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Universidade de Caxias do SulCidade Universitária

Direito Penal II – Teoria Geral do DelitoProfa. Paula Gil Larruscahim

Sistemas penais e suas características:

I – O Sistema Clássico – A teoria Causalista ou Causal-naturalista da ação:

Autores: Franz Von Lizt , Ernst Beling e Gustav Radbruch,Nélson Hungria, Magalhães Noronha, Aníbal Bruno

Época: final do séc. XIX – em 1884 foi publicado a 2ª edição do Tratado de Lizt

Método: positivista

Características:

Tem como mérito trazer para o campo do direito penal a responsabilidade subjetiva (não existe crime sema ação e é na culpabilidade que se verificará a relação psíquica entre o autor e o fato delituoso) e expulsar a responsabilidade objetiva.

O conceito de ação era dado apenas por um dado naturalístico, isto é, o delito era representado pro um movimento corporal (ação) que produz uma modificação no mundo exterior (resultado).

O injusto penal era puramente descritivo, objetivo, somente a culpabilidade era subjetiva, já que dolosa ou culposa.

O elemento essencial era a ação

Para os clássicos havia uma distinção entre vontade e finalidade, pois a vontade estava na conduta humana, ao passo que a finalidade era examinada na culpabilidade.

Resultou da fusão de suas teorias: teoria causal da ação e teoria psicológica da culpabilidade

Estrutura do crime: dois aspectos

1º) aspecto objetivo: ação, tipicidade e antijuridicidade

2º)aspecto subjetivo: culpabilidade

Assim, no sistema clássico, o conceito de delito era dado com as seguinte estrutura e características:

Ação: era o elemento básico, puramente descritivo, naturalista e causal, isto é, não se fazia um juízo de valoração sobre a conduta, que embora tivesse sua origem na vontade, seu conteúdo não tinha relevância. Lizt conceituou a ação como a intervenção muscular produzida por energias de um impulso cerebral, que, comandadas pelas leis da natureza provoca uma transformação no mundo exterior.

Tipicidade: inicialmente concebido por Beling, representava o caráter externo da ação, isto é, o mero juízo de adequação da dos aspectos objetivos do fato descrito

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na lei.Num primeiro momento o tipo e a tipicidade são meramente descritivos,mas em 1915, com Mayer, a tipicidade passa a ser entendida como um indício de antijuridicidade, isto é, toda conduta típica provavelmente será antijurídica.

Antijuridicidade: ainda que constitua um juízo de desvalor – valoração negativa da ação – ainda é um elemento objetivo e formal. Assim, o caráter valorativo recai sobre o aspecto objetivo: a provocação de resultados externos negativos, indesejáveis juridicamente.

Culpabilidade: concebida como o aspecto subjetivo do crime porque ligava o autor ao fato através do exame da finalidade da conduta realizada. A diversidade de intensidade desse nexo psicológico faz surgir as formas de culpabilidade: dolosa e culposa. Tinha como pressuposto a imputabilidade, concebida à época como capacidade de ser culpável. No entanto, o exame desse aspecto subjetivo ainda é meramente descritivo.

Críticas ao sistema clássico:

Quanto ao elemento de ligação: nem toda ação produz um crime, pois em função do princípio da legalidade, fora do que estiver descrito nos tipos penais, não pode ser considerado como uma conduta juridicamente relevante;

Quanto ao elemento essencial: naturalisticamente uma ação e uma omissão não se confundem, pois os clássicos entendiam que a ação em sentido amplo dividia-se em ação em sentido estrito (fazer) e omissão (não –fazer) e ambas eram consideradas causais, ou seja, ambas geravam relações de causa e efeito. Ocorre que no caso da omissão – o não agir - , não da ensejo a uma relação de causa e efeito, pois quem não age, pode estar deixando de interferir numa relação de causalidade,mas não produzindo uma. A importância dos crimes omissivos é o desvalor da ação que passa a ser penalmente relevante.

O dolo, a intenção é um elemento essencial da ação que está no âmbito da tipicidade e não da culpabilidade. Os clássicos ao separarem a vontade da conduta, o consideram como uma qualidade a ser atribuída apenas posteriormente, assim como a culpa, encontrando enorme dificuldade em estabelecer um conceito unitário para dolo e culpa.

Nem toda conduta causa uma modificação no mudo exterior – o problema da tentativa – crimes sem resultado – art. 14, § único do CP

II – O Sistema Finalista – Teoria Finalista da Ação

Autores: formulado por Hans Welzel em torno de 1931

Método: fenomenológico

Características:

Ainda que a conduta humana continue sendo o elemento essencial dessa teoria, para Welzel, a finalidade será sua característica fundamental, sob o ponto de vista ontológico.

Assim, conduta e finalidade não se separam, bem como não pode haver vontade sem finalidade.

Desse modo a finalidade (dolo) não pode ser elemento da culpabilidade, mas sim da conduta.

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Como conseqüência o dolo e a culpa passam a integrar a tipicidade formando o tipo penal complexo (tipo objetivo-verbo nuclear e complemento e tipo subjetivo – dolo e culpa)

A culpabilidade, portanto, passa a ser fundamentada pela Teoria Normativa que visou estabelecer um juízo de reprovação, referindo a vontade do agente à vontade da lei. A culpabilidade é somente aquele conjunto de circunstâncias que condicionam a reprovabilidade da conduta contrária ao Direito, e o objeto de reprovação situa-se no delito.

Estrutura e características do crime no sistema finalista:

Ação típica: composta pela conduta que é dolosa ou culposa, pelo resultado (em crimes matérias), nexo causal e tipicidade.

Antijuridicidade: entendida como a contradição entre a causação do resultado e a ordem jurídica.

Culpabilidade: entendida como reprovabilidade passa a ser dada por um conceito normativo

CULPABILIDADE COMO PRESSUPOSTO DE PENA OU ELEMENTO DO DELITO?

Na dogmática penal brasileira existe uma dissidência em relação a estrutura do delito, no sentido de que a culpabilidade seria mero pressuposto da pena.

Nesse sentido René Ariel Dotti, Damásio de Jesus, Júlio Mirabete, Fernando Capez, Luiz Flavio Gomes, etc.

Fundamento: Algumas disposições legais artigos que determinam isenções da pena,em função do critério da imputabilidade...

Estrutura bipartida: Crime – fato típico e antijurídico

Por outro lado, sustentando a estrutura original do delito: fato típico, antijurídico e culpável (Welzel) – Heleno Fragozo, Cezar Roberto Bittencourt, Andrei Schimdt, Francisco de Assis Toledo, Paulo José da Costa Jr, etc

Fundamento: quando da aplicação da pena concreta, o magistrado deve levar em conta a presença de todos os elementos e não apenas um e sendo a culpabilidade a reprovação do injusto, esta é a principal diferença que se estabelece entre o ilícito penal e extrapenal, razão pela qual só pode ser elemento do crime e não pressuposto de pena.

Fato típico:

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É o primeiro elemento da estrutura analítica do delito e pode ser composto conforme for o tipo doloso ou culposo;

FATO TÍPICO DOLOSO:

Ação dolosa

Resultado (crimes materias)

Nexo Causal

Tipicidade

FATO TÍPICO CULPOSO:

Ação voluntária

Resultado involuntário

Tipicidade

Falta de cuidado objetivo necessário

Previsibilidade objetiva

Da ação: não há delito sem conduta

O princípio nullum crimen sine conducta é uma garantia jurídica elementar. Se não existisse ou fosse retirado, o delito poderia ser a possibilidade de penalização do pensamento, da forma de ser, das características pessoais, etc. Exemplo disso é o artigo 3º da Lei 9605/98 (penalização da pessoa jurídica), direito penal do autor, e os delitos de esquecimento.

Utiliza-se ato e ação como sinônimos, entendidas como uma fazer humano ativo, sendo a omissão o não fazer devido. Deve-se advertir para a terminologia fato, onde para o direito penal só têm relevância os fatos humanos, que podem ser voluntários e involuntários. Nesse sentido, importam para o direito penal os fatos voluntários, que são as condutas.

Elementos da conduta:

ConsciênciaVoluntariedadeFinalidadeExteriorização

Porém, não basta a simples vontade de praticar o crime se esta não for exteriorizada. É necessário que o autor do fato inicie i crime para que sua conduto seja relevante pra o direito penal.

O conceito de ação na teoria geral do delito cumpre uma função também de limitação com o poder de punir, isto é, devem ficar fora do conceito de ação e omissão todos os movimentos corporais que não sejam relevantes para o direito penal (fragmentariedade, lesividade, intervenção mínima, subsidiar idade...). Quando o movimento corporal não for orientado pela consciência, vontade e finalidade, não se pode falar em ação.

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Há, portanto, ausência de ação nos seguintes casos:

1º) Coação física irresistível (vis absoluta): quem atua obrigado por uma força irresistível não age voluntariamente, é mero instrumento realizador da vontade do coator. Nesse caso, o CP pune a figura do autor mediato.

2º) Movimentos ou atos reflexos: são atos puramente somáticos, aqueles em que o movimento corpóreo ou sua ausência é determinada por estímulos dirigidos diretamente ao sistema nervoso. EX: segundo MAGGIORE, "como exemplo de puro ato de reflexo, poderíamos figurar um espirro violento que determina um movimento da cabeça ou do braço de que resulta dano para coisa alheia, ou que faz cair uma lâmpada e ocasiona um incêndio".

Não se confundem com os atos em curto-circuito e as reações explosivas, pois nesses existe vontade, ainda que de maneira fugaz, já que a velocidade com que surge o elemento volitivo é tão grande que se torna impossível controlá-los. No entanto, essas questões são mais pertinentes de serem examinadas na culpabilidade, especificamente na imputabilidade, como espécie de transtorno mental

3º) Estados de inconsciência:a doutrina tem trazido como exemplos os casos da embriaguez letárgica, o sonambulismo e o hipnotismo. Segundo Zaffaroni, consciência é o resultado da atividade das funções mentais, sendo o resultado do funcionamento de todas elas e não uma faculdade. Quando essas funções mentais não funcionam adequadamente se diz que há estado de inconsciência, que é incompatível com a vontade, e sem vontade não há ação.Como nesses casos os atos praticados não são orientados pela vontade, conseqüentemente não podem ser considerados aços penalmente relevantes.

Sujeitos da ação

Sujeito Ativo: é quem pratica o fato descrito como crime na norma penal incriminadora. Sendo a conduta (ação ou omissão) o centro da teoria geral do delito, essa só pode ser praticada pelo homem, que é o único ser dotado da capacidade de vontade.

Terminologia: agente (art. 14, II, CP), condenado (art. 34, CP), réu (art. 44, II), indiciado (art. 5º,§1º, CPP), acusado (art. 188, CPP) e querelado (art. 51, CPP).

Sujeito Passivo: é o titular do bem jurídico atingido pela conduta criminosa.

Podem ser:

O ser humano. Ex.: crimes contra a pessoa

O Estado. Ex.: crimes contra a Administração Pública, contra a

Incolumidade Pública, contra a fé pública...

A coletividade. Ex.: crimes contra a saúde pública

Pessoa Jurídica. Ex.: crimes contra o patrimônio

A omissão e suas formas:

Fundamento da omissão: o desvalor da omissão, isto é, quando o agente não faz o que pode e deve fazer, que lhe é juridicamente ordenado. Assim, o crime omissivo consiste sempre na omissão de uma determinada ação que o sujeito tinha obrigação de realizar e que podia fazê-lo.

Classificação:

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a) Próprio ou puro

b) Impróprio, impuro ou comissivo por omissão

a) Os crimes omissivos próprios ou puros são crimes de mera conduta, isto é, não é necessário um resultado, basta a realização do verbo nuclear do tipo e necessariamente são previstos em tipos penais específicos (legalidade).Consistem numa desobediência a uma norma mandamental, norma esta que determina a prática de uma conduta, que não é realizada. Ocorre a omissão de um dever de agir imposto normativamente.Para a consumação basta o não agir, a desobediência ao dever de agir para que o delito se consume.O resultado produzido é irrelevante.

Exemplo: art. 135, 244, 269, 168-A, 359-F, 304 da Lei 9503/97

b) Crimes omissivos impróprios ou comissivos por omissão: o dever de agir existe para evitar um resultado concreto, o agente deve agir com uma finalidade específica. Embora a omissão não cause nenhum tipo de resultado no mundo concreto, sua não-realização sujeita o agente ao tipo penal comissivo correspondente ao resultado que poderia ter sido evitado, como se ele tivesse causado esse resultado.

O código Penal no art. 13 § 2º dispõe os requisitos do crime omissivo impróprio:

Possibilidade de agir: é necessário que o sujeito tenha possibilidade física de agir, ainda que com risco pessoal (inexistente na coação física irresistível)

Dever de agir:o Obrigação Legal: dever de cuidado, proteção ou vigilância: é por

exemplo o dever de assistência que se devem mutuamente os cônjuges, os pais aos filhos, os filhos aos pais...No caso da obrigação de vigilância ou cuidado, como por exemplo o caso do policial, do médico, do bombeiro, etc.

o De outra forma, assumir a responsabilidade de impedir o resultado: também chamada de contratual ou quase-contratual- o sentido é de que o sujeito tenha assumido voluntariamente a posição de garantidor. Essa posição pode ser inclusive transitória, pode ser até por período de horas, por exemplo, é o exemplo clássico da vizinha, ou da amiga que cuida da criança por algumas horas no parque, no momento em que “assume” o papel de garantidora pode ser responsabilizada como tal.

o Aquele que com um comportamento anterior, criar o risco da ocorrência de um resultado: nesse caso, o agente, com sua conduta, agrava um processo já existente ou então com uma atividade anterior coloca em andamento um processo de risco. Não se avalia o dolo ou a culpa da conduta e em virtude desse comportamento anterior surge a ele a obrigação de impedir que essa situação de perigo evolua para uma situação de dano efetivo, ocorrendo a lesão ao bem jurídico.

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O Resultado:

Em relação ao resultado, também podemos classificá-lo conforme duas teorias que entendem depender a existência do crime conforme a ocorrência ou não de um resultado.

TEORIA NATURALÍSTICA: o resultado significa uma modificação no mundo exterior conforme a ocorrência de uma ação ou omissão.Para essa teoria só há crime sem resultado nos crimes de mera conduta.

TEORIA JURÍDICA: o resultado é uma lesão ou ameaça de lesão ao bem jurídico protegido pelo direito penal. Assim, para essa teoria, não há crime senão houver afetação a um bem jurídico penalmente tutelado.

Classificação

a) Resultado Típico:

Naturalístico: é toda modificação causada no mundo exterior e gera uma classificação dos crimes em:

Materiais: nos crimes materiais ou de resultado é necessário a produção de um resultado efetivo, exigido pelo tipo. Ex: homicídio

Formais: nos crimes formais a consumação ocorre apenas com a prática da conduta. Basta a ação e o exaurimento, independem do resultado. Ex: falsa identidade art. 307; art.157, 158

Crimes de mera conduta: o tipo penal não menciona nenhum resultado, apenas descreve condutas, independentemente de modificação no mundo exterior. Exemplos: art. 135, omissão de socorro, violação de domicílio, art. 150

Jurídico: são aqueles que provocam uma lesão concreta ou potencial ao bem jurídico protegido e geram uma classificação dos crimes em:

Crimes de dano: a consumação depende de uma lesão efetiva ao bem jurídico protegido. Exemplo: art. 121, art. 155, do CP

Crimes de perigo: só o risco do perigo ao bem jurídico já consuma o crime.

Perigo concreto: se o risco é presumido de forma relativa.

Perigo abstrato: se o risco é presumido de forma absoluta.

b) Sub- típico: é todo resultado que, verificado após a consumação do tipo penal básico acarreta uma exasperação da pena a título de qualificação ou majoração. Pode ser:

Crimes preterdolosos: ocorre quando o resultado típico é doloso e o sub-típico é culposo. Exemplo: lesão corporal seguida de morte

Crimes qualificados pelo resultado: o resultado típico é doloso, sendo que o subtípico pode ser doloso ou culposo. Exemplo: art. 157§3º, 121,§2º

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