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Desenvolvimento territorial sustentável e turismo n o Alto Vale do Itajaí,
Santa Catarina: o associativismo municipal no proje to TREMTUR
Maristela Macedo Poleza
[Arquiteta, mestre em Desenvolvimento Regional pela Universidade Regional de Blumenau, pesquisadora do Núcleo de Pesquisas em Desenvolvimento Regional/FURB,
e-mail: [email protected] ] Luciana Butzke
[Cientista social, mestre em Sociologia Política pela Universidade Federal de Santa Catarina, pesquisadora do Núcleo de Pesquisas em Desenvolvimento Regional/FURB e professora da
UNIFEBE, e-mail: [email protected]]
Iara Klug Rischbieter
[Turismóloga, mestre em Desenvolvimento Regional pela Universidade Regional de Blumenau, pesquisadora do Núcleo de Pesquisas em Desenvolvimento Regional/FURB,
e-mail: [email protected] ]
Resumo
Nos últimos anos, a atividade turística tem sido tema de inúmeros encontros, reflexões
acadêmicas, projetos e apresenta-se à administração pública como um desafio e uma
possibilidade concreta de crescimento econômico. Muitos administradores públicos estimulam o
turismo em seus municípios. Todavia, muitas ações acontecem desfocadas de uma articulação
efetiva com o planejamento local e regional. O turista passa a ser o fim do planejamento e, o
desenvolvimento, nas suas dimensões econômica, social, ambiental, cultural subordina-se a esta
visão. Dessa forma, a preocupação central desse artigo é a análise do planejamento territorial e
do turismo no Alto Vale do Itajaí em Santa Catarina a partir da atuação da Associação dos
Municípios do Alto Vale do Itajaí. Assume-se a hipótese de que a experiência dos municípios
pertencentes a AMAVI no que tange ao turismo é incipiente. Poucos são os municípios com
estrutura turística definida e operando em bases participativas. Todavia, a partir da parceria na
elaboração do Projeto Turístico da TREMTUR, em 2000, começam a surgir indícios de uma nova
fase, mais preocupada com a internalização da dimensão socioambiental e com a criação de
sinergias entre os vários atores sociais sediados no nível local e regional. A questão proposta
neste artigo será investigada pela revisão bibliográfica de fontes secundárias, buscando um
diálogo entre as principais referências do tema proposto. As informações serão analisadas à luz
do objetivo do artigo, devendo revelar, sobretudo os trunfos e fragilidades da atuação da AMAVI
no planejamento territorial e do turismo no Alto Vale do Itajaí.
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Introdução
As inovações tecnológicas alteraram as estruturas econômicas, sociais e políticas, mudando
igualmente as condições de vida das pessoas. O aumento do tempo de lazer, a complexidade das
sociedades e o advento da urbanização, entre outros fatores, levaram à procura global pelo
turismo. Atualmente essa atividade pode ser encarada como um dos fenômenos mais
significativos da contemporaneidade, tanto pela soma de setores da atividade que abrange, como
pelo número de pessoas sobre as quais atua.
Para Beni (1998), o turismo é um conjunto de recursos naturais e culturais que, em sua essência,
constituem a matéria-prima dessa atividade, pois são esses recursos que provocam a afluência de
turistas. A esse conjunto incorporam-se os serviços produzidos para dar suporte ao seu consumo.
Se considerarmos apenas a funcionalidade do processo turístico é possível compreender vários
de seus aspectos. Porém, ao introduzir-se o elemento humano - que é o sujeito do turismo -
elaborar uma definição que contemple toda a extensão do fenômeno torna-se um grande desafio.
Dessa forma, entende-se que uma definição adequada deve considerar o turismo como atividade
econômica e social, tanto pelas motivações que o originam e determinam, quanto pelas
implicações e efeitos que exerce nos sistemas econômico, social e ambiental dos lugares
receptores, bem como nos de origem dos viajantes.
Neste trabalho adota-se o conceito de Barretto (2003), que trata o turismo como uma atividade de
múltiplas peças, cujo planejamento exige uma escolha criteriosa, de cujo encaixe poderá surgir o
equilíbrio necessário ao seu desenvolvimento. Inserindo-se neste contexto, cabe aos planejadores
da atividade turística avaliar os anseios da comunidade, apreciando suas potencialidades, para
que a atividade possa ser alcançada com sucesso.
Há um entusiasmo em relação ao crescimento do turismo e uma crescente preocupação quanto
ao seu impacto. Becker (2001) alerta para o caráter híbrido do turismo, por representar um
enorme potencial de desenvolvimento e um enorme potencial de degradação socioambiental,
caso não seja devidamente planejado e organizado.
No Estado de Santa Catarina, inicialmente, o desenvolvimento desta atividade esteve ligado ao
turismo de ‘sol e mar’. Este modelo de turismo vem gerando impactos socioambientais negativos
e, sua interiorização é uma alternativa que vem sendo aos poucos colocada em prática (LINS et
al., 2002). Esta interiorização é desejável pelas administrações municipais que procuram esta
atividade como possibilidade de projeção de seus municípios por visualizarem efeitos
multiplicadores e incremento do setor econômico. Todavia, é fundamental que se faça um
planejamento cuidadoso para que o crescimento da atividade turística aconteça de uma forma
organizada, diferente do modelo do turismo desordenado e em grande escala presente no Estado,
que colabora com o aprofundamento da problemática socioambiental.
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O Alto Vale do Itajaí inclui-se nesse processo de interiorização da atividade turística em Santa
Catarina e, o associativismo municipal representado pela Associação dos Municípios do Alto Vale
do Itajaí [AMAVI], tem importância fundamental neste processo. A preocupação central desse
artigo é a análise do planejamento territorial e do turismo no Alto Vale do Itajaí, em Santa
Catarina, a partir da atuação da AMAVI. Parte-se do pressuposto de que, apesar da necessidade
de se pensar na implantação de um turismo que minimize a problemática socioambiental, o
modelo convencional que maximiza as vantagens econômicas em detrimento das várias
dimensões do desenvolvimento continua presente. Neste modelo convencional, o planejamento
do turismo passa de um “meio” a um “fim” em si mesmo. As dimensões social, cultural,
econômica, política do desenvolvimento se subordinam ao turismo, que passa a ser o ponto
central do planejamento.
A experiência dos municípios pertencentes à área de abrangência da AMAVI, no que tange ao
turismo, é incipiente. Poucos são os municípios com estrutura turística definida e operando em
bases participativas. Todavia, a partir da parceria na elaboração do Projeto Turístico de
revitalização da Estrada de Ferro Santa Catarina [TREMTUR], em 2000, começam a surgir
indícios de uma nova fase, mais preocupada com a internalização da dimensão socioambiental e
com a criação de sinergias entre os vários atores sociais sediados no nível local e regional.
A questão proposta neste artigo é investigada pela revisão bibliográfica de fontes secundárias,
buscando um diálogo entre as principais referências do tema proposto. As informações
apresentadas serão analisadas à luz do objetivo do artigo, revelando os trunfos e fragilidades da
atuação da AMAVI no planejamento territorial, assim como os trunfos e fragilidades do turismo no
Alto Vale do Itajaí. Para tanto, o artigo obedece a seguinte subdivisão: esta introdução que
pretende situar o estudo; uma segunda parte que trata do referencial teórico adotado, o
planejamento para o desenvolvimento territorial sustentável. Na seqüência, uma terceira parte que
apresenta uma caracterização do Alto Vale do Itajaí e, em seguida, uma síntese sobre a trajetória
da AMAVI. Uma quarta parte de descrição e análise do projeto TREMTUR, uma quinta parte sobre
o turismo no Alto Vale do Itajaí e a atuação da AMAVI no Projeto TREMTUR, apresentando seus
trunfos e fragilidades e, na seqüência, as considerações finais.
Planejamento territorial e turismo
O planejamento se faz presente nas ações humanas: não há ação destinada a alcançar um
objetivo sem planejamento. Dessa forma, o planejamento representa um modelo teórico para a
ação (LAFER, 1975). Birkholz (1983) afirma que o planejamento é um processo e um meio para
um melhor uso da inteligência e das capacidades do ser humano para o benefício comum.
Cardoso (1975) define planejamento como “administração racional”, a distribuição ótima dos
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recursos e dos meios para se atingir determinados objetivos. Para Sachs (1986, p. 46) “o
planejamento do desenvolvimento envolve a elaboração de políticas no intuito de moldar ou, pelo
menos, influenciar a ação do homem em relação à natureza e a si mesmo, no processo de
utilização do meio natural”.
O discurso e a prática do planejamento emergiram no século XX. Destacam-se a experiência dos
países socialistas após a Revolução Russa em 1917 e a dos países capitalistas centrais e
periféricos depois de 1929. Pode-se afirmar que essa prática inicial era essencialmente
econômica (MIGLIOLI, 1983). E intrínseca a essa ênfase na dimensão econômica, está uma visão
de desenvolvimento que subordina a dimensão social, cultural, política e ambiental a primeira.
Essa visão é fruto do processo de desenvolvimento impulsionado principalmente a partir do século
XVIII. Este levou a uma visão entusiasta relacionada à Revolução Industrial, ao desenvolvimento
das cidades, dos transportes, da comunicação, a crescente oferta de produtos, ao progresso
tecnológico e científico, aos avanços na política, etc. Esse entusiasmo fez com que por um lado,
os países industrializados passassem a ser modelos a serem seguidos pelos demais países e, por
outro, difundiu-se a idéia de que esse modelo traria bem-estar e qualidade de vida a todos.
Com o passar do tempo, esse estilo de desenvolvimento começou a apresentar seus problemas e
limites: o desenvolvimento econômico unidimensional, os perigos da extinção dos recursos
naturais, a ameaça nuclear, as mudanças ecossistêmicas, os conflitos mundiais, a pobreza, a
violência, a insegurança, as incertezas perante o futuro. O mundo material é um sistema que têm
os seus limites e não pode suportar um subsistema material sem limites (ILLICH, 1973).
Como conseqüência desses problemas e limites, a problemática socioambiental1 tornou-se, a
partir da segunda metade do século XX, tema de discussão freqüente junto aos movimentos
sociais, que mobilizam cada vez mais um contingente maior de pessoas. E acabou sendo também
motivadora de iniciativas de uma série de eventos – Estocolmo (1972), Cocoyoc (1974), Rio
(1992), dentre outros – que contaram com a participação de muitos países, a fim de buscar
alternativas que minimizassem os impactos negativos causados pelo estilo de desenvolvimento
hegemônico.
A partir do questionamento do “caráter” do desenvolvimento, os intérpretes do
ecodesenvolvimento propõem um estilo de desenvolvimento alternativo que deve priorizar a
valorização dos recursos específicos de cada região para a satisfação das necessidades
(alimentação, habitação, saúde e educação) sem ter como parâmetro os países ricos; a realização
dos seres humanos; a exploração dos recursos considerando as necessidades das gerações
futuras; a reorganização da produção para minimizar os impactos negativos das atividades
humanas no meio ambiente; a utilização de fontes locais para geração de energia; o
1 Entende-se que a problemática sócio-ambiental não conhece fronteira e “reflete a percepção de que o volume de impactos destrutivos gerados pela ação antrópica sobre os ecossistemas tem se amplificado a ponto de ameaçar diretamente as precondições de sobrevivência da espécie num horizonte de longo prazo” (VIEIRA, 1992, p.4).
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aperfeiçoamento das ecotécnicas; a constituição de uma autoridade horizontal que tenha visão
complexa; a participação das comunidades locais; a educação preparatória complementar das
estruturas participativas de planejamento e gestão (SACHS, 1998).
Na discussão sobre o planejamento e a gestão do desenvolvimento, o território é um conceito
chave. Por desenvolvimento territorial entendem-se todos os processos de mobilização dos atores
que conduzem a elaboração de uma estratégia de adaptação aos constrangimentos exteriores,
sobre a base de uma identificação coletiva ligada a uma cultura e a um território. Segundo
Beduschi e Abramovay (2003, p.3):
Territórios não são, simplesmente, um conjunto neutro de fatores naturais e de dotações humanas capazes de determinar as opções de localização das empresas e dos trabalhadores: eles se constituem por laços informais, por modalidades não mercantis de interação construídas ao longo do tempo e que moldam uma certa personalidade e, portanto, uma das fontes da própria identidade dos indivíduos e dos grupos sociais.
Na concepção do planejamento para o desenvolvimento territorial sustentável é fundamental o
papel desempenhado por instituições locais2, sejam elas supramunicipais, intermunicipais ou
municipais (SOUTO-MAIOR, 1992). A gestão local do desenvolvimento, baseada na participação,
na descentralização e em regras e normas que sejam estabelecidas num processo de negociação
entre diferentes níveis (local, regional, nacional), surge como um instrumento importante para
fortalecer os elementos característicos do ecodesenvolvimento. Decisões tomadas em um só nível
seja ele local, regional ou global podem ser arbitrárias e mutilantes (GODARD, 1997). Percebe-se,
desta forma, que, a incorporação da dimensão territorial constitui atributo central do enfoque do
ecodesenvolvimento (CAZELLA; VIEIRA, 2004).
O turismo, por sua vez, faz parte da problemática relacionada ao estilo de desenvolvimento
convencional. No contexto das novas formas de internacionalização das relações de produção e
consumo, o turismo se mundializou e ganhou a qualificação de fenômeno de massa. Nesse
sentido, torna-se importante discutir as repercussões sócio-espaciais desta atividade e levantar
questões sobre a viabilidade da mesma contribuir para desenvolvimento de uma região.
Vale ressaltar que a promoção do desenvolvimento na atividade turística implica,
fundamentalmente, no envolvimento e na participação cidadã no processo de gestão e
planejamento da localidade. Pois, é justamente a comunidade quem conhece e vivencia a
realidade local sendo capaz de identificar problemas e necessidades, avaliar alternativas,
defender o meio ambiente e buscar soluções, sugerindo caminhos que levem à melhoria da
qualidade de vida, ao fortalecimento da cultura e ao bem-estar social da comunidade.
Silveira (2002) ressalta que a participação da população é um pressuposto decisivo para o
planejamento do turismo, seus propósitos e metas. O bom andamento do processo de
2 Entendendo conforme Franco (2000, p. 27) que “todo desenvolvimento é local, seja este local um distrito, um município, uma microrregião, uma região do país, um país, uma região do mundo”. O conceito de local adquire a conotação de alvo socioterritorial das ações e passa a ser definido por um processo de desenvolvimento em curso (FRANCO, 2000).
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desenvolvimento da atividade turística não acontecerá de forma satisfatória sem que haja
comprometimento e participação da comunidade.
O planejamento turístico tem sido claramente influenciado por teorias e práticas administrativas e
publicitárias. Muitas vezes ele traz benefícios para os participantes dos negócios turísticos e não
traz benefícios à comunidade. Para o turismo, o planejamento local é importante, porém, a
articulação territorial é fundamental (BARRETTO, 2003).
É preciso pensar num planejamento mais amplo que o turístico. “O verdadeiro turismo ecológico
[denominação usada hoje abusivamente], nunca poderá ser de massas, mas está se impondo
como um ramo de atividades a ser integrado nas estratégias de desenvolvimento local de
numerosas microrregiões” (SACHS, 2004, p. 140). O planejamento, nas palavras de Godard e
Sachs (1975), não pretende ser o atributo de técnicos, mais o instrumento que um povo se dá
para pensar e realizar seu futuro. Esse futuro não é o “turismo” e sim uma melhor condição de
vida. O turismo pode ser, dependendo das circunstâncias, um “meio”, mas não deve ser
considerado um “fim”.
A abordagem territorial do desenvolvimento sustentável pressupõe um maior papel local na gestão
do seu próprio desenvolvimento territorial. Essa mudança é também um problema político e de
exercício do poder, que coloca em pauta a questão das instituições político-administrativas, da
participação e do processo político (FREY, 2001). O planejamento para o desenvolvimento
territorial sustentável deve indicar objetivos amplos do que ser quer e do que se pode para
determinada região. E, a partir desses objetivos mais amplos é que se mobilizam meios para
chegar ao futuro desejado. O turismo pode ser um desses meios, mas não é o único!
Em síntese, três aspectos relacionados ao planejamento regional e ao turismo serão considerados
na análise do estudo de caso. O primeiro deles é que o planejamento não deve priorizar uma
dimensão específica, como historicamente tem sido com a dimensão econômica. O segundo, diz
respeito à importância da participação no processo de planejamento e, a terceira, alerta para o
fato de que o planejamento não deve ter como finalidade principal a atividade turística. Tendo
esses aspectos como referência, prossegue-se a apresentação e análise do estudo de caso.
O Alto Vale do Itajaí
A região da AMAVI é constituída por vinte e oito municípios3, situa-se no Alto Vale do Itajaí entre
os paralelos 26º34’ (latitude norte) e 27º41’ (latitude sul); 49º28’ (longitude leste) e 50º26’
(longitude oeste) e tem Rio do Sul como cidade pólo.
3 Agrolândia, Agronômica, Atalanta, Aurora, Braço do Trombudo, Chapadão do Lageado, Dona Emma, Ibirama, Imbuia, Ituporanga, José Boiteux, Laurentino, Lontras, Mirim Doce, Petrolândia, Pouso Redondo, Presidente Getúlio, Presidente Nereu, Rio do Campo, Rio do Oeste, Rio do Sul, Salete, Santa Terezinha, Taió, Trombudo Central, Vidal Ramos, Vitor Meirelles e Witmarsum
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Figura 1: Área de abrangência da AMAVI
Fonte: IEL (2001, p. 10).
O Alto Vale do Itajaí localiza-se, na parte mais alta da Bacia Hidrográfica do Rio Itajaí, quase no
centro de Santa Catarina, representando 1,12% do território brasileiro. O clima é classificado
como úmido mesotérmico, com temperatura média anual de 20ºC. As chuvas oscilam em média
entre 1.600 e 1.800mm anuais (SANTA CATARINA, 1993). A cobertura vegetal é bastante
diversificada . A floresta ombrófila densa ocupava quase a sua totalidade sendo que o ciclo
exploratório da madeira e a dinâmica urbana modificaram a condição da cobertura vegetal, hoje
restrita a 10% do território.O relevo acidentado, típico de vales, favorece a existência de
cachoeiras e grutas com fauna e flora diversificadas (AMAVI, 2000).
O Vale do Itajaí era povoado pelos índios Xokleng e o contato com os imigrantes europeus deu-se
a partir da colonização do Vale, em 1850 num processo marcado por conflitos. Muller (1987)
estima que, dois terços desta população tenha sido dizimada nos primeiros anos de convívio.
Até o início do século XIX, o processo de ocupação de Santa Catarina caracterizava-se por duas
iniciativas paralelas, sem ligação entre si. Entre 1645 e 1676 pela região litorânea e em 1771 com
a ocupação do Planalto Serrano, pelos Paulistas. A área existente entre o Litoral e o Planalto
representava então, um vazio demográfico e, a necessidade de sua ocupação, como elo
comunicante, constituía-se uma política e uma necessidade.
Com o estabelecimento da Colônia Blumenau, marca-se a entrada no Vale de inúmeros
imigrantes4 e uma grande região periférica a Blumenau foi explorada. Em direção ao planalto, Emil
Odebrecht promoveu expedições abrindo em 1874 um caminho para cargueiros. Os sertanejos
que habitavam Blumenau antes da instalação da Colônia, em função do contínuo aumento desta,
se deslocaram gradativamente para as terras vagas, existentes rio acima no caminho do planalto.
4 Principalmente alemães e italianos.
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A evolução demográfica do Alto Vale do Itajaí está diretamente ligada às investidas colonizatórias,
à construção de estradas (1908 e 1911), da rede ferroviária ao do ciclo da madeira. Rio do Sul,
fruto da expansão de Blumenau, cresceu com a imigração das populações jovens, das comunas
circunvizinhas de colonização européia. O contingente populacional que se deslocou para a
região mais alta do Vale, foi predominantemente composto por brasileiros5.
A ocupação foi organizada em pequenas propriedades6, distribuídas ao longo de rios e picadas
em direção ao fundo dos Vales. O solo era explorado ao máximo para subsidiar o pagamento do
lote e suprir a necessidade de subsistência. Os colonos tinham a responsabilidade de povoamento
para com a colonizadora, sob pena de terem que devolver o lote.
Desta forma, estabeleceram-se unidades agrícolas familiares e, o fato de muitos imigrantes
serem artesãos e operários facilitou o surgimento das primeiras indústrias de pequeno porte. O
isolamento geográfico e econômico das frentes de colonização fez com que as pessoas ali
sediadas produzissem quase tudo de que necessitavam para sobreviver. A auto-sustentação fez
com que a região diversificasse sobremaneira seu sistema produtivo (MAGALHÃES, 2004). Vale
a pena registrar que a região do Alto Vale foi colonizada cerca de 30 anos após a chegada dos
europeus à foz do rio Itajaí.
Uma das atividades que impulsionaram o desenvolvimento econômico da região foi a extração da madeira, a partir da década de 30, com a Estrada de Ferro Santa Catarina. A partir de 1989, com a adoção de uma legislação mais rígida para preservar a Mata Atlântica, essa atividade entrou em declínio. Atualmente a região apresenta uma atividade econômica baseada na agricultura familiar e na industrialização descentralizada (MAGALHÃES, 2004, p. 2).
A colonização da região, como mencionado, deu-se no final do século XIX, porém, a instalação
dos municípios foi mais recente, a partir de 1930. A população rural predomina em 17 dos 28
municípios que compõe a AMAVI. Do total de 242.610 habitantes, 57,47% vivem em área urbana
e 42,53% vivem em área rural.
Este território é conhecido e identificado por festas e feiras temáticas relacionadas às vocações
culturais da região e à forte presença de elementos culturais de diversas etnias7, Tal influência
pode ser vista na gastronomia e na arquitetura ou ainda em eventos típicos e grupos folclóricos,
que mantêm vivas as tradições e os costumes dos colonizadores.
A AMAVI
A Associação dos Municípios do Alto Vale do Itajaí (AMAVI) foi fundada em 1964, por iniciativa da
Câmara Júnior de Rio do Sul. Conta com a participação de 28 municípios com objetivo maior de
5 Em 1920, faz-se referência a uma população de 8.800 habitantes, sendo apenas 596 estrangeiros (PELUSO, 1942). 6 Com vinte e cinco hectares no máximo. Os lotes precisavam ser pequenos, pois os colonos, devido às suas origens sociais, não conseguiam viver isoladamente (RENAUX, 1987). 7 Alemã, italiana, suíça, polonesa e ucraniana, além da cultura cabocla e das tradições gaúchas.
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sediar e representar força política, junto ao governo estadual e federal e através do
associativismo.
No rol dos objetivos fixados nos seus estatutos (AMAVI, 2004a), estão contemplados: (i) a
ampliação e o fortalecimento da capacidade administrativa, econômica e social dos municípios,
prestando-lhes assistência técnica; (ii) a promoção da cooperação intermunicipal e
intergovernamental; e (iii) o registro, para efeitos de lavra em benefício dos municípios
associados, de jazidas e recursos minerais existentes na região. De 1964 até 1975, a associação
funcionou basicamente como um fórum de discussão dos prefeitos, mas em 1976 contratou
equipe técnica. Atualmente, com 29 servidores, disponibiliza assessoria técnica8, principalmente
aos pequenos municípios associados que não possuem condições de contratar seu próprio corpo
técnico.
No planejamento regional do Alto Vale, a AMAVI participou da experiência de criação dos Termos
de Referência para os planos microrregionais de desenvolvimento integrado. Esta ocorreu nas
décadas de 1960/1970 e é considerada a primeira tentativa de planejamento microrregional do
Estado, por iniciativa do Serviço Federal de Habitação e Urbanismo (SERFHAU), e depois da
SUDESUL. Na década de 80, coordenou a elaboração de Planos Diretores para os municípios de
Taió, Trombudo Central, Pouso Redondo, Ituporanga, Agrolândia. Ibirama, Lontras, Presidente
Getúlio, Rio do Oeste, Rio do Sul e Salete, que foram concebidos a partir de uma metodologia
participativa. Posteriormente, já na década de 1990, participou do Plano Básico de
Desenvolvimento Regional (PBDR) e do Plano Básico de Desenvolvimento Ecológico Econômico
(PBDEE). Em 2000, elaborou, em conjunto com outras instituições sociais, o Projeto Turístico e o
de Viabilidade Econômica da revitalização da Estrada de Ferro Santa Catarina, TREMTUR
(AMAVI, 2000). Atualmente, desenvolve um projeto de Plano Diretor Regional Participativo
envolvendo os 28 municípios. Tanto o Projeto TREMTUR quanto o Plano Diretor Regional
Participativo (AMAVI, 2005) empregam metodologias participativas em escala regional.
Em maior ou menor grau, desde a década de 1960, as associações de municípios têm se
envolvido com experiências de planejamento de Santa Catarina. Todavia, os planos regionais
realizados por iniciativa do governo federal e estadual sofrem com a descontinuidade das gestões
governamentais e com a fragmentação de iniciativas. Nesse sentido, nas dinâmicas de
planejamento regional coexistem quatro recortes espaciais distintos: as associações de
municípios a partir do início dos anos 1960, os comitês de bacia a partir de 1997, as regiões
metropolitanas em 1998 (THEIS et al., 2001), e em 2003, as Secretarias de Desenvolvimento
Regional (SDR) (TURNES et al., 2004). Este padrão de atuação em mosaicos tem prejudicado a
busca de enfrentamento dos problemas estruturais da população catarinense e do tratamento da
questão regional.
8 Nas áreas administrativa, social, jurídica, engenharia, arquitetura, urbanismo, turismo, educação, contabilidade, informática, topografia e economia.
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O projeto TREMTUR
A colonização e o povoamento do Alto Vale do Itajaí guardam íntima relação com a Estrada de
Ferro Santa Catarina, construída em 1907 e desativada em 1971. No Brasil, a preservação da
memória ferroviária é o principal objetivo da Associação Brasileira de Preservação Ferroviária
(ABPF)9. As idéias de preservação da memória ferroviária chegaram a Rio do Sul no ano de 1989,
por intermédio de Luís Carlos Henckels, coordenador do núcleo da ABPF no Vale do Itajaí.
Henckels reuniu-se com o prefeito de Rio do Sul, na época, Nodgi Enéas Pellizzetti, que ofereceu
seu apoio à causa com a criação do Grupo Especial de Trabalho para a revitalização da Estrada
de Ferro Santa Catarina, pelo Decreto nº. 473/97, no seu segundo mandato como prefeito
(AMAVI, 2000; 2002).
Em 1998, foi criada a Fundação Estrada de Ferro Vale do Itajaí, a TREMTUR: entidade privada,
de caráter público e suprapartidário. Esta foi instituída para dar sustentabilidade e condições de
exeqüibilidade ao projeto turístico de revitalização de um trecho de 23 quilômetros da Estrada de
Ferro Santa Catarina. Este trecho se situa entre os municípios de Rio do Sul e Apiúna, envolvendo
indiretamente os municípios que fazem parte da AMAVI e da AMMVI 10. A Fundação TREMTUR é
força aglutinadora do potencial coletivo que se reverte em ações dos órgãos não governamentais
e entidades públicas atuantes na região (AMAVI, 2002).
A proposta turística apresentada pelo Projeto TREMTUR é uma possível área para investimentos
do Programa de Desenvolvimento do Turismo [PRODETUR]. O Projeto Turístico da TREMTUR
aponta características culturais e potenciais ambientais naturais como singularidades regionais
passíveis de políticas de valorização. A Maria Fumaça acena com um número possível de
visitantes, exaltando a Bromélia, planta típica e abundante nos remanescentes da Mata Atlântica
da região. O TREMTUR se apresenta como alternativa aos grandes eventos, propondo através
das singularidades, o resgate e a valorização do “ser” e do “saber fazer” local (AMAVI, 2000).
O codinome utilizado para o trecho, Ferrovia das Bromélias, estimula o apelo ambiental
necessário à manutenção e renovação da vegetação, bem como, da conservação da paisagem
cênica existente no entorno do trecho proposto à revitalização. O cadastro e documentação do
acervo edificado objetivam o estudo, o conhecimento e a valorização das técnicas construtivas
utilizadas, corroborando com a máxima popular que envolve a proposta da TREMTUR: ”tudo que
é velho vira novo”. Acenam-se também como possibilidades a definição de rotas turísticas
desveladoras de costumes e saberes locais ligados ao artesanato, aos hábitos e costumes, a
9 Criada em 1977 por Patrick Dollinger. 10 Associação dos Municípios do Médio Vale do Itajaí. Existe um pacto entre a AMAVI e a AMMVI, que permite o planejamento de ações conjugadas regionalmente.
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gastronomia e a religiosidade que, articuladas a macro políticas de acolhimento, levarão o Alto
Vale do Itajaí à condição de destaque (AMAVI, 2000).
O projeto pretende também “dinamizar atividades que contenham e transmitam a riqueza histórica
que a ferrovia representou para a região, apresentando novas oportunidades de geração de
empregos, novas divisas e a melhoria da qualidade de vida [...]” (AMAVI, 2002, p. 5). Expressa-se
também no projeto preocupação com os impactos negativos do turismo e a importância do
desenvolvimento sustentável.
Em ordem crescente, desde 2000, instituições públicas e privadas, profissionais liberais e
comunidade em geral, foram mobilizados e envolvidos a participarem do projeto e a Fundação
TREMTUR11. O projeto de revitalização da Estrada de Ferro Santa Catarina foi concluído no ano
de 2000 e entregue ao governo do estado no mesmo ano. A AMAVI foi uma das instituições que
participou desse processo. Ela representa o associativismo municipal e tem uma atuação
reconhecida no âmbito regional. Por ela coordenar experiências de planejamento regional e
urbano no Alto Vale do Itajaí há mais de quarenta anos, é sobre ela que vamos no debruçar para
analisar a relação entre o planejamento territorial e o turismo no Projeto TREMTUR.
O turismo no Alto Vale do Itajaí e a atuação da AMA VI no projeto TREMTUR: trunfos
e fragilidades
O Projeto TREMTUR pode ser considerado um marco na abordagem da questão turística no Alto
Vale do Itajaí. Alinhavado, estruturado e conduzido pela Fundação TREMTUR até onde lhe fora
possível, este chegou a AMAVI num contexto de desafio, visando a elaboração de um projeto que
pudesse ser financiado pelo PRODETUR. O projeto carecia de apoio, complementação técnica e
maior inserção no contexto regional, em condição nunca antes vivenciada pela associação. Até
então, a AMAVI que se definia pela gestão de projetos pontuais específicos, vislumbra o cenário
regional, se incluí e abraça a questão. Ela possibilitou a disponibilização e contratação de técnicos
11 A AMAVI elaborou o projeto de viabilidade econômica e coordenou a elaboração do projeto técnico de turismo. A Prefeitura Municipal de Rio do Sul tratou da transferência da casa do feitor, situada nos fundos da Estação Ferroviária Matador para a sede da TREMTUR e garantiu o suporte inicial das ações da Fundação TREMTUR, com a doação de terreno para a construção de casas populares para relocação de famílias que ocupavam o espaço interno da referida estação. Destinou ainda no orçamento de 2001 recursos para a contrapartida na execução do projeto e através da Assessoria de Planejamento disponibilizou equipe para efetuar o cadastramento das edificações com valor histórico situadas no entorno da ferrovia. A Câmara de Vereadores de Rio do Sul elaborou um projeto de lei tendo em vista o financiamento do projeto técnico de engenharia. As empresas B&S Consultoria, Juglans Engenharia Florestal e EMFLOR Tecnologia em Reflorestamento elaboraram o projeto de recuperação ambiental, que foi protocolado no Fundo Nacional do Meio Ambiente e definiu o plantio de mudas de árvores exóticas em propriedades privadas para o abastecimento da locomotiva. As empresas Hergen Máquinas e Equipamentos S.A., H. Bremer & Filhos Ltda. e Caldeiras Sofka Ltda. auxiliaram na recuperação da locomotiva Baldwin Tem Well nº. 232. O 13º. Batalhão de Polícia Militar e o 3º. Pelotão de Bombeiros Militar contribuem na segurança das expedições técnicas e de eventos realizados pela TREMTUR e a Fundação Cultural de Rio do Sul ocupa uma das estações e mantém amplo acervo histórico e fotográfico da Estrada de Ferro Santa Catarina. O projeto conta com a assessoria do Instituto do Patrimônio Histórico e Arquitetônico Nacional (IPHAN), do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), da SANTUR, da Organização Regional de Turismo (ORT) e do Instituto Brasileiro de Turismo (EMBRATUR) (AMAVI, 2000).
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e a canalização de recursos capazes de materializarem as idéias em projetos técnicos passíveis
de serem aceitos pelos órgãos estaduais e federais competentes.
Dentre os trunfos destacam-se, no projeto TREMTUR, além da parceria regional entre diversas
instituições e os 28 municípios, a parceria entre região do Médio Vale e do Baixo Vale do Itajaí.
Esse diálogo colabora para a busca de soluções conjuntas que minimizem os impactos negativos
da atividade turística. O envolvimento da AMAVI na elaboração e na entrega do Projeto Turístico e
do Projeto de Viabilidade Econômica da TREMTUR habilitou a instituição para tal, mas também
evidenciou fragilidades relacionadas ao trato das questões turísticas no âmbito regional.
Podemos listar problemas de ordem institucional, pois se verifica em grande parte das prefeituras
da região da AMAVI, inexistência de setores afins estruturados, como Secretarias ou Conselhos
de Turismo estruturados sob forma de lei, e ou pessoal habilitado para o trato da questão.
Administrativamente, podemos afirmar que o Turismo vem sendo tratado de forma amadora na
rotina da maioria dos municípios ou, de forma super especializada, na promoção de grandes
eventos por equipes de fora contratadas para tal. Outro aspecto, relacionado ao gerenciamento,
refere-se ao desconhecimento da realidade turística e dos potenciais turísticos dos diferentes
municípios. Os cadastros e levantamentos de dados são incipientes. O desconhecimento do valor
do acervo edificado, ambiental, natural e imaterial, principalmente relacionado com a época de
colonização e com a criação das cidades, compromete o avanço de políticas voltadas à
manutenção e ou valorização dos referidos bens.
Em relação aos aspectos culturais verifica-se na maioria dos municípios, a perda da história viva
não documentada. A convivência com a mistura das raças e a profusão de vários dialetos e
idiomas como o alemão, italiano e o indígena criaram dificuldades para o relato e a documentação
das diferentes histórias que compõem o caldo cultural regional. A falta de documentação do
acervo leva ao desconhecimento da própria história e, permite que se importem estórias e shows
com apelos comerciais, contados de fora para dentro do contexto das cidades. Isso acaba
prejudicando os valores locais, numa ânsia pelo turismo de massa, contabilizado por número de
visitantes e exposições na mídia. O cidadão não se reconhece na maior parte das comemorações
desta natureza, não vive a essência da comemoração e quase sempre só interage política e
momentaneamente com o fato.
Em relação à questão ambiental, o Alto Vale viveu o ciclo da madeira e assistiu nas décadas de
1940 a 1970 ao comprometimento expressivo de sua vegetação. A postura extrativista em relação
ao meio e o convencimento de que o lazer de fato encontra-se na região litorânea, contribui para o
não aproveitamento dos recursos naturais paisagísticos existentes como cênicos. As cidades
crescem de costas para os recursos hídricos que são vistos como veículos de dejetos.
Em síntese, os trunfos se relacionam a uma atuação mais integrada e participativa da AMAVI com
outras instituições e com a comunidade regional e, a incorporação da preocupação com a
dimensão socioambiental. As fragilidades estão associadas à falta de estrutura das prefeituras,
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amadorismo no tratamento do turismo, o desconhecimento do potencial turístico local e regional, a
falta de documentação histórica e valorização da mesma e o descaso ao meio ambiente. A fim de
resolver as fragilidades e estimular os trunfos, “as cidades precisam estabelecer pactos de
desenvolvimento, interligando projetos e ações num pensamento conjunto de parcerias com
ganhos para o todo” (POLEZA, 2001, p. 76). A participação da AMAVI neste projeto sinaliza uma
disposição crescente das instituições nesta direção.
Considerações finais
Este trabalho teve como principal objetivo à análise do papel desempenhado pela AMAVI no
projeto TREMTUR. Para tanto, inicialmente foi feita uma caracterização do Alto Vale do Itajaí, da
AMAVI, do projeto TREMTUR, do turismo no Alto Vale do Itajaí e da atuação da AMAVI junto ao
Projeto. Procurou-se identificar os principais fatores limitantes e, ao mesmo tempo, os possíveis
espaços de manobra direcionados ao planejamento para o desenvolvimento territorial sustentável.
O referencial de análise utilizado, o planejamento para o desenvolvimento territorial sustentável,
está em construção. A contribuição desse trabalho pode ser entendida como o resultado da
dialética entre o enfoque que está sendo construído e a compreensão e análise da realidade com
vistas a intervir nela. No que se refere aos três aspectos relacionados ao planejamento para o
desenvolvimento territorial sustentável, considerados na análise do estudo de caso tem-se as
seguintes considerações a fazer.
No que se refere ao primeiro deles, que o planejamento não deve priorizar uma dimensão
específica, como tem sido historicamente com a dimensão econômica, a atuação da AMAVI no
Projeto TREMTUR foi embasada e tecida em redes que possibilitam de forma prioritária melhorias
locais. Existe a preocupação com a interdependência das várias dimensões do desenvolvimento,
porém a integração de todas as dimensões precisa ser constantemente avaliada.
No segundo aspecto, relativo a importância da participação no processo de planejamento, o
Projeto TREMTUR busca a interação entre diferentes saberes abrindo possibilidades para a
valorização do saber local. Nesse sentido, a participação da AMAVI é fundamental, pois, ela
relaciona o espaço local com o regional e também com escalas espaciais mais amplas. A AMAVI,
durante muitos anos, participou de experiências de planejamento governamentais realizadas “de
cima para baixo” exercitando o fazer. Com a experiência da parceria no Projeto TREMTUR, a
instituição passa a contribuir num processo de planejamento de “baixo para cima”. É a partir da
iniciativa regional que a AMAVI, juntamente com outras instituições, vai articular o projeto
TREMTUR às diferentes escalas de planejamento [local, regional, estadual, nacional].
O terceiro aspecto, atenta para o fato de que o turismo não deve ser considerado o “fim” do
planejamento. Nesse quesito, por ser o Projeto TREMTUR um projeto turístico, não há como fugir
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desse problema. Os aspectos apresentados no Projeto estão condicionados à atividade turística e
se subordinam a ela. Uma possibilidade de mudança seria a inversão desse processo. Esta
consistiria no tratamento do turismo numa perspectiva mais ampla de planejamento territorial.
A partir dessas considerações, podem ser identificadas as margens de manobra para
experimentações com o enfoque de desenvolvimento territorial sustentável. A participação da
AMAVI, em particular, e das instituições e da comunidade regional em geral, a articulação entre as
escalas espaciais de planejamento e a incorporação da dimensão socioambiental. Entretanto, se
os pressupostos do planejamento para o desenvolvimento territorial sustentável fossem levados
em conta, essas preocupações com a dimensão ambiental e com a participação deveriam ser
ampliadas, de modo a favorecer os processos de transformação da estrutura da AMAVI e das
dinâmicas do planejamento do Alto Vale do Itajaí (BUTZKE, 2007).
A atuação da AMAVI no projeto TREMTUR sinaliza um primeiro passo rumo a uma nova postura
institucional frente ao planejamento regional. Esta precisa ampliar de maneira significativa à
compreensão e a ação relacionada ao desenvolvimento territorial, ao papel do turismo nesse
contexto e também ao papel das instituições e das pessoas que vivem na região. Assim, quem
sabe, o turismo passe de “fim” do planejamento a “meio” e se insira numa prática mais integrada
de desenvolvimento, na qual o bem-estar de todos seja o objetivo principal.
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