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Nº 03 - MARÇO – AGOSTO 2010

A construção da narrativa no filme publicitário

José Maria Mendes Mestrando do Programa de Pós-graduação em Comunicação da UFPB. E-mail:

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RESUMO

O presente estudo pretende analisar o filme publicitário narrativo, delimitando seu conteúdo enquanto narrativa, através da presença de elementos e de uma estrutura, que caracterizem esta forma específica de conteúdo em publicidade. Este intuito será alcançado através de uma pesquisa exploratória, por meio de um levantamento bibliográfico, que buscará encontrar as interseções entre a narrativa e o contexto da publicidade e, especificamente, do filme publicitário. Analisar a narrativa neste contexto é conhecer o seu potencial como estratégia persuasiva a qual pretende chegar até o consumidor através da emoção que as histórias proporcionam.

Palavras-chave: Narrativa. Publicidade. Filme Publicitário.

INTRODUÇÃO

A publicidade utiliza várias técnicas persuasivas em busca do seu intuito

principal: tornar um produto/serviço conhecido no seu universo de consumo. Não

apenas tornar este produto/serviço conhecido, mas principalmente, persuadir o

consumidor a aderir àquele. Independentemente da variedade de técnicas utilizadas com

este intuito, a maioria das estratégias está incluída diante de dois eixos essenciais: a

razão e a emoção (CARRASCOZA, 2002). Dependendo de fatores inerentes ao próprio

serviço/ produto, ao seu consumidor, e aos objetivos de comunicação, entre outros, o

publicitário se guiará por um ou outro eixo, ou ainda caminhará por ambos, já que não

há exigência de uso exclusivo de apenas razão ou emoção, estes sendo amplamente

intercambiáveis.

Contudo, o presente trabalho não está interessado no potencial da razão como

força de persuasão, mas sim no uso da emoção pela publicidade, mais especificamente

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pela utilização de uma das principais formas de construção através dessa vertente

emotiva: a narrativa.

Embora haja variedade na possibilidade de aplicar a narrativa a diversos

contextos comunicativos em publicidade (televisão, rádio, jornal, cinema, revista, etc), o

filme publicitário1, feito em sua maioria para ser veiculado em televisão, mostra-se

como uma das formas mais constantes de encontrá-la na publicidade. Por este motivo,

ou seja, por o filme publicitário ser uma composição onde a narrativa encontra uma

excelente forma de expressão é que o utilizamos como objeto de pesquisa de nossa

temática.

O objetivo principal deste trabalho é, portanto, analisar o filme publicitário

narrativo, delimitando seu conteúdo enquanto narrativa, através da presença de

elementos e de um modo de estruturar/ construir tal peça de comunicação.

As narrativas de modo geral e dos filmes publicitários, particularmente,

constroem histórias nem sempre reais, mas postas como verossímeis ao deleite do

receptor. Estes se identificam também devido ao fato de a narrativa ser uma forma

comum a todos nós seres humanos.

A narrativa é um veículo natural para a psicologia popular. Ela lida (quase que a partir da primeira fala da criança) com o material da ação e da intencionalidade humana. Ela intermedia entre o mundo canônico da cultura e o mundo mais idiossincrático dos desejos, crenças e esperanças. Ela torna o excepcional compreensível e mantém afastado o que é estranho, salvo quando o estranho é necessário como um tropo. Ela reitera as normas da sociedade sem ser didática. Ela pode até mesmo ensinar, conservar a memória, ou alterar o passado (BRUNER, 1997, p. 52).

A importância do estudo da narrativa, portanto, está em demonstrar uma

maneira de o ser humano de vivenciar e representar a vida. Quer seja lendo um romance

do século XIX, quer seja contando uma piada que aprendeu há poucos minutos, ou

simplesmente assistindo a trinta segundos de apelos emocionais veiculados na televisão

para persuadi-lo através da emoção. O presente trabalho é, portanto, um instrumento de

percepção deste tipo de composição, uma percepção do conteúdo narrativo inerente a

1 A terminologia filme publicitário é aqui referida como sinônimo de comercial televisivo, também chamado de VT. As terminologias VT e filme dizem respeito ao tipo de suporte onde foram gravadas as imagens, se em videoteipe (VT) ou em filme fotográfico, geralmente 35 mm. Porém, neste trabalho não distinguiremos um do outro, devido à forma de gravação não ser o foco do presente estudo.

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uma forma usual e atual de o ser humano vivenciar e representar a sua vida: os filmes

publicitários.

1 O FILME PUBLICITÁRIO

Sob o ponto de vista da força mercadológica, um veículo se destaca por

concentrar mais de metade dos investimentos em publicidade no Brasil: a televisão2.

Esta concentração não é grande apenas por causa dos altos custos de veiculação, mas

também devido ao fascínio que o meio exerce nas pessoas, através "da possibilidade de

uso de mensagens com som, imagens, cores e movimentos" (SAMPAIO, 2002, p. 87).

O filme publicitário é uma das formas mais comuns de apresentação da

publicidade neste meio. "As mensagens publicitárias que a TV veicula são em forma de

comerciais, em sua quase totalidade; e, em pequena escala, no esquema de ações de

merchandising (tie-in) em shows, novelas e séries" (SAMPAIO, 2002, p. 88).

Esse formato de publicidade está enquadrado no que autores como Comparato

(2000), Vanoye e Goliot-Lété (2002) chamam de formas curtas do audiovisual. Estas

são obras que se desenvolvem em um curto espaço de tempo, por isso, têm sua função

essencial colocada em primeiro plano, qualquer que seja esta: As obras fílmicas curtas exibem seus dispositivos (narrativos ou discursivos), sua estrutura dramática e rítmica, a forma-sentido que produz seu impacto de maneira mais evidente que os longas-metragens, isto provavelmente porque a apreensão desses elementos não tem tempo de ser diluída nos meandros de uma história ou distraída pela identificação com personagens ou pelas emoções que, se envolvem, fazem-no de maneira rápida, aguda, como se “precipitassem”. A forma global do filme curto se oferece à percepção e, consequentemente, à análise mais fácil (VANOYE; GOLIOT-LÉTÉ, 2002, p. 114).

Entre os roteiros curtos, como classifica Comparato, estão compreendidos o

curta-metragem, o videoclipe e o filme publicitário. O pouco espaço de tempo para o

desenvolvimento de seu intuito, como visto, é o principal elemento de ligação entre

estas formas. O curta-metragem e o videoclipe são mais flexíveis quanto à totalidade. O

primeiro dura o tempo do desenvolvimento da sua história, que também se precipita

rapidamente, não se distraindo com voltas na história ou desenvolvimento profundo de

2 Segundo dados do projeto Inter-meios, “o share acumulado até agosto é de 60,4% em TV aberta; 14,9% em jornal; 7,3% em revista; 4,5% em rádio; 4,1% em internet; e 3,5% em TV por assinatura” (WERZBITZKI, 2009).

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personagens. O segundo dura o tempo de desenvolvimento de uma música, já que

videoclipes são peças de divulgação da indústria fonográfica. Ambos, porém, envolvem

o espectador através de uma construção rápida que não se detém em detalhes e, por isto,

enfatizam o seu essencial, o desenvolvimento do enredo no primeiro caso e o

envolvimento do espectador com a música/ artista no segundo.

A função do filme publicitário é também extremamente restrita. “No que se

refere ao sentido, é possível partir do princípio de que qualquer spot de publicidade

veicula a mesma mensagem de base que será formulada: “Comprem o produto X””

(VANOYE; GOLIOT-LÉTE, 2002, p. 108). Sua função é, portanto, persuadir o

consumidor levando-o à compra, ou à mudança de atitude, porém esta função será

realizada em um curto espaço de tempo, onde os elementos do conteúdo e expressão do

filme publicitário necessitarão ser explorados com extrema significância.

Os filmes publicitários, ao contrário das outras formas curtas, possuem uma

duração de tempo mais rígida, “são, em geral, muito curtos (de 15’’ a 1’ 30’’)”

(VANOYE; GOLIOT-LÉTÉ, 2002, p. 108). Isso porque necessitam ser inseridos, na

maioria dos casos, nos intervalos da programação televisiva, que seguem uma grade de

programação rígida, com horários determinados para início de cada programa. Televisão e publicidade têm uma ligação indissociável. A partir do momento em que se instalou uma filosofia eminentemente empresarial para administrar o principal produto da televisão, o tempo, a publicidade submeteu-se às exigências de um novo formato. O tempo passou a ser dividido em unidades precisas de segundos e, assim, como pacote, vendido. Cada anúncio publicitário deveria ter uma medida desta natureza para ser veiculado na programação e por isso pagar um valor de mercado pelo tempo usado (MARCONDES, 2001, p. 178).

A publicidade está envolvida neste contexto de exploração comercial do tempo

na televisão, o qual faz o valor de cada segundo dentro do intervalo comercial tornar-se

extremamente caro e valioso. Geralmente serão grandes anunciantes que poderão arcar

com os grandes custos de veiculação deste meio e, por isso, valorizarão cada segundo

do espaço de que dispõem durante os intervalos. Marcondes assim reflete sobre este

processo de exploração comercial do tempo na televisão: Isto fez com que as agências publicitárias passassem a investir alto capital na produção de bons filmes publicitários, a saber, peças capazes de fazer uma narrativa compreensiva, atraente e convincente no espaço de 30 segundos. Era preciso a obtenção de boas imagens, que fossem ao mesmo tempo curtas e se interligassem de tal forma a constituir uma história, que traria consigo a

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mensagem para a compra de mercadorias. Tratava-se, portanto, de um sistema que exigia um uso absolutamente racional e econômico do tempo. Uma fração de segundo não poderia ser desperdiçada. Cada cena ficaria no vídeo apenas o mínimo tempo possível para que outras pudessem ser intercaladas e dessem conta do escasso intervalo de exibição de uma história publicitária (MARCONDES, 2001, p. 178-179).

O tempo é, pois, uma das principais características que impactam o modo de

construção desse tipo de peça de comunicação mercadológica.

2 O FILME PUBLICITÁRIO E SEUS APELOS DE PERSUASÃO

Há muitas possibilidades de construção do filme publicitário. Vanoye e Goliot-

Lété (2002) distinguem três tipos diferentes de estratégias que podem combinar-se entre

si e englobam a maioria das investidas no universo dos comerciais: a argumentação, a

sedução-fascínio e a narrativa.

Percebe-se que a divisão operada no meio da publicidade, entre os apelos

racionais e os apelos emocionais, como pontua Carrascoza (2002), também atinge a

produção destas peças audiovisuais. Há tanto filmes publicitários ligados à vertente

apolínea (argumentativos), como filmes que buscam na vertente dionisíaca (narrativos,

sedução-fascínio) a sua força persuasiva. No caso dos filmes publicitários, assim como

na publicidade de um modo geral, o que determinará o uso de uma ou outra estratégia

são os objetivos que o anunciante deseja atingir com sua investida e detalhes relativos

ao produto/ serviço ou público-alvo, que delimitariam o filme em uma ou outra vertente.

Os filmes publicitários argumentativos utilizam a “argumentação direta,

explícita, que se sustenta eventualmente na descrição (do produto, de seus efeitos) e na

explicação (como o produto opera). Os spots3 “argumentativos” são essencialmente

discursivos” (VANOYE; GOLIOT-LÉTÉ, 2002, p. 108). Por serem discursivos a

responsabilidade do discurso requer uma atenção especial. Segundo as autoras, este

pode estar a cargo de um personagem, ou seja, de alguém em que o modo de vestir, o

modo de se expressar tenha uma conotação favorável àquele produto/serviço, um

estereótipo, por exemplo, do especialista ou do consumidor. Um homem vestido de

branco, com expressões serenas conotando “médico”; uma mulher com avental, em

ação dentro de casa, conotando “dona-de-casa”; são exemplos bem constantes nos 3 Spots são como as autoras denominam o filme publicitário

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filmes publicitários argumentativos relativos ao universo da medicina (campanhas de

saúde, medicamentos), no primeiro caso, e relativos a produtos de limpeza e casa. A

personagem também pode ser uma celebridade, tática bastante usual.

A responsabilidade do discurso pode também recair sobre uma “voz off, que

comenta as imagens descritivas, eventualmente desenhos, gráficos etc., voz sem rosto

que fala na maioria das vezes de um lugar não especificado” (VANOYE; GOLIOT-

LÉTÉ, 2002, p. 109). O convencimento agora depende do potencial puramente sonoro

da voz, já que como observam Vanoye e Goliot-Lété (2002, p. 109) sobre alguns filmes

publicitários com voz em off, “o comentário, quer seja argumentativo, quer explicativo,

quer incitativo, “transborda” em muito a imagem”. A imagem, nos filmes

argumentativos de uma forma geral, também é carregada de signos visuais (quadro,

esboços, gráficos, números, laboratório) que sustentem uma posição de objetividade ou

cientificidade, dependendo do caso.

Indo para o outro lado do pêndulo, as autoras caracterizam a sedução-fascínio

como uma maneira de persuasão do filme publicitário, centrada no idílico:

Alguns spots (são em número cada vez maior) quase nada dizem (argumentação direta quase nula), tampouco narram. A relação entre o conteúdo do spot, as imagens e os sons, e o produto é às vezes bem longínqua e até quase inexistente, pelo menos aparentemente. As imagens e sons apresentam qualidades, denotadas ou conotadas, que pretensamente pertencem ao produto ou ao sujeito-utilizador do produto. Essas qualidades muitas vezes da ordem da juventude, da força, da atividade, da sedução, do frescor, da resistência, da alegria de viver, da segurança, etc (VANOYE; GOLIOT-LÉTÉ, 2002, p. 111-112).

A sedução-fascínio é muito utilizada para produtos de luxo (carros, moda,

perfumaria), que não necessitam de uma argumentação forte ou de criação de um

esquema narrativo com que o consumidor se identifique. A estratégia se preocupa

apenas com o sonho, nesta busca por sonhos, utiliza recursos técnicos que enfatizem tal

característica. Há o uso de filtros, de músicas ambiente estereotipadas, a fusão rápida

entre imagens, a câmera lenta, além de um recurso narrativo, que será abordado mais a

frente, a elipse. Todos são recursos técnicos que enfatizam esta busca idílica. “O

produto aparece como o doador 15’’ a 1’ 30’’ de prazer audiovisual” (VANOYE;

GOLIOT-LÉTÉ, 2002, p. 113).

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Mesmo que sua força persuasiva não esteja na criação de histórias, a estratégia

de sedução-fascínio pertence à vertente dionisíaca devido à criação de um clima

emotivo muito forte. Esta estratégia encontra sua razão de ser mais no nível de

expressão do que de conteúdo. A sedução-fascínio se constrói por uma associação entre

imagens e sons que transmitam a sensação de prazer ao ser vistas/ ouvidos. Não há

conteúdo argumentativo, nem conteúdo narrativo, mas uma construção expressiva do

idílico.

Na estratégia narrativa, por outro lado, o conteúdo da história a ser contada é

parte essencial. Também se busca a construção de um mundo idílico. Mas esta

construção se dá através da verossimilhança produzida pelas histórias que envolvem o

consumidor em uma relação com o produto-serviço. Para Vanoye e Goliot-Lété (2002,

p. 110), a função desta estratégia é dupla, já que “a estrutura narrativa desperta o

interesse de todos e o papel do produto na história constitui um elemento de influência”.

O ato de contar histórias é onde reside a força persuasiva desta estratégia. “O

espectador identifica (inconscientemente) uma estrutura que ele conhece e identifica-se

(não necessariamente de forma estável) com um dos atores da história” (VANOYE;

GOLIOT-LÉTÈ, 2002, p. 110-111). O produto/ serviço encontra-se no meio desta

“equação”, podendo adquirir os mais diversos papéis narrativos. Mas necessariamente o

filme publicitário narrativo é um tipo de construção “cuja intenção é captar a atenção do

público com o propósito de vender o produto” (COMPARATO, 2001, p. 340).

3 O FILME PUBLICITÁRIO NARRATIVO E SEU MODO DE CONSTRUÇÃO

A construção do filme publicitário narrativo, como toda peça do audiovisual,

atravessa o processo verbal de roteirização. É nesse processo que a história adquire

consistência. Não significa dizer que não haja processo de roteirização nos filmes

argumentativos, ou nos filmes que apelam para a sedução-fascínio. O roteiro é a peça

chave no momento da produção de qualquer peça audiovisual, é o guia na construção

deste tipo de produto. Porém, quando se cria uma história, quer seja em cinema,

televisão, ou para a publicidade, o roteirista exercita o processo de construção da

narrativa audiovisual, que começa no storyline e termina com o roteiro final.

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O consumidor, como todo ser humano está imerso em conflitos. A publicidade

narrativa trabalha estes conflitos, como categoria essencial da sua construção. Como

dito por Nicolau (2005, p.1) “a utilização do produto resulta em uma ordem, em um

equilíbrio, que o publicitário, na propaganda, demonstra de forma, muitas vezes,

ameaçada ou não atingida, sendo o produto o restabilizador da ordem, do equilíbrio”. A

delimitação inicial deste conflito base, como visto, surge a partir do storyline. Porém, no

filme publicitário, devido ao curto espaço de tempo para o desenvolvimento da história,

o conflito-base (o quê) é praticamente a história a ser contada.

Como próximo passo no intuito de construir a história no filme publicitário,

ter-se-á o argumento, documento onde estarão delimitados todos os elementos

narrativos. Todos estes elementos passam por uma “economia” narrativa em termos de

profundidade. Nos filmes publicitários, o espaço (onde) é regido pela unidade, o tempo

segue uma linearidade rígida (quando), os personagens (quem) são definidos de maneira

a compor um estereótipo e o enredo (qual) segue uma estrutura seqüencial simples.

Todos os elementos tendendo ao que nos contos se chamava “unidade dramática”

(MOISÉS, 1997, p. 40), e na publicidade encontra semelhante no termo “esfriamento da

mensagem” (CARRASCOZA, 2002, p.110). Mas independentemente da terminologia,

busca-se sempre a simplicidade, para assim facilitar a assimilação da mensagem por

parte o receptor.

A estrutura (como), próximo passo na construção da história no audiovisual

também será visualizada diferentemente no filme publicitário. O processo de estruturar,

ou seja, definir uma macro-estrutura, as cenas essenciais e os mecanismos de passar o

tempo, será mais simples também, em vista do pouco tempo.

O tempo, para a publicidade televisiva, é, portanto, um elemento essencial na

sua construção. A linguagem absolutamente objetiva e sintética será explorada com

excelência nos comerciais televisivos. “Na publicidade (...) a ênfase recai sobre a rápida

sucessão de imagens, cuja intenção é captar a atenção do público com o propósito de

vender o produto” (COMPARATO, 2000, p. 340). Ou seja, assim como as outras

formas audiovisuais curtas, o filme publicitário irá em busca de seu objetivo, porém sem

rodeios, indo direto a seu intuito. Embora isto não signifique que o receptor da

mensagem tenha clareza do intuito comercial deste tipo de construção. A sutileza é a

marca do discurso publicitário, que envolve o consumidor naquele universo verossímil.

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O filme publicitário age sem rodeios, atingindo direto seu objetivo, que é persuadir o

receptor de suas mensagens.

A criação para a televisão, como o é a maioria dos filmes publicitários, precisa

ter a preocupação eminentemente temporal: Devemos criar levando em conta quanto tempo temos. Acho completamente diferente 15 segundos de 30, ou 45, ou 60, ou mais. Em 15 segundos é melhor dizer uma só frase e ter uma imagem forte. Geralmente, são reduções de filmes de trinta para aumentar a freqüência, e esperamos que o consumidor complete mentalmente o que viu em 30 segundos. Ou temos séries de filmes de 15, onde um soma com o outro e permite uma freqüência maior. Para filmes de 30 segundos, o que dá certo é o humor, o bom humor, o inesperado, o exagero inteligente, uma demonstração inteligente etc. Agora se precisamos de um clima de emoção ou suspense ou contar uma estória é bom pensarmos em 60 segundos (...) (IMORBERDORF, 1989, p. 154).

Independentemente de se trabalhar com 30 ou 60 segundos, a composição

através dos três passos, exposição, desenvolvimento e resolução (BARRETO, 2004), é

facilmente identificável, justamente por que a história no filme publicitário se resume ao

essencial. Aqui não haverá espaço para um desenvolvimento integral e parcimonioso do

enredo (problema, complicação, conflito, crise, clímax, resolução), como acontece nos

formatos longos do audiovisual, como filmes, séries e novelas, por exemplo. Tal fato

até, depõe contra o caráter dramático deste tipo de produção, como se refere Comparato: Embora possa parecê-lo, o texto para publicidade não é considerado um roteiro dramático. O tempo de que se dispõe é muito curto (às vezes apenas quinze segundos). Desta forma, um anúncio pode conter cenas essenciais, estrutura dramática e personagens, mas não desenvolverá uma história; limitar-se-á a ser a exposição de uma situação, ou de um momento dramático, de um gimmick, etc (COMPARATO, 2000, p. 340).

O curto tempo, a principal característica deste tipo de produção, seria o seu

principal defeito do ponto de vista dramático, segundo o autor supracitado. Para ele não

há intensidade dramática se não há um espaço para o desenvolvimento da história. Esta

se resumiria a um momento, uma situação, ou um gimmick, este, como visto, sendo

“uma alteração arbitrária dos elementos familiares com a intenção de surpreender o

público” (COMPARATO, 2000, p.173). Mas não há o desenvolvimento de uma

história, de um momento dramático completo e construído devidamente. Com esta

afirmação, o autor, mesmo que, não intencionalmente, retira o mérito dramático do

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filme publicitário. Como se apenas as narrativas longas possuíssem o tempo necessário

parar a construção de um ideal dramático.

Barreto (1982) tem uma opinião contrária quanto à construção do filme

publicitário, para ele o princípio básico da publicidade audiovisual é criar uma tensão

dramática e aliviá-la com o produto/serviço do anunciante. O autor vai em busca das

bases dramáticas na antiguidade clássica para se referir ao caráter dramático da

publicidade: Para efeito prático (e muito mais simplório, quando nos lembramos de Sófloces) de compreender o drama de que se nutre a criatividade em TV, eu me fixaria no fato de que ele é fundamentalmente tensão. Tensão – e alívio de tensão, lembrando a forma clássica da catarse, efeito emocional da tragédia. Ou tensão – e alívio de tensão, na forma de humor, alma da comédia (BARRETO, 1982, p. 240).

Vanoye e Goliot-Lété (2002, p. 110) observam que o filme publicitário “pode

dar lugar a uma narrativa completa (atualmente mais rara) ou incompleta (caso mais

freqüente)”. As autoras, portanto, classificam como a forma mais comum de filme

publicitário aquela onde não se conta uma história completa, mas apenas um momento,

como classifica Comparato (2000). Porém, Vanoye e Goliot-Lété acreditam que, mesmo

não desenvolvendo uma história completa, a forma narrativa no filme publicitário

“adquire base a partir de alguns semas narrativos: um ou dois atores a quem é possível

atribuir papéis (...) graças a uma ou várias ações que se inscrevem em uma cronologia”

(VANOYE;GOLIOT-LÉTÈ, 2002, p. 110). Ou seja, há uma história sendo

desenvolvida e, portanto, um envolvimento dramático dos seus elementos.

Mas ainda assim há a dificuldade em se falar em uma história completa neste

curto período de desenvolvimento, mesmo que se estenda o filme até os 60 segundos.

Por isso, uma das figuras narrativas mais freqüentes em filmes publicitários é a elipse.

“O spot narrativo é ultracurto. A figura recorrente – não é surpreendente – é a elipse”

(VANOYE, GOLIOT-LÈTÈ 2002, p. 110).

A elipse é uma figura narrativa extremamente ligada ao tempo, como afirma

Comparato (2000, p. 474) é “uma passagem muito rápida do tempo”. Refere-se à

necessidade em não mostrar tudo ao espectador, em confiar na sua capacidade de

completar conteúdos. Se alguém, em uma cena, sai de casa e fecha a porta e, na outra

cena, aparece entrando em um prédio, necessariamente passou por um percurso de casa

ao prédio. Porém a necessidade dramática daquele percurso é nula para a peça como um

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todo. E não apenas por ser nula, mas por ser facilmente completada pelo público, é que

ela é eliminada da construção, sem representar nenhuma diferença. Há, neste caso, uma

mudança espacial, que revela uma passagem temporal, mas que é suprimida, por esta

figura denominada elipse. Quem pode mais, pode menos. A elipse deve cortar sem contudo emascular. Sua vocação não é tanto suprimir os tempos fracos e os momentos vazios quanto sugerir o sólido e o pleno, deixando fora de cena (fora do jogo) o que a mente do espectador pode suprir sem dificuldade (MARTIN, 1990, p. 85).

A elipse tem, então, importância fundamental na construção do filme

publicitário porque é também um recurso que põe a ênfase no essencial da narrativa,

retirando os excessos, porém sem danificar o significado pleno da história. Dando

ênfase ao essencial, esta figura colabora para pontuar o tempo dramático do filme

publicitário narrativo.

O diálogo e a construção da cena também possuem papel essencial na ênfase

do tempo dramático. Em alguns casos o diálogo é a base de construção do filme, por

onde acontece o desenvolvimento da peças e das relações entre o sujeito e o objeto.

Filmes deste estilo basicamente acontecem em uma única cena; são literalmente um

momento, uma situação, que se revela através do diálogo. Não quer dizer neste caso que

a imagem não tenha importância, porém o objetivo da cena estará no desenrolar do

próprio diálogo.

Em outros casos não há diálogo, de tipo algum, e a construção da narrativa é

realizada apenas pela composição da imagem e trilha sonora. Nos filmes compostos

apenas de imagens, cada cena possuirá um objetivo dramático que signifique algo

àquele desenrolar de fatos, àquela situação dramática de conjunção/disjunção entre o

sujeito e o objeto. Importante lembrar que, nestes casos, a configuração máxima da

narrativa encontra-se no nível da expressão, mas toda sua construção ainda foi firmada

por um processo de construção que definiu o conflito, o enredo, as personagens, o

tempo e o espaço, enfim, o conteúdo da história, mesmo toda ela não possuindo, em sua

forma final, nenhum elemento verbal.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

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Como em toda forma narrativa, como em toda construção no audiovisual, será

exclusivamente a necessidade dramática daquela peça que determinará o seu estilo de

composição. È difícil falar em erros ou acertos, em meio a uma enorme variedade de

formas e construções possíveis para o filme publicitário. A própria sobrevivência deste

tipo de produto está na sua capacidade de inovar, de mostrar apelos totalmente

diferentes, para sempre captar a atenção do consumidor, em meio à imensidão de

opções.

Ainda assim, uma força contrária à inovação e à criatividade ainda permanece,

a economia. Não a economia narrativa desse tipo de peça, mas a economia do bolso do

anunciante. A visão do “quanto menos tempo melhor” pode funcionar, porém, para o

bolso do anunciante, mas pode também minar a sua estratégia criativa baseada na

narrativa. Por isso a saída dos gimmicks e momentos dramáticos é bastante usual na

publicidade, pois não necessitam de envolvimento do espectador. São curtos, lineares e

enfáticos, de acordo como o mercado exige.

O que necessita ser reafirmado é que o potencial dramático da narrativa,

através de filmes mais longos, com 1 minuto ou 1 minuto e meio, precisa ser também

trazido à tona, já que são estratégias eficientes e extremamente persuasivas. A

veiculação de comerciais em salas de cinema é pródiga em exemplos, assim como a

veiculação de filmes publicitários na web, onde estes estão livres das amarras do tempo

impostas pela grade comercial televisiva.

Filmes mais longos induzem o espectador a imergir em um tempo dramático

específico, onde o produto/ serviço desempenha papel preponderante, verossímil e

aproximado do público-alvo, através de uma identificação que as narrativas conseguem

construir com excelência.

Mesmo a narrativa não sendo a única maneira de construção do discurso

publicitário, ela encontra ressonância comprovada como recurso persuasivo. Esquecer

este fator é não compreender o potencial de comunicação destas peças. É não entender o

modo como agem perante o consumidor. E o pior, em um contexto mercadológico onde

cada segundo vale muito, é perder o dinheiro investido em um apelo totalmente errado e

vazio de persuasão.

REFERÊNCIAS

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Nº 03 - MARÇO – AGOSTO 2010

BARRETO, Roberto Menna. Criatividade em Propaganda. 3. ed. São Paulo: Summus, 1982. BARRETO, Tiago. Vende-se em 30 segundos: manual do roteiro para filme publicitário. São Paulo: Senac, 2004. CARRASCOZA, João Anzanello. Razão e Sensibilidade no texto publicitário. São Paulo: Ed. Futura, 2004. COMPARATO, Doc. Da criação ao roteiro: o mais completo guia da arte e técnica de escrever para televisão e cinema. 5. ed. Rio de Janeiro: Rocco, 2000. IMOBERDORF, Magy. et al. Tudo que você queria saber sobre propaganda e ninguém teve paciência para explicar. 3. ed. São Paulo: Atlas, 1989. MARCONDES, Ciro Filho. Por uma reflexão consequente da estética. Disponível em: <http://www.bib.uab.es/pub/analisi/02112175n27p173.pdf>. Acesso em: 03 de abril de 2010. MARTIN, Marcel. A linguagem cinematográfica. São Paulo: Brasiliense, 1990. MOISÉS, MASSAUD. A criação literária: prosa I. São Paulo: Ática, 1995. NICOLAU, Roseane. A narratividade no texto publicitário. Disponível em: < http://insite.pro.br/Ensaio%20Roseane%20narratividade.htm>. Acesso em: 13 de abril de 2010. SAMPAIO, Rafael. Propaganda de A a Z: como usar propaganda para construir marcas e empresas de sucesso. 2. ed. Rio de Janeiro: Campus, 2002. VANOYE, Francis; GOLIOT-LÉTÉ, Anne. Ensaio sobre a análise fílmica. 2. ed. Campinas: Papirus, 2002. WERZBITZKI, João José. Investimentos em publicidade não crescem, neste ano. TV lidera, disparado. Disponível em: < http://blogs.abril.com.br/blogdojj/2009/11/investimentos-em-publicidade-nao-crescem-neste-ano-tv-lidera-disparado.html>. Acesso em: 23 de março de 2010.


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