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AS DONAS DA HISTÓRIA
Capítulo 2.
Novela de Renan Fernandes.
Escrita por Renan Fernandes.
Personagens deste capítulo:
Cláudia Antônio André Sônia Sérvia Malu
Porteiro Fabiano Jaqueline Humberto
Lucas
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002 CENA 1. CURITIBA. BALADA BOX. MESA DE CAMAROTE. INT. NOITE. Continuação imediata da última cena do capítulo anterior. Antônio se encontra em uma saia-justa. Pois Cláudia, uma de suas amantes,
está o ligando para revelar que já sabe de todas as suas mentiras, enquanto
Malu, a sua outra namorada, encontra-se ao seu lado.
MALU — (impaciente) Diga Antônio! Quem é que
ta gritando com você no celular?!
Logo, este desliga o celular e deixa Malu intrigada.
MALU — Ué? Desligou por quê?!
ANTÔNIO — Eu vou dar um recall lá na parte de fora.
Aqui ta muito ruim de ouvir. Não entendi
quase nada do que a mulher tava falando/
MALU — (desconfiada) Nossa, mas se até eu
consegui ouvir os gritos histéricos dessa
tal... (direta) Afinal de contas, quem era?!
ANTÔNIO — (mentindo) Era da clínica. Acredita você
que o residente noturno faltou e deixou
pendente uma série de exames agendados?!
E aí, não sei como, uma paciente veio ligar
pra mim e reclamar... Mas é isso que me
deixa indignado, sabe? A irresponsabilidade
desses novatos.
MALU — Que coisa mais chata!
ANTÔNIO — Você só espera um minuto, viu? Eu já
venho.
MALU — (frustrada) Tudo bem!
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
Assim sendo, Antônio sai do local, passa no meio da multidão e deixa Malu
sozinha, que toma um gole de caipirinha de vodka.
CENA 2. BALADA BOX. PARTE EXTERNA. NOITE.
Já lá, Antônio se pendura numa grade, disca o número novamente e observa
as pessoas ao seu redor, antes de conversar com Cláudia.
CENA 3. CASA DE ANDRÉ. SALA. INT. NOITE.
Atenção edição: Alternar esta cena com a anterior.
O celular toca e Cláudia atende novamente, sob os olhares de André.
CLÁUDIA — (T) (provocando) Fugindo da esposa, né?
ANTÔNIO — (T) (enfurecido) Você enlouqueceu
garota?!
CLÁUDIA — (T) (direta) Escuta aqui... Tudo o que eu
tinha pra dizer eu já disse. Agora, eu quero
escutar da sua boca toda a verdade. Não
adianta mais me enganar, Antônio. Cega eu
posso até ter sido, mas otária, isso nunca!
ANTÔNIO — (T) Mas que verdade, minha cara?! Que
loucura é essa, Cláudia? Desde quando eu fiz
todas essas sacanagens contigo?! Pelo amor
de Deus... Você tem provas?!
CLÁUDIA — (T) (indignada) O quê?! Se eu tenho
provas? Flagrar você andando de carro com
uma outra mulher é o quê? Intuição?! Virei
sensitiva agora/
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
ANTÔNIO — (T) Cláudia... Ficar me crucificando aqui,
no celular, não vai nos levar pra lugar algum!
Por isso, vamos conversar pessoalmente. E aí
você me explica direito todas essas
acusações... Todas essas barbaridades.
CLÁUDIA — (T) Sendo assim... Se encontre na minha
casa hoje, às 22h30.
ANTÔNIO — (T) (intrigado) Na sua casa? E nesse
horário?!
CLÁUDIA — (T) Sim, por que não? Por acaso você ta
com medo da força da natureza que é a
minha mãe? Não se acanhe, não... Talvez ela
nem esteja lá em casa. Nesse horário ela
sempre sai com os namorados/
ANTÔNIO — (T) Tudo bem... Já que eu não tenho
outra alternativa/
CLÁUDIA — (T) (rancorosa) Exatamente, Antônio!
Não tem outra solução. Afinal de contas, a
gente tinha marcado de se encontrar lá no
bar do museu... Lembra?!
ANTÔNIO — (T) Cláudia, eu... Eu posso explicar a
minha ausência no nosso encontro/
CLÁUDIA — (T) (estúpida) Não tem que explicar
nada! É só vir na minha casa e pronto!
Ela desliga o celular abruptamente, deixando Antônio surpreendido.
ANTÔNIO — (p/si) Caramba! Será que ela descobriu
mesmo sobre a Sônia? E agora meu Deus?!
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
De repente, Malu aparece por lá e o faz levar um susto.
MALU — Assustado, meu amor? O que foi?
Conseguiu retornar a ligação pra paciente?!
ANTÔNIO — Ah, claro... Consegui... Consegui sim! Mas
o que eu previa de pior aconteceu!
(inventando desculpa) Não tem nenhum
responsável de gabarito lá na clínica nesse
horário, e eu vou ter que reparar os erros
dos outros. Vê se pode?!
MALU — (triste) Poxa... Mas o caso dessa mulher
é tão urgente assim?
ANTÔNIO — Você ouviu os gritos dela, né? E não era à
toa. Ela tem convênio na clínica já há algum
tempo, e precisa fazer sessão de cirurgia
pra corrigir a face.
MALU — (sensibilizada) Coitada...
Antônio coloca as suas mãos sobre o rosto dela, acariciando-a.
ANTÔNIO — Não fique assim, Malu. Eu vou embora,
mas nós vamos marcar muita coisa boa ainda.
Vamos nos divertir, nos amar... Fazer tudo o
que tiver ao nosso alcance, pra nossa
felicidade ser concretizada.
MALU — (sorrindo levemente) Que homem mais
apaixonado, meu Deus...
Os dois acham graça e se abraçam, beijando-se em seguida. Assim sendo,
Antônio se despede dela e some do cenário. Enquanto Malu continua lá,
frustrada.
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
CENA 4. CASA DE ANDRÉ. INT. NOITE.
Cláudia devolve o celular para André, que vibra pela atitude da mesma.
ANDRÉ — É assim que tem que ser mesmo, Cláudia!
Você está de parabéns! Esses caras pensam
que são o quê, né? Acham que podem
enganar a vida inteira as outras e ficarem
na maior tranqüilidade de consciência?!
CLÁUDIA — É querido... É clichê falar isso. Mas
comigo não se brinca!
ANDRÉ — E tens dito!
Logo, os dois se levantam do sofá, direcionando-se para a porta de saída.
CLÁUDIA — Então eu já to indo. Muito obrigada, viu
André? Que amigo maravilhoso que eu
tenho, né? Sempre tão prestativo... Tão leal.
ANDRÉ — É um dos meus méritos... E um dos meus
defeitos também. Porque ser leal e sincero é
algo raro nos dias atuais. E ao extremo,
então? É uma aberração da natureza!
Os dois riem descontraídos e dão um abraço de despedida.
ANDRÉ — Boa sorte, viu?
Antes de fechar a porta pela parte de fora, Cláudia diz.
CLÁUDIA — Eu vou precisar mesmo!
Por fim, ela fecha a porta e André senta no sofá, ficando pensativo. De
repente, o seu celular toca novamente.
ANDRÉ — Ué? Será que é aquele Antônio de novo?!
(vê que não é e atende) (T) (animado): -
Fabiano, meu amigão, e aí? (T) Sei...
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
... Marcar uma “baladinha”, justo hoje?! (T)
Bom... Eu to sem fazer nada aqui em casa
mesmo... (T) Então faz o seguinte... Vem
aqui em casa, que aí você já vai me
encontrar arrumado. Os ônibus estão no
horário normal mesmo, não vai demorar
quase nada. (T) Trazer mais alguém pra cá?
Pode trazer sim! Vamos sair em trio que é
mais seguro. (T) Eu já conheço a pessoa?
Mas quem é? (T) Ah, você ta brincando que
é ele. Jura? (T) Caramba! Que coincidência,
né? Bacana isso... (T) Então está certo! Pode
vir junto com o Lucas... O nosso amigo em
comum!
Nisso, André desliga o celular e diz.
ANDRÉ — (p/si) Mas que mundo pequeno é esse?!
CENA 5. CASA DE JAQUELINE. SALA. INT. NOITE.
Cláudia vai até a entrada da casa, que fica atrás do brechó. Logo, acaba se
deparando com Jaqueline, que está vestida para sair.
JAQUELINE — Que demora foi essa, hein Cláudia?!
Francamente... Araucária é tão longe assim
pra você ter saído daqui às 16h00 e voltado
só agora, às 21h45?
CLÁUDIA — Ah, mãe, me perdoe, vai... Eu acabei
batendo papo com o Lucas, e aí eu quase fui
atropelada quando voltei pra cá/
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
JAQUELINE — Como? O que é isso? Atropelada em qual
rua e por quem?!
CLÁUDIA — Calma, dona Jaqueline, já ta tudo bem!
Foi um quase atropelo, entende? E a culpa
foi minha que não vi o motoqueiro cruzar a
rua movimentada.
JAQUELINE — Que perigo, hein minha filha? Ainda bem
que não aconteceu nada... Ainda bem mesmo,
viu? Imagina? Perder você. Eu fico louca!
Cláudia ri e a abraça. Mas logo se solta.
CLÁUDIA — Nossa, desculpa. Quase amassei a tua
roupa. E falando nisso, quanto estilo hein?
JAQUELINE — (animada) Ai, você acha? Pois é, mas até
que eu to sendo bem discreta nesse vestido
violeta, não é mesmo? Não quero ser
confundida com uma prostituta da rua XV...
Ou então uma cafetina, que é da minha faixa
etária! Mas Jesus amado que me abençoe
pra deixar bem longe dessas ordinárias!
Cláudia acha graça.
CLÁUDIA — Vai se encontrar com quem?
JAQUELINE — Vou num restaurante, ali no Batel.
CLÁUDIA — Eu perguntei com quem... Não em qual
lugar!
JAQUELINE — Um novo encontro casual... De internet.
CLÁUDIA — (preocupada) Olha lá, hein, toma cuidado!
Eu to te avisando pro seu bem.
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
JAQUELINE — Fique tranqüila. Eu sei me cuidar!
(despedindo-se com gesto) Beijo!
Cláudia responde com o mesmo gesto de mão, enquanto vê a sua mãe ir
embora, toda eufórica. Logo, ao virar-se para o espelho de frente à sua
vista, Cláudia muda o semblante, ficando séria.
CLÁUDIA — (p/si) Agora é comigo. E o Antônio vai ter
que revelar tudo... Nem que pra isso... Eu
tenha que fazê-lo cair em contradição.
Som de suspense no final da cena, focalizando a expressão raivosa dela.
CENA 6. RUAS MOVIMENTADAS DE CURITIBA. EXT. NOITE.
Em uma cena ágil, sem diálogos, CAM mostra, em vista aérea, o momento em
que Antônio se aproxima de um enorme congestionamento, na entrada de um
importante viaduto da cidade. Logo, CAM se direciona para o interior do
veículo, focalizando Antônio verificando o horário no relógio e buzinando o
carro diversas vezes. CLOSE em sua expressão angustiada.
CENA 7. MANSÃO DE ANTÔNIO. ESCRITÓRIO. INT. NOITE.
Sônia encontra-se no local, mexendo no seu notebook e verificando o
material do best-seller que ela está traduzindo. CAM focaliza a
desorganização da escrivaninha, repleta de livros, papéis imprimidos e uma
xícara de café, tudo em volta dela e do PC. De repente, o telefone, que se
encontra na sala, começa a tocar. E Sônia é obrigada a se levantar da
cadeira para atender a ligação.
CENA 8. MANSÃO DE ANTÔNIO. SALA. INT. NOITE.
Sônia corre rapidamente até a sala e atende o telefone portátil.
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
SÔNIA — (T) Alô?!
CENA 9. CLÍNICA ARCÁDIA. SALA DE HUMBERTO. INT. NOITE.
Atenção edição: Alternar esta cena com a anterior.
HUMBERTO — (T) Sônia?! Sou eu, o Humberto!
SÔNIA — (T) Ah, o seu Humberto... O dono da
clínica?
HUMBERTO — (T) Isso! A senhora me desculpe por ligar
nesse horário, mas é que eu to procurando o
Antônio. Ele está aí?
SÔNIA — (surpresa) (T) Aqui?! Não... Não está! Ele
me disse que ia ficar aí na clínica até altas
horas da noite/
HUMBERTO — (T) Tem certeza que ele disse isso?
Porque eu cheguei aqui no horário que vocês
tinham acabado de sair e o Antônio não
voltou até agora!
Música de suspense. Ao ouvir a última frase de Humberto, Sônia tira o
telefone do ouvido e coloca no outro, demonstrando estar chocada.
SÔNIA — (T) Então ele não ta aí mesmo? Você
procurou direito?!
HUMBERTO — (T) Procurei... Perguntei aos funcionários,
pras secretárias, e nada! O Antônio sumiu!
Estarrecida, Sônia tira o telefone novamente do ouvido, anda pela casa e se
indaga.
SÔNIA — (p/si) Será que o Antônio mentiu pra mim? Ou
pior: será que eu to sendo feita de idiota?!
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
Som de tensão no final da cena. Corta para...
CENA 10. QUADRA DA CASA DE ANDRÉ. EXT. DIA.
Lucas e Fabiano chegam até a frente da casa dele.
FABIANO — O portão ta trancado! Vou dar uma
discada pro André saber que a gente já
chegou.
LUCAS — Tudo certo. (irônico) Até ele descobrir
que a gente não é assaltante, lá se vai 45
minutos...
FABIANO — (ri) O André é bem medroso mesmo.
Morre de medo de ladrão. De qualquer coisa
que faça barulho na calada da noite.
De repente, CAM focaliza André, de vista externa, vendo-os pela janela.
FABIANO — (vendo-o) Pronto, já viu a gente.
Fabiano olha sorrindo para Lucas, que retribui. Logo, André abre a porta,
aproxima-se do portão e os encara.
ANDRÉ — Nossa, né? Que destino é esse? Como a
gente podia imaginar, Fabiano, que o Lucas
era o nosso amigo em comum?
FABIANO — Verdade. Tudo isso é obra do destino.
Porque eu conheci o Lucas bem pequeno,
ainda lá em Guaíra, enquanto você o
conheceu há 3 anos, numa balada, não é
mesmo?
LUCAS — (sarcástico) Nossa mesmo! ...
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
... Vejam só como vocês sabem mais do que
eu da minha própria vida. Daqui a pouco
vocês já podem fazer um dossiê completo de
mim.
Todos riem, no mesmo instante que André abre o portão e faz gesto para
ambos entrarem. Enquanto os 3 entram na casa, CAM focaliza, do outro
lado, a chegada do carro de Antônio. Pois a casa de Cláudia fica há apenas 1
quadra e meia da de André. Assim sendo, Antônio estaciona o veículo na
porta do brechó, desce do carro e aperta a campainha. Não passando nem 4
segundos, Cláudia abre a porta com tudo, surpreendendo-o com o gesto
estúpido.
CLÁUDIA — 15 minutos atrasado! E como tempo é
precioso demais pra ser desperdiçado...
Você tem menos esses minutos pra me
explicar toda a sua cachorrada! Então...
Pode começar!
Clima tenso. Antônio a encara com semblante de espanto, enquanto ela se
mostra decidida, numa coragem jamais vista.
PRIMEIRO BREAK.
Tema de abertura: UNDER PRESSURE-QUEEN.
CENA 11. CASA DE JAQUELINE. SALA. INT. NOITE.
Continuação imediata da última cena do bloco anterior.
Antônio senta no sofá, enquanto Cláudia fica de pé e de costas, olhando-o
pelo reflexo do espelho.
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
ANTÔNIO — (sem jeito) Cláudia... Eu... Eu preciso
saber com mais detalhes dessas acusações
ilógicas que você me fez no celular/
CLÁUDIA — (virando-se/indignada) Chega de me
fazer de trouxa, Antônio! O que é isso?
Você acha que eu sou secretária eletrônica
pra ficar repassando tudo o que já está
evidente?!
ANTÔNIO — Eu só quero uma explicação mais
coerente! Porque são acusações muito
graves. (cínico) Dizer que eu sou casado, e
que me flagrou de carro com a minha
mulher/
CLÁUDIA — E flagrei mesmo, Na hora do rush! Não
lembra aonde você tava nesse horário?
Então deixe que eu refresco a sua memória,
já que você anda tão relapso... No sinaleiro
da praça Carlos Gomes! O seu carro tava na
frente de uma fila enorme de veículos. Eu
avistei você de longe, há 1 quadra do local. E
fiquei impressionada com a maneira que você
e a sua mulher gesticulavam um com o outro.
Música de suspense. De repente, Antônio se lembra do momento que estava
voltando para casa, e passou no Centro, acompanhado de Sônia. Voltando ao
presente, ele se levanta do sofá, aproxima-se de Cláudia e faz gesto de
desentendido.
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
ANTÔNIO — Então foi isso... (alívio) Como um mal-
entendido pode queimar o filme de qualquer
pessoa, né? É incrível.
CLÁUDIA — (intrigada) O que você ta dizendo?
ANTÔNIO — (descarado) Você me viu acompanhado da
minha prima do Norte... Era ela que tava
comigo no carro!
CLÁUDIA — (surpresa/querendo acreditar) Prima?!
Isso é verdade?!
ANTÔNIO — Pelo amor de Deus, Cláudia! Que juízo
mais deturpado que você faz de mim!
(virando o jogo) Eu não merecia isso! É claro
que era a minha prima! Ela veio só pra fazer
uma consulta lá clínica. Eu abri uma brecha
pra ela, por ser parente, porque a coitada
teve que refazer os pontos mal-colocados
de uma cirurgia na barriga, que quase
estourou.
CLÁUDIA — (iludida) Nossa... Então era isso! Como
que pode... Caramba... Eu realmente ando
muito neurótica.
Aproveitando-se da situação, Antônio fica próximo a ela, e começa a
acariciá-la na face.
ANTÔNIO — Viu só? Não adianta a gente tirar
conclusões precipitadas das coisas... Além
do que, foi por esse motivo que eu não pude
aparecer naquele nosso encontro...
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
... No bar do museu! Não tinha nem como
deixar pra depois esse caso da minha prima.
Era caso grave mesmo!
CLÁUDIA — E deu tudo certo?!
ANTÔNIO — Deu... Graças a Deus! Aí eu dei uma
carona pra ela até a rodoviária, e me senti
como se tivesse cumprido uma missão, sabe?
Uma missão altruísta... Um gesto de
caridade.
CLÁUDIA — Bacana Antônio... Só que tem mais um
detalhe que ficou em aberto...
ANTÔNIO — O quê?!
CLÁUDIA — O apart que você me apresentou, dizendo
que morava. Não foi bem o que o porteiro
disse. Ele afirmou, sem medo de errar, que
você apenas aluga aquele recinto. E então,
por que você escondeu isso de mim?
Clima tenso. Antônio fica novamente em uma saia-justa, enquanto Cláudia
cruza os braços e o encara, à espera de uma resposta convincente.
CENA 12. CASA DE ANDRÉ. PORTÃO. EXT. NOITE.
Após esperarem um tempo para conversar, André, Lucas e Fabiano se
preparam para sair.
ANDRÉ — (abrindo o portão) Eu to ainda mais
surpreso com essas coincidências... Até a
Cláudia você já conhecia Lucas?!
Os três vão para a rua, enquanto André fecha o portão.
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
LUCAS — Sim... E como conheço! É a minha
amigona... E quase sócia (risos)
Eles acham graça.
FABIANO — Então a gente pode esperar ela pra sair,
né? (p/André) Ela ta em casa?!
ANDRÉ — (sem-jeito) É... Está sim. Só que ela ta
resolvendo um assunto importante com uma
pessoa/
LUCAS — (curioso) Pessoa?! Mas quem? Alguma
amiga?
ANDRÉ — Não... Pessoal, desculpa. Mas é um
assunto delicado. Eu não quero ficar
expondo a privacidade dela.
LUCAS — (desconfiado) Tudo certo. (muda de
assunto) Então nem adianta esperar...
Vamos aproveitar que ainda ta cedo e
mostrar o convite da balada, pra não
precisar pagar/
FABIANO — Exatamente. Porque o resto do dinheiro
nós vamos gastar nos “goles”.
Descontraídos, eles se direcionam para frente, quando Lucas estranha o
carrão que está estacionado na frente do Brechó de Cláudia.
LUCAS — (p/André) Escuta... Por acaso a pessoa
que ta conversando com a Cláudia é o dono
daquele carrão?
ANDRÉ — Acho que é. É que eu não conheço o
namorado dela pessoalmente/
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
Música de suspense. Lucas fica surpreso e Fabiano percebe que o mesmo
ama Cláudia, ficando triste.
LUCAS — Namorado?! A Cláudia ta com alguém?!
(desiludido) Mas ela nunca me contou nada.
ANDRÉ — (arrependido) Bendita boca! Agora que
eu falei... É isso mesmo, Lucas. A Cláudia ta
namorando. E é um cara mais velho, pelo que
eu ouvi falar.
Decepcionado, Lucas se vira de frente ao carro, observando-o.
LUCAS — (resmungando) Mais velho... Eu não posso
acreditar...
Logo, André e Fabiano, que se encontram mais afastados, percebem que
Lucas ficou incomodado com a notícia, e se olham, preocupados.
CENA 13. CASA DE JAQUELINE. SALA. INT. NOITE.
Antônio explica a história do apart alugado para Cláudia.
ANTÔNIO — Essa história de que eu alugo o apart é
um absurdo! Esse porteiro não sabe o que
diz/
CLÁUDIA — Como que não sabe? Se ele supervisiona
todo aquele prédio.
ANTÔNIO — (cínico) Eu moro lá!
CLÁUDIA — (confusa) Mas então porque ele me
falaria aquilo? Com que pretensão, Antônio?!
De repente, Antônio continua o seu teatro, tirando uma desculpa do arco da
velha.
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
ANTÔNIO — Ah, só pode ter sido isso... (rindo) Mais
um festival de histórias mal-contadas...
CLÁUDIA — (desconfiada) O que é? Essa história do
apart foi mal-entendido também?!
ANTÔNIO — Foi sim! Sabe por quê? Pelo simples fato
de que o meu vizinho se chama Aramis
Meirelles. Veja só... O mesmo sobrenome.
Mais uma coincidência desse destino irônico.
Convencida, Cláudia senta-se no sofá e ri aliviada.
CLÁUDIA — Então quer dizer que o porteiro te
confundiu com o seu vizinho?! (rindo) Mas
você tem como me provar isso, né?
ANTÔNIO — Claro que tenho! É só você vir comigo até
lá. E aí eu dou uma prensa naquele porteiro
desligado, pra ele te explicar direitinho
todo esse equívoco.
CLÁUDIA — Está certo! Mas vamos logo, porque eu to
com pressa.
ANTÔNIO — Você que manda!
Assim sendo, eles se direcionam para a saída da casa.
CENA 14. QUADRA DA CASA DE ANDRÉ. EXT. NOITE.
Lucas, André e Fabiano ainda se encontram no local.
FABIANO — (impaciente) Ô Lucas, pelo amor de Deus,
né? Porque você vai ficar aí, esperando?
Tudo isso é só pra saber quem é o tal
namorado da Cláudia?
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
LUCAS — (virando-se a ele) É! Eu quero saber de
quem se trata.
FABIANO — Mas por que isso?
LUCAS — É muito simples... Porque eu amo ela!
De repente, começa a tocar uma música triste, focalizando a tristeza
contida de Fabiano.
ANDRÉ — Eu não quero te iludir, Lucas. Mas a
Cláudia, apesar de todas as decepções que
sofreu, é muito apaixonada por esse cara.
LUCAS — Eu não entendo. O que ela vê nesses
homens mais velhos? Será que a paixão é tão
cega assim?
FABIANO — Talvez a paixão seja mal-compreendida.
Ainda mais por quem é fixado por uma
pessoa, e não enxerga o resto do mundo/
LUCAS — Isso é uma indireta?!
FABIANO — (seco) Entenda como quiser!
Logo, Lucas corta o clima tenso, virando-se novamente de frente ao carro, e
observando-o como um lunático.
FABIANO — (impaciente) Escuta... Eu e o André já
estamos indo pra balada. A gente não quer
pagar o ingresso. E daqui a pouco o horário
free vai acabar.
LUCAS — Me encontrem depois lá/
FABIANO — Não vai adiantar nada você ficar aí, de
prontidão!
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
LUCAS — Eu só quero observar! Eu não vou puxar
papo com o cara, ou então, partir pra cima
dele. Eu só quero saber de quem se trata.
Impacientes, Fabiano e André se olham um para o outro, enquanto CAM
focaliza, mais para a frente, os pés de Cláudia e Antônio, saindo do brechó.
Música de suspense. Estarrecido, Lucas vai andando passos lentos,
direcionando-se a eles, até que decide parar no meio do caminho. Cláudia e
Antônio não o vêem. Apenas entram no carro, que acelera. De repente, Lucas
vira-se em direção aos seus amigos, não tendo palavras para expressar
tamanha surpresa.
ANDRÉ — O que foi, Lucas? Que cara é essa?
LUCAS — (balbuciando) Aquele senhor que tava
acompanhando a Cláudia... Eu conheço ele/
FABIANO — (curioso) Conhece? E quem é?
LUCAS — (espantado) É o meu pai! O Antônio/
ANDRÉ — Antônio Meirelles. Isso! É esse o nome do
namorado dela.
Assim sendo, Lucas coloca as suas mãos sobre o rosto, quase chorando de
raiva.
LUCAS — Aquele filho da mãe! Como que pode? Até
nisso ele me prejudicou!
FABIANO — O que você ta dizendo?
LUCAS — (gritando) Eu odeio... Odeio esse traidor!
Pra mim ele nunca foi pai... Sempre foi um
reles... Um nada!
Clima tenso. André e Fabiano olham para Lucas, num misto de espanto com
preocupação.
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
CENA 15. APART DE ANTÔNIO. PORTARIA. INT. NOITE.
Antônio e Cláudia já se encontram conversando com o porteiro.
PORTEIRO — É... (olhando para Antônio) É
exatamente o que o seu Antônio disse. Eu
acabei fazendo uma troca de nomes e gerei
essa situação desconfortável. Vocês me
desculpem.
ANTÔNIO — Não, o que é isso! Não precisa se
desculpar. Essas coisas acontecem, não é
mesmo? (vira-se para Cláudia).
CLÁUDIA — Verdade. Às vezes tudo parece tão óbvio.
Que a gente acaba sendo injusto.
(aproximando-se de Antônio) Desculpa,
Tony! Veja só as barbaridades que eu te
falei.
ANTÔNIO — (dissimulado) Eu sempre procuro ser
claro, objetivo... E calmo, pra evitar
discussões sem sentido algum.
Sorrindo, Cláudia o abraça, enquanto Antônio e o porteiro se olham,
cúmplices.
CENA 16. APART DE ANTÔNIO. SALA. INT. NOITE.
Agora, os dois já se encontram sentados no chão, sob duas almofadas em
volta de uma mesinha.
CLÁUDIA — Pra reparar todas essas bobagens, nada
melhor do que um brinde de vinho...
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
... Pra comemorar o fim bem-sucedido de
uma briga de casal.
ANTÔNIO — (levantando-se/indo para a cozinha)
Tem um aqui, que eu comprei hoje. Vinho do
porto. E tinto. Vou pegar pra gente se
esbaldar.
CLÁUDIA — Calma! Com moderação, né?
ANTÔNIO — No bom sentido, é claro.
Eles sorriem um para o outro e Antônio vai até a cozinha, que fica acoplada
à sala, sem porta que as separem. Nisso, CAM focaliza o momento que ele
pega o vinho, a abre com o abridor e coloca nas taças. Só que, de repente,
ele tira um sonífero de sua bolsa da calça, colocando algumas gotas na taça
de Cláudia e mexendo um pouco, para diluir. Assim sendo, ele guarda o
sonífero na bolsa, pega as taças e entrega o copo “batizado” à Cláudia, que
toma.
CLÁUDIA — Ta uma delícia.
ANTÔNIO — Eu sabia que você ia gostar. Comprei
especialmente pro seu gosto apurado!
Por fim, ela continua tomando, sentada. Enquanto ele, de pé, a observa com
um sorriso sarcástico, e ao mesmo tempo, maquiavélico.
CENA 17. APART DE ANTÔNIO. QUARTO. INT. NOITE.
Instantes depois, CAM focaliza o momento que a porta se abre,
internamente, de onde surge Antônio, carregando Cláudia no colo. Ela já
está no 15º sono. Logo, ele a projeta, delicadamente, para a sua cama, e
direciona-se para o criado-mudo, tirando uma cópia de chave. De repente,
ele joga a chave em cima da cama e vai embora, deixando-a sozinha.
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
CENA 18. APART DE ANTÔNIO. PORTARIA. INT. NOITE.
Antônio conversa com o porteiro, dando-lhe alguns avisos.
ANTÔNIO — Agora você já ta bem ciente do que deve
fazer, não é mesmo?
PORTEIRO — Estou sim, seu Antônio. Eu vou seguir as
suas instruções e nunca mais fazer você
ficar numa situação constrangedora como
essa/
ANTÔNIO — É melhor assim. (aproximando-
se/olhando ao redor) Como você sabe, eu
trago mais mulheres pra cá. Só que essa que
venho aqui te perguntar, a Cláudia, é um
casinho um pouco mais sério. Além do quê, a
Malu, a outra amante que também pensa que
eu sou solteiro, não pode, em hipótese
alguma, se deparar com a outra. Porque se
as duas acabam se topando, no mesmo local,
à espera do mesmo homem... Eu fico
literalmente lascado.
PORTEIRO — Pode ficar tranqüilo. Eu não vou permitir
que isso aconteça. Mas e agora? A menina
está lá, dopada, e vai acordar toda zonza,
completamente perdida e sozinha.
ANTÔNIO — Deixa ela lá. Eu só fiz isso pra fingir que
moro aqui. E aí, quando ela acordar amanhã,
vai ver a cópia da minha chave...
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
... E uma mensagem escrita: de que eu fui
trabalhar cedo e deixei as cópias pra ela/
CENA 19. APART DE ANTÔNIO. QUARTO. INT. NOITE.
CAM focaliza, em todos os ângulos, Cláudia dormindo de barriga para cima,
completamente debruçada, e a chave ao seu lado, com a mesma mensagem
que Antônio relatou na cena passada.
CENA 20. MANSÃO DE ANTÔNIO. SALA. INT. NOITE.
Antônio abre lentamente a porta, com o intuito de não fazer muito barulho.
De repente, ele fecha-a com cuidado, percebe que tudo está escuro e se
direciona para a escada. Sônia, que já estava na sala, liga o abajur, que se
encontra ao lado do sofá, assustando-o.
SÔNIA — (aproximando-se) Quanto trabalho, hein?
(irônica) Muito caso clínico grave ou muita
pelanca de mulher pra tirar?
ANTÔNIO — Eu nem imaginava que você ainda tivesse
acordada.
SÔNIA — E nem eu imaginava que você teria a
capacidade de inventar que foi trabalhar.
ANTÔNIO — (cínico) Mas eu fui trabalhar!
SÔNIA — Então como você me explica o fato do
Humberto me ligar e dizer que não te viu em
nenhum pedaço daquela clínica, hein?!
Clima tenso. Antônio fica chocado, enquanto Sônia aguarda a resposta,
apreensiva.
SEGUNDO BREAK.
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
CENA 21. MANSÃO DE ANTÔNIO. SALA. INT. NOITE.
Continuação imediata da última cena do bloco anterior.
ANTÔNIO — O Humberto enlouqueceu!
SÔNIA — Ah, enlouqueceu? Então nesse caso todos
nós somos birutas, já que você é sempre tão
correto, nunca dá uma “puladinha” de cerca/
ANTÔNIO — Pára com isso, Sônia! Eu estava
trabalhando, sim, no meu cantinho.
SÔNIA — E a sua justificativa é de que o Humberto
não te procurou direito, é isso?
ANTÔNIO — Mas claro!
SÔNIA — Olha só! Eu acho melhor nem continuar
essa conversa mentirosa. Porque eu já
percebi que você vai tirar os maiores
lugares-comuns pra tentar me enrolar. Só
que você esquece que eu sou ligeira, eu
percebo as coisas.
ANTÔNIO — O que você ta querendo insinuar agora?
SÔNIA — Nada! Ou será que eu deveria insinuar
alguma coisa?!
ANTÔNIO — Escuta aqui, Sônia! Não sei se você
percebe, mas eu estou cansando, exausto, e
to querendo tomar uma ducha pra relaxar e
ir direto pra minha cama. Eu to de saco
cheio! Eu não agüento mais! Parece que hoje
todo mundo me tirou pra Cristo.
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
SÔNIA — Quanto estresse por causa de uma
simples ligação. Imagina só se o Humberto
ligasse pra afirmar, com todas as letras, que
você faltou trabalho pra se encontrar com
alguma amante/
Clima tenso. Antônio fica enfurecido.
ANTÔNIO — Chega Sônia! Vamos acabar com isso
agora! Vai... Continua lá trabalhando...
Traduzindo sei lá o quê... E me deixe em paz!
Por favor!
SÔNIA — Vou sim. Aproveito pra virar essa
madrugada, focando em alguma coisa que
deleite.
ANTÔNIO — Isso... Ótima idéia. E aí você pára de ficar
supondo besteiras, criando conflitos de
namorico de adolescente. E também esquece
a sua vida profissional frustrada. Porque só
pode ter sido isso que te fez ficar tão
amarga.
De repente, Sônia se olha no chão, entristecida, enquanto Antônio a encara
com maldade nos olhos.
SÔNIA — Você não precisava tocar nesse assunto/
ANTÔNIO — E nem você precisava baixar o nível
comigo. Sendo que eu trabalhei
honestamente e não dei motivo algum pra
você desconfiar da minha lealdade.
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
Logo, ela volta a olhá-lo, aproximando-se ainda mais, e ficando frente a
frente.
SÔNIA — Eu não desconfiei da sua lealdade... Eu
somente nunca consegui acreditar nesse
nosso casamento arranjado. Status eu te dei
de acordo... Enquanto você me retribuiu com
essa sua demonstração sintética de homem
de família, apaixonado...
ANTÔNIO — (sensibilizado) Sônia.. As coisas não são
tão superficiais com a gente/
SÔNIA — (firme) O nosso casamento é um acordo
superficial! E somente existiu pra fazer
você se tornar um homem de respeito,
conceituado... Não é a toa que Antônio
ACCIOLY Meirelles te tornou o famoso
cirurgião plástico. Pena que nem isso você
reconhece.
Por fim, ela volta para o escritório, e Antônio fica um tempo parado,
pensativo, até que decide subir em direção ao seu quarto.
CENA 22. BALADA BOX. ENTRADA. INT. NOITE.
Lucas, Fabiano e André chegam até o local. A música pode ser ouvida com
intensidade do outro lado. Os três deixam os seus pertences no guarda-
volumes e já caem na pista. Só que, enquanto André e Fabiano dançam, Lucas
não consegue se divertir, e se direciona para as mesas. Nisso, Fabiano e
André o seguem, sentando os três em uma mesa próxima de Malu.
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
FABIANO — O que ta acontecendo, cara? Tudo isso é
por causa do seu pai?
LUCAS — Também! Eu to muito indignado com
aquela cena dele com a Cláudia. Aliás, eu to
muito de cara com ela também.
ANDRÉ — Lucas, a Cláudia ta iludida. Releve isso. E
eu também estranhei ver os dois saírem
juntos, depois de tudo o que ela tinha
descoberto dele/
LUCAS — (curioso) O que ela descobriu?
ANDRÉ — Uma longa história. Na verdade são
deduções.
LUCAS — Deduções de quê?
ANDRÉ — De que ele é casado, e mentiu pra ela que
era solteiro.
LUCAS — Então ele nunca deve ter contado do
passado dele pra ela.
ANDRÉ — Certamente que não.
LUCAS — Claro! Imagina se ele ia contar que foi
casado com a minha mãe, traiu ela com uma
prostituta e a abandonou com um filho de 4
anos. Nunca que ele ia contar essa
pilantragem.
ANDRÉ — (surpreso) Eu não acredito! Ele fez essa
monstruosidade com vocês?
LUCAS — Fez! Aquele desgraçado... Ele é um
monstro, cara! Ele engana, ele manipula...
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
... Graças a Deus que eu nunca tive essa
influência negativa. Serviu pra alguma coisa
ele ter se afastado da minha mãe e de mim.
FABIANO — (cortando) Desculpa, pessoal! Mas esses
assuntos deixam a gente muito pra baixo.
Não vale a pena comentar, justo agora, que a
gente veio se divertir.
LUCAS — Eu não queria estragar a noite de vocês.
Mas eu prefiro ficar aqui, no meu canto.
Vocês podem aproveitar, dançar, curtir à
vontade.
FABIANO — (indignado) Aproveitar o quê? Se essa
sua paixão aguda pela Cláudia te deixou um
bezerrão insuportável!
Revoltado, Fabiano se direciona para a fila de bebidas, enquanto André e
Lucas ficam surpresos com a atitude dele.
LUCAS — O que deu nele, André?
ANDRÉ — O Fabiano é meio esquentado mesmo.
Nem se estresse com isso.
LUCAS — (preocupado) É melhor você ir lá com ele.
Quando o cara bebe, ninguém agüenta.
ANDRÉ — Você tem razão. Fica sossegado aí.
André vai até Fabiano, sendo observado por Lucas. Nisso, Fabiano sai da fila
com 3 latas de cerveja e André o intercepta.
ANDRÉ — O que é isso, meu amigo? Precisa encher a
cara desse jeito?
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
FABIANO — É bom sair um pouco dessa rotina chata,
cheia de problemas, e se divertir.
ANDRÉ — Você só ta fazendo isso porque o Lucas
admitiu que ama a Cláudia, não é mesmo?
Logo, Fabiano entrega as duas latas para André, abre a sua e toma numa
golada só.
FABIANO — Se ele pelo menos enxergasse o que eu
sinto.
ANDRÉ — Ele enxerga! Só que põe uma coisa na sua
cabeça... O Lucas é hétero!
Triste, Fabiano observa o Lucas sentado, olhando ao redor, e retorna para
André, que o encara com pena. Enquanto isso, na mesa próxima de Lucas,
Malu encontra-se sozinha, pensativa e cabisbaixa.
MALU — (p/si) Acho melhor ir embora. A noite já
acabou há muito tempo mesmo.
De repente, quando se levanta pra sair, acaba se deparando com Gene, que
também veio para curtir.
GENE — (eufórico) Malu? Que ironia é essa?
MALU — Gene, tudo bem?
Os dois se cumprimentam com beijo no rosto.
GENE — Tudo ótimo. E então, ta acompanhada de
alguém?
MALU — Não, eu to sozinha. Eu já tava de saída.
GENE — (decepcionado) Ah, que pena.
Os dois ficam sem jeito, até que Gene arrisca.
GENE — Ta indo embora de carro?
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
MALU — Na verdade eu vou de táxi. Eu vim com
uma pessoa, mas ela foi embora mais cedo.
GENE — Entendi... Mas eu acho melhor você não
fazer isso. Porque agora já ta tarde. É meio
perigoso.
MALU — Tudo bem. Eu moro aqui perto mesmo, não
tem problema.
GENE — Sendo assim... Bem que você podia aceitar
uma carona minha.
MALU — (intrigada) Mas você não acabou de
chegar?
GENE — (inventando) Não, não... Eu já to aqui há
algum tempo. Eu tinha vindo num encontro
com um amigo. Mas ele pelo jeito me deu o
cano... No bom sentido da palavra.
MALU — (ri) Então ta certo... Eu aceito a sua
proposta.
GENE — (todo feliz) Que bom! Assim a gente
pode ir conversando no caminho.
MALU — Claro. Vai ser um prazer a sua companhia.
Assim sendo, CAM focaliza o semblante apaixonado de Gene, que coloca os
seus braços sobre o ombro de Malu. Os dois saem do local.
CENA 23. RUAS DE CURITIBA. EXT. NOITE.
Em uma cena sem diálogos, Malu e Gene vão passando pela cidade de carro e
conversam sobre vários assuntos. Cena mostra que Malu é a mais tagarela,
enquanto Gene apenas presta atenção nas coisas que ela fala.
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
CENA 24. MANSÃO DE SÉRVIA. EXT. NOITE.
Gene e Malu chegam até o local e ela se prepara para sair do carro.
MALU — Obrigada pela carona, viu?
GENE — Imagina. (malicioso) Quando você
precisar, eu sempre vou estar aqui.
MALU — (irônica) Ou na agência.
Os dois riem.
GENE — Exatamente.
Por fim, Malu fecha a porta do carro e se direciona para o portão. No
mesmo instante, Servia abre a janela da sala e observa Malu fazendo gesto
de tchau para Gene, estranhando.
SERVIA — (p/si) Mas o que é isso? A Malu sai com
um ordinário feito o Antônio e volta com um
outro homem mais jovem, bonito e
interessante? Pelo jeito as minhas preces
estão funcionando. Ah, meu Deus... Como
seria bom a Malu se afastar daquele
doutorzinho de merda!
CENA 25. MANSÃO DE ANTÔNIO. QUARTO. INT. NOITE.
Sônia abre a porta do local e observa Antônio dormindo. Logo, ela se lembra
da discussão que teve com ele, além da desculpa do Capítulo 1, no qual ele
inventou que uma moça do telemarketing tinha ligado, sendo que na verdade
era Cláudia que tinha feito a chamada.
SÔNIA — (p/si) Eu prefiro fingir que essas minhas
desconfianças são apenas neuroses...
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
... Mas é muito difícil acreditar que um
homem desses seja perfeito!
Logo, ela fica um tempo parada e vela o sono dele, até que decide se deitar
ao seu lado, apagando o abajur que está no criado-mudo.
CENA 26. TRANSIÇÃO DE TEMPO. NOITE. AMANHECER.
CURITIBA. VISTA GERAL DA CIDADE. EXT. DIA.
Apresentam-se os prédios do Centro, os bairros residenciais, os famosos
parques, até cortar para a fachada da balada BOX. De lá, saem Fabiano,
Lucas e André. O primeiro se encontra podre, todo bêbado, enquanto os
outros se mostram preocupados.
ANDRÉ — Fabiano... É melhor você ficar um tempo
lá em casa. Porque se a sua mãe te ver
assim, ela vai reclamar.
FABIANO — (soltando-se dele) Deixe que reclame!
Alguém se importa comigo por acaso?
LUCAS — Pára com isso, Fabiano. Acorda pra vida,
Já amanheceu. Já acabou a farra.
FABIANO — A farra acabou... Mas a decepção
continua.
Nisso, Lucas fica mexido com o que ele diz, enquanto Fabiano some pelas
ruas, completamente perturbado.
ANDRÉ — O Fabiano sempre faz essas coisas. Ele é
alcoólatra.
LUCAS — Mas o alcoólatra sempre é sincero, né?
(triste) Realmente, essa noite foi
decepcionante...
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
... Mas eu quero encarar de frente os meus
problemas. Quero resolver logo um assunto
pendente.
ANDRÉ — (curioso) O que você quer fazer?
LUCAS — Conversar com a Cláudia. E contar tudo
sobre o Antônio. Sem deixar escapar uma
sacanagem que ele fez.
CENA 27. APART DE ANTÔNIO. QUARTO. INT. DIA.
Cláudia acorda toda zonza e se surpreende em não ver ninguém no local.
Logo, ela senta em cima do chaveiro e o pega, vendo o que está escrito.
Surpresa, ela se indaga.
CLÁUDIA — (p/si) A chave ta aqui. Será que eu bebi
tanto que o Antônio achou melhor não me
acordar?
Corta para...
CENA 28. APART DE ANTÔNIO. PORTARIA. INT. DIA.
Cláudia já se encontra conversando com o porteiro.
CLÁUDIA — Então ele foi trabalhar mais cedo mesmo?
PORTEIRO — (cínico) Sim! E ele me mandou um recado
pra te passar. Que ele deixou essas chaves
pra você, porque tinha que ir abrir a clínica.
CLÁUDIA — Pois é! Ele escreveu o recado do lado do
chaveiro. Mas então ta certo. Muito
obrigado pelo recado e até logo.
PORTEIRO — Até.
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
O porteiro a observa sumir de cenário e tira uma grana da gaveta,
começando a contar.
PORTEIRO — (p/si) Até que deu pra garantir uns bons
trocados, virando cúmplice do “Doutor
Sacana”!
Som de suspense no final da cena, focalizando a expressão cínica do
porteiro.
CENA 29. RUA PEDRO IVO. QUADRA DAS CASAS DE ANDRÉ E
CLÁUDIA. EXT. DIA.
Cláudia anda pelas ruas, direcionando-se ao brechó. Só que André aparece
na hora e a impede de entrar.
ANDRÉ — Cláudia. Tem alguém muito importante
querendo falar com você.
CLÁUDIA — Eu to tão cansada, André! Tem que ser
agora?!
ANDRÉ — Sim, por favor. Sou eu que te peço.
CLÁUDIA — Então ta.
CENA 30. CASA DE ANDRÉ. SALA. INT. DIA.
Cláudia e André abrem a porta da sala e ela se surpreende ao ver Lucas, no
canto.
CLÁUDIA — (surpresa) Lucas... Você aqui?
LUCAS — Pois é. Por ironias da vida, eu descobri
que o André era o seu melhor-amigo.
CLÁUDIA — E vocês já se conheciam?!
ANDRÉ — Já. E há muito tempo.
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
CLÁUDIA — Que legal, gente! Isso é muito bacana.
ANDRÉ — Eu também acho. Mas o assunto que o
Lucas queria te falar era outro.
CLÁUDIA — (intrigada) Sim... E sobre o que é?
LUCAS — Eu vou ser direto, Cláudia. (aproxima-se
dela) É sobre o Antônio.
Indignada, ela olha para André com reprovação.
CLÁUDIA — Você não deveria ter tocado nesse
assunto, André! Já ta tudo resolvido. Eu
descobri que o Antônio não é sacana coisa
nenhuma. Foi tudo um mal-entendido.
ANDRÉ — Mas eu não contei nada pro Lucas. Ele já
sabia.
CLÁUDIA — (surpresa) Como já sabia? Que história é
essa?
Ela alterna olhares de surpresa para os dois, até que Lucas revela.
LUCAS — Eu sabia por que eu sou o filho do
Antônio! O único que eu saiba que ele tenha
tido.
Música de suspense. CAM foca na expressão espantada de Cláudia.
CLÁUDIA — Eu... Eu to chocada.
LUCAS — E tem mais... (T) O Antônio é um
bandido... É um manipulador.
CLÁUDIA — (estarrecida/sentando no sofá) Isso não
pode ser verdade!
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AS DONAS DA HISTÓRIA CAPÍTULO 002
LUCAS — (direto) É sim! E eu vou te explicar tudo.
Absolutamente tudo o que ele já aprontou
comigo e com a minha mãe.
Por fim, Cláudia vira o seu olhar para Lucas, enquanto André apenas observa.
FIM DO CAPÍTULO 2.