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  • AULA 1 POLTICA EDUCACIONAL

    Esperamos que, ao final desta aula, voc seja capaz de:

    refletir sobre a funo social da educao;

    discutir sobre questes sociais, polticas, culturais e econmicas que interferem e determinam as polticas educacionais vigentes.

    Para o melhor acompanhamento dos contedos trabalhados nesta aula, voc deve realizar a leitura de textos que tratem sobre a importncia social da educao, bem como ficar atento s notcias veiculadas na mdia sobre a educao brasileira.

    A sociedade brasileira possui uma grande expectativa de que a educao se concretize como principal instrumento contra a desigualdade social no pas, contribuindo para a construo da cidadania, no como meta a ser atingida no futuro, mas como prtica efetiva e imediata.

    No entanto, longe de negar a fundamentalidade da educao geral para o contexto econmico e social contemporneo, h o risco de superestimar as contribuies da educao geral formal para o processo de modernizao da produo e do pas, como se tais mudanas dependessem, essencial-mente, da educao. Da a importncia de refletir sobre as reais contribui-es da educao para a transformao social. preciso ter claro, portanto, que a educao deve ser vista como integrante de um conjunto de polticas pblicas e sociais.

    A educao enquanto poltica pblica

    Aula 11

  • 1.1 Compreendendo o significado de poltica pblica

    A palavra poltica deriva de polis (politiks) e est relacionada cidade, ao que urbano, civil, pblico e social. Aristteles, por meio de sua obra intitulada Poltica, acabou por disseminar essa expresso.

    Obra considerada como o primeiro tratado sobre a natureza, funes e diviso do Estado e sobre as vrias formas de governo com a signi-ficao mais comum de arte ou cincia do governo que significa uma reflexo sobre as coisas das cidades seja qual for as intenes mera-mente descritivas ou normativas (BOBBIO, 1991, p. 954).

    Para Aristteles (1993, p. 132), poltica a cincia que tem como objetivo fixar as normas gerais da ao que assegurem o bem dos cidados e, por fim, da cidade. Ou seja, a poltica utiliza, no desenvolvimento de suas aes, as demais cincias para preservar o bem dos homens.

    Pensando sobre o assuntoSaiba mais

    Na poca moderna, o termo poltica passou a ser entendido como cincia do Estado, doutrina do Estado, cincia poltica, filosofia poltica. Muitos tericos entendem poltica como uma atividade que se manifesta nas relaes entre os grandes grupos sociais, especificamente entre classes, naes e estados.

    No contexto social, a implementao de uma poltica pblica revela uma concepo de mundo e de sociedade. Portanto, a implementao e anlise de uma poltica pblica s pode ocorrer a partir de um projeto social, pois deve configu-rar-se como instrumento de regulao social, na busca da eqidade social.

    Eqidade refere-se ao reconhecimento de que pessoas e grupos em situa-es diferenciadas ou desfavorveis necessitam de ateno e apoio para que possam ter as mesmas condies sociais que seus semelhantes no processo de desenvolvimento (LCK, 2006).

    Na sociedade atual, as polticas pblicas, inclusive as educacionais, sofrem as interferncias e determinaes da globalizao, entendida como a submisso a uma racionalidade econmica fundamentada no mercado global competitivo e auto-regulvel, pois, mundialmente, ocorrem movimentos que trazem a tentativa de melhorar as economias de diferentes pases, por meio do fortalecimento dos laos entre os processos de escolarizao, trabalho, produtividade e mercado. Para Azevedo (2001, Prefcio),

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  • (...) so definidas, implementadas, reformuladas ou desativadas com base na memria da sociedade ou do Estado em que tm curso. Constroem-se, pois, a partir das representaes sociais que cada sociedade desenvolve a respeito de si prpria. Segundo esta tica, as polticas pblicas so aes que guardam intrnseca conexo com o universo cultural e simblico ou, melhor dizendo, com o sistema de significaes que prprio de uma determi-nada realidade social.

    Encontram-se a algumas das contradies que permeiam as polticas pblicas, pois, desde o surgimento do capitalismo como modo de produo, at o seu estgio na contemporaneidade, o ser humano passou a desenvolver uma relao dialtica com a sociedade capitalista. Isso acontece, segundo Santos (2005, p. 50),

    (...) a partir do momento em que tem sua vida interferida pelas imposies do capital ou que tenta atravs de suas aes trans-formar a realidade. Isto quer dizer, que nos dias atuais, o ser humano sofre, mais intensamente do que nunca, as determina-es do atual estgio deste modo de produo, incorporando-a ou refutando-a na contradio das relaes sociais, na trama das idias, em seus valores, nos comportamentos, a fora com que o poder do capitalismo se impe hoje.

    Nesse quadro, a educao passa a atuar como instrumento em prol da ao do Estado, pois a escola, enquanto instituio responsvel pela sociali-zao do saber, acaba impregnando as reflexes de seus alunos com normas, valores e atitudes socialmente aceitas. Portanto, entende-se que o direcio-namento de uma poltica pblica manifesta os interesses e ideologia de um governo, afinal, elas so elementos estruturais na regulamentao e organi-zao de cada sociedade.

    Nesse sentido, serve como manuteno, ou instalao, de uma concepo ou de uma ideologia.

    conjunto de proposies da sociedade burguesa, com o objetivo de aparentar que os interesses da classe dominante traduzem os interesses coletivos, manifestando uma hegemonia. A ideologia, portanto, torna-se instrumento de reproduo do status quo e da prpria sociedade,

    . , tambm,

    Saiba mais

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  • 1.2 A educao enquanto poltica

    Atualmente, no h no mundo pas que no garanta, em sua legislao, o acesso de seus cidados educao bsica, reconhecendo a educao escolar como elemento essencial para a cidadania.

    Vrios so os documentos de carter internacional, assinados por pases integrantes da Organizao das Naes Unidas, que reconhecem e garantem o direito dos cidados educao. Entre eles, destacam-se a Declarao Universal dos Direitos do Homem, de 1948, a Conveno Relativa Luta contra a Discriminao no Campo do Ensino, de 1960, e o Pacto Internacional dos Direitos Econmicos, Sociais e Culturais, de 1966. Mais recentemente, encontra-se o documento assinado na Conferncia Mundial de Educao para Todos, realizada em Jomtien, na Tailndia.

    A Conferncia teve a participao de 155 governos de diferentes pases e, como patrocinadores e financiadores, quatro organismos internacionais: a Organizao das Naes Unidas para a Educao (UNESCO); o Fundo das Naes Unidas para a Infncia (UNICEF); o Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento (PNUD); e o Banco Mundial (BID).

    Para que um direito social seja legalmente reconhecido preciso que esteja inscrito em lei de carter nacional.

    A legislao estabelece os direitos, os deveres, as proibies, as possibili-dades e os limites de atuao, enfim, regras. Tudo isso possui enorme impacto no cotidiano das pessoas, mesmo que nem sempre elas estejam conscientes de todas as suas implicaes e conseqncias. Bobbio (1992, p. 79-80) explica

    a existncia de um direito, seja em sentido forte ou fraco, implica sempre a existncia de um sistema normativo, onde por exis-tncia deve entender-se tanto o mero fator exterior de um direito histrico ou vigente quanto o reconhecimento de um conjunto de normas como guia da prpria ao. A figura do direito tem como correlato a figura da obrigao.

    Declarar um direito muito significativo, pois traduz o reconhecimento legal do mesmo como prioritrio para a execuo das polticas sociais.

    A declarao e a garantia de um direito tornam-se imprescindveis no caso de pases, como o Brasil, com forte tradio elitista. Disso resulta a cobrana da sociedade quando esse direito no respeitado.

    O Brasil, por exemplo, reconhece o Ensino Fundamental como um direito desde 1934 e o reconhece como direito pblico subjetivo desde 1988. Ele obrigatrio, gratuito e quem no teve acesso a essa etapa da escolaridade em idade prpria pode recorrer justia e exigir sua vaga. Em 1967, o Ensino Fundamental, antigo primrio, passou de quatro para oito anos obrigatrios.

    Neste sentido, qualquer cidado, jovem, adulto ou idoso tem esse direito e pode exigi-lo, a qualquer momento, perante as autoridades competentes.

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  • Assim, esse jogo entre direito e dever implica aos interessados, quando na falta desse atendimento, acionar a justia, a fim de fazer respeitar um direito legalmente protegido.

    A Constituio aciona a prpria sociedade civil como espao de controle democrtico do prprio Estado, a fim de que nenhum cidado fique sem o bene-fcio da educao escolar.

    O direito educao garante ao cidado tornar-se capaz de se apossar de padres cognitivos e formativos, por meio dos quais tem maiores possibilidades de participar dos destinos de sua sociedade e colaborar na sua transformao (SHIROMA, 2002).

    O direito educao uma oportunidade de crescimento do cidado, um caminho de opes diferenciadas e uma chave de crescente estima sobre si mesmo (BOBBIO, 1992).

    Tambm preciso considerar que o direito educao decorre de dimen-ses estruturais coexistentes na prpria consistncia do ser humano.

    A racionalidade o reconhecimento de si, que s se completa pelo conco-mitante reconhecimento igualitrio da alteridade. S com o desenvolvimento dessas capacidades que a ao do homem, com o outro e sobre as coisas, torna-se humana e criativa. Portanto, o pleno desenvolvimento da pessoa no poderia se realizar sem o desenvolvimento efetivo da capacidade cognitiva, uma marca registrada do homem.

    Pensando sobre o assunto

    Assim sendo, essa marca se torna universal. Ela a condensao de uma qualidade humana que no se cristaliza, j que implica a produo de novos espaos de conhecimento, de acordo com momentos histricos especficos. a que o direito educao passa a ser legalmente reconhecido e politicamente exigido (MONLEVADE, 2000).

    A efetivao do direito educao se converte em instrumento de reduo das desigualdades e das discriminaes e possibilitam uma aproximao pac-fica entre os povos de todo o mundo.

    A disseminao e a universalizao da educao escolar de qualidade, como um direito da cidadania, so os pressupostos de uma cidadania universal. A educao, com isso, sinaliza a possibilidade de uma sociedade mais igual e humana.

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  • A oferta de uma educao gratuita e de qualidade um direito social e constitucional do indivduo e de responsabilidade do Estado.

    Na atualidade, a poltica pblica manifesta, em muitas aes, as imposies da sociedade capitalista em que se vive, disseminando modelos de gesto empresarial por meio de estratgias e argumentos relacionados qualidade e produtividade.

    So aes que resultam na implementao de diretrizes centralizadoras sobre as diferentes entidades educacionais, principalmente as pblicas, ao mesmo tempo que passam a executar aes voltadas para a melhor eficcia do processo de ensino-aprendizagem. A implementao dessas estratgias tem como justificativa a melhoria do sistema educacional.

    As polticas pblicas decorrem da ao humana, afinal, so os dirigentes e polticos das diferentes esferas pblicas que conduzem a organizao e imple-mentao de uma poltica pblica. Elas so definidas a partir das representa-es que cada sociedade desenvolve e quando implementadas manifestam uma estreita relao e significao com a realidade social.

    ARISTTELES. Poltica. Madri: Alianza Editorial, 1993.

    AZEVEDO, Janete Maria Lins de. A educao como poltica pblica. 2. ed. Campinas: Autores Associados, 2001.

    BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992.

    ______; MATTEUCCI, N.; PASQUINO, G. Dicionrio de Poltica. Braslia: UNB, 1991.

    LCK, Helosa. Gesto participativa na escola. Petrpolis: Vozes, 2006.

    MONLEVADE, Joo. Quem manda dentro da escola? In.: MONLEVADE, Joo; SILVA, Maria Abadia. quem manda na educao no Brasil? Braslia: Idia, 2000.

    SANTOS, Josiane Gonalves. O compromisso social da escola organizada em ciclos: por uma verdadeira aprendizagem. Dissertao (Mestrado). Curitiba: Universidade Tuiuti do Paran, 2005.

    SHIROMA, Eneida Oto. Poltica educacional. 2. ed. Rio de Janeiro: DP & A, 2002.

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