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AS FOLHAS DO OUTONO
As folhas, alaranjadas e dobradiças nas pontas, de outono caem dos galhos secos e
finos das árvores; algumas vão embora com o vento, dançando graciosamente pelo ar,
enquanto outras formam um montante sobre a terra úmida.
É desse jeito que começo a velar a minha história. É dessa forma que a interpreto. As
folhas pertencem às lembranças do passado as quais foram guardadas todos esses anos,
em minha mente, enclausuradas. Àquelas que dançam com o vento são as que vão
embora de mim, como se fossem se apagando lentamente com as águas do mar; elas não
pertencem mais a mim. Nunca. As outras, as folhas do montante, são as que me restam.
Olho para as minhas mãos enrugadas, as veias aparecendo assim como os ossos, e
lembro-me de anos atrás. Lembro não só das mãos, mas dos dias mais viris, mais claros
e reluzentes. Dos sonhos que nunca desisti, embora pensasse em abandoná-los, algumas
vezes. Das promessas de ser eterno. Das aventuras juvenis. Naquele tempo, remoto, eu
posso dizer, talvez eu fosse infinito. Mas, de verdade, o que é ser infinito?
É difícil dizer. A cada novo dia, a cada raio resplandecente do sol de uma nova
manhã, o meu conceito mudava. Meus planos eram outros, alguns tomavam um rumo
consciente. Mas quem eu quero enganar? Eu tinha sonhos, no entanto, poucos deles
foram totalmente realizados. Concretizados. E, hoje, eles não fazem mais parte de mim.
Fazem parte de um passado do qual vivi. Do qual lembrei. Do qual sinto saudades.
Para sempre.
Creio que, embora devido a minha idade avançada, eu posso ser infinito. Isso
depende apenas de mim. Apenas do ser humano. Pois, como dito em certo livro, temos
que acreditar em nós mesmo. Temos de acreditar que momentos, alguns deles – é claro
– serão eternos, não no dia-a-dia, mas, sim, em lembranças fragmentadas. E essas
lembranças fragmentadas não irão se apagar, pois iremos sentir, ao lembrar, o aperto no
coração. Ora, nós somos apenas espectadores de nossas vidas! Ela passa diante de
nossos olhos, e não podemos fazer nada para pausar determinados momentos.
Quando se lembrar de memórias assim, recorde das folhas do outono, pois elas são
iguais a você. As lembranças podem ir embora com o tempo, mas saberás que ela esteve
ali, na sua mente, durante um longo tempo, assim como as folhas, que dançam no ar e
deixam sua marca, enquanto outras, ao cair no chão, deixam também uma marca.
Cravo e canela.
Esse é o gosto da lembrança que sinto.
Eu quero ser infinito.
E serei.
Sempre.