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Logística de loja: o desafio da gestão do fluxo físico na ponta da cadeia São diversas as motivações para incorporar boas práticas logísticas e desenvolver os conceitos da Supply

Chain nas lojas

O papel das lojas nos fluxos da Supply

Chain Uma cadeia de suprimentos é essencialmente

constituída de fluxos: o fluxo físico dos produtos

do fornecedor primário até o cliente, o fluxo de

informações que viabiliza o físico, o fluxo

financeiro das transações entre os diferentes

integrantes da cadeia...

Ainda que o e-commerce tenha alterado (e

continue alterando) o panorama da cadeia de

suprimentos nos últimos anos, as lojas e

estabelecimentos comerciais permanecem a

ponta inescapável dos fluxos da Supply Chain.

Além de local privilegiado de contato com o

cliente e ponto de partida dos pedidos, as lojas

são geralmente os últimos destinatários do fluxo

físico de produtos antes do consumidor final. Pelo

contato com o cliente, as lojas também são o local

natural de início do fluxo de devolução, complexo

e oneroso para a cadeia.

Lojas: pontos de partida ou de chegada fundamentais dos fluxos da cadeia de abastecimento

Por Rodrigo Valente Zero

ARTIGO CONSULTOR

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Logística de loja: o desafio da gestão do fluxo físico na ponta da cadeia

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No entanto, a orientação obviamente comercial

das lojas acaba com frequência ofuscando a

dimensão desse fluxo físico e limitando uma

verdadeira integração desses estabelecimentos às

melhores práticas na gestão dos estoques.

Mas quais as razões para dedicar uma atenção

especial a esses fluxos físicos no interior das lojas?

Em primeiro lugar, estão os custos: negligenciar

os estabelecimentos comerciais como efetivos

agentes da Supply Chain pode custar caro às

empresas. Apesar de intuitivamente associados à

indústria e aos centros de distribuição, uma

parcela de 30 a 40% dos custos logísticos totais

da cadeia está diretamente ligada às lojas. O

tempo dos vendedores e promotores da loja

dedicado a tarefas essencialmente logísticas –

como conferência, abastecimento de gôndolas e

gestão de locais de reserva - é um hidden cost com frequência ignorado pelas áreas centrais de

Supply Chain das empresas.

Um segundo motivo não menos importante é a

experiência do cliente. Uma gestão errática dos

fluxos físicos na loja diminui a probabilidade de o

cliente encontrar o produto desejado,

consumindo seu tempo e levando por vezes à

perda da venda. É uma situação bastante

prejudicial à imagem do estabelecimento em

tempos de consumidores cada vez mais

conectados e exigentes. Um cliente que se deu ao

trabalho de se deslocar para realizar sua compra

não pode ser decepcionado por problemas de

logística da loja.

A mudança nas exigências e expectativas do

cliente também cria uma terceira razão para a

melhoria do fluxo físico nas lojas (que influencia

diretamente o fluxo de informação): a qualidade

dos dados. Em um contexto omnicanal, as

informações que partem das lojas sobre o nível

dos estoques devem ser precisas a todo instante,

e somente uma gestão meticulosa dos fluxos de

produto no interior da loja pode viabilizar esse

objetivo.

Aprimorando os processos de logística

física nas lojas: a inspiração dos

centros de distribuição As atividades cotidianas das lojas incluem diversas

tarefas logísticas: recepção, armazenagem,

abastecimento, separação e expedição. De fato,

toda a dinâmica de um centro de distribuição

pode muitas vezes ser perfeitamente reproduzida

em um estabelecimento comercial, ainda que em

menor escala. E por essa razão, as lojas podem

colocar em prática aprendizados dos CDs para

cada uma das etapas do fluxo de produto.

No seu dia-a-dia, as lojas recebem as

mercadorias, às vezes contando inclusive com

docas de recepção, empilhadeiras e

transpaleteiras. Em seguida, conferem os

produtos recebidos, com frequência adotando

procedimentos dispendiosos de controle 100%

(contagem item a item). A conferência e as

eventuais dificuldades encontradas no

recebimento - inconsistências na nota fiscal,

problemas cadastrais, desmembramento das

embalagens - travam o fluxo físico e impõem

obstáculos para uma chegada rápida do produto

até as prateleiras.

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Dadas as semelhanças nos princípios, as lojas

podem se inspirar dos centros de distribuição

para aumentar a fluidez de suas operações de

recebimento. Pelo volume de veículos que

gerenciam, os CDs buscam constantemente a

otimização das recepções, focando via de regra a

conferência detalhada nos fornecedores de

menor confiabilidade, e trabalhando com

percentuais amostrais para os demais.

Além disso, uma dinâmica de compartilhamento

de informações cadastrais com os fornecedores

pode ser aplicada às lojas para antecipar

dificuldades e resolvê-las antes da chegada do

caminhão, evitando produtos parados por horas

na recepção e indisponíveis aos clientes. Essas

situações podem ser mitigadas por alternativas de

data sharing entre fornecedores e varejistas como

EDI e GDSN.

Seguindo o fluxo, uma vez liberadas da recepção,

as mercadorias são levadas até locais de reserva

nas lojas - invisíveis ao cliente final - ou

diretamente até as prateleiras de venda, caso haja

espaço linear disponível.

Ainda que centros de distribuição não disponham

de gôndolas, a analogia entre CDs e lojas

permanece válida aqui: os locais de reserva das

lojas correspondem às chamadas posições de

estoque, e as prateleiras são as posições de

picking. No CD, os produtos no estoque

reabastecem o picking quando ele se esvazia; da

mesma forma, os locais de reserva são os

pulmões das gôndolas nas lojas. Os separadores

de pedidos dos centros de distribuição coletam os

produtos das posições de picking para atender

uma necessidade comercial; na loja, esse papel é

exercido diretamente pelos clientes finais.

Analogia entre fluxos logísticos nas lojas e nos CDs

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Nesse momento surge uma diferença importante:

no CD, uma ruptura de uma posição de picking

com mercadoria ainda disponível em estoque

resulta em perda de produtividade, mas pode ser

facilmente sanada. Na loja, essa mesma situação

levará muito provavelmente à perda da venda: o

cliente final desconhece a existência de estoques

de reserva, e dificilmente se dará ao trabalho de

investigar paradeiros alternativos para o produto

se não o encontrar com facilidade na prateleira.

As chamadas rupturas aparentes – produtos

presentes fisicamente na loja mas invisíveis ao

cliente – são mais impactantes do que a mera

intuição sugere: em recentes projetos com

clientes no varejo, a Diagma verificou níveis de

ruptura aparente que representavam cerca de 40-

50% da ruptura total das gôndolas. Dito de outra

forma, quase metade da ruptura da loja percebida

pelo cliente é puramente ilusória - o produto está

presente no estabelecimento, mas oculto. Em

todo caso, para o consumidor, pouco importa: a

compra não se efetiva, seja a ruptura aparente ou

real. Na dinâmica do omnicanal, isso é ainda mais

grave, já que o cliente se deslocou até a loja após

ter a certeza (através do website) do estoque

disponível.

Isso justifica a importância de uma maior atenção

ao processo de reabastecimento das prateleiras –

reduzir níveis de ruptura pela metade somente

aprimorando processos internos da loja é uma

excelente ideia. Voltando à analogia, a escola de

boas práticas pode ser o próprio centro de

distribuição: há décadas os CDs se empenham

para ganhar produtividade na separação

garantindo que as posições de picking estejam

sempre abastecidas.

Disciplinar o abastecimento e automatizar a

identificação de rupturas são exemplos de

iniciativas dos centros de distribuição que podem

ser replicadas nas lojas. A criação de rotinas

(identificação da necessidade -> abastecimento -

> atualização dos controles) com as equipes de

loja é essencial para garantir que um produto

fisicamente presente em estoque está também

disponível e visível ao cliente.

Processos de inventário rotativo inteligente, com

foco nos produtos de maior impacto em caso de

ruptura ou maior risco de erro de estoque, são

outro exemplo de boa prática logística para

ganhar produtividade nas contagens e reduzir a

chance de rupturas.

Indo além da logística: outros eixos de

ação para melhorar o fluxo físico nas

lojas

Níveis de estoque otimizados também simplificam

o tratamento da ruptura aparente: quanto menor

a quantidade de estoque do produto, mais

simples é gerenciar os reabastecimentos.

Nessa lógica, repensar a gestão dos pedidos é

uma ação importante para facilitar o fluxo de

produto. A logística física das lojas é diretamente

impactada por questões como gestão

centralizada ou descentralizada de pedidos,

políticas de estoque por produto e sistemas

automáticos de previsão e abastecimento (APS).

Vale lembrar que volumes de estoque adequados

ao nível de serviço desejado trazem grandes

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benefícios financeiros e comerciais à empresa,

muito além de somente facilitar a logística de loja.

Uma maior parceria com os fornecedores

também pode facilitar o fluxo físico na ponta da

cadeia - programas colaborativos como o CPFR e

o VMI possuem alto potencial na redução do nível

de estoque da loja (mas exigem por outro lado

um alto grau de maturidade na relação

fornecedor – varejista). Outra iniciativa pertinente

é trabalhar com o fornecedor na adaptação das

embalagens para diminuir a quantidade de

manipulações e facilitar o abastecimento - as

chamadas cut-cases são um bom exemplo.

Cut-case: mais facilidade no abastecimento das

prateleiras

Ademais, iniciativas tradicionalmente ligadas ao

marketing podem influenciar de forma muito

positiva o fluxo físico nas lojas. Como exemplos, o

gerenciamento por categoria pode tornar a

localização dos produtos nas gôndolas mais

intuitiva, e a definição dos planogramas pode se

inspirar mais do conceito de slotting dos CDs e

adequar as prateleiras ao giro dos produtos –

evitando reabastecimentos demasiadamente

frequentes. A interação entre as equipes centrais

de Supply Chain e as áreas de marketing/vendas

nesses pontos é fundamental.

De maneira geral, aumentar a integração das lojas

com as equipes da cadeia de suprimentos e

conectá-las às melhores práticas de logística é

uma iniciativa essencial no combate às rupturas e

na redução dos estoques. A loja é peça-chave no

quebra-cabeça da Supply Chain – e precisa ser

tratada como tal.


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