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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E DESENVOLVIMENTO INSTITUTO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” Direitos Humanos: uma análise sobre a aplicabilidade prática do conteúdo trabalhado no Curso de Formação de Oficiais da Polícia Militar de Minas Gerais. Por: Claudio Duani Martins Orientador Prof. Carlos Afonso Leite Leocadio Belo Horizonte 2007 DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E

DESENVOLVIMENTO

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

Direitos Humanos: uma análise sobre a aplicabilidade prática do

conteúdo trabalhado no Curso de Formação de Oficiais da Polícia

Militar de Minas Gerais.

Por: Claudio Duani Martins

Orientador

Prof. Carlos Afonso Leite Leocadio

Belo Horizonte

2007

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PRÓ-REITORIA DE PLANEJAMENTO E

DESENVOLVIMENTO

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

Direitos Humanos: uma análise sobre a aplicabilidade prática do

conteúdo trabalhado no Curso de Formação de Oficiais da Polícia

Militar de Minas Gerais.

Apresentação de monografia à Universidade Candido Mendes, como

requisito parcial para obtenção do grau de especialista em Pedagogia

Empresarial.

Por: Claudio Duani Martins.

Belo Horizonte

2007

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AGRADECIMENTOS

A Jesus Cristo, mestre e amigo; aos meus amigos da

terra e do céu; ao meu orientador, Prof. Leocadio.

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DEDICATÓRIA

À minha esposa Ana Cristina, aos meus filhos Gabriel e

Tiago e a todos os homens e mulheres que durante a

história da humanidade dedicaram suas vidas ao amor

ao próximo.

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METODOLOGIA

A pesquisa foi de natureza quantitativa, pois se utilizou a técnica do questionário

para a coleta de informações específicas sobre a eficiência da metodogia e

conteúdos da disciplina de Direitos Humanos no Curso de Formação de Oficiais da

Polícia Militar de Minas Gerais.

O método de abordagem utilizado para a pesquisa foi o hipotético-dedutivo que a

partir de hipóteses elaboradas sobre o fenômeno em estudo, buscou-se sua

comprovação. (MARCONE & LAKATOS, 2003:95)

O método de procedimento utilizado pela pesquisa foi de duas formas, o método

histórico e o estatístico. O método histórico parte do princípio de que atuais formas

de vida, as instituições e os costumes têm origem no passado, sendo importante

pesquisar suas raízes. Consiste em investigar acontecimentos, processos e

instituições do passado. O método estatístico significa redução de fenômenos

sociológicos, políticos, econômicos etc. a termos quantitativos, que permite

comprovar as relações entre si, e obter generalizações. Este método possui o papel

de fornecer uma descrição quantitativa da sociedade, considerada como um todo

organizado. (MARCONE & LAKATOS, 2003: 106)

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RESUMO

O respeito aos valores humanos é de fundamental importância na prática Policial. É

necessário que a sociedade se sinta protegida ao visualizar, por exemplo, uma

viatura Policial ou uma dupla de Policiamento. No atual cenário de violência urbana

que se desponta ante nossos olhos, a confiança na instituição Policial se torna

essencial à qualidade de vida das pessoas nos grandes centros. Além disso, a

polícia tem uma importante missão de respeitar e garantir os direitos dos cidadãos

executando com qualidade os seus serviços. Este trabalho monográfico tem como

objetivo, por meio da análise da opinião dos Cadetes que cursam o 3º ano do Curso

de Formação de Oficiais da PMMG, comprovar a qualidade do ensino de Direitos

Humanos, que lhes são repassados durante os três anos de curso. Aborda a

historiografia das polícias e dos Direitos Humanos. Relata como ocorre a interação

entre os Direitos Humanos e a prática Policial. Conceitua alguns valores

importantes para a atividade Policial e o relacionamento interpessoal. Demonstra

que a Disciplina de Direitos Humanos é importante para a formação dos oficiais,

porque em diversas situações da sua realidade profissional, terão que lidar com os

problemas sociais e ter a capacidade de compreendê-los de forma mais

humanitária. Por fim, este trabalho faz uma análise da opinião formada pelo aluno

do Curso de Formação de Oficiais, sobre o tema em tela e apresenta, ao final,

sugestões para melhorar a metodologia de ensino e a atualização dos conteúdos de

Direitos Humanos.

Palavras-chave: Direitos Humanos, Valores Humanos, Direitos Humanos e Polícia.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .........................................................................08

CAPÍTULO I .........................................................................09

1.O que é Polícia .........................................................................10

1.1 Evolução histórica das Leis, e a

necessidade da Polícia.

.........................................................................10

1.2 O Conceito de Polícia .........................................................................13

1.3 Os Sistemas Policiais .........................................................................14

1.4 A Origem da Polícia no Brasil .........................................................................22

CAPÍTULO II .........................................................................20

2. Direitos Humanos .........................................................................21

2.1 Conceito de Direitos Humanos .........................................................................21

2.2 Histórico dos Direitos Humanos no

Mundo

.........................................................................24

2.3 Direitos Humanos no Brasil .........................................................................33

2.4 Direitos humanos e Polícia ......................................................................... 37

CAPÍTULO III .........................................................................47

3. Apresentação e análise dos dados da

pesquisa

.........................................................................48

4. Conclusões e Sugestões .........................................................................52

Bibliografia Consultada .........................................................................55

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INTRODUÇÃO

A presente pesquisa traz como título Direitos Humanos: Uma análise sobre

a aplicabilidade prática do conteúdo trabalhado no Curso de Formação de Oficiais

da Polícia Militar de Minas Gerais.

O tema foi escolhido a partir da necessidade de se investigarem: Se o

conteúdo e a metodologia de ensino de Direitos Humanos, trabalhados no Curso de

Formação de Oficiais da Polícia Militar de Minas Gerais possibilita ao cadete adquirir

conhecimentos e desenvolver habilidades sobre o tema que poderão ser utilizados

em sua vida operacional.

Para a escola de formação de oficiais, é de fundamental importância à

análise do tema sugerido, pois, constata-se que os cadetes, mesmo após terem

recebido aulas de Direitos Humanos, durante os três anos de curso, com carga

horária de 90 horas/aula, expressam opiniões divergentes sobre a aplicabilidade

prática dos Direitos Humanos, seu conceito e sua compreensão do ponto de vista

axiológico.

Sem a compreensão do tema Direitos Humanos o cadete, futuro Oficial da

Polícia Militar, não consegue formular juízo sobre a importância de se promover os

Direitos Humanos.

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CAPÍTULO I

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1 O QUE É POLÍCIA

“Interrogaram–no também uns soldados: E nós, que faremos? Disse-lhes: A

ninguém queirais extorquir coisa alguma, nem deis denúncia falsa; e

contentai-vos com vosso soldo”.Lucas 3,14.

1.1 Evolução das Leis e a necessidade da Polícia

Segundo Sócrates a sociedade surgiu da necessidade, ou seja, da

interdependência dos homens. Ele diz,

“Um Estado nasce, (...) das necessidades dos homens ; ninguém basta a si

mesmo, mas todos nós precisamos de muitas coisas. (...) Então, como

temos muitas necessidades, fazem-se mister numerosas pessoas para

supri-las, cada um vai recorrendo à ajuda deste para tal fim e daquele para

tal outro; e , quando estes associados e auxiliares se reúnem todos numa

só habitação, o conjunto dos habitantes recebe o nome de cidade ou

Estado. (...) a verdadeira criadora é a necessidade (...).(PLATÃO,2000,

P.39)”

Esta interdependência entre os homens impossibilita o indivíduo viver de

forma isolada, pois todos temos várias necessidades que só podem ser supridas se

vivermos em sociedade. É isto que faz os seres humanos unirem-se para formar um

Estado.

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Para Aristóteles, a “sociedade é o Estado”1 e, portanto, surgiu da

aglomeração das famílias, estas dão origem ao Estado e constituem a principal

sociedade natural e a mais eficiente organização de poder daquela época estando

sob o comando do homem mais velho 2 . Desta forma, sendo a sociedade a fonte

constituidora do Estado, acaba bastando-se a si mesma, visto ter um objetivo

eminentemente comum, a conservação da existência dos cidadãos,

proporcionando-lhes o bem-estar. Individualmente, aqueles que compõem o Estado

não se bastam a si próprios, visto que sozinho o ser humano não conhece a justiça

nem leis, e é o pior dos animais. 3

Por isto é necessário ao cidadão aceitar as normas de convivência regidas

pelo arcabouço jurídico de seu Estado. JÉSUS (2006, p.28) diz:

... a lei forja no homem um discernimento necessário para a convivência em

comunidade. Essas leis são reconhecidas através do consentimento e

distribuídas às pessoas de forma desigual, para atender à vontade da

maioria, sendo que seu acatamento é imprescindível para a manifestação da

ordem.

No dizer de Leal (2001.p.29) “O melhor Estado é aquele que usa do seu

poder para garantir e proteger a felicidade dos cidadãos e da sociedade como um

todo, guardadas as proporções culturais de cada povo”.

Porém, a convivência humana, historicamente, esteve longe da idéia utópica

da total convivência harmoniosa e pacífica. As relações de poder, as lutas étnicas,

os conflitos religiosos, a conquista de territórios e riquezas, entre outros fatores,

ceifaram vidas e transformaram a paisagem geopolítica de nosso planeta.

1 ARISTÓTELES. Política. Tradução de Mário da gama Kury.2.ed.Brasilia:Universidade de Brasília,

1988.p.79.

2 Leal, Rogério Gesta. Teoria do Estado: Cidadania e poder político na modernidade. 2ª.ed. Porto

Alegre: Livraria do Advogado 2001.p.29.

3 idem.ibidem.,p.30-31.

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Surgiram, assim, sociedades, com costumes, religiões e culturas diferentes.

Destes, surgiram por sua vez, regras de convivência social sem as quais nenhuma

sociedade teria sobrevivido. Estas regras denominadas direitos nem sempre foram

respeitas por todos, daí surgiu a necessidade da criação de uma força paga pelo

Estado para garantir que estes direitos fossem respeitados e proporcionar a todos a

sensação de um ambiente seguro para viverem e se desenvolverem como cidadãos,

evitando, assim, o crescimento da violência.

Monet (2001, p. 31), esclarece sobre o surgimento da atividade Policial:

Não há uma história” natural ” da polícia: a função Policial como hoje é

compreendida nem sempre existiu. Ela é mais o produto de uma sucessão

de rupturas do que a conseqüência de um desenvolvimento que teria

existido em germe desde as origens. Mesmo quando se começa a discernir

seus vestígios nas sociedades do passado, nem por isso ela era composta

por corpos de agentes profissionais, recrutados, nomeados e remunerados

por uma autoridade pública.

Esta força pública denominada mais tarde como polícia surge neste

contexto como um poder de harmonização dos interesses em conflito. E estruturou-

se em diferentes sistemas, conforme as condições políticas, culturais, econômicas e

sociais de cada país em que a organização Policial foi instituída.

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Atualmente, atendendo ao fenômeno da globalização a atividade Policial se

torna mais voltada à proteção do cidadão e se baseia no cumprimento das normas

legais de cada país e do direito internacional1 .

1.2 O Conceito de Polícia

Segundo Ferreira (2000.p.542) polícia é: “(...) A corporação que engloba os

órgãos e instituições incumbidas de fazer respeitar essas leis ou regras, e reprimir e

perseguir o crime...”. Este conceito se refere a atual função das organizações

Policiais. Claro que nem sempre o termo polícia significou um corpo formado por

homens e mulheres treinados para servir e proteger os demais cidadãos de uma

sociedade. Através da história o termo teve muitas significações.

Na Grécia surge a politéía, que até Aristóteles, se refere por um lado, à

cidade enquanto entidade distinta de comunidade política e de outro àquilo que

mantém a Cidade em sua unidade: a arte de governar. Passa, a partir de Platão e

Aristóteles, a designar o conjunto de leis e regras concernentes à administração

geral da Cidade e aos guardiões da lei, encarregados de fazer cumprir a

regulamentação.

Em Roma, a politia estaria relacionada a res pública (Coisa Pública) e civitas

(negócio da cidade). O fundamento do governo à época consistia em definir as

fronteiras entre o público e o privado, através da elaboração de normas cujo

respeito era assegurado por órgãos administrativos específicos.

Na Idade Média, o jus politiae, era o poder/direito que o senhor feudal

detinha para administrar a então denominada ordem social civil. O termo politia,

passou a ser utilizado para designar ações do soberano visando resguardar a

segurança e o bem-estar de seus súditos.

Assim, ampliou-se o conceito de polícia até atingir todas as ações do

Estado, voltadas a prevenir e reprimir os antagonismos e desordens sociais, com

vistas a proporcionar o bem-estar físico, econômico e intelectual da população.

1 Segundo Roover ( 2005,p.36) . O Direito Internacional consiste em normas que governam as relações entre os Estados(...)compreendem também normas relacionadas ao funcionamento de

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Bayley(2001, p.35), descreve a atividade Policial moderna:

O Policiamento nos dias de hoje é dominado por agências públicas,

especializadas e profissionais. De fato, a maioria das pessoas acredita que

estas características definem parcialmente a atividade Policial e certamente

facilitam seu reconhecimento. Acredita-se que os Policiais são funcionários

do governo, selecionados para esta carreira, cuja responsabilidade é o

cumprimento da lei através do uso da força.

Atualmente ainda se discute, o modelo ideal de polícia, e muitas propostas

são apresentadas, por vários estudiosos de segurança pública, este assunto será

mais bem abordado, adiante, nesta pesquisa.

1.3 Os sistemas Policiais

Na Europa, América do Norte e Brasil o estudo da polícia é privilegiado

como uma das criações dos Estados nacionais modernos. Deste ponto de vista,

escolheram como modelo analítico os sistemas Policiais inicialmente implementados

na França e na Inglaterra liberal.1

A polícia, na sua concepção moderna, é caracterizada por se compor de

uma instituição profissional (separada das forças armadas e das instituições

judiciárias) uniformizada e com poderes legitimados pelo estado para a utilização da

força legal e das armas de fogo. Tendo como missão precípua a paz social. Ela

surge da concepção iluminista de produzir e sustentar a paz através de meios

pacíficos e civilizados.

instituições ou organizações internacionais, a relação delas com o Estado e os indivíduos. 1 COTTA , Francis Albert. Breve História da Polícia Militar de Minas Gerais. Belo Horizonte:

Crisálida, 2006.

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A Revolução Francesa trouxe uma nova idéia de polícia como força pública.

Na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 em seu artigo 12 º

estabelecia-se: “A garantia dos direitos do homem e do cidadão necessita de uma

força pública; esta força é, pois, instituída para fruição por todos, e não para

utilidade particular daqueles a quem é confiada.” 1

A Constituição francesa trouxe em si princípios que nortearam a criação da

Gendarmerie Nationale (força pública francesa). que foi instituída para proteger os

direitos dos cidadãos. Porém, esta força pública se tornaria com o tempo uma

ferramenta de repressão estatal e se desviaria de seus objetivos iniciais (garantia

dos Direitos Humanos). O sistema Policial francês acumulava em uma só instituição

as atribuições de polícia ostensiva, judiciária, polícia política, de fronteiras, serviço

secreto, entre outras.

A polícia francesa foi amplamente criticada pelos ingleses, pois segundo

eles, ela constituiria uma ameaça à liberdade. Em 1785, o jornal londrino Daily

Universal Register noticia:

Nossa Constituição não pode admitir nada que se pareça com a polícia

francesa; muitos estrangeiros nos declaram que preferiam deixar seu

dinheiro nas mãos de um ladrão inglês a suas liberdades nas de um tenente

de polícia (apud MONET,p.48).

A criação da polícia inglesa se daria após amplas reformas dos sistemas

criminal e penal, em 1829 por Sir Robert Peel. Ministro do Interior da Inglaterra.

Peel concebeu a New Police. Essa nova polícia de Londres seria um meio de força

pública consolidada sobre os princípios da hierarquia e disciplina militares, com uma

administração centralizada e autonomia regional. O sistema inglês sugeria uma

1 CLEYSON de Mores. Direitos Humanos: Coletânea de Legislação. Rio de Janeiro: F. Bastos,2003.

P. 39 .

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polícia sob maior controle dos cidadãos, preocupada principalmente com a

segurança individual 1 .

No caso dos sistemas portugueses, matrizes dos modelos ou sistema de

polícia no Brasil, concentra sua razão de ser na idéia de ordem estabelecida, porém,

esta manutenção da ordem extrapola a idéia de “arcabouço jurídico”, pois ela estaria

voltada à sensação de segurança e de ausência de risco para a população.

O conceito original de polícia português, não vislumbrava uma instituição

responsável pela a manutenção da ordem, como no sistema francês.

O termo polícia seria entendido como: “ordem estabelecida para a segurança

e comodidade pública dos habitantes” ou a “Boa ordem que se observa e as leis que

a prudência estabeleceu para a sociedade nas cidades.” 2 Este seria o

entendimento português no início do século XVIII.

Observa-se que o sistema Policial de maior relevância social (respeito aos

Direitos Humanos) foi o Inglês, que priorizou a defesa dos direitos do indivíduo, não

permitindo, assim, que a polícia se tornasse instrumento de opressão por parte dos

governos.

Em Portugal, após a institucionalização da intendência Geral da Polícia do

Reino e Corte, foi estruturada a polícia fundamentada nas funções desempenhadas

por seu Intendente Geral da Polícia.3

Em 1760, a Intendência Geral de Polícia foi criada para atender a estrutura

centralizada do Estado de Portugal durante o reinado de Dom José I. Possuía

características eminentemente administrativas, ela coordenava e dirigia os atos dos

1 BRETAS, Marcos Luiz. A Guerra da Ruas. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1997,p.39.

2 COTTA , Francis Albert. op.cit., p.31.

3 SILVA,Maria Beatriz Nizza da. A Intendência Geral da Polícia, 1808-1821.Arcervo. Rio de

Janeiro,v.1,n.2,p.187-204,jul/dez.1986.

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corregedores e juízes do crime, comissários da polícia, juizes de fora e juízes

ordinários. Era responsável por várias atividades de manutenção urbana, tais como

segurança, iluminação, limpeza, calçamento, arborização. Em 1780, a Intendência

Geral é ampliada e passou a funcionar como um órgão de vigilância complementar

do aparelho de justiça, Semelhante à police francesa. Em 1801, a Intendência Geral

se amplia e surge a Guarda Real da Polícia, baseada no modelo francês,

representada pela Maréssé (Polícia montada) e les guets (vigias).

Devido aos bons serviços da Guarda Real da Polícia de Lisboa,

principalmente no que se referia ao combate aos descaminhos dos direitos reais, o

príncipe regente aumentou seu efetivo e em 1805 a Intendência da Polícia

desvalorizou-se em relação à Guarda Real e observa-se o aumento gradual do

efetivo da Guarda Real da Polícia de Lisboa.

Já em 1823 ocorreu a formação de uma Guarda Nacional e a extinção da

Intendência Geral da Polícia, mantendo-se, ainda, a Guarda Real da Polícia nas

cidades de Lisboa e Porto.

A Guarda Real da Polícia de Lisboa foi finalmente substituída em 3 de julho

de 1834 pela Guarda Municipal. A característica militar foi mantida, era comandada

por oficiais do Exército e somente seriam alistados na Guarda os praças que

tivessem servido no exército.

Com o advento da República, a Guarda Municipal foi extinta, em 12 de Outubro de

1919 e imediatamente substituída, a título meramente provisório, pela Guarda

Republicana. Em 3 de maio de 1911, é então criada, como instituição nacional a

Guarda Nacional Republicana, que existe em Portugal até os dias atuais.

1.4 A origem da Polícia no Brasil

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No Brasil, a Intendência Geral da Polícia da Corte e do Estado do Brasil foi

criada em 1808, da mesma forma e com a mesma jurisdição que tinha em Portugal.

Um ano após surgiu a Divisão Militar da Guarda Real da Polícia. Os Planos de

atuação, regulamentos e uniformes seriam os mesmos adotados em Lisboa. A

Guarda da Polícia seria uma força Policial de tempo integral, organizada

militarmente e com ampla autoridade para manter a ordem e perseguir criminosos.

Após a instalação da Corte Portuguesa no Rio de janeiro, em 1808, se fez

necessário organizar os espaços públicos da cidade e disciplinar os costumes de

sua população segundo as tradições européias. Neste contexto, a Intendência Geral

da Polícia teria assumido o papel de "agente civilizador" 1, difundindo os valores e

regras de trato social condizentes com a "ordem social renovada que se pretendia

fundar no Brasil a partir de 1808" 2

Partindo da idéia de que a Intendência Geral tinha competências

eminentemente administrativas, foi então utilizada a Guarda Real da Polícia, como

força de intervenção.

Nas décadas que se sucederam à proclamação da república no Brasil, a

polícia atuou em vários momentos de nossa história como exércitos estaduais,

utilizados em grandes revoluções como as de 1930 e 1932. A partir do golpe militar

de 1964 as polícias militares passaram a ter fundamental importância na segurança

pública, deixando os quartéis e ganhando as ruas com a responsabilidade do

Policiamento ostensivo fardado.

1 SILVA,Maria Beatriz Nizza da. A Intendência Geral da Polícia, 1808-1821.Arcervo. Rio de

Janeiro,v.1,n.2,p.187-204,jul/dez.1986.

2 Lima, Lana Alge da Gama et. al. A Intendência Geral da Polícia da Corte e Estado do Brasil

(1808-1821) . História Hoje : balanço e perspectiva. IV Encontro Regional da ANPUH-RJ, 16-19 de

outubro de 1990. Rio de Janeiro, p.228-223.

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Neste período, porém, observa-se a utilização da força Policial como meio

de repressão política, que resultou em várias ações contrárias ao que preconiza a

atividade Policial (respeito, proteção e promoção dos Direitos Humanos) se tornando

“máquina repressora do Estado“. É o que afirma Motta(2006,p41):

A historiografia que tratou da polícia no Brasil seguiu uma linha teórica em

que se privilegiou a idéia de um Estado repressor a utilizar a polícia como

um instrumento de controle através da força. Para ela, a polícia era um

exército permanente travando uma guerra social contra os adversários que

ocupavam o espaço ao seu redor. A meta da polícia era reprimir e subjugar.

(MOTTA, 2006, p41)

Esta situação passa a se reverter com o processo de redemocratização,

onde surgiu uma nova perspectiva da ação Policial voltada para o Policiamento

comunitário e o respeito aos Direitos Humanos. Atualmente, no Brasil, esta

perspectiva incentivada pelos governos federal e estadual, se concretiza e cria

novas formas de se fazer segurança pública, tendo como principal objetivo a

redução da violência.

Esta pesquisa não pretendeu fazer aqui nenhuma análise histórica da

atividade Policial no Brasil, visto que pela riqueza de detalhes fugiria ao objetivo

central deste estudo. O que foi mostrado neste momento foi a evolução e origem

das polícias, para que se tenha uma visão mais ampla sobre os objetivos de sua

criação e o sentido de sua existência. O estudo constata que a essência da criação

das forças Policiais foi à defesa dos Direitos Humanos, e é sobre estes direitos, sua

origem e seu significado, que este trabalho irá tratar no próximo capítulo.

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CAPÍTULO II

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2 Direitos Humanos

2.1 Conceito

O conceito de Direitos Humanos abre espaço para múltiplas interpretações.

Conforme expõe SORONDO:

O conceito de Direitos Humanos admite múltiplas conotações e pode ser

analisado sob a perspectiva de diversas disciplinas. Optei por considerá-lo

sob dois aspectos, que constituem o essencial de seu caráter:

a) Que os Direitos Humanos constituem um “ideal comum” para todos os

povos e para todas as nações e como tal se apresentam como UM

SISTEMA DE VALORES.

b) Que este sistema de valores, enquanto produto de ação da coletividade

humana, acompanha e reflete sua constante evolução e acolhe o clamor de

justiça dos povos. Por conseguinte, os Direitos Humanos possuem uma

DIMENSÃO HISTÓRICA. 1

Para HERKENHOFF Direitos Humanos são:

1 SORONDO, Fernando. Direitos Humanos Através da História. Disponível

em:<http://www.dhnet.org.br/inedex.htm . > 1-1 p.Acesso em 23/11/2006.

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...Direitos Humanos ou direitos do homem são, modernamente, entendidos

aqueles direitos fundamentais que o homem possui pelo fato de ser homem,

por sua própria natureza humana, pela dignidade que a ela é inerente. São

direitos que não resultam de uma concessão da sociedade política. Pelo

contrário, são direitos que a sociedade política tem o dever de consagrar e

garantir.

Este conceito não é absolutamente unânime nas diversas culturas. Contudo,

no seu núcleo central, a idéia alcança uma universalidade no mundo

contemporâneo(...) 1

No dizer de ROVER (2005, p 72) Direitos Humanos são:

Um direito é um título. É uma reivindicação que uma pessoa pode fazer para

com outra de maneira que, ao exercitar esse direito, não impeça que outrem

possa exercitar o seu. Os Direitos Humanos são títulos legais que toda

pessoa possui como ser humano. São universais e pertencem a todos, rico

ou pobre, homem ou mulher. Esses direitos podem ser violados, mas não

podem jamais ser retirados de alguém. (...)Os Direitos Humanos são direitos

legais - isto significa que fazem parte da legislação.(...) É também importante

observar que os Direitos Humanos são, além disso, protegidos pelas

constituições e legislações nacionais da maioria dos países do mundo.

Na Atualidade existe, ainda, controvérsias sobre a natureza dos Direitos

Humanos. Alguns autores entendem que são direitos naturais e inatos, outros que

são positivos e históricos, ou que derivam de determinado sistema moral. De

qualquer forma, como afirma NORBERTO BOBBIO2, o problema não é conceituá-

los, mas sim protegê-los. No entanto, observa-se que existem características

1 HERKENHOFF, João Batista. A Gênese dos Direitos Humanos. Disponível

em:<http://www.dhnet.org.br/direitos/militantes/herkenhoff/livro1/dhmundo/index.html > , 1-1 p.

Acessado em 23/11/ 2006.

2 NORBERTO BOBBIO (Turim, 18 de outubro de 1909 — Turim, 9 de janeiro de 2004) foi um filósofo político, historiador do pensamento político e senador vitalício italiano.

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comuns que tornam mais fácil seu entendimento são elas: a Universalidade, a

Indivisibilidade e a Interdependência1.

Por Universalidade entende-se que todos os indivíduos são iguais em

direitos e dignidade pelo simples fato de pertencerem à raça humana, estejam onde

estiver, seja qual for sua condição financeira, etnia, religião, nacionalidade, são

sujeitos de direitos em âmbito internacional.

São indivisíveis, pois, para a consolidação da dignidade humana deve haver

uma coesão dos direitos civis e políticos, tais como os direitos à liberdade de

pensamento, à liberdade de ir e vir, o direito ao casamento, o direito ao voto, com os

direitos econômicos e sociais, como o direito à educação, o direito à alimentação e o

direito à propriedade.

A Interdependência reside na dependência entre direitos econômicos e

sociais e direitos civis e políticos. Não há como um indivíduo votar, sem que chegue

à idade adulta em perfeita saúde e plenamente capaz de exercer seu direito como

cidadão. É necessário que ele tenha tido educação, alimentação, assistência à

saúde e participação na vida social e cultural de seu país, para melhor entender sua

realidade e optar, politicamente, de forma consciente garantindo assim um futuro

melhor para si, sua família e sua comunidade.

Assim, os Direitos Humanos são todos os direitos que uma pessoa possui,

para que possa viver em plenitude e desenvolver sua personalidade dentro de uma

sociedade fraterna e igualitária. Através da história, homens e mulheres lutaram

pelo reconhecimento de seus direitos.

Na verdade, Direitos Humanos é algo muito recente, somente com um

sentido amplo poder-se-á utilizar tal conceito para outras épocas, como no caso dos

Gregos. Assim deve-se antes definir esse sentido amplo que o termo será utilizado.

Após a segunda Guerra é que se amolda o sentido atual do termo. Os Direitos

Humanos, em sua essência, são muito antigos e confunde-se com a história da

humanidade. Para se entender a importância dos Direitos Humanos, se faz

necessário retroceder no tempo e estudar as diferentes fases destes direitos.

1 PIOVESAN, Flávia. Curso de Formação de Conselheiros em Direitos Humanos Abril- Julho/2006. Realização:Ágere Cooperação em advogacy e Secr.Esp.dos Direitos Humanos.

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2.2 Histórico de Direitos Humanos no Mundo

2.2.1 Direitos Humanos na antiguidade

Na antiga Babilônia, já se podia encontrar regras que tornavam mais justa a

vida das pessoas, o Código de Hamurabi datado do século XVIII a.C. em seu

preâmbulo diz: “(...) Chamaram, a mim, Hamurábi, o excelso príncipe, o adorador

dos Deuses, para prevenir a opressão do fraco pelo forte... para iluminar o mundo e

propiciar o bem estar do povo”. 1

O Código de Hamurabi regulamentava várias atividades sociais, econômicas

e judiciais tais como o comércio (no qual o caixeiro viajante ocupava lugar), a família

(inclusive o divórcio, o pátrio poder, a adoção, o adultério, o incesto), o trabalho

(precursor do salário mínimo, das categorias profissionais, das leis trabalhistas) e a

propriedade. Apesar das rígidas punições como mutilações e pena de morte o

código tinha como pano de fundo a busca pela harmonia social.“ 2

Na antiga Roma a 450 a.C., a luta da plebe pela igualdade fez surgir à Lei

das XII tábuas, esta lei veio a diminuir as injustiças em julgamentos de plebeus e

patrícios, já que, sendo os juízes de origem patrícia, a tendenciosidade de seus

julgamentos ficava óbvia. A lei tratava de assuntos como: O chamamento a juízo,

dos julgamentos e dos furtos, do pátrio poder e do casamento, do direito público e

aqui cabe ressaltar a primeira cláusula desta tábua que determinava: “que não se

estabeleçam privilégios em lei (ou não se façam leis contra indivíduos)”,

destacando-se também a tábua décima primeira que dizia: “que a última vontade do

povo tenha força de lei” 3

1 CLEYSON de Mores. Direitos Humanos: Coletânea de Legislação. Rio de Janeiro: F. Bastos,2003.

P. 3 .

2 Código de Hamurabi, disponível em:http://www.dhnet.org.br/inedex.htm.Acesso em 02/01/2007.

3 CLEYSON .op cit.P. 19 .

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Nesta primeira fase dos Direitos Humanos não havia a limitação do poder do

Estado, as leis criadas para a organização estatal não atribuíam ao cidadão direitos

frente ao poder dos governantes.1

Nem mesmo na Grécia antiga, onde surgiram as bases do pensamento

político e da democracia moderna, não existiam leis que garantiam os direitos do

povo através do limite do poder dos governantes. É como afirma Herkenhoff:

Não obstante tenha sido Atenas o berço de relevante pensamento político.

Não se imaginava então a possibilidade de um estatuto de direitos oponíveis

ao próprio Estado. A formação da Pólis foi precedida da formação de um

território cultural. (...) Este balizou os limites da cidade grega 2

A ausência de garantias legais fazia com que os Direitos Humanos ficassem

à mercê da virtude e da sabedoria dos governantes. Mas, esta situação, de forma

alguma desmerece a importante contribuição que nos legou os povos da

Antigüidade na persecução dos ideais de liberdade e de garantia da plenitude de

direitos. É o que também diz Herkenhoff:

Alguns autores pretendem afirmar que a história dos Direitos Humanos

começou com o balizamento do poder do Estado pela lei. Creio que essa

visão é errônea. Obscurece o legado de povos que não conheceram a

técnica de limitação do poder, mas privilegiaram enormemente a pessoa

humana nos seus costumes e instituições sociais. 3

2.2.2 Diretos Humanos na Idade Média

Na Segunda fase dos Direitos Humanos destaca-se a Inglaterra medieval com a

carta que os Bispos e Barões impuseram ao rei João Sem Terra a Magna Carta

que foi outorgada por ele, em Runnymede, perto de Windsor, no ano de 1215.

1 HERKENHOFF,2006,op. cit. 2 idem.ibidem. 3 HERKENHOFF,2006,op. Cit

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Este documento destacava-se por prever direitos a viúvas e por obrigar o

Senhor Feudal a prover ferramentas às terras cultiváveis e manter limpo e em bom

estado, casas, parques, víveres, moinhos e bens análogos. Não obstante estas

responsabilidades conferidas ao rei, os documentos da era feudal Inglesa estavam

ainda distantes da idéia de universalidade de direitos do cidadão comum. A

sociedade medieval era composta de estamentos: Nobres; Clero e Servos e as

declarações garantiam apenas os direitos relativos ao estamento1, ordem ou estado

a que pertencesse o indivíduo.

Tais documentos eram contratos escritos em que o Rei, enquanto suserano,

se comprometia a respeitar os direitos de seus vassalos. Neste período o indivíduo

comum também se beneficiava, como sujeito indireto de algumas liberdades e

regalias relativas ao seu senhor.

O Filósofo Britânico John Locke (1632-1704), com sua teoria

Jusnaturalista, concebeu um sentido universal as declarações inglesas de direito.

No sentir de Locke, o homem detém, em seu estado de natureza, o poder político e

se abstém dele para o bem da coletividade, através da escolha de um representante

único, este, por sua vez, será responsável por garantir, enquanto Estado, o bem

estar geral. O governo não pode ser tirânico, nem patriarcal.

Em 1679, surge, também, na Inglaterra o Habeas-corpus, importante

documento, que revela grande potencial de universalidade de direitos, garantindo a

liberdade aos presos de forma injusta. Porém, a lei inglesa, preocupava-se não com

os direitos do homem, mas sim com os direitos do cidadão inglês.2

2.2.3 Direitos Humanos na História contemporânea.

O sentido universal dos Direitos Humanos surgiu na Revolução Francesa e

resultaria em grande transformação e no surgimento de declarações como a

Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789. Segundo Crusca3,

ela trouxe em seu texto duas categorias de direitos:

1 Cada um dos grupos da sociedade com status jurídico próprio. EX. os militares, os burocratas. 2 Prof. J. F. Crusca. Aulas de Direitos Humanos.Aula 1. Disponível em< http://www.dhnet.org.br/inedex.htm>. Acesso em 14/02/2007. 3 CRUSCA,op.cit.

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As liberdades: liberdades em geral(arts. 1º, 2º e 4º ), a segurança (art. 2º),

a liberdade de locomoção( art. 7º), lib de opinião(art. 10º), a lib. de

expressão(art. 11º), lib de dispor de bens(direito de propriedade no art. 2º e

17º ). E seus Corolários: a presunção de inocência(art. 9º ), a legalidade

criminal(art. 8º), a legalidade processual(art. 7º)e os direitos do cidadão. Os

direitos do cidadão: são poderes, meios de participação no exercício

político: o direito de participação na vontade geral ou de escolher

representante que o façam (art. 6º), consentir no imposto(art. 14), controlar

os gastos públicos(art. 14º) e pedir contas da atuação dos agentes

públicos(art. 15º).

Porém, a Declaração Francesa, ao contrário do que se possa imaginar, não

foi a primeira declaração da história contemporânea. Na América do Norte, anos

antes, em 12 de junho de 1776 foi criada a Declaração do Estado da Virgínia .

Mas, o que difere essas declarações é fato de que:” as declarações americanas, por

influência do modelo inglês, preocupa-se somente com o cidadão americano, não

com toda a humanidade.” 1 Somente em 1793, com a Constituição Francesa

proclamam-se os direitos sociais do homem: relativos ao trabalho, meios de

subsistência, instrução, proteção contra a indigência.

Observa-se, neste período, que o Estado não era obrigado a prover o povo

de condições para que seus direitos fossem efetivados, cabia ao próprio indivíduo

garanti-los. A atribuição ao Estado da responsabilidade de prover aos cidadãos seu

direito de liberdade juntamente com seus direitos econômicos é um fato histórico do

século XX.

E foi também no século XX, que em meio a revoluções e grandes guerras é

que se fortaleceu a idéia da proteção aos direitos fundamentais do ser humano, tais

como a liberdade, o trabalho, a vida. Alguns exemplos que marcaram a história, tais

como: a Revolução Mexicana de 1917, que proclamou os direitos do trabalhador,

fato á época inédito no mundo; a Revolução Russa que culmina na Declaração dos

Direitos do Povo, dos Trabalhadores e dos Explorados (1918), redigida por

Lênin, que conclama ao pensamento de que não mais bastava o “Estado de

Direitos”, pois de que valem as liberdades, onde as pessoas ainda não podem suprir

suas necessidades básicas: alimentar-se, vestir-se, morar, ter condições de saúde,

1Idem. Ibidem.

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ter segurança diante da doença, da velhice, do desemprego e de outros percalços

da vida. Surge, então, a terceira fase: dos Direitos Humanos a busca pelo “Estado

Social de Direito”, que é assim definido por Martinez 1.

Estado Democrático de Direito Social é a organização do complexo do poder

em torno das instituições públicas, administrativas (burocracia) e políticas

(tendo a priori o Poder Constituinte), no exercício legal e legítimo do

monopólio do uso da força física (violência), a fim de que o povo (conjunto

dos cidadãos ativos), sob a égide da cidadania democrática, do princípio da

supremacia constitucional e na vigência plena das garantias, das liberdades

e dos direitos individuais e sociais, estabeleça o bem comum, o ethos

público, em determinado território, e de acordo com os preceitos da justiça

social (a igualdade real), da soberania popular e consoante com a

integralidade do conjunto orgânico dos Direitos Humanos, no tocante ao

reconhecimento, defesa e promoção destes mesmos valores humanos. De

forma resumida, pode-se dizer que são elementos que denotam uma

participação soberana em busca da verdade política.

Assim, também, os ideais do proletariado encontram respaldo em alguns

documentos famosos. Esses almejam um ajuste do pensamento político ao

surgimento de um novo enfoque social, ao lado de direitos individuais: A

Proclamação das Quatro Liberdades, de Roosevelt – a de palavra e expressão, a de

culto, a de não passar necessidade, a de não sentir medo (1941); a Declaração das

Nações Unidas (Washington, 1942); as conclusões da Conferência de Moscou

(1943); As conclusões da Conferência de Dumbarton Oaks (1944); As conclusões

da Conferência de São Francisco (1945); E, finalmente, o mais importante,

conhecido e influente documento de “Direitos Humanos” da História: a Declaração

Universal dos Direitos Humanos, proclamada pela Assembléia Geral das Nações

Unidas em 10 de dezembro de 1948.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi um marco histórico na

defesa dos direitos universais. Foi elaborada no período pós-guerra, por 48 países.

Teve como presidente dos trabalhos de sua elaboração, a ilustre personalidade da

1Vinício C. Martinez,doutor em Educação pela USP, professor da Faculdade de Direito da Fundação de Ensino Eurípides Soares da Rocha em Marília (SP).Estado Democrático de Direito Social. Disponível em< http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4613> . Acesso em 14/02/2007.

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Senhora Eleonor Roosevelt1. Esta declaração levou três anos para ser concluída e

sua formulação compreendeu três etapas, como explica COMPARATO2:

(...)Na primeira, incumbir-lhe-ia elaborar uma declaração de Direitos

Humanos, de acordo com o disposto no artigo 55 da Carta das Nações

Unidas. Em seguida, dever-se-ia produzir, no dizer de um dos delegados

presentes àquela reunião, “um documento juridicamente mais vinculante do

que uma mera declaração”, documento esse que haveria de ser,

obviamente, um tratado ou convenção internacional. Finalmente, ainda nas

palavras do mesmo delegado, seria preciso criar uma maquinaria adequada

para assegurar o respeito aos Direitos Humanos e tratar os casos de

violação”. A primeira etapa foi concluída pela Comissão de Direitos

Humanos em 18 de junho de 1948, com um projeto de Declaração Universal

de Direitos Humanos, aprovado pela Assembléia Geral das Nações Unidas

em 10 de dezembro do mesmo ano. A Segunda etapa somente se

completou em 1966, com a aprovação de dois pactos, um sobre direitos

civis e políticos, e outro sobre direitos econômicos, sociais e culturais. Antes

disso, porém, a Assembléia Geral das Nações Unidas aprovou várias

convenções sobre Direitos Humanos, referidas mais abaixo. A terceira

etapa, consistente na criação de mecanismos capazes de assegurar a

universal observância desses direitos, ainda não foi completada. Por

enquanto, o que se conseguiu foi instituir um processo de reclamações junto

à Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas, objeto de um

protocolo facultativo, anexo ao Pacto sobre direitos civis e políticos.

Gradativamente, as democracias liberais foram absorvendo os direitos sociais.

Na atualidade, os países socialistas abandonam os valores do socialismo e aderem

aos valores capitalistas. Grande parte do fracasso do socialismo se deve ao fato de

ele ter sido imposto e não fruto da vontade das pessoas. O fato é de se lamentar,

porque o liberalismo capitalista leva as pessoas a uma situação de individualismo e

apatia, gerando uma cidadania despolitizada, onde os valores sociais são cada vez

mais enfraquecidos. É o que também afirma Herkenhoff:

1 Anna Eleonor Roosevelt (Nova Iorque, 11 de Outubro de 1884 — Nova Iorque, 7 de Novembro de 1962) foi a esposa Franklin Delano Roosevelt, presidente dos Estados Unidos. Foi uma diplomata e ativista dos Direitos Humanos. 2 COMPARATO, Konder Fábio. A Declaração Universal dos Direitos Humanos. Disponível em: http://www.dhnet.org.br/inedex.htm Acesso em 12/02/2007.

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(...)A meu ver, entretanto, muito cedo essas nações verão que algumas

mudanças do momento presente representam um retrocesso. Não me refiro

à busca da Liberdade, que é sempre um avanço. Refiro-me à troca da visão

socialista de mundo pela visão capitalista de mundo. É sintomático e triste,

por exemplo, segundo minha percepção, que se tenha celebrado como

progresso mudanças de comportamento, no mundo socialista, em direção

ao consumismo e às frivolidades. Quando passar a maré capitalista, talvez o

porvir reserve ao mundo um encontro de vertentes. Nesse amanhã,

triunfarão as aspirações de maior igualdade no plano econômico – de que as

correntes socialistas foram e são portadoras – com as aspirações de

liberdade, legado da democracia clássica. Creio que essas aspirações são

perfeitamente compatíveis, harmônicas e interdependentes. ” 1

2.2.3 Os novos rumos dos Direitos Humanos

Atualmente, na quarta fase dos Direitos Humanos, o que se sente no mundo

globalizado, é uma sujeição de países mais pobres aos países de primeiro mundo,

notadamente aos EUA, que mantém internamente a garantia dos direitos de seus

cidadãos, mas, em sua política externa, se mantém em uma posição ofensiva,

impondo sua hegemonia baseado em interesses puramente econômicos e militares.

A política econômica Americana impôs ao mundo uma visão cultural massificada,

gerando uma perda significativa da democracia participativa, e da

autodeterminação1 dos povos.

O Neoliberalismo2 , que norteia as ações econômicas no mundo contribui para

a degeneração de comunidades que se tornam cada vez mais consumistas, e se

1 HERKENHOFF,2006,op. cit 1 Por autodeterminação entendemos o direito de um povo decidir sobre sua própria vida comunitária, suas leis e suas regras, suas instituições, seus símbolos, seu próprio destino político. É um princípio que decorre do direito à existência inerente a cada Estado. Isso tem a ver com o conceito de soberania do próprio povo”.Disponível em:<:http://www.pime.org.br/mundoemissao/direitoshautodet.htm>, acessado em 07/02/2007. 2O neoliberalismo é uma prática econômica que rejeita a intervenção do Estado na economia e deixa o mercado

se auto-regular com total liberdade. As privatizações e a livre concorrência são características deste tipo de

pensamento. É o mercado que dita as regras e conduz a produção. Por exemplo: as empresas não produzem

apenas pela necessidade e sim após uma consulta ao mercado, verificando a análise custo-benefício e atenta a

possibilidades exteriores. Os defensores do neoliberalismo alegam que esta liberdade é saudável e que através

dela os países encontrariam uma evolução natural, um caminho para se chegar a um bem-estar geral. Contudo,

o conceito de um mercado intocável já trouxe problemas para muitas economias.

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afastam dos ideais de fraternidade universal. Noan Chonsky resume os efeitos do

neoliberalismo quando afirma:

(...) Para que a democracia seja efetiva é necessário que as pessoas se

sintam ligadas aos seus concidadãos e que essa ligação se manifeste por

meio de um conjunto de organizações e instituições extramercado. Uma

cultura política vibrante precisa de grupos comunitários, bibliotecas, escolas

públicas, associações de moradores, cooperativas, locais para reuniões

públicas, associações voluntárias e sindicatos que propiciem formas de

comunicação entre concidadãos. A democracia neoliberal, com sua idéia de

livre mercado, nunca tem em mira este setor. Em vez de cidadãos, ela

produz consumidores. Em vez de comunidades, produz shopping centers. O

que sobra é uma sociedade atomizada, de pessoas sem compromisso,

desmoralizadas e socialmente impotentes. (Chonsky,2002.Pag.40)

É notório que sem a participação de todos é impossível a efetivação dos

direitos historicamente conquistados. É necessária a união de esforços para por fim

às injustiças mundiais e a miséria extrema.

Grandes personalidades como Mahatma Ghandi e Madre Teresa de Calcutá

provaram ao mundo que, unir esforços para a realização do bem comum, pode

tornar melhor a realidade de milhões de pessoas. O discurso fatalista e a descrença

geram idéias estáticas. Ao contrario, porém, qualquer atitude humanitária e pacífica

inflama os ideais e constrói vidas. É como afirma o Comitê Nobel Norueguês em seu

pronunciamento quando da entrega do Prêmio Nobel ao Indiano Muhammad Yunus:

O Prêmio Nobel 2006 será dividido em duas partes iguais entre Muhammad

Yunus e o Grameen Bank por seus esforços para criar, do zero,

desenvolvimento econômico e social. A paz duradoura não pode ser

alcançada sem que grandes grupos populacionais encontrem formas de sair

da miséria. Microcrédito é uma delas. Criar desenvolvimento também

significa um avanço na democracia e nos Direitos Humanos.(...) Muhammad

garantiu durante 30 anos empréstimos aos pobres, em particular as

Disponívelem:<http://www.ibge.gov.br/ibgeteen/datas/economista/neoliberalismo.html>, acessado em 07/02/

2007.

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mulheres, tornando possível a abertura de novas empresas como forma de

sair da miséria por meio de seu próprio trabalho 1

Atitudes como as de Muhammad, é que levam a reflexão de que um mundo

mais justo é possível. Não só através do assistencialismo, mas, primordialmente,

através do empoderamento das pessoas. A história dos

Direitos Humanos ainda continua sendo escrita, o desenvolvimento da tecnologia, a

crescente preocupação com o meio ambiente, e o desenvolvimento sustentável, o

direito dos grupos étnicos, a questão do gênero, a liberdade sexual, e outros

assuntos estão sendo agregados na pauta mundial do respeito à dignidade humana.

Nas próximas décadas, o pensamento humano irá criar novos direitos e novas

perspectivas para o mundo.

Este capítulo tem como objetivo dar uma visão global e histórica, dos

Direitos Humanos. Porém, se faz necessário para entendimento dos demais itens,

que a história dos Direitos Humanos no Brasil seja mostrada, notadamente a partir

de nossa Independência em 1822.

2.3 Direitos Humanos no Brasil

A democracia e Direitos Humanos caminham lado a lado. “Não há

democracia sem Direitos Humanos e não há Direitos Humanos sem democracia”

(Piovesan, 2003)2 . A Historiografia dos Direitos Humanos no Brasil notadamente

após sua independência está ligada, diretamente, à evolução constitucional do país 3. Por este motivo, na linha cronológica que esta pesquisa se baseia, a questão dos

Direitos Humanos será examinada propondo um ajuste deste tema ao

desenvolvimento constitucional brasileiro.

1 http://www.noruega.org.br/policy/Nobel+Peace+Prize/nobel.html . Sociedade e

Política, acessado em 08/02/2007.

2 Anais da V Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente –Brasília 2003, palestra de Flávia Piovesan. 3 Herkenhoff, João Batista. Gênese dos Direitos Humanos.2ª ed.rev.Aparecida, SP:Editora Santuário,2002, p. 57.

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2.3.1 Constituições Brasileiras e os Direitos Humanos

A Constituição é a lei maior de um País, isso implica em dizer que ela é

superior a todas as outras leis e que todas as leis têm de ajustar-se à Constituição.

A Constituição pode ser outorgada ou promulgada. A outorgada é criada pela

autoridade que governa e é imposta ao povo. A Promulgada ou dogmática é aquela

que resulta da participação popular, e que obriga a autoridade que governa a

respeitá-la.

No Brasil, as constituições promulgadas foram a 1891, a de 1934, a de 1946

e a atual (de 1988). As constituições outorgadas foram a de 1824, a de 1937 e a de

1969.

Em 1824, surge a primeira Constituição brasileira, a “Constituição Imperial”,

que por sua vez foi outorgada. Esta Constituição, até mesmo pelo contexto histórico

em que foi criada, concentrava o poder no Imperador, que podia intervir nos

Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Sua contribuição para os Direitos

Humanos foi à inviolabilidade dos direitos civis e políticos. Esta constituição tinha

muito de “ideal” e pouco de praticidade, basta saber que manteve a escravidão.

Já no período republicano, surgiu a “Constituição republicana” de 1891, com

100 artigos, e que teve como modelo a Constituição dos Estados Unidos da

América. Esta agregou aos direitos já existentes o voto direto para deputados,

senadores e Presidente e Vice-presidente da República. Até então, um dos critérios

para o voto era a exigência de uma renda mínima, com esta Constituição este

critério veio a ser abolido, mantendo-se, porém, algumas restrições: “que os

mendigos, os analfabetos, os religiosos, não poderiam exercer tais direitos políticos”

(Samaniego)1 .

Os Direitos Sociais tiveram sua inserção em nosso ordenamento jurídico

graças à Constituição de 1934, ficando conhecida como “Constituição Social”. Esta

Constituição teve pouca participação de grupos populares, no entanto, introduziu

garantias individuais, assegurou direitos sociais, destacando-se os direitos

trabalhistas, como proibição de diferença salarial para o mesmo trabalho, em razão

de idade, sexo, nacionalidade e estado civil; proibiu o trabalho, para menores de 14

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anos, o trabalho noturno para os menores de 16 anos e o trabalho insalubre para

menores de 18 anos e para mulheres; trouxe a determinação da criação de um piso

salarial “salário mínimo”, para suprir as necessidades do trabalhador, o repouso

semanal e remunerado e a limitação da jornada de trabalho em oito horas diárias.

Na questão do gênero, houve um avanço significativo, haja vista ter instituído o Voto

Feminino.

Apesar de seus significativos avanços, a Constituição de 1934 teve somente

3 anos de vigência O contexto histórico da época dava espaço ao “Estado Novo” ,

instituído pelo então Presidente Getúlio Vargas, o mundo vivenciava os horrores da

Segunda Grande Guerra. Neste cenário foi criada a Constituição de 1937, esta

Constituição, teve como característica a limitação de liberdades :”dentre elas, a

liberdade de ir e vir, o sigilo de correspondência (uma vez que as mesmas eram

violadas e censuradas) e de todos os outros meios de comunicação, sejam orais ou

escritos, a liberdade de reunião e etc.” (Samaniego) ; e a centralização de poder no

Presidente da República.

Em 1946, no entanto, há um resgate dos ideais democráticos, no contexto

internacional, o mundo do pós-guerra estava em franca reconstrução. Nesta

Constituição, os direitos ampliados foram a proibição do trabalho noturno para

menores de 18 anos e a institucionalização do direito de greve. Sua duração foi de

20 anos.

1964, o ano do golpe militar, trouxe grandes conseqüências para o processo

democrático. Os Atos Institucionais, notadamente o AI 5, autorizavam sanções e

arbitrariedades de toda sorte, espalhando medo e terror às pessoas. A restrição de

liberdades, desaparecimentos forçados e a tortura foram características deste

período. A realidade deste contexto foi legitimada pela Constituição de 1967 e

posteriormente, na Constituição de 1969 que incorporou os Atos Institucionais.

O renascimento da democracia encontra força no ano de 1970, quando pelo

movimento popular, o País conquista a Anistia e inicia-se o processo de abertura

política que culmina, em 1985, com o fim do regime militar, e a Emenda

1 SAMANIEGO, Daniela Paes Moreira. “Direitos Humanos como utopia”.Jus Navegandi,Teresina, a.4,n.46,out.2000.Disponível em:http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=76.

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Constitucional nº 25 que convoca as eleições para a Assembléia Nacional

Constituinte1.

Na Constituição cidadã2 de 1988, a democracia encontra espaço, para se

desenvolver. Esta carta magna é considerada um marco na história dos Direitos

Humanos no Brasil. No sentir de Piovesan, “é um marco simbólico que reinvente a

nossa cidadania, é o marco da transição democrática e da nacionalização dos

Direitos Humanos no país”. 3

No preâmbulo da Constituição de 1988, institui-se o Estado Democrático de

Direito assegurando, assim, o pleno exercício dos direitos sociais e individuais, a

liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça

como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos,

fundada na harmonia social. Garantiu em seus princípios fundamentais a redução

das desigualdades, considerando a diversidade sexual, de raça, geração e o

combate a qualquer forma de discriminação, expressos em seus artigos terceiro e

quinto. A saber:

“Art.3º - Costituem objetivos fundamentais da Republica Federativa do

Brasil:

I. Constituir uma sociedade livre, justa e solidária;

II. Garantir o desenvolvimento nacional;

III. Erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades

sociais e regionais;

IV. Promover o bem de todos, sem preceitos de origem, raça,sexo, cor,

idade e quaisquer outras formas de discriminação.

(...) Art.5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer

natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no

1 RODRIGUES, Maria de Lourdes Alves Rodrigues. Curso de Formação de Conselheiros em Direitos Humanos .Abril- Julho/2006. Realização:Ágere Cooperação em advogacy e Secr.Esp.dos Direitos Humanos 2 Nome dado por Ulysses Guimarães à nossa Carta Magna, a Constituição Federal de 1988. 3 Anais da V Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente- Brasília 2003, palestra de Flávia Piovesam.

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País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança

e à propriedade” .1

Os direitos sociais e políticos também foram garantidos pela Constitiução de

1988, em seus artigos 5º ao 11º e do 14º ao 16º.

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o

lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à

infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

A participação popular ganhou força com a Constituição de 1988. Vários

movimentos sociais mobilizaram-se e participaram da formulação do texto

constitucional. Ampliando os direitos: às mulheres, as crianças e os adolescentes. O

crime de racismo foi uma decorrência da Constituição de 1988.

No próximo item esta pesquisa irá mostrar como é possível aos Policiais

atuarem em conformidade com os Direitos Humanos, e como é importante para o

bem coletivo, que cada vez mais os Policiais se integrem numa visão global destes

direitos.

2.4 Direitos Humanos e Polícia

No início deste estudo, a história das polícias e dos Direitos Humanos foi

detalhada de forma a facilitar o entendimento deste item. Agora, esta pesquisa irá

detalhar a importância do trabalho Policial na defesa dos Direitos Humanos, seus

desafios e suas perspectivas para o futuro.

Atualmente, com o quadro de violência que se apresenta no cotidiano dos

brasileiros, a segurança pública freqüentemente é alvo de frenéticas discussões,

1 BRASIL, Constituição (1988).Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988.Organização do texto: Juarez de Oliveira.4.ed. são Paulo: Saraiva,1990.168p.(série Legislação Brasileira).

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cuja tônica é a ineficácia das instituições responsáveis pela aplicação da lei,

notadamente as polícias.

Várias soluções já foram apresentadas para a segurança pública. Fala-se

em extinção do atual sistema de polícias estaduais, que atualmente são 57 (27

polícias militares e 27 polícias civis), desconstitucionalização da segurança pública

passando a competência ao Poder Executivo Estadual, entre outras, como propõe

Soares (2006, p 140 e 150):

(...) Em outras palavras, a impossibilidade de uma gestão racional, em

decorrência de impedimentos inscritos nas estruturas organizacionais das

polícias, nos conduz à conclusão drástica de que temos de substituí-las por

outras, organizadas segundo outros modelos.

(...)Com a desconstitucionalização, seria transferida aos estados a

autoridade para legislar sobre suas Policias...

No entanto, a historiografia da humanidade mostra que as mudanças

realmente significativas em qualquer sociedade se deram no plano cultural.

Também, em relação à segurança pública, as mudanças devem ocorrer entre os

próprios profissionais que atuam na aplicação da lei. Esta mudança se refere à

forma com que os profissionais são formados e treinados. Uma formação baseada

nos princípios de proteção aos Direitos Humanos, na valorização da participação

comunitária na resolução dos conflitos sociais, na defesa do interesse coletivo e da

paz social, deve ser a tônica da mudança de comportamento destes profissionais de

segurança pública.

2.4.1 A Importância do ensino de Direitos Humanos Para Policiais.

No arcabouço jurídico internacional que trata sobre a proteção aos Direitos

Humanos, cada País tem por obrigação cumprir a legislação internacional relativa ao

tema e desenvolver internamente leis e regulamentações que garantam aos seus

cidadãos o respeito a seus direitos.

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Neste contexto se insere, os policiais, e se torna fundamental para a sua

atividade, que eles adquiram, na sua formação e treinamento, conhecimento

adequado sobre disciplinas como: Direitos Humanos, Direitos Internacional e Direito

Internacional Humanitário1 . No entanto, Segundo Rover ( 2005,p. 149):

(...) o simples conhecimento não é o bastante. Os encarregados da aplicação da lei também precisam adquirir e manter certas habilidades, técnicas e táticas para assegurar a aplicação constante e adequada das exigências impostas por lei para que possam respeitar e proteger os direitos e liberdades individuais. As limitações aos direitos e liberdades pessoais só podem provir de limitações inerentes ao próprio direito, limitações legais e/ou derrogações permitidas em casos de emergência pública que ameacem a vida da nação. Tais limitações e/ou derrogações não deverão ser o resultado de práticas ilegais e/ou arbitrárias de aplicação da lei. Estas práticas não só vão contra o direito interno, mas também são prejudiciais à percepção do público e a experiência individual dos direitos e liberdades humanos.

Este conhecimento adquirido nos bancos escolares das academias Policiais

de todo Brasil é de fundamental importância para a melhoria da qualidade da

prestação de serviço pelas instituições Policiais, notadamente na redução da

criminalidade e na preservação da vida humana, tanto dos Policiais quanto dos civis

envolvidos, nos diversos e contumazes episódios de violência do nosso cotidiano.

Poucas profissões exigem recursos humanos tão especializados como os

envolvidos na segurança pública. Equilíbrio emocional, capacidade de resolução de

conflitos, de respeitar regras, de relacionar-se adequadamente com o público,

criatividade, tolerância, inteligência, conhecimentos jurídicos, psicológicos,

sociológicos, científicos, além de diversos outros conhecimentos específicos da

atividade Policial, são exigências que se faz desse profissional. Assim, é necessário

proporcionar ao Policial treinamento interdisciplinar ,abrangendo todas as áreas de

conhecimento de forma a desenvolver as qualidades necessárias ao bom

desempenho da atividade Policial.

1 Segundo Rover (2005,p.105): O direito internacional humanitário (DIH) é uma ramificação do

direito internacional público - aplicável em conflito armado - e é destinado a assegurar o respeito pelos seres humanos à medida que este seja compatível com os requisitos militares e a ordem pública, e atenuar os sofrimentos causados pelas hostilidades. O direito internacional humanitário é dividido em duas categorias: o Direito de Genebra e o Direito de Haia.

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Durante a formação, o Policial deve ser conscientizado da importância de

sua profissão e estimulado a ser um promotor dos Direitos Humanos. Pois, suas

ações futuramente irão ter um caráter pedagógico, na sociedade. É baseado nas

suas atitudes que as pessoas irão tê-lo como um amigo ou como mais, um a

discriminá-las e oprimi-las. É o que diz Balestreri (1988,p.19):

Há, assim, uma dimensão pedagógica no agir Policial que, como em outras

profissões de suporte público, antecede as próprias especificidades de sua

especialidade. (...) O Policial, assim, à luz desses paradigmas educacionais

mais abrangentes, é um pleno e legítimo educador. Essa dimensão é

inabdicável e reveste de profunda nobreza a função Policial, quando

conscientemente explicitada através de comportamentos e atitudes.

Este caráter pedagógico é reforçado por Soares( 2006,p.149):

O uniforme de um Policial é sua vestimenta funcional, mas é também uma

mensagem dirigida à sociedade, na qual se reafirma a autoridade de quem a

veste.A farda neutraliza a singularidade do indivíduo que a veste,

substituindo por um papel público, cujo portador torna-se um agente público,

cumpridor de funções institucionais. Por isto, o comportamento do Policial

militar, na esquina - face mais tangível do Estado para a maior parte da

população brasileira-, pode valorizar ou comprometer o conjunto das

instituições públicas.

Ainda, sobre o respeito aos Direitos Humanos e a imagem da organização Policial

frente a sociedade, Rover ( 2005,p 148), entende que:

É crucial que os encarregados da aplicação da lei demonstrem sensibilidade

com relação aos direitos e liberdades individuais, assim como tomem

consciência de sua própria capacidade (individual) de proteger - ou violar -

os Direitos Humanos e liberdades. A aplicação da lei é um componente

visível da prática dos Estados, sendo as ações de seus encarregados

raramente vistas ou avaliadas como individuais, e, na verdade, muitas vezes

vistas como um indicador do comportamento da organização como um todo.

É exatamente por isso que certas ações individuais de aplicação da lei

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(como o uso excessivo de força, corrupção , tortura) podem ter um efeito tão

devastador na imagem de toda a organização.

Durante muitos anos, notadamente durante o regime militar, as polícias

serviram de instrumento de repressão popular, o que gerou uma sub-cultura, onde o

respeito aos Direitos Humanos era exceção e motivo de escárnio nas instituições

Policiais, como afirma Balestreri (1988,p.13):

Em 1988, quando começamos, parecia quase impossível. A polícia se

antagonizava fortemente à comunidade de Direitos Humanos e esta, por sua

vez, amargava experiências que se haviam consolidado como preconceitos

anti-polícia. Falar, então, em trabalhar questões de cidadania no contexto de

escolas e academias Policiais, soava como algo candidamente ridículo.

Muitas vezes fomos depreciados por essa “sandice idealista”, a partir de

observações de nossos próprios companheiros.

Atualmente, após a Constituição de 1988, o cenário transformou-se, e um

novo paradigma foi dado as polícias, o de combater a crescente criminalidade

respeitando os direitos das pessoas, ou seja, “Servir e Proteger”. Porém, para que

isto ocorra, é necessária uma mudança comportamental, que só será efetiva se o

Policial acreditar em sua condição de cidadão detentor de direitos e defensor da

sociedade onde vive. Sobre isto comenta Balestreri (1988 p.18):

O Policial é, antes de tudo um cidadão, e na cidadania deve nutrir sua razão

de ser. Irmana-se, assim, a todos os membros da comunidade em direitos e

deveres. Sua condição de cidadania é, portanto, condição primeira,

tornando-se bizarra qualquer reflexão fundada sobre suposta dualidade ou

antagonismo entre uma “sociedade civil” e outra “sociedade Policial”. Essa

afirmação é plenamente válida mesmo quando se trata da Polícia Militar,

que é um serviço público realizado na perspectiva de uma sociedade única,

da qual todos os segmentos estatais são derivados. Portanto não há,

igualmente, uma “sociedade civil” e outra “sociedade militar”. A “lógica” da

Guerra Fria, aliada aos “anos de chumbo”, no Brasil, é que se encarregou

de solidificar esses equívocos, tentando transformar a polícia, de um serviço

à cidadania, em ferramenta para enfrentamento do “inimigo interno”. Mesmo

após o encerramento desses anos de paranóia, seqüelas ideológicas

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persistem indevidamente, obstaculizando, em algumas áreas, a elucidação

da real função Policial.

A violência, presente nos grandes centros urbanos, aliada muitas vezes ao

despreparo e falta de condições adequadas de trabalho gera um tipo de descrença,

onde o Policial perde a auto estima que é fundamental para sua consciência cidadã,

também sobre isto diz Balestreri (1988 p.20):

O reconhecimento dessa “dimensão pedagógica” é, seguramente, o caminho

mais rápido e eficaz para a reconquista da abalada auto-estima Policial. Note-

se que os vínculos de respeito e solidariedade só podem constituir-se sobre

uma boa base de auto-estima. A experiência primária do “querer-se bem” é

fundamental para possibilitar o conhecimento de como chegar a “querer bem

o outro”. Não podemos viver para fora o que não vivemos para dentro. Em

nível pessoal, é fundamental que o cidadão Policial sinta-se motivado e

orgulhoso de sua profissão. Isso só é alcançável a partir de um patamar de

“sentido existencial”. Se a função Policial for esvaziada desse sentido,

transformando o homem e a mulher que a exercem em meros cumpridores de

ordens sem um significado pessoalmente assumido como ideário, o resultado

será uma auto-imagem denegrida e uma baixa auto-estima. Resgatar, pois, o

pedagogo que há em cada Policial, é permitir a ressignificação da importância

social da polícia, com a conseqüente consciência da nobreza e da dignidade

dessa missão. A elevação dos padrões de auto-estima pode ser o caminho

mais seguro para uma boa prestação de serviços. Só respeita o outro aquele

que se dá respeito a si mesmo.

Com isto, a tendência do profissional de segurança pública é justamente,

afastar-se da idéia de proteção dos direitos, e partir para a prática de atos

notadamente contrários ao interesse social. Ações como estas somente levam a um

desgaste da imagem institucional. Perdendo, com isto: a sociedade, a polícia e

próprio Estado. Isto fica evidente no dizer de Soares (2006 p.117):

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Nossas polícias são máquinas pesadas e lentas, nada inteligentes e

criativas, que não valorizam seus Policiais nem os preparam

adequadamente; não planejam nem avaliam o que fizeram; não aprendem

com os erros porque não os identificam; não conhecem os problemas

sobre os quais atuam ( os Policiais, individualmente, sabem muito; a polícia,

como instituição, nada sabe );não cultivam o respeito e a confiança da

população; cada vez mais só prendem em

flagrante , porque pouco investigam; limitam-se a reagir depois que os

crimes já ocorreram; cometem um número imenso de crimes, quando sua

tarefa é evitá-los ou conduzir à justiça os perpetradores.

Por este motivo, torna-se primordial a reconstrução de uma consciência

cidadã, que cada vez mais, irá humanizar a atividade Policial. Para que isto se torne

realidade, faz-se necessário que o Policial não seja formado para ser um “guerreiro”,

mas, seja direcionado de forma a introjetar a disciplina e o amor profissão como

valor humano, e não como algo imposto por força do regulamento. Seus valores

devem estar pautados na preservação da vida humana, através da ética e do

respeito aos diversos grupos sociais. Porém, isto só será possível através de

métodos adequados de sensibilizarão agregado à formação e ao treinamento destes

Policiais.

2.4.2 Evolução do ensino em Direitos Humanos no Brasil e em

Minas Gerais.

Nos últimos anos, o Governo Federal Brasileiro tem investido no treinamento

e formação de Policiais seguindo preceitos já mencionados, de respeito aos diretos

humanos e de valorização da participação comunitária na resolução de problemas

relativos a segurança pública.

Em 13 de maio 1996, em cumprimento à recomendação específica da

Conferência Mundial dos Direitos Humanos (Viena 1993), o Governo Federal adotou

o Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH), atribuindo, assim, aos Direitos

Humanos status de política pública governamental. Já em 2002, de forma a

incorporar ações específicas no campo da garantia de direitos tais como à

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educação, à saúde, à previdência social, ao trabalho, entre outros, atualizou-se

aquele documento que passou a ser designado como PNDH II.

No campo da Segurança Pública, o Programa Nacional de Direitos

Humanos, traz como propostas as citadas abaixo, representando um primeiro

esforço no sentido de democratizar e humanizar os serviços prestados pelas

polícias em todo território nacional:

Estimular o aperfeiçoamento dos critérios para seleção e capacitação de

Policiais e implementar, nas academias de polícia, programas de educação

e formação em Direitos Humanos, em parceria com entidades não-

governamentais. (...) incluir no currículo dos cursos de formação de Policiais

módulos específicos sobre Direitos Humanos, gênero e raça, gerenciamento

de crises, técnicas de investigação, técnicas não-letais de intervenção

Policial e mediação de conflitos. (...) Incentivar a implementação da polícia

ou segurança comunitária(...)

Em 1998, em Brasília, foi organizado pelo Comitê Internacional da Cruz

Vermelha, o primeiro curso de Multiplicadores das Doutrinas de Direitos Humanos

para as Forças Policiais. Em 1999, em Minas Gerais, o mesmo curso é ministrado

para oficiais de nossa instituição. Este curso contou com a presença de instrutores

internacionais, além dos Policiais já capacitados em 1998. A partir de então,

implantou-se como filosofia institucional a capacitação dos Policiais através dos

cursos de “Promotor de Direitos Humanos” e “Professor de Direitos Humanos”.

Em decorrência destas propostas, surge, então, o Plano Nacional de

Segurança Pública trazendo como uma das estratégias de defesa dos Direitos

Humanos o Policiamento comunitário:

(...) Policiamento comunitário: Em poucas palavras, Policiamento

comunitário é a modalidade de trabalho Policial ostensivo e preventivo

correspondente ao exercício da função Policial definida pelo compromisso

inalienável com a construção social da paz e com o respeito aos Direitos

Humanos. Equivale também ao aperfeiçoamento profissional, uma vez que

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implica mais qualificação e mais eficiência na provisão da segurança

pública. Os exemplos brasileiros e internacionais são ricos em experiências

bem sucedidas de Policiamento comunitário, nas quais decrescem as taxas

de crimes e as práticas violentas, enquanto cresce, na mesma proporção, a

confiança popular na polícia. A memória da história recente ajuda a

contextualizar a importância e o sentido da nova metodologia.

Da mesma forma que no campo dos Direitos Humanos, o primeiro curso de

Polícia Comunitária foi organizado pela Secretaria Nacional de Segurança Pública

em 2001 e implementado em Minas Gerais em 2002, e seguindo os mesmos

objetivos da filosofia de implementação das doutrinas de Direitos Humanos, foram

criados os cursos de “Multiplicador de Polícia Comunitária” e o Curso de “Promotor

de Polícia Comunitária”.

A partir desta preocupação em âmbito, nacional com as premissas de

polícia comunitária e Direitos Humanos, é que a Polícia Militar no esforço de criar

doutrinas, também desenvolveu documentos institucionais como a Diretriz Para

Produção de Segurança Pública nº 4/ 2002-CG que trata da Filosofia de Polícia

Comunitária na Polícia Militar de Minas Gerias e a Diretriz Para Produção de

Segurança Pública nº 08 que se refere à Filosofia de Direitos Humanos da Polícia

Militar, que colocam em prática os objetivos 23(consolidar a filosofia de Direitos

Humanos na PMMG) e 25 (consolidar a filosofia de Polícia Comunitária na PMMG) ,

do Plano Estratégico 2004-2007 da PMMG.

Estabelecidas as doutrinas, a Instituição, durante anos, envidou esforços

para a capacitação de polícias nos cursos Promotores e Professores de Direitos

Humanos e Polícia Comunitária. Consolidando o compromisso com aprimoramento

técnico e profissional dos nossos Policiais.

Neste contexto, a Resolução nº 3.836, de 02Jan2006-CG, que estabelece

as Diretrizes de Educação de Polícia Militar (DEPM), estabelece que os referidos

cursos são aplicados aos Policiais militares de maneira específica, bem como

incorpora as disciplinas polícia comunitária e Direitos Humanos no currículo escolar

dos Cursos de Formação da PMMG.

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Com base naquela diretriz, o Curso de Formação de Oficiais da PMMG, com

duração de três anos busca através da interdisciplinaridade, estabelecer um ensino

de qualidade, onde as filosofias de polícia comunitária e diretos humanos

constituem pilares básicos, o que coaduna com os princípios da instituição Polícia

Militar, da qual os futuros oficiais serão comandantes e líderes.

Porém, por mais eficaz que seja um sistema de ensino, faz-se necessário a

uma avaliação constante dos conteúdos ensinados, para identificar distorções e

para sugerir mudanças. Com este objetivo é que esta pesquisa irá apresentar no

próximo capítulo a análise dos dados, relativos aos questionários aplicados aos

cadetes do último ano do Curso de Formação de Oficiais, e através dos quais foram

coletadas as informações sobre a eficácia do ensino de diretos humanos durante os

três anos de curso destes Policiais.

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CAPÍTULO III

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A Pesquisa

3 Apresentação e análise dos dados da pesquisa

3.1 Apresentação dos dados

Foram aplicados 104 questionários para os Cadetes do 3º ano do Curso de

Formação Oficiais. Destes 104 questionários, foram devolvidos 97 e seus dados

foram tabulados. Esses 07 questionários que não foram respondidos foi devido a

empenho dos discentes na atividade de campo programada, atividade que

inviabilizou a eles responder os questionários dentro do prazo determinado.

A seguir, os dados são apresentados por meio de gráficos permitindo uma

visão mais real do estudo em questão.

3.2 Interpretação e análise dos dados do questionário da

pesquisa

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GRÁFICO 1 – QUAL ERA SUA VISÃO SOBRE DIREITOS HUMANOS ANTES DE INGRESSAR

PARA O CFO?

15%

25%

25%

35%

Já tinha esclarecimentossuficientes, mas não vianenhuma utilidade prática.

Não sabia com clareza doque se tratava e nem meinteressava pelo assunto.

Confundia com proteçãodos direitos dosinfratores.

Sabia ser algo importantepara mim, só não tinhamaiores esclarecimentos.

Nesta pergunta, buscou-se analisar qual era a opinião formada pelo(a)

cadete sobre Direitos Humanos antes de ele ingressar no Curso de Formação de

Oficiais( CFO). De todo o grupo pesquisado 35% disseram saber, que os Diretos

humanos era algo que tinha um real significado em sua vida, porém não tinha

maiores esclarecimentos; 25% afirmaram que não sabiam com clareza do que se

tratava e nem se interessavam pelo assunto; da mesma forma 25% disseram que,

confundiam com proteção dos direitos dos infratores, e somente 15% optaram por

responder que já tinham esclarecimentos suficientes, mas não viam nenhuma

utilidade prática.

Neste caso, podemos observar que a maioria dos Cadetes pesquisados já

possuía alguma noção de que os Direitos Humanos são importantes para sua vida,

e pouco conhecimento sobre o assunto. Nota-se, também, uma significativa parcela

optou por responder que confundia os Direitos Humanos com proteção dos direitos

dos infratores.

GRÁFICO 2 – AS AULAS DE DIREITOS HUMANOS NA SUA OPINIÃO:

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0%

37%

57%

6%

Não agregamconhecimento;

Agregam poucoconhecimento;

Agregam muitoconhecimento;

Foram desnecessárias àsua formação.

Como vimos, os Cadetes, em sua maioria, possuíam pouco conhecimento

sobre Direitos Humanos, neste gráfico será analisado, se durante o CFO o cadete

agregou mais conhecimento sobre o assunto.

Dos discentes pesquisados, 57% disseram que as aulas lhes agregaram

muito conhecimento sobre o assunto, 37% disseram que agregaram pouco

conhecimento, 6% afirmaram terem sido as aulas de Direitos Humanos

desnecessária para sua formação e nenhum dos entrevistados respondem que as

aulas não agregaram conhecimento.

Apesar de 57% dos entrevistados terem respondido que as aulas lhes

agregaram conhecimentos, nota-se que se somando os demais percentuais,

verifica-se que um número significativo, 43% dos entrevistados, acham que as aulas

agregaram pouco ou nenhum conhecimento.

GRÁFICO 3 – APÓS SEU INGRESSO NO CFO COM AS AULAS DE DIRETIOS HUMANOS

QUE TEVE DURANTE OS TRÊS ANOS DE CURSO VOCÊ CONCLUI:

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50

1%

37%

36%

26%

Que a metodologia foiadequada, mas, osconteúdos apresentadosestão desatualizados.

Os conteúdos sãoadequados, mas a metologiade ensino precisa serrevista;

Os conteúdos e a metologiaprecisam ser revistos

Os conteúdos e ametodologia estãoadequados.

Dos militares pesquisados 37% concordam que os conteúdos são

adequados, mas a metodologia de ensino precisa ser revista, 36% que os

conteúdos e a metodologia precisam ser revistos, já 26% admitem que os

conteúdos e a metodologia estão adequados e somente 1% afirma que a

metodologia foi adequada, mas, os conteúdos apresentados estão desatualizados.

Isto implica em dizer que, a maioria dos entrevistados está satisfeita com a

maneira com a qual as aulas são ministradas, pois se somados os percentuais dos

que julgam adequada a metodologia e o conteúdo, com os que julgam adequado

somente o conteúdo temos 64% dos entrevistados, um número maior do que os

37% que estão insatisfeitos com a metodologia e o conteúdo.

GRÁFICO 4 – NA SUA OPINIÃO DIREITOS HUMANOS SÃO?

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11%

6%

15%

68%

Ótimos, na teoria, masnão têm aplicabilidadeprática;

É algo que só vai serefetivo para a proteção deinfratores;

É importante para oscivis, mas inexistente parapolícia;

Direitos dos quais você etoda sociedade sãodetentores e que sãoaplicáveis na prática,devendo ser promovidose protegidos sempre.

Esta pergunta é fundamental, pois, retrata o saber construído pelo cadete,

referente aos Direitos Humanos, e se houve uma mudança de opinião deste Policial.

Do total entrevistado 68% responderam que são direitos, dos quais você e

toda sociedade são detentores e que são aplicáveis na prática, 15% que é

importante para os civis mas inexistente para polícia, 6% afirmaram que é algo que

só vai ser efetivo para a proteção de infratores e 11% optaram por marcar que são

ótimos na teoria, mas não têm aplicabilidade prática;

Verifica-se, com isto, que uma maioria significativa, quase 70% dos

entrevistados, possuem agora uma opinião favorável e coerente aos Direitos

Humanos, porém, temos que 6% destes Policiais ainda conservam a idéia de que

estes direitos são efetivos apenas para os infratores. Em contrapartida, ao

confrontar-se este gráfico com o gráfico número 01, conclui-se que houve uma

redução significativa desta opinião, de 25% para 6%.

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Outro aspecto interessante é que ao se confrontar o gráfico 3 com este ,

verifica-se que o percentual de 64% de entrevistados satisfeitos com o curso

adquiriam também um a visão moderna sobre direitos humanos, que é um indicativo

de mudança de opinião, alcançada através das aulas.

4 CONCLUSÕES E SUGESTÕES

A PMMG para desenvolver a sua missão constitucional com excelente

qualidade, procura dar, aos seus integrantes, condições mínimas para prestarem

um bom serviço à comunidade. Deste modo, o ensino de Diretos Humanos é um

fator primordial que deve ser observado no conjunto mínimo de qualidades para se

ter um bom profissional.

O Ensino de Direitos Humanos torna mais fácil a compreensão dos

problemas sociais (a fome, a miséria extrema, o preconceito, a criminalidade, entre

outros), desenvolve habilidades humanísticas e torna o Policial mais socialmente

participativo e desenvolve valores importantes para a carreira do Oficial da Polícia

Militar, como a tolerância, o respeito às diferenças, o respeito aos valores humanos,

a sociabilidade, a atitude, dentre outros.

Este trabalho de pesquisa pretendeu estudar através da historiografia das

polícias e dos direitos humanos, o desenvolvimento do ensino desta disciplina em

nossa Polícia e na Academia de Polícia Militar. Durante a pesquisa também se

analisou como o ensino de Direitos Humanos estimula a consciência do cadete da

importância destes direitos em sua vida.

A pesquisa bibliográfica, documental e de campo realizada e apresentada

mais especificamente nos capítulos II,III,IV , permitem concluir que tanto o objetivo

geral, quanto os objetivos específicos, foram plenamente alcançados, conforme se

verá adiante nas considerações sobre as hipóteses do trabalho.

Em relação à hipótese básica da pesquisa: Os conteúdos da disciplina de Direitos

Humanos estão desatualizados e não possibilitam ao cadete adquirir conhecimentos

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e desenvolver habilidades sobre o tema. Não comprovada. De acordo com os dados

obtidos através da pesquisa de campo, consubstanciada no gráfico 3 deste trabalho.

Em relação às hipóteses secundárias, têm-se as seguintes considerações:

a) A metodologia de ensino dos instrutores não possibilita uma sensibilização dos

cadetes para o tema, o que dificulta o entendimento dos conteúdos e contribui para

que os discentes mantenham uma opinião desfavorável aos Direitos Humanos

reforçando a idéia de que são “direitos de bandidos”.

Não comprovada. O gráfico 4 deste trabalho, demonstra que há um número,

inexpressivo de cadetes que ainda conservaram a opinião de que Direitos Humanos

só servem para a proteção de “Bandidos”. E que um número expressivo 68% tem

uma visão moderna sobre o tema.

Com a análise das hipóteses responde-se ao problema:

a) O conteúdo e a metodologia de ensino de Direitos Humanos, trabalhados

no Curso de Formação de Oficiais da Polícia Militar de Minas Gerais possibilitam ao

cadete adquirir conhecimentos e desenvolver habilidades, que poderão ser

utilizados em sua vida operacional?

Sim, a disciplina proporcionou aos discentes entrevistados uma visão mais

ampla sobre Direitos Humanos, o que é comprovado pelo gráfico 2. Constata-se

pelo gráfico 3, que não é necessária uma revisão dos conteúdos programáticos e da

metodologia de ensino. Ainda, verifica-se que mais de 60% dos entrevistados

compreendeu a essência dos Direitos Humanos e a importância de promovê-los e

respeitá-los.

b) Após três anos de curso com uma carga horária de 90 horas/aula, o Cadete,

futuro oficial, constrói uma opinião positiva sobre Direitos Humanos?

Sim, verifica-se no gráfico 4, que 32% dos entrevistados ainda conservam

uma opinião desfavorável aos direitos humanos contra 68% que tem uma visão

moderna e acertada sobre o tema, isto comprova que houve sim uma mudança

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significativa da opinião dos cadetes com relação a Diretos Humanos.

Apesar da não confirmação da hipótese com relação a metodologia e aos

conteúdos, propõe-se, que os estes sejam revistos anualmente através de

reuniões pedagógicas, para que não ocorra o que Paulo Freire chama de “educação

bancária”, visto que o tema Direitos Humanos é amplo e dinâmico. Sugere-se ainda

a realização de seminários, palestras e work shops, para discussão mais ampla do

assunto.

Por fim, vale ressaltar que este trabalho não é um fim em si mesmo, são

referências que visam a melhoria do ensino de Direitos Humanos dos futuros oficiais

da Polícia Militar de Minas Gerais.

BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

BALESTRERI, R.B. Direito Humanos, Segurança Pública e promoção da

Justiça. Passo Fundo: Berthier, 2004.

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BECCARIA, Cesare Bonesana,Marchesi di. Dos Delitos e das Penas. Tradução de Vicente

Sabino Júnior. São Paulo,2002.

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promulgada em 5 de outubro de 1988.Organização do texto: Juarez de Oliveira.4.ed.

são Paulo: Saraiva,1990.168p.(série Legislação Brasileira).

CHOMSKY, Noan. O Lucro ou as pessoas. Tradução de Pedro Jorgensen Jr.

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F. Bastos, 2003. P. 39.

COTTA, Francis Albert. Breve História da Polícia Militar de Minas Gerais. Belo

Horizonte: Crisálida, 2006.

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FREIRE, Paulo. A Pedagogia da Autonomia: Saberes necessários à prática

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JÉSUS, José Lauri Bueno de. Polícia Militar e Direitos Humanos.Curitiba:

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MINAS GERAIS, Polícia Militar. Comando Geral. Diretriz de Direitos Humanos.

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MINAS GERAIS, Polícia Militar. Comando Geral. Manual de Prática Polícial. Belo

Horizonte, 2002.

MONET, Jean Claude. Polícias e Sociedades na Europa. 3.ed. São Paulo: Edusp,

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dezembro de 1948.

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SOARES, Luiz Eduardo,1954-Segurança tem saída/ Luiz Eduardo Soares- Rio de

Janeiro:Sextante,2006.

APÊNDICE

Modelo de questionário da monografia

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Questionário

Instruções:

1.Responda todas as perguntas abaixo de forma sincera;

2.Não deixe itens sem resposta;

3.Não é necessário se identificar.

Perguntas

1.Qual era sua visão sobre Direitos Humanos antes de ingressar para o CFO?

A( )Já tinha esclarecimentos suficientes, mas não via nenhuma utilidade prática;

B( )Não sabia com clareza do que se tratava e nem me interessava pelo assunto;

C( )Confundia com proteção dos direitos dos infratores;

D( )Sabia ser Algo importante para mim, só não tinha ,maiores esclarecimentos.

Outros:______________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________________.

2. As aulas de Direitos Humanos na sua opinião:

A( )Não agregaram conhecimento;

B( )Agregaram pouco conhecimento;

C( )Agregaram muito conhecimento;

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D( )Foram desnecessárias a sua formação.

3. Após seu ingresso no CFO com as aulas de Direitos Humanos que

teve durante os três anos de curso você conclui:

A( )Que a metodologia foi adequada, mas os conteúdos apresentados

estão desatualizados;

B( )Os conteúdos são adequados mas, a metodologia de ensino

precisa ser revista;

C( )Os conteúdos e a metodologia precisão ser revistos;

D( )Os conteúdos e a metodologia estão adequados.

4.Na sua opinião os Direitos Humanos são?

A( )Ótimos na teoria mas, não tem aplicabilidade prática;

B( )É algo que só vai ser efetivo para a proteção de infratores:

C( )É importante para os civis mas inexistente para polícia;

D( )Direitos os quais você e toda sociedade são detentores e que são

aplicáveis na prática, devendo ser promovidos e protegidos sempre.