UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
FALÊNCIA DA SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA
WILLIAN FERREIRA XAVIER
ITAJAÍ, JUNHO 2011
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
FALÊNCIA DA SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA
WILLIAN FERREIRA XAVIER
Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel
em Direito. Orientador: Professor Msc. Roberto Epifanio Tomaz
ITAJAÍ, JUNHO 2011
AGRADECIMENTO
Agradeço primeiramente ao Deus todo-poderoso criador do céu, da terra e de todas as coisas visíveis e invisíveis, o qual vive e reina eternamente.
Agradeço a minha mãe, Dona Raimunda, mulher corajosa e batalhadora que me deu a vida, e esta sempre com muito amor e carinho.
Agradeço a minha esposa Elisabeth Xavier, mulher forte e sábia, adjuntora perfeita de todas as horas, nas melhores e nas mais difíceis.
Agradeço aos meus filhos, Jonatas, Milena e Tiago, bênçãos de Deus para minha vida.
Agradeço a todos os meus amáveis professores, homens e mulheres, dedicados ao ensino e ao conhecimento jurídico, desejo que todos cheguem ao pleno conhecimento de Cristo.
Agradeço ao meu orientador Msc. Roberto Epifanio Tomaz, por aceitar esta orientação, e fazê-la com maestria.
3
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho ao Senhor Jesus Cristo que confirmou sua palavra em minha vida, pois ele mesmo me disse: “conheço as tuas obras; eis que diante de ti pus uma porta aberta, e ninguém a pode fechar; tendo pouca força, guardaste a minha palavra, e não negaste o meu nome. Apoc. 3:8”. Obrigado Senhor.
Dedico à memória do meu querido pai; Pedro Matias Xavier Neto, homem simples, nascido no nordeste do Brasil, que rompeu as fronteiras da sua terra natal em busca de uma vida melhor na cidade. A sua descendência tem prosperado.
Finalmente, dedico a toda minha família e amigos queridos que torceram por mim durante esta caminhada rumo ao saber jurídico.
4
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte
ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do
Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de
toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Itajaí-SC, Junho 2011
Willian Ferreira Xavier Graduando
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do
Itajaí – UNIVALI, elaborada pelo graduando Willian Ferreira Xavier, sob o título A
Falência da Sociedade de Economia Mista, foi submetida em, 06/06/2011 à banca
examinadora composta pelos seguintes professores: Roberto Epifânio Tomaz,
orientador e presidente da banca e Professoras Msc. Denise Shimitt Siqueira Garcia
e Esp. Geovana da Conceição avaliadoras, e aprovada com a nota ______).
Itajaí-SC, Junho 2011
Professor Msc. Roberto Epifanio Tomaz Orientador e Presidente da Banca
Professora Msc. Maria Claudia ________ Coordenação da Monografia
ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS
CC/1916 Código Civil Brasileiro de 1916 CC/2002 Código Civil Brasileiro de 2002 CPC//1973 Código de Processo Civil de 1973 CRFB/88 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 STF Supremo Tribunal Federal STJ Superior Tribunal de Justiça Art. Artigo LSA Lei das Sociedades Anônimas
ROL DE CATEGORIAS
Rol de categorias que o Autor considera estratégicas à
compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.
Administração Indireta
“É a que compreende as seguintes categorias de entidades dotadas de
personalidade jurídica própria, autarquia, empresa pública, sociedade de economia
mista, fundações públicas1”.
Comissão de Valores Mobiliários
“Órgão do Governo Federal encarregado pela lei, de conceder autorização para que
uma companhia tenha seus valores mobiliários admitidos à negociação na Bolsa ou
Mercado de Balcão [...] autarquia criada pela lei 6.385/76 e juntamente com o Banco
Central exerce supervisão e o controle do mercado de capitais de acordo com as
diretrizes do Conselho Monetário Nacional2”.
Falência
“Um estado jurídico instaurado por um provimento jurisdicional, para solucionar a
situação oriunda da insolvência do empresário ou sociedade empresária, tendo em
vista o tratamento eqüitativo de seus credores3”.
Recuperação Judicial
“[...] recuperar economicamente, o devedor, assegurando-lhe, outrossim, os meios
indispensáveis à manutenção da empresa, considerando a função social desta4”.
Sociedade de Economia Mista
“Sociedade anônima de direito privado, mas sujeita aos princípios da Administração
Pública e controlada pelo Poder Público, criada por lei para atender aos imperativos
1 MELLO, Celso Antonio Bandeira de Curso de Direito Administrativo 20 ed ver. E atual . São
Paulo: Malheiros, 2006 p.140. 2 ALMEIDA, Amador Paes de Curso de Falências e Recuperação de Empresas: de acordo com
a Lei 11.101/05 22ed. Ver. E atual . São PAULO: Saraiva, 2006.p.302. 3 FAZZIO, Júnior Waldo. Manual de Direito Comercial 3 ed . São Paulo: Atlas,2003 p.615. 4 COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial: Direito de Empresa . São Paulo: Saraiva,
2009 p.186.
viii
da segurança nacional ou relevante interesse coletivo, tendo por objeto atividade
econômica de produção ou comercialização de bens ou prestação de serviços5”.
5 NEGRÃO, Ricardo. Manual de Direito Comercial e de Empresa. Volume 1: Evolução Histórica do
Direito Comercial, teoria geral da empresa, direito societário.p.403.
ix
SUMÁRIO
RESUMO...........................................................................................12
INTRODUÇÃO ..................................................................................13
CAPÍTULO 1 ......................................... ............................................16
SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA........................ .......................16
1.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA E DISPOSIÇÃO LEGAL .......... ............................ 16
1.1.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA ................................................................................... 16
1.1.2 DISPOSIÇÃO LEGAL .... ................................................................................... 18 1.2 CONCEITO DA SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA ........ ......................... 22 1.3 FORMAÇÃO DA SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA ........ ....................... 26
1.3.1 OBJETIVO – EXPLORAÇÃO DE ATIVIDADE ECONÔMICA DE PRODUÇÃO OU COMERCIALIZAÇÃO DE BENS OU DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS ................................. 26
1.3.2 IMPERATIVOS DA SEGURANÇA NACIONAL OU A RELEVANTE INTERESSE COLETIVO28 1.4 DA NATUREZA DE PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVA DO DAS SOCIEDADES DE ECONOMIA MISTA....................... ........................................ 30
1.4.1 NATUREZA DA PESSOA JURÍDICA .................................................................... 30
1.4.2 DA PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO..................................................... 32 1.4.2.1 Classificação.............................. ........................................................................32
1.4.3 NATUREZA DE PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO DAS SOCIEDADES DE ECONOMIA MISTA............... .................................................................................... 33 CAPÍTULO 2 ......................................... ............................................35
DO INSTITUTO FALIMENTAR ............................ .............................35
x
2.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA E LEGAL DO INSTITUTO FALIMEN TAR ........... 35
2.1.1 DIREITO ROMANO.......... ................................................................................ 35
2.1.2 IDADE MÉDIA............. .................................................................................... 37
2.1.3 CÓDIGO NAPOLEÔNICO .................................................................................. 39
2.1.4 O DIREITO FALIMENTAR NO BRASIL ................................................................ 39 2.2 O CONCEITO DE FALÊNCIA......................... ............................................... 42 2.3 REQUISITOS PROCESSUAIS PARA DECRETAÇÃO DA FALÊN CIA........ 43 2.4 DOS EFEITOS JURÍDICOS DA DECLARAÇÃO DE FALÊNCIA . ................ 49
2.4.1 FORMAÇÃO DA MASSA FALIDA SUBJETIVA ...................................................... 49
2.4.2 SUSPENSÃO DAS AÇÕES INDIVIDUAIS .............................................................. 50
2.4.3 SUSPENSÃO CONDICIONAL DE FLUÊNCIA DE JUROS ......................................... 51
2.4.4 EXIGIBILIDADE ANTECIPADA DOS CRÉDITOS .................................................... 52
2.4.5 SUSPENSÃO DA PRESCRIÇÃO ......................................................................... 54
2.4.6 ARRECADAÇÃO DOS BENS DO DEVEDOR ......................................................... 54
2.4.7 EFEITOS QUANTO AO DEVEDOR ...................................................................... 57 CAPÍTULO 3 ......................................... ............................................60
A DECLARAÇÃO DA FALÊNCIA DA SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA...............................................................................................60
xi
3.1 A (IM)POSSIBILIDADE LEGAL DA DECLARAÇÃO DA FALÊ NCIA DAS SOCIEDADES DE ECONOMIA MISTA....................... ........................................ 60 3.2 DA EXCEÇÃO A REGRA GERAL DA DECLARAÇÃO DA FALÊN CIA DAS SOCIEDADES DE ECONOMIA MISTA....................... ........................................ 63 3.3 A DISTINÇÃO DOS EFEITOS JURÍDICOS EM DECORRÊNCI A DA ESSÊNCIA DE SUA CONSTITUIÇÃO – DISCUSSÃO DOUTRINÁRIA ........ ........................ 67
3.3.1 EXPLORAÇÃO DE ATIVIDADE ECONÔMICA DE PRODUÇÃO ................................. 68
3.3.2 SERVIÇOS PÚBLICOS . .................................................................................... 71 3.4 RESPONSABILIDADES DO PODER PÚBLICO............. .............................. 73
3.4.1 DA RESPONSABILIDADE CIVIL SUBJETIVA ........................................................ 73
3.4.2 DA RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA ......................................................... 74
3.4.3 RESPONSABILIDADE CIVIL DO PODER PÚBLICO JUNTO À SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA EXPLORADORA DE ATIVIDADE ECONÔMICA .................................................... 75
3.4.4 RESPONSABILIDADE CIVIL DO PODER PÚBLICO JUNTO À SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA PRESTADORA DE SERVIÇO PÚBLICO .............................................................. 77 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................... ...............................81
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS...................... .....................84
RESUMO
O presente trabalho monográfico tem por objetivo pesquisar a
possibilidade falencial das sociedades de economia mista, sendo estas companhias
sujeitas à administração indireta do Estado a priori tem características diferenciadas
das demais empresas. Com base no preceito legal se nota a possibilidade dada ao
Estado, por meio da chamada administração indireta, atuar em atividades onde a
iniciativa privada não esteja presente, ou então naqueles setores ditos estratégicos,
que supostamente necessitem da sua atuação direta. Por isto, na presente pesquisa
estudaremos a luz da Constituição, e da doutrina dominante no país, o modo de
constituição dessas empresas, forma como são regidas pela lei, suas características
básicas, e finalmente a sujeição ou não ao procedimento falencial previsto na Lei
Federal 11.101/2005. Antes, porém, aborda as fases históricas e os fatores
importantes que marcaram o instituto falimentar no decorrer da história. Em alguns
momentos desse período, consta-se que a falência é vista como um delito,
cercando-se o falido de infâmia e impondo-se lhe penas que vão de prisão à
mutilação. Daí a expressão falência, o verbo falir, cujo significado também evoluiu de
esconder, encobrir ou ocultar, para enganar ou induzir em erro, até escapar a/de.
Posteriormente verifica-se que gradativamente abrandam-se os rigores da
legislação, assumindo a falência um caráter econômico-social, refletindo no seu bojo
as profundas alterações por que passaria o direito comercial e que culminaria com a
modificação do próprio conceito de empresa, vista hoje como uma instituição social.
Atualmente a nova legislação falimentar traz algumas inovações, tendo como
princípio fundamental a recuperação econômica da empresa, a fim de permitir a
manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos
credores promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o
estímulo à atividade econômica como enfatiza o art. 47 da Lei nominada. A mesma
lei de recuperação judicial e de falência (Lei 11.101/05) traz, em seu art. 2º, inciso I,
a exclusão de sua aplicação a empresa pública e a sociedade de economia mista,
sendo assim, num primeiro momento, segundo a lei, ficam as sociedades de
economia mista, impossibilitadas de passar por um processo falimentar.
INTRODUÇÃO
A presente Monografia tem como objeto de estudo a
possibilidade da declaração da falência da sociedade de economia mista.
O seu objetivo é verificar por meio da investigação de outros
dispositivos jurídicos, que não somente o legal, a possibilidade desse tipo de
sociedade passar por um processo de falência, com isso, tratar o assunto de forma
em sentido mais amplo.
Para tanto, a pesquisa inicia tratando acerca da sociedades de
economia mista, sua evolução histórica, a intervenção da mão do Estado no terreno
econômico desta sociedade, o conceito de sociedade de economia mista, sua
formação, finalizando com o estudo da natureza de pessoa jurídica de direito privado
das sociedades de economia mista.
O capítulo 2, por sua vez, destina-se ao estudo do instituto
falimentar em si, sua evolução histórica e legal, o conceito de falência, os requisitos
processuais para declaração da falência e os efeitos jurídicos da declaração da
falência, são estudados neste capítulo.
Por fim, ultrapassada as bases teóricas fundamentais a
pesquisa o capítulo 3 propõe-se ao estudo da (im)possibilidade legal da declaração
da falência das sociedades de economia mista, analisando o art. 242 revogado da
Lei 6.404/76 pelo art.10 da Lei 10.303/01 e também a Lei 11.101/05 a atual Lei das
falências. Este capítulo também aborda a ótica da distinção dos efeitos jurídicos em
decorrência da essência da constituição, das companhias mistas e finalmente a
responsabilidade do poder público.
14
O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as
Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados,
seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre a
falência das sociedades de economia mista.
O objeto da pesquisa foi trabalhado sob a perspectiva da
seguinte problemática:
1. Tendo em vista que as sociedades de economia mista são
organizadas de forma mercantil, possuindo personalidade jurídica de direito privado,
isto permitiria, então, sua extinção a partir de processo falimentar? Existe
pacificação doutrinaria com relação a esta (im)possibilidade?
2. Em sendo possível a decretação da falência das sociedades
de economia mista quais os efeitos jurídicos estarão sujeitas, aquelas, que podem
ser atingidas pela falência?
A partir dos problemas formulados, foram levantadas as
seguintes hipóteses para o trabalho de pesquisa:
1. Pressupõe-se a admissão da decretação da falência das
sociedades de economia mista pelo entendimento legal e doutrinário, ainda que
controverso, dependendo, no entanto, da essência da forma de sua constituição.
2. Comprovado a insolvência da sociedade de economia mista,
sofrerá esta, o processo falimentar com penhorabilidade de seus bens, e
responsabilidade subsidiária sobre poder público.
Quanto à Metodologia empregada, registra-se que tanto na
Fase de Investigação6 quanto na Fase de Tratamento de Dados o Relatório dos
Resultados expresso na presente Monografia é composto na base lógica Indutiva7.
6 “[...] momento no qual o Pesquisador busca e recolhe os dados, sob a moldura do Referente
estabelecido [...]. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica : teoria e prática. 11 ed. Florianópolis: Conceito Editorial; Millennium Editora, 2008. p. 83.
7 “[...] pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica : teoria e prática. p. 86.
15
Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas
do Referente8, da Categoria9, do Conceito Operacional10 e da Pesquisa
Bibliográfica11.
8 “[...] explicitação prévia do(s) motivo(s), do(s) objetivo(s) e do produto desejado, delimitando o
alcance temático e de abordagem para a atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa.” PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica : teoria e prática. p. 54.
9 “[...] palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma idéia.” PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica : teoria e prática. p. 25.
10 “[...] uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica : teoria e prática. p. 37.
11 “Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica : teoria e prática. p. 209.
CAPÍTULO 1
SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA
A presente pesquisa tem por objetivo estudar a possibilidade
da declaração da falência das sociedades de economia mista. Portanto, mister se
faz iniciarmos o estudo a partir de uma abordagem histórica, conceitual e legal
acerca das sociedades de economia mista, é o que se predispõe o presente
capítulo.
1.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA E DISPOSIÇÃO LEGAL
1.1.1 Evolução Histórica
REQUIÃO12, em sua análise histórica do desenvolvimento da
sociedade de economia mista leciona:
Que o desenvolvimento histórico das sociedades de economia mista iniciou-se juntamente com o das sociedades anônimas, quando os Estados colonizadores do século XVII as organizavam por carta real, com o concurso de capitais públicos e privados. Essa espécie de companhia ressurgiu nos tempos modernos, quando os Estados passaram a intervir no terreno econômico, após o longo predomínio das idéias liberais e individualistas.
No mesmo diapasão, de acordo com CRETELLA13:
A sociedade de economia mista teve origem na Alemanha, “remontando seu nascimento às sociedades públicas, criadas no início da Idade Moderna (Companhia das Índias Orientais, Companhia das Índias Ocidentais), sociedades de que participavam,
12 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 2º volume. São Paulo: Saraiva, 2003 p 45. 13 CRETELLA JÚNIOR, José. Administração Indireta Brasileira: autarquia, conce ssionária, Sub
concessionária, permissionária, fundação pública, c orporação pública, empresa pública, sociedade de economia mista, autorização, atividade do particular. 4ª. ed. atual. Rio de Janeiro: Forense, 2000 p 42.
17
em estreita aliança, Estados e particulares com objetivo de colonização”.
No Brasil deste período, segundo CRETELLA14 se pode citar,
como exemplo de sociedade de economia mista, a criação do primeiro Banco do
Brasil pela Coroa Portuguesa em 1808, através do alvará de 12 de outubro de 1808,
em seguida o novo Banco do Brasil pela Lei nº 59, de 8 de outubro de 1833, pode-se
também mencionar entre outras as seguintes entidades econômicas mistas:
O Instituto de Resseguros do Brasil (Decreto nº 3002 de 31 de janeiro de 1941); Companhia Vale do Rio Doce ( Decreto nº 4352, de 1º de julho de 1942); Banco de Crédito da Amazônia ( Lei nº 1184, de 30 de Agosto de 1950); Centrais Elétricas Brasileiras, ELETROBRAS (1961) ; Centrais Elétricas Urubupungá, CELUSA (1958) a participação do Estado na atividade econômica por intermédio dessas entidades desenvolveu-se a partir do terço final do primeiro governo de Getúlio Vargas (1930-1945), governo no qual foi planejada e implementada a primeira reforma administrativa brasileira e quando teve início o processo de industrialização brasileiro.
Posteriormente, no período compreendido entre o fim do primeiro governo de Vargas e o fim da década de 1950, manteve-se o apoio do governo federal a esse processo, com a criação, por exemplo, da Companhia Siderúrgica Paulista (Cosipa) e da Petróleo Brasileiro SA – (Petrobras).
Neste período, as entidades da administração indireta, dentre
as quais as sociedades de economia mista, serviram de importante instrumento para
a aceleração do desenvolvimento.
Descreve DUTRA15 que este período histórico “caracteriza-se
pela consolidação e crescimento das atividades já exercidas pelo Estado no
processo intervencionista na economia e marcam a ação do Estado em novos
domínios".
14 CRETELLA JÚNIOR, José Comentários à Constituição Brasileira de 1988 . Rio de Janeiro:
Forense, 1992p 2230. 15 DUTRA, Pedro Paulo de Almeida. Controle de empresas estatais: uma proposta de muda nça .
São Paulo: Saraiva, 1991p 33.
18
1.1.2 Disposição Legal
Com o Decreto-Lei Nº 200, alterado pelo Decreto-Lei Nº 900,
de 29 de setembro de 196916, definiu a sociedade de economia mista como
“entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado, criada por lei, para o
exercício de atividade de natureza mercantil, sob a forma de sociedade anônima
cujas ações com direito a voto pertençam, em maioria a União à entidade de
administração indireta”.
A sociedade de economia mista é a sociedade anônima cujo
capital social é constituído por recursos provenientes, em parte majoritárias, do
poder público e em parte minoritário dos particulares.
Conforme ensina FAZZIO17 o Capital Social é a soma da
contribuição dos acionistas, o conjunto de valores (dinheiro e bens suscetíveis de
avaliação em dinheiro) que constitui o montante inicial da sociedade. Representa a
totalidade expressa em dinheiro dos contingentes prometidos ou realizada pelos
sócios.
O controle dessas sociedades anônimas pertence ao Estado e
isso as caracteriza fundamentadamente, conforme ensina REQUIÃO18:
A Lei das Sociedades Anônimas rege as sociedades de economia mista. Assim ocorre por se tratar de uma das espécies de sociedade anônima, onde os capitais públicos se aliam ao capital particular, para promoção do objeto social de maior interesse público. Claro que essas companhias têm suas peculiaridades, que lhes asseguram um tratamento específico na lei e no direito.
No entendimento de REQUIÃO19 as peculiaridades das
sociedades de economia mista lhe asseguram um tratamento específico na lei e no
direito, tanto que no simpósio realizado em São Paulo no ano de 1971, partiu dele a
ideia de se regular em futura lei as sociedades de economia mista, em sua indicação
sustentou que: “a experiência havia revelado que o mecanismo de funcionamento da
16 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del0900.htm 17 FAZZIO, Júnior Waldo. Manual de Direito Comercial 3 ed. São Paulo : Atlas,2003 p 255. 18 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 2º volume.p 45. 19 Op. Cite; .p 45.
19
sociedade anônima privada, de que se lançara mão para dar estrutura jurídica a tais
entidades públicas, a elas não se adaptava perfeitamente”.
Por isso impunha-se, então, dentro do realismo jurídico,
encontrar uma fórmula que servisse ao novo tipo de sociedade anônima estatal ou
de sociedade de economia mista.
O Simpósio20 acolheu a indicação, recomendando que se
incluísse “no contexto da nova lei das sociedades por ações capítulo destinado a
disciplinar as empresas públicas ou de economia mista tendo em vista a realidade e
as peculiaridades do seu funcionamento”.
O anteprojeto acolheu a sugestão de REQUIÃO21, elaborado
pelos juristas Lamy Filho e Bulhões Pereira figurou no texto legal o art. 235 e SS da
Lei 6404/7622 a disciplina específica das sociedades de economia mista.
Na visão de CRETELLA23 o misto do capital revela a natureza
jurídica da sociedade.
O qualificativo misto revela a natureza da sociedade, primeiro na sua constituição do capital, depois como decorrência direta dessa participação de natureza econômica, na própria parte administrativa, o que dá origem ao direito universal, de acordo com o quantum de participação, a dois tipos distintos de sociedades de economia mista: a majoritária (mais de 50% do capital) e a minoritária (no máximo 49% do capital).
A constituição da sociedade de economia mista depende de lei,
que poderá evidentemente, estabelecer normas diferentes das previstas pela
legislação do anonimato.
Explica COELHO24 que tais normas, referindo-se a
Constituição, no entanto, aplicam-se, tão-somente, à sociedade de economia mista
em particular.
20REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 2. volume.p 46. 21Op. Cite; .p 46. 22 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e
Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2011 .p.1083
23 CRETELLA JÚNIOR, José Comentários à Constituição Brasileira de 1988 .p.2230.
20
Conforme disposto no art. 37, XIX da Constituição da
República Federativa do Brasil de 198825, com redação modificada pela Emenda
Constitucional nº19 de 1988, verbis:
CRFB/1988 - Art. 37
[...]
XIX - somente por lei específica poderá ser criada autarquia e autorizada a instituição de empresa pública, de sociedade de economia mista e de fundação, cabendo à lei complementar, neste último caso, definir as áreas de sua atuação;
XX - depende de autorização legislativa, em cada caso, a criação de subsidiárias das entidades mencionadas no inciso anterior, assim como a participação de qualquer delas em empresa privada;
Destarte, fica claro que a Constituição ao preceituar que a
empresa pública e a sociedade de economia mista ficarão sujeitas "ao regime
jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações
civis, comerciais, trabalhistas e tributárias" (CRFB/198826, art. 173, §1º, II), dispondo
ainda, verbis:
Art. 173 . Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei;
§ 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre:
II - a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários;
24 COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial: Direito de Empresa . São Paulo: Saraiva,
2009 p.226. 25 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e
Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes . p.40
26 Op cite, p.97.
21
As sociedades de economia mista, como as companhias em
geral podem ser abertas27 ou fechadas28 (art. 4 da Lei 6404/76). Sendo abertas,
estão também sujeitas às normas de controle e fiscalização expedidas pela
Comissão de Valores Mobiliários.
De acordo, com o art. 238 da Lei das Sociedades Anônimas29
a pessoa jurídica que controla a sociedade de economia mista tem as mesmas
responsabilidades do acionista controlador, porém a própria lei ressalva que a
orientação dos negócios sociais pode ser feita de modo a atender ao interesse
público que justificou a criação da sociedade.
Neste sentido ensina COELHO30 que:
[...] o que há em particular é a possibilidade de comprometimento dos recursos sociais em atividades relativamente deficitárias, importando em diminuição global do lucro líquido da sociedade, em virtude da realização do bem comum que inspirou a sua constituição.
Finalmente, terão elas obrigatoriamente conselho de
administração assegurado à minoria do direito de eleger um dos conselheiros, se
maior número lhes couber pelo processo de voto múltiplo. O funcionamento do
Conselho Fiscal será permanente nessas companhias. Os acionistas minoritários
terão direito a indicação de um de seus membros e respectivo suplente, e outro
pelas ações preferenciais, se houver.
Com isso, apresentou a presente pesquisa alguns fatos
importantes que deram origem a sociedade de economia mista no Brasil, bem como
sua evolução histórica e traços igualmente importantes da disposição legal, tais
como sua criação, que depende de lei específica, a forma de Sociedade Anônima, o
capital híbrido, o controle acionário, as responsabilidades, e a extinção.
27 É a sociedade anônima cujo capital pode ser disseminado pelo público, segundo índices e
percentuais obrigatórios... FAZZIO, Júnior Waldo. Manual de Direito Comercial 3 ed. São Paulo: Atlas,2003 p 234.
28 É a sociedade anônima cujas ações e outros títulos mobiliários de sua emissão não são negociados em Bolsa ou fora dela... FAZZIO, Júnior Waldo. Manual de Direito Comercial 3 ed . p 234.
29 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2011.p.1084.
30 COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial : Direito de Empresa. p. 226.
22
A seguir trataremos sobre o conceito de sociedade de
economia mista aproveitando ainda as suas particularidades históricas.
1.2 CONCEITO DA SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA
Com a base constitutiva não olvidada no tópico anterior
podemos mesmo que de forma singela, conceituar sociedade de economia mista a
luz da sua historicidade.
Sociedade de Economia Mista é Pessoa Jurídica de Direito
Privado, constituída por capital público e privado, por isso ser denominada como
mista. A parte do capital público deve ser maior, pois a maioria das ações deve estar
sob o controle do Poder Público. Somente poderá ser constituída na forma de S/A.
COELHO31 ao tratar da conceituação da sociedade de
economia mista, o faz direta e objetivamente, dizendo:
Sociedade de economia mista é sociedade anônima cujo capital social é constituído por recurso proveniente, em parte majoritária, do poder público e em parte minoritária, dos particulares. Sua constituição depende de lei, que poderá, evidentemente, estabelecer normas diferentes das previstas pela legislação do anonimato. Tais normas, no entanto, aplicam-se, tão-somente, à sociedade de economia mista em particular.
BERTOLDI32 conceitua sociedade de economia mista como “uma
espécie de sociedade anônima na qual se aliam recursos formados pelo capital privado e
recursos advindos do poder público para exploração de atividade econômicas de
interesses”.
31 COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial: Direito de Empresa . p 226. 32 BERTOLDI, Marcelo M. Curso de Direito Comercial, vol1 teoria geral do di reito comercial,
Direito Societário 2ed. Ver. E atual . – São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2003 p.252.
23
Pode-se também entender esta conceituação a luz da Carta
Magna, vejamos a redação do art.173 , § 1° incisos I e II, da Constituição da
República Federativa do Brasil de 198833.
CRFB/88 art. 173 § 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre:
I – sua função social e formas de fiscalização pelo Estado e pela sociedade;
II - a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários;
Entende-se, portanto que a sociedade de economia mista é
criada para explorar atividade econômica de produção e comercialização de bens ou
prestação de serviços, visando atender a uma função social e sujeitando-se ao
regime jurídico próprio das empresas privadas. Mas não apenas isto, em razão do
seu regime ambígeno, se sujeita à obediência dos princípios da Administração
Pública, inclusive na contratação de obras, serviços, compras e alienações.
Obriga-se ainda, a manter conselhos de administração e fiscal,
órgãos facultativos em regra para as sociedades anônimas em geral.
Nesse sentido NEGRÃO34 ensina que a sociedade de
economia mista faz parte do complexo de empresas estatais, ao lado das empresas
públicas e outras mantidas pelo Poder Público, e que à medida que se identifica
suas características, pode-se também conceituá-la. Veja então, suas principais
características:
a) Criação e extinção por lei (art.236 da lei 6.404/76).
b) Ter como objeto atividade econômica de produção ou
comercialização de bens ou prestação de serviços. 33 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e
Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes 7 ed. São Paulo: Saraiva , 2011.p.97
34 NEGRÃO, Ricardo. Manual de Direito Comercial e de Empresa. Volume 1: Evolução Histórica do Direito Comercial, teoria geral da empresa, dire ito societário. São Paulo: Saraiva, 2007 p.403.
24
c) Ser necessária aos imperativos da segurança nacional ou a
relevante interesse coletivo, conforme definido em lei.
d) Sujeitar-se ao controle governamental.
e) Sujeitar-se as normas de direito público nas licitações,
contratações de serviços e compras, mas reger-se também pelas regras da
sociedade por ações.
f) Distinguir-se da empresa pública em razão da forma que
adota “sociedade anônima” e, ainda, porque seu capital tem origem híbrida: fundos
públicos e investimento de particulares.
g) O controle da sociedade encontra-se em poder de pessoa
jurídica de direito público.
h) A função de acionista controlador ser exercida, com todos os
seus encargos, pela pessoa jurídica de direito publico que a criou e mantém.
i) Seus administradores, além da responsabilidade ordinária
dos diretores das sociedades anônimas, estão subordinados a regime próprio da
administração estatal, inclusive às penas em decorrência de improbidade
administrativa (art.1°da Lei n. 8.429/92) 35.
Destarte, a partir dessas características próprias quanto a seu
controle, criação e objeto, é possível formular o seguinte conceito de sociedade de
economia mista, segundo NEGRÃO36:
Sociedade anônima de direito privado, mas sujeita aos princípios da Administração Pública e controlada pelo Poder Público, criada por lei para atender aos imperativos da segurança nacional ou relevante interesse coletivo, tendo por objeto atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou prestação de serviços.
O Decreto-Lei nº 200, alterado pelo Decreto-lei nº 900, de 29
de setembro de 1969, definiu a sociedade de economia mista37 como: “a entidade
35 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e
Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes 7 ed. São Paulo: Saraiva, 2011.p.1222.
36 NEGRÃO, Ricardo. Manual de Direito Comercial e de Empresa. Volume 1: Evolução Histórica do Direito Comercial, teoria geral da empresa, direito societário.p.403.
37 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Comercial. 2.p 46.
25
dotada de personalidade jurídica de direito privado, criada por lei para o exercício de
atividade de natureza mercantil, sob forma de sociedade anônima cujas ações com direito a
voto pertençam em maioria, a União ou entidade da administração indireta”.
O Supremo Tribunal Federal também exterioriza a
conceitualização de sociedade de economia mista no Recurso Extraordinário –
95554RJ, verbis:
Recurso Extraordinário 95554RJ. Ementa: SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA (CONCEITO). "SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. COM ELA NÃO SE CONFUNDE A SOCIEDADE SOB O CONTROLE ACIONARIO DO PODER PÚBLICO. E A SITUAÇÃO ESPECIAL QUE O ESTADO SE ASSEGURA, ATRAVÉS DA LEI CRIADORA DA PESSOA JURÍDICA, QUE A CARACTERIZA COMO SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA." PRECEDENTES DO STF. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CONHECIDO E PROVIDO. Relator (a): RAFAEL MAYER. Julgamento: 01/03/1982. Órgão Julgador: PRIMEIRA TURMA. Publicação: DJ 02-04-1982 PP-12887 EMENT VOL-01248-03 PP-00912.
Percebe-se, portanto, que a somatória dos conceitos tratados
apresenta a Sociedade de Economia Mista como Pessoa Jurídica de Direito Privado,
constituída por capital público e privado, por isso ser denominada como mista. A
parte do capital público deve ser maior, pois a maioria das ações deve estar sob o
controle do Poder Público. Somente poderá ser constituída na forma de S/A.
Destarte, tendo em vista várias as definições conceituais
relacionadas na presente pesquisa, adotamos o conceito ensinado por NEGRÃO38,
como o mais adequado para continuarmos tratando da sociedade de economia
mista e sua formação, como sendo:
Sociedade anônima de direito privado, mas sujeita aos princípios da Administração Pública e controlada pelo Poder Público, criada por lei para atender aos imperativos da segurança nacional ou relevante interesse coletivo, tendo por objeto atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou prestação de serviços.
Após a conceituação apresentada neste item, o estudo dará
sua continuidade tratando da formação da sociedade de economia mista.
38 NEGRÃO, Ricardo. Manual de Direito Comercial e de Empresa. Volume 1: Evolução Histórica
do Direito Comercial, teoria geral da empresa, dire ito societário .p.403.
26
1.3 FORMAÇÃO DA SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA
A Constituição da República Federativa do Brasil em seu
TÍTULO VII – Da Ordem Econômica e Financeira, onde a Constituição da República
Federativa do Brasil/198839 trata dos princípios gerais da atividade econômica, mais
precisamente no art. 173 encontramos os objetivos e condições constitucionais para
formação das sociedades de economia mista, a saber:
a) exploração de atividade econômica de produção ou
comercialização de bens ou de prestação de serviços;
b) imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse
coletivo;
Com base nas disposições legais estabelecidas, analisará
então a presente pesquisa, cada uma das características próprias para formação
desse tipo de sociedade.
O primeiro tópico que será abordado é a exploração de
atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou prestação de
serviços.
1.3.1 Objetivo – Exploração de Atividade Econômica de Produção ou
Comercialização de Bens ou de Prestação de Serviços
A Carta Magna no seu art. 173 § 1º dispõe a respeito do objeto
da Sociedade de Economia Mista, onde prescreve que a lei estabelecerá o estatuto
jurídico da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem
atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou prestação de
serviços.
39 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e
Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes .p.97
27
Com base no preceito legal se verifica que é possível ao
Estado, por meio da chamada administração indireta, atuar em atividades onde, a
par do seu interesse social, onde a iniciativa privada não esteja presente, ou então
naqueles setores ditos estratégicos, que supostamente necessitem da sua atuação
direta.
BERTOLDI40, explica que:
A empresa mista pode desempenhar atividades típicas ou essenciais ao Estado que foram a ela conferidas a título de monopólio ou oferecer serviços e bens necessários à coletividade, que não estejam ou não possam ser ofertados pela iniciativa privada. Pode, excepcionalmente, ter por objeto uma atividade também exercida pela iniciativa privada, num sistema de concorrência.
No mesmo diapasão BASTOS41 esclarece que o preceito legal
inserido no art. 173 § 1º da Constituição da Republica Federativa do Brasil de
198842, estabelece para sociedades de economia mista que explorem atividade
econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços,
que se submetam ao regime jurídico previsto para empresas privadas.
Na verdade, o propósito é impedir que o Estado, exercendo
atividade econômica, valha-se de um regime jurídico privilegiado que torne a sua
competição com a empresa privada desastrosa para esta.
Em outras palavras o Estado quer abstrair-se de sua condição
de Poder Público para atuar em meio aos particulares, e com eles competindo em
condições isonômicas.
Parece então ficar claro, para os parâmetros estabelecidos
para esta pesquisa, qual o sentido objetivo da exploração de atividade econômica de
produção ou comercialização de bens ou prestação de serviços a que são
destinadas as sociedades de economia mista, ou seja, poder explorar atividade
40 BERTOLDI, Marcelo M. Curso de Direito Comercial, vol1 teoria geral do di reito comercial,
Direito Societário 2ed. Ver. E atual. p 253. 41 BASTOS, Celso Ribeiro Comentários à Constituição do Brasil: promulgada em 5 de outubro
de 1988, v.7: arts170 a 192/ Celso Ribeiro Bastos, Ives Gandra Martins – 2ed. Atual . São Paulo: Saraiva, 2000 p67.
42 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes .p.97
28
econômica sob a égide do regime jurídico a que se submetem as empresas de
direito privado, sem privilégios e de forma igualitária.
Como se vê no mandamento constitucional a disciplina que
move o objetivo da sociedade de economia mista está firmemente fundamentada na
supremacia da Constituição.
Contudo, veja no próximo subitem que o objetivo (da
exploração de atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou
prestação de serviços) somente será permitido quando necessários aos imperativos
de segurança nacional ou a relevante interesse coletivo.
1.3.2 Imperativos da Segurança Nacional ou a Releva nte Interesse Coletivo
A exploração estatal de atividade econômica está prevista no
artigo 173§ 1º da Constituição da República Federativa do Brasil de 198843, como
viu-se subitem acima, no entanto só será permitida quando necessária aos
imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo.
Com isso, entende-se que o Estado não explora atividade
econômica, o podendo fazer apenas em via de exceção, através dos pressupostos
contidos no caput do referido artigo.
Para SOUTO44, anota-se que o “imperativo de segurança
nacional” está ligado à defesa do território e à liberdade da população, enquanto o
“relevante interesse coletivo” em determinado setores será vinculado ao
estabelecido na Lei-programa do plano político-partidário escolhido no processo
eleitoral.
No mesmo sentido BASTOS45 assevera que a expressão
segurança nacional há de ater-se aquelas atividades que dizem respeito diretamente a
43 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e
Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes .p.97
44 SOUTO, Marcos Juruena Villela. Desestatização: privatizaçã o, concessões, terceirizações e regulação. 4. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris , 2001.p. 594.
45 BASTOS, Celso Ribeiro Comentários à Constituição do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988, v.7: arts170 a 192/ Celso Ribeiro Bastos, Ives Gandra Martins – 2ed. Atual p.55.
29
produção de bens e serviços necessários ao regular funcionamento e, até mesmo, ao
satisfatório aparelhamento das Forças Armadas.
Isso não significa que toda a produção bélica tenha de ser
gerada pelo Estado obrigatoriamente. O que o texto constitucional consagra é uma
permissão para que, ocorridos pressupostos relativos à segurança nacional, passe o
Estado a desempenhar atividade ou indústria que se mostrarem necessárias.
Já quando se trata de relevante interesse coletivo BASTOS46
posiciona que a expressão não é auto-executável, pois demanda uma legislação de
integração.
Para ARAUJO47
A caracterização da segurança nacional em si, não oferece dificuldade de enquadramento, pois há ainda vigente uma “Lei de Segurança Nacional“ (Lei nº 6620 de 17-12-1978), mas o mesmo não acontece com a conceituação do relevante interesse coletivo, mais sujeito as variáveis de época, lugar, população, costumes e até mesmo ideologia dos governantes.
A constituição da República Federativa do Brasil de 198848 no
seu art. 37 , XIX estabelece que a criação da Sociedade de Economia Mista depende
de lei específica. A partir da autorização legislativa a sua formação será regida pela
Lei 6.404/76, Lei das Sociedades Anônimas.
Corroborando com o art.37 , XIX da CRFB/88, o art. 236 da Lei
nº 6.404/76 prevê na sua redação que a constituição da sociedade de economia
mista depende de prévia autorização legislativa in verbis:
Lei 6.404/76 art. 236. A constituição de companhia de economia
mista depende de prévia autorização legislativa.
46 Op. Cite, p.56 47 ARAÚJO, Edmir Netto de Curso de Direito Administrativo 4 ed. rev. e atual .- São Paulo:
Saraiva, 2009 p.201. 48 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e
Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes .p.40
30
1.4 DA NATUREZA DE PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVA DO DAS
SOCIEDADES DE ECONOMIA MISTA
1.4.1 Natureza da Pessoa Jurídica
Quanto à natureza da pessoa jurídica a doutrina apresenta
várias teorias elaboradas, no intento de justificar e esclarecer a sua existência e a
razão da sua capacidade de direito.
Segundo Maria Helena Diniz49, apesar de não haver consenso
entre a grande variedade de doutrinas é possível agrupá-las em quatro categorias, a
saber: a) teoria da ficção legal e da doutrina; b) teoria da equiparação; c) teoria
orgânica; d) teoria da realidade das instituições jurídicas.
A teoria da ficção aduz que a pessoa jurídica é uma ficção legal, ou seja, uma criação artificial da lei para exercer direitos patrimoniais e facilitar a função de certas entidades.
A teoria da equiparação entende que a pessoa jurídica é um patrimônio equiparado no seu tratamento jurídico as pessoas naturais.
Pela teoria orgânica ou realidade objetiva, há organismos sociais constituídos pela pessoa jurídica que tem existência e vontade própria distinta de seus membros, tendo por finalidade realizar um objetivo social.
A teoria das realidades das instituições jurídicas, admite que há um pouco de verdade em cada uma dessas concepções. Como personalidade humana deriva do direito, da mesma forma ele pode concedê-la a agrupamentos de pessoas ou bens que tenham por escopo a realização de interesses humanos.
Sendo a personalidade jurídica um atributo que a ordem
jurídica estatal outorga a entes que assim o merecem. A teoria mais aceita como a
que atende a essência da pessoa jurídica, conforme DINIZ50 é a teoria da realidade
jurídica.
49 DINIZ, Maria Helena Curso de Direito Civil Brasileiro – Teoria Geral do Direito Civil 27 ed . São
Paulo: Saraiva, 2010 p. 244. 50 Op. Cite, p. 244.
31
No mesmo diapasão está o entendimento de VENOSA51
Para essa teoria, o ser humano é o centro fundamental de interesse e vontade a quem o direito reconhece personalidade. Como individuo, porém, não pode cumprir todas as atividades a que se propõem senão unindo-se a outros, o Direito deve reconhecer e proteger os interesses e a atuação do grupo social. Para tal é mister que o Direito um corpo ideal coletivo com interesse unificado, diferente da vontade individual de seus membros, e com uma organização capaz de expressar a vontade coletiva.
Considerando a teoria da realidade, que o Direito também
atribui à pessoa jurídica, assim como o faz a pessoa natural, direitos e obrigações
advindas da sua personalidade, e para cada tipo de pessoa há certas condições
objetivas e subjetivas prescrita pelo ordenamento jurídico.
Encerra-se o conceito de pessoa jurídica como objetivação do
próprio ordenamento.
Sendo assim encara-se a pessoa jurídica como realidade
técnica, pois desta forma está estabelecido na lei.
Código Civil52 art. 45 . Começa a existência legal das pessoas jurídicas de direito privado com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro, precedida, quando necessário, de autorização ou aprovação do Poder Executivo, averbando-se no registro todas as alterações por que passar o ato constitutivo.
Ressalta o presente dispositivo legal que a existência da
pessoa jurídica começa com a inscrição do ato constitutivo no respectivo registro,
precedida, quando necessário, de autorização ou aprovação do Poder Executivo.
Nesse entendimento conclui VENOSA53que a pessoa jurídica é
uma criação técnica.
51 VENOSA, Silvio Salvo Direito Civil: parte geral Coleção direito civil; v 1 6.ed. São Paulo: Atlas,
2006 p. 237. 52 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e
Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes. p.232
53 VENOSA, Silvio Salvo Direito Civil: parte geral Coleção direito civil; v 1 6.ed.p. 240.
32
1.4.2 Da Pessoa Jurídica de Direito Privado
1.4.2.1 Classificação
As pessoas jurídicas de direito privado, são instituídas por
iniciativa de particulares, conforme o artigo 44 do Código Civil Brasileiro54.
Código Civil art. 44. São pessoas jurídicas de direito privado:
I - as associações;
II - as sociedades;
III - as fundações.
IV - as organizações religiosas;
V - os partidos políticos.
No âmbito das pessoas jurídicas de direito privado o artigo 44
do Código Civil trata de duas classes de pessoas jurídicas; as associações e as
sociedades, especificamente para efeito desta pesquisa, serão consideradas
apenas, a sociedade empresaria, excluindo da pesquisa a outra forma de sociedade
existente; a sociedade simples, mesmo porque a sociedade de economia mista é
uma sociedade empresaria.
Pois a natureza das operações habituais caracteriza-se pelo
exercício de atividade econômica organizada para produção e circulação de bens e
serviços, próprias de empresário sujeito a registro.
Pois bem, basicamente a pessoa jurídica de direito privado
enquanto sociedade empresaria é reservada para questões com finalidade
econômica. Trata-se de uma espécie de sociedade que congrega seus esforços,
bem como, seu capital para realização de lucro a ser repartido entre os sócios.
54 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e
Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes .p.232
33
Assevera VENOSA55 que as sociedades mercantis têm sempre
finalidade lucrativa e são regidas pelas leis comerciais.
1.4.3 Natureza de Pessoa Jurídica de Direito Privad o das Sociedades de
Economia Mista
O Decreto-Lei Nº200, alterado pelo Decreto-Lei Nº900, de 29
de setembro de 1969, definiu a sociedade de economia mista como “entidade
dotada de personalidade jurídica de direito privado, criada por lei, para o exercício
de atividade de natureza mercantil, sob a forma de sociedade anônima cujas ações
com direito a voto pertençam, em maioria a União à entidade de administração
indireta” 56.
Destarte, são elas, pessoas jurídicas de direito privado
designadas como sociedade de economia mista e são regidas por normas voltadas
ao direito empresarial, trabalhista e tributário, conforme previsto no artigo 173 da
CRFB57, verbis:
CRFB/88 art. 173 . Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei.
§ 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre:
I - sua função social e formas de fiscalização pelo Estado e pela sociedade;
II - a sujeição ao regime jurídico próprio das empr esas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, c omerciais, trabalhistas e tributários
III - licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações, observados os princípios da administração pública;
55 VENOSA, Silvio Salvo Direito Civil: parte geral Coleção direito civil; v 1 6.ed.p. 245. 56 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Decreto-Lei/Del0900.htm 57 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e
Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes. p.97
34
IV - a constituição e o funcionamento dos conselhos de administração e fiscal, com a participação de acionistas minoritários;
V - os mandatos, a avaliação de desempenho e a responsabilidade dos administradores.
§ 2º - As empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar de privilégios fiscais não extensivos às do setor privado.
§ 3º - A lei regulamentará as relações da empresa pública com o Estado e a sociedade.
A constituição da sociedade de economia mista depende de lei
específica que autoriza a sua criação assim como preceitua o artigo 37 da CRFB58:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:
XIX - somente por lei específica poderá ser criada autarquia e autorizada à instituição de empresa pública, de sociedade de economia mista e de fundação, cabendo à lei complementar, neste último caso, definir as áreas de sua atuação;
XX - depende de autorização legislativa, em cada caso, a criação de subsidiárias das entidades mencionadas no inciso anterior, assim como a participação de qualquer delas em empresa privada;
Portanto a sua natureza jurídica está intrinsecamente
conformada à lei, tanto na sua criação autorizada por lei; quanto na sua formação,
com registro do ato constitutivo, definido por lei; sendo de natureza mercantil, como
dispõe a lei; na forma de sociedade anônima, quanto ao seu capital hibrido
igualmente também definidos em lei.
Estudados os tópicos principais de conceituação, posição legal,
constituição e natureza jurídica das sociedades de economia mista, mister se faz
analisar, também o instituto falimentar, tema do próximo capítulo.
58 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e
Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes p.40
35
CAPÍTULO 2
DO INSTITUTO FALIMENTAR
Para estudar a declaração da falência das sociedades de
economia mista, mister se faz, ainda, avaliarmos, mesmo que sumariamente, o
instituto falimentar, sua evolução histórica, conceitual, características e efeitos, alvo
de estudo do presente capitulo.
2.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA E LEGAL DO INSTITUTO FALIME NTAR
2.1.1 Direito Romano
Segundo ensina ALMEIDA59 falência é um instituto intimamente
ligado à evolução do próprio conceito de obrigação.
Aquele que faltasse com a sua obrigação era de tal forma
castigado que perdia sua liberdade, quando não a própria vida. Tratava-se, portanto,
de medida punitiva contra a pessoa do devedor que era a única garantia do credor.
Ainda leciona ALMEIDA60
No direito quiritário (ius quiritium, ius civile), a fase mais primitiva do direito romano, que antecede à codificação da Lei das Tábuas, o nexum (liame entre devedor e credor) admitia a addicere, adjudicação do devedor insolvente que, por sessenta dias, permanecia em estado de servidão para com o credor. Não solvido o débito nesse espaço de tempo, podia o credor vendê-lo como escravo no estrangeiro (Trans Tiberim, além do Tibre), ou até mesmo matá-lo, repartindo-lhe o corpo segundo o número de credores, numa trágica execução coletiva.
59 ALMEIDA, Amador Paes de Curso de Falências e Recuperação de Empresas: de ac ordo com
a Lei 11.101/05 22ed. Ver. E atual. São PAULO: Saraiva, 2006.p.5 60 Op. cite, p. 5
36
Assevera ALMEIDA61
Tal sistema perdurou até 428 a.C., com a promulgação da lex Poetelia Papiria, que introduziu no direito romano a execução patrimonial, abolindo o desumano critério da responsabilidade pessoal.
Pela bonorum venditio. Instituída pelo pretor Rutilio Rufo, o desapossamento dos bens do devedor era feito por determinação do pretor, nomeado um curador (curator bonarum) para a administração dos bens.
Igualmente, facultava-se ao devedor a cessão de seus bens ao
credor, que podia vendê-los separadamente. Era acessio bonorum, criada pela Lex
Julia Bonorum (737 A.C.), na qual, para alguns autores, estaria o embrião da
falência como observa WALDEMAR FERREIRA apud ALMEIDA62 “não poucos
romanistas divisam na Lex Julia o assento do moderno Direito Falimentar, por ter editado os
dois princípios fundamentais – O direito dos credores de disporem de todos os bens do
devedor e o da par condictio creditorum”.
Sendo assim, o credor, poderia tomar a iniciativa da execução,
e poderia agir em nome próprio, mas também em beneficio dos outros credores.
Segundo ALMEIDA63, completava-se a bonorum venditio, com
larga série de providências determinadas pelo pretor, contra os atos fraudulentos de
desfalque do seu patrimônio, praticados pelo devedor.
Embora não exista entre os autores consenso a respeito das
origens do direito falimentar, pois BESSONE64 afirma que “o instituto das quebras não
foi conhecido dos Romanos”; a evolução do modo de se promover a iniciativa
correspondente ao recebimento do crédito não pago conheceu determinado marcos
fundamentais na identificação na trajetória desses procedimentos.
61 ALMEIDA, Amador Paes de Curso de Falências e Recuperação de Empresas: de ac ordo com a
Lei 11.101/05 22ed. Ver. E atual .p.5 62 Op. Cite; p.5 63 Op. Cite; p.5 64 BESSONE, Darcy Instituições de Direito Falimentar 16 ed. atual. São Paulo: Saraiva, 1995 p.7
37
Assevera REQUIÃO65
No século V a.C. aboliu-se a chamada manus injectio, com submissão do devedor ao credor que podia dispor inclusive do corpo do devedor.
A denominada Lex Poetelia Papiria fortaleceu a atuação do magistrado, cingindo-se a execução do crédito aos bens do devedor, garantia efetiva dos credores.
Surge então o Direito de Justiniano, no qual a lei de execuções experimenta um novo e importante avanço: na execução contra devedor insolvente, os credores, através da mission in possessi bonorum, tinham em comum a posse dos bens do devedor e o direito de vendê-los. Deste modo o devedor perdia o direito de administrar os seus bens, que passavam a ser administrados por um curador bonorum nomeado pelo magistrado.
REQUIÃO66 assinala ainda:
Ter sido este mecanismo jurídico primitivo que delimitou os primeiros contornos do instituto da falência, pois com o desapossamento dos bens do devedor, estes passavam a ser custodiados pelo credor, sob as ordens e controle do magistrado para a venda posterior (bonorum venditio).
O concurso de credores, consubstanciado na missio
inpossessioneem e na bonorum cessio, como assinala ALFREDO ROCCO 67 apud
ALMEIDA, sustentava-se antes de tudo, na iniciativa dos próprios credores, como
escassa ingerência do poder Público.
2.1.2 Idade Média
Na Idade Média com tudo a tutela estatal assume especial
relevo, condicionando a atuação dos credores à disciplina judiciária, como explica
ALMEIDA68.
65 REQUIÃO, Rubens. Curso de Direito Falimentar. 16 ed atual . São Paulo: Saraiva,1995.p 7. 66 Op. cite, p. 8 67 ALMEIDA, Amador Paes de Curso de Falências e Recuperação de Empresas: de ac ordo com
a Lei 11.101/05 22ed. Ver. E atual . p.6. 68 ALMEIDA, Amador Paes de Curso de Falências e Recuperação de Empresas: de ac ordo com a
Lei 11.101/05 22ed. Ver. E atual . p.6.
38
O concurso creditório é rigidamente disciplinado, com obrigatoriedade de os credores habilitarem-se em juízo, por onde se processa a arrecadação dos bens do devedor, atribuindo-se o juiz a função de zelar “Por que se guarda e vende-se, partilhando-se o produto entre os credores”.
É nessa época que o concurso de credores se transforma na falência, quando o comércio, sobretudo o marítimo, atinge extraordinária expansão nas cidades italianas.
Explica ainda ALMEIDA69 que nesta fase a falência é vista como
um delito, cercando-se o falido de infâmia e impondo-se lhe penas que vão de prisão à
mutilação – Fallit sunt fraudatores (Os falidos são fraudadores, enganadores, velhacos).
Daí a expressão falência, o verbo falir70 encontra a sua origem
na evolução etimológica latina fallo, fefelli, falsum, fallere, cujo significado também
evoluiu de esconder, encobrir ou ocultar, para enganar ou induzir em erro, até
escapar a/de. Deste verbo latino, tem-se o elemento antepositivo de composição
nominal falec, do qual resultam os vocábulos modernos falácia, falha, falso, falência.
Nos dicionário jurídico segundo GUIMARÃES71, falência “é o
estado do comerciante que não cumpre obrigação liquida, certa e exigível no prazo
pactuado ou pratica atos que revelam a sua insolvência”. Ou seja, é suspender
pagamentos; não ter com o que pagar os credores; quebrar.
Falência também é o ato ou efeito de falir, quebra, omissão,
carência72.
Com isso, se pode pressupor do ponto de vista lexicológico,
que falência se define na situação ou estado em que se encontra o comerciante que
se torna impontual nos pagamentos das suas obrigações líquidas, certas e exigíveis.
Todavia, falência, na idade média, estendia-se a toda espécie
de devedor, comerciante ou não.
69 Op. Cite. p.6. 70 TZIRULNIK, Luiz. Direito Falimentar . São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005 p37. 71 GUIMARÃES, Deocleciano Torrieri Dicionário Técnico Jurídico 7 ed. São Paulo: Rideel, 2005.
p.315. 72 AMORA, Antonio Soares Minidicionário Soares Amora da Lingua Portuguesa 16 ed. São
Paulo:Saraiva, 2003 p. 306.
39
2.1.3 Código Napoleônico
O sistema adotado nos estatutos italianos difundiu-se por
outros países, bem como, na França.
Segundo ensina ALMEIDA73
O Código Comercial francês, de 1807, na elaboração do qual Napoleão Bonaparte teve preponderante atuação, conquanto impondo severas restrições ao falido, constitui-se em inegável evolução do instituto, restrito, na legislação francesa, ao devedor comerciante.
Ainda leciona ALMEIDA74
Que gradativamente abrandam-se os rigores da legislação, assumindo a falência um caráter econômico-social, refletindo no seu bojo as profundas alterações por que passaria o direito comercial e que culminaria com a modificação do próprio conceito de empresa, vista hoje como uma instituição social.
Faz-se, então, nítida distinção entre devedores honestos e desonestos, facultando-se aos primeiros os favores da moratória, com o aperfeiçoamento da concordata, cujo embrião encontra-se no pactum est minus solvatur e no quinquenales.
Nesse período os devedores podiam ser qualificados e a
falência assumiu um caráter econômico-social, restringindo o instituto falimentar ao
devedor comerciante.
2.1.4 O Direito Falimentar no Brasil
O Brasil ainda no período de colônia portuguesa sujeitava-se
às regras jurídicas do seu colonizador, ou seja, de Portugal, onde regia as
ordenações Afonsinas, Manuelinas e as Filipinas.
73 ALMEIDA, Amador Paes de Curso de Falências e Recuperação de Empresas: de ac ordo com a
Lei 11.101/05 22ed. Ver. E atual. p. 6. 74Op.Cite;. p.6.
40
Com a lei de 8 de março de 1595 promulgada por Filipe II, e
que viria mais tarde, em 1603, inspirar o Título LXVI do Livro V das Ordenações
Filipinas75. Estas ordenações disciplinavam o concurso de credores, estabelecendo
prioridade ao credor que tivesse a iniciativa da execução, prevendo, igualmente,
pena de prisão por inexistência de bens.
Foi, porém, com o alvará de 13 de Novembro de 1756,
promulgado pelo Marques de Pombal, que segundo ALMEIDA76 “se teve um autêntico
processo de falência, nítida e acentuadamente mercantil, em juízo comercial,
exclusivamente para comerciantes, mercadores ou homens de negócio”.
Nesse período o instituto da falência começa a apresentar
características que viriam servir de inspiração aos legisladores, para elaboração de
leis mais especificas; e sócio economicamente mais eficaz.
Como observa WALDEMAR FERREIRA apud ALMEIDA77:
Impunha-se ao falido apresentar-se à junta do Comércio, perante a qual “jurava a verdadeira causa da falência”. Após efetuar a entrega das chaves “dos armazéns das fazendas”, declarava todos os seus bens “móveis e de raiz”, fazendo entrega, na oportunidade, do Livro Diário, no qual deveriam estar lançados todos os assentos de todas as mercadorias, com a discriminação das despesas efetuadas.
A lei mercantil se estendeu no tempo, tendo ele influenciado o
legislador brasileiro que ao editar a Lei nº 556, de 25 de junho de 185078.
O Código Comercial Brasileiro estabeleceu que condições para
que alguém viesse a ser comerciante.
Segundo Moacyr Lobato79:
Decorreu inegável contribuição da codificação francesa do início do século XIX, ocasião em que o legislador gaulês admitiu que os atos
75 ALMEIDA, Amador Paes de. Curso de Falência e Recuperação de Empresa: de acordo com a
Lei n. 11.101/2005. 22ed. p.7. 76 Op. Cite, p.8. 77 Op. Cite. p.8. 78 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e
Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes . p.513.
79 CAMPOS FILHO, Moacyr Lobato de. Falência e Recuperação. Belo Horizonte: Del Rey, 2007p 14.
41
do comércio fossem tanto aqueles praticados profissionalmente pelos comerciantes, quanto àqueles praticados por outras pessoas, mesmo que não-comerciantes, desde que a lei os considerasse mercantis.
Historicamente, conforme relata Moacyr Lobato80 o Brasil
conheceu quatro fases importantes, com relação ao instituto da falência a saber:
A primeira foi notadamente o Código Comercial Brasileiro de 1850, onde na sua parte III, cuidava “Das Quebras”, disciplinado nos artigos 797 a 911.
A segunda fase da evolução do instituto falimentar se deu com a edição do Decreto Republicano nº 917, de 24 de novembro de 1890, pelo qual o estado de falência passou a ser caracterizado por atos ou fatos previstos em lei, mormente pela impontualidade, instituindo a moratória, a cessão de bens, o acordo extrajudicial e concordata preventiva, como meios preventivos a decretação da falência.
Ao decreto nominado, impotente para coibir abusos e fraudes, seguiu-se a Lei nº 859 de 16 de agosto de 1902, que foi substituída em 1908 pela Lei nº 2.024, dando início a terceira fase, que por vinte e um anos vigeu no Brasil.
Revista pelo Decreto nº 5.746, de 09 de dezembro de 1929, foi a Lei 2.024 revogada em 21 de junho de 1945, com a promulgação do Decreto-Lei nº 7661, que corresponde à quarta fase histórica da falência, com inúmeras alterações permaneceu em vigor, até quando foi promulgada a Lei nº 11.101, de 09 de fevereiro de 2005.
A nova legislação falimentar traz sensíveis inovações, tendo como princípio fundamental a recuperação econômica da empresa, “a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica” como enfatiza o art. 47 da Lei nominada.
Com isso, finalizamos neste primeiro tópico as considerações
feitas sobre a evolução histórica e legal do instituto falimentar, passando agora para
as considerações relativas ao conceito de falência.
80 CAMPOS FILHO, Moacyr Lobato de. Falência e Recuperação. Belo Horizonte: Del Rey, 2007p. 16
42
2.2 O CONCEITO DE FALÊNCIA
Como estudado nos tópicos anteriores entende-se que
economicamente, falência é a situação patrimonial insuficiente para a resolução de
débitos vencidos e sem perspectivas concretas para se adimplirem essas e outras
obrigações contraídas.
Sob este prisma Falência traduz um fenômeno econômico, um
fato patológico da economia creditícia.
Dentro desse raciocínio, esclarece ALMEIDA81 “que falência é à
condição daquele que, havendo recebido uma prestação a crédito, não tenha a disposição,
para execução da contraprestação, um valor suficiente, realizável no momento da
contraprestação”.
Juridicamente, falência se define atualmente, como processo
de execução coletiva, decretado por sentença judicial, contra o (comerciante)
devedor insolvente, com o objetivo de satisfazer o crédito dos credores.
A falência, ainda segundo COELHO82, “é a execução concursal
do devedor empresário”.
No mesmo diapasão FAZZIO JÚNIOR83 ensina que falência é
“um estado jurídico instaurado por um provimento jurisdicional, para solucionar a
situação oriunda da insolvência do empresário ou sociedade empresária, tendo em
vista o tratamento eqüitativo de seus credores”.
Quando o profissional exercente de atividade empresária é
devedor de quantias superiores ao valor de seu patrimônio, o regime jurídico da
execução concursal é diverso daquele que o direito prevê para o devedor civil.
Em seguida serão apresentados os requisitos processuais
necessários para decretação da falência, destacando algumas fases intrínsecas ao
processo de falência.
81 ALMEIDA, Amador Paes de. Curso de Falência e Recuperação de Empresa: de acor do com a
Lei n. 11,101/2005 . 22ed. p.17. 82 COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial: Direito de Empresa. p.308. 83 FAZZIO, Júnior Waldo. Manual de Direito Comercial 3 ed. p.615.
43
2.3 REQUISITOS PROCESSUAIS PARA DECRETAÇÃO DA FALÊ NCIA.
Processualmente, falência é um estado jurídico instaurado por
um provimento jurisdicional, para solucionar a situação oriunda da insolvência do
empresário ou sociedade empresária, tendo em vista o tratamento eqüitativo de
seus credores84.
Ou seja, trata-se de um processo de execução coletiva em que
todos os bens da empresa devedora são arrecadados para uma venda judicial, e
com o produto da venda ser feito o pagamento dos credores.
Anota-se que o processo de falência pode iniciar apenas com
um autor/credor, mas em determinada fase processual todos os credores deverão
integrar o processo para receber seu crédito.
Essencialmente o processo falimentar se divide em três fases
distintas:
A fase pré-falimentar; a fase falimentar propriamente dita; a
fase pós-falimentar.
A fase pré-falimentar é aquela que se inicia com o pedido da
falência do devedor e dura até que o juiz pronuncie a sentença declaratória da
falência85.
Durante esse período, o devedor, amparado pela Lei, pode
construir provas para sua defesa contra a falência. Por outro lado, é a fase que a
vida econômica do devedor é amplamente investigada.
Segundo MOACYR LOBATO86 a grande novidade da fase pré-
falimentar da Lei 11.101 de 09 de fevereiro de 2005 encontra-se no disposto em seu art. 95
que é a recuperação judicial que assim dispõe:
84 FAZZIO, Júnior Waldo. Manual de Direito Comercial 3 ed . p. 615. 85 COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial: Direito de Empresa . 21 ed. p. 318. 86 CAMPOS FILHO, Moacyr Lobato de. Falência e Recuperação . p. 156.
44
Art. 95 da Lei 11.101/200587. Dentro do prazo de contestação,
o devedor poderá pleitear sua recuperação judicial.
A recuperação judicial tem o objetivo de recuperar
economicamente, o devedor, assegurando-lhe, igualmente, os meios indispensáveis
à manutenção da empresa, considerando a função social desta, em conformidade
com o disposto no art. 47, verbis:
Art. 47 . A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.
Como nos ensina ALMEIDA88
O conceito põe em revelo a preocupação de preservar a empresa, vista esta como verdadeira instituição social para qual se conjugam interesses diversos: o lucro titular da empresa (empresário ou sociedade empresária); os salários (de manifesta natureza alimentar) dos trabalhadores; os créditos dos fornecedores; os tributos do Poder Público.
Claro está que os mesmos requisitos exigidos por lei para que
o devedor alcance a recuperação judicial pretendida em pedido originário se aplicam
aos pedidos de recuperação judicial motivados pelo requerimento de falência.
Sendo assim, a tramitação dos pedidos de recuperação
judicial, observados prazos e condições constantes da lei nova, torna incerto o
desfecho de vários pedidos de falência, que só serão objeto de declaração judicial à
medida que restarem frustrados os pedidos de recuperação judicial que tenham sido
por devedores, no prazo de contestação do pedido de falência apresentado por
todos seus credores.
87 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e
Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes .p.1462
88 ALMEIDA, Amador Paes de. Curso de Falência e Recuperação de Empresa: de acor do com a Lei n. 11,101/2005. 22 ed. p. 304.
45
Declarada a falência do devedor, tem início o que podemos
chamar de falência propriamente dita89, a qual se estende até que sejam liquidadas
todas as pendências em relação aos credores.
A falência nasce de uma decisão judiciária. Sem provimento
jurisdicional inexiste estado de falência, nesse sentido ensina FAZZIO90
Que antes da decretação judicial, pode-se falar em insolvência ou crise econômico-financeira, mas nunca em falência ou liquidação judicial, porque essa é uma situação jurídico-processual, enquanto aquela é mera conjuntura fática de raiz econômica. Liquidado ou falido é o agente econômico tido como tal por provimento judiciário definitivo.
Segundo FAZZIO91trata-se de fase em que se enfatiza a situação
patrimonial da falência. Este período é também destinado à discussão sobre o
comportamento do devedor falido, na esfera empresarial ou na criminal. É aqui que a
falência poderá ser categorizada como casual, culposa ou fraudulenta.
Continua FAZZIO92 explicando
Na falência casual não é detectada qualquer culpa do devedor, que acaba por ser considerada vítima de sua má administração, tendo a impossibilidade de cumprir as suas obrigações causadas por fatores independentes da sua vontade, sejam eles socioeconômicos externos a sua atividade, mas que o atingem, ou mesmo de drásticas mudanças no cenário empresarial em que atua.
Pode-se falar na falência culposa, quando são encontradas faltas praticadas pelo devedor especialmente em seus livros comerciais, como erros de lançamento, ausência de escrituração, entre outras.
Igualmente é culposa a falência causada por negligência, imprudência ou prodigalidade manifestas do falido, quando este tenha consumido parte apreciável do seu património em jogo de azar, ou quando o falido tenha deixado de cumprir as disposições que a lei estabelece para regularidade da escrituração e das transações comerciais, a não ser que a pequena proporção do comércio e as rudimentares habilitações literárias do falido, o relevem do não cumprimento dessas disposições. A falência do banqueiro que cessa pagamentos e a do comerciante que não se apresenta voluntariamente presumem-se culposas.
89 COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial: Direito de Empresa. 21 ed. p. 318. 90 FAZZIO, Júnior Waldo. Nova Lei de Falência e Recuperação de Empresas 2 ed . São Paulo:
Atlas,2005. p.196. 91 Op. Cite. p.196. 92 Op. Cite. p.196.
46
Por fim, indícios concretos e provados de má fé na conduta do devedor antes ou depois da decretação da falência caracterizam pontualmente a falência fraudulenta.
Após a sentença de encerramento da falência, termina o
processo falimentar propriamente dito. Contudo, o falido poderá promover sua
reabilitação; se for do seu interesse voltar a exercer atividade empresarial deverá
obtê-la necessariamente.
Dar-se-á inicio a fase pós-falimentar93; desde que não tenha
havido qualquer condenação civil ou criminal, é o período em que ocorre todo o
processo de reabilitação do falido. A reabilitação compreende a extinção das
responsabilidades civis e penais do falido.
No âmbito do direito civil, deverá o falido requerer a
declaração, por sentença, da extinção das obrigações. Esta ocorre nas seguintes
hipóteses:
Com o pagamento dos créditos ou novação daqueles com
garantia real (art. 158, I);
Neste sentido aduz COELHO94 que o pagamento é a causa da
extinção das obrigações que pode ocorrer antes ou depois da sentença em encerramento
da falência.
Pode ser também por meio de rateio de mais de 50% do
passivo, após a realização de todo ativo, sendo facultado o depósito da quantia
necessária para atingir-se esta percentagem (art.158, II);
Já neste caso COELHO95 ensina que o rateio de mais de 50% do
passivo, após a realização de todo o ativo, por sua vez, é causa que se verifica,
necessariamente, antes do encerramento da falência.
93 COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial: Direito de Empresa. 21 ed. p. 318. 94 Op. Cite, p.339. 95 Op. Cite, p.339.
47
Existe também a hipótese de decurso de prazo de 5 anos após
o encerramento da falência, se o falido ou o representante legal da sociedade falida
não incorreu em crime falimentar (art. 158, III);
Igualmente o decurso de prazo de 10 anos após o
encerramento da falência se houve condenação do falido ou do representante legal
da sociedade falida por crime falimentar (art. 158, IV);
Ou prescrição das obrigações anteriormente ao decurso
desses prazos decadenciais (art. 158).
A declaração da falência suspende a fluência dos prazos
prescricionais das obrigações do falido, (o assunto será abordado mais
detalhadamente no item 2.4.5 da presente pesquisa) os quais recomeçam a fluir do
trânsito em julgado da sentença de encerramento da falência. Se antes de 5 ou 10
anos do encerramento, conforme for o caso, ocorrer a prescrição, extingue-se a
obrigação correspondente, como dispõe a lei a seguir.
Lei 11.101/0596 art. 158 . Extingue as obrigações do falido:
I – o pagamento de todos os créditos;
II – o pagamento, depois de realizado todo o ativo, de mais de 50% (cinqüenta por cento) dos créditos quirografários, sendo facultado ao falido o depósito da quantia necessária para atingir essa porcentagem se para tanto não bastou a integral liquidação do ativo;
III – o decurso do prazo de 5 (cinco) anos, contado do encerramento da falência, se o falido não tiver sido condenado por prática de crime previsto nesta Lei;
IV – o decurso do prazo de 10 (dez) anos, contado do encerramento da falência, se o falido tiver sido condenado por prática de crime previsto nesta Lei.
Com isso, norteia COELHO97:
Que o falido deverá apresentar requerimento de declaração de extinção das obrigações, acompanhado da prova de quitação dos
96 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e
Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes. p.1472
97 COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial: Direito de Empresa . 21 ed. p. 339.
48
tributos relativos ao exercício do comércio (CTN, art. 191). Após ouvidas as partes e, se for o caso, o representante do Ministério Público, o juiz proferirá sentença. Se for o caso de levantamento de falência, o juiz declarará encerrado o processo na mesma sentença que julgar extinta as obrigações do falido.
Já no âmbito do direito penal, se o falido não estiver sendo
processado ou tiver sido absolvido, por sentença definitiva, poderá com a simples
extinção das obrigações, voltar a explorar atividade empresarial, reabilitado que se
encontra.
Se, no entanto, ele for condenado por crime falimentar, deverá
ainda, requerer a sua reabilitação penal. Esta pode somente ser concedida com o
transcurso de 2 anos contados do cumprimento da pena. A declaração, por sentença
da extinção das obrigações é condição da reabilitação penal.
Finalmente, ensina COELHO98 que:
O falido reabilitado civil e criminalmente, na forma examinada, pode volta a explorar regularmente atividade empresarial. Se não requereu sua reabilitação, os efeitos da inabilitação limita-se a 5 anos, contados da extinção da punibilidade.
Lei 11.101/0599 art. 181 . menciona quais são esses efeitos da
condenação por crime:
§ 1o Os efeitos de que trata este artigo não são automáticos, devendo ser motivadamente declarados na sentença, e perdurarão até 5 (cinco) anos após a extinção da punibilidade, podendo, contudo, cessar antes pela reabilitação penal.
Na sequência da presente pesquisa será apresentada uma
abordagem periférica dos efeitos jurídicos da declaração da falência.
98 COELHO, Fábio Ulhoa. Manual de Direito Comercial: Direito de Empresa . 21 ed. p. 340 99 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e
Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes .p.1472
49
2.4 DOS EFEITOS JURÍDICOS DA DECLARAÇÃO DE FALÊNCI A.
Via de regra, a decretação da falência implica no encerramento
das atividades da empresa, excepcionalmente pode ser autorizada a continuação do
negócio no interesse dos credores. A continuação será sempre com prazo
determinado podendo ser prorrogado tantas vezes forem necessárias.
A autorização para continuação das atividades é concedida ou
aprovada pela assembléia geral de credores, sempre no interesse dos credores.
A decretação da falência acarreta alguns efeitos imediatos:
Segundo aponta FAZZIO100 resumida e genericamente, os
efeitos da sentença positiva de falência são:
Formação da massa falida subjetiva; Suspensão das ações
individuais; Suspensão condicional da fluência dos juros; Exigibilidade antecipada dos
créditos contra o devedor, sócios ilimitadamente responsáveis e administradores solidários;
Suspensão da prescrição; Arrecadação dos bens do devedor;
2.4.1 Formação da Massa Falida Subjetiva
Para FAZZIO101 a expressão massa falida comporta duas
acepções: subjetiva, quando designada dos credores; objetiva, quando pertinente ao
patrimônio colocado sob regime falimentar.
Com a decretação da quebra nasce a massa de credores. Seu
objetivo é concorrer ao ativo do devedor, pelo montante de seus haveres. Realizado
o ativo, irão partilhar o seu produto, equitativamente, conforme a classificação de
seus créditos.
Neste sentido discorre FAZZIO102 “a massa falida subjetiva
concorre sobre os bens que estão a cargo da massa falida objetiva. A massa falida não tem
100 FAZZIO, Júnior Waldo. Nova Lei de Falência e Recuperação de Empresas 2 ed . p. 282. 101 Op. Cite. p. 282.
50
bens, uma vez que estes pertencem ao devedor de cuja posse e administração é privado
em decorrência da sentença falencial”.
No mesmo diapasão CARVALHO DE MENDONÇA apud
FAZZIO103 aponta que a massa falida não tem bens, uma vez que estes pertencem
ao devedor de cuja posse e administração, são privadas em decorrência da
sentença falencial, asseverando:
“A massa falida exerce uma administração in rem suam”. A propriedade dos bens do falido é simplesmente nominal, uma vez que a massa dele pode e vai dispor. Configura-se um estágio necessário de transição: a propriedade do devedor sobre seus bens é mitigada pela apropriação judicial; a massa falida objetiva serve de ponte para entrega desses bens, ou do produto de sua realização, para massa falida subjetiva. Por massa falida objetiva entenda-se a ponte entre o devedor desapossado e os credores.
A propriedade e bens do falido é simplesmente nominal, uma
vez que a massa dele pode e vai dispor.
Nesse diapasão o mais importante é esclarecer quem pode e
quem não pode integrar a massa falida subjetiva ou corpus creditorum.
Não é todo e qualquer crédito que poderá concorrer na fase
executória da falência.
Não podem ser reclamadas: as obrigações a título gratuito; as
despesas que credores individualmente fizerem para tomar parte na falência, salvo
custas judiciais, em litígio com a massa;
2.4.2 Suspensão das Ações Individuais
Assevera FAZZIO104 que se a falência envolve a coletividade dos
bens do devedor; se, conforme a lei, todos os credores (salvo as exceções legalmente
preestabelecidas) devem concorrer no juízo infracionável e universal; se a falência visa
102 FAZZIO, Júnior Waldo. Nova Lei de Falência e Recuperação de Empresas 2 ed . p.283. 103 Op. Cite, p.283. 104 Op. Cite, p.287.
51
assegurar a par conditio creditorium, é natural que sejam suspensas as ações singulares
contra o devedor.
WALDEMAR FERREIRA apud FAZZIO105 observa:
Perderia a falência seu caráter unitário e deixaria seu juízo de ser universal, se prosseguissem as ações iniciadas contra o falido as execuções contra ele promovidas, quiçá em vários juízos, posto que na mesma comarca. Incidentes poderiam surgir desnaturando o processo coletivo, exigindo em cada juízo novo concurso creditório, quando do levantamento do preço dos bens arrematados se tratasse.
É para contornar tais inconvenientes que as execuções
individuais ficam suspensas, desde a abertura até o encerramento do processo
falimentar. O momento da suspensão é o da sentença declaratória.
Sendo assim explica FAZZIO106
Ressalvadas as exceções previstas na lei, nem todas as ações iniciadas antes da decretação da falência suspendem-se, tendo prosseguimento com o administrador judicial que representa a massa, aquelas execuções por créditos não sujeitos a rateio (ações trabalhistas e execuções fiscais), as ações que dizem respeito a obrigações personalíssimas e as que demandarem quantia íliquida.
Finalizando esse segmento, importa dizer que a decretação da
falência suspende o exercício do direito de retenção sobre os bens sujeitos a
arrecadação, pelo administrador judicial. Sendo assim, o titular do direito deve
habilitar-se para recepção de seu crédito, conforme a classificação que lhe cabe.
2.4.3 Suspensão Condicional de Fluência de Juros
Da sentença declaratória decorre, ainda, a suspensão da
fluência de juros, visto que há uma presunção legal, de caráter relativo, de que o
ativo é insuficiente para o pagamento deles. Isso significa que os juros que não
correm contra a massa são os posteriores à decretação da quebra.
105 FAZZIO, Júnior Waldo. Nova Lei de Falência e Recuperação de Empresas 2 ed . p.283. 106 FAZZIO, Júnior Waldo Manual de Direito Comercial 8ed . São Paulo: Atlas, 2007p.650.
52
Todavia, a lei falimentar deixa claro que a suspensão de juros
ocorre “se o ativo apurado não bastar para o pagamento dos créditos subordinados”
a saber:
Lei 11.101/05107 art. 124 . Contra a massa falida não são exigíveis juros vencidos após a decretação da falência, previstos em lei ou em contrato, se o ativo apurado não bastar para o pagamento dos credores subordinados.
Parágrafo único. Excetuam-se desta disposição os juros das debêntures e dos créditos com garantia real, mas por eles responde, exclusivamente, o produto dos bens que constituem a garantia.
Assim, a suspensão da fluência de juros depende de uma
condição, isto é, da impotência do produto obtido na realização do ativo.
Entendam-se, pois, que contra a massa falida incidem juros.
Estes poderão vir a ser exigidos se o ativo apurado bastar-se para o pagamento do
principal. O problema não é incidirem ou não, mas de poderem ser exigidos,
conforme as forças do ativo liquidado.
Como se percebe no parágrafo único do artigo 124 da referida
lei são excluídos da regra os juros atinentes às debêntures e aos créditos com
garantia real. Estes, na conformidade da lei, serão satisfeitos pelo produto dos bens
dados em garantia.
2.4.4 Exigibilidade Antecipada dos Créditos
Explica FAZZIO108 que em regra geral, nos casos de insolvência do
devedor, os débitos tem sua exigibilidade antecipada. É assim que o Direito Comercial e no
Direito Civil. No primeiro a divida considera-se vencida se o devedor incidir em falência; no
segundo, ao credor assistirá o direito de cobrar a divida antes de vencido o prazo pactuado,
se executado o devedor, se abrir concurso creditório.
Nos termos do art. 77 da Lei 11.101/2005, a sentença que
decreta a falência determina o vencimento antecipado das obrigações do devedor e
107 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e
Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes .p.1468.
108 FAZZIO, Júnior Waldo. Nova Lei de Falência e Recuperação de Empresas 2 ed . p.289.
53
dos sócios ilimitada e solidariamente responsáveis, com o abatimento proporcional
dos juros. Estabelece a conversão de todos os créditos em moeda estrangeira para
moeda nacional, pelo câmbio do dia da decisão judicial, a saber.
Art. 77. A decretação da falência determina o vencimento antecipado das dívidas do devedor e dos sócios ilimitada e solidariamente responsáveis, com o abatimento proporcional dos juros, e converte todos os créditos em moeda estrangeira para a moeda do País, pelo câmbio do dia da decisão judicial, para todos os efeitos desta Lei109.
A lei determina, igualmente, o abatimento dos juros legais ou
da taxa pactuada, da importância do crédito concorrente, antecipadamente exigível
em razão da inauguração do estado falimentar.
É regra do artigo 333, parágrafo único, do Código Civil110, onde
se lê que ao credor assistirá o direito de cobrar a dívida antes do vencimento no
caso de falência do devedor, mas se houver no débito solidariedade passiva não se
reputará vencida a divida quanto aos outros solventes, verbis.
Código Civil art. 333 . Ao credor assistirá o direito de cobrar a dívida antes de vencido o prazo estipulado no contrato ou marcado neste Código:
I - no caso de falência do devedor, ou de concurso de credores;
Parágrafo único. Nos casos deste artigo, se houver, no débito, solidariedade passiva, não se reputará vencido quanto aos outros devedores solventes.
O vencimento antecipado da dívida de um dos devedores
solidários só se verifica em relação a sua dívida, não se reputando vencido em
relação aos demais coobrigados.
109 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e
Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes p.1459
110 Op. Cite. .p.264.
54
2.4.5 Suspensão da Prescrição
O artigo 6º da Lei 11.101/2005111 declara que durante o
processo de falência fica suspenso o curso da prescrição relativa a obrigações de
responsabilidade do devedor.
Lei 11.101/05 art. 6 o A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário.
Com o encerramento do processo falencial, os credores
recuperam o direito de executar o devedor ou, no caso das sociedades, os sócios de
responsabilidade solidária, pelos saldos dos seus créditos.
No transito em julgado da sentença de encerramento, voltará a
fluir o prazo prescricional das obrigações do devedor, antes suspenso pela
decretação da falência, nos termos do artigo 157 da Lei Falimentar112, a saber.
Lei 11.101/05 art.157 . O prazo prescricional relativo às obrigações do falido recomeça a correr a partir do dia em que transitar em julgado a sentença do encerramento da falência.
A suspensão diz respeito, apenas, ao falido e não às
obrigações de terceiro para com o falido ou a massa. Não se suspende a prescrição
em que o falido é credor.
2.4.6 Arrecadação dos Bens do Devedor
Outro efeito da sentença de falência é a arrecadação dos bens
do devedor. É ato de imissão, pelo administrador judicial, na posse dos bens sujeitos
ao concurso de credores.
111 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e
Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes .p.1445
112 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes 1472.
55
Como já foi visto o devedor perde a disponibilidade e a gestão
dos seus bens, inclusive de direitos e ações. Não se trata de expropriação, mas de
perda da administração e da disponibilidade. O Falido não perde a propriedade dos
bens, exclusivamente porque, se todos os credores forem pagos, terá direito à
sobra, se houver. Só por isso. De fato, seu direito de propriedade esvazia-se. Esse
fenômeno é destacado por PAULO FERNANDO CAMPOS SALLES DE TOLEDO
apud FAZZIO113:
Como se vê, um dos efeitos imediatos do decreto de quebra é o desapossamento dos bens do falido, segundo costuma ser dito. Mas o falido, como também se viu, não perde apenas a posse dos bens. Perde, mais do que isso, em relação a esses bens, o exercício de toda e qualquer faculdade inerente ao domínio. Assim é que, ao serem arrecadados seus bens, perde o falido os direitos de usá-los, nem praticar quanto a ele, qualquer ato, perde o direito de perceber os frutos ou produtos deles decorrentes, sendo-lhe subtraída faculdade de gozo. Não pode igualmente dispor desses bens, mesmo porque esse direito é atribuído ao sindico, para exercício em benefício da coletividade de credores. Ou seja: nada resta ao falido do conteúdo positivo do direito de propriedade. Até aqui, no entanto, não poderia dizer que deixou de ser proprietário. E isto porque restaria ao falido a característica que tradicionalmente faz com se admita a existência, na espécie, de direito subjetivo. Ou seja: o direito de reaver a coisa de quem injustamente a detenha ou possua. Ocorre, no entanto, que nem mesmo esse direito pode ser exercido pelo falido, eis que a representação da massa falida incube ao síndico. O máximo que se permite ao falido requerer, nos autos da falência providências conservatórias dos bens arrecadados e o que for a bem dos seus direitos e interesses, podendo, ainda intervir , como assistente , nos processos que a massa seja parte ou interessada, e interpor os recursos cabíveis. Perde, pois o exercício do direito de seqüela, inerente à qualidade de proprietário, restando-lhe somente os direitos de petição e de intervenção como assistente, não característicos da propriedade ( no processo falimentar para ficar no instituto em exame , todo credor goza dos mesmos direitos).
Com a arrecadação do patrimônio do devedor, nasce a massa
falida objetiva. Constitui-se, então, um patrimônio afetado por sua destinação no
regime legal da falência. A massa falida objetiva é o próprio ativo do devedor sob a
gestão do administrador judicial.
Significa todo o ativo do devedor, ou seja, tudo o que consistir
em valor econômico.
113 FAZZIO, Júnior Waldo. Nova Lei de Falência e Recuperação de Empresas 2 ed. p.293.
56
Não são arrecadados os bens absolutamente impenhoráveis
conforme Código de Processo Civil, art. 649114, in verbis:
Código de Processo Civil Art. 649. São absolutamente impenhoráveis:
I - os bens inalienáveis e os declarados, por ato voluntário, não sujeitos à execução;
II - os móveis, pertences e utilidades domésticas que guarnecem a residência do executado, salvo os de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns correspondentes a um médio padrão de vida;
III - os vestuários, bem como os pertences de uso pessoal do executado, salvo se de elevado valor;
IV - os vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de aposentadoria, pensões, pecúlios e montepios; as quantias recebidas por liberalidade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, observado o disposto no § 3o deste artigo;
V - os livros, as máquinas, as ferramentas, os utensílios, os instrumentos ou outros bens móveis necessários ou úteis ao exercício de qualquer profissão;
VI - o seguro de vida;
VII - os materiais necessários para obras em andamento, salvo se essas forem penhoradas;
VIII - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família;
IX - os recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social;
X - até o limite de 40 (quarenta) salários mínimos, a quantia depositada em caderneta de poupança.
XI - os recursos públicos do fundo partidário recebidos, nos termos da lei, por partido político.
114 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e
Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes .p.659
57
2.4.7 Efeitos Quanto ao Devedor
Nos artigos 102 e 103 da Lei 11.101/2005115 trata dos efeitos
da sentença declaratória de falência quanto à pessoa do devedor, ou seja, quanto
ao empresário individual falido e os sócios ilimitadamente responsáveis. Os mais
importantes são: inabilitação temporária para o exercício da atividade empresarial;
perda da administração e disponibilidade de seus bens. O artigo 104 retrata os
deveres impostos ao falido com a decretação da falência, a saber:
Lei 11.101/05 art. 102 . O falido fica inabilitado para exercer qualquer atividade empresarial a partir da decretação da falência e até a sentença que extingue suas obrigações, respeitado o disposto no § 1o do art. 181 desta Lei.
Parágrafo único. Findo o período de inabilitação, o falido poderá requerer ao juiz da falência que proceda à respectiva anotação em seu registro.
Art. 103. Desde a decretação da falência ou do seqüestro, o devedor perde o direito de administrar os seus bens ou deles dispor.
Parágrafo único. O falido poderá, contudo, fiscalizar a administração da falência, requerer as providências necessárias para a conservação de seus direitos ou dos bens arrecadados e intervir nos processos em que a massa falida seja parte ou interessada, requerendo o que for de direito e interpondo os recursos cabíveis.
Art. 104 . A decretação da falência impõe ao falido os seguintes deveres:
I – assinar nos autos, desde que intimado da decisão, termo de comparecimento, com a indicação do nome, nacionalidade, estado civil, endereço completo do domicílio, devendo ainda declarar, para constar do dito termo:
a) as causas determinantes da sua falência, quando requerida pelos credores;
b) tratando-se de sociedade, os nomes e endereços de todos os sócios, acionistas controladores, diretores ou administradores,
115 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e
Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes .p.1464
58
apresentando o contrato ou estatuto social e a prova do respectivo registro, bem como suas alterações;
c) o nome do contador encarregado da escrituração dos livros obrigatórios;
d) os mandatos que porventura tenha outorgado, indicando seu objeto, nome e endereço do mandatário;
e) seus bens imóveis e os móveis que não se encontram no estabelecimento;
f) se faz parte de outras sociedades, exibindo respectivo contrato;
g) suas contas bancárias, aplicações, títulos em cobrança e processos em andamento em que for autor ou réu;
II – depositar em cartório, no ato de assinatura do termo de comparecimento, os seus livros obrigatórios, a fim de serem entregues ao administrador judicial, depois de encerrados por termos assinados pelo juiz;
III – não se ausentar do lugar onde se processa a falência sem motivo justo e comunicação expressa ao juiz, e sem deixar procurador bastante, sob as penas cominadas na lei;
IV – comparecer a todos os atos da falência, podendo ser representado por procurador, quando não for indispensável sua presença;
V – entregar, sem demora, todos os bens, livros, papéis e documentos ao administrador judicial, indicando-lhe, para serem arrecadados, os bens que porventura tenha em poder de terceiros;
VI – prestar as informações reclamadas pelo juiz, administrador judicial, credor ou Ministério Público sobre circunstâncias e fatos que interessem à falência;
VII – auxiliar o administrador judicial com zelo e presteza;
VIII – examinar as habilitações de crédito apresentadas;
IX – assistir ao levantamento, à verificação do balanço e ao exame dos livros;
X – manifestar-se sempre que for determinado pelo juiz;
XI – apresentar, no prazo fixado pelo juiz, a relação de seus credores;
59
XII – examinar e dar parecer sobre as contas do administrador judicial.
Parágrafo único. Faltando ao cumprimento de quaisquer dos deveres que esta Lei lhe impõe, após intimado pelo juiz a fazê-lo, responderá o falido por crime de desobediência
A partir da sentença declaratória positiva de falência, o devedor
fica inabilitado para exercer qualquer atividade empresarial. A vedação persiste até a
sentença extintiva de suas obrigações, igualmente com decretação falimentar, o
devedor sofre indisponibilidade de seus bens e perde o direito de administrá-los.
Encerram-se neste capítulo 2 as considerações referentes ao
instituto falimentar; embora entendendo que o assunto seja muito mais amplo do que
aquilo que foi tratado na presente pesquisa, a priori, julga-se suficiente para sua
continuidade, para tanto, no capítulo seguinte será tratado da falência da sociedade
de economia mista, propriamente dita, contudo, antes se faz necessário uma
abordagem detalhada no que se refere à lei federal 11.101/05, outrossim, o artigo
242 (revogado) da LSA, bem como os princípios constitucionais, e a opinião da
doutrina no País.
60
CAPÍTULO 3
A DECLARAÇÃO DA FALÊNCIA DA SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA
Ultrapassadas as fases iniciais de contexto teórico fundamental
para a presente pesquisa, o estudo pode, então, voltar-se a problemática principal
acerca da (im)possibilidade da decretação da falência das sociedades de economia
mista, tendo em vista o entendimento legal e doutrinário atual. É o que se predispõe
o presente capítulo.
3.1 A (IM)POSSIBILIDADE LEGAL DA DECLARAÇÃO DA FALÊ NCIA DAS
SOCIEDADES DE ECONOMIA MISTA
A lei de recuperação judicial e da falência (Lei 11.101/05) traz,
em seu art. 2º, inciso I, a exclusão de sua aplicação a empresa pública e a
sociedade de economia mista, sendo assim, num primeiro momento, segundo a lei,
ficam as sociedades de economia mista, impossibilitadas de passar por um processo
falimentar, a saber:
Lei 11.101/05116 art. 1 o Esta Lei disciplina a recuperação judicial, a recuperação extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, doravante referidos simplesmente como devedor.
Art. 2 o Esta Lei não se aplica:
I – empresa pública e sociedade de economia mista ;
Entretanto, a investigação de outros dispositivos jurídicos, nos
permite tratar o assunto em sentido mais amplo.
116 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e
Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes . p.1445
61
Inicialmente, observando a Lei 6.404/76117 – Sociedades por
Ações a Lei das S/A. percebe-se a revogação do art. 242 que assim dispunha:
Lei 6.404/76 art. 242 . (revogado) As companhias de economia mista não estão sujeitas a falência, mas os seus bens são penhoráveis e executáveis, e a pessoa jurídica que a controla responde, subsidiariamente, pelas suas obrigações.
Igualmente, no seu bojo a redação original da referida lei das
sociedades por ações (Lei 6.404/76, art. 242 ), também excluía as sociedades de
economia mista da aplicação das disposições de um processo falimentar.
No entanto, o mesmo revogado artigo que dispunha que as
companhias de economia mista não estão sujeitas a falência, previa em sua redação
que os seus bens eram penhoráveis e executáveis, e a pessoa jurídica que
controlava a sociedade de economia mista responderia, subsidiariamente, pelas
suas obrigações.
Destarte, segundo ensina CARVALHOSA118:
O artigo 242 da Lei nº 6.404/76119 estabelecia o princípio da imunidade das sociedades de economia mista ao processo de falência, justificado, na exposição de motivos da lei, pelo fato de o interesse público que enseja a criação, por lei, de uma sociedade de economia mista não permitir que sua administração possa ser transferida a terceiros, credores, por meio do síndico, como ocorre na falência.
CARVALHOSA120 continua explicando que “essa imunidade
prevista no revogado art. 242 encontrava o seu fundamento na necessidade de ser
preservado o interesse público que presidia a instituição; entendia-se não se justificar que os
credores, e não o representante do Estado passassem a dirigir as atividades da companhia
de economia mista em caso de falência”.
117 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e
Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes p.1084.
118 CARVALHOSA, Modesto A Nova Lei das Sociedades Anônimas/Modesto Carvalho sa e Nelson Eizirik São Paulo: Saraiva, 2002 p.365.
119 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes. p.1084
120 CARVALHOSA, Modesto A Nova Lei das Sociedades Anônimas/Modesto Carvalho sa e Nelson Eizirik . p. 366.
62
A imunidade falimentar, extinta, com a revogação do artigo 242
da Lei 6.404/76, pelo artigo 10 da lei 10.303/01, constituía privilégio legal atribuído
as sociedades de economia mista.
Assevera CARVALHOSA121que:
Para compensar tal privilégio legal, que evidentemente ocorria antes da sua revogação, o art. 242 da LSA previa a penhorabilidade dos bens da sociedade de economia mista e a responsabilidade subsidiaria ilimitada de seu acionista controlador.
A imunidade falimentar não comprometia a tutela dos credores por obrigações das sociedades de economia mista, identifica-se isso, na medida em que estavam garantidos pela executividade de suas dividas, pela penhorabilidade de seus bens, bem como, pela responsabilidade subsidiaria do seu acionista controlador.
Embora estivessem às sociedades de economia mista imunes ao processo de execução coletiva, ou seja, a falência; certamente se submetiam, à execução singular, podendo seus bens ser objeto de penhora. Ademais, a LSA, em seu art. 242, previa sem qualquer limitação a responsabilidade subsidiaria do acionista controlador pelas obrigações da sociedade de economia mista.
Com a revogação do art. 242, as sociedades de economia
mista passam segundo nos ensina CARVALHOSA122, a submeter-se ao processo de
execução coletiva, sem qualquer imunidade.
A revogação do art. 242 não ocasionou maiores discussões no Congresso; tal medida foi justificada quando da apresentação do (Projeto de Lei nº 3.115/97)123 à Comissão de Economia, Indústria e Comércio da Câmara dos Deputados, tendo como relator o Dep. Emerson Kapaz, basicamente pela existência de questionamentos em face da constitucionalidade do privilegio de não estarem sujeitas à falência as sociedades de economia mista que desempenham atividade econômica, diante do disposto no art. 173 § 1º, II, da Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988. Com efeito, sustentava-se que, como a CRFB/88, em seu art. 173 §1º, II, dispõe que se aplica às sociedades de economia mista o regime jurídico próprio das empresas privadas, o privilégio falimentar previsto no art. 242 da Lei das SA deveria ser tido como inconstitucional.
Na exposição de motivos para revogação do art. 242, a própria
Comissão em sua análise reconhece, que o referido artigo era sempre questionado 121 CARVALHOSA, Modesto A Nova Lei das Sociedades Anônimas/Modesto Carvalho sa e
Nelson Eizirik p.366. 122 Op Cite, p.367. 123 Acesso em 12 de abril de 2011 http://www.camara.gov.br/sileg/Prop_Detalhe.asp?id=19125
63
pela doutrina, quanto a sua constitucionalidade. Com a sua revogação, finda consigo
o privilégio legal inserido no artigo, ou seja, a partir de então as sociedades de
economia mista não estão isentas de sofrer um processo falimentar.
Na seqüência veja no Diário da Câmara dos Deputados124 a
disposição dos motivos referente à revogação do art. 242 da Lei 6.404/76,
discorridos no Projeto de Lei 3.115/97, simplesmente da seguinte forma:
Em verdade, a melhor doutrina há muito tem questionado a constitucionalidade do privilégio de não estarem sujeitas à falência as sociedades de economia mista operadoras de atividade econômica, perante o art. 173 §1º, inciso II, da Constituição Federal, que impõe às mesmas, regime jurídico próprio das empresas privadas quanto às obrigações. Por outra feita, a impossibilidade de falência das sociedades de economia mista prestadoras de serviços públicos, ao menos no que se refere à impossibilidade de paralisação do serviço e à intangibilidade dos bens a este afetos, decorre da própria natureza da atividade, independendo, portanto, da previsão legal ora afastada.
Finalmente, com a revogação do art. 242 da Lei 6.404/76, pelo
artigo 10 da lei 10.303/01, o privilégio legal que era atribuído as sociedades de
economia mista deixam de existir na forma legal deste artigo.
No entanto, o legislador aparenta certa contradição, visto que
primeiro revoga a isenção das sociedades de economia mista do procedimento
falimentar por dúvidas quanto à sua constitucionalidade, como viu-se acima no
Projeto de Lei 3.115/97, em seguida alguns anos depois, reincluí-la na legislação, no
art. 2º, inciso I da Lei 11.101/05, a atual Lei das Falências.
3.2 DA EXCEÇÃO A REGRA GERAL DA DECLARAÇÃO DA FALÊN CIA DAS
SOCIEDADES DE ECONOMIA MISTA
Como já visto no item anterior a Lei 11.101/05 em seu art. 2º,
inciso I, exclui expressamente a sociedade de economia mista da aplicação da
norma.
124 Acesso em 12 de abril de 2011 Diário da Câmara dos Deputados de 20 de abril de 2000.
Projeto de Lei 3.115/97 p.719 e 720.
64
O que na verdade parece ao ponto de vista da pesquisa um
tanto intrigante; baseando-se na análise feita da revogação do art. 242 da lei
6.404/76, que demonstra a preocupação do legislador, com relação à
inconstitucionalidade do próprio artigo.
Sendo assim, mister se faz trazer a luz da presente pesquisa
as considerações feitas por BASTOS125 com relação ao art. 173, § 1º, inciso II da
CRFB, a saber:
É um parágrafo muito importante para revelar a índole da organização jurídica da nossa economia. Ele desempenha um papel de ordem sistemática que transcende em muito o comando que o encerra.
Neste parágrafo, especificamente do inciso II, agasalha-se a ideia que é possível ao Estado, através de pessoas descentralizadas, desempenharem um papel assemelhado aquele cumprido pelas empresas privadas. Fixou-se no nosso direito a crença de que essa convivência é possível. Assim o que se procura é que empresas públicas, as sociedades de economia mista e as suas subsidiarias que explorem atividade econômica submeta-se ao regime jurídico previsto para empresas privadas.
A Lei Maior destaca claramente a previsão de que a empresa
pública e a sociedade de economia mista sejam sujeitas “ao regime jurídico próprio
das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais,
trabalhistas e tributários” (CRFB/88, art. 173, § 1º, II).
Como a Lei 11.101/05 dispõe sobre direitos e obrigações
comerciais, pressupõe-se que a sociedade de economia mista deve estar sujeita a
ela, no entanto, segundo o mandamento constitucional, afirma o preceito; que as
sociedades de economia mista devem ficar sujeitas ao regime jurídico próprio das
empresas privadas.
No comentário de BASTOS126, compreende-se a intenção
legislativa desse artigo preceituado pela Carta Magna:
125 BASTOS, Celso Ribeiro Comentários à Constituição do Brasil: promulgada em 5 de outubro
de 1988, v.7: arts170 a 192 p.67 126 BASTOS, Celso Ribeiro Comentários à Constituição do Brasil: promulgada em 5 de outubro
de 1988, v.7: arts170 a 192 p.67
65
Na verdade com o propósito de impedir que o Estado, exercendo atividade econômica valha-se de um regime jurídico privilegiado, que torne a sua competição com a empresa privada desastrosa para esta. Em outras palavras, o Estado quer abstrair-se de sua condição de Poder Público para atuar no meio dos particulares, com eles competindo em condições isonômicas. Aliás, essa preocupação é reforçada elo § 2º do mesmo artigo 173, que impede à outorga de privilégios fiscais não extensivos as empresas do setor privado.
Verifica-se, portanto, na verdade, a preocupação do
Constituinte em não permitir que o Poder Público, por meio das companhias mistas,
obtenha regime jurídico privilegiado em detrimento as empresas privadas, por isso
também o parágrafo 2º do mesmo artigo impede a outorga de privilégios fiscais que
não sejam extensivos a essas.
Para BASTOS127, trata-se, portanto, de um esforço pelo qual se
pretende tornar certo o princípio da igualdade que deve reinar entre as empresas de
controle governamental e as privadas. Essa igualdade nada mais é, por sua vez, do
que uma decorrência da subsidiariedade da iniciativa governamental.
Outrossim, o mesmo autor segue explicando128:
Com efeito, de nada valeria a Constituição condicionar as atividades do Estado no campo econômico, utilizando, para isso, pressupostos bem precisos, se de outro lado lhe fosse possível criar um regime jurídico especial para as empresas governamentais, que por essa via arruinariam as pertencentes aos particulares, originando, assim, uma forma de invasão do domínio econômico privado não contemplado na Lei Maior.
Observa-se que o escopo da norma constitucional visa a
assegurar a livre concorrência, de modo que as companhias mistas que exerçam ou
venham a exercer atividade econômica não se beneficiem de tratamento privilegiado
em relação a entidades privadas.
Assim, pode-se dizer que não é possível qualquer tipo de
diferenciação entre as companhias mistas e as privadas no que concerne a regime
jurídico ou privilegio fiscal, a não ser que sejam esses extensivos também as
empresas privadas.
127 BASTOS, Celso Ribeiro Comentários à Constituição do Brasil: promulgada em 5 de outubro
de 1988, v.7: arts170 a 192 p.70. 128 Op. Cite, p.70.
66
Nesse sentido, ainda explana BASTOS129:
Não é mais possível qualquer tipo de privilégio fiscal não extensivo ao setor privado. Tanto as sociedades de economia mista quanto as empresas publicas não poderão fluir de privilégios exclusivos. Não que estes sejam absolutamente proibidos. Pelo contrario, a Constituição até os legitima, na medida em que ordena a sua extensão às empresas do setor privado.
Posicionando as companhias mistas e as empresas que atuam
no setor privado, de forma isonômica quanto ao regime jurídico e privilégios fiscais,
conforme o preceito constitucional, ora estudado; cumpre mencionar na presente
pesquisa que as sociedades de economia mista, por conta da sua insolvência são
passivas de demanda em processo falimentar. Haja vista, ser colocada em pé de
igualdade junto a empresas do setor privado que por sua vez estão sujeitas ao
procedimento falimentar em caso de insolvência.
Elucidando o artigo 242 de 6.404/76 revogado BASTOS130, já
se posicionava nesse sentido:
O art. 242 da Lei das Sociedades Anônimas dispõe de forma contrária, isto é, exclui as sociedades de economia mista do regime falimentar. Não nos parece ser isto juridicamente válido. Fere o ditame constitucional que manda aplicar a essas sociedades o regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto às obrigações trabalhistas e tributárias
O mesmo vicio de inconstitucionalidade parece já não estar presente no art. 178 do Decreto-Lei nº200/67, que autoriza de forma genérica a liquidação ou a incorporação a outras sociedades de economia mista que venham causando prejuízo. Embora de caráter genérico o preceito não deixa de conter autorização para que se reconheça para caso concreto , se ocorrem pressupostos legais, quais sejam de estar a empresa gerando prejuízos.A configuração de uma situação desse jaez deixa prever uma futura falência; portanto é inteiramente salutar, antes que esse procedimento traumático e lesador de justos interesses de terceiros venha a ocorrer, a tomada de providencias no sentido da liquidação da sociedade.
Neste sentido, também se posiciona BASTOS131 apud
GASPARINI, quanto à sujeição das sociedades de economia mista ao procedimento
129 BASTOS, Celso Ribeiro Comentários à Constituição do Brasil: promulgada em 5 de outubro
de 1988, v.7: arts170 a 192 p.71 130 BASTOS, Celso Ribeiro Comentários à Constituição do Brasil: promulgada em 5 de outubro
de 1988, v.3: art. 37 a 43 Celso Ribeiro Bastos, Ives Gandra Martins – 2ed. Atual. São Paulo: Saraiva, 2000 p.140
67
falimentar, ensinando que “estas sociedades estão sujeitas a falência , embora o art. 242
da Lei das Sociedades Anônimas prescreva com duvidosa constitucionalidade, regra
contrária, e, pois lhe assegure a não sujeição ao regime falimentar a que se submetem as
demais sociedades anônimas”.
Como se viu nesse item, como regra geral o ordenamento
jurídico aponta na lei ordinária 11.101/05 (A Nova Lei das Falências), a exclusão da
sociedade de economia mista do processo de falência.
No entanto, a Constituição de 1988 dispõe em seu preceito
expresso no artigo 173 , a isonomia do regime jurídico e privilégios fiscais dessas
sociedades com as empresas do setor privado. Por sua vez a doutrina a sua época,
posicionou-se inúmeras vezes quanto à possibilidade das sociedades figurarem no
pólo passivo de processo de falência. Entre estes estão CARVALHOSA132 e
CRISTIANO133
Destarte, excepcionalmente as sociedades de economia mista
estariam sujeitas a falência, considerando os preceitos constitucionais, apontados na
pesquisa, contudo na regra geral a sociedade de economia mista está excluída do
processo falimentar desde 2005.
3.3 A DISTINÇÃO DOS EFEITOS JURÍDICOS EM DECORRÊNCI A DA ESSÊNCIA
DE SUA CONSTITUIÇÃO – DISCUSSÃO DOUTRINÁRIA
Como abordado anteriormente no item 1.3.1 desta pesquisa a
Carta Magna no seu art. 173 § 1º dispõe a respeito do objeto da sociedade de
economia mista, onde prescreve que a lei estabelecerá o estatuto jurídico da
sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade
econômica de produção ou comercialização de bens ou prestação de serviços.
No entanto, neste item do terceiro capítulo, a proposta de
pesquisa dar-se-á em função da distinção dos efeitos jurídicos em decorrência da 131 BASTOS, Celso Ribeiro Comentários à Constituição do Brasil: promulgada em 5 de outubro
de 1988, v.3: art. 37 a 43 Celso Ribeiro Bastos, Ives Gandra Martins – 2ed. Atual. São Paulo: Saraiva, 2000 p.140.
132 CARVALHOSA, Modesto Comentários a Lei das Sociedades Anônimas L ei 6.404 de 15 de Dezembro de 1976 vol. 4 tomo I artigos 206 a 242 São Paulo: Saraiva, 1988 p. 402.
133 CRISTIANO, Romano A nova estrutura da Sociedade Anônima Lei 6.404 de 15 de Dezembro de 1976 São Paulo: Revista dos Tribunais, 1977 p.201.
68
constituição da sociedade de economia mista; sejam elas constituídas para
exploração de atividade econômica de produção ou prestação de serviços, com o
objetivo de entender a intenção da sua formação, ou seja, se a lei autorizadora a
instituiu para exploração de atividade econômica ou para prestação de serviço
público, e com isso destacar os efeitos jurídicos de cada tipo de sociedade e, com
isso, analisarmos o posicionamento de alguns autores com relação ao tema
proposto.
3.3.1 Exploração de Atividade Econômica de Produção
EROS GRAU134 divide atividade econômica em gênero e
espécie; para o autor atividade econômica como gênero abrange: serviço público e
atividade econômica como espécie; sendo assim a atividade econômica inserida no
art.173 §1º da CRFB/88, referente a sociedade de economia mista é a atividade
econômica como espécie, que ele denomina de atividade econômica em sentido
estrito, esclarecendo:
Ao afirmar que serviço público é um tipo de atividade econômica, a ela atribuí significação de gênero no qual se inclui a espécie serviço público.
Ao afirmar que o serviço público está para o setor público assim como a atividade econômica está para o setor privado, a ela atribuí à significação de espécie
Daí a verificação de que o gênero – atividade econômica – compreende duas espécies: o serviço público e a atividade econômica.
Estamos em condições, assim, de superar a ambigüidade que assume, no seio da linguagem jurídica e no bojo do texto constitucional, esta ultima expressão. Para que, no entanto, se a supere, impõe-se qualificarmos a expressão, de modo que desde logo possamos identificar de uma banda as hipóteses nas quais ela conota gênero, de outra as hipóteses nas quais ela conota espécie do gênero. A seguinte convenção, então, proponho: atividade econômica em sentido amplo conota gênero; atividade econômica em sentido estrito, a espécie.
134 GRAU, Eros. A ordem econômica na Constituição de 1988: interpre tação e crítica. 8 ed. ver.
E atual São Paulo: Malheiros, 2003 p.92.
69
Destarte, segundo EROS GRAU135 “a atividade econômica de
produção ou comercialização de bens, expresso no §1º do art. 173 da Constituição,
significa atividade econômica em sentido estrito” .
Sendo assim o preceito constitucional aplicado no artigo 173 §
1º e § 2º da CRFB/88, na visão de EROS GRAU136, aplicam-se somente as
sociedades de economia mista que explorem atividade econômica em sentido
estrito, conseqüentemente excluem-se as empresas mistas que prestam serviços
públicos, asseverando ainda o autor:
Por isso, quanto às obrigações tributárias, o § 2º do artigo 173 afirma que as empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar de privilégios fiscais não extensivos ás do setor privado. O que resta definitivamente evidente, neste passo, é que tanto o preceito inscrito no §1º quanto o veiculado pelo §2º do art. 173 da Constituição de 1988 apenas alcançam empresas publicas e sociedades de economia mista que explorem atividade econômica em sentido estrito. Não se aplicam, pois aquelas que prestam serviço público, não assujeitadas as obrigações tributarias as quais se sujeitam as empresas privadas. As empresas publicas, sociedades de economia mista e outras empresas estatais que prestem serviço publico, podem gozar de privilégios fiscais, ainda que não extensivos a empresas privadas prestadoras de serviço público em regime de concessão ou permissão (art.175 da CRFB/88).
Por isso, o antigo Ministro do STF, EROS GRAU expôs sua
posição pela aplicação da lei falimentar às empresas públicas e sociedades de
economia mista apenas que exercem atividade econômica em sentido estrito e não
quando prestam serviço público.
No mesmo sentido, CARVALHO FILHO137 ensina que as
sociedades de economia mista que explorem atividade econômica, estão sujeitas ao
processo de falência, asseverando que:
Se o artigo 173 § 1º, inciso II da Constituição a equiparou as empresas privadas, aludindo expressamente ao Direito Comercial, a Lei Falimentar não poderia estabelecer tal discriminação excludente sem incidir em inconstitucionalidade . Sem embargo, cumpre dizer
135 GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988: interpre tação e crítica. 8
ed. ver. E atual p.95 136 Op.Cite, p.97 137 CARVALHO FILHO, José dos Santos Manual de Direito Administrativo, 13 ed Rio de Janeiro:
Lúmen Júris, 2005. p. 394.
70
que o dispositivo constitucional mencionado se refere expressamente as “exploradoras de atividade econômica”. Logo, a exclusão não pode alcançar estas ultimas, mas pode, sem incidir em inconstitucionalidade atingir as “prestadoras de serviços públicos”.
Corrobora com ele também o professor MELLO138 ao lecionar
que:
Quando se tratar de exploradoras de atividade econômica, então, a falência terá curo absolutamente norma, como se de outra entidade mercantil qualquer se tratara. É que com dito a constituição, no art. 173 § 1º, II, atribuiu-lhes sujeição “ao regime jurídico próprio das empresas privadas inclusive quanto aos direitos e obrigações civis e comerciais (...)”. Disto se deduz, também, que o Estado não poderia responder subsidiariamente pelos créditos de terceiros que ficassem a descoberto, pois se o fizesse, estaria oferecendo-lhes um respaldo de que não desfrutam as demais empresas privadas.
Ainda no mesmo diapasão explana GASPARINI139 sobre a
inconstitucionalidade do art. 2º, inciso I da Lei 11.101/05:
No que respeita a essas empresas estatais, quando interventoras de atividade econômica, sua exclusão do regime da lei Federal 11.101/2005 é inconstitucional , pois violam a regra constitucional (art.173 § 1º, II) que as equiparam as empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, trabalhistas e tributários. A distinção exploradora de atividade econômica e prestadora de serviço público é relevante, no caso, já que em favor da continuidade do serviço publico justifica-se a não-sujeição da sociedade de economia a esta recente Lei Federal.
Portanto, finalmente face aos dados colacionados na presente
pesquisa junto a recente posicionamento doutrinário do país, pode-se constatar que
as sociedades de economia mista interventora de atividade econômica obedecem ao
regime comum das empresas privadas, vez que não são prestigiadas por
prerrogativas de autoridades ou benesses de governamentais.
Seus bens não gozam dos atributos da inalienabilidade,
imprescritibilidade, e impenhorabilidade, prestando-se, portanto para garantir seus
credores. Podem ser penhorados e executados e se forem insolventes, podem
submeter-se ao regime da Lei Federal 11.101/2005, que regula a recuperação
138 MELLO, Celso Antonio Bandeira de Curso de Direito Administrativo 26 ed ver. E atual . Até a
Emenda Constitucional 57 de 18.12.2008 São Paulo: Malheiros, 2009 p.206 139 GASPARINI, Diógenes Direito Administrativo 14 ed. ver. São Paulo : Saraiva, 2009. p. 454.
71
judicial, a extrajudicial e a falência, desde que explorem atividade econômica de
produção.
3.3.2 Serviços Públicos
A constatação do item anterior, não pode ser afirmada com a
mesma convicção quando as empresas mistas prestadoras de serviços públicos em
razão do princípio da continuidade do serviço público, o próprio GASPARINI140
assim se posiciona ao tratar deste principio:
Os serviços públicos não podem parar, porque não param os anseios da coletividade. Os desejos dos administrados são contínuos. Daí dizer que a atividade da Administração Pública é ininterrupta. Assim não se admite, por exemplo, a paralisação dos serviços de segurança pública, de distribuição de justiça, de saúde, de transporte de combate a incêndios. Por essa razão, não se concebia a greve em serviços dessa natureza e em outros considerados por lei, como imprescindíveis ao desenvolvimento e a segurança da comunidade. A CRFB/88 no artigo 37, VII, dispõe que o direito a greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei especifica.
Por esta razão, sendo a sociedade de economia mista
prestadora de serviços públicos, os bens a ele vinculados recebem proteção
especial, como recebem esse favor os bens de qualquer concessionária, tudo em
razão do principio da continuidade do serviço publico.
Não bastasse isso, cabe afirmar que os seus bens, quando
utilizados na prestação desses serviços são considerados bens públicos por ditos
motivos não podem ser penhorados e, via de conseqüência não podem ser
executados.
Nesse sentido segundo GASPARINI141, justifica-se assim sua
insubmissão ao regime da Lei 11.101/2005 que regula a recuperação judicial, a extrajudicial
e a falência do empresário e da sociedade empresaria, por expressa determinação de seu
artigo 2º.
140 GASPARINI, Diógenes Direito Administrativo 14 ed. ver. p. 17. 141 Op. Cite. p. 460.
72
No mesmo diapasão ensina MELLO142 que:
Quando forem prestadoras de serviços públicos, é bem de ver que os bens afetados ao serviço em questão são bens públicos e não podem ser distraídos da correspondente finalidade, necessários que são ao cumprimento dos interesses públicos a que devem servir.
Com efeito, não faria sentido que interesses creditícios de terceiros preferissem aos interesses de toda coletividade no regular prosseguimento de um serviço publico. O mesmo se dirá em relação à obra servientes da coletividade. Assim, jamais caberia a venda destes bens em hasta pública, que seria o consectário natural da penhora e execução judicial em caso de falência.
Entretanto, pode-se dizer que o Estado em caso de insolvência
dessas sociedades, responderá subsidiariamente pelos débitos que tenham. Isto
porque, tratando-se de sujeito prestador de serviços públicos ou obras públicas,
atividades que lhe são típicas. O Poder Público deve responder pelos danos
causados pelo agente criado por ele mesmo.
Aliás, a solução jamais poderia ser outra em face do disposto
no art. 37 § 6º, da CRFB/88143, no qual se determina que as pessoas jurídicas de
direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão
pelos danos, que seus agentes nesta qualidade, causarem a terceiros. Deste item
trataremos mais detalhadamente adiante no item 3.3.4.
Sendo assim, segundo o posicionamento dos autores
mencionados na presente pesquisa entende-se que as sociedades de economia
mista que exploram atividade econômica, podem ser submetidas ao processo
comum de falência, pois obedece ao regime comum das empresas privadas, vez
que não são prestigiadas por prerrogativas de autoridades ou benesses
governamentais.
Seus bens não gozam dos atributos da inalienabilidade,
imprescritibilidade, e impenhorabilidade, prestando-se, portanto para garantir seus
credores, podendo ser penhorados e executados, e se forem insolventes, podem 142 MELLO, Celso Antonio Bandeira de Curso de Direito Administrativo 26 ed ver. E atual. Até a
Emenda Constitucional 57 de 18.12.2008 São Paulo: Malheiros, 2009 p.206 143 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e
Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes .p.41.
73
submeter-se ao regime da Lei Federal 11.101/2005, que regula a recuperação
judicial, a extrajudicial e a falência.
Por outro lado já as sociedades de economia mista prestadoras
de serviços públicos em função da continuidade do serviço público, e em proveito da
coletividade, segundo esses mesmos autores, não são passíveis de processo de
falência, sendo justificada a exclusão dessas sociedades da Lei Federal
11.101/2005 no seu art. 2º , inciso I.
3.4 RESPONSABILIDADES DO PODER PÚBLICO
Para que se possa entender até onde podem ser estendidos os
efeitos de um possível declaração de falência sobre as sociedades de economia
mista, mister se faz estudar o instituto da Responsabilidade Civil do Poder Público,
para tanto, como viu-se no item anterior se faz necessário distinguir as sociedades
de economia mista em razão da finalidade de sua natureza constitutiva; seja ela,
exploradora de atividade econômica em sentido estrito ou prestadora de serviços
públicos.
3.4.1 Da Responsabilidade Civil Subjetiva
Antes de tratar da Responsabilidade Civil do Poder Público,
junto à sociedade de economia mista exploradora de atividade econômica,
propriamente dita, cabe a presente pesquisa, mesmo que de forma singela interpelar
ao mundo jurídico o que vem a ser responsabilidade civil subjetiva.
A responsabilidade civil surge em face do descumprimento
obrigacional, pela desobediência de uma regra estabelecida em um contrato, ou por
deixar, determinada pessoa, de observar um preceito normativo que regula a
sociedade civil.
74
Segundo DINIZ144 a responsabilidade civil está relacionado
com “a aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou patrimonial
causado a terceiros, em razão de ato próprio imputado, de pessoas por quem ele responde,
ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda (responsabilidade subjetiva)”.
Seguindo essa concepção, no Direito Civil consagra-se como
regra geral a responsabilidade com culpa, tida como responsabilidade civil subjetiva,
que surge da violação de um direito subjetivo, que se funda na culpa, chamada
subjetiva e conseqüentemente no dever de indenizar pelos danos causados.
Outrossim, dentro da concepção tradicional a responsabilidade
do agente causador do dano só se materializa se agiu culposa ou dolosamente.Por
isso, a prova da culpa do agente causador do dano é indispensável para que surja o
dever de indenizar. Neste caso, figurando a responsabilidade é subjetiva, pois
depende do comportamento do sujeito.
Em seguida será abordado o enfoque jurídico da
responsabilidade civil objetiva.
3.4.2 Da Responsabilidade Civil Objetiva
Em se tratando de responsabilidade objetiva a atitude culposa
ou dolosa do agente causador do dano é de menor relevância, pois , desde que
exista relação de causalidade entre o dano experimentado pela vítima e o ato do
agente, surge o dever de indenizar, quer tenha este último agido ou não
culposamente.
Sobre este assunto CAHALI145 se impõe afirmando que no plano
da teoria geral do direito, o conceito de responsabilidade objetiva está longe de uma
definição precisa e uniforme, ensinando:
Rigorosamente, a responsabilidade objetiva tende a se bastar com simples nexo de causalidade material, eliminada a perquirição de qualquer elemento psíquico ou volitivo; a aceitação incondicionada da teoria da responsabilidade objetiva, bastando-se com a
144 DINIZ, Maria Helena Curso de Direito Civil Brasileiro. Volume VII. Responsabilid ade Civil. 12
ed, São Paulo: Saraiva, 1998, p. 34. 145 CAHALI, Yussef Said Responsabilidade Civil do Estado 3 ed. ver, atual e ampliada São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2007. p. 32
75
identificação do vinculo etiológico atividade do Estado como causa, e dano sofrido pelo particular, como conseqüência eliminaria a priori o exame de qualquer coeficiente de culpa na conduta do funcionário, ou de culpa anônima decorrente de falha da máquina administrativa, investindo a culpa de presunção absoluta, júris et de jure, portanto invencível e sem possibilidade de qualquer contraprova; nem mesmo a teoria do risco criado, do risco proveito, seria com ela compatível, na medida em que simplesmente tornaria relativa aquela presunção de culpa, fazendo-a presumida júris tantum para simplesmente liberar o lesado da produção da respectiva prova, com a transparência para o Estado da prova de fatos excludentes da responsabilidade.
Segundo esta teoria, aquele que, através de sua atividade cria
um risco de dano para terceiros, tem por obrigação repará-lo, mesmo que sua
atividade e o seu comportamento sejam isentos de culpa.
Com efeito, examina-se a situação e, se for comprovada,
objetivamente, a relação de causa e efeito entre o comportamento do agente e o
dano experimentado pela vítima, esta tem direito de ser indenizada por aquele que
causou o dano.
3.4.3 Responsabilidade Civil do Poder Público junto à Sociedade de Economia
Mista Exploradora de Atividade Econômica
A lei classifica a sociedade de economia mista como entidade
da Administração Indireta, e em se tratando de exploradora de atividade econômica
é impulsionada pelo lucro, isto se a atividade econômica se traduz em atos do
comercio e atos de indústria.
No que respeita as sociedades de economia mista
exploradoras de atividade econômica, a União, os Estados-Membros, o Distrito
Federal e os Municípios, segundo GASPARINI146 não respondem por danos
decorrentes de sua atuação, nem pelas obrigações por elas assumidas, tanto quanto
não respondem pelos danos que seus servidores, nessa qualidade causarem a
terceiros, asseverando:
Aquelas e estas são entidades distintas, não havendo porque uma responder pela outra. Devem, as sociedades de economia mista neste particular, ser tratada como empresa privada (art. 173, § 1º, II
146 GASPARINI, Diógenes Direito Administrativo 14 ed. p.461.
76
da CRFB/88), respondendo pelas obrigações contraídas, e nos termos do art. 927 do Código Civil, pelos prejuízos que seus servidores, nessa qualidade, venham a causar a terceiros ou a própria administração publica. Alias, assim decidiu o STF ao julgar o Recurso Extraordinário nº 64.800, em que prescreveu que o Município não é responsável por divida de empresa estatal sob seu controle. A responsabilidade nesses casos é subjetiva, isto é, com culpa .
No mesmo diapasão explana MELLO147:
Se a entidade for exploradora de atividade econômica suas relações negociais com terceiros, quando atinentes ao cumprimento da finalidade industrial ou comercial para que tenha sido criada, serão sempre regidas pelo Direito Privado. Assim sua responsabilidade estará sob a mesma disciplina aplicada assim empresas privadas e o Estado não responde subsidiariamente por seus atos.
Se inexistir a culpa ou dolo, não cabe a responsabilidade, nem
mesmo subsidiariamente a Administração Pública a que se vinculam, responde por
essas obrigações, pois assevera GASPARINI148 A Administração Pública não responde
por atos das pessoas que cria.
Não obstante responderá se, por ato seu, der causa a extinção
da sociedade, nesses casos responderá até o montante dos valores recebidos, dado
que somente este era o garantidor das obrigações assumidas pela sociedade de
economia mista extinta.
Desta forma, nem mesmo na falência a Administração Pública
criadora da sociedade de economia mista responde.
Perante obrigações tributárias, a situação que lhe concerne é a
mesma da generalidade das empresas que operam no setor, sendo vedado conferir-
lhe isenções ou benefícios distintos dos que se atribuam as demais empresas que
militem em seu setor de atuação, conforme apontado no item 3.2 da presente
pesquisa.
147 MELLO, Celso Antonio Bandeira de Curso de Direito Administrativo 26 ed ver. E atual. Até a
Emenda Constitucional 57 de 18.12.2008 p.208. 148 GASPARINI, Diógenes Direito Administrativo 14 ed . p.461.
77
Com efeito, a Constituição149 no art. 173, § 1º estabelece que:
Art. 173 § 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre:
I - sua função social e formas de fiscalização pelo Estado e pela sociedade;
II - a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários;
III - licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações, observados os princípios da administração pública; (...)
E no § 2º dispõe que, “As empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar de privilégios fiscais não extensivos às do setor privado”.
Com isso, se pode concluir que as empresas mistas
exploradoras de atividade econômica, respondem por danos causados a terceiros
decorrentes de sua atuação, nos moldes da Lei Civil, ou seja, a Administração
Pública não poderá responder , nem mesmo subsidiariamente por seus atos, pois
lhe será aplicada a mesma disciplina das empresas privadas.
3.4.4 Responsabilidade Civil do Poder Público junto à Sociedade de Economia
Mista Prestadora de Serviço Público
Caso a sociedade de economia mista seja prestadora de
serviço público, responderá pelos danos causados decorrentes da execução dos
serviços e pelos prejuízos que seus servidores, nessa qualidade, causarem a
terceiros.
Nessas hipóteses, responderá objetivamente (art. 37 , § 6º da
CRFB/88)150 e até o exaurimento do seu patrimônio, esgotado este, cabe a
Administração Pública a que se vincula responder pelo remanescente, verbis:
149 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e
Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes .p.97
78
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte
[...]
§ 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
Neste caso, o Poder Público responde subsidiariamente, pois
assim ensina GASPARINI151:
Com efeito, não seria justo nem jurídico, que o simples trespasse para responsabilidade de uma dessas empresas pudesse tornar mais difícil o recebimento da indenização, e o que é pior, impedir em alguns casos o completo ressarcimento do dano sofrido pela vitima. Trata-se, portanto de responsabilidade subsidiaria da Administração Pública a que se subsume a sociedade de economia mista. Essa responsabilidade subsidiaria não se aplica as outras obrigações, a exemplo das comerciais trabalhistas e tributárias.
Sendo assim, com relação à empresa estatal prestadora de
serviços públicos, todos os atos para finalidade a que está proposta, isto é, os que
diretamente se liguem ao próprio desempenho deste serviço, ficarão sob o influxo do
Direito Público.
MELLO152 em consonância com GASPARINI nos ensina que:
No que atina a responsabilidade destas empresas pelos danos que causarem a terceiros em virtude da condição de prestadora de serviço público, atualmente é certo que se governa na conformidade dos mesmos critérios que se aplicam ao Estado; ou seja: os da responsabilidade objetiva, pois assim é segundo doutrina e jurisprudência, a responsabilidade pública, Portanto independe de dolo ou culpa, bastando o nexo causal entre o seu comportamento e o agravo destarte produzido. Isto por força do precitado art. 37§6º, da CRFB/88, que estabelece para as pessoas de Direito Privado prestadoras de serviços públicos a mesma responsabilidade que incube a pessoas de Direito Público, a qual é entendida como
150 BRASIL. Código Civil; Código Comercial; Código de Processo Civil; Constituição Federal e
Legislação Complementar/ obra coletiva de autoria d a editora Saraiva com a colaboração de Antonio Luiz de Toledo Pinto, Márcia Cristina Vaz d os Santos Windt e Lívia Cépedes. p.40.
151 GASPARINI, Diógenes Direito Administrativo 14 ed . p.461. 152 MELLO, Celso Antonio Bandeira de Curso de Direito Administrativo 26 ed ver. E atual. Até a
Emenda Constitucional 57 de 18.12.2008 p.218.
79
responsabilidade objetiva, além disto, o Estado responde subsidiariamente pelos danos causados.
Igualmente BASTOS153 corrobora com o mesmo
posicionamento, lecionando:
Toda ação estatal está hoje adstrita a esse dever de não produtora de danos aos particulares. Toda vez que isso se der ocorre um encargo ao Estado consistente em recompor o prejuízo causado. São pois pressupostos fundamentais para a deflagração da responsabilidade do Estado: a causação de um dano e a imputação deste a um comportamento omissivo ou comissivo seu. É o chamado nexo de causalidade.
Existe ainda, a possibilidade de essas sociedades serem
extintas pela Administração Pública a que se liga, esta responderá pelas obrigações
assumidas pela sociedade de economia mista até o montante dos bens recebidos,
pois esses eram únicos a garanti-las, salvo em relação aos danos decorrentes de
sua atuação e dos prejuízos causados pelos seus servidores agindo nessas
condições, nesses casos a responsabilidade é total.
Finalmente, se pode concluir que as sociedades de economia
mista que exploram atividade econômica, respondem pelos danos causados a
terceiros decorrentes de sua atuação, nos moldes da Lei Civil, por conseguinte
a Administração Pública não poderá responder , nem mesmo subsidiariamente
por seus atos, pois lhe será aplicada a mesma disciplina das empresas privadas.
Já as sociedades de economia mista prestadoras de serviço
público, responderá objetivamente pelos danos causados decorrentes da execução
dos serviços e pelos prejuízos que seus servidores, nessa qualidade, causarem a
terceiros. Ademais o Estado responderá subsidiariamente pelos danos causados por
elas, caso não o possam fazer em sua totalidade.
Destarte, constata-se que com a revogação do art. 242 da Lei
6.404/76 pelo artigo 10 da lei 10.303/01, o privilégio legal que era atribuído as
sociedades de economia mista deixam de existir na forma legal deste artigo. Desta
feita o legislador revoga a isenção das sociedades de economia mista do
153 BASTOS, Celso Ribeiro Comentários à Constituição do Brasil: promulgada em 5 de outubro
de 1988, v.3: art. 37 a 43 p.169.
80
procedimento falimentar por dúvidas quanto à sua constitucionalidade, porém em
seguida alguns anos depois, reincluí-la na legislação, no art. 2º, inciso I da Lei
11.101/05 a famosa Lei das Falências.
Observa-se também que a Constituição de 1988 dispõe em seu
preceito expresso no artigo 173, a isonomia do regime jurídico e privilégios fiscais
das sociedades de economia mista com as empresas do setor privado, sendo assim,
excepcionalmente as sociedades de economia mista estariam sujeitas a falência,
considerando os preceitos constitucionais, apontados na pesquisa.
Contudo, apresenta-se claro na doutrina que as sociedades de
economia mista que exploram atividade econômica, podem ser submetidas ao
processo comum de falência, pois obedece ao regime comum das empresas
privadas.
Por outro lado já as sociedades de economia mista prestadoras
de serviços públicos em função da continuidade do serviço público, e em proveito da
coletividade, segundo esses mesmos autores, não são passíveis de processo de
falência, sendo justificada a exclusão dessas sociedades da Lei Federal
11.101/2005 no seu art. 2º, inciso I.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente pesquisa tem como objeto central o estudo a
(im)possibilidade da decretação da falência das sociedades de economia mista.
Para tanto, a pesquisa dentro da problemática proposta, foi
divida em três capítulos que apresentam as bases teórica fundamentais para
entendimento e desenvolvimento do tema.
Com o desenvolvimento do primeiro capítulo, constatou-se as
bases históricas e a natureza jurídica das sociedades de economia mista que está
intrinsecamente ligada ao ato legislativo autorizador para sua constituição, ainda que
a Lei lhe atribui, com o registro dos atos constitutivos, natureza mercantil, de pessoa
jurídica de direito privado, na forma de sociedade anônima, possuindo seu capital
social hibrido (participação da iniciativa pública e privada).
Já o desenvolvimento do segundo capítulo aponta as
características gerais do instituto falimentar, além de apresentar, ainda que de forma
sumária, um breve relato dos efeitos advindos sobre a empresa com a decretação
da falência.
Por fim, a pesquisa voltou-se ao estudo da (im)possibilidade da
decretação da falência das sociedades de economia mista, em seu terceiro capítulo,
onde se pode constatar que a Constituição de 1988 dispõe em seu preceito
expresso no artigo 173, a isonomia do regime jurídico e privilégios fiscais das
sociedades de economia mista com as empresas do setor privado, sendo assim,
excepcionalmente as sociedades de economia mista estariam sujeitas a falência,
considerando os preceitos constitucionais, apontados nesta pesquisa.
Destarte, de acordo com os autores consultados, a pesquisa
constatou que as sociedades de economia mista que exploram atividade econômica
podem ser submetidas ao processo comum de falência, pois obedece ao regime
comum das empresas privadas. No entanto, também se constatou que às
sociedades de economia mista prestadoras de serviços públicos em função da
continuidade do serviço público, e em proveito da coletividade, segundo esses
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mesmos autores, não são passíveis de processo de falência, sendo justificada a
exclusão dessas sociedades da Lei Federal 11.101/2005 no seu art. 2º, inciso I.
Desta forma, voltando-se as hipóteses elaboradas que previam
1) a admissão da decretação da falência das sociedades de economia mista pelo
entendimento legal e doutrinário, ainda que controverso, dependendo, no entanto,
da essência da forma de sua constituição, bem como 2) Comprovado a insolvência
da sociedade de economia mista, sofrerá esta, o processo falimentar com
penhorabilidade de seus bens, e responsabilidade subsidiária sobre poder público,
pode se observar que restaram parcialmente comprovadas em virtude de mesmo
sofrendo o procedimento falimentar a sociedade de economia mista exploradora de
atividade econômica pode ter os seus bens penhorados e executados, no entanto o
poder público não fica responsável por danos causados a terceiros em razão da
inadimplência e conseqüentemente da falência, esta responsabilidade fica a cargo
da própria sociedade.
Já as sociedades de economia mista prestadoras de serviço
público, segundo mostrou a pesquisa responderão objetivamente pelos danos
causados decorrentes da execução dos serviços e pelos prejuízos que seus
servidores, nessa qualidade, causarem a terceiros. Ademais o Estado responderá
subsidiariamente pelos danos causados por elas, caso não o possam fazer em sua
totalidade.
No desenvolvimento do terceiro e último capitulo, fica claro que
no âmbito dos autores pesquisados, existe entendimento harmônico em razão da
possibilidade de falência da sociedade de economia mista, enquanto exploradora de
atividade econômica e no mesmo diapasão o da impossibilidade de falência de
sociedade de economia mista prestadora de serviço público, ou seja, em razão da
essência da atividade da companhia mista, esta estará ou não, sujeita a lei
11.101/2005.
Sendo assim, dentro da proposta temática e dos autores
colacionados na pesquisa existe consenso, porém se sabe também, que existe outra
corrente doutrinária que não conforma sua opinião com a que foi trazida na presente
pesquisa, no entanto, esta não foi abordada neste estudo.
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Finalmente, ressalva-se que a presente pesquisa não tem o
intuito de por termo no assunto abordado, reconhecendo a necessidade de
continuidade dos estudos e das reflexões sobre a (im)possibilidade da decretação
da falência das sociedades de economia mista.
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