naquela época. Isso trouxe transformações significativas no sistema
de poder e no sistema político. Junto a isso, nós passamos a uma socie-
dade no Nordeste, no Brasil também, mais ainda, mas no Nordeste uma
sociedade que é mais urbana do que rural e onde muitos dos problemas da
zona rural foram transferidos para as cidades, para as periferias urbanas.
Qual o efeito disso no Semiárido?
Eu tenho me preocupado muito mais com o Semiárido nos últimos anos,
porque vejo essa região como o grande desafio. É claro que a questão regio-
nal como um todo é um desafio importante, mas a questão do Semiárido é
504
o desafio mais importante ainda, e nós vamos voltar a essa questão porque
aí há uma limitação concreta de recursos naturais, de solo e água, e há um
problema concreto de pressão nas atividades humanas, vários tipos de ati-
vidades humanas que têm levado à degradação de terras e à desertificação,
e que têm magnificado os impactos das crises climáticas das secas. Como
essas populações do Semiárido têm reagido a essas transformações sociais
que têm acontecido e, sobretudo, nos momentos de crises nas secas? É cla-
ro que a gente tem que reconhecer que melhoraram muito as formas de
mobilidade, de comunicação, de acesso a transportes, com todos os pro-
blemas que ainda existem, mas hoje as pessoas podem se locomover com
muito mais facilidade, e uma grande transformação, que é recente, que é
a da consolidação do sistema de proteção social no País, mas, como já foi
mencionado aqui, o sistema de proteção social que beneficia as populações
mais pobres e, portanto, as regiões mais pobres. Isso fez com que aqui, no
Nordeste, a gente passasse basicamente de um sistema de apadrinhamen-
to pelo dono da terra a um sistema de dependência dos benefícios sociais
do governo, como o Bolsa Família e aposentadoria rural. Nesse sentido, em
boa medida, o Estado substitui de uma forma mais objetiva o clientelismo
rural, o apadrinhamento rural, o que também traz transformações políticas
e sociais de grande importância, que a gente precisa entender melhor. A
gente que anda pelo interior conversando com pessoas representativas da
sociedade do interior, é voz comum dizer “olha, o governo está destruindo
as atividades econômicas porque ninguém mais quer trabalhar, todo mundo
505RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
tem uma renda”. Isso é uma crítica que está lá e a gente tem que enfrentar. É
claro que não interessa manter aquele sistema de dependência, de salários
baixíssimos, e as pessoas dependendo de quem paga o dia de trabalho. Mas,
por outro lado, nós temos um sistema de proteção social que tem que ser
visto como uma fase de transição, não pode ser visto como solução perma-
nente, a solução permanente tem que ser outra, e é isso que nós precisamos
tentar construir, essa solução permanente tem que passar por um processo
de capacitação da população, não vamos voltar a isso.
Outra questão que eu queria tocar é a questão da vulnerabilidade ambien-
tal, é uma questão que o Firmo adiantou, e é uma questão nova porque quan-
do a gente começou nesse processo, eu digo a gente porque já estava ativo
quando começou esse processo de industrialização de políticas regionais no
Nordeste, não existia preocupação com o meio ambiente. Mas, se tem uma
coisa nova e importante é a descoberta que há limites, que há limites e nós
temos que introduzir a dimensão ambiental em todas as questões, em parti-
cular no caso do interior do Nordeste, na região semiárida que é uma região
marginal do ponto de vista geográfico e climático, e marginal significa que
pequenas perturbações podem implicar em grandes crises. Então, numa re-
gião onde chove três meses e meio por ano, se chover dois meses e meio,
diminuir um mês, acabou, acabou a produção, é a seca verde. Numa região
que chove oito meses por ano, se diminuir dois meses de chuva, ainda assim
está lá, temos uma boa produção. Então, ela é marginal nesse sentido, quer
dizer, ela está no limite, está no limite do clima, pequenas mudanças levam
506
a grandes impactos, e a interferência das atividades humanas de forma não
sustentável leva à degradação dos recursos do solo, de água, de vegetação,
da biodiversidade. Isso é uma outra experiência que nós temos, e eu creio
que muitos que estão aqui têm conhecimento, comparando como era no in-
terior há quatro décadas atrás e como é hoje. Ao lado disso, traz também os
problemas sociais de marginalização, problemas novos que é a integração
e as transformações sociais acontecidas nos últimos tempos trouxeram e
marginalização da população, de pessoas da população, por causa da po-
breza e da falta de oportunidades, a disseminação do problema de drogas,
que está em todos os municípios do interior, está nas cidades, tem que ser
enfrentado. E o problema da insegurança que eu vejo como um dos grandes
problemas hoje da nossa sociedade brasileira e nordestina também.
Eu queria rapidamente, já tem um aviso aqui que eu não tenho muito tem-
po, fazer uma referência às políticas públicas para o desenvolvimento do
Nordeste. Então nós temos uma história rica, e eu também não vou desen-
volver, mas só mencionar que, no caso das crises climáticas, nós temos mais
de cinquenta anos de experiências de políticas de combate às secas e temos
uma evolução impressionante. E nós temos lições muito importantes que te-
mos que tirar daí, de coisas que deram certo, de coisas que não deram cer-
to. Inclusive, uma lição recente, que é o fato de que, por exemplo, estamos
hoje enfrentando uma das secas mais sérias dos últimos cinquenta anos,
com impactos muito grandes na agricultura; eu fiz uma visita ao Sertão em
março desse ano, em vários municípios, olhando a situação, municípios onde
507RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
houve perda de safra de 95%, onde houve mortandade de gado por falta de
água e de alimentos, mas onde não foi preciso criar frente de trabalho, isso
é interessante. Então, a política de proteção social conseguiu suprir essa
questão, mas ao deixar pessoas desocupadas, aumentaram outros proble-
mas, pelo que me foi relatado em alguns municípios, inclusive problemas de
drogas. Então, há uma grande experiência da infraestrutura, indústria, eu
acho que o caso da agricultura irrigada vale a pena revisitar.
E aqui eu gostaria de colocar, pela primeira vez, a questão da persistência
do aprendizado com os erros. Nós pegamos, por exemplo, o que aconteceu
no polo de Petrolina e Juazeiro, isso desde que foi lançado o programa de ir-
rigação de um milhão de hectares que nunca foi cumprido integralmente, no
governo Sarney, foram dezesseis anos de erros, de falta de resultados, até
que se conseguiu encontrar uma saída, e hoje é um polo importante, é uma
atividade, uma região que atrai pessoas, é uma atividade importante. Os pro-
blemas que aconteceram nos primeiros dezesseis anos, se não tivesse tido
uma persistência de manter, de continuar, de continuar buscando soluções,
eles provavelmente teriam eliminado aquela oportunidade e não se teria che-
gado aos resultados atuais. Então, muitas vezes é preciso aprender com er-
ros e continuar em frente, mas persistir, essa é uma questão importante da
política de desenvolvimento regional. Nós temos muitos outros exemplos, na
área de pesquisa agrícola, e assim por diante. Nós tivemos e ainda acredita-
mos, de certa forma, no papel importante dos grandes projetos, e aqui vale
uma menção ao trabalho que a Lúcia coordenou recentemente, foi publica-
508
do recentemente, mas já faz uns dois ou três anos, para o BNDES, sobre o
impacto dos grandes projetos federais no Nordeste e em cada estado. Esses
grandes projetos têm um papel importante e muitos casos, isso é que é uma
coisa interessante, e muitos casos dependeram de uma decisão de Estado,
de um planejamento e de aproveitamento de oportunidade. Foi o caso do
Complexo de Aratu, do Complexo Petroquímico, do Terceiro Polo Industrial
diversificado, que foi liderado aqui pelo Estado, pelo nosso coordenador que
está aqui. Foi um caso recente aqui do Estado, com a decisão sobre o Pe-
cém, e muitos empreendimentos estruturantes. Então, a ilação que eu tiro
daqui é que o Estado continua tendo um papel muito importante, e aprovei-
tar essas oportunidades e fazer grandes projetos é uma questão importante.
Agora, às vezes, se gasta muito recursos, eu citaria o caso da refinaria de
petróleo que, finalmente, foi decidida, mas não foi feito ainda pelo Estado.
Conseguiu-se uma em Pernambuco, e a outra também não foi feita. Mas eu
me lembro que era estudante de economia, na década de 60, quando o presi-
dente Castelo Branco visitou o Ceará, ele era cearense como vocês sabem,
e as ruas da avenida da Universidade se encheram de faixas pedindo uma re-
finaria para o Ceará. Então, é uma luta que vem de sessenta anos e que tem
consumido muitos recursos e muitas energias. Eu acho que aqui nós temos
uma lição importante, inclusive para repensar quais são as lutas que valem
a pena a gente entrar nelas, isso é uma questão muito importante, acho que
já gastamos muitos recursos e muitas energias com essa questão da refi-
naria, mas, de qualquer forma, eu acho que esses projetos são importantes.
509RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
O outro, que deve ser concluído no próximo ano, a Integração da Bacia do
Rio São Francisco e as bacias setentrionais, que também dependeu de de-
cisão do Estado, mas isso em condução muito lenta. Começou-se a discutir
isso no governo Sarney e, até agora, não terminou, até mais grave, até agora
não sabemos como vai ser administrado e, no entanto, tem uma importância
enorme para esta região do Semiárido. A gente tem que reconhecer que
esses projetos são importantes, mas temos que tentar identificar quais são
os problemas que eles resolvem. Em alguns casos, por exemplo, o problema
da transposição de águas, foi colocado como um problema que vai resolver
o problema da seca; não vai, não vai resolver o problema da seca, mas ele re-
solve um problema importante, e ele é uma parte importante e fundamental
de uma equação mais geral, que é a do aproveitamento racional dos recur-
sos hídricos do Nordeste, tanto os de chuva no território como aqueles de
águas que podem ser importadas de outras bacias.
Eu gostaria de fazer uma discussão rápida também sobre a questão das
instituições e, sobretudo, eu vou abreviar um pouco porque o tempo ago-
ra está mais limitado, já foi mencionado antes pelos meus antecessores, a
questão do planejamento. Aí eu queria reforçar de novo que essa é uma área
onde nós temos uma oportunidade muito grande de reforçar instituições que
ajudem no fortalecimento da criação, da manutenção, da discussão, de estu-
dos, de ciência, de experiências e de planejamento. Eu, pessoalmente, vejo
como a grande oportunidade de ressurgimento real e de fortalecimento da
SUDENE. Acho que uma SUDENE tem um conhecimento, como de certa
510
forma ela foi no começo, eu me lembro quando era universitário, os estudan-
tes todos eram envolvidos em projetos de pesquisa da SUDENE, todo mundo
aprendeu a fazer pesquisa com projetos que eram apoiados pela SUDENE,
hoje não temos mais isso, e esse espaço está livre, e esse espaço nem os
estados nem os ministérios vão disputar, mas se a SUDENE resolver fazer
estrada ou resolver financiar projetos, esses são espaços que outras insti-
tuições vão disputar, os estados, os ministérios e assim por diante. Então, há
um espaço importante para uma instituição regional na área de planejamen-
to e de conhecimento, e essa é uma questão fundamental.
Nos poucos minutos que me restam, eu gostaria de fazer algumas su-
gestões. Uma, relembrando a experiência do projeto Áridas, que foi uma
experiência de criação de uma metodologia de planejamento para o desen-
volvimento sustentável, desenvolvimento que leva em conta a ideia de sus-
tentabilidade. Eu acho que é importante porque ali foi criada uma metodo-
logia que está disponível, que pode ser usada e que é muito interessante
porque tem muito a ver com o que a Lúcia falou, quer dizer, ele começa com
a criação de condições para uma análise de sustentabilidade atual, enfim,
exige toda essa questão de diagnóstico, etc. e parte para construção de ce-
nários tendenciais e desejados, da mesma forma que ela vem fazendo em
Sergipe. E a partir daí, através de processos participativos, se deve chegar
a oportunidades concretas para o desenvolvimento de forma sustentável,
levando em conta os riscos. Uma questão importante nesse processo todo
é como ligar o conhecimento científico, conhecimento técnico com o pro-
511RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
cesso de participação. A gente sabe que simplesmente produzir propostas,
seja pelos melhores cientistas ou pelas pessoas que conhecem, isso não vai
dar resultados, se não houver um convencimento por parte da sociedade,
dos políticos, e assim por diante. Então, tem que haver essa participação e
essa é uma área onde também nesse projeto se desenvolveu a metodologia
de como fazer, isso foi, inclusive, utilizado na elaboração de um plano esta-
dual de desenvolvimento sustentável aqui no Estado do Ceará, que o Cláudio
coordenou e que eu ajudei também.
Tem alguns vários outros pontos que eu gostaria de tocar, mas eu acho
que tem um ponto que eu destaco, que ora estamos discutindo a ideia de
repensar o planejamento para o futuro do Nordeste, que é a questão do fun-
cionamento dos resultados, dos investimentos feitos pelo governo. Infeliz-
mente, nós temos uma tradição no nosso país de fazer investimentos e de
inaugurar. Por exemplo, eu fui daqui a Sobral de carro pela BR222, e é um
Deus nos acuda. Uma rodovia federal não poderia de forma nenhuma está
nesse estado, mas por quê? Porque não tem conservação. Tudo bem, o go-
verno está fazendo esforço, tinha obras em alguns lugares, mas isso não
devia acontecer, e se recuperar agora daqui a cinco anos vai estar de novo
esburacada, isso não pode acontecer. Então, não há uma tradição de manu-
tenção, de funcionamento no nosso país. Por isso, a gente vê, por exemplo,
nós vemos reportagens na televisão sobre os hospitais que estão aos peda-
ços, que têm máquinas que estão há dois, três meses sem funcionar. Não
pode. Então, tem que ser um capítulo importante de qualquer estratégia, é
512
preciso funcionar, talvez até antes de implantar novas coisas vamos colocar
para funcionar as que estão aí. Se a gente vai para a política do Semiárido,
metade dos poços que foram feitos ao longo da história estão desativados,
não são mantidos. O programa de um milhão de cisternas, que chegou a
trezentas mil cisternas, na avaliação que foi feita pela Embrapa Semiárido,
metade não cuida da questão da água, e a novidade que tinha nesse pro-
grama era exatamente a capacitação das famílias para gerenciar a água
das cisternas. Então, funcionamento é uma coisa importante. Até se a gente
pensa numa situação que as dificuldades orçamentárias, com limitações or-
çamentárias, se a gente pensa que uma boa parte do orçamento dos esta-
dos, do governo federal, é gasta pagando professores, talvez uma primeira
coisa seja ver com esses professores, olha, vamos melhorar a qualidade dos
serviços de educação, vamos melhorar a qualidade dos serviços de saúde
que já são pagos, que já estão aí, vamos melhorar a segurança que já está
aí, por que não pode melhorar? Então, não é questão de aumentar a capa-
cidade; tudo bem, tem que aumentar a capacidade, mas tem que garantir
que a qualidade do serviço público seja mantida, e isso tem a ver com essa
questão do funcionamento
Outra questão, final, que eu gostaria de colocar é a questão da gover-
nança. Esse é um problema que nós temos que abordar numa estratégia de
desenvolvimento. Quer dizer, nós temos que garantir processos de decisão
no setor público que sejam transparentes, que reduzam ao máximo as pos-
sibilidades de corrupção, que simplifiquem e desburocratizem, que reduzam
513RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
o tempo para se abrir e se fechar um negócio, por exemplo, que criem um
ambiente favorável para as atividades descentralizadas, que vão ser feitas
pelo setor privado. Então, esse seria um outro item importante, e aqui isso
me joga a uma questão importante, que é a governança dos municípios, em
todos os dias, mas, sobretudo, nos municípios, porque eu acho que uma boa
administração municipal pode fazer uma grande diferença com os recursos
disponíveis. É claro e, se for uma boa administração, acaba atraindo muitos
recursos, porque todo mundo vai querer ir para aquele município, e nós te-
mos vários exemplos disso também.
Ligeiramente, sobre conhecimento, pesquisa e avaliação, já fazemos isso.
E eu só gostaria de mencionar que, muitas vezes, nós também ouvimos um
mito, o mito do fazejamento, pessoas que dizem “nós já sabemos fazer, man-
da o dinheiro que a gente faz, não precisa mais fazer planejamento”. Então, a
gente precisa superar isso, nós precisamos continuamente de novos conhe-
cimentos e reforçar a questão da continuidade, tem vários exemplos que eu
não vou ter tempo de falar aqui.
E, finalmente, uma reflexão sobre para onde vai o Nordeste. Quer dizer,
diante desse quadro todo, diante do que nós vimos nas palestras anterio-
res, para onde vamos? Nós precisamos considerar que a base física é fixa,
nós temos uma geografia fixa, e nessa geografia, é uma geografia que nos
impõe algumas limitações, limitações climáticas, limitações de solo, limi-
tações de água, e essa base física, praticamente já está toda ocupada. Em
cima dessa base física, nós temos uma população que vem crescendo, con-
514
tinua crescendo, sobretudo, uma população urbana, uma população rural
já estagnada, e, olhando o futuro, a gente vê que temos que pensar numa
mudança da geografia humana da região Nordeste, com as áreas que vão
se adensar mais e outras que vão se esvaziar naturalmente. Eu acho que
não precisamos de políticas demográficas, porque as pessoas vão tomar
suas decisões. A economia vai continuar crescendo, acompanhando o cres-
cimento da economia brasileira, como já falamos no começo, reforçado por
algumas atividades importantes incluídas no planejamento, mas aí nós te-
mos que incorporar uma questão que é fundamental: é que as regras do
jogo para o futuro devem mudar com as mudanças do clima e como eu falei
que o Nordeste é especialmente vulnerável, o Semiárido, essas mudanças
que estão acontecendo vão afetar, e muito, a nossa região; quer dizer, nós
vamos ter um clima mais quente, vamos ter menos umidade, devemos ter
secas mais severas, ao longo deste século, e menor disponibilidade de água.
Menor disponibilidade de água, alguns estudos mais recentes indicam que
nós poderemos ter uma perda de 40% na disponibilidade de água na maioria
das bacias do Nordeste, dos nossos reservatórios. Isso é muito sério, temos
que pensar nisso. Em algumas áreas, onde já chove apenas três meses por
ano, pode passar a chover muito menos e isso pode implicar em mudan-
ça de semiaridez para aridez e, evidentemente, inviabilização de atividades
agrícolas tradicionais. Quer dizer, hoje as pessoas já plantam e perdem nos
anos de seca; em alguns lugares pode ficar inviável plantar, definitivamente,
e, portanto, a pecuária deve se expandir. E, assim, talvez o tamanho das pro-
515RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
priedades passe a aumentar ao invés de diminuir. Tudo isso significa maior
pressão das atividades humanas sobre o território, com maior degradação e
desertificação, e redução na disponibilidade de recursos hídricos.
Muitos desafios e dilemas são colocados, então, para uma construção de
uma nova estratégia para o Nordeste. O primeiro passaria pela consolida-
ção de uma visão de futuro compartilhada, uma coisa que já foi menciona-
da aqui, e esse evento, essa contribuição do CIC é fundamental. Nós temos
que dizer, “olha, para onde vai o Nordeste?” sobre os vários aspectos, e aí
ter coragem de assumir as informações, de tentar fugir de ideologias ou de
preconceitos. Eu só queria deixar claro que nesse processo de planejamento
estratégico, o “como” é mais importante do que o “quê”. Então, eu falei da
luta que nós tivemos, nos últimos sessenta anos, para ter uma refinaria. Tal-
vez se a gente tivesse passado esses sessenta anos lutando para melhorar o
clima de investimento, as condições de infraestrutura, reduzir a burocracia,
talvez pudéssemos ter atraído muito mais investimentos, muito mais negó-
cios, que poderiam ter tido impacto maior do que uma refinaria que nunca
veio. É preciso pensar na articulação entre o técnico e o político e construir
a sustentabilidade ambiental, social, econômica e política. Desculpe, não
dá para trabalhar muito sobre isso, mas nós temos que ver essas quatro
dimensões.
E, finalmente, eu só queria reforçar essa importância da criação do am-
biente para o investimento, que envolve a manutenção da estabilidade ma-
croeconômica, isso joga ao que também já foi colocado aqui, no quadro o
516
Nordeste e o Brasil, que joga sobre a questão da criação de fatores de loca-
lização favoráveis; tem aqueles fatores que são naturais, outros que podem
ser criados e que sugerem vários itens importantes, que já foram sugeridos
aqui, para serem considerados estratégicos na área de infraestrutura, de
ciência e tecnologia e inovação, e, sobretudo, na questão da educação. Edu-
cação é fundamental e, no projeto Áridas, nós fizemos um trabalho muito
interessante, que foi uma consulta a líderes de vários setores, várias áreas
do Nordeste, e é um processo que tinha uma primeira consulta, estruturada;
a quem se dispôs a responder; voltava, se trabalhava em cima, fazia o relató-
rio e, no final, surgia uma questão importante: o que é realmente importan-
te para o desenvolvimento do Nordeste? É educação. Então, numa visão de
longo prazo, a solução é dotar cada pessoa, cada cidadão, de capacidade de
sobreviver onde quer que ela resolva viver. Obrigado.
Firmo de Castro: Vamos iniciar rapidamente o nosso debat,e e vamos nos
utilizar de questões que já foram encaminhadas à coordenação e dirigidas
aos expositores. Aqueles que ainda tenham indagações a fazer podem entre-
gar às nossas secretárias, que deverão ser respondidas e, posteriormente,
encaminhadas pelos expositores aos seus endereços. Algumas das indaga-
ções eu vou me reservar aqui a não apresentar porque foram explicitamen-
te respondidas, mas a primeira delas, dirigida à professora Tânia, que diz o
seguinte: A dra. Lúcia Falcón, no workshop do Integra Brasil – O Nordeste
Visto de Fora, realizado no BNDES, afirmou que nós temos ferramentas ne-
517RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
cessárias para um efetivo planejamento no Brasil e na Região e, entretanto,
não se exerce, não se faz esse planejamento. Ninguém melhor do que a pro-
fessora Tânia para dar a sua opinião sobre isso, na medida em que ela viveu
algum tempo atrás uma experiência junto ao grupo central do governo fede-
ral, no Ministério da Integração. Em função dessa sua presença, criou uma
esperança muito grande em termos de a região, de que poderíamos, a partir
daí, obter uma política nova, naquela época, em termos de desenvolvimento
regional, e, por conta dessa experiência, ninguém melhor, portanto, do que
ela para poder comentar a palavra da dra. Lúcia Falcón.
Tânia Bacelar: De manhã, passou aqui uma comparação entre trabalhar na
ditadura e trabalhar na democracia. E, na ditadura, pode fazer planejamento
tendo ferramenta, mas são ferramentas técnicas, e um ditador que diz o que
vai ser feito não é fácil trabalhar assim. Na democracia, não é assim. E, entre
a ditadura e a democracia, a gente prefere a democracia. E aí, na democra-
cia, não basta ter ferramentas, ferramentas nós temos, conhecimento temos,
o processo técnico de elaboração de um plano não varia muito não. A grande
discussão é quem patrocina o planejamento. Quem patrocina? De quem é
aquele plano? Na experiência que Lúcia trouxe aqui, agora à tarde, ela não
falou de ferramenta, ela falou de um processo técnico e político de monta-
gem de um planejamento estratégico. Tem processo técnico, mas junto com
o processo técnico tem o processo político. De quem é aquele plano? Quem
é que patrocina? No que ela mostrou aqui tinha um governo legitimado pelo
518
voto popular que liderava, mas ele não se contentou com o voto, ele foi validar
o voto na microdecisão do que ia entrar no planejamento, e então gastou uma
energia social bastante grande para montar aquelas assembleias, os fóruns,
não sei quê, e no final o que eles tiveram? Um plano legitimado. Então, esse
é o grande desafio. E essa é a fragilidade que a gente viu no Nordeste. O Nor-
deste se dividiu, o Nordeste recente se dividiu, e aí a gente perdeu a capaci-
dade política de ter um planejamento para a Região, a gente caiu na ilusão
da guerra fiscal. A ilusão da guerra fiscal trouxe alguns investimentos para o
Nordeste, mas ela deixou uma sequela política, que a gente está pagando um
preço muito alto por ela. Primeiro, porque ela é uma decisão burra, ela traz
uma consequência material, mas ela é burra. Onde é que está a burrice da
guerra fiscal? É que estados pobres financiam grandes corporações, às vezes
multinacionais, para vir aportar naquele lugar. Vejam que loucura, uma região
pobre, com governos estaduais com uma capacidade de investimento peque-
na, renuncia parte dessa capacidade em investimentos para trazer grandes
corporações transnacionais, que não precisam disso para investir porque, na
verdade, antes de vir elas fazem estudo de localização e é, de certa forma,
indiferente se ela vai para Pernambuco ou para o Ceará; da lógica delas, é
indiferente. E aí ela vai em cima do governador de Pernambuco e do Ceará e
vê quem dá mais, e a gente termina entrando na guerra fratricida para dar a
quem não precisa, viria de qualquer jeito. Então, eu acho que essa herança
é muito pesada ainda, por isso que eu acho que é muito interessante esse
fórum refletir sobre isso. A gente está vendo que uma região como a nossa,
519RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
que tem grandes desafios a enfrentar, que não pode ter uma estratégia úni-
ca, que precisa combinar múltiplas estratégias; um plano estratégico para
o Nordeste é uma coisa complexa pelo que a gente viu no debate, portanto,
tem que ter muitos patrocinadores. Vai ter uns que patrocinam mais algumas
coisas, vão ter outros que patrocinam mais outras coisas, desde que uma
não seja incoerente com a outra o plano pode compor diversos interesses,
por que não? A costura política desses diversos interesses é que é a pedra de
toque. Primeiro quem faz, porque tem que ter legitimidade para fazer diante
dos outros. Por que a gente está reunido aqui? Porque esse fórum tem legi-
timidade. As instituições que estão patrocinando têm legitimidade, se não
tivessem a gente não viria, ninguém vai perder tempo. Então, essa é que é a
grande discussão. E o que nos falta é isso, infelizmente. Vejam, o Brasil não
tem uma tradição de planejamento estratégico, outros países tem, a gente
não tem. No nosso sistema nacional de planejamento não existe essa figu-
ra de plano estratégico, é um dos nossos problemas hoje. Cadê a visão de
longo prazo da sociedade brasileira? A gente vai claudicando, empurra para
lá, gera outro problema aqui, empurra para cá, porque a gente faz planos de
curto prazo. E aí a gente reclama dos políticos, que cada um que entra faz o
seu plano, mas a Constituição só garante um plano de quatro anos, a nossa
própria Constituição não manda a gente fazer um plano estratégico, manda
fazer um PPA, e o PPA tem prazo, ele tem que ser feito no primeiro ano do
mandato do cidadão e tem que terminar no primeiro ano do mandato do ou-
tro, quatro anos. Aí depois a gente reclama que cada governante que vem
520
muda, ele tem o espaço todo para mudar. Cadê o plano de longo prazo? O que
é que não pode ser mexido, quem quer que seja o governante? Quando a gen-
te fez isso, a gente avançou. Por exemplo, a gente colocou algumas cunhas
recentemente muito interessante. Obrigamos a gastar 25% em educação no
governo federal, estadual e municipal, qualquer que seja o governante, pode
ser do DEM e pode ser do PSOL, foi eleito, tem que gastar 25% em educação.
Portanto, é uma regra. Um plano estratégico é uma regra, é um horizonte, é
uma visão de futuro compartilhada, ele está dizendo o que não pode deixar
de ser feito. As mudanças, a conjuntura vai orientando, às vezes a conjuntura
é mais favorável para fazer uma coisa e desfavorável para fazer outra, aí a
gente muda a tática, mas a estratégia está definida. O que falta ao nosso país
é essa cultura e, numa região como a nossa, com o desafio que a gente tem,
a falta é muito maior, até porque, para regiões como a nossa, política pública
tem um peso muito grande. Quando a gente está em São Paulo, política pú-
blica já não tem um peso tão grande porque a estrutura privada já tem uma
força grande, já tem uma capacidade de mover a realidade, grande, então a
política pública é um complemento. No caso de uma região como a da gente,
que tem muitos desafios a enfrentar e muitas fragilidades ao mesmo tempo,
o peso da política pública é muito grande e toda política pública tem que ter
um pacto em torno dela, ela vai ter que se sentir legitimada para fazer alguma
coisa, senão não dá. Esse é o nosso grande debate.
Qual é o problema central nosso hoje, para responder a sua pergunta? Por
que a SUDENE que foi recriada é natimorta? Ela não teve patrocínio, gente,
521RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
essa é que a dura verdade, não teve patrocínio. Nem dos governadores do
Nordeste ela teve patrocínio. Ao contrário. Depois que ela chegou ao Con-
gresso, eles foram para dentro do Congresso dizer que o fundo que estava
proposto lá eles queriam que fosse direto para os seus cofres estaduais.
Fazer o quê?
Firmo de Castro: Agora, para a dra. Lúcia Falcón. A partir de sua experiên-
cia em Sergipe, que estratégia adotar para reduzir as desigualdades intrar-
regionais de renda do Nordeste como um todo?
Lúcia Falcón: Para mim, uma grande oportunidade para dar um ataque final
de economista aqui na mesa. Eu não sei, porque é uma coisa que nem todo
mundo divulga, as pessoas sabem como é que o produto interno do país é
calculado, de uma região, como é que o PIB é calculado? Eu estou falando
aqui, mas estou correndo um risco danado porque a minha professora está
aqui do lado e quem calcula PIB é ela, estou correndo risco de reprovação
aqui. Mas, na verdade, você pode medir isso a partir de três óticas. São os que
os manuais dizem. É ótica da produção, que é o valor adicionado, não adianta
o que foi insumo, adianta o valor que eu agreguei no processo de produção, é
isso que conta. Você pode fazer pelo dispêndio, como é que gasta esse valor
adicionado, e você pode ver como são remunerados os fatores de produção.
Aí entra capital, com tudo que ele tem direito, o trabalho, governo com a parte
que arrecada, porque o governo geralmente não produz, ele arrecada. Então
522
o que acontece, para aumentar, portanto, esse valor adicionado ou melhorar
a distribuição de renda ou melhorar a qualidade do gasto, das três uma, para
você dinamizar a economia de um lugar. O lado de aumentar o valor adicio-
nado é atuar onde a produção está deprimida ou estagnada, aí você tem que
ter um tipo de incentivo para a produção real, em si. O lado da distribuição da
renda todo mundo já comentou bastante aqui hoje, a importância do Bolsa
Família para o Nordeste, programa de renda mínima e valorização do salário
mínimo. Salário mínimo, como a professora Tânia disse, não é muito impor-
tante para São Paulo, mas é importante para nós aqui, porque lá em São Paulo
ninguém mais vive na indústria e no comércio com um salário mínimo, e a
gente aqui vive, aqui é um salário de referência. E a terceira coisa, é melhorar
a qualidade do gasto público, por exemplo, ou gasto privado, principalmente
dos chamados capitalistas, empresários que podem fazer investimento, que é
uma das lutas do Brasil hoje, é incentivar o investimento, por que não investe,
investimento na ampliação da produção e na modernização. Então, sobra a po-
lítica keynesiana do gasto público; gastar em quê? Em infraestrutura produti-
va, infraestrutura econômica e infraestrutura social. Então, o que acontece?
Resta para a gente aqui, já que a renda mínima está se fazendo, e o PAC está
sendo feito, resta atacar o lado do valor adicionado, o lado da produção. Tem
duas maneiras de fazer isso: uma no nível micro, uma no nível que vou chamar
de macro. Não dá para fazer uma sem a outra. Se fizer uma sem a outra vai
ficar um pouco onde o projeto Áridas parou. Quem tiver paciência e voltar,
e pegar o documento, que é uma coisa importante o documento do projeto
523RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Áridas, é bom ver, e outro risco que estou correndo porque o doutor está aqui
do meu lado, mas do que eu me lembro do documento, que é um documento
importante de planejamento, eu, assim na minha visão, porque eu estou falan-
do aqui uma coisa muito pessoal, ele tinha todas essas ferramentas que o pro-
fessor Magalhães aqui levantou, agora ele jogava muito, na minha sensação,
a responsabilidade de fazer as coisas só na sociedade, e eu acho que a gente,
ao final e ao cabo de todo esse trabalho do Integra Brasil, a grande conclusão
que eu chego, Nicolle, que não pode fazer isso; a sociedade tem um papel im-
portantíssimo, o que vocês estão fazendo aqui é insubstituível, mas vocês não
vão fazer sozinhos, o governo tem que fazer a sua parte. Então, é aquela coisa,
volta ao pacto estado-sociedade, cada um tem que fazer o seu. Então, no nível
micro é ir nessas regiões onde a produção, a economia está deprimida ou es-
tagnada, e trabalhar o conceito de arranjo produtivo local. Tem que ser obser-
vador daquela realidade, o que aquelas pessoas sabem fazer e trabalhar com
aquilo. A gente viu lá no Rio o exemplo com a agricultura daquela empresa Fa-
mosa. É uma coisa relevante. Eu vou dar um outro exemplo lá de Sergipe, um
que está começando e um que está indo. No chamado Alto Sertão Sergipano,
é uma região semiárida onde tem Xingó, é região de reforma agrária; quando
nós começamos lá o governo em 2007 para agora, já foi assentado mais de
mil e quinhentas famílias, uma coisa enorme, belíssima, um projeto de gran-
de escala de assentamento. E o que acontecia? O povo lá tinha tradição não
de fruticultura, tinha tradição de formar pequenos laticínios, queijarias e tal,
então quando eles se assentaram, que eles ganharam a terra, em vez de usar
524
o pouco de irrigação que tinham para fazer fruticultura, estavam lá plantando
quiabo, por sinal quiabo mais caro, quiabo irrigado, se for ver o preço do K1/K2
da irrigação, era um quiabo que era para ser vendido caríssimo. Mas, enfim,
em vez de partir para a fruticultura, se fez o quê? Uma base de produção de
grãos para sustentar bovinocultura de leite, e fez queijaria. Tem queijaria lá
pequenininha, queijaria artesanal com o nosso queijo de coalho, nossas coi-
sas que a gente gosta de comer no Nordeste, que podiam estar com um selo
Sebrae lá de carimbo de origem, denominação de origem. Tem tanto o que
fazer, então, esse foi um exemplo bom de arranjo produtivo local, o sertanejo
já sabia trabalhar com gado, já sabia trabalhar com laticínio, simplesmente
se vai agregando valor, e as coisas andam. E o APL da saúde em Lagarto; eu
mostrei aqui na exposição as fotos do hospital regional que o governo cons-
truiu, a universidade federal, só um campus de saúde que foi para lá. Só que
Lagarto é uma cidade que podia ser um polo regional para o complexo eco-
nômico industrial da saúde. Por quê? Porque ela já tem um pequeno distrito
industrial, ela tem movelaria, confecção, não sei quê, podia estar fazendo, por
exemplo, toda a roupa de hospital, roupa de cama, de banho, fardamento de
hospital, podia estar fabricando os móveis de metal para os hospitais, para
as clínicas, então está faltando o quê? A coordenação da política. Então, não
pode desprezar o papel do governo local, nem do Estado, nem do governo fe-
deral, mas se os três não trabalharem juntos não faz. E não pode desprezar o
empresariado local, tem que chamá-los, o senhor que tem uma fábrica, quer
converter sua linha de produção para móveis de hospital ou outra linha? Vai
525RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
o Banco do Nordeste, e financia, vai o cartão BNDES, e financia, e assim o
mundo roda. Isso é o nível micro.
E o nível macro? Que tem que andar junto com isso. Eu volto para o gran-
de instrumento de planejamento, que às vezes as pessoas esquecem, que é
a matriz de insumo-produto. Meu pedido aqui ao Banco do Nordeste: pelo
amor de Deus, Stélio, não deixa de atualizar, porque a matriz que eu mos-
trei a vocês é de 2004, todos os efeitos que a professora Tânia mostrou aqui
de investimento público e privado precisa aparecer, se pegar a matriz mais
nova, 2011, 2010, o que vocês conseguirem pegar com o IBGE e atualizar
já vai atualizar, já vai captar os impactos. Aquele morro ali, cheio de sobe
e desce, vai melhorar muito, eu tenho certeza, e se a gente não trabalhar
olhando a matriz, não vai melhorar as trocas entre os estados do Nordeste,
nem Nordeste com o Brasil, nem Brasil com o mundo, porque a matriz bra-
sileira também é muito importante de ser olhada, medida, que devia acordar
de manhã e dormir de noite com uma lupa em cima da matriz. Então, aquela
desculpa de antigamente que “ah, não vamos à matriz de insumo-produto
não, porque é um trabalhão para calcular”, só de dez em dez anos, de vinte
em vinte, meu Deus! Os supercomputadores do IBGE fazem as tabelas de
recursos em uso que calculam o PIB todo ano. Isso não tem mais restrição
de computador para fazer isso não, tem restrição é de lembrar o instrumen-
to. E, se vocês pensarem, um instrumento de planificação central que um
diacho de um comunista lá que inventou, quem primeiro usou matriz foi os
Estados Unidos, a capital do império capitalista Graças a Deus, eles têm
526
juízo. Alguém tem que ter juízo de parar a ideologia onde não deve ser e
usar um instrumento, e usar a ideologia na hora de discutir o longo prazo,
discutir instituição; aí está certo, vá para a briga política, mas ferramenta
de planejamento tem que servir, desde que o pacto se faça. Então, vamos
começar a democratizar o conhecimento, inclusive o da economia. Então,
matriz de insumo-produto no contexto macro e os APL’s no micro, um olho
no padre e um olho na missa e, complementando, a economia do Nordeste.
Isso foi muito falado aqui, não dá para pensar só no meu estado, eu tenho
que pensar o conjunto, e nossos políticos, voltando a apelar aos que estive-
rem presentes, têm que, pelo amor de Deus, começar a pensar no Nordeste
como um todo, não dá mais para essa disputa de chegar em Brasília, eu falo
direto na presidência, você não fala, eu vou buscar o meu e você que se vire;
não estou vendo onde isso está nos levando? Está nos levando a continuar
uma economia submissa ao contexto do grande capital, de novo. Por que o
nosso empresário não vira um grande capital? Qual o problema? Não falta
empreendedor aqui, não falta gente de coragem, não falta banco, não falta
fundo, tá faltando o quê? Tá faltando cooperação. Vamos começar a saber a
hora de competir na eleição e a hora de cooperar, na hora de transformar o
Nordeste é a hora de cooperar. Obrigada.
Firmo de Castro: Ao dr. Paulo Guimarães: resumindo a sua análise, qual a
política industrial mais adequada ao Nordeste para otimização do processo
de integração econômica nacional do futuro?
527RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Paulo Guimarães: Se eu aprendi com a professora Tânia, não é essa que
está aí, porque ela não tem corte regional, a política industrial atual não
tem corte regional, tem ações especiais, exatamente. Mas, de qualquer for-
ma, a ausência do corte regional não quer dizer que não tenham ações es-
pecíficas ali que são, digamos assim, estimulantes ao setor industrial, não
vou mais nem falar industrial porque agora existe a política do Brasil Maior,
com todos os setores incluídos. Existem incentivos importantes, o problema
é que eles são feitos e são colocados de uma forma que a possibilidade de
se reconcentrar ou se desestimular o que já existe, ou seja, apoiar mais do
mesmo, é significativa. De qualquer forma, numa discussão ocorrida hoje
de manhã, eu não sou especialista na área, mas eu queria ressaltar, um dos
vetores principais, já destacados aqui pela professora Tânia, é o vetor da
inovação, tão definido também no Integra Brasil para a Região. Talvez, a ino-
vação, quer seja no Semiárido, quer seja no tecido produtivo existente, ela
vai fazer o diferencial. Existe ali, naquele vetor da política industrial, uma sé-
rie de possibilidades de ação, de políticas e de linhas de apoio, quer seja no
BNDES, quer seja na FINEP, se discute agora um grande plano, o Inova, com
criação de empresa específica, a Embrapii, mas, do que eu já participei, de
algumas discussões, tem dois fatos relevantes aí, ferramentas disponíveis
existem, agora eu destacaria: dois fatos importantes; primeiro, do que eu já
ouvi dos especialistas, a inovação se concretiza na empresa, no mercado,
portanto, a participação do setor produtivo é fundamental, é onde ela vai se
realizar, onde ela vai gerar riqueza e gerar mercado, isso é um ponto. O outro
528
ponto que se agrega a esse, eu acredito que está numa maior participação
da academia, principalmente da academia nordestina. Ou seja, eu vou dar
um exemplo. Semana passada, eu recebi um telefonema muito interessante
de um professor da Universidade Estadual de Pernambuco, que vai realizar
um evento, Tânia, sobre inovação. Então, nos convidou, e já tem local, já tem
data, já tem tudo. Mas, o ponto interessante do telefonema foi: “Paulo, eu
estou te ligando para o BNDES participar da abertura, de alguns painéis,
com as ferramentas que o Banco tem, mas eu queria um apoio seu para a
gente trazer as empresas”. Porque esse evento é realizado acho que, de dois
em dois anos, ou é ano a ano, e reúnem-se aqui a academia, os cientistas,
e ficam ali conversando, saem relatórios excelentes, mas não tinha partici-
pação empresarial. Então, eu acho que se a gente conseguir dar um corte
regional em alguns instrumentos, porque aí tem um fato também importan-
te; eu estava discutindo agora há pouco no coffee break, no intervalo, por
exemplo, sobre fundos de participação. O Banco tem a BNDESPAR, nossa
subsidiária que trabalha com participação acionária, enfim, e eu estava con-
versando agora há pouco sobre fundos de participação, as possibilidades de
o Banco entrar com participação, ela existe. A gente percebe que talvez o
desafio seja arejar uma proposta, Nicolle, estimular a criação de fundos de
participação regional, porque quando a gente faz nacional a concorrência,
de quem está melhor estruturado, acaba deixando a região sem possibili-
dades, digamos, ou reduzindo a possibilidade de participação. Talvez, nos
instrumentos de política industrial, ou Brasil Maior, a gente possa tentar
529RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
trabalhar, por exemplo, fundos de inovação regionais. Hoje de manhã, o dr.
Hélio Barros fez uma cobrança aos estados. Diz ele que tem muito pouco
estímulo nos estados a fundos estaduais, digamos assim; quem sabe esses
fundos estaduais poderiam estimular a criação de um fundo regional como
contrapartida.
Então, eu acho que tem dois vetores importantes: um é o fato de que a
inovação realmente tem sido destaque na política industrial, dr. Hélio lem-
brou aqui que o professor Luciano tem um roteiro muito bom sobre isso,
feito em Recife, no Inova Recife, no Integra Brasil em Recife, e também lá
no Rio. Pode dar uma contribuição importante nesse sentido. O BNDES é
um participante, uma ferramenta e, talvez, um dos maiores formuladores da
política industrial e tem hoje a direção de um presidente que tem essa sensi-
bilidade regional. Então, a gente acha que pode trabalhar nesse sentido. Mas
eu queria reforçar esse vetor da inovação, com esses dois destaques, a ne-
cessidade de a gente aproximar mais o setor produtivo. O próprio BNDES e
a FINEP têm linhas bastante interessantes, mas que são pouco conhecidas,
são pouco utilizadas, principalmente regionalmente; e a aproximação da
academia, eu acho que a academia, principalmente regional, precisa encos-
tar no setor produtivo para tirar da gaveta aqueles projetos inovativos que
ficam ali sem vir a mercado, sem concretizar o processo de inovação que é
dado na empresa. Então, acho que se não tem especificamente nenhum cor-
te regional, acho que a gente tem nesse movimento o dever de estimular e de
trazer ele à tona, já que se trata de uma política setorial, esse é o problema.
530
A política setorial já vai em várias versões e que cada região inseriria ali um
corte regional.
Firmo de Castro: Ao dr. Magalhães, tenho a seguinte indagação: como ven-
cer o desafio do Semiárido nordestino, que, contraditoriamente, é ao mesmo
tempo um grande bolsão de pobreza do País e uma área com reconhecido
potencial econômico, a exemplo da fruticultura, piscicultura, avicultura, ovi-
nocaprinocultura e geração de energia solar e eólica?
Antônio Rocha Magalhães: Como resolver o desafio do Semiárido, eu tenho
duas respostas: primeiro, como é um assunto muito complexo, a primeira res-
posta é dizer, assim, de imediato, eu não sei. Mas, a segunda é que a gente
precisa realmente sentar e pensar nessa questão que passa no longo prazo
pela questão da educação, passa pela necessidade de uma política ambiental,
que ajuda a reduzir a questão da degradação, e do combate à desertificação,
e de fortalecimento de uma política de recursos hídricos. Então, se é uma re-
gião que tem pouca água e que tende a ter menos água, a política de recursos
hídricos precisa ser muito mais estrita, tanto do ponto de vista de oferta, da
otimização de oferta de água, aí incluindo a possibilidade de importação de
águas de outras bacias, como, sobretudo, do ponto de vista de uso, a política
de uso de águas e a cobrança de água bruta, por exemplo, que é uma coisa que
já se faz aqui no Ceará. Então, eu vejo que políticas ambientais e políticas de
recursos hídricos são fundamentais e, no longo prazo, a política de educação.
531RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Ao lado disso, também para o Semiárido, a criação de um ambiente favorável
às iniciativas locais, ao que foi chamado aqui de economia criativa; quer dizer,
há todas as possibilidades. Por exemplo, eu tenho certeza de que se os turistas
que visitam as capitais do Nordeste, tiverem no pacote a possibilidade de co-
nhecer também o Sertão. Em coisas organizadas, eles vão lá. Mas, não existe,
os pacotes de turismo são todos para as praias. Então, há um espaço realmen-
te grande aí que pode ser utilizado e se aplica a mesma recomendação geral
de que é preciso pensar o longo prazo, como foi discutido aqui.
Firmo de Castro: As demais perguntas, que também não são muitas, serão
encaminhadas posteriormente, para que nós possamos passar agora a pala-
vra para o dr. Cláudio Ferreira Lima, um dos coordenadores do Integra Brasil
e responsável pelo seu êxito, vale aqui esse claro reconhecimento, para que
ele possa fazer seu breve relato.
Cláudio Ferreira Lima: Antes de mais nada quero cumprimentar o mode-
rador, Firmo de Castro, o Paulo Guimarães, a professora Tânia Bacelar, Lú-
cia Falcón, Rocha Magalhães, companheiros de mesa, mas queria também
cumprimentar duas pessoas na plateia, se me permitem, duas mulheres fa-
bulosas que estão lá em baixo, além das que estão aqui em cima, Noemi, que
é minha esposa, e Nicolle que é a líder do projeto Integra Brasil.
Dito isso, eu farei tudo rapidamente; abro com uma citação: “As outras
histórias contam coisas passadas, esta promete dizer as que estão por vir;
532
as outras trazem à memória aqueles sucessos públicos que viam o mundo,
esta intenta manifestar ao mundo aqueles segredos ocultos e escuríssimos,
que não chegam a penetrar o entendimento”. É do Padre Antônio Vieira, na
“História do Futuro”, porque nós vamos fazer a história do futuro.
Sobre as exposições, eu anotei tudo, mas não vou poder falar tudo, eu
procurarei ser sintético.
Primeiro que tudo, a professora Tânia falou nos dois momentos que nós e
o Brasil vivemos, com suas oportunidades e com seus desafios. O primeiro
momento, que se cristalizou com a perfeita integração entre políticas so-
ciais e econômicas, que levou, sem dúvida nenhuma, à melhoria social, prin-
cipalmente no Nordeste. E o outro momento, esse que passamos a viver. E,
dentro disso, ela lançou um olhar sobre o Brasil e depois um olhar sobre o
Nordeste, para dentro. No momento atual, depois da crise de 2008, o Brasil
se prepara para mudar a sua estratégia, o seu jogo, e aí ele vai ter de investir
com força na infraestrutura, mas o país não tem recursos para isso, o setor
público, vai ter que recorrer ao setor privado, aí vem o sistema de conces-
sões, e nisso quem manda é a taxa de retorno, onde tem maior retorno levará
vantagem. No caso do Nordeste, como tem menos, vem a preocupação. O
Nordeste tem de tomar uma atitude diante disso, porque onde houver maior
retorno vai haver naturalmente esses investimentos, sobretudo em infraes-
trutura.
O mapa que Tânia mostrou da logística e transporte, em que se vêem os
grandes projetos da Bahia para baixo, já é uma clara indicação disso. Ela
533RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
fala, por exemplo, da questão das ferrovias, o problema da TRANSNORDES-
TINA; quer dizer, não é possível que a TRANSNORDESTINA pare em Eliseu
Martins; ela tem de se ligar com a Norte-Sul para trazer realmente impacto
positivo sobre a região. Então, o Nordeste tem de ter uma estratégia de trin-
ta a cinquenta anos, e ela lembrou, então, Celso Furtado na SUDENE, que
pensava nisso, nessa infraestrutura, como pensava também na formação
dos recursos humanos, onde vamos ter de correr. Então o Brasil nesse jogo
atual vai dar continuidade à industrialização, mas, sem dúvida nenhuma,
não as indústrias tradicionais, sim as indústrias de maior valor agregado
que podem competir. E o Nordeste como é que está nisso? A situação do
Nordeste não é muito boa, porque as indústrias de maior valor agregado, as
indústrias mais avançadas estão justamente na região Sudeste.
Ela falou dos desafios, por exemplo, do petróleo e gás. Nós não estamos
bem. No investimento no setor automotivo, é bem verdade que nós temos a
Ford já instalada, já produzindo lá na Bahia, e vem a Fiat para Pernambuco. Na
siderurgia, a tendência é haver uma reconcentração no Sul e Sudeste, e o Nor-
deste tem de ter uma estratégia para isso. Em energia renovável, na questão
do etanol, o Nordeste perdeu posição. E outras oportunidades que se abrem
para o Brasil que o Nordeste tem de ter estratégia, como na produção de ali-
mentos. Em grãos o Nordeste perdeu muito, na pecuária, também e, e enfim,
deve consolidar as mudanças sociais; o Nordeste nesse ponto se saiu bem.
Houve uma nova agenda. A educação no Nordeste claro que avançou,
mas, em termos relativos, continuamos no mesmo lugar. Houve avanço tam-
534
bém em ciência e tecnologia, mas para a gente ficar praticamente no mes-
mo, porque a relação continua a mesma entre as regiões. A distribuição do
gasto em ciência e tecnologia não mudou.
Aí vem o olhar do Nordeste; ela olha para o Nordeste e vê a questão da
educação, que é crucial na estratégia regional; a gente tem que também
disputar o apoio, os recursos, porque precisa intensificar essa corrida para
poder tirar esse atraso que é muito grande, principalmente nesse setor que
é fundamental.
Na mudança do perfil produtivo, é preciso saber articular bem esta base
antiga com a base nova, senão não vai ficar nada aqui. Tânia deu exemplo da
indústria da Fiat, que quando vem já traz os sistemistas todos, então os que
estão aqui não tiram benefícios disso.
Ela falou em vários desafios, estratégias específicas. O desmonte do ve-
lho tripé do Semiárido, a redução do peso do complexo alcooleiro. Então,
me recordo uma das grandes metas de Celso Furtado, que era exatamente
avançar no Semiárido e na Zona da Mata, até hoje, são problemas que conti-
nuam sem solução. O dinamismo das cidades médias, o potencial turístico, a
economia criativa, as energias renováveis, as desigualdades intrarregionais
que devem ser enfrentadas (é um calcanhar de Aquiles), a guerra fiscal que
nos dividiu (os laços afrouxaram entre os estados do Nordeste), e como é
que a gente vai poder sair com esse peso relativo de 3,5% do PIB. Também a
necessidade de definir um novo modelo de articulação e cooperação federa-
tiva, e de valorização das instituições regionais.
535RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Com isso, eu falei sobre o que a professora Tânia disse e vou falar rapida-
mente agora sobre a apresentação da professora Lúcia Falcón.
Eu começaria dizendo que ela acentua bem logo no começo, eu acho que
está presente em toda a sua apresentação, que o Brasil que nós temos, as
desigualdades que nós temos, é um produto histórico, foi criado por nós,
digamos assim, em tempos históricos diferentes. E, se foi criado por nós,
caberia a nós também mudar essa realidade. Então, ela fala que recorrer à
economia política é uma necessidade e já que o que nós temos a fazer não
está nos manuais de faculdade de economia. Como no samba que não se
aprende no colégio, já dizia Noel Rosa em “Feitio de oração”.
Então, numa apresentação muito didática, em que a grande questão é
esta: quem tem medo do desenvolvimento do Nordeste? Primeiro, ela traz
os conceitos fundamentais, como de instituições, de território e horizonte de
eventos e desenvolvimento; uma apresentação muito criativa, que eu achei
muito interessante, diferente,plural. E, depois desses conceitos fundamen-
tais, ela falou dos problemas das escalas, das relações federativas, desta-
cando quatro níveis: o poder local, do estadual, (oligarquias e clientelismo),
regional, (falta de visão estratégica, localização das firmas por aglomeração
e por “guerra fiscal”). E no federal, que planeja; mas considerando o mundo
como moldura; o mundo impõe, naturalmente, o Brasil não dá todas as car-
tas, mas tem a margem de manobras, sem dúvida nenhuma.
Vou, então, rapidamente entrar nessa questão muito interessante, neste
conceito da estratégia de que ela falou, e do conceito novo de horizonte de
536
eventos. Fala dos ciclos com os seus tempos: o ciclo eleitoral tem um tempo
curto (dois anos), o ciclo de gestão (quatro anos). Esse primeiro ciclo está
relacionado com aquilo que todo mundo consegue ver. O segundo ciclo uma
parte consegue ver, que é o ciclo de mudanças, de dez anos. E, finalmente,
um ciclo que poucos conseguem ver, que é o ciclo da mudança cultural e
institucional e suas batalhas ideológicas, isso a partir de vinte anos.
Depois, ela fala no planejamento das mudanças, num cenário prováveljá
traçado (investimentos hídricos, logísticos, das indústrias com adensamen-
to de cadeias produtivas, geração de energias renováveis e renda mínima),
mas isso não muda naturalmente essa relação subalterna da região. Em
seguida, fala do cenário possível, de uma maciça reversão de prioridades
políticas e geográficas. Então, já entra na questão da educação, da cultura,
da saúde e dá o exemplo de Sergipe. Faz a análise concreta da realidade
concreta. O cenário desejado, que é o planejamento e cooperação, a partir
de uma rede de cidades, um planejamento estratégico, participativo e terri-
torializado, com capacitação e crédito.
Por fim, os resultados esperados, que, em 4 anos, dão a sustentabilidade
do aumento do PIB, isso se conduzido dentro dessa linha; em dez anos, a ma-
nutenção da distribuição de renda, a elevação da participação do Nordeste na
produção e na exportação; destaca a matriz de insumo-produto. Finalmente,
em vinte anos, uma visão estratégica de longo prazo regional e local. Para
coordenar esses processos fala nos aspectos institucionais, em um conselho
de desenvolvimento econômico e social, e no Fórum de Governadores, enfim.
537RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Vem o Paulo Guimarães, que naturalmente, destaca o papel do BNDES, a
atuação do Banco do Nordeste, que tem evoluído, substancialmente, e a ne-
cessidade da visão estratégica, da visão de longo prazo. Ressalta o caso de
Sergipe e diz que o Banco não é mandatário de escolha, o papel de um banco
de desenvolvimento é acolher as escolhas que são feitas, naturalmente, pe-
los empresários, pela sociedade, e lança um olhar para o futuro, a tendência
de aumento da desigualdade intrarregional, pouca capacidade de gestão e
de investimento pelos municípios que sediam esses grandes investimentos,
os adjacentes aos grandes projetos. A redução de investimento em petróleo
e gás, educação e inovação, enfim, eu vou apenas destacando o principal,
e termina com a mensagem do presidente do BNDES, de que o ciclo atual
pode se esgotar, tem que se pensar vinte anos na frente, com parceiros na-
cionais e apoios locais, e o plano do Nordeste não deve vir de fora para den-
tro, o plano deve ser construído na própria região.
O Magalhães destaca a importância do Integra Brasil, faz um longo pas-
seio sobre o planejamento regional, sobre sucessos e insucessos das políti-
cas; enfim, diz da importância de se construir uma vontade política para se
fazer no Nordeste grandes investimentos. O Nordeste não é mais o mesmo,
a sociedade não é também mais a mesma, sobretudo a sociedade rural; há
grandes mudanças, em suma.
As políticas públicas para o desenvolvimento do Nordeste, e os grandes
projetos em curso não resolvem todos os problemas. Daí, a importância das
instituições regionais, o papel do setor privado, que naturalmente é um pa-
538
pel fundamental nessa história. Mas para onde vai o Nordeste? O Nordeste
mudou em muita coisa, mas o grave nessa história é que o clima realamente
deve mudar também, as mudanças climáticas estão aí.
O adiantado da hora não vai impedir que termine com este livro aqui. Não
vou ler o livro todo, vou apenas destacar nele o pronunciamento do conferen-
cista, do último painel do Seminário de 1981, professor Celso Furtado. Tinha
como debatedor o senador Marcos Freire, o ex-governador Aluísio Alves e
uma grande figura desse Ceará que deve ser sempre homenageada, Beni
Veras. O Beni Veras foi a pessoa que fez do CIC o braço político da FIEC e
também um centro de inteligência e pensamento estratégico, que a Nicol-
le agora está dando seguimento, retomando essa grande função. Então, eu
queria terminar apenas lendo o que o professor Celso Furtado disse: “Os
grandes problemas do Brasil devem ser a própria construção; onde vai o
Brasil?”. É nesse sentido que ele dizia que quando a lógica dos meios nos
domina, perdemos a visão dos fins. E dizia que concordava com o senador
Marcos Freire, que tinha feito com muita veemência o elogia da democracia;
para ele “o único ou verdadeiro problema, porque nele está embutido tudo o
mais, é conseguir criar um poder que seja legítimo, que seja representativo,
criar uma democracia, que até hoje é a maior invenção dos homens”. Muito
obrigado.
Firmo de Castro: Os senhores já viram que relatório nós vamos ter. O dr.
Cláudio mais uma vez revela não só os seus sentimentos que afloram, mas
539RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
a sua competência, e todos nós estamos absolutamente certos e tranquilos
de que teremos uma grande colaboração dele.
Ao encerrar essa sessão, para que, em seguida, se tenha o encerramen-
to, em nome do Integra Brasil, nós gostaríamos de agradecer de coração a
presença dos nossos expositores, dra. Tânia, dra. Lúcia Falcón, Paulo Gui-
marães, Antônio Rocha Magalhães, o Cláudio já é da casa, de maneira que
saiam eles convencidos que nós estamos absolutamente certos que deram
uma grande contribuição para que esse projeto possa chegar a bons resul-
tados. A todos muito obrigado, está encerrado o painel VII.
SOLENIDADE DE ENCERRAMENTOCerimonialista: “Nunca diga nordestino/ que Deus lhe deu um destino/ cau-
sador do padecer/ nunca diga que é o pecado/ que lhe deixa fracassado/
sem condições de viver/ Não guarde no pensamento/ que estamos no sofri-
mento/ é pagando o que devemos/ a providência divina/ não nos deu a triste
sina/ de sofrer o que sofremos/ Deus, o autor da criação/ nos dotou com a
razão/ bem livres de preconceitos/ mas os ingratos da terra/ com pressão
e com guerra/ negam os nossos direitos/ Não é Deus quem nos castiga/
nem a seca que obriga/ sofrermos dura sentença/ não somos nordestinados/
nós somos injustiçados/ tratados com indiferença/ Sofremos em nossa vida/
uma toalha renhida/ do irmão contra o irmão,/ nós somos injustiçados,/ nor-
destinos explorados,/ mas nordestinados, não./ Já sabemos muito bem/ de
onde nasce, de onde vem/ a raiz do grande mal;/ vem da situação crítica,/ de-
540
sigualdade política,/ econômica e social./ Por isso vamos lutar,/ nós vamos
reivindicar/ o direito à liberdade,/ procurando em cada irmão,/ justiça, paz e
união,/ amor e fraternidade./ Somente o amor é capaz/ e dentro de um país
faz/ um só povo bem unido,/ um povo que gozará,/ porque assim já não há/
opressor, nem oprimido”.
Com os versos de Antônio Gonçalves da Silva, mais conhecido como Pa-
tativa do Assaré, um dos maiores poetas populares do Brasil, damos início
à solenidade de encerramento do Integra Brasil – Fórum Nordeste no Brasil
e no Mundo.
E, neste momento, convido a compor a mesa o senhor presidente da Fe-
deração das Indústrias do Estado do Ceará, Roberto Macêdo, acompanhado
da presidente do Centro Industrial do Ceará e liderança do Integra Brasil,
Nicolle Barbosa.
Convido os senhores vice-presidente da FIEC, Beto Studart, por gentileza
que venha ao palco, e Carlos Prado.
O senhor Diretor do Banco do Nordeste, Stélio Gama Lira.
O senhor Chefe do Departamento Regional Nordeste do BNDES, Paulo
Ferraz Guimarães, aqui representando o presidente Luciano Coutinho.
O senhor Diretor-presidente do CENTEC – Instituto Centro de Ensino Tec-
nológico, Francisco Férrer Bezerra.
O Exmo. senhor secretário de Estado do Planejamento do Piauí, César Fortes.
A senhora presidente da Associação de Líderes e Lojistas Femininas –
ALFE, Fátima Duarte.
541RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Os senhores economistas e também responsáveis pela metodologia ino-
vadora do Integra Brasil, Cláudio Ferreira Lima, Firmo de Castro e Francisco
José Lima Matos.
Por gentileza, senhores, senhoras, queiram sentar-se. Já convido nesse
momento a usar da palavra o senhor presidente da Federação das Indústrias
do Estado do Ceará, empresário Roberto Macêdo.
Roberto Macêdo: Boa tarde a todos. Antes de ir para a mesa, eu perguntei
à Nicolle para que tanta cadeira, porque o plenário vai ficar vazio, ela disse,
pelo menos não sai na foto.
Eu vou ser muito breve porque realmente eu estou, além de muito feliz,
emocionado, eu tenho certeza que os senhores que aqui ainda estão, de-
pois de passarem dois dias ouvindo, pensando, anotando, devem estar com
a mesma emoção, pelo menos parte dela, neste momento, e vamos ter, tenho
certeza, um compêndio, um conjunto de sugestões, de ideias, de recomen-
dações, de indagações, enfim, vai ser um conjunto muito rico para se pen-
sar, para se planejar, numa visão de longo prazo, coisa muito difícil no nosso
país, quase inexiste, mas nós temos que adquirir essa cultura nem que seja
na marra. É a única maneira em que o nosso Nordeste pode encontrar um
caminho para o seu desenvolvimento vai ser com planejamento.
E agora, como fez a colocação o professor Magalhães, quando ele disse,
a gente planeja, a gente faz tudo, sabe o que fazer. Mas, a pergunta é como
chegar lá. E hoje nós estamos terminando a primeira fase que é o aqueci-
542
mento, que vai gerar exatamente esse norte, essas informações necessárias
para termos um planejamento de longo prazo. Agora, como fazer com que,
a partir de amanhã, nós vamos começemos a implantar isso aí. Nós vamos
começar a mobilizar realmente toda a sociedade, governo, Congresso Nacio-
nal, nossa Assembleia, enfim, governo dos estados, para que nós possamos
realmente fazer e executar aquilo que nós vamos planejar.
Eu citaria um exemplo até das dificuldades, que são inerentes ao sistema
político brasileiro, é que, quando nós chegamos com o nosso governador
apresentando o projeto, antes de iniciar a cruzada de apresentação nos esta-
dos, o governador gostou, viu, disse “podem contar cem por cento comigo, o
que vocês querem que eu faça?” E nós pedimos que ele entrasse em contato
com o BNDES, com o Banco do Nordeste e com o Ministério da Integração,
e ele em meia hora já tinha dado três telefonemas e já tinha avisado que nós
iríamos procurá-los para trabalhar. Mas, então ele disse, olha, vou pedir que
vocês não me peçam uma coisa: falar com os governadores. Quer dizer, e eu
dou razão a ele, porque não existe sequer uma conversa entre os governado-
res, cada um quer tirar o seu pedaço do jeito que pode; vai à Brasília indivi-
dualmente, como foi citado aqui pela professora. Isso é um fato. E realmente
ele me pediu, nós não pedimos, e ele disse, “isso é um papel de vocês, se eu
falar com qualquer um deles eu atrapalho.” Então nós temos que ultrapassar
isso aí. Um dos principais obstáculos que nós vamos encontrar vai ser fazer
com que os políticos, aqui nós não tivemos nenhum, só tivemos hoje à tarde,
durante o dia de hoje, um, porque está ligado à gente, está nos ajudando mui-
543RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
to, que foi o deputado Danilo Forte; ele tem nos atendido como Federação
das Indústrias, como CNI, naquelas questões onde ele está atuando como
relator. E, fora ele, nós não tivemos mais nenhum. Artur Bruno também. En-
tão, pronto, nós tivemos três. É porque eu não pude vir pela manhã porque
eu estava na reunião do conselho do SESI e do SENAI na Federação. Então,
a gente sente por aí que vai ser difícil essa tarefa, mas temos que chegar lá.
Então, cada um de nós, cada um dos senhores, das senhoras, tem real-
mente, a partir de agora, de colaborar, não é com a Federação das Indústrias,
não é com o CIC, é com o seu Estado, é com o Nordeste como um todo. Nós
sozinhos aqui, nós estamos só sendo os indutores para que possamos dar os
primeiros passos. É indispensável que todos saiam daqui querendo a mesma
coisa, a partir de amanhã já começar a ver como é que vai colaborar, ou como,
de acordo com o que colocou o nosso amigo Antônio Rocha Magalhães.
Bom, eu disse que ia falar pouco, me resta agora como co-anfitrião, por-
que a anfitriã, na verdade, é a dra. Nicolle e toda equipe que trabalhou com
ela arduamente nesse processo, e realmente temos que reconhecer que
cada um fez, usou do seu tempo, todos são ocupados, são empresários, mas
estão aqui se dedicando por uma causa que acreditam e, tenho certeza, que
temos, juntos, a condição de fazer as coisas acontecerem.
Então, agradeço a todos aqueles que trabalharam nesse projeto e a to-
dos os senhores que aqui estão ainda, e aos demais que já estiveram aqui,
pela colaboração, pela contribuição e peloo entusiasmo que estão nos dan-
do para que a gente continue esse trabalho, e eu espero que cada um saia
544
daqui com o mesmo entusiasmo e que possamos ter um resultado que vai
demandar uma geração. Isso não é coisa para amanhã, por isso é que a gen-
te tem que pensar a longo prazo. Isso é uma geração, é uma cultura nova que
nós temos que implantar. Muito obrigado a todos.
Cerimonialista: Encerrando este evento, ouviremos agora a palavra da se-
nhora presidente do Centro Industrial do Ceará e liderança do Integra Brasil,
Nicolle Barbosa.
=Nicolle Barbosa: Boa noite a todos. Peço licença para fazer o discurso no
adiantado da hora, mas eu tenho que fazer o registro dessa hora, que são os
agradecimentos.
Boa noite a todos, obrigada pela presença. Caras amigas e amigos do
Integra Brasil, estes últimos quinze meses me propiciaram uma experiência
ímpar. Neles, aprendi bem mais do que havia aprendido em todos os meus
anos passados de estudo e de vivência empresarial. Com o Integra Brasil,
tive o privilégio de conhecer um Nordeste bem maior e mais poderoso do
que aquele que habita os livros escolares, alimenta as teses acadêmicas
e povoa o imaginário popular ou favorece os discursos políticos. Um Nor-
deste rico em matéria prima para todas as formas de industrialização que
o espírito empreendedor humano solicite. Um Nordeste imensamente rico
em energias limpas e renováveis, sempre disponíveis para alimentar os mais
desafiadores sonhos que a civilização se propõe a alcançar. Um Nordeste
545RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
detentor de uma criatividade e engenhosidade capaz de abrir caminhos às
mais exigentes e avançadas tecnologias. Um Nordeste politizado e sabedor
da força e do peso do seu papel na condução dos destinos da nação que o
envolve. Um Nordeste repleto de humanismo e de uma solidariedade típicos
de povos que acreditam ungidos pelo poder divino de transformar o mundo.
E foi este Nordeste descoberto que me deu consciência do quanto ainda
temos que fazer para levar o Brasil à condição de país rico. E não falo aqui
apenas na riqueza monetária, mas fundamentalmente da riqueza econômi-
ca, aquela que envolve as pessoas e suas relações sociais com argumento e
motivação. E foi este Nordeste vivido que mostrou o quanto já somos capa-
zes de avançar com a nossa afirmação, rumo à nossa afirmação como pro-
tagonistas maiores da consolidação do Brasil como nação desenvolvida, e
desenvolvida de forma sustentável. E se, com o Integra Brasil, pude aprender
tudo isto, e o melhor, o de partilhar e disseminar tudo isso, não o fiz sozinha,
mas abraçada de um corpo de amigos que soube deixar de lado as vaidades
pessoais e se entregar com garra e determinação à tarefa de acordar e in-
citar toda esta Região para a luta por sua integração econômica, ecológica,
social e cultural, com o resto do país e com o mundo. Amigos e amigas, o
Integra Brasil se fez e se faz a múltiplas mãos, a múltiplas cabeças, e aqui,
quando encerramos esta primeira etapa, quero aproveitar para agradecer a
todos e a cada uma delas. Sem uma ordem precisa, mas com certeza emo-
cional, destaco aqueles que pensaram e conduziram a inteligência deste
movimento. Meus, hoje, mais amigos que nunca, Cláudio Ferreira Lima, Fir-
546
mo de Castro e Lima Matos, também a professora Tânia Bacelar e Armando
Avena. Mas a inteligência por si só não acontece, pede um corpo que a sus-
tente e lhe dê asas, e elas vieram com a competência e o comprometimento,
típicos dos profissionais que sabem valorizar o seu trabalho.
Da YHR Eventos, os amigos Yáskara Oliveira e Henrique Rodrigues, junto
com toda a sua equipe de apoio a esse evento, sentados ali atrás.
Da AD2M Comunicação, a amiga Ana Maria Xavier e toda a sua equipe.
Da E2 Estratégias Empresariais, o Francílio Dourado e também toda a
sua equipe que, aliás, será responsável pela edição do livro-documento que
trará a essência do que até aqui fizemos e do plano estratégico que nascerá
desse seminário. Eu acho que nós vamos lançar esse livro lá em Brasília,
não é Carlos?
Um agradecimento muito especial à equipe de secretaria do CIC, Cláu-
dia Lima e Anderson Café, e também à secretaria do Integra Brasil, Manu
Souza, Germana Mapurunga e Luzia Lendengue.
Um muito obrigado recheado de carinho a todos os nossos expositores
de todos os eventos, aos nossos moderadores e relatores, aos quais, em
nome da grande professora Lúcia Falcón, eu deixo meu abraço e um até
breve.
Muito obrigada ao Centro Internacional Celso Furtado de Políticas para o
Desenvolvimento, ao Alexandre França, que trouxe uma pequena amostra
do que fez o nosso eterno ministro do planejamento Celso Furtado. Peço ao
Alexandre que leve à viúva Rosa Furtado o nosso abraço.
547RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Obrigada, também, à nossa grande Cerimonialista, a maravilhosa Nor-
ma Zélia.
Mas, inteligência e corpo precisam ser alimentados da energia neces-
sária à sua caminhada, rumo à concretização dos seus sonhos. E ela veio,
de forma incondicional, da Federação das Indústrias do Estado do Ceará, a
quem deixo um intenso e forte muito obrigada, nas pessoas do presidente
e líder, Roberto Macêdo, e toda a sua diretoria; do motivador, conselheiro e
companheiro Carlos Prado; do incentivador, amigo e parceiro Beto Studart;
e dos amigos diletos Ricardo Cavalcante, Ricarte Pereira, Marcos Soares e
Léo Bayma, em nome de quem digo obrigada à minha incrível diretoria.
Mas, amigos e amigas, o Integra Brasil é um movimento eminentemente
político. Sua sustentação não pode prescindir da política institucionalizada.
E, nesta seara, tivemos, ao longo desses quinze meses, o apoio de lideran-
ças que merecem o nosso mais justo obrigado: o governador do Ceará, Cid
Ferreira Gomes, que abriu as portas do Ministério da Integração, do BNDES
e do BNB ao nosso movimento; o governador de Pernambuco, Eduardo Cam-
pos, essa grande promessa para o Brasil que em apoio ao Integra Brasil, es-
teve conosco durante todo o workshop de Recife, se comprometendo a levar
o Nordeste para a pauta das eleições de 2014, e bem que o Brasil poderia ter
esse Juscelino nordestino, como costuma dizer o Cláudio, que desenvolves-
se esse Nordeste em atividade de cinquenta anos em cinco; o senador Iná-
cio Arruda, que abriu as portas da Comissão de Desenvolvimento Regional
do Senado, da qual é vice-presidente, nos recebendo em audiência pública
548
com muito carinho; o deputado Pedro Eugênio, de Pernambuco, coordena-
dor da Bancada Federal do Nordeste, que acreditou no Integra Brasil desde o
primeiro minuto, com muito entusiasmo, e hoje nos prestigiou participando
do painel “Aspectos Político-Institucionais” como expositor e também nos
recebeu em reunião da bancada nordestina em Brasília. Lembro que quando
apresentei ao deputado Pedro Eugênio o Integra Brasil, ele, animado, falou:
“vocês estão trazendo um presente a esta bancada, nós jamais conseguiría-
mos um documento com tanta precisão e com tanta substância, como o que
vocês estão trazendo, porque a gente não teria jamais como reunir, aglutinar
tanta inteligência e tantos pensadores do desenvolvimento regional”.
Obrigada aos deputados e senadores que se fizeram presentes em dife-
rentes momentos aos eventos do Integra Brasil: do Ceará, o deputado Da-
nilo Forte e sua equipe de gabinete, que sempre nos acolhe e nos atende
em tantas solicitações em Brasília e aqui em Fortaleza, e olhe o que eu dou
um bocado de trabalho, eu dou trabalho mesmo. Senador José Pimentel, os
deputados Raimundo Gomes de Matos que esteve aqui hoje, Chico Lopes,
Edson Silva, João Ananias, que ontem fez um pronunciamento em apoio ao
Integra Brasil lá na Câmara, deputado Antônio Bauma, Ariosto Holanda, An-
dré Figueiredo, Artur Bruno, que também esteve aqui, e Mauro Benevides.
De Pernambuco, os deputados Pedro Eugênio e João Paulo Lima; do
Piauí, o deputado Júlio César, que quis muito estar presente aqui, mas a
agenda dele não permitiu; do Piauí ainda, Jesus Rodrigues; do Rio Grande
549RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
do Norte, Fátima Bezerra; da Bahia, Amauri Teixeira, Colbert Martins e Lúcio
Vieira Lima; do Maranhão, Carlos Brandão e Pinto Itamaraty.
Ademais, amigos e amigas, o Integra Brasil somente se fez possível por
conta do apoio e entidades comprometidas com o desenvolvimento susten-
tável do Brasil: Todas as federações da indústria e do comércio, agricultura
dos nove estados do Nordeste estiveram conosco. Quero aqui agradecer a
constante presença das caravanas da FIEMA, da FIEP, da FIERN e da FIEBA,
e também da Associação Industrial do Piauí, na pessoa do presidente Joa-
quim Costa, que esteve presente aqui conosco nessa terça e quarta-feira.
Junto a elas estavam a FACIC, a ALFE, CONAJE, FAEC, Fórum Empresarial
da Bahia, CDL Fortaleza, FCDL Ceará, governo do Estado do Piauí e governo
do Estado de Pernambuco.
Fomos patrocinados por: Confederação Nacional da Indústria, Federação
das Indústrias do Estado do Ceará, Federação das Indústrias do Estado de
Pernambuco, Banco do Nordeste do Brasil, FECOMÉRCIO-CE e FECOMÉR-
CIO-BA, SEBRAE, CODEVASP, governo do Estado do Ceará, TRANSPETRO
e BNDES. Esses dois últimos, TRANSPETRO e BNDES, foram muito mais
do que patrocinadores, foram parceiros, amigos, incentivadores e partici-
pantes assíduos a todas as ações que até aqui empreendemos. Muito obri-
gada ao presidente Sergio Machado, que esteve aqui conosco esses últimos
dois dias, e ao presidente Luciano Coutinho; os dois deram importantes con-
tribuições técnicas e presença nos eventos. O presidente Luciano só não
pôde estar aqui hoje porque está recebendo logo mais uma justa homena-
550
gem em Brasília, mas esteve todo o tempo muito bem representado pelos
amigos Paulo Guimarães e Helena Lastres.
E, para além do que fizemos, só conseguimos disseminar nossas ideias
por conta do apoio recebido da imprensa de todo o Nordeste, em especial, os
jornais Diário do Nordeste, O Povo, O Estado e Bahia Negócios.
Quero ainda agradecer a todas as entidades parceiras, em especial à CDL
Fortaleza, pelo nosso presidente Freitas Cordeiro, que nos deu enorme apoio.
À FECOMÉRCIO, pelo presidente Luiz Gastão, sempre presente e atencioso
aos nossos pleitos. À FACIC, pelo nosso presidente Chico Barreto e seu di-
retor Hermeto de Paula.
Amigos e amigas do Integra Brasil, nosso trabalho está apenas começan-
do. É responsabilidade de todos nós mudarmos a face política deste país. E
2014 está bem aí, para que mostremos a nossa vontade para combater os
maus políticos. Sim, porque graças a Deus existem muitos políticos do bem,
que praticam a boa política, inclusive já citei os nomes de alguns desses
homens públicos que honram seus mandatos e os votos que o elegeram.
Mas não podemos mais aceitar que crimes escusos, como o que foi imposto
ontem pela Câmara Federal, ao absolver o Natan Donadon, sejam jogados
para debaixo do tapete dos nossos parlamentos. Precisamos promover uma
limpeza política digna da nação que queremos ser. Precisamos tirar os maus
políticos e deixar apenas os bons, os que praticam a boa política, os que ver-
dadeiramente representam a sociedade brasileira. Precisamos de um novo
fazer político, um fazer político pautado na ética e na moral, com respeito
551RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
ao que é público e ao que é privado, um fazer política com espírito cidadão
e de coletividade, que promova o bem estar da sociedade.
Com o Integra Brasil, estamos construindo uma agenda para o Nordeste
que não pode prescindir da política; portanto, que mostremos que a política
é uma arte social, coletiva, de todos, para todos, e esta arte requer arte-
sãos que se façam merecedores do brilho do nosso olhar, do aconchego de
nossas famílias, da força motriz das nossas energias vitais. E tenho certeza
de uma coisa, o Integra Brasil não termina aqui, muito pelo contrário, ele
apenas começa. Nós levaremos este movimento para a pauta das eleições
de 2014, vamos organizar uma caravana para conhecer de perto e acompa-
nhar as grandes obras estruturantes de interesse da Região e vamos acom-
panhar o cronograma destas obras. De posse do documento final, iremos
aos governadores, novamente à bancada federal, quantas vezes for preciso,
divulgaremos amplamente esses resultados na imprensa nordestina e na-
cional. Iremos, ainda, ao coração financeiro deste país, aportaremos nos-
sas ideias na FIESP, presidente Roberto Macêdo. O Sul, principalmente São
Paulo, precisa entender o nosso sentimento e as nossas propostas para um
Brasil mais forte, mais desenvolvido e verdadeiramente integrado.
Quero fazer um agradecimento especial também ao Sistema Jangadeiro,
à Band News, que esteve presente conosco todos esses dias e, no nome do
senador Tasso Jereissati, cumprimentar a todos da imprensa.
Mas, amigos e amigas, não podemos esquecer que este movimento nas-
ceu na e da sociedade. Ele somente sobreviverá se cada um de nós, nordes-
552
tinos, der o seu apoio e a sua cota de contribuição efetiva. Somente assim,
teremos a força necessária para exercer as justas pressões sobre os gover-
nos e parlamentos, de modo a construir a imprescindível vontade política
necessária à concretização do desenvolvimento do Nordeste do Brasil. Por-
que o Brasil pode muito mais. Muito obrigada a todos.
Cerimonialista: Bem, senhoras e senhores, com as palavras dessa grande
líder feminina, encerra-se, portanto, a programação desta edição do Integra
Brasil, e agora rumo ao trabalho. Muito ainda tem que ser feito. Deus aben-
çoe a todos no retorno aos seus lares. Boa noite.
553RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
A metodologia do Integra Brasil, em especial as perguntas e os diagnós-
ticos preparados para conhecimento prévio dos expositores nos wor-
kshops, na mesa-redonda e no seminário, funcionou a contento. Assim, o
processo terminou resultando em rico e diversificado conteúdo propositivo
voltado para a transformação estrutural (e não para mero crescimento eco-
nômico), que alicerçará o Plano Estratégico de Ação para o Nordeste, a ser
levado à discussão nos principais fóruns do País na academia, governo e
sociedade.
O Plano é a base para a negociação da questão regional no âmbito fe-
derativo com todas as regiões do país; tem como premissa básica “mudar
o Nordeste para mudar o Brasil” e deve, por isso mesmo, estar em perfeita
sintonia com o projeto nacional, que, para lidar com a nova realidade mun-
CONSIDERAÇÕES FINAISCláudo Ferreira Lima
Legenda
554
dial, não pode mais ser adiado, sob pena de fragmentação da nação. Em
princípio, articula-se em torno de quatro grandes eixos.
O primeiro visa preparar a integração econômica virtuosa do Nordeste no
Brasil e no mundo. Levam-se em conta as relações entre os estados do Nor-
deste: desconcentração dentro da própria região, aproveitando vantagens
competitivas interiores; do Nordeste com as outras regiões do País; e do
Nordeste com os principais mercados mundiais.
Com isso, objetiva-se equilibrar as relações econômicas do Nordeste
dentro do País e ganhar mercado no exterior, mediante o incremento da
competitividade sistêmica, que implicará, por sua vez, em:
• expandir e aperfeiçoar a infraestrutura econômica: recursos hídricos,
energia, transportes e logística, armazenagem e telecomunicações.
Da mesma forma, a infraestrutura humana: educação, ciência, tecno-
logia & inovação.
• diversificar e fortalecer a estrutura econômica e aumentar o seu valor
agregado e efeito de encadeamento;
• criar condições para o desenvolvimento urbano, ou seja: planejar as
regiões metropolitanas e as capitais, com destaque para projetos de
saneamento, mobilidade urbana, educação e qualificação da mão de
obra; fortalecer as cidades médias, dotando-as das infraestruturas in-
dispensáveis, inclusive quanto a transportes e logística;
555RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
• criar condições para o desenvolvimento rural, destacando-se a rees-
truturação do Semiárido e da Zona da Mata, velhos problemas que têm
respondido historicamente por parte ponderável do atraso nordestino.
O segundo grande eixo é melhorar a qualidade de vida da população nor-
destina, considerando-se as dimensões social, ambiental e espacial, aqui
observado o cuidado não somente com o urbano, mas igualmente com o
rural.
O terceiro grande eixo é fortalecer os laços regionais, sobretudo por meio
da valorização da cultura nordestina, que é o principal traço de união entre
os estados da região. O esforço consorciativo na busca de soluções para o
Semiárido e a Zona da Mata, do mesmo modo no desenvolvimento do Cerra-
do e da atividade turística, constituem-se também fatores de união entre os
estados da Região.
E o quarto e último grande eixo é reestruturar o aparelho político-institucio-
nal e administrativo para o desenvolvimento do Nordeste. Aqui, vale destacar
que, avançando nas conclusões do Seminário de 1981, o Integra Brasil, além
de se colocar como um movimento, com ações norteadas por um plano es-
tratégico de ação, entende que as negociações no âmbito dos poderes Le-
gislativo e Executivo, para terem sucesso, deverão contar necessariamente
com as justas pressões da sociedade civil.
Serão definidos objetivos e metas em cada eixo, e cada meta terá indica-
dores de acompanhamento (sobre o andamento da sua execução) e indicado-
556
res de avaliação (sobre os resultados esperados). Haverá ainda metas-sínte-
se nos campos econômico e social.
Como se vê, está aí o esboço dos fundamentos do que será o Plano Estra-
tégico de Ação, a ser brevemente publicado, inaugurando a segunda fase do
Integra Brasil, quando ele se transformará em um movimento propriamente
dito. Então, sob o lema de “desenvolver o Nordeste para desenvolver o Bra-
sil”, discutirá o Plano na Academia e nas principais instâncias do governo e
da sociedade.
557RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
ANEXO I
SEMINÁRIO O NORDESTE NO BRASIL: AVALIAÇÃO E PERSPECTIVAS - COMPONENTES DAS MEDAS DOS PAINÉIS
COMPO-NENTES DA
MESA
PAINÉIS
Agricultura e desenvol-vimento do Nordeste
Industrializa-ção e desen-
volvimento do Nordeste
Aspectos políticos do desenvol-
vimento do Nordeste
Avaliação da ação do governo no
Nordeste – de 1954 até hoje
O papel do Nordeste na divisão
regional do Brasil
Alternativas institucionais para o desen-volvimento do
Nordeste
presidente Walfrido Salmito Filho
Camilo Calazans
Virgílio Távora
Camilo Calazans
Paulo Elpídio de Menezes
Neto
Virgílio Távora
Conferencista Alysson Paulinelli
Rômulo Almeida
Antônio Carlos
Magalhães
Nílson Holanda
João Paulo dos Reis Velloso
Celso Furtado
Moderador Nílson Holanda
Nílson Holanda
Nílson Holanda
Paulo Lustosa da Costa
Arnoldo Barbalho
Nílson Holanda
Debatedor Aloísio Lorscheider
Antônio Rocha
MagalhãesHélio Ramos José Flávio
Costa LimaTeotônio
Vilela Beni Veras
Debatedor Paulo Rabelo de Castro José Mindlin Dorian
SampaioLuiz Gonzaga Fonseca Mota
Osmundo Rebouças Aloísio Alves
Debatedor João Brígido Bezerra Lima
Firmo de Castro
Severo Gomes João Agripino Werner Baer Marcos Freire
Fonte: SEMINÁRIO O NORDESTE NO BRASIL: AVALIAÇÃO E PERSPECTIVAS. Fortaleza: BNB, 1982.
558
ANEXO II
INTEGRA BRASIL: EVENTOS ACOMPANHADOS QUANDO DA ELABORAÇÃO DO PROJETO
• 1° Congresso Internacional do Centro Celso Furtado (Rio de Janeiro,
de 15 a 17/08/2012), denominado “A crise e os desafios para um novo ci-
clo de desenvolvimento”, que discutiu em painel específico as “Trans-
formações recentes no Nordeste e os desafios para as novas políticas
de desenvolvimento”;
• Conferência sobre “O Nordeste e a Nova Economia” (São Paulo, em
12/09/2012), que realizou três painéis relacionados com as transforma-
ções econômicas e sociais, potencialidades e desafios para o desen-
volvimento do Nordeste;
• Seminário “Desenvolvimento Regional: Avaliação, Desafios e
Perspectivas para o Nordeste”, promovido pelo BNDES (Recife, em
28/09/2012), incluindo temas diversos sobre a questão nordestina;
• Seminário “Desafios do Federalismo Brasileiro”, organizado pela
consultoria do Senado Federal e pelo especialista no assunto, Fernando
Rezende, com o apoio do Banco Interamericano de Desenvolvimento
- BID, nos dias 18 e 19/10/2012, em Brasília, com o objetivo de promo-
559RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
ver amplo debate sobre as causas e as consequências dos problemas
vivenciados pela Federação brasileira, com vistas em um projeto de de-
senvolvimento assentado no equilíbrio entre os interesses da Nação;
• Seminário “Desafios Federativos: Mecanismos para Solução de
Controvérsias”, promovido pela Secretaria de Assuntos Estratégicos
– SAE, em parceria com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
– IPEA, no dia 27/11/2012, para discutir espaços que proporcionem o
diálogo permanente entre as unidades federadas, com foco na compo-
sição de conflitos interfederativos;
• Projeto “Nordeste Competitivo”, levantamento feito pela Confedera-
ção Nacional da Indústria (CNI), em parceria com as federações das
indústrias dos nove estados do Nordeste, para diagnosticar os princi-
pais gargalos na infraestrutura de transportes da região, lançado em
28/11/2012 na Federação das Indústrias do Estado do Ceará - FIEC.
• I Conferência Nacional de Desenvolvimento Regional, sob a coorde-
nação do Ministério da Integração Nacional e IPEA, para a construção
da “Proposta da Nova Política Nacional de Desenvolvimento Regio-
nal”, com a etapa final realizada em Brasília em 19 a 21/03/2013.
560
ANEXO III
LITERATURA SOBRE A QUESTÃO REGIONAL CONSULTADA PARA A ELABORAÇÃO DO PROJETO INTEGRA BRASIL
ALBUQUERQUE JÚNIOR. A invenção do Nordeste e outras artes. Recife:
FJN, Ed. Massangana; São Paulo: Cortez, 2001.
ALVES, Francisco Ferreira. Transferência de recursos via intermediação fi-
nanceira: o caso do Nordeste. Fortaleza: Banco do Nordeste do Brasil, 2011.
AMARAL FILHO, Jair e CARRILO, Jorge (Coord.) Trajetórias de desenvolvi-
mento local e regional: uma comparação entre a região Nordeste do Brasil e a
Baixa Califórnia (México). Rio de Janeiro: E-papers, 2011.
ANDRADE, Manuel Correia de. A terra e o homem no Nordeste: contribuição
ao estudo da questão agrária no Nordeste. São Paulo: Cortez, 2005.
__________________________. Cidade e campo no Brasil. São Paulo: Brasi-
liense, 1974.
ARAÚJO, Tânia Bacelar de. “Desenvolvimento regional brasileiro e políticas
públicas federais no governo Lula”. In: SADER, Emir (org.). 10 anos de gover-
nos pós-neoliberais no Brasil. São Paulo: Boitempo Editorial, 2013.
_______________________. Ensaios sobre o desenvolvimento brasileiro: he-
ranças e urgências. Rio de Janeiro: Revan: Fase, 2000.
ARAÚJO, Tânia Bacelar de et al. O GTDN: da proposta à realidade: ensaios
sobre a questão regional: o Nordeste do Brasil. Recife: Ed. Universitária da
UFPE, 1994.
561RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
BAER, Werner. A economia brasileira. São Paulo: Nobel, 2009.
BANCO DO NORDESTE DO BRASIL. Planejamento do combate às secas:
estudo elaborado na Assessoria Econômica da Presidência da República.
Fortaleza: Banco do Nordeste do Brasil, Comissão Incorporadora, 1953.
BARROS, Alexandre Rands. Desigualdades regionais no Brasil: natureza,
causas, origens e soluções. Rio de Janeiro: Elsevier, 2011.
BONAVIDES, Paulo. In: BONAVIDES, Paulo; LIMA, Francisco Gérson Mar-
ques de; BEDÊ, Fayga Silveira (Coord.). Constituição e democracia: estudos
em homenagem ao professor J.J. Canotilho. São Paulo: Malheiros, 2006.
___________________. História constitucional do Brasil. Brasília: OAB Edi-
tora, 2004.
BRASIL. Congresso Nacional. Comissão Especial Mista. Relatório Final. Re-
lator: Senador Beni Veras, 2ª Edição. Brasília: Senado Federal, 1993. 3 v.
BUARQUE, Daniel. Brasil, um país do presente. A imagem internacional do
“país do futuro”. São Paulo: Alameda, 2013.
BURSZTYN, Marcel. O poder dos donos: planejamento e clientelismo no Nor-
deste. Rio de Janeiro: Garamond; Fortaleza: BNB, 2008.
CANO, Wilson. Desconcentração produtiva regional do Brasil 1970-2005.
Editora UNESP, 2008.
______________. Desequilíbrios regionais e concentração industrial no Brasil
1930-1970. São Paulo: Editora UNESP, 2007.
______________. Ensaios sobre a formação econômica regional do Brasil.
Campinas, SP: Editora da UNICAMP, 2002.
562
CARVALHO, Inaiá Maria Moreira de. O Nordeste e o regime autoritário: discurso
e prática do planejamento regional. São Paulo: HUCITEC; [S.1.]: SUDENE, 1987.
CARVALHO, Otomar de et. al. Alternativas de desenvolvimento para o nordeste
Semiárido. Fortaleza: Ministério da Fazenda; Banco do Nordeste do Brasil, 2003.
_____________________. Desenvolvimento regional: um problema político.
Rio de Janeiro: Campus, 1979.
CARVALHO, Ricardo Ismael de. Nordeste: a força da diferença – Os impasses
e desafios na cooperação regional. Recife: Editora Massangana, 2005.
CASTRO, Inez Silvia Batista (Org.). Novas interpretações desenvolvimentis-
tas. Rio de Janeiro: E-papers: Centro Internacional Celso Furtado, 2013.
COHN, Amélia. Crise regional e planejamento. São Paulo: Editora Perspectiva,
1978.
CORRÊA, Roberto Lobato. Estudos sobre a rede urbana. Rio de Janeiro: Ber-
trand Brasil, 2006.
COUTINHO, Luciano (Coord.) A inserção competitiva do Nordeste: proposta
para a contribuição da ciência e tecnologia. Fortaleza: BNB, 2004.
D’AGUIAR, Rosa Freire (Org.). Essencial Celso Furtado. São Paulo: Peguin
Classics Companhia das Letras, 2013.
DINIZ, Eli. É possível um novo modelo de Estado desenvolvimentista no Bra-
sil? In: Boletim de Análise Político-Institucional / Instituto de Pesquisa Eco-
nômica Aplicada – n. 1 (2011). Brasília: IPEA, 2011.
DUQUE, José Guimarães. Solo e água no Polígono das Secas. Fortaleza: Ban-
co do Nordeste do Brasil, 2004.
563RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
FURTADO, C. Formação econômica do Brasil. São Paulo: Companhia das
Letras, 2007.
_____________ A operação Nordeste. Rio de Janeiro: ISEB, 1959.
_____________ A fantasia organizada. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985.
_____________ A fantasia desfeita. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1989.
_____________ O Nordeste e a Saga da SUDENE (1958 – 1964). 1 ed.
Rio de Janeiro: Contraponto/Centro Internacional Celso Furtado de
Políticas para o Desenvolvimento, 2009.
GALVÃO, Olímpio J. de Arroxelas. Políticas regionais na União Euro-
peia e lições para o Brasil. Fortaleza: Banco do Nordeste do Brasil, 2012.
GARCIA, Odair Lopes; AMARAL FILHO, Jair do. Relações comerciais
do Nordeste com o Brasil e o mundo. In: Cadernos do Desenvolvimen-
to, v. 7, n. 11. Rio de Janeiro: Centro Internacional Celso Furtado, 2013.
GOMES, Gustavo Maia. Conflito e conciliação: políticas de desenvolvi-
mento regional no mundo contemporâneo. Fortaleza: BNB, 2011.
GUILHOTO, Joaquim José Martins. Breve Nota sobre a Importância dos Se-
tores Produtivos e das Unidades da Federação para o Desenvolvimento da
Economia Brasileira. Disponível em: http://www.fundap.sp.gov.br/debates-
fundap/pdf/terceiro_seminario/Exposi%C3%A7%C3%A3o_do_Prof_Guilhoto.
pdf. Acesso em: 24/12/2012.
GUILHOTO, Joaquim José Martins et. al. Matriz de insumo-produto do
Nordeste: metodologia e resultados. Fortaleza: Banco do Nordeste do
Brasil, 2010.
564
GUIMARÃES NETO, Leonardo. O planejamento regional no Nordes-
te:Notas para uma avaliação. In: KON, Anita (Org.). Planejamento no
Brasil II. São Paulo: Perspectiva, 2010.
___________________________. Introdução à formação econômica do
Nordeste. Recife: FUNDAJ, Editora Massangana, 1989.
HADDAD, Eduardo; PEROBELLI, Fernando S. Integração regional e
padrão dos estados brasileiros. In: KON, Anita (Org.). Unidade e frag-
mentação: a questão regional no Brasil. São Paulo: Editora Perspecti-
va, 2002.
HIRSCHMAN, Albert. Política econômica na América Latina. Rio de Janeiro:
Fundo de Cultura, 1965.
JATOBÁ, Jorge. Desenvolvimento regional no Brasil: políticas e controvér-
sias. In: SAYAD, João (Org.) Resenhas de economia brasileira. São Paulo: Sa-
raiva, 1979.
KON, Anita (Org.). Unidade e fragmentação: a questão regional no Brasil. São
Paulo: Editora Perspectiva, 2002.
LIMA, Cláudio Ferreira (Org.). A questão regional na Constituição Brasileira.
Fortaleza: Banco do Nordeste do Brasil, 2007.
LIMA, Luiz Gonzaga de Souza. A refundação do Brasil – Rumo à sociedade
biocentrada. São Carlos: RiMa Editora, 2011.
LIMA, Marcos (Org.). Os boêmios cívicos: a assessoria econômico-política de
Vargas (1951-54). Rio de Janeiro: Centro Internacional Celso Furtado de Polí-
ticas para o Desenvolvimento, 2013.
565RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
MENEZES, Djacir. O Outro Nordeste: ensaio sobre a evolução social e política
do Nordeste da “civilização do couro” e suas implicações históricas nos proble-
mas gerais. Fortaleza: UFC. Casa de José de Alencar/Programa Editorial, 1995.
MINISTÉRIO DA INTEGRAÇÃO NACIONAL. I Conferência Nacional de De-
senvolvimento Regional: documento de referência. Brasília: Secretaria de
Desenvolvimento Regional, 2012.
MINISTÉRIO DAS RELAÇÕES EXTERIORES. Obras de integração física na
América do Sul. Brasília: Ministério das Relações Exteriores, 2007.
MOREIRA, Raimundo. O Nordeste brasileiro: uma política regional de indus-
trialização. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1979.
MOREIRA, Ruy. Geografia e práxis: a presença do espaço na teoria e na prática
geográficas. São Paulo: Contexto, 2012.
______________. Pensar e ser em geografia: ensaios de história, epistemolo-
gia e ontologia do espaço geográfico. São Paulo: Contexto, 2011.
______________. Sociedade e espaço geográfico no Brasil: constituição e pro-
blemas de relação. São Paulo: Contexto, 2011.
OECD (2013), Relatório Territorial da OCDE: Brasil 2013, OECD Publishing, p.
18-27. http://dx.doi.org/10.1787/9789264189058-pt
OLIVEIRA, Clonilo Moreira Sindeaux de. O Nordeste e a ação do setor público:
com um balanço de entrada e saída de recursos. Fortaleza: Banco do Nordes-
te do Brasil, 2010.
OLIVEIRA, Francisco de. Elegia para uma re(li)gião: SUDENE, Nordeste, Pla-
nejamento e conflito de classes. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1977.
566
PACHECO, Carlos Américo. Fragmentação da Nação. Campinas, SP: UNI-
CAMP. IE, 1998.
ROHTER, Larry. Brasil em alta: a história de um país transformado. São Pau-
lo: Geração Editorial, 2012.
SAYAD, João. Resenhas de economia brasileira. São Paulo: Saraiva, 1979.
SEMINÁRIO O NORDESTE NO BRASIL: Avaliação e Perspectivas, Fortaleza:
BNB, 1982.
SINGER, H. W. Estudo sobre o desenvolvimento econômico do Nordeste. Re-
cife: Comissão de Desenvolvimento Econômico de Pernambuco, 1962.
SOUZA, João Gonçalves de. O nordeste brasileiro: uma experiência de desen-
volvimento regional. Fortaleza: Banco do Nordeste do Brasil, 1979.
THOMAS, Vinod. O Brasil visto por dentro: desenvolvimento em uma terra de
contrastes. Rio de Janeiro: José Olympio, 2005.
SKIDMORE, Thomas E. O Brasil visto de fora. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1994.
SUDENE; BNB. Relatório da pesquisa sobre o desempenho da indústria incen-
tivada do Nordeste 1988. Recife: SUDENE, 1992.
SWEIG, Stefan. Brasil, país do futuro. Rio do Janeiro: Civilização Brasileira, 1960.
567RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
ANEXO IV
TEXTOS ELABORADOS PARA OS WORKSHOPS E A MESA-REDONDA
WORKSHOP I: ASPECTOS POLÍTICO-INSTITUCIONAIS
DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE - DADOS, INFORMAÇÕES
E ANÁLISES
Conforme Paulo Bonavides1:
Houve no Brasil duas frentes conjugadas de combate para erradicar as
desigualdades regionais: uma no campo político-constitucional; outra no
campo econômico e administrativo; ambas até agora desgraçadamente
malogradas.
Trataremos dessas duas frentes conjugadas de combate, centrando a
atenção nas razões do malogro de cada uma delas, a fim de traçar, a partir
daí, novas formas de luta que possam trazer resultados concretos.
Complementarmente, cuidaremos da posição do Nordeste na Federação
brasileira.
1 BONAVIDES, Paulo. In: BONAVIDES, Paulo; LIMA, Francisco Gérson Marques de; BEDÊ, Fayga Sil-
veira (Coord.). Constituição e democracia: estudos em homenagem ao professor J.J. Canotilho. São Paulo: Malheiros, 2006.
568
Combate às desigualdades regionais no campo político-constitucional
A seca de 1877-1879, ainda no Império, chama a atenção para a existência
da questão regional no Brasil. É quando surgem as primeiras obras contra
as secas. Na República Velha, novas secas, como a de 15 (1915) recebem o
mesmo tratamento de medidas paliativas, embora já existisse a Inspectoria
de Obras Contra as Secas (IOCS), criada em 1909, e federalizada em 1919,
sob a denominação de Inspectoria Federal de Obras Contra as Secas. As
ações mais vigorosas até então vieram com esse órgão no governo Epitácio
Pessoa (1918-1922), que realiza o mais amplo programa de obras, no entanto,
abandonado pelo seu sucessor, Artur Bernardes (1922-1926).
Em 1932, já na República Nova, logo após a Revolução de 1930, outra seca
obriga o governo central a tomar medidas, que, como as anteriores, têm ca-
ráter emergencial e transitório.
Mas a repetição do fenômeno acaba pondo a nu a decadência da econo-
mia do Nordeste, havendo então a tomada de consciência do problema regio-
nal. E com isso o tratamento da questão deixa de ser por meio de ações ad-
ministrativas de natureza emergencial para entrar no terreno constitucional.
A Constituição de 1891 previa em seu art. 5º que “Incumbe a cada Esta-
do prover, a expensas próprias, as necessidades de seu governo e adminis-
tração; a União, porém, prestará socorros ao Estado que, em caso de ca-
lamidade pública, os solicitar”. É, porém, com a Constituição de 1934 que
há a primeira tentativa de se enfrentar, e de forma mais consequente, as
desigualdades regionais. Antes, eram apenas as “obras contra as secas” e
569RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
a “borracha para o esforço de guerra”. Mas essa Lei Fundamental, embora
efêmera, traz dispositivos – inciso XV do art. 5º e art. 177 das Disposições
Gerais. Pelo inciso XV do artigo 5º compete privativamente à União “orga-
nizar defesa permanente contra os efeitos da seca nos Estados do Norte;
e, no art. 177 das Disposições Gerais, “A defesa contra os efeitos das secas
nos Estados do Norte obedecerá a um plano sistemático e será permanente,
ficando a cargo da União, que despenderá, com as obras e os serviços de as-
sistência, quantia nunca inferior a quatro por cento da sua receita tributária
sem aplicação especial”.
A Constituição de 1937, “exceção feita aos dispositivos autoritários que
serviam aos interesses imediatos do poder, não teve aplicação”.2
A Constituição de 1946 traz o inciso XIII do art. 5º, art. 199 e art. 29 das
Disposições Transitórias. O inciso XIII do art. 5º. define como competência
da União ”organizar defesa permanente contra os efeitos da seca”; o par. 1º
vincula quantia nunca inferior a três por cento da renda tributária da União
para a execução do plano de defesa contra os efeitos da “denominada seca
do Nordeste”. Desse total, um terço será depositado em caixa especial para
o socorro das vítimas da calamidade, podendo essa reserva, ou parte dela,
ser aplicada a juro módico, consoante as determinações legais, em emprés-
timos a agricultores e industriais estabelecidos na área abrangida pela seca.
2 Ver BONAVIDES, Paulo. História constitucional do Brasil. Brasília: OAB Editora, 2004, p. 348.
570
No art., 29 do Ato das Disposições Constitucionais Provisórias, “O gover-
no federal fica obrigado, dentro do prazo de vinte anos (...) a traçar e execu-
tar um plano de aproveitamento total das possibilidades econômicas do rio
São Francisco e seus afluentes, no qual aplicará, anualmente, quantia não
inferior a um por cento de suas rendas tributárias”.
Como se vê3:
O Nordeste ficava, pois, altamente aquinhoado pela Constituição de 1946,
como área de convergência de recursos federais, num montante de qua-
tro por cento da renda tributária da União e que deveriam ser aplicados,
planejadamente, já através de obras e serviços de assistência econômica
e social – para fazer face aos calamitosos efeitos da seca – já mediante
uma ação de envergadura, tendente ao aproveitamento do potencial eco-
nômico do São Francisco.
A Constituição de 1967, que extinguiu o Fundo das Secas, e a Emenda nº
1, de 1969, dos governos militares, não trataram diretamente das desigual-
dades regionais.
A Constituição 19884 procurou resgatar a questão regional e o fortaleci-
mento da Federação. Assim, de um lado, elegeu a redução das desigualda-
des espaciais e sociais como um dos objetivos fundamentais da Repúbli-
3 Op. Cit., p. 419.
4 Ver no final o anexo “Constituição da República Federativa do Brasil de 1988: Aspectos regionais”.
571RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
ca (Inciso III do art. 3º) e criou a seção “Das regiões” (art. 43), considerada
por Paulo Bonavides “a suma e o ponto culminante da constitucionalização
administrativa dos entes regionais”. Demais, dispensou especial atenção à
integração e desenvolvimento do Norte, Nordeste e Centro-Oeste, dotando
o setor produtivo dessas regiões de um fundo constitucional de financia-
mento, respectivamente, FNO, FNE e FCO (Inciso I, letra c, do art. 159). De
outro lado, promoveu a redistribuição dos recursos públicos, privilegiando
Estados e Municípios, com fundos de participação mais alentados (Inciso
I, letras a e b, do art. 159) e assegurando ao Nordeste participação no orça-
mento de investimentos da União segundo o critério populacional (§ 7º do
art. 165), dispositivo constitucional nunca respeitado.
A União, com a criação e crescente utilização de tributos não partilhados
(as chamadas contribuições), logo reverte o cenário redistributivo arquite-
tado na Constituição e volta a concentrar a maior parte da receita pública
nacional.
Em resumo, quanto à questão regional, sempre houve o divórcio entre a
Constituição escrita e a Constituição real.
Combate às desigualdades regionais
no campo econômico e administrativo
No Nordeste do gado e do algodão, a seca de 1877-1879 mata cerca de
meio milhão de nordestinos. Por isso, o grande flagelo do Norte, como fica
conhecido o fenômeno climático, torna-se problema nacional, fazendo com
572
que o imperador Pedro II crie a Comissão Imperial de Inquérito, que, em seu
relatório, propôs a melhoria do sistema de transportes e, notadamente, a
construção de açudes.
Alguns anos depois, já na República, a Constituição de 1891 prevê, em seu
artigo 5º, recursos para socorrer a população flagelada. E somente em 1909 é
criada pelo Decreto nº 7.619/1909, à semelhança do norte-americano United
States Reclamation Service (1902) – hoje Bureau of Reclamation –, a Inspecto-
ria de Obras Contra as Secas (IOCS) para coordenar tais medidas. O novo órgão,
porém, só ganha caráter permanente como repartição pelo Decreto 9.256/1911.
À IOCS cabem, sob a liderança do engenheiro Arrojado Lisboa, os pri-
meiros estudos básicos de levantamento e reconhecimento do Semiárido
nordestino.
Com a reformulação da IOCS, pelo Decreto nº 13.687, de 9/07/1919, surge
a Inspectoria Federal de Obras Contra as Secas (IFOCS), que centra as ati-
vidades na formação de infraestrutura: estradas, portos, campos de pouso,
eletrificação, açudes, poços e canais.
Sob o governo de Epitácio Pessoa, a IFOCS, conforme já comentado,
coloca em prática um programa ousado de obras contra as secas, que foi
abandonado no governo seguinte, de Artur Bernardes. Para tanto, em 1919,
por via legislativa ordinária, foi destinado percentual nunca inferior a três
por cento da renda tributária da União.
Ao Nordeste, pois, caberia contentar-se com o papel de grande reserva-
tório de mão de obra, que, àquela altura, já havia suprido a Amazônia, ainda
573RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
no primeiro ciclo da borracha, e deveria depois - como os demais recursos da
nação - servir ao complexo cafeeiro.
Em 1945, de acordo com o Decreto-Lei nº 8.486, a IFOCS passa a denomi-
nar-se Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (DNOCS), que é
organizado com a finalidade de realizar todas as obras destinadas a prevenir
e atenuar os efeitos das secas na Região a que se refere o art. 2º da Lei nº
175, de 7 de janeiro de 1936, e em outras zonas do País, a que a Lei venha a
estender o seu campo de ação.
Além das inúmeras obras hídricas e do seu aproveitamento – açudes,
inclusive em regime de cooperação com Estados, Municípios e particula-
res, poços profundos, perímetros de irrigação e estações de piscicultura –,
o DNOCS forma valioso patrimônio cultural imaterial, que se refere ao co-
nhecimento da ecologia da região onde atua, vale dizer, do seu solo, água,
vegetação e clima, entre outros aspectos, assim como das formas de con-
vivência com o Semiárido, a exemplo da açudagem, dos poços, do abasteci-
mento d’água, da pesca, da aquicultura e da irrigação. Além do mais, funcio-
na como a primeira escola técnica e a primeira universidade do Nordeste e,
na sua atuação, constitui valioso acervo histórico e documental.
O seu campo de ação hoje compreende:
• Garantir e democratizar a oferta d’água, mediante a gestão integrada,
participativa e descentralizada dos recursos hídricos;
• Assegurar o abastecimento humano;
• Desenvolver a irrigação, a pesca e a aquicultura;
574
• Aproveitar áreas desapropriadas de terra de sequeiro;
• Ampliar as fronteiras do conhecimento técnico-científico sobre o Se-
miárido nordestino;
• Realizar todos esses objetivos preservando o meio ambiente.
Para atender os ditames constitucionais, e, seguindo, a exemplo da Com-
panhia Hidrelétrica do São Francisco (CHESF), criada em 1945, para dar iní-
cio à segunda fase do combate às secas, o modelo da Tenessee Valley Au-
thority (TVA) norte-americana, surge a Comissão do Vale do São Francisco
(CVSF) (1948). O art. 29 do Ato das Disposições Constitucionais Provisórias
da Constituição de 1946 dispõe que: “O governo federal fica obrigado, den-
tro do prazo de 20 anos (...) a traçar e executar um plano de aproveitamento
total das possibilidades econômicas do rio São Francisco e seus afluentes,
no qual aplicará, anualmente, quantia não inferior a um por cento de suas
rendas tributárias”. Após atuar durante 20 anos conforme estabelecido pela
Constituição, é sucedida, nos termos do Decreto-Lei nº 292, de 1967, pela
Superintendência de Desenvolvimento do Vale do São Francisco (SUVALE),
que deve promover o desenvolvimento e a revitalização do Vale do São Fran-
cisco. Em 1974, pela Lei nº 6.088, a SUVALE muda para Companhia de De-
senvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (CODEVASF) e sua
área de atuação é ampliada para a bacia do rio Parnaíba (Lei nº 9.954/2000) e
para os vales dos rios Itapecuru e Mearim (Lei nº 12.196/2010. Em 2009, pela
Lei nº 12.040, inclui o Ceará em sua área de atuação, que passa a compreen-
575RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
der os vales dos rios São Francisco e Parnaíba, nos Estados de Pernambuco,
Alagoas, Bahia, Minas Gerais, Goiás, Piauí, Maranhão, Ceará e no Distrito
Federal. Em resumo: distribui-se um orçamento já minguado para uma área
maior. Enquanto isso, a área original ainda não encontra a solução para seus
problemas, ou melhor, a CODEVASF não aproveita todas as oportunidades
que ela oferece.
O Banco do Nordeste do Brasil S/A (BNB) (1952) nasceu sob a influência
da nova ordem institucional do após-guerra, caracterizada pelo surgimen-
to de instituições multilaterais, como a Organização das Nações Unidas
(ONU), o Banco Internacional de Reconstrução e Desenvolvimento (BIRD)
e o Fundo Monetário Internacional (FMI), assim como, sob os efeitos da ex-
pansão econômica dos “anos dourados” de 1950 em diante, aproveitando-se,
na sua concepção, os exemplos de corporações de fomento e bancos indus-
triais do Chile, México e Venezuela.
A Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE) (1959),
que completou o projeto reformista do segundo Governo Vargas, iniciado
com a criação do BNB e que visava a implantação, pela primeira vez, no Bra-
sil, de um efetivo sistema de planejamento econômico, com base nas ideias
e na visão estruturalista da Comissão Econômica para a América Latina e
o Caribe (CEPAL), tendo, na sua instrumentação, se inspirado na política
regional do Sul da Itália, sob a coordenação da Cassa per Il Mezzogiorno.
Há três características a destacar na forma de intervenção do Estado
quanto à questão regional: a primeira é que o enfoque é dado ao ataque
576
às vulnerabilidades e quase nunca ao aproveitamento das potencialidades.
Assim, os organismos regionais do Nordeste - com exceção da CHESF e da
CODEVASF – nascem sob o clamor das secas. A segunda é que, em geral,
buscamos sempre experiências de outros países, como nos casos de todos
os organismos regionais, sem exceção: DNOCS, CHESF, CODEVASF, BNB
E SUDENE. E a terceira é que, em todas as soluções, o Nordeste é sempre
tratado à parte, e nunca dentro de um projeto nacional.
Mas há ainda uma quarta característica. Ao longo de mais de um sécu-
lo de ações do governo federal no Nordeste, é patente a inconstância na
atuação dos organismos regionais, que é refletida nos altos e baixos (mais
baixos) em seus orçamentos. Não bastasse isso, duas instituições chegam
mesmo a ser extintas, o DNOCS e a SUDENE. E, recriadas, perdem a capa-
cidade de atuação de antes. Em todo esse processo, apenas o BNB, e graças
aos recursos do FNE, tem conseguido prosseguir com alguma vitalidade no
exercício do seu papel.
Resultado disso, o País continua muito distante de resolver a questão
regional. Desde 1939, quando se passa a contar com estatísticas mais
confiáveis, o Nordeste nunca alcança sequer a metade do PIB per capi-
ta nacional. O IPEA mostra que, para o Nordeste conseguir chegar ao
patamar de 75% do PIB per capita nacional, valor que a União Europeia
considera como aceitável para a distância entre as suas regiões, ele teria
de crescer 2,2 pontos percentuais acima da média nacional durante os
próximos 22 anos.
577RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
O Nordeste na Federação brasileira
O Nordeste está representado nas duas Casas do Congresso Nacional com
151 deputados federais dos 513 (29%) que compõem a Câmara dos deputados
(CD) e 27 senadores dos 81(33%) que formam o Senado Federal (SF). Decisão
do Tribunal Superior Eleitoral alterou com base no Censo de 2010 a composição
de 13 bancadas estaduais na CD para a próxima legislatura, que se inicia em
2015. Com essa modificação o Nordeste perderá 4 parlamentares, e a sua ban-
cada será reduzido para 147 membros. Apesar de ter forte presença nas duas
Casas do Congresso Nacional – bem maior do que o seu peso econômico (con-
forme o IBGE, 13,5% no PIB brasileiro) –, o Nordeste não tem conseguido, a não
ser durante a Constituinte de 1987-1988, fazer prevalecer a sua força política.
WORKSHOP II: NORDESTE – SITUAÇÃO ATUAL
E TRANSFORMAÇÕES RECENTES - DADOS, INFORMAÇÕES
E ANÁLISES
Ao tratar da política regional contemporânea, dentro de uma visão pa-
norâmica, Maia Gomes5 afirma que se tornou difícil definir a atual política
regional de desenvolvimento. Uma alternativa, segundo ele, que não agride
os fatos, identificaria com relação ao Nordeste:
5 Ver GOMES, G. M. Conflito e conciliação: políticas de desenvolvimento regional no mundo contem-porâneo. Fortaleza: Banco do Nordeste do Brasil, 2011, p. 337-8.
578
• A “Política Nacional de Desenvolvimento Regional”, do Ministério da
Integração;
• As ações da Superintendência para o Desenvolvimento do Nordeste
(SUDENE);
• Os programas de crédito e outras iniciativas de desenvolvimento do
Banco do Nordeste do Brasil (BNB);
• A atuação no Nordeste, sob condições especiais, do Banco do Brasil
(BB), da Caixa Econômica Federal (CEF) e do Banco Nacional de De-
senvolvimento Econômico e Social (BNDES);
• Os investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), que,
pelo volume de recursos anunciados, seria de longe o mais importante.
Para Maia Gomes6, “embora essa intenção não apareça explícita em
nenhum documento legal, a expansão dos gastos sociais equivaleu a uma
política regional, embora não no sentido clássico de uma política de desen-
volvimento econômico”. As chamadas políticas sociais – bolsa família, apo-
sentadorias rurais –, juntamente com os aumentos reais do salário mínimo e
a expansão do crédito em favor das classes mais baixas de renda, têm cons-
tituído forte instrumento de distribuição de renda do trabalho como também
de impulso à demanda de bens de consumo popular.
6 Op. Cit., p. 335-6.
579RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Olímpio Galvão, que realizou aprofundado estudo sobre as políticas regio-
nais na União Europeia, com o objetivo de tirar lições para a experiência bra-
sileira, chama a atenção para o fato de que, no Relatório da Secretaria Geral
das Nações Unidas sobre o Projeto do Milênio, datado de 2005, o Nordeste bra-
sileiro está, juntamente com o Oeste da China, os Estados do Norte da Índia e
o Sul do México, considerado como um dos quatro grandes bolsões de pobre-
za em todo o mundo. Para ele, “uma questão a merecer séria consideração”7.
Assim, para o autor, o Nordeste do Brasil diferencia-se dessas outras re-
giões; e isso está patenteado no seguinte8:
a) A ONU “destaca três determinantes cruciais que costumam estar
presentes no desenvolvimento das regiões que mais crescem em cada
país, com base na experiência das últimas décadas:
• A localização próxima a áreas litorâneas que apresentam possibilidades
de fáceis conexões com o resto do país e, principalmente, com o mundo;
• A presença de grandes mercados domésticos ou a acessibilidade a
grandes mercados externos; e
• A existência de condições climáticas salubres e agronomicamente
favoráveis.
b) Dentro desses critérios, vale dizer que mesmo as áreas distantes do
litoral têm apresentado excepcional desenvolvimento, haja vista as
7 Ver GALVÃO, Olímpio J. de Arrochelas. Políticas regionais na União Europeia e lições para o Brasil. Fortaleza: Banco do Nordeste do Brasil, 2012, p. 369.
8 Op. Cit. p. 370-1.
580
chapadas e cerrados do Maranhão, do Piauí e da Bahia, a irrigação
às margens do rio São Francisco em Petrolina (PE) e Juazeiro (BA), a
indústria de calçados no interior do Ceará, entre outras. Ademais, o
Nordeste conecta-se a outras regiões e mercados do país por meio de
vários modais de transportes; e, enfim, a principal limitação reside no
Semiárido, por causa das secas periódicas, mais à falta de uma ade-
quada política de convivência com o ambiente, visto que é possuidor
de grandes potencialidades, do que de uma fatalidade geográfica.
De acordo com Tânia Bacelar9, a partir de 2003, o governo Lula constrói
um pacto social que lhe permitie tanto aproveitar a conjuntura favorável do
mercado externo quanto retomar a trajetória de crescimento do país em no-
vas bases, beneficiando as camadas mais pobres da população por meio de:
• Políticas públicas de transferência de renda;
• Elevação do salário mínimo em termos reais;
• Expansão de crédito a prazos mais longos.
Nessas condições, o consumo das famílias passa a influenciar fortemen-
te o crescimento da economia, cujo padrão tem maior impacto no Nordeste,
9 VER ARAÚJO, Tânia Bacelar de. “Desenvolvimento regional brasileiro e políticas públicas federais no governo Lula”. In: SADER, Emir (org.). 10 anos de governos pós-neoliberais no Brasil. São Paulo: Boitempo Editorial, 2013.
581RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
pelo maior número, seja de famílias abaixo da linha de pobreza, seja de pes-
soas ocupadas que ganham até um salário mínimo.
O novo e sistemático fluxo de renda, além de dar cobertura aos beneficiá-
rios diretos, dinamiza lojas, farmácias, padarias, feiras semanais, de modo a
trazer importante impacto econômico nos pequenos municípios. Isso só fez
estimular o investimento de empresas locais e de grandes grupos nacionais
e internacionais, que incluem as regiões pobres em seus planos de expan-
são. Indústrias de bens de consumo popular buscam instalar-se ou expandir-
-se nessas regiões, especialmente em cidades médias. As grandes redes de
shoppings e supermercados multiplicam nesses locais, disputando os novos
consumidores.
Não bastasse isso, o governo federal lançou o Programa de Aceleração
do Crescimento (PAC) e Minha Casa, Minha Vida, ambos de caráter descon-
centrador em termos regionais. A eles vêm juntar-se, também nessa mesma
linha, os programas de compras, com destaque para a aquisição de sondas
e de navios, com estaleiros no Maranhão, Pernambuco, Alagoas e Bahia, e
de refinarias, inclusive em função das descobertas do pré-sal, beneficiando
os Estados do Maranhão, Ceará e Pernambuco.
O resultado de todo esse movimento, combinando políticas sociais e eco-
nômicas, desemboca na drástica redução da pobreza, em avanços na edu-
cação superior e no aumento expressivo do emprego formal.
No entanto, tudo isso resulta de políticas nacionais de corte setorial; as
clássicas políticas regionais explícitas não tiveram prioridade; o próprio Mi-
582
nistério da Integração Nacional (MI), responsável pela Política Nacional de
Desenvolvimento Regional (PNDR), continuou com o foco em obras hídri-
cas, e a SUDENE, recriada, tornou-se um órgão de acanhada atuação.
WORKSHOP III: ASPECTOS ESTRATÉGICOS DO
DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE - DADOS, INFORMAÇÕES E
ANÁLISES
Onde estamos? Existe um modelo de desenvolvimento no Brasil? Ainda
não, pelo menos, conforme Eli Diniz10,
no sentido forte desse termo. Em outras palavras, não é possível identifi-
car um modelo de longo prazo aglutinado de maneira consistente às dis-
tintas dimensões de uma nova estratégia de desenvolvimento, com a com-
plexidade que alcançou o conceito contemporâneo de desenvolvimento.
Existe uma estratégia de desenvolvimento regional? O que existe é a Po-
lítica Nacional de Desenvolvimento Regional (PNDR), de poder muito limi-
tado de intervenção, exercendo, por isso mesmo, reduzida influência no con-
10 Ver DINIZ, Eli. É possível um novo modelo de Estado desenvolvimentista no Brasil? In: Boletim de Análise Político-Institucional / Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – n. 1 (2011). Brasília: IPEA, 2011, p. 19.
583RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
junto das ações governamentais. E se houvesse uma, como poderia atuar, se
não existe um modelo de desenvolvimento no País?
Se avançamos tão pouco é porque, na realidade, nunca houve, a rigor, nes-
te país, uma estratégia de desenvolvimento regional em escala nacional.
O que prepondera historicamente são iniciativas localizadas, em geral
como resposta de poder limitado, primeiro, ao fenômeno das secas, como:
as obras contra as secas (DNOCS); e o aproveitamento do vale do São
Francisco (CHESF e CODEVASF).
Mais adiante, nos anos 1950, tenta-se responder ao gap entre o Nordeste
e as regiões mais prósperas com
1. a criação do BNB: semente do planejamento regional; e
2. a SUDENE e os planos diretores de desenvolvimento.
Depois, sobreveio, no início dos anos 1980, a crise da dívida externa, que
faz o País abandonar o planejamento de longo prazo e, por consequência, o
planejamento regional.
No final dos anos 1980, as conquistas do Nordeste na Constituição de 1988,
especialmente o Fundo Constitucional de Financiamento (FNE), têm efeito re-
duzido. Os gastos públicos federais continuam a não obedecer ao critério po-
pulacional, contrariando, pois, a Constituição: 60,1% para o Sudeste e 11,4%
para o Nordeste. (BRASIL. I Conferência Nacional de Desenvolvimento Regio-
nal – Documento de Referência. Brasília: MI-SDR, jul/2012, p.49).
584
Nos anos 1990, a onda neoliberal conclui o desmonte do sistema de plane-
jamento de longo prazo no Brasil e com ele o planejamento regional. Instau-
ra-se a chamada “guerra fiscal”. A grande preocupação passa a ser, com o
Plano Real, a estabilização.
Nos últimos anos, quando o País recupera a capacidade de investimen-
to, vêm surgindo novas, porém ainda tímidas iniciativas de política regional,
como a Política Nacional de Desenvolvimento Regional, do Ministério da In-
tegração Nacional, adiante comentada.
Quais as perspectivas que temos para o futuro dadas as condições
atuais? As perspectivas que se descortinam, apesar de avanços pontuais no
Nordeste, são de reconcentração econômica.
O Nordeste tem uma estratégia? Não, nem a rigor nunca teve. Pode-se
argumentar que houve a estratégia do Grupo de Trabalho para o Desenvol-
vimento do Nordeste (GTDN), que, conforme Leonardo Guimarães Neto11,
compreendia: a) a criação de um centro dinâmico capaz de substituir a fun-
ção de impulsionar o crescimento econômico que, historicamente, no Nor-
deste, havia sido desempenhado pelo setor exportador; b) redução da vul-
nerabilidade da economia agrícola regional; c) promoção de mudanças nas
formas tradicionais e arcaicas de organização social da produção.
Mas a estratégia do GTDN, afora os senões na sua concepção – pre-
tendia-se com ela implantar na região um centro manufatureiro autônomo,
11 Ver GUIMARÃES NETO, Leonardo. O planejamento regional no Nordeste:Notas para uma avaliação. In: KON, Anita (Org.). Planejamento no Brasil II. São Paulo: Perspectiva, 2010, p. 348.
585RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
quando já havia no país uma integração produtiva –, teve breve período de
execução (1959-1964).
Quais os fatores limitantes do desenvolvimento do Nordeste? Quais as
potencialidades da Região?
Entre os fatores limitantes, a maioria dos estudos sobre a Região aponta
a deficiência de infraestrutura, seja física seja humana. Com relação a esta
última, alguns pesquisadores, como Alexandre Barros, chegam a afirmar
que a limitação quanto capital humano é a principal responsável pelas desi-
gualdades regionais.
O principal fator limitante é a forma como a economia nordestina se integra à
economia brasileira, em que se situa mais como região consumidora do que pro-
dutora. Mas o Nordeste detém várias e importantes potencialidades cuja utiliza-
ção resultará na expansão e no fortalecimento da economia do país, tais como:
• A localização estratégica, que coloca o Nordeste próximo dos grandes
mercados mundiais, como a Europa e os Estados Unidos.
• O alargamento do Canal do Panamá, fazendo com que boa parte da
carga da Ásia para a América do Sul venha pela nova rota, que alcan-
ça primeiro os portos do Nordeste.
• A estrutura industrial-portuária de Itaqui (MA), Pecém (CE), Suape
(PE), Camaçari (BA), além da Ferrovia TRANSNORDESTINA, que
atravessa sete Estados.
• O surgimento de vários empreendimentos em todos os setores da economia.
586
• A política de expansão do mercado interno, em resposta à crise mun-
dial, que revelou a região como uma das principais fontes de dinamis-
mo do País.
De que precisamos para efetivar essas potencialidades? Não há outra
saída senão construir uma estratégia de desenvolvimento para o País como
um todo que dê a cada região e ao Nordeste, em particular, um papel de
relevo na matriz produtiva nacional.
Há várias iniciativas em curso. Mas nenhuma delas pode ser considerada
estratégia de desenvolvimento para o País e, daí, para a Região. De todo
modo, a Política Externa e o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC),
por exemplo, já apontam para algo nesse sentido.
A Política Nacional de Desenvolvimento Regional – PNDR, lançada em
2004 e institucionalizada em 2007 (Decreto nº 6.047), não se afirma; é frus-
trada, sobretudo, pela não criação do Fundo (Constitucional) Nacional de
Desenvolvimento Regional – PN doutor A PNDR adota a visão das múltiplas
escalas, de modo que inclui como elegíveis para a sua atuação, além de todo
o território abrangido pela SUDAM, SUDENE e SUDECO, áreas do Sudeste
e Sul classificadas como de média e baixa renda, independentemente do seu
dinamismo econômico. Trata-se de uma perspectiva que valoriza as ações
tópicas em cada grande região do País, sem levar em conta a integração
entre elas.
É bem sugestiva a orientação estratégica traçada pelo governo federal:
587RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
No longo prazo, objetiva-se, com o PPA 2004-2007, inaugurar um processo
de crescimento pela expansão do mercado de consumo de massa e basea-
do na incorporação progressiva das famílias trabalhadoras no mercado
consumidor das empresas modernas.
Em poucas palavras, o que se quer é a expansão do mercado interno, es-
tratégia natural para um país de dimensão continental e de grande popula-
ção como o Brasil. E, nesse sentido, a grande fronteira reside justamente
nas regiões mais pobres e, em particular, no Nordeste. A recente preocupa-
ção do governo federal com logística e transportes, que põe em destaque a
dimensão espacial, é um indicativo forte de que a questão regional volta à
ordem do dia, muito embora deixando à margem o Norte e o Nordeste.
Atualmente, realizam-se congressos e seminários com o propósito de
discutir a questão regional. O I Congresso Nacional de Desenvolvimento Re-
gional (CNDR), que visa reformular a Política Nacional de Desenvolvimento
Regional (PNDR), é uma das principais iniciativas nesse terreno.
De todo modo, o que tem preponderado são políticas nacionais de corte
setorial, que impactaram positivamente na redução das desigualdades re-
gionais. Assim, as políticas regionais explícitas não mereceram prioridade12.
12 Ver ARAÚJO, Tânia Bacelar de. “Desenvolvimento regional brasileiro e políticas públicas federais no governo Lula”. In: SADER, Emir (org.). 10 anos de governos pós-neoliberais no Brasil. São Paulo: Boitempo Editorial, 2013.
588
Conforme Joaquim José Guilhoto13, “para efetivamente se traçar uma po-
lítica de desenvolvimento regional na economia brasileira é necessário se
levar em consideração:
b) que o estado de São Paulo, além da sua importância na geração de
renda e emprego, é um estado que polariza a economia nacional e
que se mostra essencial, em termos estruturais, para que as outras
regiões possam se desenvolver; e
c) o baixo nível de integração nacional.
A OCDE, em seu Relatório Territorial14, faz recomendações-chave volta-
das para o desenvolvimento regional no Brasil:
a) da redução da pobreza ao crescimento inclusivo:
• a redução da pobreza não será sustentável sem a criação de empre-
gos locais e sem crescimento. As políticas sociais devem, portanto, vir
acompanhadas de políticas voltadas à criação de empregos e cresci-
mento endógeno.
13 Ver GUILHOTO, Joaquim José Martins. Breve Nota sobre a Importância dos Setores Produtivos e das Unidades da Federação para o Desenvolvimento da Economia Brasileira. Disponível em: http://www.fundap.sp.gov.br/debatesfundap/pdf/terceiro_seminario/Exposi%C3%A7%C3%A3o_do_Prof_Gui-lhoto.pdf. Acesso em: 24.12.2012.
14 OECD (2013), Relatório Territorial da OCDE: Brasil 2013, OECD Publishing, p. 18-27. http://dx.doi.or-g/10.1787/9789264189058-pt
589RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
• As demandas estão concentradas em territórios específicos. As políti-
cas sociais, portanto, têm impactos regionais, que precisam ser identi-
ficados e abordados de forma consistente.
• O Brasil pode desenvolver uma abordagem contextualizada, coorde-
nando as políticas setoriais nos territórios, de modo a alcançar uma
maior complementaridade entre a política social e as demais políticas
setoriais.
• A SUDENE e outras agências de desenvolvimento regional podem ser
usadas para a coleta de informações relevantes e para coordenar os
investimentos federais nas regiões.
• A OCDE apóia a iniciativa de complementar o Programa Bolsa Família
com programas relacionados, para promover a inclusão social e eco-
nômica das pessoas extremamente pobres.
b) do investimento público fragmentado à estratégia nacional de cresci-
mento inclusivo
• Uma parcela maior de investimento público deve buscar estimular as
oportunidades de crescimento futuro, ao invés de apenas tentar su-
perar os obstáculos existentes. O aumento da parcela de recursos de
desenvolvimento regional para o investimento público e uma condição
necessária, mas não suficiente.
• Considerar a criação de novos instrumentos para garantir que o inves-
timento público chegue às regiões atrasadas.
590
e) aperfeiçoar a capacidade da administração pública para a governan-
ça multinível de alto desempenho
• Manter e ampliar programas de capacitação em níveis estadual e mu-
nicipal, para eliminar o principal gargalo na aplicação eficaz da políti-
ca de desenvolvimento regional.
• O mapa administrativo do Brasil para o nível intermediário entre mu-
nicípios e estados precisa ser simplificado e unificado.
• Para melhorar a coordenação entre níveis de governo, é necessário
promover uma racionalização institucional.
• Estabelecer o financiamento para a política de desenvolvimento regional.
Para Olímpio Galvão, que sugere, com base na experiência europeia, uma
nova e consequente política nacional de desenvolvimento regional para o
Brasil15:
A concepção de políticas regionais num país da dimensão do Brasil deve
servir, como na Europa, ao duplo propósito de maximizar o crescimento na-
cional e, ao mesmo tempo, de promover a melhor integração das suas eco-
nomias regionais, garantindo a minimização dos impactos negativos das for-
ças polarizadoras que provocam a exclusão social e espacial, evitando-se a
continuidade de um processo histórico que levou à criação de vários brasis,
alguns relativamente ricos, outros muito pobres. Cabe, em suma, ao Brasil
15 GALVÃO, Olímpio J. de Arroxelas. Políticas regionais na União Europeia e lições para o Brasil. Forta-leza: Banco do Nordeste do Brasil, 2012, p. 394.
591RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
conceber uma política nacional de coesão – econômica, política e social –
que busque, como na Europa, a crescente inclusão de imensas frações de
seu território e de suas populações, no processo de crescimento nacional.
WORKSHOP IV: O NORDESTE VISTO DE FORA -
DADOS, INFORMAÇÕES E ANÁLISES
É antigo o interesse e a motivação em conhecer os outros países. No caso
do Brasil, desde o período de Colônia, foi objeto de curiosidade da parte não
apenas da Metrópole portuguesa, mas também de países como a Holanda.
Nos séculos XVIII e XIX, tornam-se rotineiras as chamadas viagens cientí-
ficas, que eram incursões planejadas de naturalistas com motivação cien-
tífica e interesse econômico. Com a chegada da família real, em 1808, as
viagens da espécie intensificam-se no território brasileiro, de tal modo que
essa fase ficou conhecida como a do “novo descobrimento do Brasil”.
Os viajantes ingleses, franceses, alemães e portugueses deixaram, desde
o século XVI até o século XIX, sob vários ângulos, impressões a respeito do
Brasil por meio de crônicas, relatos de viagem, correspondências, memó-
rias, diários e álbuns de desenhos. A começar por Pero Vaz Caminha, pode-
-se citar Hans Staden (Viagem ao Brasil, de 1557) e Jean de Léry (Viagem à
terra do Brasil, de 1574). Merecem destaque, por haverem viajado através
592
do Nordeste: Henry Koster (Viagens ao Nordeste do Brasil, primeira edição
publicada em Londres, em 1816; a primeira edição em português é de 1942);
François de Tollenare, que aqui esteve entre 1816 e 1818 e publicou um diário,
publicado sob o título de Notas Dominicais, nas Revistas do Instituto Ar-
queológico e Geográfico Pernambucano, em 1904, e do Instituto Histórico e
Geográfico da Bahia, em 1907; Maria Grahan, que visitou três vezes o Brasil
e escreveu o Diário de uma viagem ao Brasil e de uma estada nesse país du-
rante parte dos anos de 1821, 1822 e 1823, publicada na Série Brasiliana, vol.
8, em 1956; e Richard Francis Burton (viajou pelo Brasil e 1867 e publicou em
1869 Explorations of the highlands of Brazil, em Londres, traduzido no Brasil
em 1941 sob o título Viagens aos planaltos do Brasil).
Já no século XX, os países estrangeiros passaram a adotar novas formas
de se informar sobre os outros países. Conforme Thomas E. Skidmore16,
Estados modernos gastam grandes quantias de dinheiro para saber como
outros países os vêem. Recorrem à interceptação de telefones de altos fun-
cionários, à análise de editoriais de jornais e chegam mesmo a financiar
pesquisas de opinião (onde quer que estas possam ser colhidas). Uma das
fontes mais valiosas para a história das relações internacionais, no entan-
to, são escritores eminentes que interpretam a importância de outros paí-
ses para os seus concidadãos. Por meio de seus argumentos, provocam de-
bates e assim iluminam o pensamento de sua sociedade – ou de sua elite.
16 Ver SKIDMORE, Thomas E. O Brasil visto de fora. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1994, p. 33.
593RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
A obra clássica ou, pelo menos, de maior impacto, de um estrangeiro,
sobre o Brasil é de autoria do escritor austríaco Stefan Zweig, Brasil, país
do futuro, lançado em 1941. Para ele17, à época:
Longe de mim querer dar a ilusão de que no Brasil já tudo se acha em estado
ideal. Muita coisa ainda se acha em início e transição. A maneira de vida de
uma grande parte da população ainda está muito abaixo da maneira de viver
de grande parte da nossa [europeia]. As atividades técnicas e as indústrias
desta nação de cinquenta milhões de habitantes, por enquanto, só são com-
paráveis às de pequenos países europeus. O mecanismo de administração
ainda não está bem regulado e muitas vezes tem paradas incômodas. Com
um percurso de algumas centenas de quilômetros em direção ao interior
chegamos ainda a um meio primitivo, atrasado de um século.
Mas Stefan Zweig, que fugia da guerra na Europa, alimentava “na exis-
tência do Brasil, cuja vontade, segundo ele, está dirigida unicamente para
um desenvolvimento pacífico”, “uma das nossas melhores esperanças de
uma futura civilização e pacificação do nosso mundo devastado pelo ódio e
pela loucura”.18
É bem conhecida a visão que tinham do Nordeste alguns economistas
estrangeiros nos anos 1950. É o caso do inglês Hans Singer, que inclusi-
17 Ver SWEIG, Stefan. Brasil, país do futuro. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1960, p.10.
18 Op. cit., p. 12.
594
ve levantou questões que estariam presentes no relatório do GTDN19. Da
mesma forma, os norte-americanos Albert Hischman20 e Stefan Robock;
este último prestou importante colaboração ao Banco do Nordeste, em
especial, na criação do Escritório Técnico de Estudos Econômicos do Nor-
deste (ETENE).
O jornalista norte-americano Larry Rohter que foi correspondente da re-
vista Newsweek e do jornal The New York Times no Brasil por 14 anos – este-
ve nas manchetes por haver dito que o presidente Lula bebia muito –, conta
em “Brasil em alta: a história de um país transformado”21 sobre a impressão
que teve do nordestino quando aqui chegou nos anos 1970:
(...) escutei imigrantes do Nordeste, região assolada pela seca e tradicio-
nalmente a mais pobre do país, cantando canções que falavam dos seus
sofrimentos e esperanças frustradas, num tom lamentoso semelhante aos
blues que eu escutava em Chicago, onde nasci.
19 Ver SINGER, H. W. Estudo sobre o desenvolvimento econômico do Nordeste. Recife: CONDEPE, 1962.
20 Ver HIRSCHMAN, Albert. Política econômica na América Latina. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1965.
21 ROHTER, Larry. Brasil em alta: a história de um país transformado. São Paulo: Geração Editorial, 2012, p. 10-1.
595RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Internamente, o Nordeste (antes, conhecido como Norte) é visto, confor-
me Durval de Albuquerque Jr.22, pelo discurso da seca, elaborado pelas pró-
prias elites da região:
A questão da influência do meio era a grande arma política do discurso re-
gionalista nortista, desde que a seca foi descoberta em 1877, como um tema
que mobilizava, que emocionava, que podia servir de argumento para exigir
recursos financeiros, construção de obras, cargos no Estado etc. O discurso
da seca e sua “indústria” passam a ser a “atividade” mais constante e lu-
crativa nas províncias e depois nos Estados do Norte, diante da decadência
de suas atividades econômicas principais: a produção de açúcar e algodão.
A seca torna-se o tema central no discurso dos representantes políticos do
Norte, que a instituem como o problema de suas províncias ou Estados.
Assim:
Portanto, seja na imprensa do Sul, seja nos trabalhos de intelectuais que
adotam os paradigmas naturalistas, seja no próprio discurso da seca, o
Norte aparece como uma área inferior do país pelas próprias condições
naturais, ainda que no discurso da seca essa deficiência de meio e de raça
deveria ser compensada pela atuação do Estado, investindo na moderni-
zação da área, numa política de imigração, numa série de medidas para
“solucionar” o problema das secas.
22 ALBUQUERQUE JÚNIOR, Durval Muniz de. A invenção do Nordeste e outras artes. Recife: FJN, Ed. Massangana: São Paulo: Cortez, 2001, p.59 e 62.
596
Mais recentemente, com a globalização, é importante para os países mante-
rem boa imagem, em especial quanto à estabilidade política e econômica, para
a atração de investimentos e dinamização dos fluxos de comércio e turismo.
Hoje em dia, as principais fontes de informação provêm das organizações inter-
nacionais, como a Organização das Nações Unidas e suas várias agências, do
Fundo Monetário Internacional (FMI) e Banco Mundial; dos governos, por meio
de suas representações diplomáticas, mas segundo a visão geopolítica; da aca-
demia, merecendo destaque o papel dos chamados brasilianistas; e do setor
privado, via câmaras de comércio e órgãos de informação, como, por exemplo,
a fDi Magazine / Financial Times, uma das organizações de referência a nível
mundial no domínio da informação sobre Investimento Direto Estrangeiro, que
elabora os European Cities & Regions of the Future; e os correspondentes estran-
geiros.
O governo brasileiro, com essa preocupação, no segundo governo Lula (2007-
2010), tomou duas iniciativas de monitoramento da imagem do Brasil no exte-
rior: a) pesquisa qualitativa com 15 perguntas respondidas por 170 entidades
com presença no Brasil, incluindo embaixadas e câmaras de comércio, reali-
zada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA); e b) leitura diária
do noticiário sobre o Brasil em 48 jornais das Américas, da Europa e da Ásia,
encomendada pela Secretaria de Comunicação da Presidência (SECOM).
Atualmente como o Brasil é visto pelos organismos internacionais? E pe-
los grandes mercados mundiais: Estados Unidos; União Europeia; e China?
597RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Daniel Buarque, que vem de publicar livro sobre a imagem que os nor-
te-americanos têm do Brasil neste começo de século XXI23, e que alude ao
famoso “Brasil, país do futuro“, de Stefan Zweig, afirma24:
Depois de tanta coleta de informações, é possível dizer que a sensação de
que o Brasil está recebendo mais atenção é unânime, assim como é unâ-
nime a sensação de que o país tem uma imagem cada vez mais positiva.
Vale dizer que Daniel Buarque não vê diferenças significativas entre o que
os Estados Unidos e a Europa pensam a respeito do Brasil: os velhos estereóti-
pos – como mostra pesquisa recente do King’s College, em Londres – do “país
do Carnaval, samba e futebol” ainda povoa o imaginário nos dois continentes,
embora já tenha perdido espaço para outras questões, como a estabilidade
econômica e política. A Academia nos Estados Unidos, por exemplo, deixou
o lado exótico do Brasil para se interessar por temas como energia renovável,
meio ambiente, desenvolvimento, sustentabilidade e negócios25.
Para Larry Rother26:
Pertencer ao grupo BRIC confere tanto prestígio quanto responsabilidade, pois
é o grupo BRIC que, na percepção geral, simboliza a transformação da econo-
23 Ver BUARQUE, Daniel. Brazil, um país do presente: a imagem internacional do “país do futuro”. São Paulo: Alameda, 2013.
24 Op. Cit., p. 21.
25 Op. cit. p. 216.
26 ROTHER, Larry. Op. cit., p. 16.
598
mia global no século XXI, com a tocha da liderança empunhada pelos Estados
Unidos, Europa e Japão tendo que ser dividida com essa novas potências.
E como o Nordeste do Brasil é visto hoje pelos organismos internacio-
nais? O relatório da Secretaria Geral das Nações Unidas sobre o Projeto do
Milênio inclui o Nordeste do Brasil, juntamente com o Oeste da China, os
Estados do Norte da Índia e o Sul do México, como um dos quatro grandes
bolsões de pobreza do mundo.
De um modo geral, predomina ainda com relação ao Nordeste, porém de
forma mais atenuada, tanto nos grandes mercados mundiais quanto no Su-
deste do Brasil, a visão de região assolada pela seca e pelo atraso econômi-
co, político e social.
É hora de o Brazil com “z” (os correspondentes estrangeiros, por exem-
plo, estão presos ao eixo Brasília-Rio de Janeiro-São Paulo; a única conces-
são fora daí é a Amazônia) conhecer mais o Brasil com s, inteirando-se do
que é o Nordeste; e de o Brasil de baixo conhecer mais o Brasil de cima e
vice-versa, acabando com a desinformação e, consequentemente, com os
estereótipos. E para isso tem de ser construído um novo discurso que res-
salte não as vulnerabilidades, mas, isto sim, as potencialidades da região:
É preciso fugir do discurso da súplica ou da denúncia da miséria; é preciso
novas vozes e novos olhares que compliquem esta região, que mostrem
as suas segmentações, as cumplicidades sociais dos vencedores com a
situação presente deste espaço. Se o Nordeste foi inventado para ser este
599RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
espaço de barragem da mudança, da modernidade, é preciso destruí-lo
para poder dar lugar a novas espacialidades de poder e de saber.27
MESA-REDONDA: AS DESIGUALDADES INTRA-REGIONAIS NA
ECONOMIA NORDESTINA: SOLUÇÕES E ENCAMINHAMENTOS -
DADOS INFORMAÇÕES E ANÁLISES
Apenas três estados – Ceará, Pernambuco e Bahia – concentram 64,5%
do PIB do Nordeste. No tocante ao PIB per capita, embora não haja uma
discrepância tão grande quanto à que existe no plano interregional, em que
o Nordeste não atinge sequer a metade do PIB per capita do Brasil, mesmo
assim, há diferenças intra-regionais importantes a considerar. Maranhão,
Piauí, Alagoas e Paraíba, por exemplo, acham-se, nesse indicador, em mais
de 20 pontos percentuais abaixo de Sergipe, Bahia e Pernambuco.
Produto Interno Bruto, população residente, Produto Interno Bruto per capita
e Produto Interno Bruto per capita do Estado em relação ao Produto Interno
Bruto per capita do Nordeste, segundo os Estados do Nordeste - 2010
27 ALBUQUERQUE JÚNIOR, Durval Muniz de. A invenção do Nordeste e outras artes. Recife: FJN, Ed. Massangana: São Paulo: Cortez, 2001, p.315.
600
Estado PIB (em R$ milhões) População PIB per capita
(Em R$ 1,00)
PIB per capita do Estado/PIB
per capita do Nordeste
Maranhão 45.256 6.569.683 6.888,60 72,0
Piauí 22.060 3.119.015 7.072,80 74,0
Ceará 77.865 8.448.055 9.216,96 96,4
Rio Grande do Norte
32.339 3.168.133 10.207,56 106,8
Paraíba 31.947 3.766.834 8.481,14 88,7
Pernambuco 95.187 8.796.032 10.821,55 113,2
Alagoas 24.576 3.120.922 7.874,21 82,3
Sergipe 23.932 2.068.031 11.572,44 121,0
Bahia 154.340 14.021.432 11.007,47 115,1
NORDESTE 507.502 53.078.137 9.561,41 100,0Fonte: IBGE – Contas Regionais do Brasil 2012.
O mais grave, como já comentado, é quando se compara o PIB per capi-
ta desses estados com o do Brasil e das unidades da Federação líderes do
ranking. O PIB per capita do Maranhão, por exemplo, o menor do Nordeste e
do Brasil, representa, em relação ao Brasil, 34,8%; a São Paulo, 22,8%; e ao
Distrito Federal, 11,8%28
O comércio é outra forma de mostrar a desigualdade intrarregional. A
tabela seguinte mostra a participação dos estados do Nordeste no comér-
cio interregional, liderado pelo Ceará, Pernambuco e Bahia, que concentram
28 IBGE – Contas Regionais do Brasil 2010.
601RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
60,1% das compras e 70,9% das vendas. Ao mesmo tempo, vê-se o elevado
déficit da Região para com as demais regiões do País.
Participação dos estados no comércio interestadual de bens e serviços
da Região Nordeste – 2006 - (Em R$ milhões)
Estados Entradas Part. (%) Saídas Part. (%) SaldoMaranhão 14.962 8,93 7.821 5,71 -7.141
Piauí 6.818 4,07 1.481 1,08 -5.338
Ceará 25.778 15,39 17.927 13,08 -7.850
Rio Grande do Norte 16.649 9,94 8.564 6,25 -8.085
Paraíba 17.856 10,66 13.100 9.56 -4.756
Pernambuco 26.872 16,05 26.950 19,66 79
Alagoas 5.791 3,46 4.035 2,94 -1.757
Sergipe 4.725 2,82 4.806 3,51 81
Bahia 48.005 28,67 52.373 38,21 4.369
Nordeste 167.456 100,00 137.056 100,00 -30.400
Fonte: GARCIA, Odair Lopes; AMARAL FILHO, Jair do. Relações comerciais do Nordeste com o Brasil e o mundo. In: Cadernos do Desenvolvimento, v. 7, n. 11. Rio de Janeiro: Centro Internacional Celso Furtado, 2013, p.28.
Quando se examina a rede urbana brasileira, vê-se, pela tabela abaixo,
que Fortaleza, Recife e Salvador possuem grandes áreas de influência. A de
Fortaleza abrange, além do Ceará, Piauí e Maranhão, a área do Rio Grande
do Norte, que compartilha com Recife; a de Recife compreende, afora Per-
nambuco, Paraíba e Alagoas e mais a área do Rio Grande do Norte dividida
602
com o Ceará; e a de Salvador, a Bahia e Sergipe, dividindo o comando de
parte do oeste da Bahia com Brasília29.
Rede urbana brasileira – Dimensões das redes de primeiro nível
Metrópoles (1) População % do PIB nacional
PIB per capita: rede/
Brasil
Nº de municí-pios
Área em km²
São Paulo 51.020.582 40,57 144,7 1.028 2.279.108,45
Rio de Janeiro 20.750.595 14,39 127,6 264 137.811,66
Brasília 9.680.621 6,91 131,4 298 1.760.733,86
Manaus 3.480.028 1,68 88,8 72 1.617.427,98
Belém 7.686.082 2,02 48,5 161 1.389.659,23
Fortaleza 20.573.035 4,47 40,0 786 792.410,65
Recife 18.875.595 4,71 45,9 666 306.881,59
Salvador 16.335.288 4,89 55,1 486 589.229,74
Belo Horizonte 16.745.821 7,47 82,1 698 483.729,84
Curitiba 16.178.968 9,87 112,3 666 295.024,25
Porto Alegre 15.302.496 9,74 117,1 733 349.316,91
Goiânia 6.408.542 2,80 80,5 363 835.783,14
Fonte: IBGE, Contagem da População 2007; Área territorial oficial. Rio de Janeiro: IBGE, [2007]. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/geociencias/cartografia/default_territ_area.shtm>. Acesso em: mar. 2008. Nota: Metrópoles são os 12 principais centros urbanos do País, que se caracterizam por seu grande porte e por fortes relacionamentos entre si, além de, em geral, possuírem extensa área de influência direta. O conjunto foi dividido em três subníveis, segundo a extensão territorial e a intensidade destas relações: a. Grande metrópole nacional – São Paulo, o maior conjunto urbano do País; b. Metrópole na-cional – Rio de Janeiro e Brasília. Juntamente com São Paulo, constituem foco para centros localizados em todo o País; e c. Metrópole – Manaus, Belém, Fortaleza, Recife, Salvador, Belo Horizonte, Curitiba, Goiânia e Porto Alegre.
29 IBGE, Contagem da População 2007; Área territorial oficial. Rio de Janeiro: IBGE, [2007]. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/geociencias/cartografia/default_territ_area.shtm>. Acesso em: mar. 2008.
603RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
Como se pode observar, o grande desafio será remover os obstáculos à
maior integração intra e interregional, em benefício do desenvolvimento do
País, da região e de cada um dos seus estados.
604
ANEXO V
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988: ASPECTOS REGIONAIS
TÍTULO I - Dos Princípios FundamentaisArt. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;
TÍTULO III - Da Organização do Estado
CAPÍTULO II - DA UNIÃOArt. 21. Compete à União:IX - elaborar e executar planos nacionais e regionais de ordenação do território e de de-
senvolvimento econômico e social;
CAPÍTULO III - DOS ESTADOS FEDERADOSArt. 25. Os Estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem, obser-vados os princípios desta Constituição.§ 3º - Os Estados poderão, mediante lei complementar, instituir regiões metropolitanas, aglo-merações urbanas e microrregiões, constituídas por agrupamentos de municípios limítrofes, para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum.
CAPÍTULO VII - DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICASeção IV - DAS REGIÕES
Art. 43. Para efeitos administrativos, a União poderá articular sua ação em um mesmo com-plexo geoeconômico e social, visando a seu desenvolvimento e à redução das desigualdades regionais.§ 1º - Lei complementar disporá sobre:I - as condições para integração de regiões em desenvolvimento;II - a composição dos organismos regionais que executarão, na forma da lei, os planos
regionais, integrantes dos planos nacionais de desenvolvimento econômico e social, aprovados juntamente com estes.
§ 2º - Os incentivos regionais compreenderão, além de outros, na forma da lei:
605RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
I - igualdade de tarifas, fretes, seguros e outros itens de custos e preços de responsabi-lidade do Poder Público;
II - juros favorecidos para financiamento de atividades prioritárias;III - isenções, reduções ou diferimento temporário de tributos federais devidos por pes-
soas físicas ou jurídicas;IV - prioridade para o aproveitamento econômico e social dos rios e das massas de água
represadas ou represáveis nas regiões de baixa renda, sujeitas a secas periódicas. § 3º - Nas áreas a que se refere o § 2º, IV, a União incentivará a recuperação de terras áridas e cooperará com os pequenos e médios proprietários rurais para o estabelecimento, em suas glebas, de fontes de água e de pequena irrigação.
TÍTULO IV - Da Organização dos Poderes
CAPÍTULO I - DO PODER LEGISLATIVO
Seção II - DAS ATRIBUIÇÕES DO Congresso NacionalArt. 48. Cabe ao Congresso Nacional, com a sanção do presidente da República, não exigida esta para o especificado nos arts. 49, 51 e 52, dispor sobre todas as matérias de competência da União, especialmente sobre:IV - planos e programas nacionais, regionais e setoriais de desenvolvimento;
TÍTULO VI - Da Tributação e do Orçamento
CAPÍTULO I - DO SISTEMA TRIBUTÁRIO NACIONAL
Seção II - DAS LIMITAÇÕES DO PODER DE TRIBUTARArt. 151. É vedado à União:I - instituir tributo que não seja uniforme em todo o território nacional ou que implique
distinção ou preferência em relação a Estado, ao Distrito Federal ou a Município, em detrimento de outro, admitida a concessão de incentivos fiscais destinados a promo-ver o equilíbrio do desenvolvimento sócio-econômico entre as diferentes regiões do País;
Seção VI - DA REPARTIÇÃO DAS RECEITAS TRIBUTÁRIASArt. 159. A União entregará:
606
I - do produto da arrecadação dos impostos sobre renda e proventos de qualquer natu-reza e sobre produtos industrializados, quarenta e sete por cento na seguinte forma:
a) vinte e um inteiros e cinco décimos por cento ao Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal;
b) vinte e dois inteiros e cinco décimos por cento ao Fundo de Participação dos Municí-pios;
c) três por cento, para aplicação em programas de financiamento ao setor produtivo das Regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste, através de suas instituições financeiras de caráter regional, de acordo com os planos regionais de desenvolvimento, ficando as-segurada ao Semiárido do Nordeste a metade dos recursos destinados à Região, na forma que a lei estabelecer;
CAPÍTULO II - DAS FINANÇAS PÚBLICAS Seção I - NORMAS GERAIS
Art. 163. Lei complementar disporá sobre:VII - compatibilização das funções das instituições oficiais de crédito da União, resguar-
dadas as características e condições operacionais plenas das voltadas ao desenvolvi-mento regional.
Seção II - DOS ORÇAMENTOSArt. 165. Leis de iniciativa do Poder Executivo estabelecerão:§ 1º - A lei que instituir o plano plurianual estabelecerá, de forma regionalizada, as diretrizes, objetivos e metas da administração pública federal para as despesas de capital e outras delas decorrentes e para as relativas aos programas de duração continuada.§ 4º - Os planos e programas nacionais, regionais e setoriais previstos nesta Constituição serão elaborados em consonância com o plano plurianual e apreciados pelo Congresso Nacional.§ 6º - O projeto de lei orçamentária será acompanhado de demonstrativo regionalizado do efeito, sobre as receitas e despesas, decorrente de isenções, anistias, remissões, subsídios e benefícios de natureza financeira, tributária e creditícia.§ 7º - Os orçamentos previstos no § 5º, I e II, deste artigo, compatibilizados com o plano plu-rianual, terão entre suas funções a de reduzir desigualdades interregionais, segundo critério populacional.Art. 166. Os projetos de lei relativos ao plano plurianual, às diretrizes orçamentárias, ao or-çamento anual e aos créditos adicionais serão apreciados pelas duas Casas do Congresso Nacional, na forma do regimento comum.§ 1º - Caberá a uma Comissão mista permanente de Senadores e deputados:II - examinar e emitir parecer sobre os planos e programas nacionais, regionais e seto-
riais previstos nesta Constituição e exercer o acompanhamento e a fiscalização orça-mentária, sem prejuízo da atuação das demais comissões do Congresso Nacional e de suas Casas, criadas de acordo com o art. 58.
607RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
TÍTULO VII - Da Ordem Econômica e Financeira
CAPÍTULO I - DOS PRINCÍPIOS GERAIS DA ATIVIDADE ECONÔMICA
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, obser-vados os seguintes princípios:VII - redução das desigualdades regionais e sociais;
CAPÍTULO IV - DO SISTEMA FINANCEIRO NACIONALArt. 192. O sistema financeiro nacional, estruturado de forma a promover o desenvolvimento equilibrado do País e a servir aos interesses da coletividade, será regulado em lei complemen-tar, que disporá, inclusive, sobre:§ 2º - Os recursos financeiros relativos a programas e projetos de caráter regional, de respon-sabilidade da União, serão depositados em suas instituições regionais de crédito e por elas aplicados.
TÍTULO VIII - Da Ordem Social
CAPÍTULO III - DA EDUCAÇÃO, DA CULTURA E DO DESPORTO
Seção II - DA CULTURAArt. 215. O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fon-tes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais.§ 3º A lei estabelecerá o Plano Nacional de Cultura, de duração plurianual, visando ao de-senvolvimento cultural do País e à integração das ações do poder público que conduzem à: (Incluído pela Emenda Constitucional nº 48, de 2005)V -valorização da diversidade étnica e regional. (Incluído pela Emenda Constitucional nº
48, de 2005)
CAPÍTULO IV - DA CIÊNCIA E TECNOLOGIAArt. 218. O Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento científico, a pesquisa e a ca-pacitação tecnológicas.§ 2º - A pesquisa tecnológica voltar-se-á preponderantemente para a solução dos problemas brasileiros e para o desenvolvimento do sistema produtivo nacional e regional.
608
CAPÍTULO V - DA COMUNICAÇÃO SOCIALArt. 221. A produção e a programação das emissoras de rádio e televisão atenderão aos se-guintes princípios:II - promoção da cultura nacional e regional e estímulo à produção independente que
objetive sua divulgação;
CAPÍTULO VI - DO MEIO AMBIENTEArt. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.§ 4º - A Floresta Amazônica brasileira, a Mata Atlântica, a Serra do Mar, o Pantanal Mato--Grossense e a Zona Costeira são patrimônio nacional, e sua utilização far-se-á, na forma da lei, dentro de condições que assegurem a preservação do meio ambiente, inclusive quanto ao uso dos recursos naturais.
TÍTULO X - ATO DAS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS
Art. 34. O sistema tributário nacional entrará em vigor a partir do primeiro dia do quinto mês seguinte ao da promulgação da Constituição, mantido, até então, o da Constituição de 1967, com a redação dada pela Emenda nº 1, de 1969, e pelas posteriores.§ 10 - Enquanto não entrar em vigor a lei prevista no art. 159, I, «c», cuja promulgação se fará até 31 de dezembro de 1989, é assegurada a aplicação dos recursos previstos naquele dispo-sitivo da seguinte maneira:I - seis décimos por cento na Região Norte, através do Banco da Amazônia S.A.;II - um inteiro e oito décimos por cento na Região Nordeste, através do Banco do Nor-
deste do Brasil S.A.;III - seis décimos por cento na Região Centro-Oeste, através do Banco do Brasil S.A.
§ 11 - Fica criado, nos termos da lei, o Banco de Desenvolvimento do Centro-Oeste, para dar cumprimento, na referida região, ao que determinam os arts. 159, I, «c», e 192, § 2º, da Cons-tituição.Art. 35. O disposto no art. 165, § 7º, será cumprido de forma progressiva, no prazo de até dez anos, distribuindo-se os recursos entre as regiões macroeconômicas em razão proporcional à população, a partir da situação verificada no biênio 1986-87.§ 1º - Para aplicação dos critérios de que trata este artigo, excluem-se das despesas totais as relativas:I - aos projetos considerados prioritários no plano plurianual;II - à segurança e defesa nacional;III - à manutenção dos órgãos federais no Distrito Federal;IV - ao Congresso Nacional, ao Tribunal de Contas da União e ao Poder Judiciário;
609RELATÓRIO INTEGRA BRASIL - FÓRUM NORDESTE NO BRASIL E NO MUNDO
V - ao serviço da dívida da administração direta e indireta da União, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público federal.
Art. 40. É mantida a Zona Franca de Manaus, com suas características de área livre de co-mércio, de exportação e importação, e de incentivos fiscais, pelo prazo de vinte e cinco anos, a partir da promulgação da Constituição.
Parágrafo único. Somente por lei federal podem ser modificados os critérios que discipli-naram ou venham a disciplinar a aprovação dos projetos na Zona Franca de Manaus.Art. 42. Durante quinze anos, a União aplicará, dos recursos destinados à irrigação:Art. 42. Durante 25 (vinte e cinco) anos, a União aplicará, dos recursos destinados à irrigação: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 43, de 15.4.2004)I - vinte por cento na Região Centro-Oeste;II - cinquenta por cento na Região Nordeste, preferencialmente no Semiárido.
Diagramada e Editada pela E2 Estratégias Empresariais no calor nordestino do Ceará.Composta pela família tipográfica GrotesqueMT.
Impresso em papel offset 75g (miolo) e cartão supremo (capa) na Gráfica e Editora Tiprogresso.Fortaleza, Ceará, Brasil, Janeiro de 2014.
Esta obra é resultado da compilação dos debates empreendidos durante os eventos realizados pelo Integra Brasil. A linguagem adotada procurou preservar ao máximo as transcrissões feitas,
cujos originais estão em poder da coordenação técnica do movimento.
20140204_cic_int_brasil_capa_42,2x21cm_VolumeI_CURVAS.indd 1 04/02/14 15:34