SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO SUPERINTENDÊNCIA DE EDUCAÇÃO
FACULDADE DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIAS E LETRAS DE PARANAVAÍ E
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL – PDE
UNIDADE TEMÁTICA
Área: GESTÃO ESCOLAR
CONSELHO DE CLASSE E AVALIAÇÃO:
REFLEXÕES E PROPOSTAS PARA UMA NOVA PRÁXIS
Professora PDE: Célia Maria Barbosa Professora Orientadora: Neide de Almeida Lança Galvão Favaro
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PARANAVAÍ 2008/2009
SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO SUPERINTENDÊNCIA DE EDUCAÇÃO
FACULDADE DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIAS E LETRAS DE PARANAVAÍ E UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ
PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL – PDE
CONSELHO DE CLASSE E AVALIAÇÃO:
REFLEXÕES E PROPOSTAS PARA UMA NOVA PRÁXIS
Unidade Temática apresentada ao PDE - Programa de Desenvolvimento Educacional da Secretaria de Estado da Educação do Paraná, como requisito exigido para as atividades do segundo semestre de 2008, sob orientação da Profª M estre Neide de Almeida Lança Galvão Favaro.
Professora PDE: Célia Maria Barbosa
PARANAVAÍ 2008/2009
1. Identificação
Professor PDE: Célia Maria Barbosa
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Área: Gestão Escolar
NRE: Paranavaí
Professora Orientadora: Neide de Almeida Lança Galvão Fávaro
IES: Faculdade Estadual de Educação, Ciências e Letras de Paranavaí
(FAFIPA) e Universidade Estadual de Maringá (UEM).
Escola de Implementação: Colégio Estadual Adélia Rossi Arnaldi, Ensino
Fundamental e Médio
Público Objeto da Intervenção: Professores e equipe pedagógica do Ensino
Fundamental e Médio
2. Tema de Estudo da Intervenção: Gestão Escolar
3. Título: Conselho de Classe e avaliação: reflexões e propostas para uma
nova práxis
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CONSELHO DE CLASSE E AVALIAÇÃO: REFLEXÕES E PROPOST AS PARA UMA NOVA PRÁXIS
Profª do PDE: Célia Maria Barbosa Profª Orientadora: Neide de Almeida Lança Galvão Fávaro
O Conselho de Classe representa um importante momento do trabalho escolar,
cuja função acaba muitas vezes se perdendo no cotidiano das atividades que envolvem o
processo educativo. Por constituir-se em espaço de integração entre docentes, equipe
pedagógica, direção e às vezes alunos e pais, como também de discussão coletiva da
práxis educativa, deve haver uma atenção especial de todos os envolvidos para que
sejam aproveitadas ao máximo as possibilidades que ele oferece para a melhoria do
processo educativo.
É um dos órgãos colegiados presentes na organização da escola, no qual vários
professores das diversas disciplinas, juntamente com os coordenadores pedagógicos, ou
mesmo os supervisores e orientadores educacionais reúnem-se para refletir e avaliar o
desempenho pedagógico dos alunos das diversas turmas, séries ou ciclos (DALBEN,
2004, p. 31). Respaldado pelo Regimento Escolar, tem o poder de emitir parecer sobre
os resultados do aluno, alterando-os se assim achar necessário.
Conseqüentemente, a prática do professor em sala de aula também é refletida e
avaliada, mesmo que muitas vezes este não pareça ser o foco da discussão. Na verdade,
essa instância tem por objetivo avaliar as ações pedagógicas existentes e verificar se
estão em consonância com a proposta pedagógica do Projeto Político Pedagógico da
escola.
O Conselho de Classe nem sempre é percebido como um momento de avaliação
coletiva e diagnóstica. O que verificamos, na maioria das vezes, é uma análise
superficial da turma e dos alunos. Mediante essa problemática, optamos por resgatar
suas origens históricas e suas funções, a fim de compreender o contexto atual que
permeia esse debate e assim fornecer elementos para organizar uma nova práxis.
Discorrer sobre esse órgão e suas funções exige ainda uma reflexão relativa à
questão da avaliação, pois é impossível repensar e redirecionar a atuação do Conselho
de Classe se não compreendermos também as transformações pelas quais a avaliação
tem passado e suas exigências atuais. Procuramos, portanto, em um primeiro momento,
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resgatar brevemente suas funções históricas para, a seguir, apresentar as contradições
presentes na atualidade e como elas se refletem na atuação do Conselho de Classe.
O presente material apresenta um estudo da origem do Conselho de Classe até os
dias atuais, uma breve revisão histórica da avaliação e sua relação com a sociedade e
uma discussão sobre a avaliação e Conselho de Classe, em que apresentamos seus
impasses atuais e sugerimos algumas possíveis mudanças.
Esse encaminhamento metodológico se fez necessário por acreditarmos na
importância de desencadear nas escolas a consciência de que a educação e seus
processos não estão descolados da realidade concreta. É indispensável compreendê-la
para desvelar os mecanismos de funcionamento da escola e de seus órgãos, para, deste
modo, compreender os objetivos a que se servem.
A definição de um posicionamento teórico envolve o conhecimento de qual
sociedade e homem se quer formar, porque é preciso não esquecer que “a escola tem
uma vida interior que, sem ser alterada por códigos legislativos, pode trabalhar o
homem em nova dimensão, bastando para isso que seus membros se disponham a
estabelecer um novo projeto de reflexão e ação” (NAGEL, 1986, p. 10). Afinal, analisar
teoricamente a dinâmica da realidade que se vive é condição básica para garantir a
construção de uma nova práxis educativa.
1. Conselho de Classe: origens históricas e funções atuais
O Conselho de Classe nem sempre fez parte do trabalho escolar. A origem do
Conselho de Classe no Brasil deu-se por influência da experiência francesa de
educação. Essas idéias vieram com um grupo de educadores que estagiaram em Sévres,
na França, em 1958. O Rio de Janeiro foi o primeiro Estado a implantar o Conselho de
Classe em fase experimental, como afirma Rocha (1982).
A autora relata ainda que o Conselho de Classe teve origem na França, por volta
de 1945. Havia então a necessidade de um trabalho interdisciplinar, com classes
experimentais, que foram implantadas no sistema educacional francês. Nestas, o aluno
deveria optar por um ensino clássico ou técnico. Surgia assim o Conselho de Classe,
que se subdividia em três momentos: Conselho de Classe (dirigido à turma), Conselho
de Orientação (dirigido à escola) e Conselho Departamental de Orientação (de maior
abrangência). Todos tinham a função de orientar a aptidão do aluno para as modalidades
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de ensino que eram oferecidas. Tais conselhos eram fundamentados em uma avaliação
classificatória, a qual decidiria a vida do aluno dentro de um sistema dualista de ensino.
Dalben (1995; 2004) trabalha com o pressuposto de que a ascendência das idéias
da pedagogia escolanovista, que se encontrava expressa no Manifesto dos Pioneiros da
Educação Nova, de 1932, já contribuía para a idéia de criação de um local de discussões
coletivas nas escolas. A Escola Nova se inseria no debate educacional brasileiro,
exercendo intensas influências para a prática educativa, que se fazem presentes ainda
hoje em nossas escolas e políticas públicas.
A idéia de “organismo vivo”, de “comunidade palpitante pelas soluções de seus problemas” contém em si o dinamismo que uma nova escola deve incluir. O Manifesto colocava-se contrário à centralização de poder e de decisões, considerando necessária a adaptação da escola a seus interesses e necessidades. Essa nova concepção de escola sugere uma organização que valoriza o trabalho coletivo, a discussão, a busca e a criação de novos métodos (DALBEN, 1995, p. 27).
Do ponto de vista legal, a nossa primeira Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional – LDB, Lei 4.024/61 – já trazia a idéia de que haveria necessidade de um
trabalho escolar que levasse os professores a realizarem uma avaliação mais abrangente
sobre o desenvolvimento escolar de cada aluno, porém não abordava explicitamente o
Conselho de Classe (ROCHA, 1982).
A Lei 5.692/71, que reformou a LDB 4024/61 no que se referia então ao ensino
de 1º e 2º graus, não trouxe também a criação direta do Conselho de Classe. Ela
disponibilizava, entretanto, abertura para que o mesmo fosse institucionalizado a nível
nacional. É importante ressaltar que essa lei possuía cunho autoritário e tecnicista, cuja
finalidade era a profissionalização do educando. Concebida em um momento de
ditadura militar no Brasil, estava ligada aos interesses do setor econômico da época e ao
mercado de trabalho, atendendo às necessidades da sociedade industrial que se expandia
e que carecia de mão-de-obra qualificada.
O golpe militar foi produto de distintos interesses em jogo na década de 1960,
que foram sendo criados na dinâmica histórica. Os Estados Unidos vinham se
destacando desde o final da Segunda Guerra Mundial (1939-1945) como líder
econômico, sendo que seus interesses não coincidiam com os do modelo nacionalista e
populista que o governo brasileiro adotava. Foi no governo de Juscelino Kubitschek
(1956-1961) que o nacionalismo começou a cedeu lugar ao capital estrangeiro e suas
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indústrias multinacionais. O golpe militar, em 1964, instituiu a ditadura militar e
acelerou a desnacionalização da economia, sendo que os Estados Unidos passaram a
sobrepor-se ao Brasil. As influências desses acontecimentos tiveram reflexos diretos nas
políticas educacionais brasileiras:
[...] ao passo que a Lei 4.024/61 tinha sido antecedida por amplo debate de que participara a sociedade civil, as Leis nº 5540/68 e 5692/71 são impostas autoritariamente por militares e tecnocratas que imprimem à educação uma tendência fortemente tecnicista (ARANHA, 1989, p. 254).
Ainda segundo a autora, a partir do golpe de 1964 vários acordos secretos foram
realizados com os Estados Unidos, sendo que só vieram a público no final de 1966. São
os acordos MEC/USAID (Ministério da Educação e Cultura; United States Agency for
International Development), nos quais o Brasil substituiu as idéias pedagógicas
européias pelas idéias pedagógicas americanas, das quais passava a ter influência mais
direta.
A USAID trazia claras intenções de manipular o processo de ensino brasileiro
para transformá-lo em um processo de modernização da sociedade, a fim de obter um
alinhamento geopolítico com o neocapitalismo norte-americano no continente, como
assinala Arapiraca (1982).
Com o acordo, o Brasil passou a receber treinamento para adaptar-se à
concepção taylorista que norteava os objetivos empresariais da época, e também amparo
técnico e recursos financeiros para estabelecer a reforma. Esta se constituía em três
fundamentos, conforme Aranha (1989):
- educação e desenvolvimento: a finalidade era aumentar o número de
profissionais especializados;
- educação e segurança: com o objetivo de formar um indivíduo consciente; e
- educação e comunidade: estabelecia a concepção escola/comunidade.
Nesse contexto é que foi criado o Premen – Programa de Extensão e Melhoria
do Ensino – através do Decreto nº 63.914, de 27 de dezembro de 1968, que previa
ampliar a oferta de ensino médio e reorganizá-lo para um modelo de escola de 1º ciclo.
O Premen foi implantado na maioria dos estados brasileiros, como informa Dalben
(1995). Seus objetivos, não muito claros, provocaram muitas dúvidas à nova filosofia
educacional. Utilizando-se da mística da escola única, contrariamente desenvolvia-se a
prática de uma educação diferenciada, nos moldes de uma “escola de classe”,
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adequando o sistema educacional ao modelo social de capitalismo dependente
(DALBEN, 1995, p. 30).
Arapiraca (1982) ressalta que a criação de “quadros de inteligentzia pedagógica”
tinha por objetivo incorporar as práticas educativas dos Estados Unidos. Os educadores
eram capacitados a fim de implementar as escolas polivalentes, adaptadas ao modelo
norte-americano. A estas caberia o papel de transformar a educação brasileira, com a
expansão de ensino público e também de sua qualidade, mas para fins empresariais.
A promulgação da Lei 5.692/71 ocorreu após a implantação desse programa nas
escolas polivalentes e foi a partir dela que ocorreu “a orientação normativa e legal desse
tipo de escola para a estrutura e funcionamento de todo o ensino de 1º e 2º graus”
(DALBEN, 1995, p. 31).
O Conselho de Classe, como pontua Rocha (1982), acontecia então de forma
espontânea, nas escolas que se dispusessem a considerá-lo como importante. Convém
salientar que sua institucionalização não ocorreu através da nova lei, mas sim por
orientação do Premen.
Além das orientações do Premen, os Conselhos Estaduais de Educação emitiram
Pareceres e Resoluções que levavam à formalização de espaços coletivos de avaliação
na escola, ou seja, dos Conselhos de Classe. Foi então elaborado um novo regimento,
em que o Conselho de Classe aparecia formalizado.
Pedagogicamente, a orientação era tecnicista, privilegiava o racionalismo, a
impessoalidade, o individualismo, sobrepondo-se aos grupos e às decisões coletivas. O
especialista em educação conquistara seu espaço nas escolas, com função diretiva e
controladora, como previam os regimentos da época.
A concepção estrutural funcionalista fundamenta a educação nas décadas de
1960 e 1970, sustentando-se a lógica de que a fragmentação poderia compor um todo
harmônico. A Lei 5.692/71 deu assim abertura para a criação dos Conselhos de Classes,
mas contraditoriamente impediu que estes desenvolvessem um trabalho coletivo de
conhecimentos sobre a escola, o ensino, a aprendizagem e o aluno.
Foi só em 1985 que o Brasil teve seu primeiro presidente civil eleito
indiretamente, e posteriormente, por meio de eleições diretas. Sem as imposições e
limitações autoritárias, os partidos políticos voltam à legalidade, os estudantes reabrem
suas sedes representativas e os exilados políticos retornam ao país. As Conferências
Brasileiras de Educação debatem os encaminhamentos pedagógicos, visto que após a
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ditadura é emergente que se recupere a escola pública. Várias escolas públicas são
criadas a fim de proporcionar um ensino de qualidade (ARANHA, 1989).
Nesse processo de redemocratização, elaborou-se a Constituição de 1988,
havendo muitas pressões para a melhoria do ensino no país que levaram à aprovação de
novas leis para a educação. Vários filósofos e pedagogos defendiam a educação popular
e elaboraram sugestões para rever a educação brasileira. Dentre os autores, alguns se
destacaram, como Dermeval Saviani, José Carlos Libâneo, Carlos Roberto Jamil Cury,
Guiomar Namo de Mello.
O que ficou como proposta educacional contra-hegemônica foi a necessidade de
o aluno ter acesso aos conteúdos historicamente acumulados, como forma de sua
emancipação. Para Saviani (2003a, p. 69), uma “pedagogia articulada com os interesses
populares valorizará, pois, a escola; não será indiferente ao que ocorre em seu interior;
estará empenhada em que a escola funcione bem; portanto, estará interessada em
métodos de ensino eficazes”.
Apesar de as inúmeras pressões populares, outro projeto de lei foi aprovado para
a educação brasileira, resultando na LDB nº 9394/96, que priorizava a gestão
democrática das escolas públicas, prevendo a criação de conselhos e órgãos colegiados
com a participação da comunidade escolar e externa, a descentralização administrativa,
a elaboração interna do Projeto Político Pedagógico das escolas, dentre outros. Em seu
Art. 14, a atual LDB estabelece que:
Os sistemas de ensino definirão as normas da gestão democrática do ensino público na educação básica de acordo com as suas peculiaridades e conforme os seguintes princípios: I- participação dos profissionais da educação na elaboração do projeto pedagógico da escola; II- participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes (BRASIL, 2001, p. 11).
Não obstante a distância ainda existente entre os discursos legais e a prática,
devemos se considerar os avanços que tais políticas públicas trouxeram. Foi a partir
desses pressupostos legais que os Conselhos de Classe foram instituídos no Paraná.
Conforme a Deliberação nº 007/99 do Conselho Estadual de Educação (PARANÁ,
1999), é necessário formar um órgão, indicado no Regimento Escolar, para acompanhar
o processo de avaliação por séries, ciclos, graus ou períodos. Este deve ser
obrigatoriamente constituído pelos professores, pela coordenação pedagógica, diretor,
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além de recomendar a participação de um representante de turma. Os regimentos
escolares do Estado regulamentam sua constituição, funções e funcionamento,
ressaltando que se deve observar se os objetivos, conteúdos e metodologias estão de
acordo com o Projeto Político Pedagógico da escola, caracterizando-se, portanto, em
uma avaliação da proposta pedagógica.
Art... O Conselho de Classe é órgão colegiado de natureza consultiva e deliberativa em assuntos didático-pedagógicos, fundamentado no Projeto Político-Pedagógico da escola e do Regimento Escolar, com a responsabilidade de analisar as ações educacionais, indicando alternativas que busquem garantir a efetivação do processo ensino-aprendizagem (PARANÁ, 2007, p. 24).
O Regimento Escolar do Estado do Paraná atualmente prevê também o Pré-
Conselho, o qual é realizado com a turma em sala de aula, sob a responsabilidade de um
professor representante de turma e/ou o pedagogo da escola. Sua função seria de
preparar material (com as informações dos alunos) para discussão no Conselho de
Classe, a fim de analisar se o método empregado em determinada turma está atingindo
seus objetivos propostos.
O Conselho de Classe, por conseguinte, pode ser explicado, conforme Dalben
(2004), como um órgão colegiado em que professores, supervisores ou orientadores
educacionais se reúnem para uma avaliação pedagógica dos alunos, sendo que mesmo
quando este não participa, ele é o foco das discussões e avaliações. Esse órgão tem
características diferenciadas de outros órgãos colegiados.
Ele apresenta algumas características básicas que o fazem diferente de outros órgãos colegiados [...] São elas: a) a forma de participação direta, efetiva e entrelaçada dos profissionais que atuam no processo pedagógico; b) sua organização interdisciplinar; c) a centralidade da avaliação escolar como foco de trabalho da instância (DALBEN, 2004, p. 31).
Cruz (1995) também entende o Conselho de Classe como agente capaz de
modificar a cultura educacional sobre avaliação e sua prática em sala, sendo que as
mesmas proposições usadas para a avaliação são válidas para o Conselho de Classe.
Por estarmos de acordo com essa vinculação direta entre avaliação e Conselho
de Classe é que passamos agora a discutir as origens e funções historicamente
assumidas pela avaliação, a fim de compreendê-la em uma perspectiva crítica, que nos
dê subsídios teóricos para repensar a ação do Conselho de Classe.
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2. Algumas considerações sobre a avaliação e suas funções históricas
Ao contrário do Conselho de Classe, a avaliação não é algo recente. É da
natureza humana fazer comparações, atribuir valor, estimar, ou seja, avaliar, o que
acontece nas mais diversas situações. O homem avalia para satisfazer suas necessidades.
São muitos os sentidos da palavra avaliar, determinados pelas relações humanas.
Segundo o dicionário Aurélio:
Avaliar: 1. Determinar a valia ou o valor de [...]. 2. Apreciar ou estimar o merecimento de [...]. 3. Calcular, estimar, computar [...]. 4. Fazer idéia de [...]. 5. Reconhecer a grandeza, a intensidade, a força de [...]. 6. Determinar a valia ou o valor, o preço, o merecimento, etc.; calcular, estimar [...]. 7. Fazer a apreciação; ajuizar [...]. 8. Reputar-se, considerar-se [...]. (FERREIRA, 1986, p. 2005).
A história nos mostra que a própria forma de avaliar muda de acordo com as
concepções de homem, trabalho e sociedade, ou seja, varia historicamente, assim como
as concepções pedagógicas. Nagel (1986) postula que a avaliação acontece com
diferentes finalidades, de acordo com cada época.
Para os gregos, o que diferenciava o homem de outros animais era o raciocínio,
portanto, o que devia ser trabalhado era a arte de bem falar e de pensar. O trabalho era
considerado irracional e deveria ser realizado por artesãos e escravos da época. A
sociedade, da forma como era organizada, predestinava os que nela viviam, o escravo, o
artesão e o cidadão.
Saviani (2003b, p. 152) enuncia que ao cidadão era dado o direito de
desenvolver-se intelectualmente, pois não era ele quem realizava o trabalho. Para ele foi
criada a escola, palavra grega que “significa o lugar do ócio”. Os demais se educavam
pelo próprio trabalho.
Nessa perspectiva, os gregos realizavam suas avaliações, que tinham por
finalidade manter essa sociedade considerada por eles ideal, perfeita. A avaliação visava
a aperfeiçoar o grupo social a qual cada grego pertencia, melhorando-o em suas
atividades (NAGEL, 1986).
Na concepção feudal, o homem racional tinha uma alma (dada por Deus), o que
o diferenciava de outros animais, por isso a educação era voltada para a religiosidade.
Devia-se conhecer Teologia e a Bíblia. Também nessa época surgem as primeiras
universidades, onde teólogos e sacerdotes lecionavam e ensinavam a doutrina católica.
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Para Nagel (1986), as avaliações nessa época histórica objetivavam aprimorar o
homem para atingir o êxito dos céus e corrigir os que tentavam atrapalhar essa ordem
social. A Inquisição Religiosa avaliava os que tinham modos diferentes de pensar,
trabalhar ou viver, e de acordo com os resultados, exterminavam-nos em praças
públicas, para que todos soubessem o que acontecia com quem desafiasse essa ordem.
Na Idade Moderna, o trabalho possibilitou o desenvolvimento de instrumentos
que deram aos homens outra visão de mundo. O trabalho passou a ser visto como algo
que leva o homem a progredir e não mais como pagamento de pecados ou destinado a
seres inferiores. O excedente de produção passava a ser vendido, gerando o lucro. O
homem era considerado racional e tinha liberdade de decidir se queria trabalhar ou não.
A sociedade deixava de reconhecer a ordem religiosa, a divindade, para começar a
experimentar os princípios da ciência e da democracia.
Buscavam-se novos referenciais para a avaliação: o que o mundo reconhecia
como essencial nesse momento era o domínio da natureza e suas possíveis
transformações. O trabalho na forma capitalista passava a direcionar as avaliações.
Na Idade Contemporânea, além domínio de produção, o homem também avança
no desenvolvimento tecnológico, produz em excesso, visando ainda mais ao lucro. O
homem é considerado racional, trabalha e tem êxito. Ele somente não conseguiu atingir
o estado de igualdade a que se propôs no período revolucionário, de superação da
sociedade feudal. Há uma disparidade entre o acúmulo de riqueza e a miséria.
A atual sociedade, ainda pautada no modo de produção capitalista, traz novas
demandas à educação escolar e ao próprio processo de avaliação, que precisam ser
devidamente compreendidas para que os envolvidos no processo de ensino-
aprendizagem possam compreender os limites e possibilidades de sua atuação.
As desigualdades sociais se reproduzem na escola e trazem indefinições e
problemas que precisam ser devidamente compreendidos. Tenta-se explicar as razões
para a concentração de riqueza nas mãos de poucos e a concentração de miséria nas
mãos de muitos, bem como as causas do fracasso escolar. Por exemplo, vários testes de
inteligência foram criados, estudos estatísticos sobre lesões cerebrais, sobre falta de
vitaminas, etc., tudo isso para justificar o fracasso escolar dos mais pobres. São tantas
teorias duvidosas que permeiam o ideário educacional, que acabam por gerar
indefinições em relação à avaliação que se quer.
As pedagogias tradicional, nova e tecnicista foram formuladas como respostas às
dificuldades que os homens enfrentavam no campo social e, conseqüentemente, no
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educacional. Elas trazem diferentes perspectivas que serão brevemente apontadas para
situar as concepções hoje existentes.
A avaliação na escola tradicional, segundo Nagel (1986), priorizava o
enciclopedismo, os saberes que já foram produzidos. Portanto, ela valorizava o
somatório, a acumulação e memorização dos conteúdos. A solução para a sociedade
seria o homem deter a maior quantidade possível de conhecimentos já produzidos.
Acreditava-se que a escola para todos e o acúmulo de conhecimentos historicamente
produzidos resolveriam o problema da marginalização.
Com o tempo, o sistema econômico mundial entrou em crise e a sociedade não
se mostrava satisfeita com aquela formação de homem, para dominar conteúdos
acumulados, já que ele não fora capaz de resolver os problemas da sociedade.
Demonstrava-se também muita insatisfação com a escola que formava esse tipo de
homem.
Formulam-se então as idéias pedagógicas da Escola Nova, que se propunham a
formar um novo homem. Negava-se a importância dos saberes científicos e valorizava-
se como o aluno aprende, ou seja, o método. “Segundo essa nova teoria, a
marginalidade deixa de ser vista predominantemente sob o ângulo da ignorância, isto é,
o não domínio dos conhecimentos. O marginalizado já não é, propriamente, o ignorante,
mas o rejeitado” (SAVIANI, 2003a, p. 7).
A avaliação, nessa nova tendência pedagógica, nega o enciclopedismo, a cultura
geral, ressaltando a idéia da descoberta individual. O passado das sociedades e suas
descobertas já não são tão importantes, e sim a sociedade próxima ao cotidiano do
aluno. O homem ideal é aquele capaz de resolver os seus problemas individuais e da sua
profissão.
Com nova crise econômica, a diferença entre concentração de riqueza e
concentração de miséria aumentou sensivelmente. Dessa vez, caberia à escola e à
sociedade encontrarem um novo rumo em busca da igualdade dos homens. A educação
foi então afetada pelo racionalismo predominante no setor produtivo. Se o homem que
possuía conhecimentos científicos não apresentava bons resultados e aquele que
conhecia seus problemas particulares também não, o insucesso foi atribuído às pessoas
que não souberam planejar bem suas atividades, entrando em cena a figura dos
especialistas para organizar e direcionar a educação.
A concepção de avaliação era permeada dos pressupostos tecnicistas, que
privilegiavam “o conhecimento da técnica, do planejamento, da didática, da listagem de
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meios e de recursos, da elaboração de objetivos”, e também esperavam dos alunos
“comportamentos definidos pelos professores de acordo com os objetivos operacionais”
(NAGEL, 1986, p. 12). A contribuição da educação tecnicista para superar a
desigualdade social seria a formação de pessoas capazes de contribuir para aumentar a
produtividade da sociedade, como expõe Saviani (2003a).
Nas décadas de 1980 e 1990 houve grandes mudanças mundiais na política e na
economia e, por conseqüência, o Brasil foi atingido. A escola deveria formar um
homem capaz de participar da sociedade com autonomia, criticidade, criatividade,
enfim, que tivesse noção de seu papel na sociedade. A escola deveria ser um espaço de
democracia, com a participação de todos na construção de suas propostas pedagógicas.
Nessa época histórica, surgem tendências pedagógicas que se contrapõem às teorias que
estavam postas. A que mais se destacou no Brasil foi a Pedagogia Histórico-Crítica,
elaborada por Saviani, o qual explica que essa pedagogia trabalha com a idéia de que a
consciência é resultado de uma transformação histórica.
Esse é o sentido básico da expressão pedagogia histórico-crítica. Seus pressupostos, portanto, são os da concepção dialética da história. Isso envolve a possibilidade de se compreender a educação escolar tal como ela se manifesta no presente, mas entendida essa manifestação presente como resultado de um longo processo de transformação histórica (SAVIANI, 2003c, p. 93).
A educação é delimitada pela sociedade, porém pode ser um espaço de
contestação à classe dominante. É uma pedagogia que trabalha, portanto, com a
perspectiva de superação das relações sociais capitalistas, que visa à emancipação
humana para além das determinações do capital. Ela considera fundamental o trabalho
com os conteúdos historicamente acumulados, mas relacionados com a vida social,
devendo a avaliação verificar se a aprendizagem de tais conteúdos foi garantida a todos.
É uma pedagogia que ainda está sendo discutida e construída na prática cotidiana das
escolas, mas que convive com outras propostas que permeiam o espaço pedagógico e
que são legalmente difundidas, inclusive com o apoio dos organismos internacionais.
Estamos nos referindo às pedagogias do aprender a aprender, defendidas pelas
políticas atuais e por vários educadores. Contrariamente à Pedagogia Histórico-Crítica,
o que se defende não é a transmissão de conteúdos, mas o aprender a aprender, a criação
de habilidades e competências para que os alunos se adaptem às exigências da atual
sociedade. Podemos observar isso se analisarmos um discurso construtivista:
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Vamos concentrar nossa atenção nas relações que se estabelecem num ambiente determinado – a escola – a quem a sociedade encarrega de preparar o cidadão para sua vida profissional e social, tarefa que define sua função social: ajudar a formar o indivíduo, facilitando sua inserção no mundo do trabalho e do lazer” (MORETTO, 2003, p. 95-96).
A avaliação, nessas perspectivas, tem um viés claramente utilitarista e atende às
demandas da sociedade atual, desconsiderando a possibilidade de sua transformação. O
discurso atual defende uma avaliação contínua e mediadora do processo educativo, ou
seja, diagnóstica. Essa avaliação pretende acompanhar o processo de aprendizagem do
aluno, detectando vários fatores que ocorrem durante seu percurso e que podem
interferir no trabalho que se realiza.
Sinteticamente, podemos asseverar que as três abordagens avaliativas mais
conhecidas são: a avaliação diagnóstica, que visa a determinar a presença ou a ausência
de conhecimentos e habilidades, inclusive buscando detectar pré-requisitos para novas
experiências de aprendizagem; a avaliação formativa, realizada com o propósito de
informar o professor e o aluno sobre o resultado da aprendizagem, durante o
desenvolvimento das atividades escolares, localizando deficiências na organização do
ensino-aprendizagem, de modo a possibilitar reformulações no mesmo; e por fim a
avaliação somativa, cuja função é classificar os alunos ao final da unidade, semestre ou
ano letivo, conforme níveis de aproveitamento apresentados, sendo que não apenas os
objetivos individuais devem servir de base para a avaliação, mas o rendimento do grupo
também. Essa retomada histórica deixa evidente o quanto a prática avaliativa é
influenciada pelo momento histórico, pelas condições de produção e reprodução da vida
humana, que produzem determinadas necessidades para a educação. O Conselho de
Classe também é permeado por essas questões, ao lidar diretamente com a avaliação,
por isso é preciso clareza quanto ao posicionamento a adotar, que tipo de homem se
quer formar, qual o projeto educativo que se tem.
3. O Conselho de Classe enquanto momento privilegiado de avaliação do processo educativo
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A compreensão da avaliação no Conselho de Classe requer ainda uma análise das
influências das avaliações externas. A cultura escolar instituída hoje em nossa sociedade
nos mostra uma preocupação muito grande com a educação e a avaliação. A sociedade
brasileira cobra um homem escolarizado, com acúmulo de conteúdos suficientes para
suprir o mercado de trabalho. Esse mercado queixa-se da baixa produtividade e
conseqüentemente da competividade internacional, atribuindo à escola a culpa por esse
fracasso, como pode ser confirmado nessa assertiva da Confederação Nacional da
Indústria:
Acentua-se a tendência de contratação de recursos humanos com maior escolaridade, de nível médio e superior, além de tecnólogos [...] Essa tendência deve se acentuar progressivamente, evidenciando o desafio de ampliar a oferta de educação profissional. O baixo nível de escolaridade da força de trabalho é, no entanto, um dos principais limitadores do crescimento no país (CNI, 2007, p.13).
Isso se torna ainda mais evidente quando analisamos o quanto o governo
brasileiro ultimamente tem investido e divulgado em suas campanhas sobre a
importância da avaliação dos sistemas de ensino. Essa avaliação externa é realizada
pelos poderes públicos, que interpretam os resultados das avaliações nacionais (Prova
Brasil e SAEB – Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica) e internacionais
(PISA – Programa Internacional de Avaliação de Alunos) e é utilizada para orientar os
investimentos e as novas políticas educacionais.
Na interpretação deles, o sistema educacional brasileiro está reprovado,
considerando-se os resultados obtidos. Os testes têm o objetivo de verificar o acúmulo
de conteúdos apreendidos pelos alunos e o que se constata é um baixo aproveitamento
em todos os níveis de ensino, colocando o Brasil em um dos últimos lugares na
classificação mundial. Apesar de todas as críticas que se possam fazer quanto a essas
avaliações externas – que não avaliam a capacidade de inserção crítica dos alunos na
realidade, mas apenas se, pragmaticamente, atendem aos critérios do mercado – sem
dúvida elas nos levam a refletir sobre a ausência de aprendizagens mínimas para a
formação humana.
As escolas se deparam com esses resultados e com seus próprios problemas
internos, havendo intenso desconforto com relação às avaliações atuais. Diante de tantas
mudanças nas políticas públicas atuais, com as classes de aceleração, ciclos, aprovação
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automática, etc., os professores se vêem diante de impasses e dúvidas quanto aos
procedimentos pedagógicos e avaliações a adotar.
Nessa rotina, costumamos observar que muitos alunos não conseguiram
aprender todos os conteúdos, porém a recomendação que recebemos hoje nas escolas é
de que devemos proporcionar vários momentos e diferentes instrumentos de avaliação.
Isto acaba por caracterizar o que concebemos por uma avaliação contínua e mediadora
da aprendizagem. O consenso existente em torno da avaliação diagnóstica esbarra em
diversos problemas teóricos e práticos. A própria estrutura curricular da escola dificulta
esse processo, pois os professores têm turmas numerosas, além de muitas vezes se
dividir em diversas escolas.
Diante disso, é muito comum que os professores questionem sobre a
aprendizagem efetiva dos alunos, ou seja, será que com tantas chances de tirar notas o
aluno aprendeu realmente? Isso nos remete a uma preocupação maior: como estamos
usando a avaliação? Alguns autores vão chamar essa valorização excessiva de
“pedagogia do exame”:
A característica que de imediato se evidencia na nossa prática educativa é de que a avaliação da aprendizagem ganhou um espaço tão amplo nos processos de ensino que nossa prática educativa escolar passou a ser direcionada por uma “pedagogia do exame” (LUCKESI, 2005, p.17).
Mesmo diante de tantas possibilidades, muitos alunos não atingem o mínimo
para aprovação e são encaminhados então para o Conselho de Classe. Nesse momento,
ele não é mais avaliado pelos conteúdos que aprendeu, mas sim em seu
desenvolvimento como um todo, ele é comparado com os outros alunos da turma,
verifica-se se tem condições de acompanhar a série subseqüente, enfim, cada escola
adota seus procedimentos. Diante disso, cabe-nos perguntar: isso garantirá sua
aprendizagem? Os objetivos educacionais foram atingidos? Ou nossas avaliações se
resumem a assegurar os índices de aprovação esperados pelas estatísticas nacionais?
Como lidar com essa situação? Isso vai depender da concepção de homem que
queremos formar, da teoria pedagógica que adotarmos. Acreditamos que é preciso,
inicialmente, optar por uma concepção de avaliação do aluno. Para trazer uma
contribuição efetiva para essa problemática, em uma perspectiva crítica e
transformadora, nos apoiamos na Teoria Histórico-Cultural, fundamentada no
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materialismo histórico, por considerar a importância do ato educativo e do trabalho do
professor para a formação humana.
Nessa perspectiva, a avaliação constitui-se em uma forma de auxiliar o professor
a refletir sua prática e analisar a aprendizagem dos alunos. Ela não é aqui utilizada como
tentativa de “medir conhecimentos” nem para anunciar um valor numérico sobre o que
foi ensinado aos alunos. Entretanto, é um momento fundamental do processo de ensino-
aprendizagem, já que valoriza os conceitos ensinados.
Segundo Moraes (2008), a avaliação da aprendizagem vai depender do processo
de ensino-aprendizagem, por isso inicialmente o professor deve ter claro se o que está
sendo trabalhado com os alunos são atividades ou tarefas. A atividade é desenvolvida
por meio de ações dirigidas por metas. As tarefas são feitas para cumprir obrigações
cotidianas.
A função da avaliação é verificar se os alunos estão aprendendo ou não, e a
partir do momento em que a resposta for negativa, o professor deverá redimensionar
suas atividades de ensino. A avaliação continua sendo indispensável, mas com o foco na
aprendizagem. Ela é mediadora do processo ensino-aprendizagem e não mais a sua
finalizadora.
A avaliação na perspectiva mediadora torna possível ao professor observar se a
sua prática metodológica está adequada ou não aos alunos, pois à medida que for
avaliando, pode estar retomando os conteúdos que não foram compreendidos. Também,
ao contrário, pode confirmar se encontrou o caminho mais adequado para o trabalho
com determinada turma. Ao aluno, esse tipo de avaliação mostrará se está avançando
dentro de uma determinada atividade.
Esse recurso, ao ser usado pelo professor, tem que apresentar clareza na
linguagem, objetividade, tanto no que se pede quanto no que se pretende saber como
resposta. O aluno precisa entender que a avaliação não é um instrumento de dominação,
de repreensão, e sim de ajuda ao que ele está estudando.
Se pensarmos a avaliação nessa perspectiva, o trabalho no Conselho de Classe
precisaria ser redimensionado, e serem repensadas as funções que ele de fato apresenta.
O foco deixaria de estar na avaliação dos alunos – que consistiria em momento
privilegiado do processo de ensino-aprendizagem, envolvendo aluno e professor na
dinâmica pedagógica– para se direcionar à avaliação do trabalho pedagógico.
Embora o Conselho de Classe já tenha sido concebido para realizar uma
avaliação da proposta pedagógica da escola, coletivamente construída e pautada em uma
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determinada concepção filosófica e educacional, explicitada no Projeto Político
Pedagógico, o que constatamos é que a sua atuação resume-se, na maioria das vezes, à
realização de avaliações dos discentes, representando uma prática fragmentada e parcial.
Em outra perspectiva, seria o momento privilegiado de debater os objetivos da escola
em relação ao processo de ensino-aprendizagem, de discussão e estudos para orientar os
procedimentos metodológicos mais adequados para garantir a aprendizagem dos alunos.
Outros estudos já apontaram caminhos alternativos para tornar esse espaço um
momento de crescimento pedagógico e institucional. Para Cruz (1995), por exemplo, o
Conselho de Classe não pode deixar de ser uma avaliação diagnóstica, mas nesse
momento não apenas do aluno, e sim de todo processo pedagógico. Ele pode ser capaz
de colaborar com o desenvolvimento da reflexão relativa à proposta pedagógica e ao
trabalho realizado na sala de aula.
Para isso, o autor sugere que o Conselho divida-se em quatro partes: na primeira
parte seria uma auto-avaliação do professor sobre seu trabalho em sala de aula. Sabemos
que isso constitui uma grande dificuldade, porém necessária para possibilitar um
processo de mudança. O cuidado a se tomar nessa etapa é evitar que se caracterize como
uma ameaça aos professores ou ridicularização de seu trabalho, pois o real objetivo é
que haja troca de experiências e discussões para ajudá-los nos problemas que enfrentam.
Seria possível, assim, que o professor verificasse:
- como colocou em prática as linhas de ação comuns propostas no bimestre anterior etc. - em que avançou, que dificuldades teve; - que inovações na metodologia ou avaliação conseguiu, pôs em prática; - a que causas atribui o sucesso ou a falha nas tentativas que fez (CRUZ, 1995, p.120).
Na segunda parte, aconteceria a análise diagnóstica da turma, que não pode ser
feita de forma superficial, limitando-se a apontar os sujeitos indisciplinados, que têm
dificuldades. Ao analisar a turma, é preciso rever metodologia, as avaliações feitas, os
conteúdos e as relações interpessoais. “A análise da turma deve apontar causas, ou ao
menos, sugerir hipóteses dos problemas que o grupo apresenta, para que se possam
propor ações concretas ou atitudes que podem produzir as modificações desejadas”
(CRUZ, 1995, p.122).
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A terceira parte refere-se às linhas de ação ou ações concretas. À luz da análise
diagnóstica da turma, o Conselho teria que articular os problemas apresentados com
ações concretas que direcionarão o trabalho dos professores ou equipe pedagógica.
Na quarta parte haveria uma análise dos casos relevantes da turma. Tratar-se-ia
de ter uma visão geral do aluno, conhecê-lo como pessoa e como estudante, para se
realizar uma avaliação diagnóstica. Com essa dinâmica de funcionamento, o autor
propõe esse momento como ponto de partida para uma mudança de perspectiva no
processo de ensino-aprendizagem. “ É o momento e o espaço de uma Avaliação
diagnóstica da ação pedagógico-educativa da escola, feito pelos professores e pelos
alunos (em momentos distintos, às vezes), à luz do Marco Operativo da Escola”
(CRUZ, 1995, p. 116).
O núcleo de todas as discussões do Conselho de Classe é sem dúvida a
avaliação. Ela perpassa cada um desses momentos e abarca todos os envolvidos na
práxis educativa. Por isso há que pensarmos criticamente essa questão, principalmente
diante da complexidade que esse tema representa para a educação atual.
Considerações Finais
Ao retomarmos as origens e funções do Conselho de Classe e da avaliação, o
objetivo foi explicitar a historicidade de suas características, a vinculação a
determinados objetivos e interesses sociais e econômicos, para evidenciar a não-
neutralidade da práxis educativa em todos os seus âmbitos. Acreditamos ser
indispensável adotar um posicionamento político e ideológico em relação à educação
escolar.
Os conceitos de homem, sociedade e educação que se quer ofertar deveriam ser
coletivamente formulados por todos os envolvidos e sistematizados no Projeto Político-
Pedagógico de cada escola. A partir desses fundamentos teóricos é que se efetivaria a
prática pedagógica e se teriam condições de avaliar se os encaminhamentos
metodológicos, os conteúdos, as avaliações, enfim, os diversos momentos que
compõem esse processo estão em consonância com os objetivos formulados.
Só assim haveria condições de efetivamente modificar a práxis pedagógica, que
nada mais é que do que a própria realidade educacional, na qual estão unificadas teoria e
prática, mesmo que estas apareçam ao senso comum como separadas. A práxis, afinal,
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argumenta Vázquez (1968, p. 07), tem seu sentido “[...] como atividade real, objetiva,
material do homem, que só é homem – socialmente – em e pela práxis (como ser social
prático).
Infelizmente, sabemos que nem sempre isso ocorre nas escolas, pois ainda existe
para alguns um desconhecimento das propostas educacionais, das teorias pedagógicas e
suas implicações para a formação humana. Superar o senso comum e, ao mesmo tempo,
adotar uma posição em relação ao mundo que vá além do tratamento teórico puro é
tarefa urgente de todos os envolvidos no trabalho escolar. É necessário, portanto, que
construamos um posicionamento científico, objetivo, da realidade que nos é dada e que
se mostra complexa e contraditória quando tratamos de avaliação.
Estes estudos e discussões teóricas iniciais procuraram permitir uma percepção
mais ampla das questões que envolvem o Conselho de Classe. Ao analisar a origem,
evolução e a prática nos dias atuais do Conselho de Classe, pretendemos contribuir para
a construção coletiva de estratégias de ações avaliativas que possam repensar o
complexo processo ensino-aprendizagem e que venham a contribuir para a superação de
práticas fragmentadas e descoladas da realidade mais ampla.
Esse assunto não se esgota aqui, há necessidade de ampliação das pesquisas
sobre a formação humana, a avaliação e as funções do Conselho de Classe. Sem um
posicionamento crítico e fundamentado diante da realidade, que permita clareza teórica
das reais possibilidades de mudanças, será impossível avançar do discurso à prática que
queremos.
Referências Bibliográficas: ARANHA, M. L. de A. História da educação. São Paulo: Moderna, 1989. ARAPIRACA, J.O. A Usaid e a educação brasileira. São Paulo: Cortez/Autores Associados, 1982. BRASIL. Lei nº 5692/71, de 20 de dezembro de 1971. Fixa Diretrizes e Bases para o ensino de 1º e 2º graus, e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 1971. Disponível em:< http://www.prolei.inep.gov.br/prolei/ >. Acesso em: 02 ago. 2008. _______. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. LDB nº 9394, de 1996. Brasília: Câmara dos Deputados, 2001.
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Questões para debate:
I - Analise o Conselho de Classe e a realidade de sua escola e responda às seguintes questões:
a) O que e quem é avaliado no Conselho de Classe? b) Há discussões sobre o processo de ensino-aprendizagem no Conselho
de Classe? c) Qual o tipo de avaliação contemplada nas práticas pedagógicas
atuais?
II - A avaliação deve ser entendida como um dos momentos do processo de ensino-aprendizagem. A partir desta afirmação e das discussões apresentadas neste material, registre suas impressões e sugestões sobre as interrogações abaixo:
a) Quais os objetivos das avaliações externas realizadas pelo Ministério da Educação?
b) A avaliação praticada hoje na maioria das salas de aula assegura uma aprendizagem conceitual?
c) Há obstáculos que dificultam as práticas avaliativas atuais?
III – Elabore sugestões para orientar a dinâmica do Conselho de Classe de sua escola.