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  • Tau Lima Verdan Rangel

    COMPNDIO DE ENSAIOS

    JURDICOS:

    DIREITO DE VIZINHANA

  • COMPNDIO DE ENSAIOS JURDICOS:

    DIREITO DE VIZINHANA

    Capa: Anita Malfatti, Paisagem com Figuras e Casario, s.d.

    Editorao, padronizao e formatao de texto

    Tau Lima Verdan Rangel

    Projeto Grfico e capa

    Tau Lima Verdan Rangel

    Contedo, citaes e referncias bibliogrficas

    O autor

    de inteira responsabilidade do autor os conceitos aqui apresentados.

    Reproduo dos textos autorizada mediante citao da fonte.

  • A P R E S E N T A O

    Tradicionalmente, o Direito reproduzido por meio de

    doutrinas, que constituem o pensamento de pessoas reconhecidas pela

    comunidade jurdica em trabalhar, academicamente, determinados

    assuntos. Assim, o saber jurdico sempre foi concebido como algo dogmtico.

    possvel, luz da tradicional viso empregada, afirmar que o Direito um

    campo no qual no se incluem somente as instituies legais, as ordens

    legais, as decises legais; mas, ainda, so computados tudo aquilo que os

    especialistas em leis dizem acerca das mencionadas instituies, ordens e

    decises, materializando, comumente, uma meta direito. No Direito, a

    construo do conhecimento advm da interpretao de leis e as pessoas

    autorizadas a interpretar as leis so os juristas.

    Contudo, o alvorecer acadmico que presenciado pelos

    Operadores do Direito, que se debruam no desenvolvimento de pesquisas,

    passa a conceber o conhecimento de maneira prtica, utilizando as

    experincias empricas e o contorno regional como elementos indissociveis

    para a compreenso do Direito. Ultrapassa-se a tradicional viso do

    conhecimento jurdico como algo dogmtico, buscando conferir molduras

    acadmicas, por meio do emprego de mtodos cientficos. Neste aspecto, o

    Compndio de Ensaios Jurdico objetiva disponibilizar para a comunidade

    interessada uma coletnea de trabalhos, reflexes e inquietaes produzida

    durante a formao acadmica do autor. Debruando-se especificamente

    sobre o Direito de Vizinhana, o compndio objetiva trazer baila a

    discusso de institutos tradicionais, tal como possibilitar um exame sobre

    institutos e direitos introduzidos no ordenamento jurdico com uma

    legislao civil contempornea e em consonncia com os anseios

    apresentados pela sociedade brasileira.

    Boa leitura!

    Tau Lima Verdan Rangel

  • S U M R I O

    Apontamentos acerca das restries legais provenientes do Direito de

    Vizinhana: Comentrios ao limite entre prdios e ao direito de tapagem ............... 05

    Comentrios passagem forada no Direito de Vizinhana: Explicitaes e

    apontamentos s limitaes legais propriedade similares servido .................... 23

    Comentrios ao direito de alteamento em sede de Direito de Vizinhana:

    Breves ponderaes ...................................................................................................... 36

    Das guas no Direito de Vizinhana: Tessituras s limitaes legais

    propriedade similares servido ................................................................................ 45

    Das rvores limtrofes em sede de Direito de Vizinhana: Singelos

    apontamentos s limitaes legais propriedade similares servido .................... 61

    Direito de Vizinhana: Anotaes s limitaes legais propriedade

    similares servido ..................................................................................................... 74

    Direito de Vizinhana: Comentrios ao uso anormal da propriedade ....................... 100

    Do cabimento da passagem de cabos e tubulaes no Direito de Vizinhana:

    Singelo painel s limitaes legais propriedade similares servido .................... 123

    Do direito de madeirar em sede de Direito de Vizinhana ......................................... 133

  • 5

    APONTAMENTOS ACERCA DAS RESTRIES

    LEGAIS PROVENIENTES DO DIREITO DE

    VIZINHANA: COMENTRIOS AO LIMITE ENTRE

    PRDIOS E AO DIREITO DE TAPAGEM

    Resumo: Ab initio, evidenciar se faz carecido que o direito de vizinhana

    alberga uma gama de limitaes, estabelecidas, de maneira expressa, pelos

    diplomas legais em vigor, que cerceiam, conseguintemente, o alcance das

    faculdades de usar e gozar por parte de proprietrios e possuidores de

    prdios vizinhos, estabelecendo um encargo a ser tolerado, com o objetivo

    de resguardar a possibilidade de convivncia social e para que haja o

    mtuo respeito propriedade. Cuida anotar que se no subsistisse tais

    termos limitadores, cada proprietrio poderia utilizar de seu direito

    absoluto, na coliso de direitos todos restariam tolhidos de exercerem suas

    faculdades, eis que as propriedades aniquilar-se-iam. H que se destacar,

    tambm, que o direito de vizinhana tem como fito macio a satisfao de

    interesses de proprietrios opostos, o que se efetiva por meio das limitaes

    ao uso e gozo dos proprietrios e possuidores. As relaes de vizinhana,

    por si s, tm o condo estimular divergncias que alcanam dimenses

    desproporcionais aos interesses materiais disputados, uma anormalidade

    que ocorre pelo recrudescimento dos sentimentos agastados pela

    proximidade indesejada e ou intolervel. No raro, uma disputa por

    insignificantes centmetros de reas consome anos de litigiosidade, criando

    despesas vultosas, sem que se possa compreender a razo de tanto

    empenho por uma situao jurdica que sequer dano efetivo causa.

    Palavras-chaves: Limite entre Prdio. Direito de Tapagem. Vizinhana.

    Sumrio: 1 Direito de Vizinhana: Ponderaes Inaugurais; 2 Breve

    Anlise acerca da Natureza Jurdica do Direito de Vizinhana; 3 Do Limite

    entre Prdios; 4 Do Direito de Tapagem: 4.1 Do Tapume: Tapume Comum

    e Tapume Especial; 4.2 Do Muro Divisrio; 4.3 Da Cerca Divisria.

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    1 DIREITO DE VIZINHANA: PONDERAES INAUGURAIS

    Ab initio, evidenciar se faz carecido que o direito de vizinhana

    alberga uma gama de limitaes, estabelecidas, de maneira expressa, pelos

    diplomas legais em vigor, que cerceiam, conseguintemente, o alcance das

    faculdades de usar e gozar por parte de proprietrios e possuidores de

    prdios vizinhos, estabelecendo um encargo a ser tolerado, com o objetivo de

    resguardar a possibilidade de convivncia social e para que haja o mtuo

    respeito propriedade. Cada proprietrio compensa seu sacrifcio com a

    vantagem que lhe advm do correspondente sacrifcio do vizinho1. Cuida

    anotar que se no subsistisse tais termos limitadores, cada proprietrio

    poderia utilizar de seu direito absoluto, na coliso de direitos todos

    restariam tolhidos de exercerem suas faculdades, eis que as propriedades

    aniquilar-se-iam. H que se destacar, tambm, que o direito de vizinhana

    tem como fito macio a satisfao de interesses de proprietrios opostos, o

    que se efetiva por meio das limitaes ao uso e gozo dos proprietrios e

    possuidores.

    Nessa trilha de exposio, saliente-se que h restries decorrentes

    da necessidade de conciliar o uso e gozo por parte de proprietrios

    confinantes, vez que a vizinhana, por si, uma fonte permanente de

    conflito. Como bem aponta Monteiro Filho, ao lecionar acerca da essncia do

    tema em comento, trata-se de normas que tendem a compor, a satisfazer os

    conflitos entre propriedade opostas, com o objetivo de tentar definir regras

    bsicas de situao de vizinhana2. Imprescindvel se faz anotar que o

    conflito de vizinhana tem sua origem, intimamente, atrelada a um ato do

    proprietrio ou possuidor de um prdio que passa a produzir repercusses

    no prdio vizinho, culminando na constituio de prejuzos ao prprio imvel

    ou ainda transtornos a seu morador. Alm do pontuado, prima gizar que o

    1 FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 7 ed. Rio de Janeiro:

    Editora Lumen Juris, 2011, p. 508.

    2 MONTEIRO FILHO, Carlos Edison do Rgo. O Direito de Vizinhana no Novo Cdigo

    Civil. In: EMERJ Debate o Novo Cdigo Civil. ANAIS... 11 out. 2002, Rio de Janeiro, p.158-

    167. Disponvel em: . Acesso em 01 set. 2012, p. 158.

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    direito de vizinhana contempla uma pluralidade de direitos e deveres

    estabelecidos em relao aos vizinhos, em razo de sua especfica condio.

    Mister faz-se colacionar ainda que o objeto da tutela imediata do

    legislador com os direitos de vizinhana so os interesses privados dos

    vizinhos3. Doutra banda o escopo mediato da norma assenta na essencial

    manuteno do princpio da funo social da propriedade, eis que a

    preservao de relaes harmoniosas entre vizinhos se apresenta como

    carecido instrumento a assegurar que cada propriedade alcance o mais

    amplo uso e fruio, obtendo, desta forma, os objetivos econmicos ao tempo

    em que salvaguarda os interesses individuais. O direito de vizinhana o

    ramo do direito civil que se ocupa dos conflitos de interesses causados pelas

    recprocas interferncias entre propriedades imveis prximas4.

    Em evidncia se faz necessrio colocar que a locuo prdio vizinho

    no deve ser interpretada de maneira restritiva, alcanando to somente os

    prdios confinantes, mas sim de modo expansivo, j que compreende todos

    os prdios que puderem sofrer repercusso de atos oriundos de prdios

    prximos. H que se citar, por carecido, o robusto magistrio de Leite, no

    qual a definio de imveis confinantes no se encontra adstrito a to

    somente aos lindeiros, mas tambm os que se localizam nas proximidades

    desde que o ato praticado por algum em determinado prdio v repercutir

    diretamente sobre o outro, causando incmodo ou prejuzo ao seu ocupante5.

    Neste diapaso, infere-se a possibilidade de sofrer interferncias

    provenientes de atos perpetrados em outros prdios apresenta-se como

    suficiente a traar os pontos delimitadores do territrio do conflito da

    vizinhana.

    Denota-se, desta sorte, que a acepo de vizinhana se revela dotada

    de amplitude e se estende at onde o ato praticado em um prdio possa

    produzir consequncias em outro, como, por exemplo, o caso do barulho

    3 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 508.

    4 MONTEIRO FILHO. 2002, p. 158. 5 LEITE, Gisele. Consideraes sobre o direito de vizinhana. Boletim Jurdico,

    Uberaba/MG, a. 5, n. 203. Disponvel em: Acesso em:

    01 set. 2012.

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    provocado por bar, boate ou ainda qualquer atividade desse gnero, o perigo

    de uma exploso, fumaa advinda da queima de detritos, badalar de um

    sino, gases expelidos por postos de gasolina, dentre tantas outras hipteses,

    em que se apresenta uma interferncia de prdio a prdio, no importando a

    distncia, acabam por ensejar conflito de vizinhana. Neste alamir, com o

    escopo de fortalecer as ponderaes j acinzeladas, quadra trazer colao o

    seguinte entendimento jurisprudencial:

    Ementa: Direito de Vizinhana. Obrigao de Fazer. Chamin.

    Fumaa. Uso Anormal de Propriedade. Chamin do imvel vizinho

    em altura inferior ao telhado da casa lindeira. Terreno em declive.

    Fumaa exalada em direo residncia da autora que inviabiliza

    a abertura de janela. Uso anormal da propriedade. Art. 1.277,

    CCB. Prova documental e testemunhal que comprova os fatos

    alegados. Princpio da imediao da prova aplicado no caso

    concreto. Sentena de procedncia mantida. Negaram provimento.

    (Tribunal de Justia do Estado do Rio Grande do Sul Dcima Nona Cmara Cvel/ Apelao Cvel N. 70035708205/ Relator:

    Desembargador Carlos Rafael dos Santos Jnior/ Julgado em

    25.05.2010).

    As relaes de vizinhana estimulam divergncias que alcanam

    dimenses desproporcionais aos interesses materiais disputados, uma

    anormalidade que ocorre pelo recrudescimento dos sentimentos agastados

    pela proximidade indesejada e ou intolervel. No raro, uma disputa por

    insignificantes centmetros de reas consome anos de litigiosidade, criando

    despesas vultosas, sem que se possa compreender a razo de tanto empenho

    por uma situao jurdica que sequer dano efetivo causa. Portanto, real a

    possibilidade de se verificar abuso do direito em assuntos do gnero; s

    vezes, o acirramento dos nimos dos litigantes inebria a racionalidade.

    2 BREVE ANLISE ACERCA DA NATUREZA JURDICA DO

    DIREITO DE VIZINHANA

    In primo oculi, reconhecer se faz imprescindvel que houve rotunda

    discusso acerca da natureza jurdica do direito de vizinhana, havendo

    defensores da natureza obrigacional dos direitos de vizinhana, enquanto

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    outros sustentavam o carter real dos aludidos direitos. Entrementes, as

    discusses supramencionadas no prosperaram por longo perodo, sendo, ao

    final, pela doutrina majoritria, adotada acepo do direito de vizinhana

    enquanto detentor de essncia de obrigao propter rem, pois se vinculam ao

    prdio, assumindo-os quem quer que se encontre em sua posse. Nesta

    toada, h que se citar o entendimento estruturado por Waquin, no qual:

    [...] a natureza jurdica destes direitos [direitos de vizinhana], na

    opinio majoritria da doutrina, que tratam-se (sic) de obrigaes

    propter rem, da prpria coisa, advindo os direitos e obrigaes do simples fato de serem os indivduos vizinhos6.

    A caracterstica mais proeminente, no que concerne ao direito de

    vizinha, tange ao fato dos sujeitos serem indeterminados, j que o dever no

    incide imediatamente sobre especfica pessoa, mas a qualquer um que se

    vincule a uma situao jurdica de titularidade de direito real ou parcelas

    dominiais, como se infere no caso do usufruturio, ou mesmo a quem exera

    o poder ftico sobre a coisa, como se verifica na hiptese do possuidor. A

    restrio, deste modo, acompanha a propriedade, mesmo que ocorra a

    alterao da titularidade, sendo suficiente que o imvel continue violando o

    dever jurdico contido no arcabouo normativo.

    Alm disso, cuida anotar, por necessrio, que o sucessor ter os

    mesmos direitos e obrigaes do sucedido perante os vizinhos. Leciona Silvio

    Rodrigues que o devedor, por ser titular de um direito sobre uma coisa, fica

    sujeito a uma determinada prestao que, por conseguinte, no derivou da

    manifestao expressa ou tcita de sua vontade7. Nesta situao, o que

    torna o proprietrio ou possuidor do imvel devedor a circunstncia de ser

    titular do direito real. So excludas, desta feita, dos conflitos de vizinhana,

    as situaes nas quais se verifica a chamada interferncia direta ou

    imediata. H que se elucidar, ao lado do pontuado, que a aludida

    modalidade de interferncia tem assento quando seus efeitos j tem incio no

    6 WAQUIN, Bruna Barbieri. Consideraes sobre Direito de Vizinhana. Disponvel

    em: . Acesso em 01 set. 2012. 7 RODRIGUES, Slvio. Direito das Coisas. So Paulo: Saraiva, 2003, p. 99

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    prdio vizinho, como ocorre quando h canalizao para que a fumaa seja

    lanada diretamente no prdio vizinho. Doutro modo, a interferncia

    mediata quando tem incio no prdio de quem a causa e, posteriormente,

    transmitida ao prdio alheio. Por oportuno, quando se trata de interferncia

    imediata, o que se tem, na realidade, ato ilcito, robusta violao da

    propriedade alheia, que como tal deve repelida, alocando-se fora da rea da

    vizinhana.

    Urge verificar que as limitaes oriundas do direito de

    vizinhana afetam, de modo abstrato, a todos os vizinhos, contudo s alcana

    a concretizao em face de alguns. Isto , os direitos de vizinhana so

    potencialmente indeterminados, porm s se manifestam em face daquele

    que se encontre diante da situao compreendida pelo arcabouo normativo.

    Ademais, os direitos de vizinhana so criados por lei, inerentes ao prprio

    direito de propriedade, sem a finalidade de incrementar a utilidade de um

    prdio8, entrementes com o escopo de assegurar a convivncia harmoniosa

    entre vizinhos. Nessa toada, os direitos de vizinhana podem ser gratuitos

    ou onerosos, sendo verificada a primeira espcie quando no gera

    indenizao, sendo compensados em idntica limitao ao vizinho, j a

    segunda espcie tem descanso quando a supremacia do interesse pblico

    estabelece uma invaso na rbita dominial do vizinho para a sobrevivncia

    do outro, afixando-se a devida verba indenizatria, eis que inexiste a

    reciprocidade.

    Calha gizar que os direitos de vizinhana onerosos se aproximam

    das servides, no em decorrncia de darem azo a novas espcies de direitos

    reais, mas pela imposio do arcabouo jurdico de deveres cooperativos de

    um vizinho, no que concerne ao atendimento da necessidade de outro

    morador. Desta feita, a propriedade de uma pessoa passa a atender aos

    interesses de outrem, que poder extrair dela as necessidades. Trata-se, com

    efeito, de macia valorao dos postulados de solidariedade, os quais

    condicionam propriedade como um instrumento robusto para o

    8 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 511.

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    desenvolvimento no apenas de seu proprietrio, mas tambm dos vizinhos

    que o cercam.

    Conquanto a norma jurdica ambicione limitar a amplitude das

    faculdades de proprietrios e possuidores vizinhos com o intento de alcanar

    a harmonia social, no pertine ao Direito regular e estabelecer os marcos

    delimitadores de todas as atividades exercitadas a partir de um prdio.

    Saliente-se que ao Direito interessa regular as interferncias, to somente

    medida que estas se revelam prejudiciais aos seus vizinhos, ameaando sua

    incolumidade e o seu prprio direito de propriedade, porquanto, uma vez

    materializadas, corrompem o iderio de pacificao social.

    3 DO LIMITE ENTRE PRDIOS

    Ao se apreciar o tema em comento, cuida salientar, em uma primeira

    plana, que a demarcao surgiu juntamente com a propriedade, eis que os

    marcos ou cercas que delimitam os pontos limtrofes, alm de estimulares os

    interesses de cunho privado, asseguram a paz e a harmonia social,

    notadamente em decorrncia dos inmeros problemas provenientes de

    questes atreladas aos limites de prdios, j que conferem direitos recprocos

    aos proprietrios dos prdios contguos. Tal fato decorre, gize-se, em razo

    da manuteno, por meio dos pontos limtrofes, da linha lindeira. Ao lado

    disso, saliente-se que possvel ao proprietrio constranger o confinante a

    proceder com ele demarcao entre os prdios, aviventando rumos

    apagados, assim como renovar marcos destrudos ou arruinados, sendo

    repartido, proporcionalmente, entre os interessados as respectivas despesas.

    Cuida anotar que o direito de demarcar do proprietrio que, em

    sentido amplo, abrange todo aquele que titular de um direito real, como,

    por exemplo, o enfiteuta, o condmino, o usufruturio, o usurio e o nu

    proprietrio. Todavia, tal direito no estendido ao possuidor, como o

    locatrio, credor pignoratcio ou depositrio, nem ao sucessor da herana

    que ainda no foi objeto de partilha. O proprietrio ou qualquer um dos

    indivduos que tm legitimidade pode propor, a qualquer tempo, a ao

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    demarcatria, que imprescritvel e irrenuncivel9. Extrai-se como escopos

    da ao demarcatria o levantamento da linha divisria entre dois prdios,

    aviventar rumos apagados e renovar marcos destrudos ou arruinados. O

    Cdigo de Processo Civil10, em seu artigo 946, limitou-se a alocar duas

    possibilidades da ao demarcatria, a saber: fixar novos rumos e aviventar

    os j existentes, sendo que este compreende tanto a reconstruo da linha

    apagada como a renovao de marcos destrudos ou arruinados.

    Como bem anota Diniz11, o proprietrio poder lanar mo dessa

    ao, ainda que no esteja na posse do imvel demarcando, devendo,

    inclusive, cumular ao ora mencionada com a restituio de reas. Assim,

    verifica-se a presena de duas demarcatrias, a saber: a simples e a

    qualificada. A primeira tem por objetivo precpuo a sinalizao de limites, ou

    seja, restabelecer ou mesmo aviventar os marcos da linha lindeira, de dois

    prdios contguos. So elencados, deste modo, como conditio sine qua non: a

    contiguidade de prdios confinantes, porquanto se os prdios no limtrofes,

    tal ao ser descabida; a titularidade de domnio dos prdios vizinhos seja

    de pessoas distintas; e, necessidade de restabelecer os marcos delimitatrios

    j existentes ou ainda fixar novos, caso no haja confuso no que tange

    linha divisria. A sentena exarada na espcie em testilha tem carter

    meramente declaratrio.

    A segunda espcie, por seu turno, cumula o pedido de fixao de

    rumos e aviventao dos que j existem com o de restituio de glebas

    indevidamente ocupadas pelo proprietrio do prdio confinante, caso o

    interessado no queira, antes de aforar aludida ao, recorrer diretamente

    aos interditos possessrios. Dever, ento, demonstrar que uma parcela de

    seu terreno, sem rea especificada, encontra-se, de maneira indevidamente,

    integrando parte do domnio do lindeiro. Calha anotar que a sentena faz

    9 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Coisas. So

    Paulo: Editora Saraiva, 2011, p. 311. 10 BRASIL. Lei N 5.869, de 11 de Janeiro de 1973. Institui o Cdigo de Processo Civil.

    Disponvel em: . Acesso em: 01 set. 2012: Art. 946. Cabe:[...] I - a ao de demarcao ao proprietrio para obrigar o seu confinante a estremar os

    respectivos prdios, fixando-se novos limites entre eles ou aviventando-se os j apagados.

    11 DINIZ, 2011, p. 312.

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    coisa julgada em referncia propriedade, quando a questo atinente a isso

    houver sido resolvida de maneira contenciosa.

    4 DO DIREITO DE TAPAGEM

    Dicciona o caput do artigo 1.297 do Cdigo Civil12 que o proprietrio

    tem o direito a cercar, murar, valar ou tapar de qualquer modo o seu prdio

    urbano ou rural, com o escopo de proteger, dentro de seus limites, a

    exclusividade de seu domnio, desde que se atenha para as disposies

    regulamentares e no provoque danos ao seu vizinho. Segundo Diniz13,

    inequvoco o direito de tapar o prdio, tambm o de confinante, e, sendo

    to legtimo o deste quando daquele, de que os prdios sejam separados por

    tapumes, o concurso de ambos para a obra divisria pode ser considerado

    carecido ou no, ensejando-se, desta sorte, direitos e obrigaes de

    vizinhana.

    O dispositivo aludido acima traz as disposies no que toca a forma

    pela qual se pode estabelecer, de maneira material, a divisa entre os prdios.

    Trata-se, com efeito, de mais uma restrio ao direito de limites que

    assegura justamente tal exclusividade, conquanto se afixe, na maioria dos

    casos, comunho na divisria, qualquer que seja a matria empregada no

    estabelecimento do ponto limtrofe das propriedades. Subsiste, segundo o

    entendimento de Venosa14, a presuno de que a ambos os proprietrios

    confinantes pertencem os tapumes divisrios e congneres, dando corpo a

    verdadeira obrigao propter rem as despesas de sua edificao, manuteno

    e conservao. Isto porque, prevalece na doutrina que referidas regras de

    direito de vizinhana possuem natureza propter rem e, portanto, podem ser

    12 BRASIL. Lei N. 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Institui o Cdigo Civil. Disponvel

    em: . Acesso em: 01 set. 2012: Art. 1.297. O proprietrio tem direito a cercar, murar, valar ou tapar de qualquer modo o seu prdio, urbano ou rural, e

    pode constranger o seu confinante a proceder com ele demarcao entre os dois prdios, a

    aviventar rumos apagados e a renovar marcos destrudos ou arruinados, repartindo-se

    proporcionalmente entre os interessados as respectivas despesas. 13 DINIZ, 2011, p. 314.

    14 VENOSA, Slvio de Salvo. Direito Civil: Direitos Reais. 10 ed. So Paulo: Editora

    Atlas, 2010, p. 331.

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    opostas a todos aqueles que se encontrem na posse da coisa, inclusive, aos

    possuidores. Com o intuito de robustecer as ponderaes apresentadas at o

    momento, cuida citar o seguinte aresto:

    Ementa: Apelao. Ao de Obrigao de Fazer com Pedido de

    Tutela Antecipada. Direito de Vizinhana. Pedido para que a

    proprietria do imvel limtrofe fosse impedida de obstar a

    construo do muro divisrio. Procedncia. Possibilidade. Direito

    do proprietrio de edificar muro nos respectivos limites de seu bem

    (Art. 1.297, CC) Direito de tapagem. Regras aplicadas aos

    possuidores em decorrncia da natureza propter rem da obrigao. Ato abusivo da r que impossibilita os autores, seus

    vizinhos, de exercer a posse sobre o bem. Negado provimento.

    (Tribunal de Justia do Estado de So Paulo Vigsima Quinta Cmara de Direito Privado/ Apelao Cvel N. 0014364-

    83.2009.8.26.0576/ Relator: Desembargador Hugo Crepaldi/

    Julgado em 07 dez. 2011).

    O Diploma Civilista em vigncia anota a repartio proporcional das

    despesas gastas com a construo de marcos delimitantes, tratando-se, por

    imperioso, de presuno relativa, a qual permite prova em contrrio. Alis,

    tal presuno relativa recebe grosso destaque na dico do 1 do artigo

    1.297 da Lei N 10.406/200215. Essa presuno juris tantum, incumbindo

    o onus probandi em contrrio quele a quem interessar tal meao16. Vigora

    como regra que as divisrias sero edificadas sobre a linha lindeira ou,

    ainda, dividindo a espessura em duas partes iguais, pelos lados da linha

    divisria, contudo se o dono do prdio edificar somente de seu lado, no

    subsistir o condomnio necessrio ao marco limtrofe.

    Anote-se, por imperioso, que, em no sendo possvel a comprovao

    de sua exclusividade, no que tange ao ponto lindeiro, incidir a presuno.

    Verbaliza, ainda, o 1 do artigo 1.297 do Codex Civil que os lindeiros esto

    obrigados, em conformidade com os costumes adotados na regio, a

    15 BRASIL. Lei N. 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Institui o Cdigo Civil. Disponvel

    em: . Acesso em: 01 set. 2012: Art. 1.297. [...] 1 Os intervalos, muros, cercas e os tapumes divisrios, tais como sebes vivas, cercas de arame ou

    de madeira, valas ou banquetas, presumem-se, at prova em contrrio, pertencer a ambos

    os proprietrios confinantes, sendo estes obrigados, de conformidade com os costumes da

    localidade, a concorrer, em partes iguais, para as despesas de sua construo e

    conservao. 16 DINIZ, 2011, p. 314.

  • COMPNDIO DE ENSAIOS JURIDICOS: DIREITO DE VIZINHANA

    TAU LIMA VERDAN RANGEL

    15

    contribuir em partes iguais para as despesas de construo e conservao

    das divisrias. Prima realar que a vedao das divisas se afigura como um

    direito do proprietrio e no uma obrigao, exceto de for proveniente de

    imposio administrativa ou contratual entre os lindeiros. Frise-se, ainda, se

    for atribuda pelo loteador e se encontrar presente no registro imobilirio,

    ter o mesmo efeito de imposio administrativa.

    permitido ao proprietrio que cobre a quota do lindeiro que no

    concorreu com as despesas. Todavia, tais disposies no prosperaro se o

    vizinho que erigiu a obra divisria o fez por iniciativa sua, logrando xito o

    confinante em demonstrar no possuir interesse, bem como se efetuou obras

    ou despesas desnecessrias ou volupturias na separao, o que deve ser

    apurado no caso concreto17. Desta feita, por exemplo, em sendo empregado

    plantas raras e exticas nas cercas vivas ou mesmo material luxuoso na

    construo da divisria, o lindeiro no ter que suportar metade das

    despesas tidas como suprfluas.

    4.1 Do Tapume: Tapume Comum e Tapume Especial

    Em uma primeira plana, ao se apreciar o tapume divisrio, cuida

    assinalar que este compreende um amplo lastro de termos, dentre as quais

    se destacam as sebes vivas, as cercas de arame ou de madeira, as valas ou

    banquetas. Pela dico contida no 2 do artigo 1.297 do Cdigo Civil18, as

    sebes vivas, rvores ou mesmo quaisquer outras plantas que so destinadas

    a marco divisrio, s podero ser objeto de corte ou ainda arrancadas se

    houver comum acordo dos confinantes. Os usos do local definiro a

    qualidade e espcie de material a ser utilizados: muro simples ou pintados,

    com tijolos aparentes ou revestidos, cercas com moires de madeira ou de

    17 VENOSA, 2010, p. 332. 18 BRASIL. Lei N. 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Institui o Cdigo Civil. Disponvel

    em: . Acesso em: 01 set. 2012: Art. 1.297. [...] 2 As sebes vivas, as rvores, ou plantas quaisquer, que servem de marco divisrio, s podem ser

    cortadas, ou arrancadas, de comum acordo entre proprietrios.

  • COMPNDIO DE ENSAIOS JURIDICOS: DIREITO DE VIZINHANA

    TAU LIMA VERDAN RANGEL

    16

    concreto19, ou mesmo gradis simples ou luxuosamente trabalhados, arames

    farpados, cercas vivas com arbustos ou rvores de mdio ou grande porte.

    Encontram-se, ainda, albergados pela denominao de tapume

    divisrio quaisquer outros meios de separao de terrenos, atentando-se,

    com efeito, para as dimenses estabelecidas nos Cdigos de Postura

    Municipais, em atinncia aos costumes de cada localidade, desde que

    tenham por escopo impedir a passagem de animais de grande porte, como

    o gado bovino, equino e muar. Trata-se de tapume comum ou ordinrio, que

    constitui um direito do proprietrio do prdio contguo, devendo sua

    construo ser paga em partes iguais pelos confinantes porque uma

    imposio legal20. Como bem assinala Hely Lopes Meirelles21, o tapume que

    se presume como sendo o comum aquele corriqueiramente usado pela

    localidade, a fim de promover a vedao de animais tidos de grande porte.

    Doutro modo, os tapumes especiais se destinam a obstar a passagem

    de animais de pequena dimenso, a exemplo de aves, porcos, cabras e

    carneiros, afigurando-se como uma obrigao dos proprietrios e detentores

    desses animais, que suportaro sozinhos as despesas de sua edificao.

    Desta feita, no poder o vizinho exigir o pagamento equivalente metade

    do valor da quantia despendida a seu confinante, eis que tal espcie busca a

    satisfao de interesses particulares daquele que o construiu. No tm o

    direito de criar em aberto esses animais, salvo se houver terreno baldio, caso

    em que se estabelece o compscuo, regulado pela legislao municipal22.

    Ao lado disso, no considerado tapume comum a cerca, o gradil

    artstico ou o muro construdos para promover o embelezamento da

    propriedade, ou mesmo o tabique de proteo s obras em andamento. H

    que se citar, por imperioso, o paradigmtico aresto do Superior Tribunal de

    Justia, da relatoria da Ministra Nancy Andrighi, que delimitou, com

    clareza solar, a distino das duas espcies de tapume:

    19 VENOSA, 2010, p. 332-333. 20 DINIZ, 2011, p. 315. 21 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito de Construir. 10 ed., atual. So Paulo:

    Malheiros Editores, 2010, p. 56. 22 DINIZ, 2011, p. 316.

  • COMPNDIO DE ENSAIOS JURIDICOS: DIREITO DE VIZINHANA

    TAU LIMA VERDAN RANGEL

    17

    Ementa: Direito Civil. Direito de Tapagem. Arts. 588, 1 e 571,

    ambos do CC. Obrigao propter rem. Cerca divisria entre imveis

    rurais. Meao de Tapumes Divisrios Comuns. Cobrana de

    despesas efetuadas pelo proprietrio lindeiro. Diversidade de

    atividades rurais dos vizinhos confinantes. Reflorestamento e

    criao de gado. Substituio de cerca antiga, que imprescindia de

    recuperao, para impedir passagem do gado. Legalidade. - So

    comuns os tapumes que impedem a passagem de animais de

    grande porte, como o gado vacum, cavalar e muar (art. 588, 2,

    CC), sendo obrigados a concorrer para sua construo e

    conservao os proprietrios de imveis confinantes (art. 588, 1,

    CC), ainda que algum deles no se destine a atividade pecuria,

    mas a reflorestamento. - Apenas na obrigao de cercar imveis,

    com a construo de tapumes especiais - estes considerados como

    prprios para deter aves domsticas e animais como cabrito, porcos

    e carneiros, em seus limites -, que seria indevida a meao do

    valor gasto com os reparos neles realizados (art. 588, 3, CC).

    (Superior Tribunal de Justia Terceira Turma/ REsp 238.559/MS/ Relatora: Ministra Nancy Andrighi/ Julgado em 20.04.2001/

    Publicado no DJ em 11.06.2001, p. 202).

    Insta assinalar que a parte do lindeiro para a construo e

    conservao de tapumes divisrios s ser passvel de vindicao se firmar

    avena antes da realizao de obras ou, ainda, se forem edificados em

    decorrncia da exigncia administrativa entalhada na lei ou em

    regulamento. O direito a vedao s se reveste de aspecto de obrigao

    quando decorre de alguma norma administrativa complementar da lei civil

    ou, ainda, quando os prprios interessados se obriguem por meio de acordo

    entabulado. Os tapumes divisrios comuns observam a regra de presuno

    de pertencimento a ambos os vizinhos confinantes, admitindo, inclusive,

    prova em contrrio. J os tapumes especiais, em razo de atenderem

    interesses privados pertencem apenas ao proprietrio que o edificou. Neste

    sentido Hely Lopes Meirelles, ao tratar do tema, pontuou que a sua

    construo, conservao e utilizao podem ser exigidas daquele que

    provocou a necessidade23.

    Anota, ainda, Maria Helena Diniz24 que no se excede no direito de

    propriedade aquele que coloca ofendculos, como cacos de vidro em cima do

    muro divisrio, grades de ferro terminadas em pontas de lana, cercas

    23 MEIRELLES, 2010, p. 56. 24 DINIZ, 2011, p. 317.

  • COMPNDIO DE ENSAIOS JURIDICOS: DIREITO DE VIZINHANA

    TAU LIMA VERDAN RANGEL

    18

    eletrificadas, com o intuito de ferir aquele que, sub-repticiamente, tenta

    ingressar em sua propriedade. A utilizao de tais ofendculos objetiva a

    defesa preventiva do domnio do proprietrio do imvel.

    4.2 Do Muro Divisrio

    Inicialmente, calha assinalar que o muro divisrio assim

    considerado como todo aquele que se ergue rente linha divisria da

    propriedade. Distintamente das paredes divisrias, os muros em comento

    no podem ser erigidos alm dos limites do terreno, eis que a diversidade de

    tratamento deriva da premissa que muro elemento de vedao, ao passo

    que a parede elemento de sustentao. Tal distino, inclusive, pode-se

    facilmente observada no tratamento diferenciado dispensado pelo Cdigo

    Civil, notadamente quando aloca o muro divisrio sob a epgrafe do direito

    de tapagem e a parede divisria sob a rubrica direito de construir. Dessa

    distino resulta, ainda, que os muros s podem ser utilizados pelos vizinhos

    para vedao de suas propriedades, distintamente das paredes divisria, que

    admitem madeiramento e travejamento por parte de ambos os confinantes25.

    Com efeito, o muro divisrio de pertencimento daquele que o

    construiu, subsistindo a presuno comum aos vizinhos quando no

    possvel aferir, in concreto, quem o edificou. No encontra qualquer descanso

    o iderio de que o muro pertence ao vizinho, em razo dos pilares de reforo

    estarem direcionados ou mesmo proeminentes para a propriedade dele. No

    mais, no h que se falar em cobrana de parte das despesas do vizinho

    lindeiro, se aquele que edificou o muro divisrio no avenou com esse em

    tal sentido. Colhe-se entendimento jurisprudencial que, com clareza solar,

    acena:

    Ementa: Agravo retido que no foi reiterado; no conhecimento

    [art. 523, 1, do CPC]. Direito de vizinhana - Meao de muros e

    paredes divisrias - No obstante a lei estabelea, por razes de

    utilidade pblica, a presuno de comunho de muro de vedao de

    imveis urbanos [art. 571, do CC de 1916 e 1297, 1, do CC de

    2002], essa presuno cede diante de prova cabal de que somente

    25 MEIRELLES, 2010, p. 57.

  • COMPNDIO DE ENSAIOS JURIDICOS: DIREITO DE VIZINHANA

    TAU LIMA VERDAN RANGEL

    19

    um dos vizinhos suportou o nus da construo, verdade que,

    aliada certeza de que o uso comum tornou-se incompatvel e

    nocivo ao proprietrio, legaliza o comando de absteno de

    aproveitamento do muro alheio - No provimento. (Tribunal de

    Justia do Estado de So Paulo Dcima Cmara de Direito Privado/ Apelao Cvel N 938.926-8/ Relator: Desembargador

    nio Santarelli Zuliani/ Julgado em 23.11.2044).

    Em decorrncia de seu aspecto de elemento de vedao, salta

    aos olhos que o muro divisrio serve a ambos os vizinhos, sendo prescindvel

    o levantamento de outro justaposto ao anterior. Entrementes, se o vizinho

    pretende promover alteraes ou modificaes, s o poder fazer aps a

    obteno expressa do consentimento do proprietrio ou obtendo a meao

    devida, judicialmente, por meio do aforamento da ao adequada. Em

    decorrncia do sucedneo de problemas de segurana existentes nos grandes

    centros urbanos, o entendimento jurisprudencial tem firmado

    posicionamento de que possvel a elevao do muro divisrio, sem prvio

    consentimento do vizinho. No havendo infringncia a qualquer dispositivo

    legal vigente, o aumento na altura do muro divisrio no confere direito

    indenizao ao proprietrio de imvel lindeiro que se sentiu prejudicado com

    a obra26.

    Quadra, ainda, salientar que os muros divisrios no podem ser

    utilizados para madeiras ou travejar construes lindeiras pelos vizinhos, j

    que essa dupla utilizao cabvel to somente nas paredes divisrias. A

    meao permitida pelo ordenamento em vigor concerne utilizao de

    elemento de vedao comum, nunca como elemento de sustentao.

    Ademais, permitir o fortalecimento do equvoco provocar a desnaturao

    do muro divisrio, conferindo-lhe aspectos caractersticos que no detentor.

    4.3 Da Cerca Divisria

    26 SO PAULO (ESTADO). Tribunal de Justia do Estado de So Paulo. Acrdo

    proferido em Apelao Cvel N. 869.377-00. Nunciao de Obra Nova. Direito de

    Vizinhana. Construo do Muro Concluda. Prosseguimento no mbito do Pedido

    Demolitrio e Indenizatrio (Art. 936, incisos, do CPC). Infringncia Lei no verificada.

    Apelo Improvido. rgo Julgador: Vigsima Sexta Cmara de Direito Privado. Relator:

    Desembargador Norival Oliva. Julgamento em 10 set. 2007. Disponvel em:

    . Acesso em 01 set. 2012.

  • COMPNDIO DE ENSAIOS JURIDICOS: DIREITO DE VIZINHANA

    TAU LIMA VERDAN RANGEL

    20

    Em uma primeira plana, cuida anotar que as cercas, tal como

    ocorre com os muros divisrios, constituem elemento de vedao das

    propriedades, sendo estes empregados na zona urbana, ao passo que aquelas

    na zona rural. Considera-se cerca divisria todo elemento de tapagem,

    natural ou artificial, lanado nos limites das propriedades confinantes com

    particulares, ou com o domnio pblico27. Ao lado disso, insta salientar que

    a cerva divisria se encontra sujeita aos mesmos princpios estatudos na

    legislao, no que concerne a feitura e utilizao pelos vizinhos, inclusive no

    que concerne meao dos gastos pela edificao pelos vizinhos lindeiros.

    Conforme cedio, os gastos que orbitam em torno da edificao de

    cerca divisria, em obedincia simetria existente do direito de tapagem,

    dever, de maneira proporcional, ser suportada pelos vizinhos confinantes,

    eis que a construo de tal instrumento de vedao no se presta a

    beneficiar apenas um dos vizinhos. A edificao de cerca divisria projeta

    benefcios a ambos os lindeiros, notadamente no que se refere ao

    estabelecimento de pontos demarcatrios entre as propriedades, estando, em

    razo disso, assentada a solidariedade no que pertine aos gastos. Neste

    sentido, h que se trazer colao, com o escopo de fortalecer o aduzido, o

    entendimento firmado pelo Tribunal de Justia do Rio Grande do Sul:

    Ementa: Direito de Vizinhana. Edificao de Cerca

    Demarcatria. Diviso das Despesas entre os Proprietrios

    Confinantes. Preliminar de Complexidade da Matria Afastada.

    1. No h complexidade na matria discutida nos autos.

    incontroversa a construo de uma cerca divisria pelo autor e sua

    pretenso o ressarcimento de metade do valor despendido com a

    obra. Alm disso, no h qualquer indcio de que a cerca tenha sido

    construda em desobedincia real divisa entre os prdios, o que

    poderia ter sido evidenciado atravs de prova testemunhal ou

    mesmo da juntada de laudo tcnico elaborado a pedido do ru. 2.

    No mrito, o proprietrio tem direito de murar o seu prdio, urbano

    ou rural, e pode constranger o seu confinante a proceder com ele

    demarcao entre os dois prdios, repartindo-se proporcionalmente

    entre os interessados as respectivas despesas. Situao em que a

    cerca serve nitidamente para demarcar as propriedades de ambas

    as partes, no se podendo afirmar que aproveite apenas autora.

    Incide, portanto, o disposto no art. 1.297, do Cdigo Civil. 3. Os

    27 MEIRELLES, 2010, p. 58.

  • COMPNDIO DE ENSAIOS JURIDICOS: DIREITO DE VIZINHANA

    TAU LIMA VERDAN RANGEL

    21

    recibos e notas fiscais apresentados, em conjunto com o

    levantamento fotogrfico, evidenciam a correo do valor cobrado.

    Sentena confirmada por seus prprios fundamentos. Recurso

    improvido. (Tribunal de Justia do Estado do Rio Grande do Sul Primeira Turma Recursal Cvel/ Recurso Inominado

    N71003220159/ Relator: Ricardo Torres Hermann/ Julgado em

    27.10.2011).

    Ademais, as cercas marginais das estradas pblicas sero objeto de

    manuteno pelo Poder Pblico, podendo, contudo, ficar a cargo dos

    particulares interessados. Mister se faz realar que o traspasse da obrigao

    da Administrao Pblica para o particular s poder ser feito mediante

    competente acordo, eis que a competncia, originariamente, para a

    manuteno de estrada pblica das entidades estatais.

    REFERNCIAS:

    BRASIL. Lei N 5.869, de 11 de Janeiro de 1973. Institui o Cdigo de

    Processo Civil. Disponvel em: . Acesso em: 01

    set. 2012.

    __________. Lei N. 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Institui o Cdigo

    Civil. Disponvel em: . Acesso em: 01 set. 2012.

    __________. Superior Tribunal de Justia. Disponvel em:

    . Acesso em: 01 set. 2012.

    DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das

    Coisas. So Paulo: Editora Saraiva, 2011.

    FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 7 ed.

    Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2011.

    IMHOF, Cristiano. Cdigo Civil Interpretado: Anotador Artigo por

    Artigo. 4 ed. Florianpolis: Editora Publicaes Online, 2012.

    LEITE, Gisele. Consideraes sobre o direito de vizinhana. Boletim

    Jurdico, Uberaba/MG, a. 5, n. 203. Disponvel em:

    Acesso em: 01 set. 2012.

    MEIRELLES, Hely Lopes. Direito de Construir. 10 ed., atual. So Paulo:

    Malheiros Editores, 2010.

  • COMPNDIO DE ENSAIOS JURIDICOS: DIREITO DE VIZINHANA

    TAU LIMA VERDAN RANGEL

    22

    MONTEIRO FILHO, Carlos Edison do Rgo. O Direito de Vizinhana no

    Novo Cdigo Civil. In: EMERJ Debate o Novo Cdigo Civil. ANAIS... 11 out.

    2002, Rio de Janeiro, p.158-167. Disponvel em:

    . Acesso em 01 set. 2012.

    RIO GRANDE DO SUL (ESTADO). Tribunal de Justia do Estado do

    Rio Grande do Sul. Disponvel em:. Acesso em 01 set.

    2012.

    RODRIGUES, Slvio. Direito das Coisas. So Paulo: Saraiva, 2003.

    SO PAULO (ESTADO). Tribunal de Justia do Estado de So Paulo.

    Disponvel em:. Acesso em 01 set. 2012.

    VENOSA, Slvio de Salvo. Direito Civil: Direitos Reais. 10 Ed, So

    Paulo: Editora Atlas, 2010.

    WAQUIN, Bruna Barbieri. Consideraes sobre Direito de Vizinhana.

    Disponvel em: . Acesso em 01 set. 2012.

  • 23

    COMENTRIOS PASSAGEM FORADA NO

    DIREITO DE VIZINHANA: EXPLICITAES E

    APONTAMENTOS S LIMITAES LEGAIS

    PROPRIEDADE SIMILARES SERVIDO

    Resumo: Inicialmente, insta evidenciar que o direito de vizinhana

    compreende uma gama de limitaes, estabelecidos expressamente pelos

    diplomas legais em vigor, que cerceiam, via de consequncia, o alcance das

    faculdades de usar e gozar por parte de proprietrios e possuidores de

    prdios vizinhos, afixando um encargo a ser tolerado, a fim de resguardar

    a possibilidade de convivncia social e para que haja o mtuo respeito

    propriedade. Nesta esteira, calha evidenciar que se no subsistisse tais

    pontos demarcatrios, cada proprietrio poderia lanar mo de seu direito

    absoluto, na coliso de direitos todos restariam tolhidos de exercerem suas

    faculdades, eis que as propriedades aniquilar-se-iam. H que se negritar,

    ainda, que o direito de vizinhana tem como escopo robusto a satisfao de

    interesses de proprietrios opostos, o que se efetiva por meio das limitaes

    ao uso e gozo dos proprietrios e possuidores. Nessa trilha de exposio,

    saliente-se que h restries decorrentes da necessidade de conciliar o uso

    e gozo por parte de proprietrios confinantes, vez que a vizinhana, por si,

    uma fonte permanente de conflito. Assim, objetiva o presente em analisar

    as limitaes legais decorrentes da passagem forada em sede de direito de

    vizinhana.

    Palavras-chaves: Direito de Vizinhana. Limitaes Legais. Passagem

    Forada.

    Sumrio: 1 Direito de Vizinhana: Anotaes Introdutrias; 2 Natureza

    Jurdica do Direito de Vizinhana; 3 Comentrios Passagem Forada no

    Direito de Vizinhana: Explicitaes e Apontamentos s Limitaes Legais

    Propriedade Similares Servido

  • COMPNDIO DE ENSAIOS JURIDICOS: DIREITO DE VIZINHANA

    TAU LIMA VERDAN RANGEL

    24

    1 DIREITO DE VIZINHANA: ANOTAES INTRODUTRIAS

    Inicialmente, insta evidenciar que o direito de vizinhana

    compreende uma gama de limitaes, estabelecidos expressamente pelos

    diplomas legais em vigor, que cerceiam, via de consequncia, o alcance das

    faculdades de usar e gozar por parte de proprietrios e possuidores de

    prdios vizinhos, afixando um encargo a ser tolerado, a fim de resguardar a

    possibilidade de convivncia social e para que haja o mtuo respeito

    propriedade. Cada proprietrio compensa seu sacrifcio com a vantagem que

    lhe advm do correspondente sacrifcio do vizinho28. Nesta esteira, calha

    evidenciar, oportunamente, que se no subsistisse tais pontos

    demarcatrios, cada proprietrio poderia lanar mo de seu direito absoluto,

    na coliso de direitos todos restariam tolhidos de exercerem suas faculdades,

    eis que as propriedades aniquilar-se-iam. H que se negritar, ainda, que o

    direito de vizinhana tem como escopo robusto a satisfao de interesses de

    proprietrios opostos, o que se efetiva por meio das limitaes ao uso e gozo

    dos proprietrios e possuidores.

    Saliente-se que h restries decorrentes da necessidade de conciliar

    o uso e gozo por parte de proprietrios confinantes, vez que a vizinhana,

    por si, uma fonte permanente de conflito. Como bem aponta Monteiro

    Filho, ao lecionar acerca da essncia do tema em comento, trata-se de

    normas que tendem a compor, a satisfazer os conflitos entre propriedade

    opostas, com o objetivo de tentar definir regras bsicas de situao de

    vizinhana29. Imprescindvel se faz anotar que o conflito de vizinhana tem

    sua origem, intimamente, atrelada a um ato do proprietrio ou possuidor de

    um prdio que passa a produzir repercusses no prdio vizinho, culminando

    na constituio de prejuzos ao prprio imvel ou ainda transtornos a seu

    morador. Alm do pontuado, prima gizar que o direito de vizinhana

    28 FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 7 ed. Rio de Janeiro:

    Editora Lumen Juris, 2011, p. 508. 29 MONTEIRO FILHO, Carlos Edison do Rgo. O Direito de Vizinhana no Novo Cdigo

    Civil. In: EMERJ Debate o Novo Cdigo Civil. ANAIS... 11 out. 2002, Rio de Janeiro, p.158-

    167. Disponvel em: . Acesso em 05 jan. 2015, p. 158.

  • COMPNDIO DE ENSAIOS JURIDICOS: DIREITO DE VIZINHANA

    TAU LIMA VERDAN RANGEL

    25

    contempla uma pluralidade de direitos e deveres estabelecidos em relao

    aos vizinhos, em razo de sua especfica condio.

    Mister faz-se colacionar, oportunamente, que o objeto da tutela

    imediata do legislador com os direitos de vizinhana so os interesses

    privados dos vizinhos30. Doutra banda o escopo mediato da norma assenta

    na essencial manuteno do princpio da funo social da propriedade, eis

    que a preservao de relaes harmoniosas entre vizinhos se apresenta como

    carecido instrumento a assegurar que cada propriedade alcance o mais

    amplo uso e fruio, obtendo, desta forma, os objetivos econmicos ao tempo

    em que salvaguarda os interesses individuais. O direito de vizinhana o

    ramo do direito civil que se ocupa dos conflitos de interesses causados pelas

    recprocas interferncias entre propriedades imveis prximas31.

    Em evidncia se faz necessrio colocar que a locuo prdio vizinho

    no deve ser interpretada de maneira restritiva, alcanando to somente os

    prdios confinantes, mas sim de modo expansivo, j que compreende todos

    os prdios que puderem sofrer repercusso de atos oriundos de prdios

    prximos. H que se citar, por carecido, o robusto magistrio de Leite, no

    qual a definio de imveis confinantes no se encontra adstrito a to

    somente aos lindeiros, mas tambm os que se localizam nas proximidades

    desde que o ato praticado por algum em determinado prdio v repercutir

    diretamente sobre o outro, causando incmodo ou prejuzo ao seu

    ocupante32. Neste diapaso, infere-se a possibilidade de sofrer

    interferncias provenientes de atos perpetrados em outros prdios

    apresenta-se como suficiente a traar os pontos delimitadores do territrio

    do conflito da vizinhana.

    Denota-se, desta sorte, que a acepo de vizinhana se revela dotada

    de amplitude e se estende at onde o ato praticado em um prdio possa

    produzir consequncias em outro, como, por exemplo, o caso do barulho

    30 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 508.

    31 MONTEIRO FILHO, 2002, p. 158. 32 LEITE, Gisele. Consideraes sobre o direito de vizinhana. Boletim Jurdico,

    Uberaba/MG, a. 5, n. 203. Disponvel em: Acesso em:

    05 jan. 2015.

  • COMPNDIO DE ENSAIOS JURIDICOS: DIREITO DE VIZINHANA

    TAU LIMA VERDAN RANGEL

    26

    provocado por bar, boate ou ainda qualquer atividade desse gnero, o perigo

    de uma exploso, fumaa advinda da queima de detritos, badalar de um

    sino, gases expelidos por postos de gasolina, dentre tantas outras hipteses,

    em que se apresenta uma interferncia de prdio a prdio, no importando a

    distncia, acabam por ensejar conflito de vizinhana. Neste alamir, com o

    escopo de fortalecer as ponderaes j acinzeladas, quadra trazer colao o

    seguinte entendimento jurisprudencial:

    Ementa: Direito de Vizinhana. Obrigao de Fazer. Chamin.

    Fumaa. Uso Anormal de Propriedade. Chamin do imvel vizinho

    em altura inferior ao telhado da casa lindeira. Terreno em declive.

    Fumaa exalada em direo residncia da autora que inviabiliza

    a abertura de janela. Uso anormal da propriedade. Art. 1.277,

    CCB. Prova documental e testemunhal que comprova os fatos

    alegados. Princpio da imediao da prova aplicado no caso

    concreto. Sentena de procedncia mantida. Negaram provimento.

    (Tribunal de Justia do Estado do Rio Grande do Sul Dcima Nona Cmara Cvel/ Apelao Cvel N. 70035708205/ Relator:

    Desembargador Carlos Rafael dos Santos Jnior/ Julgado em

    25.05.2010).

    Ao lado disso, destacar se faz carecido que o vocbulo prdio no

    apresenta qualquer distino entre o imvel localizado em rea urbana ou

    rural. De igual modo, o termo supramencionado no apresenta qualquer

    questionamento acerca da finalidade, alcanando tanto o residencial,

    comercial e industrial. Evoca apenas uma edificao de uma casa ou

    apartamentos em condomnio, independente da finalidade. Mesmo o terreno

    no-edificado considervel imvel lato sensu33. Destarte, para que reste

    amoldado ao termo prdio, basta que o imvel apresente interferncia que

    tenha o condo de repercutir, de maneira prejudicial, em prdio vizinho.

    2 NATUREZA JURDICA DO DIREITO DE VIZINHANA

    In primo oculi, reconhecer se faz imprescindvel que houve rotunda

    discusso acerca da natureza jurdica do direito de vizinhana, havendo

    defensores da natureza obrigacional dos direitos de vizinhana, enquanto

    33 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 509.

  • COMPNDIO DE ENSAIOS JURIDICOS: DIREITO DE VIZINHANA

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    27

    outros sustentavam o carter real dos aludidos direitos. Entrementes, as

    discusses supramencionadas no prosperaram por longo perodo, sendo, ao

    final, pela doutrina majoritria, adotada acepo do direito de vizinhana

    enquanto detentor de essncia de obrigao propter rem, pois se vinculam ao

    prdio, assumindo-os quem quer que se encontre em sua posse. Nesta

    toada, h que se citar o entendimento estruturado por Waquin, no qual:

    [...] a natureza jurdica destes direitos [direitos de vizinhana], na

    opinio majoritria da doutrina, que tratam-se (sic) de obrigaes

    propter rem, da prpria coisa, advindo os direitos e obrigaes do simples fato de serem os indivduos vizinhos34.

    Ao lado disso, a caracterstica mais proeminente, no que concerne ao

    direito de vizinha, tange ao fato dos sujeitos serem indeterminados, j que o

    dever no incide imediatamente sobre especfica pessoa, mas a qualquer um

    que se vincule a uma situao jurdica de titularidade de direito real ou

    parcelas dominiais, como se infere no caso do usufruturio, ou mesmo a

    quem exera o poder ftico sobre a coisa, como se verifica na hiptese do

    possuidor. A restrio, luz do pontuado alhures, acompanha a propriedade,

    mesmo que ocorra a alterao da titularidade, sendo suficiente que o imvel

    continue violando o dever jurdico contido no arcabouo normativo.

    Alm disso, cuida anotar, por necessrio, que o sucessor ter os

    mesmos direitos e obrigaes do sucedido perante os vizinhos. Leciona Silvio

    Rodrigues que o devedor, por ser titular de um direito sobre uma coisa, fica

    sujeito a uma determinada prestao que, por conseguinte, no derivou da

    manifestao expressa ou tcita de sua vontade35. Nesta situao, o que

    torna o proprietrio ou possuidor do imvel devedor a circunstncia de ser

    titular do direito real. So excludas, desta feita, dos conflitos de vizinhana,

    as situaes nas quais se verifica a chamada interferncia direta ou

    imediata. H que se elucidar, ao lado do pontuado, que a aludida

    modalidade de interferncia tem assento quando seus efeitos j tem incio no

    34 WAQUIN, Bruna Barbieri. Consideraes sobre Direito de Vizinhana. Disponvel

    em: . Acesso em 05 jan. 2015. 35 RODRIGUES, Slvio. Direito das Coisas. So Paulo: Saraiva, 2003, p. 99.

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    28

    prdio vizinho, como ocorre quando h canalizao para que a fumaa seja

    lanada diretamente no prdio vizinho. Doutro modo, cuida explicitar que a

    interferncia mediata quando tem incio no prdio de quem a causa e,

    posteriormente, transmitida ao prdio alheio. Por oportuno, quando se

    trata de interferncia imediata, o que se tem, na realidade, ato ilcito,

    robusta violao da propriedade alheia, que como tal deve repelida,

    alocando-se fora da rea da vizinhana.

    Urge verificar que as limitaes oriundas do direito de vizinhana

    afetam, de modo abstrato, a todos os vizinhos, contudo s alcana a

    concretizao em face de alguns. Isto , os direitos de vizinhana so

    potencialmente indeterminados, porm s se manifestam em face daquele

    que se encontre diante da situao compreendida pelo arcabouo normativo.

    Ademais, os direitos de vizinhana so criados por lei, inerentes ao prprio

    direito de propriedade, sem a finalidade de incrementar a utilidade de um

    prdio36, entrementes com o escopo de assegurar a convivncia harmoniosa

    entre vizinhos. Nessa toada, h que se assinalar que os direitos de

    vizinhana podem ser gratuitos ou onerosos, sendo verificada a primeira

    espcie quando no gera indenizao, sendo compensados em idntica

    limitao ao vizinho, j a segunda espcie tem descanso quando a

    supremacia do interesse pblico estabelece uma invaso na rbita dominial

    do vizinho para a sobrevivncia do outro, afixando-se a devida verba

    indenizatria, eis que inexiste a reciprocidade.

    Calha gizar que os direitos de vizinhana onerosos se aproximam

    das servides, no em decorrncia de darem azo a novas espcies de direitos

    reais, mas pela imposio do arcabouo jurdico de deveres cooperativos de

    um vizinho, no que concerne ao atendimento da necessidade de outro

    morador. Desta feita, a propriedade de uma pessoa passa a atender aos

    interesses de outrem, que poder extrair dela as necessidades, como ocorre

    com a passagem de cabos e tubulaes ou ainda com a passagem forada.

    Conquanto a norma jurdica ambicione limitar a amplitude das faculdades

    36 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 511.

  • COMPNDIO DE ENSAIOS JURIDICOS: DIREITO DE VIZINHANA

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    29

    de proprietrios e possuidores vizinhos com o intento de alcanar a

    harmonia social, no pertine ao Direito regular e estabelecer os marcos

    limitantes de todas as atividades exercitadas a partir de um prdio.

    Saliente-se que ao Direito interessa regular as interferncias, to somente

    medida que estas se revelam prejudiciais aos seus vizinhos, ameaando sua

    incolumidade e o seu prprio direito de propriedade.

    3 COMENTRIOS PASSAGEM FORADA NO DIREITO DE

    VIZINHANA: EXPLICITAES E APONTAMENTOS S

    LIMITAES LEGAIS PROPRIEDADE SIMILARES SERVIDO

    Em uma primeira plana, cuida anotar que a passagem forada

    consiste no direito do proprietrio do prdio (rstico ou urbano), que no tem

    acesso via pblica, nascente ou porto, de, por meio do pagamento de cabal

    indenizao, reclamar do vizinho que lhe deixe de passagem, estabelecendo-

    se a esta judicialmente o rumo, quando necessrio em decorrncia de no

    haver acordo, objetivando o modo menos oneroso e mais cmodo para ambas

    as partes. Trata-se de uma das mais rigorosas restries de direito de

    vizinhana, como benefcio reconhecido ao titular de prdio encravado,

    urbano ou rural37. Com supedneo nas disposies contidas no artigo 1.285

    do Cdigo Civil38, vigora como pressuposto de imvel que se encontre

    absoluto encravamento em outro, aquele que no possui qualquer sada para

    via pblica. Em decorrncia da materializao de tal situao, busca o

    legislador privilegiar a funo social da propriedade encravada, o arcabouo

    normativo estabelece que o proprietrio vizinho conceda a passagem

    forada, como uma imposio de solidariedade social conjugada

    necessidade econmica de explorao do imvel encravado, com o escopo de

    no torn-lo improdutivo em razo da inacessibilidade.

    37 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 527. 38 BRASIL. Lei N. 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Institui o Cdigo Civil. Disponvel

    em: . Acesso em: 05 jan. 2015.

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    30

    Como bem anota Venosa39, a passagem forada se revela como

    direito do proprietrio do prdio encravado ao qual o vizinho no pode

    apresentar qualquer oposio. Ao lado disso, cuida evidenciar que a

    passagem deve ser estabelecida no caminho mais curto, no prdio mais

    prximo e de maneira menos onerosa para ambas as partes. Farias e

    Rosenvald40 lecionam que o tema em comento d corpo a verdadeiro direito

    potestativo constitutivo, j que o proprietrio encravado submeter o outro

    proprietrio, de modo unilateral, a aquiescer sua manifestao de vontade

    no que concerne constituio de passagem, sem que a isso possa

    apresentar oposio.

    Meirelles41 esclarece que a passagem forada materializa restrio ao

    direito de propriedade, decorrente das relaes de vizinhana. No se trata

    de servido predial, porquanto os fundamentos e pressupostos so distintos.

    A passagem forada substancializa uma imposio da solidariedade entre

    vizinhos e resulta da considerao de que no pode um prdio perder o seu

    escopo e seu valor econmico em decorrncia da ausncia de acesso a via

    pblica, nascente ou porto, permanecendo confinado entre as propriedades

    que o circundam, limtrofes ou no. Ocorrendo tal situao, a legislao

    vigente estabelece que o prdio rural ou urbano, assim encerrado entre

    outros, obtenha dos vizinhos a sada necessria. Cuida anotar que a

    passagem no fica sua escolha, nem ao alvitre dos vizinhos: deve incidir

    sobre o imvel que mais facilmente se prestar passagem e ser

    estabelecida judicialmente, da forma menos onerosa possvel aos que esto

    na obrigao de conced-la. Ao lado do exposto, insta pontuar que todos os

    danos devero ser indenizados pelo proprietrio do imvel encravado.

    Dentre os requisitos, tradicionalmente, elencados pela doutrina,

    pode-se citar que o imvel pretendidamente encravado se encontre, de fato,

    sem acesso a via pblica, nascente ou porto. Desta feita, em havendo

    39 VENOSA, Slvio de Salvo. Direito Civil: Direitos Reais. 10 ed. So Paulo: Atlas, 2010,

    p. 304. 40 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 527. 41 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito de Construir. 10 ed. So Paulo: Malheiros, 2011, p.

    77-78.

  • COMPNDIO DE ENSAIOS JURIDICOS: DIREITO DE VIZINHANA

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    31

    qualquer outra sada para a via pblica, mesmo que esta seja precria e

    penosa, dever o proprietrio dela utilizar, eis que o enorme sacrifcio ao

    vizinho s ser exigido em circunstncias excepcionais na total

    impossibilidade de aproveitamento da coisa por seu titular. Diniz42, de outro

    modo, lanando mo do enunciado n 88 do Conselho da Justia Federal,

    arrazoa que o direito passagem forada tambm assegurado nas

    situaes em que o acesso via pblica for insuficiente ou inadequado,

    devendo-se, inclusive, considerar as necessidades de explorao econmica.

    Ostentam, oportunamente, Farias e Rosenvald que nos tempos atuais, a

    penetrao do princpio constitucional da funo social da propriedade evoca

    a destinao coletiva da coisa, em benefcio conjunto de seu titular e da

    comunidade43. Neste sentido, o Superior Tribunal de Justia externou a

    valorao macia do corolrio em entendimento jurisprudencial:

    Ementa: Civil. Direitos de Vizinhana. Passagem Forada (CC,

    art. 559). Imvel Encravado. Numa era em que a tcnica da

    engenharia dominou a natureza, a noo de imvel encravado j

    no existe em termos absolutos e deve ser inspirada pela motivao

    do instituto da passagem forada, que deita razes na supremacia

    do interesse pblico; juridicamente, encravado o imvel cujo

    acesso por meios terrestres exige do respectivo proprietrio

    despesas excessivas para que cumpra a funo social sem inutilizar

    o terreno do vizinho, que em qualquer caso ser indenizado pela s

    limitao do domnio. Recurso especial conhecido e provido em

    parte. (Superior Tribunal de Justia Terceira Turma/ REsp 316.336/MS/ Relator: Ministro Ari Pargendler/ Julgado em

    18.08.2005/ Publicado no DJ 19.09.2005).

    Ementa: Civil. Direitos de Vizinhana. Passagem Forada. Imvel

    Encravado. A passagem forada constitui modalidade onerosa do

    direito de vizinhana, cujo pressuposto o encravamento do

    imvel; juridicamente, encravado o imvel cujo acesso exige do

    respectivo proprietrio despesas excessivas. Recurso especial

    conhecido e provido em parte. (Superior Tribunal de Justia Terceira Turma/ REsp n 850.867/PR/ Relator: Ministro Ary

    Pargendler/ Julgado em 26.08.2008).

    Salta aos olhos que no constituem passagens foradas

    atravessadouros particulares, por propriedades tambm particulares, que

    42 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das Coisas. So

    Paulo: Editora Saraiva, 2011, p. 300. 43 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 527.

  • COMPNDIO DE ENSAIOS JURIDICOS: DIREITO DE VIZINHANA

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    32

    no se dirigem a nascentes, pontes ou lugares pblicos, privados de outra

    serventia. Ao lado disso, Maria Helena Diniz estrutura magistrios no

    sentido que passagens particulares por propriedades particulares no so

    servides desde que se destinem, exclusivamente, a atravessar terras

    particulares, sem se dirigirem a lugares pblicos44. As travessas, na

    hiptese entalhada alhures, so concedidas de maneira precria, por mera

    tolerncia, no se alicerando em ttulos legtimos, sendo insuscetveis dos

    efeitos da usucapio. Todavia, se porventura se dirigirem a locais pblicas,

    possvel invocar a usucapio.

    O segundo requisito apresentado consiste na premissa de estar o

    prdio naturalmente encravado, logo, no pode, para efeitos da

    substancializao do instituto em comento, o encravamento ter sido

    provocado por um fato imputvel, culposamente, ao proprietrio encravado.

    No poder o isolamento derivar de fato imputvel conduta voluntria do

    proprietrio (v.g., por meio de exploses que abriram crateras sobre o

    imvel)45. Destarte, impedido est de vindicar a passagem forada pela

    propriedade vizinha aquele que, de maneira voluntria, criou o obstculo

    que lhe assegurava acesso via pblica. Entrementes, estatui o 2 do artigo

    1.285 do Cdigo Civil46 que o proprietrio que se colocou em situao de

    encravamento, por ter alienado parte do imvel que dava sada para via

    pblica, impor restrio em sacrifcio do adquirente daquela parcela. O

    comprador dever assegurar acesso a via pblica ao vendedor, mesmo

    consciente este do resultado da alienao que praticou47. Denota-se que o

    proprietrio do imvel encravado, na situao singular lanada acima, s

    poder voltar-se contra o adquirente do trecho em que perodo anterior

    havia a passagem, para obter o acesso e vis a vis. Com efeito, resta

    substancializado o corolrio da solidariedade social.

    44 DINIZ, 2011, p. 300. 45 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 528. 46 BRASIL. Lei N. 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Institui o Cdigo Civil. Disponvel

    em: . Acesso em: 05 jan. 2015. 47 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 528.

  • COMPNDIO DE ENSAIOS JURIDICOS: DIREITO DE VIZINHANA

    TAU LIMA VERDAN RANGEL

    33

    O terceiro conditio alude ao percebimento de uma indenizao cabal,

    fixada por conveno ou judicialmente, por parte do proprietrio do prdio,

    pois o direito de passagem oneroso e no gratuito. O clculo dessa

    indenizao pode ser feito por pertos com base na desvalorizao da

    propriedade e nos prejuzos que dessa passagem possam advir ao imvel

    onerado48. Cuida anotar, oportunamente, que, uma vez concedida o direito

    passagem forada, ela deve ser exercida, eis que o no uso, por 10 (dez) anos,

    pode desencadear a sua perda. Entrementes, como a via de acesso e

    considerada indispensvel ao prdio encravado, poder ela ser readquirida

    mediante pagamento do quantum indenizatrio. Cuida destacar que a

    indenizao considerada como uma compensao ao dono do prdio por

    onde se estabelece a travessia, pelos prejuzos e incmodos que ter de

    passar. Ao lado do exposto, h doutrinadores que considerem o instituto em

    destaque como uma desapropriao compulsria que, porm, no ocorre em

    razo da necessidade pblica, mas sim para atender a interesse particular.

    Nesta trilha de exposio, insta trazer colao o paradigmtico aresto do

    Superior Tribunal de Justia:

    Ementa: Direito civil. Servides legais e convencionais. Distino.

    Abuso de direito. Configurao. - H de se distinguir as servides

    prediais legais das convencionais. As primeiras correspondem aos

    direitos de vizinhana, tendo como fonte direta a prpria lei,

    incidindo independentemente da vontade das partes. Nascem em

    funo da localizao dos prdios, para possibilitar a explorao

    integral do imvel dominante ou evitar o surgimento de conflitos

    entre os respectivos proprietrios. As servides convencionais, por

    sua vez, no esto previstas em lei, decorrendo do consentimento

    das partes. [...] (Superior Tribunal e Justia Terceira Turma/ REsp 935.474/RJ/ Relator: Ministro Ari Pargendler/ Relator p/

    Acrdo: Ministra Nancy Andrighi/ Julgado em 19.08.2008/

    Publicado no DJe em 16.09.2008).

    O quarto requisito referencia a direito exercido por um titular

    legtimo, isto , o proprietrio, usufruturio, usurio ou enfiteuta. Nesta

    esteira, cuida sublinhar que o direito passagem forada nsito ao titular

    do domnio do prdio encravado e uma obrigao do dono do imvel onerado,

    48 DINIZ, 2011, p. 301.

  • COMPNDIO DE ENSAIOS JURIDICOS: DIREITO DE VIZINHANA

    TAU LIMA VERDAN RANGEL

    34

    que sofre cerceamento ao seu direito de propriedade. Anote-se, por

    imperioso, que no havendo concordncia entre esses proprietrios, o direito

    em testilha dever ser decidido judicialmente, a fim de que o dono do prdio

    contguo aceite a abertura da travessia. Como bem acinzela o artigo 1.285 do

    Cdigo Civil49, cabe ao rgo judicante decidir sobre o direito passagem,

    tendo em vista as necessidades e interesses de ambos os litigantes,

    procurando adotar o modo menos oneroso para aquele que vai conceder a

    passagem50. Considerando que a passagem forada d corpo a verdadeira

    restrio legal e no uma servido, salientar se faz sublinha que, uma vez

    findada as circunstncias ensejadoras da passagem forada, esta restar

    extinta. Em decorrncia do exposto, a propriedade reintegrada ao vizinho

    que teve que tolerar o cerceamento de seu direito de propriedade, em

    decorrncia da promoo dos preceitos de solidariedade e funo social da

    propriedade, passando a servir na plenitude de seu domnio.

    REFERNCIAS:

    BRASIL. Lei N. 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Institui o Cdigo

    Civil. Disponvel em: . Acesso em: 05 jan. 2015.

    __________. Superior Tribunal de Justia. Disponvel em:

    . Acesso em: 05 jan. 2015.

    DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito das

    Coisas. So Paulo: Editora Saraiva, 2011.

    FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 7 ed.

    Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2011.

    IMHOF, Cristiano. Cdigo Civil Interpretado: Anotador Artigo por

    Artigo. 4 ed. Florianpolis: Editora Publicaes Online, 2012.

    LEITE, Gisele. Consideraes sobre o direito de vizinhana. Boletim

    49 BRASIL. Lei N. 10.406, de 10 de Janeiro de 2002. Institui o Cdigo Civil. Disponvel

    em: . Acesso em: 05 jan. 2015: 1.285. O dono do prdio que no tiver acesso a via pblica, nascente ou porto, pode, mediante pagamento de indenizao

    cabal, constranger o vizinho a lhe dar passagem, cujo rumo ser judicialmente fixado, se

    necessrio. 50 DINIZ, 2011, p. 302.

  • COMPNDIO DE ENSAIOS JURIDICOS: DIREITO DE VIZINHANA

    TAU LIMA VERDAN RANGEL

    35

    Jurdico, Uberaba/MG, a. 5, n. 203. Disponvel em:

    Acesso em: 05 jan. 2015.

    MEIRELLES, Hely Lopes. Direito de Construir. 10 ed. So Paulo:

    Malheiros, 2011.

    MINAS GERAIS (ESTADO). Tribunal de Justia do Estado de Minas

    Gerais. Disponvel em: . Acesso em 05 jan. 2015.

    MONTEIRO FILHO, Carlos Edison do Rgo. O Direito de Vizinhana no

    Novo Cdigo Civil. In: EMERJ Debate o Novo Cdigo Civil. ANAIS... 11 out.

    2002, Rio de Janeiro, p.158-167. Disponvel em:

    . Acesso em 05 jan. 2015.

    RIO GRANDE DO SUL (ESTADO). Tribunal de Justia do Estado do

    Rio Grande do Sul. Disponvel em:. Acesso em 05 jan.

    2015.

    RODRIGUES, Slvio. Direito das Coisas. So Paulo: Saraiva, 2003.

    VENOSA, Slvio de Salvo. Direito Civil: Direitos Reais. 10 ed. So Paulo:

    Editora Atlas, 2010.

    WAQUIN, Bruna Barbieri. Consideraes sobre Direito de Vizinhana.

    Disponvel em: . Acesso em 05 jan. 2015.

  • 36

    COMENTRIOS AO DIREITO DE ALTEAMENTO

    EM SEDE DE DIREITO DE VIZINHANA: BREVES

    PONDERAES

    Resumo: Inicialmente, insta evidenciar que o direito de vizinhana

    compreende uma gama de limitaes, estabelecidos expressamente pelos

    diplomas legais em vigor, que cerceiam, via de consequncia, o alcance das

    faculdades de usar e gozar por parte de proprietrios e possuidores de

    prdios vizinhos, afixando um encargo a ser tolerado, a fim de resguardar

    a possibilidade de convivncia social e para que haja o mtuo respeito

    propriedade. Nesta esteira, calha evidenciar que se no subsistisse tais

    pontos demarcatrios, cada proprietrio poderia lanar mo de seu direito

    absoluto, na coliso de direitos todos restariam tolhidos de exercerem suas

    faculdades, eis que as propriedades aniquilar-se-iam. H que se negritar,

    ainda, que o direito de vizinhana tem como escopo robusto a satisfao de

    interesses de proprietrios opostos, o que se efetiva por meio das limitaes

    ao uso e gozo dos proprietrios e possuidores. Nessa trilha de exposio,

    saliente-se que h restries decorrentes da necessidade de conciliar o uso

    e gozo por parte de proprietrios confinantes, vez que a vizinhana, por si,

    uma fonte permanente de conflito. luz das explicitaes

    supramencionadas, objetiva o presente em analisar o direito de alteamento

    em sede de direito de vizinhana e suas implicaes diante do ordenamento

    jurdico.

    Palavras-chaves: Direito de Vizinhana. Direito de Alteamento. Altura

    do Imvel.

    Sumrio: 1 Direito de Vizinhana: Anotaes Introdutrias; 2 Natureza

    Jurdica do Direito de Vizinhana; 3 Comentrios ao Direito de Alteamento

    em sede de Direito de Vizinhana: Breves Ponderaes

  • 37

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    1 DIREITO DE VIZINHANA: ANOTAES INTRODUTRIAS

    Inicialmente, insta evidenciar que o direito de vizinhana

    compreende uma gama de limitaes, estabelecidos expressamente pelos

    diplomas legais em vigor, que cerceiam, via de consequncia, o alcance das

    faculdades de usar e gozar por parte de proprietrios e possuidores de

    prdios vizinhos, afixando um encargo a ser tolerado, a fim de resguardar a

    possibilidade de convivncia social e para que haja o mtuo respeito

    propriedade. Cada proprietrio compensa seu sacrifcio com a vantagem que

    lhe advm do correspondente sacrifcio do vizinho51. Nesta esteira, calha

    evidenciar, oportunamente, que se no subsistisse tais pontos

    demarcatrios, cada proprietrio poderia lanar mo de seu direito absoluto,

    na coliso de direitos todos restariam tolhidos de exercerem suas faculdades,

    eis que as propriedades aniquilar-se-iam. H que se negritar, ainda, que o

    direito de vizinhana tem como escopo robusto a satisfao de interesses de

    proprietrios opostos, o que se efetiva por meio das limitaes ao uso e gozo

    dos proprietrios e possuidores.

    Saliente-se que h restries decorrentes da necessidade de conciliar

    o uso e gozo por parte de proprietrios confinantes, vez que a vizinhana,

    por si, uma fonte permanente de conflito. Como bem aponta Monteiro

    Filho, ao lecionar acerca da essncia do tema em comento, trata-se de

    normas que tendem a compor, a satisfazer os conflitos entre propriedade

    opostas, com o objetivo de tentar definir regras bsicas de situao de

    vizinhana52. Imprescindvel se faz anotar que o conflito de vizinhana tem

    sua origem, intimamente, atrelada a um ato do proprietrio ou possuidor de

    um prdio que passa a produzir repercusses no prdio vizinho, culminando

    na constituio de prejuzos ao prprio imvel ou ainda transtornos a seu

    morador. Alm do pontuado, prima gizar que o direito de vizinhana

    51 FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 7 ed. Rio de Janeiro:

    Editora Lumen Juris, 2011, p. 508. 52 MONTEIRO FILHO, Carlos Edison do Rgo. O Direito de Vizinhana no Novo Cdigo

    Civil. In: EMERJ Debate o Novo Cdigo Civil. ANAIS... 11 out. 2002, Rio de Janeiro, p.158-

    167. Disponvel em: . Acesso em 06 jan. 2015, p. 158.

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    contempla uma pluralidade de direitos e deveres estabelecidos em relao

    aos vizinhos, em razo de sua especfica condio.

    Mister faz-se colacionar, oportunamente, que o objeto da tutela

    imediata do legislador com os direitos de vizinhana so os interesses

    privados dos vizinhos53. Doutra banda o escopo mediato da norma assenta

    na essencial manuteno do princpio da funo social da propriedade, eis

    que a preservao de relaes harmoniosas entre vizinhos se apresenta como

    carecido instrumento a assegurar que cada propriedade alcance o mais

    amplo uso e fruio, obtendo, desta forma, os objetivos econmicos ao tempo

    em que salvaguarda os interesses individuais. O direito de vizinhana o

    ramo do direito civil que se ocupa dos conflitos de interesses causados pelas

    recprocas interferncias entre propriedades imveis prximas54.

    Em evidncia se faz necessrio colocar que a locuo prdio vizinho

    no deve ser interpretada de maneira restritiva, alcanando to somente os

    prdios confinantes, mas sim de modo expansivo, j que compreende todos

    os prdios que puderem sofrer repercusso de atos oriundos de prdios

    prximos. H que se citar, por carecido, o robusto magistrio de Leite, no

    qual a definio de imveis confinantes no se encontra adstrito a to

    somente aos lindeiros, mas tambm os que se localizam nas proximidades

    desde que o ato praticado por algum em determinado prdio v repercutir

    diretamente sobre o outro, causando incmodo ou prejuzo ao seu

    ocupante55. Neste diapaso, infere-se a possibilidade de sofrer

    interferncias provenientes de atos perpetrados em outros prdios

    apresenta-se como suficiente a traar os pontos delimitadores do territrio

    do conflito da vizinhana.

    Denota-se, desta sorte, que a acepo de vizinhana se revela dotada

    de amplitude e se estende at onde o ato praticado em um prdio possa

    produzir consequncias em outro, como, por exemplo, o caso do barulho

    53 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 508.

    54 MONTEIRO FILHO, 2002, p. 158. 55 LEITE, Gisele. Consideraes sobre o direito de vizinhana. Boletim Jurdico,

    Uberaba/MG, a. 5, n. 203. Disponvel em: Acesso em:

    06 jan. 2015.

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    provocado por bar, boate ou ainda qualquer atividade desse gnero, o perigo

    de uma exploso, fumaa advinda da queima de detritos, badalar de um

    sino, gases expelidos por postos de gasolina, dentre tantas outras hipteses,

    em que se apresenta uma interferncia de prdio a prdio, no importando a

    distncia, acabam por ensejar conflito de vizinhana. Neste alamir, com o

    escopo de fortalecer as ponderaes j acinzeladas, quadra trazer colao o

    seguinte entendimento jurisprudencial:

    Ementa: Direito de Vizinhana. Obrigao de Fazer. Chamin.

    Fumaa. Uso Anormal de Propriedade. Chamin do imvel vizinho

    em altura inferior ao telhado da casa lindeira. Terreno em declive.

    Fumaa exalada em direo residncia da autora que inviabiliza

    a abertura de janela. Uso anormal da propriedade. Art. 1.277,

    CCB. Prova documental e testemunhal que comprova os fatos

    alegados. Princpio da imediao da prova aplicado no caso

    concreto. Sentena de procedncia mantida. Negaram provimento.

    (Tribunal de Justia do Estado do Rio Grande do Sul Dcima Nona Cmara Cvel/ Apelao Cvel N. 70035708205/ Relator:

    Desembargador Carlos Rafael dos Santos Jnior/ Julgado em

    25.05.2010).

    Ao lado disso, destacar se faz carecido que o vocbulo prdio no

    apresenta qualquer distino entre o imvel localizado em rea urbana ou

    rural. De igual modo, o termo supramencionado no apresenta qualquer

    questionamento acerca da finalidade, alcanando tanto o residencial,

    comercial e industrial. Evoca apenas uma edificao de uma casa ou

    apartamentos em condomnio, independente da finalidade. Mesmo o terreno

    no-edificado considervel imvel lato sensu56. Destarte, para que reste

    amoldado ao termo prdio, basta que o imvel apresente interferncia que

    tenha o condo de repercutir, de maneira prejudicial, em prdio vizinho.

    2 NATUREZA JURDICA DO DIREITO DE VIZINHANA

    In primo oculi, reconhecer se faz imprescindvel que houve rotunda

    discusso acerca da natureza jurdica do direito de vizinhana, havendo

    defensores da natureza obrigacional dos direitos de vizinhana, enquanto

    56 FARIAS; ROSENVALD, 2011, p. 509.

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    outros sustentavam o carter real dos aludidos direitos. Entrementes, as

    discusses supramencionadas no prosperaram por longo perodo, sendo, ao

    final, pela doutrina majoritria, adotada acepo do direito de vizinhana

    enquanto detentor de essncia de obrigao propter rem, pois se vinculam ao

    prdio, assumindo-os quem quer que se encontre em sua posse. Nesta

    toada, h que se citar o entendimento estruturado por Waquin, no qual:

    [...] a natureza jurdica destes direitos [direitos de vizinhana], na

    opinio majoritria da doutrina, que tratam-se (sic) de obrigaes

    propter rem, da prpria coisa, advindo os direitos e obrigaes do simples fato de serem os indivduos vizinhos57.

    Ao lado disso, a caracterstica mais proeminente, no que concerne ao

    direito de vizinha, tange ao fato dos sujeitos serem indeterminados, j que o

    dever no incide imediatamente sobre especfica pessoa, mas a qualquer um

    que se vincule a uma situao jurdica de titularidade de direito real ou

    parcelas dominiais, como se infere no caso do usufruturio, ou mesmo a

    quem exera o poder ftico sobre a coisa, como se verifica na hiptese do

    possuidor. A restrio, luz do pontuado alhures, acompanha a propriedade,

    mesmo que ocorra a alterao da titularidade, sendo suficiente que o imvel

    continue violando o dever jurdico contido no arcabouo normativo.

    Alm disso, cuida anotar, por necessrio, que o sucessor ter os

    mesmos direitos e obrigaes do sucedido perante os vizinhos. Leciona Silvio

    Rodrigues que o devedor, por ser titular de um direito sobre uma coisa, fica

    sujeito a uma determinada prestao que, por conseguinte, no derivou da

    manifestao expressa ou tcita de sua vontade58. Nesta situao, o que

    torna o proprietrio ou possuidor do imvel devedor a circunstncia de ser

    titular do direito real. So excludas, desta feita, dos conflitos de vizinhana,

    as situaes nas quais se verifica a chamada interferncia direta ou

    imediata. H que se elucidar, ao lado do pontuado, que a aludida

    modalidade de interferncia tem assento quando seus efeitos j tem incio no

    57 WAQUIN, Bruna Barbieri. Consideraes sobre Direito de Vizinhana. Disponvel

    em: . Acesso em 06 jan. 2015. 58 RODRIGUES, Slvio. Direito das Coisas. So Paulo: Saraiva, 2003, p. 99.

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    prdio vizinho, como ocorre quando h canalizao para que a fumaa seja

    lanada diretamente no prdio vizinho. Doutro modo, cuida explicitar que a

    interferncia mediata quando tem incio no prdio de quem a causa e,

    posteriormente, transmitida ao prdio alheio. Por oportuno, quando se

    trata de interferncia imediata, o que se tem, na realidade, ato ilcito,

    robusta violao da propriedade alheia, que como tal deve repelida,

    alocando-se fora da rea da vizinhana.

    Urge verificar que as limitaes oriundas do direito de vizinhana

    afetam, de modo abstrato, a todos os vizinhos, contudo s alcana a

    concretizao em face de alguns. Isto , os direitos de vizinhana so

    potencialmente indeterminados, porm s se manifestam em face daquele

    que se encontre diante da situao compreendida pelo arcabouo normativo.

    Ademais, os direitos de vizinhana so criados por lei, inerentes ao prprio

    direito de propriedade, sem a finalidade de incrementar a utilidade de um

    prdio59, entrementes com o escopo de assegurar a convivncia harmoniosa

    entre vizinhos. Nessa toada, h que se assinalar que os direitos de

    vizinhana podem ser gratuitos ou onerosos, sendo verificada a primeira

    espcie quando no gera indenizao, sendo compensados em idntica

    limitao ao vizinho, j a segunda espcie tem descanso quando a

    supremacia do interesse pblico estabelece uma invaso na rbita dominial

    do vizinho para a sobrevivncia do outro, afixando-se a devida verba

    indenizatria, eis que inexiste a reciprocidade.

    Calha gizar que os direitos de vizinhana onerosos se aproximam

    das servides, no em decorrncia de darem azo a novas espcies de direitos

    reais, mas pela imposio do arcabouo jurdico de deveres cooperativos de

    um vizinho, no que concerne ao atendimento da necessidade de outro

    morador. Desta feita, a propriedade de uma pessoa passa a atender aos

    interesses de outrem, que poder extrair dela as necessidades, como ocorre

    com a passagem de cabos


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