Download - AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATOS BANCÁRIOS
EXMO. SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA VARA CÍVEL DA COMARCA DE SANTA MARIA/RS
FULANO, brasileiro, casado, funcionário público estadual,
portador do CPF e RG, residente e domiciliado , através
de seu procurador regularmente constituído, ut
instrumento de mandato incluso, vem à presença de
Vossa Excelência propor a presente:
AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATOS BANCÁRIOS DE
CARTÃO DE CRÉDITO BANRISUL E CONTRATOS DE
ABERTURA DE CRÉDITO EM CONTA-CORRENTE
contra, pelos fundamentos de fato e de direito que
passa a aduzir:
I – DOS FATOS
O autor estando carente de recursos financeiros para
cumprir com suas obrigações, lançou mão de empréstimos junto à instituição
BANCO CICLANO.
No transcorrer da vigência dos aludidos financiamentos,
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o autor verificou que os encargos, à cada mês, estavam se tornando
excessivamente onerosos, não guardando qualquer relação de
proporcionalidade com o comprometimento de renda (equilíbrio
prestação/renda).
Ocorre excelência, que atualmente o autor viu o seu
salário engolido pelos descontos efetuados pela instituição bancária, com o
fundamento de saudar os empréstimos efetuados, não restando parcela
significativa de seu salário para efetuar gastos com necessidades básicas
como moradia e alimentação (DOC ANEXO 03/04), como depreende-se do
DOC ANEXO 05, no qual consta no demonstrativo de pagamento, que do
salário de R$2.929,47 ; o autor possuí líquido a receber R$795,72 ;
sendo R$929,76 pagos ao BANCO CICLANO.
Sendo a presente situação insustentável ao autor, tentou
dialogar com a instituição bancária, a fim de conseguir uma forma de
pagamento que não comprometesse sua renda familiar, não restando sucesso
no diálogo, sendo a única alternativa proposta pelo banco a assunção de mais
empréstimos. Tentou inclusive conseguir cópias dos contratos pactuados, não
logrando êxito até o momento, vez que a instituição alega que estão
arquivados em local comum aos demais clientes e de difícil localização. O
autor sequer tem cognição do valor total devido, vez que não tem em mãos
qualquer documento relativo aos empréstimos, tão pouco tem recebido do
banco qualquer demonstrativo do débito existente e conseqüente amortização.
Não tendo como sustentar sua família condignamente,
não restou ao autor alternativa, senão proceder ao pedido de cancelamento
dos descontos em folha de pagamento relativos aos empréstimos do cartão de
crédito e financiamentos do BANCO CICLANO (DOC ANEXO 06). Deve-se
frisar, neste ponto, que a mora é do credor, que onerou excessivamente as
prestações obrigacionais e, assim, impossibilitou o adimplemento.
Tais ilegalidades são conseqüências exclusivas da
conduta pérfida e abusiva BANCO CICLANO.
Todavia, infrutíferas foram as tentativas para que se
efetuasse a revisão dos valores, bem como o modo pelo qual vêm majorando
as prestações, sendo que tal revisão deveria ser feita desde o início do
financiamento.
Das tentativas de acordo extra-judiciais o requerente
conseguiu obter apenas respostas dúbias e evasivas da parte adversa, em
nada surtindo efeito, acarretando ao mesmo uma verdadeira penalidade, visto
que, atualmente, encontra-se impossibilitado de saldar a dívida; razão única,
que o levou a cancelar o pagamento do encargo mensal, cujos valores vinha
desembolsando ilimitadamente (DOC ANEXO 06).
Ademais se faz necessário que durante a tramitação
desta ação revisional, na qual é objeto de controvérsia judicial a abusividade
de cláusulas contratuais, não haja inscrição do nome do autor em cadastro de
devedores e protesto de títulos referentes aos financiamentos em litígio, a fim
de se evitar a ocorrência de prejuízos maiores ao autor. Além disto, justifica-se
este entendimento pelo fato de que estando sub judice o contrato, a
inadimplência do financiado, a qual pode embasar uma eventual inscrição do
nome do autor em cadastro de devedores, torna-se duvidosa.
À vista disso, invoca-se a tutela jurisdicional, face ao
perigo iminente de lesão ao seu patrimônio, que se não suprido "in oportune
tempore", tornar-se-á ineficaz a prestação jurisdicional, ferindo, desse modo, o
princípio da boa-fé, somando-se à mácula da nulidade absoluta do contrato.
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Logo, nada mais resta ao postulante, senão bater às
portas do Poder Judiciário, a fim de consignar em pagamento as prestações
obrigacionais vincendas, de forma revisionada.
II - DO DIREITO
a) DA PREMENTE NECESSIDADE DE ANTECIPAÇÃO
PARCIAL DOS EFEITOS DA TUTELA JURISDICIONAL.
1ª - AUTORIZAÇÃO PARA DEPÓSITO JUDICIAL DAS
PARCELAS DE FORMA REVISIONADA
Entendendo o devedor estarem sendo exigidas
prestações excessivamente onerosas, a ele é dado o direito de ver o contrato
reequilibrado dentro dos ditames legais, oferecendo em consignação os valores
que expressam a forma do contrato que entende correta.
Por ser bastante claro o ordenamento do art. 6º, inc. V, do
Código Defesa do Consumidor, que declara o direito do consumidor de revisar
contratos cujas prestações sejam desproporcionais, é perfeitamente cabível
que se efetuem os depósitos das prestações em juízo.
Os depósitos têm natureza acautelatória que previne a
mora, permitindo a adimplência do contrato. Assim, ficam garantidas ambas as
partes, porque o devedor, na eventualidade de um julgamento pela
improcedência da ação, faz uma reserva que lhe facilita o pagamento da
dívida, e o credor tem ao seu alcance, nesse caso, pelo menos parte da
importância a receber, satisfazendo o seu crédito com maior facilidade.
2ª - VEDAÇÃO DA CIRCULAÇÃO OU PROTESTO DE
TÍTULOS DE CRÉDITO VINCULADOS AOS CONTRATOS REVISIONADOS
No tocante aos pedidos de antecipação de tutela, faz se
necessária à vedação da circulação ou protesto de títulos de crédito vinculados
aos contratos revisionados, medida aceita inclusive pelo egrégio TJRS, uma
vez que estes títulos, emitidos em garantia ao fiel cumprimento de negócios
jurídicos bancários e a estes vinculados pro solvendo, são atingidos por todas
as vicissitudes do pacto principal.
Nesse sentido, transcreve-se, no que importa, o seguinte
precedente:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO REVISIONAL. PRETENSÃO DA AUTORA NO SENTIDO DA ABSTENÇÃO DA RÉ NA REMESSA DO NOME DO AUTOR PARA REGISTRO EM BANCO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. CESSAÇÃO DAS COBRANÇAS REFERENTES AO CONTRATO. IMPOSSIBILIDADE DE EMISSÃO DE TÍTULOS. APRESENTAÇÃO DE DOCUMENTO. 1) Ainda que não se entenda a medida como de tutela antecipada, possível apreciação como medida cautelar inominada. Estando em discussão o débito, legítima a pretensão do não encaminhamento do nome do autor para registro em órgãos de proteção ao crédito. Entendimento consolidado da 16ª Câmara Cível deste tribunal. 2) Sustação de providências visando cobrança, que se tem como razoável em razão da discussão do débito. 3) Igual quanto à providência à emissão de títulos. 4) Exibição de documentos indeferida, com
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argumento de que poderão vir os dados ao feito de forma natural, com a manifestação regular do banco. AGRAVO PROVIDO EM PARTE. (AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 70008327991, DÉCIMA SEXTA CÂMARA CÍVEL, JULGADO EM 5 DE ABRIL DE 2004).
3ª - SUSTAÇÃO DE PROVIDÊNCIAS DO CREDOR
VISANDO COBRANÇA DOS DÉBITOS REVISADOS EM CONTA
CORRENTE OU FOLHA DE PAGAMENTO DO AUTOR
As providências do credor em relação à cobrança dos
débitos revisados em conta corrente do autor ou até mesmo perpetradas em
sua folha de pagamento, devem restar suspensas quando o débito está sub
judice, bem como quando o correntista modificar a anterior autorização (DOC
ANEXO). Com a nova manifestação, agora negativa, o desconto passa a ser
unilateral.
Revela-se inadmissível o mencionado desconto, por força
do caráter alimentar dos vencimentos do autor, os quais, em virtude desse
caráter, são absolutamente impenhoráveis, consoante o disposto no art. 649,
IV, do CPC. Esse, aliás, o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (v.g.,
6ª Turma, REsp nº 54.176/SP, j. 13.9.1994, rel. Min. Luiz Vicente Cernicchiaro,
DJ 31.10.1994, p. 29.544).
O entendimento predominante, se inclina em admitir a
reversão de autorização para desconto em folha de pagamento, ao
fundamento, em síntese, que o indeferimento da pretensão implicaria em
igualar o desconto à penhorabilidade de salários, medida inadmissível, além de
estar entre os atos de gestão da conta por seu titular, sem falar no ilegítimo
privilégio a determinado credor, em prejuízo dos demais, sem que a lei o
preveja.
É a lição de Theotonio Negrão, em seu Código de
Processo Civil, 35ª edição, São Paulo: editora Saraiva, 2003, p. 709:
“É inadmissível a penhora mediante desconto parcelado, em folha de pagamento, dos vencimentos do funcionário.”
Assim, considerando que este entendimento está
sedimentado na jurisprudência do egrégio TJRS, especialmente da 16ª Câmara
Cível, refere os seguintes precedentes, apenas exemplificativamente:
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO REVISIONAL. PRETENSÃO DA AUTORA NO SENTIDO DA ABSTENÇÃO DA RÉ NA REMESSA DO NOME DO AUTOR PARA REGISTRO EM BANCO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO. 1) Ainda que não se entenda a medida como de tutela antecipada, possível apreciação como medida cautelar inominada. Estando em discussão o débito, legítima a pretensão do não encaminhamento do nome do autor para registro em órgãos de proteção ao crédito. Entendimento consolidado da 16ª Câmara Cível deste Tribunal. 2) Ajuizada demanda envolvendo contrato de empréstimo com desconto em conta corrente, razoável a vedação do desconto de valores a título de pagamento das parcelas decorrentes do empréstimo, enquanto não julgada a demanda, preservado o salário, que é impenhorável. Precedente do colendo STJ. AGRAVO PROVIDO. (AGRAVO DE INSTRUMENTO Nº 70008655052, DÉCIMA SEXTA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: HELENA RUPPENTHAL CUNHA, JULGADO EM 06/05/2004)” (grifos nossos)
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“APELAÇÃO CÍVEL. ILEGITMIDADE PASSIVA. Não é ilegítima para atuar no pólo passivo a associação que entremeia relação do autor e da instituição. Aplicável, à espécie, o disposto no par. 3º do art. 515 do CPC, acrescentado pela Lei nº 10.352, de 26/12/01. AÇÃO VISANDO AO CANCELAMENTO DA AUTORIZAÇÃO CONCEDIDA PARA DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO. A autorização concedida pelo servidor público para o desconto em sua folha de pagamento de valores relativos a financiamento bancário é sempre precária e pode ser cancelada a qualquer tempo. À unanimidade, proveram o recurso.”Apelação Cível nº 70006833420, TJRS, DÉCIMA SEXTA CÃMARA CÍVEL, REL. Dra. Ana Beatriz Iser, julgado em 10/09/03).” (grifos nossos)
“DECISÃO QUE DETERMINA SUSTAÇÃO DE DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO DE FUNCIONÁRIA PÚBLICA, EM FUNÇÃO DE EMPRÉSTIMOS REALIZADOS. AUTORIZAÇÃO EXPRESSA DA MUTUÁRIA PARA IMPLANTAÇÃO DOS DESCONTOS.
É vedada a retenção de vencimentos do devedor com o objetivo de compensar débitos existentes, tendo em vista o caráter alimentar de tal parcela. Inteligência dos artigos 649, inciso IV, do Código de Processo Civil e artigo 7º, inciso X, da Constituição Federal.”
RECURSO PROVIDO (Apelação N° 70006031611 16° Câm. Cív. Porto Alegre, 23 de abril de 2003. Relator Des. Claudir Fidelis Faccenda). (grifos nossos)
“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO VISANDO aO CANCELAMENTO DA AUTORIZAÇÃO CONCEDIDA PARA DESCONTO EM FOLHA DE PAGAMENTO. Preliminar de ilegitimidade passiva afastada. A AUTORIZAÇÃO CONCEDIDA PELO SERVIDOR PÚBLICO PARA O DESCONTO EM SUA FOLHA DE PAGAMENTO DE VALORES RELATIVOS A FINANCIAMENTO BANCÁRIO É SEMPRE PRECÁRIA E PODE SER CANCELADA A QUALQUER TEMPO . RECURSO DESPROVIDO .”
(Apelação Cível n° 70006821219, 16° Câm. Cív. Porto Alegre, 10 de setembro de 2003, Rel. Dra. Ana Beatriz Iser). (grifos nossos)
Não é outro o entendimento do Superior Tribunal de
Justiça, como segue:
“ADMINISTRATIVO. FUNCIONÁRIO PÚBLICO. DESCONTO EM FOLHA. Havendo dúvidas acerca do desconto e insurgindo-se contra ele o funcionário, não há como, sob pena de violação ao art. 649, IV, do CPC, validar a tese fixada pelo acórdão recorrido que admitiu o abatimento, a míngua dos meios juridicamente admitidos, por intermédio de um simples desconto em folha” (RESP 135.867/SP, DJ de 19.12.97, 6ª Turma do STJ, Relator o Ministro FERNADO GONÇALVES). (grifos nossos)
4ª - IMPEDIMENTO DE INSCRIÇÃO DO AUTOR EM
CADASTRO DE DEVEDORES (SERASA, CADIN, SPC) POR OBRIGAÇÕES
ORIGINADAS DOS CONTRATOS REVISIONADOS
Estando o devedor discutindo, através de ação revisional,
a abusividade e a ilegalidade de cláusulas contratuais, o que será capaz de
alterar o valor devido à instituição financeira, justifica-se a concessão de liminar
para determinar a não inclusão ou a retirada do seu nome dos órgãos de
proteção de crédito enquanto pendente a lide revisional.
Verifica-se que a supressão do nome do devedor dos
bancos de dados de inadimplentes não acarreta nenhum prejuízo ao credor,
até mesmo porque as informações sobre o autor continuam em seu cadastro
interno.
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Na verdade, os cadastros de inadimplentes são utilizados
como forma de pressionar o devedor a satisfazer o débito nos moldes
desejados pelo credor, sob pena de, não o fazendo, seu nome ser divulgado na
praça como inadimplente ou como mau pagador, obstaculizando os seus
futuros negócios, ainda que a cobrança seja considerada excessiva ou
questionada judicialmente. Tal conduta por parte do credor se apresenta
abusiva, mormente se levarmos em conta que o autor da ação revisional está
disposto a realizar o depósito das quantias que entende devidas, o que
demonstra a sua boa-fé e corrobora a necessidade da não-inclusão ou da
retirada do seu nome dos bancos de dados de inadimplentes.
A vedação de divulgação do nome do autor em banco de
dados protetores ao crédito enquanto em discussão o débito decorrente do
contrato que está sendo revisado, é matéria pacífica no TJRS, prevalecendo o
que estabelece a conclusão n. 11 do CETARGS, nestes termos:
“SOBRE INSCRIÇÃO DO DEVEDOR EM ARQUIVOS DE CONSUMO. Não ofende direito do credor liminar obstativa da inscrição do nome do devedor em banco de dados de consumo, assim como impeditiva de que o credor comunique a terceiros registro de inadimplência que haja procedido em seu cadastro interno, durante a pendência de processos que tenham por objeto a definição da existência do débito ou seu montante”. (Conclusão da reunião de 27-05-96 do Centro de Estudos do Tribunal de Alçada do Estado do Rio Grande do Sul - CETARGS).
O teor desta conclusão foi ratificado pelo Centro de
Estudos do Tribunal de Justiça, conforme publicação no DJ de 7/5/99.
A matéria está pacificada, inclusive com inúmeras
decisões no colendo STJ, como se vê do precedente, que se adota:
“SERASA. CAUTELAR. EFICÁCIA.ENQUANTO pendente a ação ordinária sobre a validade da cobrança de juros de 14% ao mês, deve ficar suspenso o registro da devedora em banco de dados de inadimplência. precedentes. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.” (RESP 450840/RS, RELATOR MIN. RUY ROSADO DE AGUIAR JUNIOR, JULGADO PELA QUARTA TURMA EM 3/4/2003).
Inclusive quanto ao CADIN a matéria já foi examinada, no
julgamento do Resp 504052/AL, julgado pela Primeira Turma do STJ em
14/9/2003, relator Min. José Delgado, assim ementado:
“TRIBUTÁRIO. DENÚNCIA ESPONTÂNEA. PARCELAMENTO DO DÉBITO. MULTA MORATÓRIA. APLICABILIDADE. ENTENDIMENTO DA 1ª SEÇÃO. INSCRIÇÃO NO CADIN. DÉBITO SUB JUDICE. AFASTAMENTO.
... 4. Enquanto se impugna o montante do
débito cobrado, com fundamentos razoáveis, cabe o pleito formulado pelo devedor para o fim de obstar o registro de seu nome nos bancos de dados de proteção ao crédito. Precedentes. 5. Recurso especial parcialmente provido.”
Por conseguinte, o deferimento da liminar, obtemperado
com o acolhimento da pretensão do autor de revisar os contratos abusivos,
não havendo prevalecimento de um em face de outro, até que a solução final
seja emprestada ao feito - coisa julgada material - por decisão de mérito, é
medida pertinente ao Ordenamento Jurídico Positivado e amplamente
ensejadora de JUSTIÇA.
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b) DA REVISÃO CONTRATUAL E CONSEQUENTE
INCIDÊNCIA DAS REGRAS DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
Os contratos de financiamentos, no caso, são típicos de
adesão e a revisão se impõe, pela prevalência dos princípios da relatividade e
da comutatividade, na busca da concretização do equilíbrio contratual e da
igualdade efetiva das partes, sobre o da pacta sunt servanda. Aplicam-se as
regras do Código de Defesa do Consumidor (Lei nº 8.078/90) aos negócios
jurídicos bancários, pois esse diploma possui incidência de caráter imperativo
como norma de ordem pública e interesse social, consoante o disposto em seu
artigo 1º. Os contratos em questão configuram uma relação de consumo nos
termos do art. 3º, § 2º, do CODECON ou ainda mediante a equiparação pelo
art. 29.
De registrar, ainda, o entendimento da aplicabilidade do
CDC às relações decorrentes de crédito bancário, sustentada por MÁRCIO DE
OLIVEIRA PUGGINA (Revista Ajuris n.º 50, p.203), com este fundamento:
“Se produto é todo o bem jurídico, não há negar-se que o crédito é um bem jurídico que é fornecido pelo Banco (fornecedor) ao tomador do crédito (consumidor), como destinatário final (do crédito, enquanto crédito). O mutuário só não seria destinatário final do crédito – enquanto crédito – se, em vez de consumi-lo, ele o repassasse a terceiros.
Por isso é que, diante da interpretação lógica, e sistemática do art. 2º e do § 1º do art. 3º do Código de Defesa do Consumidor, não vejo como deixar de se incluir o crédito bancário entre as relações por ele
tuteladas”.
Sobre a possibilidade de exclusão das cláusulas
abusivas, O TJRS tem entendimento pacífico, considerando aplicável o CDC,
porquanto caracterizada relação de consumo:
“APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO EM CONTA-CORRENTE. CARTÃO DE CRÉDITO.
1) Possibilidade de revisão do contrato, através da interpretacao do princípio da autonomia da vontade juntamente com os demais princípios que regem os contratos. 2) Juros remuneratórios limitados a 12% ao ano, observados os parâmetros do ordenamento jurídico. APLICABILIDADE DO CDC. 3) Determinada revisão dos contratos bancários, estabelecidos novos patamares aos encargos, possível a repetição do indébito independentemente da prova do erro; valores decorrentes de cláusula abusiva não podem permanecer com o credor porque sem causa legítima o recebimento; fundamentos no CCB e no CDC 4) Capitalização dos juros na periodicidade anual, para o contrato de conta corrente, e capitalização afastada no contrato de cartão de crédito, inexistente permissão legal. 5) Regularidade da cláusula mandato. Sucumbência redefinida. APELOS PARCIALMENTE PROVIDOS. (Apelação Cível nº 70005917034, Décima Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Des. Helena Ruppenthal Cunha, julgado em 28/05/2003) “.
“DEMANDA REVISIONAL. CONTA CORRENTE. CHEQUE ESPECIAL. RELAÇÃO SEM SOLUÇÃO DE CONTINUIDADE. REVISÃO DESDE O INÍCIO DO CONTRATO. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INCIDÊNCIA AOS CONTRATOS BANCÁRIOS QUANTO AS CLÁUSULAS ABUSIVAS. JUROS REMUNERATÓRIOS. Possibilidade de revisão de cláusulas a limitar os juros praticados de forma elevada (10,0% ao mês),
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com fundamento no Código do Consumidor. CAPITALIZAÇÃO. Admitida na forma anual (art. 4º do decreto nº 22.626/33). COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. Ineficaz a cláusula por ofensa ao disposto no art. 115, 2ª parte, do Cód. Civil, e art. 51, IV, do CDC. MULTA CONTRATUAL. Não prevalece a forma contratada por exceder ao percentual definido no §1º do art. 52 da lei nº 9.298/96, observando-se que o contrato e posterior a mudança. Repetição em dobro. Com a redução dos juros é permitida a compensação ou restituição de valores, sob pena de se tornar inócua a decisão. Porém, a restituição se fará de forma simples e não em dobro, diante da ausência da prova do erro no pagamento. APELAÇÃO E RECURSO ADESIVO DESPROVIDOS. (Apelação Cível nº 70006235105, Décima Sexta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Des. Paulo Augusto Monte Lopes, julgado em 21/05/2003)”.
“REVISIONAL DE CONTRATOS BANCÁRIOS. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. Aplicáveis suas disposições aos contratos bancários. REVISÃO DOS CONTRATOS EXTINTOS. Comprovado o encadeamento contratual, possível a revisão dos contratos originários. JUROS REMUNERATÓRIOS. Encontram limitação ao patamar de 12% a.a., forte nas disposições contidas no CDC. CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS NO CAC. Inviável sua ocorrencia em qualquer periodicidade. CAPITALIZAÇÃO NOS CONTRATOS DE FINANCIAMENTO, MÚTUO, CONFISSÃO DE DÍVIDA E AFINS. É vedada a sua cobrança sob qualquer hipótese, por ausente autorização legal. JUROS DE MORA NOS CONTRATOS BANCÁRIOS. Autorizada a sua pactuarão em 1% a.m. REVISÃO. Possível se revela a revisão da contratação para fins de afastamento dos excessos porventura apurados. CORREÇÃO MONETÁRIA. Autorizada a incidência do IGP-M ou INPC. COMPENSAÇÃO DE VALORES/REPETIÇÃO DO INDÉBITO. Nada impede a declaração no sentido de que uma vez apurados pagamentos a maior tais deverão ser computados no abatimento do débito, de forma
simples. SPC/SERASA. Enquanto em discussão o débito inviável se mostra a inscrição do nome da correntista nos cadastros de inadimplentes. DERAM PARCIAL PROVIMENTO A APELACAO DA AUTORA E NEGARAM PROVIMENTO A DO BANCO. (Apelação Cível nº 70006288351, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Des. José Francisco Pellegrini, julgado em 20/05/2003)”.
c) DA INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA
É direito do devedor que ingressa com ação revisional de
contrato requerer a exibição dos documentos necessários ao julgamento da
causa, os quais estão na posse da instituição financeira que tem, inclusive, o
dever legal de conservá-los.
Assim, a instituição financeira não deve se eximir de
apresentar os contratos, documentos comuns às partes e que estão sob sua
guarda, bem como planilhas que demonstrem os descontos efetivados na
conta corrente do autor e folha de pagamento, o valor financiado e progresso
do débito, tendo em vista o disposto nos arts. 844, II e 355, ambos do CPC.
Nesse sentido, colaciono a seguinte jurisprudência:
“PROCESSO DE EXECUÇÃO. EMBARGOS DO DEVEDOR. DISCIPLINA JURÍDICA DAS OBRIGAÇÕES DE PAGAR EM DINHEIRO.
CERCEAMENTO DE DEFESA. POSTULAÇÃO REVISIONAL DE NEGÓCIOS SUCESSIVOS. RELAÇÃO JURÍDICA CONTINUADA. EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS.
Quando a guarda dos documentos necessários à elucidação da causa incumbe ao estabelecimento de
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crédito demandado em face da sistemática de desenvolvimento das suas operações registrárias impõe-se deferida, de ofício (art. 130 do CPC) ou a requerimento da parte (art. 355 do CPC), a exibição de documentos pleiteada pelo demandante, que, não os tendo acessíveis, deles depende para deduzir a sua pretensão em juízo. Cerceamento de defesa configurado. (...)” (AC nº 197582882, 5ª Câmara Cível TARGS, Rel. Des. Aymoré Roque Pottes de Mello, 07.05.98)
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONTRATO BANCARIO. REVISAO JUDICIAL. ÔNUS DA PROVA. INVERSÃO. Exibição dos documentos por força do que dispõe o art-355 do CPC. Os contratos são essenciais para averiguar a abusividade de suas cláusulas objeto da ação promovida pelo consumidor, sendo notória a instituição financeira, encontrando respaldo a aplicação da inversão do ônus da prova (art-6, inc-VIII, segunda parte, da lei nº 8078/90). AGRAVO IMPROVIDO.” (AGI nº 598432235, 14ª Câmara Cível TJRS, Rel. Des. Henrique Osvaldo Poeta Roenick, 03.12.98
“AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO. EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS.
Cabe à instituição financeira o dever de exibir o documento comprobatório da relação jurídico-contratual existente entre as partes, não em decorrência de inversão do ônus da prova, mas por força do disposto no art. 355, do CPC. Agravo provido.” (AGI nº 70000014109, 14ª Câmara Cível TJRS, Rel. Des. Marco Antonio Bandeira Scapini, 16.09.99)
d) DO RECONHECIMENTO DE OFÍCIO DAS
NULIDADES
Tratando-se de nulidade de pleno direito, diante do que
dispõem as normas do Código de Defesa do Consumidor, impõe-se o
reconhecimento pelo juiz, independentemente de alegação das partes, como
preceitua o parágrafo único do artigo 168 do Código Civil, afastando-se, de
ofício, a abusividade da cláusula.
Nesse sentido a doutrina de Nelson Nery Jr., (in “Os
Princípios Gerais do Código de Defesa do Consumidor, Revista de Direito do
Consumidor, nº 3):
“O Tribunal pode, inclusive, decidir contra o único
recorrente, reformando a decisão recorrida para pior,
ocorrendo, assim, o que denominamos de ‘reformatio in
pejus’ permitida, já que se trata de matéria de ordem
pública a cujo respeito a lei não exige a iniciativa da parte,
mas ao contrário, determina que o Juiz a examine de
ofício.”
Em posição uniforme de seus membros, a 14ª Câmara
Cível, do TJRS assim se manifesta:
“AÇÃO DE REVISÃO DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO COM GARANTIA DE ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AGRAVO RETIDO. NÃO-RATIFICADO EM CONTRA-RAZÕES DE APELAÇÃO. NÃO-CONHECIMENTO (ART-523, PAR-1, DO CPC). INCIDÊNCIA DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. ONEROSIDADE EXCESSIVA CARACTERIZADA. NULIDADE DE PLENO DIREITO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS ABUSIVAS. POSSIBILIDADE DE DECRETAÇÃO DE OFÍCIO. (...) APELAÇÃO INTERPOSTA NA AÇÃO REVISIONAL PARCIALMENTE PROVIDA. APELAÇÃO INTERPOSTA NA AÇÃO DE BUSCA E APREENSÃO PROVIDA.” (APC Nº 70001624253, DÉCIMA QUARTA CÂMARA CÍVEL, TJRS, RELATOR: DES. MARCO ANTONIO BANDEIRA SCAPINI, JULGADO EM 19/04/2001).
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“ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO FIXO COM GARANTIA FIDUCIÁRIA. I – CONTROLE DIFUSO DA LICITUDE DOS NEGÓCIOS JURÍDICOS E INTERPRETAÇÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. 1. FUNÇÃO SOCIAL DOS NEGÓCIOS E DIREITOS FUNDAMENTAIS. REVISÃO JUDICIAL E RELATIVIZAÇÃO DO PRINCÍPIO DO PACTA SUNT SERVANDA. APLICAÇÃO INCIDENTAL DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR: CONSUMIDOR PRÓPRIO. REGULAÇÃO MANDATÓRIA: NORMAS E ORDEM PÚBLICA E INTERESSE SOCIAL. NULIDADES DE PLENO DIREITO: DECRETAÇÃO ATÉ DE OFÍCIO, A QUALQUER TEMPO E GRAUS DE JURISDIÇÃO. (...) APELO PROVIDO.” (APC Nº 70002708493, DÉCIMA QUARTA CÂMARA CÍVEL, TJRS, RELATOR: DES. AYMORÉ ROQUE POTTES DE MELLO, JULGADO EM 13/09/2001).
Em igual sentido, ainda, o posicionamento do egrégio
Superior Tribunal de Justiça, em precedentes assim ementados:
"CONTRATO. NULIDADE DE CLÁUSULA. DECLARAÇÃO DE OFÍCIO. CÉDULA DE CRÉDITO RURAL.Antes da vigência do Código de Defesa do Consumidor, que veio definir como nulas de pleno Direito as cláusulas contratuais abusivas (art. 51), era vedado ao juiz declarar de ofício a nulidade não requerida pela parte (art. 128 do C.P.C.).Recurso conhecido e provido para excluir do acórdão a declaração de nulidade de cláusula.Decisão.Por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento." (RESP nº. 90162/RS, 4ª. Turma do S.T.J., Min. Relator RUY ROSADO DE AGUIAR, j. 28.05.96)
"PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO "INTERNO" (C.P.C., ART. 545). MÚTUO RURAL. JUROS. ESTIPULAÇÃO CONTRATUAL DE ELEVAÇÃO DA ALÍQUOTA PREVISTA PARA A HIPÓTESE DE INADIMPLEMENTO
DO MUTUÁRIO. ILEGALIDADE (PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 5º., DL 167/67). CC, ARTS. 145/146. NULIDADE. APRECIAÇÃO DE OFÍCIO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. POSSIBILIDADE. RECURSO DESPROVIDO.I. Os juros moratórios, limitados, em se tratando de crédito rural, a 1% ao ano, distinguem-se dos juros remuneratórios. Aqueles são formas de sanção pelo não pagamento no termo devido. Estes, por seu turno, como fator de mera remuneração do capital mutuado, mostram-se invariáveis em função de eventual inadimplência por impontualidade. Cláusula que disponha em sentido contrário, prevendo referida variação, é cláusula que visa a burlar a disciplina legal, fazendo incidir, sob as vestes de juros remuneratórios, autênticos juros moratórios em níveis superiores aos permitidos.II. Em se tratando de nulidade absoluta contemplada no ordenamento material (CC arts. 145/146), defeso não era ao Tribunal de segundo grau apreciá-la de ofício.Decisão.Por unanimidade, negar provimento ao agravo regimental."(AGEDAG 151689/RS, 4ª. Turma do S.T.J., Min. Relator SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, j. 30/04/1998).
"DECISÃO.As razões do recurso especial atacam o acórdão proferido pelo Tribunal a quo em dois pontos: o primeiro, refere-se à alteração de encargos financeiros em razão da inadimplência, e o segundo, à capitalização de juros.Juros pelo inadimplemento.A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça não conforta a tese veiculada pelo recorrente em suas razões, conforme se verifica no AGEDAG 151.689, RS, Relator o eminente Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira, que leva a seguinte ementa:“PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO "INTERNO" (CPC, ART. 545). MÚTUO RURAL. JUROS. ESTIPULAÇÃO CONTRATUAL DE ELEVAÇÃO DA ALÍQUOTA PREVISTA PARA A HIPÓTESE DE INADIMPLEMENTO DO MUTUÁRIO. ILEGALIDADE (PARÁGRAFO ÚNICO DO ART. 5º., DL 167/67) CC, ARTS. 145/146. NULIDADE. APRECIAÇÃO DE OFÍCIO PELO TRIBUNAL DE ORIGEM. POSSIBILIDADE. RECURSO DESPROVIDO.
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I. Os juros moratórios, limitados, em se tratando de crédito rural, a 1% ao ano distinguem-se dos juros remuneratórios. Aqueles são formas de sanção pelo não pagamento no termo devido. Estes, por seu turno, como fator de mera remuneração do capital mutuado, mostram-se invariáveis em função de eventual inadimplência por impontualidade. Cláusula que disponha em sentido contrário, prevendo referida variação, é cláusula que visa burlar a disciplina legal, fazendo incidir, sob as vestes de juros remuneratórios, autênticos juros moratórios em níveis superiores aos permitidos.II. Em se tratando de nulidade absoluta contemplada no ordenamento material (CC arts. 145/146), defeso não era ao Tribunal de segundo grau apreciá-la de ofício." (DJU 01.03.99).Capitalização de juros.Neste ponto, o recurso especial também não poderia ser conhecido, seja porque o artigo 75 do Código Civil não foi prequestionado, seja porque a divergência jurisprudencial deixou de ser demonstrada.Nego, por isso, provimento ao agravo.Intimem-se.Brasília, 12 de maio de 2000.MINISTRO Ari Pargendler, Relator."(AG 253632/PR, 3ª. Turma do S.T.J., Min. Relator ARI PARGENDLER, j. 30/05/2000).
e) DO FORO DE ELEIÇÃO
Com relação à cláusulas de adesão que tratam da eleição
de foro, está cristalizada na doutrina e na jurisprudência a veemente repulsa às
cláusulas abusivas de eleição do foro. O que deveria ser uma deliberação
conjunta visando facilitar a resolução de divergências, passa à decisão
unilateral mascarada pelo típico formato inextricável dos contratos de adesão,
como o que originou esta lide.
Não vai além de artifício sutil para obstaculizar e restringir
a possibilidade de defesa de um possível contratante prejudicado. É estratégia,
meritíssimo, e das rasas. Coisa descabida entre probos.
Numa relação contratual, a cláusula em questão é tida
como leonina, e proporciona vantagem excessiva para uma parte em
detrimento de outra. O bônus auferido pelo contratante favorecido é tamanho
que o ônus do outro chega a se transmudar em efetivo dano aos seus direitos
fundamentais.
O foro de eleição disposto com má-fé no contrato de
adesão é cláusula abusiva, como se infere no Código de Defesa do
Consumidor (Lei 8.078/90), que no seu artigo 51 expressa:
"Art. 51 . São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:...IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade;...§ 1º - Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que:...III - se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e o conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso...."
Em concordância à predominante doutrina, vastíssima é a
jurisprudência que elucida o caso como, dentre inúmeras, as seguintes:
"Em contrato de adesão, a cláusula de eleição de foro deve ser interpretada em favor da parte aderente, independente de se tratar de pessoa física ou jurídica, sendo considerada abusiva na hipótese de acarretar-lhe exagerado ônus, de conformidade com a regra do artigo
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51, parágrafo 1º, inciso III, da Lei 8.078/90. ..." TAMG, 3ª C.Civil, AI 169506-3, j. em 23.02.94, rel. Juiz Guimarães Pereira, v.unânime, RJTAMG 54-55/98-100. (grifo nosso)
"... Ora, não se nega que a faculdade de eleição de foro no contrato continua válida, dentro dos princípios do art. 42 do CC. Porém, essa eleição nos contratos de massa, contratos de cláusulas predispostas ou contratos de adesão (definido pelo art.54 do CDC), como ocorre nos contratos de consórcio, pode se afigurar abusiva, se, na prática, dificultar ou impossibilitar a defesa do consumidor. Cuida-se da aplicação do princípio da boa-fé nos contratos, aliás não desconhecido pelo legislador de nosso Código Civil. Nesse sentido, diz a lei sob exame que dentre as cláusulas nulas de pleno direito incluem-se aquelas que estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade (art.51, IV) ..." 1º TACSP, 5ªC, MS 568462-0, j. em 24.11.93, rel. Juiz Sílvio Venosa, v.unânime, RDC 13/173-174. (grifo nosso)
O artifício revestido pela cláusula de eleição do foro, como
está, implica no apequenamento da parte aderente, o que lhe impõe sério dano
ao próprio direito material que deveria ser resguardado pelo contrato. A referida
disposição gera, de plano, a nulidade da cláusula, que embora não resulte na
nulidade do contrato como um todo, permite transferir a competência de foro ao
domicílio do autor.
f) DA LIMITAÇÃO DOS JUROS
Maria Helena Diniz (Curso de Direito Civil Brasileiro, 2º
volume, Editora Saraiva, São Paulo, 6ª edição aumentada e atualizada, 1991,
pág. 307) conceitua juros como “o rendimento do capital, os frutos civis
produzidos pelo dinheiro sendo, portanto, considerados como bem acessório,
visto que constituem o preço do uso do capital alheio, em razão da privação
pelo dano, voluntária ou involuntariamente.”
Os juros classificam-se em compensatórios, aqueles que
decorrem do consentimento do dono do capital como preço de seu uso por
tempo determinado, e moratórios, os que decorrem do retardamento do
adimplemento da obrigação como penalidade convencional e legal.
A questão da auto-aplicabilidade do parágrafo 3º do artigo
192 da Constituição Federal de 1988, que limita a taxa de juros é controvertida.
Com a promulgação da Constituição, o então Presidente da República, José
Sarney, aprovou o Parecer Normativo SR nº 70, de 06 de outubro de 1988, da
Consultoria-Geral da República, cuja conclusão era de que a disposição
constitucional, limitadora da taxa de juros, não era auto-aplicável, carecendo da
edição de lei complementar.
Posteriormente, o Supremo Tribunal, no julgamento da
ADIN nº 4-7-DF, por maioria de votos (6 contra 4), adotou a tese da não-auto-
aplicabilidade do parágrafo 3º do artigo 192 da Constituição Federal.
Expressiva, entretanto, também, tem sido a posição
divergente, acerca da auto-aplicabilidade da regra constitucional na
jurisprudência e na doutrina. Não é outra a lição de Luiz Roberto Barroso (O
Direito Constitucional e a Efetividade de Suas Normas, Renovar, Rio de
Janeiro, 1990, pág. 194): “Existe norma, e ao intérprete e aplicador cabe fazê-
la atuar. O conceito de juros não é controvertido. Trata-se de rendimento do
capital, em cujo conteúdo se integram duas idéias: a de remuneração pelo uso
de quantia pelo devedor e a de cobertura do risco que sofre o credor. Devem
ser considerados juros reais tudo aquilo que exceder a inflação e for pago a
título compensatório ou moratório, excetuadas as multas moratórias.
Distinguem-se, assim, da correção monetária, que não se destina a remunerar
o capital, nem a penalizar o moroso, mas, tão-somente, a preservar o valor
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aquisitivo da moeda”.
Sobre a auto-aplicabilidade do art. 192, §3º, da CF, o
Ministro Marco Aurélio Mendes de Faria Mello, do STF, assim se pronunciou:
“Quando a Corte apreciou a questão alusiva à auto-aplicabilidade do §3º do artigo 192 da Carta da República, no que impõe o respeito ao limite máximo de doze por cento para juros reais – Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 04, relatada pelo Ministro Sydnei Sanches , fiquei vencido, na companhia honrosa dos Ministros Carlos Velloso, Paulo Brossard e Neri da Silveira, no tocante à conclusão sufragada pela Corte de origem, ou seja, da eficácia imediata do preceito. Passei a ressalvar, no campo monocrático e na turma, a convicção pessoal. Todavia, os ditames da consciência levaram-se a assumir, ultimamente, posição diversa, voltando a sustentar a tese que desde o início defendi. É que a usura vem vencendo o Brasil, com nefastos efeitos no campo social. Grassa o desemprego, fato que contribui para o aumento da criminalidade. As contas públicas estão seriamente comprometidas com os acessórios da dívida interna. Por isso, voltei a expressar o convencimento externado nos idos de 1991, e que, com a passagem do tempo, somente restou robustecido. Tenho como auto-aplicável, tal como vem proclamando o Poder Judiciário do Estado do Rio Grande do Sul, a regra do §3º do artigo 192 da Carta, que, a rigor, deveria estar em dispositivo autônomo. A única justificativa para o lançamento da norma em parágrafo é a notória fuga do legislador constituinte de 1988 à elaboração de um diploma constitucional com número excessivo de artigos”.
(AI 234.873-1 (241), DJU de 29 de abril de 1999).
A legislação infra-constitucional, por igual, limita a taxa de
juros. Acolhida a nova concepção social do contrato e a defesa do consumidor
(CF/88, art. 5º, XXXII, c/c art. 170, V) é possível o expurgo do excesso de juros
remuneratórios, haja vista as condições que configuram a abusividade e a
lesividade do contrato, consoante o disposto no art. 51, IV, do Código de
Defesa do Consumidor.
Excluída a cláusula que estipula juros abusivos,
necessário adotar-se novo patamar, o que se faz dentro de um limite
referencial, tendo por base a estabilidade econômica após a implantação do
Plano Real, bem assim a observância ao princípio da boa-fé como padrão de
conduta frente à realidade social.
O equilíbrio entre as partes implica na limitação dos juros
remuneratórios em 12% ao ano, consoante o parâmetro adotado por analogia
ao citado diploma infraconstitucional, porém sob o fundamento do interesse
social da norma protetiva do consumidor.
De mais a mais, na esteira da posição explanada, os
demais fundamentos adotados como razões, também estão a conduzir para a
mencionada limitação: o caráter não vinculativo da ADIN nº 04, a recepção e
aplicação do Dec. 22626/33 (Lei de Usura) e a ausência de autorização do
Conselho Monetário Nacional (instituído pela Lei 4.595/64) para a prática de
taxas acima de 12% ao ano.
O contrato bancário/financeiro, no qual se estipulou taxa
de juros superior a 12% ao ano, é, sem dúvida, inadequado ao sistema jurídico
vigente e à boa-fé dele decorrente. A abusividade dos juros estabelecidos é
manifesta, sendo lesiva ao direito do consumidor a uma prestação equivalente.
A questão litigiosa refoge, portanto, do tema constitucional e da aplicação do
Decreto nº 22626/33, para se situar no plano da validade das disposições
negociais pela inobservância das regras que disciplinam o Sistema de Proteção
e Defesa do Consumidor.
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Manifesta a ilegalidade das cláusulas que fixaram os juros
devem ser reconhecidas suas invalidades, das quais decorrem a ineficácia do
direito do credor fiduciário relativamente àqueles juros que excederem o limite
de 12% ao ano.
Nesse sentido vem se manifestando reiteradamente a
jurisprudência do egrégio TJRS:
“APELAÇÃO CÍVEL. REVISÃO DE CONTRATOS DE CONFISSÃO DE DÍVIDA. I. APLICABILIDADE DO CDC. IRREFUTÁVEL A INCIDÊNCIA DO CDC SOBRE OS CONTRATOS BANCÁRIOS DE CONFISSÃO DE DÍVIDA, DIANTE DO ART. 3º, § 2º, DA LEI 8.078/90. II. POSSIBILIDADE DE REVISÃO CONTRATUAL. TEORIAS DA LIVRE PACTUAÇÃO RELATIVIZADAS DIANTE DA APLICAÇÃO DO CDC. III. JUROS REMUNERATÓRIOS. MANTIDA A LIMITAÇÃO AO ÍNDICE DE 12% AO ANO, EXTIRPANDO ASSIM ABUSIVIDADE CONSTATADA NA CONTRATAÇÃO DE JUROS A TAXAS QUE VARIAM ALÉM DA ESTIPULAÇÃO DA LEI DE USURA. ... (APELAÇÃO CÍVEL Nº 70006202014, DÉCIMA SEXTA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: DES. ERGIO ROQUE MENINE, JULGADO EM 21/05/2003).” (grifos nossos)
“APELAÇÃO CÍVEL. A CONFISSÃO DE DÍVIDA SE PRESTA COMO TÍTULO EXECUTIVO, CONFORME O ENTENDIMENTO DO STJ. POSSIBILIDADE DE REVISAR A AVENÇA (CONFISSÃO), MAS NÃO PACTOS ANTERIORES AO QUE ALICERÇA O FEITO EXECUTIVO. CABIMENTO DO USO DA TR COMO FATOR DE CORREÇÃO MONETÁRIA. APELO DOS EMBARGANTES PROVIDO EM PARTE. LIMITAÇÃO DOS JUROS REMUNERATÓRIOS EM 12% AO ANO. JUROS MORATÓRIOS LIMITADOS
EM 1% AO ANO, CONFORME A LEI DE USURA. PERMITIDA A CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS DE FORMA ANUAL. VEDADA A COBRANÇA DE COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. RECURSO IMPROVIDO. (APELAÇÃO CÍVEL Nº 70000203760, DÉCIMA NONA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: DES. MÁRIO JOSÉ GOMES PEREIRA, JULGADO EM 13/05/2003).” (grifos nossos)
Em razão disso, a cláusula contratual que impõe juros
acima do patamar de 12% ao ano, mostra-se excessivamente onerosa para o
consumidor-financiado (art. 51, § 1º, III, do CDC), devendo, em conseqüência,
ser considerada nula, pois incompatível com a boa-fé e a eqüidade, que devem
nortear as relações de consumo (art. 51, IV, do CDC), considerando que a
atividade bancária está submetida às normas do CDC (art. 3º, § 2º).
g) DA CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS
Quanto à capitalização dos juros, o artigo 4º do Decreto nº
22626 revogou a parte final do artigo 1262 do Código Civil de 1916. A partir de
então a capitalização de juros só é lícita em operações expressamente
autorizadas por lei especial, como, por exemplo, nos depósitos em caderneta
de poupança. A matéria é objeto da Súmula nº 121 do Supremo Tribunal
Federal: “É vedada a capitalização de juros, ainda que expressamente
convencionada". A Lei nº 4595 e as demais normas que regulam a atividade
das entidades bancárias e financeiras não contêm previsão permitindo o
anatocismo em contratos da natureza daqueles em exame.
Nessa linha, não é admissível capitalização de juros em
negócios jurídicos em que não esteja expressamente autorizada em lei. Nesta
linha, têm decidido nossos tribunais como, por exemplo, no REsp 140515-RS,
Relator o Ministro Barros Monteiro, com a seguinte ementa:
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“CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO. TAXA DE JUROS. SÚMULA Nº 596-STF. CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS. Cuidando-se de operações realizadas por instituição integrante do sistema financeiro nacional, não se aplicam as disposições do Decreto nº 22.626/33 quanto à taxa de juros. Súmula nº 596-STF. Somente nas hipóteses em que expressamente autorizada por leis especiais a capitalização mensal dos juros se mostra admissível. Nos demais casos é vedada, mesmo quando pactuada, não tendo sido revogado pela Lei nº 4.545/64 o art. 4º do Dec. nº 22.626/33. Dessa proibição não se acham excluídas as instituições financeiras. Precedentes do STJ. Recurso especial conhecido, em parte, e provido.”
No que tange à capitalização, é de ser admitida somente a
anual, incabível a mensal, em face do que dispõe o art. 4º do Decreto n.º
22.626/33 e Súmula n.º 121 do STF, a não ser que se queira aceitar o
anatocismo. A exceção é feita somente aos casos regulados por leis especiais,
relativamente às cédulas e nota de crédito rural, comercial e industrial que
admitem a capitalização semestral (Decreto-Lei 167/67, Decreto-Lei 413/69, Lei
n.º 6.313/75 e Lei n.º 6.840/80).
A propósito de capitalização, o STJ, ao apreciar o Recurso
Especial nº 154935 – RJ, Quarta Turma, de que foi relator o eminente Ministro
Sálvio de Figueiredo Teixeira, assim decidiu:
“DIREITOS COMERCIAL E ECONÔMICO. FINANCIAMENTO BANCÁRIO. CONTRATO DE CHEQUE ESPECIAL. JUROS. CAPITALIZAÇÃO MENSAL. IMPOSSIBILIDADE. ENUNCIADO DA SUM. 121/STF. INEXISTÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO LEGAL.
PRECEDENTES. RECURSO ACOLHIDO.
I - Somente nas hipóteses em que expressamente
autorizada por lei especifica, a capitalização de juros se mostra admissível, nos demais casos é vedada, mesmo quando pactuada, não tendo sido revogado pela Lei 4.595/64 o art. 4. do Decreto 22.626/33.
O anatocismo, repudiado pelo verbete da Sum. 121/STF, não guarda relação com o enunciado da Sum. 596/STF.
II - Na cobrança de divida oriunda de contrato de financiamento a particular, na modalidade cheque especial, impossível capitalizar mensalmente os juros.”
Em outra decisão, ao apreciar o Recurso Especial nº
456573-RS, Quarta Turma, de que foi relator o eminente Ministro Barros
Monteiro, o STJ proclamou:
“CONTRATOS BANCÁRIOS. TAXA DE JUROS. LIMITAÇÃO. SÚMULA N.º 596-STF. CAPITALIZAÇÃO. INADMISSIBILIDADE. MULTA. REDUÇÃO DE 10% PARA 2%. ART. 52, § 1º, DO CDC, COM A REDAÇÃO DA LEI Nº 9.298, DE 1.8.1996. INADMISSIBILIDADE NO CASO.
1. ...
2. ...
3. Somente nas hipóteses em que expressamente autorizada por leis especiais, a capitalização mensal dos juros se mostra admissível. Nos demais casos é vedada, mesmo quando pactuada, não tendo sido revogado pela Lei nº 4.595/64 o art. 4º do Decreto nº 22.626/33.
Dessa proibição não se acham excluídas as instituições financeiras .
4. ...
Recurso especial conhecido parcialmente e provido.”
Esse entendimento também encontrasse
sedimentado pelo egrégio TJRS, como se depreende da jurisprudência a seguir
colacionada:
29
“NEGÓCIO JURÍDICO BANCÁRIO. AÇÃO REVISIONAL. CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO EM CONTA CORRENTE E CORRELATOS. UNICIDADE DE RELACIONAMENTO NEGOCIAL. RENEGOCIAÇÃO. INCIDÊNCIA DO CDC NA ESPÉCIE. As negociações que envolvem o crédito bancário, por traduzirem relação de consumo, sujeitam-se a disciplina da Lei 8.078/90. REPACTUAÇÃO. UNICIDADE DA RELAÇÃO NEGOCIAL. POSSIBILIDADE DE REVISÃO. Identificada a continuidade e sucessividade negocial, possível a revisão dos pactos primitivos, no que concerne à conta corrente e renovações. Quanto aos demais pactos, limita-se a revisão ao enunciado na inicial. JUROS REMUNERATÓRIOS. Os juros remuneratórios, frente ao CDC, em período de economia estável, não podem ser superiores a 12% ao ano. Nas cédulas, há exigência de prova de autorização para pactuação superior. CAPITALIZAÇÃO. Inexistente respaldo legal específico, indevido e a capitalização dos juros em período inferior a um ano em se tratando de conta corrente, admitindo-se a mensal nas cédulas. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. Inviabilidade de cobrança por ofensa ao CDC e ao disposto no artigo 115, do CC. JUROS DE MORA. A Lei da Usura admite a elevação em até 1% sobre o máximo de 12%. Então, se pactuados os moratórios em 12% aa, possível a cobrança, que, no caso, por disposição contratual, não é cumulando os remuneratórios, e sim excluídos esses. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. Viável, na forma simples, consignando-se que, no caso, a sentença assegurou apenas compensação. APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA. (Apelação Cível nº 70005721287, Segunda Câmara Especial Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Des. Marilene Bonzanini Bernardi, julgado em 15/05/2003)”.
“APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. REVISIONAL. CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO EM CONTA-
CORRENTE. CÉDULAS DE CRÉDITO COMERCIAL. REVELIA. REVELIA. Ofertada a contestação observado prazo contido em nota expediente de intimação da juntada do mandado, vai afastada a revelia. Tratando-se de questões de direito, não alcançadas pelo decreto, ausente prejuízo. PRELIMINAR ACOLHIDA. CDC. Inaplicabilidade do CDC a relação celebrada com pessoa jurídica. REVISÃO DOS CONTRATOS EXTINTOS. Somente é possível a revisão dos contratos em aberto, no caso, o contrato de conta corrente e a nota comercial que embasa o feito executivo. Abertura de crédito em conta-corrente: taxa de juros remuneratórios. Configura-se abusiva a cláusula que estipula juros superiores a 12% ao ano, prevalecendo a limitação nesse patamar, forte no CDC. CAPITALIZAÇÃO - frente à natureza do contrato opera-se anualmente (Súmula 121 do STJ, art. 4º do Decreto nº 22.626/33 e precedentes do STJ). COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. Vedada a cobrança em qualquer hipótese. Cédulas de crédito comercial: taxa de juros remuneratórios ¿ Mesmo que se afastasse a incidência do CDC, a ausência de fixação dos juros pelo Conselho Monetário Nacional autorizaria a incidência da Lei da Usura, em conseqüência limitados a 12% ao ano. PRECEDENTES DO STJ. CAPITALIZAÇÃO MENSAL. Prevalece, no caso - Lei 6.840/80. Súmula nº 93 - STJ. AVAL - outorga uxória matéria não enfrentada na origem e, em conseqüência, aqui não conhecida. EXTINÇÃO DA EXECUÇÃO - renegociação de saldo devedor em conta corrente. CONTRATOS POSTERIORES, ORA REVISADOS. Objeto da execução tão-somente o último avençado CÉDULA DE CRÉDITO. Inviabilidade frente a ilíquidez. Execução nula. ACOLHERAM A PRELIMINAR. DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO APELO DO BANCO. VOTO VENCIDO EM PARTE. CONHECERAM EM PARTE O APELO DA DEMANDADA E, NESTA PARTE, NEGARAM PROVIMENTO. VOTO VENCIDO EM PARTE. (Apelação Cível nº 70003909975, Décima Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Des. Rosa Terezinha Silva Rodrigues, julgado em 31/10/2002)”.
31
“APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO REVISIONAL. EMBARGOS A EXECUÇÃO. CAUTELAR DE SUSTAÇÃO DE PROTESTO. CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO EM CONTA CORRENTE. CÉDULAS DE CREDITO COMERCIAL. DA POSSIBILIDADE DE REVISAR CONTRATAÇÕES BANCÁRIAS COM BASE NO CDC. CAPITALIZAÇÃO. A capitalização está restrita as hipóteses expressamente previstas em lei (DL.167/67, DL-413/69, Lei 6840). Manutenção da decisão que determinou a capitalização anual, em face da ausência de recurso especifico da contraparte. Atenção ao princípio da non reformatio in pejus. MULTA CONTRATUAL. Tendo os contratos sido firmados posteriormente a edição da Lei 9298, de 01.08.96, e de rigor sua redução. JUROS DE MORA. Tendo sido convencionados os juros de mora, obedecem ao pacto, nos termos do art-1062 do Código Civil. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. Mesmo que não cumulada a correção monetária, inadmissível a sua contratação "a taxa de mercado no dia do pagamento", porque sobre sua verificação somente uma das partes exerce influência. Incompatibilidade com a boa-fé e a eqüidade. Nulidade (art-51, IV, do CDC). INDEXADOR. TAXA REFERÊNCIAL. Tendo sido pactuada, incide como índice de correção monetária. Inscrição do nome do devedor em banco de dados de consumo. Pendente processo que tenha por objeto a definição da existência do débito e/ou seu montante, não cabe a inscrição de devedor junto ao SPC, SERASA, SCI e assemelhados. Não ofensa ao direito do credor. REVISÃO DE CONTRATOS JÁ QUITADOS. Possibilidade. RELAÇÃO JURÍDICA CONTINUATIVA. Ambas as apelações parcialmente providas. (28 fls) (Apelação Cível nº 70003288057, Décima Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Des. Guinther Spode, julgado em 20/08/2002)”.
h) DA COMISSÃO DE PERMANÊNCIA
A comissão de permanência se caracteriza, a teor do
disposto no inciso IX do artigo 4º da Lei nº 4595, como remuneração de
operação de serviços bancários e serviços financeiros. A remuneração da
operação se inclui nos juros reais e deve observar o limite estabelecido pelo
sistema jurídico. Interpretação diversa permitiria a co-existência de juros pré-
fixados e juros, o que, em essência, é a comissão, pós-fixados, em claro
anatocismo.
Conforme a Súmula nº 30 do egrégio Superior Tribunal de
Justiça, que diz, "verbis "A comissão de permanência e a correção monetária
são inacumuláveis". A duas, corresponde à alteração de taxa de encargos após
o vencimento das parcelas da dívida, não havendo autorização legal para tal.
Para essa hipótese, está prevista cláusula penal consistente na multa
contratual e juros de mora que, acumulados com a correção monetária,
correspondem à remuneração do banco e à atualização do valor devido.
Qualquer majoração dos encargos contratuais em razão do não pagamento no
vencimento, que se acresça ao pactuado, onde já está estabelecida a
duplicidade de cláusula penal, resta inadmissível e sem amparo legal.
Já se decidiu: “CONTRATO BANCÁRIO. COMISSÃO DE
PERMANÊNCIA. CUMULAÇÃO COM JUROS E MULTA.
INADMISSIBILIDADE. CLÁUSULA CONTRATUAL. REEXAME. SÚMULAS 05
E 07/STJ. Nos contratos celebrados por instituições financeiras, é vedada a
cobrança de comissão de permanência, cumulativamente com a multa
contratual e com os juros de mora. Agravo a que se nega provimento” (Agravo
no Agravo de Instrumento n° 387.585, Rel. Min. Castro Filho, 3ª Turma, STJ,
DJU 05.11.2001).
Também: “Civil e Processo Civil. Agravo de Instrumento.
Contrato de Abertura de Crédito. Comissão de permanência. É defesa a
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cumulação da comissão de permanência com os encargos de multa e de juros
moratórios.” (AGA 356894/SP e ADREsp 292984/RS, Relatora Min. Nancy
Andrighi, 3º Turma, STJ, j. 11.06.2001 e 18.06.2001).
Ainda: “COMERCIAL. CONTRATO DE ABERTURA DE
CRÉDITO. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. A existência de cláusula
permitindo a cobrança de comissão de permanência com suporte na Lei nº
4.595/64 c/c a Resolução nº. 1.129/86 – BACEN, não pode ser afastada para
adoção da correção monetária sob o simples enfoque de prejuízo para a parte
adversa. Todavia, a concomitante previsão contratual de multa por
inadimplência e juros, reconhecida pelo aresto a quo, exclui a comissão de
permanência, de acordo com as normas pertinentes à espécie”. (REsp.
267933/MS, rel. Min. Aldir Passarinho Júnior, 4ª Turma, STJ, j. em 22.03.2001).
Enfim: “COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. Se a pretexto de
incidência da denominada comissão de permanência, atrela-se a inadimplência
a percentual fixo (10% a. m.), não mais se está diante de efetiva comissão de
permanência, mas, sim, pura e simplesmente, juros moratórios. Percentual
elevadíssimo e que se pretende, no mais, aplicação capitalizada, modo mensal.
Abusividade e ilegalidade. Redução dos juros moratórios.”(AC 196152433,
relator Desembargador Armínio José Abreu Lima da Rosa, 6ª Câmara Cível,
TJRS, j. em 19.09.1996).
i) DA MORA
Dispõe o artigo 394 do Código Civil: "Considera-se em
mora o devedor que não efetuar o pagamento e o credor que o não quiser
recebê-lo no tempo, lugar e forma que a lei ou a convenção estabelecer.”
Ocorre a mora solvendi quando o devedor, por culpa sua,
não cumprir a prestação devida na forma, tempo e lugar estipulados. Já a mora
accipiendi consiste na injusta recusa do credor de aceitar o cumprimento da
obrigação devida na forma, tempo e lugar estabelecidos.
A cobrança de parcelas acessórias do débito revestidas
de abusividade configura a mora accipiendi, descaracterizando, por
conseguinte, a mora solvendi.
Ainda sob ponto de vista dos planos jurídicos, a só
existência de encargos negociais decorrente de cláusulas abusivas, a afastar a
eficácia jurídica de parte do valor devido, tornando ilíquida a prestação, não
pode caracterizar a mora debendi.
A existência de disposições negociais abusivas contrárias
às normas do Código de Defesa do Consumidor e ao princípio da boa-fé
objetiva demonstra a atuação do credor contrária a direito, a produzir a
invalidade jurídica das obrigações excessivas e a ineficácia das parcelas
acessórias, das quais decorrem sua inexigibilidade e inimputabilidade ao
devedor.
Nesse sentido o entendimento do TJRS:
APELAÇÃO CÍVEL. NEGÓCIOS JURÍDICOS BANCÁRIOS. CONTRATOS DE EMPRÉSTIMO EM CONTA-CORRENTE E RENEGOCIAÇÃO DE DÍVIDA. AÇÃO REVISIONAL. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE DE PARTE. O Banrisul é parte legítima passiva para a causa em que se discutem contratos da extinta Caixa Estadual, nos termos da Lei 10.959/97. Preliminar rejeitada. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, POSSIBILIDADE DE REVISÃO DO CONTRATO E DECLARAÇÃO ¿EX OFFICIO¿ DA NULIDADE DE CLÁUSULAS ABUSIVAS. O Código de Defesa do Consumidor é norma de ordem pública, que autoriza a revisão contratual e a declaração de nulidade de pleno direito de cláusulas contratuais abusivas, o que
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pode ser feito até mesmo de ofício pelo Poder Judiciário. NOVAÇÃO. Não estando presente o ânimo de novar, a alteração contratual apenas confirmou a anterior, o que não impede que seja revisada toda a contratualidade. JUROS REMUNERATÓRIOS. Sendo inadmissível a excessiva onerosidade do contrato, a cobrança de juros abusivos é nula, especialmente em período de estabilidade econômica. Juros reduzidos para 12% ao ano. Aplicação do art. 51, IV, do CDC. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. Em contrato de abertura de crédito em conta-corrente é possível capitalizar os juros anualmente. Todavia, em contrato de renegociação de dívida é proibida a capitalização. ENCARGOS MORATÓRIOS. - Comissão de Permanência. É vedada a cumulação de correção monetária com comissão de permanência. Súmula nº 30, do S.T.J. Também proibida a cobrança de comissão de permanência na exata interpretação dos artigos 115 do CC e 51, IV do CDC. - Juros de Mora. Reduzidos para 1% ao ano, nos termos do art. 5º do Decreto 22.626/33. Disposição de ofício. - Multa. Limitada em 2%, nos termos da Lei nº 9.298/96, a partir de 01.08.96, e calculada sobre o valor da prestação. - Inocorrência de Mora ¿Debendi¿. Em virtude da não configuração da mora do devedor, são inexigíveis os ônus a título de mora. Disposição de ofício. CORREÇÃO MONETÁRIA. O I.G.P.-M. é o índice que melhor recompõe as perdas ocasionadas pela inflação. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. Diante da excessiva onerosidade e abusividade do contrato, é cabível a repetição simples de indébito ainda que não haja prova de que os pagamentos a maior tenham sido ocasionados por erro. Disposição de ofício. Rejeitada a preliminar, negado provimento ao primeiro e ao segundo apelo, provido o terceiro apelo. (APELAÇÃO E REEXAME NECESSÁRIO Nº 70003096591, DÉCIMA QUARTA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: SEJALMO SEBASTIÃO DE PAULA NERY, JULGADO EM 28/08/2003).
j) DOS JUROS MORATÓRIOS
No tocante aos juros moratórios tem aplicação o disposto
no artigo 5º do Decreto nº 22626 que os limita em 1% ao ano, ponto
reiteradamente proclamado pelo egrégio TJRS. Com efeito, diz o referido
artigo: “Admite-se que pela mora dos juros contratados estes sejam elevados
de 1% (um por cento) e não mais”. Para os negócios de crédito rural, comercial
e industrial incide a norma do parágrafo único do artigo 5º do Decreto-Lei nº
167, de 14 de fevereiro de 1967.
Merece referência, ainda, lição de Pontes de Miranda,
que, ao tratar do assunto in “Tratado de Direito Privado", 3ª. ed., Ed. Borsoi,
Rio de Janeiro, 1971, p. 50, ensina:
“Diz o art. 5º. do Decreto nº. 22.626, de 7 de abril de 1933: ‘Admite-se que, pela mora dos juros contratados, estes sejam elevados de 1% e não mais’.“Cumpre que se distingam, preliminarmente, (a) as cláusulas de juros de juros, em caso de mora, e (b) a cláusula de elevação dos juros , em caso de mora: ali, estabelece-se taxa para que dos juros não pagos fluam juros; aqui, dispõe-se que, incorrendo em mora o devedor, a taxa dos juros seja elevada. As duas cláusulas (a) e (b), não se confundem com (c) as cláusulas penais por mora do capital e (d) por mora dos juros.“As cláusulas de juros de juros, em caso de mora, são as que prevêem que se não paguem os juros e estipulam que corram juros de tais juros, enquanto não se purga a mora. As cláusulas de elevação de juros, em caso de mora, são cláusulas com que o credor se precata contra a duração da mora, mas, aí, os juros a mais se não têm como juros moratórios, devido ao conteúdo mesmo da cláusula (juros x, ou, se ocorre m, juros y). A alusão, aí, é feita à mora, porém poderia ser a qualquer outro fato que servisse de elemento diferenciador, no tempo das taxas estipuladas. A construção jurídica tanto pode ser: "juros y, mas, enquanto não se der mora, juros x", como "juros x, mas, se ocorrer mora, juros y". Daí a necessidade de x e
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y não excederem as taxas máximas das leis contra a usura. Na técnica legislativa, o legislador pode determinar a) que os juros y não podem exceder a taxa legal, - ou b) admitir que, em caso de mora, se elevem os juros x até y, sendo y abaixo da taxa máxima das leis de usura ou c) acima da taxa máxima das leis de usura. O Decreto nº. 22.626, de 7 de abril de 1933, art. 1º., permitiu taxas até 12%, isto é, até o dobro da taxa legal (Código Civil, art. 1.062) e - tendo de solver o problema de técnica legislativa a que aludimos - elegeu o critério c), isto é, y pode ser maior do que 12%. Porque: até 12% os juros são estipuláveis; em caso de mora, os juros estipulados (Decreto nº. 22.626, art. 5º., verbo "contratados") podem ser elevados de 1%, "e não mais". Portanto: x pode ser, no máximo, 12%; y, 12% + 1% = 13%.”
Nesta linha, o egrégio TJRS e o Superior Tribunal de
Justiça já decidiu, em precedente assim ementado:
CONTRATO DE ABERTURA DE CRÉDITO EM CONTA CORRENTE ¿ SUPER CONTA BANRISUL. AÇÃO DE COBRANÇA COM PRETENSÃO REVISIONAL DEDUZIDA EM CONTESTAÇÃO (EXCEÇÃO SUBSTANCIAL). PRELIMINARES CONTRA-RECURSAIS AO RECURSO ADESIVO. 1) AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. Descabe a alegação de falta de interesse recursal no tocante à multa contratual e à cumulação de correção monetária com comissão de permanência, ausente sua incidência, porquanto, embora na planilha de cálculo apresentada não conste a cobrança de multa e da comissão de permanência, resta demonstrada a pactuação de incidência dos referidos encargos, inclusive a multa, de modo a tornar possível a análise do pleito recursal. Prefacial rejeitada. 2) INOVAÇÃO RECURSAL. Não prospera a alegação de inovação recursal quanto ao pedido de redução da multa a 2%, pois, ao contrário do que afirma a instituição financeira em suas contra-razões, os recorrentes adesivos referiram, na peça contestatória, pedido incidental de revisão da cláusula relativa à redução desta multa contratual fixada no contrato em 10%. CÓDIGO DE DEFESA
DO CONSUMIDOR. ALTERAÇÃO NEGOCIAL POR APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ OBJETIVA. ÔNUS DA PROVA. INVALIDADE DAS CLÁUSULAS NEGOCIAIS QUE FIXARAM PARCELAS ACESSÓRIAS DO DÉBITO ABUSIVAS. Os negócios jurídicos bancários realizados merecem alteração judicial se inobservada a boa-fé objetiva que deflui do sistema jurídico, relativamente às cláusulas abusivas (inválidas) que estabeleceram as parcelas acessórias. Manifesta a ilegalidade parcial das cláusulas que fixaram parcelas acessórias abusivas, devem ser reconhecidas suas invalidades, das quais decorre a ineficácia do direito da entidade bancária/financeira. RECONHECIMENTO DE OFÍCIO. Tratando-se de nulidade de pleno direito, diante do que dispõem as normas do Código de Defesa do Consumidor, impõe-se o reconhecimento pelo juiz, independentemente de alegação das partes, como preceitua o parágrafo único do artigo 146 do Código Civil, afastando-se, de ofício, a abusividade da cláusula. Precedentes do STJ. JUROS REMUNERATÓRIOS. Reduzidos a 12% ao ano. CAPITALIZAÇÃO. Vedada a capitalização mensal, admitida a anual no contrato de crédito rotativo na conta-corrente, pela aplicação do artigo 4º do Decreto nº 22626/33. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. Descabimento. CORREÇÃO MONETÁRIA. Adoção do IGP-M como índice de atualização monetária durante todo o contrato, diante da redução dos juros remuneratórios, vedação da capitalização e da comissão de permanência, evitando o enriquecimento sem causa dos demandados. Após a liquidação do contrato, cabível a incidência apenas da referida correção monetária pelo IGP-M (e não pela TR como aplicado pelo banco). Disposições de ofício. MORA. Pela cobrança de parcelas acessórias abusivas, descaracterizada a mora solvendi. ENCARGOS MORATÓRIOS. Descaracterizada a existência de mora solvendi, descabe a cobrança dos encargos dela decorrentes, como multa e juros moratórios. Quando houver mora solvendi, deve ser reduzida a multa contratual a 2% sobre as parcelas efetivamente inadimplidas, pela aplicação do Código de Defesa do Consumidor, e, após o
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vencimento do contrato, deve haver a incidência de juros moratórios de 1% ao ano, no caso de ocorrência da mora. EFEITO RESTITUTÓRIO. Redefinidos os critérios de cálculo das parcelas acessórias, a restituição dos valores eventualmente pagos a maior é efeito decorrente da decisão. COMPENSAÇÃO. Pela aplicação do princípio da restituição integral, cabe, na hipótese, a compensação, a ser efetivada entre as parcelas prestadas ineficazmente pelo consumidor e o eventual débito pendente em razão dos negócios jurídicos celebrados com o fornecedor. AÇÃO DE COBRANÇA. Acolhida a pretensão revisional, a ação de cobrança procede em parte, relativamente ao saldo devedor apurado em liquidação de sentença, após recálculo dos valores devidos, conforme determinado nesta decisão. Apelo desprovido e, afastadas as prefaciais contra-recursais, recurso adesivo provido, com disposições de ofício. (APELAÇÃO CÍVEL Nº 70005628037, DÉCIMA QUARTA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: JOÃO ARMANDO BEZERRA CAMPOS, JULGADO EM 25/09/2003)
l) DO EFEITO RESTITUTÓRIO
No conceito de Clóvis (apud Maria Helena Diniz em Curso
de Direito Civil, 2º volume, Editora Saraiva, 6ª edição aumentada e atualizada,
São Paulo, 1991, pág. 194): "pagamento indevido é o feito, espontaneamente,
por erro, como o efetuado pelo 'solvens', convencido de que deve pagar, ou o
levado a efeito por quem não é devedor, mas pensa sê-lo, ou a quem se supõe
credor".
O pagamento indevido é uma das formas de
enriquecimento sem causa. O enriquecimento ilícito ocorre sempre que uma
pessoa tiver uma vantagem de cunho econômico à causa de outrem, com
diminuição patrimonial deste, ausente fato jurígeno. A ação de in rem verso
objetiva reequilibrar o dois patrimônios, alterados sem justa causa, com
restituição da situação econômica anterior, por compensação.
São requisitos da ação de in rem verso o enriquecimento
de uma parte, o empobrecimento da outra correlativo, a ausência de causa
jurídica, a inexistência de interesse pessoal do empobrecido. Tem, finalmente,
um caráter subsidiário, isto é, cabe a pretensão de restituição somente na
inexistência de qualquer outra ação no sistema jurídico, evitando, assim, que
se torne uma espécie de action passe partout.
Entre as espécies de enriquecimento sem causa está o
pagamento indevido, definido por Serpa Lopes como "o pagamento efetuado
com a intenção de cumprir ('animo solvendi') uma obrigação inexistente
('indebitum'), em conseqüência de erro".
A natureza do erro, requisito essencial do pagamento
indevido, caracteriza suas espécies: objetivo, quando o erro incide sobre o
objeto da prestação, ou subjetivo, na hipótese de erronia do autor ou quanto a
quem recebe o pagamento.
Os requisitos para caracterização do pagamento indevido
são o enriquecimento patrimonial do accipiens pela lesão do solvens com
relação de imediatividade, a existência do erro, e a ausência de causa jurídica.
Logo, na inexistência de comprovação de prestação por erro, descabe a
pretensão de repetição.
Diz o artigo 182 do Código Civil:
“Anulado o negócio jurídico, restituir-se-ão as partes ao estado em que antes dele se achavam, e, não sendo possível restituí-las, serão indenizadas com o
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equivalente.”
Trata a disposição sobre o denominado efeito restitutório.
Sobre ele preleciona Pontes de Miranda (Tratado de Direito Privado, tomo IV,
4ª edição, Editora Revista dos Tribunais, São Paulo, 1983): “O Código Civil
Brasileiro, tem o mérito de se não referir à retroatividade, nem lembrar a ‘in
integrum restitutio’. De um lado e do outro, restabelece-se a anterior estado de
coisas, isto é, o estado em que se achavam os bens da vida, num e noutro
patrimônio. Não se leva em conta qualquer efeito do contrato ou negócio
jurídico unilateral anulado (e.g. a denúncia de locação, em cláusula contratual,
a remissão de dívida, ou reconhecimento de direito do outro contratante, ou de
terceiro), salvo se só houve anulação parcial que não atingiu o elemento a que
o efeito corresponde. Voltam os créditos cedidos; voltam à eficácia as dívidas
remitidas; as quantias pagas são restituídas. E tudo se passa como se não
tivesse havido cessão de crédito, remissão de dívida, ou pagamento.”
Assim, em razão da eficácia constitutiva da sentença
invalidatória, as parcelas ineficazes prestadas, anuladas as disposições
negociais abusivas e ilegais (ausente dolo do fornecedor), devem ser
restituídas, modo simples, atualizadas desde a prestação pelo critério
negocialmente estabelecido para pagamento, acrescidas de juros a partir da
citação na demanda revisional.
m) DA COMPENSAÇÃO
A redução do débito decorrerá da revisão judicial,
ensejando a compensação do saldo devedor apurado com o que foi pago a
maior, haja vista o princípio do enriquecimento sem causa.
Nesse sentido:
“A PRETENSÃO DE DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS A MAIOR, EM VIRTUDE DO EXPURGO DE PARCELAS JUDICIALMENTE DECLARADAS ILEGAIS, É CABÍVEL EM VIRTUDE DO PRINCÍPIO QUE VEDA O ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA, PRESCINDINDO DE DISCUSSÃO A RESPEITO DE ERRO NO PAGAMENTO.” (RESP. 200.267/RS, 4ª TURMA, REL. MIN. SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, 03/10/2000).
Maria Helena Diniz (Curso de Direito Civil Brasileiro, 2º
volume, Editora Saraiva, 6ª edição, São Paulo, pág. 258) define compensação
como "um meio especial de extinção de obrigações, até onde se equivalem,
entre pessoas que são, ao mesmo tempo, devedoras e credoras uma da
outra".
Assim, dispõe o artigo 368 do Código Civil: "Se duas
pessoas forem ao mesmo tempo credor e devedor uma da outra, as duas
obrigações extinguem-se, até onde se compensarem".
A origem do instituto é romana, fundando-se em princípio
de eqüidade. No período clássico, a compensatio era efeito de uma convenção
entre as parte que extinguia a obrigação pela renúncia às respectivas ações.
No período Justineo, passou a ser forma de extinção da obrigação
independentemente da vontade das partes, mas foi o próprio Justiniano que lhe
atribuiu eficácia de pleno direito. Compensationes ex omnibus ipso fieri
sansimus, nulla differentia in rem, vel personalibus actionibus inter se
observanda. Este conceito não foi alterado em seu conteúdo, passando a
doutrina moderna a distinguir três espécies de compensação: a legal, a
convencional e a judicial.
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Os requisitos do instituto decorrem da própria definição
legal: a. obrigações principais recíprocas; b. o objeto das prestações deve ser
bem fungível, de mesma espécie e qualidade; c. as prestações devem estar
vencidas, sendo líquidas e exigíveis; d. não pode existir direitos de terceiros
sobre as prestações; e e. possibilidade jurídica.
Também pela aplicação do princípio da restituição
integral, cabe, na hipótese, a compensação, a ser efetivada entre as parcelas
prestadas ineficazmente pelo consumidor e o eventual débito pendente em
razão dos negócios jurídicos celebrados com o fornecedor. Estão preenchidos
os requisitos do instituto, pois os objetos das prestações recíprocas têm igual
natureza, decorrendo a compensação de causa legal, evitando-se o
enriquecimento sem causa do fornecedor que recebeu indevidamente quantias
decorrentes de cláusulas inválidas.
III - DOS PEDIDOS
Em face ao exposto e por tudo o mais que destes
autos vierem à constar, REQUER:
1. O benefício da gratuidade da justiça, eis que
não tem condições de arcar com as custas processuais sem prejuízo de
seu sustento e da família (em anexo declaração, e documentos que
comprovam a renda e gastos DOCS 03-05);
2. A antecipação parcial dos efeitos da tutela
jurisdicional, com fulcro permissivo no art. 273, CPC, para o fim de:
a) obter autorização para o depósito judicial das parcelas de forma
revisionada;
b) seja vedada a circulação ou protesto de títulos de crédito vinculados
aos contratos revisionados por parte do BANCO CICLANO.;
c) seja determinada a sustação de providências do credor visando
cobrança dos débitos revisados em conta corrente ou folha de
pagamento do autor;
d) seja vedada a inscrição do autor em cadastro de devedores
(SERASA, CADIN, SPC) e designada a retirada do seu nome dos
órgãos de proteção de crédito se assim o BANCO CICLANO já o fez,
por obrigações originadas dos contratos revisionados enquanto
pendente a lide revisional (para a hipótese de descumprimento, que
seja estipulada uma multa diária, sem prejuízo das sanções penais
correspondentes - CP, Art.330).
3. Em sendo deferidos os pedidos supras, que seja
intimada a parte adversa para cumprir a ordem judicial e, no mesmo mandado,
que seja citada, para, querendo, ofertar o contraditório (ou levantar as quantias
à serem depositadas) no prazo legal, sob pena de revelia e confissão;
4. Nos termos do art. 6° do CDC, que seja invertido o
ônus da prova, em favor do consumidor;
a) deferida a inversão do ônus da prova, que apresente a
parte adversa ainda no prazo de contestação os contratos de abertura de
créditos objeto da lide, planilhas que demonstrem os descontos efetuados em
folha de pagamento e conta corrente do autor, e progresso dos débitos.
5. No mérito, que seja julgada procedente a presente
ação, em todos os seus termos, para o fim de:
a) confirmar a tutela antecipada eventualmente concedida;
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b) declarar a existência de "atos ilícitos contratuais” (encargos);
c) declarar a existência de "lesão enorme";
d) declarar a existência da prática de "usura e anatocismo",
oficiando-se, após, ao Ministério Público, para as providências
cabíveis;
e) declarar a prática de "abuso de poder econômico";
f) declarar que a regra do parágrafo terceiro do art. 192, CF, é
auto-aplicável;
g) declarar que o Conselho Monetário Nacional não possui
legitimidade para legislar ou regulamentar sobre matéria
inerente aos juros e questões financeiras;
h) declarar que a Súmula 596 do Supremo Tribunal Federal não
revogou, nem poderia revogar, a regra da Lei de Usura e é,
portanto, inaplicável à presente hipótese;
i) assim, declarar que "a mora é do credor" (C.Civil, 394);
j) ser efetuada uma revisão judicial do contrato, restabelecendo-
se, assim, o seu equilíbrio e a sua comutatividade, acolhida a
nova concepção social do contrato e a defesa do consumidor
(CF/88, art. 5º, XXXII, c/c art. 170, V) em que é possível o
expurgo do excesso de juros remuneratórios, haja vista as
condições que configuram a abusividade e a lesividade do
contrato, consoante o disposto no art. 51, IV, do Código de
Defesa do Consumidor;
k) julgar procedente a pretensão consignatória, em todos os
seus termos;
l) decretar a nulidade das cláusulas contratuais abusivas, que
impõe-se o reconhecimento pelo juiz, independentemente de
alegação das partes, como preceitua o parágrafo único do
artigo 168 do Código Civil, afastando-se, de ofício, a
abusividade da cláusula;
m) fixar os juros remuneratórios no limite de 12% (doze por
cento) ao ano.
n) fixar os juros moratórios no limite de 1% (um por cento) ao
ano.
o) vedar a capitalização mensal de juros;
p) vedar a incidência de comissão de permanência cumulada
com correção monetária;
q) limitar eventual incidência de multa ao percentual de dois
pontos, à incidir sobre eventual saldo devedor, atualizado;
r) efetuar a correção monetária pelo indexador IGPM-FGV;
s) efetuar o expurgo dos valores eventualmente adimplidos
consoante os parâmetros ilegais antes estipulados pela parte
adversa;
t) constituir eventual saldo credor/devedor do autor em relação
ao requerido, promovendo-se, assim, um acertamento da
relação crédito/débito;
u) na hipótese de virem a ser julgados procedentes quaisquer
ítens dos supra-elencados e revisado o contrato e o débito,
desde o seu nascedouro, em qualquer ponto, que sejam os
valores pagos anteriormente contabilizados e aplicados ao
suposto débito, se é que existente, como amortização;
v) na hipótese de verificação de cobrança em excesso, e ou
mesmo existência de saldo credor, que seja aplicada a regra
do art. 940, do Código Civil, combinada com a mesma regra
do Código de Defesa do Consumidor (art.42), devendo, pois, a
parte adversa vir a ser condenada à pagar em dobro o que
cobrou indevidamente, para a indenização dos danos
patrimoniais diretos;
w) na eventualidade de virem a ser indeferidas, por despacho
interlocutório, quaisquer medidas incidentais, incluindo-se aí a
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liminar, bem como na hipótese de julgamento, por sentença,
no mérito, de improcedência da ação, ou de decisão
terminativa, o que não acredita o autor seja possível
juridicamente, ad cautelam, requer sejam pré-questionadas
todas as normas constitucionais e infra-constitucionais
porventura abordadas e ou ventiladas no presente
procedimento, objetivando dar cumprimento de uma
formalidade ensejadora do positivo Juízo de Admissibilidade
de Recursos Especial (STJ) e Extraordinário (STF);
6. A condenação do Réu no pagamento das custas
e honorários advocatícios no valor de 20% da ação;
Dá à causa, para os efeitos fiscais, o valor de
alçada 765,50 (setecentos e sessenta e cinco reais e cinqüenta
centavos) e protesta pela produção de todos os meios de provas em
direito admissíveis.
NESTES TERMOS,
PEDE DEFERIMENTO.