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DOGMÁTICA ELEMENTAR DO DIREITO DE GREVE

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DOGMÁTICA ELEMENTAR DO DIREITO DE GREVE

1ª edição — 2014

2ª edição — 2015

ESTÊVÃO MALLETProfessor de Direito do Trabalho da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.

Conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil — Secção de São Paulo; Advogado.

DOGMÁTICA ELEMENTAR DO DIREITO DE GREVE

2ª edição

EDITORA LTDA.

© Todos os direitos reservados

Rua Jaguaribe, 571CEP 01224-001São Paulo, SP — BrasilFone (11) 2167-1101www.ltr.com.br

Junho, 2015

versão impressa — LTr 5306.1 — ISBN 978-85-361-8483-8 versão digital — LTr 8749.2 — ISBN 978-85-361-8493-7

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Mallet, Estêvão

Dogmática elementar do direito de greve / Estêvão Mallet. — 2. ed. — São Paulo : LTr, 2015.

Bibliografia.

1. Direito de greve 2. Direito de greve — Brasil 3. Direito do trabalho — Brasil 4. Greves I. Título.

15-04511 CDU-34:331.89 (81)

Índice para catálogo sistemático:

1. Brasil : Direito de greve : Direito do trabalho 34:331.89 (81)

Para Olinda, sempre e sempre

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Índice

PREFÁCIO ................................................................................................... 9

APRESENTAÇÃO ..................................................................................... 11

I — CONSIDERAÇÕES GERAIS .............................................................. 151. Introdução ............................................................................................... 15

1.1. A greve como delito ................................................................... 161.2. A greve como liberdade ............................................................ 171.3. A greve como direito ................................................................. 17

2. A greve no direito internacional .......................................................... 183. A greve no direito positivo brasileiro ................................................. 204. A greve como direito fundamental ..................................................... 215. Etimologia .............................................................................................. 28

II — ELEMENTOS CONCEITUAIS .......................................................... 306. Conceito de greve .................................................................................. 30

6.1. Dimensão subjetiva .................................................................... 306.2. Duração no tempo ...................................................................... 33

7. Movimento coletivo ............................................................................... 368. Forma ....................................................................................................... 429. Fundamentos da greve .......................................................................... 47

9.1. Nem todo fundamento pode ser admitido ............................. 489.2. Reivindicação de natureza profissional .................................. 50

9.2.1. Obrigação já existente .................................................. 509.2.2. Criação de novas condições de trabalho ................... 51

9.3. Greve de solidariedade ............................................................. 539.4. Greve política .............................................................................. 55

10. Efeitos da greve sobre o contrato de trabalho ................................... 5810.1. Greve e salários........................................................................... 6110.2. Tempo de serviço ....................................................................... 6610.3. Greve e contrato interrompido ou suspenso .......................... 6710.4. Contratos a prazo ....................................................................... 69

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III — PROTEÇÃO LEGAL DA GREVE.................................................... 7011. Medidas de proteção da greve ............................................................. 7012. Piquetes e arrecadação de fundos ....................................................... 70

12.1. Realização de piquetes .............................................................. 7112.2. Arrecadação de fundos ............................................................... 74

13. Constrangimento de grevistas ............................................................. 7514. Proibição de dispensas e contratações ................................................ 77

14.1. Proibição de dispensa de empregados .................................... 7714.2. Proibição de contratação de trabalhadores substitutos ........ 79

IV — PROCEDIMENTO LEGAL ............................................................... 8515. Procedimento .......................................................................................... 8516. Tentativa de negociação ........................................................................ 8517. Aprovação da paralisação .................................................................... 8618. Aviso prévio ............................................................................................ 8819. Suspensão do trabalho .......................................................................... 93

19.1. Adesão ......................................................................................... 9319.2. Desenvolvimento da greve ....................................................... 9519.3. Término ....................................................................................... 96

20. Manutenção dos serviços mínimos ..................................................... 98

V — ATIVIDADES ESSENCIAIS .............................................................. 10021. Greve em atividades essenciais ........................................................... 10022. Rol de atividades.................................................................................... 10023. Atividades essenciais e necessidades inadiáveis da comunidade .. 106

VI — ABUSO E RESPONSABILIDADE .................................................. 11524. Abuso ....................................................................................................... 11525. Responsabilidade ................................................................................... 120

25.1. Responsabilidade trabalhista do empregado frente ao em-pregador ...................................................................................... 120

25.2. Responsabilidade do sindicato e dos empregados pelos pre-juízos causados com a greve .................................................... 122

25.3. Limitação da responsabilidade aos agentes ........................... 12425.4. Responsabilidade, composição e anistia ............................... 129

VII — GREVE E DISSÍDIO COLETIVO ................................................. 13126. Greve e dissídio coletivo ....................................................................... 13127. Dissídio coletivo de greve antes da Emenda Constitucional n. 45 . 13128. Dissídio coletivo de greve após a Emenda Constitucional n. 45 .... 132

BIBLIOGRAFIA ........................................................................................ 137

JURISPRUDÊNCIA ESTRANGEIRA ....................................................... 145

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Prefácio da segunda edição

O esgotamento da primeira edição menos de um ano após o seu lançamento permitiu que se revisse o texto publicado. A revisão feita envolveu, em primeiro lugar, a redação. Além da eliminação de lapsos de escrita antes não identificados, procurou-se aprimorar o estilo, redigindo- -se novamente uma ou outra passagem, na busca de expressão mais leve e adequada. De outro lado, algumas informações, lançadas até então em notas, passaram ao corpo do texto, para tornar a leitura mais fluída, menos sincopada. Também a sistematização de certos itens foi modificada, com introdução de subdivisões, de forma a facilitar a busca da informação. Deu- -se um pouco mais de amplitude a certos pontos do estudo, em particular no tocante ao tema da responsabilidade decorrente da greve, algo tão importante na prática, com o que se debatem os tribunais constantemente, e que é muito pouco estudado pela doutrina, pelo menos a brasileira. A jurisprudência citada, nacional e estrangeira, foi também ampliada, com indicação de novos precedentes, surgidos após a conclusão da edição anterior, e de antigos, na altura não localizados ou indevidamente omitidos. Manteve-se a referência constante ao direito comparado, com menção de outros sistemas jurídicos, antes não cogitados. Muitas vezes compreende-se melhor o direito nacional quando se pode cotejá-lo com outros ordenamentos. Outras vezes, o direito comparado, que se ocupa do mesmo assunto, mas com uma expressão formal diversa, indica como pode ser melhor interpretado o direito nacional. Por fim, ampliou-se a bibliografia, com a adição de quase duas dezenas de novos textos, para que o leitor, desejoso de aprofundar a reflexão, saiba mais facilmente onde encontrar material para pesquisa. Espera-se que essa nova edição possa encontrar a mesma acolhida da anterior e se revele de alguma utilidade para quem a venha a consultar.

São Paulo, fevereiro de 2015.

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Apresentação

A greve algumas vezes é vista e tratada como algo patológico ou como forma de ruptura da normalidade. Chega-se a apresentá-la como sinônimo de desordem ou desorganização. Em verdade, cuida-se, no entanto, de algo que nada tem de exorbitante e que faz parte da realidade produtiva fundada no trabalho livre. Longe está de ser mera situação de distúrbio. É, ao contrário, o natural contrapeso da preeminência econômica do tomador de serviço em face de quem vive do trabalho, contrapeso com o qual se procura equilibrar um pouco uma relação em que predomina a desigualdade fática(1). Segundo assinalado em decisão do Tribunal Constitucional de Portugal, o direito de greve é reconhecido “como forma de dar força aos trabalhadores para reequilibrar uma relação (a relação laborativa de conflito) que, em si mesma, é uma relação descompensada”(2). Mais ainda, a greve é componente essencial de sistema jurídico em que se pretenda tenha a negociação coletiva papel de alguma relevância a desempenhar, como se dá no direito brasileiro. Afinal, é bastante difícil conceber a negociação coletiva sem a possibilidade de suspender-se a prestação de serviço. O que os trabalhadores cedem ou têm a oferecer, ao negociar com o empregador, é justamente não exercer o direito de deixar de prestar serviços. Se esse direito não existe, ficam eles enfraquecidos, e a própria possibilidade de negociar perde muito de seu sentido. Em resumo, há estreita relação entre negociação coletiva e greve.

Sem embargo, os desdobramentos da greve são muito variados, e a complexidade do fenômeno por ela revelado, inclusive do ponto de vista jurídico, envolve a consideração de diferentes aspectos. O texto que se segue examina os principais deles, essencialmente sob a perspectiva da dogmática

(1)  Em termos próximos, Hélène Sinay, La grève, Paris, Dalloz, 1966, n. 39, p. 90, e, com a alusão à greve como um dos instrumentos para a remoção de obstáculos econômicos e sociais limitativos da igualdade e da liberdade dos cidadãos, consoante o enunciado do art. 3, n. 1, da Constituição italiana de 1947, cf. Gigno Giugni, Diritto sindacale, Bari Cacucci, 1975, p. 195. Também assim, ainda que de modo muito ligeiro, Ubaldo Prosperetti, Il lavoro subordinato, Milano, Francesco Vallardi, 1964, n. 105, p. 140.(2)  Acórdão n. 480/89, Processo n. 604/88, decisão de 13.7.1989; a passagem transcrita encontra-se no item 11 da decisão.

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legal. A tônica não é a da sociologia da greve, da história da greve, da política da greve e tampouco a da tática ou técnica da greve, sobre o que se poderia escrever longamente. A tônica é a da regulamentação jurídica da greve. O propósito é compreender a evolução do tratamento legal da greve, sua definição, a repercussão de seus fundamentos sobre a legitimidade do movimento e seus efeitos sobre o contrato de trabalho, a proteção que lhe é conferida, o respectivo procedimento, as atividades essenciais, o abuso no exercício do direito, a responsabilidade por sua deflagração e sua relação com o dissídio coletivo de trabalho. Examinam-se tais questões sob a perspectiva do direito positivo brasileiro em vigor. De qualquer sorte, recorre-se, com alguma frequência, ao direito estrangeiro, seja à legislação, seja à jurisprudência, como forma de ilustrar melhor os problemas enfrentados e de apresentar a solução vigente em outros países, sem perder de vista as peculiaridades do sistema nacional. Não se pretende um tratado amplo e completo da matéria. Ao contrário, o estudo é intencionalmente limitado e objetivo. Daí o título da obra, Dogmática elementar do direito de greve, com o qual se indica o caráter básico e introdutório do texto. Para maior desenvolvimento do assunto, o leitor deve recorrer à bibliografia citada, que se buscou apresentar com boa largueza.

Espera-se que a publicação, integrada por alguma referência aos precedentes judiciais nacionais e estrangeiros, possa ser de utilidade tanto aos práticos — advogados, juízes e procuradores — como aos estudiosos do Direito do Trabalho. Se assim for, terá atingido o objetivo a que se propôs seu autor quando começou a escrevê-la, animado pela advertência que encontrou registrada em uma parede, na Universidade de Stanford: “We must not desire all to begin by perfection. It matters little how we begin provided we be resolved to go on well and end well”. Quer o autor deixar registrado, antes de encerrar esta apresentação, seu profundo e sincero agradecimento a José Pedro de Camargo Rodrigues de Souza, que leu com muita atenção e paciência os manuscritos. Não fossem seu cuidado e suas sugestões, mais numerosos seriam os erros. É claro que os outros que ficaram não são de sua responsabilidade.

São Paulo, outubro de 2013.

“A vida do direito é uma luta: luta dos povos, do Estado, das classes, dos indivíduos. Todos os direitos da humanidade foram conquistados na luta...”

Jhering, A luta pelo direito

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I. Considerações Gerais

1. Introdução

É conhecida a clássica tripartição de Calamandrei em torno da disciplina legal da greve como delito, como liberdade ou como direito, formulada pouco tempo depois da entrada em vigor da Constituição italiana de 1947(1). Mais do que a indicação de fases historicamente sucessivas, a tipologia das figuras da greve-delito, greve-liberdade e greve-direito indica distintas reações da ordem jurídica à paralisação coletiva de trabalhadores, ora como proibição, ora com indiferença e finalmente como valorização.

O encadeamento dos modelos não necessariamente se apresenta de modo completo ou na ordem sugerida. As nuanças do desenvolvimento histórico de cada país, especialmente do ponto de vista econômico e político, podem fazer com que se comece com a greve-liberdade, passando-se a seguir para a greve-delito ou, de outro modo, que se vá diretamente para a greve-direito, sem existência de período de greve-delito. Nos Estados Unidos, por exemplo, é difícil identificar um período de greve-delito. A concepção liberal dominante no país faz com que, no tratamento jurídico da greve, se fique muito mais no campo da greve-liberdade, ainda que alguns autores falem, incidentalmente, em um “right to strike”(2). No Canadá, de modo similar, a doutrina lembra que não há propriamente fundamento normativo para afirmar a existência de um verdadeiro “right to strike”(3). Tal direito tem sua existência deduzida apenas implicitamente(4)

De qualquer sorte, a sequência proposta por Calamandrei funda-se numa ordem evolutiva, de estágios menos avançados, com a greve-delito, para estágios mais avançados, em que se culmina com o reconhecimento

(1) Significato costituzionale del diritto di sciopero, publicado de início na Rivista giuridica del lavoro, 1952. p. 221 e segs., e posteriormente na Opere Giuridiche, volume terzo, p. 443 e segs., Napoli, Morano, 1968.(2)  William B. Gould IV, A primer on american labor law. Cambridge: MIT, 2004. p. 104.(3) George W. Adams, Canadian Labour Law, Ontario, Canada, Law Book Inc., § 11.1, 1985. p. 620.(4)  George W. Adams, Canadian Labour Law cit., § 11.1, p. 620.

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pleno do direito de greve. Mais ainda, a passagem de um contexto de greve- -direito para outro de greve-delito — o que não se exclui em teoria — significa evidente retrocesso, cuja ocorrência é mais natural relacionar com a queda de regimes democráticos e sua substituição por governos autoritários.

1.1. A greve como delito

No primeiro tipo de tratamento (greve-delito), a paralisação coletiva é tipificada como ilícito penal, sujeitando os que nela se envolvem à mais forte reação legal imaginável, ou seja, a punição criminal. É o que se vê, por exemplo, em França, ao tempo do Código Penal de 1810, em que se pune a participação em greve com pena de um a três meses de prisão, com sanção agravada para os chefes ou promotores do movimento, sancionados com pena de prisão de dois a cinco anos. O art. 415 do mencionado Código dispõe: “Toute coalition de la part des ouvriers pour faire cesser en même temps de travailler, interdire le travail dans un atelier, empêcher de s’y rendre et d’y rester avant ou après de certaines heures, et en général pour suspendre, empêcher, enchérir les travaux, s’il y a eu tentative ou commencement d’exécution, sera punie d’un emprisonnement d’un mois au moins et de trois mois au plus. Les chefs ou moteurs seront punis d’un emprisonnement de deux ans à cinq ans”. No México, durante curto período, na altura da Revolução de 1916, chegou-se a punir com a morte o incitamento ou a participação em greve. O Decreto de 1º de agosto de 1916, com largueza extraordinária, prescrevia, no art. 1º: “Se castigará con la pena de muerte, además de a los transtornadores del orden público que señla la Ley de 25 enero de 1862: Primeiro: A todos los que incitem a la suspensión del trabajo en las fábricas o empresas destinadas a prestar servicios públicos o la propaguen; a los que presidan las reuniones em que se proponga, discute o apruebe; a los que la defiendan y sostengan; a los que la aprueben o suscriban; a los que asistan a dichas reuniones o no se separen de ellas tan pornto como sepan su objeto, y a los que procuren hacerla efectiva una vez que se hubiere declarado”(5).

No Brasil também se adotou o modelo do delito sob o Código Penal de 1890, em que se capitulava a greve, definida como “cessação ou suspensão de trabalho, para impor aos [...] patrões aumento ou diminuição de serviço ou salário”(6), no rol dos crimes contra o livre gozo e exercício dos direitos individuais, com pena de um mês a um ano de “prisão celular”(7). O quadro se mantém na Constituição de 1937, em que a greve é mencionada como recurso antissocial, incompatível “com os superiores interesses da produção

(5) Apud José Dávalos, Orígenes, evolución y ejercicio de la huelga en el derecho mexicano del trabajo, p. 123-124 in http://biblio.juridicas.unam.mx/libros/2/649/13.pdf, acesso em 2 jul. 2013.(6)  Art. 206.(7) Idem, art. 206 e §§ 1º e 2º.

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nacional”(8). Nada de surpreendente. A greve como delito é a concepção característica do Estado autoritário(9).

1.2. A greve como liberdade

Quando se sai do campo da greve-delito para entrar no da greve- -liberdade, há uma transformação importante. A paralisação coletiva não é mais disciplinada como ilícito penal, evidentemente. Não há punição criminal como desdobramento do fato do não trabalho, mas não se chega ainda ao terceiro estágio, do reconhecimento do direito. Fica-se no campo do mero inadimplemento contratual.

A greve passa a envolver o exercício de uma liberdade, inerente a todo trabalhador livre ou a qualquer pessoa, a saber, a liberdade de não prestar serviço. Tal como o empregado que deixa de comparecer ao trabalho em determinado dia, sem que tenha motivo justificado para fazê-lo, o trabalhador em greve, no âmbito da greve-liberdade, exerce também a faculdade de não trabalhar, de abster-se de cumprir uma obrigação. Vale-se, nas palavras de Calamandrei, daquela “libertà [...] di fare tutto quello che non è vietato dalle leggi”(10). Não comete o trabalhador um crime, mas não se encontra tampouco ao abrigo de um direito. Opta por não trabalhar. Incorre, portanto, em mora, sujeitando-se à dispensa motivada. É a concepção mais presente no Estado liberal, como lembra Calamandrei(11).

1.3. A greve como direito

Na greve-direito o cenário é outro, significativamente diferente. O trabalhador deixa de prestar serviços não por conta da sua mera liberdade de não trabalhar, que todos têm. Passa ele a contar com a prerrogativa legal de não cumprir as obrigações contratuais relacionadas com a prestação de serviço. Não há inadimplemento contratual ou mora com a greve-direito(12), como ocorre com a greve-liberdade. Há o exercício de um direito, reconhecido pelo ordenamento jurídico, a saber, o direito de não trabalhar, identificado por Evaristo de Moraes no princípio do Século XX(13). A ausência ao trabalho é

(8)  Art. 139, n. 1.(9) Calamandrei, Significato costituzionale del diritto di sciopero cit., p. 446, e Pontes de Miranda, Comentários à Constituição de 1967 com a Emenda n. 1 de 1969, tomo VI, Rio de Janeiro, Forense, 1987. p. 233.(10)  Calamandrei, Significato costituzionale del diritto di sciopero cit., p. 446.(11) Ibidem.(12)  Francesco Santoro-Passarelli, Autonomia coletiva, giurisdizione, diritto di sciopero em Saggi di diritto civile, Napoli, Jovene, 1961. p. 193.(13) Apontamentos de direito operário, Rio de Janeiro, Imprensa Nacional, 1905, p. 60-61.

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justificada, como se dá no caso da empregada em licença-maternidade ou do empregado que doa sangue ou falta para registrar seu filho recém-nascido.

Do ponto de vista exterior, no plano dos fatos apenas, o resultado é o mesmo, ou seja, há o não trabalho, mas, como já se escreveu, a simples abstenção do trabalho é “un comportamento equivoco”(14), do qual se extraem variados significados, como inadimplemento contratual, interrupção ou suspensão do contrato. Quando a greve se torna um direito, o não trabalho recebe tratamento legal diferente do que lhe é dado no caso de greve-liberdade. O trabalhador deixa de prestar serviço, sem que se caracterize mora. É o que se vê no caso do não cumprimento da obrigação a cargo de um contratante, em contrato sinalagmático, antes do adimplemento da prestação pelo outro contratante. O fato exterior não muda: há o não adimplemento. A qualificação jurídica é diversa, pois não há mora, nos termos do art. 476 do Código Civil. Segundo se escreveu, reconhecer a greve como direito é mais do que apenas proscrever sua tipificação penal. É ir muito além. Implica não a tratar como “desvalor civil e negocial”, ou seja, “como incumprimento do contrato”(15). A greve passa a ser tutelada e protegida, como um verdadeiro direito que se tem e cujo exercício o ordenamento jurídico ampara.

2. A greve no direito internacional

Na atualidade, a greve é com frequência referida como direito em textos internacionais, inclusive no âmbito regional.

O Pacto Internacional sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, adotado pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 1966, refere a greve como um dos direitos a serem assegurados pelos Estados Partes, observadas, em seu exercício, “as leis de cada país”(16).

A Carta da Organização dos Estados Americanos, após enunciar que “o homem somente pode alcançar a plena realização de suas aspirações dentro de uma ordem social justa, acompanhada de desenvolvimento econômico e de verdadeira paz”, salvaguarda o direito dos empregadores e dos trabalhadores “de se associarem livremente para a defesa e promoção de seus interesses, inclusive o direito de negociação coletiva e o de greve por parte dos trabalhadores”(17).

(14)  Renato Corrado, Trattato di diritto del lavoro, Torino, UTET, 1965, volume primo, n. 134. p. 243.(15)  Maria do Rosário Palma Ramalho, Tratado de Direito do Trabalho, Coimbra, Almedina, 2012, Parte III — Situações laborais colectivas, p. 415. Cf. também Gigno Giugni, Diritto sindacale cit., p. 199.(16)  Art. 8º, n. 1, alínea d.(17)  Art. 45, alínea c.