GRANDES LINHAS ESTRUTURAIS DO SISTEMA
JURÍDICO
(Baptista Machado, págs. 63 – 77)
As grandes divisões do Direito
O domínio do Direito compreende a vida social do homem, a sua
função ordenadora abrange todos os domínios sociais, toda a
actividade humana que tenha ou possa ter implicações no se
“envolvimento” social. Não admira por isso que sejam inúmeras as
normas legisladas em vigor. O mais importante, portanto, é adquirir a
“competência” para desenvolver um pensamento jurídico autónomo e
para saber trabalhar com as leis – incluindo as novas leis que estão a
ser editadas todos os dias. Para tanto carece de ter quadros gerais
que lhe permitam compreender e ordenar sistematicamente o
material legislativo.
Direito Objectivo e direitos subjectivos
Direito Objectivo: corpo ou complexo de regras gerais e abstractas
que organizam a vida em sociedade sob os mais diversos aspectos e
que, designadamente, definem o estatuto das pessoas e regulam as
relações entre elas.
Direitos Subjectivos: aquelas posições de privilégio (direitos),
faculdades ou poderes que, por aplicação das regras de direito
objectivo, são atribuídos a pessoas determinadas, uma vez
verificados certos eventos (factos jurídicos em sentido lato) previstos
naquelas mesmas regras.
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Ramos do direito (objectivo).
Acontece que as normas que regulam as diferentes matérias ou se
reportam às diferentes áreas institucionalizadas da vida social
tendem a constituir diversos subconjuntos normativos organizados
em torno de certos princípios comuns e de certas técnicas
regulamentadoras que lhes conferem uma relativa especificidade.
Temos, então, os vários ramos do direito.
“Summa divisio”: Direito Público e Direito Privado
A divisão suprema tradicional do universo jurídico é aquela que
distingue entre Direito Público e Direito Privado. Trata-se de uma
distinção para a qual não foi achado até hoje um critério
absolutamente satisfatório e de uma distinção que continua a ser
polémica. Para abreviar, diremos que, de todos os critérios de
distinção propostos, o mais divulgado e aquele que se revela o mais
praticável e susceptível de menos reparos é o chamado “critério da
posição dos sujeitos”
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Nos termos deste critério, o direito público caracteriza-se pelo facto de, nas relações por
ele reguladas, se verificar o exercício de um poder de autoridade pública. Assim, seriam
de direito público aquelas normas que regulam a organização e a actividade do Estado e
de outros entes públicos menores (autarquias regionais e locais), as relações desses
entes públicos entre si no exercício dos poderes que lhe competem, bem como as
relações dos entes públicos enquanto revestidos de poder de autoridade (revestidos de
publica potestas) com os particulares.
Relações de direito público entre os entes públicos e os particulares = relações de
desigualdade
Órgão do ente público actua no exercício do seu imperium,
e os particulares numa posição subordinada.
Direito Privado: Normas que regulam as relações em que as partes aparecem numa
posição de igualdade ou paridade. Regulam, portanto, as relações entre os particulares,
ou entre os particulares, ou entre os particulares e os entes públicos quando estes não intervenham
nelas revestidos de um poder de autoridade, mas em pé de igualdade cm os particulares.
Assim nenhuma das partes aparece na posição de supremacia de autoridade pública =
relação de paridade ou de coordenação.
Daqui decorre que os entes públicos podem estabelecer com os particulares relações
Ramos do direito público
a) Direito Constitucional : direito que se ocupa da organização do
Estado e das linhas da organização dos entes públicos menores,
dos órgãos de soberania e da repartição dos poderes entre eles,
e bem assim da garantia dos direitos fundamentais, fixando, ao
mesmo tempo, as traves mestras do ordenamento jurídico da
comunidade. Constituição = Lei Fundamental.
b) Direito Administrativo : é o conjunto de normas que disciplina a
organização e a actividade da Administração Pública.
c) Direito Penal: é constituído pelo complexo de normas que
regulam os crimes e as penas, e bem assim as medidas de
segurança a que estão sujeitos os infractores cuja perigosidade
subsiste para além do cumprimento da pena ou aqueles que,
sendo inimputáveis, são todavia socialmente perigosos.
d) Direito Fiscal : Trata-se de um sub-ramo do Direito Financeiro,
com particular relevância prática. O Direito Financeiro é
constituído pelo complexo de normas que regulam a recolha, a
gestão e a aplicação ou dispêndio dos meios financeiros
públicos, meios estes provenientes dos impostos e taxas, das
receitas patrimoniais e dos empréstimos públicos. De entre este
complexo de normas podemos destacar uma subconjunto
constituído por aquelas que regulam a obtenção dos impostos e
taxas de montante autoritariamente fixado por entes dotados
de poder de império – o direito tributário. Como ramo deste
último, temos o Direito Fiscal, constituído por aquelas normas
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particulares, ou entre os particulares e os entes públicos quando estes não intervenham
nelas revestidos de um poder de autoridade, mas em pé de igualdade cm os particulares.
Assim nenhuma das partes aparece na posição de supremacia de autoridade pública =
relação de paridade ou de coordenação.
Daqui decorre que os entes públicos podem estabelecer com os particulares relações
que regulam a incidência (determinação da matéria colectável),
o lançamento e a cobrança dos impostos.
e) Direito Processual (civil, penal, do trabalho, administrativo e
fiscal): As regras processuais são designadas por normas de
direito adjectivo [do direito substantivo] (ou processual) =
complexo de normas que regulam o processo, ou seja, o
conjunto de actos realizados pelos tribunais e pelos particulares
que perante eles actuam ou litigam durante o exercício da
acção jurisdicional.
f) Direito Internacional Público (Direito das Gentes) : complexo de
normas que regula as relações entre Estados (ou entre Estados
e outras entidades soberanas: Santa Sé, Soberana Ordem de
Malta). Admite-se hoje que outras organizações que não
Estados possam ser sujeitos de Direito Internacional e vai-se
mesmo ao ponto de admitir que, em certas hipóteses o possam
ser os próprios indivíduos. É um direito de fonte supra-estadual.
O DIP ou é de fonte consuetudinária (costume internacional) ou
é de fonte convencional (tratados e convenções entre os
Estados) e os princípios gerais de direito comuns às nações
civilizadas. Art.º 8.º CRP, n.º 1 (fazem parte integrante do
direito português); n.º 2 (vigoram na ordem interna apões a sua
publicação oficial e enquanto vincularem internacionalmente o
Estado português.
Ramos do Direito Privado
Define-se como o conjunto de normas reguladoras das relações entre
simples particulares ou das relações entre estes e o Estado ou outros
entes públicos, desde que tais entes públicos intervenham nas ditas
relações despidos do seu imperium.
a) Direito Civil : é o direito privado comum ou direito-regra, cujo
campo de acção se estende potencialmente, portanto, a todas
as relações de direito privado, salvo aquelas ou os aspectos
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daquelas que se tornam objecto de um direito especial. Nele se
contêm as normas que regulam designadamente, a condição
normal das pessoas (estatuto pessoal) e dos bens (estatuto
real), assim como o intercâmbio de bens e serviços (estatuto
contratual) É o tronco comum do direito privado. Deste
tronco destacam-se direitos privados especiais. O Direito Civil
aparece-nos subdividido (no CC) em:
- Direito das Obrigações, que regula o
tráfico de bens e serviços e a reparação dos danos e têm
por instituição fundamental o contrato como forma por
excelência de expressão da autonomia privada;
- Direito das Coisas, cuja instituição central
é a propriedade;
- Direito da Família, no qual se regula a constituição
da família e as relações que dentro dela se estabelecem;
- Direito das Sucessões, que regula a sucessão por morte
nos bens do defunto, sucessão essa que, consoante o título de
vocação sucessória, testamentária, legitimaria e legítima.
b) Direito Comercial : trata-se de um direito privado especial;
conjunto de normas que regulam os actos de comércio, quer
subjectivamente, quer objectivamente comerciais. É aqui que
se estudam as sociedades comerciais e os contratos comerciais,
as letras, livranças e cheques e outros títulos de crédito.
c) Direito Internacional Privado : é o direito que resolve os conflitos
de leis de direito privado no espaço ou regula as situações da
vida privada internacional.
Outros ramos do Direito e novos ramos de Direito
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Ao falarmos acima dos principais ramos de direito omitimos certos
complexos normativos de Direito Público que gozam de acentuada
autonomia, designadamente, Direito dos Registos e Notariado.
Quanto ao Direito de Autor (regula os direitos sobre as obras
intelectuais, literárias e artísticas) é um dos ramos do Direito Civil.
Quanto ao direito agrário, é um direito privado especial, emoldurado
por importantes normas de direito público.
Quanto ao Direito do Trabalho, a sua caracterização como ramo do
Direito Privado ou como ramo do Direito Público parece inviável. Por
um lado ele aparecer-nos-ia, á primeira vista, como um direito
privado especial, na medida em que especifica o Direito das
obrigações ao regular o contrato individual de trabalho. Mas, por
outro lado, quando olhamos à regulamentação das relações
colectivas de trabalho, e bem assim à política de protecção ao
trabalhador que inspira todas estas normas, notamos que já se não
está no mero âmbito das relações do direito privado. Fica num meio
termo, portanto (há quem diga que é “direito social”).
Caminha-se para a sistematização de um Direito de Segurança Social,
que tende a abranger toda a população.
Quanto ao Direito Económico, é discutida a sua autonomia.
Quanto ao Direito Canónico, trata-se de um direito não estadual que
rege a comunidade da Igreja Católica.
Refira-se, por último, o Direito Comunitário. Este, relativamente aos
Estados membros não é, pois, um direito estrangeiro, mas um
sistema normativo procedente de uma autoridade supranacional, no
qual o ordenamento do Estado parcialmente se integrou.
Actos comunitários:
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- Regulamento: Pelo que respeita ao problema da hierarquia das
fontes, dir-se-á que a norma comunitária não está subordinada às
fontes de direito interno, pois situa-se no vértice daquela hierarquia,
em posição paralela à das normas constitucionais. Deve, porém,
dizer-se que tal norma não pode afectar os direitos fundamentais dos
cidadãos.
- Directivas e decisões: diferentemente dos regulamentos, que
contêm normas válidas no âmbito do ordenamento jurídico interno, as
directivas vincula exclusivamente os Estados membros a
prosseguirem determinado escopo através de procedimentos e meios
a escolher por estes. Não têm como destinatários, pois, os cidadãos
dos referidos Estados. As decisões individuais, por seu turno, só
vinculam os respectivos destinatários.
Necessidade de uma interpretação uniforme do Direito Comunitário.
Devido a esta necessidade, criou-se um Tribunal da Comunidade
Europeia.
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