Download - Evolução - Marcos Lira
EVOLUÇÃO
OBRAS DO AUTOR
Olhos – Ed. Voxxel (2003)
MARCOS LIRA
EVOLUÇÃO
EDITORA
Belo Horizonte – 2004
Direitos reservados à EDITORA VOXXEL LTDA
Rua Rio Branco, 104 CEP 48.880-000 Santa Luz – BA
Fone – (75)265-2245
Capa
Erivan Araújo
Revisão
Loíde Lira
DEDICATÓRIA
Para Martha Moyra que começa a trilhar o caminho
da evolução.
AGRADECIMENTOS
Fádwa Andrade e Rosemary Dayrel pelo apoio na publicação.
APRESENTAÇÃO
Transitar pelos caminhos da poesia é
desafio atroz para mim. Sempre foi. Aceitar o desafio de Marcos Lira para
escrever algo como uma apresentação para os preciosos lampejos que vivenciou em suas viagens pelas diferentes paisagens do imenso Brasil e que
se transformaram em versos foi um gesto impensado. Como impensadas são as ações do
poeta, que nascem em compartimentos insuspeitados da sua alma e vêm à tona sem passar pelo crivo tirânico da crua razão. E os versos,
aparentemente simples, me forçaram a aprender em tempo excessivamente curto que a poesia não se lê,
bebe-se com os olhos, degusta-se lenta e pausadamente e que cada verso sorvido revela fragmentos do universo pessoal de onde surgiram e
nos arrasta forçando-nos a partilhar os segredos escondidos na escrita do poeta. Segredos, medos, esperanças... num gesto de extrema coragem se
permite o artista desnudar-se em nome da Poesia. Gesto impensado, sem dúvida, mas extremamente
belo. E enriquecedor.
Erivan Araújo
PRÓLOGO
Como num sonho, contemplo o rosto polido, arte magnífica do novíssimo, gigantesco e belo
monumento. Seu corpo felino repousa sobre a areia escaldante do deserto e entre suas patas, erige um imenso
umbral de pesadas portas que se abrem dando passagem às entranhas da Terra.
Ali me dispo das paixões e aprendo a controlar a força física. Sinto-me leve, flutuando pelo Ar, aprendo a
respeitar a vida, zelar da saúde física e desenvolvo o intelecto.
Mergulho na água, dominando as emoções e sinto emergir o amor puro e verdadeiro. Uma cortina de Fogo se abre, onde penetro,
regenerando todo meu ser, tornando-me um ser espiritual. Acordo aos pés da velha e desgastada esfinge...
Evolução
9
Elemento 1
1- FACES DO ÓDIO.........14
2- MÃE.......................15 3- NUNCA MAIS............16
4- VOCÊ......................17
5- PASSOS...................18
6- PÁSSARO VOANDO......19 7- MARGHERITA............20
8- FERA DOMADA..........21
9- MONTES BRANCOS.....22
10- WHAT A WONDERFUL..... WORLD II....23
Evolução
10
Elemento 2
11- MARGINAL..............25
12- ADEUS...................26
13- BAGDÁ...................28
14- NAÇÃO COCOROBÓ....29
15- O ÚLTIMO.................
GUERRILHEIRO......30
16- CANAÃ..................32
17- RAÇAS...................33
18- RASTAFARI.............34
19- SEPARAÇÃO.............35
20- GISELLI.................36
21- VIVER DE AMOR........37
22- PRINCESINHA..........38
Evolução
11
Elemento 3
23- CORAÇÃO NO CÁRCERE..40
24- CANOA QUEBRADA.......41
25- DESENCONTRO............42
26- O ARDOR DA................. DESPEDIDA......43
27- ADEUS SOLIDÃO.........45
28- SAUDADE..................47 29- MENINAS DA DIVISA...48
30- SONETO DO SOM........49
31- AMEI.......................50
32- BELINHA...................51
33- DOIS.......................52
34- INFANTIL.................53
35- RAINHA...................54 36- TODOS OS SENTIDOS..55
Evolução
12
Elemento 4
37- ULTIMA TRAVESSIA.......58
38- REFLEXOLIDÃO.............59
39- ESCURECEU.................60
40- PAI...........................61
41- SONETO PARA UMA..........
AMIGUINHA....62
42- ROSA NA ESTRADA.........63
43- TERAPIA......................64
44- HAIKAI.......................65
45- A DANÇA DOS PUNHAIS..66
46- JUVENTUDE INTOCÁVEL..67
47- RENASCIMENTO............68
48- SANTA LUZ.................69
49- MANU........................70
50- VERDADE ...................71
51- ALQUIMIA..................72
52- CICLO INFINITO..........74
Evolução
13
Elemento 1
Terra frágil ganha força
Nasce o poder pessoal
Torna-se sadio e belo
Cruza o primeiro portal
Evolução
14
FACES DO ÓDIO
Ir o poder resgatar sem medo
Da lama espúria, maldade vil
E afogar no abismo negro
Da escravidão do amor servil
É Marte o astro que rege o mundo
Rompe o temor, o pudor, o ser
Dilacerando a essência, a vida
Submissão, jogo de poder
Ou deixa a Lua cumprir o encanto
Insano espaço astral, sem fim
Desdobra em brilho total beleza
Em aparência se mostra assim
Pérola em parto surge da gosma
Não há poeira, cratera ou frio
Daqui de baixo a tudo encanta
Não se viu podre quando surgiu
Belo Horizonte em 20 de abril de 2002
Evolução
15
MÃE
Adeus fantasia, sonho, ilusão
Aquele que me ama
Não mais verá esmeraldas nos meus olhos
Nem o ouro pendido nos fios amarelos de meus
cabelos
Ter-me trazido à luz
Torna lícito e direito
Que escolhas o afago
A depositar pesado e dilacerante
Sobre meu hímen
Amanhã haverá de possuir-me
Em breves e insignificantes deleites
Em troca de algumas moedas
E há de odiar-me e viveremos, todos
Infelizes para sempre
Araci, 1989
Evolução
16
NUNCA MAIS
A boca beijada é a tua
O corpo afagado é o teu
Agora eu estou te perdendo
Quem vive você não sou eu.
E nem adianta estar perto,
Ou do outro lado do mundo
Ninguém dobra um sentimento
Que nasce do eu mais profundo.
Assim nada vale o poder
Pra que humildade nos atos.
Importa o carro importado?
Ou não ter nos pés uns sapatos?
Enquanto aqui tudo desaba
A vida não volta ao sossego
Não há mais conforto na calma
Já não mais se vive sem medo
Belo Horizonte, 25 de janeiro de 2002
Evolução
17
VOCÊ
Menina de deus
Não era e eu via
Que apareceu
Menina do dia
Se o deus vagabundo
De vez se apagar
Seu dia imundo
Vai logo acabar
Você está solta
Se vá com os seus
Pois sempre vem outra
Menina de deus
Pojuca, 1982
Evolução
18
PASSOS
Numa festa sem cabeça
De infinitas horas mortas
Sem pedir que apareças
Sem nada, em tudo cortas
Sou pouco no vasto mundo
Imundo no vasto o pouco
Me queres, sabes no fundo
Mas dizes que sou um louco
Este início chega ao fim
Antes nunca, não mereço
Quisera acabasse enfim
Ainda quando o começo
Não entendo essa razão
De ser assim submissa
Pois o poder do Rei Sol
Fulminará tua cobiça
Pojuca, 12 de julho de 1982
Evolução
19
PÁSSARO VOANDO
Um suave Algodão Doce,
Maçã, alegre no ar
Lá numa Terra Encantada
Um Carrossel a rodar
Girando em minha cabeça
Cavalga em minha emoção
Quando você se aproxima
Galopa o meu coração
Se vem, encanto e alegria
Enche-me de confiança
Felicidade irradia
Na volta insegurança
Para o girar colorido
Te perdi na multidão
Pássaro longe, voando
Que escapou de minha mão
Acorda a dor dessa alma,
Em ponta aguda e vinho
É o cristal que despenca
É sangue em meio ao caminho
Não há mais som que eu cante
E nem alegria ou razão
Talvez na Roda Gigante
Nasça uma nova paixão
Santa Luz, 01 de abril de 2001
Evolução
20
MARGHERITA
Hoje eu choro apaixonado
Choro o choro de quem ama
Choro pela garçonete
Que nem sei como se chama
Choro então desesperado
Por Karina e Isabela
E me sinto amargurado
Por Priscila e Daniela
Hoje entendo as mulheres
São vingança e mansidão
Se não querem vão à forra
Mas se querem é só perdão
Só não sei o que acontece
Com meu louco coração
Que vive despedaçado
Quer o mundo em sua mão
Belo Horizonte, 18 de julho de 2002
Evolução
21
FERA DOMADA
Do temor certo onde aflora a emoção
Ali renasce o sentimento adormecido
Mira a lua bem distante um coração
Na emoção de ter um bem correspondido
Incerto sonho, objeto de desejo
A jóia viva na vitrine de concreto
Doura o fascínio incontido de um beijo
Vejo a vitória e não creio estar tão perto
A flor entregue à brisa cede a carícias
Reluz o brilho do tesouro em minha mão
Transborda a alma flutuando nas delicias
Enquanto corpos nus vagueiam pelo chão
A natureza se entrega sem pecado
É o instinto que sufoca a timidez
E o desejo vem no rosto estampado
De poder vê-la pequenina outra vez
Canaã dos Carajás, 07 de fevereiro de 2003
Evolução
22
MONTES BRANCOS
Brotam lágrimas da terra
Inicia a caminhada
Sobre os ombros pesa o medo
Passos lentos pela estrada
Por frestas suspira a vida
O silêncio é um lamento
Assim sigo cauteloso
Vacilo cada momento
Vou chegar até os montes
De onde a vida irradia
Ao redor dessas colinas
Sinto pura energia
O espírito me guia
Pela determinação
Miro longe uma planície
Um lago me é canção
O pavor já se dissipa
Posso descansar na relva
Me carrego de encanto
Até penetrar na selva
A natureza responde
Pelo sussurro das águas
Imponência em cachoeira
Vem lavar as minhas mágoas
Carajás, 16 de Novembro de 2002
Evolução
23
WHAT A WONDERFUL WORLD II
Ao passar o passaredo
Se encanta de cantar
Na caminhada da vida
São as curvas do amar
E faz a minha cabeça
É assim que fico pronto
Balança, ondas suaves
Que logo me deixa tonto
Quando fito este rosto
Um corpinho mavioso
Essa criação divina
Que mundo maravilhoso!
Santa Luzia, 10 de julho de 2002
Evolução
24
Elemento 2
O ar traz vitalidade,
A conquista do saber
A razão, a consciência
A ciência faz crescer
Evolução
25
MARGINAL
Morre,
Agora que te roubaram a esperança,
Depois que te roubaram o pão,
A terra, a saúde
Morre,
Teu desespero traz a alegria
Pra aqueles que te mataram
Os mesmos que te fizeram
Desprezar a morte
Morre,
Pois tu não choraste
Por teu filho assassinado,
Eles também não chorarão por ti.
Tu não os ama porque eles te mataram
Ele são o teu próximo e não te amam
Porque estão distantes
Nada é teu
Nem as lágrimas
Nem as terras
A saúde ou o pão
Assim a ilusão estava certa
Quando te matou
Nada tens, então
Morre.
Campo Formoso, 1983
Evolução
26
ADEUS
Cruza a picada abraçada
Maria com Seu João
Trazem últimas notícias
Das porteiras do sertão
Nenhum capim, menos gado
Já secou o ribeirão
A galinha ainda ciscava
Hoje mesmo no terreiro
Mas se a fome amargava
Tem durado o ano inteiro
Era a última e eu matava
Como fiz com meu carneiro
Do romantismo da nuvem
Que cobria nossa lua
Não restou mais nem a virgem
Do outro lado da rua
Cujos olhos já não cingem
Se foi da vida tão sua
Evolução
27
No poço que nos molhava
No tronco do mulungu
O sabor da madrugada
Grama e mandacaru
Seus espinhos não dão nada
Só me resta ir pr’o sul
Dessa terra do sem fim
Só me restará lembrança
Já vou começar enfim
O penar de uma andança
Para a terra onde espero
Me espera a esperança
Campo Formoso, 1984
Evolução
28
BAGDÁ
Quando insana a ganância
Toma conta do juízo
Quando os inconseqüentes
Ignoram o prejuízo
Temos mil e uma noites
De horror no Paraíso
Veias vivas sob a terra
O petróleo a pulsar
É a águia assassina
Fazendo o sangue jorrar
E as mães de todo o mundo
Tristes em seu lamentar
Lâmpada apaga sem Gênio
Já não é maravilhosa
E a fumaça que surge
É agora perigosa
As estórias da infância
Hoje história rancorosa
O ladrão que vem de fora
O tapete é metralhado
O fogo sobre o Eufrates
O cálice é derramado
E vem o apocalipse
O terror globalizado
Canaã dos Carajás, 13 de abril de 2003
Evolução
29
NAÇÃO COCOROBÓ
Exemplo de toda paz,
Democracia, paixão
Onde resgata o melhor
Que vem da religião
Luta em cooperativa
Amor e grande união
Colhendo o fruto e o progresso
Pureza e compreensão
As crianças no colégio
Os adultos no labor
Sempre, no final da tarde
Rezam prece com fervor
Eu falo de Conselheiro
Que este mundo criou
Choro o choro vendo as águas
Que hoje o sonho afogou
Belo Horizonte, 24 de janeiro de 2002
Evolução
30
O ÚLTIMO GUERRILHEIRO
Que a juventude não pague
Na estrada da ingratidão
Pendurada em Pau-de-Arara
O preço da alienação
Ignorando as guerras
Travadas por liberdade
Como o herói Tiradentes
Que venha ainda que tarde
Veio Zumbi no Quilombo
E Marighela ou Lamarca
Nas lutas organizadas
Pela justiça tão parca
A saga de Conselheiro
Andando pelo sertão
Pagou com sangue o intento
De repartir peixe e pão
Estes são imprescindíveis
Lutaram por toda a vida
Como Irmã Dulce e Betinho
São luzes d’alma sofrida
Chico, Vandré, Caetano
Fundindo grito e brandura
Os que endurecem a voz
Sem perder nunca a ternura
Evolução
31
Mesmo se no horizonte
Não surge o breu do pavor
Temos que ser vigilantes
Pregando, vivendo amor
Clamando assim por justiça
País, estado, cidade
Pra que tenhamos por certo
A paz e a felicidade
Belo Horizonte, 16 de junho de 2002
Carajás, 26 de setembro de 2002
Evolução
32
CANAÃ
Vivia no anonimato
Nossa terra prometida
Até que foi finalmente
Por outro povo invadida
Quando tocou a trombeta
O muro de proteção
Pela força do trator
Foi com a mata ao chão
Sumiu o povo pintado
Que sucumbiu com a floresta
Os irmãos da profecia
Tentam viver com o que resta
Esperando a redenção
Que traz um novo costume
Como a arca de Noé
Vem forrada de betume
Carajás, 20 de outubro de 2002
Evolução
33
RAÇAS
Hoje existem duas raças
Uma é branca de pureza
Que cultiva amor e paz
E em tudo vê beleza
Raça de compreensão
Esta une as diferenças
É a que estende a mão
E tolera as divergências
Outra raça é a vermelha
Mergulhada na ganância
Encharcada pelo sangue
Que se impõe com arrogância
Que divide o povo em castas
Que impõe as dependências
A que tudo quer pra si
Sem medir as conseqüências
Com aparência preta ou branca
Amarela ou colorida
Escolha estar com a morte
Ou vir ao lado da vida
Santa Luz, 06 de abril de 2003
Evolução
34
RASTAFARI
Pesa o coturno no peito
O canivete na trança
Brusco é o movimento
Que desfigura a esperança
Era o belo, era origem
Era imagem poética
Com paciência, cuidado
Se cultivava a estética
Era o sentir-se bonito
O dedicar-se em contento
A arte, espelho da vida
Pendia solta ao vento
Vem o brutal pesadelo
O preconceito medonho
Quando o racismo aflora
Cai na sarjeta o sonho
Belo Horizonte, 07 de junho de 2003
Evolução
35
SEPARAÇÃO
Um náufrago anda sozinho
Mergulhado em suas dores
Tempestade, frio no inverno
E primavera sem flores
Ilhado pelas mentiras
Chora um lamento tristonho
Pois vem à tona o claro
Oculto então pelo sonho
E como dói perceber
Lutando até o final
Que ela assim como os ratos
Foge ao primeiro sinal
Assim a noite despenca
Enquanto oh, sol tu descansas
Meu acalanto é o fardo
E lá são festas e danças
Santa Luz, 28 de dezembro de 2001
Evolução
36
GISELLI
Rodas, vento, liberdade
É simplesmente real
Ronco, rampa, depressão
Ascensão do animal
Perto assim da natureza
Canta, corre e assobia
Sol e chuva ou tempestade
Clara noite, rubro dia
Pela estrada de viver
Voando sem um abrigo
Equilíbrio sem problemas
Tudo fora de perigo
Brasília, 13 de novembro de 2002
Evolução
37
VIVER DE AMOR
Não posso viver
Na ânsia amargurada da solidão
Pois já morri de amor.
Tantas vezes...E tanto
Belo Horizonte, 25 de abril de 2003
Evolução
38
PRINCESINHA
Palavras soltas jamais descreverão a emoção
De fitar a profundidade de teus olhos
E presenciar esse sorriso ingênuo
Tão cheio de malícia.
De cada dedinho que se enrosca
Nas pontas de teus cabelos,
Emana forte energia que me faz sentir
A presença de meu próprio coração.
O despontar dos seios é a aurora da loucura.
As curvas ainda suaves me envolvem
E o medo que nos afasta me encoraja
A me aproximar mais e mais de ti.
A grande diferença que há entre nós
Equilibra nossas aspirações.
A preocupação de estar errado em pensar em ti,
Me faz não te esquecer um instante sequer.
Tua fragilidade se funde a minha rudez.
E esta graça me envolve tão suavemente,
Que acredito ser muita felicidade
Para ser só um sonho
Santa Luz, 2000
Evolução
39
Elemento 3
Na água que purifica
Sem ofuscar por paixão
Luz na escuridão da ira
Quando aflora a compaixão
Evolução
40
CORAÇÃO NO CÁRCERE
Quando enfim finda o domínio
De voar na imensidão
Confinado na gaiola
Os muros de uma paixão
Luta se debate e fere
Assim sangra o coração
Vê-se em luta desigual
E cansado de sofrer
Conformado com a dor
Acaba assim por ceder
Calado, passivo e triste
Um lamento é seu viver
Um dia se abre a porta
E o costume da prisão
O leva a permanecer
No fundo do alçapão
Abre mão da liberdade
Fica o medo e a solidão
Precisa voltar à tona
Recompor o tempo perdido
Até ser agraciado
Com o amor correspondido
Só assim vai entender
O valor de ter sofrido
Belo Horizonte 14de junho de 2002
Evolução
41
CANOA QUEBRADA
O vento levou nossa areia
Nossa canoa afundou
Acabaram-se os sonhos
Até nosso mar secou
O vazio da tua ausência
Vou preencher de esperança
De você gostar de mim
Qual antes daquela dança
E vivendo de saudades
Hei de andar triste chorando
Eu não quero te perder
Vou estar sempre esperando
Agora como não posso
Gritar os meus sentimentos
Vou mergulhar na canção
Lembrando dos bons momentos
E sempre que eu estiver
Tocando meu violão
Lembra-te que estarei
Cantando minha paixão
Caldas do Jorro, 19 de agosto de 2001
Evolução
42
DESENCONTRO
O destino age assim
Fez a gente se cruzar
E depois o desencontro
Pela missão de voar
Vem o mundo dando volta
Nos coloca aqui tão perto
Vem saudade novamente
Como águia no deserto
O ciclo de evolução
Me tange, outro lugar
Vai na mala a esperança
De outra vez te encontrar
Salvador, 2003
Evolução
43
O ARDOR DA DESPEDIDA
Surge a dor e a aflição
Onde foi felicidade
Chove o horror da traição
Sobre o calor da amizade
O sorriso vira choro
O nojo vem da afeição
O prazer de estar perto
É repúdio e rejeição
Toda admiração
Vem agora sucumbindo
E tudo quanto foi vida
Hoje volta destruindo
Evolução
44
O peso do sofrimento
Traz o medo de morrer
É fugir, virar a mesa
É não mais poder se ter
As lembranças tatuadas
Cicatrizes de um amor
Impossível esquecer
Perseguem por onde for
Desabrocha o sorriso
Em um mundo diferente
Uma outra amizade
Nasce tudo novamente
Belo Horizonte, 13 de março de 2003
Evolução
45
ADEUS SOLIDÃO
Flutuando pelas ruas
Plano sobre a multidão
Tenho assim por companhia
A amarga solidão
Qualquer som me entristece
Penso um monte de besteiras
Sinto como se o mundo
Fosse feito de fronteiras
Se eu vejo alguém alegre
Fico triste, não sou eu
E se outro está triste
O problema não é meu
Evolução
46
Esqueço que o carinho
Está em qualquer lugar
Que em todo canto existe
Um alguém para amar
Alem disso tanta gente
Também anda triste assim
Quem sabe, até encontro
Um que precise de mim
Vou voltar à superfície
E viver cada cidade
Enxergar em cada rosto
Uma nova amizade
Arapiraca, 02 de dezembro de 2001
Evolução
47
SAUDADE
Longe te sinto presente
Quantos dias sem ti ver
Em aqui parece longe
Canso de tanto sofrer
O mundo parece um barril
De pólvora até a tampa
Como me sinto infantil
É a saudade que acampa
Mas a distância é um bem
Hoje estou flutuando
Que sensação agradável
Todo momento pensando
Assim aumenta a esperança
A cada dia que foi
Aguça mais o momento
De explodir com teu oi
Santa Luzia, 25 de março de 2002
Evolução
48
MENINAS DA DIVISA
Quisera ser brasileiro
Nem do norte nem do sul
Entre Minas e Bahia
Onde o céu é mais azul
“Lumiado” pelo brilho
Das meninas dessa terra
Encantada de beleza
Onde o pensamento emperra
Rodeado de carinho
Tudo que eu sempre quis
Estar perto da alegria
Isso sim é ser feliz
Belo Horizonte, 24 de abril de 2003
Evolução
49
SONETO DO SOM
Debruçado na marquise
Jamais vi coisa tão linda
Não importa sofrimento
Se há música ainda
Seus dedos escorregavam
Sobre a pista preta e clara
Todos os anjos cantavam
Só meu coração se cala
Amanhã vem outro dia
Me vem grande confusão
Um olhar tão penetrante
Eu fiquei tão inconstante
Não sei se é impressão
Fico cego sem um guia
Pojuca, 1982
Evolução
50
AMEI
Às vezes nem acredito
Que acredito no amor
Achar que alguém pode ter
Um sentimento sem dor
Eu fico aqui esperando
Um bem incondicional
Este que não deixa dúvida
De uma entrega total
Sem mascarar sentimentos
Sem se encharcar de perfume
Sem jogo, sem possessão
Livre de todo ciúme
Mútua entrega e alegria
Um puro instinto animal
Será assim com você?
Será que não sou normal?
Belo Horizonte, 25 de março de 2002
Evolução
51
BELINHA
Movido pela emoção
Que denuncia o olhar
Eu já me sinto seguro
Descobri o que é amar
Sedentos como vampiros
Envolvidos no abraço
Mergulhados no desejo
Assim nos vence o cansaço
Flutuamos na penumbra
Sentindo como é viver
São momentos imortais
Que jamais vou esquecer
Amanhã vem outro dia
E eu recordo risonho
Tudo pode acontecer
Até ser real o sonho
Belo Horizonte, 22 de fevereiro de 2002
Evolução
52
DOIS
É somente o que me falta,
Viver cada bom momento
Compartilhando o amor
Evitando o sofrimento
Porque és a imagem viva
Daquela que eu criei
Eu te fabriquei na mente
És tudo que eu sonhei
Como jóia preciosa
Que precisa ser cuidada
Vem viver em segurança
E ser sempre admirada
Eu sempre te serei grato
Por tua dedicação
E pela fidelidade,
De todo meu coração
Arapiraca, 10 de Junho de 2001
Evolução
53
INFANTIL
Até quando acharás que a terra
É um parque de diversões
E brincará de boneca
Como uma criança?
Até quando enxergarás a vida
Com essa naturalidade
Como se tudo fosse fácil...
E possível?
Até quando confiarás nas pessoas
E darás risada de tudo
Como se viver
Fosse só alegria?
Até quando te entregarás
De corpo e alma ao amor,
Achando que o outro se entregará
Tanto quanto você?
Até quando serás feliz?
Nordestina, 07 de março de 1996
Evolução
54
RAINHA
Se voa, navega e corre
Mas tem total segurança
Saber que todo o alicerce
É firme amor e esperança
Nômade só pelo mundo
Tapete, barco e camelo
Se nutre de tal certeza
Alguém lhe espera com zelo
Aguarda, riso nos lábios
Aquele amor sem maldade
De braço aberto, alegria
Supera adversidade
É recebido com festa
Sentindo gozo profundo
Vem, recarrega energia
E cai de volta no mundo
Belo Horizonte, 24 de janeiro de 2002
Evolução
55
TODOS OS SENTIDOS
Sinto a tua presença
Se miro nuvens esparsas
Procuro te ver à distância
Por esta rua que passas
Sem profanar tua pureza
Beleza rosa em botão
A voz abala meu corpo
Um terremoto, um tufão
Teu cheiro invade a vila
Gostoso gás profusão
E num abraço inocente
Congela a minha emoção
Mata minha sede teu beijo
Suave e doce sabor
E do teu corpo a aura
Ofusca ao claro do amor
Nuvens assim neste encontro
Respondem pura energia
Se abre a rosa em beleza
O chão se rasga em magia
Transborda o sangue da terra
Força viril de um vulcão
Os gases reagem e se expandem
Em descontrolada explosão
Evolução
56
Despenca o gelo da serra
Tão frágil, tão alvo e leve
Ao deslocar-se transforma
Imensa bola de neve
Então toda força contida
Rompe o temor da razão
E se desprende em dilúvio
De só prazer e paixão
Arapiraca, 05 de janeiro de 2001
Evolução
57
Elemento 4
Regenera pelo fogo
Em fé e meditação
Em reflexão a alma
Vive em contemplação
Evolução
58
ULTIMA TRAVESSIA
Um lago
Por vezes refletia sobre a face
Figuras disformes
Tornando aquele plano um espelho multicor
Um bote verde cruza vagaroso
Aquela superfície
Deixando atrás de si
Um rastro que aos poucos
Se desfaz
Lá longe, no horizonte
Surge aos poucos
Uma nova figura na paisagem
O remador observa
Talvez seja o sol
Que finalmente vem trazer a aurora
Ondas surgem crescentes
Ao redor dessa figura
De súbito emerge uma serpente
Imensa como uma quimera
Baixa sobre o bote
Levando consigo
A utopia de um novo dia
Alagoinhas, 1983
Evolução
59
REFLEXOLIDÃO
Parem os relógios
Está me faltando tempo
Tempo pra gostar de ser
Quem eu me tornei
Tempo pra pensar
Onde eu quero chegar
Tirem os biombos
Eu preciso de espaço
Preciso olhar nos olhos
Encontrar amigos
Saber quem gosta de mim
Eu quero ser feliz
Me coloquem no chão
Quero um lugar
Que eu fale qualquer sotaque
Onde eu possa ser quem sou
Onde não seja preciso
Ser um ator de mim mesmo
Belo Horizonte, 09 de junho de 2003
Evolução
60
ESCURECEU
Quando nós nascemos, eles surgiram e eram
maiores
Quando queríamos paz, inventaram a pólvora
Quando protestamos, inventaram os nêutrons
Quando pregamos o amor, eles pregaram Cristo na
cruz
Quando crescemos, eles nos perseguiram
E fomos envolvidos pelas luzes, fomes, bebidas
Pressões, ilusões e por fim fraqueza
E fomos contra as divisas e elas pesaram sobre nós
Arriscamos olhar , mas eles foram mais penetrantes
Quisemos gritar, mas eles gritaram mais forte
Então baixamos nossas cabeças e fomos morrer
Mas nos olhamos uns aos outros e vimos neles a
nossa própria face
E ela brilhou forte
Daí aproveitamos este brilho e iluminamos o
caminho
E o que era escuridão se fez luz
Campo Formoso, 20 de janeiro de 1986
Evolução
61
PAI
Eu na varanda esperando
Quem sei jamais vai chegar
Mas eu espero chorando
Um dia há de voltar
Não sei se sóbrio ou sonhando
Não sei de gosto ou pesar
Se vem alegre e cantando
Ou se há mágoa e penar
Não sei se foi para sempre
Não sei se está descontente
Mas sei que eu vou também
Pode assumir nova vida
Sua missão foi cumprida
Fique onde está, fique bem
Belo Horizonte, 21 de fevereiro de 2004
Evolução
62
SONETO PARA UMA AMIGUINHA
Tem gente que nos faz ter
Uma grande afinidade
Existe uma identidade
Mesmo longe, sem se ver
Assim se cultiva amizade
Sob qualquer situação,
E se entrega o coração
Com a seca ou tempestade
É sempre estar a dispor
Pra se ver em paz e calma
Mesmo nas dores do amor
Precisou, está na palma
Pois que um sempre morou
No fundo da outra alma
Santa Luz, 10 de abril de 2002
Evolução
63
ROSA NA ESTRADA
Embebe a rua de amor
Seca o rancor coração
Encharca a alma alegria
Vem, irradia emoção
Flor no asfalto, és gente
Enxuga a nossa tristeza
Passa, espalha e perfuma
Com tua rara beleza
Araci, 1993
Evolução
64
TERAPIA
Se hoje vejo você
Até me sinto risonho
É parte do pesadelo
Que em um dia foi sonho
Você surgiu dos escombros
Qual obelisco na praça
Tornou alegre a lembrança
Graças a toda sua graça
Como a rosa que enfeita
O cano de um fuzil
Você, a Ilha de Açores
Da Atlanta que sucumbiu
Ao seu passar se enfeita
A rua com a beleza
Devolve a paz num sorriso
Seu jeito, pura pureza
Você vai a quem precisa
Ascende ou apaga a chama
Traz alegria, põe vida
Vai para amar mar e ama
Santa Luz, 17 de março de 2002
Evolução
65
HAIKAI
A semente vai brotar
Pois o ódio das palavras
Vem do amor do coração
Belo Horizonte, 14 de setembro de 2003
Evolução
66
A DANÇA DOS PUNHAIS
O menino sobe a estrada
Atravessa sete colunas
Está de frente a um punhal
A prata reluz e cativa
Muda a face e sempre é lindo
Perto fere e deixa a dor
Traz assim tanta injúria
Deixa um homem confundido
Se se despe, baila e brilha
Se se veste apaga e trilha
Caminhos indesejados
O fez brilhar por vezes
Transformando o sentimento
Que faz ver agora o quadro
Um ancião desce a estrada
Passa por sete colunas
Está de frente a uma cruz
Pojuca, 1982
Evolução
67
JUVENTUDE INTOCÁVEL
A prata polida do espelho
Em vez do seu corpo encantado
Reflete o teu povo pequeno
E a perseguição do passado
O mago gasto em matéria
Os servos, breves mortais
Amam somente a canção
As matas e os animais
E tu, juventude intocável
Porque foste iniciada
A ser a morada da deusa
Assim transformando-se em fada
Então protegida dos tempos
Hoje és testemunha real
Do tempo da harpa e harmonia
Do tempo do amor imortal
Araci, 1989
Evolução
68
RENASCIMENTO
Na tarde vai o menino
Ouve o canto e estremece
Como o vibrar do sino
Na lida tudo acontece
Já passou por os umbrais
De portas que rangem dentes
Acreditou nos mortais
Sem esquecer outras gentes
Até na casa dos mortos
Os anjos lhe davam luz
Em vez de ver os seus corpos
Sangrando, pregados na cruz
Alguém lhe falou da certeza
Que quando acaba a esperança
Sobe ao trono a princesa
Que põe um fim nessa andança
Mas não é chegado o tempo
Ele espera com aflição
Que o canário cante ao vento
Na palma de sua mão
Pojuca, 1982
Evolução
69
SANTA LUZ
Chega a manhã, vem sem medo
Fresta a luz anuncia
Raia a felicidade
Nasce o clarão, chega o dia
Claro é o sentimento
A pele, a terra, a flor
Clara vem a luz do sol
Claro é se dar sem ter dor
Dorme o caos do egoísmo
Fruto da obsessão
A paz vem do equilíbrio
Sem os males da paixão
Clara é a alegria
Claro é saber viver
É viver a realidade
Nunca mais ter que sofrer
Parauapebas, 25 de outubro de 2002
Evolução
70
MANU
Naquele dia ele acordou
Que não cabia em si
Tamanha era a felicidade
Abraçou e beijou todos os amigos
Presenteou a todos os queridos
À tarde sentou-se na varanda
Contou casos do arco da velha
Recordou todas as alegrias do passado
E sentiu-se feliz
Sentou-se à mesa
E se fartou de tudo quanto lhe era de direito
Agradeceu a Deus por todas as bonanças
Deitou-se e dormiu um sono eterno
Petrolina, 1984
Evolução
71
VERDADE
Vento varou vozes
Veja: violência vagando
Vai vida vadia
Viaja, volta vazia
Vem vida virada
Alagoinhas, 1981
Evolução
72
ALQUIMIA
Fogo em meu coração
Queima os meus sentimentos
Que eu volte a sentir paz
Apague os ressentimentos
E essa dor do ciúme
Vire força e razão
Que eu passe a dominar,
Controlar minha emoção
A traição seja vista
Como uma concessão,
Te devolvo a liberdade
Tens o mundo à tua mão
Que o ódio que eu sinto
Volte a ser mais puro amor
Sem cobrança ou recompensa
Sem paixões e sem rancor
Evolução
73
Que agora eu me concentre
Apenas na emoção
Mudando assim da angústia
Para regeneração
Os momentos de alegria
Cresçam em meu pensamento
E floresçam me trazendo
Algo de contentamento
Sendo transmutado em ouro
Surge uma nova medida
Me reerguendo das cinzas
E ganhando nova vida
Santa Luz, 16 de outubro de 2001
Evolução
74
CICLO INFINITO
O homem...
Nada sobre a Terra,
Um indivisível átomo
Com seu solitário Elétron
A porção menor da célula
Cujo núcleo é o sol.
Esta, parte de um órgão
Vindo do Incomensurável
Espelho da criatura
Sua imagem e semelhança
Que se torna agora o tudo
O homem...
Belo Horizonte, 20 de abril de 2003
Evolução
75
EVOLUÇÃO
Terra frágil ganha força
Nasce o poder pessoal
Torna-se sadio e belo
Cruza o primeiro portal
O ar traz vitalidade,
A conquista do saber
A razão, a consciência
A ciência faz crescer
Na água que purifica
Sem ofuscar por paixão
Luz na escuridão da ira
Quando aflora a compaixão
Regenera pelo fogo
Em fé e meditação
Em reflexão a alma
Vive em contemplação
O ciclo do crescimento
Toca a alma, corpo e mente
A sede de perfeição
Vive tudo novamente