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Page 1: IINOICE I as mulheres pobres recorram ao sistema público de saúde. Ao propor a descriminalização, meu objetivo é fazer com que o aborto seja raro e seguro " o senhor também defende

IINOICE I

54 Donald Trump: bombardeio ê Siris em retaliação 80

ataque qulmlco

• 12 OE ABRIL. 20li

74 A repercussao do assédio do ator José Mayer à figurinista Susllem Tonanl

12 Carta ao leitor 17 Entrav1st8 Lufs Roberto Barroso

24 Leitor 28 Detas 30 Imagem da Semana 32 Conversa com Matheus Gomes

de luca ~ 34 SobeDesce 34 AUsta 37 Sensacionalista

38 Radar 42 Val.Essa 44 Leva-Jato A Odebrecht

relata um novo pagamento

de propina ao ministro

ElIseu Padilha

48 justiça O Julgamento Que pode

dar em nada

110 Conaresso O Uder do PMDB

na Senado decide fazer opoSição

ao governo do ?MOS

51 Dora Kramar

TJOFT BIBLlOTE'CA i

',1':;."--0 [··:tr. t j ? -. ~l~~i\~ i

52 Partidos Os estilhaços das

investigaçOes no alto tucanato

54 Siri. Trump entra com força

no conflito

58 Economia O fim do Ciência

sem Frontei ras 62 A inflação, depois de sete anos,

volla à meta 63 André Lahóz Mendonça

de Barros

84 Educação A 8ase Nacional

Curricular sai do papel

87 Claudio da Mour. eaatro 88 Ollmplada A prlsao de

dirigentes das modalidades

aquáticas evidencia a crise de

gestao do esporte nacional t® 74 Especial O caso José Maver tira

o assédio sexual das sombras tE. 82 Genta 84 Transporte As ameaças ao

futuro do Uber ~ 88 C .... cl. Como as novas

tecnologias têm ajudado

arqueólogos a desvendar

o passado da humanidade ~ 92 Pqlna Aberta Thiago Signorini

Gonçalves

94 PerfIl A verdadeira Bibi Perigosa ~ 88 S.6d. Nova plataforma facilita

o acesso de quem quer participar

de estudos clfnicos no paIs

97 Ambiente Levantamento mostra que o Brasil é o campeao mundial em diversidade de árvores

98 Primei,.. Pessoa Nailor Proveta

100 Televlsio Fiv. Came Back, série da Netflix sobre cinco

cineastas que fizeram

documentários na 11 Guerra t% 104 Uvroa Pelos Caminhos do Rock,

de Eduardo AraújO ~ 106 CInema Despedida em Grande

Estilo, com Michael Caine ~ 107 Joio Cezar de Castro Rocha 108 VEJA Recomenda ~ 109 Os livras mais vendidos

110 l.R. Guzzo

I! AGNEWS,FELlPE.PA.NFILI; l.FP PJo!OTO·.,iIM WATSON

Tiragem 961531 exemplares

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ENTREVISTA luís ROBERTO BARROSO

o ministro do STF diz que a Lava-Jato corre grande risco de acabar sem punir os pollticos envolvidos e explica por que defende a descriminalização do aborto e de drogas como a maconha

A OPERAÇÃO LAVA-JATO periga não alcançar os políticos com o mesmo efeito avassalador que pôs na cadeia empresários e outros protagonistas do petrolão investigados e processados em Curitiba. Quem faz o alerta é o ministro Lnis Roberto Barroso, um dos onze in­tegrantes do Supremo Tribunal Fede­ral. Há três aoos e meio na corte, aonde cbegou por escolha da ex-presidente Dilma Rousseff,o ministro diz que há um "risco real" de os ministros, deputa­dos e sen~res investigados em Brasí­lia escaparem ilesos do maior escânda-

'C C~ IST!A~O WAI:i!l

RODRIGO RANGEL

lo de corrupção da históna. O motivo? O foro privilegiado, que. segundo ele, só serve para fomentar a cultura de impu­nidade reinante no pais. Apesar do prognóstico, Barroso se diz esperanço­so com a "mudança de paradigma" tra­zida pela Lava-Jato - e até arrisca di­zer que o Brasil está diante de uma oportunidade sem igual de vencer a corrupção. O ministro falou a VEJA às vésperas de viajar para os Estados Uni­dos para uma palestra na Universidade Harvard sobre "ética e o jeitinho brasi­leiro" A seguir, sua entrevista.

Tempos atrás, o senhor disse que o veredicto do mensalAo foi um ponto fora da curva. A Lava-Jato pode se­guir o mesmo caminho? O mensalão foi um ponto fora da curva porque pe­la primeira vez a Justiça brasileira conseguiu punir atores públicos e pri­vados que praticaram crimes políticos e econômicos. Ali se iniciou wna mu­dança de paradigma, depois retomada e aprofundada pela Lava-Jato. Essa operação representa uma mudança de paradigma na impunidade, na leniên­cia e no compadrio que tradicional-

12 DE ABRIl. 2017 17

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I ENTREVISTA Luís ROBERTO BARROSO

mente existiram no Brasil. A Serieda­de que a operação está imprimindo aos crimes de colarinho-branco já co­meça a ser replicada pelo pais afora. Esses rapazes (re{ere-se aos integran­tes da (orça-tarefa) estão fazendo uma revolução no Brasil, dentro da Consti­tuição e das leis.

A operaç/lo jé tem três anos e Inúme­ras condenações nas InstAncias In­feriores, mas nc STF nenhum poI/tIco foi punido até hoje, Eu penso que há um risco real de que isso não ocorra.

Risco de que nlIo haja punlÇAo? O fo­ro privilegiado foi criado para dar uma certa proteção institucional à au­toridade. Talvez a intenção pudesse ser legitima, mas no mundo real se tornou ilegítima por produzir impuni­dade. Isso precisa ser mudado. Ou por emenda à Constituição, que restrinja o foro privilegiado a algumas poucas autoridades. Ou, enquanto isso não acontecer, deve ser restringido por in­terpretação do Supremo. Eu propo­nho limitá-lo aos atos praticados pelo parlamentar em razão do cargo. O que não tem a ver com o mandato parla­mentar não seria competência do Su­premo. Isso já representaria redução de 93% dos processos.

Por que o STF e a Procuradorla-Geral da República nAo criam uma força­tarefa, corno existe em Curitiba, pe­ra agilizar os processos da Leva­Jato e evitar o risco de Impunidade? Acho que o problema está mais a5>O­ciado ao modelo de procedimentos aqui lia corte do que propriamente à falta de recursos humanos. Existem muitas etapas, os procedimentos ;ão lentos. Tem a ver com o modo como é disciplinado o processo, e isso é defi­nido por lei. Não é um problema de mão de obra.

18 12 DE ABRIL. 2017

IIÉ impossível não sentir

vergonha do que aconteceu no Brasil. É a

revelação de um país feio, triste e ~esonesto. E preciso

requalificar a política"

o protagonlsmo do juiz Sergio Moro é alvo de muitos alogios, mas também de algumas criticas. Ele é um juiz sé­rio, ;obrio. que não ;e deixou contami­nar pela celebridade. Pelo contrário. Ele e o grupo em geral, promotores e policiais. Acho que já houve erros, já houve maus momentos, mas numa operação que já dura três anos, fiscali­zada pelos melhores advogados do país e por toda a imprensa, se contam nos dedos de uma mão os erros come­tidos. Acho que ninguém dirá que os erros são uma característica dessa operação. Pelo contrário, a caracterÍS­tica é a mudança no paradigma de im­punidade que se tem no Brasil.

o que se pode esperar dassa inédita exposição das entranhas da polltlca tradicional? Alguém imaginava que os partidos se engalfmhavam para in­diear diretores nas estatais para que eles fizes;em coisas boas? Sabíamos para o que era. E mesmo assim nós

nos surpreendemos com a extensão e a profundidade da corrupção no Bra­sil. A corrupção adquiriu níveis es­pantosos e endêmicos. Foi um fenô­meno generalizado, tornou-se um modo de vida para Ufi; e um meio de negócio para outros. Onde você des­tampa, há coisas erradas. É impossí­vel não sentir vergonha do que acon­teceu no Brasil. É a revelação de um pais feio, triste e desonesto. Mas essa revelação é o que nos permitirá mudar de patamar na história. É preciso re­qualificar a política.

Neste exato momento. há várias ani­culaçães em andamento no Con­

gresso pt!ra anistiar os parlamenta­

res que cometeram crimes. ~luitas gerações têm procurado enfrentar a dificuldade que a elite brasileira tem de condenar seus parceiros de mesa, os seus iguais. As pessoas que fre­quentam os mesmos banquetes não se condenam entre si. Precisamos criar a cultura da igualdade, da justiça. VaIe para os que têm medo de ser punidOS e para os que se queixam que vão ter de ser honestos daqui para a frente. A im­punidade e o compadrio nos trouxe­ram a este país devastado pela cor­rupção. A sociedade e a imprensa bra­sileira têm um grau de maturidade que dificulta certos arranJos.

NOjulgamento do mensalão. o senhor disse que lamentava condenar o ex­

deputado José Genoino porque ele

não enriqueceu na vida pública. Eu disse aquilo porque venho de uma ge­ração que resistiu à ditadura militar, e para essa geração algumas pessoas simbolizavam a resistência. Quando essas pessoas foram Oagradas nas práticas que elas e toelos nós condená­vamos, aquilo me trouxe certa frus­tração. Eu não repetiria aquela decla­ração. Quando digo que não repetiria,

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é porque aquilo, descobrimos agora, não foi um incidente, uma casuali­dade. Era um modo de fazer política.

o Supremo com frequência é acusa­

do de praticar ativismo judicial, usur­

pando a competência do Congresso.

A corte tem se excedido? Esse é um fenômeno mundial. Desde a Il Guer­ra, as democracias do mundo assisti­ram a uma significativa ascensão polí­tica do Judiciário. A palavra ativismo assumiu conotação negativa. Mas a atuação mais expansiva do Judiciário é legítima em alguns casos. Ê legíti­ma, por exemplo, para proteger as re­gras do jogo democrático e para pro­teger direitos fundamentais. A deci­são que permitiu a união homoafetiva foi para atender a um direito funda­mental. As pessoas têm direito de co­locar seu afeto e sua sexualidade onde mora seu desejo. Es;e é um direito fundamental, que não pode depender da vontade das maiorias.

A prOibição do financiamento eleito­

ral privado não deveria ser uma deci­são do Congresso? Também fOI uma decisão moralizadora. Eu atéconside­ro essa uma decisão política que cabe­ria ao Congresso. Mas o modelo era inconstitucional, por violar princípios mínimos de decêncIa politica e morali­dade. Por exemplo, a empresa podia tomar dinheiro emprestado do BNDES e financiar o candidato de sua prefe­rência. Usava dinheiro de todo braSI­leiro para atender a seus interesses. Is­so é uma imoralidade.

A reforma da Previdência . em dis·

cussão no Congresso. certamente vai desaguar no Supremo. Qual ê a

sua opinião a respeito? Não se trata de uma opção filosófica ou ideoló­gica. É uma questão de aritmética e de justiça intergeracionaL Se não nos

sacrificarmos um pouco agora, en­tregaremos um pais devastado a nos­sos filhos.

Por que o senhor defende a descri­

minalização de drogas como a ma­

conha? A guerra contra as drogas fracassou no mundo inteiro. O que eu proponho é tratar a maconha co­mo se trata o CIgarro, como um pro­duto lícito, altamente regulado, proi­bido para menores, com restriçóes à publicidade. Esse foi o tratamento que se deu ao cigarro, e sabe o que aconteceu? Nas últimas décadas, o porcentual da população adulta que fuma caiu de 34% para 15%, ao pas­so que o consumo de drogas s6 au­mentou. Não posso garantir que essa política relativa à maconha vá dar certo. Mas, se der, eu certamente co­gitaria estender a descriminalização à cocaína.

liA criminalização do aborto impede que as mulheres pobres recorram

ao sistema público de saúde.

Ao propor a descriminalização,

meu objetivo é fazer com

que o aborto seja raro e seguro "

o senhor também defende a descriml­nalização do aborto. O aborto é uma coisa ruim, e portanto eu sou contra o aborto, e acho que o papel do Estado e da sociedade é evitar que ele ocorra. Mas a criminalização não produz ne­nhum impacto relevante sobre o núme­ro de abortos que são realizados. A cri­mínalização só impede que ele seja feito de forma legal. No BraSIl, são praticados aproximadamente 500000 abortos por ano, com cerca de ISO 000 íntercorrên­cias que vão da morte à mutilação. A cri­minalização impede que as mulheres pobres recorram ao sistema público de saúde. É uma política que discrimina e penaliza as mulheres pobres pa-que. da classe média para cima, todo mundo sa­be qual é o remédio e aonde ir para rea­lizar o procedimento. Ao propor a des­criminalização, meu objetivo é fazer com que o aborto S(!ja raro e seguro.

Como o senhor define ojeitinho brasi­

leiro, tema de sua palestra em Har­

vard? Esse é um termo genérico que identifica muitos compa'lamentos, q,te vão desde o uso do charme até a cor­rupção pura e simples. Alguns com­pOrtamentos são positivos ou inofensi­vos, como afetividade e uma certa le­veza de ser, mas essa faceta é ampla­mente superada pelos aspectos negati­vos: o improviso, a incapacidade de planejar as coisas e de executá-las nos prazos, a dificuldad.e de cumprir a pa­lavra, o costume de colocar sentimen­tos pessoais acima do cumprimento dos deveres e obrigações, a relação di­fícil com a leI, a sensação de que a lei é só para os outros. E dai vêm práticas como furar a fila, estacionar na calça­da, fazer as coisas fora do prazo. O jei­tinho vai numa curva descendente, vai da quebra de certas normas sociais à violação da le~ como pagar propina. É um fenômeno negativo que precisamos derrotar no processo civilizatório. _

12DEABRIL .2D~7 1.


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