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Filosofia, Ética e Cidadania

1º Período

1ª versão Gilson Porto Jr.

Jair José MaldanerMarcelo Rythowem

2ª versãoJair José Maldaner Marcelo Rythowem

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EMPRESA DE EDUCAÇÃO CONTINUADA LTDA

Diretor PresidenteLuiz Carlos Borges da Silveira

Diretor ExecutivoLuiz Carlos Borges da Silveira Filho

Diretor de Desenvolvimento de ProdutoMárcio Yamawaki

Diretor Administrativo e FinanceiroJúlio César Algeri

FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE DO TOCANTINS

ReitorHumberto Luiz Falcão Coelho

Vice-ReitorLívio William Reis de Carvalho

Pró-Reitor de GraduaçãoGalileu Marcos Guarenghi

Pró-Reitor de Pós-Graduação e ExtensãoClaudemir Andreaci

Pró-Reitora de PesquisaAntônia Custódia Pedreira

Pró-Reitora de Administração e FinançasMaria Valdênia Rodrigues Noleto

Diretor de EaD e Tecnologias EducacionaisMarcelo Liberato

Coordenador PedagógicoGeraldo da Silva Gomes

Coordenadora do CursoJaqueline Carvalho Quadrado

MATERIAL DIDÁTICO – EQUIPE UNITINS

Organização de Conteúdos Acadêmicos1ª versão: Gilson Porto Jr. Jair José Maldaner Marcelo Rythowem2ª versão: Jair José Maldaner Marcelo Rythowem

Coordenação EditorialMaria Lourdes F. G. Aires

Assessoria EditorialDarlene Teixeira Castro

Assessoria Produção GráficaKatia Gomes da Silva

Revisão Didático-PedagógicaFrancisco Gilson R. P. Junior

Revisão Lingüístico-TextualIvan Cupertino Dutra

Revisão DigitalDouglas Donizeti Soares

Projeto GráficoDouglas Donizeti SoaresIrenides TeixeiraKatia Gomes da Silva

IlustraçãoGeuvar S. de Oliveira

CapaEdglei Dias Rodrigues

MATERIAL DIDÁTICO – EQUIPE FAEL

Coordenação EditorialLeociléa Aparecida Vieira

Assessoria EditorialWilliam Marlos da Costa

RevisãoJuliana Camargo HorningLisiane Marcele dos Santos

Programação Visual e DiagramaçãoDenise Pires PierinKátia Cristina Oliveira dos SantosRodrigo SantosSandro NiemiczWilliam Marlos da Costa

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Caro estudante,

Você está recebendo os textos relacionados à disciplina Filosofia, Ética e Cidadania que têm por objetivo nortear seus estudos nesta importante área. Queremos deixar claro que este material não tem a pretensão de esgotar nenhum dos assuntos abordados.

Filosofia, Ética e Cidadania é uma disciplina cativante, aberta, abrangente, basilar para que você possa fazer uma análise e reflexão sobre os principais paradigmas e dilemas da humanidade, relacionados à Ética e Cidadania ao longo da história.

A aula 1, de caráter introdutório, servirá de base conceitual para a compre-ensão dos conceitos de Filosofia, Ética e Cidadania. Nela, procuramos tratar a origem e evolução dos conceitos, bem como suas principais características.

Nas aulas 2 a 7, fizemos uma abordagem histórica, desde a Grécia antiga até os dias atuais, tendo como fio condutor os fundamentos filosóficos da ética e da cidadania e seus principais pensadores. O principal objetivo deste tipo de abordagem é proporcionar um contato com os aspectos significativos que fundamentaram a evolução da sociedade ao longo dos tempos.

Bons estudos e boa reflexão.

Prof. Jair José Maldaner

Prof. Marcelo Rythowem

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Plan

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EMENTA

Matrizes históricas do pensamento filosófico ocidental: a relação ética e filosofia; ética e sociedade; teoria do conhecimento; sistema de valores; o conceito de justiça; ética e moral; conceito de cidadania e dimensão ético-profissional; o fenômeno da globalização e as inclusões e exclusões no mundo do trabalho.

OBJETIVO

Proporcionar aos alunos conhecimentos, a partir da análise e reflexão dos pressupostos ético-filosóficos da cidadania ao longo da história e suas implicações no contexto da sociedade contemporânea.

CONTEÚDO PROGRAMÁTICO

Investigação do que é filosofia, ética e cidadania

A antiguidade clássica: Sofistas e Sócrates

Platão e Aristóteles

O Helenismo

Pressupostos filosóficos da ética e da cidadania na Idade Média

O Renascimento

Empirismo e Racionalismo

O pensamento filosófico de John Locke e Immanuel Kant

A diversidade do mundo contemporâneo e os desafios para a ética e cidadania

O século XX e os desafios da filosofia

Pós-modernidade e os desafios éticos

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UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 7

BIBLIOGRAFIA BÁSICA

CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. 2. ed. São Paulo: Ática, 2002.

SÁNCHEZ VÁZQUEZ, Adolfo. Ética. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001.

VALLS, Álvaro. O que é ética. São Paulo: Brasiliense, 1997. (Primeiros Passos)

BIBLIOGRAFIA COMPLEMENTAR

ARANHA, Maria Lúcia de Arruda; MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: introdução à filosofia. 2. ed. São Paulo: Moderna, 1993.

ASHLEY, P. A. A mudança histórica do conceito de responsabilidade social empresarial. In: ASHLEY, P. A. Ética e responsabilidade social nos negócios. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2005.

MAGEE, Bryan. História da Filosofia. 3. ed. São Paulo: Loyola, 2001.

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Sum

ário

Aula 1 – Investigando o que é filosofia, ética e cidadania ......................9

Aula 2 – Pressupostos filosóficos da ética e da cidadania na Antiguidade ..................................................................27

Aula 3 – Pressupostos filosóficos da ética e da cidadania na Idade Média .................................................................45

Aula 4 – Modernidade .....................................................................57

Aula 5 – Liberalismo e Iluminismo ......................................................71

Aula 6 – A crise da razão e a filosofia ...............................................81

Aula 7 – Os desafios da filosofia, ética e cidadania na pós-modernidade ...........................................................93

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AULA 1 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 9

Objetivos

Esperamos que, ao final desta aula, você seja capaz de:

conceituar filosofia, ética e cidadania;

apontar as relações entre filosofia, ética e cidadania.

Pré-requisitos

Esta aula será melhor aproveitada se você fizer uma revisão dos conteúdos de filosofia do Ensino Médio. Anote em uma folha os aspectos que mais lhe chamaram a atenção durante a realização dos estudos secundários. Reflita também sobre ética e cidadania em nosso país, bem como a relação que mantemos com as regras e normas em nosso dia-a-dia. Essas reflexões serão importantes para que você possa compreender de forma adequada como a filosofia embasa a reflexão sobre a ética e a cidadania.

Introdução

Filosofia, ética e cidadania são conceitos próximos, complementares, inter-ligados e abrangentes. Ao longo da história, vários foram os enfoques que a sociedade deu a esta temática. O berço da filosofia é a sociedade grega que abordou os temas da ética e cidadania. O discurso ético filosófico grego é um discurso de afirmação da cidadania no sentido mais completo do termo, ou seja a participação ativa e efetiva nos decisões da cidade, participação nas riquezas coletivas e gozo de direitos definidos coletivamente. No período medieval esta caracterização de cidadania é abandonada. Prevalecem os valores e crenças religiosas e o interesse por questões espirituais em detrimento de questões materiais e políticas. Com o advento da modernidade e depois com a Revolução Francesa a cidadania começa a se efetivar mediante decla-rações e legislações. Atualmente o desafio maior da sociedade e dos governos

Aula 1Investigando o que é filosofia,

ética e cidadania

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AULA 1 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

10 1º PERÍODO • SERVIÇO SOCIAL • UNITINS

é garantir o efetivo acesso aos direitos, como saúde, educação, moradia, trabalho, lazer, etc., que garantem a cidadania.

1.1 Filosofia

Para início de conversa, leia, atentamente, este trecho do livro Alice no país das maravilhas de Lewis Carroll:

O Gato apenas sorriu quando viu Alice. Ele parecia bem natural, ela pensou, e tinha garras muito longas e muitos dentes grandes, assim ela sentiu que deveria tratá-lo com respeito.“Gatinho de Cheshire”, começou, bem timidamente, pois não tinha certeza se ele gostaria de ser chamado assim: entretanto ele apenas sorriu um pouco mais. “Acho que ele gostou”, pensou Alice, e continuou. “O senhor poderia me dizer, por favor, qual o caminho que devo tomar para sair daqui?”“Isso depende muito de para onde você quer ir”, respondeu o Gato.“Não me importo muito para onde...”, retrucou Alice.“Então não importa o caminho que você escolha”, disse o Gato.“... contanto que dê em algum lugar”, Alice completou.“Oh, você pode ter certeza que vai chegar”, disse o Gato, “se você caminhar bastante” (Disponível em: <http://www.alfredo-braga.pro.br/biblioteca/alice-3.html>).

O termo filosofia vem do grego philos (amigo) e sophos (sabedoria, conhe-cimento). O filósofo é, portanto, o amigo do conhecimento. A maioria de vocês já deve ter ouvido falar da filosofia. Talvez alguns pensem que filosofia é algo difícil, “coisa de gente doida”, “ocupação de quem está no mundo da lua”.

Isto não lhe lembra a história de Alice frente ao gato no início deste texto? Quem sabe, o filó-sofo, por se preocupar em pensar os problemas e buscar algumas respostas, ocupe no imagi-

nário da sociedade um espaço reservado para estes problemas que parecem sem sentido.

Esse tipo de pensamento a respeito da filosofia deve-se ao fato de vivermos

em uma sociedade em que o ato de pensar criticamente perdeu um pouco a

sua razão de ser. Na maioria das vezes, quando precisamos resolver algum

problema, é comum recorrermos aos especialistas de plantão. Ou seja, há

sempre a nossa disposição alguém que sabe mais do que nós e que pode

pensar a solução do problema. Estes dias, ficamos sabendo da existência do

personal organizer – que é um especialista em pensar soluções de organização

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AULA 1 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 11

para a bagunça de seus clientes. Vamos, aos poucos, perdendo o interesse em procurar por nós mesmos a solução para os nossos problemas.

Na realidade, filosofamos o tempo todo no cotidiano, no plano dos valores pessoais, sociais, econômicos, políticos.

Filosofar significa também uma forma de conhecimento que procura responder às grandes questões que os seres humanos se colocam, entre outras, são: por que existem as coisas e não o nada? Quem sou eu? O que

devo fazer? Como devo agir em relação aos outros? Qual o sentido de tudo? A filosofia não é nem melhor, nem pior que as demais formas de conheci-mento (religião, arte, ciência, senso-comum). O ponto de partida é o pensa-mento – aqui entendido como coerência lógica de seus argumentos e racio-cínios. Diferentemente da teologia, que parte da fé e dos livros sagrados; da ciência, que utiliza a experimentação; da arte, que utiliza a intuição estética e do senso-comum, que parte do conhecimento vulgar e cotidiano, a filosofia utiliza-se da razão e busca manter a coerência de suas reflexões. Esses conhecimentos, no entanto, inter-relacionam-se. Os pressupostos de uma ciência têm na sua base uma concepção filosófica. O senso comum é ponto de partida para filosofar, para o desenvolvimento das ciências. As religiões são analisadas pelos filósofos e demais ciências sociais, enquanto valores vivenciados pelas pessoas. Por exemplo, um grupo religioso, que por razões doutrinárias não pode receber transfusões de sangue, colaborou financeiramente para a invenção do sangue artificial.

O termo vulgar vem de vulgo, aquilo que diz respeito às pessoas em geral. Porém, o termo vulgar assumiu uma conotação moralista, o que lhe confere um sentido de baixaria, coisa feita

por gente sem educação. Neste caso, utilizamos vulgar como aquilo feito pela maioria das pessoas, deixando de lado a questão moralista e resgatando o sentido original da palavra.

Para muitos, o exercício filosófico é complicado pela diversidade de

respostas encontradas para questões sobre as quais não há um consenso.

Ao contrário do que estas pessoas pensam, vemos que esta é a riqueza da

filosofia, pois há sempre espaço para criar algo novo. Renée Descartes, pai

da filosofia moderna e um dos mais importantes filósofos do século XVI, afirma

“(...) na filosofia havia sobre um assunto, tantas opiniões quantas fossem as

cabeças a pensá-lo” (DESCARTES, 1962, p. 46).

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AULA 1 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

12 1º PERÍODO • SERVIÇO SOCIAL • UNITINS

O termo crítica vem do grego krínein¸ que signifi ca julgamento, apreciação, bom senso.

Nessa linha de raciocínio, vamos analisar diferentes concepções do que seja a fi losofi a. Em seu livro Convite à Filosofi a, Marilena Chauí (1997, p. 16-17) apresenta quatro conceitos:

visão de mundo: de um povo, de uma civilização ou de uma cultura. É um conceito muito amplo e genérico que não permite, por exemplo, distinguir a fi losofi a da religião;

sabedoria de vida: a fi losofi a seria uma contemplação do mundo e dos homens para nos conduzir a uma vida justa, sábia e feliz. Esse conceito nos diz somente o que se espera da fi losofi a (a sabedoria interior), mas não o que é e o que faz a fi losofi a;

esforço racional para conceber o universo como uma totalidade ordenada e dotada de sentido. Este conceito dá à Filosofi a a tarefa de explicar e compreender a totalidade das coisas, o que é impossível;

fundamentação teórica e crítica dos conhecimentos e das práticas. A fi losofi a se interessa por aquele instante em que a realidade natural e histórica tornam-se estranhas, espantosas, incompreensíveis. Quando o senso comum já não sabe o que pensar e dizer e as ciências ainda não sabem o que pensar e dizer.

Segundo Chauí, esse último conceito é o mais abrangente, pois concebe a fi losofi a como análise das condições das ciências, da religião, da moral, como refl exão sobre si mesma e como crítica das ilusões e preconceitos indi-viduais e coletivos das teorias científi cas, políticas. “(...) a Filosofi a é a busca do fundamento e do sentido da realidade em suas múltiplas formas” (CHAUI, 1997, p. 16-17).

Saiba mais

Karl Marx afi rma que a fi losofi a deve não só interpretar o mundo, mas transformá-lo. Isto é, a fi losofi a também pode ser compreendida como uma atividade que pode transformar o mundo por meio da ação de homens e mulheres preocupados em construir o futuro de acordo com seus princípios.

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AULA 1 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 13

No século XX, Antônio Gramsci (1891-1937), filósofo italiano, afirma que todos os seres humanos podem ser filósofos. Acompanhe, a seguir, como Gramsci defende esta idéia.

Deve-se destruir o preconceito muito difundido de que a filosofia seja algo muito difícil pelo fato de ser a atividade intelectual própria de uma determinada categoria de cien-tistas especializados ou de filósofos profissionais e sistemá-ticos. Deve-se, portanto, demonstrar, preliminarmente, que todos os homens são ‘filósofos’, definindo os limites e as características desta ‘filosofia espontânea’ peculiar a ‘todo o mundo’, isto é, a filosofia que está contida: 1) na própria linguagem, que é o conjunto de noções e de conceitos e não, simplesmente, de palavras gramaticalmente vazias de conteúdo; 2) no senso comum e no bom-senso; 3) na religião popular e, conseqüentemente, em todo sistema de crenças, superstições, opiniões, modos de ver e de agir que se mani-festam naquilo que se conhece geralmente por ‘folclore’ (GRAMSCI, 1995, p. 11).

A filosofia da qual fala Gramsci é, muitas vezes, inconsciente porque não é refletida e está permeada pelo viver cotidiano. Para que esta filo-sofia espontânea, isto é, vivenciada diariamente, possa contribuir para a construção de um sentido e a formação da consciência do sujeito, é neces-sário um segundo momento: o da crítica. Gramsci indaga esse momento nos seguintes termos:

[...] é preferível pensar sem disto ter consciência crítica, de uma maneira desagregada e ocasional, isto é, ‘participar’ de uma concepção de mundo ‘imposta’ mecanicamente pelo ambiente exterior, ou seja, por um dos vários grupos sociais nos quais todos estão envolvidos desde sua entrada no mundo consciente (...) ou é preferível elaborar a própria concepção de mundo de uma maneira crítica e consciente e, portanto, em ligação com este trabalho próprio do cérebro, escolher a própria esfera de atividade, participar ativamente na produção da história do mundo, ser o guia de si mesmo e não aceitar do exterior, passiva e servil-mente, a marca da própria personalidade? (GRAMSCI, 1995, p. 12).

Essa é, como vocês podem perceber, uma das mais esclarecedoras definições de filosofia, pois a vê como essencial para a formação da cons-ciência das pessoas.

Quem pode ser filósofo?

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AULA 1 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

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1.2 Investigando o que é ética

Leia as manchetes a seguir.Em março deste ano, o caso da americana Terri Schiavo virou motivo de polêmica nos EUA. Em estado vegetativo havia 15 anos, Terri parou de receber alimentação por determinação da Justiça dos EUA, após um pedido do próprio marido. Os pais da americana tentaram, sem sucesso, reverter a decisão com o argumento de que ela ainda poderia se recuperar – ao contrário do que afirmavam os médicos. Terri acabou morrendo 13 dias depois (MUNDO. Zero Hora, Porto Alegre, 6 out. 2005. Caderno Gente).

Washington – Estudo do Banco Mundial (Bird) sobre os efeitos da deterioração do meio ambiente, denominado “O meio ambiente importa”, apresentado na quarta-feira, mostra que a poluição do ar mata 800 mil pessoas anualmente. O docu-mento afirma também que cerca de um quinto das doenças dos países em desenvolvimento podem ser atribuídas a problemas ambientais, como falta de água potável e poluição do ar, e que os problemas ecológicos atingem, sobretudo, os mais pobres e as crianças (Disponível em: <http://www.estadao.com.br/ciencia/noticias/2005/out/06/9.htm>).

Os fatos que você viu anteriormente talvez tenham lhe provocado algum tipo de reação. Situações e manchetes como essas sempre tocam o nosso senso moral. Em nossa consciência, avaliamos se são boas ou más, desejáveis ou indesejáveis, justas ou injustas, certas ou erradas. É muito difícil que fiquemos indiferentes a elas. É uma prova de que, a todo o momento, avaliamos o que se passa a nossa volta e procuramos, conscientemente ou não, aquilo que nos parece ser o melhor.

O senso moral e a consciência moral referem-se aos princípios que funda-mentam nossas escolhas, sentimentos, emoções e valores. Mesmo sem nos darmos conta desses princípios, eles são a expressão de nossas crenças mais profundas, do mais valioso que possuímos. Podemos afirmar, portanto, que o nosso agir, a maneira como nos relacionamos conosco, com os outros e com o mundo, é o reflexo de nossa existência ética. Isso significa que, mais do que uma série de conteúdos normativos, refletiremos, nesta aula, sobre a forma

como assumimos essa relação com o que nos rodeia.

1.2.1 Ética e Moral

É muito comum, no dia-a-dia, utilizar-se os termos ética e moral como

se fossem sinônimos. Pretendemos demonstrar neste tópico que se trata de

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AULA 1 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 15

Para Heráclito, o ethos designa a morada do homem. O ethos é a casa do homem, onde surgem os atos humanos – o fundamento da práxis. Para Heráclito a ética está vinculada à índole interior, ao estado de consciência da pessoa. O ethos é o espaço a partir do qual a Consciência se manifesta no homem. É algo íntimo, presente nele e não assimilado do exterior. Não é algo introjetado, mas aquilo que está presente nele. A ação ética surge de dentro para fora, tendo a Consciência como fonte que impulsiona para o reto agir. Em termos de Educação temos a “escolha da consciência”.

Para Aristóteles, o ethos diz respeito ao comportamento que resulta de um constante repetir-se dos mesmos atos. Hábito. Modo de ser ou caráter que se vai adquirindo ao longo da existência. Ethos-hábitos-atos. Para Aristóteles o ethos não é algo que já esteja no homem e sim aquilo que foi adquirido por meio de hábitos. A ação expressa aquilo que foi assimilado previamente do exterior. Por isso não é inato. A ação ética surge de fora para dentro. São atos repetidos. Em termos de Educação, temos o ensino – a formação de hábitos. Esse foi o ponto de partida para o uso posterior da palavra moral, os costumes que devem ser introjetados por meio da educação moral.

Quando a palavra ethos foi transliterada – escrever com o nosso alfabeto uma palavra – predominou a conceituação utilizada por Aristóteles, ou seja, com o significado de hábito ou costume.

Moral: Vem do latim mos, moris, que significa maneira de se comportar regulada pelo uso. Daí vem costume, com as palavras do latim moralis, morale, relativo aos costumes.

Os costumes são diferentes em épocas e locais diferentes. A moral está vinculada ao sistema dominante, aos costumes daquela sociedade, e é rela-tiva; já a ética é universal. Se os hábitos são diferentes em culturas diferentes,

Práxis: os gregos chamavam práxis à ação de levar a cabo alguma coisa: significa ainda o conjunto de ações que o homem pode realizar e, neste sentido, a práxis se contrapõe à teoria. No marxismo significa interpendência entre a teoria e a prática,

ou seja, uma prática refletida e uma teoria que vise a transformar o mundo.

conceitos distintos. Em comum possuem o fato de regular o agir humano, mas diferem quanto ao modo como se dá esse processo.

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AULA 1 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

16 1º PERÍODO • SERVIÇO SOCIAL • UNITINS

os princípios universais, a busca do bem, a preservação da vida, etc., são constantes e estão acessíveis, em qualquer lugar onde o homem estiver, pois ali estará sua mente.

Por influência de Aristóteles, e devido à transformação do ethos como morada em costumes, a ética, no seu sentido primordial dado por Heráclito, acabou sendo confundida com a moral tradicional. Se no grego havia dois sentidos para o ethos, no latim foi usada só uma palavra – mores (costumes). E, assim, costumes, vinculados aos hábitos, foi o significado que prevaleceu.

A ética é a ação em conformidade com a consciência. É uma ação sempre refletida e fruto da escolha livre e consciente – até para infringir uma norma, se for o caso. Não se trata de uma ação que vise apenas a seguir o senso comum ou o politicamente correto, para não ferir as aparências, a imagem ou aquilo que é externo. A ética é, antes de tudo, expressão da índole pessoal. Não defendemos com isto o relativismo, ou que tudo é lícito por ser fruto da delibe-ração pessoal, inclusive a violência. Pelo contrário, a ação livre e consciente está sempre de acordo com aqueles princípios universais, especialmente o respeito pela dignidade do outro como absolutamente outro em sua dignidade como pessoa humana.

Por sua vez, a moral se expressa como um conjunto de normas, regras, leis, hábitos e costumes que definem de antemão o certo e o errado, o permitido e o proibido, desejado ou indesejado. Por ser um conjunto de regras externas a nossa consciência, deve ser cumprida necessariamente. Como não possui a adesão pessoal, seu não cumprimento resultará em algum tipo de sanção.

Enfim, quando se percebe o clamor na sociedade por novos códigos de normas (e de sanções), não se discute a ética, mas apenas mais um código moral. Dessa forma, perde-se o espaço para a reflexão e tomada de decisões tendo em vista as conseqüências de nossos atos, e deixa-se a cargo de terceiro, com os méritos e deméritos, o papel de guardião da ética, enquanto exime-se de assumir a condução da própria vida. A ação moral é muito menos exigente porque o esforço em pensar novas possibilidades de ação não chega a ser cogitado. Viver no mundo da ética implica caminho muito mais espinhoso, mas recompensador, tendo em vista que podemos atuar de forma autônoma, construtiva e responsável.

1.2.2 A avaliação ética

Conforme afirmamos anteriormente, a ética trabalha com juízos de valor. Os juízos de valor são normativos porque exprimem algo que é desejável e

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AULA 1 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 17

reprovam o que possa ser prejudicial. Os juízos de valor indicam, então, o que é o bom, pois visam a alcançar o bem. Porém, nem sempre é fácil determinar o que é o bem como fundamento para uma avaliação do que é desejável. A seguir, apresentamos uma interessante abordagem do problema do bem e do bom a partir de algumas concepções em quatro períodos históricos, com base nas reflexões de Vázquez (2002, p. 155-171).

1.2.3 O bom como felicidade – eudemonismo

Aristóteles foi o primeiro pensador que sustentou a felicidade como o bem supremo. Para alcançá-la, seria necessário viver de acordo com a razão e possuir alguns bens;

a ética cristã sustenta que a verdadeira felicidade não se consegue aqui na terra, mas no céu como prêmio a uma vida de acordo com os preceitos cristãos;

os filósofos iluministas e materialistas franceses sustentavam o direito de os homens serem felizes neste mundo, porém tratavam o homem de forma abstrata sem levar em conta as condições reais em que viviam.

Eudemonismo: etimologicamente, em grego, significa felicidade. Doutrina filosófica que defende a felicidade como bem supremo.

1.2.4 O bom como prazer – hedonismo

Epicuro sustentava que cada um deveria procurar o máximo de prazer, não se referia aos prazeres sensíveis e imediatos (comida, bebida, sexo), mas aos prazeres duradouros e superiores como os intelectuais e estéticos.

As teses fundamentais do hedonismo são:

1. todo prazer ou gozo é intrinsecamente bom;

2. somente o prazer é intrinsecamente bom;

3. a bondade de um ato ou experiência depende do prazer que contém.

Hedonismo: vem do grego, hedoné, prazer. Doutrina que atribui ao prazer uma predominância, quer de fato, quer de direito.

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AULA 1 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

18 1º PERÍODO • SERVIÇO SOCIAL • UNITINS

1.2.5 O bom como “boa vontade” – formalismo kantiano

Kant defendia que o bom deveria ser absoluto, irrestrito ou incondicio-nado. Afirma, portanto, que “a boa vontade não é boa pelo que possa fazer ou realizar, não é boa por sua aptidão para alcançar um fim a que nos propu-séramos; é boa só pelo querer, isto é, boa em si mesma”. Considerada por si só, é, sem comparação, muitíssimo mais valiosa do que tudo que poderíamos obter por meio dela.

Iluminismo: corrente filosófica (século XVIII) que defende o uso da razão contra o absolutismo que impede as pessoas de saírem de sua menoridade intelectual.

1.2.6 O bom como útil - Utilitarismo

O utilitarismo concebe o bom como útil, mas não em um sentido egoísta ou altruísta, e sim no sentido da felicidade geral para o maior número de pessoas possível. Os principais expoentes desta corrente foram Jeremy Bentham (1784-1832) e John Stuart Mill.

1.2.7 Responsabilidade Ética

O sujeito ético, para que alcance o status de responsável por sua ação, deve atender a quatro condições. No esquema a seguir abordaremos a concepção de Chauí (2000, p. 337-338):

ser consciente de si e dos outros, isto é, ser capaz de reflexão e de reconhecer a existência dos outros como sujeitos éticos iguais a ele;

ser dotado de vontade, isto é, de capacidade para controlar e orientar desejos, impulsos, tendências, sentimentos (para que estejam em conformidade com a consciência) e de capacidade para deliberar e decidir entre várias alternativas possíveis;

ser responsável, isto é, reconhecer-se como autor da ação, avaliar os efeitos e conseqüências dela sobre si e sobre os outros, assumi-la, bem como as suas conseqüências, respondendo por elas;

ser livre, isto é, ser capaz de oferecer-se como causa interna de seus sentimentos, atitudes e ações, por não estar submetido a poderes externos que o forcem e o constranjam a sentir, a querer e a fazer

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alguma coisa. A liberdade não é tanto o poder para escolher entre vários caminhos possíveis, mas o poder para autodeterminar-se dando a si mesmo as regras de conduta.

1.3 Cidadania: construindo possibilidades

O discurso da cidadania tem ocupado importantes espaços de discussão em nossa sociedade. Tem-se apresentado a cidadania como a panacéia que resolverá todos os males, principalmente os que envolvem o desvio dos recursos públicos.

A banalização do uso do termo não tem contribuído para a efetivação de políticas públicas e do engajamento da sociedade civil na solução dos graves problemas sociais que enfrentamos na sociedade contemporânea.

Mas o que é cidadania afinal? Como ela é vista e vivida? Podemos nos reportar à cidadania como algo automático? Essas são questões que orien-tarão nosso debate a seguir.

1.3.1 A cidadania entre os gregos

Provavelmente, um cidadão grego estranharia o conceito de cidadania para nós hoje. Podemos identificar a origem do conceito de cidadania na sociedade greco-romana, no período da antiguidade clássica, entre os séculos VI e IV a.C. A cidadania era um título recebido por aquele que participava do culto da cidade e, dessa forma, poderia usufruir dos direitos civis e políticos.

Cidadão na Grécia antiga é, portanto, todo aquele que segue a religião da cidade e honra seus deuses. Aos estrangeiros, às mulheres, aos escravos, às crianças, era vedada essa possibilidade, tendo em vista a preservação das cerimônias sagradas. A religião era, dessa forma, o marco referencial que deli-mitava o espaço da cidadania e distinguia de forma categórica o cidadão do estrangeiro. Em outras palavras, a cidadania grega era realmente excludente.

A pólis, definindo um modo de vida urbano que seria a base da civilização ocidental, mostrou-se ser um elemento fundamental na constituição da cultura grega.

Ela possuía uma configuração espacial.

Na Grécia antiga, ser cidadão significava a oportunidade de ser ouvido na assembléia, isto é, representava o direito de exercer cargos públicos e defender seus próprios interesses no tribunal.

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A cidadania, em suas origens, é um mecanismo de exclusão. Designava aqueles que podiam gozar de uma série de direitos e aproveitar-se disso tomando decisões favoráveis aos seus interesses. Apesar dos avanços conse-guidos pela cidadania que, de certa forma, eliminaram as diferenças de origem, classe e função e instauraram a isonomia, isto é, a igual participação de todos os cidadãos no exercício do poder, a maioria absoluta da população encontrava-se alijada deste exercício.

Aranha e Martins (1995, p. 65) nos dão uma visão desta situação de exclusão quando afirmam que

o apogeu da democracia ateniense se dá no século V a C., já no período clássico, quando Péricles era estratego. È bem verdade que Atenas possuía meio milhão de habitantes dos quais 300 mil escravos e 50 mil metecos (estrangeiros); excluídas mulheres e crianças, restavam apenas 10% considerados cidadãos propria-mente ditos, capacitados para decidir por todos.

Apesar desse aspecto excludente, a cidadania, como os antigos a constru-íram, foi uma grande invenção, pois separou os interesses públicos e privados e mostrou que o poder poderia ser exercido por todos os cidadãos. Essa é a grande contribuição de gregos e romanos para nossa cultura.

1.3.2 Os direitos do homem e do cidadão: a cidadania a partir da Revolução Francesa (Século XVIII)

Com a expansão territorial e militar romana, a Grécia acabou sendo domi-nada. O conceito de cidadania, como os gregos o haviam construído, era incompatível com as formas oligárquicas de exercício do poder na sociedade romana. Após a fragmentação do Império Romano do Ocidente e a consti-tuição da sociedade feudal, a questão da cidadania perde sua relevância política e cai no esquecimento.

Porém, com a reurbanização e fortalecimento do poder centralizado nos Estados modernos, os debates em torno da cidadania voltam a ocorrer. A necessidade de justificação racional do poder político em oposição a monar-quias hereditárias, claro sinal de privilégio para a nobreza, será realizada pelo Iluminismo. Esse movimento filosófico torna-se o escopo ideológico para os interesses da burguesia que, apesar de possuir o poder econômico, não participa politicamente do poder e é obrigada a sustentar os privilégios da nobreza pelo pagamento de impostos. O lema “sapere aude” - ouse fazer uso da tua razão - indica que somente aquilo que pode ser racionalmente justificado é válido. A origem do poder não é mais de ordem teológica, mas

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os seres humanos, por meio de um contrato, baseado em critérios racionais, é que constituirão o poder. Instaura-se o conflito entre a burguesia e a nobreza. Daí ocorrem as Revoluções Inglesa (1688) e Americana (1776).

Revolução Francesa é o nome dado ao conjunto de acontecimentos ocorridos entre 5 de Maio de 1789 e 9 de Novembro de 1799 e que alteraram o quadro político e social da França. Historiadores modernos apontam que a Revolução teve três fases:

uma fase burguesa, uma segunda fase radical e a terceira, contra-burguesa.

A Revolução Francesa, nesse caso, é paradigmática. Por meio da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (DDHC) institucionaliza-se que os seres humanos gozam de direitos frente ao Estado antes de parti-cipar de qualquer sociedade. São, dessa forma, direitos naturais do indivíduo singular. A DDHC oferecerá ao cidadão o direito, inalienável, de liberdade frente ao Estado, devendo aquele resistir a qualquer forma de opressão e agressão a sua dignidade por parte deste.

Inspirados na experiência das declarações inglesa e americana, que reco-nheciam juridicamente os direitos do cidadão, os revolucionários instituciona-lizam por meio da nova constituição as conquistas alcançadas pela Revolução. Com isso, pretendiam impedir possíveis retrocessos.

Porém, a burguesia, condutora do processo revolucionário, precisa delimitar quais serão os elementos do antigo regime que deverão ser reformados e quais conservados, além de procurar deter os anseios populares na medida exata para a realização de seus interesses ante as demandas de reformas abran-gentes prometidas às massas em troca de apoio na Revolução. Por isso, a forma como a cidadania será estabelecida é muito mais formal e abstrata do que os desejos do povo. Assim, a burguesia preserva seus interesses econômicos.

A expansão e a universalização da cidadania se darão a partir da legali-zação dos direitos sociais, fato que se deu entre o fim do século XIX e o início do século XX. É o que veremos a seguir.

1.3.3 Conceituando a cidadania

Jaime Pinsky (2003, p. 9) afirma queser cidadão é ter direito à vida, à liberdade, à propriedade, à igualdade perante a lei: é, em resumo, ter direitos civis. É também participar do destino da sociedade, votar e ser votado, ter direitos políticos. Os direitos civis e políticos não asseguram

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a democracia sem os direitos sociais, aqueles que garantem a participação do indivíduo na riqueza coletiva: o direito à educação, ao trabalho, ao salário justo, à saúde, a uma velhice tranqüila. Exercer a cidadania plena é ter direitos civis, polí-ticos e sociais.

O ordenamento jurídico contemporâneo entende que o direito necessita de reconhecimento na forma de uma lei escrita, ou seja, positivada. Do ponto de vista legal, só isso bastaria para assegurar os direitos de cidadania. Porém não é essa a opinião de setores amplos da sociedade organizada, uma vez que o Estado deve promover sua organização de forma a garantir, por meio de políticas públicas, que todos tenham acesso aos direitos.

Em um regime democrático, como o nosso, é imprescindível que o debate em torno das políticas públicas seja feito de forma transparente, assegurando a todos o direito de colocar publicamente suas demandas. A aplicação de mecanismos de democracia direta tais como consultas populares, audiências públicas, criação de conselhos entre outros é instrumento necessário para a participação da sociedade civil, uma vez que é cada vez mais consenso na sociedade que a democracia representativa parlamentar possui uma série de lacunas e falhas.

O Brasil já vem dando passos significativos quanto a isso. Mas, somente por meio de uma boa política educacional, que vise à emancipação do cidadão, é que estes instrumentos terão eficiência e eficácia. A educação de qualidade promove o bem-estar coletivo e constrói no cidadão as condições para que possa controlar a execução das políticas públicas, ou seja, o efetivo acesso aos direitos, e exigir a transparência necessária por parte do Estado no uso dos recursos públicos.

Síntese da aula

O termo filosofia deriva do grego philos (= amigo) e sophia (= sabedoria). Quem pode ser filósofo? Todos aqueles que cultivam a curiosidade, estão abertos ao novo, não aceitam as coisas de modo passivamente e procuram dar uma resposta pessoal aos problemas que encontram. A admiração/espanto e a angústia são atitudes que provocam o início da reflexão filosófica. Vimos também nesta aula, que a ética é uma postura de vida que não pode ser redu-zida a uma série de normas. Pudemos perceber também que, ao longo da história, cada cultura e cada povo procura construir princípios éticos que visam sempre a alcançar o bem. A banalização do uso do termo cidadania não tem

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contribuído para a efetivação de políticas públicas e do engajamento da socie-dade civil na solução dos graves problemas sociais que enfrentamos. Cidadão na Grécia é, portanto, todo aquele que segue a religião da cidade e honra seus deuses. Aos estrangeiros, às mulheres, aos escravos, às crianças, era vedada esta possibilidade, tendo em vista a preservação das cerimônias sagradas. Com a Revolução Francesa, cria-se a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (DDHC), a qual institucionaliza que os seres humanos gozam de direitos frente ao Estado, antes de participar de qualquer sociedade.

Atividades

1. Reflita sobre o texto a seguir “Muitos políticos vêm facilitado seu nefasto trabalho pela ausência da filosofia. Massas e funcionários são mais fáceis de manipular quando não pensam, mas tão-somente usam de uma inteli-gência de rebanho. É preciso impedir que os homens se tornem sensatos. Mais vale, portanto, que a filosofia seja vista como algo entediante” (JASPERS, citado por ARANHA; MARTINS, 1996, p. 77).

Elabore um texto de 15 linhas sobre o seu posicionamento pessoal a respeito da reflexão abordada.

2. Elabore uma reflexão sobre a afirmação “ser ético é ser herói”. Construa para isso um texto crítico de 15 linhas.

3. Em relação às afirmações a seguir, assinale V para as verdadeiras e F

para as falsas, depois indique a sequência correta.

( ) A cidadania na Grécia antiga era altamente excludente, pois mulheres, escravos, estrangeiros e não-proprietários não poderiam ser cidadãos.

( ) Na Idade Média a cidadania perde força, pois predominaram os inte-resses pela vida espiritual e busca da salvação.

( ) A Revolução Francesa pouco contribuiu para a afirmação da cida-dania, pois foi liderada pelos burgueses.

( ) Atualmente os governos precisam garantir o efetivo exercício da cida-dania, por meio da implantação de políticas públicas.

4. Em relação às interfaces entre filosofia, ética e cidadania, muitas são as possibilidades. Aponte a alternativa incorreta sobre a relação entre filo-sofia, ética e cidadania.

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a) A filosofia promove a discussão sobre a justiça e sobre a cidadania.

b) No período medieval a filosofia, ética e cidadania recebiam a influ-ência da visão antropocêntrica.

c) Na modernidade busca-se resgatar valores da antiguidade clássica, dentre eles a visão antropocêntrica.

d) Durante a Revolução Francesa é promulgada a Declaração Universal dos Direitos do Homem e do Cidadão.

Comentário das atividades

Na atividade 1, você pode abordar a questão de que a ausência de filo-sofia significa ausência de reflexão e análise profunda de qualquer realidade. Procure também escrever sobre as dificuldades de se exercer a cidadania quando faltam a reflexão, a análise e a crítica.

Na atividade 2, procure analisar o seu dia-a-dia e veja como já se tornou comum essa afirmação de que “ser ético é ser herói”. Estamos de fato em uma crise de valores. Descreva situações concretas em que aparece essa crise.

Na atividade 3 você terá que fazer uma análise histórica da cidadania. Na Grécia, a cidadania era excludente, cerca de 10% da população apenas eram cidadãos. No medievo, a cidadania perde importância prevalecendo as questões de interesse espiritual. A Revolução Francesa, por meio da Declaração dos Direitos do Cidadão, foi importante marco da afirmação de direitos de cidadania. Atualmente, os governos procuram garantir a cidadania implantando políticas públicas nas diferentes áreas, como saúde, educação, moradia, lazer, etc.

Na atividade 4, veja que são intrínsecas as relações ao longo da história entre filosofia, ética e cidadania. No medievo, essas relações estão de acordo com a visão teocêntrica de mundo. Na modernidade há o resgate do antro-pocentrismo da antiguidade e, a partir da Revolução Francesa, acontecem as promulgações de Direitos de cidadania.

ReferênciasARANHA, Maria Lúcia de Arruda; MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: introdução à filosofia. 2. ed. São Paulo: Moderna, 1995.

DESCARTES, R. Discurso do método. In: Descartes: obras escolhidas. São Paulo: Difel, 1962.

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GRAMSCI, A. A concepção dialética da história. São Paulo: Cortez, 1995.

LEWIS, C. Alice no país das maravilhas. Disponível em: <http://www.alfredo-braga.pro.br/biblioteca/alice-3.html>. Acesso em: 20 jun. 2006.

Na próxima aula

As bases da sociedade ocidental podem ser encontradas na filosofia grega. Filósofos como os sofistas e, principalmente, Sócrates, Platão e Aristóteles, foram pensadores que definiram conceitos como ética, lógica, política, metafísica, que duraram séculos. A própria palavra cidadania surge no contexto da anti-guidade grega. Estas questões e a relação entre Filosofia, Ética e Cidadania na Grécia e no Helenismo é o que veremos na próxima aula.

Anotações

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AULA 2 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

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Objetivos

Esperamos que, ao final desta aula, você seja capaz de:

contextualizar a antigüidade clássica;

identificar características dos Sofistas, Sócrates, Platão, Aristóteles e do período helenista.

Pré-requisitos

Para integralizar os conteúdos desta aula é importante trazer presente os conceitos de filosofia, ética e cidadania que vimos na aula anterior. Estes, como vimos, estão inter-relacionados e se complementam. Esta visão integrada vai ser a principal característica da antiguidade clássica.

Introdução

No século V a.C., conhecido como Século de Péricles, auge da demo-cracia, Atenas tornou-se o centro da vida cultural e política da Grécia.

O ideal de educação aristocrática, baseado em Homero e Hesíodo, do guerreiro belo e bom em que a virtude (arete = ser bom naquilo que faz, excelência) maior era a coragem, é substituído pela educação do cidadão, a formação do bom orador, que é aquele que participa das decisões da pólis, argumentando e persuadindo os outros.

2.1 O movimento Sofista

Para educar os jovens desse novo período, surgem os Sofistas (sábios, especialistas do saber). Eles eram cidadãos da Hélade (toda Grécia), não só de uma cidade-estado. Os Sofistas elaboraram teoricamente e legitimaram o ideal da nova classe em ascensão, a dos comerciantes enriquecidos.

Aula 2Pressupostos filosóficos da ética e

da cidadania na Antiguidade

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Para os Sofistas, o pensamento dos filósofos até então estava cheio de erros, era contraditório e não tinha utilidade para a vida da pólis (cidade). É inútil procurar as causas primeiras das coisas, a metafísica, sem antes estudar o homem em profundidade e determinar com exatidão o valor e o alcance de sua capacidade de conhecer. O interesse dos Sofistas era essen-cialmente humanístico.

Metafísica: do grego metâ tà physikò = depois dos tratados da física.

Assim, a palavra significa literalmente depois da física (Metha = depois, além; Physis = física). É também definida como a parte da filosofia que procura os princípios e as

causas primeiras.

A realidade e a lei moral, para os sofistas, ultrapassam a capacidade cognitiva do homem: ele não pode conhecê-las. Tudo o que o homem conhece é arquitetado por ele mesmo: “O homem é a medida de todas as coisas” (Protágoras). Não pode haver conhecimento verdadeiro, absoluto, mas somente conhecimento provável. O fim supremo da vida para os sofistas é o prazer.

O movimento sofístico tinha como pilar de sustentação a opinião e a retó-rica, cuja técnica definia o homem público. E foi com essa idéia de formação dos jovens na técnica de instrumentos da oratória e retórica que se basearam os Sofistas, respondendo às necessidades da democracia grega.

2.2 Sócrates

Sócrates viveu em Atenas entre 469 e 399 a.C. O Oráculo de Delfos lhe revelou que era o homem mais sábio da Grécia. Sócrates concluiu que era o mais sábio porque tinha consciência da sua própria ignorância. Sua vocação era ajudar os homens a

procurar a verdade.

Seu objetivo era incitar os homens a se preocuparem, antes de tudo, com

os interesses da própria alma, procurando adquirir sabedoria e virtude. Antes

de conhecer as causas primeiras, os princípios metafísicos, é preciso conhe-

cer-se a si mesmo, saber qual é a essência do homem. O homem é a sua

alma. Alma é a razão, o lugar, sede de nossa atividade pensante e eticamente

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UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 29

operante. É preciso educar os homens para que cuidem mais de sua alma do que do corpo.

Dotado de espírito arguto e questionador, a grande preocupação de Sócrates era com a moral, era descobrir o que era justo, verdadeiro e bom. Assim as indagações filosóficas mais urgentes devem ser: O que é bom? O que é certo? O que é justo?

Sócrates afirmava que o homem pecava por falta de conhecimento. Se tivesse conhecimento das coisas, não pecaria. Portanto, conhecimento era virtude, sendo a ignorância a maior causa do mal.

Para o conhecimento verdadeiro sobre o bem, o mal e a justiça, utilizava na praça pública, junto aos jovens e a todos os que o seguiam, inclusive Platão, o método de pergunta e resposta. Seu método foi posteriormente denominado maiêutica – parturição das idéias. Sócrates extraía aos poucos do interlocutor o conhecimento através da lógica, impregnada de ironia. Sócrates deixa emba-raçado e perplexo aquele que está seguro de si mesmo, faz com que o homem veja os seus problemas, desperta curiosidade e o estimula a refletir, não ensina a verdade, mas ajuda cada um a descobri-la nele mesmo. Para ele, aprender não é coisa fácil, só lenta e progressivamente se chega ao conhecimento da verdade.

Fanarete, a mãe de Sócrates, era parteira. Talvez daí venha a influência para o seu método.

Seu objetivo, por meio da dialética e da ironia, era desmascarar a falsa sabedoria e chegar a um conhecimento da natureza humana. Podia-se chegar ao conhecimento verdadeiro com muito trabalho intelectual.

A ética socrática baseava-se no respeito às leis e, portanto, à coletividade. Vislumbrava nas leis um conjunto de preceitos de obediência incontornável, independentemente de essas serem justas ou injustas. Entendia o direito como um instrumento de coesão em favor do bem comum. É pela submissão às leis que a ética da cidade se organiza, já que a ética do coletivo está sempre acima da ética do individual.

Os poderosos da época viram-se ameaçados pela atitude filosófica de Sócrates: ele provocava o pensamento crítico e os jovens poderiam começar a questionar as suas ações. Sócrates tornou-se uma figura muito polêmica, amada e odiada por muitos. Foi preso sob acusação de corrupção da juventude e de não acreditar nos

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deuses da cidade. Seu julgamento ficou célebre e foi condenado com duas opções de pena: ou exilar-se ou morrer (ingerindo um veneno – a cicuta).

Coerente com sua postura e sua filosofia de que “mais vale um homem infeliz no sentido de estar permanentemente inquieto com a busca da verdade, do que viver como um porco satisfeito”, Sócrates escolhe beber cicuta, ficando para a posteridade seu amor à verdade, ao desapego aos bens materiais, à postura ética frente a si próprio e a sua sociedade. Aceitou a morte como prova de que ele defendia o valor da lei como elemento de ordem do todo.

Magee (2001, p. 23), ao falar sobre a postura de Sócrates, afirma que:nenhum outro filósofo teve mais influência do que Sócrates, tendo sido o primeiro a ensinar a prioridade da integridade pessoal em termos do dever da pessoa para consigo mesma, e não para com os deuses, a lei ou quaisquer outras autoridades. Além disso, buscou, mais do que ninguém, o princípio de que tudo deve estar aberto ao questionamento – não pode haver respostas taxativas e inflexíveis, porque elas próprias, como tudo o mais, estão abertas ao questionamento.

Desde então, o método de pergunta e resposta, instigando o aluno a pensar, para buscar a verdade, constitui, por excelência, o método pedagó-gico utilizado amplamente no processo de ensino-aprendizagem.

2.3 Platão

Seu nome era Aristócles, mas pelo vigor físico e extensão de sua testa recebe o apelido de Platão, platôs em grego significa amplitude, largueza, extensão. Platão foi discí-pulo de Sócrates por cerca de 10 anos. Filho de família nobre, entrou na escola de Sócrates para se preparar para a política. Ficou, porém, decepcionado com as injus-tiças praticadas pelo governo e pela condenação de Sócrates à morte, abandonando sua aspiração à política. Com a condenação de Sócrates, Platão deixa Atenas e vai a Megara, temendo perseguições do governo de Atenas. Em 387 a.C., volta a Atenas e funda a Academia. A Academia é, por muitos, considerada a primeira universidade que existiu a estrutura do programa da academia era a geometria e a matemática. Durante séculos, a academia foi o centro de atração para todos os estudiosos. Platão morre em 347a.C.

Diferentemente de seu mestre Sócrates, que nada escreveu, Platão escreveu cerca de duas dezenas de diálogos, verdadeiras peças literárias. Por meio desses diálogos, expõe, na primeira etapa, as idéias de Sócrates e, na segunda, suas próprias idéias.

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UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 31

Fundou sua escola com o nome de Academia cujos estudos básicos eram aritmética, geometria, astronomia e as harmonias do som, cujo objetivo era preparar os jovens para se iniciarem nas indagações filosóficas.

De sua obra, dois diálogos são considerados pelos historiadores os mais famosos: a República, que se ocupa, sobretudo, da natureza da justiça (e, portanto, da ética), no qual traça o plano do Estado ideal, e o Banquete, uma investigação sobre a natureza do amor.

Platão acompanhou e vivenciou o drama da acusação de Sócrates e regis-trou o acontecimento nos diálogos: o Crítias, a Apologia e o Fédon. A Apologia narra o discurso feito por Sócrates em sua própria defesa em seu julgamento e é a justificativa de sua vida.

Para você compreender melhor a concepção de Platão sobre ética, vamos explicar, resumidamente, algumas idéias desse filósofo sobre como conhe-cemos a realidade e o que é a realidade para Platão.

Segundo ele, existem dois tipos de realidade: o mundo em que vivemos, do qual temos apenas um conhecimento sensível, aparente, e um mundo ideal, que são as essências com existência própria.

A República é um diálogo escrito no século IV a.C. por Platão. Nesse diálogo são questionados os assuntos da organização social. Nesta obra, Platão nos apresenta a alegoria da caverna (Mito da Caverna). Nela são apresentadas questões importantes sobre o viver, ação e ética.

Visite o site <http://pt.wikipedia.org/wiki/Mito_da_caverna> e aprofunde as questões que surgirem após a reflexão. Tente aproximar isso de sua prática profissional.

A doutrina das idéias é a intuição fundamental de Platão da qual derivam todos os outros conhecimentos. Platão demonstra a existência do mundo das idéias da seguinte forma:

a) Reminiscência: não tiramos as idéias universais da experiência, mas sim da recordação de uma intuição do que se deu em outra vida;

b) O verdadeiro conhecimento: a ciência só é possível quando são trabalhados conceitos universais. Para isso, deve existir o mundo inteligível, universal;

c) Contingência: idéia necessária e estática para que se explique o nascer e o perecer das coisas.

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AULA 2 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

32 1º PERÍODO • SERVIÇO SOCIAL • UNITINS

As idéias, segundo Platão, são incorpóreas, imateriais, não-sensíveis, incorruptíveis, eternas, divinas, imutáveis, auto-suficientes, transcendentes.

2.3.1 A Ética das virtudes

A compreensão da teoria ética platônica passa também pela forma como o filósofo concebe a alma e suas principais atribuições.

Para o discípulo de Sócrates, a alma – princípio que anima ou move o homem – se divide em três partes: razão, vontade (ou ânimo) e apetite (ou desejos). As virtudes são função desta alma, as quais são determinadas pela natureza da alma e pela divisão de suas partes. Na verdade, ele estava propondo uma ética das virtudes, que seriam função da alma.

Pela razão, faculdade superior e característica do homem, a alma se elevaria, mediante a contemplação, ao mundo das idéias. Seu fim último é purificar ou libertar-se da matéria para contemplar o que realmente é e, acima de tudo, a idéia do Bem. A ética platônica ensina a desprezar os prazeres, as riquezas, honras, a renunciar aos bens do corpo, as coisas deste mundo e a praticar a Virtude.

A vida aqui na terra é passageira, é uma prova. A verdadeira vida está no além-Hades (o invisível). No Hades, a alma é julgada, podendo receber prêmios, castigo eterno ou castigo temporário.

Para Platão, em conformidade com seu mestre Sócrates, a virtude consiste no conhecimento, e o mal, na ignorância. A virtude é uma só: a conquista da verdade. O ensinamento moral de Platão entra em choque com os valores tradicionais baseados nos poetas Homero e Hesíodo e codificados na reli-gião pública. Os valores de beleza do corpo e de saúde física são despre-zados por Platão.

O verdadeiro e autêntico fim da vida moral é a alma. E como cuidar dela? Procurando purificá-la, libertá-la dos laços que a prendem ao corpo e ao mundo material, habituando-a a viver só consigo mesma e só para si mesma. A alma deve elevar-se ao supremo conhecimento do inteligível, ou seja, à contemplação das idéias.

Platão, pode-se dizer, criou uma “pedagogia” para o desenvolvimento das virtudes. Na escola, as crianças, primeiramente, têm de aprender a controlar seus desejos, desenvolvendo a temperança, depois incrementar a coragem para, por fim, atingir a sabedoria.

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UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 33

A ética de Platão tem relações com sua filosofia política, pois é na pólis (cidade estado) que acontece a vida moral.

O estado ideal, segundo Platão, correspondia ao ser humano: como o corpo possui cabeça, peito e baixo-ventre, também o estado deveria possuir, respectivamente, governantes, guerreiros e trabalhadores, esses têm as caracte rísticas que você vê a seguir.

Trabalhadores (lavradores, comerciantes e artesãos): neles preva-lece o aspecto concupiscível da alma, o mais elementar, sua virtude principal é a temperança que consiste na ordem, domínio e disci-plina dos prazeres e desejos. Pressupõe-se, também, desta classe, a submissão às ordens das classes superiores.

Guerreiros: nestes prevalecem a força volitiva da alma. A caracterís-tica destes deve ser, ao mesmo tempo, a mansidão e a ferocidade. A virtude dos guerreiros deve ser a fortaleza ou a coragem. Esta classe é responsável pela vigilância, deve cuidar dos perigos externos e internos da Cidade. Devem observar, também, para que as tarefas sejam confiadas aos cidadãos conforme a índole de cada um.

Governantes: estes deverão amar a cidade como ninguém. Têm de cumprir com zelo sua missão e, acima de tudo, que tenham apren-dido a conhecer e a contemplar o Bem e a Justiça. Nos governantes domina a alma racional e sua virtude principal é a sabedoria.

A justiça nada mais é do que a harmonia que se estabelece entre essas três virtudes. O conceito de justiça em Platão é, segundo a natureza, cada um fazer aquilo que lhe compete fazer.

O regime ideal para Platão é o do filósofo-rei, pois o filósofo governa pela sabedoria e sabe discernir melhor do que ninguém o que é justo ou injusto para a pólis. Bom governo é o que realiza o bem do homem (da alma). Estado ideal é o que quer viver no bem, na justiça e na verdade.

Logo o sábio e o cidadão pertencem aos segmentos superiores, privi-legiados que atingiram o conhecimento, a sabedoria pela razão. Na visão de Platão, os trabalhadores no Estado ocupam o lugar mais baixo em sua hierarquia.

A filosofia platônica exerceu grande influência no pensamento religioso cristão e moral do ocidente.

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AULA 2 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

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2.4 Aristóteles

Aristóteles (384-322 a. C.) nasceu em Estagira, na Trácia, em 384 a.C., na fronteira com a Macedônia. Seu pai era médico e serviu a Corte da Macedônia. Aos 17 anos, vai a Atenas e entra na Academia de Platão, na qual permanece por 20 anos, até a morte de Platão. Com a morte de Platão (347 a.C.) volta a Macedônia e torna-se preceptor de Alexandre Magno. Em 336 a.C., volta novamente a Atenas.

Em Atenas abriu uma escola chamada Peripatética, pois dava suas lições em um corredor do Liceu (Perípatos). O interesse da Escola de Aristóteles está nas ciências naturais.

Platão escreveu suas obras em forma de diálogo; Aristóteles, porém, preferiu o Tratado, pois permitia mais clareza, ordem e objetividade. A atividade filo-sófica, segundo Aristóteles, nasce da admiração. Os homens foram levados a filosofar, sendo primeiramente abalados pelas dificuldades mais óbvias e foram progredindo pouco a pouco até resolverem problemas maiores. O filo-sofar deve estar destituído de conotação utilitária e interesseira. A Filosofia é a ciência das causas primeiras, é de todas as ciências a única que é livre, pois só ela existe por si. As outras ciências podem até ser mais necessárias que a filosofia, mas nenhuma se lhe assemelha em excelência.

Aristóteles rejeitou a teoria das idéias de seu mestre Platão, privilegiando o mundo concreto. A observação da realidade, segundo Aristóteles, leva-nos à constatação da existência de inúmeros seres individuais concretos e mutáveis que são captados por nossos sentidos.

Partindo da realidade sensorial-empírica, a ciência deve buscar as estru-turas essenciais de cada ser. É a partir da existência do ser que devemos atingir a sua essência em um processo de conhecimento que caminha do indi-vidual ao universal.

Para isso, ele elege a experiência como fonte de conhecimento, mostrando que as formas são a essência das coisas, que não há separação entre os objetos e as formas: essas são imanentes àqueles. As idéias não existem fora das coisas: dependem da existência individual dos objetos.

Então, comparando as interpretações de Platão e Aristóteles sobre como podemos conhecer a realidade, constatamos que elas são radicalmente dife-rentes. Magee (2001) comenta que estas duas posições são

os dois arquétipos das duas principais abordagens conflitantes que têm caracterizado a filosofia ao longo da história. De um

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AULA 2 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 35

lado há filósofos que atribuem um valor apenas secundário ao conhecimento do mundo tal como apresentado a nossos sentidos, acreditando que nossa preocupação última precisa ser com algo que está por ‘trás’, ‘além’ ou ‘oculto sob a super-fície’ do mundo. Do outro lado, há os que acreditam que este mundo é em si mesmo o objeto mais adequado para nossa preocupação e nosso filosofar.

Para efeitos de nossos objetivos, destacamos para você o eixo central do pensamento de Aristóteles sobre Ética e Política.

2.4.1 O que é a Ética para Aristóteles?

O Homem é um ser racional, e sua felicidade consiste na atuação da razão, não em riquezas e honrarias. Felicidade é a plena realização das próprias capacidades. A atuação da razão está na contemplação. Mas os sentidos devem ser satisfeitos. É preciso haver harmonia entre razão e sentidos. Prazer e razão. Se tivermos auto-indulgência e autoconfiança desenfreadas estaremos em perpétuo conflito com os outros e, então, tais atitudes são preju-diciais ao nosso caráter. Em contrapartida, a inibição também. O meio para conseguir a felicidade é a virtude. Virtude é o hábito de escolher o justo meio. “A virtude está no meio”. Virtude é o ponto intermediário entre dois extremos, sendo esses extremos considerados vícios. Aristóteles não identifica virtude com saber (como Platão), mas dá importância à escolha, à qual depende mais da vontade que da razão.

O homem encontra as virtudes éticas já prontas. São transmitidas pela ordem estabelecida na sociedade e no Estado (pólis). Tais virtudes têm vali-dade e consentimento universal (por exemplo, prudência, generosidade). A atitude ética não nasce inicialmente dos julgamentos, mas é adquirida graças à prática: pelo exercício, hábito, aprendizagem.

2.4.2 E a Política, como Aristóteles a define?

Para Aristóteles, o Homem é por natureza um animal político. A origem do Estado se dá de maneira instintiva, natural. Segundo ele, quem vive fora do Estado ou não precisa dele ou é Deus, ou um animal.

O Estado deve tornar possível a vida feliz, só o Estado torna possível a completa realização de todas as capacidades humanas. A finalidade do Estado é o Bem Comum. O que irá tornar possível a relação entre o homem e a política é a Justiça. Para a realização da justiça, é preciso que haja vontade, o sujeito irá praticar determinado ato não porque foi condicionado a isso, mas sim porque ele próprio optou.

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AULA 2 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

36 1º PERÍODO • SERVIÇO SOCIAL • UNITINS

Para melhor ilustrar este período sugerimos que você assista o fi lme “Alexandre”.

Aristóteles desenvolveu um conceito de justiça distributiva a qual se refere a todo tipo de distribuição feita pelo Estado, seja de dinheiro, honras, cargos, etc. Refere-se às repartições nas quais se consideram aspectos subjetivos, méritos, qualifi cações, desigualdades etc. A justiça distributiva confere a cada um o que lhe é devido, dentro de uma razão de proporcionalidade participa-tiva, pela sociedade, evitando os extremos tanto do excesso como da falta.

O conceito de justiça distributiva implica outro conceito desenvolvido por Aristóteles, a eqüidade. Na realização de uma lei ou da justiça, pode ocorrer o injusto, daí nasce o conceito da equidade. A eqüidade indica um direito que, embora não formulado pelos legisladores, acha-se difundido na cons-ciência das pessoas. Uma lei quando feita tem sua aplicação generalizada. O fato é que a lei é para todos, mas nem todos os casos devem ser punidos com o máximo de justiça. A eqüidade nasce do fato de que se deve tratar de maneira desigual os desiguais. Em uma sociedade escravocrata, a desigual-dade torna-se algo comum. A eqüidade representa a excelência do homem altruísta que, ao ter de recorrer ao império coativo da lei, prefere valer-se de técnicas de civilidade e virtuosismo que seguem os princípios da moral que permeou a escola socrática.

2.5 O Helenismo

Atualmente, percebe-se certa apatia das pessoas em relação às questões sociais e políticas. Para a maioria, o que importa é cada um se preocupar consigo mesmo e não se envolver nas questões coletivas. Vejamos o que esse cenário tem a ver com o assunto em pauta.

No Século IV a.C. Atenas perde sua hegemonia e independência para os macedônios. Podemos datar esse período entre a morte de Aristóteles em 322 a.C. e o começo da Era Cristã. Nesse longo período a cultura e a língua gregas desempenharam papel preponderante nos três grandes reinos helê-nicos, a Macedônia, a Síria e o Egito.

Saiba mais

Após a decadência política e econômica da Grécia Antiga, com a invasão por Alexandre Magno da Macedônia, a cultura construída pelos gregos

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UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 37

permanece e se expande por meio das conquistas de Alexandre, constituindo o fenômeno hoje conhecido por helenismo.

Seu Império se estendia por quase todo o mundo conhecido pelos gregos antigos, da Itália à Índia, incluindo boa parte do que hoje é chamado de Oriente Médio, junto com vastas áreas do Norte da África. As cidades-es-tados gregas perderam sua independência e foram absorvidas pelo império de Alexandre, perdendo seu predomínio cultural.

Entretanto, esse imperador, aonde chegava, fundava novas cidades e incentivava o casamento dos gregos com mulheres locais, tornando-se essas populações cosmopolitas. Mas seu ethos e sua língua permaneceram gregos em toda parte. Formam-se, então, populações multirraciais e multilíngües. Caem, desta forma, preconceitos racistas contra bárbaros e escravos, pois Alexandre instruiu milhares de jovens bárbaros na arte da guerra. Tentou equiparar os bárbaros e escravos com os gregos. A cultura helênica (grega) torna-se hele-nística na difusão entre os vários povos e raças. A Hélade teve que assimilar alguns elementos desses povos, dos romanos, por exemplo, a praticidade.

A cidade mais importante deste império foi Alexandria, fundada por Alexandre no norte da África, capital cultural deste império e durou cerca de trezentos anos, desde a queda das cidades-gregas no século IV a.C. até o surgimento do Império romano no século I a.C.

O declínio da pólis não corresponde ao nascimento de organismos polí-ticos fortes capazes de ser referência moral e acender novos ideais. As monar-quias helenísticas, nascidas após a dissolução do império de Alexandre (323 a.C.), foram organismos instáveis. De cidadão, o homem grego torna-se súdito. Das “virtudes civis”, passa-se a determinados conhecimentos técnicos que não podem ser domínio de todos, porque requerem estudos e disposições especiais. O administrador da coisa pública torna-se funcionário, soldado, mercenário. Há um desinteresse para com as coisas do Estado, da Política.

O helenismo é pouco propício à profundeza e originalidade. Os três grandes filósofos de Atenas, Sócrates, Platão e Aristóteles se transformaram em fonte de inspiração para diferentes correntes filosóficas, sobressaindo a preo-cupação com a Ética. Após a perda da independência da pólis, o cidadão grego se sente inseguro e perdido. A via da salvação é refugiar-se em si mesmo, em sua solidão interior. As grandes perguntas do período são: o que é felicidade? Qual é o bem supremo? O mundo helenístico forma indivíduos. Quebra-se o laço entre ética e política, homem-cidadão. Em 146 a.C, a Grécia perde totalmente a liberdade tornando-se uma província romana.

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Para resolver os problemas do homem cosmopolita da época, relativos à ética e à verdade, surgem alguns movimentos filosóficos, dos quais destaca-remos o estoicismo e o epicurismo.

2.5.1 Epicurismo

O epicurismo foi a doutrina de maior influência no mundo romano. Deve seu nome ao pensador grego Epicuro de Samos (347/270 a.C.) que foi seu iniciador. No entanto, não difundiu suas idéias sozinho, deixou discípulos que as disseminaram, quais sejam Menequeu, Heródoto, Pitocles, Metrodoro, Hermano e Colotes.

Foi reconhecendo a importância dos sentidos e seu papel para o homem que o epicurismo delineia seus princípios éticos, tendo como base fundamental a dor evitada e o prazer almejado.

No entanto, o prazer que defende o epicurismo é a ausência de dor. Epicuro afirmava que quando dizemos que o prazer é a meta, não nos refe-rimos aos prazeres terrenos dos depravados e dos bêbados, como imaginam os que desconhecem nosso pensamento ou nos combatem ou nos compre-endem mal, e sim à ausência de dor psíquica e à ataraxia da alma.

Ataraxia: os estóicos identificam a ataraxia com a apatia, isto é, a serenidade inte-lectual, o domínio de si, o estado da alma que se tornou estranha às desordens das

paixões e insensível à dor, rejeitando a procura da felicidade. Já que as “coisas” não podem ser de outro modo, o mais sensato é acomodarmo-nos.

A ética social epicurista, uma vez compreendida, leva à conclusão de que a consciência de dor e de prazer induz o homem a se furtar da dor, e, portanto, a evitar produzi-la injustamente em outrem. Fazendo, com isso, surgir a ética social do prazer. Assim, o homem que sofre torna-se sensível ao sofrimento do outro. Aqui está a chave da sociabilidade ética do epicurismo, e também a chave para a compreensão dos preceitos de justiça. A justiça consiste em conservar-se longe da possibilidade de causar dano a outrem e de sofrê-lo; consiste naqueles lugares em que se concluiu um pacto para não causar e não sofrer danos.

Para o epicurismo, a sensação é a origem de tudo, uma vez que a busca do prazer e a repulsão à dor, a si e por conseqüência a outrem, fazem com que as relações humanas sejam firmadas em pactos, a fim de gozar de um bem estar social.

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UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 39

Com o advento do cristianismo, os epicuristas eram vistos como sinônimo de perdição, pois negavam a imortalidade e a existência de um deus benévolo e afirmavam ser fundamental viver os valores deste mundo.

A filosofia epicurista, no entanto, é considerada muito semelhante ao huma-nismo científico e liberal do século XX. Essa filosofia foi a primeira versão raciona-lizada de uma postura de vida que tem sido muito abraçada em nossa época.

2.5.2 Estoicismo

O estoicismo é uma filosofia que preconiza que o homem deve enfrentar o seu destino com coragem e dignidade e suportar a dor. Os estóicos conside-ravam que o bem supremo era uma vida virtuosa.

Foi fundado no século IV a.C. e teve influências em toda filosofia Antiga e Medieval-Cristã. A palavra estoicismo vem de Stoa que significa pórtico (entrada do Templo ou Edifício Nobre). Os estóicos ensinavam sob os pórticos de Atenas. Expoentes: Zenão – fundador da Escola. Crisipo, Epicleto, Sêneca e Marco Aurélio.

Surgiu na Grécia, mas foi em Roma que exerceu grande influência, facilitada pela austera psicologia do cidadão romano que constituíra o império. Filosofia que influenciou com mais força o Cristianismo e tornou-se indispensável para a preservação do Direito greco-romano. Ao expandir suas fronteiras, formando um vasto império, Roma desenvolve conhe-cimentos práticos, tais como construir estradas duradouras para trânsito de seus soldados e das mercadorias, e absorve a ética estóica, enquanto necessita de guerreiros fortes, valentes e destemidos, que saibam controlar as paixões e a dor.

O Estoicismo busca explicar o mundo, os fenômenos naturais e estabe-lecer uma ética para o homem, desenvolvendo dois valores: a igualdade e a liberdade. O ser humano só é livre quando a vontade é autônoma, e isso era possível na Grécia, onde os cidadãos tinham autonomia para criar suas normas jurídicas. Com o surgimento do Império, os indivíduos perderam sua função e isso fez com que surgisse uma nova concepção do homem.

A filosofia estóica afirma que “uma vez que a morte e a adversidade estão fora de nosso controle, e acontecem a todo mundo, devemos enfrentá-las com nobre resignação”. Portanto, para os estóicos, só devemos nos preocupar com aquilo que depender de nós, que estiver ao nosso alcance e aceitar com imper-turbabilidade o que foge de nossa alçada. As pessoas não devem se rebelar

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contra essa fatalidade, que não é, na visão dessa filosofia, uma tragédia. A rebelião contra isso demonstra que nossas emoções estão erradas.

Os estoicistas alertavam para a postura de que ”se todas as nossas emoções forem submetidas a nossa razão, só admitirão juízos verdadeiros, e assim nos poremos de acordo com as coisas como realmente são”.

A ética estóica é uma ética da ataraxia, voltada não só para a finalidade da conduta humana, mas para a ação, pois é nela que reside a capacidade de conferir felicidade ao homem. A ética estóica determina os cumprimentos éticos pelo simples dever, ou seja, a ética deve ser cumprida porque trata de mandamentos certos e incontornáveis da ação, mandamentos esses decor-rentes de lei natural; é a intuição das normas naturais que conferem ao homem a capacidade de discernir o que é favorável e o que é desfavorável ao seu bom agir. Isso vem bem espelhado nas obras de Cícero, quando explica que se não se deve agir pelo temor social da punição, mas a vontade de praticar justiça deve ser o móvel da ação.

A ética estóica teve influência indiscutível sobre a ética cristã. Os termos estóico e estoicismo, no uso familiar de nossa língua, significam “enfrentar a adversidade sem se queixar”.

Síntese da aula

O Movimento Sofista trouxe para o centro da reflexão filosófica a discussão das questões humanistas. O objetivo de Sócrates era incitar os homens a se preocupar, antes de tudo, com os interesses da própria alma, procurando adquirir sabedoria e virtude. Sócrates, por meio da dialética e da ironia, procurava desmascarar a falsa sabedoria e chegar a um conhecimento da natureza humana. Para Platão, existem dois tipos de realidade: o mundo em que vivemos, do qual temos apenas um conhecimento sensível, aparente. E, por outro lado, um mundo ideal, que são as essências, com existência própria, fora deste mundo, que só atingimos por meio do conhecimento racional após uma purificação do conhecimento sensório. Aristóteles rejeitou a teoria das idéias de seu mestre Platão, privilegiando o mundo concreto. A observação da realidade, segundo Aristóteles, leva-nos à constatação da existência de inúmeros seres individuais concretos e mutáveis que são captados por nossos sentidos. Partindo da realidade sensorial-empírica, a ciência deve buscar as estruturas essenciais de cada ser. Para Aristóteles, o homem encontra as virtudes éticas já prontas. São transmitidas pela ordem estabelecida na sociedade e

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no Estado (pólis). Tais virtudes têm validade e consentimento universal (por exemplo, prudência, generosidade). A atitude ética não nasce inicialmente dos julgamentos, mas é adquirida graças à prática: pelo exercício, hábito, aprendizagem.

Após a decadência política e econômica da Grécia Antiga com a invasão por Alexandre Magno da Macedônia, a cultura construída pelos gregos permanece e se expande por meio das conquistas de Alexandre, constituindo o fenômeno hoje conhecido por helenismo. O declínio da pólis não corresponde ao nascimento de organismos políticos fortes capazes de ser referência moral e acender novos ideais. Para o epicurismo, a sensação é a origem de tudo, uma vez que a busca do prazer e a repulsão à dor, a si e, por conseqüência, a outrem, fazem com que as relações humanas sejam firmadas em pactos, a fim de gozar de um bem estar social. O maior destaque da filosofia estóica é a capacidade de suportar as vicissitudes da vida com calma e dignidade.

Atividades

1. Vimos na aula que os sofistas foram os grandes educadores dos filhos dos ricos comerciantes que queriam participar da vida politica da pólis grega. Quais são os grupos sociais em ascensão atualmente? Que tipo de educação/treinamento procuram?

2. Elabore uma análise crítica de 15 linhas da frase de Sócrates “mais vale um homem feliz do que um porco satisfeito”.

3. Nas afirmações a seguir indique as verdadeiras e as falsas e depois marque a sequência correta.

( ) Platão dividiu a realidade em Mundo Sensível e Mundo das Idéias.

( ) No Mito da Caverna Aristóteles defende que o homem é um animal político.

( ) Junto com Sócrates, Platão e Aristóteles são considerados os mais importantes pensadores da antiguidade grega.

( ) No período Helenista a cultura grega foi ignorada. Neste período foi enaltecida a cultura romana.

A seqüência correta é:

a) F, F, V, F

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AULA 2 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

42 1º PERÍODO • SERVIÇO SOCIAL • UNITINS

b) V, F, V, F

c) V, V, F, F

d) F, V, F, V

4. Após a decadência política e econômica da Grécia Antiga com a invasão por Alexandre Magno da Macedônia, a cultura construída pelos gregos permanece e se expande por meio das conquistas de Alexandre, cons-tituindo o fenômeno hoje conhecido por helenismo. Entre as principais características do helenismo pode-se afirmar que:

a) era uma forma de pensamento original superior à filosofia feita pelos clássicos gregos;

b) privilegiava a ação individual em oposição à tendência política dos gregos;

c) buscava compreender a origem do mundo e do ser humano;

d) promovia um forte compromisso social entre as pessoas.

Comentário das atividades

Na atividade 1, procure identificar que grupos sociais estão em ascensão hoje, onde estudam, que cursos preferem, se estudam em escolas ou universi-dades públicas ou privadas. Que tipo de pedagogia e ideologia as escolas e universidades reforçam.

Na atividade 2, procure as definições éticas em Sócrates, como a doutrina da educação da alma para responder adequadamente esta questão. Atente também para a crítica de Sócrates em relação à sociedade grega que se preo-cuparia demasiado com coisas fúteis e sem sentido.

Na atividade 3, procure trazer as seguintes idéias: Platão, autor da República, dividiu a realidade em mundo sensível e mundo das idéias. Aristóteles afirmava que o homem é um animal político no livro Política. Sócrates, Platão e Aristóteles são os principais representantes da antiguidade grega. Eles enalte-ceram a cultura grega e esta foi assumida como modelo por Alexandre durante o Helenismo.

Na atividade 4, reveja as características do helenismo como ausência de pensamento original, preocupação com aspectos individuais e éticos em detri-mento de um pensamento político e social típico da sociedade grega.

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UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 43

ReferênciasCHAUÍ, Marilena. Convite à filosofia. 6. ed. São Paulo: Ática, 1997.

MAGEE, Bryan. História da filosofia. 3. ed. São Paulo: Loyola, 2001.

Na próxima aula

Um período histórico cria as condições e contradições para o surgimento de outro. Neste sentido, com o declínio da pólis grega e a afirmação do hele-nismo vão surgindo lentamente as características do que seria uma nova época histórica, a Idade Média. No contexto do Império Romano e do Helenismo surgirá o cristianismo que, com seu novo quadro de valores e crenças, vai caracterizar o período medieval. As características da idade medieval e os seus principais representantes, Santo Agostinho e Tomás de Aquino são os temas que veremos na próxima aula.

Anotações

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AULA 2 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

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AULA 3 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 45

Objetivos

Esperamos que, ao final desta aula, você seja capaz de:

identificar os principais paradigmas do pensamento filosófico medieval ligados à ética e à cidadania;

caracterizar o pensamento de Santo Agostinho e Tomás de Aquino.

Pré-requisitos

Para bem compreender os temas desta aula retome as principais caracte-rísticas da antiguidade clássica ligados à questão da ética e da cidadania. Faça uma síntese do pensamento dos Sofistas, Sócrates, Platão e Aristóteles, bem como tenha presente as contradições da sociedade helenística que deram as bases da construção do pensamento medieval.

Introdução

O cristianismo surge a partir do movimento iniciado por Jesus Cristo e, logo após sua morte, começa a propagar-se por meio de seus seguidores, introduzindo no mundo romano, junto às camadas mais desfavorecidas, novas crenças e valores que começam a sacudir os deuses do império romano que, então, serviam como uma das ideologias para sustentar a organização social do imenso império conquistado.

Durante os mil anos entre a queda do Império Romano (séc. V d.C.) e o Renascimento (séc. XV), a Europa absorve a religião professada pela Igreja Católica.

A partir do séc. III d.C., o pensamento religioso toma um lugar fundamental na filosofia ocidental. No período medieval, três religiões vão influenciar o pensamento europeu: cristianismo, judaísmo e islamismo.

Aula 3Pressupostos filosóficos da ética e

da cidadania na Idade Média

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AULA 3 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

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3.1 Contextualizando a Idade Média

A Idade Média é o longo período que vai de 476 (queda do Império Romano do Ocidente) até 1453 (queda do Império Romano do Oriente, tomada de Constantinopla pelos Turcos–Otomanos).

O antigo império romano foi se dividindo pouco a pouco em três espaços culturais diferentes. A cultura cristã de língua latina formou-se na Europa, cuja capital era Roma. Já na Europa oriental surgiu um núcleo cultural cristão de língua grega, cuja capital era Bizâncio. O norte da África e o Oriente Médio tinham pertencido ao Império Romano. Nessas regiões desenvolveu-se, na Idade Média, uma cultura muçulmana de língua árabe.

Em conseqüência, a filosofia grega tomou três rumos diferentes. A cultura católico-romana no ocidente, a cultura romano-oriental e a cultura árabe. No período medieval, os únicos letrados, e que, portanto, tinham acesso ao conhe-cimento, eram os monges. Então a temática da época estava relacionada à tentativa de conciliar a fé com a razão.

O Método da disputa era típico da filosofia medieval e consistia na expo-sição de idéias filosóficas em que a tese era apresentada e devia ser refutada ou defendida por argumentos tirados da Bíblia, de Aristóteles, Platão ou de outros padres da Igreja. Esse método era conhecido também como Princípio da Autoridade. Observe o que dizem Aranha e Martins na citação a seguir:

O desejo de unidade de poder, de restauração da antiga ordem perdida se expressa na difusão do cristianismo que representa, na Idade Média, o ideal de Estado Universal. Desde o final do Império Romano, quando o cristianismo obteve liberdade de culto do Império no ano 313, estabelece-se a ligação entre Estado e Igreja. A igreja legitima o poder do Estado, atribuindo-lhe uma origem divina (ARANHA; MARTINS, 1996, p. 199).

O período medieval tinha a concepção de que o homem teria a natureza sujeita ao pecado e ao descontrole das paixões, o que exige vigilância cons-tante, cabendo ao Estado intimidar os homens para que agissem corretamente. Há, dessa forma, uma estreita ligação entre política e moral, com a exigência de se formar o governante justo, que consiga obrigar, muitas vezes pelo medo, a obediência aos princípios da moral cristã. O Estado medieval tem em suas mãos o poder temporal, voltado para as necessidades mundanas. A igreja possui o poder espiritual, voltado para os interesses da salvação da alma, que é o obje-tivo e horizonte ético central do homem medieval e deve encaminhar o rebanho para a verdadeira religião por meio da força da educação e da persuasão.

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AULA 3 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 47

A fé popular nem sempre se manifestava nos termos pretendidos pela doutrina católica. Havia uma série de crenças e ações, denominadas heresias, que se chocavam com os dogmas da Igreja. O papa Gregório IX criou, em 1231, os tribunais da inquisição que tinham como objetivo combater as heresias.

Os tribunais da inquisição atuaram em vários reinos cristãos: Itália, França, Alemanha, Portugal e, sobretudo, Espanha. Pressionada pelas monarquias cató-licas, a inquisição atuou no combate aos movimentos contrários à ordem social dominante, desempenhando também papel de repressão social e política.

A formação da sociedade feudal–medieval se dá efetivamente com a instalação de um modo de produção: o feudalismo. A insegurança provo-cada pelas invasões dos séculos IX e X obrigou as populações a se prote-gerem. Muitas pessoas migraram da cidade para o campo. Construíram-se vilas fortificadas e castelos cercados por muralhas. Cada um se defendia como podia. Os mais fracos procuravam ajuda de nobres poderosos. Já os camponeses, que buscavam a proteção dos senhores de terra, foram subme-tidos à servidão.

Um fator histórico relevante é que, com a decadência da escravidão, desestruturação do Império Romano e as invasões dos povos considerados “bárbaros”, há uma transformação nas relações de trabalho e na sociedade em geral que resultou na estruturação da sociedade feudal.

O sistema feudal tem como características principais:

a terra é o principal meio de produção e pertencia aos senhores feudais;

a sociedade é rigidamente hierarquizada, tendo como classes sociais: senhores feudais, clero e servos;

os trabalhadores tinham direito ao usufruto e à ocupação das terras, mas nunca à propriedade delas. Os senhores, por meio dos laços feudais, tinham o direito de arrecadar tributos sobre os produtos ou sobre a própria terra;

existência de um sistema de deveres entre senhores e servos. Os servos trabalhavam em regime de servidão, no qual não se goza de plena liberdade, mas, também, não se é escravo;

os servos eram os que efetivamente trabalhavam; os senhores feudais e o clero viviam do trabalho dos outros.

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AULA 3 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

48 1º PERÍODO • SERVIÇO SOCIAL • UNITINS

A servidão na sociedade feudal perdurou um longo tempo porque havia forte solidariedade entre as famílias senhoriais, cumprimento irrestrito de compromissos e juramentos, e também pela presença da igreja sancionando esses compromissos, definindo claramente o lugar das classes servis nessa comunidade. Desse modo, os senhores conseguem não só manter pleno domínio da situação, mas também fazer com que essa dominação fosse aceita pelos dominados.

Essa situação, que se manteve durante séculos sem contradições e conflitos, começou a mudar no século XIV. A crise da sociedade feudal foi fruto da fome, doenças (peste negra), Guerra dos Cem Anos (Entre Inglaterra e França), insur-reições camponesas, etc.

Com a desestruturação da sociedade feudal, surgem os primeiros sinais da constituição lenta e permanente de um novo modo de produção: o capitalista.

Nesse longo período, portanto, a igreja romana dominava a Europa, ungia e coroava reis, organizava cruzadas à terra santa e criava, em volta das catedrais, as primeiras universidades e escolas.

A ética predominante no período medieval é a cristã, esta se distingue das antigas nos seguintes aspectos:

os antigos tinham por objetivo assegurar sua felicidade terrestre. A religião cristã centra a conquista da felicidade como um esforço do indivíduo para alcançar a felicidade eterna fora da terra;

os antigos consideravam que a via moral é uma via conforme a natu-reza do homem. A via da moral cristã é ao contrário, transcendente, a lei divina se impõe sobre o homem, ultrapassa a ordem natural e é conhecida pela revelação; é exterior ao homem, é imposta sob forma de uma obrigação, um dever.

No estabelecimento das relações entre Ética e Política, enquanto Aristóteles associava como virtude máxima a justiça de responsabilidade do Estado, Cristo ensina uma moral cujos fundamentos implicam uma anulação do pensamento político. Dizia: “meu reino não é deste mundo”, “façam penitência porque o reino de Deus está próximo”, explicitando que a via dos cristãos deve estar voltada para o céu.

O apóstolo São Paulo modifica esta doutrina: “que toda pessoa seja submissa às autoridades superiores, porque toda autoridade vem de Deus

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AULA 3 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 49

e as autoridades que existem foram instituídas por Deus” (epístola aos Romanos).

3.2 Patrística e Escolástica

O grande problema enfrentado pela filosofia na Idade Média foi defender a fé cristã dos questionamentos feitos pela filosofia. Justificar racionalmente a fé e assim propagá-la ao mundo inteiro.

Vejamos como os dois principais movimentos filosóficos do período – a Patrística representada por Agostinho de Hipona, e a escolástica, por Tomás de Aquino – se desdobram nessa tarefa.

3.2.1 A Patrística

Na primeira etapa de formação da Idade Média, em relação ao pensa-mento da igreja, destaca-se a filosofia chamada Patrística (entre séc. II e VII d.C), cuja principal figura é Santo Agostinho. É o período da história da filosofia caracterizado pelo esforço feito pelos apóstolos Paulo e João e pelos primeiros padres da Igreja para conciliar a nova religião – o Cristianismo – com o pensamento filosófico dos gregos e romanos, pois somente com tal conciliação seria possível convencer os pagãos da nova verdade e conver-tê-los a ela.

A filosofia patrística tem a tarefa religiosa de evangelização e defesa da religião cristã contra os ataques teóricos e morais que recebia dos antigos. A Patrística foi obrigada a introduzir idéias desconhecidas para os filósofos greco-romanos: a idéia de criação do mundo, pecado original, encarnação e morte de Deus, juízo final, fim dos tempos e ressurreição dos mortos. Como pode existir o mal se tudo foi criado por Deus?

Para impor as idéias cristãs, os padres as transformaram em dogmas que são verdades reveladas por Deus por meio da bíblia e dos santos. Por serem divinos, os dogmas eram considerados irrefutáveis e inquestionáveis.

Quanto aos temas centrais do período, fé e razão, os pensadores assu-miam três posições distintas. São elas:

fé e razão são irreconciliáveis: a fé é superior à razão;

fé e razão são conciliáveis: a razão é subordinada a fé;

fé e razão são irreconciliáveis: cada uma tem um campo de atuação específico.

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AULA 3 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

50 1º PERÍODO • SERVIÇO SOCIAL • UNITINS

3.2.2 Santo Agostinho

Agostinho nasceu em Tagaste, atual Argélia, norte da África em 354. Foi bispo de Hipona, também norte da África, por isso é conhecido como Agostinho de Hipona. Sua vida pode ser dividida em dois períodos distintos: antes da conversão e depois da conversão ao cristianismo. Antes da conversão Agostinho interessa-se principalmente por retórica e filosofia. Depois da conversão, concentra seu interesse, sobretudo, na Sagrada Escritura e na teologia.

Santo Agostinho cria uma doutrina para conciliar a filosofia grega, princi-palmente o pensamento de Platão, com o cristianismo. Antes de sua conversão ao cristianismo, adotou a doutrina maniqueísta do profeta persa Mani, do século III d. C, que partia do princípio de que o universo é o campo de batalha entre as forças do bem e do mal, da luz e da treva. Considerava, esse profeta, que a matéria é má, mas o espírito é bom, sendo cada ser humano uma mistura de ambos, com uma luz que vem da alma que anseia libertar-se da matéria do seu corpo.

Entretanto, Agostinho abandonou essa doutrina e buscou a fonte nos textos de Platão e de Plotino, também grego (204-269 d.C.), que seguiu o pensa-mento místico de Platão. Embora não professasse a religião cristã, Plotino exerceu enorme influência nos dois maiores filósofos cristãos, Santo Agostinho e Santo Tomás de Aquino.

O cristianismo, centrado, sobretudo, nas práticas morais, não apresen-tava uma filosofia. Cristo não se preocupava em discutir questões filosóficas. Portanto, unir a filosofia platônica de um lado e, do outro, uma religião não-filosófica, abriu perspectivas para a união desses dois campos.

Nos anos próximos de sua morte, Agostinho vivenciou o desmoronamento do Império Romano. O mundo civilizado que conheceu estava sendo destruído, entre outras razões, pelas invasões de hordas, chamadas pelos romanos de bárbaros.

Comenta Magee (2001) que certamente essas circunstâncias influen-ciaram em sua visão pessimista sobre a natureza humana, como decadente e de caráter pecaminoso, e do mundo em que temos de viver.

Analisa em seu livro A Cidade de Deus a questão de como cada indivíduo é um cidadão de duas comunidades diferentes ao mesmo tempo. A cidade de Deus e a cidade dos homens. Na primeira, está o reino de Deus, imutável,

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AULA 3 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 51

eterno e baseado em valores verdadeiros; na segunda, estão os reinos alta-mente instáveis deste mundo, com seus valores fugazes e falsos.

Nesse sentido, lembre-se da teoria platônica das duas realidades, a das essências verdadeiras, fora deste mundo, e a das aparências, que é o próprio mundo onde vivemos, teoria em cuja fonte Agostinho foi buscar fundamentos para sua filosofia ética.

Nossa verdadeira cidadania, portanto, não é deste mundo, mas do outro. A outra influência que reflete em sua filosofia ética é também sua própria vida pessoal, que na juventude foi vivida na boemia e nos prazeres terrenos e, após sua conversão ao cristianismo, busca novos valores com fundamentos na ética do cristianismo. Sua conversão e sua vida são relatadas em sua famosa obra As confissões.

O conceito fundamental da ética agostiniana é o amor que coincide com a vontade. O fim do esforço humano é a felicidade, que é alcançada não por meio dos apetites de bens materiais particulares, mas em Deus, imutável. Deus criou o homem a sua imagem e semelhança e é somente nele que o homem pode encontrar-se, pelo amor.

3.2.3 Escolástica

No longo período histórico de formação da Idade Média (entre os séc. IV ao XIII - período áureo da Idade Média), grandes civilizações desenvolve-ram-se em outras partes do mundo. Nesse período, o Islã prosperou em todo o território do que fora o Império de Alexandre, disseminando-se pela África do Norte até a Espanha. Foi o mundo islâmico que preservou grande parte da cultura clássica, como, por exemplo, as obras de Aristóteles que, no século XIII, foram reintroduzidas na Europa, além de levar sua cultura com grande efeito transformador para o desenvolvimento intelectual europeu.

Também, nesse longo período, a civilização chinesa desenvolveu ampla-mente sua cultura e, de igual modo, os japoneses.

O período de reflorescimento da cultura européia é conhecido também sob a denominação de Escolástico. Nos séculos IX, X, XI e XII são debatidas muitas questões filosóficas que preparam o advento de ouro do século XIII.

Por que Escolástico? Ao longo desse período, são criadas escolas, as futuras universidades, onde teólogos, professores e alunos debatem temas filo-sóficos à luz da religião.

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52 1º PERÍODO • SERVIÇO SOCIAL • UNITINS

No século XIII, renasce o pensamento filosófico europeu, de forma siste-mática, e refloresce a cultura. Ocorre um grande intercâmbio entre filósofos árabes e cristãos, são construídas as grandes catedrais góticas francesas; na Inglaterra, são fundadas as Universidades de Oxford e Cambridge, onde se iniciam pesquisas lideradas por Rogério Bacon.

As universidades surgem também em Paris e em outras cidades impor-tantes, onde se desenvolvem as disputas filosóficas à luz da teologia, ou seja, da fé católica, cujos pensadores, padres e alunos, buscam fundamentar os dogmas da Igreja com base no raciocínio filosófico.

3.2.4 Tomás de Aquino

Nasceu em Roccasecca, Itália, em 1225. Em 1239 entrou para a Universidade de Nápoles e pouco depois para a ordem dos dominicanos. Depois de obter o grau de mestre em teologia, ensinou essa disciplina na Universidade Sorbonne em Paris e mais tarde assumiu o cargo de teólogo papal na corte pontifícia. Passou seus últimos anos no convento de Nápoles, compondo a Suma Teologia, comentando Aristóteles e pregando ao povo.

Tomás de Aquino sobressai nesta tarefa quando, ao estudar a filosofia de Aristóteles, introduzida pelos árabes, absorve-a e sistematiza o pensamento teológico da Igreja Católica.

O problema das relações entre fé e razão é também a temática central do pensamento de Tomás de Aquino.

Na obra Suma Teológica, Tomás de Aquino expõe sua doutrina básica no estudo do que significava a justiça como problema ligado à ação humana. No que se diz respeito à natureza humana, Santo Tomás definia que o homem é composto de corpo e de alma, sendo aquele o material para o aperfeiçoa-mento da alma, criado por Deus. Aperfeiçoamento que se dá porque a alma animal pode ser sensitiva ou intelectual. É na atividade intelectual do homem que ele particulariza e diferencia sua alma.

Para ele, a filosofia deveria subordinar-se à revelação, que é critério único de verdade. Tomás definiu o termo justiça mesclado no conceito de ética, afir-mando assim, com base nas influências aristotélicas, que justiça é uma vontade

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AULA 3 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 53

perene de dar a cada um o que é seu. Caracterizando a justiça como igual-dade de pessoas, exteriorizada no comportamento dessas pessoas em poder discernir o que é seu e o que não é.

No século XIX, a Igreja Católica escolhe sua obra para fundamentar o dogma cristão. Para Tomás, fé e razão não podem se contradizer na medida que ambas emanam de Deus. Em conseqüência, filosofia e teologia não podem apresentar verdades divergentes, apenas diferem pelo método: a filosofia parte das coisas criadas para alcançar Deus, enquanto a teologia tem como ponto de partida Deus.

No âmbito de nosso estudo, vamos compreender a filosofia ética de Tomás de Aquino: O “bem” transcendental é objeto da ética. O bem é uma realidade que se apresenta como uma perfeição e que é, portanto, o fim de uma aspi-ração para um outro ser.

Para Tomás de Aquino, o bem supremo, Deus, é contemplado com plena felicidade por determinação da alma racional, cujas virtudes o filósofo distingue entre teologais e cardinais naturais.

As Teologais só são acessíveis ao homem por meio da graça de Deus: fé, amor, esperança, em que o amor ordena todos os atos humanos para o fim divino supremo.

As Cardinais são definidas como perfeição das faculdades naturais. Assim é preciso buscar na razão a sabedoria e a inteligência; na vontade, a justiça; no esforço, a coragem; no desejo, a temperança.

Para Tomás, as virtudes definem a atitude interior do homem; a ordem exterior e as ações são dirigidas pelas leis. O legislador supremo é Deus, pois é o legislador de todo o universo. A lei eterna é a sabedoria divina que tudo dirige. A participação da razão humana na lei eterna é pela lei natural.

Por outro lado, a liberdade de querer não está limitada pela lei divina. Somente em relação à natureza destituída de razão é que a lei age por neces-sidade interna. Para o homem, entretanto, a lei assume um caráter de uma lei normativa e, nessa medida, o homem participa da providência divina, pois é capaz de prever para si e para os outros. É preciso fazer o bem e evitar o mal.

Finalizando, Tomás de Aquino, ao elaborar seu tratado teológico com base na filosofia aristotélica, buscando também fontes no pensamento judaico e islâmico, demonstrou, na época, que havia compatibilidade entre pensa-mento filosófico e crença cristã. Procurou, entretanto, distinguir sempre filosofia e religião, razão e fé.

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AULA 3 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

54 1º PERÍODO • SERVIÇO SOCIAL • UNITINS

Síntese da aula

A servidão na sociedade feudal perdurou um longo tempo porque havia forte solidariedade entre as famílias senhoriais, cumprimento irrestrito de compromissos e juramentos, e também pela presença da igreja sancio-nando esses compromissos, definindo claramente o lugar das classes servis nessa comunidade.

O período medieval tinha a concepção de que o homem teria a natu-reza sujeita ao pecado e ao descontrole das paixões, o que exige vigi-lância constante, cabendo ao Estado intimidar os homens para que agissem corretamente.

A ética cristã se diferencia da demais por compreender que a felicidade só será alcançada em vida fora da vida terrena. Compreende também que a ética deve ser transcendente, isto é, por meio da revelação divina o ser humano deve cumprir o seu dever de agir em conformidade com os ensinamentos das escrituras sagradas.

A filosofia patrística tem a tarefa religiosa de evangelização e defesa da religião cristã contra os ataques teóricos e morais que recebia dos antigos.

Santo Agostinho cria uma doutrina para conciliar a filosofia grega, princi-palmente o pensamento de Platão, com o cristianismo.

Para Tomás, fé e razão não podem se contradizer na medida que ambas emanam de Deus. Em conseqüência, filosofia e teologia não podem apre-sentar verdades divergentes, apenas diferem pelo método: a filosofia parte das coisas criadas para alcançar Deus, enquanto a teologia tem, como ponto de partida, Deus.

Atividades

1. Comente a afirmação “na Idade Média o importante não era ser cidadão, era ser fiel”. O que isso implica na questão da cidadania e da ética?

2. Vimos, nesta aula, que o grande problema enfrentado pela filosofia medieval foi conciliar fé e razão. Elabore um texto crítico de 15 linhas analisando que tipo de relação é possível entre religião e filosofia.

3. No período medieval a cidadania perde o caráter de participação política. Nesta época são mais importantes os valores espirituais que os materiais. Quais foram os dois principais representantes deste período histórico?

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AULA 3 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 55

( ) Platão e Aristóteles

( ) Plotino e Sêneca

( ) Santo Agostinho e Santo Tomás de Aquino

( ) Maquiavel e Fílon de Alexandria

4. O espírito renascentista provocou mudanças no interior da Igreja Católica, que foi duramente criticada neste período. As insatisfações culminaram com um movimento de ruptura na unidade cristã. Assinale a alternativa a seguir que corresponde a este movimento.

a) Reforma Eclesial

b) Reforma Protestante

c) Reforma Feudal

d) Reforma Renascentista

Comentário das atividades

Na atividade 1, procure relacionar como as crenças cegas em determinados dogmas e crenças limitam a atuação cidadã. Você também pode contextualizar o período falando dos motivos pelos quais as pessoas priorizavam a religiosidade.

Na atividade 2, escreva sobre as características da filosofia medieval cujo tema central eram as relações entre fé e razão. Lembre-se de que a razão era serva da fé. Analise como se dão também atualmente estas relações, procure ouvir o que outras pessoas pensam a respeito das relações entre filosofia e religião.

Na atividade 3, identifique, por meio da leitura atenta do texto, as contribui-ções de Santo Agostinho e Santo Tomás de Aquino para o pensamento medieval.

Na atividade 4, observe que o Renascimento foi especialmente crítico em relação à interferência da Igreja em todas as atividades humanas. Esse posi-cionamento provocou a Reforma Protestante, que promoveu o rompimento da unidade católica na Europa.

Sugestão de filmes: O Nome da Rosa, Em nome de Deus, Cruzada.

ReferênciasARANHA, Maria Lúcia de Arruda; MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: introdução à filosofia. 2. ed. São Paulo: Moderna, 1996.

MAGEE, Bryan. História da filosofia. 3. ed. São Paulo: Loyola, 2001.

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AULA 3 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

56 1º PERÍODO • SERVIÇO SOCIAL • UNITINS

Na próxima aula

A sociedade caracterizada pelo teocentrismo e sob forte influência da religião será contestada pelo Renascimento, movimento cultural que buscou retomar alguns conceitos da antiguidade clássica, principalmente o antropo-centrismo. O Renascimento fará a transição da sociedade medieval para a modernidade. Esse período é marcado pela crítica à religião que culminará com a Reforma Protestante. Todo contexto moderno junto com os seus represen-tantes como Maquiavel, Bacon, Galileu e Descartes serão objeto de análise e reflexão na nossa próxima aula.

Anotações

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AULA 4 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 57

Objetivos

Esperamos que, ao final desta aula, você seja capaz de:

reconhecer as principais características e movimentos do Renascimento, contextualizando a importância da Reforma Protestante e o pensa-mento maquiaveliano no processo de construção da modernidade;

analisar os movimentos filosóficos do empirismo e do racionalismo a partir da análise de como se produz o conhecimento.

Pré-requisitos

Para que você possa aproveitar melhor esta aula, procure rever como é o processo de controle do poder político e intelectual da Igreja na Idade Média, esse conteúdo foi apresentado na aula anterior. Essa revisão é importante para compreender as reações promovidas a partir do renascimento e da moderni-dade, assuntos desta aula.

Introdução

A Idade Média representou o apogeu de uma sociedade fundada em valores transcendentais, sustentados por uma visão de mundo dualista: as coisas de Deus são boas, o mundo é apenas um obstáculo para a realização da plenitude humana possível só em outra vida.

A modernidade vem oferecer ao homem a possibilidade de ele próprio cons-truir o seu destino, aqui mesmo, utilizando-se da sua razão, da sua capacidade de pensar. A partir da modernidade, o ser humano é desafiado a construir um sentido novo para seu existir: buscar a felicidade por seus próprios méritos.

Se na Idade Média os valores são transcendentais, são justificados por Deus, a partir de agora, a visão de mundo é imanente, isto é, a razão humana deverá

Aula 4Modernidade

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justificar, segundo seus critérios, a ordem vindoura. Esta concepção transformará a organização social, o modo de produzir conhecimento, a regulação da vida cotidiana e a atitude humana perante o mundo e os demais humanos.

4.1 O Renascimento: gestação da modernidade

A partir do século XI, ou seja, na baixa Idade Média, a Europa passa por um processo de reurbanização provocado pela intensa atividade comercial desenvolvida com o oriente. Em torno dos castelos medievais, vão se formando pequenas aglomerações urbanas. Na maioria dos casos, são pessoas expulsas dos feudos devido ao excedente populacional. O comércio e outros ofícios passam a ser a ocupação dessas pessoas. A maioria desses centros urbanos nascentes encontra-se no caminho de grandes rotas comerciais. O que se percebe com isso é o fortalecimento das famílias comerciais, o crescimento dos centros urbanos, o enfraquecimento dos antigos senhores feudais.

Renascimento: o movimento intelectual e cultural que caracterizou a transição da menta-lidade medieval para a mentalidade moderna ficou conhecido como Renascimento. Esse nome se dá porque muitos artistas, intelectuais e cientistas do século XV e XVI quiseram recuperar ou retomar a cultura antiga, greco-romana, que esmorecera na Idade Média, buscar novos caminhos para a investigação científica. O Renascimento iniciou-se na Itália, principalmente nas cidades de Florença, Veneza e Roma.

A burguesia, classe social emergente, sente-se prejudicada, pois, atrelada aos padrões tributários e políticos da sociedade feudal, não pode se desen-volver de forma satisfatória. Para que o capitalismo comercial, então, nos seus primórdios, possa progredir, a burguesia necessita de se desvincular do poder da Igreja e da estrutura feudal.

Essas transformações, juntamente com as grandes navegações e a conse-qüente conquista do continente americano, constituem o embrião da formação do capitalismo na Europa e nos Estados Unidos, a revolução econômica, cultural, social e política do mundo ocidental.

Com a redescoberta das obras dos pensadores greco-romanos, foi possível retomar valores como o uso da razão e a vida política em uma sociedade repu-blicana. Isso despertou o desejo de liberdade em relação ao poder teológico político dos papas e imperadores. A cultura grega foi redescoberta, graças a um contato mais estreito com os árabes na Espanha e com a cultura bizantina. É

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UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 59

aqui que se encontram, em uma só, as três correntes de pensamento que preser-varam a cultura grega, as quais haviam se separado no início da Idade Média, quais sejam: cultura católico-romana no ocidente (Roma), cultura romano-oriental (Bizâncio) e cultura árabe.

Para os renascentistas, Roma, Atenas, Esparta são tomadas como modelo de cidade, por representar o ideal republicano. Tê-las por modelo significa valorizar a vida ativa da prática política contra o ideal de contemplação e submissão imposto pela Igreja.

República: forma de governo em que o poder supremo é exercido por um ou mais indivíduos eleitos pelo povo e em que há uma separação entre a coisa

pública e os interesses individuais do governante.

Dessas atitudes, teremos, como conseqüência, as duas principais caracte-rísticas do mundo renascentista: o humanismo antropocêntrico e o racionalismo. Para o humanismo antropocêntrico, o ser humano é o centro da vida política e cultural. Essa proposição tem um claro sentido de se opor ao teocentrismo (Deus como ponto de partida das explicações). Porém, não se quer afirmar o ser humano de qualquer maneira, mas como portador de uma racionalidade capaz de desvendar os segredos da natureza e colocá-la a serviço do homem. O racionalismo quer também promover os valores do indivíduo como alguém separado de qualquer sistema de dominação ou sujeição porque os renascen-tistas desenvolvem uma crença totalmente nova no homem e em seu valor, o que se opunha frontalmente à Idade Média, quando se enfatizava apenas a natureza pecadora do homem. O homem passou a ser visto, agora, como algo infinitamente grandioso e valioso.

Essa nova visão de homem levou a uma nova concepção de vida. O homem não existia apenas para servir a Deus, mas, também, a ele próprio. O homem podia se desenvolver livremente, ele tinha possibilidades ilimitadas. Seu objetivo era ultrapassar todas as fronteiras.

O Renascimento levou também a uma nova concepção de natureza. O fato de a vida do homem na Terra não ser vista apenas como preparação para a vida no céu deu origem a uma postura completamente nova diante do mundo físico. A natureza era considerada agora algo positivo. Muitos acredi-tavam que Deus estava presente na sua criação. Se Deus é infinito, também é

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onipresente, ou seja, está presente em todo lugar (Panteísmo). Essa concepção se chocava com a concepção da Igreja que dizia que havia um abismo intrans-ponível entre Deus e sua criação.

4.2 Reforma Protestante

O espírito renascentista provocou também mudanças no interior da Igreja Católica, duramente criticada nesse período. As insatisfações culminaram com um movimento de ruptura na unidade cristã: a Reforma Protestante, cujo autor principal foi Martinho Lutero.

Martinho Lutero: fundador do Luteranismo. Nasceu em Einsleben, na Alemanha, em 1483. Ele pretendia abrir um debate para uma avaliação interna da Igreja, pois

acreditava que a Igreja precisava ser renovada, a partir do Evangelho de Jesus Cristo. Faleceu em 1546.

Segundo Cotrim (1997, p. 158-159), a reforma protestante foi motivada por diversos fatores. Dentre eles, destacaram-se:

Novas interpretações da Bíblia: com a difusão da imprensa, a Bíblia foi traduzida do aramaico e do grego para as línguas nacionais, o que possibilitou o acesso de mais pessoas à Sagrada Escritura e a novas formas de interpretação da doutrina cristã.

Corrupção do Clero: diversos cristãos começaram a condenar o comportamento do clero. O alto clero de Roma, por exemplo, vendia relíquias sagradas falsas, como espinhos que coroaram a fronte de Cristo, objetos pessoais de santos etc. Além disso, a Igreja começou a vender indulgências (perdão dos pecados). Mediante certo pagamento destinado a financiar obras da Igreja, os fiéis poderiam comprar a sua salvação. Esse comportamento do clero gerava um problema ético-religioso, pois a Igreja dizia que os sacerdotes eram os intermediários entre os homens e Deus.

Nova Ética Religiosa: a Igreja condenava o lucro excessivo, que era chamado de usura. Essa concepção entrava em choque com a ganância da burguesia que queria tirar o lucro máximo nos negócios, mas não se sentia à vontade, pois temia ir para o inferno. A ética protestante atendeu, em parte, a essa necessidade da burguesia.

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UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 61

Sentimento Nacionalista: a Igreja insistia em se apresentar como insti-tuição universal que unia o mundo cristão. Porém, os Estados nacio-nais em formação estavam interessados em afirmar as diferenças dos povos como a língua e as tradições.

A preocupação de Martinho Lutero deu-se na perspectiva religiosa. Ele queria voltar às origens, às fontes do cristianismo. Conseqüentemente, as Sagradas Escrituras eram consideradas o centro das interpretações. Para Lutero, cada um deveria ter acesso à leitura da Bíblia. Ninguém tinha o direito de ser intermediário entre o homem e Deus. Para ele, os padres não desfrutavam de uma relação privilegiada com Deus. Além disso, não se obtinha o perdão de Deus e a libertação dos pecados por meio dos rituais da Igreja. A redenção era concedida ao homem de forma inteiramente gratuita, unicamente pela fé. As obras não seriam necessárias.

4.3 Nicolau Maquiavel e o nascimento da ciência política

Maquiavel é considerado o fundador da ciência política, pois foi o primeiro a considerá-la como categoria autônoma. “As observações das ações dos homens do seu tempo e dos estudos dos antigos, sobretudo da Roma Antiga, levam-no à constatação de que os homens sempre agiram pelas vias da corrupção e da violência. Partindo do pressuposto da natureza humana capaz do mal e do erro, analisa a ação política sem se preocupar em ocultar ‘o que se faz e não se costuma dizer’. Maquiavel torna a política autônoma porque a desvincula da ética e da religião, procurando examiná-la na sua especificidade própria” (ARANHA; MARTINS,1993, p. 206).

Nicolau Maquiavel nasceu em Florença em 03 de maio de 1469, em uma Itália frag-mentada em inúmeros Estados com regimes políticos, desenvolvimento econômico e

culturas variadas. Estes Estados estavam sujeitos a disputas internas, hostilidades entre cidades vizinhas e constantes invasões externas. A maior parte dos governantes não

conseguia se manter no poder por muito tempo.

Sua obra O Príncipe tem provocado inúmeras interpretações e controvér-sias. Frases do tipo: “É necessário a um príncipe, para se manter, que aprenda a poder ser mau e que se valha ou deixe de valer-se disso segundo a necessi-dade”, daí surge a expressão “os fins justificam os meios” também relacionada à teoria política de Maquiavel:

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O príncipe virtuoso é aquele que tem a capacidade de perceber o jogo de forças que caracteriza a política para agir com energia a fim de conquistar e manter o poder. O Príncipe não deve obedecer às normas preestabelecidas da moral cristã. A ética proposta por Maquiavel analisa as ações não mais em função de uma hierarquia de valores dada a priori, mas sim em vista das conseqüências, dos resultados da ação política. O critério para se definir o que é moral é o bem da comunidade, e nesse sentido às vezes é legítimo o recurso ao mal como o emprego da força coercitiva do Estado, a guerra, a prática da espionagem, o emprego da violência. Estamos diante de uma moral imanente, mundana, que vive do relacionamento entre os homens. E se há possibilidade de os homens serem corruptos, constitui dever do príncipe manter-se no poder a qualquer custo (ARANHA; MARTINS, 1993, p. 204-205).

A finalidade da política não é, como diziam os pensadores gregos romanos e cristãos, a justiça e o bem-comum, mas, como sempre souberam os políticos, a tomada e manutenção do poder. Ao afastar a ética e moral da política, a doutrina de Maquiavel não comportava a idéia de Direito Natural, fonte dos valores morais e da justiça.

A filosofia moderna interrompe o pensamento filosófico cristão, e desen-volve suas reflexões, sem se prender à autoridade da Igreja, revelando-se estri-tamente crítica e profana. O seu objetivo é alcançar a verdade, tão somente com o auxílio da razão e do conhecimento científico. É uma postura seme-lhante, do ponto de vista do conhecimento, à dos filósofos da Grécia Antiga.

O crescimento das manufaturas, em boa parte pelo aumento da oferta dos produtos vindos das colônias da América, provoca alteração nas formas de trabalho. Os artesãos, de produção doméstica, começam a perder para os capitalistas seus instrumentos de trabalho e, reunidos em galpões onde nascem as futuras fábricas, passam a receber salário.

A nova ordem se consolida com o mercantilismo, sistema que supõe o controle da economia pelo Estado e que resultou da aliança entre reis e burgueses. Estes financiavam a Monarquia Absoluta necessitada de exército e marinha, enquanto os reis ofereciam em troca vantagens como incentivos e concessão de monopólios que aumentaram a acumulação de capital.

Politicamente, o século XVII é absolutista. Entre os teóricos que defendem o poder irrestrito dos reis, o mais conhecido é o filósofo inglês Thomas Hobbes (1588-1679). Não se trata, no entanto, de fundamentar o absolutismo no “direito divino dos reis”, mas sim no contrato, no pacto social. Esse é um sinal

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UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 63

dos tempos em que o homem abandona as explicações religiosas e busca auto-nomia da razão. A Europa, com essas transformações, entra na era conhecida como modernidade.

4.4 Entre a razão e a experiência: o fundamento do conhecimento

O debate filosófico da modernidade tem como uma de suas principais preocupações a busca do fundamento do conhecimento. Com a perda do monopólio sobre o saber por parte da Igreja e a expectativa de que a inte-ligência humana pudesse desvendar o mundo, era necessário encontrar um fundamento sólido sobre o qual o conhecimento pudesse estabelecer suas bases. De certa forma, abandonou-se a perspectiva metafísica, isto é, a que se preocupava com a essência das coisas, e procurou-se saber como era possível conhecer, o que era possível conhecer e qual o critério para se alcançar o conhecimento verdadeiro. Por isso é comum se afirmar que, a partir da modernidade, a filosofia passou a se confundir com uma teoria do conhecimento.

Nesse sentido, duas correntes propõem, de forma antagônica, a solução para esse problema: o racionalismo e o empirismo.

4.4.1 Racionalismo

Para o racionalismo, “a razão é a fonte do conhecimento verdadeiro operando por si mesma, sem o auxílio da experiência sensível, e controlando a própria experiência sensível” (CHAUÍ, 2002, p. 117).

Para o racionalismo, o ser humano é capaz de desvendar a verdade dos fatos sem o auxílio da experiência sensível. Basta usar corretamente a inteli-gência que toda a verdade pode ser alcançada. “A perspectiva racionalista é resposta aos desafios de uma sociedade que não pode mais encontrar funda-mento sócio-político na racionalidade divina enquanto revelador de seus desíg-nios para os homens” (LARA, 1986, p. 34).

A maior preocupação de Descartes era encontrar uma verdade que não pudesse ser posta em dúvida. Para alcançar essa verdade, propõe-se a ques-tionar todas as coisas em que se pode fundamentar o conhecimento. A dúvida metódica é o método utilizado por ele. Para Descartes, todos possuem a capa-cidade de conhecer o que é o certo, desde que utilizem o método adequado. Descartes não estava preocupado em construir um método universal, mas sim que fosse útil para que ele encontrasse verdades sólidas.

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64 1º PERÍODO • SERVIÇO SOCIAL • UNITINS

O percurso feito por Descartes, na aplicação da dúvida metódica, está na obra Discurso do Método. Descartes põe em dúvida as afirmações do senso comum, os argumentos de autoridade, o testemunho dos sentidos, a tradição, a fé, as informações da consciência, as verdades deduzidas pelo raciocínio, a realidade do mundo exterior, a própria realidade de seu corpo e chega à conclusão de que não são dignos de confiança. A única coisa da qual não se pode duvidar é que se duvida. E para duvidar é necessário pensar. Então ele chega à conclusão de que o pensamento é o reconhecimento de sua exis-tência. Portanto: “Penso, logo existo” – “Cogito, ergo sum”.

O pensamento, a realidade pensante é, portanto, a base, o fundamento para o conhecimento, segundo Descartes. O “eu pensante” é um puro pensa-mento, res cogitans (ser pensante), porque a realidade do corpo, da matéria, da coisa extensa (res cogitans) foi posta em questão pela dúvida metódica. Com isso é passível de avaliação moral, apenas, a realidade pensante, o sujeito. A matéria, a coisa extensa, perde qualquer valor em si mesma, pois dela não é possível conhecimento seguro. Desta forma, Descartes e, conse-qüentemente, a filosofia posterior irão se preocupar com a realidade pensante: o sujeito. A física é que irá estudar o mundo objetivo, dando assim início a uma interpretação mecanicista do mundo físico que pode por isso ser explorado de maneira ilimitada.

Enquanto ocorre a demolição da antiga moral, Descartes propõe uma moral provisória. Essa moral consiste em seguir aquilo que as pessoas mais sábias costumam fazer e em usar o bom senso sempre que for possível.

4.4.2 Empirismo

Diferentemente do racionalismo, o empirismo procura na realidade dos fatos a racionalidade. Enquanto o racionalismo tem uma perspectiva transcendente, pois a verdade não está nos fatos, mas na razão que procura intuir a essência, o empirismo coloca toda a possibilidade do conhecimento na experiência empírica. Marilena Chauí, (2002, p. 117), assevera que “para o empirismo, a fonte de todo e qualquer conhecimento é a experiência sensível, responsável pelas idéias da razão e controlando o trabalho da própria razão”.

Para o empirismo, o conhecimento humano não possui um caráter absoluto. Ao ser humano não seria possível alcançar a verdade definitiva, pois o conhe-cimento tem suas raízes nos fatos e por mais que se esforce, o ser humano não conseguirá descobrir relações necessárias entre eles. Na concepção empirista,

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UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 65

o fato de todos os dias o sol nascer a leste não significa que sempre será assim. Por força do hábito e pela experiência cotidiana, somos levados a esperar que isso sempre aconteça, mas a não a garantir que ocorrerá sempre dessa forma.

Cético, segundo a etimologia, seria propriamente aquele que está sempre à procura. Para os céticos não existe a possibilidade de conhecimento verdadeiro, definitivo e seguro.

A verdade é um processo em constante construção. As verdades que temos hoje são frutos de experiências passadas e as verdades futuras dependerão de experiências presentes e futuras. É impossível inferir que algo possa acontecer no futuro baseando-nos em experiências passadas. Com isto, o empirismo introduz o ceticismo e abre a possibilidade da pluralidade de idéias. Como o empirismo nega a possibilidade da intuição intelectual e coloca o conhe-cimento a partir da experiência, ele destrói qualquer tentativa de promover fundamentos definitivos e dogmáticos. Ao refletir sobre o empirismo, Lara assevera que

a influência do empirismo ultrapassa a teoria do conhecimento e obrigará a moral e a política a encontrarem novos funda-mentos. Não há mais transcendências a serem invocadas, mas fatos a serem questionados, interpretados e erigidos como fundadores de racionalidades históricas concretas, sobre as quais se elevem os valores humanos (LARA, 1986, p. 41).

O empirismo vai propor um novo modelo de ciência baseado no método experimental. O inglês Francis Bacon (1561-1626) e o italiano Galileu Galilei (1564-1642) irão determinar como deveria proceder a ciência no futuro. O método científico contempla, até hoje, em sua metodologia, as contribuições desses pensadores.

4.4.2.1 Francis Bacon

Elaborou uma crítica da ciência antiga, pois seu resultado não propiciava coisas úteis à humanidade. Para ele, a ciência deveria propiciar uma melhoria na qualidade de vida das pessoas. Mas, como se daria isso?

Em primeiro lugar, era necessário eliminar os obstáculos ao conhecimento. Esses obstáculos seriam os pré-juizos, idéias pré-concebidas que impedem o avanço do conhecimento. Bacon dá a esses pré-juízos o nome de ídolos. Esses ídolos seriam causados pelas falhas e insuficiência dos sentidos, pela educação e inclinações pessoais, pela tirania da linguagem e pelo respeito exagerado para com a autoridade.

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66 1º PERÍODO • SERVIÇO SOCIAL • UNITINS

Feito isso, seria necessário usar um método adequado para o avanço do

conhecimento. Na Antiguidade e Idade Média, usava-se o método dedutivo.

Para Bacon, esse método conseguia apenas antecipações estéreis. Isto é,

tirava conclusões precipitadas que não produziam nada de novo. O método

adequado seria, então, o método indutivo, interpretar os fatos particulares em

busca de leis universais que regem a natureza. O método das ciências deveria

seguir impreterivelmente o esquema:

1. observação e coleta de dados;

2. levantamento de hipóteses;

3. experimentação para comprovação ou refutação da hipótese.

O método proposto por Bacon seria, daí em diante, cânone, regra para

a pesquisa científica. A adoção desse método trouxe uma série de avanços,

o que influenciou, de forma decisiva, o mundo ocidental, servindo de base

para o desenvolvimento posterior do capitalismo por meio da pesquisa

tecnológica.

O método científico proposto por Bacon traz algumas conseqüências éticas

em pelo menos dois aspectos: o ser humano enquanto objeto de pesquisa

pode ser manipulado, experimentado livremente? Que tipo de conseqüências

a exploração da natureza, por meio do método científico, pode acarretar para

o equilíbrio ecológico?

4.4.2.2 Galileu Galilei

Era um notável físico, astrônomo e matemático. Sua grande contribuição

para ciência moderna foi a inserção da matemática como instrumento de obser-

vação. Para Galilei, a natureza era um grande livro escrito com caracte res

matemáticos. Cabe ao cientista a tarefa de quantificar os fenômenos permi-

tindo, assim, a maior objetividade possível. Para o avanço da ciência, não se

podia trabalhar com conceitos qualitativos. A ciência deveria investir todas as

suas fichas naquilo que pudesse ser quantificado.

Em virtude de suas teorias, Galileu foi condenado pela Inquisição, acusado

de cometer heresia. Para livrar-se de sua punição, foi obrigado a retratar-se

negando suas teorias. Entretanto, sabia que os postulados que defendeu, (por

exemplo, “a terra não é o centro do universo e sim o sol”) e as comprovações

de suas teorias seriam confirmadas pela posteridade.

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UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 67

Síntese da aula

Para o humanismo antropocêntrico, o ser humano é o centro da vida polí-tica e cultural. O racionalismo quer também promover os valores do indivíduo como alguém separado de qualquer sistema de dominação ou sujeição. A Reforma Protestante defendia que ninguém tinha o direito de ser intermedi-ário entre o homem e Deus. A redenção era concedida ao homem de forma inteiramente gratuita, unicamente pela fé. As obras não seriam necessárias. Maquiavel torna a política autônoma porque a desvincula da ética e da religião, procurando examiná-la na sua especificidade própria. A filosofia moderna interrompe o pensamento filosófico cristão, desenvolvendo suas doutrinas, sem se prender à autoridade da Igreja e se revelando estritamente crítica e profana. O seu objetivo é alcançar a verdade, tão somente com o auxílio da razão e do conhecimento científico. É uma postura semelhante, do ponto de vista do conhecimento, à dos filósofos da Grécia Antiga. Para o racionalismo, “a razão é a fonte do conhecimento verdadeiro operando por si mesma, sem o auxílio da experiência sensível, e controlando a própria expe-riência sensível”. Para o empirismo, a fonte de todo e qualquer conhecimento é a experiência sensível, responsável pelas idéias da razão e controlando o trabalho da própria razão.

Atividades

1. Elabore uma síntese descritiva enumerando os principais aspectos do Renascimento e da Reforma Protestante que promoveram a superação da mentalidade teocêntrica até então predominante.

2. “A finalidade da política não é, como diziam os pensadores gregos, romanos e cristãos, a justiça e o bem comum, mas, como sempre souberam os políticos, a tomada e manutenção do poder”. Essa afirmação de Nicolau Maquiavel significa que:

a) a finalidade da política está vinculada à moral;

b) a política é autônoma em relação à fé e à moral;

c) o príncipe deve ter as virtudes cristãs como meta;

d) o poder não se vincula à política.

3. A partir do que você estudou até aqui, procure refletir sobre suas práticas profis-sionais futuras tendo em vista a seguinte situação: o que é mais importante: planejar muito bem – Racionalismo – ou executar com eficácia – empirismo?

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68 1º PERÍODO • SERVIÇO SOCIAL • UNITINS

4. Em relação à questão da origem do conhecimento, é incorreto afirmar que:

a) Descartes promoveu uma ruptura com o teocentrismo ao afirmar que o sujeito conhecente é o único fundamento confiável no conhecimento;

b) o empirismo surge como forma de contestar as tradições baseadas em valores metafísicos;

c) Francis Bacon utilizou o método dedutivo em suas investigações;

d) para Galileu a matemática era a linguagem adequada para escrever a história do universo.

Comentário das atividades

Na atividade 1, é desejável que se aborde a revalorização dos valores humanísticos e da crise no poder da Igreja durante o Renascimento e a Reforma Protestante.

Na atividade 2, a alternativa correta é a (b) pois Maquiavel compreende que a política, para ser soberana, deve ter como único fim a conquista e a manutenção do poder. As demais alternativas estão incorretas porque a polí-tica não é tratada de forma autônoma, não é um fim em si mesma.

Na atividade 3, o que se pretende é relacionar o racionalismo com as atividades de planejamento e empirismo com as de execução. Se você tiver uma visão de mundo racionalista optará pela primeira opção, planejar. Caso contrário, se for empirista valorizará mais a execução.

Na atividade 4, estão corretas as alternativas (a), pois Descartes promove o sujeito como única fonte do conhecimento; a alternativa (b) porque ao priorizar a experiência concreta, o empirismo procura atacar as instituições que se baseiam em valores que estão acima daquilo que é produzido pelos seres humanos; e (d) pois com Galileu a matemática é a linguagem adotada pela ciência. A alternativa incorreta é a letra (c), pois para Francis Bacon o método dedutivo apenas promove reflexões estéreis e não consegue realizar coisas úteis.

ReferênciasARANHA, Maria Lúcia de Arruda; MARTINS, Maria Helena Pires. Filosofando: introdução à filosofia. 2. ed. São Paulo: Moderna, 1993.

CHAUÍ, Marilena. Convite à filosofia. 2. ed. São Paulo: Ática, 2002.

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UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 69

COTRIM, Gilberto. História global. São Paulo: Saraiva, 1997.

LARA, Tiago Adão. Caminhos da razão no ocidente: a filosofia ocidental, do Renascimento aos nossos dias. Petrópolis: Vozes, 1986.

Na próxima aula

A modernidade, como vimos, produziu uma série de transformações no campo do conhecimento, da política e da moral. Veremos na próxima aula como os movimentos filosóficos do iluminismo e do liberalismo tratam as ques-tões éticas e políticas.

Anotações

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AULA 4 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

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AULA 5 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 71

Objetivos

Esperamos que, ao final desta aula, você seja capaz de:

identificar as características do liberalismo em John Locke e Jean

Jacques Rouseau;

contextualizar filosoficamente a ética iluminista de Immanuel Kant.

Pré-requisitos

Para que você possa aproveitar melhor esta aula, será necessário que

você reveja na aula anterior os tópicos relativos ao desejo de autonomia da

sociedade em relação aos poderes da Igreja e do Estado. Essa revisão será

necessária para que você possa contextualizar o pensamento liberal e ilumi-

nista que veremos nesta aula.

Introdução

Para a maioria das pessoas, a liberdade, a autonomia, significa a possibi-

lidade de agir sem qualquer tipo de constrangimento.

O que para nós é hoje um direito fundamental é fruto de uma discussão

filosófica que teve a contribuição de muitos pensadores. Nesta aula, estu-

daremos dois deles; John Locke, Jean Rouseau e Immanuel Kant. Veja como

eles fundamentam o nosso direito de agir em conformidade com nossa

consciência.

5.1 O Liberalismo como fundamento ético do Capitalismo

Uma nova concepção de ética e das relações dos indivíduos com o Estado

surge com o advento do capitalismo e da teoria liberal.

Aula 5Liberalismo e Iluminismo

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AULA 5 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

72 1º PERÍODO • SERVIÇO SOCIAL • UNITINS

O que significava na época a expressão “liberal”?

O liberalismo é uma corrente política, econômica e moral que expressa a vontade, especialmente da burguesia ascendente, de evitar a inge-rência da Igreja e, principalmente, do Estado nas suas vidas e negócios particulares.

A partir das Revoluções Puritana (1640) e Gloriosa (1688) na Inglaterra, o poder dos monarcas passa a ser limitado por uma Constituição. Essas leis eram aprovadas por um conjunto de homens representantes de setores da sociedade, antes de serem aplicadas. Essa, é a gênese do Estado Democrático Liberal que, com sua divisão tripartite dos poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário), é modelo básico ainda adotado pelos Estados contemporâneos. Uma de suas características principais é justamente respeitar e garantir as liberdades (direitos) de cada um de seus integrantes.

A conseqüência dessa organização política liberal para a cidadania é a sua restrição ao caráter meramente formal. Isto é, em tese, todos os cida-dãos seriam iguais, porém o direito de explorar economicamente o trabalho alheio expande o poder econômico da burguesia e restringe a cidadania à possibilidade de votar, desde que atendido o critério de se possuir uma certa renda.

Separando-se da religião, a moral iluminista se tornou laica. Acentuando seu caráter pessoal, ela ampliou o espaço do livre pensar individual, que convivia com a idéia de se atingirem as leis morais universalmente válidas para todas as épocas.

Os princípios do Liberalismo apresentam as seguintes características:

liberdades individuais na composição de uma sociedade equilibrada: os homens devem ser livres para agir conforme bem entenderem, pois só assim é possível promover a eficaz satisfação de suas necessidades. Essa postura se tornaria a base para o ultraindividualismo reinante a partir do fim do século XX;

a propriedade, em um sentido muito amplo: “tudo o que pertence” a cada indivíduo, ou seja, sua vida, sua liberdade e seus bens;

a não intervenção do Estado nos empreendimentos econômicos: liber-dade para negociar; (laissez-faire).

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UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 73

Um dos primeiros intérpretes das idéias políticas liberais é o filósofo inglês John Locke (1632-1704).

5.2 John Locke

Do ponto de vista da filosofia política, Locke expõe suas idéias na obra Dois tratados sobre o governo civil.

O pensamento de Locke parte da questão da legitimidade de poder:

O que torna legítimo o poder do Estado?

Locke desenvolve então a hipótese do homem em “estado de natureza”, em que todos seriam livres, iguais e independentes. Os riscos das paixões e da parcialidade são muito grandes porque “cada um é juiz em causa própria”, o que torna impossível a vida comum. Para superar essas dificuldades, as pessoas consentem em instituir o corpo político por meio de um contrato, um pacto originário que funda o Estado.

Para Locke, os direitos naturais dos homens não desaparecem em conse-qüência desse consentimento, mas subsistem para limitar o poder do soberano. Em última instância, justifica-se até o direito à insurreição, caso o soberano não atenda ao interesse público. Daí a importância do legislativo, poder que controla os abusos do executivo.

Um dos aspectos progressistas do pensamento liberal reside na origem democrática e parlamentar do poder político, agora determinado pelo voto e não mais pelas condições de nascimento, como na nobreza feudal.

Embora a teoria liberal se apresente como democrática, é inevitável encon-trar na sua raiz o elitismo que a distingue como expressão dos interesses da burguesia. Na vida em sociedade, somente aqueles que têm propriedades, no sentido restrito de fortuna, podem participar de fato da política e apresentam reais condições de exercer a cidadania.

Kunzmann (1993) aborda a visão de Locke sobre o ponto de vista ético, com destaque para os seguintes princípios normativos:

o homem, enquanto ser que age segundo a razão e o saber, tudo faz para atingir um fim qualquer, sobretudo sua felicidade;

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AULA 5 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

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o bem e o mal são determinados em função da alegria (felicidade) e da dor;

os critérios do agir baseiam-se no esforço que o homem faz para atingir a felicidade e evitar a dor.

As leis morais derivam destes princípios normativos, que devem estar ligadas à recompensa ou à punição. Observe, na citação a seguir, a reflexão que Locke faz sobre o bem e o mal:

O bem ou o mal, portanto, são uma conseqüência do acordo ou desacordo das nossas ações voluntárias com uma lei pela qual somos atraídos para o bem ou para o mal segundo a vontade e o poder do legislador (LOCKE, citado por KUNZMANN, 1993)

Locke distingue três tipos de leis morais:

a lei divina, cujo critério é o pecado ou o dever, imposto diretamente ao homem por Deus, com a correspondente punição ou recompensa;

a lei civil: são as regras impostas pelo Estado, que fixam o caráter repreensível de certas ações;

a lei da opinião pública ou da reputação, considerada por Locke uma lei filosófica, porque se encontra no campo da filosofia: estabelecer o critério do vício e da virtude, que acarretam a consideração ou o desprezo.

O pensamento liberal de Locke, divulgado no final do século XVII, exerce grande influência no século seguinte, por ocasião da Revolução Francesa e das lutas de emancipação colonial nas Américas.

5.3 Jean Jacques Rousseau

Nascido em Genebra, na Suíça, em 28 de junho de 1712, e falecido em Ermenonville, França, em 2 de julho de 1778, esse filósofo representou uma corrente de pensamento que influenciou liberais e socialistas. Talvez em função disso é que seu pensamento seja tão controverso.

Para ele, o ser humano em estado de natureza é bom. Corrompe-se pela ação da sociedade. No estado de natureza o ser humano é livre, mas em sociedade vive a ser colocado em grilhões. A sociedade ideal para Rousseau é aquela que preserva a liberdade do indivíduo. Para garantir a liberdade é necessário um contrato social.

Da mesma forma que John Locke, Rousseau é contratualista. Porém, o contrato social, ao partir do fato de que há uma igualdade e liberdade de nascença entre

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os homens, trata o Estado como o resultado de um pacto em que os cidadãos, mantendo seus direitos naturais, constroem o Estado para preservar esses direitos. Expressão da “vontade geral”, o Estado é a unidade dessas vontades. Não se trata da vontade da maioria, mas de uma vontade geral na qual todos são convocados a participar. Sendo expressão da vontade pessoal dos contratantes, obedecer à vontade geral é obedecer à própria vontade.

Rousseau ataca a propriedade privada, causa de todas as desavenças. Segundo esse filósofo, os problemas começaram quando alguém cercou um pedaço de terra e afirmou que era propriedade sua. Nesse sentido, tornou-se um dos inspiradores do movimento socialista.

Para ele, a democracia deveria ser direta. O poder não é instrumento de concessão. Somente o povo é soberano. A representação retira a soberania das decisões populares.

Sua influência foi muito forte na educação. Apesar de ter colocado seus cinco filhos em um orfanato, tiveram grande repercussão na época seus métodos educa-cionais. A educação deveria permitir às pessoas o exercício da liberdade.

5.4 Immanuel Kant

Natural de Königsberg, na Prússia Oriental, foi o primeiro grande filósofo desde a Idade Média a ser um acadêmico profissional.

Kant tem como principal mérito a elaboração da síntese entre racionalismo e empirismo. Do ponto de vista do conhecimento, sustentava que ganhamos conhe-cimento tanto na experiência quanto pelo entendimento. Acreditava que aquilo que não pode ser apreendido por nosso aparato corpóreo nunca será experiência para nós. Magee (2001) cita o exemplo, a partir de um quadro do pintor John Everett Millais (1856) A menina cega, de que uma pessoa cega, em um campo aberto, pode apreciar o som da música, o toque da mão de sua irmã, o cheiro de seu cabelo, mas nunca poderá “experimentar” o arco-íris no céu atrás dela.

Do ponto de vista da ética, acreditava que só uma criatura capaz de entender as razões por que fazer ou não fazer algo poderia ser vista como comportando-se moral ou imoralmente e, portanto, a moralidade é uma possi-bilidade apenas para criaturas racionais.

5.4.1 A obrigação Moral para Kant

O filósofo levantou a seguinte questão: pode-se fazer depender a moral de um saber?

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– Não, responde, porque cada um sabe qual é seu dever, mesmo que não o cumpra.Então, indaga o filósofo: é preciso admitir a existência de um sentimento moral primitivo?– Muito menos ainda, responde: a moral não pode fundar-se em inclinações; ela consiste na consciência de uma obrigação. Portanto, a moralidade repousa sobre um dever.

Para tanto, distingue a ação autenticamente moral, cumprida pelo dever, daquela ação conforme a moral, mas cumprida pelo interesse ou por inclinação (por exemplo, o comerciante que é honesto pelo medo de perder sua clientela).

Kant pergunta: como é possível representar-se seu dever? Responde: porque o homem é um ser que raciocina: existe uma lei moral universal, que não depende de um princípio exterior (como os desígnios de Deus pela religião), mas que cada sujeito descobre em si mesmo como necessária e objetiva, que pertence ao domínio da razão prática, e não ao domínio da razão teórica que é do domínio do conhecimento.

Enquanto pertencente ao domínio da razão prática, a ação moral é essen-cialmente voluntária, porque supõe a resistência que nós podemos fazer aos motivos pessoais que nos influenciam. Depende, portanto, de um princípio subjetivo da ação, como uma máxima, que a comanda. Esta ação moral, diz Kant, apresenta-se sempre sob a forma de um imperativo.

Entretanto, o filósofo distingue imperativo categórico de um imperativo hipotético. O categórico comanda uma ação como necessária em si mesma, independente das circunstâncias, dizendo; é preciso agir desta forma, ao passo que o hipotético diz-nos: é preciso… se…, e este tipo de imperativo, diz Kant, pode ser uma regra de prudência ou de técnica, mas jamais da moralidade. Apenas o imperativo categórico é uma regra moral.

Para Kant, a consciência moral só atingiria seu sentido pleno, regida por um imperativo categórico. Ele recebia essa denominação por ser um dever incondicional para quem age racionalmente.

Kant formula o imperativo categórico nos seguintes termos:

“age de tal modo que a máxima de tua ação possa sempre valer como princípio universal de conduta”;

“age de modo que trates a humanidade, tanto na tua pessoa como na dos outros, como fim e nunca como meio”;

“age de modo tal que a tua vontade possa considerar a si mesmo como instituidora de uma legislação universal”.

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Para Kant, o homem tendia naturalmente para o egoísmo; só o dever seria capaz de torná-lo um ser moral. Assim, os imperativos categóricos como leis racionais não eram meramente subjetivos, mas universais e necessários para todos aqueles que atingissem esse nível elevado de entendimento.

Só atingimos a consciência do comportando guiado por uma lei moral, quando agimos livremente. E só alcançamos a liberdade quando seguimos nossa razão.

Na visão de Gaarden (1996), autor de O Mundo de Sofia, a ética kantiana é, ao mesmo tempo, uma ética do dever e uma ética da atitude. Se, de um lado, a boa ação é um dever para quem age racionalmente, ela exige meios e fins correspondentes.

Uma leitura atualizada desses imperativos kantianos nos permite fazer uma breve reflexão sobre quadros sociopolíticos atuais.

Quando você trata bem o seu semelhante porque é seu dever, essa ação é estritamente moral. Porém, quando você o faz visando a obter algum retorno, esta ação perde seu conteúdo ético.

Quando, em momentos de calamidade pública, faz-se uma campanha para obter donativos e doá-los aos necessitados, acreditando estar ajudando a outrem, age-se moralmente. Porém, quando se executa a mesma ação visando a se promover politicamente, esta atitude carece de moralidade.

Na visão kantiana, a justeza de uma ação não deve ser medida em si mesma, mas na vontade de quem aplica. Como nosso cotidiano foi tomado pejorativamente pela máxima maquiavélica de que os fins justificam os meios, parece-nos de grande valor refletir sobre os imperativos kantianos. Em última instância, eles propõem tratar o ser humano enquanto fim e não como meio para atingir algo.

Por fim, afirma que a ação moral, obra da vontade, supõe a liberdade, que é a condição de possibilidade de toda ação moral, na medida em que o homem não é um ser inteiramente determinado nos seus atos. Agir por dever não quer dizer agir forçado, mas, ao contrário, que ele pode lhe obedecer se ele quiser. Portanto, agimos com a vontade que é autônoma, porque obede-cendo à lei moral, que é a lei da razão, obedeço a mim mesmo.

Por outro lado, diz Kant: se só fazemos o que “nos agrada”, não seremos livres, por mais paradoxal que pareça, pois nossa vontade estará a serviço de nossas inclinações, de nossos interesses pessoais, e esse tipo de vontade é

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AULA 5 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

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heterônomo, isto é, determinado por fatores que não eu mesmo, semelhante ao movimento provocado de uma pedra, não livre.

Assim, Kant distingue a obrigação da repressão, a consciência do dever da força ou impulso físico. A liberdade não é contrária à lei, nem à obediência, só é contrária à obediência forçada, a uma lei ou a uma força exterior.

Síntese da aula

A origem do liberalismo está ligada ao desejo de certos homens em limitar a interferência da Igreja e, principalmente, do Estado nas suas vidas e negó-cios particulares. O pensamento liberal de Locke, divulgado no final do século XVII, exerce grande influência no século seguinte, por ocasião da Revolução Francesa e das lutas de emancipação colonial nas Américas. Kant tem como principal mérito a elaboração da síntese entre racionalismo e empirismo. Na visão kantiana, a justeza de uma ação não deve ser medida em si mesma, mas na vontade de quem aplica.

Atividades

1. Estabeleça um paralelo a respeito do liberalismo em Locke e Rousseau na forma de um texto crítico de 20 linhas.

2. Elabore um texto de 15 linhas analisando as três máximas do imperativo categórico de Immanuel Kant.

3. Kant afirma que a ação moral, obra da vontade, supõe a liberdade, que é a condição de possibilidade de toda ação moral, na medida em que o homem não é um ser inteiramente determinado nos seus atos. Agir por dever não quer dizer agir forçado, mas, ao contrário, que ele pode lhe obedecer se ele quiser. Portanto, agimos com a vontade que é autônoma, porque obedecendo à lei moral, que é a lei da razão, obedeço a mim mesmo. A moral heterônoma, que é fruto da imposição de normas que estão fora da consciência do sujeito, pode ser exemplificada pelo ato de:

a) não sair mais cedo por medo de ser flagrado pelo chefe;

b) definir metas para sua vida e cumpri-las apesar de nem sempre gostar do que esteja fazendo;

c) falar a verdade sempre;

d) sempre respeitar as normas por acreditar que elas são importantes para a convivência social.

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AULA 5 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 79

4. O liberalismo surgiu como um movimento que questionava, entre outros, o modelo moral, político e econômico de sua época, afirmando o indivíduo frente à sociedade. Entre os principais alvos da crítica do liberalismo estavam:

a) a moral proposta pela Igreja e o controle da economia pelo absolutismo;

b) as regras de mercado e a democracia parlamentar;

c) a Reforma Protestante e a dissolução do antigo regime;

d) o poder das monarquias constitucionais e o movimento de restauração.

Comentário das atividades

Para responder à atividade 1, leve em conta o fato de que Locke propõe um liberalismo voltado essencialmente para o papel do indivíduo como agente econômico, pois só os proprietários participam das decisões políticas, enquanto que Rousseau busca reforçar o papel político dos cidadãos a partir da igual-dade entre todos.

Na atividade 2, é necessário que você trate das máximas kantianas levando em conta que toda ação deve ser universal e possa ser realizada em qualquer tempo ou época, que não trate o outro como coisa.

Na atividade 3, a alternativa (a) representa a moral heterônoma pois o indivíduo age a partir de uma regra externa a sua vontade. As demais alter-nativas (b), (c) e (d) são todas exemplos de ações em que o sujeito se dá as próprias regras, isto é, é autônomo.

Na atividade 4, a alternativa (a) está correta porque o liberalismo representa desejo de certos homens de limitar a interferência da Igreja e, principalmente, do Estado nas suas vidas e negócios particulares. As demais estão incorretas porque tratam da crítica de elementos que são valorizados pelo liberalismo como a Reforma Protestante (c), o mercado (b) ou a monarquia constitucional (d).

ReferênciasGAARDER, Jostein. O mundo de Sofia: romance da história da filosofia. 17. ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1996.

KUNZMANN, Peter e outros. Atlas de la philosophie. Paris: Librairie Générale Française, 1993.

MAGEE, Bryan. História da filosofia. 3. ed. São Paulo: Loyola, 2001.

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AULA 5 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

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Na próxima aula

O mundo contemporâneo é rico em desafios à filosofia. Nesse período é feita uma grande crítica ao poder da razão humana em conhecer e decidir sobre tudo. Assim, novas possibilidades são propostas, especialmente no campo da ética em que elementos como linguagem e subjetividade são discu-tidos como forma de enriquecer o debate ético. Todas essas questões veremos na próxima aula.

Anotações

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AULA 6 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 81

ObjetivosEsperamos que, ao final desta aula, você seja capaz de:

caracterizar a contestação do poder da razão feita por Karl Marx e Sigmund Freud;

analisar as concepções éticas de Jürgen Habermas e Jean-Paul Sartre.

Pré-requisitosVocê compreenderá melhor esta aula se compreender adequadamente o

iluminismo tratado por Kant na aula anterior. Para essa corrente somente a razão é capaz de fundar o conhecimento e a moral. Essa revisão será impor-tante para compreender a crítica que é feita à razão nessa aula. Para os autores que abordaremos a seguir, a razão, além de não resolver os problemas a que se propôs resolver, criou outros.

IntroduçãoNeste tema, vamos refletir sobre os desafios e a pluralidade do mundo

contemporâneo. De início, vamos citar algumas características e aconteci-mentos históricos, culturais, políticos e filosóficos desta época. Em seguida, refletiremos sobre alguns dos mais relevantes pensadores desse período a partir da crítica que é feita ao conceito de razão iluminista.

Aula 6A crise da razão e a filosofia

A Idade Contemporânea compreende o período de 1789 - Revolução Francesa - até os dias atuais.

6.1 Contextualização

6.1.1 Política

Revolução Francesa: por meio da qual, os ideais de liberdade, igual-dade e fraternidade se difundiram pelo mundo.

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AULA 6 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

82 1º PERÍODO • SERVIÇO SOCIAL • UNITINS

Colonialismo europeu nos outros continentes, principalmente na África e Ásia.

Em 1917, acontece a Revolução Russa, inspirada nas teorias político-econômicas da Karl Marx, o que seria a primeira experiência de um Estado socialista no mundo contemporâneo.

Os dois conflitos mundiais: 1ª Guerra Mundial (1914-1918) e 2ª Guerra Mundial (1939-1945). A Segunda Guerra Mundial, principal-mente, provocou na humanidade um sentimento de angústia a respeito do seu próprio destino.

Guerra Fria: após o término da Segunda Guerra Mundial, o mundo é partilhado entre os Estados Unidos, no comando dos países do bloco capitalista; e, por outro lado, a União Soviética, à frente dos países do bloco socialista, determinando assim a geopolítica mundial que daria origem a uma série de conflitos bélico-ideológicos.

Entre 1989 (queda do muro de Berlim) e 1991 (fim da União Soviética) ocorre a queda dos principais regimes socialistas euro-peus, dando fim ao chamado socialismo real e à promoção dos Estados Unidos como potência hegemônica mundial. Inaugura-se o período de discurso único em defesa do regime capitalista como o modo de produção econômico possível; os Estados Unidos, evocando seu destino manifesto, auto-proclamam-se a “polícia do mundo”.

Formação de blocos econômicos tais como a União Européia, Mercosul, NAFTA (EUA, México, Canadá), APEC (países do Pacífico).

Surgimento de países como importantes atores no cenário político e econômico, tais como a Alemanha, Japão e China como contrapeso à hegemonia norte-americana.

6.1.2 Antropologia

Nascimento de um novo tipo de humanidade, que tem como características:

a instabilidade e a mutabilidade;

antidogmatismo;

secularismo: o homem pode resolver sozinho seus problemas prescin-dindo de Deus;

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AULA 6 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 83

ativismo: o homem é orientado para a ação. É preciso produzir. Nada

de pensar, meditar, contemplar; essas atividades perderam o interesse;

utopia: o homem acredita que, com o progresso técnico-científico,

pode chegar à felicidade plena;

Historicidade: seus projetos e os seus ideais não são produto da Natureza

ou de Deus, mas o resultado de uma ação através dos séculos.

6.1.3 Sociedade e Cultura

A difusão dos meios de comunicação (jornais, telefone, cinema, rádio,

televisão, Internet) e o desenvolvimento dos meios de transporte (ferro-

vias, rodovias, aviação, etc.) tiram os indivíduos do isolamento.

Crítica profunda de tudo o que vinha, durante séculos, constituindo o

patrimônio da Europa Cristã na arte, na literatura, na moral, na filo-

sofia, na pedagogia, na religião etc. Tentou-se introduzir e desenvolver

novas formas e novos modelos nessas áreas.

Individualismo. Dissolvendo-se as ideologias, nascem as formas

contemporâneas do individualismo, uma atitude que privilegia o

indivíduo em relação à coletividade. O individualismo atual distin-

gue-se dos anteriores que significa o triunfo da individualidade em

face das regras constrangedoras. O atual significa “a realização de

indivíduos estranhos à disciplina, às regras, aos constrangimentos

diversos, às uniformizações”.

6.2 A contestação da razão

O poder da razão é colocado em cheque, principalmente por Marx e

Freud. Para Marx, o homem tem a ilusão de estar agindo por sua própria

cabeça, racional e livremente, porque desconhece um poder invisível que o

força a pensar como pensa. Esse poder é social: ideologia. Para Freud, nem

todas as coisas que pensamos estão sob controle de nossa consciência, pois

desconhecemos uma força invisível psíquica que atua sobre nossa consciência

sem que ela saiba. É o inconsciente.

Vamos estudar agora como os principais filósofos deste período temati-

zaram suas idéias sobre o mundo contemporâneo.

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6.2.1 Karl Marx (1818-1883)

Contra todos os filósofos do seu tempo, proclama que o que conta não é interpretar o mundo, mas mudá-lo.

Com essa, frase Marx inaugurava um novo modo de ser e de pensar o homem. Em sua crítica à concepção de Hegel, ele afirma que pensar a história como uma realização do espírito é uma inversão filosófica que a põe de cabeça para baixo. Pensá-la, assim, seria não refletir sobre as condições concretas nas quais os homens produzem, trocam e distribuem seus bens materiais.

Visando a demonstrar que as idéias, valores espirituais e princípios de mora-lidade não são abstração pura, Marx apresentou, no Prefácio à Contribuição à crítica da economia política, uma analogia entre construção de um edifício e as bases sobre as quais se ergue uma sociedade:

(...) na produção social da própria vida, os homens contraem relações determinadas, necessárias e independentes da sua vontade, relações de produção estas que correspondem a uma etapa determinada do desenvolvimento das forças produtivas materiais. A totalidade dessas relações de produção forma a estrutura jurídica e política e á qual se levanta a superestrutura jurídica e política e à qual correspondem formas sociais deter-minadas de consciência. O modo de produção da vida mate-rial condiciona o processo em geral da vida social, política e espiritual. Não é a consciência dos homens que determina o seu ser, mas o contrário, o seu ser social é que determina sua consciência (MARX, 1982, p. 29-30).

Superestrutura: são as instituições como a família, o Estado, a religião, o direito, etc. que dependem da estrutura econômica da sociedade que é constituída pelo conjunto das

relações de produção que é o ponto de partida de toda análise da sociedade em Marx.

Se, para edificar uma construção, os homens primeiro constroem o alicerce, sua base, para só em seguida levantar as outras paredes, segundo Marx, para entender o funcionamento social, deve-se, primeiramente, conhecer a forma como os homens se organizam na produção e distribuição dos bens materiais, para assim compreender o modo como pensam e se organizam a si mesmos na sua vida social.

No entanto, esse conhecimento não é fácil de se adquirir, uma vez que as relações sociais não são dadas para todo o sempre, estando em constante estado de mudanças. Para Marx, na sociedade capitalista, todas as relações sociais são fetichizadas. O homem que deveria ser o fim de todas as ações

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humanas é reduzido à condição de um meio de realização do capital. As mercadorias produzidas são elevadas à condição de ser, passando a assumir uma vida exterior ao homem, ganhando vida própria. E, em sentido contrário, a atividade própria do sujeito lhe é negada, terminando por ser reduzido a uma mera condição de objeto. Assim, tudo em que o capital põe a mão termina por ser invertido, por meio de uma existência negada.

As diversas transformações na produção, desencadeadas a partir da incorporação das novas tecnologias, de cibernética, informação e microele-trônica, poderiam fazer supor, como previu Aristóteles, que o homem poderia ser liberado de sua labuta diária, destinando mais tempo ao lazer e ao ócio prazeroso. Contudo, as profecias aristotélicas não se fizeram realidade. Ao contrário, sob os desígnios da ideologia neoliberal, os direitos sociais estão dia-a-dia sendo suprimidos e os trabalhadores condenados ao subemprego e à marginalidade.

Marx chegou a antever que a produção na sociedade capitalista atingiria um nível tão grande de automação, que a produção da riqueza social já não mais diria respeito ao trabalho, mas à potência da ciência e da tecno-logia postas em movimento. Essas transformações na base técnica industrial terminariam por suprimir a ação direta dos trabalhadores na esfera produtiva. Atingido esse estágio, eles se comportariam mais como supervisores e regula-dores do processo produtivo autômato, realizado pelas máquinas.

Como para Marx toda produção capitalista se volta para a produção do valor e como esta só pode ser calculada a partir do quantum de trabalho vivo incorporado à produção, essa transformação, ao reduzir a participação do trabalho vivo (mão-de-obra) em função do trabalho morto (máquinas), estaria anunciando o esgotamento sistêmico da sociedade baseada na produção do valor e no trabalho.

6.2.2 Ética em Marx

Na medida em que sucumbe a sociedade capitalista e com ela a proprie-dade privada, a divisão de mercadorias, seria necessário que se constituísse um novo código de moralidade que corresponderia às novas exigências de convivência social, que transcenda os valores emanados da sociedade do trabalho, que permita a constituição de um ser indiviso, plural e, por isso, efetivamente emancipado. Assim, só na superação da sociedade capitalista, com o fim do trabalho abstrato e, portanto, da base sobre a qual se ergue a

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moderna exploração do homem pelo homem, é que poderá surgir uma moral realmente autêntica, baseada no princípio da igualdade e na fraternidade humana, tomada como valor universal.

Em uma sociedade dividida em classes, as idéias predominantes sãos as das classes dominantes. Na sociedade capitalista, os burgueses, detentores dos meios de produção fundamentais, enquanto expressões personificadas do poder de capital, dominam também a produção das idéias e dos valores. Os códigos de moralidade que aqui se constroem correspondem as suas idéias hegemônicas, organizadas de acordo com os atuais interesses de valorização do capital.

Por isso, para Marx, apenas com a superação da sociedade baseada na produção de mercadorias, com a correspondente abolição do trabalho enquanto medida de valor, é que se poderá realizar a efetiva emancipação do homem. A partir da constituição dessa nova sociabilidade, poderá surgir uma moral realmente autêntica, baseada no princípio de igualdade e na fraterni-dade humana.

A ética, para Marx, volta-se para as ações coletivas, em função do todo da sociedade. Como doutrina ética, o marxismo, diz Sánchez Vázquez (2001), oferece uma explicação e uma crítica das morais do passado, ao mesmo tempo, põe em evidência as bases teóricas e práticas de uma nova moral. Marx tenta recuperar, como outros pensadores da época contemporânea, o homem concreto que se tinha transformado em uma série de abstrações.

A democracia real não se sustenta nos direitos da burguesia, mas no acesso da população aos bens produzidos socialmente pelos trabalhadores, sejam materiais ou culturais. Uma nova noção de cidadania é proposta: a conquista real dos direitos sociais, não apenas proclamados.

Para Sanches Vasquez (2001), sua ética pode ser apresentada com base nas seguintes premissas:

o homem real é um ser espiritual e sensível, natural e propriamente humano, teórico e prático, objetivo e subjetivo. É práxis, que quer dizer, um ser produtor, transformador, criador, mediante o seu trabalho, em todas as áreas: transforma a natureza, nela se plasma e cria um mundo a sua medida, que se manifesta na arte e em outras atividades;

o homem é um ser social, só o ser humano produz relações sociais (relações de produção) e as demais relações, inclusive as chamadas de superestrutura (ideologia);

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o homem é um ser histórico, em cada época constrói um tipo de formação econômico-social, que muda pelas suas contradições e formas de produção. Mudando a forma econômica, muda também a organização política e jurídica e, evidentemente, a moral. Os homens fazem sua história. Mas em cada época histórica, o agente principal da mudança é a classe ou as classes, cujos interesses coincidem.

6.2.3 Sigmund Freud (1856-1939)

Freud, fundador da Psicanálise, como corrente psiquiátrica e psicoterapêu-tica, tem, nas bases de sua teoria, fundamentos filosóficos e éticos.

O autor distingue na personalidade humana três zonas: o id (conjunto de forças, impulsos ou tendências inconscientes); o ego (que é a consciência em sentido próprio) e o superego (conjunto de normas e prescrições que são impostas ao sujeito de maneira autoritária e inconsciente, valores morais adquiridos no período da educação). Este superego entra em conflito com a consciência moral (o ego).

Até que ponto é possível conciliar determinação inconsciente das ações, sentimentos e condutas humanas com a existência de uma consciência autô-noma livre e responsável?

Essa nossa consciência moral obedece a forças ou impulsos que escapam ao controle da própria consciência e, nesse sentido, analisa Sánchez Vázquez.

Freud dá uma contribuição importante à ética, pois convida-a a levar em consideração essa motivação, pela qual é obri-gada a chegar a esta importante conclusão, a saber: se o ato propriamente moral é aquele no qual o indivíduo age cons-ciente e livremente, os atos praticados por uma motivação inconsciente devem ser excluídos do campo moral. Á ética não pode ignorar esta motivação e, por isso, deve mostrar que é imoral julgar como moral o ato que obedece a forças incons-cientes irresistíveis (SÁNCHEZ VÁZQUEZ, 2001, p. 198).

O papel da psicanálise, para Freud, será ajudar a pessoa a se tornar cons-ciente das normas que lhe são impostas de maneira autoritária.

6.3 O Século XX e os desafios da filosofia

As novas descobertas científicas no século XX provocaram profundas trans-formações na maneira de conceber a humanidade e o conhecimento. Isso terá um forte impacto também nas concepções filosóficas, jurídicas e históricas.

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Citemos duas descobertas importantes, a título de exemplo: a Informática e a inteligência artificial (a inteligência é fato unicamente humano ou as máquinas podem substituir os humanos neste aspecto?) e a revolução biológica (como estão as relações entre filosofia, ciência, ética e biologia?).

No século XX, a filosofia começou a desconfiar do otimismo técnico-cientí-fico, expressão da racionalidade moderna, em virtude de vários acontecimentos: duas guerras, campos de concentração, bomba atômica, ditaduras sangrentas na América Latina, etc. Afirma-se a pluralidade de culturas, cada uma se rela-ciona com as outras e encontra dentro de si seus modos de transformação.

Alguns autores contemporâneos chegam a afirmar o fim da filosofia: o otimismo positivista ou cientificista acreditou que no futuro só haveria a ciência e que tudo seria explicado por ela. A filosofia caminhava para o desapareci-mento, pois não teria motivos para existir.

No entanto, no século XX, a filosofia passou a mostrar que as ciências não possuem princípios totalmente certos, seguros. Freqüentemente, há resul-tados duvidosos e precários. Com isso, a Filosofia volta a afirmar seu papel de compreensão e interpretação crítica das ciências, discutindo a validade de seus princípios e conclusões.

Hoje percebemos, em grande parte da população, o fortalecimento da consciência da cidadania, a consciência crítica e a participação política, essencial para a construção de uma humanidade diferente. Torna-se neces-sário o resgate de valores como a solidariedade, gratuidade e partilha, que contrastam com o espírito de ganância e de lucro.

Há o esforço de vários grupos sociais, pensadores, escritores, para teorizar uma nova perspectiva para o homem atual. Perspectiva que recupera valores essenciais que foram esquecidos ou propositalmente ignorados.

O século XX é muito fecundo em termos de reflexão filosófica, são muitas as teorias e muitos os autores. Vamos nos ater ao pensamento de dois dos seus principais pensadores: Sartre e Habermas.

6.4 Jean-Paul-Sartre (1905-1980)

Sartre é considerado o filósofo da corrente conhecida como existencia-lismo, de maior aceitação junto aos intelectuais e junto aos jovens e acadêmicos de seu tempo, sobretudo após a 2ª Guerra Mundial. Seu sucesso prende-se, entre outros fatores, à divulgação de muitas de suas obras filosóficas sob forma

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literária (teatro, romance). O existencialismo, sobretudo na França, torna-se na época uma “corrente da moda”. Entre as obras principais que discutem as questões filosóficas, destaca-se O Ser e o Nada.

Como para ele Deus não existia, o homem era livre para exercitar sua subjetividade e responsável por seus atos: cabe a ele a escolha dos princí-pios e valores que fundamentavam sua ação. Eliminava-se assim qualquer fundamentação teológica na constituição dos valores morais. A esse respeito, Sartre recordava as palavras de Dostoievski: “Se Deus não existisse, tudo seria permitido”.

Diferente dos objetos, o homem é um ser para si. Essa condição permite que o indivíduo projete sua ação e, portanto, suas conseqüências. A liberdade de escolha lhe confere a plena liberdade.

No transcorrer de sua vida, o homem é obrigado a fazer inúmeras esco-lhas diante de situações limites, que o levariam a exercitar a sua liberdade. O próprio Sartre viveu uma destas situações quando, em 1940, resolveu fugir de um campo de concentração nazista para, em seguida, aderir à resistência fran-cesa contra a ocupação alemã. Discordando de Freud, para Sartre o homem só possui a consciência, e por isso é plenamente responsável pelos seus atos Sartre afirma que somos condenados à liberdade.

Apesar de enfatizar a importância das ações individuais, o existencia-lismo sartreano não representa uma doutrina individualista nem tão pouco permissiva, uma vez que há uma profunda preocupação com o ser do outro, como se pode observar em O Existencialismo é um Humanismo (SARTRE, 1973) quando afirma que o primeiro esforço do existencialismo é o de pôr todo homem de posse do que ele é e atribuir-lhe a responsabilidade total de sua existência. “E, quando dizemos que o homem é responsável por si próprio, não queremos dizer que o homem é responsável por sua estrita individualidade, mas que é responsável por todos os homens” (SARTRE, 1973, [s. p.]).

Sabemos, contudo, que esse modelo sartreano de pensar não neces-sariamente se aplica ao homem do início do terceiro milênio, porque o homem dominado pela mídia tornou-se consumista e pragmático, caindo em um vazio interior e individualismo exacerbado. Seu egoísmo é tamanho que tem dificuldade de conjugar o nós em outra perspectiva que não é centrada no eu.

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6.5 Jürgen Habermas (1929-)

Um novo princípio é defendido por Habermas, importante filósofo de

nosso tempo: a ética discursiva. Para ele, todos somos portadores de uma

razão comunicativa. Essa razão é construída a partir da relação entre sujeitos,

enquanto capazes de se posicionarem criticamente diante das normas. Nesse

caso, a validade das normas não deriva de uma lei geral nem da vontade

egoísta de cada um, mas do consenso e do acordo encontrado a partir do do

conjunto dos indivíduos. Para que isto ocorra, é necessário se garantir que não

haja pressões, coações políticas ou econômicas que interfiram no diálogo e

que todos os sujeitos usem argumentos racionais para convencer os demais ou

para se deixar convencer.

É no princípio da comunicação, na linguagem e na intersubjetividade

que a ética contemporânea vai descobrir o solo da ética, pois só a comuni-

cação transparente fornece o paradigma de uma moralidade preocupada com

proceder por meio da reciprocidade e da ausência de violência.

A racionalidade comunicativa permite buscar o entendimento entre os

sujeitos. E só ocorrerá transparência na comunicação quando, para elucidação

dos conceitos, o ponto de partida for a análise lingüística, por meio da busca

do significado dos signos.

Síntese da aula

As transformações do mundo contemporâneo colocam em questão

os valores e a mentalidade da modernidade. Marx realiza a crítica do

modo de produção capitalista defendendo que só com a eliminação da

propriedade privada dos meios de produção é que é possível alcançar uma

sociedade plenamente ética. Freud questiona o poder da consciência ao

propor o inconsciente, que é um conjunto de conteúdos mentais dos quais

não é possível um controle pleno. Nossas ações são, portanto, reflexo,

também, desses conteúdos. No século XX, a filosofia começou a descon-

fiar do otimismo técnico-científico, expressão da racionalidade moderna, e

passou a mostrar que as ciências não possuem princípios totalmente certos,

seguros. Com isso, a Filosofia volta a afirmar seu papel de compreensão e

interpretação crítica das ciências, discutindo a validade de seus princípios

e conclusões.

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AULA 6 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 91

Atividades

1. Analise as características do mundo contemporâneo, procurando contextua-lizá-las em seu cotidiano.

2. Elabore por escrito uma reflexão sobre os questionamentos que Marx e Freud fazem ao poder da racionalidade humana.

3. A filosofia, no século XX, recupera seu papel na compreensão do mundo por meio da denúncia das limitações da ciência. É um período rico em reflexões, dada a pluralidade de debates que ocorrem. Habermas e Sartre representam uma parte da discussão feita no século XX e são relevantes pela maneira como abordaram a questão da ética. Assinale a seguir a alternativa que não corresponde ao pensamento deles.

a) A responsabilidade é fundamental no pensamento sartreano, uma vez que há uma profunda preocupação com o ser do outro.

b) Para Habermas a validade de uma norma procede do consenso e do acordo encontrado a partir do grupo do conjunto dos indivíduos.

c) Tanto Habermas quanto Sartre concordam que a tradição é funda-mental na composição de regras morais.

d) Sartre desenvolve a idéia de que somos condenados à liberdade.

4. Em relação às idéias sobre ética refletidas por Marx e Freud é incorreto afirmar que:

a) Marx defende uma ética individual;

b) não somos plenamente conscientes de nossas ações, segundo Freud;

c) a sociedade ética só será possível pela abolição da propriedade privada dos meios de produção, segundo Marx;

d) o papel da Psicanálise, para Freud, será ajudar a pessoa a se tornar consciente das normas que são lhe impostas de maneira autoritária.

Comentário das atividades

Para responder a atividade 1, você deverá analisar os elementos citados na contextualização, especialmente os tópicos sobre a cultura e antropologia. Se você concordar com as características e valores do mundo contemporâneo seu texto ressaltará essas vantagens, por outro lado, se você vê traços nega-tivos, seu texto denunciará os efeitos maléficos desse período.

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AULA 6 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

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Na atividade 2, lembre-se de que Freud afirma que nossas ações são determinadas por conteúdos inconscientes e que portanto não se pode falar de uma razão plena. Marx denuncia que a razão é fruto dos valores da classe dominante e que, portanto pode ser fruto de ideologias.

Na atividade 3, leve em conta que a liberdade é um valor fundamental para Sartre e que a comunicação o é para Habermas. Portanto estão corretas as alter-nativas (a), (b) e (d). A única afirmação incorreta é representada pela alternativa (c) porque a tradição coloca valores acima da liberdade e da comunicação.

A atividade 4 reflete a questão da ética, que em Freud está limitada pelo inconsciente e em Marx, pela ideologia da classe dominante burguesa. A alter-nativa que representa uma afirmação incorreta é a (a) porque Marx defende os valores da classe proletária e é uma ética de valores coletivos, caracterís-tica essa que justifica a correção da alternativa. As alternativas (b) e (d) estão corretas porque afirmam o papel do inconsciente na construção da moralidade e a (c) também está correta porque a supressão da propriedade privada dos meios de produção é a única forma de superar a moral burguesa. Deve-se marcar, portanto, a alternativa (a).

ReferênciasMARX, Karl. Manuscrito econômico-filosófico. São Paulo: Difel, 1982.

SÁNCHEZ VÁZQUEZ, Adolfo. Ética. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2001.

SARTRE, J. Existencialismo é um humanismo. São Paulo: Abril Cultural, 1973. (Os Pensadores, v. 45)

Na próxima aula

Os desafios éticos da pós-modernidade são muitos. Estão relacionados a uma civilização que se constrói em novas bases, com forte influência da tecnologia e dos meios de comunicação. Nesse sentido, é preciso repensar a ética para dar respostas concretas a problemas para os quais as éticas tradicionais, muitas vezes, não têm respostas. Essas serão as questões abordadas na próxima aula.

Anotações

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AULA 7 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 93

Objetivos

Esperamos que, ao final desta aula, você seja capaz de:

compreender as principais características da pós-modernidade;

analisar as atitudes das pessoas diante da tecnologia e as proposições de Hans Jonas em relação a este tema.

Pré-requisitos

Para um melhor entendimento dessa aula revise o que vimos na aula 4 sobre a temática da modernidade. A proposta da modernidade, por meio do uso da razão e da ciência, era tirar a humanidade da ignorância e resolver todos os seus enigmas e problemas. Observe também que as éticas tradicio-nais não levavam em conta as micro-realidades históricas e eram destituídas de preocupações gerais que afligem nossa sociedade como a biodiversidade e as diferenças de gênero, raça, religião.

Introdução

A pós-modernidade diz respeito a novas posturas frente à sociedade tecno-lógica, virtual, cujos valores vêm subvertendo os padrões culturais, modos de vida, éticos e morais até então defendidos e apregoados. Esse fato vem acon-tecendo, sobretudo, a partir das duas últimas décadas do século XX.

Como as organizações percebem essas mudanças e são afetadas por elas? Como devemos nos portar perante as mudanças ocorridas? Vejamos nesta aula alguns indicativos importantes.

7.1 Iniciando a conversa...

O termo pós-moderno designa, genericamente, toda uma corrente de pensa-mento que tem em comum uma critica à visão de mundo da modernidade. Ela

Aula 7Os desafios da filosofia, ética e cidadania na pós-modernidade

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AULA 7 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

94 1º PERÍODO • SERVIÇO SOCIAL • UNITINS

se expressa em diferentes áreas, da arquitetura à filosofia, da psicanálise à sociologia, da física à história.

A crítica à modernidade se refere a seus pressupostos básicos: o raciona-lismo iluminista, a crença na ciência como redentora dos males da humanidade, a concepção de história como processo de evolução social. Quanto à racio-nalidade, afirma que ela tem servido para legitimar a dominação do homem pelo homem e justificar, desde o século passado, duas guerras mundiais, o armamentismo nuclear, o totalitarismo, a concentração de riquezas, a fome, a degradação do meio ambiente.

Nesse sentido, a ciência moderna teria servido a um inegável processo que possibilitou a destruição e não impediu a fome e a exploração da miséria. Por sua vez, a promessa de evolução da humanidade se concentrou no processo técnico e na degradação social.

Em uma sociedade secularizada, cada vez mais complexa e plural, com problemas sociais de dimensões mundiais, levanta-se a questão do consenso ético racional. Apresenta-se o debate sobre uma ética universal em um mundo plural. Reconhecidas como décadas de crise, os últimos 30 anos do século passado nos apresentam uma questão fundamental: é possível um consenso racional que nos possibilite uma leitura totalizante e abrangente do mundo e que fundamente uma ação qualitativamente nova?

Em relação ao pensamento ético contemporâneo, Russ (1999) ressalta alguns aspectos da pós-modernidade que estão levantando reflexões sobre o futuro dos fundamentos da ética:

o narcisismo é a constante do indivíduo na atualidade: voltado para si mesmo, busca as delícias da ‘descontração’, do descompromisso, dos valores hedonistas permissivos;

ausência de grandes sistemas filosóficos. A descrença nos grandes sistemas filosóficos e a morte das ideologias trazem como conseqüên cia a ausência de uma perspectiva finalista de vida, a negação (niilismo) de valores como etapa espiritual, sem resposta à pergunta “por quê?”, conforme refletia Nietzsche; “ é no topo desse vazio que nasce a ética contemporânea, a do nosso tempo”;

este pensador põe a seguinte questão para nossa reflexão, do ponto de vista ético: o individualismo configura nossa modernidade avan-çada, se a sociedade é assim atomizada em uma poeira infinita de

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AULA 7 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

UNITINS • SERVIÇO SOCIAL • 1º PERÍODO 95

“narcisos”, como requerer então, para a ética, um princípio que possua uma validez universal?

novas tecnologias;

criação de um ambiente técnico cheio de ameaças e perigos. As novas tecnologias têm permitido que os homens adquiram, cada vez mais, e com maior velocidade, poderes nunca antes atingidos, seja do ponto de vista econômico, político, de controle das ações humanas, da vida e da morte. Paradoxalmente, o homem torna-se, em muitos aspectos, sujeito do seu destino, mas também objeto de suas técnicas – biotec-nologias, energia nuclear, técnicas no campo da comunicação, entre outras esse. É um caminho possivelmente sem volta;

a questão ecológica se apresenta como ameaça real de destruição total ou, pelo menos, em grande escala da vida na terra. Mesmo agora, podemos presenciar uma destruição irreparável: efeito estufa, superaquecimento do planeta, poluição da água e do ar, redução preocupante das fontes de água potável, devastação de florestas e recursos naturais, extinção de plantas e animais, são alguns exemplos dessa ameaça;

no plano subjetivo, ocorre a separação entre indivíduo e sociedade até então unificados pela tradição. Emerge, assim, a personalidade como fator de autonomia, garantida por processos cognitivos, e de identidade pessoal: a conquista da sexualidade, a emancipação da mulher, os desejos e as aptidões pessoais e a realização profissional são alguns exemplos desta subjetividade conquistada.

7.2 As éticas aplicadas

As morais tradicionais tornam-se inoperantes frente aos avanços das ciên-cias e tecnologias. Há uma urgência, um clamor por uma nova ética, que possa fundamentar as ações humanas, com novas referências.

O desafio atual é repensar o seu modo de ser, propondo uma ética e uma sociabilidade que resgatem a dimensão coletiva do ser do homem grego, com sua visão de ser cosmopolita. Uma ética que, ao mesmo tempo, reconheça os valores universais humanos e as micro-realidades históricas; preserve a biodi-versidade e reconheça as especificidades locais; e que respeite as diferenças de gênero, etnia, religião.

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AULA 7 • FILOSOFIA, ÉTICA E CIDADANIA

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Qual o sentido exato das éticas práticas de nosso tempo? Russ (1999) preo-cupada com essa questão, faz uma reflexão sobre algumas éticas práticas: a bioética, a ética do meio ambiente, a ética do business (dos negócios), a ética das mídias e a ética da política. Vejamos cada uma delas.

7.2.1 A bioética – princípios e desafios

O termo bioética é utilizado desde a década de 80 do século XX, em virtude dos progressos da biologia. Inventado nos Estados Unidos pelo cance-rologista Potter, a bioética designa um “projeto de utilização das ciências biológicas destinado a melhorar a qualidade de vida”. As pesquisas nesse campo inicialmente têm propósitos pragmáticos e técnicos, sem preocupações de criação de um sistema refletido de valores. Russ (1999, p. 68) apresenta a seguinte definição:

(...) a bioética designa a expressão da responsabilidade em face da humanidade futura e distante que está confiada à nossa guarda, e a busca das formas de respeito devidas à pessoa – quer se trate de outrem ou de si mesmo –, busca que se efetua particularmente considerando o setor biomédico e suas aplicações.

7.2.2 A ética dos Negócios

No final dos anos sessenta do século XX, a ética da empresa começa a se desenvolver, sobretudo nos Estados Unidos. As denúncias de corrupção e escândalos em relação a produtos levam as firmas a iniciar um processo de reflexão sobre as responsabilidades da empresa. Nos anos 80, com o cresci-mento das discussões sobre a questão ética, mais de três quartos das grandes empresas dos Estados Unidos teriam um código de conduta e criariam comitês de ética. O mesmo ocorreu com países europeus.

Na realidade, os protagonistas das empresas estão em busca de regras de conduta e, para o crítico Octave Géliner, esta ética é de fato deonto-logia, uma síntese de desempenho e de obediência às regras.

Deontologia: a palavra deontologia, segundo o Dicionário Aurélio, tem sua origem no vocábulo grego déontos, que significa necessidade.

O termo designa a obrigatoriedade de se cumprir uma determinada regra ou norma, independentemente de seus resultados efetivos e dos interesses pessoais.

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Neste sentido, pode-se considerar que a própria deontologia não está isenta de sentido ético: a vontade de obedecer a regras, de praticar o respeito (simplesmente deontológico) ao outro, de subordinar os negócios à arte do êxito a longo termo, sem desprezar os parceiros, assinala uma perspectiva para o futuro, com implicações éticas. Busca-se a responsabilidade em relação à ação futura. Em que pesem as críticas à ética dos negócios, preocupar-se com o futuro sob a ótica da responsabilidade das ações empresariais é um processo importante, instalado no coração da ética dos negócios e, nesse sentido, em busca de valores, é axiológica.

7.2.3 Ética e Mídias

O mundo contemporâneo pode ser caracterizado por sua mediati-zação, isto é, as informações que recebemos são produzidas por outros e, por meio das mídias, as recebemos. São poucas as possibilidades de presenciarmos “in loco” algum evento. Como essa informação é produ-zida? Qual o critério de seleção utilizado para sua exposição? Qual o interesse em jogo?

Essas e outras questões nos levam a questionar o poder de mobilização das mídias. Com a promoção da sociedade do consumo, não se pode deixar de lado os interesses econômicos na “fabricação” de gostos, nos pacotes culturais prontos tais como o livro da moda, o filme que levantou a maior bilheteria, os sites mais visitados, os computadores e celulares de última geração. Todas essas manifestações da mídia não são gratuitas, nem desinteressadas: estão carregadas de sentidos e valores acessíveis à dinâmica de nossos desejos. Félix Guattari, pensador francês, nos fala de modos de produção da subjetividade, que delimitam o modo como podemos e devemos pensar, que pautam os assuntos interessantes e determinam os irrelevantes.

Que fatores de exploração destes recursos tão ricos da mídia estariam contribuindo para a desinformação, para o acirramento da crise de valores de nossa época? Antônio Gramsci, grande filósofo do século XX, destaca que, no processo de comunicação, é preciso analisar, dialeticamente, as relações entre aqueles que comunicam a mensagem e os que a recebem. Buscar alternativas para mudanças requer a análise de como o público reage com a informação recebida, como as seleciona, como pensa, que tipos de programa prefere, porque prefere uns e porque rejeita outros.

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Axiología (do grego άξιος valor, dignidade + λόγος estudo, tratado). Teoria do valor. Ramo da Filosofi a que tem por objeto o estudo da natureza dos valores e juízos valorativos, especialmente, os morais (Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Axiologia>).

7.2.4 Ética e política

Estariam hoje os termos ética e política separados? A gestão política no âmbito executivo atualmente defi ne-se, quase sempre, como pura organização, desprovida de análise dos valores apregoados em favor da cidadania, em nome da efi cácia e efi ciência, da competência técnica e, conforme freqüente-mente temos conhecimento, há grande manipulação dos recursos públicos em proveito dos próprios governantes, deixando de realizar as prioridades elen-cadas nas campanhas eleitorais, em prol das cidades ou das áreas rurais.

Saiba mais

A gestão política fi ca esvaziada de toda refl exão ética, ocorrendo ainda a sua profi ssionalização crescente, com a redução do político a uma estratégia de poder. Esse fenômeno tem gerado movimentos sociais dos mais variados matizes, em nome da garantia da efetivação dos direitos proclamados dos cidadãos. Movimentos das chamadas minorias (mulheres, negros, trabalha-dores rurais, homossexuais, marginalização pela pobreza, contra a invasão de países, pela paz, contra a corrupção, entre muitos outros).

Sujeito: indica a pessoa que age com autonomia e de maneira consciente, é alguém que pode ser considerado dono de seu destino, de suas escolhas.

Indivíduo: é referido mais à parte biológica da pessoa; indica uma posição que é relacionada a objeto.

Do ponto de vista teórico, muitos pensadores têm refl etido e buscado os fundamentos éticos da política, da democracia (tão apregoada, mas pouco efetivada na prática), seja pelos governantes nacionais, pelas políticas interna-cionais dos países hegemônicos em relação às demais nações.

Os princípios éticos que poderiam guiar nossas democracias estão minados, no mundo globalizado, liderado pelo capitalismo que monopoliza a quase totalidade do planeta. Trata-se de unifi car ética e política, compreender a democracia à luz da ética.

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7.3 Refletindo sobre as novas tecnologias

Se apresentássemos um questionário a um grupo de pessoas pedindo-lhes que apontassem a grande característica dos tempos atuais, sem dúvida os avanços tecnológicos seriam um dos mais citados. Pensar o nosso dia-a-dia sem o uso das novas tecnologias seria muito difícil. Este curso, que usa as tecnologias em EaD, simplesmente não existiria.

Uma reflexão sobre as tecnologias de última geração se faz necessária: como humanizar a tecnologia? Como a tecnologia pode interferir na formação da personalidade do ser humano? Quem se beneficia destas tecnologias? Essas e outras perguntas devem ser enfrentadas, pois não se pode mais pensar nossa sociedade sem o uso da tecnologia.

O impacto das novas tecnologias é evidente. Na maioria das vezes, quando se fala de tecnologia, tem-se a impressão de que ela tenha vida própria. Para muitas pessoas, a eliminação da tecnologia resolveria uma série de problemas, principalmente o desemprego. Essas pessoas não percebem que a tecnologia é uma ferramenta.

As novas tecnologias, principalmente a microeletrônica e a chamada biotecnologia, vêm ocupando um amplo espaço em nosso dia-a-dia. Frente a esse fenômeno, que é relativamente recente, não há um único modo de se portar. Assim, diante das novas tecnologias, tem-se visto duas atitudes anta-gônicas que poderíamos chamar, conforme (RIBEIRO, 1999, p. 78-79), de tecnotopia e tecnofobia:

por um lado, há uma visão que se maravilha com os avanços tecno-lógicos por sua contribuição para a ampliação das possibilidades humanas – tecnotopia. É fruto da ideologia do progresso e da visão evolutiva da história. A partir da Revolução Industrial, tem-se mostrado como a tábua de salvação para os problemas da humanidade;

por outro lado, há uma série de discursos pessimistas sobre a destruição causada pela parafernália tecnológica – a tecnofobia. Uma das suas principais causas é a má distribuição dos recursos tecnológicos alimen-tada também pelo temor de certos grupos da manipulação sem limites da natureza. Acusam o interesse do homem brincar de Deus.

Para Ribeiro (1999, p. 80), no fundo, a tecnologia é, conforme analisava Freud, um desejo de transcendência por parte do ser humano. A humanidade vê na tecnologia uma possibilidade de ultrapassar seus limites, ampliando as

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possibilidades de extensão do corpo humano para aumentar seu poder nas relações com os outros e a natureza.

Qualquer reflexão sobre a tecnologia deve superar aquela dicotomia e focar naquilo que é específico. A palavra tecnologia é formada por dois termos gregos: téchne – habilidade ou arte de fazer algo – e logos – discurso, estudo, ciência sobre. É uma abordagem científica sobre os instrumentos que o ser humano utiliza para transformar a natureza. Recorrendo à etimologia da palavra, fica explícito o caráter instrumental da tecnologia: é uma ferramenta a serviço do ser humano. Não existe em si nem por si, mas depende do uso que nós seres humanos fazemos dela.

A partir disto, podemos inferir que o discurso fatalista tanto dos tecnó-fobos quanto dos tecnótopos não se sustenta. A tecnologia é fruto de opções histórico-políticas que os seres humanos fazem, visando à manutenção de seu espaço de poder.

Karl Marx, no século XIX, já denunciava o poder que as coisas têm de colocar de ponta-cabeça aquilo que é produção humana. Isto é, o ser humano cria os objetos e, depois, perde a noção de que as coisas são criações suas e passa a imaginá-las como se tivessem vida própria. Você já viu por aí algum robô ou computador pleiteando uma vaga de trabalho? É claro que não! Não é a tecnologia em si que ameaça o ser humano, mas o uso que certos grupos fazem dela.

As tecnologias devem ser pensadas como uma forma de emancipação, de tomada de consciência do educando como sujeito de seu desenvolvimento. Precisamos estar cientes disso e compreender a tecnologia não como um fata-lismo – é assim e todos devem adaptar-se. Lembremo-nos de que a tecno-logia é criação humana e seus usos devem ser discutidos, suas conseqüências devem ser levadas em conta, seus benefícios devem ser divididos da forma mais justa possível.

Em nossa sociedade, os meios de comunicação têm-se mostrado como um local privilegiado de mudanças tecnológicas. Por meio da internet e da televisão a cabo, a informação circula com uma velocidade muito grande. Para muitos, isto significa uma era de mudanças na sociedade. Para Giroux (1997, p. 112), esse relacionamento entre mudanças sociais e inovação tecnológica não é tanto uma questão relativa à natureza das novas tecnolo-gias, mas deve-se muito mais à ideologia do grupo dominante que controla a inserção destas tecnologias. Uma possibilidade para Giroux estaria em

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concentrar-se na contradição entre o uso e o potencial que determinada tecnologia possui. Vejamos o exemplo da Educação à Distância (EaD), em que as potencialidades das diversas tecnologias, transmissão via satélite, internet são utilizadas para a formação de novos profissionais, ampliando o acesso à educação.

7.4 Hans Jonas e a ética da responsabilidade

Hans Jonas é um dos pensadores contemporâneos cujo pensamento está centrado na construção de uma ética voltada para os impactos da tecnologia. No contexto das éticas aplicadas, vistas anteriormente, procura recuperar a dimensão da coletividade e de uma ética capaz de responder aos desafios de nossa realidade e às conseqüências futuras da ação tecnológica.

De acordo com esse pensador, a tecnologia está aí e não há volta para esse processo. Pela primeira vez na história da humanidade, o ser humano goza de um poder quase ilimitado, fruto do avanço tecnoló-gico. O mau uso da tecnologia pode colocar em risco a própria sobrevi-vência da humanidade. Estão aí para comprovar essa tese, a devastação ambiental, a produção e o uso de armas nucleares, químicas e biológicas e a ampliação sem precedentes da miséria e da fome de milhões de pessoas pelo mundo afora.

É preciso, portanto, propor uma ética da responsabilidade pelas conseqüên cias futuras das ações que praticamos atualmente por meio do uso da tecnologia. Jonas desenvolve assim uma ética que procura refletir no aqui e agora sobre conveniência ou não do uso de certas tecnologias. Leva em conta o fato de que somos fruto de um processo que vem de outras gerações. O planeta não é único e exclusivamente nosso. Pertence às gerações futuras e às outras espécies animais e vegetais.

Da mesma maneira que Kant, Hans Jonas propõe um novo imperativo. Um imperativo que procura dar conta de nossas ações atuais e de suas conseqüências. Este imperativo é formulado da seguinte maneira:

“Age de modo que os efeitos de tua ação sejam compatíveis com a permanência de uma vida autenticamente humana sobre a terra”.

“Age de modo que os efeitos de tua ação não sejam destrui-dores para a possibilidade futura de tal vida”.

“Não comprometas as condições da sobrevivência indefinida da humanidade na terra”.

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“Inclui em tua escolha atual a integridade futura do homem como objeto secundário de teu querer” (JONAS citado por RUSS, 2006, p. 100).

Como pode-se perceber no texto anterior, o imperativo da responsabili-dade se mostra como uma forma de prevenir danos aos direitos das gerações futuras. Para Jonas, esse princípio é a maneira pela qual nossa geração pode dar um futuro digno ao nosso planeta.

Síntese da aula

Neste tema, analisamos alguns aspectos da problemática da ética e da cidadania na Idade Contemporânea, em especial do Período Pós-moderno. A emergência do indivíduo como fonte de toda e qualquer justificação racional coloca o problema da relação do sujeito com a coletividade. No mundo contemporâneo, este dilema é resolvido em favor do sujeito e é do respeito ao sujeito individual que é necessário fundamentar toda a filosofia, a ética e a cidadania. A reflexão sobre as novas tecnologias é hoje essencial. Vimos as atitudes diante das tecnologias: Tecnotopia é uma visão que se maravilha com os avanços tecnológicos por sua contribuição para a ampliação das possi-bilidades humanas. Tecnofobia é uma série de discursos pessimistas sobre a destruição causada pela parafernália tecnológica. Hans Jonas propõe uma ética da responsabilidade pelas conseqüências futuras das ações que prati-camos atualmente por meio do uso da tecnologia.

Atividades

1. O termo Pós-moderno designa, genericamente, toda uma corrente de pensamento que tem em comum uma critica à visão de mundo da moder-nidade. Ela se expressa em diferentes áreas, da arquitetura à filosofia, da psicanálise à sociologia, da física à história. Das afirmativas que seguem qual não é característica da pós-modernidade:

a) crítica ao racionalismo iluminista;

b) crítica à concepção de ciência como redentora dos males da humanidade;

c) processo de desconstrução e dissolução das utopias e do sentido;

d) explicação da realidade a partir de concepções essencialistas ou metafísicas.

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2. O impacto das novas tecnologias na sociedade é evidente. Diante das novas tecnologias, tem-se visto duas atitudes antagônicas que poderí-amos chamar de:

a) tecnotopia e tecnofobia

b) tecnicismo e tecnofobia

c) tecnopessimismo e tecno-otimismo

d) tecnólogos e técnicos

3. Caracterize, em um texto de 10 linhas, a ética da responsabilidade proposta por Hans Jonas.

4. A partir da reflexão da contextualização da pós-modernidade, feita no início da aula, reflita sobre os desafios éticos do mundo contemporâneo.

Comentário das atividades

Na atividade 1, a alternativa correta é a (d), pois as visões essencialistas tratam o ser humano sem levar em conta sua história. As demais representam o pensamento predominante da pós-modernidade porque criticam a idéia de uma razão onipotente (a), não reconhecem a ciência como um processo somente benéfico (b) ou porque afirmam que no contexto contemporâneo é extremamente difícil a existência de grandes utopias (c).

Na atividade 2, a alternativa correta é a (a) pois a tecnotopia e a tecno-fobia são atitudes extremas em relação à tecnologia afirmando os benefícios ou denunciando os prejuízos da tecnologia. As alternativas (b), (c), (d) estão incorretas, pois os termos citados não estão de acordo com o tema abordado e com o enunciado da questão.

A atividade 3 poderá ser desenvolvida abordando o papel que as gera-ções atuais têm no cuidado com os recursos tecnológicos de forma que não venham a comprometer as gerações futuras.

A atividade 4 deverá abordar que a pós-modernidade traz desafios às éticas tradicionais que só podem ser enfrentados pelas éticas aplicadas. Exemplo disso está na questão das minorias étnicas e sociais, questões de gênero, questões ligadas à diversidade cultural, novas tecnologias, sustenta-bilidade e meio ambiente, temas que não estavam incluídas no debate das éticas tradicionais.

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ReferênciasGIROUX, Henry A. Os professores como intelectuais: rumo a uma pedagogia crítica da aprendizagem. Porto Alegre: Artmed, 1997.

RIBEIRO, Gustavo L. Tecnotopia versus tecnofobia o mal-estar do século XXI. Humanidades. Brasília, n. 45, 1999.

RUSS, J. Pensamento ético contemporâneo. São Paulo: Paulus, 1999.

Anotações

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