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DELIBERAÇÃO DO CONSELHO DE ADMINISTRAÇÃO DA
ENTIDADE REGULADORA DA SAÚDE
(VERSÃO NÃO CONFIDENCIAL)
Considerando que a Entidade Reguladora da Saúde nos termos do n.º 1 do artigo 4.º dos Estatutos
da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto exerce funções de regulação,
de supervisão e de promoção e defesa da concorrência respeitantes às atividades económicas na
área da saúde nos setores privado, público, cooperativo e social;
Considerando as atribuições da Entidade Reguladora da Saúde conferidas pelo artigo 5.º dos
Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto;
Considerando os objetivos da atividade reguladora da Entidade Reguladora da Saúde
estabelecidos no artigo 10.º dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22
de agosto;
Considerando os poderes de supervisão da Entidade Reguladora da Saúde estabelecidos no artigo
19.º dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto;
Visto o processo registado sob o n.º ERS/43/2017;
I. DO PROCESSO
I.1. Origem do processo
1. A Entidade Reguladora da Saúde (ERS) tomou conhecimento de uma reclamação subscrita por
S.T., em 3 de janeiro de 2017, a qual versa sobre questões e constrangimentos no
acompanhamento médico prestado no âmbito do programa SIGIC e que envolvem quer o
Hospital Lusíadas Albufeira, estabelecimento inscrito no SRER da ERS sob o n.º 118159 e
detido pela entidade Lusíadas, S.A., entidade inscrita no SRER sob o n.º 13833, quer o Centro
Hospitalar e Universitário do Algarve, E.P.E., entidade inscrita no SRER da ERS sob o n.º
22789.
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2. A referida exposição foi inicialmente tratada em sede do processo de reclamação n.º
REC/268/2017, termos em que, para uma análise preliminar da mesma, em 13 de fevereiro de
2017, foi aberto o processo de avaliação registado sob o número AV/010/2017, no qual foram
realizadas diversas diligências instrutórias.
3. Após o que, face à necessidade de uma intervenção regulatória acrescida, e ao abrigo das
atribuições e competências da ERS, o respetivo Conselho de Administração determinou, por
despacho de 2 de agosto de 2017, a abertura do processo de inquérito em curso.
I.2 Diligências
4. No âmbito da investigação desenvolvida pela ERS, realizaram-se, entre outras, as diligências
consubstanciadas em:
(i) Pesquisa no Sistema de Registo de Estabelecimentos Regulados (SRER) da ERS
relativa ao registo dos prestadores Hospital Lusíadas Albufeira, estabelecimento inscrito
no SRER da ERS sob o n.º 118159 e detido pela entidade Lusíadas, S.A., entidade
inscrita no SRER sob o n.º 13833, e Centro Hospitalar Universitário do Algarve, E.P.E.,
entidade inscrita no SRER da ERS sob o n.º 22789.
(ii) Pedidos de elementos enviados ao Hospital Lusíadas Albufeira e ao Centro Hospitalar
Universitário do Algarve em 27 de março de 2017 e análise das respostas de 13 de abril
e de 24 de maio de 2017, respetivamente;
(iii) Pedidos de elementos ao Hospital Lusíadas Albufeira e ao Centro Hospitalar
Universitário do Algarve em 28 de fevereiro de 2018 e análise das respostas de 20 de
março e de 24 de abril de 2018, respetivamente;
(iv) Relatório de Apreciação Clínica de Perito médico.
II. DOS FACTOS
II.1. Da reclamação da utente
5. Da exposição, subscrita em 21 de dezembro de 2016 e recebida pela ERS em 3 de janeiro de
2017, consta o seguinte:
“[…]
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Após consulta solicitada pela minha médica de família, bem como pela minha médica da
Medicina do Hospital de Faro (que já me segue há vários anos, devido a uma doença auto-
imune) com a finalidade de ser observada pelo departamento da especialidade da
neurocirurgia, na sequência do resultado de uma ressonância magnética, recebi, três anos
e meio depois, uma carta de convocação.
Após o referido tempo de espera para a tal consulta, fui finalmente avaliada na
Neurocirurgia do Hospital de Faro (pela Dr.a L.), e posteriormente fui colocada na lista de
espera para cirurgia, a fim de ser submetida a uma intervenção cirúrgica à coluna
vertebral, em resultado da inserção na lista, e como se três anos e meio não fossem o
suficiente de sofrimento físico e psicológico, ainda tive que esperar outros sete meses, até
receber um vale de cirurgia.
Após receção do Vale de cirurgia, marquei consulta, no Hospital Lusíadas em Albufeira,
com o Dr. G., para o dia 16 de Julho de 2016. Na data marcada para a consulta, fui
recebida pelo Dr. G., tendo duração da consulta sido breve, e ao questionar o Doutor sobre
os riscos da cirurgia em causa, foi-me indicado, como resposta, que "não haveriam riscos
e que a grande maioria dos seus pacientes não apresentam dores após as cirurgias,
recuperando rapidamente".
A cirurgia ficou, então, marcada para o dia 22 de Julho de 2016 no referido Hospital
Lusíadas. Na semana posterior à consulta fui chamada para efectuar análises, radiografia,
ECG e para ser analisada por um anestesista no mesmo hospital. Fui internada, como
previsto, no dia 22 de Julho e operada no mesmo dia ao fim da tarde.
Após a cirurgia, o Dr. G. informou-me, de forma rápida, que correu tudo bem. Na manhã do
dia seguinte fiz um TC, sendo importante referir que a sua realização, bem como a análise
do mesmo pelo Dr. G., demoraram breves instantes.
Queixei-me, frequente e constantemente, que tinha dores muito fortes na parte esquerda -
incluindo zona lombar e toda a perna, dores ciáticas, formigueiro, partes da perna sem
sentimento (por exemplo nos dedos do pé) e fortes "choques eléctricos". Indiquei todas
estas queixas à equipa de enfermagem que estava de serviço, bem como ao Dr. G..
Mesmo assim, e menosprezando o quadro clinico por mim apresentado, e estando eu
praticamente incapaz de me manter em pé, deu-me alta no dia seguinte (24 de Julho
2016).
Foi-me ministrado, por receita médica subscrita pelo Dr G., Brufen 400 mg (2 vezes por
dia) e Paracetamol íg PO em SOS (de 8 em 8 horas), com a indicação de que não me
deveria sentar durante pelo menos 10 dias, deveria fazer repouso e só me poderia levantar
para ir à casa de banho. Como o hospital não tem transporte de ambulância fui
transportada no banco traseiro, deitada, num carro particular para casa. A viagem de
Albufeira até à minha casa, em Salir, foi insuportável, em virtude das dores.
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As dores não melhoraram e os sintomas da perna esquerda ficaram cada vez piores. Por
isso, entre a data da alta, dia 24 de Julho, e o dia 29 de Julho fui transportada várias vezes
até ao Hospital Lusíadas de Albufeira.
Uma vez pela INEM, que o meu filho de 15 anos teve que chamar, e as restantes vezes
com um carro particular porque a INEM normalmente não faz transportes para hospitais
privados. Outras entidades, tais como os Bombeiros Voluntários, a Cruz Vermelha, etc.
nunca tiveram disponibilidade para efectuar o transporte, mesmo após solicitação. As
viagens de minha casa para o hospital foram sempre um autêntico pesadelo, em virtude
das dores, e o tratamento ministrado nunca foi melhor. Fui sempre assistida nas Urgências
do Hospital referido, só com medicação por injecção ou medicação intravenosa, tendo alta
de novo após umas horas. Nunca foram feitos quaisquer exames/controlos médicos, nem
nunca fui vista por um neurocirurgião ou pelo próprio Dr. G. Ouvi comentários como 'isso é
normal após uma cirurgia dessas' ou 'a senhora tem que ter paciência, isso já passa', e
recebi novas receitas com mais medicações contra as dores, que nunca chegaram a fazer
efeito, nenhum, ou durante mais de meia hora.
No dia 29 de Julho de 2016, telefonei novamente para o hospital referido, queixando-me
que não apresentava melhorias, e queria ser vista pelo neurocirurgião que havia feito o
acompanhamento da cirurgia, ao que me informaram que o Dr. não estava disponível,
encontrando-se em Lisboa, e que só estaria novamente disponível no dia 6 de Agosto de
2016. Insisti com o funcionário, e este mesmo disse para eu me apresentar no dia
seguinte, dia 30 de Julho, no hospital, uma vez que o Dr. [JC] (o segundo neurocirurgião,
que me operou em conjunto com o Dr. ) dava consultas e podia-me ver.
No referido dia 30/07/16, mais uma viagem até ao hospital, o que significou novamente
dores insuportáveis e, na verdade, tempo e dinheiro desperdiçados. O Dr. [JC] observou-
me brevemente e dobrou a minha perna esquerda de tal maneira, que até o meu filho, na
sala de espera, me ouvisse a gritar. Disse-me que iria falar com o Dr. e que este iria entrar
em contacto comigo com brevidade.
O Dr. [JC] disse também à enfermeira de serviço que poderia tirar todos os agrafos (15)
justificando-se com o bom aspecto que a cicatriz tinha (7 dias após a operação...). Recebi
também mais uma receita com mais um remédio que, novamente, não serviu para nada,
uma vez que não me tirou as dores.
No fim do dia 31 de Julho, liguei mais uma vez para o hospital, já que as minhas dores
insustentáveis eram tão grandes que não me aguentava mais, e estava a entrar em
colapso físico e psicológico, com as circunstâncias descritas, do meu ponto de vista,
inadmissíveis, e, adicionalmente, pela falta de uma resposta do Dr.
Em conversa com o Hospital, prometi ligar ao meu advogado e fazer este caso público.
Após o término desta chamada recebi, menos do que 15 minutos depois, uma resposta do
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hospital. O encarregado da tarefa ordenou, de forma antipática e bruta, que me
apresentasse no dia seguinte (1 de Agosto) logo de manhã no hospital.
Passando estes dias de verdadeiro horror, perdi sete quilos de peso, ficando praticamente
incapaz de andar, manter-me em pé ou ficar sentada. Chegámos de manhã, no dia 1 de
Agosto de 2016, à hora indicada, ao dito hospital. Na recepção avisei que, por indicação
médica, estava proibida de ficar sentada (e nem podia, pois era uma posição
humanamente impossível de suportar) não tendo naquele momento forma de me aguentar
em pé, ninguém no atendimento se preocupou com este facto, e disseram-me
simplesmente para esperar na sala de espera.
Após algum tempo em pé, não me aguentei mais e, por isso, para não desmaiar, deitei-me
em três cadeiras plásticas existentes na dita sala de espera. Obviamente que alguém só se
considera deitar-se em cadeiras desconfortáveis quando se sente, de facto, muito mal. De
repente, chegou o Dr. , que começando a gritar comigo, desrespeitosamente, exclamou
que tal lugar não era uma zona para se deitar. Na frente de todos os presentes,
funcionários e pacientes, o agora mais autoritário e incivilizado Dr. , ordenou-me segui-lo
até ao seu gabinete. Este encontrava-se no lado oposto da sala de espera e eu quase que
não me conseguia mexer. Todo o comportamento perante mim era antipático, impaciente,
indelicado e inadequado.
Disse-me, unicamente, que seria readmitida no Hospital, fez uma chamada telefónica, e
apareceu uma não me aguentava sentada, virou-se para a funcionária e disse, clara e
expressivamente: "Então que vá a pé".
Sempre (em todas as minhas deslocações a este hospital) fui acompanhada por um ou
mais familiares que, infelizmente, tiveram que ouvir e assistir a todas estas reações e
comportamentos imprudentes.
Um comportamento vergonhoso de um médico da medicina humana!
Mesmo após o internamento não me foram feitos exames complementares de diagnóstico,
apenas recebi mais medicação via intravenosa, que não aliviaram de forma alguma as
dores. Tive que esperar até ao fim do dia seguinte, dia 2 de Agosto, para ser sujeita
novamente a intervenção cirúrgica à coluna.
Após a segunda cirurgia, recebi uma explicação do Dr. sobre as dores insuportáveis que
apresentava, aparentemente um osso partiu-se durante a primeira cirurgia, e estaria a
"esmagar" o nervo da perna esquerda, causando as dores que senti desde o dia 23 de
Julho de 2016. Perguntei-lhe, então, se tinha tido razão para as queixas repetidamente
apresentadas ao Hospital durante todo o tempo decorrido até à segunda cirurgia, sendo a
sua reposta breve e simples: "Sim", com um ar sorridente.
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Mesmo após a segunda cirurgia, os sintomas de formigueiro, sentimento de partes
dormentes nas pernas e outras mantiveram-se, referindo esse facto ao Dr. , que me disse,
de forma desleixada, que isso logo passaria e que era normal.
Tive um "colapso/crise" no dia 4 de Agosto de 2016, com fortes dores no peito, estômago e
mal estar geral, que ninguém da equipa de serviço soube explicar.
Recebi alta no dia 6 de Agosto de 2016, mantendo queixa de dores na perna, e saí
medicada com Nolotil em SOS (8 em 8 horas).
No dia 7 de Agosto, já em casa, o meu filho teve que chamar de novo o INEM, por efeito
de uma crise igual à vivida no hospital no dia 4 de Agosto, com os mesmos sintomas. Fui
transportada até ao Centro de Saúde de Loulé, onde recebi tratamento intravenoso e
prescrição de remédios para o estômago.
No dia 9 e 11 de Agosto mudei o penso no Hospital Lusíadas em Albufeira, continuando
com queixas de dores na perna. No dia 13 de Agosto pedi para ser vista de novo pela
equipa da neurocirurgia devido às dores fortes.
O Dr. [JC] disse-me que as dores eram normais porque a minha coluna estava, passo a
citar, "muito estragada". Passou-me mais uma receita, desta vez Morfina. Como eu estava
impossibilitada de o fazer, era normalmente um familiar que ia à farmácia comprar os
remédios prescritos. Desta vez, como se tratava de Morfina, não venderam o remédio em
causa ao meu pai porque a receita não estava devidamente preenchida pelo médico. No
campo da entidade responsável estava escrito: "Sem comparticipação p/SNS".
Pergunto-me como é que isso pode acontecer se eu sou uma paciente beneficiada por um
vale de cirurgia do Hospital de Faro, e o Hospital Lusíadas tem em posse todo o meu
processo clínico, juntamente com todos os meus dados pessoais, incluindo o n° de
segurança social, n° de utente do serviço nacional de saúde, etc.
Só nesta altura percebi que vinha a pagar mais do que deveria pelos remédios
anteriormente prescritos, pois as receitas estavam todas incorrectamente preenchidas, nos
termos supra referidos. Mas o pior foi que tivemos que voltar a Albufeira para ser feita uma
nova receita com os meus dados correctos. Falei com uma das secretárias do hospital que
lamentou muito esta situação, e que não sabia como isto poderia ter acontecido.
Voltei ao hospital no dia 16 e 18 de agosto de 2016 para me ser retirado, em cada um dos
referidos dias, metade dos pontos.
No dia 20 de Agosto de 2016 tive novamente uma breve consulta com o Dr. , confrontei-o
com a contínua existência de dores, queixando-me, mais uma vez. Porém, recebi como
resposta: "Está tudo bem e, como tal não são necessários mais exames e pode fazer a sua
vida normalmente." O Dr. entregou-me, adicionalmente, uma carta para a minha médica de
família com o intuito de marcar consulta de Fisiatria e as posteriores sessões de
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fisioterapia. Ao referir as receitas incorrectamente preenchidas, disse-me que a secretária
trataria desse assunto. No fim da consulta desejou-me "Boa Sorte!"
Ao sair do gabinete, falei com a secretária sobre as referidas receitas, afirmando que não
era ela que poderia resolver o assunto, mas sim o Doutor. Entreguei-lhe todas as receitas
em causa, pedindo que fossem refeitas para puder receber a diferença do preço dos
remédios que paguei a mais. Disse-me que as deixaria na pasta do Dr. .
Tentei ter uma consulta com a minha médica de família, mas não haviam marcações
possíveis. Teria, por isso, que me dirigir até ao respectivo Centro de Saúde de manhã,
para tentar obter uma vaga. Acabei por não o fazer. Derivado ao meu estado de saúde,
isso não era possível, uma vez que significaria longas horas de espera e, por isso, marquei
uma consulta num hospital privado. 0 Fisiatra precisava de ver o TC pós-cirúrgico para
poder avaliar a minha situação em relação à fisioterapia necessária. Como não tinha uma
cópia do TC dirigi-me, mais uma vez, até ao Hospital Lusíadas.
Inicia-se, então, mais um intervalo de tempo gasto e completamente desnecessário, que
complementa todo este ciclo prescindível e repetitivo.
A secretária disse que a carta de pedido de Fisiatria não me deveria ter sido entregue.
Supostamente, o Dr. devia ter entregue a carta à funcionaria, que teria, como função,
enviá-la para o Hospital de Faro, correspondendo este ao processo correto. Esta
confessou, também, que o Dr. deveria estar a par deste procedimento.
Com o objectivo de ser reembolsada o mais rápido possível - devido ao prazo de entrega -
perguntei pelas minhas receitas, as quais o Dr. estava encarregue de actualizar. A senhora
procurou-as, não as encontrando, inicialmente. Como forma de confirmação, procurou na
pasta do Dr. , onde ainda se encontravam as mesmas, com uma anotação da secretária
para serem refeitas. Evidentemente, o Dr. não cumpriu o seu dever, estando eu,
novamente, penalizada, em não receber o meu reembolso.
Entretanto, falei com o mesmo Fisiatra privado que me aconselhou a iniciar as sessões de
fisioterapia o mais breve possível. Com todo este atraso, tive que pagá-las por conta
própria.
Através de um questionário que recebi do UHGIC, que devolvi devidamente preenchido,
queixei-me, obviamente, do péssimo atendimento e tratamento que recebi. Tendo alta, e
em face das queixas apresentadas de dores e dormência na perna, o meu processo foi,
aparentemente, reaberto no Hospital Lusíadas em Albufeira, uma vez que recebi uma
chamada do mesmo, convocando-me para uma nova consulta com o Dr. no dia 17 de
Setembro. A consulta foi curta e o Dr. pediu um novo TC que efectuei no dia 21 de
Setembro.
Foi durante uma consulta, no dia 6 de Outubro, que o Dr. viu este exame e disse-me que
estava tudo muito bem. Eu disse-lhe que estava com as mesmas dores, tendo, por isso,
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problemas em dormir, em andar, em me sentar ou em estar de pé. A resposta dele foi que
isso ainda poderia levar muito tempo (até meses) para passar, se passasse. Até que fez o
comentário que há pessoas que já tiveram um nervo comprimido durante muito mais tempo
do que eu. Posso apenas sublinhar a indecência do Dr. e a sua imoralidade em se atrever
a afirmar algo do género. Para que fique claro, foi o próprio Dr. que provocou esta situação
do nervo esmagado, uma vez que eu não apresentava quaisquer queixas na perna
esquerda antes da I a operação. Outro conselho (se é que se pode chamar conselho) foi o
de que eu deveria "começar a fazer desporto, por exemplo andar de bicicleta, nadar,
correr", etc. Para já eu nem era capaz porque não estava/estou em condições físicas que o
permitam, e o doutor da Fisiatria disse que eu apenas podia fazer fisioterapia. Na saída do
consultório, o Dr. disse-me "Esperemos que melhore" - estando a ser, claramente,
sarcástico, uma vez que me disse, várias vezes, que estava tudo "muito bem" comigo.
No dia 7 de Novembro 2016 tive uma consulta de neurocirurgia no Hospital de Faro.
Estava muito contente porque esperava uma segunda opinião sobre toda esta minha
situação, pois supus que seria com a Dra L.. Infelizmente, e para meu grande desgosto,
esta consulta foi realizada por um membro da equipa que me operou no Hospital Lusíadas
de Albufeira, o Dr. JPC, que ordenou, em virtude de ora ser superior hierárquico da Dra L.,
que o processo passasse para si. 0 resultado desta consulta, que demorou escassos dois
minutos, foi a marcação de uma nova consulta para o dia 6 de Fevereiro de 2017. Este,
não estando eu à espera de uma resposta mais cooperativa e respeitadora, não perguntou
pelos remédios que estou a tomar, nem se preocupou com o facto de eu não estar melhor.
Também não quis saber de novos exames, como por exemplo uma electromiografia ou
uma ressonância magnética, para averiguar o estado de lesão do nervo da perna
esquerda. Isto apenas demonstra a sua parcialidade, reforçando a minha perda de
confiança nestes dois médicos, os quais não quero que me sigam futuramente, em virtude
do supra descrito. Este médico, recusou-se a prescrever a realização de quaisquer outros
exames de diagnóstico, tendo no relatório da ultima consulta, feito constar, alegadamente,
e segundo informação prestada verbalmente pelos serviços do Hospital de Faro, que o
meu estado era estável e sem queixas, quando na realidade todo o meu quadro clinico se
mantém como supra descrito. A minha primeira consulta da neurocirurgia no Hospital de
Faro foi realizada pela Dr.a L. e, se fosse possível, gostaria que fosse esta a seguir-me no
futuro, em face do supra exposto.
Obviamente, obtive uma segunda opinião de um outro neurocirurgião privado. Este sugeriu
que fosse feita uma electromiografia, que se pode realizar 3 meses após a cirurgia, para
avaliar o nervo, bem como uma ressonância magnética porque estou com mais dores na
zona lombar do que antes das cirurgias efectuadas. Assim como muitos outros
profissionais envolvidos neste caso, também este dizia que deixar sofrer-me e passar por
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um autêntico pesadelo durante 11 dias é absolutamente inaceitável. O Dr. devia ter
utilizado outros meios de diagnóstico para averiguar a causa das minhas dores
insuportáveis, ao invés de me 'encher' unicamente com medicação que não fez efeito
nenhum. Pior ainda são as sequelas médicas pós-operatórias descritas que podiam ter
sido evitadas ou minimizadas (com a atempada realização de outros meios de diagnósticos
ou outro tipo de tratamento).
Infelizmente, até à data, ainda não melhorei e o prognóstico é uma incógnita.
Não consigo andar, estar em pé, sentada, ou deitada durante muito tempo. Tenho que
mudar sempre a minha posição. Durante a noite levanto-me, frequentemente, para aliviar
as dores, ainda não recuperei o meu peso e apresento, devido aos remédios que tenho
que tomar, grandes problemas de estômago.
Sou chefe de família, de uma família monoparental, com um filho menor a cargo e, não
sendo já o suficiente viver nos dias que correm martirizada por dores físicas, juntam-se
também as psíquicas, pois não posso trabalhar neste estado, provocando um futuro
incerto, e a retoma de uma vida normal uma incógnita.
[…]”.
6. Numa primeira resposta à utente, de 16 de janeiro de 2017, o Hospital Lusíadas Albufeira
remeteu a seguinte informação, assinada pelo Dr. G.:
“[…]
Foi submetida a cirurgia em 22/07/2016 […]. Não se registaram complicações intra
operatórias. A doente iniciou levante no dia seguinte, com quadro de lombalgia residual,
sem irradiação para os membros inferiores. Realizou TAC da coluna lombosagrada em
23/07/2016, que revelou material de artrodese corretctamente colocado (intraósseo), sem
compromisso radicular, invasão do canal lombar ou outras alterações relevantes, tais como
hematoma da loca cirúrgica.
A doente teve alta com lombalgia residual, referindo dor ligeira no membro inferior direito,
pelo que foi medicada com analgésicos. Não referia dor irradiada ao membro inferior
esquerdo e mantinha as parestesias no pé esquerdo.
Recorreu ao serviço de atendimento permanente do Hospital Lusíadas Albufeira, por dor
lombar irradiada ao membro inferior direito, pelo que foi revista a terapêutica analgésica e
anti-inflamatória e fez corticoide intra muscular. A cicatriz operatória não revelava sinais
inflamatórios ou exsudado. Retirou agrafos cerca de 10 dias após a cirurgia, com
cicatrização completa da ferida operatória.
Por persistência das queixas álgicas foi proposto à doente internamento hospitalar para
realizar terapêutica analgésica e anti-inflamatória EV durante alguns dias, tendo recusado
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e optado por fazer a mesma em ambulatório. Por persistência das queixas álgicas, foi
proposta para cirurgia, que aceitou. Foi informada do procedimento cirúrgico e potenciais
complicações, tendo assinado o respectivo consentimento informado.
Foi reoperada em 1 de agosto de 2016, sem necessidade de revisão do material de
artrodese, uma vez que não se objectivou qualquer compreensão radicular evidente, tal
como o TAC realizado no pós operatório confirmava; optou-se por alargar as
foraminotomias, por existência de edema radicular moderado, mas mais marcado à direita.
No pós operatório, observou-se regressão completa do quadro de ciatalgia direita, com
persistência das parestesias do pé esquerdo. Realizou TAC da coluna lombosagrada, em
21/09/2016, que não revelou alterações relevantes.
A doente foi referenciada à consulta de Fisiatria, tendo iniciado reabilitação, com boa
evolução, segundo testemunho da mesma.
Foi reavaliada periodicamente em consulta de Neurocirurgia no Hospital Lusíadas
Albufeira. Não apresentava alterações ao exame neurológico, com marcha sem alterações
e com sinal de Lassègue negativo. Mantinha quadro de lombalgia residual, em franca
evolução positiva com a reabilitação física. Não se observou qualquer evolução nos
sintomas sensitivos do pé esquerdo.
Em 28/10/2016 foi reavaliada em consulta de Neurocirurgia. Apresentava dor moderada
irradiada ao membro inferior esquerdo ocasional, sem limitações funcionais evidentes, com
sinal de Lassègue negativo. Por vontade expressa da doente, foi transferida para o
Hospital de Faro, no sentido de manter a reabilitação, por ser mais próxima da sua área de
residência evitando, assim, as deslocações a Albufeira.
De salientar que todas as consultas e internamentos de Neurocirurgia realizadas no
Hospital Lusíadas Albufeira decorreram sempre em ambiente cordial, nunca tendo a
doente manifestado qualquer desagrado com qualquer situação. Foi sempre informada da
evolução da sua situação clínica que, no meu entender, foi a habitual neste tipo de
patologia.
A presente reclamação constitui, assim, uma surpresa, após o tratamento de uma doente
com patologia complexa da coluna lombo-sagrada, em que o resultado final dificilmente é a
cura completa, tal como a doente foi informada na consulta pré operatória, quando da
assinatura do consentimento informado para os procedimentos a que foi submetida.
Relativamente aos juízos de valor que são tecidos relativamente à minha pessoa, quanto
ao meu comportamento ético e deontológico, uma vez que saem da esfera técnica, serão
tratados, também, noutra instância.
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[…]”.
7. Nessa sequência, e já em sede de processo de avaliação, foi remetido ao Hospital Lusíadas
Albufeira (HLA), em 27 de março de 2017, o seguinte pedido de elementos adicionais:
“[…]
1. Se pronunciem sobre todo o conteúdo da reclamação remetida à ERS e forneçam
esclarecimentos adicionais que entendam relevantes sobre a situação da utente;
[…]
3. Enviem cópia de regulamento/protocolo/procedimento vigente em matéria de
procedimento cirúrgico, em especial, sobre acompanhamento/seguimento pós-
operatório;
4. Informem sobre os meios de que o hospital dispõe para transporte não urgente de
utentes e procedimentos em vigor nesse domínio, juntando documentos comprovativos;
5. Informem os motivos para o facto de, em nenhuma das ocasiões em que a utente se
teve que deslocar entre o seu domicílio e o hospital, e alegadamente apresentando a
mesma graves e insistentes dores, tais meios de transporte terem sido acionados;
6. Pronunciem-se sobre o facto de constar das prescrições médicas (na sequência de
consulta de dia 13 de agosto de 2016) emitidas à utente a menção “Sem compartição
para SNS”, juntando cópia das mesmas;
7. Informem detalhadamente sobre os procedimentos em vigor relativamente à
solicitação de consultas em entidades hospitalares terceiras, e os motivos para o
médico Dr. G. não os ter seguido, conforme V. Exas. informaram;
8. Envio de cópia do mapa de pessoal afeto a Neurocirurgia e horários de permanência
do mesmo nas V/ instalações;
9. Confirmem, a que título e em que termos, o Dr. JPC presta serviços médicos à V/
instituição (juntando documento comprovativo);
10. Se pronunciem sobre o facto de o Dr. JPC ter acompanhado a utente quer em
consultas no V/ Hospital, quer, posteriormente, no Hospital de Faro;
11. Indiquem se, no entretanto, a utente foi mais alguma vez atendida nas V/
instalações e, em caso afirmativo, informem da sua situação clínica;
12. Quaisquer outros esclarecimentos complementares julgados necessários e
relevantes para a análise do caso concreto. […]”.
8. Por resposta rececionada em 11 de abril de 2017, o HLA prestou os seguintes esclarecimentos:
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“[…]
1. Não temos mais informações a acrescentar sobre o conteúdo da reclamação
remetida […], para além do já enviado no passado dia 17.01.2017.
2. O processo clínico completo da Sra. D. ST foi por nós enviado para a Ordem dos
Médicos, instituição que tem incumbências específicas nesta matéria, e que nos
solicitou o mesmo […][…]
3. Concretamente quanto aos protocolos dos procedimentos cirúrgicos, os mesmos
dependem da patologia a tratar, e a evolução clínica, pós-procedimento cirúrgico,
determina o seguimento pós-operatório.
4. O Hospital Lusíadas Albufeira, à semelhança da maioria das unidades hospitalares,
dispõe dos meios existentes, na comunidade, para transporte não urgente de doentes.
Recorre aos serviços dos Bombeiros Voluntários ou da Cruz Vermelha Portuguesa.
Pontualmente, e de acordo com a situação clínica dos doentes, utiliza outras empresas
de transporte de doentes, mas de forma esporádica e programada.
5. Os meios indicados nunca foram acionados, tão simplesmente, porque a doente em
causa em momento algum o solicitou, tendo-se deslocado para o Hospital Lusíadas
Albufeira e do Hospital Lusíadas Albufeira, sempre, em transporte familiar.
6. Não nos é possível confirmar nem negar tal afirmação, sendo certo que apenas
conseguimos supor que, a ter ocorrido essa situação, a mesma se poderá dever a
alguma falha de ligação ao servidor do SPMS. Contudo, o sistema de RSP não permite
a emissão de uma cópia de uma receita previamente emitida, pelo que essa
documentação terá de ser solicitada à própria Sra. D. ST.
7. Nos doentes operados ao abrigo do Programa SIGIC, as consultas a “entidades
terceiras”, supondo que se pretendem referir ao Hospital de Origem, são tratadas como
um procedimento administrativo, e efetuadas através da plataforma informática própria
do SIGIC, o que, no caso em apreço, aconteceu.
Por esse motivo, a Sra D. ST foi transferida para o CHA-Faro, e realizou fisioterapia
através de pedido efetuado na dita plataforma.
8. Informamos que no Hospital Lusíadas Albufeira colaboram, na especialidade de
neurocirurgia, os Srs. Drs. G. e JPC.
9. O Sr. Dr. JPC colabora com o Hospital Lusíadas Albufeira desde 01.04.2015 –
Declaração dos Recursos Humanos em anexo.
13
10. O Sr. Dr. JPC observou a doente no Hospital Lusíadas Albufeira, no dia 30.07.2016.
Relativamente à circunstância de a doente também ter sido observada no Hospital de
Faro pelo mesmo Dr. JPC, tal certamente se deverá ao facto de, em Julho de 2016, a
pedido expresso do Sr. Ministro da Saúde, o referido médico ter assumido a Direção do
Serviço de Neurocirurgia desse Hospital, o qual, em pleno Verão, ficou sem Direção e
sem Urgência, conforme foi largamente difundido, ao tempo, pela Comunicação Social.
[…]”.
9. Também em 27 de março de 2017 foi enviado ao CHUA um ofício com o seguinte pedido de
elementos:
“[…]
1. Se pronunciem sobre o teor da reclamação remetida à ERS e forneçam
esclarecimentos adicionais que entendam relevantes sobre a situação da utente, quer em
matéria de agendamento da primeira consulta de especialidade, quer em matéria de
realização de cirurgia, tendo presente os TMRG legalmente definidos no Anexo I da
Portaria n.º 87/2015, de 23 de março;
2. Relativamente à consulta realizada, indiquem os seguintes elementos
acompanhados do respetivo suporte documental:
a) Data do pedido de marcação de consulta pelo médico de família, com cópia do registo
respetivo, extraído do ALERT P1;
b) Data da realização da triagem, com cópia do registo respetivo, extraído do ALERT P1, e
a prioridade atribuída ao pedido de primeira consulta de especialidade hospitalar, com
cópia do registo respetivo, extraído do ALERT P1;
c) Data da marcação e data da realização da consulta, com cópia do registo respetivo,
extraído do ALERT P1;
3. Confirmem, a que título e em que termos, o Dr. JPC presta serviços médicos à V/
instituição (juntando documento comprovativo);
4. Se pronunciem sobre o facto de o Dr. JPC ter acompanhado a utente quer em
consultas no Hospital Lusíadas, quer, posteriormente, no V/ Hospital;
5. Informação sobre se a utente terá sido informada das alternativas existentes no SNS
para acompanhamento da sua situação clínica e, no caso afirmativo, indicação dos meios
de comunicação utilizados para esse fim e das respetivas datas, bem como identificação
dos profissionais de saúde envolvidos.
14
6. Quaisquer outros esclarecimentos complementares julgados necessários e
relevantes para a análise do caso concreto.
[…]”.
10. Por ofício recebido em 24 de maio de 2017, veio o prestador transmitir os seguintes
esclarecimentos, os que vêm assinados pelo próprio Dr. JPC:
“[…]
- O Dr. JPC é o Diretor do Serviço de Neurocirurgia do Centro Hospitalar do Algarve.
Relativa ao ponto 4:
- O Dr. JPC quando estava num sábado a fazer consulta externa no Hospital dos Lusíadas,
foi-lhe pedido que observasse como urgente uma doente do Dr. G. e o Dr. JPC cumpriu o
seu dever deontológico e não recusou a doente.
Posteriormente viu a doente no Hospital de Faro, por lapso uma vez que era doente da
Dr.ª L. e foi posteriormente reencaminhada para a Dr.ª L..
Relativamente ao ponto 6:
- A doente tem TAC do dia seguinte à cirurgia que mostra material correctamente
colocodo, sem fracturas e sem compressões nervosas. Contradiz as suas afirmações.
A doente na consulta com a Dr.ª L. em Março de 2017 tinha electromiograma que exclui
lesão de raiz nervosa.
Ou seja a doente tem exames de imagem e de função que inequivocamente excluem
lesões dos nervos que a doente afirma ter.
[…]”.
11. Por ofício de 28 de fevereiro de 2018, foi enviado novo ofício ao CHUA, com o seguinte teor:
“[…]
Em face do exposto, solicita-se a V. Ex.as., ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 31.º
dos Estatutos da ERS, aprovados pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto, que se
pronunciem sobre o facto de a utente em causa ter referido o seguinte:
“No dia 7 de Novembro 2016 tive uma consulta de neurocirurgia no Hospital de Faro.
Estava muito contente porque esperava uma segunda opinião sobre toda esta minha
situação, pois supus que seria com a Dra. L.. Infelizmente, e para meu grande desgosto,
esta consulta foi realizada por um membro da equipa que me operou no Hospital Lusíadas
de Albufeira, o Dr. JPC, que ordenou, em virtude de ora ser superior hierárquico da
Dra. L., que o processo passasse para si.
15
[…]”.
12. Por resposta rececionada em 24 de abril de 2018, o CHUA prestou os seguintes
esclarecimentos:
“[…]
Assim, para um total e cabal esclarecimento dos factos alegados pela Utente, foi requerida
a colaboração do Dr. AC, Diretor do Departamento Cirúrgico deste Centro Hospitalar, o
qual em sede de auditoria interna, e mediante consulta do processo clinico, concluiu que à
utente foram prestados os cuidados de saúde adequados, em conformidade com a legis
artis mantendo tratamento clínico e custódia terapêutica, com seguimento actual em
Neurocirurgia, Medicina Física e de Reabilitação e Consulta da Dor, conforme melhor se
apreende do relatório elaborado pelo mesmo, que se anexa e se dá por integralmente
reproduzido para todos os efeitos legais. (Doc. 1).
Da análise efetuada, concluiu ainda, o Dr. AC, que não constar nos registos clínicos,
declarações dos profissionais ou nas peças documentais, qualquer anotação que revele
conduta motivadora de reparo ou censura, mantendo a utente confiança institucional,
demonstrada por recentes cirurgias à vesícula biliar e ao joelho direito, com benefícios
evidentes”.
13. Também por ofício de 28 de fevereiro de 2018, foi o Hospital Lusíadas Albufeira interpelado no
seguinte sentido:
“[…]
1. Envio de cópia de regulamentos/procedimentos vigentes em matéria de procedimento
cirúrgico e pós-cirúrgico, nomeadamente, aqueles que enquadram a cirurgia realizada à
utente em causa;
2. Confirmação de que o Dr. JPC foi o segundo neurocirurgião, juntamente com o Dr. G., a
operar a utente no V/ Hospital no âmbito da emissão de Vale Cirurgia;
3. Quaisquer outros esclarecimentos complementares julgados necessários e relevantes
para a análise do caso concreto.
[…]”.
14. Em 20 de março de 2018, o HLA enviou a seguinte informação:
“[…]
1. Conforme solicitado […], junto se envia a Política “Cirurgias no Local da Intervenção
Correto, Procedimento Correto, no Cliente/Utente Correto”, em vigor no Grupo Lusíadas
Saúde.
16
2. Não é consentâneo com a realidade afirmar que o Sr. Dr. JPC colaborou como segundo
neurocirurgião nas intervenções cirúrgicas da paciente ST
3. O que aconteceu foi que, na 2ª intervenção cirúrgica ocorrida no dia 08-02-2016,
considerando a incongruência entre as queixas apresentadas pela doente, o exame clínico
e os exames de imagem, o cirurgião, Sr. Dr. GNA, solicitou em benefício da doente, apoio
ao Sr. Dr. JPC que se encontrava também no Algarve, na data desta segunda intervenção
cirúrgica, a fim de obter intraoperatoriamente uma outra opinião técnica acerca do
procedimento que se iria realizar.
4. Assim, o Dr. JPC não atuou na cirurgia. Numa atitude ética e deontologicamente
louvável e sem auferir quaisquer tipo de honorários, disponibilizou-se, repete-se, em
benefício da doente, a prestar o apoio técnico que fosse necessário ao seu Colega.
5. Mais informamos que não há qualquer outro esclarecimento adicional para além do já
prestado […].
[…]”.
15. Ouvido o Perito médico, este pronunciou-se nos seguintes termos:
“[…]
Na eventualidade de os dois elementos referidos terem ligação e participado na
intervenção, esta situação configura uma violação do Regulamento do SIGIC, que impede
que médicos com ligação contractual ao Hospital de Origem, participem nas intervenções
realizadas no Hospital de Destino, de doentes com origem no mesmo Hospital, o que
parece ter sido o caso.
Sugiro igualmente que a Ordem dos Médicos, aliás como já parece ser o caso, por parte
da informação remetida pelo Hospital dos Lusíadas, tome conhecimento do processo, para
avaliação por pares.
Problemas identificados
Composição da equipa cirúrgica que participou na intervenção.
Adequação dos cuidados pós-operatórios à doente que me pareceram menos adequados.
[…]”.
17
III. DO DIREITO
III.1. Das atribuições e competências da ERS
16. De acordo com o n.º 1 do artigo 5.º dos Estatutos da ERS, esta tem por missão “[…] a
regulação da atividade dos estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde.
17. Ainda, de acordo com o disposto no n.º 2 do artigo 5.º dos seus Estatutos, as atribuições da
ERS compreendem “[…] a supervisão da atividade e funcionamento dos estabelecimentos
prestadores de cuidados de saúde no que respeita:
[…] b) À garantia dos direitos relativos ao acesso aos cuidados de saúde, à prestação de
cuidados de saúde de qualidade, bem como dos demais direitos dos utentes;
c) À legalidade e transparência das relações económicas entre os diversos operadores,
entidades financiadoras e utentes.”.
18. Sendo que estão sujeitos à regulação da ERS, nos termos do n.º 2 do artigo 4.º dos seus
Estatutos, “[...] todos os estabelecimentos prestadores de cuidados de saúde, do setor público,
privado, cooperativo e social, independentemente da sua natureza jurídica, nomeadamente
hospitais, clínicas, centros de saúde, consultórios, laboratórios de análises clinicas,
equipamentos ou unidades de telemedicina, unidades móveis de saúde e termas”.
19. Consequentemente, o Hospital Lusíadas Albufeira é um estabelecimento inscrito no SRER da
ERS sob o n.º 118159 e detido pela entidade Lusíadas, S.A., entidade inscrita no SRER sob o
n.º 13833.
20. Por sua vez, o Centro Hospitalar Universitário do Algarve, E.P.E. é uma entidade inscrita no
SRER da ERS sob o n.º 22789.
21. No que se refere ao objetivo regulatório previsto na alínea b) do artigo 10.º dos Estatutos da
ERS, de assegurar o cumprimento dos critérios de acesso aos cuidados de saúde, a alínea a)
do artigo 12.º do mesmo diploma legislativo estabelece ser incumbência da ERS “ assegurar o
direito de acesso universal e equitativo à prestação de cuidados de saúde nos serviços e
estabelecimentos do Serviço Nacional de Saúde (SNS), nos estabelecimentos publicamente
financiados, bem como nos estabelecimentos contratados para a prestação de cuidados no
âmbito de sistemas ou subsistemas públicos de saúde ou equiparados, acrescentando a alínea
b) do mesmo artigo o dever de “prevenir e punir as práticas de rejeição e discriminação
infundadas de utentes nos serviços e estabelecimentos do SNS, nos estabelecimentos
18
publicamente financiados, bem como nos estabelecimentos contratados para a prestação de
cuidados no âmbito de sistemas ou subsistemas públicos de saúde ou equiparados”.
22. Podendo fazê-lo mediante o exercício dos seus poderes de supervisão, consubstanciado no
dever de “zelar pela aplicação das leis e regulamentos e demais normas aplicáveis às
atividades sujeitas à sua regulação, no âmbito das suas atribuições”, bem como na emissão de
ordens e instruções, ou recomendações e advertências individuais, sempre que tal seja
necessário, sobre quaisquer matérias relacionadas com os objetivos da sua atividade
reguladora, incluindo a imposição de medidas de conduta e a adoção das providências
necessárias à reparação dos direitos e interesses legítimos dos utentes – cfr. al. a) e b) do
artigo 19.º dos Estatutos da ERS.
23. E, no que concretamente respeita à obrigação de assegurar o cumprimento dos critérios de
acesso aos cuidados de saúde, se é certo que a violação do direito de acesso, como direito
complexo, pode surgir sob diferentes formas, ou ser originada por diferentes causas, é
igualmente certo que uma das suas violações mais gravosas e últimas se consubstancia na
rejeição infundada de pacientes.
24. É também competência da ERS “(…) prevenir e punir as práticas de rejeição e discriminação
infundadas de utentes nos serviços e estabelecimentos do SNS, nos estabelecimentos
publicamente financiados, bem como nos estabelecimentos contratados para a prestação de
cuidados no âmbito de sistemas ou subsistemas públicos de saúde ou equiparados” (cfr. alínea
b) do artigo 12.º dos Estatutos da ERS).
25. Sendo estabelecido na alínea b) do n.º 2 do artigo 61.º dos Estatutos da ERS, que “Constitui
contraordenação, punível com coima de 1000 EUR a 3740,98 EUR ou de 1500 EUR a 44
891,81 EUR, consoante o infrator seja pessoa singular ou coletiva:
[…]
b) A violação das regras relativas ao acesso aos cuidados de saúde:
i) A violação da igualdade e universalidade no acesso ao SNS, prevista na alínea a)
do artigo 12.º;
ii) A violação de regras estabelecidas em lei ou regulamentação e que visem garantir
e conformar o acesso dos utentes aos cuidados de saúde, bem como práticas de rejeição
ou discriminação infundadas, em estabelecimentos públicos, publicamente financiados, ou
contratados para a prestação de cuidados no âmbito de sistemas e subsistemas públicos
de saúde ou equiparados, nos termos do disposto nas alíneas a) e b) do artigo 12.º”.
26. Já quanto ao objetivo regulatório de zelar pela prestação de cuidados de saúde de qualidade,
previsto na alínea d) do artigo 10.º, incumbe à ERS, entre outras, a garantia do direito dos
19
utentes à prestação de cuidados de saúde qualidade, conforme estatuído na alínea c) do artigo
14.º dos Estatutos da ERS.
III.2 Do modelo de funcionamento do Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia
agora integrado no Sistema Integrado de Gestão do Acesso na vertente cuidados de saúde
hospitalares (SIGA CSH)
III.2.1 Nota prévia
27. No seguimento da recente aprovação do Decreto-Lei n.º 44/2017, de 20 de abril, que
consubstanciou a primeira alteração à Lei n.º 15/2014, de 21 de março, a Portaria n.º 147/2017,
de 27 de abril, veio concretizar o desiderato de regulamentação do Sistema Integrado de
Gestão do Acesso (SIGA) previsto no n.º 5 do artigo 27.º-A do Decreto-Lei n.º 44/2017.
28. Nos termos do n.º 1 do artigo 2.º, a portaria regula o Sistema Integrado de Gestão do Acesso
dos utentes ao Serviço Nacional de Saúde (SIGA SNS), que é um sistema de
acompanhamento, controlo e disponibilização de informação integrada, destinado a permitir um
conhecimento transversal e global sobre o acesso à rede de prestação de cuidados de saúde
SNS, e a contribuir para assegurar a continuidade desses cuidados e uma resposta equitativa e
atempada aos utentes.
29. Segundo o n.º 1 do artigo 4.º da Portaria, o SIGA SNS possui 5 componentes: cuidados
primários (SIGA CSP); primeiras consultas de especialidade hospitalar (SIGA 1.ª Consulta
Hospitalar); cuidados de saúde hospitalares (SIGA CSH); para realização de MCDT (SIGA
MCDT); e para a Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (SIGA RNCCI).
30. De acordo com a alínea c) do n.º 1 do artigo 4.º, o SIGA CSH (cuidados de saúde hospitalares)
regula a referenciação e o acesso aos cuidados hospitalares, incluindo, di-lo expressamente a
Portaria, o SIGIC.
31. O n.º 2 do artigo 9.º estatui que o SIGA CSH é composto por duas vertentes: i) Procedimentos
Hospitalares Cirúrgicos, que engloba o SIGIC; e ii) Procedimentos Hospitalares Não Cirúrgicos.
32. A respeito da primeira vertente, o n.º 3 prevê que os utentes a aguardar cuidados de saúde
hospitalares programados são inscritos na Lista de Inscritos para Cuidados de Saúde
Hospitalares (LICSH) de uma instituição do SNS, mais acrescentando o n.º 4 que o âmbito de
aplicação da componente SIGA Procedimentos Hospitalares Cirúrgicos inclui as entidades do
setor social e do setor privado com os quais o SNS haja contratado a prestação destes
cuidados de saúde aos seus utentes.
20
33. O artigo 27.º da Portaria n.º 147/2017, de 27 de Abril estatui que é revogada a Portaria n.º
45/2008, de 15 de janeiro, que criou e regula o SIGIC, e a Portaria 179/2014, de 11 de
setembro, que alterou a primeira.
34. Todavia, a Portaria 147/2017 prevê um conjunto de regulamentação subsequente a aprovar
(artigo 26.º), esclarecendo o n.º 2 do artigo 26.º que, até à entrada em vigor dessa
regulamentação, é aplicável, em tudo o que não colida com o disposto na Portaria, a
regulamentação em vigor na data da sua publicação.
35. Por sua vez, o n.º 5 do artigo 9.º estipula que os regulamentos específicos do SIGA CSH são
aprovados por Despacho do membro do Governo responsável pela área da Saúde, quer para a
vertente SIGA Procedimentos Hospitalares Não Cirúrgicos (alínea b) do n.º 5 do artigo 9.º),
quer, no que aqui releva, para a vertente SIGA Procedimentos Hospitalares Cirúrgicos (alínea
a) do n.º 5 do artigo 9.º), a qual, como já referido, passou a incluir o SIGIC.
36. Ora, a alínea a) do n.º 1 do artigo 26.º (“Regulamentação”) clarifica, então, que o regulamento
específico para a vertente SIGA Procedimentos Hospitalares Cirúrgicos será aprovada nos 90
dias seguintes contados da publicação da Portaria, ou seja, contados a partir de 27 de abril de
2017.
37. Significa isto, portanto, que se deve entender, sob pena da existência de um vazio legal no que
respeita à regulamentação do SIGIC, que, até à aprovação desse novo regulamento específico,
se encontra plenamente em vigor a Portaria n.º 45/2008, de 15 de janeiro (com as alterações
introduzidas pela Portaria n.º 179/2014, de 11 de setembro), em tudo o que não colida com a
Portaria n.º 147/2017.
38. Termos em que a subsunção dos factos descritos nos presentes autos ao direito se fará tendo
por enquadramento e referente jurídico-normativos a referida Portaria n.º 45/2008, a qual se
constitui no regulamento – ainda em vigor – definidor dos princípios e normas vigentes do
SIGIC.
III.2.2 Das regras do SIGIC
39. Conforme descrito na Portaria n.º 45/2008, de 15 de janeiro1 que aprovou o Regulamento do
Sistema Integrado de Gestão de Inscritos para Cirurgia (SIGIC), é este último um sistema de
regulação da atividade relativa “[…] a utentes propostos para cirurgia e a utentes operados,
assente em princípios de equidade no acesso ao tratamento cirúrgico, transparência dos
1 Alterada por via da publicação da Portaria n.º 179/2014, de 11 de setembro.
21
processos de gestão e responsabilização dos utentes e dos hospitais do Serviço Nacional de
Saúde (SNS) e dos estabelecimentos de saúde que contratam e convencionam com aquele a
prestação de cuidados de saúde aos seus beneficiários.”; e
40. São elegíveis para efeitos de inscrição na lista de inscritos para cirurgia (LIC) “[…] todos os
utentes dos hospitais do SNS e os utentes beneficiários deste Serviço referenciados para os
estabelecimentos de saúde do sector privado e do sector social, ao abrigo dos contratos e
convenções celebrados.”.
41. Sendo que toda a programação cirúrgica é registada no SIGLIC e deve obedecer aos critérios:
(i) da prioridade clínica estabelecida pelo médico especialista, em função da doença e
problemas associados, patologia de base, gravidade, impacto na esperança de vida, na
autonomia e na qualidade de vida do utente, velocidade de progressão da doença e tempo
de exposição à doença; bem como
(ii) da antiguidade na LIC, sendo, em caso de igual prioridade clínica, selecionado em
primeiro lugar o utente que se encontra inscrito na lista há mais tempo – cfr. § 73. do
Regulamento.
42. Cumprindo a este propósito ressaltar que, cronologicamente, a inscrição dos utentes em LIC é
precedida da consulta da especialidade e da consequente elaboração de um plano de
cuidados, ou seja da elaboração de uma proposta de abordagem de um ou mais problemas de
saúde do utente, onde se inscrevem e caracterizam os eventos necessários à sua resolução,
ordenados de forma cronológica, não havendo limitação ao registo na proposta quanto ao
número de diagnósticos descritos ou procedimentos a realizar, cfr. § 3.2.1.1. e 3.2.1.2.1 do
Manual de Gestão de Inscritos para Cirurgia (MGIC).
43. Concretamente, prevê o MGIC de forma taxativa as causas de exclusão de inscrição de atos a
realizar, como sendo os atos praticados fora do bloco operatório (BO), por não cirurgiões ou
pequenas cirurgias que não necessitem de utilização do BO;
44. Elencando igualmente os elementos de menção obrigatória no preenchimento da proposta de
cirurgia, nos quais consta, entre outros a caracterização dos problemas a abordar, incluindo
patologias associadas, em termos de descrição, codificação e respetiva lateralidade, e episódio
antecedente se aplicável cfr. § 3.2.1.2.1 do MGIC.
45. Igualmente prévia à inscrição do utente em LIC, uma vez concluído o preenchimento da
proposta de cirurgia, é a recolha do consentimento informado do utente, garantindo que o
mesmo atesta a concordância com a proposta e respetiva inscrição em LIC.
46. Por outro lado, “[…] todos os atos relacionados com a inscrição do utente em LIC, desde a
efetivação da primeira consulta em serviço hospitalar relacionada com a proposta cirúrgica até
22
à realização da intervenção cirúrgica e respetiva alta, são registados no SIGLIC, de acordo
com as regras previstas no MGIC”, devendo qualquer registo na LIC respeitar os
procedimentos ali considerados, mormente os constantes dos § 58 a 75.
47. Pelo que, “[…] após a emissão de certificado de inscrição, dá-se lugar à ativação da inscrição
do utente na LIC do serviço/unidade funcional da instituição hospitalar.” – cfr. § 3.2.1.2. do
MGIC.
48. Ademais, aos utentes é reconhecido, nomeadamente, o direito de obter um certificado
comprovativo da sua inscrição e de obter informação a todo o tempo junto da Unidade
Hospitalar de Gestão de Inscritos para Cirurgia (UHGIC) do seu hospital e a seu pedido, sobre
os dados que lhe respeitem registados na LIC, como seja o nível de prioridade que lhe foi
atribuído e o seu posicionamento relativo na prioridade atribuída – cfr. § 44. do Regulamento.
49. Assim, a UHGIC é o principal elo de ligação do utente com o hospital, e todos os contactos com
aquele e outros factos são registados no SI, competindo-lhe a informação aos utentes ou seus
representantes, sobre o estado da inscrição, o teor dos deveres e direitos e qualquer outra
sobre as diferentes fases do processo. – cfr. § 3.3.3. e § 3.3.5. do MGIC que remetem para o
Volume II – Área da gestão.
50. Compete ainda aos responsáveis pelas unidades ou serviços dos hospitais envolvidos nos
procedimentos cirúrgicos zelar pela atualização permanente da lista de procedimentos
cirúrgicos suscetíveis de serem realizados pelos seus serviços, garantindo que a cada um está
corretamente associado o código do sistema de codificação em vigor e ainda, garantir a
seleção dos utentes inscritos em LIC para efeito de programação cirúrgica de acordo com os
critérios de antiguidade e prioridade estabelecidos no MGIC e neste Regulamento – cfr. alíneas
b) e c) do § 57 do Regulamento.
51. Pelo que, “[…] sempre que a instituição hospitalar de origem não consegue garantir ou a
realização da cirurgia ou o seu agendamento até 100% do TMRG, o serviço/UF tenha perdido
ou a capacidade técnica para realizar a cirurgia ou apresente piores tempos de acesso do que
outro que se lhe equipare e ainda por conveniência justificada do utente, estão criadas as
condições para se dar início à etapa de transferência. Seja qual for o tipo de transferência, esta
só pode ocorrer com o acordo expresso do utente […]”. – cfr. § 3.2.1.4. do MGIC.
52. Concretamente, no que à transferência cirúrgica diz respeito, é “[…] operada pela emissão e
cativação de NT/VC [nota de transferência/vale cirurgia2], implica apenas a transferência da
2 “[…] Quer a nota de transferência, quer o vale cirurgia, habilitam o utente a marcar a cirurgia diretamente
numa das entidades de destino […] a diferença reside no facto da primeira permitir apenas a sua utilização no âmbito do SNS e a segunda poder ser utilizada quer nos hospitais do SNS, quer nas instituições convencionadas do sector privado e social.” – cfr. § 3.2.1.4.1.7 do MGIC.
23
prestação dos procedimentos cirúrgicos relativos ao(s) problema(s) identificado(s) e às
eventuais intercorrências da responsabilidade da instituição hospitalar ou complicações
identificadas até sessenta dias após a alta hospitalar […] “- cfr. § 3.2.1.4. do MGIC.
53. Ainda, “[…] a transferência de utentes através da emissão de NT/VC para outras unidades
hospitalares integradas no SNS ou unidades convencionadas é obrigatória sempre que o
hospital de origem, com os seus recursos, não possa garantir a realização da cirurgia dentro
dos TMRG estabelecidos por prioridade clínica, por patologia ou grupo de patologias,
presumindo-se a falta de garantia quando a cirurgia não for agendada até ao limite do prazo
estabelecido para cada nível de prioridade, a contar da data de inscrição na LIC. […]”, o que,
no caso dos doentes com prioridade de nível 2, equivale ao trigésimo dia do TMRG - cfr. §
3.2.1.4.1.1. do MGIC.
54. Decorridos os prazos para agendamento da cirurgia, tal como previstos nos n.ºs 79 e 80 da
Parte V do Regulamento3 sem que o agendamento no Hospital de Origem tenha ocorrido, “[...]
e não existindo HD do SNS disponível nos termos do [...] Regulamento, a UCGIC emite de
imediato um vale cirurgia a favor do utente.” – cfr. n.º 108 da Parte V do Regulamento;
55. Competindo, com efeito, à Unidade Central de Gestão de Inscritos para Cirurgia (UCGIC), nos
termos da alínea l) do.º 49 da Parte IV do Regulamento do SIGIC “[e]mitir e enviar vales
cirurgia.”.
56. Efetivando-se essa mesma transferência mediante a emissão pela UCGIC de “[...] nota de
transferência a favor do utente, propondo-lhe a selecção de uma das unidades hospitalares
constante da listagem anexa de hospitais disponíveis” – cfr. n.º 98 da Parte V do Regulamento .
57. Sendo que a emissão de vale cirurgia pela UCGIC pressupõe a aplicação de um algoritmo
automático que procura as instituições hospitalares do SNS com capacidade para realizar o
procedimento cirúrgico, indicando em primeiro lugar as instituições do concelho de residência,
seguido das instituições dos concelhos limítrofes e por último do distrito.
58. Por outro lado, conforme estipulado no parágrafo 124 do Regulamento do SIGIC “O hospital de
destino, após a realização da intervenção cirúrgica e de todos os procedimentos pós-
operatórios, conclui o processo, no prazo máximo de 60 dias, validando os registos
informáticos e registando a descrição das intercorrências e complicações observadas, e emite
dois certificados de alta: um, em suporte de papel destinado ao utente e outro, electrónico
destinado ao SIGLIC; se a intervenção não tiver sido realizada, deve igualmente proceder ao
registo do facto e respectiva justificação no SIGLIC”.
3 Nos termos dos n.ºs 79 e 80 da Parte V do Regulamento do SIGIC, o agendamento das cirurgias deve
ocorrer até ao limite de 50 % e 75 % do tempo de espera, respetivamente se os utentes estiverem classificados com nível 2 e nível 1.
24
59. Completando o parágrafo 126 do mesmo diploma que “O hospital de destino é responsável
pelos tratamentos e intercorrências até à alta hospitalar e, após esta, pela cedência até 15 dias
das ajudas técnicas necessárias ao adequado tratamento e segurança do utente, pelo
tratamento da ferida operatória, pela continuação dos tratamentos de todas as intercorrências
da sua responsabilidade ocorridas durante o internamento, assim como de quaisquer
complicações dos tratamentos instituídos, identificadas no período de dois meses após a alta”.
60. Com relação ao SIGIC e com relevância para os presentes autos, tenha-se ainda presente o n.º
5 do artigo 9.º do Anexo II da Portaria n.º 207/2017, segundo o qual:
“A produção cirúrgica realizada num hospital convencionado no âmbito do SIGIC, só poderá
dar origem a faturação se a equipa cirúrgica, médicos e enfermeiros, que a efetuar, não
apresentarem relação laboral com a instituição de origem em serviços que elaboraram
propostas cirúrgicas ou realizam cirurgias programadas”.
61. Por fim, e quanto ao modelo de gestão do SIGIC, refira-se, que as UHGIC ficam integradas nos
hospitais, competindo-lhes:
“[…]
a) Zelar pelo cumprimento das normas aplicáveis à LIC e respetivo Regulamento;
g) Prever e identificar os casos dos utentes que deverão ser transferidos para outra
unidade prestadora de cuidados de saúde […]” – cfr. § 54.º e 56.º do Regulamento.
62. As URGIC ficam integradas nas Administrações Regionais de Saúde, competindo-lhes:
“[…]
a) Monitorizar, avaliar e controlar a evolução de inscritos para cirurgia nas unidades
hospitalares, designadamente os tempos de espera;
j) Autorizar a emissão de vales cirurgia para a realização de procedimentos cirúrgicos
propostos pelo HD, quando sejam complementares de procedimentos cirúrgicos
realizados anteriormente, após auscultação do HO;
m) Decidir nas situações em que se verifiquem conflitos entre HO e HD;
n) Verificar se a facturação emitida pelas entidades convencionadas corresponde à
actividade realizada no âmbito dos vales cirurgia […]” – cfr. § 50.º e § 52.º do
Regulamento.
63. Ainda, a UCGIC fica integrada na ACSS, competindo-lhe:
“[…]
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j) Selecionar os utentes a transferir e garantir o cumprimento e monitorização dos
protocolos de transferência definidos por parte dos restantes intervenientes;
l) Emitir e enviar vales cirurgia;
m) Autorizar o […] HD a elaborar propostas cirúrgicas e a realizar os procedimentos que
lhes correspondam” – cfr. § 47.º e 49.º do Regulamento.
IV. Análise da situação concreta
64. Dos factos apurados no decurso do presente processo de inquérito resulta a existência de
diversos constrangimentos no acesso da utente aos cuidados de saúde no Hospital Lusíadas
de Albufeira (HLA).
65. Em primeiro lugar, tendo a utente sido submetida a uma cirurgia complicada (laminectomia de
L5, foraminotocomia de L5 e S1, artrodese L5-S1 com parafusostranspediculares) no dia 22 de
julho de 2016,
66. E tendo a mesma referido constantes e intensas dores na zona lombar e nas pernas aos
médicos e equipa de enfermagem, inclusivamente de que não se sentia capaz de se manter de
pé,
67. Foi-lhe dada alta médica logo no dia 24 de julho, o que mal se compreende à luz do quadro de
queixas que a mesma reportava.
68. Ao que acresce o facto de, estando nas débeis condições em que se encontrava, não ter sido
providenciado pelo HLA à utente o transporte para o seu domicílio, vendo-se esta forçada a
deslocar-se “[…] no banco traseiro, deitada, num carro particular para casa. A viagem de
Albufeira até à minha casa, em Salir, foi insuportável, em virtude das dores […]”.
69. Circunstância agravada pelo facto de as dores se terem mantido e intensificado, levando a que
a utente se visse forçada a dirigir-se, por várias ocasiões, ao hospital entre os dias 25 de julho
e 30 de julho.
70. Todo um quadro, portanto, que se mostra inaceitável à luz do direito dos utentes a receberem
cuidados de saúde pós-operatórios completos, contínuos e, acima de tudo, de qualidade e de
forma humanizada.
71. Isto mesmo sendo corroborado pelo Perito médico ouvido pela ERS, segundo o qual:
“[…] Adequação dos cuidados pós-operatórios à doente que me pareceram menos
adequados […]”.
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72. No dia 30 de julho de 2016, e na indisponibilidade de o Dr. G atender a utente por se encontrar
em Lisboa, esta foi observada pelo Dr. JPC, que ordenou que lhe fossem retirados os agrafos e
lhe receitou medicação para as dores.
73. Tal medicação não surtiu efeito, tendo a utente referido que se encontrava, devido às dores,
“[…] praticamente incapaz de andar, manter[-me] em pé ou ficar sentada”, perdendo peso e
sofrendo, de caminho, danos psicológicos.
74. O certo é que as dores da utente se mantiveram, forçando a utente a entrar novamente em
contacto com o HLA, que lhe marcou uma consulta para dia 1 de agosto, desta feita com o Dr.
G.
75. Uma vez observada pelo Dr. G., a utente foi submetida a nova cirurgia no dia 1 de agosto,
76. A qual, note-se, não estava prevista, tendo apenas lugar em função das complicações e dores
verificadas após a primeira cirurgia efetuada no HLA.
77. A utente referiu que o Dr. JPC a havia co-operado no dia 22 de julho de 2016 (primeira cirurgia).
78. Por sua vez, o HLA, embora sem fazer qualquer prova, afirmou que não só o Dr. JPC apenas
teve intervenção na segunda cirurgia de 2 agosto de 2016 (e não na primeira),
79. Como este se teria limitado a emitir uma opinião técnica sobre o procedimento a realizar, mas
não tendo atuado efetivamente na cirurgia.
80. A utente teve alta no dia 6 de agosto, embora com dores e medicada para o efeito.
81. Mantendo-se as dores, a utente teve que recorrer ao Centro de Saúde Loulé no dia 7 de agosto.
82. No dia 13 de agosto, observada novamente no HLA, uma vez mais pelo Dr. JPC (e não pelo Dr.
G), foi-lhe receitada morfina.
83. Todavia, as prescrições foram preenchidas pelo médico de forma incorreta, porquanto no
campo da entidade responsável constava a menção “Sem comparticipação p/ SNS”.
84. O que obrigou a utente a pagar mais do que o valor devido caso as prescrições estivessem
corretamente preenchidas.
85. Tal situação, apesar das queixas da utente junto do prestador para que este corrigisse a
situação, nunca veio a ser solucionada, para prejuízo da primeira.
86. No dia 20 de agosto, em nova consulta com o Dr. G, e em virtude das dores permanentes, o
médico entregou-lhe uma carta para a médica de família, no sentido de a utente marcar
consulta de fisiatria e sessões de fisiatria no seu Centro de Saúde.
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87. Ora, considere-se a data da primeira cirurgia (22 de julho de 2016) ou da segunda (2 de agosto
de 2016), em qualquer um dos casos, o HLA estava obrigado a prestar todo o
acompanhamento pós-operatório no período de 2 meses subsequente à data da cirurgia,
88. Conforme estipulado pelos parágrafos 124 e 126 do Regulamento SIGIC.
89. Não conseguindo encontrar vaga no Centro de Saúde, a utente marcou consulta num hospital
privado, para o que lhe foi solicitado o TC realizado após a cirurgia.
90. A este respeito, e conforme informou a utente:
“[…]
A secretária disse que a carta de pedido de Fisiatria não me deveria ter sido entregue.
Supostamente, o Dr. G. devia ter entregue a carta à funcionaria, que teria, como função,
enviá-la para o Hospital de Faro, correspondendo este ao processo correto. Esta
confessou, também, que o Dr. G. deveria estar a par deste procedimento.
[…]”.
91. Procedimento que, como se vê, não teve lugar, assim se protelando a situação da utente, não
tendo sido possível apurar se, posteriormente, a utente veio ou não a ter acesso ao TC.
92. No dia 7 de novembro de 2016, a utente teve uma consulta de Neurocirurgia no Hospital de
Faro, onde foi observada pelo Dr. JPC, médico que também já a havia observado no Hospital
Lusíadas de Albufeira.
93. Ora, constata-se, assim, que o Dr. JPC observou a doente quer no Hospital de Destino (HLA),
quer no Hospital de Origem (Hospital de Faro), pelo menos nas seguintes ocasiões:
a) No Hospital de Destino (HLA): Consultas no dia 30 de julho e 13 de agosto de 2016,
tendo ainda acompanhado a primeira cirurgia da utente (22 de julho);
b) No Hospital de Origem (Hospital de Faro): Consulta no dia 7 de Novembro de 2016.
94. Tal sobreposição configura uma situação de conflito de interesses desrespeitadora do
preceituado no n.º 5 do artigo 9.º do Anexo II da Portaria n.º 207/2017, segundo o qual:
“A produção cirúrgica realizada num hospital convencionado no âmbito do SIGIC, só
poderá dar origem a faturação se a equipa cirúrgica, médicos e enfermeiros, que a
efetuar, não apresentarem relação laboral com a instituição de origem em serviços que
elaboraram propostas cirúrgicas ou realizam cirurgias programadas”.
95. Por tudo o que se vem de expor, acrescido de uma atuação dos profissionais do HLA que, em
muitos momentos, não se pautou pela maior urbanidade, zelo e correção na interação com a
utente,
28
96. Considera-se necessária a adoção da atuação regulatória infra delineada ao abrigo das
atribuições e competências legalmente atribuídas à ERS
97. Por forma a assegurar o acesso dos utentes aos cuidados de saúde que se apresentem como
necessários e adequados à satisfação das suas necessidade de forma integrada,
humanamente, com correção, prontidão e respeito pelo utente.
98. E, em especial, de modo a garantir o cumprimento pelas regras estabelecidas no Regulamento
do SIGIC.
V. AUDIÊNCIA DOS INTERESSADOS
99. A presente deliberação foi precedida de audiência escrita dos interessados, nos termos e para
os efeitos do disposto no artigo 122.º do Código do Procedimento Administrativo, aplicável ex vi
artigo 24.º dos Estatutos da ERS, tendo, para o efeito, sido chamados a pronunciar-se,
relativamente ao projeto de deliberação da ERS, a reclamante e o prestador.
100. Decorrido o prazo concedido, apenas foi rececionada a pronúncia do prestador, que abaixo
se reproduz:
“[…]
nâo pode a sociedade participada aceitar o projecto de deliberação e a respetiva Decisão, em
virtude de não haver no processo qualquer resquício de prova quanto aos factos alegados pela
participante, a paciente Sra. D. [ST];
2) Nesta seara, entende a sociedade Lusíadas, S.A. ter cumprido escrupulosamente com todos
os procedimentos legal e deontologicamente previstos quanto aos cuidados de saúde prestados
à paciente, não havendo lugar, portanto, a qualquer possibilidade de descumprimento, quer das
normas que regulamentam o SIGIC, quer da leges artis, ou do Código Deontológico da Ordem
dos Médicos. Aliás,
3) A decisão dessa ERS, nomeadamente no que concerne ao ponto (iii), foi tomada sem
qualquer suporte ou apoio documental que pudesse minimamente demonstrar a evidência de
uma actuação contrária a leges artis por parte do corpo clínico do Hospital Lusíadas Albufeira,
uma vez que o processo clínico da paciente [ST];foi enviado apenas à Ordem dos Médicos,
entidade competente para aferir o regular cumprimento da leges artis. Ora, para que essa ERS
pudesse se debruçar sobre questões afectas aos cuidados de saúde prestados á paciente,
deveria, a nosso sentir, ter solicitado â Ordem dos Médicos um parecer médico fundamentado
quanto a essa questão, o que não o fez, não podendo, portanto, imputar ao Hospital Lusíadas
Albufeira um qualquer comportamento irregular ou censurável.
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4) Desta forma, não se percebe como essa ERS pretende que a ora participada possa dar
efectivo cumprimento ao ponto (iii) de sua Decisão, por duas ordens de razões: a) não ser
materialmente factível dar cumprimento a tal ordem, pois tal como se encontra redigida, mais
parece uma exortação para a prática de uma determinada conduta, não se vislumbrando, a
priori, a possibilidade de se reduzir tal questão em suporte documental; b) não existe nos autos
qualquer indício de violação das regras da legis artis, ao contrário, pois o ofício do Centro
Hospitalar do Algarve junto aos autos, atesta, ao invés, que foram prestados os devidos
cuidados médicos à paciente
5) Concretamente quanto a questão que se colocava relativamente a actuação do médico que
observou a utente, tanto no hospital de origem como o de destino, não restou minimamente
comprovado que o Dr. [JC] tenha intervido no Hospital Lusíadas Albufeira em qualquer
intervenção cirúrgica em que a paciente tenha se submetido, já tendo a sociedade ora
participada se manifestado contrariamente a essa possibilidade, não tendo essa ERS recolhido
qualquer outra prova em contrário do que foi aqui alegado. Aliás, o próprio perito médico da
ERS levanta a questão na seara da eventualidade, o que despoletou a averiguação da situação
por parte da ERS, tendo todos os elementos coligidos aos autos denotarem a não verificação de
uma actuação do médico [JC] violadora ao regulamento do SIGIC.
6) Ora, para além disso, a única vez que o [JC] viu a doente no Hospital Lusíadas Albufeira foi
em contexto de urgência, por ser o único neurocirurgião no Hospital no dia em que a paciente
se dirigiu a essa unidade hospitalar, em total cumprimento as regras deontológicas previstas no
parágrafo 6" do artigo 4ª do Código de Deontologia da Ordem dos Médicos.
7) Quanto aos demais factos capitulados na proposta de Deliberação, entende a sociedade
Lusíadas, S.A., que
os mesmos já foram completamente esclarecidos ao longo de toda a instrução do presente
processo, pelo que se reitera todos os argumentos já manifestado nos autos.
8) Por fim, vale referir que essa ERS louvou-se apenas e tão somente dos factos alegados pela
Sra. D. [ST] que o fez sem qualquer prova documental que pudesse suportar suas alegações,
sendo principio basilar de um Estado Democrático de Direito que a prova incumbe a quem
alega, o que não se verificou no caso concreto. Mais se refira que a sociedade ora participada
refutou de maneira cabal e fundamentada todos os factos que contra si vieram referidos, sem
que qualquer um deles tivesse qualquer relevo para essa Entidade Reguladora da Saúde.
9) Por fim, e, no caso do Projecto de Deliberação ser mantido na íntegra, tem a sociedade
Lusíadas, S.A., sérias dúvidas quanto a forma de dar cumprimento a Decisão, quer pelas
questões levantadas por essa ERS serem mais comportamentais do que procedimentais, tais
como os números (i), (ii) e (iii), quer pelo facto de tais questões serem provenientes de
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legislação escrita, sendo o seu cumprimento de carácter imperioso para os prestadores de
saúde privados que prestem cuidados médicos a doentes originários do SIGIC.
[…]”.
101. Face à pronúncia, cumpre analisar os elementos invocados na mesma, aferindo da
suscetibilidade dos mesmos infirmarem a deliberação delineada.
102. Faça-se desde já notar que os argumentos apresentados na pronúncia foram devidamente
considerados e ponderados pela ERS,
103. Ainda que dos mesmos não tenha resultado uma alteração no sentido da decisão que a
ERS ora entende emitir.
104. De facto, os argumentos aduzidos não põem em causa o quadro factual e legal apresentado
pela ERS no seu projeto de deliberação, não contrariando ou esclarecendo, na substância, as
matérias aí tratadas.
105. Numa parte da sua argumentação inicial, o prestador limita-se a negar, sem fundamentação
bastante, os factos que lhe são imputados.
106. Quanto à alegação de que a decisão da ERS “(…) no que concerne ao ponto (iii), foi tomada
sem qualquer suporte ou apoio documental (…). (…) para que essa ERS pudesse se debruçar
sobre questões afectas aos cuidados de saúde prestados à paciente, deveria (…) ter solicitado
à Ordem dos Médicos um parecer médico”,
107. Importa referir que, conforme consta do projeto de deliberação anteriormente notificado ao
prestador, a ERS consultou Perito médico, o qual, tendo analisado todo o processo e respetiva
documentação, se pronunciou pela desadequação dos cuidados pós-operatórios à doente,
estando o seu Relatório devidamente junto aos autos.
108. Relativamente ao ponto 4) do argumentário do prestador, cabe ao mesmo fazer prova nos
autos de que alterou e adequou os seus procedimentos – nomeadamente, escritos – ao
conteúdo da instrução da ERS, tendo em especial atenção os circunstancialismos de factos
ocorridos nos autos negativamente valorados pela ERS e o modo de os suprir.
109. Não cabe à ERS indicar, prescritivamente, o modo de o fazer, desde logo porque, em
termos jurídico-administrativos, se trata de uma instrução (prescreve o fim, não os meios), e não
de uma ordem (prescreve os fins e os meios).
110. Quanto à situação do Dr. JPC, o prestador limita-se, novamente, a negar os factos sem
avançar com fundamentação (nomeadamente, através de documentação clínica da utente) que
rebata o que consta do projeto de deliberação:
“[…]
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No dia 7 de novembro de 2016, a utente teve uma consulta de Neurocirurgia no Hospital de
Faro, onde foi observada pelo Dr. JPC, médico que também já a havia observado no Hospital
Lusíadas de Albufeira.
Ora, constata-se, assim, que o Dr. JPC observou a doente quer no Hospital de Destino (HLA),
quer no Hospital de Origem (Hospital de Faro), pelo menos nas seguintes ocasiões:
a) No Hospital de Destino (HLA): Consultas no dia 30 de julho e 13 de agosto de 2016,
tendo ainda acompanhado a primeira cirurgia da utente (22 de julho);
b) No Hospital de Origem (Hospital de Faro): Consulta no dia 7 de Novembro de 2016.
[…]”.
111. Deste modo, justifica-se a manutenção, na íntegra, do projeto de deliberação da ERS e
respetiva intervenção regulatória, devendo o prestador demonstrar junto da ERS a adoção de
condutas concretas em ordem ao cumprimento da mesma.
VI. DECISÃO
112. O Conselho de Administração da ERS delibera, nos termos e para os efeitos do preceituado
na alínea a) do artigo 24.º e das alíneas a) e b) do artigo 19.º dos Estatutos da ERS, aprovados
pelo Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto, emitir uma instrução ao Hospital Lusíadas
Albufeira, no sentido de este dever:
(i) Garantir que o atendimento dos utentes se processe dentro do rigoroso cumprimento
das regras de funcionamento do programa SIGIC, designada mas não limitadamente,
quanto ao dever de acompanhamento e de realização de todos os procedimentos
pós-operatórios necessários no período de 2 meses após alta médica, conforme
estipulado pelos parágrafos 124 e 126 do Regulamento SIGIC, não reenviando os
utentes para prestadores de cuidados de saúde primários ou hospitalares do SNS;
(ii) Assegurar que, relativamente aos utentes que, no âmbito de realização de cirurgia do
SIGIC, provenham de um Hospital de Origem integrante do SNS, os mesmos não
sejam atendidos por profissionais médicos que desenvolvam simultaneamente
atividade no Hospital Lusíadas Albufeira (enquanto Hospital de Destino) e no
Hospital de Origem (SNS), qualquer que seja a natureza do vínculo jurídico existente
entre o profissional médico e os hospitais de origem e destino;
(iii) Garantir, em permanência, que, na prestação de cuidados de saúde, são
respeitados os direitos e interesses legítimos dos utentes, nomeadamente, o direito
aos cuidados adequados e tecnicamente mais corretos, os quais devem ser
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prestados integradamente, humanamente, com correção e respeito pelo utente, com
prontidão e num período de tempo clinicamente aceitável, em conformidade com o
estabelecido no artigo 4º da Lei n.º 15/2014, de 21 de março;
(iv) Garantir que os profissionais médicos preenchem devida e corretamente as
prescrições médicas dos utentes e, bem assim, que toda a documentação relativa ao
seu processo clínico é tratada e entregue diligentemente aos prestadores de
cuidados de saúde que a solicitem ou aos próprios utentes, conforme o caso;
(v) Dar cumprimento imediato à presente instrução, comunicando à ERS, no prazo
máximo de 30 (trinta) dias úteis contados da presente deliberação, os procedimentos
adotados para o efeito.
113. A instrução ora emitida constitui decisão da ERS, sendo que a alínea b) do n.º 1 do artigo
61.º dos Estatutos da ERS, aprovados em anexo ao Decreto-Lei n.º 126/2014, de 22 de agosto,
configura como contraordenação punível in casu com coima de € 1000,00 a € 44 891,81, “[….]
o desrespeito de norma ou de decisão da ERS que, no exercício dos seus poderes
regulamentares, de supervisão ou sancionatórios determinem qualquer obrigação ou proibição,
previstos nos artigos 14.º, 16.º, 17.º, 19.º, 20.º, 22.º, 23.º ”.
114. A presente deliberação deverá ser levada ao conhecimento da Administração Regional de
Saúde do Algarve.
115. A versão não confidencial da presente decisão será publicitada no sítio oficial da ERS na
Internet.
Porto, 26 de julho de 2018.
O Conselho de Administração.