UNIVERSIDADE VEIGA DE ALMEIDA
Diretoria de Pós-Graduação e Pesquisa
Mestrado Profissional em Psicanálise, Saúde e Sociedade
ELIANE GOMES DOS SANTOS
Avaliação Institucional: Impasses no Contexto Universitário Brasileiro
RIO DE JANEIRO
2010
UNIVERSIDADE VEIGA DE ALMEIDA
ELIANE GOMES DOS SANTOS
Avaliação Institucional: Impasses no Contexto Universitário Brasileiro
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Psicanálise, Saúde e Sociedade da Universidade Veiga de Almeida, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre.
Orientadora: Professora Dr.ª Sônia Xavier de Almeida Borges
RIO DE JANEIRO
SETEMBRO 2010
UNIVERSIDADE VEIGA DE ALMEIDA
ELIANE GOMES DOS SANTOS
TÍTULO
Avaliação Institucional: Impasses no Contexto Universitário Brasileiro
Dissertação apresentada ao Curso de Mestrado em Psicanálise, Saúde e Sociedade da Universidade Veiga de Almeida, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre.
Área de Concentração: Psicanálise e Sociedade
Linha de Pesquisa: Psicanálise, Sociedade e Práticas Sociais
Data da Defesa: 24 de setembro de 2010.
Orientadora: Professora Dr.ª Sônia Xavier de Almeida Borges
Banca Examinadora:
_____________________________________________________ Professora Dr.ª Maria da Glória Schwab Sadala - UVA
_____________________________________________________ Professor Dr. Roberto Guimarães Boclin –
Secretaria de Ciência e Tecnologia do Estado do Rio de Janeiro Avaliador do MEC/INEP
RIO DE JANEIRO
SETEMBRO 2010
DIRETORIA DOS PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU E DE PESQUISA Rua Ibituruna, 108 – Maracanã 20271-020 – Rio de Janeiro – RJ Tel.: (21) 2574-8871 - (21) 2574-8922
FICHA CATALOGRÁFICA
Ficha Catalográfica elaborada pelo Sistema de Bibliotecas da UVA Biblioteca Maria Anunciação Almeida de Carvalho
S236a Santos, Eliane Gomes dos
Avaliação institucional: impasses no contexto
universitário brasileiro / Eliane Gomes dos Santos, 2010.
88f. ; 30 cm.
Digitado (original).
Dissertação (Mestrado) – Universidade Veiga de
Almeida, Mestrado Profissional em Psicanálise, Saúde, e
Sociedade, Rio de Janeiro, 2010.
Dedicatória
Ao Magnífico Reitor da Universidade Veiga de Almeida
Mario Veiga de Almeida Junior
Epígrafe
__________________________________________________________________
... que a importância de uma coisa não se mede com fita métrica nem com balanças nem barômetros etc. Que a importância de uma coisa há que ser medida pelo encantamento que a coisa produza em nós.”
(Manoel de Barros)
AGRADECIMENTOS
Ao Senhor Deus que é a razão da minha existência, a quem eu devo a Honra, a Glória e o
Louvor;
Aos meus pais, Maria do Carmo e Helio que mesmo ausentes, continuam em mim, cujo sonho de
me verem Mestre, está se concretizando;
À querida Tia Cléria, minha grande amiga, companheira e incentivadora;
Ao Luiz Fernando Theisen que foi meu primeiro professor em avaliação e grande amigo que me
estendeu a mão num momento muito delicado de minha vida;
À Anunciata que foi a primeira a me dizer uma palavra de incentivo;
À Luamar que me passou muitas informações sobre avaliação e sempre me incentivou;
À Prof.ª Tania Marinho que me ensinou o “funil” e me deu outras dicas;
Às queridas amigas Claudia Tadhéa e Cristina Tanure, além de todas (os) que fazem parte da
nossa turma inicial, todos (as) queridos (as);
Aos Professores Antônio Quinet, Maria Anita e Sônia Borges e Betty Fuks cujas aulas foram
verdadeiros seminários em Paris VIII.
À Diretora dos mestrados, Prof.ª Maria Beatriz e à secretaria dos mestrados representados pela
Elaine, pelo Rafael, pela Eloá e pela Martha que ajudaram com toda gentileza a cuidar tão bem
do nosso mestrado;
Ao Prof. Marcos Braga pelas dicas e conversas sobre avaliação;
Ao Prof. Arlindo pelo interesse demonstrado em prestigiar o meu trabalho;
Ao Prof. Abílio pelos constantes incentivos com palavras de ânimo.
Ao Álvaro, à Leila, à Prof.ª Lúcia, ao Alexandre Kogut, ao Prof. Andrade pela convivência
frutífera na CPA, e tantos mais......
Agradecimentos Especiais: Ao Vice-Reitor, Prof. Tarquínio Prisco Lemos da Silva minha eterna gratidão por sua amizade,
seus grandes ensinamentos. Ele é e será sempre nossa maior referência de Mestre;
Ao Ilustre Prof. Roberto Guimarães Boclin, referência Nacional em Avaliação Institucional,
agradeço pela amizade, generosidade, ensinamentos e pelo apoio incondicional;
À especialíssima amiga de excepcional seriedade e competência, Prof.ª Glória Sadala que confiou
em minhas potencialidades, acreditou em mim quando eu mesma duvidava. Não tenho palavras.
Muito Obrigada;
À querida amiga e orientadora Prof.ª Sonia Borges, que foi aquela que sofreu e se alegrou junto
comigo todo esse tempo com paciência, carinho e extrema competência – foi encantador
trabalhar com ela.
Resumo ______________________________________________________________
O objetivo desta dissertação é fazer uma reflexão sobre a questão da avaliação
institucional no ensino superior brasileiro, tendo como base a teoria da psicanálise e como
particular enfoque, a resistência dos “atores-sujeitos” ao processo e à implantação da cultura de
avaliação. Através da teoria dos discursos de Jacques Lacan foi possível refletir a respeito dos
impasses da avaliação institucional no contexto universitário brasileiro e pensar em propostas
frente aos fenômenos sociais a ela relacionados.
Palavras-Chave: Avaliação Institucional, Psicanálise, discursos
Abstract ___________________________________________________________________
The objective of this thesis is to reflect on the question of institutional evaluation in
Brazilian higher education, based on the theory of psychoanalysis, with the particular focus, the
strength of the "actors-subjects" to the process and the deployment culture of evaluation. By the
theory of Jacques Lacan's speeches could reflect on the dilemmas of institutional evaluation in
the university context and think of Brazilian forward proposals to social phenomena related to it.
Keywords: Institutional Assessment, Psychoanalysis, speeches
SUMÁRIO
INTRODUÇÂO 12
CAPÍTULO 1 A QUESTÃO DA AVALIAÇÃO DO ENSINO SUPERIOR NO BRASIL 15
1.1 Corte Histórico, Concepções Teóricas e Metodológicas Divergentes 24
1.2 Expansão Neoliberal e Qualidade Total: As Mudanças e a Complexidade da
Gestão das Universidades Privadas
39
CAPÌTULO 2 PSICANÁLISE, SUJEITO E LAÇO SOCIAL 45
2.1 Sujeito, Desejo e Grupos 51
2.2 Os Discursos em Lacan 61
CAPÌTULO 3 A AVALIAÇÃO INSTITUCIONAL E SEUS ATORES: UM GIRO NOS
DISCURSOS
69
3.1 Por uma Avaliação mais Qualitativa: Proposta de Giro pelos Discursos
69
3.2 A CPA (Comissão Própria de Avaliação) como Agente da Avaliação 76
CONCLUSÃO
80
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 83
ANEXO 1 87
12
INTRODUÇÃO
O objetivo desta pesquisa é trazer o pensamento psicanalítico para nossa investigação
relativa à autoavaliação institucional no âmbito universitário brasileiro. Procuramos entender,
pelo viés da psicanálise, a dificuldade da criação de uma cultura de avaliação, ponto falho comum
identificado por teóricos e práticos do meio educacional superior.
Como envolver os grupos representativos da comunidade no processo de avaliação?
Como criar uma cultura de autoavaliação e reflexão que possibilite um debate crítico? A gestão
dos projetos acadêmicos não é tarefa nada fácil. Isto se deve, principalmente, à complexidade de
sua particular estrutura ligada ao ensino, à pesquisa e à extensão.
Para delinearmos nosso interesse de estudo descrito acima faremos um recorte da
autoavaliação institucional no Brasil a partir do segundo semestre de 1993, quando a Secretaria
de Ensino Superior do MEC – SESu e as Universidades Brasileiras apresentaram uma proposta
de sistematização e consolidação dos diversos instrumentos de avaliação existentes, que veio a
ser chamado de Programa de Avaliação Institucional das Universidades Brasileiras- PAIUB. Na
sequência investigaremos também a criação do Sistema Nacional de Avaliação do Ensino
Superior- SINAES, em 2004, que implementa a avaliação institucional sistemática, controlada
pelo governo federal.
Como dissemos inicialmente, a pesquisa em foco visa estudar como a psicanálise pode
colaborar no campo da avaliação institucional. Para o desenvolvimento do nosso trabalho, além
de um extenso percurso teórico na área dos estudos sobre avaliação, utilizaremos, para elucidação
destas questões, as literaturas específicas da avaliação bem como as da teoria psicanalítica,
particularmente, os conceitos de sujeito, inconsciente, desejo e laço social. Para tanto, contamos
com uma bibliografia que contempla o tema, além de nossa vivência profissional em uma
instituição privada de ensino superior na qual trabalhamos há dez anos.
Essa instituição, uma universidade, começou há setenta e seis anos seu longo caminho em
busca da qualidade, tendo contratado, por volta do ano de 2003, consultores para desenvolver seu
Plano Estratégico de Desenvolvimento. Após isso, iniciou ações para a confecção do Plano de
Desenvolvimento Institucional- PDI, no qual trabalhei inicialmente, junto ao coordenador
designado para tal tarefa. Aprovados o PDI, o Plano Pedagógico Institucional - PPI e o Plano
Pedagógico de Cursos – PPC pela administração superior e pelo MEC, iniciamos a primeira
13
grande avaliação institucional, contemplando as dez dimensões estabelecidas pelo SINAES, das
quais falaremos mais adiante.
Como resultado da avaliação supra mencionada, a Comissão Própria de Avaliação - CPA,
da qual sou membro, produziu relatório de quatrocentos e setenta páginas. A análise dos
indicadores e a grande pesquisa documental revelaram retrato bem mais nítido da nossa
Instituição. Aquele relatório foi produzido no período de 2004 a 2006 e é utilizado, ainda hoje,
como instrumento consultor e orientador de decisões pertinentes à gestão universitária,
considerando-se tanto a área acadêmica como a administrativo-financeira.
Contudo, cabe ressaltar que a experiência desses anos com a autoavaliação, não tem sido
ainda suficiente para entendermos alguns pontos obscuros no processo por nós vivenciado. Um
dos aspectos mais polêmicos foi a dificuldade inicial de adesão dos professores e funcionários ao
próprio processo de avaliação, problema bastante generalizado nas IES como revela a literatura
da área.
Ao longo do processo avaliativo e, consultados os teóricos em avaliação, foi possível
apreender e apontar a importância da criação de uma cultura de avaliação como fator
fundamental para o sucesso da avaliação institucional. A criação da cultura de avaliação pode
colocar em movimento os processos e implantar transformação de ordem qualitativa. Essa visão é
muito importante, como destacou a Diretora de Avaliação da Educação Superior, do Instituto
Nacional de Educação e Pesquisas – INEP/MEC, Iguatemy Maria de Lucena, no 22º Encontro do
Fórum Brasileiro de Pró-Reitores de Graduação –FORGRAD:
“A autoavaliação é um procedimento de grande importância no
processo, já que propicia à instituição uma cultura de avaliação que permite gerar
a compreensão completa da missão e da finalidade das IES. Além disso, a
avaliação interna proporciona às instituições o exercício de analisar as suas
ações, levando em conta suas singularidades, indispensável se o propósito é
construir uma cultura de avaliação”.
Por ser uma prática encarada como um processo, a avaliação institucional no contexto
universitário, deve ser capaz de provocar novos debates na comunidade acadêmica, colaborando
na revisão dos comportamentos e na reestruturação das práticas administrativas pelo estímulo à
interação e ao diálogo entre os atores para melhor conhecimento da instituição, como um lugar de
construção para um ensino melhor.
14
É oportuno dizer que algumas IES, enquanto instâncias de poder tendem a reduzir o seu
processo autoavaliativo à função de controle e fiscalização, ampliando assim o papel do Estado
no fazer da instituição. Essa inclinação para o controle e para a regulação é inerente ao poder, faz
parte de sua natureza. Contudo, o problema maior está na resistência dos atores-sujeitos
(principalmente professores) ao processo avaliativo devido, certamente, ao caráter punitivo,
historicamente construído que amplia a grande dificuldade de se estabelecer nas instituições de
ensino superior uma cultura de avaliação.
Só o fato de estarmos diante de uma baixa adesão dos atores ao processo avaliativo
sentida em todas as IES, públicas ou privadas, atribuída ao conceito punitivo implantado ao longo
dos anos, não basta, para explicar um silêncio, um enigma da avaliação, algo significativo que a
simples mensuração não alcança.
Iniciamos nossa investigação, tomando como base o modelo de avaliação que é o
apresentado pelo Prof. Roberto Guimarães Boclin, em seu livro Avaliação Institucional: Quem
Acredita? (BOCLIN, 2006). O autor fala: “o modelo de avaliação institucional baseado em
informações mensuráveis de natureza qualitativa e quantitativa, minimizando conclusões
subjetivas, sendo contínuo na medida da construção de uma política institucional interna de
avaliação”. Com certeza, esse modelo formado por indicadores de desempenho, é o que mais se
aproxima do ideal, principalmente, para efeitos de gestão de qualidade que é tão primordial nos
dias atuais. Podemos observar que há tendências para dois modelos de avaliação: o qualitativo e o
quantitativo. Ao longo desta dissertação buscaremos identificar estas tendências e seus limites;
considerando, de modo particular, a questão do envolvimento dos atores-sujeitos neste processo.
15
CAPÍTULO I
A QUESTÃO DA AVALIAÇÃO DO ENSINO SUPERIOR NO BRASIL
O objetivo deste capítulo é fazer uma reflexão histórica, política e metodológica da
avaliação institucional do ensino superior privado no Brasil, a partir do segundo semestre de
1993, quando a Secretaria de Ensino Superior do MEC - SESu e as Universidades Brasileiras
apresentaram uma proposta de sistematização e consolidação dos diversos instrumentos de
avaliação existentes que veio a ser chamado de Programa de Avaliação Institucional das
Universidades Brasileiras - PAIUB, até a criação do Sistema Nacional de Avaliação do Ensino
Superior - SINAES que implementa a avaliação institucional sistemática, controlada pelo
governo federal. Este percurso nos possibilitará apreender melhor, não só as principais questões
relativas à criação da cultura de avaliação como também elucidar-nos qual a contribuição da
psicanálise para o assunto em tela.
É consenso no meio educacional que o desenvolvimento de um processo democrático de
avaliação institucional nas instituições de ensino superior, envolve muitos desafios.
A nova sistemática de avaliação institucional marcada pela criação do SINAES,
representa para as universidades uma possibilidade de construção de processos democráticos de
autoavaliação. Esses processos podem ter como base os princípios de autonomia de liberdade
acadêmica, e de construção de uma cultura avaliativa dirigida para a gestão.
Por um lado a visão do Governo relativa à educação superior e à avaliação está fortemente
ligada a interesses econômicos e políticos, sofrendo a influência de uma política restritiva do polo
público estatal e de valorização do polo público-mercantil, que levou à expansão do setor privado
e que detém hoje 71,7% das matrículas na educação superior. (BRASIL, 2005).
Por outro lado, as universidades, em posição diferente, defendem uma avaliação
democrática e participativa. Nesse caso a avaliação é assumida como um organizador qualificado
que traz em si o compromisso social com a garantia de padrões de excelência na formação e na
produção de conhecimentos, com a ampliação das oportunidades de acesso a todos que possam se
beneficiar do ensino superior e com a formação de consciência crítica e melhoria das condições
de vida da sociedade. (DIAS SOBRINHO, 2004).
Esses diferentes entendimentos sobre a função da universidade são fatores de tensão
acadêmico-institucional, que se fazem presentes na polêmica sobre as concepções e modelos de
16
avaliação da produção acadêmica e, em especial, sobre os indicadores e critérios utilizados para
estimá-la. Mas que indicadores são esses? Como utilizá-los?
Recorremos ao teórico e profissional especializado em educação e avaliação, professor
Roberto Boclin, que em seu livro Avaliação Institucional: quem acredita? (BOCLIN, 2006).
esclarece a questão dos indicadores:
Um indicador deve informar algo de importante sobre o que está
ocorrendo num domínio complexo, sendo mais eficaz, quando usado de modo
combinado com outros. Os melhores são elaborados para fornecer medidas que
se reforcem mutuamente ou que, associados, ilustrem com precisão um fato.
(EWELL, PETER and JONES, DEMIM, P.Indicators of “Good Pratice” In
performancein Funding Higher Education: A Critical Analysis of Tennessee’s
Experience. Boulder, Colorado: National Center for Education Management
Systems. ED 310655. 176pp. MF-01: PC-08,1986 apud BOCLIN,R,2006,
p.42).
Os indicadores de qualidade utilizados na Educação são particularmente úteis com relação a
três objetivos principais:
- comparar performances;
- monitorar a operação permanente; e
-verificar com clareza os efeitos de intervenção durante a execução.
(...) “Como qualquer instrumento de política, os sistemas de
indicadores institucionais não são uma panacéia. No nível mais amplo, sua
utilização adequada exige um planejamento cuidadoso bem como uma atenção
significativa para o modo como a informação resultante está alinhada aos valores e
orientações da instituição. Mais especificamente, construir bons indicadores exige
uma atenção considerável para com os estímulos e desestímulos específicos para a
ação criados pelo sistema resultante em todos os níveis da comunidade
institucional”. (BOCLIN R, 2006, p. 46.)
Os modelos atuais de gestão universitária são produzidos para obter informações rápidas
devido às aceleradas mudanças. Essa necessidade gerencial demanda indicadores que funcionem
como instrumentos de gestão. Geralmente são utilizados indicadores de natureza quantitativa que
produzem grande número de formulários estatísticos para controle prático e rápido.
17
Se o que se deseja é ampliar as questões internas no sentido de identificar problemas que
não aparecem em simples estatísticas, deve-se adotar uma filosofia mais ampla de acordo com a
complexidade universitária, identificando causas e efeitos e levando em conta o ensino, a
pesquisa e a extensão.
Indicadores de qualidade são quocientes entre dados de variáveis, sempre buscando uma
função comparativa. Se o que se quer é levar em conta a qualidade, um dado estatístico simples,
não é tão simples assim. Pode ter complicações profundas nos processos de decisão.
Quando se decide criar e utilizar indicadores de qualidade, deve-se colocar o
aperfeiçoamento contínuo acima dos rápidos ajustes para soluções instantâneas. A aplicação
desses indicadores deve ser continuada e comparativa, pois os ambientes são diversos, os
momentos diferentes e há grande diversidade.
Características dos Indicadores QUANTITATIVOS
Características dos Indicadores QUALITATIVOS
Descrevem de forma objetiva um determinado aspecto da realidade (uma única variável ) . Ex: nº de vagas na universidade, nº de matrículas.
Associa um conjunto de variáveis e uma média entre elas. Ex: matrículas de acordo com a renda e escolaridade (faz cruzamento entre renda e educação).
São indicadores para auxiliar a gestão. São conclusões rápidas
São indicadores para comparações globais. Autoavaliação do desempenho da gestão
O processo genuíno de autoavaliação deve levar em consideração os indicadores internos
e os externos, sendo que, deve-se dar maior ênfase aos indicadores internos construídos com a
participação dos atores e com a preocupação de fazer uma análise histórica e comparativa das
avaliações anteriores.
Em seguida, como exemplo, um projeto para autoavaliação institucional com indicadores
qualitativos e com levantamento de dados quantitativos, obedecendo às normas do Sistema
Nacional de Avaliação – SINAES (autor: Roberto Boclin).
18
DIMENSÃO 2 - A Política de Ensino,Pesquisa, Pós-Gra duação e Extensão
NÚCLEO BÁSICO COMUM
- Concepção do currículo e avaliação de sua adequaç ão às Diretrizes Curriculares, à Missão da Universidade, ao mercado profissional, às inovações na área e às necessidade s e interesses dos alunos.
- Métodos e práticas pedagógicas (inclusive uso de EaD) para a construção do conhecimento e formação do profission al;
- Fatores de melhoria do ensino (qualificação docen te, apoio ao estudante, à interdisciplinaridade, às inovações di dático-pedagógicas e uso das novas tecnologias no ensino).
CONCEPÇÃO DO
CURRÍCULO
Coordenadores e professores que consideram a concepção do currículo baseada em pesquisa do conhecimento
Coordenadores e professores que consideram a concepção do currículo baseada no mercado de trabalho
ADEQUAÇÃO DO
CURRÍCULO
% Coordenadores e % de professores que consideram a concepção do currículo adequada às Diretrizes Curriculares
% de Coordenadores e % de professores que consideram a concepção do currículo adequada aos Interesses dos Alunos
A POLÍTICA PARA O
ENSINO
% de Coordenadores e % de professores que consideram a concepção do currículo adequada às Inovações na área
% de Coordenadores e de Professores que consideram a concepção do currículo adequada às finalidades profissionaliz antes da Instituição (Missão)
SATISFAÇÃO COM O ENSINO
% Alunos satisfeitos com o curso (por curso e Campus)
% Alunos e Docentes satisfeitos com a Coordenação do Curso
% Coordenadores satisfeitos com suas equipes de professores
% Coordenadores satisfeitos com o sistema de avaliação do aprendizado dos alunos
% de Coordenadores e de professores satisfeitos com a distribuição das disciplinas pelos períodos do curso
% Alunos satisfeitos com as disciplinas
% Alunos satisfeitos com congressos, palestras, seminários, eventos e visitas orientadas proporcionados pelo seu curso
Média global das respostas dos alunos e dos professores ao bloco das disciplinas , por curso e por campus
Média global das respostas dos alunos e dos professores ao bloco turma , por curso e por campus
Média global das respostas dos alunos ao bloco dos professores , por curso e por campus
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MÉTODOS E PRÁTICAS
PEDAGÓGICAS
% de Docentes e de Alunos que declararam usar/ter seminários, congressos, palestras, conferências e visitas orien tadas (atividades complementares) regularmente/sempre
% de Docentes e de Alunos que declararam usar/ter trabalhos em grupo (projetos, pesquisas, apresentações, etc.) regularmente/sempre
% de Docentes e de Alunos que declararam usar/ter atividades multidisciplinares regularmente/sempre
% de alunos que já cursaram disciplinas on line
Coeficientes de correlação entre as respostas de Professores e Alunos sobre os métodos e práticas pedagógicas , por Curso
FATORES DE MELHORIA DO
ENSINO
% de Docentes que declararam ter disposição para aprender e usar novas tecnologias educacionais regularmente ou sempre
Média global das respostas dos alunos, coordenadores e professores ao fator 1 professor , por curso, centro e campus
Média global das respostas dos alunos, coordenadores e professores ao fator 2 métodos de ensino , por curso, centro e campus
A POLÍTICA
PARA O ENSINO
Média global das respostas dos alunos, coordenadore s e professores ao fator 3 alunos (seleção, recuperação, avaliação) , por curso e campus Média global das respostas dos alunos, coordenadores e professores ao fator 4 condições físicas, por curso, centro e campus
Média global das respostas dos alunos e professores ao fator 5 coordenação do curso
Ranking dos 5 fatores para a melhoria do curso para os Coordenadores Professores e Alunos (por curso)
NUCLEO TEMAS OPTATIVOS
- Adequação do sistema e da periodicidade das revis ões curriculares
- Adequação dos currículos e práticas pedagógicas a o perfil dos egressos
REVISÕES CURRICULARES
% Coordenadores que atualizaram currículo e/ou programas de disciplinas nos últimos dois anos (pelo total de cursos)
% Docentes satisfeitos com oportunidades de participar de revisões curriculares e ou programas das disciplinas
ADEQUAÇÃO DO CURRÍCULO AO PERFIL DO
EGRESSO
% alunos concluintes satisfeitos com a congruência entre o que aprendeu e o que precisou para seu estágio
% alunos concluintes que se sentem habilitados a atuar profissionalmente na área em que se formou
% de alunos concluintes, de professores e de coordenadores satisfeitos com a relevância e com a carga horária atribuídas à Monografia ou TCC
- As atividades de extensão são consideradas estrat égicas para a formação do conhecimento na Universidade?
- A extensão universitária tem conceito bem definid o? É
20
A POLÍTICA DE
EXTENSÃO
NÚCLEO BÁSICO COMUM
entendida como atividades da comunidade acadêmica q ue levam suas competências para além da sala de aula, de for ma integrada, planejada e coordenada?
- Existe um órgão que se incumbe das ações de exten são? Qual a sua posição hierárquica? Que relações o órgão mant ém com a graduação?
- Existem convênios firmados com empresas para a of erta de cursos de extensão? Quais? Quantos?
% Alunos, Docentes e Funcionários satisfeitos com oportunidades de participar em ações de extensão universitária.
NÚCLEO
DE TEMAS
OPTATIVOS
- Que programas são desenvolvidos dentro do escopo da extensão?
- As atividades de extensão oferecem tratamento prefe rencial a ex-alunos?
- Existem instalações adequadas a programas de exte nsão? Descreva-as.
- As atividades de extensão têm orçamento prévio se mestral ou por atividade ou ambos?
POLÍTICA
DE ENSINO,
PESQUISA
PÓS-
GRADUA
ÇÃO E
EXTENSÃO
NÚCLEO BÁSICO COMUM
- Quais são os Programas de Mestrado em operação?
- Quais as suas situações no sistema de avaliação d a CAPES?
- Cursos Lato Sensu oferecidos entre ... a ...
- Área de conhecimento considerada prioritária para fins de Pós-Graduação
- Cursos de Mestrado e Doutorado estão programados para (período)
% de Alunos satisfeitos com as oportunidades de par ticipação em iniciação científica A 8
% de Professores que participaram de grupos de pesquisa e Iniciação Científica
% de Professores satisfeitos com as oportunidades de participação em grupos de pesquisa e/ou iniciação científica
NÚCLEO
DE TEMAS OPTATIVOS
- Relação entre a Pós-Graduação e as pesquisas em and amento, por área do conhecimento, coordenador e ano de iníc io;
- Pesquisas que obtiveram financiamento externo em ... a ....
DOCUMENTOS, DADOS
INDICADORES
Quadro dos Cursos segundo ano de criação e situação de autorização e reconhecimento pelo MEC => % cursos reconhecidos e % cursos autorizados
% cursos consolidados = +8 anos, captação estável, notas C ou melhor
21
% cursos promissores = com até 5 anos de funcioname nto, captação crescente ou estável, boa avaliação pelo M EC (Enade ingressantes, Conceitos comissões)
Evolução dos resultados das avaliações de curso do MEC
POLÍTICA DE ENSINO, PESQUISA PÓS-
GRADUA
ÇÃO E
EXTENSÃO
ENSINO
Nº de professores do curso / Nº de alunos do curso
Nº de disciplinas do curso / Nº de professores do curso
Nº de alunos do curso / Nº de turmas do curso
Quadro dos cursos por nº alunos, professores, disciplinas e turmas diurnas e nº turmas em cada campus (em.. e ...)
EXTENSÃO
Evolução do nº de cursos e de matrículas de extensão de ... a ...
Quadro dos cursos de extensão de ... a ... com o total dos alunos e os % de alunos Universidade, ex-alunos e alunos externos
% de professores externos e de professores da Universidade nos cursos de extensão (pelo total de professores) de ... a ...
Evolução do nº de participantes em Seminários, Eventos, Workshops promovidos pela Universidade por área de conhecimen to de ... a ...
% de conferencistas convidados por área de conhecimento de ... a ...
Nº de conferencistas estrangeiros / Total de conferencistas (de ... a ...)
Relação de serviços prestados através de projetos, clínicas e de atendimento
Relação de convênios para atividades de extensão por Campus
PÓS-GRADUAÇÃO. E PESQUISA
Utilizar critérios e resultados de avaliações da CAPES para os Mestrados
Taxa de produtividade docente (no. publicações / no. docentes) por Programa de Pós-Graduação
% de alunos de iniciação científica por projeto de pesquisa, curso
Relação de pesquisas (IC e outras) realizadas fora do âmbito dos Mestrados (relacionar título, coordenador, equipe e datas de início e termino)
Evolução dos cursos e das matrículas de Especialização de ...a ...
% de alunos externos e de alunos e ex-alunos da Universidade nos cursos de Especialização (pelo total dos alunos de extensão) de ... a ...
% de professores externos e de professores da Universidade nos cursos de Especialização (pelo total de professores) de ... a ...
22
DIMENSÃO3: A Responsabilidade Social da Universida de
NÚCLEO BÁSICO COMUM
- Importância das ações da IES para o desenvolvimen to regional e nacional, campus a campus; - relações com o setor público, com o setor produti vo, com o mercado de trabalho e com instituições sociais, cul turais e educativas de todos os níveis.
- ações voltadas ao desenvolvimento da democracia, promoção da cidadania, de atenção a setores sociais excluído s, políticas de ação afirmativa etc.
NÚCLEO DE TEMAS
OPTATIVOS
- Critérios e ações para o atendimento de portadores de necessidades especiais e para a inclusão de setores ou grupos sociais discriminados
- Ações vinculadas a Escolas, Cooperativas, ONGs, C entros de saúde, Incubadoras, etc.
DOCUMENTA-ÇÃO, DADOS
E INDICADORES
% Funcionários beneficiados com plano de saúde por campus
% Funcionários beneficiados com bolsas de estudos por campus
RESPONSABILI DADE SOCIAL
DA UNIVERSIDADE
Alunos beneficiados com bolsas integrais do PR0UNI / Total de Aluno
No. de alunos com necessidades especiais/ total de alunos por campus
Nº de atendimentos (ações judiciais, etc.) do Setor de Prática Jurídica pelo total de solicitações recebidas (período ......)
Total de atendimentos subsidiados da Clínica de Total de solicitações recebidas (período ...)
Ações da Pró-Reitoria Comunitária desde ...
Análise: Esse projeto contempla as dez dimensões do SINAES, sendo que escolhemos
como exemplo duas dimensões: A Política de Ensino, Pesquisa, Extensão e Pós-Graduação-
Indicadores da dimensão 2(dois) e A Responsabilidade Social da Universidade- Indicadores da
dimensão 3(três). Este projeto é um exemplo bem sucedido de avaliação qualitativa e
quantitativa. Para melhor explicar trouxemos o que o autor diz sobre sue projeto:
“É justamente nessa linha de raciocínio que o projeto se
estrutura, propondo a construção de um conjunto de indicadores de
desempenho que não se confunda com a mensuração simples e, mais
precisamente, com uma abordagem docimológica, em que a medida é o
preâmbulo da avaliação. Dentro desta presunçosa proposta de um modelo de
avaliação institucional configura-se o que entendemos por estreita relação
entre a avaliação e a pesquisa.
23
Se considerarmos, como Vianna (2000, apud BOCLIN, 2006),
os aspectos que distinguem a avaliação da pesquisa, podemos definir a
avaliação como a aplicação dos métodos da pesquisa na solução de problemas
específicos de uma área.
“Sem dúvida, existe um traço comum entre pesquisa e a avaliação,
qual seja, a busca do conhecimento para a compreensão dos fenômenos
educacionais e a solução dos seus problemas “(Stufflebeam,1976, idem). “A
pesquisa é julgada em função da sua validade interna, e a avaliação pela sua
utilidade e credibilidade.” (Glass e Worthen ,1971, idem).
24
1.1 Corte Histórico e Concepções Teóricas e Metodológicas Divergentes
Historicamente, a avaliação como instrumento da Reforma Universitária (instituída pela
Lei 5540/68), provocou mudanças nas áreas centrais do Ensino Superior como financiamento,
gestão institucional e autonomia universitária, explicitadas na Constituição de 1988,
estabeleceram novas bases para se pensar o ensino superior. A reforma de1968 torna-se um
marco referencial que influenciou a concepção de qualidade dos anos seguintes. Sobre a
importância da avaliação Dias Sobrinho escreve:
"A avaliação é um instrumento fundamental da reforma do Estado.
Nenhum Estado moderno desenvolvido pode abrir mão da avaliação" ( DIAS
SOBRINHO, 2003, p.97). Isto significa que a avaliação é um instrumento
valioso de diagnóstico interno (autoavaliação) e externo, que vem adquirindo
uma importância crescente, principalmente a partir dos anos 90, que "(...) podem
ser chamados de década da avaliação" (DIAS SOBRINHO, 2003, p. 98).
De acordo com Cunha, a tradição no Brasil aponta que o ensino estatal prevalece e que é
centralmente controlado. Essa característica de Estado controlador, segundo o autor, permeou o
ensino superior brasileiro desde o Império até o início do século XX (CUNHA, 2004). Que
função tem o controle e quais os resultados que se obtêm com este modelo centralizador? É
importante esclarecer que historicamente a avaliação das instituições segue duas linhas: a da
emancipação e a da regulação.
A primeira, que tem a sua origem em algumas universidades na década de 1980,
pressupõe o ato autônomo da universidade em prestar contas à sociedade, e que a avaliação é, por
outro lado, uma das ferramentas de gerenciamento e de tomada de decisões das instituições de
ensino.
A segunda, tem como base a ideia neoliberal de que o papel do estado em relação à
educação consiste em avaliar as instituições de ensino.
Ao dizer que, na avaliação participativa, a qualidade da educação deve ser negociada com
os atores sociais participantes do processo educacional, Luis Carlos de Freitas faz uma descrição
das duas linhas:
[...]“uma disputa entre duas grandes políticas públicas: as chamadas
neoliberais, conduzidas pelo PFL e pelo PSDB, e as que chamaríamos democráticas e
participativas, conduzidas pelo PT e seus aliados. [...] nas políticas neoliberais a
25
mudança é vista como parte de ações gerenciais administradas desde um “centro
pensante”, técnico, ao passo que a tendência das políticas participativas é gerar
envolvimento na “ponta” do sistema. (FREITAS, 2005, p. 913-4).
A diferença básica entre as duas linhas é a instância onde ocorre a significação do que é
qualidade. Na visão neoliberal, os técnicos das agências estatais é que definem o que é qualidade
bem como os indicadores a serem utilizados para aferi-la.
Na avaliação participativa e emancipatória a definição da qualidade e dos indicadores é
negociada com os agentes do processo (professores, administrativos, alunos). No Brasil, essas
duas linhas da avaliação são facilmente identificáveis em dois momentos das políticas de
avaliação estatal das Instituições de Educação Superior.
A avaliação com enfoque regulatório, implantada na segunda metade da década de 1990,
pelo então ministro da educação Paulo Renato de Souza e a avaliação emancipatória - estrutura
do PAIUB, instituído pela Portaria 1.855 de 30 de dezembro de 1994.
No início do governo Luís Inácio Lula da Silva foi instalada a Comissão Especial de
Avaliação da Educação Superior - CEA, com o objetivo de elaborar uma nova sistemática de
avaliação. A proposta da CEA tinha como pressuposto que a avaliação deveria ser marcadamente
emancipatória/formativa. O processo de elaboração da lei 10.861/2004, que instituiu o Sistema
Nacional de Avaliação da Educação Superior, foi marcado por conflitos internos ao governo em
relação ao papel que a avaliação deveria atender prioritariamente: a formação ou a regulação. Na
redação final da citada lei, vigorou a visão que prioriza a finalidade de regulação.
A divergência em relação ao papel da avaliação não se encerrou com a promulgação da
“lei do SINAES”. Pode-se considerar que sempre houve pouca clareza no que se refere à
definição de políticas para o ensino superior, o que não se estabeleceu sem consequências. E isto
se somou aos incentivos diretos e indiretos à iniciativa privada, aliados à representação
majoritariamente privatista do Conselho Federal de Educação- CFE proporcionaram a inversão
da predominância das IES públicas no sistema. Estas passaram a ser minoritárias em relação à
proporção de estudantes matriculados. Tal quadro legou, ainda, um aparato regulatório pouco
eficaz, baseado mais no lobby empresarial do que em critérios voltados para o interesse
público.Diante desse quadro do setor educacional brasileiro, a expansão privada do ensino
superior passou a ser de grande relevância para estudos e pesquisas sobre o processo de regulação
deste setor pelo Estado. Entre 1994 e 2004, o número de estudantes matriculados em cursos de
graduação cresceu em 250,67%, passando de 1.661.034 para 4.163.733. Uma expansão
26
notadamente do setor privado de ensino, que responde por 71,7% das matriculas em cursos de
graduação (BRASIL, 2005).
O aumento das demandas educacionais do ensino superior indicou a necessidade de sua
ampliação, tendo em vista maior possibilidade de acesso, particularmente para a classe média.
Desta forma ficou claro às IES, especialmente às particulares, como veremos no decorrer deste
trabalho, a necessidade de tornar mais eficientes os processos das atividades universitárias assim,
como empreender maior eficácia e rendimento em suas ações.
A busca pela qualidade foi estabelecida ainda mais fortemente pela nova ordem do
mundo moderno, que vem indicando que a avaliação institucional do ensino superior nas
universidades brasileiras é necessária e imprescindível como forma de manter o nível de
qualidade científica e acadêmica de acordo com os padrões internacionais reconhecidos.
Entende-se que os conceitos de avaliação e qualidade são construídos historicamente.
Sendo assim, é de suma importância compreender, em seus fundamentos teóricos, as
transformações da educação superior nos últimos anos, considerando os processos de avaliação
adotados pelo governo e pelas universidades, de modo a identificarmos as tensões e como se
estabeleceu sua configuração atual.
Na perspectiva de Dias Sobrinho (2004), tanto a educação superior, quanto a avaliação,
representam fenômenos sociais que cumprem determinados papéis e respondem às demandas que
se impõem a partir das circunstâncias históricas.
As recentes transformações supracitadas ensejaram uma gama de tendências e
possibilidades no que diz respeito às políticas educacionais, isso é, melhor planejamento da
estrutura educacional, organização de toda a estrutura da educação desde o ministério até as salas
de aula, especialmente a partir de orientações das agências multilaterais de fomento ao
desenvolvimento. No final dos anos sessenta (1960), a linha de atuação do Banco Internacional
para a Reconstrução e o Desenvolvimento-Banco Mundial BIRD, passou a ter como um de seus
focos principais a área educacional, sobretudo nos países latino-americanos, o que se intensificou
sobremaneira nos anos 1980-90. Desde então, as diretrizes do Banco Mundial vêm sendo
utilizadas como fundamento principal para as políticas educacionais brasileiras, no contexto da
reforma do Estado e da educação. Em síntese, são elas: 1) focalização do gasto público no ensino
básico, com ênfase no ensino fundamental; 2) descentralização do ensino fundamental, o que vem
sendo operacionalizado através do processo de municipalização do ensino; 3) estímulo à
privatização dos serviços educacionais e à criação de verdadeiras indústrias em torno das
atividades educacionais; 4) ajuste da legislação educacional no sentido da desregulamentação dos
27
métodos de gestão e das instituições educacionais, garantido ao governo central maior controle e
poder de intervenção sobre os níveis de ensino (via sistemas nacionais de avaliação e fixação de
parâmetros curriculares nacionais, por exemplo), mas sem que ele mesmo participe diretamente
da execução de tais serviços. Em linhas gerais, a interferência do Banco Mundial na educação
tem como objetivo promover os ajustes de interesse do grande capital internacional (sobretudo o
financeiro) com relação ao Estado brasileiro. Busca adequar o conjunto das políticas educacionais
num plano mais amplo, que é o da atuação do Estado, como um todo, frente aos desígnios do
processo de acumulação mundial de capital. A tal processo chamou-se de Reforma do Estado.
No documento "La Enseñanza Superior: Las Lecciones Derivadas de La Experiencia", o
BIRD apresenta quatro orientações principais no que diz respeito à reforma educacional no nível
superior de ensino:
I. Fomentar a maior diferenciação das instituições, incluindo o desenvolvimento de
instituições privadas;
II. Proporcionar incentivos para que as instituições públicas diversifiquem as fontes de
financiamento, por exemplo, a participação de estudantes nos gastos e a estreita
vinculação entre financiamento fiscal e resultados;
III. Redefinir a função do governo no ensino superior;
IV. Adotar políticas destinadas a priorizar os objetivos de qualidade e equidade. (BIRD,
1995, p. 4).
O conteúdo do documento acima referido identifica na iniciativa privada um setor com
grande potencial de atuação no ensino superior, constituindo "elemento importante de alguns dos
sistemas de ensino pós-secundário mais eficientes que existem atualmente no mundo em
desenvolvimento". Sugere, ainda, que o Estado deve migrar de uma posição de controle direto do
sistema de ensino superior para o oferecimento de um ambiente de políticas favoráveis às
instituições (BIRD, 1995, p. 6).
A Organização Mundial do Comércio - OMC incluiu, em 1999, a educação, entre os
serviços que devem ser regulados pelo Acordo Geral sobre Comércio em Serviços - AGCS -
GATTS - em sua sigla na língua inglesa. Esse acordo multilateral, aprovado pelos estados
membros da OMC, em 1994, prevê a liberalização progressiva de serviços em âmbito
transnacional. A perspectiva da OMC é transformar o campo educacional em setor comercial de
abrangência global, regido essencialmente pelas forças do mercado.
28
Uma política educacional pautada em demandas de mercado, contudo, vem suscitando
alguma polêmica. Para exemplificar - Silva Junior (2005) compreende que o paradigma proposto
pelas agências multilaterais, como é o caso do Banco Mundial e da OMC, caracteriza uma visão
de desenvolvimento em que a educação não tem por objetivo elevar a condição humana, mas se
constituir num instrumento de adaptação à realidade e consequente sobrevivência em sua
configuração presente.
A literatura pesquisada sobre avaliação institucional no Brasil revelou-nos dois pontos de
vista que retratam distinções de conceito relativas à universidade e à educação: as já
mencionadas avaliações participativa e emancipatória e a regulatória. Para Dias Sobrinho
(1998), esses dois enfoques não são sempre e necessariamente excludentes, podendo ser
complementares e se interpenetrarem. Uma abordagem de "avaliação institucional", para Dias
Sobrinho, "vem de cima para baixo e de fora para dentro", sendo expressão de políticas
neoliberais fomentadas por organismos internacionais como o Banco Mundial. Seu eixo
dominante - a lógica de mercado visa maior produtividade e eficiência, diferenciação e
hierarquização das instituições.
O outro ponto de vista, aqui mencionado como autoavaliação, seria resultante dos
princípios e características conjecturadas pelo Programa de Avaliação das Universidades
Brasileiras - PAIUB, à época de sua implantação, durante o governo Itamar Franco (1993-1994).
Para viabilizar a proposta do PAIUB, que viria a ser fundamental para o alcance da
qualidade nas IES, foi constituído um comitê com especialistas em avaliação e composto por
representantes do Ministério da Educação, de fóruns das universidades e integrantes de
associações. Tendo como ponto de partida uma proposta da Associação Nacional de Dirigentes
de Instituições Federais de Ensino Superior- ANDIFES. Após intenso trabalho, os princípios, os
objetivos e as linhas metodológicas da avaliação institucional foram sistematizados pela adoção
de um documento básico do PAIUB.
Já no início de 1994, 59 universidades integraram-se voluntariamente ao PAIUB, com
projetos autônomos de avaliação institucional aprovados e financiados. No ano seguinte, já eram
93 universidades agregadas ao programa, que representava três quartos das universidades
brasileiras. Devido a essa adesão significativa, constatou-se que havia uma cultura de avaliação
dispersa, faltando somente um programa que possibilitasse a integração dos vários mecanismos
de aferição.
29
O PAIUB não apresentou políticas externas que prejudicassem o desempenho e a
autonomia das instituições. Libertou-se das características de caráter regulador, princípios de
controle e perspectivas mercadológicas de enfoque quantitativo.
Para Ristoff (2000, p. 40-50) "o PAIUB se baseou nos seguintes princípios: o da
globalidade, comparabilidade, respeito à identidade institucional, não premiação ou punição,
adesão voluntária, legitimidade e continuidade".
Com a mudança política que instituiu o Exame Nacional de Cursos - ENC e posterior
retirada do apoio do Ministério da Educação - MEC, o PAIUB transformou-se em um processo
meramente interno às instituições, o que determinou a desaceleração do seu ritmo de crescimento.
A Lei no 9.131 de 24 de novembro de 1995 altera as atribuições do Conselho Federal de
Educação - CFE e sua denominação passa a ser Conselho Nacional de Educação - CNE. Para
substituir o PAIUB foi criado o ENC como política educacional do Estado. Tornou-se o
instrumento de avaliação principal do ensino superior de 1995 a 2002.
O Decreto nº 3.860/2001 que “Dispõe sobre a organização do ensino superior, a avaliação
de cursos e instituições, e dá outras providências” cria a figura do Plano de Desenvolvimento
Institucional - PDI. Não extinguiu o PAIUB e reforça o ENC como instrumento principal de
avaliação do ensino superior e mantém o sistema de informações por meio da demonstração
estatística, compondo essa política. Esse decreto injeta no ambiente institucional por meio do
PDI, a prática do planejamento que até então era tarefa dos órgãos centrais do governo. Assim o
governo Fernando Henrique Cardoso estabeleceu, através do Decreto 2.026/96, procedimentos
para o processo de avaliação dos cursos e instituições de ensino superior, indicando em seu Art.
1°:
I - análise dos principais indicadores de desempenho global do sistema nacional de
ensino superior, por região e unidade da federação, segundo as áreas do conhecimento e o tipo ou
a natureza das instituições;
II - avaliação do desempenho individual das instituições de ensino superior,
compreendendo todas as modalidades de ensino, pesquisa e extensão;
III - avaliação do ensino de graduação, por curso, por meio da análise das condições
de oferta pelas diferentes instituições de ensino e pela análise dos resultados do ENC;
IV - avaliação dos programas de mestrado e doutorado, por área do conhecimento.
Após dois meses, este Decreto foi complementado pela Lei n°. 9.394/96, da Lei de
Diretrizes e Bases LDB, com referência aos prazos para saneamento das deficiências detectadas,
dando surgimento ao critério de periodicidade/validade das avaliações processadas nas IES.
30
Nesse período a sistemática da avaliação constituiu-se em um processo de grande número
de leis, decretos, portarias, resoluções de vários órgãos e instâncias do Sistema Federal de Ensino
Superior. O foco se dá na avaliação de cursos, principalmente na análise de resultados. Em meio
a toda essa metodologia adotada somou-se a expansão das instituições, dos cursos e das vagas.
Todo esse crescimento sem uma política satisfatória de avaliação gerou grande
insatisfação no meio acadêmico críticas e pressões da sociedade. Dias Sobrinho relata:
[...] É indubitável que o ENC tem uma grande capacidade de
organização do sistema e fiscalização das instituições. Mas é criticado
exatamente porque funcionou como fiscalizador e controlador, e não como
instrumento de melhoria educativa. É visto com grande desconfiança pelos
acadêmicos mais comprometidos com as funções públicas da educação pelo fato
de estabelecer esquemas hierarquizadores das instituições e cursos, para
informação dos clientes e consumidores do mercado educacional e das
autoridades. É especialmente criticado pelos educadores em virtude da usurpação
do currículo que ele efetua e da consequente desprofissionalização do magistério.
Segundo estes argumentos, o Provão é um elemento da privatização e só
interessa às forças do mercado. (DIAS SOBRINHO, 2003, p.114-115).
O aprimoramento da sistemática de avaliação resultou na ampliação das funções do
Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais - INEP e do MEC, em detrimento das
atribuições do CNE que foram reduzidas. O INEP, através do Decreto n°. 3.860/2001, institui:
I - avaliação dos indicadores de desempenho global do sistema nacional de educação
superior, por região e Unidade da Federação, segundo as áreas do conhecimento e a classificação
das instituições de ensino superior, definidos no Sistema de Avaliação e Informação Educacional
do INEP;
II - avaliação institucional do desempenho individual das instituições de ensino
superior (...);
III - avaliação dos cursos superiores, mediante a análise dos resultados do ENC e das
condições de oferta de cursos superiores.
Parágrafo 2°. - as avaliações realizadas pelo INEP subsidiarão os processos de
recredenciamento de instituições de ensino superior e de reconhecimento e renovação de
reconhecimento de cursos superiores.
Os autores citados referem-se à indefinição e descontinuidade das políticas e diretrizes
educacionais e governamentais de curto e longo prazo, que resultou em um ensino fragmentado.
31
A reformulação do papel do estudo, a preocupação com o nível do ensino, constituiu-se nos
pontos principais da motivação do Governo para a reestruturação da Educação no país. Um
princípio importante levado em consideração foi o de uma avaliação voltada para o conjunto das
IES, pois existia todo um sistema para ser avaliado.
Como prática mais interessada em resgatar o sentido democrático no que tange à questão
da avaliação institucional, nasce o SINAES. As bases da proposta original do SINAES foram
apresentadas em 27 de agosto de 2003 pela CEA - ponto de partida para a construção de todo o
sistema avaliativo. No ano seguinte, o SINAES, tendo como base a Lei n°10.861, de 14 de abril
de 2004, criou o novo modelo de avaliação nas Instituições de Ensino Superior.
Os princípios que nortearam a nova proposta do Ministério da Educação para o SINAES
são, respectivamente:
1. Responsabilidade social com a qualidade da educação superior; reconhecimento da
diversidade do sistema;
2. Respeito à identidade, à missão e à história das instituições;
3. Globalidade, isto é, compreensão de que a instituição deve ser avaliada a partir de um
conjunto significativo de indicadores de qualidade, vistos em sua relação orgânica e não de forma
isolada; e
4. Continuidade do processo avaliativo.
Para coordenação, supervisão da Avaliação do Ensino Superior e implementação do
SINAES foi instituída a Comissão Nacional de Avaliação CONAES, em junho de 2004, como
órgão colegiado com a missão de avaliar a qualidade acadêmica e a responsabilidade social das
instituições de ensino superior do país. A CONAES foi composta por 12 membros de nome
reconhecidos como especialistas na área de avaliação da Educação Superior com mandato de 4
anos, permitida a recondução para o período imediatamente subsequente, havendo renovação de
quatro membros a cada dois anos. Ao Presidente da República coube a nomeação dos membros,
por indicação do Ministro da Educação.
A Avaliação das IES foi planejada para ser desenvolvida em duas etapas: a autoavaliação
coordenada pela Comissão Própria de Avaliação - CPA, a ser implantada nas universidades com
o objetivo coordenar e articular o processo interno de avaliação, bem como sistematizá-lo; e a
avaliação externa. O quadro abaixo exemplifica atividades desenvolvidas por uma CPA.
32
ATIVIDADES DA AUTOAVALIAÇÃO DESENVOLVIDAS PELA CPA DA IES DE ACORDO COM A
ORIENTAÇÃO DO SINAES/CONAES, IMPLANTADA PELA LEI 10 .861/2OO4.
1 - Elaboração do projeto de autoavaliação;
2 - Seleção dos indicadores;
3 - Elaboração dos questionários;
4 - Pré-testes dos questionários;
5 - Ajustes finais dos questionários;
6 - Definição dos dados documentais da universidade;
7 - Envio ao MEC do projeto de autoavaliação;
8 - Seminários de sensibilização;
9 - Aplicação dos questionários;
10 - Processamento das respostas aos questionários;
11 - Análise dos indicadores resultantes dos questionários;
12 - Coleta dos dados documentais junto aos diversos setores da IES;
13 - Análise dos indicadores resultantes do levantamento documental;
14 – Versão preliminar do relatório da autoavaliação; e
15 - Envio ao MEC do relatório final da autoavaliação.
Após o processo interno de autoavaliação e a consolidação do relatório final, a IES se
submeterá a uma avaliação externa. Ela será feita por membros externos da comunidade
acadêmica e científica, designados pela CONAES. A avaliação externa é um importante
instrumento que exige a organização, a sistematização e o inter-relacionamento do conjunto de
informações, de dados quantitativos, de juízos de valor sobre a qualidade das práticas e da
produção teórica de toda a instituição que está sendo avaliada. Por isso as ações combinadas de
avaliação interna e externa são processos importantes de discussão e reflexão com respeito aos
grandes temas de política pedagógica, científica e tecnológica, bem como para tomada de
decisões, buscando o fortalecimento ou redirecionamento das ações.
O Decreto nº 5.773, de 9 de maio de 2006, segundo o MEC, documento chamado de
“decreto-ponte” porque faz uma ligação entre a avaliação e a regulação. Para o setor privado,
33
“decreto-ponte” significa que o MEC está antecipando alguns pontos da regulação do ensino
superior previstos na terceira e última versão do anteprojeto da reforma universitária, engavetado
desde julho de 2005 na Casa Civil, sem acordo, para ser submetido ao Congresso Nacional. O
Decreto em tela é polêmico no meio institucional e entre os órgãos representativos de classe,
como por exemplo, a Associação Brasileira de Mantenedoras do Ensino Superior - ABMES.
O Decreto acima mencionado “Dispõe sobre o exercício das funções de regulação,
supervisão e avaliação de instituições de educação superior e cursos superiores de graduação e
sequenciais no sistema federal de ensino”.
Em seu artigo 47, o novo decreto prevê que o MEC, ao constatar eventuais irregularidades
nas instituições de ensino superior, possa conceder um prazo para sanear a deficiência. A medida
está prevista na LDB desde 1996, mas nunca foi utilizada sistematicamente. No Art. 60 do
capítulo IV fala da “ obtenção de conceitos insatisfatórios nos processos periódicos de avaliação,
nos processos de recredenciamento de instituições, reconhecimento e renovação de
reconhecimento de cursos de graduação enseja a celebração de protocolo de compromisso com a
instituição de educação superior”.
O artigo 61 alerta para o que o protocolo de compromisso deverá conter:
I - o diagnóstico objetivo das condições da instituição;
II - os encaminhamentos, processos e ações a serem adotados pela instituição com vistas à
superação das dificuldades detectadas;
III - a indicação expressa de metas a serem cumpridas e, quando couber, a caracterização
das respectivas responsabilidades dos dirigentes;
IV - o prazo máximo para seu cumprimento; e
V - a criação, por parte da instituição de educação superior, de comissão de
acompanhamento do protocolo de compromisso.
E ainda:
No Art. 63. “O descumprimento do protocolo de compromisso enseja a instauração de
processo administrativo para aplicação das penalidades previstas no art. 10, § 2º, da Lei nº
10.861, de 2004, que são:
I - suspensão temporária da abertura de processo seletivo de cursos de graduação;
34
II - cassação da autorização de funcionamento da instituição de educação superior ou do
reconhecimento de cursos por ela oferecidos; e
III - advertência, suspensão ou perda de mandato do dirigente responsável pela ação não
executada, no caso de instituições públicas de educação superior.
§ 1º “A instituição de educação superior será notificada por ciência no processo, via
postal com aviso de recebimento, por telegrama ou outro meio que assegure a certeza da ciência
do interessado, para, no prazo de dez dias, apresentar defesa, tratando das matérias de fato e de
direito pertinentes.”
§ 2º “Recebida a defesa, o Secretário apreciará o conjunto dos elementos do processo e o
remeterá ao CNE para deliberação, com parecer recomendando a aplicação da penalidade cabível
ou o seu arquivamento.”
§ 3º “Da decisão do CNE caberá recurso administrativo, na forma de seu regimento
interno.”
§ 4º “A decisão de arquivamento do processo administrativo enseja a retomada do fluxo
dos prazos previstos nos §§ 7º e 8º do art. 10. “
§ 5º “A decisão administrativa final será homologada em portaria do Ministro de Estado
da Educação.”
No Art. 64, ”A decisão de suspensão temporária da abertura de processo seletivo de
cursos de graduação definirá o prazo de suspensão, que não poderá ser menor que o dobro do
prazo fixado no protocolo de compromisso”.
Em seu Art. 65, “À decisão de cassação da autorização de funcionamento da instituição
de educação superior ou do reconhecimento de cursos de graduação por ela oferecidos, aplicam-
se o disposto nos Arts. 57 ou 54, respectivamente”.
Finalmente, no Art. 79, “Revogam-se os Decretos nºs 1.845, de 28 de março de 1996,
3.860, de 9 de julho de 2001, 3.864, de 11 de julho de 2001, 3.908, de 4 de setembro de 2001, e
5.225, de 1o de outubro de 2004.”
“O processo de avaliação precisa produzir resultados. Não basta
apontarmos quais cursos e instituições são melhores ou piores. Os resultados da
avaliação devem refletir-se na regulação”. (Fernando Haddad, Ministro da
Educação).
O Art. 3 da Lei 10.861, de 14 de abril de 2004 estabelece 10 dimensões como base de sua
proposta metodológica e três núcleos, a saber:
35
Dimensões:
1. Missão e o Plano de Desenvolvimento Institucional - PDI
2. Política para o Ensino de Graduação, Pesquisa, Pós-Graduação e Extensão
3. Responsabilidade Social
4. Comunicação com a Sociedade
5. Política de Pessoal
6. Organização e Gestão
7. Infraestrutura Física
8. Planejamento e Avaliação
9. Política de Atendimento a Estudantes e Egressos
10. Sustentabilidade Financeira
Núcleos:
1. Núcleo Básico Comum – tópicos essenciais dos processos de avaliação de todas as IES.
2. Núcleo de Temas Optativos - relativo ä realidade da instituição, sendo motivadores das
reflexões da comunidade acadêmica e ações de melhoria de desempenho.
3. Núcleo de Documentação, Dados e Indicadores – fundamenta e justifica as análises e
conclusões.
O Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade), que integra o Sistema
Nacional de Avaliação da Educação Superior (Sinaes), tem o objetivo de aferir o rendimento dos
alunos dos cursos de graduação em relação aos conteúdos programáticos, suas habilidades e
competências.
O Enade é realizado por amostragem e a participação no Exame constará no histórico
escolar do estudante ou, quando for o caso, sua dispensa pelo MEC. O Inep/MEC constitui a
amostra dos participantes a partir da inscrição, na própria instituição de ensino superior, dos
alunos habilitados a fazer a prova.
Nos últimos dez anos, a avaliação institucional no Brasil tem recebido críticas devido ao
seu caráter controlador e regulador. Mas, em nenhum momento da História, como o acima
36
descrito, se fez tão presente no espaço interno das instituições culminando com a constante
presença dos avaliadores externos nas IES. A avaliação externa teve sua regulamentação pela
publicação da Portaria nº 1.264, de 17 de outubro de 2008 que aprova, em extrato, o instrumento
de avaliação externa de instituições de educação superior do SINAES. Os avaliadores externos
são admitidos por área de conhecimento e treinados para fiscalizar as ações da IES in loco. Eles
pesquisam pelo sistema e-MEC (sistema criado para envio de toda documentação exigida,
inclusive para os relatórios de avaliação) toda a documentação enviada com o que apuraram
durante a visita à IES.
Para o autor Moacir Gadotti, aos poucos, pelas contingências e necessidades
contemporâneas, a avaliação vem assumindo um papel emancipador e transformador. Explica:
A avaliação institucional não mais é vista como um instrumento de
controle burocrático e centralizador, em conflito com a autonomia. Ela está
sendo institucionalizada como um processo necessário de administração do
ensino, como condição para a melhoria do ensino e da pesquisa e como exigência
da sociedade democrática. Mesmo assim, ela encontra resistências. (...) Não se
constitui numa prática constante. É algo a ser instituído num instituinte onde não
existe muita cultura da avaliação.(...). (GADOTTI, Moacir. Avaliação
institucional - necessidade e condições para a sua realização (versão
preliminar).Teleconferência,6/3/1999.
As diferenças relatadas ao longo do histórico da avaliação institucional no Brasil acerca
da dupla concepção da avaliação institucional, como reforçam Dias Sobrinho (1998) e Belloni
(1998), por exemplo, “são expressões de percepções diferentes: de um lado, o poder instituído, o
Estado; e do outro, a comunidade acadêmica enquanto expressão de uma visão democrática, de
construção de, e a partir de, dentro da instituição, ou seja; o desejo de autonomia, de participação,
de decisão consensuada e de não interferência externa”.
Observa-se que o conceito de regulação vem sendo utilizado para identificar a intervenção
de instâncias com autoridade legítima, em geral de natureza estatal, com intuito de coordenar e
orientar a ação de agentes econômicos. A regulação, nesse caso, abrange as dimensões de
coordenação, controle e influência exercidos pelo Estado sobre os sistemas econômicos e sociais,
inserindo-se assim como mecanismo importante das políticas públicas, especialmente no contexto
de alteração dos modos de intervenção estatal. Sua importância vem à tona quando, de um lado,
37
assistimos à tentativa de assegurar ao Estado papel relevante na definição, pilotagem e execução
das políticas públicas e, de outro, esse papel passa a ser cada vez mais compartilhado com novos
agentes e atores sociais. (BARROSO, 2006).
Na sistemática do PAIUB, percebe-se que as instâncias governamentais não exerciam a
centralização dos processos, mas sim cumpriam, em primeiro lugar, o papel de indutoras dos
processos de autoavaliação e, a seguir, de, financiadoras e avaliadoras das propostas
(metaavaliação). O PAIUB segundo Dias Sobrinho:
[...] Este programa resultou de um amplo acordo com as instituições
de educação superior, de todas as naturezas jurídicas ou administrativas e de
todos os quadrantes do país, com as autoridades do Ministério da Educação, no
ano de 1993. Pode ser considerado um modelo ou enfoque de avaliação, pois
comporta, de forma consistente e coerente, concepções, princípios e
metodologias de avaliação. (DIAS SOBRINHO, 2003, p.82).
Quanto ao ENC, um dos ensinamentos retirados desse programa foi o de que tentativas
de avaliação institucional, que tomassem como unidade a instituição e pretendessem, mediante
um processo único e completo, medir o seu desempenho em todas as áreas de conhecimento,
abrangendo todo o ensino, toda a pesquisa e toda a extensão, seriam por demasiado complexas e
quase intermináveis. (MAIA, FILHO 1998 p. 76).
O PAIUB, segundo o autor, teria as seguintes limitações: como cada instituição elaborava
a sua proposta com indicadores próprios, não haveria a possibilidade de comparação entre as
instituições; o PAIUB limitava-se apenas à avaliação dos cursos de graduação e não tinha uma
gama maior de instrumentos de avaliação. O controle dessa avaliação estava nas mãos de cada
instituição que se autoavaliava, cabendo à SESu incentivar o intercâmbio entre as experiências
das instituições e a eventual alocação de recursos para o apoio parcial de cada projeto. Uma das
características do PAIUB é que os resultados dos projetos institucionais podem ser de extrema
utilidade para áreas específicas de uma instituição ou para a revisão do seu projeto institucional
global. Mas, pela diversidade de abordagens e de amplitude das questões, há dificuldades para a
comparação de experiências, alternativas e de resultados institucionais. Limita também a
construção de parâmetros referenciais de qualidade, principalmente no que se refere ao ensino de
graduação propriamente dito. Mas, a multiplicação das experiências recentes da avaliação, o
38
entendimento de que, em nível nacional e institucional, os sistemas de avaliação devem ser
compostos por vários processos avaliativos complementares, bem como os resultados do ENC,
realizado a partir de 1996, vêm fazendo com que o PAIUB seja revalorizado, como é
demonstrado pelo aumento significativo do número de projetos institucionais apresentados à
SESu a partir de 1997. (MAIA FILHO, 1998, p. 77)
O SINAES, com a implantação de sua nova proposta de avaliação é marcada por
divergências nos bastidores do governo Lula, relativas às questões: A avaliação da educação
superior deve ser: formativa/emancipatória ou regulatória/controladora?
Nas Diretrizes do SINAES/CONAES não se utiliza a expressão “avaliação com fins
regulatórios” ou “avaliação regulatória”. Na avaliação, as instituições passam a comparar o
projeto da IES e a sua realidade institucional e a melhorar a qualidade acadêmica. No contexto de
cada IES constrói-se uma proposta de autoavaliação voltada para a globalidade da instituição,
buscando dimensionar a relação entre o projeto institucional e sua prática, para reformulá-lo no
planejamento e nas ações futuras da instituição. Elabora-se uma metodologia que organiza as
atividades dos diferentes atores envolvidos no processo avaliativo, buscando a construção de um
sistema integrado. Deste modo, amplia as formas de compreensão sobre a instituição, visando
aperfeiçoar os diferentes setores.
Busca-se conciliar a ideia da avaliação emancipatória com a regulação, dividindo o
processo em três momentos: o primeiro realizado pelo poder público “precede o processo de
avaliação nas etapas iniciais da autorização e do credenciamento dos cursos”; o segundo é o
processo da avaliação propriamente dita, “que se realiza autonomamente pela instituição de
forma integrada e segundo suas diferentes modalidades”; o terceiro, após o parecer da CONAES
pelo Poder Público “são aplicados os efeitos regulatórios – previstos em lei – decorrentes da
avaliação”. (CONAES, 2004a, p. 10).
A avaliação por sua vez, também é dividida em momentos distintos: inicia-se com
autoavaliação, sendo que “o seu caráter formativo deve permitir o aperfeiçoamento, tanto dos
docentes, discentes e corpo técnico-administrativo quanto institucional”. O documento produzido
pelas CPAs é encaminhado para avaliação externa, para que o “o exame de fora para dentro,
corrija eventuais erros de percepção produzidos pelos agentes internos”.
As universidades têm a particularidade de serem instituições que atuam em interação com
a sociedade localizada em seu entorno. Com um modelo próprio de gestão, a Universidade é
reflexo do Estado e da Sociedade em que se situa.
39
A Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional - LDB, Lei nº. 9.394, em seu Artigo
52 comenta: "As universidades são instituições pluridisciplinares de formação dos quadros
profissionais de nível superior, de pesquisa, de extensão e de domínio e cultivo do saber
humano". (BRASIL, 1996).
A UNESCO, conforme o documento elaborado para a Conferência Mundial sobre o
Ensino Superior no Século XXI: visão e ação, assim define as instituições de ensino superior,
dentre as quais o estabelecimento universitário:
[...] são sistemas complexos que interagem com as instituições de seu
ambiente, isto é, com os sistemas políticos, econômicos, culturais e sociais. São
influenciadas pelo ambiente local e nacional (ou meso-ambiente) e, cada vez
mais, pelo ambiente regional e internacional (macro-ambiente). Mas por sua vez,
podem e mesmo devem influenciar esses diversos tipos de ambientes. (1998, p.
105).
A inserção das instituições na política nacional de avaliação interfere na direção das
práticas avaliativas, diz respeito à forma de relação estabelecida pela instituição com os setores
oficiais responsáveis pela política de avaliação oficial, assim como com o conjunto das
instituições de ensino superior.
1.2 Expansão Neoliberal e Qualidade Total: As Mudanças e a Complexidade da Gestão na
Avaliação das Universidades privadas
As IES brasileiras particulares enfrentam grandes desafios na reformulação de suas
prioridades devido às exigências da nova política educacional e às novas condições do mercado.
Procuram encontrar o desenvolvimento sustentável e por essa razão muitas IES desenvolvem
seus planos estratégicos com planejamento a curto, médio e longo prazo, o que propicia a
absorção das inovações, pois as antigas tradições estão arraigadas à velha cultura e resistentes às
mudanças.
Sendo a avaliação institucional um processo sem fim, mas não sem finalidade,
construindo permanentemente sua realidade, não se pode concebê-la sem pensar em mudança, em
dinâmica, porque a realidade social, política, organizacional, tecnológica e científica mudam de
forma acelerada a cada momento, exigindo atualização e renovação constante. Belloni afirma:
40
“Em meio a muitos retrocessos e avanços na prática, a avaliação
institucional demonstra grande potencial de transformação, estando diretamente
ligada à mudança e à melhoria se adequadamente instrumentalizada, uma vez
que se constitui um meio, uma ferramenta e não em um fim.” (Belloni, 1998).
Encontramos em nossa pesquisa, alguns fatores externos pela lógica de mercado que
impulsionam as mudanças nas IES e na avaliação na opinião dos gestores universitários:
• O aumento da demanda social e a necessidade de diversificar a captação de alunos;
• Cortes nos gastos – obrigando a concepção de sistemas mais rentáveis;
• Mudança no mercado – necessidade de reorganização das economias para adaptação ao
novo contexto mundial; e
• Sistemas de avaliação – externos e internos
Fatores internos:
• O avanço da ciência;
• Fomento das abordagens interdisciplinares e multidisciplinares de ensino, pesquisa
extensão;
• A disseminação e a aplicação rápida das demandas de técnicas de informação, tecnologia
e comunicação;
• Desenvolvimento da pesquisa;
• Implementação da melhoria do ensino e da pesquisa.
Os instrumentos oficiais de avaliação, criados para pré-estabelecer padrões mínimos de
qualidade de ensino, transformaram a gestão interna das IES. As escolhas de coordenadores de
curso e professores passaram a pautar-se nas referências do modelo MEC/SINAES de avaliação,
assim como as decisões acadêmicas, pedagógicas e administrativas, devido ao alinhamento
exigido entre as práticas como uma rede de entrelaçamento de dados e ações.
Contudo, os recentes métodos de avaliação propostos e o modelo atual de avaliação
institucional adotado pelo governo e introduzido nas IES vem encontrando dificuldades em sua
aplicação, devido à falta de conhecimento dos seus processos. Muitas instituições fazem a
avaliação e não utilizam os resultados o que é pior do que não fazer avaliação.
Para as IES, um grande objetivo a ser alcançado no processo avaliativo é sua
continuidade. É necessário que a comunidade acadêmica veja a avaliação institucional como uma
41
estratégia importante para todo o contexto de funcionamento da universidade. Haveria
continuidade do processo avaliativo sem a implantação de uma cultura de avaliação?
Sendo a avaliação institucional instrumento de reforma do Estado e da Educação
Superior, sua prática é recente nas universidades brasileiras e acontece coincidentemente com a
expansão neoliberal.
Na visão crítica dos autores do livro Neoliberalismo, Qualidade Total e Educação (2007)
estamos vivendo um tempo de reorganização política, econômica, social e ideológica e bem no
âmago de toda essa reorganização encontra-se o que se denomina neoliberalismo. Este evoca
propostas de organização da sociedade baseada em políticas de mercado e interesses empresariais
privados. Incluem-se nas instituições educacionais o novo conceito de “qualidade total”.
Borja (2003, p. 38) comenta:
(...) enquanto a globalização é um fenômeno múltiplo que prevê a
internacionalização e interdependência das economias nacionais, o globalismo é uma
construção ideológica que pretende explicar e justificar a globalização com todos seus abusos,
excessos, assimetrias e perversões e estendê-la pelo mundo com uma clara estratégia dos
países industriais para conquistar mercados, acrescentar laços de dependência externa e
aprofundar a clássica divisão internacional do trabalho, além de exercer dominação
ideológica, política, econômica, científica e tecnológica.
A chamada globalidade do cenário internacional vem alcançando grandes repercussões
em nosso país. No Brasil, a partir de 1995, acentuou-se o caráter neoliberal das políticas
governamentais, inclusive no campo da educação. O principal motivo para tal é beneficiar-se de
financiamentos externos. Na própria lei n. 9.394/96, as Diretrizes e Bases da Educação Nacional
(LDBEN) refletiram os novos tempos de uma visão educacional mercadológica até então
contestada pela sociedade civil organizada.
A maior questão, a da qualidade de ensino, vem se tornando objeto de disputa ideológica.
Para uns, significa a possibilidade de um sistema que atenda as exigências do mundo do trabalho
(estreitamente ligado ao conceito de qualidade total), respeitando a estrutura de poder que
articula os países ricos com os dependentes. Para outros, representa o desenvolvimento de uma
cultura crítica e alicerçada, capaz de criar uma condição emancipatória. A primeira tem empenho
na competitividade e a segunda na qualidade acadêmica e qualidade social no que foi
denominado de compromisso social.
42
Para a maioria dos autores, qualidade total “é uma técnica de administração
multidisciplinar formada por um conjunto de programas, ferramentas e métodos, aplicados no
controle do processo de produção das empresas, para obter bens e serviços pelo menor custo e
melhor qualidade, objetivando atender as exigências e a satisfação dos clientes. Os princípios da
Qualidade Total estão fundamentados na Administração Científica de Frederick Taylor (1856-
1915), no Controle Estatístico de Processos de Walter A. Shewhart (1891-1967) e na
Administração por Objetivos de Peter Drucker (1909-2005). Seus primeiros movimentos
surgiram e foram consolidados no Japão após o fim da II Guerra Mundial com os Círculos de
Controle da Qualidade, sendo difundida nos países ocidentais a partir da década de 70”.
Além da “qualidade total” existe o conceito de “gestão da qualidade” que é o processo de
conceber, controlar e melhorar os processos da empresa, quer sejam processos de gestão, de
produção, de marketing, de gestão de pessoal, de cobrança ou outros. A gestão da qualidade
envolve a concepção dos processos e dos produtos/serviços, envolve a melhoria dos processos e o
controle de qualidade. Controle da qualidade são as ações relacionadas com a medição da
qualidade, para diagnosticar se os requisitos estão sendo respeitados e se os objetivos da empresa
estão sendo atingidos.
Nos espaços do sistema de ensino no Brasil e no mundo, "o discurso que tem
fundamentado a necessidade de reformas educacionais contemporâneas vem fazendo apelo a
excelência, eficácia e eficiência, à competitividade e a outros aspectos da racionalidade
econômica". ( Martins, 2002: p. 269). Percebe-se a invariável disposição de que a melhoria dos
sistemas educativos esteja atrelada aos indicadores de produtividade. Tal posição é decorrente
das mudanças da concepção de Estado, que assume, cada vez mais, uma função regulatória,
através dos mecanismos de avaliação.
Nesse contexto, e à luz também de sua crítica, as instituições passaram a pensar melhor
sobre seus rumos, a buscar maior qualidade em seu trabalho, a acompanhar as necessidades de
desenvolvimento da sociedade.
Contudo, o coautor do livro Neoliberalismo, Qualidade Total e Educação, Tomaz Tadeu
escreve:
É difícil discordar da descrição da atual situação educacional feita pelo
discurso neoliberal. É mais difícil ainda ficar contra a proposta de mais
43
qualidade, sobretudo quando essa “qualidade” é anunciada como “total”.
Entretanto, o que o discurso neoliberal em educação esconde é a natureza
política essencialmente da configuração educacional existente. [...] Assim, o
discurso da qualidade total, da política como participação no consumo não se
apresenta apenas como uma outra possibilidade ao lado e no mesmo nível de
outras. Ele tende a suprimir as categorias com as quais tendíamos a pensar a
vida social e a educação, ajudando-nos a formular um futuro e uma
possibilidade que transcendessem a presente e indesejável situação social. O
discurso da qualidade total, das excelências da livre iniciativa, da
“modernização”, dos males da administração pública reprime e desloca o
discurso da igualdade/desigualdade, da justiça/injustiça, da participação política
numa esfera pública de discussão e decisão, tornando quase impossível pensar
numa sociedade e numa comunidade que transcendam os imperativos do
mercado e do capital. (DA SILVA, TADEU TOMAZ. Neoliberalismo,
qualidade total e educação: visões críticas. Petrópolis – Rio de Janeiro: Vozes,
2007.
Existe na literatura sobre a avaliação institucional uma colocação que pode esvaziar seu
potencial transformador. Quando se fala, por exemplo, que se pretende identificar as
insuficiências e as potencialidades de instituições e do sistema, ou, ainda, que a avaliação
institucional é um processo de autoconhecimento e tomada de decisões, (Belloni, 1998), revela a
idéia de que o sujeito da avaliação institucional é a elite dirigente que decide, toma decisões a
partir do conhecimento da realidade institucional. Aos que não giram em torno do poder e no
mundo das políticas, só resta concordar, aderir e colocar em prática políticas e decisões.
Essa colocação parece relegar uma dimensão importante da avaliação, que é a criação da
cultura de avaliação, do "firmar valores" (Ristoff, 1996) ao nível de cada ator-sujeito do processo,
seja colaborador, seja estudante, seja professor. A avaliação institucional, no seu sentido mais
amplo, é a junção das duas dimensões da realidade: a das estruturas de poder e seus dirigentes e a
dos atores-sujeitos, responsáveis, em última instância, pelo funcionamento de todo o sistema.
"Toda avaliação opera com valores, nenhuma é desinteressada e livre das referências valorativas
dos distintos grupos sociais", defende Sobrinho. (2003, p. 113).
A realidade é que algumas IES fazem sua autoavaliação para cumprir as determinações do
MEC. A tudo que foi apresentado, junta - se a falta de pessoal técnico treinado e interessado em
promover o processo de autoavaliação, o que tem deixado os resultados nas gavetas. Sem a
utilização desses resultados e sem o envolvimento dos atores do processo, não se cria cultura de
44
avaliação. Certamente, as IES que utilizarem a avaliação para se aperfeiçoar internamente terão
condições de melhores projeções externas.
Em seguida, no segundo capítulo, apresentaremos as ideias do campo da Psicanálise para
um melhor entendimento do que acontece nas IES com a questão da avaliação institucional.
45
CAPÍTULO 2
PSICANÁLISE, SUJEITO E LAÇO SOCIAL
Como foi contemplado no decorrer do primeiro capítulo, a questão da resistência na
participação dos funcionários, professores e alunos, ou seja, dos atores-sujeitos, ao processo e à
implantação da cultura de avaliação é reveladora de um mal-estar. A criação de uma cultura de
avaliação institucional deve ser considerada como um processo educativo. A cultura é expressa
na universalidade, na singularidade e na particularidade da instituição e de seus atores. Para
entendimento desse processo, e de como ele afeta particularmente nosso campo de estudo,
faremos uma incursão no conceito de sujeito, segundo a psicanálise.
Entendemos que a contribuição da psicanálise para com este trabalho se faz, sobretudo,
com suas concepções sobre as relações entre sujeito e desejo. Parece-nos imprescindível que o
ator institucional saia da “margem” da avaliação constituindo-se realmente como ator-sujeito
neste processo para se viabilizar a implantação da cultura de avaliação. Porém existe uma grande
lacuna entre as práticas de avaliação e a implantação desta. Acreditamos que esse “espaço não
ocupado” seja o do desejo dos atores-sujeito.
Nossa intenção neste capítulo é fazer uma leitura dos conceitos da Psicanálise relativos ao
sujeito, ao desejo e ao laço social como contribuição para estruturarmos um pensamento crítico
sobre os intricamentos do processo de avaliação institucional. Isto pode nos levar na direção que
nos conduzirá ao fio de ligação que fará interface entre psicanálise e avaliação, podendo apontar
algumas soluções para as questões levantadas relativas ao grupo em foco. Sem essa compreensão,
seria impossível entendermos como a psicanálise pode contribuir nesse campo do saber. Para isto,
precisamos ir ao fundamento, ao avesso dos discursos que prevalecem sobre a avaliação para
achar a “verdade” do discurso no qual esse sujeito está inserido.
Para Freud, foi o sonho, assim como a histeria, o caminho da descoberta do inconsciente.
O sonho traz sempre o desejo singular de um sujeito. Os mecanismos - deslocamento,
condensação - foram evidenciados no sonho. Em A Interpretação de Sonhos (Freud, [1900] 1972)
Freud identifica na lógica do processo de elaboração dos sonhos, as leis do inconsciente. E que
sempre as cenas da infância são tomadas por empréstimo pelo trabalho do sonho, juntamente com
cenas e afetos do dia anterior, ou do dia do sonho. Trata-se, na verdade, de representações que
expressam uma tentativa de realização do desejo do sujeito do inconsciente. As representações
46
inconscientes são dispostas em fantasias, histórias em que a pulsão se fixa e que podemos
conceber como verdadeiras encenações do desejo.
Os desejos inconscientes, constituídos ao longo da história do sujeito, são uma instância
marcada pela falta fundante do ser desejante. Sua lógica é pulsional, sua relação é com o objeto
perdido e nós somos alheios a esta vontade.
A condensação garante, pelas suas formas operativas, possibilidades infinitas de
singulares combinações dessa trama constitutiva dos desejos. São várias cadeias associativas que
se encontram em uma única representação psíquica. São cadeias associativas, metonímicas, de
pensamentos inconscientes que insistem em tomar forma através de representações psíquicas
sempre em mutação.
O deslocamento, revela que o interesse, a intensidade de uma representação é suscetível
de se destacar dela para passar a outras representações originariamente pouco intensas, ligadas à
primeira, por uma cadeia associativa. O deslocamento no material onírico deve ocorrer enquanto
este se encontra no estágio dos processos inconscientes, enquanto a condensação deve ser
provavelmente representada como um processo que se estende por todo o curso dos eventos até
atingir a região perceptual. Mas, em geral, devemos nos contentar em admitir que todas as forças
que tomam parte na formação dos sonhos operam simultaneamente.
Em Psicopatologia da Vida Cotidiana, (FREUD, S. 1901), no Capítulo IV - Lembranças da
Infância e Lembranças Encobridoras, Freud levanta a hipótese de que:
"...nas lembranças da primeira infância é preservado tudo aquilo que é
indiferente e sem importância, ao passo que (amiúde, contudo nem sempre) na
memória dos adultos não há vestígios de impressões daquela época que sejam
importantes, muito impressionantes e plenas de afeto".
Com essa afirmação, constata o mecanismo de deslocamento atuando como principal
operador dessas transformações mnêmicas que podem velar o desejo. Em seguida, relata como
funciona a "multiplicidade das relações e dos significados das lembranças encobridoras:"
"Naquele exemplo, o conteúdo da lembrança encobridora pertencia a um
dos primeiros anos da infância, ao passo que as vivências mentais por ela
substituídas na memória que haviam permanecido quase inconscientes,
ocorreram na vida posterior do sujeito. Designei essa espécie de deslocamento
retroativo ou retrocessivo" (FREUD,S. 1901 p.68.).
47
Nesse exemplo, o passado, embora não exista para o mundo fenomenológico, desloca-se e
possibilita a censura de um afeto vivido na vida adulta. É como se a causa chegasse após o efeito
e fosse por ele modificado.
Apoiado nos estudos dos sonhos de Freud, Lacan (1957[1998]) define o processo
metafórico como o trabalho de substituição de um significante por outro que tenha com o
primeiro uma relação de similaridade; a operação metonímica, por sua vez, seria a responsável
pela própria conexão entre os significantes na cadeia. Deste modo, a metáfora é o mecanismo que
implanta um significante na rede discursiva, significante este que assume o lugar de um outro,
fazendo-o passar para um estado latente.
"se pode dizer que é na cadeia do significante que o sentido insiste,
mas que nenhum dos elementos da cadeia consiste na significação de que ele
é capaz nesse mesmo momento. Impõe-se, portanto, a noção de um
deslizamento incessante do significado sob o significante." (LACAN,
1957[1998, p.506])
Já a metonímia viabiliza o encadeamento de um significante a outro, combinando
termos provenientes de diferentes registros. Em si, o processo metonímico é aquele que se define
por levar de um significante a outro, mas, diferente do que ocorre na metáfora, a substituição
significante não faz com que o primeiro fique em estado latente; pelo contrário, eles permanecem
em proximidade um com o outro. Nesta medida, o procedimento metonímico torna viável ao
discurso desdobrar-se no tempo, pois assim, determinado enunciado vai estar sempre ligado a
outro por contiguidade, numa sequência infinita de rearranjos narrativos.
Freud, ao interpretar o sonho que teve com sua paciente, Irmã (FREUD,S.1900[1973, p.
344 ]), revela-nos a força dos desejos recalcados que buscam expressar-se. É somente a partir da
sua interpretação que Freud teve a certeza de que ali se encontrava um desejo: o desejo de eximir-
se de responsabilidade com relação ao estado de Irma. Havia uma preocupação em não ter sua
reputação abalada, assim como a vontade de vingar-se do amigo Otto, pelo comentário do dia
anterior, responsabilizando-o pelo estado de Irma e isentando-se da mesma. É assim que Freud
obtém a certeza de que os sonhos dizem respeito à realização de um desejo. Como nos
demonstrou, os sonhos são como os sintomas neuróticos e fazem parte das formações
inconscientes. Falam de desejos proibidos, incestuosos, e por isso mesmo censurados, que só
conseguem expressar-se por meio de formas substitutivas. Nesse sonho da injeção de Irma, Freud
se defronta com algo obscuro, traumático, mas isso não o faz desistir da busca desse inominável,
48
do encontro com o real traumático. É através dessa experiência, assim como na clínica de
histeria, que ele vai chegar aos pensamentos inconscientes. O sonho é assim a "via régia para o
inconsciente", diz ele (FREUD, 1900a, p. 647).
Com a Traumdeutung, Freud fica maravilhado e diz que esta descoberta é a mais valiosa
de todas as que já teve a felicidade de fazer e que compreensão dessa espécie só ocorre uma vez
na vida. A psicanálise vai em busca da verdade, contida, mas escondida no discurso, a verdade
sobre o desejo. Freud nos convida a atentar para a força dos nossos desejos inconscientes.
No capítulo Experiência de Satisfação no Projeto (1895), Freud já vinculava suas
descobertas sobre o inconsciente a satisfação pulsional nas relações do sujeito com o próximo.
“Um outro ser humano(...) semelhante foi, ao mesmo tempo, o primeiro objeto de
satisfação, o primeiro objeto hostil e também sua única força auxiliar. É por esse motivo que é em
seus semelhantes que o ser humano aprende a se (re) conhecer .”(FREUD, [ 1895] 1976:438).
Freud afirma que o desamparo inicial do sujeito humano é o registro da alteridade e não se
restringe à presença do outro semelhante, indica algo mais radical que encobre/desvela, como
explica:
“...quando se inicia a função judicativa as percepções despertam
interesse devido a sua possível conexão com o objeto desejado, e seus complexos
são decompostos em um componente (a Coisa) não assimilável e uma porção
conhecida do eu através de sua própria experiência (atributos,atividade)”
(FREUD, op.cit:481).
Freud, remetendo-se a Kant, desenvolve aí suas concepções sobre a Coisa, que escapa ao
juízo, algo estranho, hostil, no reconhecimento do próximo é algo que resiste, sendo a causa do
reconhecimento nunca ser total. É sempre um (re) encontro de caráter precário.Daí a
ambivalência que caracteriza a relação do sujeito com seu próximo, uma vez que nele estão
articulados, ao mesmo tempo, a identidade e a separação. Na busca do objeto do desejo, o sujeito
encontra esse outro que “pode servir”, mas que remete sempre ao Outro enigmático.
A Coisa (das Ding) é o que sobra e resta à articulação simbólica dos juízos primários e
secundários. É resto, mas também funciona como causa desses processos. Na elaboração
freudiana do processo do pensar (simbolizar), encontrada no "Projeto" de 1895, é importante
sublinhar a noção de processo primário e processo secundário. O processo primário, prévio ao
aparecimento do eu, é caracterizado aqui por um forte investimento dos traços do objeto, que são
reativados alucinatoriamente.
49
Com o aparecimento do eu e dos investimentos colaterais, há uma inibição parcial do
investimento, do desejo, de modo que possa haver uma diferenciação entre percepção e
lembrança. Isto vai caracterizar o processo secundário.
Das Ding está fora, mas seu destino é ser substituída no aparelho. Está no solo da
simbolização. Todo o sistema de substituição se apoia sobre das Ding que organiza o idêntico e o
diferente. O pensar é guiado e causado pelo desejo.
A primeira apreensão da realidade pelo sujeito é através do que Freud denomina
Nebenmensch = neben: próximo, mensch: homem, e isto já será determinante de seus laços
sociais futuros. Seria o homem próximo, o vizinho, o semelhante. É a partir do próximo que
Freud articula a função do Outro. O sujeito, na sua relação com a realidade, vai ao encontro do
objeto que é, desde sempre, perdido. Vai a procura daquilo que é impossível de ser achado: Das
Ding — o Outro absoluto — a mãe.
A lei de proibição do incesto determina a inacessibilidade da mãe. É o que está no
fundamento de das Ding. Freud designará posteriormente como interdição do incesto o princípio
da lei primordial, mola de todos os desenvolvimentos culturais e, ao mesmo tempo, identifica o
incesto como o desejo mais fundamental, o desejo do filho pela mãe. Só há desejo porque o
objeto é interditado e inatingível. O desejo pela mãe não poderia ser satisfeito, pois representaria
o fim da demanda e do inconsciente. A mãe ocupa o lugar da Coisa como impossível no
inconsciente.
A primeira experiência inscreve o sujeito no campo do desejo. Quando, ante a falta de
objeto, são investidos, simultaneamente, os traços da experiência de satisfação, o desejo emerge
presentificando à dimensão de perda e de retorno a uma satisfação já experimentada.
Na ótica freudiana, o homem está condenado a uma forma radical de intersubjetividade
que implica em: aproximação e afastamento. Em psicologia das massas e análise do eu (1921)
Freud utiliza a parábola dos porcos espinhos de Shopenhauer, a qual citaremos mais adiante, para
afirmar que o homem não suporta uma aproximação demasiado íntima com o próximo,
principalmente porque a deseja. As relações amorosas estão cheias de hostilidade nem sempre
perceptível por causa do recalcamento.
Lacan coloca a Coisa no centro e, em volta dela, o mundo subjetivo do inconsciente
estruturado nas cadeias significantes, mas destaca a dificuldade de sua representação topológica:
"está no centro, mas no sentido de estar excluída".
50
A noção de das Ding formulada por Freud no "Projeto" presentifica uma divisão
constitutiva no campo do Outro e, portanto, no sujeito. Lacan retoma esta ideia para elaborar a
noção desejo.
Lacan estuda a temática do desejo em vários trabalhos. Destacam-se especialmente “O
Seminário”, livro 5: as formações do inconsciente e em” O Seminário”, livro 6: o desejo e sua
interpretação (Lacan, 1957-58 ).
Lacan pensa que uma das vertentes do desejo é que o sujeito procura, inicialmente,
constituir-se em objeto do desejo de seu semelhante, o outro, em primeira instância, a mãe. O
desejo é estruturado pela via da fala, portanto no Outro. É o Outro quem oferece, desde o início,
as palavras que possibilitam desejar. A necessidade do bebê interpretado pela mãe, inscreve-o no
universo da linguagem. A palavra que nomeia a Coisa também encerra o gozo bruto da
experiência. O Outro, representado pela mãe, ou outro adulto que a represente, indica o que
desejar.
Há um duplo desejo de reconhecimento: pelo outro e pelo Outro. Porém, assim como
estruturante do sujeito, a linguagem confere ao desejo uma das características essenciais: o efeito
de deslocamento metonímico infinito de um para outro objeto.
Desejamos porque falamos. A linguagem é a estrutura que nos torna desejantes. O desejo
fica, ao mesmo tempo, inscrito e oculto na demanda. Na realidade, o que se demanda é ser
amado, como sucede na análise. O Outro regula esta relação, assim como todas as relações.
A ferida narcisista surge diante da frustração da demanda. Podemos tolerar muitas coisas,
mas não suportamos não sermos reconhecidos e amados.
Da identificação narcisista surge o desejo de ocupar o lugar do objeto de desejo. Porém,
este mesmo semelhante nos introduz, ao exprimir em palavras nosso desejo, em um universo
significante que exige nossa subordinação às leis da linguagem - o Outro. Como resultado disso,
nosso desejo não poderá ser nomeado jamais e circulará metonimicamente, de um para outro
significante. Mas, a estrutura me obriga a continuar desejando.
Na relação com o Outro há sempre uma dimensão de perda. Segundo Lacan, Freud
"coloca na origem da conquista da realidade o objeto perdido que não pode atingir, pois mesmo
presente sua lembrança o situa numa outra cena". Esse resto que se perde e fica excluído de toda
simbolização e de todo revestimento imaginário é das Ding que, no "Projeto", representaria o
Outro absoluto, aproximando a dimensão real enquanto impossível.
No "Projeto", e na correspondência a Fliess, Freud apresentou a função primordial do
outro pré-histórico e inigualável, que antecede o sujeito como função do desejo. Esse Outro
51
primordial não só oferece sua face de luz com seus traços distintivos, mas a de sombra onde se
prefigura o lugar de uma falta.
A Coisa situa-se em um nível além do universo da linguagem, fora do espaço da
representação, definindo-se como ausente, como realidade muda que regula a trama significante e
o caminho do sujeito em relação ao mundo do desejo. Ela determina a espera de algo ”que está
sempre a uma certa distância da Coisa”.
Referindo-se ao texto de Freud de 1925 “A Denegação”, Lacan identifica das Ding à
tendência a retornar que caracteriza a orientação do sujeito humano em direção ao objeto. O
encontro do objeto, como Freud afirma em vários textos, é sempre um reencontro, uma vez que o
objeto absoluto do desejo não existe. O que se reencontra está irremediavelmente “a uma certa
distância da Coisa”, o que impõe o caminho da repetição. Como Outro absoluto do sujeito, real,
das Ding não é reencontrada, mas apenas suas ”coordenadas de prazer”.
Das Ding não pertence, portanto, ao espaço da representação, não habita naquilo que
Freud chamou de aparato psíquico, mas nem por isso deixa de “aparecer” embora esteja ausente.
Algo no nível das Vorstellungen (ou dos significantes) sinaliza a Coisa.
Esse algo não é uma coisa, nem a própria Coisa disfarçada, mas um vazio que não pode
ser preenchido adequadamente por objeto algum. É o que Lacan denomina “objeto a”. Esse
índice não é um objeto específico, mas é um vazio, um furo.
Lacan, quando chama o objeto a de furo quer dizer que está perdido para sempre.
Objeto a – não é o objeto de desejo, mas o “objeto causa de desejo.”
2.1 Sujeito, Desejo e Grupos
Descartes deu o passo inaugural para a ciência moderna com o cogito. O cogito cartesiano
refere-se à seguinte postulação: “Cogito, ergo sum: penso, logo sou” (Lacan, 1957:519),
expressão que registra uma reviravolta no valor do conhecimento e do pensamento humano. A
existência do sujeito é afirmada pelo ato de pensar. O cogito afirma o ser enquanto pensante.
Freud subverte o cogito cartesiano dizendo: ...”Sou, lá onde não penso” e avança,
propondo o sujeito do inconsciente ao dizer que no campo do sonho, do lapso, do ato falho, do
chiste, isto é, nas formações do inconsciente, este surge.
O sujeito da psicanálise é o mesmo da ciência. Mas esse sujeito está foracluído do campo
da ciência porque esta não lida com a falta e com a castração. É o sujeito do desejo que a
psicanálise faz retornar do exílio onde a ciência o coloca.
52
A psicanálise é proveniente da ciência, contudo não se reduz a ela, não
se estabelece no campo da ciência porque a noção de sujeito é a sua chave
fundamental. Ela toma para si o peso da verdade, assumindo a responsabilidade
por ela, seja qual for a sua natureza. A psicanálise recoloca o sujeito na cena
discursiva, fato que a ciência, par se fundar, necessariamente excluiu. (ELIA,
2000, p. 20).
A grande preocupação de Freud foi identificar o vínculo entre a Psicanálise e a Ciência.
Consciente do furo em qualquer sistema científico ou filosófico sabia perfeitamente que a
realidade assume a forma e o conteúdo sob o efeito de nossa subjetividade, ou seja, de fantasia.
Para ele, toda realidade é psíquica, porque qualquer que seja a fantasia é ela que tem efeito sobre
o sujeito.
A ciência exclui de seus cálculos a subjetividade do cientista, assim como a subjetividade
do sujeito quando objeto de pesquisa. Para a ciência, o sujeito é apenas uma variável passível de
mensuração.
Muito interessante é a afirmativa “o sujeito sobre quem operamos em psicanálise, só pode
ser o sujeito da ciência”. (Lacan 1966, p. 873). Depreende-se que é o mesmo sujeito de que se
fala, mas na psicanálise, aparece como se fosse o seu avesso, num ato que traz à tona a expressão
de sua subjetividade. Que lugar dá a ciência ao sujeito do inconsciente?
Se Lacan sustenta que a ciência inaugura uma concepção nova do sujeito, desta afirmação
não decorre que este sujeito seja por ela aceito em sua operação. Pode-se dizer que, ao contrário,
para constituir-se ela precisa excluir de sua área este mesmo sujeito por ela criado. Mesmo que o
sujeito da psicanálise seja o mesmo da ciência, as operações que resultam sobre ele não se
equivalem.
Segundo Elia (1999), a psicanálise encontra-se num lugar mais além, exterior ao referente
da ciência, porém situada no interior desta. Ainda no domínio da ciência, a psicanálise dela se
afasta num ponto por aquela inapreensível. Deste modo, sem dispensar as referências da ciência,
ou seja, dela se servindo, a psicanálise, para operar como tal, precisa também dela prescindir.
A psicanálise, pela associação livre, busca a verdade do mito individual, encaminha-se
para entrar na dimensão da realidade psíquica, uma vez que a ciência exclui o particular em que
se constitui o sujeito.
Na Psicanálise, Freud não utilizou o termo sujeito, mas usou a terminologia das Ich para
se referir ao sujeito da experiência. Freud conceitua o inconsciente como um sistema próprio,
53
com leis próprias, normas, associações e encadeamentos que o homem desconhece, mas que são
imperativos e que emergem em sua fala.
Para a psicanálise o sujeito é diferenciado do Eu – decorre do Outro que é referência à
linguagem, sendo efeito da ordem simbólica. Por esta razão, o sujeito é consequência do
significante que é regido pelas leis do simbólico. Lacan coloca o sujeito como que dividido entre
saber e verdade. O eu é do registro do imaginário, é síntese que fazemos de nós mesmos.
O sujeito do inconsciente testemunha a dependência do falante à ordem simbólica que
pré-existe à sua constituição. Portanto, para Lacan, a causa do sujeito é a estrutura do
significante. Para ele, não é uma ilusão fabricada pelo Eu – porque é inconsciente, portanto não é
o agente da fala, mas é descentrado, acéfalo, dividido, evanescente.
Para Lacan “O sujeito é aquilo que um significante representa para outro significante. O
sujeito liga os dois significantes”.
O inconsciente é marcado pela inscrição do significante. E mais, o assujeitamento à ordem
significante aponta para o que a psicanálise lacaniana afirma: inconsciente e linguagem têm a
mesma estrutura, ou ainda, o inconsciente funciona como uma linguagem. Nessa definição
conjunta de sujeito e significante, compreende-se que a entrada do sujeito no simbólico, na
linguagem, dá-se simultaneamente com a perda do objeto.
Foi a partir de Ferdinand Saussurre e da linguística - a Ciência Moderna, que Lacan
recorreu à categoria de significante – imagem material acústica para Saussurre, à qual se associa
um conceito (ideia), como significado, na constituição do signo linguístico. Lacan subverte essa
associação significante/significado, dando maior importância ao primeiro, o significante. O
significante prevalece sobre o significado. Só o significante é material - imagem sonora, unidade
material da fala humana e simbólico - sua articulação em cadeia possui uma ordem capaz de
engendrar o significado, que não se encontra constituído desde o começo, isto é, antes da
articulação significante.
Lacan propõe a categoria de Outro para designar o “universo simbólico”, ou seja, o
“universo dos discursos”, que vem a ser representado pelos outros, os semelhantes, inicialmente o
adulto próximo ao recém-chegado ao mundo que já é efeito da sociedade e da cultura. O Outro
transmite - pode ser a mãe -, para o bebê uma estrutura significante. Para ela, inconsciente – para
além do que ela deseja transmitir. O que chega até o bebê, inicialmente, é um conjunto de marcas
materiais e simbólicas – significantes- introduzidas pelo Outro materno que provocarão em seu
corpo um ato de resposta que se chama sujeito. Mas Lacan nos evidencia que o laço social
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também é efeito de discurso, como veremos adiante, o que será de suma importância para este
trabalho e sua conclusão.
O homem está inserido em numerosos grupos, achando-se ligado a estes por vínculos de
identificação e compondo seu Ideal do eu segundo os modelos mais variados. É isto que define a
sua constituição e o seu desejo. Para a Psicanálise sujeito é sinônimo de desejo.
Para Lacan, cada homem participa de formações discursivas que lhe propiciam
possibilidades de constituição como sujeitos pela via dos processos identificatórios. O que são
esses processos? Falaremos sobre eles um pouco mais a frente.
Em Totem e Tabu (1912), Freud constrói um mito relativo à inauguração da cultura e das
instituições, relacionado à elaboração de um complexo universal, o complexo de Édipo, próprio
de todas as sociedades humanas e na origem de todas as religiões. Por isto o nosso interesse por
este texto. Elizabeth Roudinesco assim descreve o mito freudiano:
“Num tempo primitivo, os homens viviam no seio de pequenas hordas,
cada qual submetida ao poder despótico de um macho que se apropriava das fêmeas.
Um dia, os filhos da tribo, rebelando-se contra o pai, puseram fim ao reino da horda
selvagem. Num ato de violência coletiva, mataram o pai e comeram seu cadáver.
Todavia, depois do assassinato, sentiram remorso, renegaram sua má ação e, em
seguida, inventaram uma nova ordem social, instaurando simultaneamente a exogamia
(ou renúncia à posse das mulheres do clã do totem) e o totemismo, baseado na proibição
do assassinato do substituto do pai (o totem). Totemismo, exogamia, proibição do
incesto: foi o modelo comum a todas as religiões, e em especial o monoteísmo”. (1998,
p.758)
Em Totem e Tabu (1912), Freud se utiliza de pesquisas antropológicas sobre sociedades
primitivas, para melhor entender determinados processos, funcionamentos e patologias da vida
mental do homem moderno. Nesta obra, é possível encontrar traços do conceito de poder no
pensamento social freudiano, identificado primeiramente, como se fosse o poder do pai da horda
primitiva sobre todos os homens e mulheres do clã. Este poder que será socializado entre os
filhos após o banquete canibalesco, retorna em forma de Totem. E o pai morto torna-se mais
poderoso do que em vida.
Das sociedades totêmicas a humanidade evolui para sociedades com religiões mais
elaboradas, porém essencialmente fundadas na figura mítica de um pai poderoso. Os líderes
políticos ou religiosos incorporam com maior ou menor intensidade, traços significantes deste pai
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simbólico que insere sua presença eterna no imaginário da humanidade. Em Freud, a formação
social encontra seu ponto central e criador nas relações intrafamiliares, origem mais remota da
organização social do homem.
Na sociedade primitiva, estudos feitos por Darwin, indicam a presença de um pai violento
e ciumento que guarda as fêmeas para si próprio e expulsa os filhos à medida que crescem. Um
dia os filhos se unem e matam o pai, invejado e temido, devoram seu cadáver, identificando-se
com ele, apropriando-se, assim, de sua força. Após terem cometido o parricídio, os irmãos
tornam-se rivais em relação às mulheres. Percebem que nenhum deles poderia ocupar o lugar do
pai, sem o risco de morte. Renunciam ao objeto desejado, motivo principal de o levarem a matar
o pai. A culpa filial se instala por causa dos dois aspectos dos sentimentos: ódio ao pai – que
representava um impedimento ao seu anseio de poder e aos desejos sexuais. E amor e admiração
por tudo que ele representava. Ao derrotarem o pai, satisfazem o ódio. Quando colocam em
prática os desejos de se identificar com o pai – surge a afeição que estava recalcada, sob a forma
de remorso. O pai morto torna-se mais forte do que quando vivo. Esta é a base do complexo de
Édipo, que na teoria freudiana se estabelece a partir da rivalidade da criança com o pai, para que
seu desejo mais primitivo seja realizado. Os sentimentos hostis frente ao pai são acompanhados
pela nostalgia deste mesmo pai, exatamente como o desejo pela mãe é acompanhado pelo horror
do incesto. Assim, os dois tabus do totemismo se derivam do complexo de Édipo, com o
propósito de impedir a repetição do crime.
Freud, em Totem e Tabu, consegue com suas proposições mostrar que o desejo primário
de uma criança, manifestado claramente durante a fase edípica, assemelha-se muito ao desejo do
homem primitivo. O complexo de Édipo postulado por Freud revela em cada um de nós,
acontecimentos subjacentes tanto na nossa história pessoal como na história da humanidade. Ao
pensar em Totem e Tabu como origem da civilização, Freud mostra um mito fecundo para
refletir-se acerca das condições pelas quais foi possível a construção da cultura.
Em Psicologia das massas e análise do eu a tese de Freud é que a massa e os grupos se
organizam e se estruturam a partir de um duplo processo: instalação de um mesmo objeto externo
– o líder do grupo - no lugar do ideal do eu de seus membros e identificação recíproca. A
transformação psíquica do indivíduo, na massa, é produto de uma redução do narcisismo de cada
um dos membros em função da instalação do mesmo líder como ideal do eu e do vínculo
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amoroso que se estabelece entre os pares, funcionando como compensação pela renúncia
narcísica.
Freud evidencia, a partir do capítulo nove, que o indivíduo na multidão regride, de alguma
maneira, a um modelo infantil e arcaico de funcionamento. É possível reconhecer na vida grupal
do homem contemporâneo, a ‘persistência’ da horda originária. Existe uma estrutura comum que
perpassa essas formações sociais, porque – conforme a formulação de Freud – o homem é “um
animal de horda, uma criatura individual numa horda conduzida por um chefe” (FREUD, 1921,
p.147). Há um desejo que perpassa os grupos e que é um desejo de autoridade.
Diante do poder sedutor, quase hipnótico, do líder e das massas, parece que não há como
pensar a liberdade e a singularidade. No entanto, à massa ou ao indivíduo enredado no seu desejo
ilusório, Freud contrapõe certa singularidade e solidão heroica. A passividade, a resignação, o
conformismo, a obediência não são necessariamente um destino ao qual estamos fadados na
nossa vida em grupo, a despeito da nossa ‘identidade’ se constituir do precipitado de inúmeras
identificações. “Cada indivíduo, portanto, partilha de numerosas mentes grupais – as de sua raça,
classe, credo, nacionalidade etc. – podendo também elevar-se sobre elas, na medida em que
possui um fragmento de independência e originalidade”. (FREUD, 1921, p.163).
O modelo idealizado e elegante de sujeito não resiste ao desafio real da comunidade
humana simbolizada na parábola dos porcos-espinhos de Schopenhauer descrita por Freud que
diz:
“Durante a era glacial, muitos animais morriam por causa do frio. Os
porcos-espinhos juntavam-se em grupos, assim se agasalhavam e se protegiam
mutuamente. Mas os espinhos de cada um feriam os companheiros mais
próximos, justamente os que forneciam calor. E, por isso, tornavam a se afastar
uns dos outros. Voltaram a morrer congelados e precisavam fazer uma escolha:
desapareceriam da face da Terra ou aceitavam os espinhos do semelhante. Com
sabedoria, decidiram voltar e ficar juntos. Aprenderam assim a conviver com as
pequenas feridas que uma relação muito próxima podia causar, já que o mais
importante era o calor do outro”. (Freud, 1921, p.128 e nota 1).
Essa alegoria ilustra o drama que atravessa o laço social entre os homens. Necessário,
porque o desamparo individual e grupal frente à insensibilidade do mundo o exige. Dolorido,
porque nada garante que o grupo humano consiga encontrar um equilíbrio entre exigências de
felicidade individual e exigências comunitárias.
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Em certas formações grupais vemos que o sujeito abandona algo de Ideal do eu e o troca
por ideais do grupo, identificando-se com o líder, o chefe, e mesmo com ideias.
Os processos identificatórios aprofundados em Psicologia das massas e análise do eu
(Freud, 1921), vem responder por muitas das funções anteriormente imputadas à pulsão de auto
conservação (referente à escolha amorosa, por exemplo). O texto reafirma uma identificação
originária estruturante anterior ao jogo objetal do complexo de Édipo: a identificação é conhecida
pela psicanálise como a mais longínqua expressão de um laço emocional com outra pessoa. Ela
cumpre um papel na história primitiva do complexo de Édipo. Representa um mecanismo
originário de estruturação do eu de sua relação com os objetos cuja possibilidade de reatualização
encontra-se sempre presente.
Os processos identificatórios ficam evidentes no complexo de Édipo da teoria freudiana.
Ele passa a representar a forma de constituição do desejo sexual pela via da identificação. Por
este complexo se encena o drama do narcisismo e se constituem as leis da escolha de objeto. O
ideal do eu, em 1921, em “O Eu e o Isso”, será pensado frente à dificuldade de dissociar o
investimento objetal da identificação narcísica. A intenção de Freud é mostrar que a identificação
e o ideal do ego não são apenas aspectos da estrutura psíquica, mas que essas noções permitem
compreender o modo de constituição do laço social.
Em 1920 Freud pesquisou as pulsões, aclarando-nos que as duas, a de vida e a de morte,
agem sempre em conjunto; diante do mal- estar e dos sofrimentos que a vida nos impõe. Numa
entrevista de Sigmund Freud, em 1930, a George Sylvester Vierek, ele disse:
“A mesquinharia é a maneira que o homem tem para vingar-se da
sociedade pelas restrições que esta lhe impõem. É o sentimento vingativo que
anima o conformista e o fofoqueiro. Um selvagem pode nos cortar a cabeça, nos
devorar, nos torturar, mas nos poupará das pequenas e contínuas ferroadas que, às
vezes, fazem que a vida em uma comunidade civilizada seja quase intolerável. Os
hábitos e idiossincracias mais desagradáveis do homem, sua falsidade, sua
covardia, sua falta de respeito, são produtos de uma adaptação incompleta a uma
civilização complexa. São o resultado do conflito entre nossas pulsões e nossa
cultura”. (FREUD, 1930).
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O desenvolvimento do sujeito, bem como da cultura da qual faz parte, somente são
possíveis a partir da administração das pressões que lhe são impostas. Dois princípios conflitam-
se na vida do indivíduo, a pulsão de vida e a pulsão de morte. A pulsão de vida interage na
cultura para aproximar os indivíduos, trabalha em favor da vida comunitária. A pulsão de morte
age de maneira oposta.
Ao descobrir o conceito de pulsão, Freud utiliza os termos: alvo, objeto, pressão e fonte.
“Por pressão (Drang) entende-se seu fator motor, a soma de força ou medida de trabalho que ela
representa”- esta pressão pode ser compreendida como uma quantidade de descarga que tende à
excitação. Este é um termo que, sozinho, não define a pulsão. O próprio Freud faz distinção entre
as excitações internas, a primeira seria a pressão de necessidade, como fome e sede, por exemplo,
já a segunda seria a pressão da pulsão. Enquanto a primeira possuía uma força momentânea, a
segunda é constante. Este fator nos revela um aspecto muito importante da pressão. Não se trata
apenas de um fator motor (no sentido de provocar movimento), mas sim de um processo de
transformação complexo. Sua função é de transformar a energia acumulada, transformação esta
que implica uma codificação. O que se leva em conta não é o organismo e sua finalidade
adaptativa, e sim o aparelho psíquico, cuja regulação ocorre através do princípio do prazer e pelo
princípio da realidade, através de representação - a pressão pulsional será definida no âmbito do
aparato psíquico.
“O alvo da pulsão é, em todos os casos, a satisfação que só pode ser alcançada
cancelando-se o estado de estimulação da fonte da pulsão”. Se a força da pulsão é constante,
como cancelar a estimulação? Quando a satisfação é alcançada?
Esse alvo nunca é alcançado pela própria natureza da pulsão, e a satisfação é sempre
parcial. O recalque, a sublimação, o sintoma, o sonho e outros destinos da pulsão provocam
também satisfação. Frente a esta impossibilidade de satisfação da pulsão, estamos sempre
procurando um objeto que possa satisfazê-la. Ela precisa de um objeto para que possa obter
satisfação, mesmo que parcial. Este objeto não é específico e nem qualquer um, mas sim um
objeto que possui a capacidade de satisfazer a pulsão. Esta aptidão está ligada à história do
sujeito, às suas fantasias e seus desejos. O conceito de objeto, elaborado por Freud, não se trata
de algo do mundo que nos é oferecido à percepção, mas sim representações-objeto que são
formadas a partir da associação entre imagens sensoriais e palavras. Pode-se dizer que o objeto,
concebido por Freud, é o efeito da incidência da palavra sobre as sensações advindas dos
estímulos externos.
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A fonte da pulsão é corporal e não psíquica. Então, podemos dizer que a pulsão tem sua
origem no corpo. “É um processo somático que ocorre num órgão ou parte do corpo e cuja
excitação é representada na vida mental pela pulsão”.
Freud considera em “O Mal-Estar na Cultura” (1930) a impossibilidade do homem
realizar seus desejos na civilização. Mesmo sendo a civilização aparentemente sólida e
organizada, constituída para controlar a convivência dos grupos em uma cultura, está
constantemente à beira de uma desintegração em razão da hostilidade primordial, um
interminável conflito entre os homens.
Em “O Mal-Estar na Cultura” (1930), Freud inicia seu artigo mostrando as diversidades
de impulsos plenos de desejo e as discrepâncias dos pensamentos e das ações dos sujeitos no
contexto social.
“É impossível fugir à impressão de que as pessoas comumente empregam
falsos padrões de avaliação – isto é, de que buscam poder, sucesso e riqueza para
elas mesmas e os admiram nos outros, subestimando tudo aquilo que
verdadeiramente tem valor na vida. No entanto, ao formular qualquer juízo geral
desse tipo, corremos o risco de esquecer quão variados são o mundo humano e sua
vida mental. Existem certos homens que não contam com a admiração de seus
contemporâneos, embora a grandeza deles repouse em atributos e realizações
completamente estranhos aos objetivos e aos ideais da multidão. Facilmente, poder-
se-ia ficar inclinado a supor que, no final das contas, apenas uma minoria aprecia
esses grandes homens, ao passo que a maioria pouco se importa com eles. Contudo,
devido não só às discrepâncias existentes entre os pensamentos das pessoas e as suas
ações, como também à diversidade de seus impulsos plenos de desejo, as coisas
provavelmente não são tão simples assim “. (FREUD, 1930 ).
Freud mostra como tema central a discussão sobre as exigências impostas pela sociedade.
Fala da exposição do indivíduo, no meio social a uma espécie de policiamento e esse
“enquadramento” nas regras sociais provoca uma alienação que inibe seu desenvolvimento. A
pulsão impele o indivíduo a destruir o meio em que vive para se libertar do sistema social
repressivo.
Como já dissemos anteriormente, existem dois princípios que se conflitam na vida do
indivíduo, o princípio do prazer e o princípio da realidade, que também podem ser chamados de
pulsão de vida e pulsão e morte. A pulsão de vida tem como fundamento interagir na civilização
para aproximar os indivíduos, trabalhando em favor da vida comunitária. A pulsão de morte age
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de maneira oposta; contra a civilização. Por estar alienado ao meio ao qual pertence e frente às
imposições de uma sociedade repressiva, e na impossibilidade de estar num ambiente que permita
a total liberdade, o ser humano não acha formas de concretização da felicidade, entendida como a
liberação das energias pulsionais. Sabe-se que a plenitude não existe. Somente alguns momentos
de satisfação temporária, consequência dos impulsos, sobretudo sexuais.
Frente ao conflito entre o princípio do prazer e o princípio da realidade algumas análises
podem ser levadas em consideração, e a principal é a relação existente entre o amor, cujo poder
induz ao indivíduo a necessidade de não querer privar-se do objeto de desejo, e a dor, ou seja,
sensação desagradável causada principalmente em virtude da não concretização de uma relação
interpessoal. Enquanto que o amor é visto como pulsão de vida e se manifesta, sobretudo pelo
desejo e pela afloração da sexualidade.
A dor enquadra-se no que Freud chama de princípio de morte, ou pelas manifestações da
agressividade decorrentes da insatisfação e da incapacidade de concretização do amor. O amor é
uma das formas mais eficientes para a realização dos desejos, e a ausência de uma relação ou a
insatisfação do desejo conduz à dor. Freud explica sua proveniência a partir das relações entre os
indivíduos sejam de caráter afetivo ou tomadas por impulsos sexuais. É justamente esse tipo de
dor que tem a maior capacidade de ferir e atingir o ego do indivíduo. Como “remédio”, ou
melhor, saída para a dor, aponta algumas alternativas: a desistência do desejo, a procura de algum
prazer alternativo que possa saciar essa ausência, e ainda a fuga da realidade por meio da loucura,
a criação de um universo íntimo, que pode também acarretar no uso de drogas como meio de
evasão desse sofrimento.
É em o Mal-Estar na Cultura (1930) que o laço social será pensado não só pelas
vicissitudes da libido, mas também pelo aspecto radical da pulsão de morte. As razões do
agravamento da condição psíquica derivam do tratamento dispensado à pulsão de morte pela
civilização.
Freud ao final deste texto chega à conclusão: Que poderoso obstáculo à civilização a
agressividade deve ser, se a defesa contra ela pode causar tanta infelicidade quanto sua própria
agressividade? (FREUD, 1930, p. 168).
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Neste momento, após termos conhecido as bases da construção do sujeito em psicanálise e
da convivência dos indivíduos no meio social, vejamos no próximo item quais são as posições
discursivas ocupadas pelas teorias da avaliação institucional universitária.
2.2 Os Discursos em Lacan
Como dissemos anteriormente, Lacan em suas teorias sobre os discursos desenvolve as
ideias de Freud sobre a cultura e seu funcionamento. Desenvolve a ideia de que o laço social, isto
é, o relacionamento entre os seres humanos, é sustentado pelos discursos, a saber: do mestre, do
universitário, da histérica e do analista. Portanto, assume as características da época e da cultura
em que está inserido, distinguindo-se através das formas de gozo dos sujeitos, sobre os quais
exercem seus efeitos. Lacan propõe os discursos afirmando que são formas de utilização da
linguagem como vínculo social, pois é na estrutura significante que o discurso se estabelece. São
as articulações das cadeias significantes que geram os discursos.
“Os discursos nada mais são do que a articulação significante, o
aparelho, cuja mera presença, o status existente, domina e governa tudo o que
eventualmente pode surgir de palavras. São discursos sem palavras, que vêm em
seguida alojar-se nele”. (LACAN, 1992, p. 158).
Para Lacan o discurso excede à palavra, vai mais além dos enunciados que realmente se
pronunciam. O discurso subsiste sem palavras, porque se trata de relações fundamentais que se
sustentam da linguagem. “O discurso sustenta a realidade, a modela sem supor o consenso por
parte do sujeito”. (LACAN, 1977, p. 21).
Na verdade, os discursos são para Lacan, as quatro possibilidades de relacionamento:
governar, educar, analisar e fazer desejar, pensadas a partir das formulações freudianas sobre o
“mal- estar na civilização”. Os discursos são o novo modo de Jacques Lacan apresentar a posição
dos sujeitos nos laços sociais, no centro de uma articulação inusitada entre o campo da linguagem
e o campo do gozo.
Em “O seminário, livro17: o avesso da psicanálise“ (1969/70) ele discute as formas de
laço social a partir da definição de quatro discursos: do mestre, do universitário, da histérica e do
analista, utilizando matemas para representar os laços sociais nos discursos. Os matemas são a
formalização da lógica matemática a serviço do processo analítico. Visam permitir a transmissão
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de um mínimo daquilo que se decanta da experiência analítica, já que “o real só poderia se
inscrever por um impasse de formalização”, dado a sua impossibilidade de subjetivação.
Os matemas ocupam um lugar de intercessão entre fantasia e real. Os quatro discursos, do
mestre, do universitário, da histérica e do analista, além do discurso capitalista, são quatro
configurações significantes - embora nem tudo seja significante na estrutura do discurso - que se
diferenciam e se especificam por sua distribuição espacial. Está em jogo aquilo que ordena e
regula os vínculos sociais entre os sujeitos.
Como já dissemos anteriormente, o sujeito objeto de estudo da psicanálise, é o sujeito do
inconsciente, é aquele dividido, sem qualidades, vazio, com a característica de vir a ser. Esse
sujeito surge da relação significante, pois um significante representa o sujeito junto a outro
significante.
Lacan (1992) ilustra o argumento acima no seguinte matema:
A formalização dos discursos respeita uma distribuição espacial que se dá em dois níveis:
quanto aos lugares - que são permanentes, e quanto aos termos:
O agente :
Estrutura a produção discursiva, domina o laço social, ao dar o "tom" ao discurso e ao
possibilitar que haja alteridade. O agente não é aquele que age, é o agenciador, promove o
discurso. O agente é movido pela verdade, lugar que pode ser ocupado por qualquer termo.
O outro:
É aquele a quem o discurso se dirige. O outro precisa do agente para se constituir.
63
A verdade:
A verdade sustenta o discurso, mas é acessível apenas pelo "semi-dito". Ela não pode ser
toda dita, havendo uma interdição entre a produção e a verdade.
A produção:
A produção é o efeito do discurso, é aquilo que resta.
Lacan vai estabelecer a verdade como um lugar, distinção entre lugares e os elementos
que entram nesses lugares – “o indivíduo é transformado e transforma”.
A forma do discurso surge em sequência fixa, mas ocupa alternadamente cada uma das
posições de sua estrutura básica:
O S1
É o significante mestre - representa o sujeito como determinado pela ação significante. É
a condição da articulação da cadeia, estando, de alguma forma, fora dela. É um significante vazio
de significação. Ele comemora a erupção de um gozo associado ao S2 (saber), inicia uma
linguagem.
S2
É o matema do saber - significante diante do qual S1 representa o sujeito - ligação em
que se estrutura a cadeia mínima para a significação.
A psicanálise é o descobrimento de um saber que não se sabe - o inconsciente - cuja
articulação é a do S2. Representa toda a cadeia significante.
Objeto a
objeto "a", causa de desejo ou mais-de-gozar.
Lacan verificou que a estrutura do inconsciente estava incompleta e distante do desejado.
Para Lacan, o sujeito nunca é completo a partir do seu próprio eu. A função do objeto a é de
simbolizar a falta do Outro, é um gozo que escapa.
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Sujeito Barrado $
É o sujeito marcado pela barra - a possibilidade de vir a ser. O sujeito é, para Lacan,
esvaziado de toda substância.
No momento em que o significante (S1) intervém no campo do Outro (A), campo
estruturado por um saber (S2) em que outros significantes se articulam, surge o sujeito dividido
($). Nesse caminho há também uma perda, que Lacan denomina objeto a. Esta estrutura é
chamada por Lacan de Discurso do Mestre:
[...] é fato, determinado por razões históricas, que essa primeira
forma, a que se enuncia a partir desse significante, que representa um sujeito ante
outro significante, tem uma importância toda particular na medida em que, entre
os quatro discursos, ela se fixará no que iremos enunciar este ano como discurso
do mestre (LACAN, 1992, p. 18).
No discurso do mestre, podemos ver a relação dialética entre o senhor e o escravo em uma
análise feita por Lacan, na qual ele discute a ideia de que o escravo se libertará pelo trabalho:
[...]. O trabalho, diz-nos ele, a que se submete o escravo, renunciando
ao gozo por medo da morte, será justamente a via pela qual ele realizará a
liberdade. Não há engodo mais manifesto politicamente e, ao mesmo tempo,
psicologicamente. O gozo é fácil para o escravo e deixará o trabalho na servidão
(LACAN, 1998, p. 825).
Partindo do discurso do mestre, surgem três estruturas discursivas, levando em conta que
a cadeia simbólica não pode ser desarrumada - com exceção do discurso do capitalista, abordado
mais adiante. Cada uma das estruturas desses discursos é diferente da outra pela posição dos
termos. Lacan chama seus discursos de "pequenos quadrípodes giratórios", definindo "quatro
discursos radicais".
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Esses discursos segundo Lacan dão sustentação ao mundo, fazem parte de seus pilares. A
cada um quarto de giro dos termos pelas posições, obtemos cada um dos quatro discursos, que se
seguem:
Além dos quatro discursos há, ainda, o Discurso do Capitalista, fora da ordem lógica dos discursos:
O Discurso do Capitalista, ao qual Lacan se refere no Seminário 17, não é propriamente
um outro discurso, mas uma forma mais contemporânea de pensar o discurso do mestre ( Quinet,
2006).
Cabe verificar que as posições mudaram e apenas o lugar da verdade permanece o
mesmo. Mas não existe nenhuma relação entre o agente e o outro: não há laço social no discurso
do capitalista, não há vínculo entre o capitalista e o proletário.
A proposta de Lacan para o Discurso do Mestre:
A verdade do mestre é a castração. O escravo tem algum saber sobre a castração do
senhor, pois o $ no lugar da verdade indica que o sujeito é dividido.
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Aqui, o saber ocupa a posição dominante; o sujeito sapiente é o agente. O professor
transmitirá o ensino. O "a", como outro, representa o estudante (ou "a"-estudante, como prefere
Lacan) que, causado pelo desejo, realiza o trabalho de escrever, sendo explorado pelo discurso
universitário.
O produto da universidade é um sujeito barrado – ($), incompleto, que sempre terá desejo
de saber mais. Lacan diz que o estudante entra na universidade achando que sabe tudo e sai
consciente de que não sabe nada. O S1 aparece no lugar da verdade, que ordena: "- Vai, continua.
Não para! Continue... a saber, sempre mais" (LACAN, 1992, p. 98).
Este discurso tem no educador o seu principal agente, ao mesmo tempo sujeito e
assujeitado. Assujeitado, sim, porque o professor não ensina os conteúdos que ele produz, mas
sim peça da engrenagem da instituição que o autoriza ou não ser livre para pensar e agir.
Portanto, esse professor não se autoriza por si próprio, mas sim através de “Outros”.
O discurso da histérica tem grande importância para a psicanálise. Foi na escuta desse
discurso que Freud fundou a psicanálise e sua descoberta principal, o inconsciente. O S2 aparece,
portanto, na posição de produção. A histérica sabe-se dividida ($ como agente) - o sintoma
aparece como dominante e solicita interpretação. A posição histérica é, antes de tudo, de
questionamento, até sobre si própria. A histérica admite sua falta e procura, incessantemente,
preenchê-la. Para preencher essa falta constitui alguém como mestre, mas com a intenção de mais
67
além de questioná-lo, frustrá-lo; é como “puxar o tapete”. É nessa posição, de mestre, que ela
busca colocar os que a cercam, mas sempre para em seguida tirá-lo do lugar de mestre. O objeto
"a" está na posição da verdade, em separação do saber: "Sua verdade é que precisa ser objeto a
para ser desejada" (LACAN, 1992, p. 167).
“O que a histérica quer", afirma Lacan:
[...] é um mestre. A tal ponto que podemos indagar se a invenção do
mestre não partiu daí [...] Ela quer que o outro seja um mestre, que saiba muitas e
muitas coisas, mas mesmo assim, que não saiba demais, para que não acredite
que ela é o prêmio máximo de todo o seu saber. Quer um mestre sobre o qual ela
reine (LACAN, 1992, p. 122).
O agente, no discurso do analista, é o desejo inconsciente, um questionamento dos
significantes mestres. A posição do analista é feita substancialmente do objeto "a", causa de
desejo, a partir do qual é possível a associação livre; assim, "o analista se faz causa do desejo do
analisante" (LACAN, 1992, p. 36). O saber inconsciente (S2) ocupa, no discurso do analista, o
lugar da verdade. E estando no lugar da verdade, é um enigma, um dito pela metade.
A experiência analítica é, para Lacan, "uma experiência de discurso", uma experiência da
ordem do saber, que liga S1 a S2.
No discurso do mestre, que poderia aproximar-se de uma fala do eu, há a ideia de que
quem fala sabe sobre o que fala. Há o recalcamento da falta, é o discurso da possibilidade do
saber. O discurso do analista provoca exatamente o desvelamento do recalcado. Provoca a queda
do saber suposto, para que o sujeito possa produzir outros saberes. Almeja a produção do
inconsciente, pela associação-livre.
No discurso universitário existe um saber erudito ao qual o aluno deve se submeter. Existe
um saber sobre o objeto - o aluno como objeto – de como ele deve ser. O saber é da ordem de um
grande Outro, o que instiga a alienação do sujeito. Buscar um mestre que possa dominar o saber é
o intuito da histérica que recalca a falta e provoca a fala no corpo. O efeito deste discurso é
provocar o saber, pois ele desafia a autoridade, a teoria estabelecida, propondo insistentemente a
dúvida sobre o saber do Outro.
68
Lacan, em vários momentos, faz referência a capturar um discurso a partir de outro não só
por meio do giro de um quarto de volta, mas também pela inversão completa. Então, pode-se
concluir que cada discurso resulta do que seria o seu oposto. No Seminário 17, essa inversão já
está presente desde o título, O avesso da psicanálise: “Deve começar a aparecer a vocês que o
avesso da psicanálise é justamente isso que eu avanço este ano sob o título de discurso do senhor”
(LACAN, 1991, p. 99).
O seminário posterior de Lacan refaz esse ponto: “O discurso do senhor não é o avesso
da psicanálise, ele é onde se demonstra a torção própria, eu diria, do discurso da psicanálise”
(LACAN, 2006, p. 9). A relação entre os extremos aparentemente contraditória da matriz dos
discursos é capturada de forma mais precisa pela fita de Moebius, que matiza a ideia de oposição
sobrepondo-lhe a ideia de continuidade. O fundamento disso se torna claro quando prestamos
atenção que o termo que ocupa o lugar da produção em um discurso é o agente no outro, e vice-
versa. É essa a relação que existe entre o discurso da universidade e o discurso da histeria na
contemporaneidade. Sem esquecermos que o discurso do senhor permanece como referência
subjacente aos dois discursos.
Em seu livro “Psicose e Laço Social” (2006, p. 37), Antonio Quinet, faz a seguinte
observação à histerização do discurso universitário:
“A histeria, como avesso do discurso universitário da burocracia, faz
objeção ao totalitarismo perverso do saber, seja ele qual for. Esse discurso é o
responsável pela utilização do saber como forma de tratamento do mal-estar na
civilização (grifo nosso). A histeria como produção de saber provocado pelo sujeito
é o que faz Lacan encontrar a afinidade da ciência com o discurso da histérica- que é
o melhor que se pode esperar da ciência. O pior é quando ela se encontra a serviço do
discurso do capitalista(nova modalidade do discurso do mestre)(...). O sujeito
histerizado pelo discurso universitário restitui, em seu laço social, um mestre que
produzirá o saber que promove, ao ser agente, o discurso universitário. E assim por
diante- o que não constiui propriamente uma saída”.
69
Capítulo 3
A AVALIAÇÃO INSTITUCIONAL E SEUS ATORES: UM GIRO NO DISCURSO DA
AVALIAÇÃO
Estamos vivendo no presente século uma conjuntura histórica de situações complexas e
contraditórias, particularmente no que se refere às mudanças nas universidades. Dentre os
processos contemporâneos e polêmicos no meio acadêmico, emerge a avaliação institucional,
tema desta dissertação.
Frente a essa peculiar demanda, devido à necessidade de sobrevivência no mercado e,
também, às novas políticas consideradas no primeiro capítulo deste trabalho, as universidades
passaram a se preocupar com seus projetos de avaliação institucional. Atualmente não se faz
gestão universitária sem processo de avaliação. Com isso, surgiu a necessidade de melhor
entender a trama destes processos internos e os laços sociais que implicam na comunidade
acadêmica. Estamos em busca de novas formas de relações institucionais que são fortemente
abaladas pelas mudanças que, por mais bem planejadas que sejam, esbarram em processos
ligados às subjetividades dos atores. Percebe-se uma insatisfação reinante, muitas vezes
silenciosa e uma retração na participação destes nos processos internos de avaliação. Uma
análise criteriosa desta questão à luz dos conceitos psicanalíticos, particularmente com a teoria
dos discursos, pode ser um diferencial importante como suporte para o seu melhor entendimento,
quando se trata da participação do sujeito no grupo.
3.1 Por uma Avaliação mais Qualitativa: Proposta de Giro no Discurso Universitário
A avaliação, como uma prática pedagógica, exige um planejamento estratégico e uma
análise detalhada que traga valores importantes para o desenvolvimento da instituição, justamente
para evitar que seja confundida com uma ação de controle interno-punitiva, respaldada por
instrumentos legais externos.
É consenso no meio educacional que as universidades sempre resistiram às mudanças e
que estas são lentamente assimiladas. É o caso dos novos processos avaliativos. Existem
resistências, no interior das instituições decorrentes, das alterações que as reformas produzem nas
práticas dos atores docentes nas diferentes culturas institucionais.
70
As reformas são vistas, por parte significativa dos docentes, como uma ameaça às suas
crenças, aos seus valores, às suas escolhas políticas, às suas práticas didático-pedagógicas etc.
Há, também, como vimos, divergências quanto aos projetos e finalidades da avaliação. Para
alguns há um reducionismo da função da educação superior, particularmente, a universitária.
Todavia, um bom número de mudanças, adaptações e experiências estão sendo testadas. Existem
várias universidades dando tratamento especial ao setor de avaliação com profissionais
capacitados que tentam manter um processo mais qualitativo.
Faremos uma leitura de como, de um modo geral, a universidade opera com as duas
vertentes da avaliação institucional - quantitativa e qualitativa - identificando quais são os
principais obstáculos e consequências, além da exclusão do sujeito do desejo e dos modos de
lidar com eles adotados pela universidade. Para isto buscaremos identificar quais são as
contribuições estabelecidas pelas estruturas discursivas propostas por Lacan no desenvolvimento
da avaliação.
A partir de seu envolvimento como ciência moderna, a universidade passa a se referenciar
pelo domínio das fórmulas e letras, ou seja, pela técnica e pela exatidão. Esse mundo criado entre
o ideal e o teórico levou a universidade a disseminar um suposto saber estabelecido, acumulado,
que poderia ser dominado, apreendido e distribuído universalmente.
Assim sendo, no campo da ciência e, portanto, na universidade, todas as ações são
realizadas em favor do conhecimento e da racionalidade científica, e o resultado mais
significativo disso é a exclusão, nesta cena, do sujeito como sujeito do desejo. Essa atitude
adotada pela universidade, na visão de Lacan, é característica de sua adoção do discurso da
ciência, a serviço do capitalismo, com consequências, não só para o ensino, como também para o
processo de avaliação.
Compreendendo a universidade à luz da teoria dos quatro discursos proposta por Lacan,
torna-se possível analisar esta questão que se define pela relação estabelecida com o saber que
opera na universidade. Para diversos autores há um processo de padronização dos atores, assim
como dos processos que ocorrem na universidade, como se existisse uma só forma de agir e
pensar, isto nos remete ao conceito de sujeito e às suas posições nos discursos de Lacan que
visam responder aos enigmas relativos às instituições sociais, considerados como ”impossíveis”
de funcionar, dentre outras, a escola. Como disse Foucault:
“A penalidade perpétua que atravessa todos os pontos e controla todos
os instantes das instituições disciplinares compara, diferencia, hierarquiza,
homogeneíza, exclui. em uma palavra, ela normatiza” (Foucault, 2003 p. 153).
71
Como lembra Sousa Santos (2000), o dilema consiste em que a validação de uma só forma
de conhecimento provoca a cegueira epistemológica e valorativa, destruindo as relações entre os
objetos e, nessa trajetória, eliminando as demais formas alternativas de conhecimentos: "O
reverso da força da visão única é a incapacidade para reconhecer visões alternativas" (p. 241)...
Esse fenômeno pode redundar num epistemicídio "a destruição de formas alternativas de
conhecimento não é um artefato sem consequências, antes implica a destruição de práticas sociais
e desqualificação de agentes sociais que operam de acordo com o conhecimento em causa" (idem,
p. 242).
Mas, ainda que o discurso universitário nos pareça ter predomínio no âmbito da
universidade, tanto no ambiente da burocracia, quanto no ambiente acadêmico, evidenciando-se
isto nas formas quantitativas da avaliação, a experiência discursiva universitária não deveria se
resumir ao discurso universitário.
A nosso ver, em consequência desta predominância, o exercício da avaliação institucional
nos espaços institucionais vem mostrando, pelas situações vivenciadas, um distanciamento entre
estes mesmos processos de avaliação desencadeados e as práticas dos sujeitos, com desencontros
e lógicas conflitivas que impedem, devido, ao seu potencial de exclusão dos sujeitos, como
comentado anteriormente, o alcance das mudanças almejadas pela avaliação. Mas, os discursos,
podem girar por posições distintas, assumidas por docentes e alunos frente à construção e
transmissão do saber. Ou seja, girar para a posição histérica. Conforme Lacan, a histérica é o
avesso da padronização da burocracia, porque é lugar de produção do saber novo, no que tem
afinidade com a ciência.
A avaliação institucional, que inclui os atores-sujeitos, inclui o discurso histérico e
necessariamente acontece num ambiente em que se pode presenciar saudáveis confrontos e
convergências de universos e ideologias e de representações. Essas tramas institucionais, tecidas
por seus atores, são construídas e reconstruídas e interferem no processo avaliativo de forma
positiva ou não, mas são sempre lugares que propiciam o novo.
Buscamos teóricos com experiência de campo para compreendermos melhor o que ocorre
com os atores institucionais. Philippe Perreneud, Doutor em Sociologia e Antropologia, professor
de práticas pedagógicas nas Faculdades de Psicologia e Ciência da Educação na Universidade de
Genebra sempre transmitiu suas experiências sobre avaliação institucional buscando caminhos
para minimizar as diferenças no contexto complexo da aplicação da avaliação e da implantação
72
da cultura nas instituições de ensino superior. Perreneud em seu livro “Avaliação: da excelência à
regulação das aprendizagens - entre duas lógicas” - mostra a complexidade do problema da
avaliação, o qual se refere à diversidade das lógicas em questão, a seus antagonismos, ao fato de
que a avaliação está no âmago das contradições do sistema educativo e, constantemente, na
articulação da seleção e da formação, do reconhecimento e da negação das desigualdades”.
(Philippe Perreneud, 1999).Sua visão remete-nos para uma autoavaliação formativa, portanto
qualitativa.Fala em desenvolver uma cultura de autoavaliação, que devemos reconhecer que o
que mais caracteriza a avaliação institucional é como o resultado é utilizado pela gestão da
universidade. Se esse resultado não está sendo bem aproveitado deve-se mudar o foco da
universidade. Os dados fornecidos pela autoavaliação são subsídios importantes para a criação da
cultura de avaliação e cada um deve saber o seu papel dentro do processo, a instituição deve
ultrapassar esse conceito ampliando suas possibilidades.
Perreneud, enfatiza que cada ator-sujeito do processo, professores, coordenadores, alunos,
gestores, funcionários têm sua importância no sistema autoavaliativo, e que o poder que a
instituição detém limita o processo de autoavaliação ao sistema de controle porque a tendência é
ampliar, reproduzir e aprofundar o papel do Estado, ou da burocracia universitária. Afirma que
isso acontece porque as instâncias de poder precisam exercer um controle mínimo para medir o
processo e os resultados alcançados.
É plenamente difundido no meio institucional que os atores-sujeitos envolvidos nos
processos universitários precisam acompanhar as mudanças mundiais, atualizando-se de maneira
continuada. Mas, antes de tudo, precisam estar predispostos às mudanças consequentes desse
processo que serão necessárias para o desempenho frutífero da avaliação institucional. A
mudança é de ordem cultural, uma cultura aberta à inovação, ao novo, que tenha a capacidade de
atualizar-se constantemente. Seria isto possível sem uma participação, efetiva, fundamentada em
um desejo real de participação dos atores-sujeitos? Seria isto possível sem o giro para o discurso
histérico?
Pronunciamento do Relatório Final da Conferência Mundial sobre Educação Superior da
UNESCO (1998 – pg. 25):
“...Devido ao escopo e à velocidade das mudanças, a sociedade tornou-se
incrivelmente baseada no conhecimento, de modo que a educação superior e a
pesquisa atuam como componentes essenciais do desenvolvimento cultural, sócio-
econômico e ambiental sustentável de indivíduos, comunidades e nações. A
Educação Superior é confrontada com desafios formidáveis e deve proceder à mais
radical mudança e renovação que foi jamais requerida a fazer”.
73
Em seguida relatam-se como deve ser a mudança:
Dentro desta concepção, são os atores-sujeitos do processo avaliativo universitário que
necessitam mudar e assumir o desafio de sua auto superação e do aprendizado contínuo. Os
discentes devem reivindicar o máximo da instituição e de seus professores, para o alcance de um
crescimento pessoal e profissional. Quanto aos docentes devem estar aptos e desejosos a construir
ponte entre o mundo da ciência, da tecnologia, da filosofia e o mundo discente com suas
carências formativas. Os colaboradores (técnico-administrativos) precisam cumprir sua parte a
fim de que as metas da universidade se realizem evitando uma cultura burocrática que lembra
uma repartição pública formalmente eficiente, mas sem comprometimento real.
Pierre Bourdieu, filósofo, sociólogo e antropólogo francês, grande pesquisador, fundador
e diretor do Centro de Sociologia da Educação e da Cultura e considerado um dos maiores
intelectuais de seu tempo, em seus últimos anos de vida ficou conhecido por suas contundentes
intervenções políticas contra os efeitos do neoliberalismo sobre os sistemas educacionais. Como
foi colocado anteriormente, o discurso universitário está sujeito ao da ciência que serve ao
capitalista.
Ao aprofundar suas pesquisas sobre a posição do professor nas práticas institucionais
docentes, concluiu:
“A posição do professor, em qualquer nível que seja, me parece,
de fato, muito dificilmente compatível com a posição de pesquisador. Pode-se objetar
que existem posições de professor-pesquisador, que há um certo número de
instituições, (...) onde estruturas pedagógicas estão integradas à pesquisa.
Infelizmente, o que se chama ensino, de modo corrente, são lugares de transmissão,
codificada, rotinizada do saber, e uma parte considerável da inércia dos campos
científicos vincula-se ao atraso estrutural resultante do fato de que as pessoas que
ensinam são comumente desconectadas da atividade de pesquisa. Assim,
bizarramente, não é exagerado dizer que o ensino é, em parte, um fator de inércia. Os
professores têm interesses inconscientes pela inércia. Uma vez que não estão
conectados diretamente à pesquisa viva, são solidários da rotina, pelo simples
fato de estarem estatutariamente, um pouquinho à margem, e eles têm, mesmo,
às vezes, um interesse inconsciente em desqualificar o que é eminente (grifo
nosso). Isso é particularmente visível nas disciplinas literárias, nas quais o professor
permaneceu como um leitor , no sentido medieval do termo, que tem uma espécie de
desconfiança com relação aos autores, inventores, criadores etc. Mas o mesmo
74
fenômeno observa-se em medicina e em ciência. Assim como, segundo Weber, o
padre rotiniza a mensagem do profeta, o professor rotiniza, banaliza o discurso
criador, em particular, fazendo desaparecer o que é fundamental, isto é: O problema
tal como colocou o criador”. (BORDIEU, 1997[2003]p.71-72).
O desafio da avaliação é o de exercer um papel estratégico de modo a incluirmos os atores
como sujeitos no processo, que é o mesmo que dizer - possibilitar o giro pelos discursos. Só
assim, tomando de Bordieu as palavras, pode - se ter “pesquisa viva”. Os atores terão saído “das
margens” para o centro do processo.
O que uma avaliação institucional pode operar é a mudança da cultura. Com os atores
participando como sujeitos, tudo pode mudar no ambiente universitário, as salas de aula, os
laboratórios, os núcleos de pesquisa, os colegiados, os departamentos, a reitoria, as instâncias de
representação dos interesses corporativos, a própria universidade, o entorno, a comunidade
regional e suas instituições também poderão, progressivamente, refletir essa nova cultura. A
possibilidade de uma universidade ser uma instância transformadora de seu entorno está
diretamente ligada à sua capacidade de atualizar-se.
Mas toda essa discussão leva - nos a voltar à consideração de que para alguns autores,
nos últimos dez anos, a avaliação institucional no Brasil tende a assumir um caráter controlador e
regulador, regido, portanto, pelos discursos que causam esse efeito. Para alguns destes autores, há
uma contradição nas propostas neoliberais para a educação que precisa ser levantada: por um
lado, um discurso de autonomia universitária, que, em princípio, poderia significar um
fortalecimento do trabalho docente, porém há um rígido controle pedagógico bastante
centralizado (como o modelo pautado em provas para avaliação do sistema e a proposta de um
currículo nacional), que é a própria negação da autonomia docente:
"Ensinar não é uma atividade como as outras. Poucas profissões serão
causa de riscos tão graves como os que os maus professores fazem correr aos
alunos que lhe são confiados. Poucas profissões supõem tantas virtudes,
generosidade, dedicação e, acima de tudo, talvez entusiasmo e desinteresse. Só
uma política inspirada pela preocupação de atrair e de promover os
melhores,(grifo nosso) esses homens e mulheres de qualidade que todos os
sistemas de educação sempre celebraram, poderá fazer do ofício de educar a
juventude o que ele deveria ser: o primeiro de todos os ofícios." (Bourdieu, 1982).
75
No meio de toda essa mudança de conceitos, conclui-se pelos relatos registrados no
material teórico pesquisado que não só os alunos, mas os professores universitários, atualmente
no Brasil, estão submetidos paulatinamente à lógica de mercado, estimulada pelos modelos
externos de avaliação, de modo a serem fortemente atingidos na sua condição de poder e
autoridade, ficando como diz Bordieu, “à margem”. Perdendo, por isto mesmo, sua crença nas
possibilidades mais transformadoras da avaliação. A contradição em tela dos processos de
regulação da avaliação institucional é que, ao mesmo tempo em que se propõem formas – pelo
menos é a retórica – de aumentar a autonomia universitária, visando o fortalecimento do trabalho
docente e de seu poder sobre o trabalho pedagógico, ocorre uma centralização dos processos de
avaliação do sistema de ensino (provas e currículo nacional, por exemplo) e de controle do
trabalho pedagógico que desresponsabiliza os atores, consequentemente, excluindo-os do
processo.
Ao finalizar este capítulo, constatamos que não se trata de uma tarefa simples pesquisar os
processos avaliativos. Deparamo-nos em nossa reflexão, com vários aspectos da política
avaliativa e, particularmente, com dois pontos de vista cruciais: a avaliação formativa e a
mercadológica.
Nesse espaço de contradições, na esfera da avaliação institucional, e frente às mudanças
internas e externas globalizadas, haverá condições de se consolidar um processo avaliativo que
favoreça a participação dos atores institucionais como sujeitos desse processo?
Dentro desse contexto, há a possibilidade de provocarmos uma cultura de avaliação?
Como pensar a relação entre ensino formador de pesquisadores, de “cabeças pensantes”,
alunos e professores, sem os imperativos iminentes do mercado, que exigem “resultados já”?
Como fazer uma avaliação mais qualitativa que inclua o ator-sujeito como sujeito do
desejo?
Esta questão nos leva, neste momento, para um enfoque especial nas posições discursivas
ocupadas na universidade e seus efeitos na avaliação que são: o discurso universitário e o
discurso da histérica, tendo em vista estabelecer uma relação dessas duas posições discursivas
com a avaliação quantitativa e com a avaliação qualitativa. Sabemos que todos os discursos (do
mestre, do analista, do capitalista), além desses dois, circulam no ambiente universitário.
A seleção de duas estruturas discursivas se deve ao fato da predominância evidente do
discurso universitário, na sua relação com o discurso da ciência a serviço do capitalismo, no rol
de discursos presentes na universidade, fato este que tem como consequência a exclusão do
76
sujeito do desejo e a consequente inércia do ator-sujeito quanto a uma participação efetiva tanto
nos processos de avaliação quanto na execução do que decorre dela. A abertura ao discurso da
histérica, como se disse, pode ser a via, no âmbito da universidade, de inclusão do sujeito do
desejo. Com esta escolha, temos a intenção de analisar as possíveis contribuições que o giro nas
posições discursivas, particularmente, para a posição histérica, pode oferecer ao melhor
desempenho do processo de avaliação institucional no ambiente universitário.
O discurso universitário e o da histérica resultam de um giro de um quarto de volta a
partir do discurso do senhor; num caso, o giro é no sentido anti-horário, no outro, é no sentido
horário. Em consequência, as posições de cada termo no discurso da histeria são exatamente
simétricas às posições no discurso da universidade. E, entre eles, parece haver uma
complementaridade. O discurso da universidade produz um sujeito dividido (S), esvaziado de sua
particularidade (a): o proletário privado da mais-valia; o cidadão despojado de suas crenças, raça,
sexo, transformado no indivíduo anônimo das massas. O discurso da histeria coloca esse mesmo
sujeito (S) na posição principal, incitado pelo objeto do desejo (a). No discurso da histérica, o
sujeito está no lugar de agente e o saber ocupa o lugar da produção. O significante mestre (S1)
ocupa o lugar do trabalho a quem se dirige o discurso.
O que caracteriza o educador, e mais especificamente, as agencias administrativas na
universidade que estão no discurso histérico é poderem abrir mão da posição de um saber
absoluto e passar a um questionamento do saber que está no Outro. Esta adoção do discurso
histérico refere-se ao afloramento do sujeito que anseia saber acerca de sua falta, a partir de seus
erros, lugar no qual S2 é incapaz de dar conta de sua divisão. Assumir a posição do discurso
histérico possibilita ao ator – sujeito encontrar-se com o que é um fato da estrutura. É como
sujeito barrado que ele pode permitir a articulação e o deslizamento significante e impedir a sua
estagnação. O discurso histérico surge por meio do desejo, no ato de dizer, na busca particular do
que falta ao próprio saber que se transmite. A construção de saber é ordenada pelo que não se
sabe, mas interroga.
A circularidade dos discursos no âmbito universitário se faz fundamental para a evolução
das relações com o saber na universidade, tendo como premissa que o discurso da histérica
proporciona interrogações ao saber estático. O giro do discurso universitário para o discurso da
histérica pode ser a relação de avesso existente entre eles?
3.2 A CPA (Comissão Própria de Avaliação) como Agente da Avaliação
77
Entendemos que pela relevância e importância na criação da cultura das IES e por seu
objetivo de coordenar e articular o processo interno de avaliação da instituição, bem como
sistematizar e disponibilizar informações e dados, a CPA pode ser encarada como agente da
avaliação. Ela deve ser formada por representantes de todos os segmentos da comunidade
universitária e da sociedade civil organizada. Ao final do processo de autoavaliação, a CPA
apresentará relatórios, pareceres e, eventualmente, recomendações. Todos os membros da
comunidade educativa – professores, estudantes, técnico–administrativos, ex-alunos e outros
grupos sociais relacionados devem se envolver nos processos avaliativos para a integração,
articulação e participação. A finalidade é a melhoria da qualidade acadêmica e o
desenvolvimento institucional pela análise das qualidades, problemas e desafios para o presente e
para o futuro. Os dados coletados são enviados ao MEC que os considera determinantes para a
fiscalização das Instituições de Ensino Superior para trabalhar os elementos obtidos em pesquisa
e entrevistas, planejando como será organizada a instituição em termos de ações administrativas e
educacionais.
Como se viu no primeiro capítulo, existe uma contradição nos processos de regulação da
avaliação institucional que, ao mesmo tempo, propõe formas de aumentar a autonomia
universitária, visando o fortalecimento do trabalho docente e de seu poder sobre o trabalho
pedagógico, mas centraliza os processos de avaliação do sistema de ensino produzindo uma
avalanche de portarias, prejudicando, assim, o trabalho, o desenvolvimento e a autonomia das
instituições. Parece-nos claro que esse fato mostra bem como a avaliação está presa ao discurso
universitário, discurso que parece estar invadindo todas as áreas.
A partir do que foi desenvolvido até aqui, pode-se dizer que a CPA está inserida no
discurso universitário e no discurso da ciência, reguladores das ações, de onde, supostamente, tira
sua verdade. Ela reproduz os ditames do MEC e de normas bastante cristalizadas, - o seu Outro,
pois está submissa a ele, tira das orientações externas sua verdade.
A CPA, em sua ação institucional, de um modo geral, apresenta-se como agente do
discurso universitário, porque pode se autorizar ações supondo uma verdade que permite que ela
se autorize. Essa verdade, enquanto institucional, é neste caso, a verdade do discurso
universitário, ou mais explicitamente, uma reprodução do MEC.
Se a CPA, nesta posição de agente, atua e qualifica o laço social, não se poderia pensar
que seria produtivo que saísse da posição de assujeitada a qualquer que seja o discurso pronto,
tido como verdade?
78
É esta alienação que nos permite concluir que os processos avaliativos estão inseridos no
discurso universitário - da burocracia padronizado, cuja Produção é o a- sujeito, ou o alienado.
Isto não explicaria a falta de adesão aos processos de avaliação?
Para buscar uma saída desta alienação não seria possível o giro para o discurso da
histérica? Giro que permitiria a instalação de formas coletivas de condução e resolução das
dificuldades que dessem sentido à construção de intercâmbios novos, superadores dos
burocraticamente estabelecidos, com a participação dos atores envolvidos nas práticas de
avaliação?
No campo da Educação, há uma preocupação evidente em quantificar acertos e erros. Isso
é conduzido por uma crença na possibilidade de controle dos resultados. Na avaliação
institucional, exclusivamente quantitativa, em nome de uma objetividade científica, usa-se uma
contabilidade que tenta definir antecipadamente o bom do ruim. Essa prática inibe o sujeito de
fazer suas escolhas autênticas, pois, o sujeito que emerge é o da objetividade, o que é verdade no
sujeito fica submerso.
Com a posição mais próxima do discurso da histeria, o discurso universitário talvez
pudesse se tornar menos unívoco e totalitário, apontando-se o ”impossível” de se avaliar.
Possibilitar o giro do discurso universitário para o discurso da histérica, pelo desejo de trocar
experiências com seus pares, faria o processo avaliativo mais dinâmico. Assim como governar,
ensinar e analisar, são profissões impossíveis (Freud 1937), é igualmente impossível avaliar. Esta
impossibilidade, entretanto, torna a avaliação ainda mais necessária.
A experiência avaliativa aponta, e o acervo pesquisado confirma, que as ações coletivas e
dinâmicas devem ser incentivadas para promover sinergia entre os envolvidos, o que dará a eles
autoridade quanto à expressão de suas vivências individuais e melhor qualidade na avaliação.
Também a capacitação dos avaliadores tem se mostrado escassa e inconsistente,
mas fundamental para a condução do processo.
De acordo com Ristof, e outros autores, o PAIUB foi o ideal em avaliação. Na linguagem
de psicanálise podemos dizer que foi uma avaliação que se fez sobre laços sociais, pois levou em
conta o desejo dos sujeitos. Conseguiu adesão espontânea, foi discutida em caráter nacional e
respeitou a autonomia das instituições, provocando debates nacionais. Mas a política produziu
um giro para o discurso capitalista, com a entrada no cenário nacional do ENC, totalmente
79
quantitativo, obrigatório e regulador, de acordo com Dias Sobrinho a serviço dos interesses das
forças de mercado.
Já o SINAES foi concebido para resgatar a cultura de avaliação dispersa construída pelo
PAIUB e a criação de um programa que possibilitasse a integração dos vários mecanismos de
aferição. Há discordâncias quanto aos seus efeitos.
Mas que tipo de avaliação nos interessa? Em qual delas a adesão poderia melhorar?
A princípio poderíamos dizer que o PAIUB cumpriu essa meta, pois, foi o que conseguiu
maior adesão dos atores, sendo um ideal em avaliação qualitativa e formativa - podemos dizer,
um momento único na história da avaliação. Como disse Ristoff:
A verdade é que, durante os anos de 1993 e 1994, o país viveu um
momento realmente histórico no tocante à avaliação. As iniciativas da
Associação Nacional de Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior
(ANDIFES), da Associação Brasileira dos Reitores das Universidades Estaduais
e Municipais(ABRUEM), dos Fóruns de Pró-Reitores de Graduação e
Planejamento encontraram eco na equipe, ideologicamente plural do MEC. Este
passou a exercer o papel não condutor do processo, mas de articulador, de
viabilizador e, por fim, de financiador. E isto talvez esteja fazendo toda a
diferença. (RISTOFF, 2000, p.38).
As instituições, não podem fugir das normas estabelecidas pela Política Nacional de
Ensino, mas em sua política interna, podem exercer uma avaliação que contemple a participação
desejante dos atores, permitindo ações que minimizem o mal-estar, que levem ao resultado
desejado, a uma cultura de avaliação. Mesmo sabendo que a avaliação nunca é totalmente
qualitativa, pois existem os dados quantitativos, a adoção de uma concepção qualitativa da
avaliação faz toda a diferença para o sucesso da mesma na instituição de ensino.
80
CONCLUSÃO
O presente trabalho objetivou investigar no primeiro capítulo a baixa adesão dos atores-
sujeitos aos processos avaliativos nas universidades privadas brasileiras num período recortado
de 1993 a 2004, isto é, do PAIUB ao SINAES.
Os teóricos da área consultados no decorrer desses dois anos de pesquisa (RISTOFF,
1996; BELLONI,1998; BORJA, 2003; DIAS SOBRINHO,2003; BOCLIN, 2004;CUNHA,2004),
além de alguns outros também citados ao longo deste, são unânimes em dizer que há um duplo
conceito em avaliação, a qualitativa e a quantitativa e que há uma extrema necessidade da criação
de uma cultura de avaliação. Existem também dois conceitos de qualidade: um gerado pelo
Estado com indicadores formulados por técnicos com uma visão neoliberal e outro onde a criação
dos indicadores é negociada com os agentes do processo. Há sempre uma dualidade; de um lado a
regulação e de outro o desejo de autonomia.
O caráter punitivo implantado historicamente no cenário da avaliação institucional
brasileira vem sofrendo transformações, pois havia uma busca por um programa que
sistematizasse o processo avaliativo. O que mais cumpriu a forma qualitativa foi o PAIUB,
porém a carência por sistematização continuou após seu término. A criação do SINAES ensejou
cumprir esse desejo consensuado da comunidade acadêmica, porém ainda faltam ajustes e acertos
em rumos equivocados como a regulação imposta por normas e portarias excessivas, colocando
em risco a autonomia das instituições.
Concluímos no primeiro capítulo a análise dos principais pontos que envolvem a
autoavalição e ratificamos que a criação de uma cultura de avaliação é uma dimensão importante,
“firmar valores”como diz (RISTOF,1996). Com isso, entendemos que a utilização dos resultados
da avaliação é primordial para o sucesso das instituições nos dias atuais e que o investimento na
análise dos processos e dos resultados pelas CPAs poderá impulsionar as IES para melhores e
excelentes posições externas.
Procuramos agregar ao polêmico debate sobre avaliação do ensino superior privado,
novas possibilidades para desenvolver um processo avaliativo mais saudável, mais democrático e
mais prazeroso. Encaminhamos então, nossa pesquisa, para o campo da psicanálise, visando
contribuir com a implantação de uma cultura de avaliação constituída e qualificada para o
aperfeiçoamento da gestão das instituições.
No segundo capítulo, percorremos algumas ideias de Freud. Ao longo de toda sua
obra Freud mostra que os desejos inconscientes são constituídos ao longo da história do sujeito e
81
que sua lógica é pulsional, sua relação é com o objeto perdido, nós somos alheios a essa vontade.
Isso demonstra que a exposição do homem no contexto social submete-o a certo enquadramento
para o melhor convívio na civilização, porém, torna-o insatisfeito, aliena-o e inibe seu
desenvolvimento.
Entendemos mais adiante que a Psicanálise procura a verdade localizada no subterrâneo
do discurso, a verdade sobre o desejo. É o próprio Freud que atenta para a força extraordinária de
nossos desejos. Fala também da relação do sujeito com o seu próximo na busca do objeto de
desejo que sempre remete ao Outro (enigmático). A forma radical em que o homem está
implicado, segundo Freud é a aproximação e o afastamento.
Toda essa subjetividade do sujeito é desprezada pela ciência. Para ela o sujeito é apenas
uma variável passível de mensuração. A ciência não dá lugar ao sujeito do inconsciente.
Na relação com os grupos vimos que são estes numerosos, ligados por vínculos de
identificação, formando seu ideal do eu mediante os mais variados modelos. É o que define a
constituição do desejo do sujeito – sujeito, para a Psicanálise, é sinônimo de desejo.
Freud tinha a intenção de mostrar que a identificação e o ideal do eu não são apenas
aspectos da estrutura psíquica, mas que permitem compreender o modo de constituição do laço
social.
Lacan reconhece que cada homem participa de formações discursivas que lhe permitem
possibilidades de constituição, como sujeito, pelos processos identificatórios.
Freud fala da exposição do indivíduo no meio social a uma espécie de policiamento,
enquadramento nas regras sociais que inibem seu desenvolvimento. Talvez seja neste momento
que a teoria freudiana nos revela a dificuldade de adesão à avaliação institucional, não seria
porque a forma regulação tende a excluir o sujeito do desejo?
Em seguida, chegamos por intermédio da teoria lacaniana, aos laços sociais que são
sustentados pelos discursos: do mestre, do universitário, da histérica e do analista. Por
conseguinte, assumem as características da época e da cultura em que estão inseridos,
distinguindo-se através das formas de gozo dos sujeitos, sobre os quais exercem seus efeitos.
Conseguimos pelos discursos, dispositivos de análise, para reflexão e articulação das
questões propostas, indicando o caminho das soluções dos fenômenos sociais encontrados no
grupo objeto de nosso estudo: atores da avaliação institucional.
82
No capítulo três a psicanálise, ao apontar a possibilidade de giro pelos discursos, abre
a possibilidade de se transitar pelo discurso histérico no âmbito da universidade.
Pensamos no discurso da histérica como avesso da dominação, pelo seu questionamento
ao saber estabelecido, ou seja, pelo abandono da concepção do saber como verdade. Nesse caso
poderemos ter o privilégio de articular saber e desejo no ambiente universitário. Mas, como
planejar esse giro, como seria este modelo de avaliação?
Além de ser uma prática encarada como um processo, a avaliação institucional, no contexto
universitário, pode também ser uma alternativa capaz de provocar novos debates na comunidade
acadêmica, podendo colaborar na revisão dos comportamentos, na reestrutura das práticas
administrativas e pedagógicas e estimular a interação e o diálogo para que os atores se conheçam
mais e, também, conheçam melhor a instituição - um lugar de construção de um ensino de alta
qualidade.
Os atores que convivem na IES produzem, na experiência do cotidiano, um conhecimento
da instituição que pode revelar uma realidade diferente daquela descrita nos documentos oficiais.
Essa realidade tem relação com o desejo do sujeito. Como conhecer essa realidade para atuar
sobre ela?
Conhecemos esta realidade quando provocamos uma ação que promove a escuta dos
atores. Porém, quando se está capturado por um discurso autoritário, cala-se o sujeito, este fica
assujeitado. Mesmo assim, os sujeitos são sempre dotados de alguma liberdade e iniciativa.
Nunca se submetem por completo à autoridade e sempre tem uma iniciativa que o detentor da
autoridade não havia previsto, portanto, não há como padronizar. Isto significa que não há como
deter inteiramente o sujeito, ou seja, o giro pelos discursos.
83
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87
Anexo 1
Publicação do Instituto de Pesquisas Avançadas em Educação ISSN 1517-1930
ano 20 - nº 234 - agosto de 2009
Avaliação da Educação Superior
A avaliação das universidades, centros universitários e faculdades é regulada pela
Lei nº 10.861, de 14 de abril de 2004, que instituiu o SINAES (Sistema Nacional de Avaliação da
Educação Superior), sendo disciplinada pelo Decreto nº 5.773, de 9 de setembro de 2006. São
previstos três processos: a avaliação interna, a avaliação externa das instituições e dos cursos e a
avaliação dos estudantes.
A primeira é feita pela própria instituição, através dos métodos de auto-avaliação;
a externa, pelo Ministério da Educação (quando se tratam de organizações mantidas pela União
Federal ou pela livre iniciativa) que prevê critérios de verificação das condições de oferta e a última,
dos alunos, por meio de aferição do desempenho acadêmico dos estudantes dos cursos de graduação,
que é feita por intermédio do ENADE (Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes).
Essa estrutura legal é perfeita e encontra cobertura tanto da Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional, como da Constituição Federal. Ocorre, contudo, que o Poder Público
não vem conseguindo exercer corretamente o seu dever (o de avaliar, na forma da lei) as instituições e
cursos. Inicialmente, justificando falta de recursos financeiros, criou taxa para verificação "in loco".
Congresso Nacional acolheu a proposta e editou lei específica, fixando valores, aliás significativos,
para que o governo cumprisse com sua obrigação.
Considerando que inexistiram questionamentos judiciais até o presente momento as
mantenedoras pagam para serem visitadas. Mesmo assim, em face das dificuldades da burocracia
estatal, somada a outros fatores internos, como a carência de avaliadores capazes de verificar o
funcionamento de 2.500 entidades e de mais de 26.000 cursos, o Executivo resolveu criar mecanismos
"simplificados", por meio de portarias ministeriais que se chocam frontalmente com a lei.
Iniciou-se a fase dos indicadores provisórios, índices de diversas categorias,
conceitos preliminares e estabeleceu-se um perverso ranking das escolas superiores.Agrava-se a
situação quanto não há um prévio direito dos avaliados a conhecerem seus desempenhos. Os
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resultados são anunciados através de "bravatas governamentais nacionalistas" junto à grande
imprensa, estampando resultados "preliminares" que se tornam fatais para muitas universidades,
centros e faculdades.No dia 31 de agosto de 2009 o Brasil conheceu mais um ilegal ranking cujas
bases são mecanismos definidos por técnicos da máquina ministerial.Os resultados poderão ser
contestados, por meio de recursos administrativos ou judiciais mas, mesmo que esse quadro "legal"
seja revertido existirão consequências sociais e econômicas imprevisíveis.
A listagem completa encontra-se disponibilizada no site do Ministério da Educação, podendo ser
acessado pelo link http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/igc_embargos.xls
(IPAE 187 - 07/09)