UNIVERSIDADE TECNOLÓGICA FEDERAL DO PARANÁ
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA AMBIENTAL
NELISSA CAMARGO TORREZANI
AVALIAÇÃO DA PRESENÇA DE CHUMBO (Pb) EM ESPÉCIES DE
PEIXES ASSOCIADA À QUALIDADE AMBIENTAL DA BACIA DO
RIBEIRÃO CAMBÉ (LONDRINA/PR)
DISSERTAÇÃO
LONDRINA
2015
NELISSA CAMARGO TORREZANI
AVALIAÇÃO DA PRESENÇA DE CHUMBO (Pb) EM ESPÉCIES DE
PEIXES ASSOCIADA À QUALIDADE AMBIENTAL DA BACIA DO
RIBEIRÃO CAMBÉ (LONDRINA/PR)
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Engenharia Ambiental,
Universidade Tecnológica Federal do Paraná,
Câmpus Londrina e Apucarana, como requisito
parcial para obtenção do grau de Mestre em
Engenharia Ambiental. Área de Concentração:
Saneamento Ambiental.
Orientador: Prof. Dr. Edson Fontes de Oliveira.
Co-orientadora: Prof.ª Dr.a Alessandra Furtado da
Silva.
LONDRINA
2015
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Biblioteca UTFPR - Câmpus Londrina
T694a Torrezani, Nelissa Camargo Avaliação da presença de chumbo (Pb) em espécies de peixes associada
à qualidade ambiental da Bacia do Ribeirão Cambé (Londrina/PR). / Nelissa Camargo Torrezani. – Londrina: [s.n.], 2015.
57 f.: il.; 30 cm. Orientador: Prof. Dr. Edson Fontes de Oliveira Co-Orientadora: Prof.ª Drª Alessandra Furtado da Silva
Dissertação (Mestrado) - Universidade Tecnológica Federal do Paraná. Programa de Pós-Graduação em Engenharia Ambiental. Londrina, 2015. Bibliografia: f. 49-57
1. Água - Poluição. 2. Chumbo. 3. Peixes. I. Oliveira, Edson Fontes de, orient. II. Silva, Alessandra Furtado da, cooriet. III. Universidade Tecnológica Federal do Paraná. IV. Programa de Pós-Graduação em Engenharia Ambiental. V. Título.
CDD: 628
A Folha Aprovação assinada encontra-se na Coordenação do Programa de Pós Graduação em
Engenharia Ambiental.
Ministério da Educação
Universidade Tecnológica Federal do Paraná
Pró-reitora de Pesquisa e Pós Graduação
Programa de Pós-Graduação em Engenharia Ambiental
Campus Londrina/Apucarana
TERMO DE APROVAÇÃO
AVALIAÇÃO DA PRESENÇA DE CHUMBO (PB) EM ESPÉCIES DE
PEIXES ASSOCIADA À QUALIDADE AMBIENTAL DA BACIA DO
RIBEIRÃO CAMBÉ (LONDRINA/PR)
por
Nelissa Camargo Torrezani
Dissertação de mestrado apresentada no dia 24/04/2015 como requisito parcial para a
obtenção do título de MESTRE EM ENGENHARIA AMBIENTAL pelo Programa de Pós-
Graduação em Engenharia Ambiental, Câmpus Londrina/Apucarana, Universidade
Tecnológica Federal do Paraná. O Candidato foi arguido pela Banca Examinadora composta
pelos professores abaixo assinados. Após deliberação, a Banca Examinadora considerou o
trabalho aprovado. (Aprovado ou Reprovado)
___________________________
Prof. Dr. Edson Fontes de Oliveira - Orientador
(UTFPR)
___________________________
Prof.a Dr.a Kátia Valéria Marques Cardoso Prates - Membro Titular
(UTFPR)
___________________________
Prof. Dr. Sidinei Magela Thomaz - Membro Titular
(UEM)
___________________________
Prof. Dr. Edson Fontes de Oliveira
Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Engenharia Ambiental
Dedico este trabalho aos meus pais amados Ademir e Rute, além de
toda a minha família, que apesar das dificuldades, sempre estiveram
ao meu lado, compreendendo todo o meu esforço e dedicação.
AGRADECIMENTOS
A Deus, que sempre cuidou de mim, dando-me coragem, paciência, sabedoria e inteligência
nos momentos em que mais precisei para chegar até aqui.
A toda a minha família, especialmente aos meus pais Ademir e Rute, aos meus irmãos Neiva
e Glauber, a minha cunhada Gabriela, aos meus sobrinhos Gabriel e Guilherme e ao meu
namorado Cristian, que muitas vezes partilharam do seu tempo para escutar com toda
paciência, carinho e respeito os meus anseios e desejos.
A Universidade Tecnológica Federal do Paraná, pela oportunidade e realização do mestrado.
A Fundação CAPES pelo apoio financeiro durante a realização do mestrado.
A todos os professores do Departamento de Pós-Graduação de Engenharia Ambiental que
compartilharam conhecimento, experiência e profissionalismo.
Ao Professor Edson Fontes de Oliveira que desde o início acreditou no meu potencial. Dando-
me confiança e a responsabilidade para elaboração de cada detalhe desse trabalho. Agradeço
por seus ensinamentos e conselhos durante essa jornada, não somente como professor, mas
como amigo. Sinto orgulho por ter sido uma de suas primeiras orientadas do mestrado na
UTFPR e feliz por mais uma vez compartilhar ao seu lado a conquista de mais um título em
minha vida.
A minha co-orientadora Alessandra Furtado da Silva que durante esse período foi muito
importante. Creio que sem a sua ajuda algumas coisas não seriam possíveis. Agradeço do
fundo do meu coração pelos seus ensinamentos como professora, conselheira, companheira de
viagem e amiga.
Aos meus amigos de sala de aula pelos estudos, trabalhos e churrascos.
A todos os amigos e companheiros de trabalho do Laboratório de Ecologia Teórica e Aplicada
(LETA): Cristian, Bruno, Loueverton, Letícia, Nathalia, Dominique, Gabriel, Victor, Rodrigo,
e Luiza, além de outros que participaram das coletas e biometria.
Ao Sr. José por nos levar e acompanhar nas coletas de peixes nos ribeirões de Londrina.
A Rafaela Squizzato pelo fornecimento dos dados referentes à Bacia do Ribeirão Cambé.
Aos amigos do Laboratório de Monitoramento Ambiental (LAMA): Newmar, com os auxílios
na digestão das amostras de peixes, além de Alexandra e Estéfano pelas sugestões durante
todo o processo de análise no GF AAS.
A Barbara Damásio, companheira fiel de ambos os laboratórios. Muito obrigada por ter
contribuído diretamente nas coletas e elaboração dessa dissertação. Acredito em sua
competência e responsabilidade para dar continuidade nessa pesquisa, porém se precisar pode
contar comigo, pois você se tornou uma grande amiga.
Muito obrigada a todos!!!
A tristeza quando chega ao coração do poeta, é igual a poluição
quando chega ao Rio vivo, morre.
(Tiago Augusto da Cunha)
RESUMO
TORREZANI, Nelissa C. Avaliação da presença de chumbo (Pb) em espécies de peixes
associada à qualidade ambiental da Bacia do Ribeirão Cambé (Londrina/PR). 2015. 57 f.
Dissertação (Mestrado em Engenharia Ambiental) - Programa de Pós-Graduação em
Engenharia Ambiental, Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Câmpus Londrina e
Apucarana. Londrina, 2015.
O chumbo é um elemento não-essencial, bioacumulador, com propriedades altamente tóxicas
e responsável por efeitos agudos e crônicos nos seres vivos. Em concentrações elevadas
podem promover danos às comunidades aquáticas, modificando suas estrutura e distribuição.
O presente estudo verificou o grau de vulnerabilidade ambiental da Bacia do Ribeirão Cambé,
a partir da avaliação da presença de chumbo nas espécies de peixes mais abundantes, por
meio da técnica analítica de Espectrometria de Absorção Atômica com Atomizador em Forno
de Grafite (GF AAS), assim como, pelos parâmetros da estrutura da assembléia de peixes que
envolveram as análises de riqueza, equitabilidade, diversidade, abundância, biomassa e
comprimento padrão das espécies. Além desses parâmetros, também foram analisadas
variáveis físicas e químicas da água utilizando equipamentos portáteis (temperatura da água,
pH, condutividade elétrica, turbidez e oxigênio dissolvido), e por último, a análise dos
padrões de uso e ocupação do solo, obtidos por meio da literatura. Os resultados revelaram
ampla área impermeabilizada ao longo do gradiente longitudinal do Ribeirão Cambé e trechos
de agricultura/campo, sendo essa última classe mais dominante no ponto de amostragem 6. Os
parâmetros abióticos avaliados estiveram dentro do limite permitido pela Resolução
CONAMA 357/2005, exceto o oxigênio dissolvido que revelou concentrações inferiores a 6
mg.L-1 nos pontos de amostragem 3 e 4, os quais compreendem o Lago Igapó, corpo aquático
enquadrado na Classe I. Além disso, a condutividade elétrica foi elevada para todos os pontos,
quando comparados aos valores estabelecidos pela Companhia de Tecnologia de Saneamento
Ambiental (CETESB). Em relação à composição da ictiofauna, verificou-se a presença de três
espécies exóticas: Poecilia reticulata, Oreochromis niloticus e Tilapia rendalli, distribuídas
com abundância na maioria dos pontos de amostragem. A espécie nativa Hypostomus
ancistroides também esteve presente na maioria dos pontos do Ribeirão Cambé, evidenciando
tolerância a ambientes poluídos, semelhantemente às espécies exóticas. Os pontos 2 e 5 foram
os que apresentaram maior equitabilidade e diversidade. A Poecilia reticulata revelou maior
abundância para todos os pontos de amostragem, enquanto a biomassa foi destaque para
quatro espécies: Geophagus brasiliensis, Oreochromis niloticus, Hypostomus ancistroides e
Hypostomus regani. Quanto ao comprimento padrão das espécies, a classe dos pequenos foi a
mais representativa. Referente às concentrações de chumbo nas espécies de peixes, as médias
no verão variaram de 0,18 a 6,74 mg.kg-1, apresentando diferenças significativas e acima do
limite permitido para os pontos 1, 2, 3, 4 e 5. No outono, as concentrações médias de chumbo
variaram de 0,04 a 0,17 mg.kg-1 entre os pontos e abaixo do limite permitido, enquanto no
inverno as médias variaram de 0,04 a 4,83 mg.kg-1, apresentando diferenças significativas e
acima do limite permitido para os pontos 2, 3 e 5. A partir desses dados, a Análise de
Correlação Canônica confirmou que os pontos 1, 4 e 5 estavam afetados pela presença de
chumbo, enquanto o ponto 6 se mostrou mais rico em oxigênio, além de maior biomassa e o
ponto 2 evidenciou boa oxigenação e espécies de maior porte.
Palavras-chave: Contaminação. Elementos-traço. Ictiofauna. Uso e Ocupação do Solo. Bacia
do Ribeirão Cambé.
ABSTRACT
TORREZANI, Nelissa C. Assessment of lead (Pb) presence in fish species associated with the
environmental quality of Cambé Stream Basin (Londrina/PR). 2015. 57 f. Dissertação
(Mestrado em Engenharia Ambiental) - Programa de Pós-Graduação em Engenharia
Ambiental, Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Câmpus Londrina e Apucarana.
Londrina, 2015.
Lead is a non-essential element, bioaccumulative, with highly toxic properties and is
responsible for acute and chronic effects on living beings. In high concentrations may
promote damage to aquatic communities by modifying their structure and distribution. This
study found the degree of environmental vulnerability of the Cambé Stream Basin, from the
evaluation of the presence of lead in the most abundant species of fish, through the analytical
technique of Graphite Furnace Atomic Absorption Spectrometry (GF AAS), as well as the
parameters of the fish assemblage structure involving wealth, equitability, diversity,
abundance, biomass and standard length analysis of species, beyond the physical and
chemical variables of water from portable equipment, and finally, the analysis of patterns of
use and occupation of land obtained through literature. The results revealed wide
impermeabilized area along the longitudinal gradient of Cambé Stream Basin and
agriculture/field, the latter being most dominant class in the sampling point 6. The evaluated
abiotic parameters (water temperature, pH, conductivity, turbidity and dissolved oxygen) were
within the limit allowed by CONAMA Resolution 357/2005, except the dissolved oxygen
showed concentrations below 6 mg L-1 in the sampling points 3 and 4, which comprise the
Igapó Lake, water body framed in Class I. In addition, the electrical conductivity was high for
all points when compared to the values established by the Environmental Sanitation
Technology Company (CETESB). Regarding the composition of fishes verified the presence
of three exotic species: Poecilia reticulata, Oreochromis niloticus and Tilapia rendalli, in
most heavily distributed sampling points. The Hypostomus ancistroides kind of native
character also present in most parts of Cambé Stream, showing tolerance to polluted
environments, similar to exotic species found. Points 2 and 5 were those with the highest
evenness and diversity. Poecilia reticulata showed greater abundance for all sampling points
and the biomass obtained emphasis on four species: Geophagus brasiliensis, Oreochromis
niloticus, Hypostomus ancistroides and Hypostomus regani. As for the standard length of the
small species was the most representative. Regarding lead concentrations in fish species, the
means in the summer ranged from 0.18 to 6.74 mg.kg-1, showing significant differences and
above the limit allowed for the points 1, 2, 3, 4, and 5. In the autumn, the means
concentrations of lead ranged from 0.04 to 0.17 mg.kg-1, between points, with no statistical
difference and below the limit allowed, and in winter, the means ranged from 0.04 to 4.83
mg.kg-1, among the points, showing significant differences and above the limit allowed for the
points 2, 3 and 5. Thus, from the Canonical Correlation Analysis confirmed that the points 1,
4 and 5 are affected by the presence of lead. Point 6 was more rich in oxygen, and the largest
biomass and point 2 showed good oxygenation and larger species.
Keywords: Contamination. Trace elements. Icthyofauna. Use and occupation of land. Cambé
Stream Basin.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Pontos de amostragem da Bacia do Ribeirão Cambé. ............................................... 17 Figura 2 - Áreas de uso e ocupação do solo da Bacia do Ribeirão Cambé. ............................... 19 Figura 3 - Médias e desvios-padrões de condutividade elétrica entre os pontos da Bacia do
Ribeirão Cambé.. ........................................................................................................................ 29 Figura 4 - Médias e desvios-padrões da turbidez entre os pontos do Ribeirão Cambé.. ............ 31
Figura 5 - Percentual de biomassa e abundância de cada espécie de peixe nos seis pontos de
amostragem na bacia do Ribeirão Cambé (Londrina-PR). ......................................................... 36 Figura 6 - Padrão de distribuição de comprimento das espécies de peixes coletadas nos seis
pontos de amostragem.. .............................................................................................................. 38 Figura 7 - Concentração média e desvio padrão de Pb (mg.kg-1) nas espécies P. reticulata, A.
altiparanae, T. rendalli, O. niloticus, e H. ancistroides da Bacia do Ribeirão Cambé em
dezembro de 2013.. ..................................................................................................................... 40
Figura 8 - Concentração média e desvio padrão de Pb (mg.kg-1) na espécie O. niloticus da
Bacia do Ribeirão Cambé em março de 2014.. .......................................................................... 43 Figura 9 - Concentração média e desvio padrão de Pb (mg.kg-1) nas espécies A. aff. paranae,
O. niloticus, P. reticulata e H. ancistroides da Bacia do Ribeirão Cambé em junho de 2014... 44
Figura 10 - Diagrama das CCA parciais: A) Para os parâmetros limnológicos dos pontos de
amostragem P1 a P6 (OD = Oxigênio Dissolvido; pH; Turb = Turbidez; CE = Condutividade
Elétrica; Pb = Concentrações de Chumbo nas espécies de peixes) e parâmetros da comunidade
de peixes (Abund = Abundância; Biom = Biomassa; CpP = Percentuais de indivíduos por
classe de tamanho de 0 a 10 mm; CpM = Percentuais de indivíduos por classe de tamanho
maiores que 10 mm; E = Equitabilidade; H’ = Índice de Diversidade de Shannon; S =
Riqueza); B) Para os parâmetros de uso e ocupação do solo na bacia hidrográfica do ribeirão
Cambé em percentuais de área ocupada (Agua = Superfície de ambientes aquáticos; Campo =
Áreas de campo e agricultura; Imperm = Áreas urbanas com solo impermeabilizado; Solo =
Solo exposto; Veg = Cobertura vegetal). As setas indicam a correlação dos parâmetros
limnológicos e de uso e ocupação do solo com os eixos 1 e 2 das CCAs parciais,
respectivamente. Os autovalores das CCAs parciais foram: A) 1o eixo = 0,217; 2o eixo =
0,045; B) 1o eixo = 0,217; 2o eixo = 0,046. ............................................................................... 46
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Caracterização biogeofísica dos pontos de amostragem ao longo da Bacia do
Ribeirão Cambé durante o período de estudo. ............................................................................ 18 Tabela 2 - Área (km2) e os respectivos percentuais para cada classe de elemento de paisagem
nos diferentes pontos amostrais. ................................................................................................. 19 Tabela 3 - Parâmetros físicos utilizados na digestão das amostras de peixes. ........................... 22
Tabela 4 - Programa de temperatura do forno para a determinação do Pb. ............................... 23 Tabela 5 - Médias e desvios-padrões dos parâmetros limnológicos analisados no presente
estudo. ......................................................................................................................................... 28
Tabela 6 - Posição taxonômica das espécies coletadas ao longo dos seis pontos amostrais da
Bacia do Ribeirão Cambé. .......................................................................................................... 32 Tabela 7 - Número de indivíduos das espécies e padrões de diversidade da assembléia de
peixes do Ribeirão Cambé analisados no presente estudo. ........................................................ 34
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
Min. Minutos
Seg. Segundos
OECD Organization for Economic Co-operation and Development
US United States
IPPUL Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Londrina
USGS United States Geological Survey
NTU Unidades Nefelométricas de Turbidez
ICMBio Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade
SISBIO Sistema de Autorização e Informação em Biodiversidade
GF AAS Graphite Furnace Atomic Absorption Spectrometry
LOD Limite de detecção
CCA Canonical Correlation Analysis
ANOVA Análise de Variância
ETE Estação de Tratamento de Esgoto
CETESB Companhia Ambiental do Estado de São Paulo
Ache Acetilcolinesterase
MOA
Monoamina oxidase
LISTA DE SÍMBOLOS
Pb Chumbo
Ni Níquel
Ca Cádmio
Cr Cromo
Cu Cobre
Km Quilômetro
km2 Quilômetro quadrado
mS/cm Milisiemens por centímetro
µs/cm Microsiemens por centímetro
°C Grau Celsius
kW Quilowatt
A Ampere
V Voltagem
% Porcentagem
v/v Volume por volume
Pd Paládio
G Grama
mg.L-1 Miligrama por litro
µg.L-1 Micrograma por litro
mL Mililitro
µL Microlitro
mg.kg-1 Miligrama por quilograma
Nm Nanômetro
L Litro
σ Desvio padrão médio
S Inclinação da curva de calibração
Σ Soma
Pi Proporção de Indivíduos na amostra
Ln Logaritmo natural
S Riqueza
H’ Índice de Diversidade de Shannon
E Equitabilidade
P Pequeno
M Médio
G Grande
M Músculo
I Inteiro
Y Concentração em µg.L-1 de Pb
A Coeficiente angular da reta
B Coeficiente linear da reta
X Valor da absorbância
R2 r ao quadrado
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................... 14 2. MATERIAL E MÉTODOS ....................................................................................... 17 2.1. CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO ......................................................... 17 2.1.1. Localização, pontos de amostragem e uso e ocupação do solo .................................. 17 2.2. TOMADA DE DADOS LIMNOLÓGICOS E COLETA DE AMOSTRAS DE
PEIXE ........................................................................................................................... 20 2.2.1. Estimativa de parâmetros abióticos ............................................................................ 20 2.2.2. Amostragem de peixes no campo ............................................................................... 20
2.2.3. Identificação e biometria dos espécimes coletados .................................................... 21 2.3. PREPARAÇÃO E DIGESTÃO ÁCIDA DAS AMOSTRAS DE PEIXE .................... 21 2.3.1. Materiais e Reagentes ................................................................................................. 21 2.3.2. Tratamento das amostras de peixes ............................................................................ 21
2.4. DETERMINAÇÃO DE Pb EM PEIXES USANDO ESPECTRÔMETRO DE
ABSORÇÃO ATÔMICA COM ATOMIZAÇÃO EM FORNO DE GRAFITE
(GF AAS) ...................................................................................................................... 23 2.4.1. Curva de Calibração ................................................................................................... 23
2.4.2. Instrumentação ........................................................................................................... 23 2.4.3. Limite de Detecção Instrumental ............................................................................... 24
2.5. ANÁLISE DOS DADOS .............................................................................................. 25 2.5.1. Análise de abundância, biomassa, comprimento, riqueza, equitabilidade e índice de
diversidade de Shannon da assembléia de peixes ...................................................... 25
2.5.2. Análises estatísticas .................................................................................................... 25 3. RESULTADOS E DISCUSSÃO ................................................................................ 27
3.1 USO E OCUPAÇÃO DO SOLO DA BACIA DO RIBEIRÃO CAMBÉ .................... 27 3.2 PARÂMETROS LIMNOLÓGICOS DO RIBEIRÃO CAMBÉ ................................... 27
3.3 COMPOSIÇÃO DA ICTIOFAUNA ............................................................................. 32 3.4 CONCENTRAÇÃO DE Pb ACUMULADO EM PEIXES DE DIFERENTES
ORDENS DA BACIA DO RIBEIRÃO CAMBÉ ........................................................ 39 3.5 CORRELAÇÃO DAS VARIÁVEIS BIÓTICAS, ABIÓTICAS E USO E
OCUPAÇÃO DO SOLO POR MEIO DA ÁNALISE DE CORRELAÇÃO
CANONICA (CCA) ..................................................................................................... 45 4. CONCLUSÃO ............................................................................................................. 48 REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 49
14
1. INTRODUÇÃO
A poluição é um dos principais problemas enfrentados pela sociedade. Com o
crescimento da população humana, o advento da urbanização e o rápido desenvolvimento
econômico, alterações no meio ambiente podem ocorrer, afetando direta e indiretamente o
ambiente e a saúde do homem. Dentre os poluentes ambientais, os metais pesados são de
principal interesse, pois causam uma série de efeitos deletérios para os organismos aquáticos
(GOLDSTEIN, 1990; GLEDHILL et al., 1997).
Os metais são elementos catiônicos e oxiânions comumente presentes em baixas
concentrações no ambiente, por isso definidos como elementos-traço (PIERZYNSKI et al.,
1994; SPARKS, 1995; ESSINGTON, 2004). Alguns desses metais são considerados
essenciais para o funcionamento do organismo e outros são potencialmente perigosos,
denominados como não-essenciais. Todavia, mesmo aqueles essenciais, quando em elevadas
concentrações, podem trazer sérios prejuízos aos ecossistemas terrestres e aquáticos,
constituindo-se assim, em contaminantes ou poluentes de solo e água (GUILHERME et al.,
2005).
O chumbo (Pb) é um elemento não-essencial com propriedades altamente tóxicas e
responsável por efeitos agudos e crônicos na saúde humana. Mesmo em baixas concentrações
pode bloquear ou imitar a ação do cálcio, pois apresentam propriedades semelhantes, inibir
enzimas relacionadas com a síntese de hemoglobina, bem como alterar todo metabolismo
celular, provocando problemas neurológicos, cardiovascular, renal, gastrointestinal,
hematológicos e efeitos no sistema reprodutor. O tipo e o grau dos efeitos dependem do nível
e tempo de exposição ao metal (SHUQAIR, 2002; UNITED NATIONS, 2010).
De modo geral, a toxicidade do Pb depende de sua propriedade química. Na forma
inorgânica a intoxicação ocorre através da via respiratória e digestiva (SADAO, 2002). Sua
distribuição inicia-se nos tecidos moles e posteriormente, sofre redistribuição e deposição nos
ossos, nos dentes e no cabelo. Quase todo o chumbo inorgânico circulante encontra-se
associado aos eritrócitos (KLAASSEN, 1991). No entanto, a intoxicação do Pb orgânico
ocorre principalmente através do Pb tetraetila e tetrametila. Esses compostos apresentam
características lipossolúveis, sendo facilmente absorvidos pela pele, pelo trato gastrointestinal
e pelos pulmões (KLASSEN, 1991; SADAO, 2002). A toxicidade destes, todavia, deve-se à
conversão dos mesmos em Pb trietila e Pb inorgânico (KLAASSEN, 1991).
15
As fontes antrópicas de Pb estão relacionadas principalmente às atividades de
mineração e produção de metal não ferroso. Todavia, produtos ou resíduos constituídos por
Pb, tais como tintas, pigmentos, munições, combustíveis fósseis, revestimentos de cabos e
baterias podem também contribuir com a contaminação ambiental (UNITED NATIONS,
2010). Por outro lado, a introdução desse elemento pode decorrer de processos naturais, tais
como: lixiviação do solo, erosão de rochas e atividades vulcânicas.
Nos sistemas aquáticos, o Pb pode apresentar forma iônica, em complexos orgânicos
com materiais dissolvidos (húmus), associados a partículas coloidais, tais como óxido de ferro
e manganês, ou ligados às partículas sólidas de argila ou restos de organismos mortos
(ORGANIZATION FOR ECONOMIC CO-OPERATION AND DEVELOPMENT, 1993).
Entretanto, o seu comportamento na água varia de acordo com alguns parâmetros físicos e
químicos, tais como: pH, oxigênio dissolvido e dureza da água.
O Pb é reconhecidamente um elemento metálico bioacumulador, entretanto, o
processo de biomagnificação do Pb inorgânico na cadeia alimentar aquática não é muito
conhecido. Isso pode ser parcialmente explicado pelo fato de que o Pb nos vertebrados é
preferencialmente estocado em ossos, o que diminui o risco de transmissão desse metal para
outros organismos na cadeia alimentar (TUKKER et al., 2001).
É crescente o interesse por estudos com bioindicadores ambientais. Segundo
Schirmer (1992), a concentração de elementos-traço nos organismos aquáticos constitui-se da
verdadeira quantidade biodisponível desses elementos nos corpos d’águas. Os peixes estão
entre os organismos que respondem de forma mais variada quando em contato com um
determinado contaminante. Esses organismos são considerados ótimos indicadores de
carcinogenicidade, mutagenicidade e genotoxicidade em humanos. Quanto à dinâmica das
cadeias tróficas, os peixes são vetores diretos de contaminantes ou metais tóxicos para seus
consumidores, via processo de biomagnificação (AI-SABTI; METCALFE, 1995).
Dentro desse contexto, a análise da estrutura das assembléias de peixes proporciona
uma visão integrada das condições em que se encontram os ecossistemas aquáticos,
constituindo-se outra forma bioindicadora da qualidade do hábitat e dos efeitos dos impactos
(CASATTI et al., 2008). Abes e Agostinho (2001) e Filho et al. (2008) citam que variáveis
como largura de canais, profundidade, temperatura da água e do ar, oxigênio dissolvido,
condutividade, pH, demanda química de oxigênio, turbidez e substrato afetam diretamente a
riqueza, composição e estrutura das assembléias de peixes, além dos impactos antropogênicos
16
relacionados com as diferentes utilizações terrestres (PENCZAK et al., 1994), que contribuem
negativamente com os atributos da assembléia de peixes.
A Bacia do Ribeirão Cambé, a qual cruza a zona urbana da cidade de Londrina (PR),
tem sido alvo de diversas interferências humanas, tais como: lançamentos irregulares de
esgoto doméstico, assoreamento e poluição química. Yabe e Oliveira (1998), nessa mesma
bacia, já identificaram elementos-traço como: Pb, níquel (Ni), cádmio (Cd), cromo (Cr) e
cobre (Cu), introduzidos, segundo eles, por fontes urbanas e industriais.
Diante do exposto, o presente estudo verificou o grau de vulnerabilidade ambiental
da Bacia do Ribeirão Cambé, a partir da avaliação da presença de concentração de Pb nas
espécies de peixes mais abundantes, assim como da análise de parâmetros da estrutura da
assembléia de peixes, das variáveis físicas e químicas da água e dos padrões de uso e
ocupação do solo da bacia hidrográfica.
17
2. MATERIAL E MÉTODOS
2.1. CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO
2.1.1. Localização, pontos de amostragem e uso e ocupação do solo
A Bacia do Ribeirão Cambé (Figura 1) está situada no município de Londrina/PR,
apresentando aproximadamente 77,20 km² e 25 km ao longo de seu curso principal
(ARAÚJO, 2004) e 219 metros de gradiente altitudinal (NEVES, 2012). Suas coordenadas
geográficas compreendem 23°08’47” e 23°55’46” de Latitude Sul e 50°52’23” e 51°19’11”
de Longitude Oeste (PREFEITURA DE LONDRINA, 2014). Nessa bacia foram selecionados
seis pontos de amostragem, partindo da cabeceira até a foz, conforme demonstrado na Figura
1. As coletas dos parâmetros abióticos e bióticos foram realizadas entre os anos de 2013 e
2014, abrangendo as estações do verão outono e inverno.
Figura 1 - Pontos de amostragem da Bacia do Ribeirão Cambé.
Fonte: Autoria própria.
18
A seleção dos pontos teve como prioridade os critérios de acessibilidade, potencial de
contaminação, atividade de pesca amadora e sistemas límnicos diferentes (lóticos e lênticos).
Já as características biogeofísicas da bacia estão apresentadas logo abaixo na Tabela 1. Para
melhor caracterização, os pontos de amostragem estudados foram definidos em trechos como
cabeceira, médio e foz.
Tabela 1 - Caracterização biogeofísica dos pontos de amostragem ao longo da Bacia do
Ribeirão Cambé durante o período de estudo.
Trecho de cabeceira Trecho médio (Lago) Trecho próximo à foz
Pontos de Amostragem 1 2 3 4 5 6
Altitude (m) 604 586 539 526 516 431
Latitude 23o17’14,6" 23o17'42,7" 23°19'0,84" 23°19'45,84" 23°20'17,52" 23°21'11,16"
Longitude 51°13'58" 51o13'37,6" 51°11'12,12" 51°10' 2,64" 51°8'57,12" 51°6'54"
Substrato predominante Rochoso Arenoso Areno-
Argiloso
Areno-
Argiloso Rochoso Rochoso
Declividade Baixa Baixa Baixa Moderada Alta Alta
Vegetação ribeirinha Arbórea-
Arbustiva
Arbórea-
Arbustiva
Arbórea-
Rasteira
Arbórea-
Rasteira
Arbórea-
Rasteira
Arbórea- Rasteira-
Arbustiva
Uso e ocupação do solo Urbana-
Industrial Urbana-
Industrial Urbana Urbana Urbana Agropecuária
Erosão nas margens Moderada Acentuada Ausente Ausente Moderada Moderada
Fonte: Autoria própria.
Referente ao uso e ocupação do solo da Bacia do Ribeirão Cambé, estudos de análise
espaciais realizados a partir de imagens de sensoriamento remoto de alta resolução (SPOT
com resolução espacial de 5 metros - 2005) e avaliados por Squizzato (2014), revelaram as
classes de paisagens mais frequentemente encontradas ao longo do gradiente longitudinal da
bacia. O mesmo autor supracitado classificou essas classes em cinco elementos (Figura 2): (i)
Vegetação densa; (ii) Água (corpo hídrico); (iii) Solo exposto; (iv) Área impermeabilizada
(antrópica); e (v) Agricultura/Campo, sendo definidas de acordo com os usos mais comuns do
ribeirão.
19
Figura 2 - Áreas de uso e ocupação do solo da Bacia do Ribeirão Cambé. Fonte: Squizzato (2014).
Alvo de impactos antrópicos, a área estudada é amplamente impermeabilizada em
função do trecho urbano no qual está inserida, compondo de diversos estabelecimentos, tais
como: indústrias, residências, postos de gasolinas, rodovias, hospitais, entre outros. Os
valores percentuais referentes às áreas relativas ocupadas por cada uma das classes de uso e
ocupação de solo no entorno dos pontos de amostragem, encontram-se descritos na Tabela 2.
Tabela 2 - Área (km2) e os respectivos percentuais para cada classe de elemento de paisagem
nos diferentes pontos amostrais.
Classes P1 P2 P3 P4 P5 P6
Área (%) Área (%) Área (%) Área (%) Área (%) Área (%)
Vegetação densa 0,3 12,68 0,56 11,17 0,82 10,83 0,83 9,2 1,17 12,67 2,74 25,52
Água 0,04 1,81 0,01 0,06 0,06 0,75 0,36 4,04 0,25 2,68 0,01 0,04
Solo exposto 0,01 0,36 0,14 2,69 0,22 2,87 0,35 3,85 0,06 0,64 1,22 11,41
Área impermeab. 1,27 52,73 2,96 58,71 5,11 67,36 6,09 67,79 5,63 61,1 1,3 12,13
Agricultura/Campos 0,78 32,42 1,38 27,37 1,38 18,18 1,36 15,12 2,11 22,9 5,46 50,9
Área total 2,4 100 5,04 100 7,59 100 8,99 100 9,21 100 10,73 100 Fonte: Squizzato (2014).
20
2.2. TOMADA DE DADOS LIMNOLÓGICOS E COLETA DE AMOSTRAS DE PEIXE
2.2.1. Estimativa de parâmetros abióticos
Parâmetros físicos e químicos da água foram aferidos em campo, tais como: pH
(peagâmetro portátil TECNOPON, Modelo MPA 210P), condutividade elétrica (mS/cm)
(condutivímetro portátil INSTRUTHERM, Modelo CD-860), oxigênio dissolvido (mg.L-1)
(oxímetro portátil Politerm, modelo POL-60), turbidez (NTU) (turbidímetro portátil
TECNOPON, Modelo TB 1000P) e temperatura da água (°C).
2.2.2. Amostragem de peixes no campo
As coletas de peixes foram implementadas sob licença do Instituto Chico Mendes de
Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Sistema de Autorização e Informação em
Biodiversidade (SISBIO; Licença permanente no 28.113-1/2011).
Para a captura dos peixes nos pontos de coleta selecionados foram utilizados
equipamentos como pesca elétrica (gerador portátil de corrente alternada, 2,5 kW, 400 V,
2A), redes de espera, peneiras, puçás e varas de pesca. A técnica aplicada variava com o tipo
de sistema límnico. Em cada ponto foi percorrido um trecho total, de jusante a montante do
ponto amostrado, de aproximadamente 50 m de extensão. As coletas ocorreram
trimestralmente no período de dezembro de 2013 a junho de 2014, com esforço amostral de
40 min. cada, delimitando os segmentos amostrados com redes de contenção
multifilamentadas com malha de 2 mm entre nós, usados somente nos ambientes lóticos.
No campo, os peixes coletados foram imediatamente colocados em sacos plásticos
esterilizados e acondicionados em caixa térmica com gelo até a chegada ao laboratório, onde
foram congelados e mantidos sob refrigeração (±4°C) até a realização dos ensaios.
21
2.2.3. Identificação e biometria dos espécimes coletados
Os espécimes de peixes coletados, após o descongelamento, foram identificados por
meio de chaves de identificação, baseado na literatura de Graça e Pavanelli (2007).
Posteriormente, foram medidos com o auxílio de um ictiômetro e pesados em balança
analítica (Shimadzu, modelo BL3200H), para a avaliação da estrutura de comunidades, que
envolvem os parâmetros de abundância, biomassa, riqueza, equitabilidade, diversidade de
Shannon e comprimento padrão. Logo em seguida, os peixes foram submetidos ao processo
de digestão ácida e análise no Espectrômetro de Absorção Atômica com Atomização em
Forno de Grafite (GF AAS), para a investigação da presença de chumbo nos tecidos.
2.3. PREPARAÇÃO E DIGESTÃO ÁCIDA DAS AMOSTRAS DE PEIXE
2.3.1. Materiais e Reagentes
No processo de digestão ácida das amostras foram utilizados ácido nítrico (HNO3) e
peróxido de hidrogênio (H2O2) suprapuros, de alto grau analítico, bem como a água na
condição ultrapura (Purelab Option Q Elga, Inglaterra). O uso desses dois reagentes,
associados aos parâmetros de pressão, temperatura e radiação do microondas (Titan MPS,
PerkinElmer, US) favoreceram a oxidação de materiais orgânicos e, consequentemente, a
conversão da amostra sólida em líquida.
2.3.2. Tratamento das amostras de peixes
Após a biometria dos peixes, as amostras de músculo foram retiradas com auxílio de
um bisturi e tesoura, previamente descontaminados com HNO3 (30% v/v). Peixes menores
foram analisados inteiros, pois não permitiam a retirada de quantidades mínimas de amostras
para digestão ácida. Em seguida, as amostras foram secas em estufa com circulação de ar
22
forçada por um período de 48 horas a 50°C e posteriormente foram submetidas aos processos
de trituração em gral de porcelana, quarteamento e peneiramento em malhas de poliéster com
abertura de 63 µm para uma melhor homogeneização e distribuição da amostra possivelmente
contaminada por chumbo.
Foram utilizados aproximadamente 300 mg de amostras de peixe, usando balança
analítica (Mettler Toledo, modelo ML204/A01) e em triplicata, sendo transferidas para
vessels do digestor. Em capela, foram adicionados 8 mL de HNO3 e 2 mL de H2O2, além da
preparação do branco (adição de reagentes sem amostra no vessel). Após 10 minutos em
repouso, as amostras foram digeridas no digestor assistido por microondas. Os parâmetros
físicos utilizados no digestor assistido por microondas estiveram conforme a recomendação
do fabricante (Tabela 3).
Tabela 3 - Parâmetros físicos utilizados na digestão das amostras de peixes.
Etapas Temperatura Pressão Tempo Rampa
Tempo de
permanência
(min)
Potência (%)
1 190 40 6 10 90
2 50 0 1 1 0
3 50 0 1 10 0
4 50 0 1 10 0
5 50 0 1 1 0
Fonte: PerkinElmer Titan MPS - Microwave Sample Preparation System.
Após a conclusão do processo de digestão, as amostras e o branco permaneceram em
repouso por cerca de 20 minutos nos vessels, até alcançar a temperatura ambiente. Em capela,
as amostras concentradas em ácidos foram transferidas para tubos de polipropileno. Com
auxílio de uma balança analítica, obteve-se volume final de 15 mL com água ultrapura.
23
2.4. DETERMINAÇÃO DE Pb EM PEIXES USANDO ESPECTRÔMETRO DE
ABSORÇÃO ATÔMICA COM ATOMIZAÇÃO EM FORNO DE GRAFITE (GF AAS)
2.4.1. Curva de Calibração
Foram preparadas soluções padrões de Pb nas concentrações de 5, 10, 20, 30 e 40
µg.L-1, a partir de uma solução padrão de 1000 mg.L-1 (marca Fluka) de Pb para a obtenção da
curva de calibração e posteriormente a leitura das amostras de peixes possivelmente
contaminadas por chumbo.
2.4.2. Instrumentação
O Espectrômetro de Absorção Atômica em Forno de Grafite modelo Thermo
Scientific ICE 3300 com corretor de deutério foi usado neste estudo para a determinação de
Pb presente nas amostras de peixe. Foram usados argônio como gás inerte e lâmpada de
catodo oco como fontes de energia. O programa de temperatura é apresentado na Tabela 4.
Tabela 4 - Programa de temperatura do forno para a determinação do Pb.
Etapa Temperatura Tempo Rampa Fluxo do Gás
(°C) (seg) (°C/seg) (L/min)
1a Secagem 120 30 10 0,2
2a Pirólise 600 20 150 0,2
3a Atomização 1800 3 0 -
4a Limpeza 2500 3 0 0,3
Fonte: Adaptado ICE 3300, Thermo Scientific, Estados Unidos.
24
O comprimento de onda do Pb foi de 217 nm, a corrente de 4 mA e a largura da
fenda de 0,5 nm. Foram usados tubos de grafite revestidos piroliticamente e a área do sinal
transiente. Aproximadamente 30 µL de amostra foram injetados no forno de grafite, sendo 10
µL de modificador químico (paládio - Pd) e 20 µL da amostra digerida. Vale ressaltar que o
uso de modificadores químicos aumenta a volatilidade da matriz e retarda a volatilização do
analito, ou seja, do Pb (SKOOG, 2005). Para cada amostra foram realizadas leituras em
triplicatas. Para a obtenção da concentração do elemento-traço Pb em µg.g-1 foi aplicado o
seguinte cálculo:
[Pb] µg.g-1 = ([Pb] µg L-1 x Volume da amostra (L)
Massa em gramas
Ao final das leituras no GF AAS foi realizado o Teste de Recuperação do chumbo
para validação do método, ou seja, comprovação do desempenho analítico dos procedimentos
investigados. Dessa forma, para a verificação, cerca de 10 µL de padrão de Pb foram
adicionados em pelo menos duas amostras com concentrações máximas e mínimas já
quantificadas.
2.4.3. Limite de Detecção Instrumental
O limite de detecção instrumental foi calculado com base no desvio padrão obtido
para uma série de 10 medidas de brancos. O valor encontrado foi multiplicado por três e
dividido pelo coeficiente angular da reta (slope da curva) do respectivo elemento-traço
investigado nesse estudo.
LOD = 3σ/S
Onde:
LOD = limite de detecção
σ = desvio padrão médio de 10 medidas do branco
S = inclinação da curva de calibração
25
2.5. ANÁLISE DOS DADOS
2.5.1. Análise de abundância, biomassa, comprimento, riqueza, equitabilidade e índice de
diversidade de Shannon da assembléia de peixes
A estrutura da assembléia íctica foi analisada a partir de parâmetros de riqueza,
equitabilidade e diversidade além das relações de abundância-biomassa e padrão de
comprimento das espécies coletadas.
A Riqueza (S) representa o número de espécies em um determinado ponto, a
Diversidade (H’) foi calculada pelo índice de Shannon-Wiener que leva em consideração a
riqueza e a equitabilidade das espécies (H’ = -Σ pi.ln.pi, onde ln = logaritmo natural e pi =
proporção de indivíduos na amostra) e a Equitabilidade (E) indica a distribuição relativa da
abundância entre as espécies (E = H’/logS, onde H’ = índice de diversidade de Shannon e S =
riqueza).
Quanto à abundância foi considerado o número médio de indivíduos por coleta, por
outro lado a biomassa correspondeu ao peso médio dos indivíduos (g), enquanto os padrões
de comprimento foram avaliados a partir dos percentuais de indivíduos pertencentes a cada
uma das três classes criadas, P (0-100 mm), M (100-200 mm) e G (200-300 mm), todos
estimados por ponto de amostragem.
2.5.2. Análises estatísticas
A Análise de Variância (ANOVA) e o Teste não paramétrico de Tukey foram
aplicados com intuito de verificar a ocorrência de diferenças significativas entre as
concentrações médias de Pb encontrados nas amostras de peixes entre os pontos.
Análises de Correlação Canônica (CCA) parciais foram aplicadas para verificar as
possíveis correlações multivariadas entre os diferentes pontos do ribeirão, os parâmetros
bióticos (abundância, biomassa, riqueza, equitabilidade, diversidade e comprimento padrão)
matriz principal da CCA. Abióticos (temperatura da água, pH, condutividade, turbidez,
oxigênio dissolvido e concentração de Pb no sistema aquático por meio de um bioindicador) e
26
o uso e ocupação do solo (áreas relacionadas à vegetação densa, corpo hídrico, solo exposto,
área impermeabilizada e agricultura/campo), com esses últimos parâmetros constituindo as
matrizes secundárias da CCA.
Inicialmente foi analisada a correlação entre os parâmetros bióticos e os pontos de
amostragem para obtenção dos coeficientes canônicos das variáveis. Na sequência foi
realizada uma primeira CCA entre os autovalores dos parâmetros bióticos e os abióticos, e
uma segunda CCA entre os mesmos autovalores dos parâmetros bióticos e os parâmetros de
uso e ocupação do solo. As correlações entre os parâmetros bióticos, abióticos e de uso e
ocupação do solo e os eixos canônicos foram plotados na forma de vetores, indicando as
correlações entre as variáveis e os pontos no espaço multivariado (JOHNSON; WICHERN,
1998).
A opção pela realização de duas CCAs parciais foi em razão do menor número de
parâmetros bióticos em relação aos demais, conduzindo à análise dos padrões multivariados
de correlação separadamente. As análises foram realizadas no software STATISTICA10 ® e
no PC-Ord (MCCUNNE; MEFFORD, 1999).
27
3. RESULTADOS E DISCUSSÃO
3.1 USO E OCUPAÇÃO DO SOLO DA BACIA DO RIBEIRÃO CAMBÉ
Como base no levantamento realizado por Squizzato (2014) a partir de imagem de
satélite, os valores percentuais de cobertura de cada uma das classes de uso e ocupação de
solo no entorno dos pontos de amostragem revelaram tendência no aumento de área
impermeabilizada do ponto 1 ao ponto 4 (52,73% para 67,79%, respectivamente) e tendência
de diminuição da classe agricultura/campo ao longo dos mesmos pontos (32,42% para
15,12%, respectivamente; Tabela 2).
Entretanto, o ponto 6, mais afastado do centro urbano, compreende uma área de
intensa pastagem e vegetação densa na margem esquerda do ribeirão, com 50,90% e 25,52%,
respectivamente. Vale ressaltar, que a montante do respectivo ponto amostral encontra-se
instalada a Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) do município de Londrina, a qual lança o
seu efluente tratado no ribeirão em estudo.
3.2 PARÂMETROS LIMNOLÓGICOS DO RIBEIRÃO CAMBÉ
As médias e os desvios-padrões dos parâmetros limnológicos analisados no presente
estudo durante o período de 2013 a 2014 estão descritos na Tabela 5. Vale ressaltar que de
acordo com a Portaria SUREHMA no 3, de 21 de março de 1991, o Ribeirão Cambé e seus
afluentes até o Parque Arthur Thomas estão enquadrados como corpo hídrico de Classe I.
Dessa forma, até o ponto de amostragem 5 da área de estudo o curso d’agua está dentro dessa
classe.
28
Tabela 5 - Médias e desvios-padrões dos parâmetros limnológicos analisados no presente
estudo.
Pontos Temperatura
da água (°C) pH
Condutividade
elétrica (μS/cm)
Turbidez
(NTU)
Oxigênio
dissolvido (mg.L-1)
1 21.98 ± 2.50 7.59 ± 0.97 158.44 ± 98,78 14.26 ± 8.50 6.06 ± 2.47
2 23.10 ± 4.07 8.28 ± 0.93 139.77 ± 54,91 21.39 ± 13.86 7.53 ± 0.79
3 23.07 ± 3.21 8.10 ± 1.14 263.77 ± 39,93 11.63 ± 13.67 5.6 ± 1.53
4 23.48 ± 1.81 8.00± 0.99 167.33 ± 17,87 3.55 ± 1.98 5.1 ± 1.79
5 24.62 ± 2.37 8.2 ± 0.72 152.50 ± 12,88 1.21 ± 0.74 7.41 ± 1.45
6 25.68 ± 3.83 7.87 ± 0.58 403.97 ± 60,99 19.82 ± 10.27 8.51 ± 5.91
A temperatura da água registrou média mínima de 21,98°C para o ponto 1 e máxima
de 25,68°C para o ponto 6, revelando variação também esperada para o período do ano em
que as análises foram realizadas.
O pH, parâmetro que estima o grau de acidez ou alcalinidade da água, apresentou
média mínima de 7,59 para o ponto 1 e máxima de 8,28 para o ponto 2. Os valores médios do
ponto 1 ao ponto 5 encontram-se dentro do limite permitido pela Resolução Conama
357/2005, que estabelece um pH para corpos hídricos de Classe I entre 6 e 9. No ponto 6 o
valor de pH continua dentro desse mesmo limite.
A condutividade elétrica, parâmetro que avalia a capacidade de uma solução
conduzir corrente elétrica por meio da concentração de íons dissolvidos, apresentou uma
média mínima de 139 μS/cm para o ponto 2 e máxima de 403 μS/cm para o ponto 6. Esse
parâmetro não é considerado pela Resolução Conama 357/2005, porém, a Companhia
Ambiental do Estado de São Paulo (CETESB) propõe valor de até 100 μS/cm. Portanto,
considerando-se esse limite, todos os pontos investigados apresentaram condutividade elétrica
acima do máximo recomendado, com diferenças significativas entre os pontos, conforme
demonstrado na Figura 3.
29
Figura 3 - Médias e desvios-padrões de condutividade elétrica entre os pontos da Bacia do Ribeirão Cambé. Médias de colunas
diferentes seguidas da mesma letra não diferem significativamente pelo Teste de Tukey (p<0,05).
Em relação aos pontos 1, 2, 4 e 5 não foram verificados diferenças significativas
entre os valores de condutividade elétrica. Entretanto, o ponto 3 e 6 diferiram
significativamente entre eles e em relação aos demais pontos, exceto o ponto 3 que não
revelou diferença significativa com o ponto 4.
Os níveis elevados de condutividade elétrica revelados pelos pontos 3 e 6,
independente da estação de coleta, podem ser atribuídos às condições locais. Na imagem de
uso e ocupação do solo da bacia, avaliado por Squizzato (2014; Figura 2), é possível
visualizar para o ponto 3 uma extensa área impermeabilizada que contribuem fortemente para
o escoamento de sedimento em suspensão e o carreamento de resíduos urbanos em épocas de
intensas chuvas. O ponto de amostragem 3 está inserido no Lago Igapó 4 e, de acordo com
Meneghel (2003) e Araújo (2004), em 2003 e 2004 houve intensa entrada de esgoto e resíduos
sólidos, os quais chegaram até o lago através das águas pluviais.
Almeida (2013) afirma que dados preliminares já evidenciavam assoreamento dos
lagos 1, 2, 3 e 4 em 2013, comprovando o lançamento de poluição difusa e esgotos
clandestinos. Já no ano de 2015, avaliações no Lago Igapó acusaram elevados níveis de
30
sulfetos e nitratos, resultado do despejo de lixo, poluentes de veículos e possíveis pontos de
esgotos clandestinos (DIAS, 2015).
Em relação ao ponto 6, a alta condutividade elétrica deve-se possivelmente a
presença de áreas de agricultura/campo ao lado direito da margem do riacho, que contribui
vigorosamente no escoamento superficial de sais provenientes do solo em épocas chuvosas.
Além disso, há ocorrência de lançamento de esgoto tratado pela ETE do município de
Londrina, a montante do ponto de amostragem.
A turbidez, parâmetro que avalia a concentração de substâncias suspensas na água,
sejam sólidos finamente desagregados ou em estado coloidal, ou mesmo organismos
microscópicos, apresentou média variando entre 1,21 NTU para o ponto 5 a 21,39 NTU para
o ponto 2 (Tabela 5 e Figura 4). De acordo com a Resolução Conama 357/2005, esse
parâmetro para o Ribeirão Cambé encontra-se dentro do limite permitido, sendo recomendado
por essa resolução até 40 NTU para corpo hídrico de Classe I.
O ponto 2 apresentou valores de turbidez significativamente maiores do que o ponto
5, conforme demonstrado na Figura 4. O ponto 2 está localizado a jusante de uma queda de
água após um pequeno trecho canalizado do Ribeirão sob uma rodovia, seguido por trecho
com fundo tipicamente arenoso, o que favorece a suspensão de partículas na coluna d’água.
Contudo, o ponto 5, apesar de ambiente típico de corredeiras, com fundo rochoso, dificulta a
suspensão de material inorgânico ou orgânico. Além disso, entre os pontos 4 (Lago Igapó 1) e
o ponto 5 há uma barragem, a qual tende a reter sólidos suspensos (TUNDISI; TUNDISI,
2008).
No ponto 5 verifica-se, ainda, a presença de floresta ripária com estrutura
relativamente equilibrada, com presença de estratos herbáceos, arbustivo e arbóreo,
auxiliando no processo de retenção de materiais alóctones e redução da erodibilidade local.
31
Figura 4 - Médias e desvios-padrões da turbidez entre os pontos da Bacia do Ribeirão Cambé. Médias de colunas diferentes seguidas
da mesma letra não diferem significativamente pelo teste Tukey (p<0,05).
Referente ao parâmetro oxigênio dissolvido, somente os pontos 1, 2, 5 e 6
apresentaram valores dentro do limite permitido pela Resolução Conama 357/2005 para corpo
hídrico de Classe I (Tabela 5). Entretanto para os pontos 3 e 4, enquadrados nessa mesma
Classe, região referente ao Lago Igapó, os valores obtidos foram inferiores a 6 mg.L-1. Dessa
forma, a menor média encontrada foi de 5,10 mg.L-1 para o ponto 4 (Lago Igapó 1) e a maior
foi de 8,51 mg.L-1 para o ponto 6. Sabe-se que esse parâmetro é extremamente relevante para
o funcionamento do sistema aquático e valores menores que 6 mg.L-1 indicam possivelmente
águas poluídas, devido ao processo de decomposição microbiana da matéria orgânica.
Como o valor de oxigênio dissolvido apresentou-se próximo e abaixo do limite
mínimo estabelecido pelo CONAMA, cabe ressaltar que baixas concentrações de oxigênio
(hipóxia) afetam a fisiologia, bioenergética, comportamento e crescimento (RANTIN;
JOHANSEN, 1984), bem como influencia diretamente o padrão de distribuição espacial de
espécies no ambiente aquático (OLIVEIRA; GOULART, 2000).
32
3.3 COMPOSIÇÃO DA ICTIOFAUNA
Foram coletados 1.172 exemplares ao longo da Bacia do Ribeirão Cambé entre o
período de 2013 a 2014, perfazendo uma biomassa total de 4.782,67 g, pertencentes a quatro
ordens, cinco famílias, oito gêneros e treze espécies (Tabela 6).
Tabela 6 - Posição taxonômica das espécies coletadas ao longo dos seis pontos amostrais da
Bacia do Ribeirão Cambé.
ORDEM NOME POPULAR HÁBITAT
COLETADO GUILDA TRÓFICA
CYPRIDONTIFORMES
POECILIDAE
Poecilia reticulata (Peters, 1859)
Barrigudinho Lêntico/Lótico Detritívoro/Omnívoro Phalloceros aff. caudimaculatus
(Hensel,1868)
PERCIFORMES
CICHILIDAE
Oreochromis niloticus (Linnaeus, 1758)
Tilápia/Cará Lêntico Omnívoro Tilapia rendalli (Boulenger, 1897)
Geophagus brasiliensis
(Quoy e Gaimard, 1824)
SILURIFORMES
LORICARIDAE
Hypostomus ancistroides (Ihering, 1911)
Cascudo Lêntico/Lótico Detritívoro Hypostomus strigaticeps (Regan, 1908)
Hypostomus regani (Ihering, 1905)
Hypostomus sp.
HEPTAPTERIDAE
Rhamdia quelen (Quoy e Gaimard, 1824) Jundiá Lótico Omnívoro
CHARACIFORMES
CHARACIDAE
Astyanax aff. paranae (Eigenmann, 1914)
Lambari Lêntico/Lótico Insetívoro Astyanax altiparanae (Garutti e Britski, 2000)
Astyanax bockmanni (Vari e Castro, 2007)
Dentre as espécies de peixes coletadas na Bacia do Ribeirão Cambé estão três
exóticas: P. reticulata, O. niloticus e T. rendalli. Essas espécies demonstram maior resistência
a ambientes degradados e um comportamento ecológico generalista e oportunista. Muitas
espécies da família Poecilidae, principalmente P. reticulata e P. aff caudimaculatus são
33
usadas como indicadoras de integridade de hábitats aquáticos (BOZZETTI; SCHULZ, 2004;
FERREIRA; CASATTI, 2006; PINTO et al., 2006; VIEIRA; SHIBATTA, 2007).
P. reticulata mostrou-se dominante em todos os pontos selecionados (Figura 1),
desde a nascente até a foz do ribeirão Cambé, compreendendo tanto ambientes lênticos como
lóticos. Trata-se de uma espécie introduzida no Brasil para controle biológico, mas apresenta
caráter oportunista com hábitos alimentares detritívoro e omnívoro (KOHNEM, 1991). Sua
alta densidade em ambientes aquáticos urbanos está relacionada à elevada taxa reprodutiva e
plasticidade adaptativa a ambientes impactados. Segundo Vazzoler (1996), P. reticulata
apresenta fecundação interna e vários eventos reprodutivos independentes da sazonalidade,
apresentando ainda adaptações fisiológicas que favorecem a sua colonização em diversos
ambientes, inclusive em locais com baixas concentrações de oxigênio e variações na
salinidade (SOUZA; TOZZO, 2013).
Estudos relacionados a essa espécie já foram realizados por Oliveira e Bennemann
(2005) no Ribeirão Cambé, nos quais verificaram expressiva dominância de P. reticulada em
alguns trechos, comumente associada às péssimas condições de qualidade ambiental. Dessa
forma, P. reticulata pode ser utilizada como indicadora de ambientes aquáticos alterados.
Segundo Araújo (1998), valores maiores que 20% de P. reticulata já podem indicar a
ocorrência de locais degradados. No presente estudo foram encontrados valores próximos ou
iguais a 100% de P. reticulada nos pontos de amostragem durante todas as estações.
A espécie O. niloticus ocorreu com maior abundância nos pontos 1, 2, 3, 4 e 6
(Figura 1). Trata-se de uma espécie com hábito alimentar omnívoro (MEURER et al. 2000).
Indivíduos adultos dessa espécie são muito explorados pela pesca amadora nos pontos 3 e 4
(Lago Igapó), sendo normalmente utilizadas como fonte alimentar. Segundo Hayashi et al.
(1995), essa espécie tem alto potencial na aquicultura em razão da sua rusticidade, rápido
crescimento e adaptação ao confinamento. Além disso, Popman e Phelps (1998) relatam a
resistência da espécie O. niloticus às condições de alta temperatura, baixa concentração de
oxigênio dissolvido e alta concentração de amônia na água.
A espécie T. rendalli, exótica na Bacia do Ribeirão Cambé, detém altas plasticidades
ecológica e alimentar que favorecem a sua permanência em diferentes condições ambientais.
No Ribeirão Cambé apresentou maior abundância nos pontos de amostragem 2, 3 e 4 (Figura
1), sendo muito explorada por meio da pesca amadora nas regiões dos lagos. Sabe-se que essa
espécie é amplamente distribuída geograficamente e de hábito oportunista, o que
34
provavelmente favoreceu a sua proliferação ao longo da Bacia do Ribeirão Cambé desde
quando foi introduzida.
Por outro lado, quanto à presença de espécies nativas na Bacia do Ribeirão Cambé, a
espécie H. ancistroides foi que obteve maior ocorrência nos pontos 2, 3, 5 e 6 (Figura 1). De
hábito detritívoro, essa espécie possui capacidade morfo-fisiológica de absorver ar
atmosférico em condições hipóxicas, demostrando-se tolerante à poluição (VAL; ALMEIDA-
VAL, 1995).
Além da introdução de espécies exóticas, a Bacia do Ribeirão tem sido alvo de
muitos acidentes ambientais e interferências antrópicas nos últimos anos. Vários episódios já
foram registrados em relação ao derramamento de óleo diesel, lançamento de efluentes
industriais e esgotos domésticos em vários trechos, provocando alterações na abundância,
riqueza, equitabilidade e diversidade das espécies ao longo do ribeirão. A Tabela 7 apresenta
os padrões de diversidade da assembléia de peixes verificados durante a realização do
presente estudo.
Tabela 7 - Número de indivíduos das espécies e padrões de diversidade da assembléia de
peixes do Ribeirão Cambé analisados no presente estudo.
ESPÉCIES P1 P2 P3 P4 P5 P6
1. Poecilia reticulata 296 31 128 113 35 167
2. Astyanax bockmanni 3 3 - - - -
3. Oreochromis niloticus 3 11 17 35 - 3
4. Geophagus brasiliensis 4 3 1 - - 2
5. Astyanax aff. paranae 13 - - - - 1
6. Astyanax altiparanae - 18 - - - -
7. Hypostomus ancistroides - 5 3 - 27 1
8. Tilapia rendalli - 13 11 15 - -
9. Phalloceros aff. caudimaculatus - - 153 - - -
10. Hypostomus sp. - - - - 12 -
11. Hypostomus cf. strigaticeps - - - - 12 -
12. Hypostomus regain - - - - 8 1
13. Rhamdia quelen - - - - - 1
Indivíduos coletados 319 84 313 163 94 175
Riqueza 5 7 6 3 5 7
Equitabilidade 0,213 0,853 0,588 0,732 0,908 0,156
Índice de Diversidade de Shannon-Wiener 0,343 1,659 1,054 0,804 1,461 0,28
35
As maiores abundâncias de indivíduos coletados foram registradas nos pontos 1, 3, 4
e 6. Os pontos 2 e 5 foram os que apresentaram maior equitabilidade e diversidade. Se
comparado aos demais pontos, o 2 foi o que apresentou maior diversidade em função da sua
maior riqueza, representada tanto por espécies nativas como exóticas (Tabela 7).
O ponto 2 localizado dentro de uma propriedade privada trata-se de um ambiente
represado composto por vegetação com estrutura secundária. O percurso de mata até o
ribeirão é degradado e as margens do trecho trabalhado revela indícios de erosão e entrada de
óleo. Além disso, nesse ponto, há criação de tilápia para consumo humano. A cerca de 500
metros do ponto 2 do presente estudo, Squizzato (2014) registrou riqueza de nove espécies,
sendo elas: A. aff. paranae, A. altiparanae, G. brasiliensis, G. inaequilabiatus, H.
ancistroides, O. niloticus, P. reticulata, R. quelen e T. rendalli.
O ponto 5, apesar de apresentar mata ciliar com relativa estrutura, se encontra logo
após a barragem do Lago Igapó, a qual tende a reter grande parte dos sedimentos que foram
carreados a partir dos trechos superiores do Ribeirão. O respectivo ponto obteve maior
equitabilidade, isso por que não há uma dominância significativa de uma única espécie e os
valores de abundância se apresentaram mais homogêneos entre as espécies. Entretanto, este
ponto apresentou diversidade inferior ao ponto 2, devido a sua menor riqueza de espécies.
Todavia, a qualidade encontrada para riqueza, equitabilidade e diversidade no ponto
2 do presente estudo não corresponde ao grau de integridade ambiental atribuído por
Gambarotto (2014), o qual classificou esse ecossistema como relativamente pobre,
principalmente quando comparado a ecossistemas mais íntegros. Entretanto, em suas análises
foram aplicados outros índices de avaliação ambiental.
Segundo Shibatta et al. (2003), a ictiofauna da Bacia do alto Ribeirão Cambé na
região do baixo Tibagi apresentou riqueza de 16 espécies, apontando a necessidade de
medidas urgentes de recuperação ambiental. Já Oliveira e Bennemann (2005) registraram 15
espécies nesse trecho, sendo que no presente estudo pode-se observar somente 13 espécies
coletadas. Nesse contexto, para complementar as análises ambientais do corpo hídrico,
padrões de abundância, biomassa e comprimento foram analisados (Figuras 5 e 6).
36
Ponto 1 Ponto 2
Ponto 3 Ponto 4
Ponto 5 Ponto 6
Figura 5 - Percentual de biomassa e abundância de cada espécie de peixe nos seis pontos de amostragem na Bacia do Ribeirão
Cambé (Londrina/PR).
Para todos os pontos de amostragem (Figura 5) verificou-se maior abundância de P.
reticulata, exceto para ponto 3, que em uma das estações de coleta predominou a espécie P.
aff. caudimaculatus. Todavia, ambas espécies pertencem a mesma família. Em relação ao
37
parâmetro biomassa, quatro espécies se destacaram: G. brasiliensis, O. niloticus, H.
ancistróides e H. regani.
Os pontos 1, 4 e 6 apresentaram os maiores percentuais de abundância para P.
reticulata, alcançando próximo a de 100% de ocorrência, enquanto os maiores percentuais de
biomassa foram verificados nos pontos 4 e 6 pelas espécies O. niloticus e H. ancistroides,
com aproximadamente 100% e 80%, respectivamente. Por outro lado, os pontos 2 e 5 foram
os ambientes com distribuição mais equitativa da abundância e biomassa, condição também
verificada na equitabilidade, o que lhe confere característica relativa de menor desequilíbrio
ecossistêmico.
Com relação aos padrões de comprimento (Figura 6), nota-se que em todos os pontos
o percentual de indivíduos de comprimento P (pequenos) é mais representativo, exceto no
ponto 2. Nesse ponto há uma diferença muito pequena em relação ao comprimento M, o qual
também contribuiu relativamente nos pontos 3 e 6.
Os pequenos tamanhos dos indivíduos, principalmente nos pontos amostrais de
sistemas lóticos (Figura 6) revelam, provavelmente, as persistentes influências antrópicas,
uma vez que boas condições de integridade de ribeirões são representadas por espécies de
peixes nativas com indivíduos distribuídos em várias classes de tamanhos e com estrutura
trófica balanceada. Dessa forma, à medida que a influência antrópica aumenta, as espécies
mais sensíveis começam a desaparecer e a estrutura trófica é alterada, tendendo à
instabilidade e desequilíbrio (LYONS et al., 1995),
Essa ameaça à biodiversidade decorre da perda e fragmentação de hábitats,
removendo de imediato à flora e fauna nativas e, consequentemente, ao desaparecimento de
populações inteiras ou parte delas, redução da distribuição geográfica das espécies e perdas de
diversidade genética (HERO; RIDGWAY, 2006).
No entanto, vale ressaltar, que no ponto 4 (Lago Igapó 1) foi priorizada a coleta de
peixes na zona litorânea, tipicamente composta por espécies de pequeno porte e juvenis das
espécies de maior porte, exclusivamente composta por fauna introduzida. Já no ponto 6,
espécies de peixes com comprimentos superiores a 100 mm também estão possivelmente
presentes, uma vez que se trata de um ambiente com características mais próximas de riacho
relativamente mais íntegro, com floresta ripária mais estruturada, provavelmente
disponibilizando maior diversidade de recursos alimentares. Todavia, a preferência por peixes
menores está relacionada à dificuldade de acesso da pesca elétrica, sendo somente utilizados
peneiras e puças para a avaliação da presença de Pb nos tecidos dos peixes.
38
Ponto 1 Ponto 2
Ponto 3 Ponto 4
Ponto 5 Ponto 6
Figura 6 - Padrão de distribuição de comprimento das espécies de peixes coletadas nos seis pontos de amostragem. Comprimento P
(pequenos): 0–100 mm; Comprimento M (médio): 100-200 mm; Comprimento G (grande): 200-300 mm.
P1
P2
P3
P4
P5
P6
39
Oliveira e Bennemann (2005) revelaram que a composição da ictiofauna da porção
superior do Ribeirão Cambé, tipicamente mais impactada, era composta por indivíduos com
tamanhos variando entre 13 a 105 mm. Esse resultado confirma a hipótese de que o
comprimento pequeno dos indivíduos das espécies presentes nesse trecho do Ribeirão já vem
constituindo um padrão que persiste até os dias de hoje, bem como provavelmente os
impactos antrópicos responsáveis por essa estrutura.
3.4 CONCENTRAÇÃO DE Pb ACUMULADO EM PEIXES DE DIFERENTES ORDENS
DA BACIA DO RIBEIRÃO CAMBÉ
No que se refere à metodologia empregada na técnica GF AAS, a curva de calibração
aquosa obtida resultou na equação: y = 0,061 + 0,012x, com r2 de 0.99, apresentando
excelente correlação linear. Em relação ao limite de detecção instrumental o valor encontrado
foi de 0,65 µg.L-1, indicando a capacidade da técnica em determinar quantidades de Pb em
níveis de traços. Para o teste de recuperação, o valor médio encontrado foi de 96%, dentro da
faixa de 80 a 120% recomendada para a validação de métodos. O resultado obtido demonstrou
que a metodologia não apresentou problemas de interferências e/ou perdas do metal analisado
nas amostras de peixe.
Dentre as espécies da assembléia de peixes coletadas ao longo do presente estudo,
apenas algumas foram analisadas, em razão do número reduzido de indivíduos amostrados.
Dessa forma, para cada ponto foram analisadas até três espécies dominantes, variando em
função da estação do ano e das condições do local.
No verão (dezembro de 2013) foram analisadas as concentrações de Pb (mg.kg-1) nas
espécies P. reticulata, A. altiparanae, T. rendalli, O. niloticus e H. ancistroides (Figura 7). As
médias dos níveis acumulados de Pb nos tecidos dos peixes variaram de 0,18 nos músculos a
6,74 mg.kg -1 para os organismos inteiros (Figura 7). Segundo a Resolução RDC Nº 42, de 29
de agosto de 2013, que dispõe sobre o Regulamento Técnico Mercosul sobre Limites
Máximos de Contaminantes Inorgânicos em Alimentos, a concentração acumulada nos
tecidos animais para os pontos 1, 2, 3, 4 e 5 estavam além do permitido, já que o nível
estabelecido é de 0,30 mg.kg-1. Entretanto, as três maiores concentrações médias ocorreram
para os pontos 1, 3 e 5. Os pontos 1 e 3 não diferiram entre si, porém foram
40
significativamente maiores do que os pontos 2, 4 e 6. Já o ponto 5 revelou diferença
significativa em relação aos demais pontos avaliados nesse estudo.
Figura 7 - Concentração média e desvio padrão de Pb (mg.kg-1) nas espécies P. reticulata, A. altiparanae, T. rendalli, O. niloticus, e H.
ancistroides da Bacia do Ribeirão Cambé em dezembro de 2013. Médias na mesma coluna seguidas da mesma letra não diferem
significativamente pelo teste Tukey (p<0,05). As letras em parênteses significam o tecido analisado, ou seja, espécies de peixes com
tamanhos médios tiveram como preferência o músculo (M) e espécies de peixes com tamanhos pequenos foram analisados inteiros
(I).
Considerando os resultados de estrutura de assembléia de peixes para o ponto 1
(espécie dominante: P. reticulata; Tabela 7), comprimento padrão tipicamente pequeno
(Figura 6) e uso e ocupação de solo principalmente por área impermeabilizada e
agricultura/campo (Tabela 2), juntamente com os níveis médios de Pb 4,12 mg.kg-1 (Figura 7)
para a espécie P. reticulata, confirma-se o grau de degradação da cabeceira do Ribeirão
Cambé, refletindo não somente na estrutura física (elevada condutividade elétrica) e química
(concentrações de oxigênio próximas do limite permitido pelo CONAMA) do local, mas
também, na baixa diversidade de peixes e toxicidade do ambiente aquático.
Segundo Silva et al. (2003), a espécie P. reticulata é muito utilizada para estudos dos
efeitos das variações ambientais. No Ribeirão Cambé, P. reticulada já foi registrada nos
41
estudos de Araújo (1988) e Lemes e Garutti (2002). Ambos os autores caracterizam essa
espécie como dominante, devido a sua sobrevivência em águas contaminadas por metais.
Como meio de comparação da concentração de Pb em peixes com outros estudos,
Widianarko et al. (2000) verificaram que a espécie P. reticulada é realmente tolerante a
riachos poluídos na Indonésia. De acordo com esses autores, esses peixes são atraídos por
resíduos orgânicos e sobrevivem à contaminação de níveis acentuados de metais. A
concentração mínima de Pb encontrada para essa espécie em riacho não poluído na Indonésia
foi de 0,8 mg.kg-1e máxima de 6,9 mg.kg-1 no riacho extremamente poluído. Os autores
supracitados supõem que a resistência da P. reticulata seja devido ao desenvolvimento de
uma adaptação fisiológica, que permite o acúmulo de altas concentrações de metais em
ambientes excessivamente degradados e contaminados.
Em relação ao ponto 3, localizado no Lago Igapó 4, verificou-se uma média de
concentração de 4,10 mg.kg-1 de Pb (Figura 7) para a espécie T. rendalli. Essas concentrações
foram observadas em estágios mais juvenis, uma vez que os tamanhos coletados nesse
período foram predominantemente pequenos. No entanto, vale ressaltar, que apesar da
concentração média de Pb detectada, esse ponto revelou valor de diversidade de espécies
dentre os maiores registrados no conjunto de pontos analisados (Tabela 7).
A T. rendalli, exótica, é considerada uma espécie relativamente importante como
bioindicadora de poluição, pois apresenta alta sensibilidade aos efeitos tóxicos de
contaminantes (PATIN, 1984). De modo geral, esses peixes se adaptam facilmente a
diferentes condições ambientais, ou seja, apresentam ampla plasticidade ecológica e inclusive
alimentar (CALA; BERNAL, 1997; BATJAKAS et al., 1997; DUPONCHELLE et al., 2000;
WINEMILLER; WINEMILLER, 2003; DIAS et al., 2005).
Em comparação à bioacumulação de Pb pela T. rendalli em outros estudos, Repula et
al. (2012) analisaram um córrego no estado do Paraná próximo a um curtume e a um tanque
de peixes e observaram as seguintes concentrações desse elemento-traço: no músculo as
concentrações variaram de 0,35 a 2,17 mg.kg-1 e no fígado de 2,32 a 34,30 mg.kg-1. Ao todo,
os autores verificaram que somente três amostras estavam acima do limite para o músculo e
todas acima para o fígado, quando comparados com os limites de Brasil (1988) que determina
2,0 mg.kg-1. A partir dessa análise, os autores concluíram que elevadas concentrações de íons
metálicos nos músculos dos peixes são detectadas apenas quando há contaminação elevada
nos órgãos acumuladores (REPULA et al., 2012).
42
Paiva (2005), em um diagnóstico sobre a dispersão do Pb em ambientes aquáticos de
Belo Jardim-PE, também revelou que as concentrações de Pb em T. rendalli foram
consideravelmente mais baixas no músculo que as encontradas nas vísceras. Essas
concentrações estiveram dentro do limite máximo de tolerância para contaminantes
inorgânicos em pescados, segundo a determinação de BRASIL (1988), entretanto, os
resultados para as vísceras foram próximos de 12 mg.kg-1.
Fisiologicamente, o acúmulo do Pb nas vísceras pode ser atribuído à tendência desse
elemento reagir com grupamentos presentes em proteínas existentes em grandes quantidades
nesta parte do organismo do peixe. A exposição ao Pb pode provocar paralisação dos
impulsos nervosos através da inibição da enzima monoamina oxidase (MOA) e da
acetilcolinesterase (ACHE), causando patologias nos tecidos dos peixes (TAYEL et al.,
2008). Dessa forma, neste trabalho, futuras análises são necessárias para verificar o nível de
concentração de Pb no fígado dos peixes da Bacia do Ribeirão Cambé, haja vista as
concentrações encontradas acima da resolução para músculo e peixes inteiros.
Por outro lado, o ponto de amostragem 5 do presente estudo se apresentou como o
mais preservado, haja vista a presença de mata ciliar com relativa estrutura, parâmetros físicos
e químicos em boas condições (Tabela 5), níveis de equitabilidade e diversidade elevadas
(Tabela 7) e águas límpidas e transparentes. Além disso, o ponto está localizado após a
barragem do Lago Igapó 1, o qual tende a reter grande parte dos sedimentos que foram
carreados para o ribeirão.
Contudo, as concentrações de Pb detectadas no ponto de amostragem 5 para a
espécie H. ancistroides revelou média de 6,74 mg.kg-1 (Figura 7). A hipótese é de que nesse
ponto a contaminação por esse elemento-traço seja devida às supostas atividades irregulares
praticadas a montante, como lavagens de veículos após a barragem, o que é proibido por Lei,
ou às ocorrências de esgotos domésticos e ligações clandestinas nessa área.
A família Loricariidae, a qual pertence à espécie H. ancistroides, normalmente vive
em fundos de rios rochosos de água doce. Devido ao seu hábito alimentar detritívoro, possui
participação direta no processo de pré-mineralização da matéria orgânica disponível no
substrato lodoso, facilitando a decomposição pelos microorganismos e, em decorrência disso,
acelerando a reciclagem de nutrientes, proporcionando a dinamização do metabolismo
aquático. Araújo et al. (2010) mencionaram que em razão ao comportamento detritívoro,
poluentes podem ser absorvidos por meio da alimentação, liberando para a cadeia trófica e
coluna d’água compostos anteriormente insolúveis. Dessa forma, por se tratar de um grupo
43
bastante resistente a ambientes degradados a utilização desses peixes é bastante relevante para
as análises toxicológicas.
No outono, as médias dos níveis acumulados de Pb nos peixes variaram de 0,04 a
0,17 mg.kg-1 para o músculo de O. niloticus (Figura 8). Segundo a Resolução RDC Nº 42, a
concentração desse elemento-traço para os pontos 1, 2, 3 e 4 revelaram valores abaixo do
limite permitido, não ocorrendo diferenças significativas entre os pontos investigados. Em
relação aos pontos 5 e 6 os níveis de Pb para os peixes H. strigaticeps e P. reticulata
estiveram abaixo do limite de detecção da técnica de GF AAS.
Figura 8 - Concentração média e desvio padrão de Pb (mg.kg-1) na espécie O. niloticus da Bacia do Ribeirão Cambé em março de
2014. Médias na mesma coluna seguidas da mesma letra não diferem significativamente pelo teste Tukey (p<0,05). A letra M em
parênteses representa o uso de músculo nas análises.
No inverno, as médias dos níveis acumulados de Pb nos peixes variaram de 0,04 a
4,83 mg.kg-1 para peixes inteiros (Figura 9). De acordo com a Resolução RDC Nº 42, as
concentrações nos peixes para os pontos 2, 3, e 5 se revelaram acima do limite permitido.
Contudo, somente o ponto 5 diferiu significativamente em relação aos pontos 1, 2, 4 e 6. Os
44
níveis encontrados para a espécie H. ancistroides no ponto 5 se devem supostamente às
atividades irregulares praticadas a montante da área amostral, mencionado anteriormente.
Figura 9 - Concentração média e desvio padrão de Pb (mg.kg-1) nas espécies A. aff. paranae, O. niloticus, P. reticulata e H.
ancistroides da Bacia do Ribeirão Cambé em junho de 2014. Médias na mesma coluna seguidas da mesma letra não diferem
significativamente pelo teste Tukey (p<0,05). As letras em parênteses significam o tecido analisado, ou seja, espécies de peixes com
tamanhos médios tiveram como preferência o músculo (M) e espécies de peixes com tamanhos pequenos foram analisados inteiros
(I).
Todavia, vale ressaltar, que a espécie O. niloticus revelou um comportamento
acumulador em todos os períodos sazonais, mesmo sendo em níveis mais baixos. A
explicação para este baixo acúmulo pode ser devido à resistência a ação de contaminantes,
mediada pelo desenvolvimento de alguns mecanismos defensivos, como por exemplo,
secreção de muco excessivo. Outra razão pode estar relacionada com a baixa afinidade do
metal com as proteínas presentes em gônadas e músculos, ressaltando que no caso deste
último a questão toma outra conotação, na medida em que é consumido como alimento pelo
homem (OSMAN; KLOAS, 2010).
Em suma, a absorção de Pb e demais elementos-traço por organismos aquáticos pode
ocorrer através da pele, brânquias, além da via alimentar (TAO et al., 1999). O tempo de
45
permanência em águas poluídas, a idade e o seu tamanho afetam diretamente o acúmulo de
elementos metálicos em seus organismos, comprometendo não somente o tamanho da
população de peixes, mas também o seu consumo.
Na literatura, as concentrações de elementos-traço em tecidos de peixes de água doce
podem variar consideravelmente entre diferentes estudos (JAVED, 2005; PAPAGIANNIS et
al., 2004), possivelmente devido às diferenças de concentrações de elementos metálicos e
características químicas da água a partir do qual os peixes foram amostrados, necessidades
ecológicas, metabolismo e temporada da alimentação em que os estudos foram feitos
(MANSOUR; SIDKY, 2002). Por esse motivo, conclui-se que os resultados obtidos nesse
estudo, quanto à avaliação da presença de Pb nas espécies de peixes durante as diferentes
estações de coleta, podem ter sofrido tais influências, resultando em concentrações de Pb
diferenciadas entre as espécies amostradas nos diferentes pontos investigados ao longo da
Bacia do Ribeirão Cambé.
3.5 CORRELAÇÃO DAS VARIÁVEIS BIÓTICAS, ABIÓTICAS E USO E OCUPAÇÃO
DO SOLO POR MEIO DA ÁNALISE DE CORRELAÇÃO CANONICA (CCA)
A CCA confirmou a influência de alguns parâmetros limnológicos e de uso e
ocupação do solo sobre a estrutura da assembléia de peixes ao longo da bacia hidrográfica do
ribeirão Cambé (Figura 10). O primeiro eixo canônico revela que os pontos 1 (cabeceira), 4
(Lago Igapó) e 5 (imediatamente a jusante da barragem do lago) se mostraram mais afetados
pelas concentrações de Pb, associados a trechos com maiores áreas de cobertura aquática e
áreas impermeabilizadas ao longo da bacia, com elevada abundância de indivíduos de
pequeno porte.
A correlação dos pontos em razão das concentrações de Pb foi provavelmente
favorecida pela vasta área impermeabilizada ao redor do Ribeirão Cambé, que pode contribuir
significativamente para o lançamento do elemento Pb nos pontos 1, 4 e 5. Essa contribuição
pode ocorrer por meio do escoamento de resíduos urbanos em épocas chuvosas, acidentes
ambientais ou através de redes pluviais possivelmente contaminadas, já que a extensa área de
corpo hídrico favorece maior conexão com possíveis redes.
46
P1
P2
P3
P4
P5P6
S EH
Abund
CpP
CpM
Biom
pHCE
Turb
OD
Pb
-1,5 -1,0 -0,5 0,0 0,5 1,0
CCA 1
-1,5
-1,0
-0,5
0,0
0,5
1,0
1,5
2,0C
CA
2
P1
P2
P3
P4
P5P6
SE
Abund
CpP
CpM
VegSolo
-1,5 -1,0 -0,5 0,0 0,5 1,0
CCA 1
-2,0
-1,5
-1,0
-0,5
0,0
0,5
1,0
1,5
CC
A 2
Figura 10 - Diagrama das CCA parciais: A) Para os parâmetros limnológicos dos pontos de amostragem P1 a P6 (OD = Oxigênio
Dissolvido; pH; Turb = Turbidez; CE = Condutividade Elétrica; Pb = Concentrações de Chumbo nas espécies de peixes) e
parâmetros da comunidade de peixes (Abund = Abundância; Biom = Biomassa; CpP = Percentuais de indivíduos por classe de
tamanho de 0 a 10 mm; CpM = Percentuais de indivíduos por classe de tamanho maiores que 10 mm; E = Equitabilidade; H’ =
Índice de Diversidade de Shannon; S = Riqueza); B) Para os parâmetros de uso e ocupação do solo na bacia hidrográfica do ribeirão
Cambé em percentuais de área ocupada (Agua = Superfície de ambientes aquáticos; Campo = Áreas de campo e agricultura;
Imperm = Áreas urbanas com solo impermeabilizado; Solo = Solo exposto; Veg = Cobertura vegetal). As setas indicam a correlação
dos parâmetros limnológicos e de uso e ocupação do solo com os eixos 1 e 2 das CCAs parciais, respectivamente. Os autovalores das
CCAs parciais foram: A) 1o eixo = 0,217; 2o eixo = 0,045; B) 1o eixo = 0,217; 2o eixo = 0,046.
H’
Biom
Imper
Água
Campo
A
B
47
Entretanto, a correlação do padrão de comprimento pequeno dos peixes deve-se
possivelmente a fatores como ambientes de cabeceira, como no ponto 1, ou pela degradação
do local. Segundo a literatura, peixes de pequeno porte e de distribuição geográfica restrita
normalmente colonizam ambientes naturais de cabeceiras (BÖHLKE et al., 1978;
CARAMASCHI, 1986; LANGEANI, 1989; ROSA; MENEZES, 1996; LOWE-
MCCONNEL, 1999; OYAKAWA, 2000; CASTRO, 2001; CASATTI, et al., 2001). Por outro
lado, essa correlação com indivíduos de pequeno porte pode estar relacionada com a presença
de impactos negativos no meio, ocasionando o desaparecimento de populações de peixes,
alterando a estrutura trófica e, consequentemente, a diversidade do local. Entretanto, o
comprimento pequeno encontrado para o ponto 4 (Lago Igapó) deve-se a coleta na zona
litorânea, constituída, sobretudo de peixes juvenis, não podendo se descartar a presença de
peixes maiores, já que se trata de um ambiente lacustre. Quanto ao parâmetro abundância,
mesmo sendo aplicadas técnicas de coletas diferenciadas nos pontos 1, 4 e 5, pois se tratam de
sistemas límnicos diferentes, a quantidade de indivíduos coletados foi próxima entre eles
(Tabela 7), evidenciando que suas diferentes características permitiram a elevada abundância
de espécies de pequeno porte por distintas razões (Figura 10).
Por outro lado, o ponto 6 (ponto mais próximo à foz do ribeirão) se mostrou o mais
rico em oxigênio dissolvido, em parte em razão da declividade do canal nesse trecho,
formando áreas de correrias de longas extensões, cercado por áreas de campo e agricultura,
solo exposto, mas também pela maior contribuição relativa de cobertura vegetal. Em razão
dessas características morfométricas e fisiográficas, o ponto 6 se caracterizou pela maior
biomassa de peixes, principalmente de indivíduos de maior porte da Ordem Siluriformes, os
quais são adaptados a ambientes lóticos de intenso fluxo e fundo rochoso (PAGOTTO et al.
2011). Esses indivíduos, gênero Hypostomus, por exemplo, apresentam corpos deprimidos e
bocas ventrais que permitem explorar o perifíton e a matéria orgânica que fica aderida às
rochas no leito do ribeirão, revelando adaptações ecomorfológicas específicas para esse tipo
de hábitat (DELARIVA e AGOSTINHO, 2001).
O ponto 2 (após a cabeceira e a jusante de uma pequena barragem) se revelou um
ambiente relativamente bem oxigenado e com a ocorrência de espécies de maior porte,
formado por uma grande proporção de espécie exótica T. rendalli, introduzida para pesca
amadora local.
48
4. CONCLUSÃO
O Ribeirão Cambé se revelou fortemente impactado ao longo da sua bacia, sofrendo
diferentes pressões à medida que percorria diferentes elementos da paisagem. O trecho de
cabeceira apresentou elevadas concentrações de Pb, com intensa sedimentação de material
alóctone e indícios de assoreamento, revelando forte dominância da espécie exótica de
pequeno porte P. reticulata.
No seu trecho médio, o principal impacto sobre a bacia é a instalação de uma cadeia
de reservatórios (Lagos Igapó), a qual tende a sedimentar materiais em suspensão e contribui
para a formação de uma dinâmica lêntica dentro do sistema lótico original. Como os trechos
da bacia próximos ao Lago Igapó correspondem à área mais intensamente urbanizada, a
contribuição desses materiais se dá principalmente via escoamento superficial por galerias de
captação de água pluvial.
No lago e imediatamente a jusante, a concentração de Pb nas espécies de peixes se
apresentou muito alta, acima do que determina a legislação. Este fato traz preocupação, pois
corresponde a uma área com relativa atividade pesqueira amadora, visando o consumo de
proteína animal. No trecho próximo à foz, localizado a jusante do lançamento de efluentes
tratados de uma ETE, por se tratar de uma área de corredeiras cercada por vasta área de
floresta ciliar, revelou ocorrência de espécies de grande porte, portanto relativamente com
maior biomassa.
Do ponto de vista da dinâmica temporal de contaminação da bacia, no inverno as
espécies O. niloticus, P. reticulata e H. ancistroides apresentaram concentrações médias
significativas e acima da resolução para os pontos 2, 3 e 5. Entretanto, os maiores acúmulos
de Pb nos peixes ocorreram nas estações do verão, sendo significativamente maiores em
relação às demais estações.
49
REFERÊNCIAS
ABES, Sara S. da; AGOSTINHO, Ângelo A.; OKADA, Edson K.; GOMES, Luiz C. Diet
Iheringichthys labrosus (Pimelodidae, Siluriformes) in the Itaipu Reservoir Paraná River,
Brasil-Paraguay. Brazilian Archives of Biology and Technology, Maringá, v. 44, n.1, p.
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