Ciência e Técnica no livro do Gêneses: a construção da Arca de Noé na percepção
do padre jesuíta Athanasius Kircher (1602-1680)
Fabiana Dias Klautau [email protected]
PUC-SP
Maria Helena Roxo Beltran [email protected]
PUC-SP
O Gênesis foi um dos livros bíblicos mais apreciados por sábios seiscentistas, como é o
caso de Athanasius Kircher (1602-1680), que com sua personalidade cativada pela história
antiga e pela história das origens das línguas, se debruçou sobre as passagens da Torre de
Babel e da Arca de Noé. Na passagem do Dilúvio bíblico, a grande inundação é um marco
divisório, pois após um banho de água purificador não sobraria nenhum resquício do Paraíso
terreno, e a humanidade entraria numa nova jornada através de um pacto de aliança
indestrutível entre Deus e Noé, o novo Adão1.
E Deus disse a Noé,
Faze uma arca de madeira resinosa2; tu a farás de caniços3 e a calafetarás com betume por dentro e por fora. Eis como farás: para o comprimento da arca, trezentos côvados, para a sua largura, cinquenta côvados; para a altura, trinta côvados. Farás um teto para a arca e o rematarás um côvado mais alto4; farás a entrada da arca pelo lado, e farás um primeiro, um segundo e um terceiro andares(Gn 6, 14-16)5.
Vendo toda a corrupção no coração do homem, Deus arrependeu-se de sua criação.
Decidido a aniquilar todos os homens e animais, Ele decidiu enviar uma grande chuva que
cairia durante quarenta dias e quarenta noites, fazendo com que as águas se elevassem além
1Liano, Athanasius Kircher (1602-1680), 46. 2 O termo “madeira resinosa” trata-se de uma tradução aproximada do hebraico. 3 Como a cesta onde Moisés foi colocado antes de ser lançado Rio (Ex, 2,3). Do hebraico “ninhos”. 4 Segundo a tradução adotada, o teto teria o declive de um côvado, para escoamento da água. 5A edição bíblica escolhida para a realização desse trabalho é a Bíblia de Jerusalém, considerada em diversos países a melhor edição da Sagrada Escritura devido às opções críticas que orientaram a tradução, às introduções, notas, referências marginais e apêndices. Foi usada a 6ª impressão, realizada pela editora Paulus, no ano de 2010.
das montanhas e ceifassem todo sopro de vida da superfície da Terra. Porém, Noé encontrou
graça diante de Deus e foi escolhido para construir uma arca, salvar a si, a sua família, e
alguns pares de animais6.
Dois mitos antigos fazem um paralelo com o Dilúvio do Gênese. Um deles seria o mito
acadiano, encontrado na Epopeia de Gilgamesh, corrente também entre os sumérios, os
hurritas e os hititas. Segundo Graves e Patai, nesse mito
o herói Utnapishtim é advertido por Ea, deus da Sabedoria, que os outros deuses, liderados por Enlil, o Criador, haviam planejado um dilúvio universal, e que ele deveria construir uma arca. O motivo de Enlil para varrer do mundo a humanidade parece ter sido a omissão desta quanto a seus sacrifícios de Ano Novo. Utnapishtim constrói uma arca de seis conveses, na forma de um cubo exato, com laterais de cento e vinte cúbitos, e usa o betume para calafetá-la. A arca é completada em sete dias(...)Quando uma chuva arrasadora começa a cair, ele, a sua família, artesãos e servos carregando seus tesouros, além de animais e pássaros, entram na arca (GRAVES & PATAI, 1994: 103)
Outro mito análogo ao Dilúvio bíblico, é o grego, e esse nos conta
Desgostoso com o canibalismo dos ímpios, Zeus todo poderoso liberou uma grande enchente sobre a terra com a intenção de dela varrer toda a raça humana; mas Deucalião, o rei da Pítia, prevenido por seu pai, o titã Prometeu, a quem ele fora visitar no Cáucaso, construiu uma arca, encheu-a de mantimentos, e subiu a bordo com sua mulher, Pirra, uma das filhas de Epimeteu. E então o Vento Sul soprou, a chuva caiu e os rios se precipitaram rugindo para o mar, o qual, subindo a uma velocidade surpreendente, varreu todas as cidades da costa e das planícies; até o mundo inteiro estava inundado, exceto por alguns picos de montanhas, e todas as criaturas mortais pareciam perdidas, exceto Deucalião e Pirra. A arca flutuou à deriva durante cerca de nove dias (...) Deucalião tranquilizou-se graças a uma pomba que mandara em um vôo de exploração.(GRAVES & PATAI, 1994: 103)
O Dilúvio do livro de Gênesis compõe-se de pelo menos três elementos distintos. O
primeiro seria a memória histórica de uma tromba d´água nas montanhas da Armênia, que
teria inundado o Tigre e o Eufrates, cobrindo aldeias sumérias em uma área de 60.000
quilômetros quadrados com três metros de lama e destroços, por volta de 3200 a.E.C.,
segundo Ur dos Caldeus, de Woolleyref. Um segundo elemento seria a festividade da vindima
de Ano Novo realizada durante o outono, na Babilônia, Síria e Palestina, na qual a arca era
um barco em forma de lua crescente, contendo animais de sacrifício, e era comemorada com
libações de vinho novo para estimular as chuvas de inverno. Já um terceiro elemento seria a
6Gen, 6 e 7. Acerca dos animais selecionados para adentrar a arca, será feita uma discussão em outro trabalho.
menção acerca dos remanescentes da arca sobre o Ararat7, em que os curdos locais ainda
tiravam dela lascas de betume para usar como amuletos.8
Em 1675, o padre jesuíta Athanasius Kircher (1602-1680) publicou uma obra dedicada à
história bíblica de Noé, da construção da Arca, e do Dilúvio. Em poucas palavras, o seu Arca
Noë, in três libros digesta trata no primeiro livro - De rebus quae ante Diluvium – da história
de Noé antes do Dilúvio, da construção da Arca, da seleção dos animais que embarcaram e da
acomodação das espécies. No segundo livro – De iis, quae ipso Diluvio e jusque duratione –
lê-se sobre o Dilúvio e sua duração, da administração da Arca durante a inundação, além de
trazer uma exposição mística – alegórica – tropológica da Arca. Já no terceiro livro – De iis,
quae post Diluvium à Noëmo gesta sunt – encontramos os feitos de Noé após o recuo das
águas, a comparação do globo terrestre antes e após o Dilúvio e as ideias de Kircher de como
teria sido a dispersão dos homens e dos animais pela Terra após as águas baixarem9. O
presente trabalho dedica-se ao primeiro livro da obra, em especial no que tange aos estudos
sobre a construção da embarcação.
Segundo os cálculos de Kircher, o Dilúvio teria acontecido em 2396 a.C. e teria durado
365 dias desde o cair da primeira gota de chuva até a chegada de Noé e sua família no Monte
Ararat10.
O pensamento de Athanasius Kircher era fundamentado na teologia Cristã, tendo como
suporte a filosofia. Para ele, o objeto do conhecimento estava no pensamento de Deus, e este
poderia ser acessado por duas vias: através da Bíblia e pela revelação da natureza,
manifestada na Criação. Para Kircher, não somente o homem tinha sido criado a imagem e
semelhança de Deus, como está na Bíblia, mas o mundo, em sua totalidade, refletia a mesma
base paterna. Ele aceitava a analogia microcosmo-macrocosmo e entendia que esse
pensamento era compatível com a sua teologia cristã. Contudo, a estrutura do mundo seria
apresentada pelas palavras de Deus. Para Deus, “falar” significava “criar” e essa era a
gramática da língua de Deus. Assim, quando o homem adapta sua linguagem à de Deus, sua
mente pode representar o mundo como Deus projetou. Essa ideia promoveria uma
correspondência entre o intelecto e o mundo material, e com isso, as regras, a gramática e o
vocabulário poderiam ser únicos, visto que a mente e o corpo humanos e o mundo como um
7 Menção de Flávio Josefo, que cita fragmentos de Berossus preservados em sua obra. Berossus foi sacerdote de Bel, na Babilônia, durante o século III a.E.C. 8 Graves & Patai, 103 e 104. 9Kircher, Arca Noë, Prefatio. 10Liano, 46.
todo são modelados pela Mente Divina, que provê a chave para o conhecimento do mundo
natural.11
Athanasius Kircher era dotado de um vasto conhecimento sobre história antiga e
arqueologia e por isso podia empregar todo seu virtuosismo especulando sobre a arca
construída por Noé bem como sobre todos os detalhes circunstanciais, geográficos e
zoológicos dessa passagem bíblica12.
FIGURA 1
Athanasius Kircher, Arca Noë, 28.
Em seu livro Kircher escreve que, se o homem foi criado a imagem e semelhança de
Deus, as proporções para a Arca deveriam ser aquelas do corpo humano13. Segundo Santo
Agostinho, uma das fontes referenciadas por Kircher,
as medidas de seu comprimento (da Arca), largura e altura são símbolo do corpo humano (...) Com efeito, o comprimento do corpo humano, do alto da cabeça aos pés, é seis vezes a largura que vai do lado direito ao esquerdo e dez vezes a altura, medida no lado, das costas ao ventre. Assim, se medes alguém, estendido de bruços ou de costas, o comprimento, da cabeça aos pés, é seis vezes maior que a largura, da direita para a esquerda ou da esquerda para a direita, e dez vezes que a altura, do solo ao vértice. Por isso,
11Breidbach&Ghiselin, Athanasius Kircher (1602-1680), 991. 12Liano, 46.13Kircher, 33-34.
a arca foi feita de trezentos côvados de comprimento, cinquenta de largura e trinta de altura. (SANTO AGOSTINHO, 2006: 212)
No capítulo em que Kircher escreve sobre as dimensões e mensurações para a construção
da Arca, ele apresenta uma lista de medidas empregadas em sua época, as quais tinham por
base partes do corpo, mostrando também as correspondências entre elas:
FIGURA 2
Athanasius Kircher, Arca Noë, 30.
A analogia com as proporções do corpo humano também pode ser encontrada no Tratado
de Arquitetura de Vitrúvio (?-15 a.C), e Kircher, em sua obra, afirma que, assim como outros,
as mensurações realizadas por Vitrúvio foram “certíssimas e veríssimas em suas legítimas
partes”14. Assim Vitrúvio descreve:
(...) a natureza de tal modo compôs o corpo humano que o rosto, desde o queixo até o alto da testa e a raiz dos cabelos, corresponde à sua décima parte, e a mão estendida, desde o pulso até a extremidade do dedo médio, outro tanto; a cabeça, desde o queixo ao cocuruto, à oitava; da parte superior do peito, na base da cerviz, até a raiz dos cabelos, à sexta parte, e do meio do peito ao cocuruto da cabeça, à quarta parte. Por sua vez, da base do queixo à base das narinas vai a terça parte da altura do citado rosto, e do nariz, na base das narinas, ao meio das sobrancelhas, vai outro tanto; daqui até a raiz dos cabelos temos a fronte, que é também a terça parte. O pé, por seu turno, corresponde à sexta parte da altura do corpo; o antebraço, à quarta; o peito, também à quarta (...) E também (os antigos) retiraram dos membros do corpo humano o sistema de medidas que parece necessário em todas as obras, como o dedo, o palmo, o pé, o côvado, que dividiram com relação a um número perfeito, que os gregos diziam teleon. Os antigos instituíram esse número perfeito, que se diz dez; depois a partir das mãos, encontraram o
14Kircher, 30.
número de dedos, e a partir do palmo instituíram o pé. (VITRÚVIO, 2007: Livro 3, Capítulo 1, 2 e 5)
A imagem abaixo, extraída da obra da Kircher, acompanha uma descrição acerca das
relações da medida chamada de “palmo”.
FIGURA 3
Athanasius Kircher, Arca Noë, 28.
Vitrúvio, em seu tratado, também discorre sobre as medidas do corpo humano inseridas
em uma circunferência ou em um quadrado. Vejamos:
Igualmente, assim como o esquema da circunferência se executa no corpo, assim nele se encontra a figura do quadrado; de fato, se medirmos da base dos pés ao alto da cabeça e transferirmos essa medida para a dos braços abertos, será encontrada uma largura igual à altura, como nas áreas definidas em retângulo com o auxílio do esquadro. (VITRÚVIO, 2007: Livro 3, Capítulo 3)
Após escrever sobre a mensuração do corpo humano como referência às medidas para a
construção da Arca, Kircher apresenta uma figura que mostra um corpo inserido em um
quadrado, explicando suas proporções.
FIGURA 4
AthanasiusKircher, Arca Noë, 34.
Kircher explica que Noé foi tão somente o fabricante da Arca, mas que o próprio Deus foi
o arquiteto, introduzindo em Noé o conhecimento para a construção da Arca15, assim, a Arca
seria uma manifestação concreta da inteligência de Deus16. Kircher era um conhecedor de
diferentes línguas e para escrever sobre as dimensões da Arca ele não se baseou apenas na
Vulgata latina, mas também em versões de livros sagrados em Hebreu, Grego, Árabe, Caldeu
e Siríaco, explicando minuciosamente os detalhes da construção da embarcação.
Segundo o jesuíta, baseado nas informações do segundo capítulo bíblico de Gêneses,
versículos 15 e 16, a arca era feita de madeira gofer, calafetada com betume ou piche17, e
tinha as seguintes medidas: 300 côvados de comprimento por 50 côvados de largura por 30
côvados de altura, totalizando 450.000 côvados cúbicos. O plano básico foi um tipo de caixa 15 Kircher, 23-24. 16Breidbach&Ghiselin, 992.17 Kircher, 20-21.De acordo com Graves e Patai, a madeira de gofer é uma espécie desconhecida, e a que foi utilizada por Noé poderia ter sido a acácia e não o cedro, a mesma que foi utilizada na construção da barca funerária de Osíris. Segundo a tradução portuguesa de João Ferreira de Almeida, em Gênese 7,14, Deus ordenou a Noé que fizesse uma arca de tábuas de cipreste.
retangular, com três níveis cada um, contendo corredores e salas, coberta por um telhado
inclinado com um pico ao longo da linha média da embarcação. No último nível havia
sentinelas por onde os excrementos eram despejados18.
É interessante notar que Santo Agostinho explica que Deus mandou que a Arca fosse
construída de tábuas de madeira quadradas, pois estas significavam a vida plenamente estável
dos santos, visto que o quadrado, de qualquer lado que fosse visto, demonstra sempre
firmeza19.
FIGURA 5
Quadrante da Arca em Cúbitos, Athanasius Kircher, Arca Noë, 35.
FIGURA 6
Sobre as janelas, Athanasius Kircher, Arca Noë, 38
No tratado de Vitrúvio podemos encontrar a descrição para a unidade de medida côvado -
derivada da palavra Cubitus - que seria a medida equivalente a um pé e meio, ou seja, a seis
palmos ou a 24 dedos. Os antigos teriam estabelecido que o seis também seria um número
perfeito pois o pé do homem tem a sexta parte da sua estatura, e com a sua medida,
18 Graves & Patai, 98. 19 Santo Agostinho, 213.
multiplicada por seis, se obtinha a dimensão da altura do corpo. Além disso, o côvado
constaria de seis palmos, equivalente a 24 dedos20. Também Kircher dedica um capítulo de
seu livro – o capítulo VIII – para explicar a medida côvado e suas relações com as partes do
corpo21.
Sobre a calefação, Vitrúvio discorre acerca da preparação dos rebocos em lugares úmidos
e comenta que a aplicação interna e cuidadosa do betume afastaria, das paredes construídas, a
umidade22.
Kircher não se deteve a apenas um modelo para a Arca, mas apresentou algumas
possíveis formas para a embarcação:
FIGURA 7
Athanasius Kircher, Arca Noë, 43.
Acerca da madeira utilizada para a construção da Arca, Kircher discorre sobre a tradução
proveniente de diferentes línguas – entre elas o Hebraico, o Caldeu e o Árabe – do nome do
possível material utilizado para construir a embarcação, que poderia ser o gopher ou o cedro,
além de fazer uma discussão sobre os tipos de plantas e árvores que poderiam ter sido
utilizadas para essa divina construção23.
Segundo Liano, as informações sobre a arca são tão minuciosas quanto se podia esperar
em uma época de impressionante desenrolar da navegação e para Kircher, a Arca de Noé
poderia ser um paralelo sagrado dos galeões que atravessavam o oceano para desbravar novos
20Vitrúvio, 3, 5 e 7. 21Kircher, 28. 22Ibid, 7,4,3.23 Kircher, 19.
mundos. Talvez por isso, Kircher tenha dedicado essa sua obra ao Rei Carlos II da Espanha, a
primeira potência oceânica da época 24.
Godwin afirma que pode existir uma contradição na narração bíblica visto que no livro de
Gênesis pode-se ler acerca da existência de gigantes habitando a Terra naquela época, e que o
próprio Noé poderia ser um gigante. Porém, se a Arca tivesse sido construída seguindo as
dimensões descritas no Gênesis (e projetadas pelo próprio Deus), a embarcação teria medidas
insuficientes para acomodar Noé e sua família, além dos animais. Kircher também se
pergunta se não teria existido os gigantes e se Noé não teria sido um deles, mas ele mesmo
responde que nas dimensões da Arca, assim como nas do altar de Moisés e do templo de
Salomão as medidas se ajustavam às proporções normais do corpo humano, embora afirmasse
que de acordo com as proporções que ele calculara para a Arca, ela seria suficiente para Noé e
sua família, caso eles fossem mesmo gigantes. Segundo o sábio, a noção de gigante estava
relacionada à ideia do filósofo Giambattista Vico, que em sua obra Ciência Nova os descreve
como progenitores ou patriarcas dos gentios25.
Essa concepção acerca das dimensões da Arca e dos gigantes dá suporte a várias
interpretações alegóricas sobre a passagem do Dilúvio, mas não afeta a crença de Kircher na
verdade bíblica literal, assim, a Arca poderia representar não somente o corpo humano
servindo de veículo para a alma que enfrenta suas tempestades ao longo de toda a sua
existência, mas também poderia ser um símbolo da Igreja, onde Noé representaria um
símbolo e uma profecia acerca de Cristo, um mediador entre Deus e o homem pecaminoso26.
Em suma, toda a estrutura da Arca, “figura da Cidade de Deus peregrina neste mundo”,
indicaria sinais de futuras realidades na Igreja27.
Graves e Patai sugerem que certos espíritos errantes também entraram na Arca e foram
salvos, entre eles, dois monstros grandes demais para qualquer compartimento: o Reem, que
foi nadando atrás, descansando o focinho na popa; e o Gigante Og, filho de Hia com a mulher
que depois casou com Cam. Ela teria suplicado a Noé que mantivesse a cabeça de Og acima
da água, permitindo-lhe segurar-se a uma escada de corda. Em gratidão, Og jurou que seria
um escravo para Noé, mas apesar de sua intenção, mais tarde Og retomou seu mau caminho.28
24Liano, 48. 25Liano, 46. 26 Godwin, Athanasius Kircher, 26.27 Santo Agostinho, 213. 28 Graves &Patai, 98-99.
Segundo Kircher, conforme sugere o relato bíblico, após o Dilúvio, Noé encontrou terra
seca no Monte Ararat– onde ainda se encontram os restos da Arca – e onde se estabeleceu
com sua família junto aos animais escolhidos para perpetuarem na Terra, agora com uma
nova geografia.
FIGURA 8
A Arca de Nó no Monte Ararat após as águas baixarem. Athanasius Kircher, Arca Noë, 159.
FIGURA 9
Geografia da Terra pós diluviana. Athanasius Kircher, Arca Noë, 192.
A Arca de Noé foi um dos últimos livros escrito por Kircher e pode-se notar o seu
esforço, assim como o de muitos sábios da época, em comparar e estabelecer cronologias para
a história natural, que envolvia complexos problemas teóricos e teológicos. Kircher levou a
Bíblia ao pé da letra e tentou adaptar o real à história sacra29.Assim, não poderiam ser
diferentes suas referências para a construção da Arca, suas dimensões, materiais utilizados,
classificação e esquemas minuciosos para a acomodação dos animais. Para corroborar suas
ideias humanas e divinas sobre a fabricação da embarcação, Kircher fundamentou suas
explicações arquitetônicas em importantes tratados da época como o de Vitrúvio, e em obras
como a de Santo Agostinho, a fim de inferir maior confiabilidade aos seus leitores.
Referências
AGOSTINHO, Santo. A cidade de Deus contra os pagãos. Parte II. 7ª ed. Trad. Oscar Paes Leme. Bragança Paulista: Editora Universitária São Francisco, 2006. BREIDBACH, Olaf & GHISELIN, Michael T. “Athanasius Kircher (1602-1680) on Noah’sArk: Baroque “Intelligent Design” Theory” em Proceedings of the California Academy of Sciences Vol 57, nº 36 (28 de Dezembro de 2006): 991-1002. FINDLEN, Paula. Athanasius Kircher. The last man Who Knew everything. New York: Routledge, 2004. GODWIN, Joscelyn. Athanasius Kircher. A Renaissance Man and the Quest for Lost Knowledge. London: Thamesand Hudson Ltd, 1979. GRAVES, Robert &PATAI, Raphael. O livro do Gênese. Mitologia Hebraica. Trad. Eduardo Francisco Alves. Rio de Janeiro: Xenon, 1994. KIRCHER, Athanasius. Arca Noë, in três libros digesta. Amsterdã: 1675. LIANO, Ignacio Gomez de. Athanasius Kircher (1602-1680). Itinerario del extasis, o las imagenes de um saber universal. Madrid: Ediciones Siruela, 1998. VITRÚVIO, Tratado de Arquitetura. Tradução, introdução e notas M. Justo Maciel. São Paulo: Martins, 2007.
29 Biblioteca Nacional Mexicana. Disponível em http://bdmx.mx/documento/athanasius-kircher-arca-noe-1602. Acesso em 15/08/2018.