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UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS – UFG

FACULDADE DE DIREITO

ALINE MYTHSUÊ H. DO PRADO

ANA TEREZA SOUZA DOMINGOS

BRUNO GEOVANE

CÉSAR DE VASCONCELOS

DÉBORA BARCELOS GOMIDES

GABRIELA DE AZEREDO COUTINHO LOYOLA

KELLY FORTES VIOLADA

MATEUS ROCHA DE LISBÔA

MELISSA DE ALMEIDA CARDOSO

MÉRCIA DOS SANTOS

THALES AMORIM CAVALCANTE

EVOLUÇÃO DO ESTADO MODERNO

PARADIGMAS CONSTITUCIONAIS DO ESTADO LIBERAL DE DIREITO,

DO ESTADO SOCIAL DE DIREITO E DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE

DIREITO

Goiânia, Goiás

Outubro 2014

UNIVERSIDADE FEDERAL DE GOIÁS – UFG

FACULDADE DE DIREITO

ALINE MYTHSUÊ H. DO PRADO

ANA TEREZA SOUZA DOMINGOS

BRUNO GEOVANE

CÉSAR DE VASCONCELOS

DÉBORA BARCELOS GOMIDES

GABRIELA DE AZEREDO COUTINHO LOYOLA

KELLY FORTES VIOLADA

MATEUS ROCHA DE LISBÔA

MELISSA DE ALMEIDA CARDOSO

MÉRCIA DOS SANTOS

THALES AMORIM CAVALCANTE

EVOLUÇÃO DO ESTADO MODERNO

PARADIGMAS CONSTITUCIONAIS DO ESTADO LIBERAL DE DIREITO,

DO ESTADO SOCIAL DE DIREITO E DO ESTADO DEMOCRÁTICO DE

DIREITO

Trabalho apresentado como exigência de

avaliação parcial para a disciplina Teoria

da Constituição, junto ao Curso de

Graduação em Direito da Universidade

Federal de Goiás – UFG, sob orientação

do Prof. Herberson Alcântara .

Goiânia, Goiás

Outubro 2014

Evolução Do Estado Moderno

Paradigmas Constitucionais do Estado Liberal de Direito, do Estado Social de

Direito e do Estado Democrático de Direito

1. ESTADO LIBERAL DE DIREITO

(Desenvolvido por Bruno, Débora, Kelly e Thales)

1.1. HISTÓRICO

O Estado Liberal é o primeiro Estado de Direito . Surge nos últimos séculos da Idade Média ,

através da Revolução Francesa, que garantiu o triunfo político da burguesia. Esse Estado e um

produto histórico, concebido por e para um segmento em situação econômica próspera, que

lega preciosas conquistas, como os direitos fundamentais.

O Estado Liberal sucedeu o Estado Absolutista, que foi caracterizado pelo forte centralismo

político, impregnado pelo teocentrismo e teoria do direito divino como fundamento do poder

monárquico. O Absolutismo sufocou a sociedade, através da força e do arbítrio real. Com a

evolução do pensamento humanista, sustentado pelo Iluminismo e o espírito revolucionário da

época, há o aparecimento do Estado Liberal, este sustentado pelos ideais da Era das

Revoluções, marcadas principalmente pela Revolução Gloriosa (1688), Independência Norte

Americana (1776) e, sobretudo pela Revolução Francesa (1789) que, por sua vez, possuía

suas bases nos ideais: Liberdade, Igualdade e Fraternidade.

O ideal racionalista inspirado nas ideias liberais e democráticas de John Locke foi o que

justificou o processo de ruptura institucional. O primeiro Estado de Direito possui forte

vinculação com a burguesia politicamente emergente e seu individualismo racionalista.

Portanto, buscou-se formular uma constituição que poderia corresponder às demandas da

sociedade burguesa e suas respectivas garantias.

O Estado Liberal nasce com a marca da racionalidade, através da despersonalização do

exercício do poder e obediência dos indivíduos, não uns aos outros, mas à lei. Ocorre a

consagração do homem como detentor de direitos e a formalização do poder. Em oposição à

estrutura pluralista da sociedade medieval, o Estado Moderno assume uma estrutura monista,

uma vez que o estado concentra em si todos os poderes, principalmente aquele de criar o

direito.

1.2. PARADIGMAS

O paradigma liberal estabelece um alcance restrito das liberdades públicas, com a não

intervenção do Estado no campo privado, proporcionando a cada indivíduo toda a liberdade

para que possa valer-se das oportunidades de alcançar suas conquistas pessoais.

Surge, então, um conceito ideal de constituição, baseado nas demandas e garantias da

liberdade burguesa. Propõe-se o reconhecimento dos direitos fundamentais, a divisão de

poderes e a participação popular no poder legislativo. Essa divisão de poderes funciona como

garantia contra o abuso de poder do Estado. A constituição é escrita e representa um pacto

político revestido em documento.

A moderna constituição do Estado burguês se firma nos seguintes preceitos: a liberdade de

todos os seres humanos, membros de uma sociedade, enquanto homens; a dependência de

todos a uma legislação comum, como súditos; a igualdade formal de todos, como cidadãos

(KANT, 1989:33).

Da ideia de liberdade burguesa, segundo Shmitt, deduzem-se dois princípios: princípio da

distribuição (que designa que a esfera da liberdade do indivíduo deve ser ilimitada e o poder

do Estado para invadi-la é limitado) e o princípio de organização (que viabiliza o princípio da

distribuição, quando o poder do Estado se divide e se fecha em sistemas de competências

circunscritas).

Existe, no Estado Liberal, um sistema de freios e contrapesos para realizar um controle

recíproco entre os poderes e impedir a hipertrofia de qualquer um dos mesmos. Entretanto,

devido sua função legiferante, existe uma certa supremacia do poder Legislativo sobre os

demais.

Os elementos estruturais dominantes na constituição liberal são: a referência da constituição é

o próprio Estado; o arquétipo é o Estado liberal; a finalidade da constituição liberal é

primordialmente a racionalidade e os limites do poder; a força normativa da constituição

objetiva regular juridicamente o estatuto organizatório das instituições do Estado separado da

sociedade; a estrutura da constituição limita o poder estatal e consagra direitos de defesa do

cidadão perante o Estado, sendo assim considerada basicamente negativa; a verdade da forma

constitucional liberal deve ser procurada no texto (expresso) e no contexto (oculto). A

constituição liberal presume ainda o modelo econômico liberal burguês: autonomia privada,

economia privada e valores básicos do individualismo possessivo.

O Estado de direito é um conceito político. Ele objetiva proporcionar segurança jurídica para

a economia liberal e, por isso, privilegiou a autonomia privada, com os direitos de

propriedade e liberdade dos contratos.

Por uma questão didática, dividem-se os direitos fundamentais em três categorias ou

momentos, denominadas de “gerações”. Surge, no Estado liberal, a primeira geração dos

direitos fundamentais, focados no direito da liberdade, principalmente liberdade individual e

política. Esses direitos têm como titular o indivíduo, são oponíveis ao Estado e têm um traço

característico de subjetividade. São, portanto, direitos de resistência e oposição perante o

Estado. (SALGADO, Os Direitos Fundamentais, 2006, p. 25):

O nascimento dos direitos individuais está, como se vê, ligado ao

avanço das concepções liberais diante da estrutura de poder que rege a

sociedade civil. As teses de Locke e Montesquieu [...] têm em vista

[...] garantir aos indivíduos um espaço de liberdade [...] em que o

Estado não pode penetrar [...] Os direitos individuais do liberalismo

puro não significam democratização do poder, mas limitação do

poder.

Como dito anteriormente, o Estado realiza uma tutela negativa dos direitos fundamentais. Isso

dá a ele uma característica abstencionista e policial, uma vez que abstém-se de ferir as

liberdades e garante que os outros sujeitos também não o façam. O objetivo é intervir o

mínimo possível, para que cada indivíduo possa alcançar livremente seus objetivos.

Com o surgimento do modelo democrático-liberal, o indivíduo tornou-se centro da sociedade,

cabendo ao direito reconhecer e proteger a identidade de cada cidadão. Porém, o Estado

Liberal estava a serviço da burguesia, o que fazia com que o mercado ficasse abandonado aos

economicamente poderosos e, a liberdade e a igualdade, fossem reconhecidas apenas no plano

formal. A liberdade e a igualdade, assim, eram apenas direitos de defesa ante o Estado e não

direitos de participação política da comunidade.

A organização social no Estado Liberal determina a organização política e cultural, pois a

separação existente entre a igualdade política e a desigualdade, operada pelo capitalismo, é

ilusória. Essa igualdade política meramente formal gerou uma sociedade desequilibrada. A

livre concorrência beneficiou o acúmulo de bens pela burguesia em detrimento dos segmentos

proletarizados. A partir daí - sentindo-se incapazes de superar as injustiças sociais - as classes

marginalizadas começaram a questionar o Estado abstencionista.

O Estado de Direito visava a execução do bem geral, associando a lei à ideia de justiça

material. O Estado de Direito, com o liberalismo, seguiu-se colocando em prática um direito

formal, que adquiriu contornos definitivos com o positivismo jurídico-estatal (não

valorizando o caso além do descrito na norma e vetando o poder criativo do juiz, buscando

garantir a preservação da liberdade). O Estado de direito reduziu-se a um sistema apolítico de

defesa, concebendo, assim, o princípio da legalidade da administração (submetendo a

administração à lei e seus atos de controle jurisdicional), fazendo com que até mesmo

soberano se submetesse ao império da lei.

No Estado Liberal de Direito, e de seu legado, transparecem os prenúncios da Era das

Revoluções (HORTA, Estudos de Direito Constitucional, 1995, p. 109).

A Declaração dos Direitos de 1789, pela universalidade de seus

princípios, beleza literária e jurídica de sua construção, transformou-se

no marco culminante do constitucionalismo liberal, no instrumento de

ascensão política e econômica da burguesia, a nova classe que se

apossava do comendo do Estado e da Sociedade e nessa posição

plasmaria novas instituições políticas e jurídicas que iriam assegurar o

seu domínio secular.

1.3. CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS

Dentro do processo constitucional brasileiro duas constituições se integram no paradigma do

Estado Liberal, são elas: a constituição do Império de 1824 e a primeira constituição

republicana de 1891.

1.3.1. Constituição do Império de 1824

A ideologia liberal e estimulada no Brasil com a chegada da Corte em 1808. A realidade

econômica estabelecida no sistema escravista de produção e os atrasos culturais marcaram o

liberalismo que se desenvolveu Brasil, criando um modelo ideológico com características

próprias. A realidade local inseriu nos ideais liberais a comparação e a sobreposição entre

liberdade e propriedade, bem como entre autoritarismo e liberdade política. Desse modo,

formou-se o contraditório liberalismo brasileiro.

A primeira constituição brasileira foi outorgada por Dom Pedro I logo após a independência

do Brasil. Apesar da convocação de uma assembleia constituinte em 1823 que apresentou

ideias marcadamente liberais, Dom Pedro acabou dissolvendo-a e, a despeito de toda

influência do liberalismo sobretudo na Europa a constituição surgiu contrária ao Regime

Liberal do ponto de vista político, mas não deixou de apresentar alguns traços desse regime

no sentido econômico, além de se preocupar com os direitos dos cidadãos.

Ressalta-se que esses traços foram fracos. As garantias de direitos ficaram apenas no plano

teórico, em função da constante luta entre conservadores e liberais. A liberdade de expressão

só era garantida quando usada em favor do imperador e seu governo.

A influência das ideias liberais é realmente evidente no plano econômico, pois a constituição

garantia a liberdade dos indivíduos e não dispunha sobre qualquer tipo de intervenção estatal

na ordem econômica, nas relações comerciais e liberdade de contratos.

No plano político - tendo em vista a figura do Poder Moderador - a constituição foi marcada

por um forte centralismo administrativo e político, e também por unitarismo e absolutismo. O

poder Moderador é a chave de toda a organização política, e foi o mecanismo encontrado para

assegurar a estabilidade do trono do imperador.

As liberdades públicas sofreram grande influência da Revolução Americana de 1776 e da

Revolução Francesa de 1789. Ela continha um relevante rol de direitos civis e políticos e

influenciou as declarações de direitos e garantias das constituições brasileiras seguintes.

Em resumo, a Constituição de 1824 não conseguiu garantir todo o corpo de direitos

idealizados pela doutrina liberal, por oposição de ideias entre conservadores e liberais.

Considerando os aspectos do liberalismo presentes na Constituição, pode-se concluir que o

ambiente liberal brasileiro influenciou o processo constituinte e produziu uma Carta liberal,

ainda que de seu próprio modo.

1.3.1. A Constituição Republicana de 1891

Em 1889 declarou-se o fim do Império e a proclamação da República no Brasil. Depois da

Assembleia Constituinte de 1890, a primeira constituição da República do Brasil foi

promulgada em 24 de fevereiro de 1891 e vigorou até 1930. Seu relator foi o senador Rui

Barbosa.

Ela sofreu grande influência da Constituição norte-americana de 1787, e esta por sua vez, foi

fortemente influenciada pelo liberalismo. Consagrou-se o sistema de governo presidencialista,

abandonou-se o unitarismo implementando o federalismo, e substituiu-se a monarquia pelo

governo republicano.

A nova constituição extinguiu privilégios de nascimento, foros de nobreza e ordens

honoríficas. Garantiu a igualdade de todos perante a lei (artigo 72, § 2º), direito de

propriedade, liberdade de associação e expressão, baniu a pena de morte e a de banimento, e

estabeleceu a prevalência de proteção às liberdades privadas, civis e políticas. Além disso,

instituiu-se pela primeira vez a garantia constitucional do habeas corpus.

No campo econômico, manteve-se as ideias do liberalismo. O Estado não intervia no

mercado, nas relações comerciais, industriais, financeiras ou quaisquer relações privadas. Ele

apenas garantia direitos e conferia liberdade às relações.

No que diz respeito à organização dos poderes, o artigo 15 extinguiu o Poder Moderador e

instaurou a estrutura de poder tripartite, estabelecendo: "São órgãos da soberania nacional o

Poder Legislativo, o Executivo e o Judiciário, harmônicos e independentes entre si".

2. ESTADO SOCIAL DE DIREITO

(Desenvolvido por César, Gabriela, Matheus e Mércia)

2.1. OS PARADIGMAS DO ESTADO SOCIAL DE DIREITO

Com a Segunda Revolução Industrial e a decorrente industrialização e urbanização da

sociedade européia e americana, o paradigma do Estado Liberal de Direito entrou em crise. O

Estado Liberal foi teorizado e consolidado em um contexto completamente diverso da

segunda metade do século XIX: a economia era fundamentalmente baseada em manufaturas,

as cidades não passavam por problemas de urbanização e não havia preocupação com a

questão da marginalização decorrente da concentração exacerbada de renda entre burgueses e

proletariados. Desse modo, o Estado Liberal, que era marcado pela ideia de limitação do

poder e garantia de liberdade individual, entra em crise e começa a ser severamente criticado.

Surgem novas propostas e ideias de organização estatal. São as teorias socialistas, mais

voltadas às questões sociais, que se tornam as principais correntes teóricas críticas do

paradigma liberal. Já nos primórdios do século XX, o novo paradigma, cunhado de

constitucional social, se consolida em substituição do Estado Liberal de Direito.

O paradigma do Constitucionalismo Social se caracteriza pela busca de garantir a todos os

cidadãos o acesso a bens e direitos que não poderiam ser alcançados sem a interferência

estatal. Assim, amplia-se a ideia de igualdade e a atuação estatal (intervencionismo). Nessa

linha, o Estado passa a ter deveres não mais apenas negativos (de abstenção), mas também

positivos; em outras palavras, o Estado passa a ter que ser prestador de serviços, produtor e

fomentador. Outro fator do Estado Social de Direito é a maior participação popular no

exercício do poder, já que a base da cidadania nesse novo paradigma é “participar

efetivamente no exercício do poder político, ou da gestão dos negócios da cidade, por meio de

modalidades, procedimentos e técnicas diferentes”. (SOARES, Mário Lúcio Quintão, Teoria

do Estado, 2011, p.200)

Deve se deixar claro que o paradigma do Estado Social de Direito não se opões, nem nega o

paradigma anterior, o Estado Liberal de Direito. O que ocorre é um processo de mudança na

finalidade estatal. Assim, o objetivo do Estado não é mais apenas garantir liberdades

individuais e limitar poderes. Soma-se a isso a preocupação social que o Estado deve ter. Em

outras palavras, as garantias de liberdade individual e a limitação do poder não são negadas

no paradigma social, mas sim reafirmadas e acrescentadas à ideia de busca de igualdade social

(com a participação mais ativa do Estado através de prestação de serviços e garantia à toda

população o acesso a bens e direitos) e participação no poder pela sociedade como um todo.

Ao mesmo tempo em que o Estado Social de Direito se consolidava na Europa (Constituição

de Weimar – 1919) e na América (Constituição mexicana – 1917), a via mais radical das

teorias socializantes também ganhava espaço, especialmente com a Revolução Russa. Trata-

se da alternativa do socialismo marxista-leninista. Se comparada com essa via, a corrente

social-democrata do Estado Social é reformista, já que busca afirmar as reivindicações do

proletariado através do aparato jurídico, isto é, revigora-se o Estado de direito, e não o

substitui por um Estado Social (ditadura do proletariado). Portanto, o paradigma

constitucional social mantém o Estado de direito do período liberal, porém com mudanças

(por isso reformista): o cidadão deverá ter garantido pelo Estado direitos a bens e serviços que

não teria sem o intervencionismo estatal, além de ter maior participação política,

aprofundando o viés democrático. É exatamente nesse ponto que se encontra a diferença

fundamental entre o paradigma social-democrata reformista e o marxista-leninista

revolucionário. Concluindo, o que há no Estado Social de Direito é a constitucionalização da

cláusula social, e não uma revolução que derruba o Estado de direito para implementação do

Estado Social (ditadura do proletariado).

O Estado Social de Direito criou o Welfare State, um Estado intervencionista, administrador,

fomentador e fiscal. Manteve-se a estrutura econômica capitalista, apesar de a intervenção do

Estado na economia crescer, assim como a arrecadação de impostos, porque esta era a

principal fonte econômica do Estado para a prestação de serviços para a sociedade.

Concomitantemente a essa estrutura capitalista, havia as ideias socialistas de busca do bem-

estar social geral. Assim, a função do Estado Social de Direito na economia era crescê-la e

fortalecê-la para se atingir os fins sociais. Além disso, o Estado Social teve que conformar a

realidade de conflito social decorrente de uma nova estrutura urbana que surgiu, devendo ser

integrador ao buscar reduzir as desigualdades geradoras desses conflitos. Por isso, tal

paradigma consolidou um Estado administrador, em que a técnica se sobrepunha à ideologia,

e a administração, à política, pois se fazia necessário a interferência estatal para a diminuição

das desigualdades sociais.

Em resumo, o Welfare State era uma estrutura estatal que preservava o capitalismo como

estrutura política, com a propriedade privada e a livre iniciativa, apesar da intervenção estatal

na economia ser grande se comparada ao estágio liberal e ter crescido o número de empresas

estatais. Já no aspecto ideológico e social, buscava-se diminuir as desigualdades sociais,

geradoras dos conflitos de classes. Para isso, o Estado se colocava como prestador de serviços

e garantidor de direitos sociais. Por fim, pode-se dizer que há uma mudança teleológica: no

paradigma liberal, o fim do Estado era limitar poder e garantir as liberdades individuais; já no

paradigma social, tais fins liberais são mantidos, porém o principal objetivo do Estado passa a

ser o bem estar social.

Todo esse paradigma entrou em crise ao longo do século XX. Isso em decorrência do

agigantamento do Estado Social de Direito, pois era a administração pública quem garantia às

exigências de bem estar da sociedade. Para isso, obviamente, crescia o braço estatal, que

passava a não ser mais viável. Ou seja, uma crise econômica também levou à derrocada do

Welfere State, gerada pelo aumento cada vez maior das dívidas estatais, que eram feitas para

colocar em prática os serviços sociais, e da crescente demanda social, tendo que o Estado

atender a todas elas.

Com a crise dos países socialistas na segunda metade do século XX, as ideias socialistas se

mostraram fadadas à crise. Isto é, tanto a via social democrata, como a via marxista-leninista

não conseguiram ter resultados satisfatórios para a sua manutenção, ainda que os motivos que

levaram à derrocada de cada uma dessas vias socialistas fossem diferentes.

2.1.1. Fundamentos sociológicos

Para o professor Elias Díaz, o Estado social de Direito é uma realidade surgida após a

Primeira Guerra Mundial que se caracteriza pela institucionalização jurídica-política da

democracia social e do capitalismo maduro e permite compatibilizar o neocapitalismo com o

estado intervencionista produtor de bens de uso e serviços. Com essa breve introdução

também é necessário a alusão ao apanhado histórico para se entender este tema.

O progresso da indústria trouxe consigo grandes transformações na organização social. As

massas transferiram-se, gradualmente, do campo para os centros urbanos. Com péssimas

condições de trabalho floresceu a consciência de classe, com a formação de um proletariado

cada vez mais organizado e forte, a ganhar experiência política. Assim, a burguesia viu-se

obrigada a ceder mais um passo, fazer mais uma concessão com o aumento das reivindicações

trabalhistas. Considerando essas afirmações históricas pode-se de fato entender essa ordem

político-social.

Para Antônia Carlos Wolkmer, os principais fatores sociológicos que implicaram na

construção do Estado social de Direito foram as grandes modificações socioeconômicas

ocorridas na Europa no fim do século XIX e início do século XX. Podem-se considerar como

as principais modificações: amplitude dos conflitos sociais e ao conseqüente alargamento da

„questão social‟, isto é, o crescimento de reivindicações das massas urbanas trabalhadoras,

associadas, a contribuição da Igreja Católica na afirmação de uma doutrina de justiça social;

os novos rumos do desenvolvimento do capitalismo industrial e financeiro; os efeitos da

Grande Guerra de 1914-18 e o decisivo impacto ideológico da Revolução Russa de 1917.1

A importância da classe burguesa também deve ser considerada, utilizando o direito como

mediador para iniciar e consolidar uma grande revolução política que se iniciou desde o fim

da Idade Moderna. No primeiro momento, se valeu do direito natural paraderrubar o

absolutismo. No segundo momento, através do direito positivo, consagrou o dito chamado

Estado de Direito, com seus Códigos e Constituições, que estruturam uma nova organização

política dos Estados.

Dessa maneira, tem-se a especificação desse tipo de Estado, que criou-se a partir de

importantes acontecimentos históricos que representaram mudanças na sociedade nos mais

variados aspectos: jurídico, axiológico, social e político.

2.1.2. Fundamentos axiológicos

O Estado social de Direito baseia-se na priorização da garantia de uma real liberdade,

fundamentada na ideia de igualdade.

Torna-se necessário a diferenciação entre igualdade contemporânea e igualdade clássica.

Segundo Joaquim Carlos Salgado desde os tempos antigos existia a ideia de justiça, mas foi a

modernidade que acrescentou a ideia de liberdade. Hegel acrescenta mais um valor a ideia de

justiça, o valor trabalho que é libertador.

O século XIX é marcado pelo o advento de novas concepções quase sempre igualitárias. As

quais já faziam parte de alguma maneira do Estado liberal. Para João Mangabeira a questão

era ir além do Estado liberal e da igualdade formal.

Assim formam-se os ideais socialistas, sustentados em criticas ao Estado liberal. Criticas de

reprovação referente ao lado social do homem e seus problemas, a satisfação de soluções

formais, com liberdades formais e igualdades formais e ao capitalismo e a burguesia.

1WOLKMER, Antônio Carlos. Para um Paradigma do Constitucionalismo Ocidental. Revista

Brasileira de Estudos Políticos, Belo Horizonte, Universidade Federal de Minas Gerais, n. 62,

1986, p. 47

O socialismo trouxe uma nova ética fundada na igualdade e na dimensão social dos homens.

Apesar disso o movimento socialista também é plural e multifacetado como o próprio

liberalismo. Depois de Marx e Engels é comum à distinção entre o socialismo cientifico e

dialético do utópico, todos aqueles não marxistas. O marxismo corresponde a diversas

concepções como o materialismo histórico, a luta de classes, a teoria das crises econômicas, a

teoria do valor trabalho.

Através das pressões sociais e ideológicas do marxismo o Estado liberal transformou-se,

dando lugar ao Estado social. Deve-se ao Estado social não apenas os ideais marxistas, mas

também o movimento social-democrata que teve um papel importante na evolução em sentido

social dos direitos fundamentais.

Desse modo o Estado social seria herdeiro do socialismo, mas também do liberalismo e da

democracia. Sendo assim uma conquista politica do socialismo democrático.

O Estado social ainda teve a contribuição das ideias norte-americanas, com a declaração das

quatro liberdades: liberdade de expressão, liberdade de culto, liberdade de viver sem medo e a

liberdade de viver sem passar necessidades, proclamas pelo presidente Roosevelt.

Assim o Estado social representa à emancipação do proletariado, buscando a instauração de

uma democracia real,defendendo a igualdade dos homens e criando condições de liberdade.

2.1.3. Fundamentos jurídicos

O Estado Social pertence à segunda fase do Direito Moderno. Seu tema principal, segundo

Miguel Reale, é a “socialização do Direito”. Dentre as várias características dele pode-se

destacar que: emerge o Estado intervencionista, no qual existe um sentido ético em relação a

essa intervenção; o Estado nega a concentração do poder, então o divide em poderes e se

submete a uma regulamentação escrita e há a hipertrofia do poder executivo.

Surge a “teoria do ordenamento jurídico”, com Santi Romano, na qual estabelece o

fortalecimento estatal. Emerge assim um Estado cada vez mais intervencionista, mas que se

justifica, em parte, por visar proteger o mais fraco frente aos graves males do mercado. A

intervenção, portanto, possui um sentido ético na vida privada. No entanto, nem toda

intervenção estatal pode ter sido considerada ética, devido ao fato de muitas vezes ela

abranger campos que não lhe cabia intervir por não se tratar de proteger o mais fraco.

Mesmo com essa grande intervenção, não se pode confundir Estado Social, com Estado

Socialista ou com Estado autoritário. Isso seria errado, pois mesmo que tenham pontos em

comum, como o fortalecimento das formações estatais e a grande atenção dada ao trabalho e

aos trabalhadores, o Estado Social mantém eleição, partidos e livre opinião.

Além de o primeiro reestruturar o capitalismo com influências do socialismo e não estatizar

os meios de produção, ele não busca que todos vivam no mesmo patamar, mas que todos

vivam com, pelo menos, o mínimo de dignidade humana, coisas nas quais o Estado socialista

faz diferente.

Nesse Estado há a hipertrofia do poder Executivo, o que acarreta na crise do conceito de

separação dos poderes e também na crise da noção de Estado de Direito. Gera uma crise, pois

muitas vezes os poder executivo, nesse Estado, cria leis, ou seja, tira a competência do poder

legislativo e faz com que haja uma crise de legitimidade. Pode-se ver crise de legitimidade no

ramo da economia, no ramo da política e no ramo jurídico.

2.1.4. O constitucionalismo social

O marco inicial do Constitucionalismo social foi a Constituição da República de Weimar, que

aconteceu pós Primeira Guerra Mundial. Ela serve como um divisor de águas, pois as

constituições a partir daí não servem mais somente como declarações formais de direitos e

mecanismos de limitação do poder. Nessa época é inserido nas constituições sociais o

intervencionismo, que fortalece cada vez mais o Estado. Dessa forma, ele é autorizado a

intervir na esfera socioeconômica, ou seja, a Constituição passa a abranger o conjunto da vida

social. Assim, há uma ampliação do seu conteúdo e ela passa a estender as normas jurídicas

não somente a todo mecanismo jurídico, mas também para as relações sociais e econômicas.

Autores de grande renome discutiram sobre o conceito e a abrangência da Constituição. Pode-

se citar Hans Kelsen, que lhe dá um sentido jurídico-formal, Carl Schmitt, que é a favor de

um conceito político de constituição, dentre outros autores.

Esse constitucionalismo social produz um novo campo de enfoque: o da Teoria da

Constituição. Entre muitas divergências no campo da Teoria do Estado, surge um ponto em

comum entre os autores Carl Schmitt, Rudolf Smend e Loewenstein, que são considerados os

fundadores da Teoria da Constituição: todos eles possuem uma posição epistemológica acerca

dos estudos de Teoria da Constituição. Eles possuem fortes inclinações sociológicas sobre o

tema.

No entanto, Hans Kelsen discorda dessa visão sociológica. Para ele, o Estado nada mais é que

o sistema jurídico a ele pertinente e a Constituição, na qual é a norma que regula a produção

de outras normas. Se for constituir uma disciplina (Teoria da Constituição) será meramente

normativa, pura de fatos e valores e não sociológica como pregam outros autores. Mesmo

sendo considerada ultrapassada essa visão atualmente, o ponto de vista de Kelsen contribuiu

na configuração do constitucionalismo social, pois é visto como um divisor de águas.

A principal diferença entre os pontos de vista Schmittiano eKelseniano, é que o primeiro parte

da premissa de que a Constituição é uma decisão conjunta de um povo e é válida quando parte

de um poder constituinte. Já o segundo, determina que tudo é previsível e calculável, pois a

decisão consiste no elemento fundamental da ordem jurídica.

Há uma terceira concepção da definição de constituição, defendida por Hermann Heller, na

qual é bem aceita atualmente. Ele insere os pontos de vista de Kelsen e Schmitt para formar o

seu. Ele considera a constituição como uma realidade social, presente em toda sociedade

política e que possui três dimensões: a constituição não normada, mas que se encontra

normatizada; a constituição normadaextrajuridicamente, que possui normas sociais de

costume, mora, religião e também princípios éticos; e a constituição normada juridicamente.

Ou seja, é o conjunto da normalidade e da normatividade. É um conceito no qual a dualidade

está inserida.

Com essa nova visão, há o estudo dos sentidos formal e material da Constituição, da própria

efetividade constitucional e da meditação em torno da teoria do poder constituinte. Dessa

forma, ocorre a passagem do Constitucionalismo político para o Constitucionalismo social.

As constituições que surgem após a Primeira Guerra Mundial têm novas exigências, ou seja,

não se limitam apenas com a estrutura política do Estado, mas abrangem também o direito e o

dever do Estado em reconhecer e garantir a nova estrutura exigida pela sociedade.

2.1.5. A Segunda Geração de Direitos Fundamentais

Nesse contexto do Constitucionalismo Social, firmou-se a chamada segunda geração de

direitos fundamentais. São os direitos sociais, culturais, econômicos e da coletividade de um

modo geral. Os direitos de segunda geração foram consequência das lutas sociais ao longo do

século XIX, bem como da propagação de ideais antiliberais e da busca constante do princípio

da igualdade.

As críticas aos direitos liberais ou de primeira geração se concentram ao excessivo

formalismo da lei: em busca de segurança jurídica e legalidade, primou-se em demasia à

forma da lei, deixando de lado o conteúdo dela, sua matéria. Além disso, os direitos de

primeira geração garantiam liberdade apenas ao indivíduo isolado, não o considerando como

um partícipe de um meio social. Por fim, a não preocupação com a igualdade entre os

indivíduos nos direitos do Estado Liberal, já que o escopo principal desse período era apenas

limitar o poder e garantir liberdades individuais. Desse modo, os direitos de segunda geração

surgem para acrescentar aos feitos da geração primeira, direitos que visem à igualdade e a

justiça social de modo geral.

Assim, o titular dos direitos de segunda geração são os indivíduos considerados em um meio

social concreto, tendo o direito de se igualar, ao menos em oportunidades, a todos os demais

cidadãos. Em busca de justiça social, valoriza-se o trabalhador através de leis trabalhistas.

Caracterizando ainda esse estágio, os direitos de segunda geração garantem também o acesso

à saúde e à educação a todos os indivíduos. Outras áreas complementares desses direitos são a

previdência social, a cultura, lazer e transporte, sendo que todas elas são garantidas pelo

paradigma do Estado Social de Direito.

Outro fator louvável dos direitos de segunda geração foi a ampliação das liberdades políticas.

Um exemplo básico disso é a extensão de voto às mulheres. Sem dúvidas, com o advento do

constitucionalismo social a participação política popular aumentou de modo geral.

As críticas a essa geração se concentram basicamente ao fato de as liberdades individuais

terem sofrido certa limitação e enfraquecimento, em alguns países que o governo teve um

caráter socializante mais acentuado, apesar de terem tido melhoras consideráveis nas áreas de

saúde, trabalho e educação. Deve se deixar claro, contudo, que o paradigma do Estado Social

de Direito não veio se contrapor ou negar o paradigma anterior do Estado Liberal de Direito.

Na verdade, o constitucionalismo social buscava conciliar as liberdades individuais e a

limitação do poder garantidas no período anterior com ideias de justiça social e igualdade.

Essas críticas feitas à segunda geração de direitos são aos locais que não conseguiram

conciliar as duas gerações, isto é, a países que enfatizaram demasiadamente a questão social,

colocando em cheque as liberdades individuais.

2.2. AS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS DE CARÁTER SOCIAL

No Brasil, as Constituições que tiveram caráter social foram duas ao longo de toda sua

história.

A primeira delas foi a Constituição de 1934, inspirada na de Weimar, de 1919. A Carta

brasileira de 1934 tem como elementos sociais a consagração do sufrágio feminino, a criação

da Justiça do Trabalho e a definição dos direitos constitucionais do trabalhador. Consagrou-se

assim um Estado empreendedor e de intervenção econômica através de serviços sociais, tendo

o Estado a missão de assegurar saúde, educação, liberdade, democracia e nacionalização das

fontes da vida econômica e financeira.

A segunda Constituição brasileira de caráter social-democrata foi a de 1946. A cláusula social

foi ampliada nessa nova Carta, aumentando a garantia de direitos fundamentais. As inovações

pontuais dessa Constituição que destacam seu caráter social são o reconhecimento ao direito

de greve, a incorporação da Justiça do Trabalho ao Poder Judiciário e a repressão ao abuso do

poder econômico.

3. ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO

(Desenvolvido por Aline Mythsuê, Ana Tereza e Melissa)

3.1. HISTÓRICO

Após a segunda guerra mundial alastra-se no mundo um sentimento de desesperança e medo

resultado das catástrofes que traumatizaram a população. O mundo é movido pelo complexo

industrial-militar, a indústria bélica está em pleno desenvolvimento. Tem-se o fim da 2º

guerra mundial e se dá inicio a Guerra Fria, um conflito ideológico (capitalismo x socialismo)

entre duas potências (EUA e URSS) que refletiu em uma tensão mundial. Em 1989, com a

que do Muro de Berlim, coloca-se fim na bipolaridade que cerca o mundo e os regimes

opressores deixam de encontrar legitimidade para se manterem, o socialismo é dado por

vencido. A partir de então se inicia a era globalizada com a supremacia capitalista. Nascem

empresas multinacionais que consomem os recursos naturais e poluem o ambiente sem limite.

A transnacionalização dos mercados pressionou a política para que ela tomasse uma nova

forma de organização que ultrapassa a ideia de soberania do Estado, o sistema político

também deveria se adaptar a globalização. A presença do Estado na economia é vista com

horror e então se busca diminuir a intervenção dele nas relações comerciais através da

privatização e da desregulamentação, transferindo para o setor privado as atividades que

podem ser controladas pelo mercado. Cada vez mais se mostra necessário fazer uma reforma

política para que o Estado se enquadre na nova realidade econômica e social globalizada e

dinâmica.

A falta de crença na figura do Estado faz com que o Direito e o ordenamento jurídico também

percam a sua credibilidade. Por isso é preciso reformular a estrutura do direito positivado para

que ele seja suscetível a pressões democráticas, fazendo com que as normas jurídicas sejam

mais flexíveis.O novo Estado de Direito possui como valor central a Fraternidade, ou seja, o

reconhecimento do outro como semelhante, o que exige a universalização desse Estado.

Compreende-se que toda a humanidade deve ser permeada pela dignidade, não é possível que

se feche os olhos para à exclusão social ou ao desemprego. A globalização faz com que o

aumente a responsabilidade do Estado, pois eles não podem deixar de salvaguardar o que é

próprio e peculiar a cada Nação. Vê-se então que é necessário fazer uma redefinição dos

conceitos e princípios jurídicos que são pertinentes à soberania estatal, e à consecução das

liberdades de circulação de pessoas, bens, mercadorias e serviços.

Para uma adaptação desse novo modelo de Estado que surge, o Constitucionalismo

Democrático começa a buscar uma estruturação. Os princípios constitucionais são normas

selecionadas como fundamentos para a instituição da norma jurídica e por isso são critérios de

integração do modelo constitucional, e se mostram como a melhor opção de limitação do

poder, respeito aos direitos e promoção do progresso. E dentro do Estado Democrático o

constitucionalismo deverá ter como tema os direitos fundamentais.

Os direitos fundamentais que adentram o Estado de Direito são tidos como direitos de terceira

geração. Com a Declaração de 1948, os direitos passam a ser tidos de forma universal e

positiva, ou seja, os destinatários destes direitos são todos os homens e também os direitos

deverão ser efetivamente protegidos até mesmo contra o próprio Estado que os tenha violado.

Os titulares desses direitos não podem ser determinados de forma clara, eles são grupos

humanos, como a família, coletividades regionais, o povo e a própria humanidade. Esses

novos direitos veem para ampliar o corpus dos direitos humanos já conhecidos, surgindo, por

exemplo, os direitos ambientais, do consumidor e da criança.

Desse modo, o Estado de Democrático de Direito surge em decorrência de transformações na

forma de organização social. E tem como principal marcação a fraternidade que exige a

universalização, ou seja, é preciso abarcar a todos, fazer o outro que é estranho também ser

inserido no grupo social de modo a que todos tenham seus direitos garantidos. Não é possível

ignorar a existência da exclusão social, do desemprego, pois nessa forma de Estado é

necessário que a dignidade humana permeie toda a humanidade. A realização plena do Estado

de Direito e da pessoa humana é então nomeada de Estado Democrático de Direito.

3.2. PARADIGMAS CONSTITUCIONAIS

O Estado democrático de Direito estabelece novos paradigmas constitucionais, que surgem

em meio à degeneração dos paradigmas clássicos, o Estado Liberal e o Estado Social. Aquele

se apresenta como uma fusão do que deu certo nessas estruturas predecessoras, mas inova,

especialmente, no sentido de ampliar o alcance dos direitos fundamentais.

O Estado democrático surge no cenário do segundo pós-guerra, e se consolida como conceito

em meados da década de 60. Dessa forma, os paradigmas que o acompanham refletem a

tentativa de instaurar uma nova ordem formal que intente sanar os desvios e incongruências

observados nas formas anteriores de Estado de Direito, a liberal e a social. Desse modo, pode-

se questionar o por quê da escolha do termo “democrático” para caracterizar esse novo

momento, uma vez que todos os Estado de Direito já são implicitamente entendidos como

democráticos. A explicação surge do estabelecimento do primeiro paradigma desse último

Estado, o princípio da fraternidade.

A fraternidade surge no Estado democrático de Direito como inovação do entendimento de

democracia, como havia sendo exercida. Princípio advindo da Revolução Francesa, que

coincide com a formação do Estado de Direito, e que ainda não havia sido devidamente

desenvolvido nos estágios Liberal e Social – que se ocuparam, primordialmente, da Liberdade

e da Igualdade, respectivamente – a Fraternidade se tornará o núcleo do Estado democrático,

no sentido de conceber uma democracia fraternalmente universalizante. Desse modo, a

democracia que vinha sendo exercida é ressignificada, com o intuito de promover a aceitação

do outro como algo diferente, mas profundamente identificado com a realidade pessoal e

própria de cada um, ou seja, ganham forças as ideias de direitos fundamentais inalienáveis, de

dignidade humana, e de defesa da participação das minorias no cenário político decisório.

Ainda pensando no desenvolvimento dos princípios revolucionários de 1789, percebe-se que,

no Estado democrático de Direito, a liberdade e a igualdade já são considerados princípios

sociais básicos. E ainda, essa nova forma de Estado estabelece a fusão das autonomias

privada e pública, que no momento Liberal e no Social eram tratados com desigualdade de

prioridade. Aqui se faz necessária, uma melhor explicação para se compreender o segundo

paradigma em destaque, o princípio procedimentalista.

No Estado Liberal, a autonomia privada era formalmente garantida, e se estabelecia como

suficiente para impedir as ingerências estatais e para assegurar a isonomia entre os cidadãos;

entretanto, essa centralização na esfera privada de realização de direitos desconsiderava as

desigualdades econômicas e sociais. Para corrigir esse aspecto, o Estado Social se apresenta

com o intuito de garantir a isonomia dos cidadãos por meio da equiparação material deles,

centralizando-se assim a autonomia pública, ou seja, há um aumento do poder político do

Estado com fim de melhor controle das relações de direito; entretanto, esse modelo decorre

em uma democracia formal quase que exclusivamente representativa. Frente a esses reveses

práticos, o Estado democrático discursa por uma união dessas autonomias, de modo que os

cidadãos compreendendo sua autonomia pública possam delimitar o campo de ação de sua

autonomia privada, qualificando-se assim para exercer direitos, como pessoas privadas, no

cenário social. Desse modo, os cidadãos adquirem a capacidade de construírem o Direito por

meio de seu papel de membro da sociedade civil (ente privado) em exercício na esfera

pública. Essa participação ao gerar um sentido de autoorganização política da comunidade (os

próprios sujeitos de direito são capazes de influenciar na legislação e nas decisões) é o

paradigma procedimentalista.

Nessa perspectiva de o próprio cidadão ter capacidade de conhecer seus problemas e criar

soluções pertinentes a eles, outro paradigma se apresenta: o neoconstitucionalismo. Isso

porque, a efetuação da fusão entre as autonomias privada e pública depende essencialmente

do intermédio do Direito, e, mais especificamente, das garantias fundamentais constitucionais.

Dessa forma, a Constituição no Estado democrático de Direito se torna suprema, suas normas

e princípios adquirem força normativa, podendo-se falar inclusive em “norma das normas” e

“primazia dos princípios”. Nesse novo Estado, a Constituição pretende-se irradiadora das

diretrizes ideológicas e práticas de todo o Direito, levando-se à busca da efetividade

constitucional e da unidade garantidora dos direitos fundamentais básicos.

Ainda pensando em Constituição, percebe-se o paradigma do princípio da

constitucionalidade, que se relaciona não só com o neoconstitucionalismo, como também

com a reserva constitucional. Nesse sentido, pode-se pontuar, também, que houve grande

avanço no Estado democrático dos mecanismos de controle constitucional.

Relacionado a essa explicação também, diz-se que há os paradigmas do princípio da

legalidade da administração, do princípio da segurança jurídica, do princípio da proteção

jurídica e das garantias processuais e do princípio de garantia de acesso ao judiciário.

Todos esses paradigmas estão ligados à supremacia da lei e ao Direito como garantidor das

demandas básicas do ser humano em comunidade e como limitador das arbitrariedades de

poder, seja estatal ou privado.

O princípio da legalidade da administração é o cerne da teoria do estado de Direito,

designando a prevalência da lei e a reserva de lei (as condutas proibidas, permitidas e

obrigatórias devem ser matéria de lei, e ninguém está obrigado a fazer algo que não esteja

previamente designado em um texto legal; além disso, há previsões constitucionais de como

as leis formais devem ser feitas, ou seja, há um procedimento específico e obrigatório para a

criação de textos legais, constitucionalmente definido). Já o princípio da segurança jurídica é

uma demanda que surge da necessidade de confiança dos cidadãos, que são levados a crer em

nome desse paradigma que há um processo de racionalização da estrutura estatal-

constitucional, eliminado as possibilidades de arbitrariedades de poder no âmbito político e de

Direito. Ainda, o princípio da proteção jurídica e das garantias processuais refere-se ao

direito ao devido processo legal, além de delimitar a proteção jurídica individual sem lacunas

e de estabelecer garantias de procedimento e processo, como garantias do processo judicial,

de processo penal e de procedimento administrativo, assim como independência de tribunais e

vinculação do juiz à lei. E o princípio de garantia de acesso ao judiciário concatena o pleno

direito de defesa ao cidadão, contribuindo também em complementaridade ao princípio

procedimentalista.

O Estado democrático de Direito tem como paradigma, ademais, o princípio da divisão de

poderes. Nesse sentido, há um esforço para que os poderes sejam bem definidos e para que

exista uma distribuição de competências, entretanto também se percebe hoje uma tendência

para haja uma ordenação controlante-cooperante entre os poderes.

Por fim, apresenta-se o paradigma do sistema de direitos fundamentais, que é considerado o

tema central do Estado democrático de Direito. Os direitos fundamentais estão presentes, de

uma forma ou de outra, nos objetivos ou fundamentações de todos os outros paradigmas desse

Estado. Na verdade, o texto constitucional no Estado democrático tornou-se uma espécie de

catálogo de direitos humanos, e além de regulamentá-los a Constituição também traça e exige

medidas de implementação desses direitos. No Estado democrático surgem os direitos

humanos de terceira geração, que tem como titular não o indivíduo em sua singularidade, mas

sim grupos humanos (família, povo, nação, coletividades regionais e étnicas), ou seja, são

direitos de titularidade coletiva. Dentre esses direitos se destacam o direito ao meio ambiente,

o direito à paz, o direito à autodeterminação dos povos, direito à qualidade de vida, direito do

consumidor, direito ao desenvolvimento, ou seja, direitos difusos, mas que muito promovem

mudanças no horizonte do Direito e do Estado. É por isso, que o Estado democrático de

Direito é celebrizado por aumentar o alcance dos direitos fundamentais, estabelecendo que a

violação desses direitos é causada pelas desigualdades sociais, demandando mudanças de

ordem política, social e econômica, adotando, par isso, uma postura muito mais

procedimentalista, do que liberal ou assistencialista.

Por fim, destaca-se o paradigma do internacionalismo, que decorre de um processo de

constitucionalização do direito internacional e de internacionalização do direito

constitucional. Esse paradigma estabelece a recepção das resoluções de tratados e convenções

internacionais na Constituição e no ordenamento jurídico em geral. Essa característica

corrobora com o princípio da fraternidade de reconhecimento do outro e com o sistema de

direitos humanos, que pretende-se universalizante e inalienável a todos os homens.

3.3. A CONSTITUIÇÃO DEMOCRÁTICA DE 1988

A Constituição Federal de 1988 foi um marco na reformulação do Estado, rumo a

consolidação de um Estado Democrático de Direito. A nova ordem constitucional já consagra

em seu artigo 1º princípios fundamentais como soberania, cidadania, dignidade à pessoa

humana, valores sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo político. Além disso, a

Carta Magna de 1988 mantém como pressuposto fundamental, o respeito aos direitos e

garantias individuais, garantindo, em seu art. 5º, aos brasileiros e aos estrangeiros residentes

no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à

propriedade, um mister mínimo de direitos assegurados aos que aqui se encontrem.

Como o Estado Democrático de Direito, está calcado nos referidos princípios, em objetivos, e

em direitos e garantias individuais inerentes à pessoa humana, percebe-se que a Constituição

Brasileira foi formulada em prol de consolidar tal Estado Democrático de Direito.

Além disso,a Constituição também garante, a Dignidade Humana, através de uma sociedade

justa e solidária, prevalecendo os Direitos Humanos. Nesse aspecto, percebe-se que o Estado

Democrático de Direito instaurado na Democracia Brasileira com a tal Constituição Federal

de 1988 se consubstancia em Estado de Direito e de Justiça Social e, por conseguinte, as

diretrizes constitucionais permitem aos cidadãos o exercício do direito humano fundamental

de participação política, através dos mecanismos da democracia representativa e participativa,

para que cada cidadão possa atuar, de forma permanente, em fiscalizar e exigir que a atuação

dos Poderes Públicos esteja em consonância com os objetivos fundamentais da República

Federativa do Brasil.

O exercício da cidadania em prol de políticas públicas sociais para consecução de uma

sociedade livre, justa e solidária se funda no fato de que o Estado Democrático de Direito

Brasileiro se vincula ao paradigma contemporâneo de democracia de três vértices (democracia

procedimentalista, democracia substancialista ou material, democracia fraternal), na qual os

conceitos de humanismo e democracia garantem que o cidadão possa requerer a atuação da

Jurisdição Constitucional para impor aos Poderes Públicos a plena observância e o

cumprimento dos ditames do princípio da Justiça Social com a concretização de Políticas

Públicas Sociais que propiciem aos indivíduos o acesso aos direitos humanos sociais que

permitem a materialização das condições mínimas de existência condizentes com a dignidade

da pessoa humana.

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