1
Luciano Lourenço
Guillermo Julio
ANÁLISE ÀS ESTRUTURAS ORGANIZATIVAS
DE PREVENÇÃO E COMBATE AOS
INCÊNDIOS FLORESTAIS
EXISTENTES EM PORTUGAL CONTINENTAL
NO ANO DE 2003
RREELLAATTÓÓRRIIOO FFIINNAALL
Coimbra
10 de Outubro de 2003
2
1
Luciano Lourenço
Guillermo Julio
ANÁLISE ÀS ESTRUTURAS ORGANIZATIVAS
DE PREVENÇÃO E COMBATE AOS
INCÊNDIOS FLORESTAIS
EXISTENTES EM PORTUGAL CONTINENTAL
NO ANO DE 2003
RREELLAATTÓÓRRIIOO FFIINNAALL
Coimbra
10 de Outubro de 2003
2
3
SUMÁRIO
Pág.
INTRODUÇÃO 5
PROGRAMA DE TRABALHO 7
ANÁLISE GERAL SOBRE A SITUAÇÃO DE PORTUGAL 11
ANÁLISE DE AFOLCELCA 21
RECOMENDAÇÕES 25
À GUISA DE CONCLUSÃO 35
ANEXOS 37
4
5
INTRODUÇÃO
Os avultados danos causados pelos incêndios florestais em Portugal Continental,
durante o ano de 2003, comoveram a população do país, abalaram as instituições
governamentais e prejudicaram gravemente os proprietários de terrenos rurais.
Com efeito, de acordo com os valores constantes do Relatório Provisório sobre
Incêndios Florestais – 2003, publicado pela Divisão de Protecção e Conservação Flores-
tal, da Direcção Geral das Florestas, de 18 de Setembro, a superficie ardida no território
do continente, até ao dia 14 de Setembro, deve rondar cerca de 410 mil hectares, dos
quais aproximadamente 70% correspondem a povoamentos florestais e 30% a mato.
Os números apresentados são realmente alarmantes, porque correspondem à
incineração de cerca de 5 % do território continental e a mais de 8% da sua área
florestal queimada. Desta situação resultaram graves impactes e danos — ecómicos,
sociais, culturais e ambientais — pois, além da perda dos povoamentos florestais e do
mato, incluem também o desaparecimento de culturas agrícolas, bem como a destruição
de vivendas, casa e instalações rurais e, ainda mais grave, a morte de várias pessoas,
bem como de animais domésticos e de gado.
Para fazer face a calamidades deste tipo, há sensivelmente dois anos, as
Empresas Portucel, Soporcel, Caima e Celbi, uniram esforços e integraram recursos na
Afocelca, uma organização estabelecida com o sentido de, em conjunto, poderem vir a
proteger a totalidade dos respectivos patrimónios florestais.
Apesar de disporem duma organização própria de combate a incêndios, estas
empresas perderam, no ano de 2003, aproximadamente 10 % das suas plantações de
eucaliptos (cerca de 20.000 ha), percentagem superior à da média nacional, o que
representa uma perda considerável dum recurso destinado exclusivamente ao
abastecimento das suas indústrias de celulose.
Perante esta difícil situação, o Conselho de Administração do Grupo Portucel/
/Soporcel entendeu por conveniente encomendar um estudo a peritos externos sobre o
problema ocorrido.
Estes entenderam dever incluir nesse estudo não só a análise da formulação e do
cumprimento dos planos de protecção, mas também a organização estabelecida para a
sua execução, os recursos afectados e a gestão realizada. Além disso, consideraram que
seria conveniente incorporar à tarefa recém-descrita uma opinião geral das instituições
públicas que, por imperativo legal, devem assumir a primeira responsabilidade na
prevenção e no combate aos incêndios florestais, e que se são, respectivamente, a
Direcção Geral das Florestas e o Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil.
O mencionado estudo visa, pois, um duplo propósito: Por um lado, visa detectar
os problemas existentes, em particular aqueles que sejam impedimento para as empresas
procederem à protecção do seu património florestal e, concomitantemente, pretende
apresentar propostas concretas de eventuais soluções, através da aplicação de acções
correctivas, de previsível e necessária aplicação futura. Por outra parte, procurou
avaliar, se bem que apenas em termos gerais, a gestão dos organismos públicos
envolvidos na defesa da floresta contra os incêndios e, como consequência, pretendeu
apresentar as correspondentes recomendações, em termos de medidas a implementar, as
quais correspondem a aspectos que se identificaram como pontos fracos.
Os peritos externos executantes do estudo, Professores Luciano Lourenço e
Guillermo Julio, das Universidades de Coimbra e do Chile, respectivamente, realizaram
o seu trabalho entre os días 12 e 21 de Setembro do presente ano de 2003, tempo
insuficiente para terem procedido a uma análise bastante detalhada, apesar da forma
exaustiva como decorreu, mas que, mesmo assim, permitiu efectuar as análises e obter
os resultados que se expõem nas páginas seguintes.
6
7
PROGRAMA DE TRABALHO
Dia 12
Reuniões na RAIZ
Manhã: 10h00-13h30
Participantes: Engº Rogério Freire, Administrador da Portucel Florestal (Coordenador);
Engº Serafim Tavares, Director-Geral da RAIZ;
Engº Luis Lemos, Consultor da RAIZ;
Prof. Engº. Guillermo Julio, Faculdade de Ciências Florestais, Universidade do
Chile; Prof. Doutor Luciano Lourenço, Inst. Est. Geográficos, Fac. Letras, Univ. de
Coimbra.
Sumário:
– Apresentação dos objectivos do trabalho;
– Definição da metodologia geral;
– Programação das actividades a desenvolver;
– Levantamento da documentação a consultar;
– Calendarização dos trabalhos;
Tarde – 14h30-16h00
Participantes: Prof.s Guillermo Julio e Luciano Lourenço;
Sumário:
– Enquadramento do trabalho no contexto da problemática dos incêndios florestais
em Portugal Continental;
– Afinação da metodologia de trabalho;
– Definição das entidades oficiais a serem contactadas;
Tarde –16h00-17h30
Participantes: Engº.s Rogério Freire, Serafim Tavares e Luis Lemos, Portucel/Soporcel;
Prof.s Guillermo Julio e Luciano Lourenço, Consultores;
Sumário:
– Contactos com entidades, para marcação de reuniões a ter na segunda-feira;
– Nomeação do representante da Portucel/Soporcel que acompanharia os
consultores;
– Acertos finais do programa a desenvolver, que ficou acordado ser o seguinte:
Segunda e terça-feira, entrevistas com as entidades envolvidas na prevenção e
combate a incêndios florestais;
Quarta-feira, manhã livre, para organização do material recolhido. Reunião,
durante a tarde, para avaliação do trabalho afectuado e preparação do trabalho
de campo a efectuar nos dias seguintes;
Quinta e sexta-feira, trabalho de campo;
Sábado e Domingo, elaboração de relatório;
Segunda-feira, entrega do relatório.
8
Dia 15
Entrevistas em Lisboa
10h00 – Aliança Florestal e Afocelca;
Entrevistado: Engº. Pedro Moura, Aliança Florestal e Afocelca
Participantes: Prof.s Guillermo Julio e Luciano Lourenço, Consultores;
Engº. Luis Lemos, Consultor da Raiz;
15h00 – Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil;
Entrevistado: Engº. Pedro Lopes, Vice-Presidente do Serviço Nacional de Bombeiros e
Protecção Civil;
Participantes: Prof.s Guillermo Julio e Luciano Lourenço, Consultores;
Engº. Luis Lemos, Consultor da Raiz;
18h00 – Direcção-Geral das Florestas.
Entrevistados: Engº. A. Sousa Macedo, Director Geral das Florestas
Engº. Manuel Rebelo, Subdirector Geral das Florestas;
Engº. Vitor Louro, Director dos Serviços de Valorização do Património Florestal;
Engª. Ivete Strecht, Chefe da Divisão de Protecção e Conservação Florestal
Engº. Miguel Galante, Divisão de Protecção e Conservação Florestal.
Participantes: Prof.s Guillermo Julio e Luciano Lourenço, Consultores;
Engº. Luis Lemos, Consultor da Raiz;
Dia 16
Entrevistas na Região Centro
10h00 – Afocelca (Leirosa);
Entrevistados: Engº. Orlando Ormazábal, Director Executivo da Afocelca
Participantes: Prof.s Guillermo Julio e Luciano Lourenço, Consultores;
Engº. Luis Lemos, Consultor da Raiz;
15h30 – Centro de Formação da Escola Nacional de Bombeiros (Lousã);
Entrevistados: Cmdt. Gouveia Serra, Director do Centro;
Cmdt.s Victor Ginja e Parola Gonçalves, Formadores de Combate a Incêndios
Florestais;
Participantes: Prof.s Guillermo Julio e Luciano Lourenço, Consultores;
19h00 – Coimbra;
Entrevistados: Cor. Ribeiro de Almeida, Inspector Regional de Bombeiros do Centro e Chefe da
Delegação do Serviço Nacional de Protecção Civil do Distrito de Coimbra (na
aposentação);
Participantes: Prof.s Guillermo Julio e Luciano Lourenço, Consultores;
9
Dia 17
Coimbra
17h00 – Reunião no NICIF
Participantes: Engº.s Rogério Freire, Serafim Tavares, Oliveira Martins, João Lé e Luis
Lemos, Grupo Portucel/Soporcel;
Prof.s Guillermo Julio e Luciano Lourenço, Consultores;
Sumário:
– Preparação do trabalho de campo dos dias seguintes;
– Definição das áreas queimadas a merecerem observação especial:
Dia 18
Nisa;
Fratel;
Chamusca;
Dia 19
Monchique-Silves;
Aljezur-Odemira.
– Programação dos locais de observação, itinerários a seguir e dos pontos de
paragem;
– Definição dos elementos a inquirir em cada uma das áreas:
Pertencentes às empresas:
Gestor da Divisão;
Técnico da Aliança Florestal;
Chefe da Brigada Afocelca;
Exteriores às empresas
Coordenador de Socorros do Distrito;
Comandante de Bombeiros
– Contacto com os elementos a inquirir no dia seguinte, com indicação do local e
hora da entrevista.
Dia 18
10
Incêndios do Vale do Tejo
Participantes: Engº.s Oliveira Martins e João Lé, Portucel/Soporcel;
Prof.s Guillermo Julio e Luciano Lourenço, Consultores;
Entrevistas:
Nisa:
Cmdt. Polido, Comandante dos Bombeiros Voluntários de Nisa;
Carlos Pereira, Gestor da Divisão;
Raul Matos, Técnico da Aliança Florestal;
Rogério Dias, Chefe de Brigada Afocelca;
Castelo Branco
Rui Esteves, Coordenador de Socorros do Distrito de Castelo Branco;
João Pires, Técnico da Aliança Florestal;
Jorge Pires, Chefe de Brigada Afocelca;
Caniceira (Chamusca):
José Luís Carvalho, Gestor da Divisão;
Arlindo Neto, Técnico da Aliança Florestal;
Hugo Rodrigues,Chefe de Brigada Afocelca;
Joaquim Chambel, Coordenador de Socorros do Distrito de Santarém;
Dia 19
Incêndios do Sul
Participantes: Engº.s Oliveira Martins e João Lé, Portucel/Soporcel;
Prof.s Guillermo Julio e Luciano Lourenço, Consultores;
Entrevistas:
Monchique:
Francisco Inácio, Técnico da Aliança Florestal e 2º. Comandante dos
Bombeiros Voluntários de Odemira;
Fernando Fonseca, Técnico da Aliança Florestal;
Fiais
Engº. José Vilhena, Gestor da Divisão Sul;
José Gonçalves, Técnico da Aliança Florestal;
Miguel Guerreiro, Chefe de Brigada Afocelca;
Caniceira
Engº. Oliveira Martins, Representante da Aliança Florestal no
Conselho Técnico da Afocelca;
Mário Santana, Supervisor Chefe da Brigada Helitransportada que
foi vítima do acidente (não se concretizou por estar a combater
incêndio);
João Rodrigues, combatente, grande conhecedor do terreno onde
ocorreu o acidente, por viver muito próximo do local (idem);
11
ANÁLISE GERAL SOBRE A SITUAÇÃO DE PORTUGAL no que concerne à caracterização da floresta portuguesa e à organização das
estruturas de prevenção e combate incêndios florestais
Evolução do coberto florestal e dos incêndios florestais
A floresta portuguesa resulta de uma longa evolução do coberto florestal
autóctone que, ao longo dos tempos, começou por evoluir naturalmente e, depois,
passou a ser cada vez mais intervencionado pelo homem, ao ponto de, em certas
regiões, ter destruído completamente os bosques autóctones.
Algumas medidas de protecção a certas espécies têm vindo a ser tomadas desde
os primórdios do séc. XIV, sobretudo por D. Dinis (1320), a quem também se atribui o
início da fixação sistemática das areias das dunas litorais, por ter mandado semear o
“Pinhal de Leiria”.
Contudo, só com o Plano de Povoamento Florestal (1940) se aprova e inicia a
sementeira maciça e a plantação do pinheiro bravo, tanto nas areias do litoral, como nas
serras escalvadas do interior, política que irá originar das maiores manchas contínuas de
pinheiro bravo de toda a Europa.
A partir de meados da década de 70, do século XX, grandes incêndios florestais
passaram a dizimar muitos destes povoamentos de pinhal que, progresssivamente, têm
vindo a ser substituídos por eucaliptos.
Ora, o aumento exponencial do número de ocorrências de fogos florestais,
registado no último quartel do século XX e que parece começar a inverter-se no início
deste séc. XXI (fig. 1), ficou a dever-se a profundas transformações que, a partir de
meados do séc. XX, começaram a fazer sentir-se na população residente nas áreas
florestais, sobretudo do interior do país, mas que se intensificaram no último quarto
daquele século e se traduziram numa grande redução dos efectivos populacionais,
acompanhados de substanciais mudanças tanto nas suas estruturas (etária, social,
económica e cultural), como nos sectores das actividades por eles desenvolvidas, com
significativa redução das ligadas à agricultura e à floresta, ou seja, das agro-silvo-
pastoris, e com significativo incremento das actividades ligadas à indústria e aos
serviços.
Deste modo, tanto o êxodo rural, que levou à concentração da população activa
nas grandes áreas urbanas, nas sedes de distrito e de município, e deixou, por isso, as
áreas florestais com uma população muito rarefeita e idosa, como a rápida modificação
na ocupação da população activa que continuou a residir nas áreas florestais, conduziu
ao abandono de muitos campos agrícolas. Por conseguinte, não só foram criadas muitas
áreas de incultos que, progressivamente, foram sendo ocupadas por mato e floresta,
aumentando significativamente os espaços com potencialidades florestais, mas também
ficou reduzida a intervenção na floresta, onde passaram a acumular-se grandes cargas de
combustível.
Estas condições facilitam o rápido desenvolvimento e a progressão dos grandes
incêndios florestais (fig. 2), sobretudo com situações meteorológicas simultaneamente
favoráveis à deflagração (temperatura do ar elevada e humidade relativa do ar reduzida)
e à propagação (existência de vento, por vezes com rajadas fortes, preferencialmente do
quadrante Este), como têm acontecido com relativa frequência ao longo dos últimos
anos e que, quase sempre, correspondem a semanas com grande número de ocorrências
e vastas extensões percorridas pelas chamas (QUADRO I).
12
Fonte: DGF
Fig. 1 – Evolução do número de ocorrências de fogos florestais em Portugal Continental. O
progressivo aumento do número de ocorrências de fogos florestais dá bem conta da urgência
do trabalho que é necessário continuar a efectuar para manter e, porventura, acentuar a inver-
são desta tendência que, finalmente, parece começar a esboçar-se no início do século XXI.
Fonte: DGF
Fig. 2 – Evolução anual da área ardida em Portugal Continental.
Os anos com menor área ardida (1977, 1988, 1997) beneficiaram de condições
meteorológicas desfavoráveis à propagação de incêndios florestais.
13
Nas propriedades das empresas, a incidência de áreas ardidas tem apresentado
valores pouco significativos quando comparados com os registados no conjunto do
território continental, à excepção de 2003, ano em que a área ardida nas propriedades
das empresas quase duodecuplou, ou seja, foi doze vezes maior do que a verificada em
2000, o pior dos anos anteriores (fig. 3), enquanto que, no conjunto do território, pouco
duplicou o valor do pior dos anos anteriores, que foi o de 1991 (fig. 2).
0
2 500
5 000
7 500
10 000
12 500
15 000
17 500
20 000
1968
1970
1972
1974
1976
1978
1980
1982
1984
1986
1988
1990
1992
1994
1996
1998
2000
2002
Fonte: Grupo Portucel Soporcel
Fig. 3 - Evolução anual da área ardida nas propriedades do Grupo.
Curiosamente, do ponto de vista meteorológico, o ano de 2003, contrariamente
ao que uma simples análise aos quantitativos das áreas ardidas possa sugerir, em regiões
tradicionalmente problemáticas do litoral centro e norte, até foi relativamente mais
fresco e húmido do que anos anteriores ou manteve condições meteorológicas
relativamente semelhantes às existentes nos anos mais adversos (fig. 4). Pelo contrário,
nas regiões do interior, sobretudo do centro e sul, as situações foram, de modo geral,
mais severas do que as habitualmente registadas, pelo que foi sobretudo aí que se
concentraram as grandes manchas ardidas (fig. 5).
0,0
10,0
20,0
30,0
40,0
50,0
60,0
70,0
80,0
90,0
100,0
J-1 3 5 7 9 11 13 15 17 19 21 23 25 27 29 31 2 4 6 8 10 12 14 16 18 20 22 24 26 28 30
TMºC
HRm%
Fonte: IGUC
Fig. 4 – Evolução dos valores diários da temperatura máxima e da humidade relativa
mínima do ar, no Instituto Geofísico da Universidade de Coimbra,
durante os meses de Julho e Agosto de 2003.
14
Fig. 5 - Distribução espacial dos
grandes incêndios florestais
registados em Portugal Continental
durante o ano de 2003
Fonte: EUROPEAN COMMISSION
DIRECTORATE GENERAL JOINT RESEARCH CENTRE
INSTITUTE FOR ENVIRONMENT AND SUSTAINABILITY Land Management Unit
Update to the report “The European Forest Fires Information System
(EFFIS) results on the 2003 fire season in Portugal” (Sept. 15, 2003).
Sem pretender entrar em análises exaustivas às condições meteorológicas que se
fizeram sentir durante o período estival, nas diferentes regiões do continente, por
ultrapassarem os objectivos deste relatório, não podemos deixar de mencionar que, no
período mais crítico correspondente aos primeiros dias de Agosto, a simultaneidade de
muitos focos de incêndio, que se ficaram a dever a trovoadas secas, quase sempre
acompanhadas por temperatura elevada e reduzida humidade relativa do ar, bem como por
vento forte, com rajadas superiores a 100 Km/h, criaram condições para a fácil propagação
e aumentaram a dificuldade do combate, a que não foi alheio um certo histerismo colectivo,
em parte gerado pelos meios de comunicação social.
A principal consequência deste facto terá sido a afectação de muitos meios dos
bombeiros à defesa das habitações, com o consequente desguarnecimento das frentes de
chamas e das primeiras intervenções, o que impediu o ataque directo às chamas e, por isso,
em muitas circunstâncias, tiveram possibilidade de progredir sem qualquer impedimento.
Adiante desenvolveremos esta e outras situações que, do nosso ponto de vista,
ajudam a explicar os diferentes acontecimentos que permitiram o desenrolar da tragédia que
afectou a floresta portuguesa no verão de 2003.
15
QUADRO I – Áreas ardidas e número de ocorrências de fogos e de grandes incêndios
florestais registados em semanas com condições meteorológicas muito favoráveis à
deflagração e propagação de incêndios florestais
Ano Semana Nº. de ocorrências
(≥ 3 000)
Área ardida
(≥ 12 500 ha)
Nº de IF
≥ 100 ha
1998
27Jul a 02Ago 3 253 7 989 8
03Ago a 09 Ago 5 549 35 692 41
10Ago a 16 Ago 3 453 8 587 20
17Ago a 23Ago 3 518 19 345 25
24Ago a 30 Ago 3 431 14 365 16
1999 19Jul a 25Jul 2 901 12 580
2000 31Jul a 06Ago 3 114 15 436 16
07Ago a 13Ago 3 773 21 019 26
14Ago a 20Ago 3 431 12 339 24
2001 06Ago a 12Ago 2 863 14 176 20
03Set a 09Set 3 863 17 093 11
10Set a 16Set 3 515 9 343 6
2002
08Jul a 14Jul 687 15 027 15
15Jul a 21Jul 2 332 17 362 25
22Jul a 28Jul 1 928 14 394 20
29Jul a 04Ago 2 561 21 616 27
2003
28Jul a 03Ago 2 052 242 786 51
04Ago a 10Ago 1 974 54 620 27
11Ago a 17Ago 1 365 29 486 10
Fonte: DGF
A lenta evolução inicial do coberto florestal ao longo dos séculos deu lugar, nos
últimos anos, a rápidas transformações, devidas sobretudo à grande incidência dos
incêndios florestais, que tiveram como consequência uma profunda alteração das espécies
autóctones, fazendo com que, na actualidade, as duas espécies mais representativas da
floresta do Norte e Centro de Portugal sejam o pinheiro bravo e o eucalipto, enquanto que,
no sul, ainda continuam a dominar o sobreiro e a azinheira, mas onde o eucalipto e o
pinheiro manso começam a ocupar áreas cada vez mais significativas, pelo que as áreas
ocupadas por floresta no território continental se distribuem do seguinte modo:
Espécie florestal Área florestal
Hectares (ha) Percentagem (%)
Pinheiro bravo (Pinus pinaster) 976 069 31
Eucalipto (Eucalyptus spp.) 672 149 21
Sobreiro (Quercus suber) 712 813 22
Azinheira (Quercus rotundifolia) 461 577 14
Outras resinosas 105 008 4
Outras folhosas 273 515 8
Total 3 201 131 100,0
Fonte:DGF/IFN, 2001
16
Evolução da estrutura organizativa de prevenção e combate aos incêndios florestais
Foi, também a partir de meados da já referida década de 70 do séc. XX que,
paulatinamente, foram introduzidas sucessivas alterações na estrutura nacional de
prevenção e combate aos incêndios florestais. Nos últimos anos esboçaram-se algumas
tentativas de profunda reestruturação dos serviços do Ministério da Administração Interna
envolvidos nesta problemática — Serviço Nacional de Protecção Civil, Serviço Nacional de
Bombeiros e Comissão Nacional Especializada de Fogos Florestais —, que acabaram por
se concretizar com a fusão destes três serviços num único — o Serviço Nacional de
Bombeiros e Protecção Civil — pelo que este ano de 2003, apresentou substanciais
alterações relativamente ao ano passado, sobretudo no que respeita à estrutura organizativa
do combate aos grandes incêndios florestais.
Desde logo, a própria designação de Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção
Civil, parece-nos desadequada e deveria ser alterada para, apenas, Serviço Nacional de
Protecção Civil, pois, uma vez que o Estado não possui bombeiros, quanto a nós, não se
justifica a existência dum Serviço Nacional de Bombeiros.
Além do mencionado organismo do Ministério da Administração Interna, intervêm
também na prevenção e auxiliam no combate aos incêndios florestais, outros serviços do
Ministério da Agricultura, Desenvolvimento Rural e Pescas e do Ministério do Ambiente,
que são responsáveis pela gestão de áreas públicas ou que se encontram sob administração
pública. Existem ainda outros organismos oficiais que colaboram na prevenção de
incêndios florestais, pelo que a estrutura de prevenção e combate a incêndios florestais está
organizada do seguinte modo (QUADRO II).
O combate aos incêndios florestais é da responsabilidade dos bombeiros que, para o
efeito, se organizam em grupos de primeira intervenção (GPI). Nessa tarefa são auxiliados
por outras equipas de primeira intervenção que com eles colaboram na extinção, rescaldo e
vigilância de incêndios florestais (QUADRO III).
Os grupos de primeira intervenção são, em regra, constituídos por bombeiros
voluntários, embora todos os corpos de bombeiros bombeiros (QUADRO IV) possam ser
chamados a colaborar no combate às chamas, especialmente em situações da chamada
segunda intervenção, para rendição dos grupos de primeira intervenção e para reforço dos
meios envolvidos em operações que tardam em dar-se por concluídas.
Se bem que, do ponto de vista teórico, esta organização possa funcionar, tem-se
verificado que, ao longo dos anos, cada vez mais tem dificuldade em dar a resposta
adequada a situações de crise, já que a mobilização de meios para segunda intervenção
parece cada vez mais difícil, acabando por funcionar quase sempre, numa primeira fase,
com recurso a grupos de primeira intervenção não envolvidos em operações, mas que
deixam desguarnecidas as suas zonas de intervenção, e num segundo momento, com a
mobilização de grupos de reforço que, frequentemente, são obrigados a percorrer grandes
distâncias. Nestas condições, quando chegam ao teatro de operações estarão mais aptos
para irem descansar do que para combater incêndios florestais.
17
QUADRO II – Organismos oficiais envolvidos na prevenção e combate a incêndios
florestais, por Ministérios
Minis-
tério Entidade Competências
Agri
cult
ura
, D
esen
volv
imen
to
Rura
l e
Pes
cas
Direcção-Geral das
Florestas
– Definição das políticas de prevenção e vigilância;
– Recolha e tratamento da informação estatística;
Direcções Regionais de
Agricultura (5)
– Detecção de incêndios;
– Fiscalização/policiamento;
– Prevenção e vigilância;
– Primeira intervenção;
– Determinação das causas;
Adm
inis
traç
ão I
nte
rna
Ser
viç
o N
acio
nal
de
Bom
bei
ros
e
Pro
tecç
ão C
ivil
Comissão
Nacional
Especializada de
Fogos Florestais
– Protecção da floresta privada e alguma do Estado, através
do financiamento de projectos de: infraestruturas
florestais; infraestruturas dos meios aéreos de combate;
vigilância móvel terrestre; vigilância aérea; limpeza de
matos; sensibilização da população escolar; sensibilização
da população em geral; investigação científica;
Serviço
Nacional de
Bombeiros
– Comando de grandes operações;
– Coordenação de meios;
– Apoio financeiro aos corpos de bombeiros;
Serviço
Nacional de
Protecção Civil
– Coordenação técnica e operacional dos meios a empenhar
em situações de crise (acidente grave, catástrofe e
calamidade);
– Mobilização de meios exteriores aos bombeiros;
– Compensações sociais de danos produzidos pelos
incêndios florestais;
– Contratação de meios estrangeiros;
Guarda Nacional
Republicana e Polícia
de Segurança Pública
– Vigilância;
– Fiscalização;
– Determinação de causas;
Am
bie
nte
Instituto de
Conservação da
Natureza
– Detecção de Incêndios;
– Fiscalização/Policiamento;
– Prevenção e vigilância;
– Primeira intervenção;
Instituto de
Meteorologia
– Previsão das condições meteorológicas;
– Cálculo do índice de risco de incêndio;
Just
iça
Polícia Judiciária – Investigação de crimes de incêndio;
– Levantamento de processos crime;
Ciê
nci
a e
Ensi
no
Super
ior
Universidades e
Institutos Politécnicos
– Investigação científica;
– Estudo e análise de casos concretos de incêndios ocorridos
(causas, desenvolvimento, consequências);
Edu
-
caçã
o Escolas dos Ensinos
Básico e Secundário
(Clubes da Floresta)
– Sensibilização e responsabilização da população escolar;
– Educação/formação florestal;
18
QUADRO III – Tipo de equipas de primeira intervenção que podem ser envolvidas no
combate a incêndios florestais
Designa-
ção
Enti-
dade
respon-
sável
Nº. de
ele-
men-
tos
Compo-
sição
Forma-
ção
certi-
ficada
Função Observações
Grupo de
primeira
inter-
venção
(GPI)
Corpo
de
Bom-
beiros
5
Variável,
funciona
por escala
de serviço.
Ao longo da
campanha, a
composição
do GPI
pode variar
diariamente;
Rara-
mente
– Extinguir os fogos
nascentes;
– Deveriam regressar
ao quartel sempre
que a supressão se
prolongasse no
tempo para ficarem
disponíveis para
novas primeiras
intervenções;
– Frequentemente, são
mobilizados para
combate a incêndios
florestais for a da
sua área prioritária
de intervenção;
Equipas
de Sapa-
dores
Flores-
tais
(ESF)
Assoc.
de
Produt.
Flor.,
Juntas
Freg.,
…
5 Fixa Obriga
-tória
– Extinguir, na sua
área de inter-venção,
os fogos nascentes;
– Apoiar os bombeiros
no combate aos
incêndios florestais;
Brigada
para ope-
rações de
apoio ao
combate a
incêndios
florestais
(BOACIF)
Par-
ques e
Reser-
vas
Natu-
rais
5 Fixa
Variável
(Só é
obri-
gatória
em
certos
Parques)
– Extinguir, os fogos
nascentes nas áreas
protegidas;
– Apoiar os bombeiros
no combate aos
incêndios florestais;
Brigadas
de Com-
bate a In-
cêndios
Flores-
tais
Sector
Flores-
tal das
Empre-
sas de
Celu-
lose
2
e
4
Fixa Não
– Extinguir os fogos
nascentes, nas áreas
florestais das
empresas;
– Apoiar os bombei-
ros no combate aos
incêndios florestais;
19
QUADRO IV – Tipos de corpos de bombeiros que podem ser envolvidos no combate a
incêndios florestais
Denominação Entidade Competências
(no âmbito do combate a
incêndios florestais) Estatuto Detentor
Corpos
de
Bombei-
ros
Voluntários
Associativo,
com utilidade pública,
constituídos por
bombeiros voluntários
e permanentes
Associação
Humanitária de
Bombeiros
Voluntários, …
– Combate aos
incêndios
florestais;
– Comando das
operações;
– Gestão de
recursos;
Municipais Misto, constituídos
por (Funcionários da
C. M. e B. Vol.)
Câmara Municipal
Sapadores Público (Funcionários
da C. M.) Câmara Municipal
Privativos Privado Empresa – Apoio
eventual;
20
21
ANÁLISE DE AFOLCELCA
Antecedentes Gerais à análise da gestão
A AFOCELCA é um Agrupamento Complementar de Empresas para Protecção da
Floresta contra Incêndios Florestais no património territorial do Grupo, formada pela
Aliança Florestal (Grupo Portucel-Soporcel), Celbi (Stora Enso) e Silvicaima (Caima), que
se baseia na adopção de estratégias assentes em critérios técnicos comuns e de uma
organização mais flexível, que permita minimizar os danos provocados pelo fogo, ganhar
sinergias na utilização dos meios disponíveis e optimizar a capacidade profissional de
recursos disponíveis para o combate, através do melhoramento da qualidade e da eficiência
de brigadas, tanto terrestres como helitransportadas.
Deste modo, para dar resposta às solicitações para que foi criada e, em particular, no
que toca à adopção de estratégias comuns, considerou-se necessário e prioritário que a
AFOCELCA ficasse incumbida de realizar as seguintes actividades:
a) Planear as campanhas de prevenção, vigilância e apoio ao combate e rescaldo dos
incêndios florestais;
b) Conduzir a contratação dos meios (humanos e materiais) a afectar anualmente
àquelas operações;
c) Promover a concepção e o desenvolvimento de sistemas de informação mais
adequados ao desempenho da sua missão;
d) Desenvolver a cooperação com instituições relacionadas com a problemática dos
incêndios florestais, nomeadamente: Protecção Civil, Bombeiros, Direcção Geral
das Florestas, Municípios, Universidades, etc..
Organização de AFOCELCA.
Para efeitos do cumprimento das directrizes acabadas de assinalar, o esquema
organizativo de AFOCELCA contempla diversas instâncias, que se descrevem de forma
resumida:
Conselho de Administração: É constituído pelos Directores de Aliança Florestal, Celbi
e Silvicaima, competindo-lhes definir as políticas gerais de AFOCELCA, designada-
mente:
• aprovar os instrumentos de gestão inerentes ao desenvolvimento das actividades
(planos, orçamentos e relatórios);
• facultar informações relativas às empresas, necessárias para o normal funcionamento
da AFOCELCA;
• aprovar os regulamentos propostos pelo Director Executivo e pelo Conselho Técnico;
• aprovar a incorporação de novas instituições na AFOCELCA;
• apoiar a gestão do Director Executivo e do Conselho Técnico;
• promover e facilitar as suas relações com entidades externas, tais como: Bombeiros,
DGF e outras;
• aprovar as propostas do Director Executivo e do Conselho Técnico sobre contratações
de serviços.
22
Director Executivo: Compete-lhe administrar os meios de AFOCELCA, de acordo com
as políticas e os critérios definidos, bem como cumprir os acordos estabelecidos pelo
Conselho de Administração sobre orçamentos, regulamentos, planos, relatórios, estudos,
contratações, etc. Deve, ainda, colaborar com o Conselho Técnico na formulação de
planos, projectos e actividades relativas ao Serviço de Protecção.
Conselho Técnico: É formado por técnicos pertencentes aos quadros das empresas que
compõem AFOCELCA, as quais representam, com o fim de apoiar o Director
Executivo, tanto nas tarefas de gestão, como nas suas relações com o pessoal das
empresas e com outras entidades.
Central de Operações: Depende directamente do Director Executivo e deve cumprir as
funções de afectação de recursos para o combate, a coordenação das radiocomunicações
nas diferentes operações da AFOCELCA e a administração do sistema de informação
relativo a todas as actividades de prevenção, planeamento, combate e gestão.
Supervisores de Protecção: Dependem da AFOCELCA e são de carácter temporário.
Têm por função supervisar o desempenho das unidades e do pessoal do serviço de
protecção das empresas prestadoras de serviços e colaborar na selecção, formação e
avaliação do pessoal das brigadas e dos equipamentos a elas consignados. Até à chegada
dos bombeiros, também assumem o papel de chefes das brigadas de combate a
incêndios, bem como a coordenação dos meios de combate próprios, disponíveis no
terreno.
Supervisores de Património: São técnicos ou encarregados das empresas, mas podem
incluir também Chefes de Divisão ou de Região. Têm por missão apoiar a gestão de
AFOCELCA, principalmente nas actividades de prevenção que assumam directamente,
tais como:
• zelar para que as fainas florestais se realizem de forma segura;
• manter o património (vegetação) seguro, livre de perigos importantes;
• realizar inspecções preventivas;
• investigar as causas dos incêndios;
• participar nas operações de pré-supressão e de combate, mas debaixo da coordenação
de AFOCELCA.
Unidades e Recursos para a Pré-supressão e o Combate
Os recursos humanos e materiais disponibilizados, no ano de 2003, para a
AFOCELCA realizar a sua missão distribuem-se pelas quatro zonas operacionais das
empresas (Norte, Centro-Interior, Vale do Tejo e Sul) e foram os seguintes:
- 2 helicópteros Bell-205, com um tanque de 1300 litros de água e espumífero;
- 2 brigadas helitransportadas, com 12 combatentes altamente especializados e
preparados para o uso de ferramentas manuais;
- 15 brigadas de primeira intervenção, compostas por 4 combatentes que se
deslocam numa carrinha pickup, equipada com um kit de 600 litros de água;
23
- 23 brigadas de primeira intervenção, formadas por 2 combatentes que se
deslocam em carrinha pickup, equipada com um kit de 500 litros de água;
- 5 brigadas com 4 combatentes, em unimog equipado com um kit de 3000 litros
de água;
- 4 brigadas com 2 combatentes, em autotanque, equipadas com kit de 3000 ou de
9000 litros de água;
- 10 torres de detecção integradas na rede nacional de postos de vigia;
- 300 colaboradores das empresas envolvidos no sistema de protecção;
- 1 central de operações incorporada na rede nacional de alerta;
Além deste dispositivo, devem ser ainda referidas 35 carrinhas pickup, com 1
homem e um tanque de 600 litros de água disponibilizados por Aliança Florestal, como
recurso de apoio ao patrulhamento terrestre e à primeira intervenção de combate.
24
25
RECOMENDAÇÕES
Comentários e recomendações sobre a organização da estrutura de prevenção, detecção e
combate a incêndios florestais
Tendo como base as referências constantes dos anexos a este relatório, no que
respeita à organização da estrutura nacional de prevenção, detecção e combate a incêndios
florestais, afiguram-se-nos os seguintes comentários e recomendações:
Notou-se a inexistência de uma inadequada política nacional no que respeita ao
tema dos incêndios florestais, que, entre outras situações, se manifesta através de:
insuficiente valorização dos espaços com aptitão florestal;
precária capacidade para avaliação antecipada dos risco de deflagração e dos
potenciais perigos de propagação;
dispersão das estruturas de prevenção e combate a incêndios florestais por
diversos Ministérios, o que implica uma gestão separada dos aspectos essenciais
da protecção e do combate;
deficiente coordenação das acções de prevenção, uma vez que é feita por
diversas instituições (Direcção Geral das Florestas, Direcções Regionais de
Agricultura, Núcleo de Protecção Florestal do Serviço Nacional de Bombeiros e
Protecção Civil (ex-CNEFF), Instituto da Conservação da Natureza, Parques e
Resrvas Naturais, Câmaras Municipais,…), pertencentes a Ministérios
perfeitamente desligados uns dos outros e, até por vezes, dentro dum único
Ministério os seus diferentes organismos não se coordenam bem entre si.
Estes aspectos, entre muitos outros que concorrem para o problema, conduzem a
resultados pouco satisfatórios, tanto em termos técnicos como de organização, não só ao
nível da execução da prevenção, mas também a nível da pré-supressão e do combate, e que
se reflectem em graves problemas económicos, sociais e ambientais.
Política florestal nacional
Assim, a nível da política florestal nacional, parece lógica a proposição de um
Ministério da Floresta que centralize todas as responsabilidades dos diferentes organismos
do Estado detentores de floresta ou de espaços com aptidão florestal (Direcção Geral das
Florestas/Direcções Regionais de Agricultura do Ministério da Agricultura e Instituto da
Conservação da Natureza do Ministério do Ambiente) ou que executam políticas de
prevenção de incêndios florestais (Direcção Geral das Florestas, do MADRP, Núcleo de
Protecção Florestal do SNBPC, do MAI e Instituto do Ambiente, do Ministério das
Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente) e que, gradualmente, possa vir a assumir
a primeira intervenção no combate aos incêndios florestais, deixando aos bombeiros
voluntários a intervenção primordial na defesa das habitações e em situações de crise, como
segunda intervenção, para reforço e complemento dessa estrutura base.
26
Num único Ministério será possível estabelecer tentativas de conciliação de
políticas de conservação do ambiente florestal, sustentável, tanto com gestão rentável das
áreas florestais públicas ou sob administração pública, como com políticas inequívocas e
interventivas de apoio aos proprietários privados, a fim de lhes ajudar a resolver alguns dos
problemas mais crónicos com que se debatem e que são entrave à gestão rentável das suas
propriedades, sendo por isso necessário:
proceder de imediato ao levantamento cadastral, para se ficar a conhecer tanto o
número de propriedades como de proprietários florestais;
resolver a pulverização das propriedades no Norte e Centro do território,
nomeadamente através de:
reestruturação fundiária;
gestão conjunta de unidades com viabilidade;
Estrutras nacionais de prevenção e detecção de incêndios florestais
Embora não se tenha procedido a uma análise exaustiva de todas as situações, foram
identificadas algumas deficiências no funcionamento tanto da prevenção como da detecção
que se mencionam, indicando também as causas prováveis, para, no futuro, poderem vir a
ser eliminadas:
Ineficácia do sistema de prevenção, sobretudo a nível de manutenção de aceiros
e caminhos e da limpeza de matos, em parte por falta de correcto
aproveitamento do trabalho dos sapadores, cuja acção não parece ser
devidamente fiscalizada;
Ineficiência do sistema de detecção, entre outras razões, devido à sua dispersão
por sete Direcções Regionais de Agricultura, com relativa autonomia sobre o
sistema e à falta de formação certificada da maior parte dos intervenientes no
dispositivo de detecção;
Existência de CPDIF e CDOS em edifícios distintos ou, quando no mesmo
edifício, em gabinetes diferentes, o que atrasa a comunicação da detecção e o
alerta que vai accionar o envolvimento dos meios de combate;
Como procedimentos a instituir para melhorar a prevenção julgamos ser necessário
criar um conjunto de mecanismos que, entre outras, deverão contemplar as seguintes
medidas:
Elaboração de normas específicas para aplicação dos diferentes programas de
silvicultura preventiva;
Concepção e implementação de programas específicos de sensibilização,
vocacionados para públicos alvos bem diferenciados, a desenvolver tanto nas
áreas de maior risco de incêndio, como junto de públicos negligentes que, por
diversos meios, podem causar incêndios florestais;
27
Também, a nosso ver e a nível da detecção, entendemos ser necessário introduzir
alguns procedimentos. De entre outros, parece-nos fundamental destacar a implementação
dos seguintes:
Delimitação clara das responsabilidades de cada uma das organizações
envolvidas;
Avaliação e melhoramento dos sistemas de detecção e alerta;
Elaboração de planos de acção;
Criação de mecanismos de controlo;
Elaboração de relatórios pormenorizados de cada incêndio.
Estrutras nacionais de combate a incêndios florestais
Se bem que uma situação particularmente catastrófica não possa nem deva
desequilibrar um esforço continuado, desenvolvido ao longo de muitos anos com vista à
reformulação e melhoria das estruturas de combate aos incêndios florestais, também é certo
que as condições meteorológicas, particularmente adversas nalguns dias de verão do
corrente ano de 2003, não podem ser responsabilizadas por tudo o que sucedeu.
O trabalho de campo permitiu identificar algumas situações que merecem reflexão,
no sentido de poderem vir a ser corrigidas nos próximos anos, já que não é viável uma
completa mudança das estruturas de um ano para o seguinte.
Indicam-se algumas das debilidades detectadas e que, no nosso entender,
contribuiram para tornar ainda mais caótica uma situação que, naquelas condições
meteorológicas, seria sempre grave:
Falta de planos prévios de intervenção para situações de crise, em termos de
grandes incêndios florestais;
Falta de planos prévios de intervenção específicos para cada zona operacional;
Gritante falta de formação certificada na maior parte dos intervenientes no
dispositivo de combate a incêndios florestais e também de suportes de formação
adequados para chefes de equipa, comandantes e formadores, de que, entre
outras consequências, resultam:
Impossibilidade de pleno aproveitamento e rentabilidade dos equipamentos
utilizados;
Desrespeito pelas normas de segurança e de protecção individual;
Uso da água como agente extintor quase exclusivo - os bombeiros só
apagam os fogos com água e, quase sempre, apenas à beira dos caminhos;
Não utilização da técnica do contra-fogo, por ser considerada “tabu”, quando
parece ser a única capaz de resolver algumas situções;
Não utilização de ferramentas manuais, nomeadamente durante o
reabastecimento dos veículos;
Muitos rescaldos mal efectuados e deficiente vigilância após fogo, o que
origina elevado número de reacendimentos, muitos dos quais se
transformam em grandes incêndios que eram perfeitamente evitados;
28
Dispositivo organizado essencialmente em função da primeira intervenção;
Quando é necessário fazer avançar a segunda intervenção, que deveria ser
para rendição dos GPI’s, normalmente acaba por ser para reforço e é
formada com envolvimento de mais GPI’s, deixando-se muitas vezes
completamente desguarnecida a zona operacional para ocorrência a
eventuais novas primeiras intervenções;
Entretanto, para integrar a segunda intervenção, muitas vezes também são
mobilizados bombeiros voluntários que deixam os seus afazeres
profissionais, com todos os inconvenientes que daí decorrem. Se é uma
situação perfeitamente normal em cenários de crise, é inadmissível como
solução comum para a segunda intervenção;
Falta uma segunda intervenção organizada, devidamente disciplinada, formada e
treinada, capaz de ser mobilizada em tempo útil;
Só em teatros de operações de grande envergadura ou perigo é que
avançaram grupos de reforço rápido, nem sempre eficazes quer porque
foram constituídos em função das disponibilidades do momento, quer por
serem provenientes de regiões muito afastadas.
Por isso, sempre que falha a primeira intervenção, é normal que os fogos
passarem rapidamente a grandes incêndios florestais que, por norma, só são
controlados quando as condições meteorológicas se alteram, apesar do
anormal envolvimento de meios que ocorrem nestas circunstâncias;
Ausência de um comandante efectivo dos bombeiros, a nível distrital (deveria
ser o comandante de sector da actual estrutura), capaz de assumir o verdadeiro
comando das grandes operações;
Observa-se uma grande dispersão do comando dos incêndios, por não existir
nem esse comandante distrital, nem uma tipificação hierarquizada dos
comandantes dos corpos de bombeiros, em função dos respectivos efectivos.
São todos comandantes de “quatro galões”;
Inexistência de modelos para simulação do comportamento dos incêndios, não
só para ajuda à decisão, mas também para formação e treino dos chefes de
equipa e dos comandantes das operações de combate a incêndios florestais. É
urgente proceder à sua criação e desenvolvimento, com base na realidade
nacional, e, depois, passar à fase da sua aplicação sistemática na formação e na
ajuda à decisão;
Falta uma estratégia global para apagar o incêndio, que, em grande parte, resulta
do somatório dos items anteriores; como resultado, cada equipa ou cada corpo
de bombeiros envolvido no teatro de operações apaga o “seu” incêndio;
Implementação de estratégias inadequadas, como sucedeu este ano em
particular, e que consistiu na colocação dos meios nas aldeias, apenas com a
preocupação da defesa das habitações, o que teve consequências nefastas, pois a
desguarnição do combate às chamas contribuiu para o alastramento de alguns
incêndios. Por outro lado, a espera junto às casas, em muitas situações, demorou
vastas horas que, se tivessem sido usadas no combate directo às chamas,
29
poderiam ter evitado que o fogo se aproximasse das casas e, por conseguinte,
poderia ter-se evitado não só a incineração de algumas áreas mais próximas das
aldeias, mas também e sobretudo o pânico gerado pela proximidade das chamas
junto às casas;
Por último, grande “paternalismo” nas organizações, sobretudo de combate, o
que leva à desresponsabilização dos principais intervenientes;
Para melhorar a eficácia do combate, parece-nos conveniente proceder à alteração
de alguns procedimentos, designadamente dos seguintes:
Repensar a estrutura de socorro;
Não seria mais lógico que, de modo geral, os antigos Técnicos Distritais de
Protecção Civil viessem a assumir as funções de Coordenadores Distritais
das Operações de Socorro e os anteriores Inspectores Distritais de
Bombeiros assumam as de Comandantes Distritais (de Sector)?
Responsabilizar os Serviços Municipais de Protecção Civil pela coordenação
dos socorros nos respectivos concelhos;
O responsável deverá ser o Comandante de Bombeiros, devidamente
certificado, que poderá ser o primeiro elemento a ser contratado para,
paulatinamente, ir sendo constituído um Corpo de Bombeiros Municipal que
deverá vir a assegurar a base do socorro municipal (apenas o que
actualmente é efectuado pelos bombeiros permanentes dos corpos de
bombeiros voluntários);
Deste modo, as associações humanitárias passariam a ser efectivamente de
bombeiros voluntários, que complementariam a estrutura permanente, de
natureza municipal, nomeadamente nas situações de crise;
Repensar o envolvimento dos bombeiros voluntários no combate aos incêndios
florestais;
Há pessoal que trabalha de dia e combate incêndios durante a noite. Até
quando será possível manter esta situação sem continuar a pagar caro por
isso?
Repensar todo o dispositivo de combate, em particular o de primeira
intervenção, nomeadamente através de:
Criação de diferentes níveis de comando na estrutura;
Criação de um comando real para os grandes incêndios (global), distanciado
das “pressões” existentes no teatro de operações, a funcionar nos CDOS,
com acesso a modelos de ajuda à decisão, baseados em sistemas de informa-
ção geográfica, o qual distribui os meios para as diferentes frentes de com-
bate do teatro de operações, cada uma delas dotada de um comando local;
Criação de condições para uma chefia efectiva das equipas de combate a
incêndios florestais, a principal chave do sucesso das operações de primeira
intervenção;
30
Constituição de equipas de combate a incêndios florestais devidamente
formadas, treinadas e motivadas, em substituição dos actuais grupos de
primeira intervenção;
Distribuição dessas equipas ou, eventualmente, dos GPI’s, não em função da
disponibilidade de recursos humanos para a sua constituição, mas sim do
risco de incêndio florestal, uma vez que é habitual ficarem desfalcadas ou
pouco guarnecidas algumas das áreas de maior risco;
Combater as frentes de chama, não ficando à espera do incêndio junto às
estradas, mas indo ao seu encontro e usando material sapador;
Comentários e recomendações sobre a gestão da AFOCELCA
Da revisão de diversos documentos e de relatórios emitidos tanto pelas empresas,
como por Afocelca e, ainda, por diversas outras organizações, associada às visitas
efectuadas às zonas de operação e aos sectores afectados pelos incêndios, bem como às
entrevistas tidas com diversos orgãos directivos, técnicos e chefes de unidades das
Empresas, da AFOCELCA e de outras entidades, tais como o Serviço Nacional de
Bombeiros e Protecção Civil, a Direcção Geral das Florestas, entre outros, permitem
fundamentar os seguintes comentários e recomendações:
a) O ano de 2003 foi extremamente grave em Portugal, pelos danos provocados pelos
incêndios florestais, registando-se prejuízos económicos, sociais e ambientais de
uma magnitude nunca observada, pelo menos desde que existem estatísticas oficiais
no país. A frequente simultaneidade de incêndios, a enorme quantidade de casos
com uma presença de níveis extremos do comportamento do fogo e as
características catastróficas que continuamente se verificaram, ultrapassaram as
capacidades de controlo disponíveis tanto na AFOCELCA como também nas
diversas entidades que participam na prevenção e no combate.
b) Aparentemente, a principal causa do problema assenta nas críticas condições
meteorológicas que se fizeram sentir durante o verão. Contudo, ainda que seja clara
a elevada severidade da temporada e esta é uma matéria que requere ser avaliada
profundamente antes de se emitir uma conclusão definitiva, o resultado da análise
aos antecedentes e os estudos no terreno, indiciam outros factores que também
poderiam ter contribuído de maneira significativa para a grande quantidade de
danos observados. Entre os mais relevantes cabe destacar os seguintes:
Ausência de acções efectivas de prevenção, baseadas em campanhas de
sensibilização, dirigidas aos diferentes grupos agentes de risco de incêndios
florestais;
Ausência do uso de sistemas de prognóstico de incêndios florestais, que apoiem
o alerta anticipado nos períodos críticos e a precoce reprogramação diária dos
recursos disponíveis nos dias de previsível alto risco, sobretudo nas situações de
risco máximo e, porventura, também nas de risco muito elevado;
Ineficiências importantes na detecção de incêndios, que frequentemente
contribuiram para a ineficácia das acções de primeira intervenção;
31
Descoordenações entre as entidades participantes no combate, quiçá derivadas
de directrizes incompletas ou inadequadas, ou de debilidades nas comunicações
internas e interinstitucionais.
Evidentes problemas de formação numa importante proporção do pessoal dos
diferentes níveis (directivos, técnicos, supervisores, operários, etc.), das distintas
entidades, no tema da prevenção e combate a incêndios florestais.
Aplicação de esquemas de combate baseados preferencialmente no emprego da
água. Contraditoriamente, na maioria das entrevistas, a opinião generalizada
estava de acordo com a eficácia do uso do fogo (na manutenção de linhas e
mediante contrafogos) e no uso de ferramentas manuais para a construção de
linhas, mas na prática tal não se observa.
A inexistência de estatutos que estabeleçam os requisitos necessários para a
selecção e o bom desempenho do pessoal nos diferentes cargos das organizações
de protecção. É urgente definir os atributos necessários ao desempenho de cada
uma das funções, tais como as habilitações académicas e profissionais
(certificação), a experiência, ou os atributos intelectuais e físicos requeridos.
A falta de projectos de investigação e de desenvolvimento tecnológico,
principalmente no tocante a operações de protecção, ou a falta de definição de
prioridades de protecção, ou, ainda, a inexistência de modelos para as
comunicações oficiais, para mencionar apenas alguns dos aspectos mais
relevantes na formulação de planos e programas, limitam a avaliação da
capacidade dos recursos disponíveis, os requerimentos de cobertura e a
elaboração de desenhos para a execução da prevenção, pré-supressão e combate.
c) No que diz respeito a AFOCELCA, considera-se que a sua criação foi uma decisão
acertada, pelas vantagens que acarreta para o Grupo de Empresas, em termos dos
ganhos de eficácia na protecção das propriedades, resultantes das sinergias
introduzidas no emprego dos recursos disponíveis e do indubitável ganho de
eficiência que se irá conseguindo, gradual e permanentemente, com o decorrer do
tempo.
d) No entanto, a decisão de consolidar a AFOCELCA deve ser plenamente assumida
pelas empresas, sobretudo no que diz respeito às condições requeridas para
assegurar o seu bom e pleno funcionamento. Provavelmente, por falta de
informação suficiente, observou-se em algumas das zonas visitadas, uma certa
desconfiança ou inconformidade, por parte de directivos e técnicos das Empresas,
em relação ao modo como a gestão está a ser feita, tendo-se detectado
inclusivamente um certo desejo de que a organização da protecção voltasse a ser
como era em tempos passados, anteriores à criação da AFOCELCA.
e) A gestão da AFOCELCA, apesar de diversos problemas que teve de enfrentar,
próprios duma entidade recém criada e que teve de deambular por um ambiente
complexo, devido às normais assimetrias das empresas associadas, constitui
indubitavelmente um exemplo dos modelos que devem ser estabelecidos para
impulsionar sistemas de protecção da floresta, modernos e eficientes. Não restam
dúvidas de que, apesar do escasso tempo decorrido desde a sua criação, a
AFOCELCA demostrou ser a organização mais completa e eficiente do país na
defesa da floresta contra incêndios.
32
f) Contudo, os ganhos de AFOCELCA poderão ser ainda muito maiores e realizar-se
num prazo menor se forem superadas as diversas debilidades que foram detectadas
na avaliação realizada, sobre as quais cabe tecer os seguintes comentários:
Em princípio, muitos dos problemas assinalados na letra b) sobre a protecção
geral das florestas do país, também estão presentes na AFOCELCA: Escassa
formação e treino do pessoal; inexistência de modelos para a selecção do
pessoal, para a atribuição de cargos e para a actividade mínima em prevenção;
descoordenações, problemas nas comunicações; uso precário da informação
meteorológica e emprego de prognósticos de riscos, aplicação limitada e
insuficiente das técnicas de combate, entre outras.
Com frequência as debilidades dos sistemas de protecção do SNBPC e da DGF
repercutem-se em graves danos para o património das Empresas. Ainda que a
origem destes problemas não seja controlada pela AFOCELCA, esta deveria
passar a estabelecer esquemas de autosuficiência, cuja necessidade resulta da
incerteza do apoio que seria de esperar dos serviços públicos e, por conseguinte,
da insegurança que acarreta para o património florestal das Empresas. As leis
não impedem um maior desenvolvimento privado da detecção e do combate,
sempre e desde que não se ultrapassem as competências e responsabilidades
legalmente estipuladas para os organismos por eles responsáveis.
Igualmente, AFOCELCA, de forma directa, ou através da administração do
património das empresas, deveria criar um programa de sensibilização dirigido
aos centros populacionais localizados nas imediações das propriedades
florestais, com o objectivo de conseguir um maior apoio na prevenção de
incêndios florestais, e também para melhorar a imagem das empresas florestais
no que diz respeito à sua contribução para o desenvolvimento económico, social
e ambiental.
Nas entrevistas realizadas ao pessoal das zonas percorridas comprovaram-se,
especialmente nos técnicos e chefes de brigada, diferenças importantes na sua
preparação técnica, e também nos atributos ou qualificação que possuem para
desempenhar os seus cargos. Considera-se iniludível levar a efeito uma
avaliação de todo o pessoal, a fim de comprovar os seus pontos fortes e as
debilidades de formação e competência. É fundamental estabelecer as
normalizações correspondentes, dado que é a única forma de conseguir que o
sistema de protecção funcione de maneira harmónica e eficiente.
O exposto no ponto anterior implica a necessidade de estabelecer um programa
permanente de formação certificada para todo o pessoal de AFOCELCA e das
empresas que participam nas actividades de apoio. Das entrevistas comprovou-
-se que a formação e a habilitação/certificação do pessoal foram praticamente
mínimas durante muitos anos.
Por outro lado, não pareceu clara a eficácia das unidades de combate compostas
por 2 pessoas. A experiência internacional demonstra que, inclusivamente para
a primeira intervenção ou primeiro ataque, o recomendável é contar com
brigadas de 6 ou 8 pessoas, porque com essa quantidade de combatentes já é
possível construir linhas de controlo do fogo com um nível adequado de
eficiência. Isto mesmo se comprovou no terreno com o trabalho das unidades de
combate helitransportadas, que executaram uma alta produtividade de faixas
33
com um resultado muito positivo na detenção das frentes de chamas, através das
quais se faz a propagação do fogo.
Uma opção, relativamente ao anteriormente indicado e que, logicamente,
requererá ser avaliada, poderá ser a incorporação gradual de patrulhas
motorizadas, equipadas com algumas ferramentas manuais, de modo a que
movimentem continuamente em tarefas de vigilância e possam actuar
rapidamente na extinção de pequenos focos que se detectem, enquanto chegam
as unidades com maior capacidade de combate, se tal vier a ser necessário.
Considera-se ser necessário incorporar maior precisão nas responsabilidades
atribuídas à estrutura da AFOCELCA. Por exemplo, na descrição das funções do
Director Executivo e do Conselho Técnico observa-se uma espécie de
paralelismo, não sendo claro se as relações entre ambos são funcionais ou
hierárquicas, ou ainda, qual destas duas instâncias é a que assume a primeira
responsabilidade na entrega de propostas, relatórios e informações ao Conselho
de Administração.
Salienta-se um importante esforço na implementação e funcionalidade da
Central de Operações localizada na Leirosa (Figueira da Foz), especialmente na
preparação e aplicação dos diversos instrumentos requeridos para o
cumprimento das funções atribuídas, tendo-se constituído realmente como a
“unidade de inteligência” de AFOCELCA. Contudo, durante a visita efectuada
denotou-se insuficiência na disponibilização, por parte das empresas, de mapas
que facultem as informações necessárias à elaboração de mapas operacionais
que apoiem tanto a comunicação e a decisão, como a definição das estratégias
de combate. Teve-se conhecimento de que grande parte da informação é
deficitária, designadamente a relativa aos mapas das propiedades, no que
respeita aos tipos e características das plantações, etc., oportunamente solicitada
às empresas, mas que realmente não se transferiu ou foi entregue com muito
atraso.
Ainda que a central de operações localizada na Leirosa (Figueira da Foz)
cumpra a função de dirigir todas as actividades de pré-supressão e combate em
todo o património forestal das Empresas, não existe uma contrapartida efectiva
para a coordenação das operações que se executam ao nível das zonas,
generando-se por isso, frequentemente, problemas de comunicação,
disponibilidade de informação de apoio, fluidez na aplicação de procedimentos,
coincidências na direcção do combate e na definição de estratégias, entre outros.
Como consequência, é evidente que a coordenação em cada uma das zonas deve
ser fortalecida técnica e hierarquicamente, de modo a que sejam capazes de
canalizar adequadamente as referências e instruções emanadas da central de
operações para, no local, zelarem pela correcta execução dos trabalhos a efctuar.
A recente criação de AFOCELCA e o precário apoio de pessoal especializado
que requere, dificultaram os seus propósitos de elaboração de diversos planos,
procedimentos técnicos e outros elementos de apoio para a caracterização dos
incêndios forestais e a tomada de decisões estruturais e conjunturais. Entre elas,
destaca-se a criação dum sistema de determinação das prioridades de protecção,
que é urgente desenvolver e definir, pela importância que representa na
atribuição e distribuição espacial de meios para a pré-supressão e o combate,
bem como deve ser efectuada a avaliação da cobertura territorial das unidades e,
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de modo geral, será necessário preparar e definir diferentes modelos para as
operações em desenvolvimento, sobretudo no que respeita à quantidade e
localização dos meios a afectar.
Considera-se de fundamental importância, principalmente pela experiência
recolhida durante as operações executadas em 2003, a formulação de planos de
emergência para o combate de incêndios florestais que se possam prever como
catastróficos ou que, efectivamente, tenham alcançado esse nível. Em tais
situações, a chave do sucesso passa a ser a incorporação dos recursos de
AFOCELCA existentes noutras zonas, o pessoal e os meios disponíveis nas
outras empresas que não estejam envolvidos directamente na protecção e, em
geral, o apoio que possa ser conseguido junto de outras instituções. Se não
estiverem estabelecidos previamente os esquemas de organização para o
conjunto dos recursos assinalados, os problemas de coordenação, comunicação,
aplicação de estratégias de combate e cumprimento de procedimentos, podem
levar a situações caóticas, com consequências graves, e a inutilidade do
contributo dessa grande quantidade de meios.
Parece-nos ser muito conveniente que AFOCELCA, com o apoio das empresas,
iniciem una linha de trabalho de investigação e estudos em protecção, não só
com o propósito de ir aumentando os escassos conhecimentos sobre risco,
perigo e danos potenciais produzidos pelos incêndios forestales, mas também
para facilitar a elaboração de desenhos operacionais para a prevenção, pré-
supressão e combate de incêndios florestais. Neste sentido, é muito positiva a
recente iniciativa do grupo Portucel-Soporcel que, através da Aliança Florestal,
lidera uma candidatura à medida 8.1 do Programa Agro, com um projecto sobre
“Gestão Integrada do Risco de Incêndio Florestal”, no qual procurou envolver
diversas instituições, produtoras de conhecimento científico e principais
utilizadoras desse conhecimento sobre incêndios florestais. Esperemos que o
resultado seja passível de aplicação prática, a custos razoáveis.
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À GUISA DE CONCLUSÃO
As condições inerentes à pesquisa que serviu de suporte à elaboração deste relatório,
bem como as que presidiram à sua redacção, de fortes limitações de tempo, impediram um
maior desenvolvimento dos temas e o tratamento pormenorizado de alguns “casos de
estudo” que seria interessante aprofundar.
No entanto, mesmo só com os elementos disponíveis foi possível concluir que as
vastas áreas percorridas pelos incêndios florestais, durante o período estival, se ficaram a
dever à concorrência de um conjunto de factores.
De entre eles podemos mencionar aqueles que se prendem com as caraterísticas do
relevo, dos combustíveis e, sobretudo, das condições meteorológicas que se fizeram sentir.
Embora as condições meteorológicas, em certos dias, tenham assumido alguma
gravidade, não podem, no entanto, ser as únicas, nem sequer as principais, responsáveis
pelas grandes manchas queimadas. A ser assim, todas as áreas onde se fizeram sentir
estariam incineradas, o que felizmente não se verifica.
Com efeito, várias circunstâncias concorreram para que, em certos dias, se tivesse
verificado uma certa simultaneidade de ocorrências de focos de incêndio, o que levou à
dispersão de meios, que se revelaram insuficientes para ocorrerem a todos eles. Essa
insuficiência resultou mais da sua má distribuição e não tanto da sua falta, dado que os seus
detentores são os Corpos de Bombeiros, que concentram meios nas áreas mais povoadas e
não nas de maior risco.
Verificaram-se também situações em que, por razões várias, as primeiras
intervenções não foram suficientemente eficazes para debelar as chamas, o que permitiu
reacendimentos que volveram grandes incêndios ou, até, que alguns desses focos iniciais se
tivessem transformado em grandes incêndios.
Nas situações metorológicas mais críticas, a incapacidade de controlar os grandes
incêndios e de debelar os focos que, entretanto, tiveram início, associada à pressão criada
pelos orgãos de comunicação sobre o sistema de socorro, levaram a que se tivesse entrado
num certo histerismo colectivo, que contibuiu para agravar ainda mais as situações que de
per si já eram muito complicadas.
Sendo nacional e, do nosso ponto de vista, indelegável a responsabilidade do
controlo dos procedimentos, bem como a da verificação do funcionamento dos sistemas,
das estruturas e da organização e, ainda, a da fiscalização dos recursos humanos e
materiais, parece-nos que devem passar a ser efectuadas com carácter regular e, sobretudo
nos próximos tempos, devem ser secundadas, porventura estribadas, em auditorias externas
— isentas, credíveis e com consequências — a realizar aos sistemas de protecção às
florestas e combate aos incêndios florestais, pois contribuiriam de forma decisiva para uma
rápida e significativa melhoria da eficácia de todo o sistema.
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ANEXOS
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REUNIÕES
12 de Setembro de 2003
Lugar: Raiz - Eixo (Aveiro).
Participantes: Rogério Freire (Administrador de Portucel Forestal).
Serafim Tavares (Director Geral da Raiz).
Guillermo Julio (Universidade de Chile).
Luciano Lourenço (Universidade de Coimbra).
Luis Lemos (Consultor de Raiz).
Temas: Revisão das referências para o trabalho de consultação:
Análise do estado da protecção contra incndios forestais no património das empresas
(AFOCELCA);
Análise da situação geral dos incêndios florestais em Portugal;
Formulação de recomendações para AFOCELCA e, em geral, para a organização nacional
(Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil e Direcção Geral das Florestas).
Apresentação gráfica do património das empresas, locais de ocorrência e danos provocados
pelos incêndios florestais em 2003 e esquema de organização territorial para a protecção da
floresta contra incêndios.
Discusão geral sobre a situação catastrófica verificada no ano de 2003, nas Empresas e em
Portugal, e troca de opiniões sobre os meios e modalidades de acções de protecção.
Revisão dos antecedentes disponíveis para a realização da consultação e petição de recolha de
dados.
Identificação das áreas a visitar onde ocorreram incêndios, para avaliar no terreno as situações
verificadas.
Revisão da lista de instituições e pessoas a consultar, para recolher antecedentes e opiniões
sobre as situações ocorridas em 2003 e, em geral, sobre os recursos e esquemas organizacionais
vigentes, avaliação da gestão em protecção.
Elaboração do programa de trabalho para os Professores Luciano Lourenço e Guillermo Julio.
Ficou ainda pendente a participação de um perito espanhol (possivelmente José António Vega,
do Departamento de Incêndios Florestais do Centro de Investigações Florestais de Lourizán
(Galiza) ou Francisco Rodríguez y Silva, da Universidade de Córdoba).
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ENTREVISTAS
15 de Setembro de 2003
Entrevista ao Sr. Engº. Pedro Moura (Administrador da Aliança Forestal e seu representante na
Afocelca).
Lugar: Lisboa (Aliança Forestal – Edifício Portucel).
Participantes: Luciano Lourenco (Universidade de Coimbra).
Guillermo Julio (Universidade de Chile).
Luis Lemos (Consultor de Raíz)
Temas:
Confirmação dos termos de referência da consultação e ratificação do asssinalado na reunião de
sexta-feira 12 de Setembro. Foi-nos referido que as avaliações deverão ter um carácter
eminentemente técnico. Considerou-se conveniente incorporar alguns parâmetros sobre
avaliação económica, na medida em que a dsiponibilidade de informação e o tempo previsto
para a consultação o permitam, especialmente sobre a relação custo/benefício do esforço de
protecção efectuado; o dimensionamiento do plano de protecção (níveis de gastos razoáveiss),
atribuições de recursos de acordo com prioridades (em acções e por zonas).
Revisão do esquema de organização das empresas que constituem AFOCELCA.
Descrição dos antecedentes sobre o património florestal alvo de protecção:
Eucalipto - 190.000 ha,
Pinheiro bravo - 10.000 ha;
Sobreiro - 11.000 ha;
Outras espécies - 9.000 ha:
Outros usos - 37.000 ha;
Total: - 257.000 ha.
Revisão dos recursos disponíveis para a protecção, esquemas organizativos e modalidades
operacionais, gestão realizada. Troca de opiniões sobre as diferentes unidades de combate
(brigadas de primeira intervenção - básicas e secundárias, unidades unimog, unidades
autotanque e helicópteros). Verificou-se que, em geral, se seguiu a linha de trabalho
impulsionada pela CELPA, privilegiando a certificação e a profissionalização.
Foram expressas algumas reservas sobre a real eficácia das unidades de primeira intervenção
compostas por apenas duas pessoas, ainda que se reconheça que é um tema a merecer análise
durante as visitas ao terreno. Ficou claro que isso está definido somente para acções de
patrulhamento e de primeira intervenção, porque o controlo e extinção definitiva dos incêndios
é da responsabilidade dos Bombeiros.
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Em relação aos programas de prevenção baseados na sensibilização, fomos informados de que
AFOCELCA não está a efectuar quaisquer actividades desse tipo, porque correspondem a uma
responsabilidade da Direcção Geral das Florestas e das Direcções Regionais de Agricultura. No
entanto, CELPA já desenvolveu algumas acções dentro dessa linha.
No que diz respeito a actividades de silvicultura preventiva, foi-nos referido que é uma tarefa
desenvolvida directamente por cada empresa no seu trabalho de gestão das respectivas
propriedades (limpezas, corta-fogos, etc.), mas que não possui informação quantitativa. Propôs
que, durante as visitas no terreno, se efectuassem consultas sobre esta matéria.
Em relação aos resultados da gestão do ano de 2002, os peritos consideraram preocupante a
referência que dá conta de que em 9 incêndios a primeira intervenção começou quando as
superfícies já queimadas eram consideráveis. Perguntou sobre o modo de funcionamento do
sistema de detecção e a oportunidade da chegada das unidades de combate. Foi-lhes explicado
que isso se deve a que, em grande medida, as torres de detecção são administradas pela DGF,
tendo-se comprovado deficiências no cumprimento do trabalho estabelecido, gerando-se
diversos problemas que estão fora do controlo das Empresas. Por outra parte, tiveram
conhecimento de que praticamente a totalidade dos incêndios que afectaram o património das
Empresas tiveram início em propriedades vizinhas, pertencentes a outros proprietários.
Foi, ainda, assinalado que em 2003 se fizeram importantes esforços para superar erros
identificados e cometidos em anos anteriores, como por exemplo uma maior eficácia na
primeira intervenção e no rescaldo dos incêndios. Por outro lado, introduziu-se o Posto Zero nas
operações de combate, com o qual se concede uma importante ajuda aos bombeiros com a
entrega de informação sobre acessos, pontos de água, localização de pontos críticos e propostas
de estratégias para la contenção do fogo. Contudo, subsistem alguns temas que ainda não houve
possibilidade de resolver, como a certificação do pessoal.
Em geral, o ano de 2003 foi extremamente grave devido às condições meteorológicas anormais
que prevaleceram, com a presença simultânea de múltiplos focos, produzidos por frequentes
trovoadas secas registadas em diversas áreas e que se agravaram devido às temperaturas muito
elevadas e humidades relativas do ar muito baixas. Estes factores superaram largamente a
capacidade de Afocelca. Face ao sucedido, estabeleceram-se diversos acordos com o
Coordenador Nacional de Socorros do Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil, no
sentido de se enfrentar o combate da melhor forma; no entanto, os Comandantes Locais não
coincidiram na execução das acções decididas conjuntamente.
Foi relatada uma grande preocupação pelos problemas ocorridos no país nos recentes dias 13 e
14 de Setembro, porque se repetiu o sucedido um mês antes, com a repetição dos mesmos erros
antes cometidos para fazer face às situações de emergência, sem que essas experiências
tivessem sido aproveitadas como boas lições.
Considerou-se ser necessário impulsionar um maior desenvolvimento tecnológico na protecção
contra incêndios florestais e reconheceu-se que a disposição das Empresas para com a
investigação nesta matéria foi praticamente nula até à presente data. Contudo, agora, sob
liderança do Grupo Portucel/Soporcel, apresentou-se uma candidatura à medida 8.1 do
Programa Agro, para desenvolvimento dum projecto sobre “Gestão Integrada do Risco de
Incêndio Florestal”, no qual colaboram diversas instituições e mediante o qual se pretende
definitivamente iniciar um significativo desenvolvimento científico e tecnológico na prevenção
e combate.
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15 de Setembro de 2003
Entrevista ao Sr. Engº. José Pedro Lopes (Vice-Presidente do Serviço Nacional de
Bombeiros e Protecção Civil).
Lugar: Edificio do S.N.B.P.C., Carnaxide (Lisboa).
Participantes: Luciano Lourenço (Universidade de Coimbra).
Guillermo Julio (Universidade de Chile).
Luis Lemos (Consultor de Raíz)
Temas:
Começou por ser apresentada a natureza do Serviço de acordo com o establecido na lei, que
atribui aos bombeiros diversas funções em todo o país, nomeadamente o combate a incêndios
urbanos e rurais, o socorro à população noutras situações de emergência, tais como salvamento
e desencarceramento, a prestação de serviços sociais, como sejam o transporte de doentes, etc..
Além disso, o SNBPC também colabora na prevenção, detecção e vigilância de incêndios
florestais, nomeadamente através de apoio financeiro às Comissões Especializadas de Fogos
Florestais, que funcionam a nível distrital e municipal, para desenvolverem os seguintes
programas:
Infraestruruas florestais – prevê a construção e reparação de caminhos florestais e a
construção de pontos de água;
Infraestruturas dos meios aéreos de combate – destina-se à construção e melhoria de
helipistas e pistas com envolvimento directo no combate a incêndios florestais;
Vigilância móvel terrestre – consiste na organização de patrulhamentos efectuados por
equipas de dois elementos que se transportam em duas motorizadas, em missão de
detecção, vigilância e disuassão;
Vigilância aérea – executa-se em rotas pré-estabelecidas, para reforçar a detecção de
incêndios. Faz-se com avionetas privadas, pertencentes aos aeroclubes que anualmente
subscrevem um protocolo onde são acordadas as condições da operação;
Limpeza de matos – efectuada em áreas críticas, por exemplo nas bermas das estradas e
caminhos florestais, por maquinaria apropriada, por trabalhadores desempregados e por
sapadores florestais;
Sensibilização da população. Este programa contemplou, em anos anteriores, três
subprogramas, respectivamente destinados a:
Sensibilização da População Escolar, desenvolvido essencialmente pelo Núcleo de
Investigação Científica de Incêndios Florestais, da Faculdade de Letras da Universidade
de Coimbra, através duma vasta rede de Clubes da Floresta criados nas Escolas dos
Ensinos Básico, Secundário, Técnico-Profisssional e Especial;
Sensibilização da população em geral, através de campanhas levadas a efeito na rádio,
televisão e imprensa nacional e regional, cuja coordenação era assegurada directamente
pela estrutura nacional;
Sensibilização da população, efectuada através das Associações de Defesa do
Ambiente;
Investigação científica – programa para apoio a candidaturas com vista ao desenvolvimento
de projectos de investigação na área dos incêndios florestais, coordenado pela Fundação
para a Ciência e Tecnologia.
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Em relação ao combate de incêndios florestais, o SNBPC dispõe, para os 18 distritos do
continente, de estruturas operacionais para a execução de uma rápida extinção dos fogos,
baseada num Comandante de Sector (Distrital), que coordena o trabalho dos Comandante das
Zonas Operacionais, os quais, por sua vez, coordenam os Comandantes dos Corpos de
Bombeiros locais, primeiros responsáveis pelo comando de operações, nas suas áreas de
actuação. De modo geral, em 2003, a força de combate assenta nas disponibilidades dos
diferentes 445 Corpos de Bombeiros, sendo 407 Associativos (Voluntários), 6 Sapadores, 18
Municipais e 14 Privativos. O dispositivo especial de combate a incêndios florestais para 2003
dispunha de:
Bases de apoio
12 bases de apoio logístico;
26 centros de meios aéreos;
Grupos de intervenção, elementos de comando de serviço e pessoal de apoio
560 grupos de primeira intervenção (GPI);
160 grupos de apoio (GAP);
15 grupos especiais de intervenção (GEI-HT);
50 elementos de comando de serviço aos sectores operacionais;
25 elementos de comando de serviço aos meios aéreos;
74 elementos de apoio aos centros de meios aéreos;
Total de elementos 3 344
Meios aéreos
19 Helicópteros bombardeiros ligeiros;
4 Helicópteros bombardeiros pesados;
10 Aerotanques ligeiros (aviões Dromader);
2 Aerotanques pesados (aviões Canadair);
1 Helicóptero de socorro e assistência;
Total de meios aéreos 36
Meios terrestres
560 veículos de combate a incêndios (2,5 t);
120 veículos tanque tácticos (10 t);
40 veículos tanque de grande capacidade (30 t);
19 veículos de comando e comunicações;
50 veículos de comando operacional;
11 veículos de apoio;
Total de meios terrestres 802
Os grupos de primeira intervenção (GPI), são constituídos por 5 elementos e deslocam-se em
veículos de combate a incêndios (2,5 t). Os grupos de apoio (GAP) são formados por 2
elementos que se deslocam nos veículos tanques tácticos (10 t) e de grande capacidade (30 t).
Os grupos especiais de intervenção compõem-se por 5 elementos que se movimentam de
helicóptero. Os elementos de comando de serviço aos sectores operacionais deslocam-se nos
veículos de comando operacional.
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Além deste dispositivo, também é de considerar o apoio emprestado por Espanha e França que,
durante os períodos mais críticos de Agosto e Setembro, disponibilizaram, respectivamente, 3 e
2 aviões Canadair.
A estrutura de combate, para articulação das forças, também contempla centros de operações de
socorro, funcionando um deles a nível nacional (Centro Nacional de Operações de Socorro -
CNOS) e 18 a nível distrital (Centros Distritais de Operações de Socorro - CDOS).
Em períodos de maior risco meteorológico, o CNOS pode organizar vigilância aérea armada em
zonas críticas, utilizando para o efeito os meios aéreos não envolvidos em operações, do mesmo
modo que os CDOS podem organizar patrulhamentos nas respectivas zonas críticas, com meios
de combate.
O dispositivo prevê a existência de meios de reforço, planeados e constituídos pelos
Coordenadores Distritais de Socorros para reforço rápido de Teatros de Operações de maior
envergadura ou perigo. Contudo, a grande maioria dos 12 grupos previstos não se localiza nas
áreas de maior risco, o que, além de implicar morosas deslocações para os Teatros de
Operações, acarreta uma série de outros inconvenientes. A segunda intervenção faz-se, quase,
mobilizando os restantes GPI’s da zona operacional, deixando-a desguarnecida para outras
primeiras intervenções que, porventura, possam ocorrer e com recurso a bombeiros voluntários
retirados dos seus normais afazeres profissionais. Os grupos de reforço rápido só costumam ser
mobilizados para operações de muito grande envergadura.
O orçamento do SNBPC em 2003, para operações de combate a incêndios forestais, é da ordem
dos 34,5 milhões de euros, sendo distribuído do seguinte modo:
Prevenção e Infraestruturas - 30 %;
Combate Terrestre - 30 %;
Combate Aéreo - 30 %;
Outros - 10 %.
Embora o dispositivo de combate assente em bombeiros voluntários, o regime não pode ser
considerado de verdadeiro voluntariado, na medida em que todos os elementos enquadrados no
dispositivo como permanentes recebem um subsídio diário, variável consoante a função que
desempenham;
O Serviço Nacional de Bombeiros e Protecção Civil não possui, na sua organização, unidades
especializadas ou exclusivas para o combate a incêndios forestais, devido à obrigação de
enfrentar toda uma vasta variedade de situações de emêrgencia e de catástrofes, o que, sem
dúvida, é um factor limitativo para uma melhor formação e certificação dos elementos
envolvidos nas operações de combate a incêndios florestais. Apesar disso, verificou-se existir
uma boa relação com o pessoal de apoio integrado nas unidades de combate das empresas
forestais (Afocelca) e nas equipas de sapadores forestais, pertencentes a Associações de
Produtores Forestais que, quase sempre, possuem formação certificada.
A detecção efectuada pelos postos de vigia é, normalmente, da responsabilidade das Direcções
Regionais de Agricultura (7), sob coordenação da DGF, tendo a obrigação de reportar para os
Centros de Prevenção e Detecção todos as ocorrências detectadas. Muitos destes centros já
funcionam em edifício comum ao do Centro Distrital de Operações de Socorro do SNBPC e,
felizmente, alguns deles até na mesma sala. Contudo, uma proporção importante de primeiras
detecções é comunicada pelas brigadas móveis, pelas empresas forestais e, cada vez mais, pelo
público em geral, sobretudo devido à grande divulgação do telemóvel.
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O SNBPC produz estatísticas dos incêndios forestais, através da recolha dos registos relativos
aos recursos envolvidos em cada operação, desde o pedido de ajuda, os meios envolvidos, a
cronologia do combate, até ao final das operações de rescaldo e vigilância. No final de cada dia
elabora-se uma informação relativa ao número de incêndios e falsos alarmes, que é enviada para
a DGF. Estas informações são cruzadas com as recolhidas pelos Centros de Prevenção e
Detecção de Incêndios Florestais, é-lhes incorporada a relativa às áreas ardidas, cujo
levantamento é da responsabilidade da DGF e ficam assim determinados os dados estatísticos
relativos aos incêndios florestais, sendo a DGF a entidade responsável pela sua divulgação
oficial.
Finalmente, foi referido que dada a grande quantidade de recursos que participam nas operações
de combate a incêndios forestais de grandes proporções, provenientes de numerosos corpos de
bombeiros e de diversas outras entidades e organizações, tais como as brigadas de sapadores
florestais ou equivalentes dos parques e reservas naturais, das empresas forestais (Afocelca) e
das associações de produtores florestais, é frequente a crítica de descoordenação que afectam a
eficácia das operações, mas o problema mais importante não é o da coordenação, mas sim o da
ausência de directivas precisas e oportunas para as situações de crise.
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15 de septiembre de 2003
Entrevista na Direcção Geral das Florestas:
Sr. Engº. A. Sousa Macedo (DirectorGeral das Florestas);
Sr. Engº. Manuel Rebelo (SubdirectorGeral das Florestas);
Sr. Engº. Vitor Louro (Director de Serviços de Valorização do Património Florestal);
Sra. Engª. Ivete Strecht (Chefe de Divisão de Protecção e Conservação Florestal);
Sr. Engº. Miguel Galante (Divisão Protecção e Conservação Florestal)
Lugar: Edificio da D.G.F., Av. João Crisóstomo, Lisboa.
Participantes: Luciano Lourenco (Universidade de Coimbra);
Guillermo Julio (Universidade de Chile);
Luis Lemos (Consultor de Raíz).
Temas:
Foi referido que a missão da DGF é impulsionar para os recursos florestais de Portugal um
grande projecto mobilizador, de contornos nacionais, assente nas suas extensas floresta, e que,
de maneira sustentável contribua para o desenvolvimento rural e para o abastecimento de uma
indústria próspera, moderna e competitiva, consubstanciado num contexto de aceitação social e
de melhoramento dos recursos naturais fundamentais, como são a água, o solo, o ar e a
biodiversidade.
No que diz respeito aos incêndios forestais, a DGF assume os seus compromissos com
responsabilidade, especialmente pelos graves prejuízos que se geram, mas que, pelas
características e diversidade das entidades envolvidas, está presente una importante exigência
de acções interministeriais, em que a prevenção deve assumir cada vez mais um papel mais
relevante e, por outro lado, a eficácia do combate tem que ser devidamente avaliada, pela
grande quantidade de recursos que lhe é afectado anualmente.
Entre as acções que são da competência da DGF, cabe destacar preferencialmente as seguintes:
Campanhas de Sensibilização, como uma maneira de prevenir actos de negligência
e vandalismo; Prevenção, através da aplicação de técnicas e práticas que assegurem o bom uso do fogo,
bem como de alertas para a proibição do seu uso em determinados períodos do ano.
Silvicultura preventiva, Através da execução de medidas dirigidas para a gestão da
floresta, nomeadamente no que concerne à limpeza de combustíveis perigosos,
especialmente nas bermas dos caminhos. Vigilância e detecção de incêndios florestais, através das 233 torres que a DGF coordena
no território continental, procurando estabelecer a melhor comunicação e coordenação dos
seus alertas com as organizações de combate, particularmente com o SNBPC.
Sapadores Florestais, apoio ao programa de trabalho de primeira intervenção no combate,
velando por uma adequada acção nos rescaldos e no controlo dos reacendimentos, que são
causas comprovadas de início de numerosos e grandes incêndios.
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Perante a consulta sobre a eventual existência de colaboração da DGF com o Ministério da
Educação, especialmente no que diz respeito às campanhas de sensibilização da população
escolar, foi respondido que, por norma, esse Ministério não realiza actividades importantes
sobre este tema, não obstante a importância que tal representa para a prevenção.
Sobre diversas questões colocadas sobre a detecção por meio de postos de vigia, foi respondido
que não se estabeleceram pré-requisitos para desempenhar o trabalho de vigia, nem se
realizaram programas de formação e que subsistem problemas para encontrar pessoal disponível
para desempenhar essa tarefa (geralmente são estudantes, muitos dos quais têm de regressar às
aulas a 15 de Setembro). Também se assinalou que não existem antecedentes sobre a eficiência
dos postos de vigia e que não se registam os tempos de detecção (período que decorre entre o
início dos fogos e o momento em que são detectados pelos vigias).
Naquilo que diz respeito à actividade de investigação e desenvolvimento realizada pela DGF, a
informação obtida dá conta da execução de diversos projectos realizados em conjunto com
outras entidades: Detecção automática (Associação para o Desenvolvimento da Aerodinâmica
Industrial); Índice de Risco (Instituto de Meteorologia); Uso de Imagens de Satélite para
Avaliação de Danos (Instituto Superior de Agronomia).
A reunião terminou com uma projecção de fotografías dos últimos incêndios florestais
ocorridos, em particular sobre o da Tapada de Mafra.
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INQUÉRITO
ao Acidente da Chamusca
Acidentados:
Manuel Jesús Montoya Avila
Isaías Roque Huenuan Paine
Chefe da Brigada Helitransportada:
Mario Santana Ríos
Acompanhante dos acidentados, minutos antes do acidente:
João Rodrigues
1. Estava previsto proceder ao reconhecimento do local, no dia 18, ao fim da tarde,
durante a visita à área queimada na Chamusca;
2. Uma avaria no helicóptero impediu o encontro com os técnicos que deveriam
acompanhar os consultores ao local;
3. No dia seguinte, após o regresso de Monchique, estava prevista a audição dos senhores
Mário Santana e João Rodrigues, o que não foi possível por ambos se encontrarem a
combater um incêndio florestal que, entretanto, tinha deflagrado e lavrava com alguma
violência.
Pelas razões indicadas não foi possível proceder ao apuramento de dados que
permitissem acrescentar mais alguma coisa ao que é conhecido.
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