ENTRE ÁGUAS: A UTILIZAÇÃO DO TELHADO TRADICIONAL NA
ARQUITETURA CONTEMPORÂNEA
Escritórios: Arquitetos Associados, BCMF Arquitetos, AUM Arquitetos e
MGS
Autoria: Luísa Medeiros dos Santos e Ana Elísia da Costa
INTRODUÇÃO
Neste estudo, são analisadas casas contemporâneas pavilhonares cobertas por telhados em uma ou duas águas. A
motivação desta análise nasce justamente da observação do emprego do “telhado” na arquitetura contemporânea,
contrapondo-se a um “senso comum”1 de que o telhado remete à tradição, e de que o vocabulário arquitetônico moderno
e contemporâneo é caracterizado apenas pelo emprego de novas tecnologias e de volumes puros.
Nesta perspectiva, é importante observar que o uso do telhado foi “marginalizado” por parte da arquitetura moderna
que, buscando promover inovações tecnológicas e a ruptura com as referências do passado, propunha o uso do terraço jardim e dos volumes puros lecorbusianos. No caso específico do Brasil, a princípio, esse discurso opunha-se também à
tradição colonial portuguesa que tinha o uso do telhado enraizado na cultura popular. Este fato pode justificar em parte
a atitude conciliatória do modernismo brasileiro, principalmente através da figura de Lucio Costa, que propunha a
hibridização do repertório formal moderno com elementos da tradição colonial e com o uso materiais locais, como a
madeira e a pedra. Processualmente, com os ideais nostálgicos da arquitetura pós-moderna dos anos 80 e 90, abriram-
se novos espaços para o resgate dos valores históricos e tradicionais e, consequentemente, para a reuso e/ou releitura
do telhado tradicional (LUCCAS, 2008).
Estes valores e posturas da arquitetura modernas e pós-moderna, também processualmente, podem explicar o caráter
híbrido da arquitetura contemporânea, a qual busca no “olhar sobre passado” extrair ensinamentos de experiências
precedentes, transcendendo os seus próprios limites. Montaner (2001) e Luccas (2008) concordam que a arquitetura
contemporânea passou a perseguir a união da essência moderna, reconhecendo inovações e resultados compatíveis
com a realidade atual, com a reinterpretação da tradição, baseando-se na análise de suas obras exemplares. Neste
sentido, Luccas afirma:
Hoje a arquitetura volta a compor algumas frases e até parágrafos inteiros articulados corretamente, porém às vezes o texto soa
como plágio, outras vezes apresenta estórias novas ou, pelo menos, novas versões de velhas e boas estórias. Como mais um legado, o período também estancou um pouco da sede pela novidade permanente, resultante daquele meio século modernista de busca incansável de ineditismo e superação. (LUCCAS, 2008, n.p.)
Do universo da pesquisa A Casa Contemporânea Brasileira, a qual analisa as residências dos 25 escritórios eleitos em
2010 pela revista AU como a nova geração da arquitetura brasileira, 11 escritórios2 apresentaram casas cobertas por
telhados de uma ou duas águas, dentre os quais 16 foram selecionadas para ilustrar esta análise (Tabela 1).
TABELA 1 – CASAS COM TELHADO NA ARQUITETURA RESIDENCIAL CONTEMPORÂNEA BRASILEIRA
1 Conhecimentos empíricos acumulados ao longo da vida e passados de geração em geração, admitidos pela maioria dos indivíduos. 2 Arquitetos Associados, AUM, BCMF, Bernardes e Jacobsen, Carla Juaçaba, DDG, MGS, Nitsche, O norte – oficina de criação, UNA e SIAA.
BARRA DO SHAY NITSCHE
São Sebastião, 2002
SÍTIO INES E RENZO BCMF ARQUITETOS Brumadinho, 2004
CASA ARACAJÚ AUM ARQUITETOS
Aracajú, 2005
CHÁCARA DO SOL DDG
Resende, 2010
1 ÁGUA ARRANJO TÉRREO
CASA JS DDG
Rio de Janeiro, 2007
CASA NO DERBY O NORTE - OFICINA DE CRIAÇÃO
Refice, 2008
CASA EM ALDEIA O NORTE - OFICINA DE CRIAÇÃO
Camaragibe, 2009
CASA ZM BERNARDES E JACOBSEN
Itacaré, 2005
CASA CA BERNARDES E JACOBSEN Bragança Paulista, 2009
BARRA DO UNA SIAA
São Sebastião, 2004
CASA EM TRANCOSO UNA ARQUITETOS
trancoso, 2005
CASA NA PRAIA PRETA NITSHCE
Praia Preta, 2006
CASA NO PEIXE GORDO ARQUITETOS ASSOCIADOS
Ceará, 2012
VALE DOS JATOBÁS MGS
Padre Bernardo, 2002
CASA VARANDA CARLA JUAÇABA
Rio de Janeiro, 2008
CASA PIRACAIA NITSCHE
Piracaia, 2012
1 ÁGUA E PLANTA EM NÍVEIS
1 ÁGUA ASSOCIADA À VOLUMES PUROS
2 ÁGUAS COM CUMEEIRA LONGITUDINAL ÚNICA
2 ÁGUAS COM CUMEEIRA LONGITUDINAL DESCONTÍNUA
2 ÁGUAS COM CUMEEIRA TRANSVERSAL
Tabela 1: Casas com telhado na arquitetura residencial contemporânea brasileira. Fonte: MEDEIROS DOS SANTOS, 2015; fotos disponíveis nos sites dos escritórios.
A partir da visão geral destas residências, observa-se um mosaico de soluções no arranjo das águas dos telhados em
relação às suas bases. Nestes casos, os telhados podem assumir uma expressão formal mais volumétrica, observado
principalmente nos telhados em 2 águas com cumeeira única, ou mais planar, recorrente nos telhados com 2 águas com
cumeeira decomposta e nos telhados com 1 água. Essa expressão formal ainda sofre variações através da
materialização do telhado em si, com o uso de “estrutura em madeira/telhas de barro” ou “estrutura metálica/ telhas leves”, o que condiciona a inclinação dos telhados, e com a exploração formal ou não dos seus componentes construtivos.
Neste universo, foram selecionadas duas casas para serem analisadas comparativamente, a Casa Aracajú (2005), do
escritório paulista AUM Arquitetos, e a casa no Peixe Gordo (2012), do escritório mineiro Arquitetos Associados. Apesar
de apresentarem 1 e 2 águas, respectivamente, ambas apresentam organização pavilhonar e têm a varanda como
elemento estruturador da composição.
Como premissas de estudo, questiona-se de que modo a aparência e materialidade do telhado tradicional se
compatibilizam com suas bases, tanto do ponto de vista bidimensional, observado através de suas plantas, como
tridimensional, observado na espacialidade dos ambientes.
IMPLANTAÇÃO E PARTIDO FORMAL
Em ambas casas estudadas, os terrenos - planos, de grandes dimensões e sem pressões de edifícios vizinhos - dão
liberdade para a implantação das residências que buscam a articulação dos volumes com a geometria do terreno, bem
como a exploração das melhores orientações solares e visuais. Na casa em Aracajú, o terreno em forma de retângulo regular possibilita a inserção do pavilhão da residência em uma porção quase centralizada do lote, configurando um pátio
secundário à oeste e um pátio principal à leste, o qual usufrui da melhor orientação solar para a locação do jardim e da
piscina. Ainda, um plano transversal e deslizante no terreno sugere a segmentação do pátio a leste, configurando uma
área mais social e outra íntima (figura 1a). Já na Peixe Gordo, com terreno de geometria irregular, a casa se insere
alinhada com a extremidade mais retilínea (sudeste), criando um espaço aberto de jardim junto às extremidades
irregulares (nordeste), para o qual a casa se volta (figura 1b).
A geometria dos terrenos e a escolha do local de implantação das residências tendem a sugerir a criação de um telhado
de duas águas na casa Aracajú, de maneira a harmonizar a relação com os pátios laterais do pavilhão, e de um telhado de uma só água na casa Peixe Gordo, explorando o fato de o pavilhão estar quase colado na divisa em um dos lados, a
fim de liberar o outro para o desenvolvimento do jardim, para onde a casa se volta. Porém, o que se concretiza é
justamente o contrário. Na Aracajú, o telhado assume a configuração de uma água que, juntamente com os muros transversais ao pavilhão, evidenciam a intenção de compor um arranjo planar. Essa característica é reforçada pelo
emprego de diferentes texturas nos planos: telhas de barro na cobertura; concreto nos planos transversais da
edificação; e pedra no plano que compartimenta os pátios. Porém, nas fachadas norte e sul, a utilização de ripados de
madeira próximos às extremidades dos beirais, contraditoriamente, confere uma expressão volumétrica à casa (figura
2a). Na Peixe Gordo, opta-se pela utilização de um telhado de duas águas, que somado ao sequenciamento rítmico das
Figura 1: Implantação das residências Aracajú (a) e Peixe Gordo (b). Fonte: (a) MEDEIROS DOS SANTOS, 2015. (b) COLOMBO, 2015.
(a) (b) LEGENDA
Volume
Limites do terreno
Varanda
Visuais
Vias N
N
tesouras, materializa virtualmente um volume triangular que se sobrepõe ao volume de base, cujo escavo gera as
varandas (figura 2b).
Se o tratamento formal expressa diferenças entre as casas, a descontinuidade e fluidez do arranjo espacial as aproxima.
Em ambos os casos, observa-se a “quebra” transversal da volumetria, configurando o isolamento da ala íntima e da ala
de serviços/social. Na Aracajú, essa ruptura ocorre através do estar e, na Peixe Gordo, do grande jantar. Ambos
ambientes são tratados como extensões naturais das varandas, que articula e organiza as composições, mesmo que a
sala da Aracajú seja fechada por planos envidraçados, o que a configura como uma espécie de “sala-varanda” (figuras
3a e 3b).
Figura 2: Volumetria das residências Aracajú (a) e Peixe Gordo (b). Fonte: (a) I. http://aumarquitetos.com.br/projeto/aracaju II e III. MEDEIROS DOS SANTOS, 2015.
(b) I. http://www.arquitetosassociados.arq.br/?projeto=casa-no-peixe-gordo II COLOMBO, 2015. e III. MEDEIROS DOS SANTOS, 2015.
(a)
(b)
A partir dessa sala-varanda, cuja largura define uma maior hierarquia espacial em relação ao conjunto, utiliza-se uma
grelha bilateral e uniforme. A sala-varanda da Aracajú mantém o padrão de proporcionalidade da grelha, valendo-se da
utilização de um módulo sem subdivisões e que cuja base se prolonga até as extremidades do terreno para afirmar a
importância do espaço central. Na Peixe Gordo, para consolidar esta mesma hierarquia, a sala-varanda insere o vazio
central em um módulo excepcional de maior dimensão (figura 4a e 4b).
ala social
ala serviços
ala íntima
“vazio” central
Figura 3: Zoneamento das residências Aracajú (a) e Peixe Gordo (b) em igual escala. Fonte: (a) MEDEIROS DOS SANTOS, 2015. (b) MEDEIROS DOS SANTOS, 2015.
LEGENDA:
(a)
(b)
Figura 4: Modulação das residências Aracajú (a) e Peixe Gordo (b) em igual escala. Fonte: (a) MEDEIROS DOS SANTOS, 2015. (b) MEDEIROS DOS SANTOS, 2015.
(a)
(b)
espaço central semiaberto LEGENDA:
ARRANJO FUNCIONAL
A varanda que, desde o período colonial foi muito utilizada na arquitetura tradicional brasileira, também é resgatada
nestes projetos, assumindo o papel de elemento de composição central. É ela que faz a transição entre exterior e interior,
bem como articula as alas entre si. A existência de varandas transversais e longitudinais ocorre em ambas casas,
contudo, desempenhando diferentes hierarquias em cada caso.
Na Aracajú, a varanda transversal se expande para além dos limites dos beirais, através de uma plataforma que
atravessa a edificação, percorrendo todo o terreno. Esta estratégia, típica das composições planares, consolida tênues
limites entre dentro-fora e proporciona uma biorientação à sala. Em contrapartida, suas varandas longitudinais são
apenas espaços de passagem, estes também com distintas hierarquias - um mais reservado, para a qual se abrem os
quartos, e outro com função de circulação espacializada periférica. Na Peixe Gordo, as varandas não extrapolam os
limites da cobertura. A varanda transversal é mais enclausurada que a da Aracajú, com ênfase em apenas uma
orientação. Já as dimensões da única varanda longitudinal sugerem ser este não só um espaço de circulação, mas
também um espaço de permanência, o qual cria uma conexão direta e permanente com o jardim.
Assim, a varanda transversal da Aracajú é que cumpre mais efetivamente o papel de elemento integrador dos espaços
internos e externos, o qual é desempenhado pela varanda longitudinal da Peixe Gordo. Nos dois casos, contudo, a varanda
“penetra” no interior das edificações não só através das salas-varandas abertas ou semiabertas, mas também através
do diálogo generoso que estas varandas estabelecem com os ambientes compartimentados por meio das grandes
portas-janelas (figuras 5a e 5b).
(a)
(b)
LEGENDA:
Varanda transversal Varanda longitudinal
A diferente hierarquia entre as varandas, todavia, não interfere nas lógicas distributivas das circulações, que são muito
similares. Nas varandas, desenvolvem-se os principais eixos de circulação que, por serem periféricos, favorecem a
disposição regular e modulada dos demais elementos de composição, como é recorrente nas composições lineares.
Como complemento, utiliza-se um sistema circulatório secundário composto por eixos perpendiculares que conectam os
quartos à varanda longitudinal e ao corredor, e por um eixo de circulação longitudinal alternativo (figuras 6a e 6b).
A organização dos elementos de composição irregulares nas alas se dá pricipalmente em função da implantação da casa
no terreno. Na Aracajú, onde o terreno é explorando em todos os sentidos do pavilhão, os núcleos hidrálicos são inseridos
no intermeio dos elementos regulares, permitindo a biorientação dos dormitórios e da sala de estar (figura 7a). Na Peixe
Gordo, é criado um núcleo hidráulico na parte posterior da edificação, organizado em linha e voltado para o recuo que
possui caráter residual. Dessa forma, estrategicamente, é reforçada a orientação dos ambientes para a varanda
longitudinal e, consequentemente, para o pátio lateral. (figura 7b).
Figura 5: Varandas nas residências Aracajú (a) e Peixe Gordo (b). Fonte: (a) MEDEIROS DOS SANTOS, 2015. (b) COLOMBO, 2015
Figura 6: Circulações das residências Aracajú (a) e Peixe Gordo (b). Fonte: (a) MEDEIROS DOS SANTOS, 2015. (b) COLOMBO, 2015
(a)
(b)
ESPACIALIDADE
A espacialidade das casas é analisada nos percursos ou “itinerários arquetípicos” por elas promovidos, considerando
que estes ocorrem prioritariamente no hall, estar, corredor íntimo e quartos. Nestes percursos, avalia-se a experiência
que o espaço promove em seu interior, através do movimento, registrando efeitos de dilatação e/ou compressão
espacial, bem como a consolidação de um ou de múltiplos pontos focais de interesse, o que condiciona a configuração de
tensões uni ou multidirecionais. Esses percursos são simulados nas maquetes virtuais, vindo a construir uma
representação que se aproxima da realidade, mas que não a reproduz fielmente.
Nas casas estudadas, a inexistência de um hall definido confere à varanda o papel de ambiente principal de transição
entre o espaço externo e interno, pelo qual se dá o acesso à residência. A pequena compressão espacial, consequência
do plano inclinado do telhado e dos planos verticais dos volumes, confere certa ambiguidade ao espaço, pois, ao mesmo
tempo que a varanda configura uma extensão do espaço doméstico, ela possui também um caráter público e externo.
Assim, sua espacialidade é muito dinâmica, com diversos pontos focais de interesse (figuras 8a e 8b).
Figura 7: Elementos irregulares das residências Aracajú (a) e Peixe Gordo (b). Fonte: (a) MEDEIROS DOS SANTOS, 2015. (b) COLOMBO, 2015
Elementos irregulares
(a)
(b)
LEGENDA:
(a)
(b)
A sala de estar se configura de maneira distinta em cada residência, explorando ou não o plano inclinado do telhado
para enriquecer a espacialidade. Na Aracajú, o estar assume uma continuação da varanda, ligado a ela por grandes
planos envidraçados e pela continuação do plano inclinado do telhado no espaço interno, assim configurando um espaço
muito dinâmico e com diversos pontos focais de interesse (figura 9a). Na Peixe Gordo, o estar se insere no interior do
volume edificado, conectando-se com o telhado pela ausência de forro, porém sem demonstrar preocupação em
compatibilizar a geometria do ambiente com a das tesouras, parcialmente visualizadas. A dilatação vertical e não
harmônica do ambiente se contrapõe à dilatação horizontal promovida por tímidas e diversas portas-janela ligadas à
varanda. O espaço sugere, assim, mais introspecção que a sala da Aracajú, mas também sugere múltiplos pontos focais,
configurando uma tensão multidirecional (figura 9b).
Figura 8: O adentrar nas Aracajú (a) e Peixe Gordo (b). Fonte: (a) MEDEIROS DOS SANTOS, 2015. (b) COLOMBO, 2015
(a)
(b)
(a)
(b)
Figura 9: O acolher nas Aracajú (a) e Peixe Gordo (b). Fonte: (a) MEDEIROS DOS SANTOS, 2015. (b) COLOMBO, 2015
Nos dormitórios, o local de recolhimento dos usuários, configura-se uma espacialidade ainda menos dinâmica, de tensão
unidirecional, tendo como ponto focal de interesse a grande abertura de uma porta-janela para a varanda. A existência
de outro acesso, que não o da porta-janela, possibilita ainda a alteração da espacialidade pelo fechamento dessas
grandes aberturas, configurando assim um espaço mais estático e privado e, portanto, mais adequado à atividade do
recolher-se. Comparativamente, na Aracajú, o plano inclinado e a maior dimensão da porta de vidro garantem uma maior
dinamização do espaço do que no Peixe Gordo, onde se percebe a utilização de um forro horizontal e de portas-janela de
menores dimensões, (figuras 10a e 10b).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os dois projetos explicitam a adequada implantação das casas em relação à geometria do lote e à orientação solar,
mesmo que recorrendo a diferentes estratégias compositivas – planar (Aracajú) e volumétrica (Peixe Gordo). Apesar
destas diferentes estratégias compositivas, observa-se em comum uma rígida modulação e a segmentação transversal da volumetria, inserindo uma espécie de sala-varanda como elemento conector.
A existência da varanda, composta por uma parcela longitudinal e outra transversal ao pavilhão, é recorrente em ambas
casas, diferenciando-se pela hierarquia dada a estes espaços em cada projeto – transversal, na casa Aracaju, e
longitudinal, na Peixe Gordo. Nestas varandas, entretanto, as redes circulatórias das duas casas se desenvolvem de
maneira muito semelhante. Já os elementos de composição irregulares diferem-se em sua forma de inserção nas
alas, estando no intermeio dos elementos regulares (Aracajú) ou configurando uma faixa longitudinal (Peixe Gordo) e,
dessa forma, adequando-se aos condicionantes impostos a cada um dos projetos.
A espacialidade das duas casas revela semelhanças promovidas principalmente nos percursos desenvolvidos junto às varandas, porém, a experiência espacial junto às salas e quartos explicita sutis diferenças, sendo mais exteriorizada na
Aracajú se comparada com a Peixe Gordo. Neste contexto, o uso ou o desuso de forros e se mostra muito operante. O
tratamento planar da cobertura da Aracajú configura uma espacialidade mais controlada e homogênea no todo espacial,
onde observa-se uma contraposição da horizontalidade, imposta pelos planos envidraçados, à verticalidade, sugerida pela mudança de pé direito do plano inclinado da cobertura.
Figura 10: O recolher-se nas Aracajú (a) e Peixe Gordo (b). Fonte: (a) MEDEIROS DOS SANTOS, 2015. (b) COLOMBO, 2015
(a)
(b)
Em contrapartida, a cobertura da Peixe Gordo, com tesouras tradicionais aparentes, configura distintas espacialidades
no todo espacial, sugerindo inclusive uma falta de compatibilização entre as espacialidades do “volume-base” e do
“volume-cobertura”. Destaca-se três contextos distintos: a horizontalidade virtual nas varandas, ditada pela sequência
rítmica dos banzos inferiores das tesouras; a cubagem imprecisa do estar, em que se explicita segmentos de tesouras;
e a horizontalidade decorrente do uso de forro que omitem as tesouras nos quartos.
Neste sentido, o uso do telhado sobre pavilhões parece ser um desafio projetual em que se deve dominar não só a técnica
construtiva do telhado, mas também as relações dele com os ambientes e a espacialidade resultante.
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