XXIV CONGRESSO NACIONAL DO CONPEDI - UFMG/FUMEC/DOM
HELDER CÂMARA
DIREITO CIVIL CONSTITUCIONAL
MARCELO BENACCHIO
NARCISO LEANDRO XAVIER BAEZ
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D598 Direito civil constitucional [Recurso eletrônico on-line] organização CONPEDI/ UFMG/FUMEC/Dom Helder Câmara; coordenadores: Marcelo Benacchio, Narciso Leandro Xavier Baez – Florianópolis: CONPEDI, 2015. Inclui bibliografia ISBN: 978-85-5505-089-3 Modo de acesso: www.conpedi.org.br em publicações Tema: DIREITO E POLÍTICA: da vulnerabilidade à sustentabilidade
1. Direito – Estudo e ensino (Pós-graduação) – Brasil – Encontros. 2. Direito civil. 3. Direito Constitucional . I. Congresso Nacional do CONPEDI - UFMG/FUMEC/Dom Helder Câmara (25. : 2015 : Belo Horizonte, MG).
CDU: 34
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XXIV CONGRESSO NACIONAL DO CONPEDI - UFMG/FUMEC/DOM HELDER CÂMARA
DIREITO CIVIL CONSTITUCIONAL
Apresentação
O Direito Civil apresenta uma interessante perspectiva de um futuro ligado ao passado,
contudo renovado pela compreensão seus institutos basilares por um paradigma iluminado
pelos valores e princípios presentes na Constituição Federal.
Não é possível abandonar os aspectos culturais desenvolvidos ao longo do tempo e hauridos
pelo direito civil pátrio a partir de suas raízes portuguesas, sabidamente fundadas em fontes
do direito romano. Não obstante, ao lado dessa tradicional metodologia, como também
ocorreu em sistemas europeus, imperioso a consideração do projeto de sociedade contido na
Constituição da República.
Os tradicionais institutos jurídicos das obrigações, dos contratos, dos direitos reais, da família
e das sucessões sofreram o influxo direto das normas constitucionais formando o fenômeno
do chamado direito civil constitucional, enquanto nova metodologia para aplicação de
institutos tão antigos e centrais na vida social.
Nos elementos patrimoniais e não patrimoniais do regime jurídico de direito civil é
imprescindível a consideração dos princípios constitucionais para a funcionalização do
direito privado no atendimento da dignidade humana dos participantes da relação jurídica e,
também, pela utilização da função social, a consideração de seus efeitos a toda sociedade.
A autonomia privada iluminada pela raiz constitucional da autodeterminação das pessoas
redunda em novas perspectivas estruturais e funcionais do contrato. A família, enquanto local
de realização da dignidade humana, igualmente sofre a recognição dos poderes e finalidades
que lhe são basilares.
A propriedade, na compreensão de seu acesso, as necessidade de moradia e compatibilização
dos interesses de proprietários e não proprietários repercute em novas possibilidades desse
instituto tão debatido ao tempo da Revolução Francesa.
Todas essas questões foram objeto dos percucientes debates, fundados nos estudos ora
publicados, havidos no GT de Direito Civil Constitucional no XXIV Congresso do
CONPEDI sob o tema Direito e Política: da Vulnerabilidade à Sustentabilidade realizado de
11 a 14 e novembro de 2015, na cidade de Belo Horizonte, Minas Gerais.
O ponto comum entre os estudos é a metodologia de direito civil constitucional permitindo
novas miradas para os institutos de direito civil na perspectiva da dignidade da pessoa
humana e dos direitos fundamentais acerca dos direitos da personalidade, autonomia privada,
direitos da mulher, contrato, responsabilidade civil, nome, posse, propriedade, privacidade e
entidades familiares, entre outros.
A obra publicada foi produzida por diversos professores e alunos de várias instituições
nacionais representando profunda pesquisa e a vanguarda no instituto jurídico objeto da
temática de cada capítulo.
Com os agradecimentos e cumprimentos ao coautores, sejam todos muito bem vindos ao
presente livro, a cuja leitura convidamos.
Prof. Dr. Narciso Leandro Xavier Baez - Unoesc
Prof. Dr. Marcelo de Oliveria Milagres - Miton Campos
Porf. Dr. Marcelo Benacchio - Uninove
CLÁUSULA GERAL DE PROTEÇÃO SOB A PERSPECTIVA CIVIL-CONSTITUCIONAL: A NORMATIVIDADE DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E SUA RELAÇÃO COM OS DIREITOS FUNDAMENTAIS E OS
DIREITOS DE PERSONALIDADE
CLAUSE GENERAL PROTECTION UNDER CIVIL-CONSTITUTIONAL PERSPECTIVE: THE NORMATIVITY OF HUMAN DIGNITY AND ITS
RELATIONSHIP WITH THE FUNDAMENTAL RIGHTS AND PERSONALITY RIGHTS
Dirceu Pereira SiqueiraAndré Vinícius Rosolen
Resumo
O presente trabalho tem por finalidade, através de análises bibliográficas e estudos de
decisões judiciais, fazer uma abordagem teórica e prática sobre a normatividade do princípio
da dignidade da pessoa humana como fundamento de interligação das categorias dos direitos
fundamentais e dos direitos de personalidade. O princípio da dignidade da pessoa humana é
um princípio diretriz de interpretação e aplicação dos direitos subjetivos que viabiliza a
concretização da tutela civil-constitucional de proteção ao ser humano nas relações públicas
(eficácia vertical) e privadas (eficácia horizontal). A ordem jurídica brasileira consagrou a
cláusula geral de proteção da pessoa por meio da incorporação e positivação da dignidade da
pessoa humana como princípio e fundamento da República Federativa do Brasil, dos direitos
e garantias fundamentais e dos direitos da personalidade, com o objetivo de conferir eficácia
- negativa e positiva - aos direitos do ser humano (respeito, proteção e promoção), em face
das ofensas e violações perpetradas pelo poder público e pelos particulares e de assegurar a
responsabilidade dos ofensores pelos danos causados à vítima. Deste modo, o princípio da
dignidade da pessoa humana se consubstancia no princípio jurídico constitucional que
concretiza a cláusula geral de proteção da pessoa e fundamenta a interligação jurídica dos
direitos fundamentais e dos direitos da personalidade para assegurar a tutela civil-
constitucional, por meio de uma relação tríade que forma o núcleo intangível e indissolúvel à
unidade normativa.
Palavras-chave: Cláusula geral de proteção da pessoa, Dignidade da pessoa humana, Direitos fundamentais, Direitos de personalidade
Abstract/Resumen/Résumé
This study aims to, through the examination of judicial decisions and bibliographical
analysis, take a theoretical and practical approach on the normativity of the principle of
human dignity, considering it as the basis for interconnection between the categories of
fundamental rights and personality rights. The principle of human dignity guiding principle
for the interpretation and application of legal standards as civil-constitutional safeguards to
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protect the rights of people in public (vertical effectiveness) and private relations (horizontal
effectiveness). The Brazilian law established the general principle of the protection of the
person through the embodiment and positivation of the dignity of the human person as a
principle and foundation ofthe Federative Republic of Brazil,the personality rights and the
fundamental guarantees and rights, in order to grant positive and negative effectiveness to
the rights of man (respect, protection and promotion), considering the violations and offenses
perpetrated by public authorities and private individuals and to ensure the accountability of
offenders for the damages they caused. Thus, the principle of human dignity is embodied in
the constitutional legal principle which fulfills the general clause of protection of the person
and establishes the interconnection of legal the fundamental rights and the personality rights
to ensure the civil-constitutional protection through a triad relationship that unites the
intangible and indissoluble core with the normative unit.
Keywords/Palabras-claves/Mots-clés: General clause of protection of the person, Principle of human dignity, Fundamental rights, Personality rights
6
Introdução
O princípio da dignidade da pessoa humana se constitui em uma cláusula geral de
proteção da pessoa que fundamenta a interligação dos direitos fundamentais e dos direitos da
personalidade na ordem jurídica brasileira, tendo por objetivo assegurar o respeito, proteção e
promoção dos direitos do indivíduo em todas suas concepções, como integridade física, moral
e intelectual, bem como ao desenvolvimento de sua personalidade.
A importância do trabalho se justifica em razão dos reflexos pelo uso da
normatividade da dignidade humana para interligar as diferentes categorias jurídicas - direitos
fundamentais e direitos da personalidade – na construção de uma cláusula geral da pessoa na
perspectiva da constitucionalização do direito civil. Nesse sentido, o princípio da dignidade da
pessoa humana se projeta como gênero (fim), enquanto que os direitos fundamentais e os
direitos da personalidade são espécies normativas (meios) que permitem a efetivação da tutela
civil-constitucional e a concretização da cláusula geral da pessoa.
A cláusula geral de proteção do indivíduo surge com a incorporação da dignidade da
pessoa humana e com o fenômeno da constitucionalização do direito civil, que
(re)personalizou o Direito para centralizar a pessoa como o fim do Estado e da sociedade,
superando a tradicional dicotomia entre os regimes de direito público-privado. Por tais razões,
através da constitucionalização houve a repersonalização do Direito e o princípio da
dignidade da pessoa humana passou a fundamentar a criação normativa dos direitos
fundamentais e dos direitos de personalidade.
Não obstante, a cláusula geral de proteção tem a finalidade de assegurar o respeito e
a proteção das qualidades intrínsecas das pessoas em todas as suas dimensões físicas, morais e
intelectuais, bem como visa censurar as violações perpetradas pelos particulares e pelo poder
público. O surgimento da cláusula geral de proteção ocorreu depois dos acontecimentos das
guerras mundiais e se sedimentou em razão da globalização e dos avanços tecnológicos como
forma de proteção à pessoa.
Os direitos fundamentais são direitos subjetivos do ser humano incorporados pela
Constituição, que objetivam resguardar a proteção dos direitos e garantias individuais das
violações praticadas pelo poder público. Já os direitos de personalidade são direitos subjetivos
que visa à proteção dos atributos intrínsecos da pessoa em seus aspectos físicos, morais e
intelectuais, em face das ofensas praticadas pelos particulares nas relações privadas.
7
A diferença dos regimes jurídicos foram remodelados pelo princípio da dignidade da
pessoa humana, através do fenômeno da constitucionalização do direito civil, que realizou a
unificação e a integração das categorias dos direitos fundamentais e dos direitos de
personalidade para conferir maior eficácia na proteção dos direitos da pessoa e concretizar o
novo sentido da tutela civil-constitucional, no plano infraconstitucional e no plano
constitucional.
O princípio da dignidade da pessoa humana está conexo com os direitos
fundamentais e os direitos de personalidade em uma relação tríade, que viabiliza a construção
e a formação da cláusula geral de proteção da pessoa e assegura a reparação pelos danos
causados à vítima em razão dos atos ofensivos e violações praticadas pelo Estado e pelos
particulares nas relações público-privadas.
Portanto, a dignidade da pessoa humana representa o fundamento da conjugação das
categorias dos direitos fundamentais e de personalidade para proteger os valores intrínsecos
da pessoa e os direitos subjetivos do indivíduo, por meio da unidade normativa da cláusula
geral de proteção.
1. Dignidade da pessoa humana como cláusula geral de proteção
A dignidade da pessoa humana é um princípio jurídico previsto na Constituição
Federal, utilizado para salvaguardar o mínimo de respeito (tratamento), proteção (defesa) e
promoção de direitos das pessoas (concretizações) em razão da própria condição humana da
pessoa, com extensão nas relações públicas e nas relações particulares. Por seu turno, a
dignidade da pessoa humana se caracteriza pela cláusula geral de proteção da pessoa que
fundamenta a existência dos direitos fundamentais e dos direitos de personalidade.
O termo dignidade deriva do latim “dignitas”, que designa virtude, honra ou
consideração da qualidade moral que possuía determinada pessoa, bem como a função para
justificar o próprio respeito do indivíduo. Do mesmo modo, poderá ser compreendida como a
distinção ou honraria conferida à pessoa (SILVA, 2014, p. 467).
No pensamento da antiguidade clássica, a dimensão política da dignidade se refere à
posição social ocupada pelo indivíduo na sociedade. A dimensão filosófica da dignidade
designava a qualidade inerente do ser humano dotado de liberdade e igualdade que os
diferenciavam dos demais seres (SARLET, 2015a, p. 33). O sentido atribuído à dignidade
estava associado com um dever de respeito, honra e deferência a determinados indivíduos e
instituições merecedores de tratamento distintos, isto é, estava relacionado ao status pessoal
8
de alguns indivíduos pelas posições políticas ou sociais que ocupavam, fazendo referência à
proeminência de determinadas instituições ou supremacia dos poderes (BARROSO, 2014, p.
13).
No periodo medieval, a noção de digndade sofreu modificações por influências do
Cristianismo. Os seres humanos possuem dignidade porque são obras da divindade e possuem
uma relação de aproximação com o divino, sendo que o homem foi feito à imagem e
semelhança de Deus -“Imago Dei” -, revigorando os valores da fraternidade e de
solidariedade de cada pessoa em amar o seu próximo na mesma proporção.
A Modernidade foi marcada pelo Renascimento (antropocentirsmo) que provocou
modificações de pensamentos e estruturas sociais – o homem passou a ser o centro do
universo - sendo que a dignidade da pessoa passou a representar o sentido de liberdade e o
livro arbítrio do invidíduo (SARLET, 2015a, p.35-36).
No entanto, foi no pensamento de Imannuel Kant que a dignidade da pessoa humana
desvinculou das demais acepções clássicas, passando a ser fundamentada na autonomia da
vontade da pessoa, em que o homem é o fim em si mesmo, não um meio.1 Neste sentido, Kant
define a dignidade como um status moral que confere ao indivíduo a aptidão de possuir
direitos e deveres, com oponibilidade “erga omnes”, de respeitar às pessoas da coletividade e
de abster-se de realizar agressões à autonomia do sujeito (COSTA NETO, 2014, p. 25).
No século XVIII, remanesce a consagração da dignidade da pessoa como
pressuposto de que o homem, na condição de sua própria natureza e independente de qualquer
circunstância, é titular de direitos que deve ser reconhecido e respeitado por outros seres
semelhantes e pelo Estado (SARLET, 2015a, p. 47). A ideia de dignidade se constitui a partir
da natureza humana racional e da liberdade da pessoa de fazer escolhas morais e de
determinar o seu próprio destino, o que justificou sua consagração em documentos
internacionais e nas Constituições do Estado.
A dignidade da pesoa humana teve juridicidade por meio dos intereses do sistema
sociopolíticos como forma de reação a práticas do nazismo e facismo na Segunda Guerra
Mundial, bem como contra todas as formas de degradação do ser humano (ROCHA, 1999, p.
25). Diante dos acontecimentos, a dignidade da pessoa humana foi incorporada no discurso
político como forma de promover a paz mundial, a democracia e a proteção aos direitos
humanos, sendo, posteriormente, consagrada em diversos tratados internacionais de Direitos
Humanos e nas Constituições do Estado, tendo em vista o holocausto provocado pelos
nazistas na Segunda Guerra Mundial, que fez reaproximar o direito da moral e da filosofia
9
política com a tarefa de modificar o sistema de interpretação das normas jurídicas conforme a
ética e a dignidade da pessoa humana (BARROSO, 2014, p.18-19).
No século XX, marcado pelas barbáries e crueldades das grandes guerras mundiais, a
dignidade humana foi incorporada como norma jurídica para resguardar o mínimo de proteção
e respeito aos seres humanos. Neste sentido, o preâmbulo da Carta das Nações Unidas de
1945 prevê a reafirmação dos direitos fundamentais do homem, da dignidade e no valor do ser
humano, como forma de preservação das futuras gerações marcada pelo flagelo da guerra, que
por sua vez trouxe sofrimentos indivíveis à toda sociedade mundial.
Deste modo, a dignidade humana se tornou o valor fundante do sistema dos direitos
fundamentais e se converteu no patrimônio jurídico-moral da pessoa humana estampada nos
direitos subjetivos incorporados e assegurados pelo sistema constitucional (ROCHA, 1999, p.
32). Segundo Luis Roberto Barroso, a compreensão contemporânea sobre dignidade da pessoa
humana se assenta no pressuposto de que cada ser humano possui um valor instrínseco e
desfruta uma posição especial no universo (BARROSO, 2014, p. 14).
A dignidade humana é um princípio fundamental que forma o núcleo de
harmonização das normas jurídicas, com a função de dirigir os meios de interpretação à
concordância normativa para aplicar o valor de um princípio ou de preservar o conteúdo
axiológico da norma jurídica. O princípio da dignidade possui conceito aberto que serve como
instrumento de estabilidade constitucional, adaptando o seu conteúdo à evolução da
sociedade, sem, contudo, alterar o texto da lei.2
Ingo Wolfgang Sarlet define a dignidade da pessoa humana de forma aberta e
inclusiva sobre a própria condição humana nas relações intersubjetivas:
“Assim sendo, termos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e
distintiva reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito
e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um
complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra
todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as
condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e
promover sua participação ativa e coresponsável nos destinos da própria existência e
da vida em comunhão com os demais seres humanos, mediante o devido respeito aos
demais seres que integram a rede da vida.” (SARLET, 2015a, p. 70-71).
Do mesmo modo, Jesús González Pérez entende que a dignidade da pessoa humana
está associada com a noção de valor superior e princípio fundamental consagrado na
Constituição que obriga os poderes públicos e os particulares. Por seu turno, define a
dignidade humana como a categoria que corresponde ao homem, como ser humano dotado de
inteligência e de liberdade, distinto e superior a toda a criação, que implica no tratamento
10
condizente com a natureza humana. Outrossim, a violação da dignidade humana ocorrerá
sempre que desrespeitar essa essencial superioridade do homem ou de ser considerado como
qualquer outra parte da natureza, sendo indigno tudo o que se presume de degradação do
posto central que corresponde à criação (PÉREZ, 2011, p. 165).
Os sistemas que adotam a dignidadade humana como fundamento axiológico do
ordenamento jurídico prima por realçar a diferença do ser humano dos demais seres (COSTA
NETO, 2014, p. 35). A dignidade humana é uma norma jurídica com qualificação de
conteúdo ético e moral - valores instrínecos do ser humano - que infunde respeito e proteção à
pessoa, em virtude de desfrutar de uma posição especial e distinta no universo (SARLET,
2015a, p. 82-83).
A dignidade da pessoa humana possui duas dimensões, normativa (princípio jurídico)
e outra axiológica (valores do ser humano), que se relacionam e se complementam
mutuamente. Nesse contexto, a dignidade apresenta uma dimensão interna que expressa o
valor intrínseco ou próprio de cada indivíduio que é inviolável, e outra dimensão externa, que
representa os direitos, aspirações e responsabilidades de proteger a pessoa das ofensas e
violações (BARROSO, 2014, p. 62).
Nessa linha de pensamento, a dignidade da pessoa humana é um princípio jurídico
constitucional - norma jurídica - que enuncia direitos e reconhece os meios de
responsabilidade de respeito e proteção aos valores intrínsecos do ser humano, ou seja, o
sentido normativo implica no tratamento condizente da pessoa em razão da própria condição
de ser humano e de assegurar uma mínima respeitabilidade do indivíduo.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos consagrou a dignidade da pessoa
humana para enunciar os direitos humanos fundamentais de forma inalienável e em igualdade
de condições, bem como para reconhecer os valores intrínsecos e inerentes à pessoa humana,
com fundamento da liberdade, justiça e paz social.
O art. 1º, inciso III, da Constituição de 1988 prevê a dignidade humana como
fundamento da República Federativa do Brasil e do Estado Democrático de Direito. Com
efeito, a dignidade é uma norma constitucional que reconhece os direitos das pessoas e a
inviolabilidade dos valores humanos, conferindo unidade de interpreção, sentido à aplicação
das normas jurídicas e legitimidade para a ordem constitucional.
O texto constitucional assegura o respeito e a proteção dos direitos das pessoas
elencados em seu texto com fundamento no princípio da dignidade humana (direitos e
garantias individuais dos cidadãos), a fim de possibilitar o desenvolvimento da personalidade
do indivíduo sem qualquer forma de discriminação e sem interferência dos poderes
11
constiuídos e dos particulares, concretizando os objetivos fundamentais para construção de
uma sociedade livre, justa e solidária.
A dignidade humana se assenta no fundamento de todo o sistema jurídico positivo,
transformando no núcleo essencial e indivisívelde fundamentação dos direitos das pessoas
consagrados pela norma constitucional e infraconstitucional. O Estado e os particulares
possuem o dever jurídico - responsabilidade - de respeitar e proteger a dignidade humana de
qualquer indivíduo contra os abusos e violações.
Neste passo, a dignidade humana constitui não só na dimensão garantia negativa de
respeito e proteção de que a pessoa não será objeto de ofensas e humilhações, mas também
implica na dimensão positiva de assegurar o desenvolvimento da personalidade de cada
indivíduo, mediante o reconhecimento da autodisposição de cada pessoa para dispor sem
interferências ou impedimentos e de autodeterminação para projetar-se conforme a razão
humana (LUÑO, 2010, p. 324).
A partir da dignidade se irradia os valores éticos e morais das pessoas para toda
ordem jurídica, uma vez que é pressuposto para existência de direitos, isto é, a dignidade da
pessoa humana reconhece os direitos subjetivos do indivíduo como necessários e
indispensáveis para o desenvolvimento integral da personalidade.
Por seu turno, a eficácia do princípio da dignidade humana se subdivide em eficácia
positiva e negativa. A eficácia positiva (prestacional) significa que o princípio da dignidade
humana vincula a atuação do poder público e do terceiro, mediante a imposição de
comportamento positivo (obrigações de fazer e de dar) para promover os direitos das pessoas
e de assegurar mínimas condições para o seu exercício. Na eficácia negativa (limitação) o
princípio da dignidade estabelece abstenções ou limites para atividades dos poderes públicos e
dos particulares, com a finalidade de assegurar o respeito e a proteção dos direitos das
pessoas.
No entanto, vale ressaltar que a preocupação dos juristas reside na aplicação do
princípio da dignidade da pessoa humana no plano real ou concreto, não ficando apenas no
ponto de vista formal e abstrato. O Estado e os próprios indivíduos, nas suas projeções
sociais, devem efetivar o mandamento constitucional da dignidade humana para produzir os
efeitos concretos projetados pela norma.
De outro modo, a dignidade da pessoa humana exerce uma função de integração e
interpretativa/hermenêutica3 que possibilita o diálogo e a interligação com as categorias dos
direitos da personalidade e dos direitos fundamentais. O conteúdo da dignidade humana é o
mecanismo jurídico utilizado para conferir uma relação dialógica com os direitos
12
fundamentais e os direitos da personalidade, para abranger a proteção da pessoa nas suas
respectivas relações públicas e privadas.
Ingo Wolfgang Sarlet reconhece a indissociável vinculação entre dignidade da
pessoa humana com os direitos humanos e fundamentais como postulado que se assenta o
Direito Constitucional contemporâneo (SARLET, 2015a, p. 28). Do mesmo modo, Luís
Roberto Barroso assevera que a dignidade da pessoa humana e os direitos humanos e
fundamentais estão intimamente relacionados, uma vez que expressa os valores morais que
singularizam as pessoas merecedoras de igual respeito e consideração, bem como porque
contempla os direitos fundamentais como positivação da moral por meio de normas jurídicas
(BARROSO, 2014, p. 75).
A pessoa possui valores que lhes são intrísecos pela condição humana, capazes de
promover seu devenvolvimento na sociedade. A dignidade integra os valores do ser humano,
que conduz e centraliza a personalidade de cada indivíduo, ou seja, se apresenta como fonte
de aspirações, desejos e formas de manifestações individuais, bem como o meio de preservar
a individualidade da pessoa (ARAÚJO, 2008, p. 226).
Para José Afonso da Silva (1998, p. 94), a dignidade da pessoa humana é um
princípio fundamental que inspiram a ordem jurídica, uma vez que possui natureza de valor
supremo que dimensiona e humaniza a pessoa para realização e a efetivação dos direitos
fundamentais.
Não obstante, a dignidade da pessa humana coexite com os direitos fundamentais e
os direitos de personalidade como uma unidade indivisível que se complementa para atender
as seguintes finalidades jurídicas: a) assegurar o respeito de tratamento ao ser humano sem
discriminação e desprezo de não considerar a pessoa como um objeto/intrumento; b)
assegurar a proteção dos direitos e as qualidades da pessoa em face dos abusos e
arbitrariedades praticadas pelo Estado e pelos particulares; c) promover os direitos subjetivos
das pessoas ou de assegurar as mínimas condições para o seu exercício e para o
desenvolvimento de sua personalidade.
Em suma, a dignidade da pessoa humana se apresenta como cláusula geral de
proteção da pessoa, através da incorporação e anunciação dos direitos fundamentais e dos
direitos da personalidade na ordem jurídica, em face dos abusos e violações praticadas nas
relações jurídicas com o poder público (eficácia vertical) e com os particulares na órbita
privada (eficácia horizontal).
13
1.2 A distinção normativa das categorias dos direitos fundamentais e dos
direitos de personalidade e a constitucionalização do direito civil
Os direitos humanos, os direitos fundamentais e os direitos de personalidade são
direitos essenciais do ser humano que foram reconhecidos e positivados na ordem jurídica
nacional e internacional para assegurar a proteção à pessoa das ameaças, abusos e violações
perpetradas pelo Estado ou pelos particulares. A distinção das categorias dos direitos
fundamentais e dos direitos de personalidade reside no fato de que os direitos fundamentais
pertencem ao regime de direito público (Direito Constitucional) e os direitos de personalidade
ao regime de direito privado (Direito Civil), sendo que os direitos fundamentais incidem na
relação vertical entre indivíduo e Estado, enquanto que os direitos de personalidade são
aplicados na relação horizontal entre os particulares.
Neste sentido, Rabindranath Valentino Aleixo Capelo de Souza entende que a
relação entre os direitos fundamentais e os direitos da personalidade emerge a partir da
sobreposição ao nível da pessoa humana de dois planos jurídicos: do direito civil (direitos da
personalidade) e do direito constitucional (direitos fundamentais). Porém, ressalta que,
embora haja diversos direitos de personalidade constitucionalmente reconhecidos como
direitos fundamentais, nem todos os direitos de personalidade constituem direitos
fundamentais, por outro lado, nem todos direitos fundamentais são direitos de personalidade,
pois se revestem de sentido, função e aplicações distintas (SOUZA, 2011, p.584).
Do mesmo modo, Jorge Miranda entende que os direitos fundamentais e os direitos
de personalidade possuem significados distintos, uma vez que os direitos fundamentais
pertencem ao Direito Constitucional e pressupõe uma relação de poder, com incidência nas
relações públicas e privadas. Os direitos de personalidade são aplicados ao Direito Civil em
uma relação de igualdade entre os indivíduos na esfera privada (MIRANDA, 2012, p.76).
Por sua vez, Carlos Alberto Bittar (2015, p. 56) e Elimar Szaniawski (2005, p. 45)
reproduzem o entendimento dos civilistas brasileiros sobre a distinção das categorias, dizendo
que os direitos fundamentais são os direitos do ser humano que objetivam a proteção do
indivíduo contra a ingerência e os abusos do Estado, ou seja, são direitos que pertencem ao
direito público que decorrem de uma relação vertical entre indivíduo e Estado, com o intuito
de limitar ao exercício do poder. Em contrapartida, os direitos de personalidade são direitos
do ser humano aplicados na esfera do direito civil, que visa a proteção da pessoa contra as
ameaças e violações perpetrada nas relações horizontais entre os particulares.
14
A diferenciação formal das categorias dos direitos fundamentais e dos direitos de
personalidade ocorre por meio da aplicação normativa, competência legislativa, regime
jurídico e sistema de garantia de direitos.4 No entanto, no seu aspecto material não existe
nenhuma diferenciação, tendo em vista que formam um núcleo intangível e uma unidade
indivisível para salvaguardar o respeito e a proteção da dignidade da pessoa humana.
Os direitos fundamentais e os direitos de personalidade possuem as mesmas
características no seu conteúdo e finalidade, visto que objetivam a concretização da tutela
civil-constitucional de proteção da pessoa e dos valores intrínsecos dos indivíduos com
fundamento no princípio da dignidade da pessoa humana. Deste modo, o princípio da
dignidade da pessoa humana se constitui na cláusula geral de proteção da pessoa porque
realiza a interligação das categorias dos direitos fundamentais e dos direitos de personalidade
como um núcleo/unidade normativa que assegura a proteção e os direitos do ser humano,
superando a tradicional dicotomia entre o direito público e o direito privado para formação da
tutela civil-constitucional.
A constitucionalização do direito está associada ao efeito expansivo das normas
constitucionais por todo o ordenamento jurídico, sendo que os valores e as normas jurídicas
contempladas pela Constituição condicionam a validade e o sentido de todo o Direito, nas
suas relações públicas e privadas (BARROSO, 2015, p. 16-17). A readequação do direito se
deu após as atrocidades ocorridas no período da Alemanha Nacional Socialista (Nazismo),
tornando indispensável a normatização da dignidade da pessoa humana para reaproximar o
direito da moral e conferir maior proteção às pessoas.
O fenômeno da constitucionalização foi um novo processo hermenêutico de
compatibilização do Código Civil e da legislação extravagante do direito privado, com os
dispositivos da Constituição Federal, sendo reivindicado do jurista um novo sentido de
interpretação do Código Civil à luz da Constituição Federal. As disposições legais previstas
no Código Civil e no regime privado foram editadas e contempladas pela norma
constitucional para formular a unificação de direitos pessoais e unidade do núcleo normativo
(TEPEDINO, 2004a, p. 1).
A Constituição consagrou dignidade da pessoa humana para limitar a atuação do
Estado e para promover a repersonalização do Direito Civil com ênfase nos valores
existenciais e no espírito da pessoa, mediante o reconhecimento dos direitos da personalidade,
nas suas dimensões físicas, morais e intelectuais (BARROSO, 2015, p. 33).
Por tais razões, o princípio da dignidade da pessoa humana é o fundamento jurídico-
positivo que permite a conexão dos direitos fundamentais e os direitos da personalidade para
15
formar a unidade normativa de cláusula geral de proteção à pessoa e para salvaguardar a tutela
civil-constitucional contra as ofensas empregadas pelo Estado e pelos particulares.
1.3 Direitos Fundamentais sob uma perspectiva concretizadora
Os direitos fundamentais e os direitos humanos são diferenciados quanto ao plano de
aplicação e incorporação na ordem jurídica. Os direitos fundamentais são direitos
incorporados na Constituição do Estado e os direitos humanos estão previstos em normas
internacionais, isto é, os direitos humanos são direitos naturais e universais frutos da
construção histórica e sedimentados ao longo do tempo, sendo, posteriormente, incorporados
nas Constituições como direitos fundamentais.
Conforme ensina Ingo Wolfgang Sarlet, os direitos do homem são direitos naturais
que não foram positivados, os direitos humanos são direitos do indivíduo positivado na esfera
internacional e os direitos fundamentais são os direitos do ser humano reconhecidos,
outorgados e protegidos pela norma constitucional interna de cada Estado (SARLET, 2015b,
p. 30).
Cabe ressaltar que os direitos fundamentais surgiram através das lutas e conquistas
sociais interligadas com o processo de positivação – constitucionalização - dos direitos
humanos, como forma de resistência à opressão das autoridades estatais e com a função
limitação ao exercício do poder do Estado. A construção dos direitos fundamentais se iniciou
com os movimentos políticos e sociais para assegurar as liberdades individuais.
No século XVIII, a Declaração de Direitos de Virgínia (1976) e a Declaração dos
Direitos do Homem e do Cidadão (1789), incorporaram os direitos do ser humano como
forma de defesa da pessoa contra o Estado.5 Com efeito, foi a partir das revoluções inglesa e
francesa que surgiu os direitos fundamentais como forma de limitação do poder e defesa dos
direitos do homem (MIRANDA, 2012, p. 26).
Ocorre que, somente no século XIX, com o advento da promulgação da Constituição
Alemã, é que foi reconhecida a categoria dos direitos fundamentais. Segundo Konrad Hesse,
os direitos fundamentais tiveram sua origem triunfal com a elaboração das magnas
Declarações de Direitos Americana e Francesa ao final do século XVIII, porém foi
expressamente denominada pelas Constituições dos Estados alemães no século XIX (HESSE,
2009, p. 26).
De acordo com Luiz Alberto David Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior, os direitos
fundamentais são vocacionados à proteção da dignidade da pessoa humana, constituindo uma
16
natureza poliédrica de diversas dimensões que visa resguardar a liberdade do ser humano
(direitos e garantias individuais), de atender suas necessidades materiais (direitos econômicos,
sociais e culturais) e de preservação da pessoa (direito à fraternidade e solidariedade) como
forma de antepor as agressões à dignidade (ARAÚJO; NUNES JÚNIOR, 2007, p. 111).
Dimitri Dimoulis e Leonardo Martins definem os direitos fundamentais como
direitos públicos-subjetivos das pessoas consagrados na norma constitucional que tem por
finalidade limitar o exercício do poder estatal em face da liberdade individual (DIMOULIS;
MARTINS, 2014, p. 41). Do mesmo modo, Ingo Wolfgang Sarlet expressa que os direitos
fundamentais são os direitos dos seres humanos reconhecidos e positivados na ordem
constitucional de determinado Estado (SARLET, 2015b, p. 29).
Antonio Enrique Pérez Luño entende que os direitos fundamentais são as faculdades
e instituições - direitos intrínsecos da pessoa humana - consagrados na Constituição, que
objetiva proteger os indivíduos contra as violações do Estado e dos particulares e de promover
a dignidade da pessoa humana, para construção de uma sociedade livre, justa, igualitária e
solidária, sem preconceitos e quaisquer outras formas de discriminação (LUÑO, 2010, p. 50).
A incorporação dos direitos fundamentais ocorreu em momentos históricos distintos,
conforme as exigências, necessidades e o aumento das demandas sociais voltadas para
proteção dos direitos individuais. As dimensões dos direitos fundamentais estão subdividas
em direitos de primeira dimensão (direitos de liberdade), direitos de segunda dimensão
(direitos econômicos, sociais e culturais), direitos de terceira dimensão (direitos difusos e
coletivos) e direitos de quarta dimensão.
Os direitos de primeira dimensão são os direitos civis e políticos destinados a
assegurar o respeito e a proteção das liberdades públicas individuais das pessoas, mediante a
limitação do poder estatal. Já os direitos de segunda dimensão são os direitos econômicos,
sociais e culturais que visam reduzir as desigualdades de acordo com aplicação do princípio
da igualdade material, que exigem uma prestação positiva por parte do Estado para atender as
mínimas condições e necessidades humanas, sob a ótica da igualdade material e da realização
da justiça social.
Os direitos de terceira dimensão são os direitos difusos e coletivos destinados à
proteção de grupos de indivíduos e a coletividade em razão do desenvolvimento social, da
tecnologia e da ciência. Os direitos de quarta dimensão são os direitos relativos à manipulação
do patrimônio genético e ao desenvolvimento tecnológico (clonagem, alimentos transgênicos,
fertilização “in vitro”). Conforme Paulo Bonavides, a globalização da política e a
institucionalização do Estado Social implicou na elaboração da quarta dimensão para abranger
17
a universalidade das relações humanas e a proteção do direito à democracia, direito à
informação e direito ao pluralismo (BONAVIDES, 2014, p. 585).
A dimensão subjetiva dos direitos fundamentais consiste no comportamento ou
vontade de produzir efeitos sobre as relações jurídicas, por meio de uma exigência de ação
negativa (respeito e proteção), positiva (promoção) ou de competência (modificação de
posições jurídicas). Por sua vez, a dimensão objetiva significa que os direitos fundamentais é
um princípio de ordem constitucional, que exerce a função de limitar o poder e diretriz para
atuação dos poderes constituídos (MENDES; BRANCO, 2014, p. 167).
Por outro lado, os direitos fundamentais são classificados em três categorias distintas,
que compreende os direitos de defesa (dever de abstenção ou prestações negativas), direito de
prestação (dever de promoção ou prestações positivas) e direitos de participação (prestações
positivas e negativas).
No direito de defesa, os direitos fundamentais protegem os indivíduos do Estado e
dos particulares, mediante a imposição de deveres de caráter negativo para preservar as
liberdades públicas e a autodeterminação do indivíduo contra os abusos e violações. No
direito de prestação, o Estado tem o dever de agir para realização dos direitos fundamentais,
mediante o fornecimento de prestações materiais - bens e de serviços públicos - para atender
determinados direitos ou por meio de prestação jurídica para regular determinada situação
para defesa de direitos.
Por conseguinte, os direitos de participação obriga o Estado de fornecer meios
adequados e necessários para assegurar o exercício da cidadania com a participação dos
indivíduos nos assuntos e interesses estatais (perspectiva positiva), bem como de proibir a
criação de mecanismos que inviabilizem a sua participação (perspectiva negativa).
Do mesmo modo, os direitos fundamentais possuem certas características que são
distintas em relação aos demais direitos. As principais características dos direitos
fundamentais são as seguintes: fundamentalidade, historicidade; universalidade;
irrenunciabilidade e inalienabilidade; imprescritibilidade e indivisibilidade.
Os direitos e garantias fundamentais estão previstos na Constituição Federal, sendo
subdivididos nas seguintes espécies: direitos e deveres individuais e coletivos (art. 5º CF/88),
direitos sociais (art. 6º ao art. 11 CF/88), direitos de nacionalidade (art. 12 ao art. 13 CF/88), e
direitos políticos (art. 17 CF/88). A constituição assegura dos direitos fundamentais
individuais como direito à vida, à liberdade e à igualdade (art. 5º CF/88), o direito à
integridade física (art. 5º, inciso III, CF/88), os direitos à intimidade, vida privada, honra e
18
imagem das pessoas (art. 5º, inciso X, CF/88) e os direitos autorais (art. 5º, incisos IX e
XXVII, CF/88), entre outros.
As violações aos direitos fundamentais podem ocorrer a partir de uma relação
vertical de esfera pública (relação indivíduo versus Estado) ou de uma relação horizontal entre
os particulares (relação indivíduo versus indivíduo). A eficácia vertical representa a aplicação
das normas de direitos fundamentais nas relações entre o cidadão e o Estado para resguardar a
proteção dos direitos individuais das violações perpetradas pelos agentes estatais. Por sua vez,
a eficácia horizontal consiste na aplicação das normas dos direitos fundamentais nas relações
particulares, que objetiva a proteção dos direito do ser humano em face dos atos de violação
praticados por particulares.
Portanto, os direitos fundamentais são direitos subjetivos do ser humano previstos
pela norma constitucional e regidos pelo direito público, que visa limitar o exercício do poder
e assegurar o respeito e a proteção da pessoa das ofensas e violações praticadas pelos agentes
do Estado e pelos particulares nas relações privadas e intersubjetivas.
1.4 Direitos da Personalidade sob uma perspectiva horizontalizada
A compreensão dos direitos da personalidade demanda uma prévia análise sobre o
que significa pessoa, personalidade e personalidade jurídica. A pessoa é o ser humano dotado
de individualidade e racionalidade em ralação aos demais seres. A personalidade representa as
características e as qualidades intrínsecas da pessoa. Por sua vez, a personalidade jurídica
consiste na aptidão e suscetibilidade da pessoa titularizar direitos e contrair obrigações nas
relações sociais, tendo por objeto a proteção de bens jurídicos da pessoa humana (físicos,
psíquicos, morais e intelectuais do ser humano).
A categoria dos direitos da personalidade surgiu no Direito Alemão, com o advento
da Lei Fundamental de Bonn e da construção jurisprudencial, para atender a proteção dos
atributos das pessoas em face dos abusos e violações praticadas nas relações privadas. Os
direitos da personalidade, inicialmente, sugiram como direitos fundamentais (direito da
personalidade público), posteriormente, forma aplicados nas relações particulares com o
objetivo de proteger os atributos da personalidade e as qualidades intrínsecas do ser humano.
No século XIX, os direitos subjetivos foram fracionados em direitos público de
personalidade e direito privado de personalidade. Os direitos públicos de personalidade são os
direitos fundamentais, previstos nas Constituições e na Declaração Universal dos Direitos do
Homem e do Cidadão, destinados à defesa das pessoas contra os abusos e violações
19
perpetradas pelo Estado. Os direitos privados de personalidade que são os direitos da pessoa
aplicados e regulados nas relações entre os particulares (SZANIAWSKI, 2005, p. 43-44).
Os direitos de personalidade foram aplicados como direitos fundamentais, sendo que
primeiro foram consagrados pelo direito público em que o Estado deveria abster e promover
os direitos das pessoas, em seguida, foram incorporados pelos Códigos para disciplinar os
atributos e as qualidades essenciais das pessoas nas relações privadas com outros indivíduos.
No século XXI, as Constituições dos Estados e os Códigos passaram a disciplinar a
cláusula geral dos direitos da personalidade à luz do princípio da dignidade da pessoa
humana, o que justificou a formulação e a introdução da categoria dos direitos de
personalidade na ordem jurídica, como direito sobre a própria pessoa, existência pessoal ou
direito à exteriorização e desenvolvimento das faculdades de pensar e sentir (GONÇALVES,
2008, p. 78).
Nesse sentido, com a promulgação da Constituição da República Federal da
Alemanha de 1949 passou admitir a existência de um direito geral de personalidade como
direito subjetivo, com fundamento na dignidade da pessoa humana e no desenvolvimento da
personalidade (SOUZA, 2011, p. 85). A construção da cláusula geral de proteção dos direitos
da personalidade foi desenvolvida com a Constituição da República Federal da Alemanha
(Lei Fundamental de Bonn), no seu art. 1°, n1 (dignidade da pessoa humana) e no art. 2°, n1
(desenvolvimento da personalidade).6
Segundo Orlando Gomes os direitos da personalidade são o conjunto de direitos
considerados essenciais à pessoa humana com a finalidade de resguardar a sua dignidade e a
necessidade de proteção contra práticas abusivas e atentatórias à personalidade do indivíduo
(GOMES, 1996, p. 149). Do mesmo modo, Francisco Amaral entende que os direitos da
personalidade são direitos subjetivos que visam à proteção dos bens e valores do ser humano
de natureza física, moral e intelectual.7
Em síntese, os direitos da personalidade são direitos subjetivos das pessoas
faculdades e prerrogativa - que visam assegurar o respeito e a proteção dos bens e dos
atributos da pessoa nas suas relações privadas. O direito positivo confere proteção aos
atributos e qualidades da pessoa humana (integridade física, moral e intelectual), facultando
ao titular a reparação civil dos danos por meio do ajuizamento de ações judiciais preventivas e
reparadoras.
A legislação brasileira confere proteção jurídica às pessoas contra qualquer tipo de
ameaça ou ofensas/violações à integridade física, moral ou intelectual, sendo assegurado ao
titular - vítima da ofensa - o direito de requer a cessação da ameaça ou a reparação dos danos
20
pelas lesões. A norma jurídica assegura à pessoa – ente autônomo e individualizado - a
faculdade de proteger os atributos e as características da personalidade humana nas relações
privadas.
Na ordem jurídica brasileira os direitos da personalidade estão localizados no texto
constitucional e no Código Civil. A Constituição prevê o direito à vida e o direito à liberdade
(art. 5º, “caput”, CF/88) bem como o direito à intimidade, direito à vida privada, direito à
honra, direito à imagem (art. 5º, inciso X, CF/88). Por outro lado, o Código Civil disciplina a
tutela geral de personalidade (art. 12 CC), direito de disposição do próprio corpo e à
integridade física (art. 13 CC), direito à incolumidade psicofísica (art. 14 CC), direito ao
nome (art. 16 CC) e direito à vida privada (art. 21 CC).
O objeto dos direitos de personalidade consiste na proteção dos valores e atributos do
ser humano que compreende o aspecto físico, moral e intelectual (vida humana, corpo,
integridade física e psíquica, honra, imagem, liberdade, nome, intimidade), com fundamento
na dignidade da pessoa humana (AMARAL, 2014, p. 304-305). Os direitos de personalidade
são classificados em três dimensões distintas: integridade física (tutela do corpo humano);
integridade moral (valores do ser humano); e integridade intelectual (inteligência humana),
que estão fundamentadas nos elementos que compõe a pessoa humana (corpo, alma e
intelecto).
Nesse sentido, de acordo com a tradicional civilística, os direitos da personalidade
estão subdivididos nos seguintes aspectos: a) integridade física que compreende a proteção
jurídica do direito à vida, direito ao corpo (corpo vivo), direito ao cadáver (corpo morto); b)
integridade moral que confere proteção ao direito à privacidade (segredo e intimidade), direito
à liberdade (civil, política e religiosa), direito à vida privada, direito à imagem (retrato,
atributo e voz), direito à honra (objetiva e subjetiva), direito ao nome (prenome, sobrenome,
pseudônimo) e direito à identidade pessoal; c) integridade intelectual que protege o direito à
autoria científica ou literária (direitos autorais), direito à liberdade pensamento e direito à
liberdade de expressão.
Por outro lado, os direitos de personalidade são o conjunto de direitos que formam
uma categoria especial que possui suas próprias características na ordem jurídica. As
principais características dos direitos da personalidade são as seguintes: indisponibilidade
(intransmissíveis e irrenunciáveis); absolutos; imprescritíveis; impenhoráveis;
extrapatrimoniais; e vitalícios.
Dessa forma, os direitos de personalidade são os direitos subjetivos aplicados e
regulados pelo direito privado, com a finalidade de proteger os atributos do ser humano
21
(integridade física, moral e intelectual) e os valores da personalidade do indivíduo8, em face
das ofensas e violações praticadas outros indivíduos nas relações particulares.
1.5 A dignidade da pessoa humana e sua relação com os direitos fundamentais e
os direitos da personalidade (relação tridimensional)
A dignidade da pessoa humana é o princípio que fundamenta a estrutura a ordem
jurídico-constitucional e do Estado Democrático de Direito, sendo diretriz de interpretação e
de aplicação dos direitos fundamentais e dos direitos de personalidade para assegurar o
respeito, proteção e promoção dos direitos do ser humano em todos os seus sentidos.
A pessoa humana é a gênese de valores éticos que gravitam sobre o ordenamento
jurídico e constitui principal tarefa-finalidade do Estado, da sociedade e dos particulares para
resguardar os valores intrínsecos das pessoas e de proteger os seus aspectos físicos, morais e
intelectuais. Nos dizeres de Miguel Reale, a pessoa humana é o valor fonte da ordenação
axiológica porque possui a faculdade de outorgar sentido aos atos e as coisas, bem como pela
consciência de sua dignidade não só pelo mero fato de existir, mas pelo significado e o
sentido de sua existência, que traduz: “como autoconsciência espiritual, é o valor que dá
sentido a todo evolver histórico, ou seja, valor a cuja atualização tendem os renovados
esforços do homem em sua faina civilizadora”. (REALE, 2002, p. 2010).
O conteúdo da dignidade humana reconhece a elevação do ser humano ao centro da
ordem jurídico-positiva e confere sentido às normas que foram elaboradas para o ser humano
e à sua relação existencial, a fim de proporcionar a garantia dos mínimos direitos condizentes
com a dignidade da pessoa individualmente considerada (FARIAS; ROSENVALD, 2015, p.
127). Nesse contexto, a dignidade representa um princípio jurídico e valor fundamental com
origem nos direitos humanos, que exerce dupla função de fornecer a compreensão nuclear dos
direitos fundamentais para interpretação das normas ambíguas ou lacunosas e de resolver as
colisões de direitos envolvendo aspectos morais (BARROSO, 2014, p. 111).
O iluminismo foi um movimento filosófico, caracterizado pela racionalidade e pelo
reconhecimento do homem como origem e fundamento da ordenação social, que consolidou a
noção dos direitos subjetivos oponíveis contra o Estado e os particulares, outorgando às
pessoas mecanismos endógenos e operacionais para a tutela de poderes e faculdades inerentes
à dignidade da pessoa humana e da autonomia da vontade (SOUZA, 2011, p. 91-92).
Como se observa, historicamente, não existia uma relação dos direitos subjetivos do
ser humano (direitos fundamentais e direitos de personalidade) com a dignidade da pessoa
22
humana, tendo em vista que foram consagrados em momentos diversos e possuíam interesses
e finalidades distintas. No entanto, a vinculação jurídico-positiva entre direitos fundamentais e
dignidade da pessoa humana teve início com a instituição do Estado Social de Direito, mais
precisamente com o advento das Constituições e dos tratados internacionais posteriores à
Segunda Guerra Mundial (MIRANDA, 2009, p. 168).
A incorporação da dignidade humana em Declarações internacionais de Direitos
Humanos e na ordem jurídica do Estado, como princípio constitucional, viabilizou a
construção e a formação da cláusula geral de proteção à pessoa e reaproximou os direitos
fundamentais e os direitos da personalidade, com a finalidade de assegurar uma tutela civil-
constitucional. Os direitos fundamentais e os direitos da personalidade estão conexos por
força do princípio da dignidade da pessoa humana, através de uma relação tríade que forma
um núcleo intangível ou uma unidade indissolúvel.
Nestes termos, Jorge Miranda afirma que a Constituição esta assentada na dignidade
da pessoa humana, como fundamento da sociedade e do Estado, que confere unidade de
sentido e de valoração para conjugação dos direitos fundamentais e dos direitos de
personalidade para assegurar a proteção e o desenvolvimento da pessoa, conforme se verifica:
“A Constituição confere uma unidade de sentido, de valor e de concordância prática
ao sistema de direitos fundamentais. E ela repousa na dignidade da pessoa humana,
ou seja, na concepção que faz da pessoa fundamento e sim da sociedade do Estado.
Pelo menos, de modo directo e evidente, os direitos, liberdades e garantias pessoais
e os direitos económicos, sociais e culturais comuns têm a sua fonte ética na
dignidade da pessoa, de todas as pessoas. Mas quase todos os outros direitos, ainda
quando projectados em instituições, remontam à ideia de proteção e
desenvolvimento das pessoas. A copiosa extensão do elenco não deve fazer perder
de vista esse referencial. [...]. Para além da unidade do sistema, o que conta é a
unidade da pessoa. A conjugação dos diferentes direitos e das normas
constitucionais, legais e internacionais a eles atinentes torna-se mais clara a essa luz.
O “homem situado” no mundo plural, conflitual e em acelerada mutação do nosso
tempo encontra-se muitas vezes dividido por interesses, solidariedades e desafios
discrepantes; só na consciência da sua dignidade pessoal retoma unidade de vida e
de destino.” MIRANDA, 2009, 169).
Conforme ensina Anderson Schreiber, a ciência jurídica contemporânea visa superar
o abismo tradicional criado pelos juristas entre direito público e o direito privado para
reunificar as duas esferas em torno da unidade constitucional por meio do princípio da
dignidade da pessoa humana, isso significa que os direitos de personalidade e os direitos
fundamentais estão correlacionados como consectários da dignidade humana (SCHREIBER,
2011, p. 13).
23
Do mesmo modo Rabindranath Valentino Aleixo Capelo de Souza reconhece
tendência da tutela dos direitos da personalidade pela norma constitucional como direitos
fundamentais em face do reconhecimento constitucional da dignidade da pessoa humana, bem
como em razão do reconhecimento da dimensão relacional entre os direitos fundamentais e os
direitos de personalidade (SOUZA, 2011, p. 585). No mesmo sentido, Antonio Enrique Pérez
Luño assevera que a dignidade da pessoa humana é o valor básico que fundamenta os direitos
do ser humano que tendem explicar e atender as necessidades das pessoas e conferir
legitimidade para criação dos direitos da pessoa (LUÑO, 2010, p. 324).
Por fim, Ingo Wolfgang Sarlet também entende que existe uma indissociável relação
entre o princípio da dignidade da pessoa humana e os direitos fundamentais. A dignidade da
pessoa humana é o fundamento e o conteúdo da enunciação dos direitos fundamentais, que
assegura a proteção e promoção dos direitos do ser humano (SARLET, 2015a, p. 125).
Os direitos fundamentais e os direitos de personalidade se assemelham no seu
aspecto material, uma vez que foram normatizados para proteger os indivíduos das violações
perpetradas pelo Estado e pelos particulares. A dignidade da pessoa humana é um princípio de
diretriz para interpretação e aplicação dos direitos fundamentais e dos direitos de
personalidade, que objetiva resguardar a proteção da pessoa sob a ótica da tutela civil-
constitucional.
A cláusula geral de proteção da pessoa está assentada na relação tridimensional que
realiza a correlação entre o princípio da dignidade da pessoa humana com os direitos
fundamentais e os direitos de personalidade. A relação dialógica e integradora entre princípio
da dignidade da pessoa humana, os direitos fundamentais e os direitos de personalidade,
viabiliza a formação da cláusula geral de proteção do ser humano.
Nestes termos, vale ressaltar que esta relação tríade formada pela dignidade da
pessoa humana (art. 1º, inciso III, CF/88), os direitos fundamentais (art. 5º CF/88) e os
direitos de personalidade (art. 11 CC ao art. 21 CC) foi incorporada pela ordem jurídica
brasileira como forma de concretização dos valores constitucionais da igualdade, liberdade e
de justiça presentes no Estado Democrático de Direito.
A tutela civil-constitucional e a cláusula geral de proteção da pessoa são
concretizadas no plano jurídico em virtude da relação tridimensional conjugada pela
dignidade humana (valor) com os direitos fundamentais e de personalidade (norma), que visa
unificar os diferentes regimes do Direito Público e do Direito Privado, para conferir a
proteção da pessoa em todos os seus aspectos (físicos, morais e intelectuais) e de
24
responsabilizar o Estado e os particulares das ofensas e violações praticadas, através de ações
judiciais de reparação dos danos.
A diferença formal entre os direitos fundamentais e direitos da personalidade devem
estar interligados com o seu aspecto material, fundamentado no princípio da dignidade da
pessoa humana. Na verdade, a relação entre o princípio da dignidade da pessoa humana, os
direitos fundamentais e os direitos de personalidade visa à formação de uma unidade
indivisível de proteção à pessoa em todos os aspectos (físico, moral e intelectual), o que
justifica a construção da cláusula geral de proteção do ser humano e a sua tutela no plano
civil-constitucional.
A consagração do princípio da dignidade da pessoa humana na Constituição
sedimentou a construção da cláusula geral de proteção e a unificação dos direitos públicos e
privados, ampliando os meios de proteção aos bens jurídicos inerentes à pessoa humana nas
relações com o Estado e com outros indivíduos nas relações particulares. O processo de
normatização da dignidade da pessoa humana fundamenta a enunciação e a correlação dos
direitos fundamentais e dos direitos da personalidade.
A correlação entre os direitos fundamentais e os direitos de personalidade recebe o
beneplácito dos Tribunais Superiores, que aplica o princípio da dignidade da pessoa humana
para integrar lacunas normativas, para resolver colisões de direitos ou para servir de diretriz
de interpretação na aplicação de direitos fundamentais e dos direitos de personalidade9. A
justificativa da cláusula geral de proteção, por meio da conexão entre os direitos fundamentais
e os direitos de personalidade, torna efetivada a tutela civil-constitucional à luz do princípio
da dignidade da pessoa humana.
O Supremo Tribunal Federal (STF) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) utilizam o
princípio da dignidade da pessoa humana para concretizar a clausula geral de proteção da
pessoa e fazer a ligação com os direitos fundamentais e os direitos de personalidade,
viabilizando a efetivação da garantia tutela civil-constitucional.
Oportuno destacar que no julgamento da ADPF 13210, o Tribunal reconheceu a união
homoafetiva como instituto jurídico, assegurando a possibilidade de casais do mesmo sexo
constituírem uniões estáveis, com fundamento no princípio da dignidade da pessoa humana
como promoção de direitos. Por sua vez, no julgamento do RE 24886911, o Tribunal fez
referência do direito ao nome como corolário do princípio da dignidade da pessoa humana
que traduz na identidade pessoal e na origem de sua ancestralidade.
Do mesmo modo, no HC 71.37312, o Tribunal entendeu que o investigado, na ação
de paternidade, não poderá ser submetido à força pelo Estado para realização de exame de
25
DNA, em respeito à intimidade, à manutenção da integridade física e moral e da
intangibilidade do corpo humano, a fim de assegurar a preservação da dignidade humana.No
julgamento da ADI 264913, houve a declaração da constitucionalidade da Lei nº 8.899/94,
com o objetivo de assegurar às pessoas com deficiência o seu acesso ao transporte público,
concretizando o princípio da dignidade da pessoa humana.
No Recuso Especial 1169337/SP14, o princípio da dignidade da pessoa humana foi
utilizado como diretriz de interpretação para colisão entre direitos fundamentais e direitos de
personalidade, sendo assegurado o respeito e a proteção à honra e a imagem da pessoa em
face das ofensas perpetrada por particulares em jornais de informação. Em outro julgado, o
Tribunal deferiu o pedido de homologação de sentença estrangeira que autorizou a
modificação do nome do menor, através da extração do nome de família do pai biológico, em
razão da mãe biológica ter contraído novas núpcias e preferir a utilização do sobrenome do
novo consorte, de forma para tutelar os direitos de personalidade e respeitar a dignidade da
pessoa humana.15
No julgamento do REsp 617.588/SP16 e do Resp 684.442/RS17, o princípio da
dignidade da pessoa humana foi aplicado para assegurar o fornecimento da prestação de
serviços essenciais à vida humana (água e energia elétrica) em razão da inadimplência do
pagamento das faturas, isto é, assegurou a proteção das condições mínimas para uma vida
digna.
No Tribunal Constitucional de Portugal, o princípio da dignidade da pessoa humana
foi utilizado para efetivar os direitos fundamentais e os direitos de personalidade, assegurando
o direito a um mínimo de existência condigna (mínimo existencial) inerente ao princípio do
respeito da dignidade humana.18 Em outro julgado, declarou a inconstitucionalidade da lei que
admitia a penhora de vencimentos em montante capaz de privar a pessoa de dispor de um
rendimento mensal mínimo necessário à sua subsistência, o que desrespeita o princípio da
dignidade da pessoa humana.19
As interlocuções entre os direitos fundamentais e os direitos da personalidade são
integradas pelo princípio da dignidade da pessoa humana, através de uma sua relação
tridimensional, que objetiva a efetivação da cláusula geral de proteção da pessoa no seu
aspecto físico, moral e intelectual sob o enfoque da tutela civil-constitucional.
A assimetria entre os direitos fundamentais e os direitos de personalidade foi
reconstruída com o princípio da dignidade da pessoa humana ao estabelecer uma interpretação
unificadora. A proteção da pessoa e a sua tutela civil-constitucional emergem de uma relação
26
tríade formada pelo princípio da dignidade da pessoa humana que é o sustentáculo e diretriz
para interpretação e aplicação dos direitos fundamentais e dos direitos de personalidade.
Nos conflitos normativos envolvendo os direitos fundamentais e os direitos da
personalidade, sugere-se à aplicação do princípio da dignidade da pessoa humana para
solução da antinomia das normas e para assegurar a efetiva tutela dos direitos das pessoas noa
esfera civil-constitucional, conforme os critérios da proporcionalidade e da preponderância
dos interesses.
Dessa forma, a cláusula geral de proteção é construída pela normatividade da
dignidade da pessoa humana, que perfaz a correlação dos direitos fundamentais e dos direitos
da personalidade por meio de uma relação tridimensional, com a finalidade de assegurar a
tutela civil-constitucional dos atributos das pessoas e dos direitos subjetivos.
Conclusão
A personalidade jurídica da pessoa se inicia a partir do nascimento com vida, sendo
ressalvada desde a concepção, momento que passa a titularizar direitos e contrair obrigações
na ordem civil. O Direito visa regular as relações dos indivíduos e resguardar a proteção dos
atributos das pessoas em seus aspectos físicos, morais e intelectuais, como vida, liberdade,
integridade física e psíquica, imagem, honra, liberdade de pensamento, privacidade,
intimidade, identidade, dentre outros.
A Segunda Guerra Mundial foi responsável pela modificação da estrutura jurídico-
positiva que motivou a consagração da inviolabilidade da dignidade da pessoa humana e dos
direitos fundamentais nas Constituições do Estado, com a finalidade de proteger os direitos
subjetivos dos indivíduos das violações perpetradas pelas autoridades públicas.
Posteriormente, os direitos subjetivos das pessoas também foram protegidos contra as
agressões praticadas pelos particulares nas relações privadas, consolidando a construção dos
direitos de personalidade.
Todavia, com o advento da globalização e dos avanços tecnológicos, os sistemas de
proteção dos direitos da pessoa se tornaram mais complexos e insuficientes em virtude do
aumento de violações aos direitos fundamentais e de personalidade, o que demandou a
superação da dicotomia entre os regimes de direito público e do direito privado para
construção da cláusula geral de proteção de direitos e da dignidade da pessoa humana.
Conforme se verifica, o fenômeno da constitucionalização reformulou os meios de
interpretação jurídica para compatibilizar as normas dos diversos ramos do Direito à luz da
27
Constituição Federal. Assim sendo, o princípio da dignidade da pessoa humana
repersonalizou a ordem jurídica para unificar a proteção dos direitos subjetivos - direitos
fundamentais e direitos de personalidade - por meio da cláusula geral de proteção para
assegurar uma tutela civil-constitucional.
O princípio da dignidade da pessoa humana fundamenta a enunciação e a ligação das
categorias dos direitos fundamentais e dos direitos de personalidade para formação da
cláusula geral de proteção da pessoa, centralizando o indivíduo como prioridade do Estado e
de toda coletividade. Nesse sentido, a dignidade da pessoa humana, os direitos fundamentais e
os direitos de personalidade formaram o núcleo intangível ou unidade normativa de direitos
dos seres humanos.
A cláusula geral de proteção da pessoa tem a função de norma integradora para
solução de controvérsias sem previsão legal ou para preenchimento de lacunas normativas;
norma interpretativa que visa orientar o jurista na busca do sentido jurídico e de solucionar
conflitos normativos; norma diretiva que determina diretriz e estabelece objetivos para
promoção e proteção dos direitos fundamentais e dos direitos de personalidade; norma
unificadora que confere unidade normativa na conjugação dos direitos fundamentais e dos
direitos de personalidade para concretizar a tutela civil-constitucional.
Por tais razões, a relação tridimensional deriva do princípio da dignidade da pessoa
humana, dos direitos fundamentais e dos direitos de personalidade, em que se assenta a
cláusula geral de proteção do indivíduo e dos direitos subjetivos. O Estado e os particulares
estão vinculados à clausula geral de proteção, para garantir a tutela civil-constitucional nas
dimensões físicas, morais e intelectuais da pessoa humana, mediante a disponibilização de
mecanismos jurídicos eficazes para fazer cessar as ameaças e responsabilizar os ofensores
pelos danos causados à vítima.
A cláusula geral de proteção assegura à pessoa, na condição de sujeito titular de
direitos e obrigações, a inviolabilidade da dignidade humana e de sua personalidade na ordem
jurídica. Por seu turno, os direitos fundamentais e os direitos de personalidade são garantidos
pelo Estado como forma de defesa e de promoção do ser humano em todos os seus aspectos.
Em síntese, a formação da unidade da cláusula geral de proteção realiza a
interligação do princípio da dignidade da pessoa humana com os direitos fundamentais e os
direitos de personalidade para proteger a pessoa em todas as suas dimensões (físicas,
psíquicas, morais e intelectuais), contra as agressões do Estado ou dos particulares, através de
instrumentos jurídicos preventivos e reparadores das lesões, tornando eficaz a tutela civil-
constitucional dos direitos subjetivos.
28
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1 O imperativo categórico representa que a pessoa, na condição de ser humano, deve ser tratada com dignidade
por outros indivíduos. O ser humano é dotado de racionalidade com autonomia ética para agir conforme sua
vontade, razão pela qual o homem é um fim em si mesmo, não admitindo que seja tratado como objeto de
instrumentalização para outra finalidade diversa. Assim, se verifica: “Agora afirmo, o homem – e, de uma
maneira gera, todo o ser racional – existe como um fim em si mesmo, e não apenas como meio para o uso
arbitrário desta ou daquela vontade. Em todas as suas ações, pelo contrário, tanto nas direcionadas a ele
mesmo como nas que o são os outros seres racionais, deve ser ele sempre considerado simultaneamente como
fim.” (KANT, 2011, p. 58).
2 A respeito do ajustamento do princípio da dignidade à realidade social, mesmo na ausência de norma especial
prevista para o caso concreto, verificar o precedente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), cuja parte da redação
merece destaque: “A falta de fôlego do Direito em acompanhar o fato social exige, pois, a invocação dos
princípios que funcionam como fontes de oxigenação do ordenamento jurídico, marcadamente a dignidade da
pessoa humana – cláusula geral que permite a tutela integral e unitária da pessoa, na solução das questões de
interesse existencial humano.” (BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 1008398/SP. Relatora
Ministra Nancy Adrighi, Brasília, julgado no dia 15 de outubro de 2009, pulicado no dia 18 de novembro de
2009).
3A função integradora e interpretativa da dignidade da pessoa humana diz respeito à sua conexão com os direitos
fundamentais, em que enfatiza a utilização do princípio da dignidade humana como critério para construção de
um conceito materialmente aberto e receptivo dos direitos fundamentais previstos na Constituição (SARLET,
2015, p.112).
4 A diferença dos direitos fundamentais e dos direitos de personalidade na ordem jurídica brasileira é realizada
da seguinte forma: I) Aplicação normativa: os direitos fundamentais são aplicados no contexto das relações
públicas, estabelecidas entre indivíduo e Estado, uma vez que se originaram dos ideais liberais contra os abusos e
arbitrariedades praticadas pelo soberano (eficácia vertical). Os direitos da personalidade são aplicados nas
relações privadas entre os particulares, sendo que surgiram com a evolução social e tecnológica com a finalidade
de assegurar a proteção dos atributos do indivíduo em face dos abusos perpetrado pelos particulares (eficácia
horizontal); II) Competência legislativa: a competência legislativa para criar e incluir novos direitos
fundamentais é do Poder Constituinte (originário ou derivado). A competência para disciplinar sobre direitos da
personalidade é privativa da União (art. 22, inciso I, CF/88); III) Regime jurídico: os direitos e garantias
fundamentais pertencem ao regime do direito público ou Direito Constitucional (art. 5º CF/88). Os direitos da
personalidade estão vinculados ao direito privado ou Direito Civil (art. 11 e art. 21 CC); IV) Sistema de
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garantias: os direitos fundamentais são assegurados por meio das garantias das ações constitucionais (direito de
petição, ação popular, ação civil pública, mandado de segurança, habeas data, habeas corpus) e ações de controle
de constitucionalidade. Os direitos de personalidade são assegurados de forma preventiva por meio de ação
inibitória (art. 12 CC e art. 273 CPC c/c art. 461 CPC) ou de forma reparadora por meio da responsabilidade civil
de indenização (art. 12 CC e art. 927 CC).
5 “A defesa de que certo número de direitos preexistem ao próprio Estado, por resultarem da natureza humana,
desvenda características crucial do Estado, que lhe empresta legitimação – o Estado serve aos cidadãos, é
instituição concatenada para lhes garantir os direitos básicos. Essas ideias tiveram decisiva influência sobre a
Declaração de Direitos de Virgínea, de 1776, e sobre a Declaração Francesa, de 1789. Talvez, por isso, com
maior frequência, situa-se o ponto fucral do desenvolvimento dos direitos fundamentais na segunda metade do
século XVIII, sobretudo com o Bill of Rights de Virgínia (1776), quando se dá a positivação dos direitos tidos
como inerentes ao homem, até ali mais afeiçoados a reivindicações políticas e filosóficas do que a normas
jurídicas obrigatórias, exigíveis judicialmente.” (MENDES; BRANCO, 2014, p 16).
6 Artigo 1
(1) a dignidade da pessoa humana é intangível. Respeitá-la e protege-la é obrigação de todo o poder público.
Artigo 2
(1) Todos têm o direito ao livre desenvolvimento da sua personalidade, desde que não violem os direitos de
outros e não atentem contra a ordem constitucional.
7 Segundo a definição de Francisco Amaral: “Direitos da personalidade são direitos subjetivos ou melhor,
situações jurídicas existenciais que têm por objetivo os bens e valores essenciais da pessoa, de natureza física,
moral e intelectual. Como direito ou situações jurídicas subjetivas, conferem ao seu titular o poder de agir na
defesa dos bens ou valores essenciais da personalidade, que compreendem no seu aspecto físico, o direito à vida
e ao próprio corpo; no aspecto intelectual, o direito à liberdade de pensamento, direito de autor e inventor; e no
aspecto moral, o direito à liberdade, à honra, ao recato, ao segredo, à imagem, à identidade, e, ainda, o direito de
exigir de terceiros o respeito a esses direitos.” (AMARAL, 2014, p. 301-302).
8 Conforme ensina Gustavo Tepedino, os direitos de personalidade são direitos subjetivos que tutelam os valores
da pessoa humana nas relações de direito privado: “Na medida em que a pessoa humana torna-se objeto de tutela
também nas relações de direito privado, com o estabelecimento de direitos subjetivos para a tutela de valores
atinentes à personalidade, tratam os civilistas de definir sua configuração dogmática, delineando-se um direito
iluminado pelo paradigma dos direitos subjetivo privado por excelência, o direito de propriedade. Cogita-se,
nesta esteira, que tais direitos pertencem à categoria dos direitos privados exatamente porque a vida, a
integridade física, a honra, a liberdade, satisfazem aspirações e necessidades próprias do indivíduo em si mesmo
considerado, e inserem-se, portanto, na esfera da utilitas privada”. (TEPEDINO, 2004. p. 32).
9 No Direito Constitucional brasileiro a incidência do princípio da dignidade da pessoa humana abrange os
seguintes aspectos: a) ambiguidade de linguagem em que o parâmetro de escolha de uma solução e não de outra
deverá estar pautada na que tiver melhor consonância com a dignidade humana; b) lacuna normativa, na qual a
dignidade humana será utilizada para fazer a integração normativa; c) colisões de normas constitucionais e
direitos fundamentais, a dignidade humana é utilizada como critério de solução de colisões de direitos; d)
desacordo moral razoável, sendo que a dignidade humana é invocada como reforço argumentativo ou elemento
de argumentação (BARROSO, 2014, p. 114).
10BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental 132. Relator
Min. Ayres Britto, Brasília, julgado no dia 05 de março de 2011, publicado em 14 de outubro de 2011.
11BRASIL, Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 248869. Relator Min. Maurício Corrêa, Brasília,
julgado no dia 07 de agostos de 2003, publicado em 12 de março de 2004.
12BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus 71.373. Relator: Min. Francisco Rezek, Brasília, julgado
no dia 10 de novembro de 1994, publicado em 22 de novembro de 1996.
13BRASIL, Supremo Tribunal Federal (STF). Ação Direta de Inconstitucionalidade 2649. Relatora Min. Cármen
Lúcia, Brasília, julgado no dia 08 de maio de 2008, publicado em 17 de outubro de 2008.
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14BRASIL, Superior Tribunal de Justiça (STJ). Recurso Especial 1169337/SP. Relator Min. Luis Felipe
Salomão, julgado no dia 18 de novembro de 2014, publicado em 18 de dezembro de 2014.
15 BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Sentença Estrangeira Contestada 5.726/EX. Relatora Ministra. Maria
Thereza de Assis Moura, Brasília, julgado no dia 29 de agosto de 2012, publicado em 13 de setembro de 2012.
16BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 617.588/SP. Relator: Min. Luiz Fux, Brasília, julgado
no dia 27 de abril de 2004, publicado em 31 de maio de 2004.
17BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Recurso Especial 684.442/RS. Relator: Min. José Delgado, Brasília,
julgado no dia 03 de fevereiro de 2005, publicado em 05 de setembro de 2005.
18PORTUGAL. Tribunal Constitucional. Acórdão nº 509/02. Rel. Cons. Luís Nunes de Almeida, Lisboa, julgado
no dia 19 de dezembro de 2002.
19PORTUGAL. Tribunal Constitucional. Acórdão nº 96/04. Rel. Cons. Maria Helena Brito, Lisboa, julgado no
dia 11 de fevereiro de 2004.
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