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  • 5/28/2018 Dcio Freitas - Escravos Senhores de Escravos

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    Este livro destina-se ao uso exclusivo de deficientes visuais, nopodendo ser copiado ou utilizado com quaisquer fins lucrativos. Ignoraressa advertncia significa violar a lei n 96!, de 9 de fevereiro de99", que regulamenta os direitos autorais no #rasil.

    Escravos e sen$ores de escravos

    %&'I( )*EI+dvogado e istoriador

    /ercado 0erto - 9"12rie 3ovas 4erspectivas, 54orto legre - *

    'apa /arco 'ena'omposi7o *icardo ). da ilva*eviso '$arles 8ieferuperviso 3oelci *. aco0:9"1

    +odos os direitos reservados pela /ercado 0erto Editora e 4ropaganda;tda.*ua antos %umont, "6 -9!!!! - 4orto legre, *

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    no curso do ano de 96, para servirem como textos de apoio num cursoso0re a escravatura, ministrado pelo autor nos meses de Qaneiro,fevereiro e mar7o de 966 a um grupo de exilados 0rasileiros.Este tra0al$o foi possi0ilitado pelas riquCssimas 0rasilianas encontradasno 4rata. Em /ontevid2u #i0lioteca 3acional, a #i0lioteca do 'lu0e#rasileiro, a #i0lioteca dos narquistas Druguaios e finalmente um Rse0oRem 'iudad ieQa, cuQo nome a memSria trai7oeira no consegue resgatar. Em#uenos ires a #i0lioteca 3acional e, particularmente, o incompar=velRse0oR de %om 4a0lo ernandez, em 'alle +ucum=n.3o ano de 966, o di=rio Epoca, que dirigia em /ontevid2u Eduardo

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    ocupa7o e da manuten7o de nosso territSrio pelo europeu, e que seusdescendentes se misturam com o nosso povo. (nde ele no c$egou ainda, opaCs apresenta o aspecto com que surpreendeu aos seus primeirosdesco0ridores. +udo o que significa luta do $omem com a natureza,conquista do solo para $a0ita7o e cultura, estradas e edifCcios,canaviais e cafezais, a casa do sen$or e as senzalas dos escravos,igreQas e escolas, alfJndegas e correios, tel2grafos e camin$os de ferro,academias e $ospitais, tudo, a0solutamente tudo, que existe no paCs, comoresultado do tra0al$o manual, como emprego de capital, como acumula7o deriquezas, no passa de uma doa7o gratuita da ra7a que tra0al$a U que faztra0al$ar.3unca se pode esquecer, no entanto, que a escravido no foi apenas denegros, foi igualmente de Cndios. +odos os paCses do 3ovo /undocon$eceram a escravido indCgena, por2m o #rasil a todos excedeu nonYmero de autSctones ca7ados, exterminados ou escravizados. #ementendido, o $olocausto indCgena no se compara nem de longe ao dosafricanos, mas, ainda assim, quase um mil$o de Cndios sucum0iram, diretaou indiretamente, no processo da escraviza7o. 3o foi seno na metade dos2culo XIII que o cativeiro indCgena aca0ou legalmente no #rasilW nisso,tam02m, fomos o Yltimo paCs do 3ovo /undo.

    (#rasil assinalou o recorde americano no tr=fico de escravos, importandoperto de 5!Z do total de nove mil$Pes e quin$entos mil negros trazidospara o 3ovo /undo nove vezes mais que os Estados Dni dos ?6Z@ e 0em maisque o do0ro da m2rica ispnica ?"Z-@, do 'ari0e ingls ?BZ@ e do'ari0e francs ?BZ@. ( #rasil foi o Yltimo paCs independente a a0olirlegalmente o tr=fico. 'u0a e 4orto *ico, Yltimos mercados compradores denegros do 3ovo /undo, permaneciam colPnias da Espan$a. uprimiram aindaassim a escravido antes que o #rasil ?""!@.%emonstra tudo isso que viceQou no #rasil a forma7o social escravistamais importante do 3ovo /undo. 3en$um outro paCs teve sua $istSria tomodelada e condicionada pelo escravismo, em todos os aspectos -econTmico, social, cultural. 4ode dizer-se que a escravatura delineou operfil $istSrico do #rasil e produziu a matriz da sua configura7osocial. 4assados noventa anos da a0oli7o, conserva toda sua validez ao0serva7o de 3a0uco de que a escravatura ainda continuaria por muitotempo uma caracterCstica nacional do #rasil. Dma parcela enorme dos0rasileiros descendem de escravos, de uma forma ou de outra. )az apenasnoventa anos que a classe tra0al$adora 0rasileira se compPe de $omensQuridicamente livres - $omens imitidos na posse de sua prSpria for7a detra0al$o.Entre os funestos legados da escravido, figuram a condi7o atual donegro 0rasileiro e a concep7o que faz do tra0al$o manual um la02u.3en$uma investiga7o econTmica s2ria deixar= de situar na escravatura asraCzes do atraso 0rasileiro. 4ois o povo de um dos maiores e mais ricospaCses do mundo, depois de $aver produzido durante trs s2culos v=riasdas grandes riquezas dos tempos modernos, ingressou no s2culo XX como umdos mais deserdados que se con$ecem.

    3estas condi7Pes, impPe-se a todo 0rasileiro preocupado com sua $istSrianacional, a formula7o e a solu7o de uma s2rie de questPes. ( que foique determinou a implanta7o da escravatura no #rasilV que atri0uir-sea solidez e a longevidade da institui7oV Em que consistiu suaespecificidade na $istSria do escravismo do 3ovo /undoV 'omo e por que, adespeito de tudo, o sistema se desintegrou e desapareceuV Kltima questocomo se pode definir o tipo de mudan7a social operada em conseq[ncia daescravaturaVEstas questPes distam muito de ser acadmicas so cruciais para acompreenso de um passado que oprime o presente e 2 um o0st=culo U

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    conquista do futuro.

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    I - 3o ano de "11, o Qovem economista ingls Ed\ard

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    das colTnias. Ynica 0ase da riqueza colonial era a escravido.3o admira que o economista ten$a querido ficar no anonimato. quele eraprecisamente o tempo em que a 0urguesia inglesa tonitroava contra aescravido no #rasil.3o se diga que as colTnias inglesas da 3ova Inglaterra ofereciam umdesmentido U teoria de ]a^efield. 3o possuCam aquelas colTnias condi7PesecolSgicas para a produ7o das mercadorias tropicais que interessavam aocapitalismo mercantil. uas terras serviam unicamente para a produ7o deartigos de su0sistncia que nen$um lucro davam U metrSpole, que de restoos produzia tam02m para exporta7o. grande serventia daquelas terrasconsistia em aloQar uma incTmoda multido de dissidentes polCticos ereligiosos. Mualquer das minYsculas il$as produtoras de a7Ycar dasntil$as mostrava-se enormemente mais valiosa que as colTnias da 3ovaInglaterra.II - +rs s2culos antes de ]a^efield, a coroa e os mercadores portuguesesQ= $aviam empiricamente c$egado U concluso de que a Ynica forma de tirarlucro das terras desco0ertas no #rasil seria a explora7o do tra0al$oescravo.amais afirmaram em qualquer documento que em 4ortugal no $aviacamponeses dispostos a emigrar para o #rasil. Isto foi uma invencionice

    de $istoriadores 0rasileiros para Qustificar como uma necessidade naturalaquilo que na verdade era apenas uma necessidade econTmica domercantilismo portugus. avia ento em 4ortugal uma grande massa decamponeses que son$ava sair do reino para construir vida nova em terrasdistantes. 0em dizer, necessitavam desesperadamente emigrar. (sprimeiros anos do reinado de oo III foram de grande mis2ria popular emconseq[ncia de m=s col$eitas, a que se seguiram pestes devastadoras. coroa, o clero e a no0reza $aviam monopolizado quase todas as terrasagrCcolas, das quais duas ter7as partes se ac$avam incultas. R(slavradores - escreve o $istoriador portugus ;uis *e0elo da ilva -preferiam ver convertidas em desertos as terras produtivas do que reg=-las com o suor do rosto para que depois a mo do fisco, do clero ou dossen$ores viesse arre0atar da eira ou dos lagares todos os frutos do seutra0al$oR.ouve no inCcio uma certa imigra7o de camponeses lusitanos. Estescamponeses, no entanto, logo sofreram a amarga decep7o de verdesatendidas as suas duas principais exigncias - terras e li0erdadepessoal. (s donat=rios queriam su0met-los a um tra0al$o intensivo anCvel de su0sistncia nas planta7Pes. & de ver que no $aviam emigradopara a inSspita colTnia apenas para suportar condi7Pes ainda piores queas da p=tria. %ado que eram $omens livres, instalaram-se em algum lugar,tra0al$ando para si prSprios e no para os donat=rios. 3o dizer dearn$agen, Rlan7avam-se U vida gentClicaR. %uarte 'oel$o, donat=rio de4ernam0uco, c$egou a enforcar alguns e escreveu ao rei pedindo Rpelo amorde %eusR que no os deixasse mais em0arcar para o #rasil, pois eramRpiores que pe7on$aR. coroa de fato no os deixou mais em0arcar. o longo do perCodo

    colonial, a imigra7o se compTs exclusivamente de Rno0resR elementos da0aixa no0reza ou ricos comerciantesW artesos qualificados, que por suavez empregariam tra0al$o escravoW soldados que, concluCdos seus anos deservi7o, se esta0eleciam na terra como propriet=rios de grandessesmariasW degredados e aventureiros. R legisla7o portuguesa sempreprocurou contrariar ou dificultar a imigra7oR, assinalou oo )rancisco;is0oa em sua 'rTnica do #rasil 'olonial. %ispun$am uma lei de fins dos2culo XII R3en$uma pessoa de qualquer qualidade poder= passar Uscapitanias do #rasil, seno as que forem despac$adas com governos,postos, cargos ou ofCcios, os quais no levaro mais criados do que a

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    cada um pode competir, conforme sua qualidade e empregoR. Exercia-sesevera fiscaliza7o nos em0arques para o #rasil. omente se concediampassaportes para em0arque depois de rigorosa averigua7o Qudicial. indaassim, na $ora da partida dos navios para o #rasil, estando eles Q= Uvela, realizavam-se 0uscas e se prendiam todas as pessoas encontradas sempassaporte. plicavam-se-l$es pesadas multas e os que no tin$am din$eiropara pag=-las eram degredados por trs anos para a Ffrica. ` c$egada dosnavios ao #rasil e antes de se comunicarem com terra, repetia-se adiligncia da 0usca, e quantos se encontrassem sem passaporte eramrecam0iados para o reino. 3a Inglaterra, em contrapartida, no $aviaqualquer restri7o ou fiscaliza7o no em0arque para a m2ricaW antes,pelo contr=rio, esta0eleceu-se a indYstria dos seq[estros e em0arques afor7a. desculpa para estas restri7Pes U emigra7o era a necessidade de evitarque o reino se despovoasse. /il$ares de camponeses, no entanto, notin$am terras e passavam fome. ( /in$o Q= era no s2culo XII umaprovCncia superpovoada e seus camponeses tentavam por todos os meiosem0arcar para o #rasil. Muem esquadrin$e calmamente os arquivosportugueses - rquivo da +orre do +om0o, rquivo istSrico Dltramarino,#i0lioteca da Quda, #i0lioteca 3acional de ;is0oa, rquivo e #i0lioteca

    %istrital de &vora, para citar apenas os principais - encontra grandecSpia de requerimentos pedindo permisso para viver no #rasil,sistematicamente indeferidos. 3o foi seno em meados do s2culo XIII que$ouve uma imigra7o de camponeses a7orianos para o 'ontinente de o4edro, aos quais se deram lotes de terras. /as isso porque se queriaproduzir uti possidetis num territSrio disputado com os castel$anos.( sistema de produ7o colonial, desse modo, operou inicialmente na 0aseda escravido indCgena. & certo que $ouve desde o come7o escravos negros,mas at2 0em avan7ado o s2culo XI o predomCnio a0soluto foi de escravosCndios. +ra0al$aram na extra7o de pau-0rasil, no plantio da cana-de-a7Ycar, na produ7o de drogas do serto, nas economias de su0sistncia,na constru7o de fortifica7Pes, em tudo que exigisse o emprego de energia$umana.3o tardou, por2m, que se desencadeasse apaixonada campan$a contra estaescraviza7o do elemento autSctone. Esta campan$a produziu em B! umalei de %. e0astio proi0indo o cativeiro de Cndios. Em algumas regiPes,a campan$a e a lei tiveram xito imediato, su0stituindo-se inteiramente oescravo Cndio pelo escravo negro, malgrado o custo deste Yltimo fosse, nomCnimo, cinco vezes superior ao do primeiro. elucida7o do porqu desta su0stitui7o constitui um dos pro0lemas maisimportantes e menos estudados da $istoriografia 0rasileira.

    III - er= interessante examinar os argumentos dos religiosos, dosfuncion=rios da coroa e dos mercadores a favor da su0stitui7o do escravoCndio pelo escravo negro.4rimeiro, o argumento QurCdico-religioso. s 0ulas papais que $aviamoutorgado aos reis i02ricos o domCnio so0re o 3ovo /undo, impuseram uma

    suprema o0riga7o difundir os Evangel$os e atrair os pagos para aIgreQa de 'risto. 4ara refor7ar este entendimento, em 1B o papa 4auloIII declarou que os Cndios eram Rseres racionais, suscetCveis Ucristianiza7o, e por isso no podiam ser privados de sua li0erdade,ainda que estivessem afastados da f2 de esus 'risto ... nem deviam emnen$um caso ser escravizadosR. 3o se apresentava semel$ante pro0lema noque dizia respeito aos negros da Ffrica. 3a 0ula %um diversa, de 55>, opapa 3icolau outorgara a fonso de 4ortugal ?o RfricanoR@, o direitode Ratacar na costa da Ffrica os infi2is, pagos ou sarracenos,escravizar suas pessoas e apropriar-se de seus 0ensR. %epois, em 56, o

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    papa 'alixto outorgara U (rdem de 'risto a Qurisdi7o eclesi=sticaso0re a

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    tra0al$o no decorrer de todo o perCodo colonial. +al como a portuguesa, acoroa castel$ana teve de transigir e capitular diante da resistncia doscolonizadores. pretexto de guerras Qustas contra os autSctones que$ostilizavam os espan$Sis - isso se dizia da resistncia indCgena Uescraviza7o e ao es0ul$o das suas terras -, tolerou o cativeiroindCgena em outros casos, os colonizadores simplesmente ignoraram asproi0i7Pes r2gias, continuando a explorar grandes massas de tra0al$adoresindCgenas. 'omo disse 'larence aring no seu importante livro so0re oimp2rio $ispJnico na m2rica, Ras leis que proi0iam o tra0al$o pessoalfor7ado dos Cndios nunca passaram de letra morta e resultaramcompletamente inoperantesR. %emais disso, em quase toda a ispano-m2ricaa escravido indCgena perdurou dissimulada em institui7Pes eufemCsticascomo a encomienda, a mitra e a na0oria.s missPes QesuCticas da *epY0lica

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    encarni7ada resistncia dos colonos de certas regiPes U a0oli7o docativeiro e U correlata importa7o de escravos negros, cessou desde omomento em que medraram economias produtoras de mat2rias-primasdestinadas ao mercado mundial. Exemplos tCpicos o 4aulo, /aran$o,4ar=, '$ile, 4eru, 3ova , a compan$ia mercantil exigira a supresso da escravido indCgenapara pura e simplesmente vender africanosW em B, no apenas fizera

    estas exigncias, seno que simultaneamente se comprometia a adquirirtudo o que os propriet=rios produzissem e exportassem em drogas e gnerostropicais. Em 6">, no $avia mercado na Europa para aquelas produ7PesWem B, $avia um amplo mercado para o cacau, o arroz, o algodo, o caf2,a salsa, o cravo fino, o cravo grosso, o ta0aco, o anil, as madeiras delei.( que as leis da coroa e as prega7Pes dos religiosos no $aviamconseguido - a su0stitui7o da escravatura indCgena pela escravaturanegra - operara-se instantaneamente quando a economia regional searticulara com o com2rcio mundial.

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    c$ave dos pro0lemas da su0stitui7o reside, por conseguinte, naarticula7o da economia local com o com2rcio internacional. 4areceimpossCvel fugir U concluso de que foi essa conexo que efetivamente0aniu de certas regiPes a escravatura indCgena para implantar em seulugar a de negros.

    - Esta 2 a altura conveniente para inquirir em que consistiu ointeresse do com2rcio internacional em introduzir a escravatura negra.upon$amos que a produ7o colonial de mat2rias-primas para exporta7o se0aseasse exclusivamente no tra0al$o de escravos Cndios. 3esse caso omercantilismo europeu teria de adquirir as mat2rias-primas a peso de ouroe prata, pois o mercado interno para as manufaturas europ2ias se limitavaU mCnima minoria dos propriet=rios. a0e-se que a polCtica mercantilistadeitava raCzes na grande fome de metais preciosos que afligiu a Europa noperCodo anterior aos desco0rimentos. 3essa escassez de moeda residira emdeterminado momento o principal empecil$o U expanso da economiaeurop2ia, e foi a desesperada urgncia de conseguir metais queimpulsionou os desco0rimentos. 3essas condi7Pes, gan$ou for7a de dogma oprincCpio de que o poder e a riqueza de um paCs se 0aseavam nas suasreservas de ouro e prata, impondo-se evitar a evaso da moeda como

    imperativo de defesa do interesse nacional. Essa concep7o criso-$edonista constou como pedra angular na polCtica das na7Pes em quefloresceu o mercantilismo.3a $ipStese de uma produ7o colonial 0aseada na escravatura indCgena, oseuropeus teriam de adquirir as mat2rias-primas a peso de ouro e prata.'omo conseq[ncia, so0reviria uma descapitaliza7o da Europa em 0enefCciodas colTnias, o que importava uma nega7o da prSpria razo de ser dopacto colonial. (s mesmos metais preciosos que a Europa nesse tempoextraCa do 3ovo /undo seriam recam0iados para as colTnias. averiaacumula7o de capital nas colTnias e no nas metrSpoles.Impun$a-se, portanto, adquirir as mat2rias-primas coloniais com uma moedano-met=lica. Essa moeda viria a ser o negro - uma moeda extremamente0arata.

    o mecanismo desses sistemas de trocas, con$ecido como com2rciotriangular, consistia esquematicamente na troca de manufaturas 0arataseurop2ias por negros na costa da Ffrica, na posterior permuta dessesnegros por mat2rias-primas nas colTnias americanas e, por fim, na vendadas mat2rias-primas na Europa a din$eiro de contado e pre7os altos.3a negocia7o da costa da Ffrica no entrava moeda met=lica, servindoesta apenas de padro de contaW fazia-se tudo por permuta. (sportugueses, por exemplo, usavam na 1quilates na costa da

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    economista anSnimo portugus de fins do s2culo XIII, dizia que o lucroda opera7o mercantil Rde ordin=rio 2 todo consumido e esgotado notratamento, sustento e vestu=rio decente da famClia dos propriet=rios esen$orios-de-engen$oR.3estas trocas entre os propriet=rios coloniais e o mercantilismoportugus no entrava tampouco din$eiro met=lico. ( que permite entender,entre outras coisas, a constante e angustiosa penYria de moeda queafligia a colTnia, apesar do pactolo de ouro que ela produzia emetodicamente vertia na Europa.

    I - ( uso do negro como moeda para aquisi7o das mat2riasprimascoloniais, pode ser direta ou indiretamente ilustrado por diversasformas. #astaria aqui citar um documento do s2culo XII que coloca ascoisas de maneira perfeitamente clara.+rata-se de uma esp2cie de memorial, datado de >! de agosto de 6!, de/anuel )ernandes 'ruz, Rantigo morador de 4ernam0ucoR, ao rei de4ortugal, so0re a recupera7o da capitania conquistada pelos $olandeses.3o parece $aver dYvida de que /anuel )ernandes 'ruz era um mercadorportugus, daqueles que $aviam permanecido no territSrio depois daconquista.

    egundo 'ruz, $avia duas maneiras de recuperar a capitania mediantepagamento de uma indeniza7o aos $olandeses ou uma guerra para expuls=-los. Expun$a um plano detal$ado so0re o modo de reaver 4ernam0uco Rsemgasto da fazenda real nem extorso dos vassalosR, em am0as as $ipSteses.)izesse el-*ei Restanco do com2rcio das pe7as de escravos de ngola paraa costa do #rasil pelo espa7o de cinco anosR. Isto significava quemandaria vir por conta da sua real fazenda os escravos, da seguinteforma >.!!! pe7as em cada ano, sendo .!!! para 4ernam0uco, 5.!!! paraa #a$ia e 1.!!! para o *io de aneiro, vendendo-se a 6! mil r2is cadauma. Este pre7o de 6! mil r2is Raos $a0itantes do #rasil pareceria muitomoderadoR. 'alculava que deste nYmero de >.!!! escravos poderiam c$egarvivos ao #rasil cerca de !.!!!. Estimava em >!.!!! cruzados o custototal da coloca7o destes !.!!! escravos nos portos 0rasileiros,

    compreendendo as manufaturas para a permuta7o na costa da Ffrica edespesas da viagem a partir de ;is0oa. endidos ao pre7o indicado, os!.!!! negros dariam em cada ano um mil$o e !! mil cruzados.(s vassalos do #rasil, por sua vez, dariam o a7Ycar em Rpagamento destaspe7asR, o que importa em dizer que a safra de a7Ycar seria vendida por ummil$o e !! mil cruzados U real fazenda. /ais simplesmente, trocar-se-iaa totalidade do a7Ycar pelas pe7as de ngola.( a7Ycar a ser permutado pelas pe7as, seria o de todos os engen$os do#rasil, ou seQa, 1! engen$os, desde o 3ordeste at2 o *io de aneiro, osquais produziam um total de .>!! arro0as de a7Ycar Rma c$oR. Estea7Ycar, ao pre7o de cruzados cada arro0a, renderia em ;is0oa 6 mil$Pesde cruzados. Em outras palavras, !.!!! negros que $aviam custado >!.!!!cruzados - o missivista incluCa nesse custo as despesas do transporte edo com0oio para ;is0oa - serviam para comprar mat2rias-primas a serem

    vendidas na Europa por 6 mil$Pes de cruzados. 'oncluCa que dessa formaRtodos estes 0enefCcios se conseguiam sem gasto da fazenda real, e tam02msem protestos dos vassalosR.3aturalmente, estes resultados seriam alcan7ados na $ipStese de que acoroa explorasse diretamente o tr=fico e a comercializa7o do a7Ycar. (mercador no auferia os mesmos lucros, pois tin$a de pagar um sem-nYmerode tri0utos e taxas impostos de saCda dos escravos de ngola e entradano #rasil, impostos de entrada do a7Ycar em 4ortugal, d2cimas, fintas,dCzimos, etc. ( que aqui importa assinalar, 2 que o colonialismomercantilista como um todo, auferia aquele lucro ao comprar as mat2rias-

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    primas coloniais mediante o uso do negro como moeda.'laro, portanto, que a su0stitui7o da escravatura indCgena pela africanafoi uma imposi7o dos interesses mercantilistas, o0Qetivando a permitir-l$es a aquisi7o das mat2rias-primas coloniais com uma moeda no-met=licae 0arata - o negro. 4or isso cumpria proi0ir a escravatura indCgena. menos que $ouvesse importa7o de negros, no $averia tampouco exporta7ode mat2rias-primas coloniais. produ7o foi em Yltima an=lise toda trocada por escravos negros. (mesmo se pode naturalmente dizer da produ7o de ouro e diamantes. e comoafirmou um0oldt, metade do ouro das m2ricas saiu do #rasil, pode-se porigual afirmar que aquele ouro apenas deixou em /inas . Escravido na estJncia gaYc$a

    I - 3a estJncia gaYc$a preponderaram desde o inCcio rela7Pes de produ7ocapitalistas. ( peo, produtor direto, era um tra0al$ador livredesprovido de meios de produ7o, devendo por isso vender sua for7a-de-tra0al$o para prover U su0sistncia.4ortanto, a economia pastoril gaYc$a apresentava aquilo que 2 o tra7oespecCfico do capitalismo no apenas a produ7o de mercadorias, de restopresente em outros sistemas, mas a transforma7o da prSpria for7a-de-tra0al$o em mercadoria, como outra qualquer. & certo que uma pequenaparcela da produ7o 0ovina se destinava ao consumo do estancieiro e seustra0al$adores, mas fundamentalmente o sistema produzia valores-de-troca.+ratava-se, pois, de um sistema de produ7o social 0aseado no tra0al$oassalariado, o que importa dizer capitalista.3o o descaracterizava como tal o fato de que o estancieiro no pagassetotalmente em din$eiro o sal=rio. 4arte do sal=rio era pago em esp2cie,

    ou seQa, diretamente em meios de su0sistncia. Em razo disso, assumiampeo e estancieiro uma dupla posi7o, em que ao mesmo tempo vendiam ecompravam mercadorias. 3um sistema capitalista desenvolvido, otra0al$ador se apresenta frente ao capitalista apenas como um vendedor demercadoria - sua for7a de tra0al$o. ( capitalista, por sua parte,representa apenas o papel de comprador da mercadoria for7a-de-tra0al$o.3aquela economia pastoril, am0os compravam e vendiam mercadorias. Estasitua7o 0ifronte provin$a do 0aixo grau de diviso do tra0al$o e daescassa quantidade de capital vari=vel empregado. magnitude do tra0al$o excedente era determinada pelas condi7Pesnaturais de produ7o. Muanto mais favor=veis estas condi7Pes, a sa0er, aspastagens, tanto menor a quantidade de tra0al$o necess=rio e,conseq[entemente, tanto maior a quantidade de tra0al$o excedente. b3ogeral, o tempo de tra0al$o necess=rio U manuten7o e reprodu7o do peose mostrava extremamente exCguo. (s meios de su0sistncia,consistentes quase sS de carne, provin$am de uma riqueza 0asicamentenatural, quase uma d=diva da natureza. %emais, o clima temperado reduziaas necessidades no apenas da alimenta7o, mas de vestu=rio e a0rigo. (0aixo grau de desenvolvimento social do peo fazia dele um indivCduo quese contentava com pouco - um peda7o de carne, uma c$o7a, uns farrapos.3o $= elementos que permitam medir exatamente o poder aquisitivo dosal=rio pago, mas uma vez que o valor da for7a-de-tra0al$o correspondiaao valor dos meios de su0sistncia, for7a 2 concluir que se tratava de

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    sal=rio extremamente 0aixo.

    II - propSsito das rela7Pes de produ7o na economia pastoril, 2necess=rio discutir o papel da escravatura, o0Qeto de viva controv2rsiana $istoriografia gaYc$a.Dma das principais fontes da controv2rsia reside no famoso e fecundo

    di=rio de viagem de aint-ilaire. ( s=0io francs alude freq[entemente aRestJnciasR com nYmero consider=vel de escravos, mas poucos e mesmonen$um tra0al$ador livre. Estas o0serva7Pes induzem $istoriadores Uconcluso de que Us vezes o tra0al$o pastoril fosse desempen$adopredominantemente, quando no exclusivamente, por escravos,caracterizando-se, assim, como um sistema de produ7o escravista.EstJncia proveio do arcaico estanciar ou estancar, lugar onde se paravaou permanecia por algum tempo. )erno ;opes, nas 'rTnicas, diz estantespara designar residentes. Escrevendo em BB so0re o 'ontinente de o4edro, )rancisco oo *oscio diz RestJncia ou casaR. EstJncia se dissedepois a propriedade aonde vivia em car=ter permanente o dono dere0an$osW por extenso, c$amou-se tam02m assim a grande propriedadeagrCcola da campan$a enquanto o gado no expulsou o cereal. 3o tempo emque aint-ilaire fez sua viagem, ainda prosperava uma significativa

    produ7o tritCcola na 0ase do tra0al$o escravo, o que explica que elec$amasse tais propriedades de estJncias. agricultura extensiva sempre se prestou 0em ao tra0al$o escravo. %aCque fosse Rapreci=velR o nYmero de escravos nas propriedades agrCcolas,conforme assinala orge alis

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    o0viamente tra0al$aria pouco e mal, usando com toda a pro0a0ilidade ocavalo para fugir atrav2s das dilatadas, indivisas e despovoadascampan$as, cruzando a raia em 0usca de uma li0erdade asseguradalegalmente nas terras platinas. emel$ante vigilncia e superviso serialogicamente antieconTmica.` parte isso, os africanos no possuCam experincia t2cnica de tra0al$opastoril. 3o poderia $aver nada mais antieconTmico que a importa7o deum negro da Ffrica para su0met-lo a um demorado adestramento. 3em seQustificaria semel$ante gasto de capital quando existia na campan$a umamassa de tra0al$adores livres dotada de experincia e tradi7o pastorisos gaYc$os ou gaud2rios, Cndios e mesti7os.3o 2 dizer que no $ouvesse em a0soluto emprego de negros nas atividadespastoris. 3as crPnicas e nos invent=rios, aparecem reiteradas alusPes aescravos RcampeirosR. 3ote-se, contudo, que os que desem pen$avamatividades propriamente pastoris, eram como regra negros forros. penas$avia emprego de escravos em tra0al$os auxiliares do pastoreio, Ucondi7o de que so0re eles se pudesse exercer a vigilncia. +al ocorria,por exemplo, nas arreadas e nos rodeios, em que $avia participa7o decapatazes. R3as estJncias pouco tem que fazer o negro, exceto na ocasiorara dos rodeiosR, testemun$a 3icolau %re:s. 3as instru7Pes do 'onde de

    4iratini aos seus cartazes, documento precioso desco0erto e pu0licado por

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    escravido 2 apenas uma institui7o QurCdica. simples existncia daescravido no determina necessariamente um processo de produ7oescravista. 3o $= produ7o escravista nas forma7Pes sociais em que,malgrado exista a institui7o QurCdica da escravido, a produ7o socialno se 0aseie fundamentalmente no tra0al$o escravo. +al o caso dasforma7Pes sociais em que o escravo est= su0metido a uma condi7opatriarcal, suplementando a for7a-de-tra0al$o do amo, ou o das forma7Pesem que o escravo desempen$a predominantemente fun7Pes dom2sticas ouostentatSrias, descansando a produ7o so0re o tra0al$o de $omens decondi7o servil ou livre. existncia de um processo de produ7oescravista pressupPe evidentemente a da institui7o QurCdica daescravido, mas, esta institui7o, apenas por si no constitui umprocesso de produ7o escravista.

    - Esta0elecidas estas premissas teSricas e metodolSgicas, importaapreciar rapidamente algumas peculiaridades $istSricas do capitalismopastoril gaYc$o.s leis do processo de produ7o capitalista no operaram na sua plenitudeem todas as 2pocas econTmicas. Isto sS ocorreu quando o aludido processose tornou dominante em determinada forma7o social. 3os paCses mais

    evoluCdos da Europa (cidental, essa dominJncia apenas se realizou nasegunda metade do s2culo XIIIW antes disso, o processo de produ7ocapitalista era dependente e, por isso mesmo, dominado.( capitalismo pastoril gaYc$o integrava uma forma7o social em quedominavam as rela7Pes de produ7o escravistas. Em resultado disso, estavasu0ordinado U lSgica e Us necessidades do escravismo. Isto fazia dele umcapitalismo impuro, dependente e atrasado. acumula7o de capital foiescassa. %ado que explorava reduzidCssimo nYmero de tra0al$adores,produzia por igual pouca mais-valia. Isto explica que, no come7o dos2culo, os estancieiros gaYc$os no dispusessem de capital para aorganiza7o de um simples frigorCfico, como o demonstrou andra ata$:4esavento, em *epY0lica el$a

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    da na7o mais rica da terra, contra um pequeno e po0re paCs agr=rio deuma penCnsula asi=tica.%e todo modo, $= prata da casa para ilustrar mel$or a tese a ocupa7o do3ordeste 0rasileiro pelos $olandeses no s2culo XII constitui um casocl=ssico.'omecemos pela conquista. (s $olandeses tin$am todos os motivos paraesperar um xito fulminante. 3a primeira metade do s2culo XII aindYstria, a navega7o, o com2rcio e as finan7as faziam dos 4aCses-#aixosa primeira na7o da Europa. /edido pela escala militar da2poca, o ex2rcito invasor era formid=vel. 'ontra isso, o que $avia em4ernam0uco era uma pra7a po0remente guarnecida, equipada de armamentoo0soleto e escasso.pesar disso, os $olandeses precisariam de sete anos de uma guerra cruel,destrutiva e extenuante, para poder consumar a conquista, limitada assimmesmo ao reduzido nYmero de povoa7Pes da orla marCtima.s dificuldades da conquista $olandesa so atri0uCdas U t=tica empregadapelos defensores luso-0rasileiros - a guerra de em0oscadas ou guerra deguerril$as. 3o se pode esquecer, no entanto, que semel$ante t=ticaapenas pode prosperar se tiver por si o respaldo da popula7o. verdade2 que os $olandeses no contavam com o apoio ou a simpatia de nen$uma

    classe social importante da sociedade colonial. (s sen$ores-de-engen$o,que tin$am o domCnio interno a nCvel econTmico, social e ideolSgico,ofereceram tenaz resistncia, mo0ilizando os estratos acessSrios dapopula7o livre. (s escravos, a outra classe fundamental, preferiram0uscar a li0erta7o em 4almares viram logo que aquela no era a suaguerra. (s Cndios aderiram em massa aos $olandeses, mas essa adeso foiescassamente significativa, visto no se tratar de Cndios integrados nasociedade de classes da colTnia. (s $olandeses apenas granQearam o apoiode renegados e aventureiros, apoio esse que, sem ser desden$=vel, no foiem todo caso decisivo. to falada deser7o de 'ala0ar teve grandeutilidade para os invasores, mas no tanta que no tivessem de gastarmais cinco anos no remate da conquista. 3em se mostrou mais decisiva aadeso de elementos isolados, como

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    %emais, no gozavam de prestCgio so0re as categorias sociais su0alternas.4ara tanto faltava-l$es, como disse o padre ntTnio ieira com ufaniatipicamente portuguesa, RindYstria para tratar escravosR.)rei /anuel 'alado, um sagaz 0eneditino que ento vivia em 4ernam0uco,resumiu lucidamente a situa7o para um general $olands Re ossasen$orias pretendem viver nesta terra e conserv=-la, 2 impossCvel opoderem faz-lo sem os moradores que sa0em plantar os mantimentos e0eneficiar os canaviais, e fazer o a7Ycar e criar os gados, o que os$olandeses no sa0em fazer, nem podem, porque para isso 2 necess=rio quevivam no serto, e apartados uns dos outros em largas distJncias, e queesteQam suQeitos a l$es virem cada dia os soldados portugueses que0rar asca0e7as sem o poderem remediar e ainda que andem dez mil flamengos emquadril$as vigiandoR.. @ ssim que sem o favor dos moradores 2 impossCvelossas en$orias conservarem-se nesta terraR.Importa entender sen$ores-de-engen$o, onde o frade dizia genericamentemoradores. 3a arenga de 'alado estava implCcita uma proposta de alian7aentre os sen$ores-de engen$o e os conquistadores, como Ynica forma deresta0elecer a produ7o a7ucareira. (s dirigentes mais lYcidos da'ompan$ia das ndias (cidentais logo entenderam que no $avia outrasaCda.

    3o faltou entretanto quem imaginasse e at2 tentasse alternativas. maisS0via e tentadora consistiria em colonizar 4ernam0uco com camponeses0atavos, o que oferecia a dupla vantagem de consolidar o domCnio doterritSrio e reduzir a violenta tenso social imperante na metrSpole.s dificuldades pr=ticas dessa coloniza7o se ac$am expostaso0Qetivamente em um documento $olands, o #reve %iscurso, pu0licado novolume 15 da *evista do Instituto rqueolSgico e

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    de /auric2ia no ano de 659 e teve a dura7o de nove dias, participandodeputa7Pes de sen$ores-de-engen$o de *ecife, (linda, Ita marac=,IgarassY, 4orto 'alvo e erin$a2m, conforme se pode ver das atas lavradasna ocasio. 3a a0ertura dos tra0al$os estipulou-se que as propostasRvigoraro e sero inviolavelmente guardadas nesta *epY0licaR.(s $olandeses asseguraram aos sen$ores-de engen$o a propriedade, ali0erdade religiosa, perdo geral Rqualquer que seQa o crimeR, Qusti7aeq[idosa, cr2ditos para a compra de escravos, represso contra a0usos desoldados e, finalmente, direito ao uso de armas de fogo. s discussPesso0re a cl=usula relativa ao uso das armas de fogo, proQetam luz claraso0re o significado da alian7a cele0rada entre os sen$ores-de-engen$o eos conquistadores.4ropuseram estes que somente aos sen$ores-de engen$o fosse facultado ouso de armas de fogo. Excepcionalmente, para o com0ate aos RsalteadoresR,isto 2, escravos re0eldes, poderiam usar armas de fogo os 0rancos po0rese os mulatos. /as os sen$ores-de-engen$o, receando mais os elementos dascategorias populares que os mercen=rios da tropa $olandesa, opuseram-se Uexce7o, insistindo em que a defesa da propriedade e da ordem cou0esseexclusivamente U tropa $olandesa.3assau deixou 0em claro que no $averia contempla7o para com os

    sen$ores-de engen$o que de qualquer modo preQudicasse os interessescomerciais da 'ompan$ia. REspias ?sic@ seriam colocados em todos osdistritos, a fim de evitar descamin$os de a7Ycar. (s que comprovadamentefaltassem ao aQuste, seriam R0anidos da terra com todos os seus 0ensR.( pacto de /auric2ia funcionou a contento das partes interessadas at2 omomento em que os conquistadores - movidos em parte pela sSrdida avarezacaracterCstica do mercantilismo neerlands e em parte pelas pressPes darecesso econTmica que ento atingia o auge na Europa - esqueceramimprudentemente que os sen$ores-de-engen$o ainda tin$am o podereconTmico, social e ideolSgico.Eis aqui o que aconteceu. 3o curso daqueles anos, a 'ompan$ia outorgaraaos sen$ores-de engen$o contCnuos empr2stimos, que na pr=tica semostravam irresgat=veis porque vinculados a Quros escorc$antes. Dma vezremida a dCvida, apareciam os Quros acumulados da usura, impondo novoendividamento. 'om isso, os sen$ores-de-engen$o estavam com seuspatrimTnios $ipotecados U 'ompan$ia ou a prestamistas mais ou menosligados a ela.egundo carta do general )rancisco #arreto ao rei de 4ortugal - cartaessa que pode ser vista na Cntegra no rquivo istSrico Dltramarino, 4E,'aixa 5, 'arte de >.!.5, 'onsulta de 6.>.65, ou um resumo emirginia *au, /anuscritos da 'asa de 'adaval respeitantes ao #rasil, I,p. 9!96 - as dCvidas dos sen$ores-de-engen$o de 4ernam0uco com os$olandeses montavam, em 65, a pouco mais ou menos dez mil$Pes decruzados, o que equivalia, pelos pre7os correntes, ao valor da produ7ode quase cinco safras de a7Ycar postas em msterd.

    I - Muando no governo, 3assau exercera uma a7o $a0ilmente

    contemporizadora no tocante a tais dCvidas. Intervin$a quaseinvariavelmente para assegurar prorroga7Pes quando a 'ompan$ia ou outroscredores pretendiam executar os devedores em mora.(s ucessores do 'onde na dire7o da 'ompan$ia em *ecife inauguraram umanova polCtica que significava em Yltima instJncia a total ruCna dossen$ores-de-engen$o. /ostraram-se inflexCveis, a princCpio pela recusasistem=tica de dila7Pes nos venciment(s das dCvidas e a0ertura de novoscr2ditos, e depois pela execu7o e seq[estro dos 0ens dos devedores.'olocando dessa forma os sen$ores-de-engen$o U 0eira da ruCna total, a'ompan$ia ins2nsatamente minava de contradi7Pes insan=veis o prSprio

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    terreno social em que assentava o seu domCnio em 4ernam0uco. Muando porfim iniciou o seq[estro dos 0ens dos devedores, rompeu o pacto vigoranteentre ela e os sen$ores-de-engen$o.4ara estes, o confisco representava o seu desaparecimento como classesocial, o que somente poderia ser evitado pela insurrei7o. ituados numvazio social, os $olandeses no tin$am como esmagar a insurrei7o, adespeito da superioridade militar. %urante aqueles anos, $aviamdescarregado todo o peso da sua opresso so0re as 0aixas e m2diascategorias sociais. avia muito que essas categorias exigiam uma re0eliocontra os $olandeses, mas os sen$ores-de-engen$o resistiam, porquantoainda no a consideravam essencial aos seus interesses. 3o $avia outraclasse social em condi7Pes de deflagrar e conduzir a luta contra os$olandeses. (s sen$ores-de engen$o assim o fizeram, vencendo asuperioridade 02lica do inimigo e-ignorando as dissuasPes da coroalusitana.4or duas vezes, na resistncia U invaso e na reconquista, os sen$ores-de-engen$o reuniram de0aixo do seu estandarte todas as categorias sociaisde $omens livres - 0rancos, negros, mulatos, Cndios. %eixaram de fora osescravos. 3em poderia deixar de ser assim, uma vez que um escravo quepegasse em armas automaticamente se converteria em $omem livre. fuga

    dos escravos para 4almares permitiu aos sen$ores-de-engen$o manterem aluta armada contra os $olandeses, sem o perigo de um ataque, pelascostas, de parte dos oprimidos.3o entanto, as duas guerras custaram um altCssimo pre7o aos sen$ores-de-engen$o. implesmente perderam seus escravos, parte mais valiosa dos seuspatrimTnios. 3o esqueceram esta experincia. 3as suas insurgnciasfuturas - "B, 'onfedera7o do Equador, 4raieira - deixariam de ir at2 ofim, compondo-se com o advers=rio, para evitar o mal maior.

    5. Independncia e escravido

    I - a0emos que em muitos sentidos, nos tempos coloniais, os prSpriosdominadores nativos tam02m eram, por sua vez, dominados. Internamente, a

    propriedade dos meios de produ7o l$es conferia a domina7o a nCveleconTmico e social, mas, como decorrncia do status colonial, a domina7opolCtica pertencia U metrSpole portuguesa. 'om isso, no era dado aosdominadores nativos tomarem as decisPes cruciais a respeito de seusinteresses. 3o que estes fossem totalmente ignorados, e nem poderiam s-lo, pois os dominadores nativos estavam afinal de contas U frente doprocesso de produ7o que alimentava os copiosos r2ditos da coroa.+odavia, prevaleciam em Yltima instJncia os interesses da classe que em4ortugal aproveitava a produ7o colonial - uma 0urguesia mercantil que senota0ilizava por uma sSrdida rapacidade. 'omo conseq[ncia, tam02m osdominadores se sentiam explorados, no considerando satisfatSrio o seuquin$o no processo de explora7o dos dominados. 3o s2culo XII, o frade0eneditino %omingos de ;oreto 'outo sintetizara a situa7o ao dizer queos sen$ores-de-engen$o se limitavam a RfeitorizarR escravos em 0enefCciodos comerciantes portugueses. 3os come7os do s2culo XIX a situa7o nomudara, como assinalou um o0servador estrangeiro, ierra : /ariscal R(sen$orio de engen$o tra0al$a incessantemente para terceiro e no parasiR.3o foi contudo seno no alvorecer do s2culo XIX que os dominadoresnativos adquiriram conscincia e for7a suficientes para formular eexecutar um proQeto de cria7o de um Estado 3acional.3um amplo sentido $istSrico, a Independncia 0rasileira se inscreve nociclo de revolu7Pes que converteram as colTnias do 3ovo /undo em Estados

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    3acionais. Estas revolu7Pes foram especificamente anticoloniais e nooutra coisa. 'onstituCram su0produtos da revolu7o industrial que naEuropa encerrou o longo e asfixiante reinado do mercantilismo. estrutura colonial, cria7o do mercantilismo, fundava-se essencialmenteno monopSlio metropolitano so0re o mercado dos territSrios dominados. `scolTnias no era dado comerciar seno com a metrSpole e nesse monopSlioradicava a essncia mesma do pacto colonial.Muase desde o inCcio o monopSlio foi 0urlado atrav2s do contra0ando,modalidade de com2rcio que dava a outras na7Pes europ2ias o acesso aosmercados coloniais e facultava Us colTnias permutarem as mat2rias-primaspor manufaturas em condi7Pes mais compensatSrias que as permitidas pelomercantilismo metropolitano. 4ara o $istoriador argentino *odolfo4uiggros, o contra0ando constituiu o RoxignioR que permitiu Uspopula7Pes coloniais respirarem e viverem. %e todo modo, 0eneficiouprincipalmente a 0urguesia inglesa, que 0urlando-se do monopSlio pTdeacumular capitais para financiar a revolu7o industrial. /ultiplicadasgigantescamente as necessidades de mat2rias-primas e mercados paramanufaturas, Q= no 0astou U Europa industrial o mecanismo de trocas aconta-gotas do contra0ando. /anifestou-se violenta contradi7o entre omercantilisno monopolista e a nova ordem industrial, impondo como Ynica

    alternativa a supresso do monopSlio e sua su0stitui7o pelo livrecom2rcio.Isto implicava logicamente a supresso do domCnio das metrSpoles so0re osterritSrios coloniais. 3outras palavras, para que $ouvesse li0erdade decom2rcio, era preciso que as colTnias adquirissem a so0erania polCtica. 0urguesia inglesa, que madrugara no processo da revolu7o industrial,tin$a mais interesse que qualquer outra na extin7o do monopSliomercantilistaW natural, pois, que estimulasse decididamente as revolu7Pesanticoloniais. %este modo, em cada colTnia a revolu7o foi o0ra declasses que, possuindo Q= o domCnio econTmico e social, aspiravam Udomina7o polCtica.

    II - revolu7o anticolonial 0rasileira foi um proQeto exclusivo da

    classe dos sen$ores-de-escravos, que a dirigiu em proveito prSprioW afalar verdade, quando a emancipa7o se declarou como uma irreversCvelnecessidade $istSrica, no $avia outra classe apta a realiz=-la.3as conspira7Pes do s2culo XIII ?/ineira - B"9W #aiana - B9"W 'arioca- B95@ e na Insurrei7o 4ernam0ucana de "B, a elite nativa desen$ores-de-escravos no conseguira resolver um crucial pro 0lemapolCtico o de como fazer a revolu7o sem sacrifCcio da institui7oescravista. revolu7o anticolonial no podia se transfigurar emrevolu7o social. 'onsentir que a Independncia se acompan$asse daemancipa7o escrava, importaria para os sen$ores-de-escravos em cavar aprSpria ruCna.( perigo se apresentaria inevitavelmente na $ipStese de uma prolongadaguerra contra a metrSpole. 'omo sustent=-la, rodeados de escravos sempreU espreita de uma oportunidade para a revoltaV Esse medo explica o fato

    de que a classe como um todo no ten$a secundado as tentativasprecursoras da #a$ia, /inas, *io e 4ernam0uco, empreendidas por gruposque pretendiam apoiar-se nas d20eis for7as ur0anas de $omens livres.eduzia a tais conspiradores o exemplo das colTnias inglesas, onde ainstitui7o so0revivera U guerra. %eclara7o de Independncia foraredigida por um sen$or de escravos e afinal emergira uma repY0lica queno excluCa o escravismo. 3a verdade, $avia diferen7as capitais entre ascolTnias inglesas e a colTnia portuguesa. 3aquelas, ao contr=rio do quesucedia aqui, dominava uma Q= vigorosa 0urguesia manufatureira queliderara a luta, aliando-se apenas taticamente aos sen$ores-de-escravos

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    do ul. %emais, o escravismo no era l= a forma dominante de produ7o,no possuindo, por isso mesmo, a $omogeneidade e a solidez do sistema0rasileiro. Igualmente importante ao passo que nas colTnias inglesas osescravos no c$egavam a !Z da popula7o, no #rasil representavam 0emmais de metade.3o caso da Insurrei7o 4ernam0ucana de "B, o pro0lema se apresentou deforma particularmente dram=tica. $istoriografia da insurrei7o,particularmente a de 'arlos

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    Este o0sessivo medo a uma revolta escrava explica a nfase de os2#onif=cio no sentido de uma Rindependncia ordeiraR.quela foi de fato a Independncia mais ordeira de todo o 3ovo /undo./erc da entroniza7o de um prCncipe portugus - ningu2m menos que ofil$o e $erdeiro do rei de 4ortugal - os sen$ores-de-escravos aplacaram eneutralizaram a metrSpole, evitando os perigos sociais inerentes a umaguerra. Excetuada a #a$ia, onde a 0urguesia mercantil lusitana mo0ilizoua guarni7o numa resistncia que durou nove meses e sS no prosseguiuporque a massa escrava c$egara a um alarmante estado pr2-insurrecional, o#rasil no teve de sustentar uma verdadeira guerra para a conquista daIndependncia.

    III - Em contrapartida, a Independncia feita por essa forma atrasou emsessenta e seis anos a constitui7o do #rasil como na7o. Independncia no se interessou pelos escravos e os escravos no seinteressaram pela Independncia. e os sen$ores no podiam admitir aemancipa7o dos escravos, estes por sua vez no podiam se comover por umaIndependncia madrasta que l$es recusava quanto $avia de mais importante,ou seQa, sua prSpria emancipa7o. Em suma a emancipa7o polCtica do paCsno teve para os escravos a menor significa7o. 4ois, como salientou

    (liveira ;ima, Rantes de emancipar-se politicamente, tin$am que seemancipar civilmenteW antes da Independncia, careciam da alforriaR.a0e-se que a 'onstitui7o de ">5 excluiu os escravos da nacionalidade,ainda que nascidos no #rasil. %esse modo, com sua classe tra0al$adorareduzida ao cativeiro, o #rasil independente veio a ser uma na7oinconclusa. (s escravos seriam durante sessenta e seis anos os 0astardosda na7o 0rasileira, situa7o anTmala que no entanto no provocou entreos radicais do li0eralismo, como assinalou oaquim 3a0uco, mais que umleve Rdesassossego da conscinciaR. Independncia foi particularmente madrasta para com os li0ertos. Entreoutras iniq[idades, manteve em vigor a disposi7o das (rdena7Pes quepermitia ao antigo sen$or revogar a alforria por ingratido. R+udo eraQusta causa de revoga7oR, escreve 4erdigo /al$eiro. R4ode-se dizer uma

    verdadeira rede em que o li0erto podia facilmente cair e ser arrastado denovo para a escravidoR. 4ara tanto, 0astava uma simples inQYria ver0alcontra o antigo amo, malgrado no fosse na presen7a deleW tratava-se,nesse caso, da Ringratido ver0al em ausnciaR. 'on$ecem-se inYmerasescrituras de revoga7o da alforria e um nYmero ainda maior de decisPesQudiciais placitando essas revoga7Pes quando arg[idas pelos li0ertos.inda mesmo no silncio da escritura de alforria, ficava o li0ertosuQeito a um sem-nYmero de o0riga7Pes para com o ex-sen$or, c$amadopatrono como em *oma Rervi7os pessoaisR ou R0ons ofCciosRW RrespeitoR,Rpiedade filialR e RrevernciaRW necessidade de autoriza7o Qudicial parademandar o patrono. Esta dependncia explica porque 2 que as dela7Pes deinsurrei7Pes escravas partiam invariavelmente de li0ertosW do mesmo modose entende o fato de que nas elei7Pes os li0ertos votassem nos candidatosescravocratas, contra os a0olicionistas.

    constitui7o e as leis su0meteram o li0erto a restri7PesQurCdicoinstitucionais que virtualmente criavam um terceiro estamento nasociedade 0rasileira. penas podia votar nas elei7Pes prim=riasW nopodia ser eleitor e exercer cargos como deputado provincial ou geral,senador, Qurado, Quiz de paz, delegado ou su0delegado de polCcia,promotor pY0lico, ministro, magistrado, diplomata. 3o podia rece0erordens religiosasW podia servir no ex2rcito, mas no c$egar aooficialato. menos que $ouvesse nascido no #rasil, no se tornava cidado0rasileiro. /uitos li0ertos aos quais se negava a cidadania, o0servou um

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    deputado U 'onstituinte, $aviam na #a$ia lutado de armas na mo. simples RsuspeitaR de envolvimento em insurrei7Pes escravas autorizava ogoverno a deport=-los para a Ffrica, como sucedeu com centenas deli0ertos depois da insurrei7o 0aiana de "1.3o 2 uma das menores desditas da $istoriografia 0rasileira, o recenteflorescimento de uma concep7o da nossa $istSria, a qual nem por 0emintencionada deixa de ser nefasta.Muando se ocupa da Independncia, esse $istoricismo populista exalta aparticipa7o do RnegroR nas lutas ento travadas, dando como exemplo osregimentos de negros da #a$ia. Dma vez que a quase totalidade da massaescrava se compun$a de negros, a afirma7o sugere su0liminarmente que osescravos lutaram pela Independncia. 3a verdade, os efetivos dessesregimentos negros se constituCam de li0ertos e integravam o sistema deseguran7a dos sen$ores-de-escravos, desempen$ando-se de resto com not=veleficincia na represso aos quilom0os e Us insurrei7Pes. fora estessoldados negros, participaram da luta na #a$ia li0ertos que apenaso0edeciam a uma exigncia de seus patronos. ( que no impediu que pelomenos dois deles, citados por ;a0atut em ordem-dodia como R0ravosR -4edro lves e oo *aimundo de lima - ten$am sido deportados para aFfrica, como suspeitos de participa7o na insurrei7o de "1, de acordo

    com o decreto imperial de 5 de mar7o daquele ano. caracterCstica essencial do B de setem0ro 2 que foi uma independnciafeita por propriet=rios de escravos exclusivamente para propriet=rios deescravos.

    . en$ores de escravos e 0urguesia mercantil

    I - 3a #a$ia, excepcionalmente, o processo da Independncia nada teve depacCfico. (s portugueses ofereceram encarni7ada resistncia, apenasvencida apSs nove meses de luta 0astante cruenta. resistncia foienca0e7ada pelos comerciantes portugueses, que aliciaram a guarni7omilitar e parcela expressiva da popula7o. %20eis na cidade, os patriotasse fizeram fortes no *ecTncavo, onde formaram um governo interino e

    mo0ilizaram for7as, sitiando e afinal conquistando alvador. /esmo depoisdo triunfo, o partido da Independncia no deu tr2gua aos portugueses.

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    da m2rica do ul. o domCnio da 0urguesia colonial lusitana so0re a #a$iano tin$a paralelo, exercendo-se atrav2s de m2todos particularmenteespoliativos que na mesma medida provocavam o endividamento e aanimadverso dos magnatas 0aianos.Estes no dispun$am de capitais lCquidos para o custeio da produ7o -compra de escravos, implementos agrCcolas e meios de su0sistnciaeuropeus. (s comerciantes portugueses l$es antecipavam esses recursos ou,por outra, RfiavamR tudo. Estavam numa posi7o que l$es permitialiteralmente esquarteQar os mutu=rios. 4ara come7ar, os empr2stimos eramfeitos so0re as safras futuras. %ado que os pre7os do a7Ycar e do ta0acosofriam constantes oscila7Pes, os comerciantes ar0itravam cota7Pesridiculamente 0aixas. )aziam exatamente o contr=rio no concernente aosescravos e Us manufaturas, sem os quais era impossCvel dar sequer inCcioU produ7o. o0re os adiantamentos em din$eiro, os comerciantes c$egavama co0rar Quros de at2 5Z ao ms, a crer num anTnimo economista portugusde fins do s2culo XIII ?%iscurso 4reliminar, istSrico, Introdutivo, comnatureza de %escri7o EconTmica da 'omarca, e 'idade da #a$ia, nais da#i0lioteca 3acional, vol. >[email protected] o escoamento da produ7o se processou pelo sistema das frotas,extinto por 4om0al em B66, os 0rasileiros estiveram suQeitos a atrasos

    sistem=ticos na liquida7o de seus d20itos e, conseq[entemente, aospesados Quros dos comerciantes. Isto porque a frota tardava dois, trs eat2 quatro meses. 3esse entrementes, os plantadores 0rasileirosnecessitavam de novos suprimentos a fim de dar continuidade ao processoda produ7o, o que os deixava ainda mais U merc dos onzen=rios. o Q=citado economista portugus fala em RsSrdido com2rcio e torpes e lesivoscontratosR, para concluir Ro sen$orio de engen$o tra0al$aincessantemente para terceiro e no para siR.

    II - s cifras so 0astante elucidativas. 4elos fins do s2culo XIII, ocom2rcio supria anualmente a lavoura a7ucareira com 6".!!!.!!! rs. decapital de giro. 'alcula-se que a venda do a7Ycar e derivados produzia9B5!!!!!! rs., o que dava para a economia a7ucareira em conQunto um lucro

    lCquido anual de 16!!!!!! rs., correspondente a Z so0re o valor totaldos engen$os, or7ado em mil$Pes de cruzados. Este lucro, o0serva oeconomista colonial, Rde ordin=rio 2 todo consumido e esgotado notratamento, sustento e vestu=rio decente da famClia dos propriet=rios esen$orios-de-engen$oR.ssinale-se que estas estimativas correspondiam a um perCodo deprosperidade e compreendem os engen$os como uma universalidade, noparticularizando a situa7o de certas categorias integrantes do sistema,como pequenos engen$os, lavradores o0rigados, arrendat=rios e meeiros. (lucro de Z era a 0em dizer apropriado pelos sen$orios de ! engen$osreputados grandes, num conQunto de cerca de 5!! engen$os.eQa como for, estavam todos, sem exce7o, su0metidos ao pesado servi7ode uma dCvida sufocante que remontava U grande e prolongada crise doperCodo entre B19-BB!. a0e-se que desde fins do s2culo XII o a7Ycar

    0rasileiro entrou a sofrer a concorrncia do produto antil$ano deingleses, franceses e $olandeses.3o ca0e, aqui, esmiu7ar os fatores que 0arateavam o produto antil$ano, asa0er, a t2cnica superior, a produ7o prSpria de implementos agrCcolas, omenor pre7o dos escravos, a maior disponi0ilidade de capitais lCquidos, aamplitude dos mercados e os fretes mais 0aixos. 3o que interessa U #a$ia,a escravatura representava um fator especial de encarecimento. Enquantoas demais regiPes a7ucareiras importavam quase exclusivamente escravosangolanos, a #a$ia importava, predominantemente, os carCssimos escravossudaneses e guineanos da c$amada 'osta da /ina. razo disso era que a

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    'osta da /ina a0sorvia a maior parte da produ7o ta0aqueira da #a$ia. (singleses, franceses e $olandeses, que dominavam a 'osta da /ina e orespectivo mercado de escravos, impun$am aos negreiros 0aianos pesadosgravames, em virtude dos quais os escravos sudaneses e guineanos l$essaCam muito mais caros que aos seus concorrentes, Us vezes at2 BZ ...( produto 0aiano tin$a, pois, um custo 0astante mais elevado que o deoutras regiPes a7ucareiras do #rasil, o que explica que a coroa lusitanao privilegiasse com um pre7o superior ao de 4ernam0uco, /aran$o e *io. partir da quarta d2cada do s2culo XIII, o a7Ycar 0rasileiro em geral e o0aiano em particular ingressaram na pior crise da sua $istSria. s causasdessa crise foram mYltiplas. Internas grandes secas e epidemias.Externas as pazes entre as potncias europ2ias, permitindo Us suascolTnias antil$anas uma produ7o Stima. ( terremoto de ;is0oa fez piorarainda mais a situa7o do a7Ycar 0rasileiro, tanto pela destrui7o de umasafra depositada na alfJndega da cidade como pela decorrente crise geral. vista disso, simplesmente no $avia compradores para o a7Ycar 0aiano.`s vezes, despac$ava-se para 4ortugal a7Ycar que ficava armazenado empen$or de dCvidas. %ado que os comerciantes enQeitavam o a7Ycar, oslavradores o expediam U sua conta para ;is0oa e 4orto. 'alcula nossoeconomista anTnimo que em certos anos a exporta7o decresceu a menos de

    metade. ( que ia cada vez mais para 4ortugal era din$eiro, destinado aopagamento das dCvidas.4or volta de B6!, a maior parte dos engen$os 0aianos estavamseq[estrados pela *eal )azenda, pelas ordens religiosas, pelos conventos,pelas irmandades e so0retudo pelos comerciantesW no poucos foram levadosU pra7a.

    III - ( pulso de ferro de 4om0al a0randou um tanto a crise depois deB!.4ara que o pre7o dos escravos 0aixasse e a #a$ia aumentasse suaimporta7o - de !.!!! ao ano caCra para 5.!!! - , o ministro proi0iu areexporta7o para outros paCses ?B@W reprimiu duramente o contra0andode manufaturas de 4ortugal para o #rasil ?B@W facilitou a rea0ilita7o

    dos falidos e regulou os fretes ?B6@W esta0eleceu pre7os fixos para oa7Ycar e a0oliu as frotas ?B6@W interditou o ingresso de fil$os desen$ores-de-engen$o em clausuras, medida tendente a sustar adescapitaliza7o da lavoura, e mo0ilizou os capitais improdutivos dascorpora7Pes de mo-morta ?B66@. d2cada de B! viu a retomada da prosperidade. %epois, no entanto, 0emmais que a polCtica pom0alina, contri0uCram para isso, sucessivamente, asnovas guerras europ2ias, a *evolu7o da Independncia dos Estados Dnidos,a revolta dos escravos $aitianos e, afinal, a *evolu7o )rancesa. (spre7os e os volumes da exporta7o de a7Ycar, acresceram de 6!? emrela7o ao perCodo anterior U crise. 3em assim, todavia, os magnatas0aianos se safaram do guante dos comerciantes portugueses de alvador.4ois estes, no os 0rasileiros, foram os principais 0enefici=rios daprosperidade.

    3o auge da crise, um certo nYmero de credores executara os devedores, demodo que alguns sen$orios-de-engen$o mudaram de mos ?tais os portuguesesque fugiram do *ecTncavo para alvador, depois da ecloso da luta pelaIndependncia@. maioria, no entanto, perce0endo o alcance das medidasde 4om0al e fareQando o retorno da prosperidade, optara por cele0rar comos devedores escrituras de transa7o e nova7o de dCvidas, composi7Pes emque o0tiveram a vantagem de Quros extremamente altos.(s sen$ores-de-engen$o da #a$ia c$egaram, pois, ao come7o do s2culo XIX,onerados com uma dCvida na ordem de 5 mil$Pes de cruzados, correspondentea pouco menos de um quarto do valor universal do seu patrimTnio.

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    (s comerciantes portugueses, como se v, no poderiam estar mel$orgarantidos. Em condi7Pes normais, os 0rasileiros no teriam como remir-sedesta dCvida. 3as v2speras da Independncia, a situa7o econTmico-financeira dos sen$ores-de-engen$o era extremamente crCtica. ( que levavaalguns, segundo ierra : /ariscal, a maliciosamente empen$ar a safra atrs e quatro comerciantes ao mesmo tempo, Rpassando com tudomiseravelmenteR. (s sen$ores, a seu ver, queriam a Independncia, paracom ela Rse verem livres dos seus credoresR./ediante a expulso dos comerciantes portugueses, os sen$ores-de-engen$ose li0ertariam da dCvida de 5 mil$Pes de cruzadosW quanto aoscomerciantes portugueses, para que pudessem salvar os capitais empatados, a #a$ia devia continuar portuguesa. Entretanto, os dois grupossociais se compuseram, pondo fim U guerra. 3o podiam prosseguir, poisexpun$am-se U su0leva7o escrava ou, na mel$or das $ipSteses, Unecessidade de fazerem concessPes aos escravos.

    I - (s acontecimentos $aviam evoluCdo dramaticamente desde que c$egara U#a$ia a notCcia do movimento constitucionalista do 4orto.%esencadeou-se intensa agita7o, que culminou em fevereiro de ">, numasedi7o contra as autoridades a0solutistas. ( governador conde da 4alma

    foi o0rigado a Qurar a constitui7o e se formou uma Qunta de governo. 3oano seguinte, $ouve elei7o dos deputados 0aianos Us cortes, todos semexce7o sen$ores-de-escravos. Em fevereiro de ">>, a notCcia da nomea7odo 0rigadeiro a0solutista /adeira de /elo, para o comando das armas,precipitou os acontecimentos. cJmara se recusou a cumprir a formalidadedo registro da nomea7o, os quart2is se dividiram, tumultos explodiramnas ruas e as famClias 0rasileiras fugiram para o *ecTncavo. ( confrontoarmado explodiu a 9 de fevereiro, triunfando o partido lusitano, com umsaldo de duzentas vCtimas entre mortos e feridos. resistncia nativa se concentrou nas vilas de 'ac$oeira, anto maro eo )rancisco. 3a primeira, a > de Qun$o, aclamou-se %. 4edro e formou-se uma Qunta de governo. 3este mesmo ms, /adeira se recusou a o0edecerUs ordens de %. 4edro para que reem0arcasse as tropas portuguesas. Em

    lugar disso, lan7ou uma proclama7o em que tentava dissuadir os sen$ores-de-engen$o de se lan7arem U luta, aludindo ao perigo de levantesescravos REvitai revolu7PesW em toda a parte elas so perigosasW por2mmuito mais neste paCsR. ( governo de 'ac$oeira, que formara um ex2rcitocomposto de gente livre, iniciou o cerco de alvador. Em outu0ro,c$egaram refor7os enviados do *io, so0 o comando do aventureiro francs;a0atut. ( cerco so0re alvador se apertou, instalando-se o acampamentomilitar dos 0rasileiros em 4iraQ=, quase Us portas da capital.( partido 0rasileiro lutava em duas frentes, as tropas lusitanas emalvador e a massa escrava na retaguarda. 3os engen$os, nas povoa7Pes eestradas, os escravos depredavam, incendiavam e matavam. Em todo*ecTncavo formigavam os quilom0os. Em novem0ro de ">>, o governo de'ac$oeira tomou medidas en2rgicas para evitar o que c$amou de Rumasu0leva7o de escravosR. (s capites-mores das vilas deviam determinar

    aos capites e oficiais que fizessem rondar por escoltas de ordenan7astodos os distritos onde $ouvessem quantidade de escravos, proi0indo queestes se reunissem a pretexto de fun7Pes ou 0atuques, Rvigiando muitoescrupulosamente so0re a conduta dos mesmosR. +odos os propriet=rios elavradores seriam intimados, so0 pena de responsa0ilidade, a noconsentirem que os seus escravos tivessem nas senzalas espingardas,lan7as, c$u7os, foices, facPes, espadas e facas. 3o poderiam mandar osescravos a parte alguma sem 0il$ete de autoriza7o e mesmo nesse casoeles no poderiam portar armas. eriam presos os que andassem pelasestradas sem 0il$ete ou armados. (s escravos surpreendidos com armas

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    sofreriam o castigo de cento e cinq[enta a7oites no pelourin$o. (scapites-mores fariam correr as matas onde constasse existir quilom0os. (governo interino esta0eleceu o toque de recol$er para os escravos Us 9$oras da noite. (s que depois dessa $ora fossem encontrados sem 0il$etedos seus sen$ores, seriam su0metidos a cinq[enta a7oites, se desarmados,e a duzentos a7oites, se armados.'orria que os portugueses $aviam espal$ado pelo *ecTncavo agentesincum0idos de ati7ar a revolta escrava. ( general /adeira estariaformando um contingente armado de negros e se preparava para dar alforriaa todos que se levantassem contra os amos. 4ouco depois de assumir ocomando do ex2rcito patriota, ;a0atut rece0eu ofCcios do governo de'ac$oeira, advertindo contra o perigo de uma insurrei7o geral deescravos e pedindo providncias urgentes. lgumas cJmaras e muitospropriet=rios instaram-no igualmente a que reprimisse a re0eldia escrava.'onvencido, afinal, de que a escravatura estava Rquase em perfeitainsurrei7oR, o general francs decidiu escarment=-la./andou fazer recon$ecimento num quilom0o 0astante populoso situado aescassa distJncia de 4iraQ=. (s quilom0os $ostilizaram os 0atedores, queresponderam com uma fuzilaria, fazendo Rdezenas de mortosR. 4oucos diasdepois, na madrugada de de novem0ro, os quilom0olas retaliaram,

    atacando o acampamento. )oram dizimados, e, al2m disso, deram a ;a0atut opretexto que 0uscava.'erca de um ms depois, o general exarou numa ordem do dia a amea7a deque fuzilaria todos os negros encontrados de armas na mo.'erca de sete dias depois, a 9 de dezem0ro, uma tropa numerosa atacou oquilom0o. 'onsta que $ouve Rcom0ate muito disputadoR, mas o 0aluartenegro caiu. s informa7Pes so de que contava mais de trezentosmoradores. /uitos tom0aram mortos ou feridos, muitos outros conseguiramfugir e cinq[enta e um caCram prisioneiros.avia trinta e um $omens e vinte mul$eres entre os prisioneiros. (general francs no os su0meteu sequer a um simulacro de Qulgamento./andou fuzil=-los, sumariamente.'Jmaras e sen$ores-de-escravos aplaudiram o massacre, dizendo que depoisdisso os escravos $aviam deixado de se su0levar. REste exemplo terrCvelR,disse ;a0atut em ofCcio a os2 #onif=cio, Rtem o0stado at2 agora aformarem-se outros quilom0osR. ( 0om entendimento entre o general francse os potentados 0aianos, entretanto, no durou muito. s causas dodissCdio foram mYltiplas, figurando entre elas a tentativa do general decriar um #atal$o de ;i0ertos. Esta iniciativa, segundo os sen$ores-de-escravos, dera Razo a que corresse a voz de que o escravo que se l$eapresentasse para pra7a, ficava livreR.Em maio de ">1, oficiais Us ordens do governo de 'ac$oeira, destituCrame prenderam ;a0atut. 'omo disseram numa representa7o ao governoimperial, o francs entrara em conflito com Rtodos os que pensam epossuem nesta provCnciaR. u0metido a consel$o de guerra no *io, ;a0atutfoi a0solvido de todas as acusa7Pes, principalmente quanto U c$acina dosescravos, considerada necess=ria para a Rsalva7o da provCncia at2 ento

    amea7ada de su0leva7o da escravaturaR.

    - Enquanto perdurou a luta contra /adeira, os sen$ores-de-engen$oviveram no medo U revolta escrava. (s $a0itantes de aguari0e opuseram-sea que a guarni7o local se incorporasse ao ex2rcito patriota, devido aoperigo da Rra7a africana, cuQas maldades Q= $ouveram ?sic.@ no tempo doconde da ponteR. cJmara de aguari0e foi contra o empr2stimo deescravos para o ex2rcito patriota, pois isso poderia Rfazer re0entarnesta malfadada provCncia o mais funesto de todos os vulcPes polCticosR.& difCcil acreditar que, na $ipStese da guerra se prolongar, assumindo

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    car=ter generalizado, os c$efes do partido da Independncia pudessemevitar o engaQamento maci7o de escravos. +eriam de recorrera essa medida, ou para aumentar os seus efetivos, ou para impedir ainsurrei7o. Muando o ex2rcito patriota finalmente entrou em alvador, emQul$o de ">1, os escravos do *ecTncavo estavam em estado francamentepr2-insurrecional. 3o $= notCcia, contudo, de que o mesmo ocorresse comos de alvador, durante esse tempo singularmente ap=ticos.3os anos que se seguiram, caracterizados por uma agita7o e insta0ilidadeque davam U #a$ia, segundo o prSprio governo, o R$orrCvel aspecto deanarquiaR, no se registraram tampouco insurg2ncias escravas em alvador.+alvez isso se devesse U impossi0ilidade de qualquer tentativa numam0iente de intensa mo0iliza7o militar. 3o deixa de ser significativoque a vaga insurrecional somente ressurQa depois de ">6, quando a lutaentre as fac7Pes desavindas da classe dirigente se desloca do campomilitar para o polCtico.

    6. Muilom0os

    I- grande massa escrava 0rasileira se condensou no quadro rural, o que2 dizer que se tratava de uma massa essencialmente camponesa.3o tin$am estes escravos camponeses a mais remota possi0ilidade deorganizar uma insurrei7o geral para a destrui7o do regime escravista.s consider=veis distJncias que separavam uma propriedade da outrarepresentavam um o0st=culo praticamente insuper=vel, pois os escravos nopodiam se comunicar e articular. 4or isso, quando fugiam ou sesu0levavam, a Ynica solu7o consistia em 0uscar um lugar distante, emgeral montan$oso e selv=tico, onde esta0eleciam comunidades que com opassar do tempo se iam povoando gra7as U adeso de novos elementos. olongo de toda a $istSria da escravido, estas comunidades constituCam oprincipal meio de li0erta7o dos escravos.3a documenta7o $istSrica as comunidades de ex-escravos aparecemdesignadas como niocarn0os. +rata-se de voz do idioma quim0undo,significando cumeeira ou tel$ado. Em /inas

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    mocam0o foi dada Us comunidades de ex-escravos pelos prSprios sen$ores-de-escravos.eQa como for, a investiga7o $istSrica elucida que no $ouve sequersemel$an7a entre as comunidades negras 0rasileiras e os quilom0osangolanos, caracterizando-se eles, pelo contr=rio, como su0stancialmenteantinTmicos. s comunidades negras 0rasileiras constituCram na verdadeuma nega7o do quilom0o angolano.

    II - ( quilom0o foi introduzido em ngola pelas $ordas dos im0angalas,que os portugueses fizeram Qagas. s origens deste povo so um enigma$istSrico ainda no ca0almente elucidado.s $ipSteses mais acreditadas os fazem proceder de uma regio nasnascentes do 3ilo ou do _aire, ou, ento, das altas montan$as da erra;eoa. )or7ados a a0andonar seu paCs, no se sa0e se devido U invaso deoutros povos ou U exausto do solo, marc$aram para o sul do continente,em $ordas dedicadas U pil$agem. 3a segunda metade do s2culo XI,penetraram em territSrio /0undu, $a0itado por povos pastores eagricultores tri0ut=rios do reino do 'ongo. Estes povos formavam umaconfedera7o de cls enca0e7ada por um c$efe, c$amado 3gola pelos nativose RreiR pelos portugueses.

    +odos os anos, o rei do 'ongo fornecia aos portugueses quatro ou cincomil escravos extraCdos do territSrio /0undu. fora isso, o prSprio 3golamercadeQava escravos diretamente com os comerciantes portugueses queatracavam em ;uanda. Este com2rcio se intensificou e fez emergir um reinoindependente.Empen$ado em preservar o monopSlio de escravos, o 3gola resistiuencarni7adamente ao avan7o dos Qagas atraCdos pelo tr=fico negreiro. 3oteve xito, pois os Qagas enta0ularam rela7Pes diretas com osportugueses. Em fins do s2culo XI, no intuito de adquirir uma posi7omais estrat2gica para o tr=fico de escravos, os Qagas recuaram para lestee se esta0eleceram entre os rios ;ui e 8\ango.Esta regio foi convertida pelos Qagas no maior empSrio de escravos daFfrica 'entral. rmados de mosquetes e espingardas pelos portugueses,

    empreendiam constantes razias para escravizar e vender os nativos. omesmo tempo, fizeram-se soldados de fortuna a servi7o dos portugueses,defendendo fortalezas e esmagando re0eliPes nativas. %essa forma,tornaram-se Rodiados dos gentios destes reinosR, segundo ntonio de(liveira 'adornega, o cronista cl=ssico das guerras angolanas.3a segunda metade do s2culo XII, a legend=ria *ain$a

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    surpreende, pois, que 'adornega a descrevesse como Rmul$er c$eia de0ondade e virtudes crists, sem fingimentos nem $ipocrisiasR.

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    quantidade de escravos, pagando com armas de fogo, 0iQuterias, sedas evin$os. autoridade de

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    fortificado. 'ircundavam a povoa7o de cercas muito fortes de madeira epedra, cercas Us vezes duplas e triplas, dotadas de torneiras a doisfogos a cada 0ra7a, de flancos, de redutos, de redentes, de faces eguaritas capazes de assegurar aos defensores incolumidade quase completa./ais ainda, escavavam largos e profundos fossos, dissimulados porvegeta7o e eri7ados de estrepes, puas pontiagudas de ferro que c$egavamU altura das viril$as e at2 mesmo da garganta de um $omem. s =reassemeadas de estrepes se estendiam no raro por consider=vel distJnciafora das fortifica7Pes. Dm $omem que assomasse no lado oposto, convertia-se em alvo f=cil dos atiradores e arqueiros negros. Este tipo defortifica7o prevaleceu no 3ordeste e foi uma cria7o dos negrospalrnarinos. 3o se v um sistema de defesa to ela0orado nos quilom0osde /inas

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    fil$osR, por sua vez, davam nascimento a outros quilom0os. 3unca $avia,por isso, apenas um quilom0o em determinada regio. o quilom0o da errada #arriga foi a matriz de mais de uma dezena de quilom0os dispersos numimenso territSrio da ento capitania de 4ernam0uco. (utro tanto se podedizer do quilom0o da 'idade laravil$a, aparentemente o segundo emimportncia na $istSria da escravatura 0rasileira. 4ode-se de restoafirmar pacificamente que esta foi a regra em quase toda a parte. (sdiferentes quilom0os, por sua vez, se articulavam atrav2s de uma unidadepolCtica que tin$a sua sede no quilom0o-capital. 'a0eria portanto falarem confdera7o de quilom0os.

    I - (s quilom0os se estruturavam como sociedades de classes. o processodesta diferencia7o social pode ser reconstituCdo nas suas lin$as gerais.(s fundadores do quilom0o, aqueles que $aviam devassado a regio,construCdo as primeiras fortifica7Pes e criado as 0ases da produ7oeconTmica, adquiriram com o tempo o privil2gio de viverem como no-produtores. & de crer que a necessidade de uma organiza7o militar quedefendesse o quilom0o contra as expedi7Pes dos sen$ores-de-escravos ten$asido a origem dessa classe. isso seguiram-se as necessidades decoordena7o polCtica e administrativa do quilom0o. 3outras palavras,

    desenvolveram-se aparatos estatais 0urocracia civil, 0urocracia militar,0urocracia Qudici=ria. 4ara prover U su0sistncia prSpria e dos aparatos,reclamaram do quilom0o o pagamento de um tri0uto em produtos. +udo leva acrer que o compromisso do pagamento deste tri0uto foi inicialmentevolunt=rioW a amea7a externa dos sen$ores-de-escravos e o crescimento oumultiplica7o dos quilom0os, Qustificavam a reivindica7o. responsa0ilidade do pagamento do tri0uto recaCa so0re o quilom0o comocoletividade, no so0re os produtores diretos individualmenteW noutraspalavras, a dependncia frente a essa classe dominante era do quilom0o.(s Rquilom0os-fil$osR pagavam um tri0uto maior que o Rquilom0o-matrizR.Isso est= claramente evidenciado no caso da *epY0lica dos 4almares. 'erca *eal do /acaco, na erra da #arriga, merc da sua privilegiadCssimaposi7o estrat2gica, constituCa a principal garantia dos Rquilom0os-

    fil$osR. 3o sS estava em condi7Pes de interceptar as expedi7Pes quepretendiam atacar os outros quilom0os, seno que, nos momentos de maiorperigo, podia acol$er no interior das suas fortifica7Pes quase todos os$a0itantes daqueles quilom0os. +anto assim que a destrui7o da *epY0licade 4almares apenas se tornou possCvel quando a 'erca *eal finalmentetom0ou vencida no ano de 695.(s camponeses depositavam o excedente no paiol e aC a classe dirigentedele se apropriava. (s camponeses ao mesmo tempo se suQeitavam atra0al$os de interesse coletivo, entre os quais, notadamente, as o0ras defortifica7Pes e defesa.3o se deve ver como feudal esta classe dominante. 3o tin$a apropriedade da terra nem de quaisquer meios de produ7o. 3o se sa0e deum Ynico caso em que o quilom0o ten$a perdido a propriedade eminente daterra. o produto apropriado no se transformava em renda-din$eiro, no se

    acumulava. %estinava-se a@ ao consumo dos c$efes e mais mem0ros daRfamCliaRW 0@ U manuten7o da 0urocracia civil e militarW c@ a trocas comos 0rancos para o0ten7o de armas, muni7Pes, sal, ferro, artigos deRluxoR. 3ote-se que, quando no podia o0ter estas coisas dos 0rancosatrav2s de trocas, a aristocracia funcion=ria recorria ao saque daspropriedades escravistas.avia entre os mem0ros dessa classe Rrela7Pes de parentescoR. (sprodutores diretos estavam fora desta maran$a de rela7Pes de parentescoWelas somente vigoravam no interior da classe dominante. inculavamQurCdica, polCtica e ideologicamente entre si, os mem0ros da classe.

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    +ratava-se, evidentemente, de rela7Pes de parentesco fictCcias, salvo noscasos reais de consang[ineidade. egundo sua importncia, os mem0ros daclasse assumiam a condi7o de Rfil$osR, Rso0rin$osR, RprimosR, RnetosR do

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    escravismo externo. %iante da amea7a externa dos escravocratas, tornava-se secund=ria a contradi7o social. recorda7o dos $orrores daescravido e a possi0ilidade de voltar a ela ou mesmo morrer, amorteciaou anulava a luta de classes.3unca $ouve incompati0ilidade ou conflito 2tnico entre negros e Cndios ou0rancos. porcentagem de Cndios nos quilom0os sempre foi 0astanteexpressiva. tan=sio, o c$efe do quilom0o 'idade /aravil$a, era cafuzo.3unca faltou a presen7a de 0rancos nos quilom0os, predominando ossoldados desertores e os perseguidos pela Qusti7a dos dominadores.( quilom0o constituiu uma cria7o dos escravos em resposta Us condi7Pespeculiares do escravismo 0rasileiroW no foi a transplanta7o deforma7Pes sociais africanas. ( $istoriador c$ileno *olando /ellafe,especialista em $istSria da escravido nas colPnias espan$olas ?ondeestas comunidades se c$amavam quilom0o, palenque, repY0lica, ciniarrones@opina igualmente que no se tratava de Rgrupos tri0ais empen$ados emrecriar estruturas origin=rias da FfricaR. investiga7o sistem=tica destas originais forma7Pes sociais constituiuma das mais urgentes tarefas que se impPem U $istoriografia 0rasileira.

    B. (s li0ertos

    I - /algrado sua significa7o demogr=fica e social, o estamento dosli0ertos ou forros rece0e geralmente pouca aten7o nos estudos so0re oescravismo 0rasileiro.Esta categoria estamental foi definida nas (rdena7Pes )ilipinas, que porsua vez se inspiraram no direito romanoW depois da Independncia, tevesua situa7o regulada simultaneamente pelas (rdena7Pes e pela 'arta de">5.ntes de "B, o escravo no gozou do direito U alforria - palavraoriunda do =ra0e al-$orria, que significa li0erdade do cativeiro. Em "1o 'onsel$o de Estado decidiu que Rno pode o sen$or ser o0rigado aalforriar o escravo contra sua vontade, mesmo dando aquele seu valorR eisso porque Ra 'onstitui7o garante a propriedade em toda a sua

    plenitudeR. ouve contudo exce7Pes antes de "B. Dma resolu7o de "1Bmandou alforriar todos os escravos do Imperador que dessem o seu valor. partir de "5B, adotou-se esta pr=tica em rela7o aos escravos da 3a7o.4or Yltimo, os donos dos escravos armados pelos )arrapos foramdesapropriados, e se os mandou indenizar.3o seu artigo 6, , a 'onstitui7o distinguia dois tipos de li0ertos osafricanos, nascidos na Ffrica, e os crioulos, nascidos no #rasil. (sprimeiros no rece0eram a cidadania 0rasileira, so0 a alega7o de queeram estrangeiros. discrimina7o era inQusta a todos tCtulos. aviamsido trazidos U for7a, muitas vezes em tenra idade. (s que c$egaramdepois da ;ei de B de novem0ro de "1, tornaram-se legalmente livres,mas foram na sua quase totalidade mantidos na escravidoW no entanto, aoadquirirem a li0erdade, no adquiriam a cidadania 0rasileira. discrimina7o se tornava ainda mais 0rutal U vista do tratamentodispensado aos 0rancos que no $aviam nascido no #rasil. ssim, todos osnascidos em 4ortugal e suas possessPes, mas residentes no #rasil U 2pocada Independncia, adquiriram a cidadania mediante simples op7o. (utrosestrangeiros adquiriam a cidadania mediante naturaliza7o, a qual erarecusada aos li0ertos africanos, conforme o decidiu o 'onsel$o de Estadoem ".Em decorrncia disso, os li0ertos africanos no tin$am o direito de viverdefinitivamente no #rasil. 4odiam ser deportados para a Ffrica atrav2s desimples deciso administrativa, como sucedeu a v=rias centenas deles

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    depois da insurrei7o dos negros mu7ulmanos da #a$ia em "1W por sinal,a deciso determinou a deporta7o mesmo daqueles que a autoridadepolicial Qulgasse apenas RsuspeitosR de participa7o no movimento e aindaque $ouvessem sido a0solvidos pelo QYri. %e resto, durante todo o regimeda escravido sempre aparecem nos repertSrios administrativos casos deli0ertos africanos deportados. ( mais inCquo destas deporta7Pes 2 queimportavam na separa7o das famClias nos casos em que a mul$er e osfil$os $ouvessem nascido no #rasil.( proQeto de 'onstitui7o ela0orado pela 'onstituinte fec$ada por %om4edro I, negava a cidadania 0rasileira at2 mesmo aos li0ertos nascidos no#rasil. %e todo modo, a cidadania outorgada pela 'arta de >5 foi apenasparcial, pois a alforria no transformava o escravo em um $omeminteiramente livre, igual ao seu sen$or.%esde que possuCam a renda necess=ria - renda lCquida anual de cem milr2is por 0ens de raiz, indYstria, com2rcio ou empregos - podiam osli0ertos 0rasileiros votar nas elei7Pes paroquiais ou prim=rias queelegiam os eleitores que nomeavam os deputados, senadores e mem0ros dosconsel$os gerais das provCncias. 3o podiam, por2m, ser eleitores e votarnestas elei7Pes de segundo grau, mesmo quando tivessem patentes militaresou ordens sacras. Em conseq[ncia, o li0erto 0rasileiro no podia ser

    senador, deputado geral ou provincial, Qurado, Quiz de paz, promotorpY0lico, ministro, magistrado, diplomata. 4odia servir no ex2rcito, masno c$egar ao oficialato.eQa como for, mesmo no exercCcio do direito de voto nas elei7Pesprim=rias, o li0erto 0rasileiro no gozava de independncia polCtica.4ois sua li0erdade era prec=ria, podendo ser revogada pelo antigo sen$or.

    II - Este direito do sen$or de revogar a alforria se 0aseava nas(rdena7Pes )ilipinas. ;ei de >! de outu0ro de ">1 dispTs que as(rdena7Pes continuariam em vigor enquanto se no organizasse novo 'Sdigoou no fossem elas especialmente alteradas. s (rdena7Pes, como se sa0e,constituCram nossa lei civil durante todo Imp2rio.s (rdena7Pes rezavam Re algu2m forrar seu escravo, livrando-o de toda

    a servido, e depois que for forro, cometer contra quem o forrou, algumaingratido pessoal em sua presen7a, ou em a0sncia ?sic@, quer seQaver0al, quer de feito e real, poder= esse patrono revogar a li0erdade,que deu a esse li0erto, e reduzi-lo U servido, em que antes estavaR?(rd., ;ivro I, +Ctulo ;XI@. 'onsiderava-se a alforria uma doa7o e Rodoador pode revogar a doa7o feita ao donat=rioR. Em outras passagens, as(rdena7Pes se mostravam ainda mais explCcitas no tocante Us causas derevoga7o a@ R... se o donat=rio disse ao doador, quer em sua presen7a,quer em sua a0sncia, alguma grave inQYria, assim como se l$e dissesse emQuCzo, ou em pY0lico, perante alguns $omens 0ons, de que o doadorrece0esse vergon$aRW 0@ se o agredisse ou ferisseW c@ se ao tratar denegScio do patrono l$e causasse preQuCzo ?Rgrande perda e danoR@, aindaque de 0oa-f2W d@ quando amea7asse o patrono de perigo ou dano, ou Rl$eprocurasse a morte, ou perigo de seu corpo, ou estadoRW e@ em geral,

    quando o li0erto deixasse de cumprir alguma promessa feita ao amo paraque este l$e desse a alforriaW f@ dava causa U revoga7o, a inQYria feitaao patrono morto, revoga7o essa promovida pelos $erdeirosW g@ se noalimentasse o patrono, quando este se visse reduzido U necessidade. revoga7o podia ser promovida por terceiros. %ava-se isto nos casos emque a alforria $ouvesse sido feita por Rnulidade em geralR,particularmente em fraude dos credores do li0ertando, das legCtimas dos$erdeiros necess=rios ou da mea7o da mul$er. revoga7o da alforria do li0erto nascido no #rasil importava emcassa7o da cidadania 0rasileira. uristas c$amaram a aten7o para o fato

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    de que a 'onstitui7o esta0elecera, no artigo 69, 9, e no artigo 95,os Ynicos casos de perda da cidadania, entre os quais no constava esteda ingratido do li0erto para com o patrono. Importava isso, ademais, emreduzir uma pessoa U escravido, o que o artigo B9 do 'Sdigo 'riminalcapitulava como crime. uristas e tri0unais, por2m, contra-argumentavamque as (rdena7Pes continuavam em vigor. controv2rsia foi liquidada pelomais eminente Qurista da 2poca, +eixeira de )reitas, que declarouR*epugna ... salvar a ;ei )undamental U custa da moralidadeR. rgumentoque, diga-se de passagem, nada tin$a de QurCdico. Mue sucedia aos fil$ostidos pelo forro depois da alforriaV (pinou +eixeira de )reitas Roescravos os fil$os conce0idos depois da revoga7o, no assim osconce0idos antes delaR.egundo a Qurisprudncia, o li0erto devia ao patrono servi7os pessoais ou0ons ofCciosW RrespeitoR, Rpiedade filialR e RrevernciaR. 4ara demandaro patrono, necessitava o li0erto de autoriza7o Qudicial. Em causascriminais, no podia testemun$ar contra o patrono. R+udo era Qusta causade revoga7oR, escreveu 4erdigo /al$eiro. avia segundo o Qurista Rumaverdadeira rede em que o li0erto podia facilmente cair e ser arrastado denovo para a escravidoR. situa7o do li0erto era verdadeiramente a deuma li0erdade vigiada.

    pr=tica da alforria permitia a um indivCduo constituir uma clientela de$omens o0rigatoriamente dedicados. /erc da alforria, o polCticoescravista podia aumentar o nYmero de votos que controlava nas elei7Pesprim=rias ou paroquiais. 3isto reside a explica7o da circunstJncia,repetidamente lamentada por oaquim 3a0uco, de que nas elei7Pes osli0ertos votavam nos candidatos antia0olicionistas. 4or medo de seremacusados de ingratos, os li0ertos denunciavam as conspira7Pes escravas.( li0erto se vinculava ao patrono at2 mesmo pelo so0renome. Escravos,como se sa0e, no tin$am so0renome, e por isto ao se alforriarem adotavamo do patrono.

    III - 3o se deve contudo idealizar a massa de li0ertos. e algunsadquiriam a li0erdade a peso de din$eiro ameal$ado atrav2s do tra0al$o,

    no exercCcio de uma atividade especializada - caso dos c$amados escravos-de-gait$o - outros entretanto o adquiriam mediante uma dedica7o caninaao sen$or. Isentos dos tra0al$os mais pesados e ingratos, faziamconscientemente a carreira para a alforria, denunciando e perseguindo osoutros escravos, so0retudo os que se insurgiam.3o foi pequeno o nYmero de li0ertos que se tornaram propriet=rios deescravos e Us vezes de muitos escravos. $ouve os que se fizeram realmentericos e assim gozaram de total independncia. %o mesmo modo, tornavam-seinevitavelmente partid=rios da escravido e rece0eram a a0oli7o com omais profundo desgosto. %e uma maneira geral, se os amos os desprezavam,os escravos os odiavam. ;ei *io-#ranco, de "B, ao revogar o dispositivo das (rdena7Pes quefacultava a revoga7o da alforria, conferiu a todos os li0ertos a maiscompleta independncia QurCdica, mas nem por isso suprimiu a restri7o

    aos seus direitos polCticos.

    ". s insurrei7Pes de escravos mu7ulmanos na #a$ia

    I - o aman$ecer do dia 5 de maio de "1, cinco negros mu7ulmanos - osescravos

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    mulatos.aviam sido condenados U morte como lCderes de uma grande insurrei7onegra na noite de >5 para > de QaneiroW outros treze negros, tam02mcondenados U morte, $aviam tido suas penas comutadas. execu7o doscinco negros no fora f=cil nem tranq[ila. /arcada para o dia 1 de maioe armada a forca com muitos dias de antecedncia, no se ac$ava quemquisesse servir de carrasco. 3o dia > de maio, o Quiz comunicou aopresidente da provCncia que at2 U noite do dia anterior Rno $aviaindivCduo algum nas prisPes para servir de executor da Qusti7aR. vistadisso, alvitrava que Rse oferecesse uma quantia um pouco avultada, at2 >!ou 1! mil r2isR. Estava certo de que com esta recompensa Rse ac$aria nascadeias um dos presos pronto para esse fimR. 3em assim o carcereiro-morencontrou quem aceitasse o encargo. R3o $= quem queira aceitarR,comunicou aos superiores, depois de percorrer as prisPes, uma a uma.R3en$um quer por recompensa alguma e nem mesmo outros negros queremaceitar, apesar das diligncias que l$es ten$o feito, com grandespromessas, al2m do din$eiroR. )ace a isso, resolveu-se fuzilar os cinconegros.s circunstncias desta execu7o testemun$am o estado de tenso existenteem alvador. Em documento pY0lico, a *egncia falou no Rterror que se tem

    apoderado da popula7o dessa 'idade, em conseq[ncia da revolta deafricanos na noite de >5 para > de QaneiroR. 3a verdade, $avia quasetrs d2cadas que a popula7o no-negra de alvador vivia so0 o terror dasinsurrei7Pes dos negros mu7ulmanos. 4ara pTrfim a esta amea7a, a *egncia determinou a deporta7o para a Ffrica detodos os li0ertos mu7ulmanos Rsuspeitos de terem tido parte naquelarevolta, ainda quando pelo motivo acima citado seQam a0solvidos no QYrida 'idadeR ?'ole7o de ;eis do Imp2rio do #rasil, v. I, parte XI,p=ginas B9 e "!@. (s que fossem escravos, no poderiam em nen$uma$ipStese sair da provCncia, e no seriam postos em li0erdade a menos queos sen$ores assinassem Rtermo de seguran7a em que afiancem sua condutaR. execu7o dos cinco negros encerrou um ciclo de insurrei7Pes que a0aloua cidade de alvador, a intervalos mais ou menos 0reves. entre os anos de"!B e "1. Estas foram, ao que se sai0a, as Ynicas insurrei7Pes ur0anasde negros, no #rasil e no 3ovo /undoW em toda parte, os protestos negrossempre tiveram lugar no quadro rural. Estas insurrei7Pes representaramigualmente as Ynicas tentativas negras de tomada do poder no #rasil. 3odecurso da $istSria da escravatura 0rasileira, os li0ertos nunca sesolidarizaram com os escravos e muito menos se integraram nos quilom0osWnas insurrei7Pes de alvador, li0ertos de confisso mu7ulmana tiverampapel destacado e aproveitaram sua condi7o para assumir a lideran7a. (sinsurretos tiveram contra si, no apenas os 0rancos e os mulatos, mastam02m os negros no-mu7ulmanos. 3unca aceitaram a escravido.(rganizavam insurrei7Pes durante a viagem entre a Ffrica e o #rasilWdepois, ainda nos depSsitos de escravos novos destinados U venda,revoltaram-seW esmagada uma insurrei7o, come7avam imediatamen


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