DIREITOS HUMANOS PARA ASOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
Cees J. Hamelink
RESUMOO artigo propõe explorar como “os desenvolvimentos informativos”
interagem com as sociedades em que ocorrem. Esses desenvolvimentos
referem-se ao significado crescente dos produtos da informação (tais
como notícias, propaganda, entretenimento e dados científicos) e de
serviços de informação (tais como aqueles fornecidos pelo World WideWeb); os volumes crescentes da informação gerados, coletados, arma-
zenados e disponibilizados; o papel essencial da tecnologia de infor-
mação como a espinha dorsal de muitos serviços sociais e como o motor
da produtividade econômica moderna.
Propõe ainda uma tipologia dos desenvolvimentos informacionais como
interações com sociedades e questiona as formas em que os padrões
internacionais de Direitos Humanos são pertinentes a essas interações.
Aponta para a necessidade do estabelecimento dos Direitos à Co-
municação como protagonista e fundamento essencial de qualquer
sistema democrático.
INTRODUÇÃOSociedade da Informação é um conceito ambíguo, ainda sem significado
preciso ou definição estabelecida. Apesar dos argumentos sobre suas
fraquezas, esse conceito se tornou parte do discurso político, econômico e
cultural em nível internacional.
Pode-se questionar se em algum lugar do mundo atual existe uma
Sociedade da Informação. Talvez seja mais apropriado dizer que algumas
HAMELINK, C. J. Direitos Humanos para a Sociedade da Informação. In MARQUES
DE MELO, J.; SATHLER, L. Direitos à Comunicação na Sociedade da Informação. São
Bernardo do Campo, SP: Umesp, 2005.
DIREITOS À COMUNICAÇÃO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
104
sociedades são confrontadas com “desenvolvimentos informacionais”. Essa
noção se refere à crescente importância dos produtos de informação (tais
como notícias, publicidade, entretenimento e dados científicos) e serviços de
informação (como os oferecidos pela World Wide Web); os crescentes volumes
de informação gerada, coletada, armazenada e disponibilizada; o papel
essencial da tecnologia da informação como espinha dorsal de muitos
serviços sociais e como motor da produtividade econômica e a entrada do
processamento de informação nas transações comerciais e financeiras. O
confronto social com os desenvolvimentos informacionais ocorre de
diversificadas formas, em diferentes níveis, com variadas velocidades e em
contextos históricos específicos. As sociedades concebem suas respostas a
esses desenvolvimentos por meio de políticas, planos e programas, seja com
iniciativas centralizadas ou com atividades descentralizadas, nos níveis
nacional e local. Muitas dessas iniciativas são motivadas por razões econô-
micas mostram-se fortemente tecnocêntricas. Os atores envolvidos são tanto
instituições públicas como organizações privadas, atua-se, cada vez mais, na
forma de parcerias público-privadas. As sociedades podem responder aos
desenvolvimentos informacionais com o estabelecimento de leis ou com
modelos de auto-regulação.
Este capítulo propõe uma tipologia dos desenvolvimentos
informacionais como interações com sociedades e questiona as formas em
que os padrões internacionais de Direitos Humanos são pertinentes a essas
interações.
POR QUE DIREITOS HUMANOS?A decisão de analisar aquilo que o campo dos Direitos Humanos
internacionais pode oferecer à discussão dos desenvolvimentos infor-
macionais é, obviamente, uma opção normativa. Esses desenvolvimentos
também podem ser abordados pelo ângulo dos acordos internacionais de
comércio ou pelas convenções técnicas de padronização. Este capítulo é
inspirado pela noção de que os desenvolvimentos informacionais afetam as
pessoas em múltiplos níveis, sendo moldados e governados por iniciativas
humanas. As futuras sociedades da informação serão as configurações
sociopolíticas nas quais os indivíduos e os grupos sociais conduzirão suas
vidas, trabalharão, amarão, jogarão, desfrutarão e sofrerão. Desta forma, é
uma opção legítima de abordagem, de olhar para o futuro e tentar construir
algo novo de forma a atender melhor aos interesses do povo.
DIREITOS HUMANOS PARA A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
105
Uma definição do interesse popular é uma tarefa complexa, porque não
pode ser expressa de uma forma singular, nem um fórum claramente
identificável. Por isso, o interesse popular precisa ser inferido a partir de um
conjunto de padrões, claramente identificável e sobre o qual haja comum
acordo. Isso parece quase impossível, dado que, num mundo multicultural,
com sociedades multiestratificadas, as pessoas terão interesses distintos e
farão escolhas normativas diferentes. Contudo, apesar das tentações de um
relativismo normativo e a justificada suspeita de julgamentos de valor
unitários, é possível inferir o interesse popular dos padrões universalmente
aceitos. Esses padrões são dados pelos Direitos Humanos internacionais. Os
Direitos Humanos formam, atualmente, o único conjunto universalmente
disponível de padrões para a dignidade e a integridade de todos os seres
humanos. É no interesse de todas as pessoas que eles são respeitados. As
disposições das leis de Direitos Humanos internacionais representam os
interesses de homens, mulheres e crianças, cidadãos comuns, seja como
indivíduos, ou como grupos e comunidades.
Existe, no presente, consenso político internacional sobre Direitos
Humanos. A comunidade política global tem reconhecido a existência dos
Direitos Humanos, sua universalidade e indivisibilidade, e tem aceito a
concepção de formas para o seu contínuo reforço. Em 1993, a Conferência de
Viena sobre Direitos Humanos reforçou a natureza universal dos padrões dos
Direitos Humanos. Isso significa que as leis internacionais de Direitos
Humanos representam, ainda que ineficazmente, um conjunto universalmente
aceito de reivindicações morais. Desta forma, temos um guia normativo
legítimo para as respostas das sociedades aos desenvolvimentos informacionais.
INTERAÇÕES ENTRE SOCIEDADES EDESENVOLVIMENTOS INFORMACIONAIS
As sociedades e os desenvolvimentos informacionais interagem de
muitas formas. Essas interações podem ser diferenciadas por quatro
dimensões, citadas a seguir.
Dimensão tecnológica da interação. A tecnologia objetivamente desempenha
papel essencial nos desenvolvimentos informacionais. O escopo, volume e
impacto desses desenvolvimentos são, em larga medida, moldados pelas
inovações tecnológicas e as oportunidades que elas criam. A interação é um
processo no qual as forças sociais e os interesses também contribuem para
DIREITOS À COMUNICAÇÃO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
106
moldar as inovações tecnológicas. Nessa dimensão, são colocadas questões
sobre o controle e o acesso à tecnologia e a determinação de quem se beneficia
dela, bem como os riscos sociais embutidos nas inovações e suas aplicações.
Dimensão cultural da interação. As formas das sociedades lidarem com a
provisão e o processamento de informação são determinadas por perspectivas
culturais. Conteúdos informacionais são produtos culturais. A informação é
parte de uma produção cultural da sociedade. Entre as questões importantes
dessa dimensão está o compartilhamento do conhecimento e a proteção da
identidade cultural.
Dimensão sociopolítica da interação. Informação e tecnologia de informação
têm impacto no desenvolvimento, no progresso e no sistema político das
sociedades. Entre as questões importantes relativas a essa dimensão, temos
a liberdade de opinião e de discurso político, a proteção contra os discursos
abusivos e as necessidades informacionais das sociedades.
Dimensão econômica da interação. Surgiram mercados globais de informação.
Os interesses econômicos estão de sobreaviso no tocante à proteção da
propriedade do conteúdo. Há questões de Responsabilidade Social Empresarial1
e de auto-determinação das nações no desenvolvimento econômico.
DIMENSÕES E DISPOSIÇÕES DE DIREITOS HUMANOSQuais disposições de Direitos Humanos internacionais são relevantes
para essas quatro dimensões? Ou, em outras palavras, como deveria ser um
modelo normativo que estabelecesse padrões para as formas pelas quais as
sociedades devessem responder aos desenvolvimentos informacionais?
Cada uma das quatro dimensões é considerada nas próximas páginas,
com descrição detalhada das disposições relevantes existentes sobre elas nos
vários acordos internacionais. No final de cada seção, são listados os
instrumentos considerados relevantes.
1. Nota dos organizadores (N.O.) Corporate Social Responsibility (CSR), compreendida aqui não
como filantropia empresarial ou marketing relacionado a causas, mas sim como uma das “funçõesorganizacionais inerentes, no fluxo das relações e interações que se estabelecem entre sistemas empresariaisespecíficos e o sistema social mais amplo” (ver FISCHER, Rosa Maria. O desafio da colaboração:práticas de responsabilidade social entre empresas e terceiro setor. São Paulo: Editora Gente, 2002).
Trata de como a responsabilidade das empresas vai para muito além do lucro, visão
indispensável para o bem-estar da Sociedade.
DIREITOS HUMANOS PARA A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
107
Sobre tecnologia e Direitos Humanos
Compartilhando os benefícios do desenvolvimentoda tecnologia
O direito de acesso à tecnologia é disposto no artigo 27.1 da Declaração
Universal dos Direitos Humanos (DUDH), onde se afirma que “todos têm
o direito de ... partilhar do avanço científico e de seus benefícios”. Este
direito é inspirado pelo princípio moral básico da eqüidade e pela noção de
que ciência e tecnologia pertencem à herança comum da humanidade.
Até 1968 não havia debate sério na comunidade internacional sobre a
relação direta entre o desenvolvimento científico e tecnológico e a proteção
dos Direitos Humanos. A seguinte declaração foi adotada na Conferência
Internacional de Teerã, sobre Direitos Humanos, em 1968:
Embora as descobertas científicas recentes e os avanços tecnológicos
tenham aberto vastas perspectivas para o processo econômico, social e
cultural, esses desenvolvimentos podem, todavia, colocar em risco os direitos
e liberdades dos indivíduos e vão exigir contínua atenção (UN, 1968).
A Conferência recomendou, na Resolução XI, “que as organizações da
família da ONU devem assumir um estudo sobre os problemas relativos aos
Direitos Humanos advindos dos desenvolvimentos na ciência e tecnologia”.
A Assembléia Geral da ONU aprovou essa recomendação e pediu à Secre-
taria Geral (Resolução 2450, 19/12/1968) para focar este estudo
particularmente em:
• respeito à privacidade dos indivíduos e à integridade e soberania das
nações, à luz dos avanços das tecnologias, particularmente as de arma-
zenamento de dados;
• proteção da personalidade humana e sua integridade física e intelectual,
à luz dos avanços na biologia, medicina e bioquímica;
• usos de aparelhos eletrônicos que possam afetar os direitos das
pessoas e os limites que devem ser colocados a esses usos em uma sociedade
democrática e
• de uma forma mais geral, o equilíbrio que deve ser estabelecido entre
o progresso científico e tecnológico e o avanço intelectual, espiritual, cultural
e moral da humanidade.
DIREITOS À COMUNICAÇÃO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
108
Em 11 de dezembro de 1969, a Assembléia Geral da ONU adotou a
Declaração sobre o Progresso Social e o Desenvolvimento. Em seu artigo 13,
esta Declaração dispõe sobre:
• o compartilhamento eqüitativo dos avanços científicos e tecnológicos
entre os países desenvolvidos e os em desenvolvimento, e um crescimento
balanceado no uso da ciência e tecnologia, em benefício do desen-
volvimento social;
• o estabelecimento de um equilíbrio harmônico entre o progresso
científico, tecnológico e material e o avanço intelectual, espiritual, cultural e
moral da humanidade; e;
• a proteção e a melhoria do meio-ambiente.
Com base no estudo que a Assembléia Geral havia pedido em 1968, e
também em vários relatórios relacionados ao tema, a Comissão de Direitos
Humanos deu considerável atenção ao tema em sua 27ª sessão, em 1971,
tendo destacado, particularmente:
• a proteção dos Direitos Humanos nos campos econômico, social e
cultural, de acordo com a estrutura e os recursos dos estados e o nível
científico e tecnológico que eles alcançaram, bem como a proteção do direito
ao trabalho, nas condições de automação e mecanização da produção;
• o uso dos desenvolvimentos científicos e tecnológicos para ampliar o
respeito pelos Direitos Humanos e legitimar interesses de outras pessoas e
o respeito a padrões morais e de legislação internacional mais genericamente
reconhecidos; e,
• a prevenção de que as conquistas da ciência e tecnologia sejam usadas
para restringir direitos e liberdades democráticas fundamentais.
Nos anos de 1971 a 1976 uma série de relatórios foram produzidos,
lidando com os problemas de proteção à privacidade, uso de satélites de
observação, processos de automação, procedimentos de diagnose pré-natal,
introdução de químicos na produção de alimentos, deterioração do meio-
ambiente e o poder destrutivo dos modernos sistemas de armamentos.
Na Resolução 3026 (18/12/1972), a Assembléia Geral da ONU pediu à
Comissão de Direitos Humanos que analisasse a possibilidade de elaboração
de um instrumento legal internacional para tratar da questão do fortalecimento
dos Direitos Humanos à luz dos desenvolvimentos científicos e tecnológicos.
Em 1973, a Assembléia Geral (Resolução 3150) conclamou os estados a
ampliar a cooperação internacional para assegurar que os desenvolvimentos
DIREITOS HUMANOS PARA A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
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científicos e tecnológicos fossem utilizados para fortalecer a paz, a segurança,
a realização do direito dos povos à auto-determinação, o respeito à soberania
nacional e o propósito do desenvolvimento econômico e social. Solicitou-se à
Secretaria Geral a elaboração de um relatório sobre esses assuntos. O relatório,
apresentado em 1975, tratou dos efeitos nocivos da automação e da meca-
nização sobre o direito ao trabalho, os efeitos nocivos dos desenvolvimentos
científicos e tecnológicos sobre o direito à alimentação adequada, e os
problemas de um tratamento eqüitativo em relação aos impactos dos desen-
volvimentos científicos e tecnológicos no direito à saúde. O relatório também
analisou a deterioração do meio-ambiente, o problema da explosão popula-
cional e o problema especial do impacto da radiação atômica na saúde pública.
Então, em 10/11/1975, a Assembléia Geral resolveu adotar a Declaração sobre
o Uso do Progresso Científico e Tecnológico no Interesse da Paz e para o
Benefício da Humanidade (Resolução 3384).
Os princípios-chave desta declaração são:
• cooperação internacional para assegurar que os resultados dos
desenvolvimentos científicos e tecnológicos sejam usados para fortalecer a
paz e a segurança internacional, para promover o desenvolvimento eco-
nômico e social e para realizar os Direitos Humanos e liberdades;
• medidas para assegurar que os desenvolvimentos científicos e
tecnológicos satisfaçam as necessidades materiais e espirituais de todas
as pessoas;
• um compromisso dos estados para impedir o uso dos desenvol-
vimentos científicos e tecnológicos para violar a soberania e a integridadeterritorial de outros estados, de interferir em seus assuntos internos, para
empreender guerras, para suprimir movimentos de liberação ou para exercer
políticas de discriminação racial;
• cooperação internacional para fortalecer e desenvolver a capacidade
científica e tecnológica dos países em desenvolvimento;
• medidas para estender os benefícios dos desenvolvimentos científicos
e tecnológicos para todas as camadas da população e para proteger as
camadas de menor renda dos possíveis efeitos nocivos;
• medidas para assegurar que o uso da ciência e tecnologia promova a
realização dos Direitos Humanos;
• medidas para prevenir o uso dos desenvolvimentos científicos e
tecnológicos em detrimento dos Direitos Humanos; e,
DIREITOS À COMUNICAÇÃO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
110
• ações para assegurar que as legislações nacionais sejam compatíveis
com a necessidade de garantir os Direitos Humanos num ambiente de
desenvolvimento científico e tecnológico.
Em setembro de 1975, especialistas reunidos em Genebra recomen-
daram o estabelecimento de um mecanismo internacional para abordar as
novas tecnologias do ponto de vista dos Direitos Humanos. Esta forma de
compreensão da tecnologia incluiria a avaliação dos seus possíveis efeitos
colaterais e os efeitos de longo prazo das inovações tecnológicas, pesando
suas vantagens e desvantagens. A Assembléia Geral não adotou essa
recomendação, tendo meramente pedido à Comissão de Direitos Humanos
que acompanhasse, com especial atenção, a implementação da Declaração.
Desde 1982, a Secretaria Geral relata regularmente sobre a implementação
das disposições da Declaração para a Assembléia Geral.
Nos últimos anos, a Assembléia Geral e a Comissão de Direitos
Humanos adotam uma série de resoluções que apóiam e ampliam os
princípios da Declaração. Entre elas está a resolução 1986/9, da Comissão
de Direitos Humanos (Uso do Desenvolvimento Científico e Tecnológico
para a Promoção e a Proteção dos Direitos Humanos e Liberdades Funda-
mentais) que conclama os países a empenharem todos os esforços na
utilização dos desenvolvimentos científicos e tecnológicos para a promoção
e a proteção dos Direitos Humanos e liberdades fundamentais.
Ao longo dos anos, a Unesco tem estado particularmente preocupada
com as implicações humanas e culturais dos desenvolvimentos científicos e
tecnológicos. Em uma série de reuniões de especialistas, o organismo tratou
de problemas relacionados aos efeitos da ciência e tecnologia sobre as
culturas locais. Em 1982, promoveu um seminário em Trieste (sob os
auspícios do Instituto Internacional para Estudo dos Direitos Humanos) para
estudar as conseqüências para os Direitos Humanos dos desenvolvimentos
científicos e tecnológicos, particularmente nos campos da informática,
telemática e manipulação genética. Os princípios estabelecidos nos artigos 23
e 26 da DUDH e a Convenção Contra Discriminação na Educação (1960),
bem como as disposições das duas mais importantes convenções no âmbito
dos Direitos Humanos (a Convenção Internacional sobre os Direitos Civis
e Políticos e a Convenção Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais
e Culturais) e a Convenção para Eliminação de Todas as Formas de Discri-
minação Contra a Mulher (1979) são parte do preâmbulo que precede a
Convenção da Unesco sobre Educação Técnica e Vocacional, de 1989, com
DIREITOS HUMANOS PARA A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
111
vigência a partir de 1991. Esta convenção dispõe o direito de acesso
eqüitativo à educação técnica e presta especial atenção às necessidades de
grupos em situação de desvantagem.
Tecnologia e a proteção contra os seus efeitos nocivosNas últimas décadas, a Comissão de Direitos Humanos e a Assembléia
Geral da ONU têm atentado para o fato de que os avanços da tecnologia não
geram somente benefícios, mas também podem prejudicar as pessoas. Há
consciência dos potenciais efeitos negativos das novas tecnologias sobre a
integridade física e mental das pessoas (por meio de novas formas de testes
pessoais e corporais); sobre a privacidade de seus lares e a confidencialidade
de suas correspondências (a partir de novas formas de vigilância); sobre a
deterioração dos ambientes de trabalho (devido às técnicas de automação);
e sobre o meio-ambiente (como um resultado do crescimento do desperdício
elétrico e eletrônico).
Tecnologia e tomada de decisõesA idéia de Direitos Humanos precisa se ampliar para as instituições
sociais (os arranjos institucionais) que facilitariam a realização dos padrões
fundamentais. Os Direitos Humanos não podem ser assegurados sem o
envolvimento dos cidadãos no processo de tomada de decisão nas áreas nas
quais os padrões de Direitos Humanos ainda estão por ser alcançados. Isso
move o processo democrático para além da esfera política e amplia o
requisito de participação dos arranjos institucionais para outros domínios
sociais. O direito humano de participação democrática requer que as escolhas
tecnológicas também devam ser sujeitas a controles democráticos. Isto é
particularmente importante à luz do fato de que o processo político corrente
tende a delegar importantes áreas da vida social ao controle privado, ao invés
do controle público, melhor acompanhado por accountability2. Volumes cadavez maiores de atividade social estão saindo da esfera da responsabilidadepública, do controle democrático e da participação de cidadãos na tomada dedecisão. Contra isso, tanto a DUDH quanto a Convenção Internacional sobreos Direitos Civis e Políticos estabelecem o direito das pessoas de
2. Nota do tradutor (N.T.) O termo “accountability” foi mantido no original, podendo
remeter a um sentido de responsabilização, monitoramento, controle e transparência que
é transversal e multidisciplinar, especialmente na Governança do Estado.
DIREITOS À COMUNICAÇÃO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
112
participarem na condução de assuntos públicos, seja diretamente, seja por
meio de representantes livremente escolhidos. Isto aponta para a necessidade
de desenvolvimento de formas de governança democrática, que garantam os
direitos e liberdades dispostos por esses instrumentos.
Os instrumentos relevantes• a Declaração Universal dos Direitos Humanos (DUDH);
• a Convenção Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos;
• a Declaração sobre o Progresso Social e o Desenvolvimento (Assem-
bléia Geral da ONU, 11/12/1969);
• a Declaração sobre o Uso do Progresso Científico e Tecnológico no
Interesse da Paz e para o Benefício da Humanidade (Resolução 3384, da
Assembléia Geral da ONU de 1975);
• a Convenção da Unesco sobre Educação Técnica e Vocacional, de 1989.
SOBRE CULTURA E DIREITOS HUMANOSDurante as discussões que precederam a adoção da carta constituinte3
da ONU, em 1945, muitos países latinoamericanos propuseram a inclusão de
direitos culturais, o que não foi aceito naquele momento, mas, em 1948, uma
referência aos direitos culturais foi incluída nos artigos 22 e 27 da DUDH.
O artigo 22 dispõe que todos são elegíveis à realização dos direitos econô-
micos, sociais e culturais indispensáveis para sua dignidade e o livre
desenvolvimento de sua personalidade. O artigo 27 dispõe que “todos têm
o direito a participar livremente da vida cultural da comunidade”.
Em 1966, a Assembléia Geral da ONU adotou a Convenção Interna-
cional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, e os direitos culturais
foram estabelecidos nos artigos 1 e 15. O artigo 1 dispõe que “todos os
povos têm direito à auto-determinação. Por meio desse direito, eles de-
terminam livremente o seu status político e buscam livremente o seu
desenvolvimento econômico, social e cultural”. E o artigo 15 diz que os
países signatários da Convenção reconhecem o direito de todos:
• a participar da vida cultural;
3. (NT.). “Charter” foi traduzido como carta constituinte. Normalmente, se refere a um
documento que expressa as finalidades e os princípios de uma organização. No caso das
Nações Unidas, o seu documento fundador chama-se, em português, meramente “Carta
das Nações Unidas”, conforme site da ONU em português – www.onu.org.
DIREITOS HUMANOS PARA A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
113
• a desfrutar os benefícios do progresso científico e suas aplicações;
• a se beneficiar da proteção dos interesses morais e materiais re-
sultantes de qualquer produção científica, literária ou artística das quais
eles são autores.
A Unesco se tornou a agência da ONU especializada na proteção desses
dispositivos. Nas últimas décadas, produziu muitos instrumentos relevantes
que tratam dos direitos culturais.
Em 1995, a Unesco recebeu o relatório da Comissão Mundial sobre
Cultura e Desenvolvimento, intitulado “Nossa diversidade criativa” (Ourcreative diversity), o qual propôs uma agenda de ação sobre os direitos culturais.
Em 2/11/2001, a 31ª Conferência Geral da Unesco adotou a Declaração
Universal de Diversidade Cultural. Como declarou o Diretor-Geral da Unesco
à época, Koichiro Matsuura,
“Esta é a primeira vez que a comunidade internacional comprometeu a
si mesma com um instrumento de definição de parâmetros tão abran-
gente, elevando a diversidade cultural ao grau de ‘herança comum da
humanidade’, como necessária para a raça humana assim como a
biodiversidade no campo natural, e fez de sua proteção um imperativo
ético, inseparável do respeito pela dignidade humana”.
O florescimento da diversidade criativa requer uma completa imple-
mentação dos direitos culturais. Todas as pessoas têm, portanto, direito de
livre expressão, de criar e disseminar seu trabalho, na língua de sua escolha,
particularmente na sua língua nativa; todas as pessoas são elegíveis a uma
educação de qualidade, que respeite plenamente a sua identidade cultural; e
todas as pessoas têm o direito de participar na vida cultural de sua escolha,
condizente com suas próprias práticas culturais.
A Declaração afirma, no artigo 7º, que todas as culturas devem ter a
capacidade de expressar a si mesmas e fazer a si mesmas conhecidas, e devem
ter acesso aos meios de expressão e disseminação. O artigo 8º trata dos bens
e serviços culturais e demanda especial atenção
“para a diversidade da oferta de trabalho criativo, ao devido reco-
nhecimento dos direitos dos autores e artistas e à especificidade dos
bens e serviços culturais, os quais... não devem ser tratados como meras
commodities ou bens de consumo”.
DIREITOS À COMUNICAÇÃO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
114
A Declaração é acrescida de um plano de ação para sua implementação.
Ela propõe, entre outros objetivos:
• preservar a herança lingüística da humanidade;
• promover a alfabetização digital e o gerenciamento das novas tecno-
logias de informação e comunicação;
• promover o acesso às novas tecnologias de informação e comunicação
nos países em desenvolvimento e nos países em transição;
• apoiar a presença de diversos conteúdos na mídia e enfatizar o papel
das instituições públicas de transmissão;
• aumentar a mobilidade de artistas criativos;
• ajudar a capacitar as indústrias culturais dos países em desen-
volvimento;
• envolver a Sociedade Civil na elaboração de políticas sociais que
tenham como objetivo a preservação da diversidade cultural.
Dentro do regime de Direitos Humanos internacionais, foram identifi-
cados os direitos culturais essenciais mencionados a seguir (Hamelink, 1994).
O direito à culturaMuitos fatores explicam a emergência dos direitos culturais no pós-II
Guerra Mundial. Houve o surgimento de nações pós-coloniais, que buscavam
definir sua identidade, à luz tanto dos padrões coloniais impostos como de
seus próprios valores tradicionais. A questão da identidade cultural se tornou
muito importante no processo de descolonização. Os países recém-indepen-
dentes viam a afirmação de sua identidade cultural como um instrumento de
batalha contra a dominação estrangeira. Em sua batalha primordial contra o
colonialismo, a identidade cultural tem desempenhado um papel significativo
na motivação e legitimação do movimento de descolonização.
A proliferação dos meios de comunicação de massa criou a possibilidade
de uma interação cultural sem precedentes, bem como os riscos de unifor-
midade cultural. A difusão de uma sociedade consumidora, largamente
promovida pelos meios de comunicação de massa, levantou preocupações
sérias sobre a emergência de uma nova “cultura global” homogênea.
A adoção do direito à cultura como parte do sistema de Direitos
Humanos, com sua ênfase inclusiva, direitos para “todos”, implica a saída de
uma concepção elitista do setor para uma visão da cultura como “herança
comum”. Atualmente, a Declaração da Unesco sobre Raça e Racismo, de
1978 (Conferência Geral da Unesco, Resolução 3/1.1/2) fundamentou o
DIREITOS HUMANOS PARA A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
115
direito à cultura na noção dessa como “herança comum da humanidade”,
implicando que todas as pessoas devem “respeitar o direito de todos os
grupos à sua própria identidade cultural e o desenvolvimento de uma vida
cultural distintiva dentro do contexto nacional e internacional” (artigo 5).
Em 1968, uma conferência de especialistas da Unesco considerou a
questão dos direitos culturais como Direitos Humanos. A conferência concluiu:
“Os direitos à cultura incluem a possibilidade de cada homem obter os
meios de desenvolvimento de sua personalidade, através de sua parti-
cipação direta na criação de valores humanos e de se tornar, dessa
forma, responsável por sua situação, seja em escala local ou global”
(Unesco 1968:107).
A Conferência Intergovernamental sobre Aspectos Institucionais,
Administrativos e Financeiros das Políticas Culturais (reunida pela Unesco em
1970) decidiu que o direito de participar na vida cultural obriga os governos
ao dever de fornecer os meios efetivos para essa participação.
Uma série de conferências regionais sobre políticas culturais (em 1972,
1973 e 1975) forneceram importantes elementos para a formulação de uma
recomendação da Unesco sobre a Participação Ampla das Pessoas na VidaCultural e sua Contribuição a Ela, aprovada pela 19ª sessão da Conferência Geral
da Unesco, em 26/11/1976. A recomendação almejava “garantir como
Direitos Humanos aqueles direitos relativos ao acesso e à participação na vida
cultural” e propôs que os países-membros “disponibilizem salvaguardas
efetivas para o livre acesso à cultura nacional e global por todos os membros
da sociedade”, “prestem especial atenção à elegibilidade plena das mulheres
ao acesso à cultura e participação efetiva na vida cultural” e “garantam o
reconhecimento da igualdade das culturas, incluindo a cultura de minorias
nacionais e minorias estrangeiras”.
Com relação aos meios de comunicação de massa, a recomendação
afirma que eles “não devem ameaçar a autenticidade das culturas ou
empobrecer a sua qualidade; eles não devem agir como instrumentos de
domínio cultural, mas servir ao mútuo entendimento e à paz”.
A recomendação preocupa-se particularmente com a concentração do
controle sobre os meios de produção e distribuição de cultura e sugere que
os governos “devem certificar-se que o critério de lucro não exerça uma
influência decisiva nas atividades culturais”. Houve uma oposição ocidental
muito forte a vários elementos da recomendação, como à menção, de uma
DIREITOS À COMUNICAÇÃO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
116
forma negativa, da cultura comercial de massa, e o uso da expressão “ampla”
no título da recomendação. Nas reuniões preparatórias e durante a Con-
ferência Geral da Unesco, muitas delegações ocidentais expressaram a sua
preocupação de que, caso implementada, a recomendação restringiria o Livre
Fluxo de Informação e a independência dos meios de comunicação de massa.
O opositor mais forte foi os Estados Unidos.
“Os Estados Unidos defenderam a crença de que o acesso e a par-
ticipação na vida cultural não eram temas sujeitos à regulação interna-
cional, participaram muito pouco do processo de elaboração e rascunho
do documento, não enviaram delegação à reunião intergovernamental,
pediram que a Conferência Geral não aprovasse o texto proposto e,
após a sua adoção, anunciaram que não tinham intenção de transmitir
a recomendação para as autoridades e instituições relevantes nos EUA”
(Wells, 1987: 165).
A recomendação usou uma noção ampla de cultura como parte integral
da vida social e um dos principais fatores no progresso da humanidade. A
cultura “não é meramente uma acumulação de trabalhos e conhecimento que
a elite produz, coleta e conserva... mas é... a demanda por um modo de vida
e a necessidade de comunicar”.A principal linha de pensamento da recomendação foi reforçada pela
Conferência Mundial sobre Políticas Culturais, realizada em 1982 na Cidadedo México. A Declaração sobre Políticas Culturais adotada pela Conferênciareafirmou a conclamação aos Estados para que tomassem medidas adequadaspara implementar o direito à participação cultural. Em suas várias reco-mendações, os participantes da Conferência reivindicaram que a democraciacultural devia se basear numa participação mais ampla possível, por parte dosindivíduos e da sociedade, na criação de bens culturais, na tomada de decisãorelativa à vida cultural e na disseminação e desfrute da cultura. Muitosestudos sobre a implementação da recomendação na participação na vidacultural nos últimos anos têm mostrado que pouco tem sido feito, eminúmeros países, e que essas questões permanecem relevantes.
Em resumo, pode ser estabelecido que o reconhecimento do direito
humano à cultura implica a participação na vida cultural, a proteção da identidade
cultural, a necessidade de conservar, desenvolver e difundir cultura, a proteção
aos direitos de Propriedade Intelectual e o reconhecimento da diversidade
lingüística. Cada um desses temas é tratado nos parágrafos seguintes.
DIREITOS HUMANOS PARA A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
117
O direito a participar plenamente na vida culturalA participação na vida cultural tem levantado questões difíceis sobre
a definição de comunidades, a posição de sub-culturas, a proteção aosdireitos de participação das minorias, a provisão de recursos físicos deacesso, os elos entre acesso cultural e condições socioeconômicas.Subjacente a algumas dessas dificuldades está a tensão entre a interpretaçãoda cultura como bem público ou como propriedade privada. Essasinterpretações podem ser mutuamente excludentes quando o trabalhohistórico de arte desaparece nos labirintos de coleções privadas. O direitoa participar livremente da vida cultural de uma comunidade reconhece quea qualidade de sociedade democrática não é definida somente porinstituições políticas, mas também pela possibilidade das pessoas moldaremsua identidade cultural, perceberem o potencial da vida cultural local epraticarem tradições culturais.
Direitos de participação também abrangem o direito das pessoas de“participarem livremente na vida cultural da comunidade, desfrutarem dasartes e partilharem do avanço científico e seus benefícios” (artigo 27 daDUDH). A reivindicação de participação requer a criação de condiçõessociais e econômicas que permitam que as pessoas “não apenas desfrutemdos benefícios da cultura, mas também tenham uma participação ativa na vidacultural geral e no processo de desenvolvimento cultural”.
A Recomendação da Unesco sobre Participação Ampla das Pessoas naVida Cultural e Sua Contribuição a Ela, que articula esse requisito, também
dispõe que “a participação na vida cultural pressupõe o envolvimento de
diferentes parceiros sociais no processo de tomada de decisão relacionado
à política cultural”. Essa participação vai além da participação do público
na produção midiática ou na gestão midiática nas áreas de tomada de
decisão pública. A Consulta de Especialistas da Unesco, realizada em
Bucareste, Romênia, em 1982 (Unesco 1982) enfatizou que é essencial “que
os indivíduos e grupos sejam capazes de participar, em todos os níveis
pertinentes, em todas as fases da comunicação, monitorando e revendo as
políticas de comunicação”. Este padrão necessita, então, que as práticas
políticas disponham sobre a participação das pessoas na tomada de decisão
pública sobre a produção da cultura. Pessoas têm o direito de participar das
decisões públicas sobre a preservação, proteção e desenvolvimento da
cultura. Isto significa que deveria haver amplo espaço para participação
pública na formulação e implementação de políticas culturais públicas.
DIREITOS À COMUNICAÇÃO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
118
O direito à proteção da identidade culturalA proteção da identidade cultural se tornou um assunto especialmente
sensível durante os debates, nos anos setenta, sobre imperialismo cultural. Em
1973, chefes de estado no Encontro de Países Não-Alinhados, em Algiers,
afirmaram em sua declaração que “é um fato estabelecido que a atividade do
imperialismo não é limitada aos domínios econômico e político, mas abrange
também as áreas culturais e sociais, impondo dessa forma uma dominação
ideológica estrangeira sobre as pessoas do mundo em desenvolvimento”.
A dominação cultural e a ameaça à identidade cultural também foram
tratadas pela Comissão Mac-Bride, que foi designada pela Unesco. A
Comissão enxergou que a identidade cultural estava
“ameaçada por uma superpoderosa influência sobre a assimilação de
algumas culturas nacionais, embora essas nações possam muito bem
serem herdeiras de uma cultura muito mais antiga e rica. Considerando
que diversidade é a qualidade mais preciosa da cultura, o mundo inteiro
fica mais pobre (Comissão Internacional para o Estudo de Problemas
de Comunicação, 1980:31).
Em suas recomendações, a Comissão ofereceu poucas contribuições
para uma aproximação multilateral ao assunto da dominação cultural.
Sua principal recomendação foi no sentido de estabelecer políticasnacionais que deveriam nutrir a identidade cultural. Tais políticastambém deveriam conter diretrizes para salvaguardar o desenvolvimentocultural nacional, e, ao mesmo tempo, promover o conhecimento deoutras culturas” (Comissão Internacional para o Estudo de Problemasde Comunicação, 1980:259).
Nenhuma recomendação foi proposta no tocante às possíveis medidas da
comunidade mundial, em nível coletivo. A Comissão propôs o fortalecimento
da identidade cultural e a promoção de condições para a preservação da
identidade cultural, mas deixou a implementação para o nível nacional.
Dez anos depois, a Comissão Sul (South Commission) também tratou do
assunto da identidade cultural. De acordo com seu relatório, a preocupação
com a identidade cultural
“não implica a rejeição de influências externas. Ao contrário, ela deve
ser parte de esforços para fortalecer a capacidade para tomada de
decisão autônoma, misturando elementos indígenas e universais a
serviço de uma política centrada nas pessoas” (Comissão Sul, 1990:132).
DIREITOS HUMANOS PARA A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
119
A Comissão conclamou os governos a adotarem Acordos de Desen-
volvimento Cultural, que articulassem os direitos básicos dos indivíduos no
campo cultural. Políticas culturais deveriam destacar o direito à cultura, a
diversidade cultural, bem como o papel do estado na preservação e no
enriquecimento da herança cultural da sociedade (Comissão Sul, 1990:133).
A noção de identidade cultural permanece um tópico para muita
discussão. Entre os assuntos não resolvidos, está a questão de como uma
sociedade pode proteger a identidade cultural de suas partes constituintes,
mantendo, ao mesmo tempo, sua coesão social.
O direito à proteção da propriedade e da herançacultural nacional e internacional
Este direito cultural é particularmente pertinente em tempos de conflito
armado. Também tem implicações importantes para o reconhecimento da
Propriedade Intelectual de povos indígenas.
Em 14/12/73, a Assembléia Geral da ONU adotou uma resolução
(Resolução 3148, XXVIII), sobre a preservação e o desenvolvimento
adicional dos valores culturais. A resolução considera o valor e a dignidade
de cada cultura, bem como a habilidade para preservar e desenvolver seu
caráter distintivo, como um direito básico de todos os países e povos. Sob
a luz dos possíveis riscos aos caracteres distintivos das culturas, a preser-
vação, o enriquecimento e o desenvolvimento adicional das culturas nacionais
deve ser apoiado. É importante notar que a resolução reconhece que “a
preservação, renovação e criação contínua de valores culturais não deveria ser
um conceito estático, mas sim dinâmico”. A resolução recomendou ao
diretor-geral da Unesco a promoção de pesquisas para analisar “o papel dos
meios de comunicação de massas na preservação e desenvolvimento adicional
de valores culturais”.
A resolução também conclamou os governos a promoverem “o envol-
vimento da população na elaboração e implementação de medidas que assegurem
a preservação e o desenvolvimento futuro de valores culturais e morais”.
Sobre a proteção da propriedade cultural, os governos adotaram duas
convenções da Unesco: a Convenção de Hague para a Proteção de Pro-
priedade Cultural no Caso de Conflito Armado (1954), e a Convenção sobre
os Meios de Proibir e Prevenir a Importação, Exportação e Transferência
Ilícitas de Propriedade Cultural (1970).
DIREITOS À COMUNICAÇÃO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
120
Um instrumento específico sobre a proteção da herança cultural mundial
foi adotado pela 17ª sessão da Conferência Geral da Unesco, em 1972: a
Convenção para a Proteção da Herança Cultural e Natural do Mundo. O
texto observou que a herança cultural do mundo está ameaçada, o que é um
fator de empobrecimento para a humanidade. Então, são necessárias
providências efetivas para proteger coletivamente a herança cultural de valor
universal. Na convenção, a proteção internacional da herança cultural mundial
é entendida como
“o estabelecimento de um sistema de cooperação e ajuda internacional,
projetado para apoiar os estados-membros da Convenção em seus
esforços para conservar e identificar aquela herança”.
Em 18/12/73, a Assembléia Geral da ONU adotou uma resolução
sobre a Restituição de Obras de Arte a Países Vítimas de Expropriação
(Resolução 3187, XXVIII). A resolução vê a imediata restituição de obras de
arte como um fortalecimento da cooperação internacional e como uma
reparação justa aos danos feitos. Para implementar esta resolução, a Unesco
estabeleceu o Comitê Intergovernamental para Promover o Retorno da
Propriedade Cultural aos seus Países de Origem ou sua Restituição nos casos
de Apropriação Ilícita. Ao longo dos anos 80, a Assembléia Geral da ONU
destacou o assunto, recomendando o trabalho da Unesco neste campo e
convocando os países associados a ratificar a convenção pertinente. Em 1986
a Assembléia Geral proclamou o período 1988-1997 como a Década Mundial
para Desenvolvimento Cultural. Foram formulados os seguintes objetivos
durante a década: o reconhecimento da dimensão cultural do desen-
volvimento, o enriquecimento das identidades culturais, a participação ampla
na vida cultural e a promoção de cooperação cultural internacional (Assem-
bléia Geral da ONU, Resolução 41/187, 8/12/86).
Outras abordagens da comunidade internacional à proteção da pro-
priedade cultural incluem a proteção da cultura tradicional e do folclore. Em
1989, a Conferência Geral da Unesco adotou uma recomendação que
acentuou a necessidade de se reconhecer o papel de folclore e os perigos que
ele enfrenta. O folclore foi definido como a totalidade das criações baseadas
na tradição de uma comunidade cultural. A recomendação reivindica medidas
para a conservação, preservação, disseminação e proteção do folclore.
DIREITOS HUMANOS PARA A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
121
A Minuta de Declaração sobre os Direitos dos Povos Indígenas, da
ONU (1994), refere-se explicitamente à propriedade cultural dos povos
indígenas. O artigo 12 dispõe que:
“Os povos indígenas têm o direito para praticar e revitalizar as suas
tradições culturais e seus costumes. Isto inclui o direito de manter, proteger
e desenvolver as manifestações de suas culturas no passado, no presente
e no futuro, tais como locais arqueológicos e históricos, artefatos,
cerimônias, tecnologias e artes visuais e performáticas e literatura, bem
como o direito à restituição da propriedade cultural, intelectual, religiosa e
espiritual que foi levada sem o seu livre e bem-informado consentimento
ou em violação às suas leis, tradições e costumes”.
O direito a usar o idioma nativo em privado e públicoEste direito cultural reconhece que os direitos lingüísticos são uma parte
crítica dos Direitos Humanos. O idioma que falamos e a nossa língua
materna, em particular, são uma parte crucial de quem nós somos como
indivíduos. Para um grupo minoritário, a perda do idioma ameaça a existência
do grupo, porque eventualmente ocorrerá uma assimilação ao grupo do
idioma que se fala.
O artigo de mais amplo alcance que articula as leis de Direitos Humanos
com os direitos lingüísticos é o artigo 27 da Convenção Internacional sobre
Direitos Civis e Políticos (1966), que estabelece:
“Naqueles estados nos quais as minorias étnicas, religiosas ou lin-
güísticas existem, as pessoas que pertencem a essas minorias não devem
ter negado o seu direito a, em conjunto com outros membros do seu
grupo, desfrutarem de sua própria cultura, professarem e praticarem sua
própria religião, ou de usarem seu próprio idioma”.
Inicialmente, este artigo foi interpretado como se referindo aos
indivíduos e não a grupos. Isto não ajudou as comunidades de imigrantes,
que não foram vistas como minorias. Porém, isto mudou a partir de uma
nova interpretação do artigo, feita em um comentário geral ao artigo 27,
adotado pelo Comitê de Direitos Humanos da ONU, em 6 de abril de 1994.
O Comitê entendeu que o artigo oferecia proteção a todos os indivíduos no
território de uma nação, ou que estejam sob sua jurisdição, inclusive os
imigrantes e refugiados.
DIREITOS À COMUNICAÇÃO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
122
A Minuta da Declaração da ONU sobre os Direitos dos Povos Indígenas
formula explicitamente os direitos lingüísticos e demanda que os países
aloquem recursos para tratar desse assunto. Mas o destino da Minuta ainda é
incerto, a mais recente versão foi completada em julho de 1994 e remetida à
Sub-Comissão da ONU para Prevenção da Discriminação e Proteção das
Minorias, que, por sua vez, submeteu o assunto à Comissão de Direitos
Humanos da ONU, para discussão em fevereiro de 1995. Os trabalhos na
Minuta ainda continuam e grandes alterações ainda são esperadas. Porém, há
alguma suspeita de que os povos indígenas não venham a ter, eles mesmos,
muita influência nesses dispositivos. Com relação ao reconhecimento dos seus
direitos lingüísticos, a minuta de Declaração dispõe, também no artigo 17, que
as pessoas indígenas têm “o direito eqüitativo a todas as formas de mídia não
indígena”. Adicionalmente, diz que “os estados devem tomar medidas efetivas
para assegurar que as mídias públicas reflitam apropriadamente a diversidade
cultural indígena”.
A Conferência Mundial sobre Direitos Lingüísticos foi realizada em
Barcelona, em junho de 1996, organizada pelo Clube PEN Internacional e
pelo Centro para a Legislação Lingüística, fundado pela União Européia,
baseado na Catalunha. Uma Minuta da Declaração Universal de DireitosLingüísticos foi aprovada e a Unesco empreendeu um esforço de promoçãoe submissão da declaração ao endosso dos governos nacionais, bem comopara refinar o texto em colaboração com as associações pertinentes. O textoé um documento abrangente, que traz um esclarecimento conceitual sobre osdireitos lingüísticos na administração pública, na educação, na mídia, nacultura e na esfera socioeconômica.
O fato de que o documento acentua os direitos do que chama “comu-
nidades” lingüísticas (correspondendo, grosso modo, a minorias territoriais)
à sua língua materna e à proficiência na sua língua oficial, é de pouca ajudapara minorias não territoriais e minorias de imigrantes.
A Declaração de Unesco sobre Diversidade Cultural tem algumasreferências a direitos lingüísticos, mas não destaca o assunto do idioma. Emseu artigo 5, dispõe que “todas as pessoas têm, desta forma, o direito deexpressarem a si mesmos e de criarem e disseminarem o seu trabalho nalíngua de sua escolha, e particularmente na sua língua natal”.
O item 5 do plano de ação propõe “que se proteja a herança lingüísticada humanidade e que se apóie a expressão, criação e disseminação no maiornúmero possível de línguas” e o item 6 estabelece o dever de se “encorajar
DIREITOS HUMANOS PARA A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
123
a diversidade lingüística, ao mesmo tempo que respeitar a língua materna, emtodos os níveis da educação, onde quer que for possível, e disseminar oaprendizado de muitas línguas para os jovens”. O item 10 recomenda “apromoção da diversidade lingüística no ciberespaço”.
Os instrumentos relevantes• A Declaração Universal de Direitos Humanos (1948);• A Convenção Internacional sobre Direitos Sociais, Econômicos e
Culturais (1966);• A Convenção Internacional sobre Direitos Civis e Po-líticos (1966);• A Convenção de Hague, da Unesco, sobre a Proteção da Propriedade
Cultural no caso de Conflito Armado (1954);• A Convenção da Unesco sobre os Meios de Proibir e Prevenir a
Importação, Exportação e Transferência Ilícitas de Propriedade de Pro-priedade Cultural (1970);
• A Convenção da Unesco para a Proteção da Herança Cultural eNatural do Mundo (1972);
• A Recomendação da Unesco sobre a Participação Ampla das Pessoasna Vida Cultural e sua Contribuição para Ela (1976);
• A Minuta da Declaração da ONU sobre Direitos dos Povos Indígenas(1994);
• A Declaração da Unesco sobre os Princípios de Cooperação CulturalInternacional (1966);
• A Declaração Universal da Unesco sobre Diversidade Cultural (2001).
SOBRE POLÍTICA, SOCIEDADE E DIREITOS HUMANOS
Liberdade de expressãoNo tocante às interações entre os desenvolvimentos informacionais e os
sistemas políticos das sociedades, os dispositivos-chave de Direitos Humanosse referem à liberdade de expressão. Esses dispositivos são encontrados naDUDH (artigo 19) e na Convenção Internacional em Direitos Civis ePolíticos (artigo 19). O direito à liberdade de expressão das crianças étambém disposto na Convenção sobre os Direitos das Crianças (artigo 13).A disposição essencial continua sendo a formulação do artigo 19 da DUDH,onde se afirma que “todos tem o direito à liberdade de opinião e deexpressão; este direito inclui a liberdade de manter opiniões sem interferênciae de buscar, receber e dar informações e idéias através de qualquer mídia eindependentemente de fronteiras”.
DIREITOS À COMUNICAÇÃO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
124
De modo a proteger as sociedades contra os possíveis abusos do
direito à liberdade de discursos, as leis internacionais de Direitos Humanos
também têm disposto uma série de limitações a essa liberdade. Entre essas
está a proibição do incitamento ao genocídio. O artigo 3 da Convenção
sobre Prevenção e Punição do Crime de Genocídio de 1948 declara que
entre os atos passíveis de punição está o “incitamento direto e público ao
crime de genocídio”. O artigo 4 define que “as pessoas que cometem
genocídio ou qualquer um dos outros atos estabelecidos no artigo 3 devem
ser punidas, sejam eles legisladores, constitucionalmente responsáveis,
oficiais públicos ou indivíduos”.
Também há dispositivos sobre a proibição à discriminação. No artigo
2 da DUDH está escrito que
“todos são elegíveis a todos os direitos e liberdades descriminados nessa
declaração, sem distinção de qualquer tipo, tais como de raça, cor, sexo,
língua, religião, opinião política ou outra, origem nacional ou social,
propriedade, nascimento ou outra condição”.
Além disso, de acordo com a declaração, não deve ser feita qualquer
distinção com base na condição política, jurisdicional ou internacional do país
ou território ao qual a pessoa pertença, seja ele independente, colônia, ou sem
auto-governo ou sobre qualquer tipo de limitação de sua soberania. O
princípio essencial é a eqüidade. Tratamento diferencial às pessoas com base
nas características específicas das pessoas ou grupos está em flagrante
conflito com a noção básica de dignidade humana. O artigo 2º tem como
intenção prover uma proteção geral contra a discriminação.
O padrão de igualdade entrou no direito internacional pela primeira vez
com a criação da ONU. A Convenção da Liga das Nações (1919), por
exemplo, não continha tal proteção. O preâmbulo da carta de criação da
ONU pede por “direitos iguais para homens e mulheres e para nações
grandes e pequenas”. Durante o trabalho na minuta da carta de criação da
ONU, um dos pontos da discussão foi a discriminação, entre outras. Uma
das controvérsias era: devem ser incluídas a opinião política ou noções como
condição, propriedade e nascimento, uma vez que eram alvo de opiniões
contraditórias? A frase “sem distinções de qualquer natureza, tais como ...”
implica que a enumeração não deve ser lida como exaustiva.
DIREITOS HUMANOS PARA A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
125
A DUDH e a Convenção Internacional sobre Direitos Civis e Po-
líticos usam o termo “distinção”, e a Convenção Internacional sobre
Direitos Econômicos, Sociais e Culturais usa “discriminação”. Contudo, a
Convenção Internacional sobre Direitos Civis e Políticos usa o termo
discriminação no artigo 4.1.
Um dos mais importantes tratados para codificação dos padrões de
não-discriminação é a Convenção Internacional sobre a Eliminação de
Todas as Formas de Discriminação Racial (1965). A mais contestada (e,
para a mídia, a mais pertinente) disposição dessa convenção encontra-se no
artigo 4, que diz respeito à disseminação de idéias baseadas na
superioridade racial.
A convenção sobre discriminação racial foi ratificada pela ampla maioria
dos países associadas à ONU. O artigo 4 dessa convenção e o artigo 20.2 da
Convenção Internacional sobre Direitos Civis e Políticos incorporaram à
legislação doméstica a proibição da disseminação de idéias baseadas na
superioridade racial e o “incitamento ao ódio racial ou à defesa de ódio
religioso, racial ou nacional, que constitui o incitamento à discriminação,
hostilidade ou violência devem ser proibidos por lei”.
Outros importantes dispositivos contra a discriminação são
encontrados na Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação contra a Mulher (1979). O artigo 5 dessa convenção
demanda a “eliminação de representações estereotipadas dos papéis dos
homens e mulheres e preconceitos baseados na idéia da inferioridade ou
superioridade de qualquer um dos sexos”. No artigo 10, sobre educação, há
uma forte argumentação pela eliminação de qualquer conteúdo
estereotipado sobre os papéis dos homens e das mulheres em qualquer dos
níveis e em qualquer forma de educação.
A limitação da liberdade de expressão está também implícita pelos
padrões de Direitos Humanos sobre a proteção da privacidade das pessoas
contra interferências indevidas. A DUDH dispõe, em seu artigo 12:
“Ninguém deve ser submetido à interferência arbitrária na sua priva-
cidade familiar, de sua casa ou de sua correspondência, nem a ataques
à sua honra e reputação. Todos têm o direito à proteção legal contra tais
interferências ou ataques”.
DIREITOS À COMUNICAÇÃO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
126
A liberdade de ter opiniõesNo artigo 19 da DUDH, a liberdade de manter opiniões sem interferência
é devidamente reconhecida. Quando esse dispositivo foi transformado em lei,
após sua incorporação à Convenção Internacional sobre Direitos Civis e Políticos
(artigo 19), um desenvolvimento interessante teve lugar. Na Convenção, a
liberdade de opinião e a liberdade de expressão são separadas. A Convenção
dispõe pelo direito absoluto de liberdade de opinião, mas permite certas restrições
no direito de expressão, como as necessárias ao respeito dos direitos e reputações
de terceiros e à proteção da segurança nacional ou da ordem pública (ordrepublique), ou da saúde pública ou da moral (parágrafo 3º do artigo 19). A
Convenção também limita a liberdade de expressão pelos dispositivos do artigo
20, que demandam que qualquer propaganda da guerra deve ser proibida por lei
e que qualquer defesa de ódio nacional, racial ou religioso que constitua
incintamento à discriminação, hostilidade ou violência também deve ser proibida
por lei. A Convenção enfatiza o caráter especial do direito à liberdade de manter
opiniões, fazendo deste um direito privado (relacionado à proteção da priva-
cidade) que não pode ser sujeito a qualquer interferência.
Sobre a exposição pública de prisioneiros de guerraAs leis humanitárias internacionais (as quais podem ser descritas como
Direitos Humanos para tempos de conflito armado) proíbem a exposição de
prisioneiros de guerra à curiosidade pública (Terceira Convenção de Genebra
relativa ao Tratamento de Prisioneiros de Guerra, de 12 de agosto de 1949).Os noticiários violam esse dispositivo de Direitos Humanos quando
publicam fotos de prisioneiros de guerra capturados, expondo-os à curio-sidade pública. Em vários conflitos armados recentes esse padrão foi violadopela maioria dos noticiários globais. Exemplos muito bem conhecidos dessasviolações são as fotos dos suspeitos de pertencerem à Al Qaeda, na Baía deGuantânamo e no Afeganistão, a estação de TV Al Jazeera mostrandosoldados britânicos capturados, bem como os fragmentos de vídeo deprisioneiros iraquianos sendo capturados, que foram transmitidos ao redor
do mundo pela mídia ocidental.
Fornecendo informaçõesAs leis de Direitos Humanos internacionais também apontam para a
responsabilidade social de disseminar certos tipos de informações. Os
preâmbulos da DUDH e as duas convenções internacionais sobre Direitos
Humanos (Convenção Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e
DIREITOS HUMANOS PARA A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
127
Convenção Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais)
propõem uma responsabilidade geral que contribua para o ensino dos
Direitos Humanos. A DUDH declara que “todos os indivíduos e todos os
órgãos da sociedade, mantendo esta Declaração sempre em mente, devem
lutar por ensinar e educar tanto a promover o respeito a esses direitos e às
liberdades”. Os preâmbulos das duas convenções declaram que
“Perceber que o indivíduo, tendo deveres com relação aos outros
indivíduos e para com a comunidade que ele pertence, está sob uma
responsabilidade de se esforçar para promover e defender a observância
dos direitos reconhecidos na presente Convenção”.
A referência a “todos” e a “cada órgão da sociedade” e à respon-
sabilidade individual, parece implicar, logicamente, que todos os fornecedores
de informação estão entre esses indivíduos e espera-se que contribuam para
a promoção e a proteção dos Direitos Humanos.
A Convenção sobre os Direitos das Crianças também encoraja a
provisão de um tipo especial de informação. No artigo 17, esta Convenção
dispõe que:
“Os países-membro reconheçam a importante função desempenhada
pelos meios de comunicação de massa e devam assegurar que as
crianças tenham acesso à informação e materiais de uma diversidade de
fontes nacionais e internacionais, especialmente àquelas voltadas para a
promoção de seu bem-estar social, espiritual e moral, bem como sua
saúde física e mental”.
Para essa finalidade, os países-membro devem:
• Encorajar os meios de comunicação de massa a disseminar infor-
mações e materiais que beneficiem social e culturalmente as crianças e que
estejam em consonância com o espírito do artigo 29;
• Encorajar a cooperação internacional na produção, intercâmbio e
disseminação de tais informações e materiais, de uma diversidade de fontes
culturais, nacionais e internacionais;
• Encorajar a produção e disseminação de livros infantis;
• Encorajar os meios de comunicação de massa a prestarem especial
atenção às necessidades lingüísticas de crianças que pertençam à grupos
minoritários ou que sejam de origem indígena.
DIREITOS À COMUNICAÇÃO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
128
Os instrumentos relevantes• A Declaração Universal de Direitos Humanos (1948);
• A Terceira Convenção de Genebra relativa ao Tratamento de Prisio-neiros de Guerra (1949);
• A Convenção Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (1966);
• A Convenção sobre a Prevenção e o Castigo do Crime de Geno-
cídio (1948);
• A Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discri-
minação contra Mulheres (1979);
• A Convenção nos Direitos da Criança (1989).
SOBRE A ECONOMIA E OS DIREITOS HUMANOS
O direito à auto-determinação e o direito ao desenvolvimentoCom relação aos desenvolvimentos informacionais e o desenvolvimento
das indústrias locais para a produção e disseminação de informação, é
importante observar que o artigo 1º da Convenção Internacional sobre os
Direitos Econômicos, Sociais e Culturais dispõe sobre o direito à auto-
determinação. Isso implica que todas as sociedades são livres para determinar
e perseguir o seu desenvolvimento econômico. Esse padrão foi poste-
riormente fortalecido pela Declaração sobre o Direito ao Desenvolvimento,
adotada pela Assembléia Geral da ONU, por meio da resolução 41/128, de
4 de dezembro de 1986.
No seu artigo 2º, a declaração dispõe que
“Os países têm o direito e o dever de formular políticas nacionais dedesenvolvimento apropriadas, que mirem na melhoria constante dobem-estar da população inteira e de todos os indivíduos, na base da suaativa, livre e significativa participação no desenvolvimento e na justadistribuição dos benefícios dele resultantes”.
Esse padrão tem implicações óbvias para a formulação de políticas
relacionadas aos desenvolvimentos informacionais.
O direito à proteção dos interesses morais e materiaisdas obras culturais
Esse padrão de Direitos Humanos veio desempenhar um papel cres-
centemente importante na economia internacional. As regras internacionais
DIREITOS HUMANOS PARA A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
129
para a proteção da Propriedade Intelectual são originárias do século XIX.
Desde o princípio, essa proteção tem sido inspirada por três razões. A
primeira era a noção que aqueles que investiram na produção de uma
Propriedade Intelectual deveriam ter garantido sua remuneração financeira.
Com o estabelecimento dos primeiros tratados internacionais sobre proteção
da Propriedade Intelectual (a Convenção de Paris para a Proteção da
Propriedade Industrial, de 1883; e a Convenção de Berna para a Proteção das
Obras Artísticas e Literárias, de 1886), um benefício monetário para o criador
era percebido como incentivo necessário para o investimento na inovação e
à criatividade. Durante a revisão da Convenção de Berna, em 1928, a segunda
razão, a noção dos direitos morais, foi adicionada ao direito aos benefícios
econômicos. A introdução do valor moral dos trabalhos reconheceu que eles
representam a personalidade intelectual do autor. Os direitos morais
protegem o trabalho criativo contra a modificação sem o consentimento do
autor, protegem a reivindicação de autoria e o direito do autor sobre a
publicação ou não de um trabalho. Anteriormente, no desenvolvimento dos
direitos à Propriedade Intelectual, também era reconhecido que havia um
interesse público na proteção da Propriedade Intelectual. Como princípio
comum e como terceira razão, reconhecia-se que os direitos à Propriedade
Intelectual promoviam a inovação e o progresso nos campos artístico,
tecnológico e científico, e, desta forma, atendiam ao interesse público. O
artigo 1º da Constituição dos Estados Unidos, por exemplo, articula essa idéia
da seguinte forma: “promover o progresso da ciência e das artes úteis,
assegurando, por um tempo limitado, direitos exclusivos aos autores e
inventores com relação aos seus respectivos escritos e descobertas”. A
proteção aos direitos da Propriedade Intelectual são, de fato, um delicado
equilíbrio entre interesses econômicos privados, propriedade individual e
interesse público.
Com a crescente importância econômica da Propriedade Intelectual, o
sistema global de governança nesse domínio se deslocou das dimensões
morais e do interesse público, enfatizando, atualmente, os interesses
econômicos dos donos da Propriedade Intelectual. Atualmente, tais pro-
prietários não são mais, na maioria dos casos, os autores individuais ou
compositores que criaram produtos culturais, mas corporações transnacionais
que produzem bens culturais. Os autores individuais, compositores e artistas
estão embaixo na lista dos dados comerciais e, como resultado, há uma
tendência em relação a arranjos de proteção aos direitos de Propriedade
DIREITOS À COMUNICAÇÃO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
130
Intelectual que favoreçam o investimento institucional em detrimento dos
produtores individuais.
A tendência recente de incluir os direitos à Propriedade Intelectual nas
negociações globais de comércio demonstra os interesses comerciais dos
principais beneficiários atuais. Os problemas de copyright têm se tornado
questões comerciais e a proteção ao autor tem cedido lugar aos interesses dos
comerciantes e investidores. Essa ênfase na propriedade corporativa implica
em ameaça ao uso comum da Propriedade Intelectual e traz transtornos ao
equilíbrio entre as reivindicações de propriedade individual por parte dos
produtores e as reivindicações dos benefícios públicos, pelos usuários. O
equilíbrio entre os interesses dos produtores e usuários sempre tem estado
sob ameaça no desenvolvimento dos direitos à Propriedade Intelectual e seu
sistema de governança, mas parece que os arranjos surgidos recentemente
não beneficiam nem os criadores individuais nem o público de forma ampla.
Os principais beneficiários dos arranjos têm sido os conglomerados de mídia,
cujo principal negócio é o conteúdo. Muitas das fusões vistas recentemente
nesse setor foram, de fato, motivadas pelo desejo de obter controle sobre os
direitos de conteúdos, como, por exemplo, investimento em filmotecas ou
em coleções de músicas.
Os desenvolvimentos recentes nas tecnologias digitais, que abrem
possibilidades sem precedentes para o acesso livre e fácil, para a utilização do
conhecimento, também têm tornado a produção, reprodução e distribuição
profissional de conteúdo vulnerável à pirataria em grande escala. Isso tem
feito com que os proprietários de conteúdo fiquem muito preocupados
quanto aos seus direitos à propriedade e interessados na criação de um
regime legal reforçado para a sua proteção.
Contudo, a proteção à Propriedade Intelectual não está isenta de riscos, pois
também restringe o acesso ao conhecimento, uma vez que define o
conhecimento como propriedade privada e tende a facilitar práticas monopolistas.
A concessão de um controle monopolista sobre uma invenção pode restringir a
sua utilização social e reduzir os benefícios públicos potenciais. O princípio de
controle exclusivo sobre a exploração das obras que alguém criou pode
constituir-se num direito efetivo ao controle monopolista, que restringe o livre
fluxo de idéias e de conhecimento. Nas batalhas atuais travadas pelas corporações
contra a pirataria, parece que os protagonistas principais estão, em geral, mais
preocupados com a proteção dos investimentos do que com a integridade moral
das obras criativas ou com a qualidade da vida cultural no mundo.
DIREITOS HUMANOS PARA A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
131
No regime de direitos à Propriedade Intelectual que está emergindo,
algumas poucas megaempresas tornam-se as controladoras globais da
herança cultural da humanidade. Ao mesmo tempo, dificilmente os
pequenos produtores individuais ou comunitários de literatura, artes ou
música se beneficiam de proteção legal internacional. A maior parte do
dinheiro coletado vai para uma pequena porcentagem de pessoas criativas
(cerca de 90% do dinheiro vai para 10% das pessoas criativas) e a maioria
dos artistas que produzem Propriedade Intelectual recebem uma porção
menor dos fundos coletados (cerca de 90% dividem 10% de recursos). A
maior parte do dinheiro vai para artistas-estrelas e autores de best-sellers.
A indústria da mídia não faz dinheiro criando diversidade cultural tanto
quanto ganha com os artistas blockbusters. Caso haja mais variedade no
mercado musical, por exemplo, os títulos pequenos e independentes iriam
competir com os líderes de mercado transnacionais. Embora isso se encaixe
no pensamento tradicional sobre mercados livres, a indústria, na realidade,
prefere a consolidação do que a competição!
Tem se tornado cada vez mais claro que o movimento para proteger
produtos de mídia contra reprodução não-autorizada leva a um crescente
nível de restrições à reprodução para propósitos privados. Os direitos à
Propriedade Intelectual são reconhecidos pela DUDH (artigo 27), que
coloca a proteção à Propriedade Intelectual no contexto de outros
Direitos Humanos, como a liberdade de expressão e o direito ao acesso
à informação e ao conhecimento. Esse contexto de Direitos Humanos
deve moldar o ambiente político para todas as partes envolvidas:
produtores, distribuidores, artistas e consumidores. Isso implica que a
proteção aos direitos à Propriedade Intelectual não pode ser separada do
contexto do direito à plena participação na vida cultural, estendido a
todos; o direito ao acesso em condições razoáveis, para todos; o
reconhecimento aos direitos morais dos produtores culturais; os direitos
dos artistas criativos; a diversidade da produção cultural e a proteção do
domínio público.
Um acordo internacional baseado nos Direitos Humanos sobre a
proteção aos direitos de Propriedade Intelectual deveria reconhecer as
necessidades de todas as pessoas, a noção de direitos comuns e o com-
partilhamento dos benefícios (o Acordo da Organização Mundial de
Comércio sobre os Direitos à Propriedade Intelectual Comerciáveis, de 1993,
reconhece em seu preâmbulo, os direitos à Propriedade Intelectual apenas
DIREITOS À COMUNICAÇÃO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
132
como direitos privados). O seu propósito básico seria social mais do que
comercial, e os direitos à Propriedade Intelectual deveriam ser vistos como
direitos de liberdade mais do que como direitos de restrição e propriedade.
A concepção inicial dos direitos à Propriedade Intelectual como Direitos
Humanos concebia a restrição ao uso de tal propriedade apenas tempo-
rariamente. Essa monopolização era vista como socialmente aceitável desde
que o produto eventualmente voltasse ao domínio público. Os esforços atuais
para estender a duração da proteção (tal como nos Estados Unidos, onde
recentemente a proteção foi estendida de 50 para 70 anos após a morte do
autor) aponta para a direção de uma restrição praticamente ilimitada.
Direitos Humanos e responsabilidades corporativasMuitas das operações das corporações transnacionais ao redor do globo
têm dimensões relacionadas aos Direitos Humanos. As atividades comerciais
de um número crescente de corporações transnacionais afetam questões
como o aquecimento global, o trabalho infantil, os alimentos geneticamente
modificados e os mercados financeiros.
Segundo as políticas de liberalização e desregulamentação amplamente
disseminadas e aceitas, o alcance e a liberdade das corporações transnacionais
têm se expandido consideravelmente sem o desenvolvimento paralelo de suas
responsabilidades sociais. As corporações transnacionais, contudo, enfrentam
desafios públicos à sua conduta moral, e para alguns atores corporativos isso
têm significado que eles precisam começar a refletir sobre padrões de boa
Governança Corporativa e Responsabilidade Social.
Algumas empresas têm proposto que o atendimento voluntário aos
padrões de Direitos Humanos (por meio de códigos de conduta e auto-
regulação) é bom para os negócios e faz com que as empresas pareçam
melhores aos olhos dos consumidores, além de evitar processos legais,
melhorar a gestão do risco e aumentar a produtividade dos trabalhadores. Em
um pronunciamento à ONU, a organização não-governamental Human RightsWatch propôs o desenvolvimento de algumas diretrizes sobre o assunto como
primeiro passo ao processo de desenvolvimento de padrões de Direitos
Humanos para corporações. Ela acredita “que há a necessidade de padrões
vinculantes que previnam que as corporações tenham um impacto negativo
no desfrute dos Direitos Humanos. Tais padrões não devem somente se
limitar às corporações transnacionais, mas sim serem aplicados a qualquer
corporação: local, nacional ou transnacional”. O Relatório da ONU sobre
DIREITOS HUMANOS PARA A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
133
Desenvolvimento Humano, de 1999, também argumenta que as corporações
transnacionais são muito importantes para que sua conduta seja deixada a
padrões auto-determinados e de adesão voluntária.
A questão dos Direitos Humanos com relação aos atores privados se
tornou mais importante agora que os serviços públicos são geralmente
desempenhados por atores privados. Uma vez que as instituições outrora de
propriedade estatal, como os serviços postais, são privatizadas, a obrigação, por
exemplo, de garantir que o Direito Humano à privacidade não seja violado não
pode mudar. A proteção aos Direitos Humanos implica que os Estados devam
impedir que agentes privados violem os Direitos Humanos de seus cidadãos.
As Diretrizes sobre Violações de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais
(1997), elaborada durante reunião de especialistas em Maastricht, afirma que:
“a obrigação de proteger inclui a responsabilidade dos estados deassegurar que as entidades privadas ou indivíduos, inclusive corporaçõestransnacionais sobre as quais exerçam jurisdição, não privem as pessoasde seus direitos econômicos, sociais e culturais” (ICJ et al., 1997:9).
Os Direitos Humanos internacionais realmente dispõem que os Estados
têm obrigação de assegurar que os negócios privados respeitem os Direitos
Humanos. Isto é parte da responsabilidade indireta dos Estados. Também há,
contudo, obrigações diretas para a conduta das empresas comerciais. Há
obrigação para todas as partes (como estabelecido no preâmbulo da DUDH)
de promover os Direitos Humanos. Isto significa dar publicidade e dis-
seminar os princípios e padrões dos Direitos Humanos, para explicá-los, para
ajudar outros a entendê-los e a usar qualquer influência que alguém tenha
para protegê-los. A Convenção Internacional sobre Direitos Econômicos,
Sociais e Culturais foi muito explícita sobre a inclusão de atores privados na
proteção de Direitos Humanos. O comitê, entre outras coisas, apontou a
necessidade do direito à privacidade ser protegido de violações cometidas por
entidades privadas. Assumiu também a posição de que os direitos pelos quais
é responsável em disseminar realmente se aplicam a partes privadas.
Semelhantemente, a Declaração Tripatirte da Organização Mundial do
Trabalho sobre Princípios Concernentes às Empresas Multinacionais e à
Política Social (1977) refere, no artigo 8, à necessidade de respeito os Direitos
Humanos por todas as partes envolvidas (governo, empregadores e
sindicatos) e menciona direitos como a liberdade de expressão.
DIREITOS À COMUNICAÇÃO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
134
A Subcomissão para a Promoção e Proteção de Direitos Humanos (um
órgão da Comissão de Direitos Humanos da ONU) tem um grupo de
trabalho sobre corporações transnacionais e Direitos Humanos. Em 1999, o
grupo de trabalho começou a trabalhar em um código de conduta em
corporações no tocante aos Direitos Humanos, que foram aprovados para
desenvolvimento adicional em 2000. O grupo de trabalho quer, even-
tualmente, fazer do código um instrumento vinculante. A administração dos
EUA se opôs a isto e propôs a dissolução do grupo.
Privacidade e segurançaObviamente, para o comércio internacional, a segurança das transações
on-line se tornou assunto crucial. A pergunta que surge disto é se podem ser
aplicados dispositivos de Direitos Humanos à proteção da privacidade e à
confidencialidade das comunicações. A complicação aqui é que a indústria
tende a usar um padrão duplo. Por um lado, há forte preferência por proteção
das comunicações seguras, como condição prévia essencial para o crescimento
do comércio eletrônico, e por outro lado está aumentando o interesse das
corporações em coletar e negociar dados pessoais dos consumidores.
Tecnologias de criptografia são as ferramentas óbvias para
assegurarem comunicações eletrônicas seguras. Esta tecnologia tem
vantagens claras para a privacidade dos usuários, mas também facilita a
comunicação secreta entre membros de organizações criminosas. A maioria
dos países reivindica o direito de ter acesso aos fluxos de informação nos
casos em que eles possam arriscar a segurança nacional, ou no caso de
processos judiciais que requerem isto. Como resultado, eles tendem a
defender posições ambivalentes quanto à criptografia. A tendência
dominante nos países da Organização para a Cooperação e o
Desenvolvimento Econômico (OCDE) é em favor da liberalização da
criptografia e da aceitação geral de técnicas de codificação. Um assunto
ainda a ser solucionado é se os códigos utilizados no processo de
criptografia devem ser depositados com terceiros, de forma que os
governos possam acessá-los quando precisem, para segurança ou para
propósitos legais. Em março de 1997, a OCDE recomendou uma
regulamentação que demonstrava essa ambigüidade de forma muito clara.
As Diretrizes da OCDE para a Política de Criptografia formavam um
conjunto de princípios não vinculantes sobre o uso das tecnologias de
criptografia. Os princípios regulatórios essenciais são a confiança e a
DIREITOS HUMANOS PARA A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
135
escolha dos métodos de criptografia, o desenvolvimento de princípios de
criptografia orientados para o mercado, a necessidade de padronização nos
métodos de criptografia, a proteção da privacidade e dos dados pessoais,
o acesso coberto por dispositivos legais, a imputabilidade e a cooperação
internacional.
As regras enfatizam que as políticas nacionais sobre criptografia
devem respeitar os direitos fundamentais dos indivíduos à privacidade, à
confidencialidade da comunicação e à proteção dos dados pessoais.
Contudo, o princípio do acesso, conforme definido nas decisões legais,
permanece muito vago e pode ser interpretado de formas distintas, que
não fornecem proteção muito clara à privacidade. A OCDE e outros
fóruns, tais como as câmaras de comércio, estão inclinados a adotar um
sistema no qual as chaves de criptografia sejam depositadas com
organizações independentes. Uma questão que se levanta sobre essa
possibilidade é o que isso significaria no caso dos cidadãos que respeitam
a lei passem a obedecê-la, enquanto os criminosos desenvolvem seus
próprios sistemas de criptografia. Na União Européia, a maioria dos
governos tende a permitir aos usuários de meios eletrônicos de
transmissão que utilizem formas de criptografia, porém solicitando o
acesso nos casos em que for muito necessário.
Uma recomendação do Conselho da Europa relativa aos problemas
das leis sobre procedimentos criminosos com a tecnologia da informação
destaca a necessidade de minimizar os efeitos negativos da restrição da
criptografia para o processo criminal, ao mesmo tempo em que se permita
o uso legítimo das tecnologias. Em 8 de outubro de 1997, a Comissão
Européia emitiu uma recomendação, chamada Rumo a um Modelo
Europeu para Assinaturas Digitais e para Criptografia. A Comissão
enfatizou o significado de uma proteção forte da confidencialidade das
comunicações eletrônicas, pois estava preocupada com o fato de que a
restrição às tecnologias de criptografia pudesse afetar negativamente a
proteção à privacidade. Na verdade, a Comissão sentiu que as restrições
poderiam tornar os cidadãos comuns mais vulneráveis aos criminosos,
uma vez que esses últimos não se sentiriam constrangidos em utilizar
essas tecnologias.
A preferência individual em ser deixado sozinho e sem ser inco-
modado (direito à privacidade) conflita com o desejo de instituições
públicas e privadas de reunir informações sobre os indivíduos. O desen-
DIREITOS À COMUNICAÇÃO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
136
volvimento de tecnologias de informação e comunicação digitais aumentou
a tensão desse conflito, bem como o seu senso de urgência. A proteção aos
dados pessoais sempre foi um desafio difícil, mas com o desenvolvimento
de tecnologias, como a Internet, o esforço tem se tornado muito
desencorajador. Informações sobre como as pessoas utilizam a Internet são
coletadas de várias formas (tais como os chamados cookies), e cada ato no
ciberespaço contém um perigo real de invasão de privacidade. Usar um
correio eletrônico, por exemplo, implica, inevitavelmente, uma perda
considerável do controle sobre sua privacidade pessoal, a menos que os
usuários sejam treinados para o uso de técnicas de criptografia, enquanto
essas não sejam proibidas por lei.
Quando nos envolvemos em transações no ciberespaço, nós deixamos
um rastro digital por meio de cartões de crédito, de bônus e de visita. E
com o crescimento das transações online, a coleção de dados pessoais vai
aumentar. Eles não somente são atrativos para as empresas, para saber as
preferências de seus clientes, como são vendáveis a terceiros, gerando lucro.
Adquirir dados sobre o perfil biogenético de uma pessoa, bem como dados
de consumo, pode ser muito valioso para uma empresa de seguros, entre
outras. A combinação de informações sobre pressão alta e compra de
bebidas alcoólicas, por exemplo, ajuda a seguradora a definir o nível de
risco e também o preço que o cliente deverá pagar por sua apólice.
Dados pessoais estão armazenados em lugares conhecidos como
armazéns de dados (data warehouses). Com a ajuda de sistemas de
informação cada vez mais inteligentes, todos esses dados podem ser
analisados, detalhados e perfis pessoais podem ser compostos por meio
da combinação de dados de várias fontes. Isso permite que sejam
respondidas, em profundidade e com razoável acerto, perguntas sobre o
comportamento de certas categorias de clientes, o que implica, por um
lado, que eles podem ser melhor servidos pela venda de bens e serviços
customizados. Mas isso também aponta que a sua privacidade vai ser
progressivamente minada. Coletar, analisar e interpretar dados pessoais se
tornou uma indústria (data mining).
Propriedade corporativaAs leis de Direitos Humanos internacionais não contêm nenhum
dispositivo diretamente relacionado à questão da propriedade de infor-
mação e das organizações de comunicação. Não há padrões que regulem a
DIREITOS HUMANOS PARA A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
137
possibilidade de monopolização ou oligopolização, tanto da produção
quanto da distribuição de bens/serviços informacionais e comunicacionais.
Contudo, há uma série de dispositivos sobre a diversidade do conteúdo
cultural e das fontes de informação, a função social da informação, o
compartilhamento eqüitativo da informação e do conhecimento, e a
especificidade dos bens e serviços culturais, como algo mais do que
meramente bens de consumo. É difícil enxergar como esses dispositivos
podem ser combinados com a questão de um controle monopolista ou
oligopolista dos mercados de informação e comunicação. As implicações
dos dispositivos atuais sobre Direitos Humanos parecem apontar para a
necessidade de variedade de produtores e distribuidores de bens e serviços
de informação e comunicação que sejam independentes, e para uma mistura
equilibrada de propriedade privada, atores corporativos comerciais, atores
públicos e instituições sem fins lucrativos.
Os instrumentos relevantes• A Declaração Universal de Direitos Humanos (1948);
• A Convenção Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e
Culturais (1966);
• A Declaração da Organização Internacional do Trabalho sobre Prin-
cípios Relativos a Empreendimentos Multinacionais e Política Social (1977);
• A Declaração da ONU sobre o Direito ao Desenvolvimento (1986).
SOCIEDADES E DESENVOLVIMENTOSINFORMACIONAIS: RESUMO
Os dispositivos de Direitos Humanos relevantes para as interações entre
as sociedades e os desenvolvimentos informacionais podem ser resumidos na
tabela seguinte:
DIREITOS À COMUNICAÇÃO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
138
TABELA 1: DISPOSITIVOS DE DIREITOS HUMANOS
Dim ensões Dispositivos de Direitos Hum anos Tecnologia
Acesso à educação técnica Uso da tecnologia para prom over os Direitos Hum anos Com partilham ento eqüitativo dos benefícios da tecnologia Proteção contra os efeitos nocivos Participação na concepção de políticas públicas Atenção para as necessidades de grupos em situações de
desvantagem
Cultura
Auto-determinação do desenvolvim ento cultural Diversidade do trabalho criativo e conteúdos de m ídia Participação na vida cultural Reconhecimento de práticas culturais Com partilham ento dos benefícios do desenvolvim ento
científico Uso da língua materna Proteção da herança cultural Envolvim ento nas políticas culturais
Política
Liberdade de expressão Liberdade de opinião Proteção contra o incitam ento ao ódio e à discriminação Proteção à privacidade Proteção aos prisioneiros de guerra Presunção da inocência Responsabilidade de fornecer inform ações sobre questões
de interesse público Elim inação de conteúdos estereotipados
Econom ia
Auto-determinação do desenvolvim ento econôm ico Direito ao desenvolvim ento Proteção à Propriedade Intelectual Responsabilidade social em presarial Privacidade/segurança Propriedade corporativa
DIREITOS HUMANOS PARA A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
139
IMPLEMENTAÇÃOA mais importante questão para a significância e a validade do regime
de Direitos Humanos é o fortalecimento dos padrões que eles propõem.
FortalecimentoHá evidências abundantes de que esses padrões são quase inces-
santemente violados ao redor do mundo, por atores com variadas posições
políticas e ideológicas. Ao se analisar os relatórios anuais da Anistia
Internacional, por exemplo, parece que não há nenhum país onde os Direitos
Humanos não sejam violados. Para filósofos da moral, isso não é, na verdade,
surpreendente. Está relacionado ao clássico hiato entre o conhecimento moral
possuído por seres humanos e sua intenção de agir moralmente.Os mecanismos que a comunidade internacional desenvolveu para lidar
com o “hiato moral” são amplamente inadequados. Os atuais procedimentossão baseados principalmente no Protocolo Opcional (OP) à ConvençãoInternacional sobre Direitos Civis e Políticos (1966) e a Resolução 1503,adotada pelo Conselho Econômico e Social da ONU, em 1970. O protocoloautoriza ao Comitê de Direitos Humanos da ONU a receber e considerarcomunicações de indivíduos dos países signatários do OP (atualmente 75países) que aleguem serem vítimas de violações dos Direitos Humanos ou dequalquer um dos direitos estabelecidos na Convenção. Essas reclamações sãopublicadas como parte de um relatório sobre Direitos Humanos nos países.O OP dispõe sobre as comunicações, análise e relatório, mas não sobresanções. O Conselho Econômico e Social da ONU, em sua resolução 1503,reconhece a possibilidade de reclamações individuais sobre violações dosDireitos Humanos. Ela autoriza à Comissão de Direitos Humanos da ONUa examinar “comunicações, junto com as respostas dos governos, se houver,as quais aparentem revelar padrões consistentes de graves violações dosDireitos Humanos”. O procedimento estabelecido pela resolução 1503 élento, confidencial e não dá aos indivíduos o direito de recurso.
Adicionalmente ao papel da Comissão sobre Direitos Humanos daONU e do Comitê de Direitos Humanos de monitorar o cumprimento daConvenção Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, outros mecanismosinstitucionais para a implementação da mesma são o Comitê para a Eli-minação da Discriminação Racial, o Comitê para os Direitos Econômicos,Sociais e Políticos, o Comitê sobre a Eliminação da Discriminação contra aMulher, o Comitê contra a Tortura, o Comitê sobre os Direitos das Crianças.Embora o trabalho de todos esses organismos seja importante, a sua
DIREITOS À COMUNICAÇÃO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
140
autoridade para fortalecer os padrões dos Direitos Humanos é muitolimitada. Seus membros são representantes dos países. Descobertas daComissão têm um certo significado, mas não são vinculantes.
O Comitê de Direitos Humanos da Convenção Internacional sobre
Direitos Civis e Políticos consiste de 18 especialistas que supervisionam a
implementação da Convenção. O trabalho do Comitê cobre apenas os
Estados que assinaram a Convenção (atualmente 129 países) e fornece
monitoramento internacional com base nos relatórios feitos pelos países. O
monitoramento do Comitê não resulta em qualquer sanção, mas pode gerar
alguma publicidade negativa com relação ao desempenho de determinado país
no campo dos Direitos Humanos.
O Comitê sobre a Eliminação da Discriminação Racial foi estabelecido
para a implementação da convenção sobre discriminação racial. Ele pode
receber reclamações de estados, mas apenas 14 estados autorizaram o Comitê
a receber reclamações de indivíduos.
O órgão de implementação da Convenção sobre a Eliminação da
Discriminação contra a Mulher é o Comitê sobre a Eliminação da Dis-
criminação contra a Mulher, que é autorizado a receber comunicações de
indivíduos. O Comitê sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais não
tem direito de receber reclamações de indivíduos ou grupos. Em seu relatório
à Conferência Mundial sobre Direitos Humanos da ONU, de 1993, o Comitê
pediu por um procedimento formal para reclamações:
“Uma vez que a maioria dos dispositivos da Convenção (e mais nota-velmente aqueles relativos à educação, saúde, alimentação e nutrição, ehabitação) não são alvo de qualquer escrutínio detalhado em nívelinternacional, é mais improvável que eles venham a ser objeto de exameno nível nacional” (ONU, 1993a: parágrafo 24).
Em 1997, a 53ª sessão da Comissão sobre Direitos Humanos da ONU
discutiu uma minuta de protocolo para um procedimento de reclamações e, em
uma resolução, afirmou o interesse dos seus membros na minuta. Este foi o
primeiro passo no longo processo que culminou no Protocolo Opcional.
Para a Convenção sobre os Direitos da Criança, as instituições e
procedimentos para um fortalecimento sério dos direitos são amplamente não
efetivos. Em 1991 os países signatários da Convenção elegeram pela primeira
vez um órgão de monitoramento para a Convenção: o Comitê sobre os
DIREITOS HUMANOS PARA A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
141
Direitos da Criança. Composto por 10 especialistas, este comitê reúne-se três
vezes por ano para examinar os relatórios de implementação que são
submetidos pelos países-membros que aceitaram o dever (artigo 44 da
Convenção) de relatarem regularmente os passos tomados para implementar
a Convenção. Contudo, um importante trabalho do Comitê, o de reforçar os
padrões da Convenção, é severamente limitado. Além do mais, a Convenção
não permite que sejam recebidas reclamações individuais de crianças ou de
seus representantes sobre eventuais violações.
Os obstáculosAdicionalmente à fraqueza dos mecanismos formais de fortalecimento
(as condições “internas”), as seguintes condições “externas” impedem a
implementação efetiva dos dispositivos de Direitos Humanos:
• A ampla falta de conhecimento ao redor do mundo sobre a existência
dos Direitos Humanos. Há muitos esforços no campo da educação para os
Direitos Humanos, mas, no momento, o comprometimento com recursos
para esses esforços é claramente insuficiente;
• A atual suspensão, em nível mundial, de Direitos Humanos fundamentais,
em função da guerra ao terrorismo ou da proteção à segurança nacional;
• A ausência de vontade política de comprometer recursos adequados
para a realização dos Direitos Humanos;
• O alargamento do “hiato digital” (digital divide) entre e intra-
sociedades e a recusa comum dos elaboradores das políticas públicas de
enxergar o hiato digital e sua solução como parte da vontade política de
resolver o problema do alargamento;
• O existente, e em expansão, regime para a proteção dos direitos à
Propriedade Intelectual, que impede o acesso eqüitativo à informação e ao
conhecimento;
• A tendência a sujeitar bens e serviços culturais às regras do regime da
Organização Mundial do Comércio e a recusa de isentar a cultura das
políticas internacionais de comércio, que ameaçam a diversidade cultural;
• A apropriação de muito do conhecimento técnico mundial por
corporações privadas e a recusa dos detentores da tecnologia em concordar
com padrões internacionais para transferência de tecnologia;
• O controle corporativo monopolista ou oligopolista sobre a produção
e distribuição dos bens e serviços informacionais e comunicacionais;
DIREITOS À COMUNICAÇÃO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
142
• A proliferação, em nível mundial, de um jornalismo orientado para o
mercado, com subinformação – quando não desinformação – do público ao
redor do mundo no tocante à questões de interesse público;
• As perspectivas limitadas dos Direitos Humanos como sendo princi-
palmente, ou mesmo tão somente, direitos individuais. Isto ignora o fato que
as pessoas comunicam-se e se envolvem em práticas culturais, como
membros de comunidades, e impede o desenvolvimento de fontes indígenas
de informação e de conhecimento.
O DIREITO HUMANO À COMUNICAÇÃONão importa qual a forma de desenvolvimento que será seguida pelas
Sociedades da Infomação, nós provavelmente veremos diferentes padrões
para o trânsito da informação entre as pessoas. Seguindo uma proposta de
Bordewijk e Vann Kaam (1982), quatro padrões podem ser distinguidos:
• A disseminação de mensagens (Bordewijk e Van Kaam chamam isso
de “alocução”);
• A consulta à informação (como em bibliotecas ou na Web);
• O registro de dados (para fins públicos ou privados);
• O intercâmbio de informação entre pessoas (a modalidade da
conversação).
Levantamento sobre os Direitos Humanos existentes pertinentes aos
desenvolvimentos informacionais mostra que eles cobrem principalmente a
disseminação, a consulta e o registro de informações:
• Os Direitos Humanos para a disseminação tratam das questões da
liberdade do discurso e suas limitações.
• Os Direitos Humanos relativos à consulta tratam das questões do
acesso e da confidencialidade.
• Os Direitos Humanos relativos ao registro tratam das questões da
privacidade e da segurança.
A tabela seguinte dá um panorama.
Padrões Dispositivos de Direitos HumanosDisseminação Liberdade de ExpressãoConsulta Acesso à informaçãoRegistro Proteção da privacidade
DIREITOS HUMANOS PARA A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
143
Embora os três primeiros padrões estejam cobertos, há grande omissão
nos Direitos Humanos internacionais com relação a dispositivos sobre o
quarto padrão – a conversação, ou a comunicação no sentido específico do
termo. Praticamente todos os dispositivos de Direitos Humanos referem-se à
comunicação como “transferência de mensagens”. Isto reflete uma inter-
pretação da comunicação que se tornou bastante comum desde que Shannon
e Weaver (1949) introduziram a teoria matemática da comunicação. O seu
modelo descreve a comunicação de forma linear, como um processo de mão
única. Isto é, contudo, uma concepção muito limitada e por vezes enganosa de
comunicação, por ignorar o fato de que, na essência, “comunicar” refere-se a
um processo de compartilhar, tornar comum ou criar uma comunidade.
Comunicação é utilizada para a disseminação de mensagens (tal como no
caso dos meios de comunicação de massa), para a consulta às fontes de
informação (como pesquisas em bibliotecas ou buscas na World Wide Web),
para o registro de informações (como acontece nos bancos de dados) e para
as conversas das quais as pessoas participam.
As leis existentes de Direitos Humanos, asseguradas pelo artigo 19 da
DUDH e artigo 19 da Convenção Internacional sobre Direitos Civis e
Políticos, cobrem o direito fundamental à liberdade de opinião e de ex-
pressão. Isto é, indubitavelmente, uma base essencial para o processo de
diálogo entre as pessoas, mas não se constitui como tráfego de mão dupla.
É a liberdade de expressão do mendigo que fala em uma esquina, e a quem
ninguém tem que ouvir, e que pode não estar se comunicando com ninguém.
O artigo também se refere à liberdade de ter opiniões: isto se refere às
opiniões dentro da cabeça das pessoas, que podem servir para a comunicação
consigo mesmo, mas não necessariamente traz uma obrigatoriedade de
comunicação com outros. Menciona o direito de buscar informações e idéias:
dispõe para o processo de consultar e reunir notícias, por exemplo, o que é
diferente de comunicar. Também há o direito a receber informação e idéias,
o que é também, em princípio, um processo de mão única: o fato de que eu
possa receber quaisquer informações ou idéias que eu queira não implica que
eu esteja envolvido em um processo comunicacional. Finalmente, há o direito
a disseminar informações ou idéias: isso se refere à disseminação/alocução
que vai além da liberdade de expressão, mas da mesma forma não implica em
diálogo ou intercâmbio. Em suma, os dispositivos dos artigos tratam apenas
de um processo de mão-única de transporte, recepção, consulta e alocução,
mas não do processo de mão-dupla, que é a conversação.
DIREITOS À COMUNICAÇÃO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
144
Questão crucial para este capítulo é como esta omissão pode ser
remediada. Em 1969, Jean d’Arcy introduziu o Direito à Comunicação, ao
escrever “vai chegar o tempo em que a Declaração Universal dos Direitos
Humanos vai ter que abranger um direito mais extensivo do que o direito
humano à informação. (...) Este é o direito do homem a comunicar”. (D’Arcy
1969:14). A comunicação precisa ser entendida como um processo interativo.
As regras adotadas foram criticadas por focarem muito no conteúdo do
processo. “É a informação, por si mesma, que é protegida” (Fisher 1983:8).
“As declarações anteriores sobre a liberdade de comunicação ... implicavam
que a liberdade de informação era um direito de mão única de um nível mais
elevado para um nível mais baixo” (Fisher 1983:9). Há uma crescente
necessidade de participação: “mais e mais pessoas podem ler, escrever e usar
equipamentos de transmissão em massa, e não podem mais continuar a ter
acesso negado à participação nos processos de mídia por ausência de
comunicação ou habilidades manuais” (Fisher 1983:9).
O direito de comunicar é percebido por seus protagonistas como mais
fundamental do que o direito à informação, como atualmente disposto pelas
leis internacionais. A essência do direito seria baseada na observação deque a comunicação é um processo social fundamental, uma neces-
sidade humana básica e o fundamento de todas as organizações
sociais. A idéia foi introduzida no âmbito da Unesco desde 1974. A 18ª
sessão da Conferência Geral da Unesco, em sua resolução 4.121, afirmou que
“todos os indivíduos devem ter acesso igual às oportunidades de participação
ativa nos meios de comunicação e de se beneficiar de tais meios, enquanto
preservam o direito à proteção contra seus abusos”.
A resolução autorizou então o diretor geral a “estudar caminhos e
meios pelos quais uma participação ativa no processo de comunicação
possa se tornar possível e analise o direito de comunicar”. Em maio de
1978, o primeiro seminário de especialistas da Unesco sobre o direito de
comunicar teve lugar em Estocolmo (em cooperação com a Comissão
Nacional da Suécia, da Unesco). Os participantes identificaram diferentes
componentes do conceito do direito a comunicar. Esses incluem o direito
à participar, a acessar os recursos de comunicação e o direito de
informação. A reunião concordou que grupos devem ter os direitos de
acessar e participar do processo de comunicação. Também foi destacado
que deve ser dada especial atenção com relação ao Direito à Comunicação
de várias minorias – nacionais, étnicas, religiosas e lingüísticas” (Fisher
DIREITOS HUMANOS PARA A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
145
1982:43). Em resumo, a reunião de Estocolmo concluiu que: “O conceito
do direito de comunicar coloca problemas ‘grandes e complexos’, que
requerem um panorama maior do que o fornecido por qualquer backgroundcultural, qualquer disciplina profissional ou qualquer órgão particular de
experiência profissional. E embora alguns dos aspectos do conceito sejam
desconfortáveis para alguns dos participantes e observadores, esses mesmos
participantes e observadores também achavam, de uma forma geral, o
conceito como esperançoso e encorajador” (Fisher 1982:45).
Ainda que a reunião de Estocolmo tenha fornecido ampla análise do
direito a comunicar nos níveis individual e comunitário, um segundo
seminário de especialistas, focado na dimensão internacional do direito a
comunicar, foi realizado durante a Reunião de Especialistas sobre o Direito
a Comunicar, em Manila. Essa reunião foi organizada em parceria com a
Comissão Nacional da Unesco nas Filipinas e teve lugar de 15 a 19 de
outubro de 1979. Os participantes propuseram que o direito a comunicar seja
tanto um direito individual quanto social. Como um Direito Humano
fundamental, ele deveria ser incorporado à DUDH. Ele tem validade nacional
e internacional, abrange deveres e responsabilidades para indivíduos, grupos
e nações e requer a alocação de recursos apropriados.
Em seu relatório final, a Comissão MacBride, designada pela UNESCO,
concluiu que o reconhecimento desse novo direito “promete fazer avançar
a democratização da comunicação” (Comissão Internacional para o Estudo
dos Problemas da Comunicação, 1980:173). A Comissão declarou que
“as necessidades de comunicação em uma sociedade democrática devem
ser atendidas pela extensão dos direitos específicos, tais como o direito
a ser informado, o direito a informar, o direto à privacidade, o direito
a participar na comunicação pública – todos elementos de um novo
conceito, o direito de comunicar. No desenvolvimento do que cha-
mamos de uma nova era de direitos sociais, nós sugerimos que todas as
implicações do direito de comunicar sejam explorados mais profun-
damente” (Comissão Internacional para o Estudo dos Problemas da
Comunicação, 1980:265).
A Comissão também observou que a “liberdade do discurso, da
imprensa e de reunião são vitais para a realização dos Direitos Humanos. A
extensão dessas liberdades de comunicação para um direito individual e
DIREITOS À COMUNICAÇÃO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
146
coletivo mais abrangente, o direito de comunicar, é um princípio evolutivo
do processo de democratização” (Comissão Internacional para o Estudo dos
Problemas da Comunicação, 1980:265). De acordo com a Comissão, “o
conceito de ‘direito de comunicar’ ainda tem que receber sua forma final e
seu conteúdo pleno ... ainda está no estágio de ser pensado através de todas
as suas implicações e ser gradualmente enriquecido” (Comissão Internacional
para o Estudo dos Problemas da Comunicação, 1980:173).
A Conferência Geral da Unesco de 1980, em Belgrado, em sua resolução
4/19,14, definiu direito de comunicar como sendo o “respeito ao direito do
público, de grupos étnicos e sociais e de indivíduos de ter acesso à fontes de
informação e de participar ativamente no processo de comunicação”.
A Conferência Geral da Unesco de 1983, em Paris, adotou a resolução
3.2 sobre o direito de comunicar: “retomando que o objetivo não é substituir
a noção de direito de comunicar por quaisquer outros direitos que já são
reconhecidos pela comunidade internacional, mas aumentar o seu escopo
com relação a indivíduos e os grupos que eles formam, particularmente em
vista das novas possibilidades de comunicação ativa e diálogo entre culturas
que são abertas pelos avanços nas mídias”.
A 23ª Conferência Geral da Unesco, em 1985, em Sofia, solicitou ao
diretor-geral que desenvolvesse atividades para a realização do direito de
comunicar. No início dos anos 1990, o direito de comunicar havia pratica-
mente desaparecido da agenda da Unesco. Não era mais um conceito crucial
no Plano de Médio-Prazo para 1990-95. O direito de comunicar foi men-
cionado, mas não convertido em ações operacionais.
Em 1992, Pekka Tarjanne, secretária-geral da União Internacional de
Telecomunicações (UIT) levantou a questão do direito de comunicar e
afirmou “eu sugeri aos meus colegas que a Declaração Universal dos Direitos
Humanos deve ser emendada para reconhecer o direito de comunicar como
um direito humano fundamental” (Tarjanne 1992:45). Durante os prepa-
rativos para o Encontro Mundial da ONU sobre a Sociedade da Informação
(WSIS), que foi realizado em 2003, em Genebra e será continuado em 2005,
na Tunísia, a discussão sobre o direito de comunicar se revitalizou. Isto
ocorreu devido, particularmente, às atividades da campanha dos Direitos àComunicação na Sociedade da Informação (CRIS), durante as reuniões preparatórias
do Comitê (em julho de 2002 e fevereiro de 2003). É especialmente
significativo que a Secretaria Geral da ONU, em sua mensagem pública no
DIREITOS HUMANOS PARA A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
147
Dia Mundial das Telecomunicações (17 de maio de 2003), tenha lembrado à
comunidade internacional que “milhões de pessoas nos países mais pobres
ainda são excluídas do direito de comunicar, cada vez mais visto como um
direito humano fundamental”.4 Em sua evolução, o direito de comunicar não
ficou isento de críticas. Desmond Fisher escreveu, ainda em 1982:
“O direito de comunicar abraça um espectro muito mais amplo de
liberdades de comunicação do que as formulações anteriores, as quais
falharam em conseguir apoio geral por causa da incerteza sobre suas
conseqüências práticas. Inevitavelmente, a nova formulação vai
encontrar uma oposição ainda maior” (Fisher 1982:34).
Ao longo do debate, foi continuamente levantada a objeção de que “a
comunicação é uma parte tão integral da condição humana que é
filosoficamente desnecessário e talvez equivocado descrevê-la como um
direito humano” (Fisher 1982:41). Outra objeção apontava para o possível
uso do conceito por parte de grupos poderosos na sociedade: “O conceito
tem que ser interpretado e isso vai ser feito pelos grupos no poder, não pelos
mais fracos ou oprimidos. Limites vão ser fixados dentro dos quais o direito
de comunicar pode ser exercido. Esses limites vão ser definidos politicamente
e vão favorecer as atuais relações de poder no mundo. O direito de comunicar
não é um conceito que leva para uma mudança; é uma tentativa de dar a
grupos que trabalham em prol de uma liberação um sentimento de que são
levados a sério, enquanto, na prática, o direito de comunicar vai ser usado para
preservar a atual ordem do mundo e, talvez, para consolidá-la ainda mais”
(Hedebro 1982:68).
A oposição ao direito de comunicar veio de diferentes pontos de vista
ideológicos. “O conceito do direito de comunicar é alvo de desconfiança das
nações ‘ocidentais’ que o vêem como parte dos propósitos relativos à Nova
Ordem Informacional e Comunicacional mundial, sobre os quais eles têm
muitas suspeitas... Em alguns países socialistas e do Terceiro Mundo, a
oposição ao direito origina-se no fato de que ele possa ser usado para justificar
a continuidade do presente desequilíbrio massivo no fluxo de informações e
4. (N.T.) Mensagem do Secretário-Geral da ONU por ocasião do Dia Mundial das
Telecomunicações, www.itu.int/newsroom/wtd/2003/unsg_message.html, acessado em
23/10/2003.
DIREITOS À COMUNICAÇÃO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
148
para importação irrestrita de tecnologia e informação ocidental e, conse-
qüentemente, valores ocidentais” (Fisher 1982:34).
O governo dos Estados Unidos se opôs ao direito de comunicar nos
debates iniciais e denunciou o conceito como artimanha comunista. Em sua
rejeição, o principal argumento foi a ligação entre o direito de comunicar e
a noção dos direitos das pessoas. Embora a referência às pessoas e aos
direitos das pessoas seja muito comum na história política dos Estados
Unidos, no contexto da Unesco isso foi visto como defesa dos direitos dos
países e uma ameaça aos direitos individuais.
Uma questão importante para a discussão do direito humano de comunicar
é saber se a expansão do regime de Direitos Humanos como um novo direito vai
ameaçar os dispositivos já existentes. A lei internacional é um processo vivo e o
catálogo dos Direitos Humanos tem crescido consideravelmente ao longo dos
últimos anos para incluir novos direitos e liberdades, sem ameaçar os padrões
básicos formulados pela DUDH. E, na verdade, não deveria haver razão para
problemas com a adição do direito de comunicar, uma vez que tudo o mais
permanecerá do mesmo jeito. A última coisa que alguém tentaria fazer é abrir a
discussão sobre os artigos da DUDH e revê-los. Esse seria um caminho muito
perigoso hoje, porque a comunidade internacional certamente não adotaria um
documento tão amplo quanto a DUDH de 1948.
Outro importante ponto levantado na discussão presente sobre o direito
de comunicar é se esse novo direito leva ou não a um abuso por parte de
governos. Todos os dispositivos das leis internacionais podem ser des-
respeitadas por parte de governos. Mesmo a Carta da ONU pode ser
interpretada por um país membro de formas deturpadas. Adotar um padrão
internacional sobre comunicação é mais um problema para governos anti-democráticos do que o direito à liberdade de expressão. Permitir que aspessoas falem livremente nas esquinas ameaça menos um governo do quepermitir que as pessoas se comuniquem livremente umas com as outras. O
direito à liberdade de comunicação vai ao âmago do processo democrático,
e é muito mais radical do que o direito à liberdade de expressão! A tentativa
de ter um direito de comunicar adotado pela comunidade internacional
deverá, desta forma, ter uma grande resistência.
Para os protagonistas do direito de comunicar há várias possibilidades
de ação. Primeiro, há uma trajetória na lei internacional formal, onde o finaldesejado é a incorporação do direito de comunicar nas leis de Direitos
Humanos internacionais. Essa rota implica a preparação de uma formulação
DIREITOS HUMANOS PARA A SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
149
(na forma de uma resolução ou declaração) que seria dotada por uma
Conferência Intergovernamental, como a Cúpula Mundial da Sociedade da
Informação (WSIS), ou pela Conferência Geral de uma das agências da
ONU, como a Unesco. Eventualmente, essa abordagem pode levar a uma
Conferência Especial da ONU a fazer uma Minuta de Convenção.
Segundo, há um caminho pelo qual os representantes dos movimentos da
Sociedade Civil adotam uma declaração do direito de comunicar como um
documento inspirador, ferramenta educacional ou como guia para a ação social.
Eles não buscam o consentimento de outros setores, como o governo ou
empresas, um exemplo dessa abordagem é a Carta de Comunicação das Pessoas.
Terceiro, há a opção de expandir a comunidade de países que adotam,
tal direito, usando o exemplo da Declaração de Hague sobre o Futuro da
Política de Migração e Refugiados. Esta declaração surgiu de uma reunião
patrocinada pela Sociedade para o Desenvolvimento Internacional (novembro
de 2002) e os signatários eram indivíduos da Sociedade Civil, governo e
empresários. Tal declaração funcionou como um lembrete para a comunidade
internacional dos padrões relevantes e sugere ações futuras.
CONCLUSÃONo final de 2003 e novamente em 2005, a Cúpula Mundial da Sociedade da
Informação (WSIS), reunida pela ONU trata de algumas das questões mais
importantes no campo da informação e da comunicação. O encontro é inspirado
por uma necessidade de encontrar uma visão comum sobre os desenvolvimentos
informacionais que atualmente afetam a maioria das sociedades e que são
convenientemente reunidos sob o título de “Sociedade da Informação”.
A conquista mais significativa da comunidade internacional, desde a II
Guerra Mundial, foi a articulação e a codificação de um amplo espectro de
Direitos Humanos fundamentais. Pareceria, então, lógico que um modelo
normativo de padrões de Direitos Humanos deveria moldar essa visão
comum. De fato, nas últimas décadas a comunidade internacional tem
adotado e muitas vezes confirmado leis vinculantes e uma variedade
impressionante de padrões relativos à informação e à comunicação. Este
capítulo fez um panorama desses dispositivos e apontou para o problema
maior: a ausência de implementação.
Seguindo essa análise, a WSIS pode lembrar à comunidade internacional de
tudo o que já foi conquistado e destacar a importância de seriamente identificar
e remover os maiores obstáculos à necessidade urgente de implementação dos
DIREITOS À COMUNICAÇÃO NA SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO
150
dispositivos existentes. A Cúpula também pode apontar que a omissão essencial
nos “Direitos Humanos para a Sociedade da Informação” é a ausência de
dispositivos de Direitos Humanos concernentes ao modo de conversação da
comunicação ou a comunicação como um processo interativo. Como o
Secretário-Geral da ONU, Kofi Annan, declarou em sua mensagem no Dia
Mundial das Telecomunicações (17 de maio de 2003), o objetivo básico da
Cúpula é ajudar todas as pessoas do mundo a se comunicar.
“Se, de fato as pessoas do mundo, podem ser ajudadas a participar nasconversações públicas e privadas que afetam suas vidas, a comunidadeinternacional vai ter que assegurar condições sob as quais esse processopossa ter lugar. A comunicação conversacional entre indivíduos e grupos,seja em público ou em particular, deve ser protegida contra interferênciaindevida de terceiros. Precisa de confidencialidade, espaço e tempo, erequer o aprendizado da ‘arte da conversação’. Também pede recursospara conversações multilingüísticas, e para a inclusão das pessoas emsituação de desvantagem. Tudo isso requer o compromisso de umacomunidade de multistakeholders – governos, organizaçõesintergovernamentais, Sociedade Civil e empresas. Uma declaração daWSIS sobre o ‘direito de comunicar’ pode transmitir ao mundo um fortesinal para a mobilização em prol desse compromisso”.5
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Cees J. Hamelink é professor de Comunicação Internacional na Universiteit van Amsterdandesde 1984. Desde 2001 é docente também na área de Mídia, Religião e Cultura na VrijeUniversiteit em Amsterdan. Tem seu Ph.D. junto à Universidade de Amsterdan, onde estudou
Teologia e Psicologia. É editor-chefe do periódico científico Gazette The International Journalfor Communication Studies. Tem mais de 16 livros escritos na área de mídias, ICT e Direitos
Humanos.