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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” AVM FACULDADE INTEGRADA O ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO PRATICADO PELO BENEFICIÁRIO. Por: Nilton Vieira Reis Orientador Prof. William Rocha Rio de Janeiro 2014 Neevia docConverter 5.2.0 DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL

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Page 1: DOCUMENTO PROTEGIDO PELA LEI DE DIREITO AUTORAL - … · Acerca da origem do estelionato, Rogério Greco destaca: Desde que surgiram as relações sociais, ... Curso de Direito Penal:

UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

O ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO PRATICADO PELO BENEFICIÁRIO.

Por: Nilton Vieira Reis

Orientador

Prof. William Rocha

Rio de Janeiro

2014

Neevia docConverter 5.2.0

DOCUMENTO PROTEGID

O PELA

LEI D

E DIR

EITO AUTORAL

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

AVM FACULDADE INTEGRADA

O ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO PRATICADO PELO BENEFICIÁRIO.

Apresentação de monografia à AVM Faculdade

Integrada como requisito parcial para obtenção do

grau de especialista em Direito e Processo Penal

Por: . Nilton Vieira Reis

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente a Deus que nunca me desamparou mesmo nos momentos difíceis, aos meus familiares que sempre me apoiam nas minhas escolhas e a “ela”, onde quer que esteja fez do pouco momento os melhores e mais felizes.

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DEDICATÓRIA

Dedico à minha amiga Marcela, quem tanto me incentivou e auxiliou na elaboração deste trabalho, e aos colegas do 6º Juizado Especial Federal de São João de Meriti.

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RESUMO

O presente estudo objetiva melhor compreender o tratamento jurídico brasileiro

para o crime de Estelionato Previdenciário.

Os crimes previdenciários tem como consequência a lesividade de toda uma

sociedade, o que compromete seus próprios benefícios. Esses crimes tipificados pelo

Código Penal em seu artigo. 171.

Analisaremos a classificação jurídica mais adequada para o crime consistente no

emprego de meios fraudulentos por parte do sujeito ativo com o objetivo de obter, para

si ou para outrem, vantagem ilícita economicamente apreciável em prejuízo do Instituto

Nacional de Seguridade Social (artigo 171, § 3º, do Código Penal).

Assim sendo, iniciaremos o primeiro capítulo compreendendo melhor

estelionato em sua modalidade fundamental, através do caput do artigo em tela.

Passando para o segundo capítulo, trataremos efetivamente a abordagem do estelionato

previdenciário, ressaltando a sua definição, previsão legal, apontamentos históricos e

outras peculiaridades. Na sequência, fez-se o estudo sobre algumas das classificações

penais utilizadas pela doutrina e pertinentes ao tema.

E por último, finalizaremos, quando da análise das classificações apontadas pela

jurisprudência e pela doutrina pátria.

Palavras-chave: “Estelionato”; “Previdência Social”; “Crime Instantâneo”;

“Continuidade Delitiva”.

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METODOLOGIA

A morosidade da fiscalização por parte das autoridades competentes facilita de

certa forma a propagação deste ilícito penal. O tema é de grande relevância e bastante

polêmico, despertando interesse ao ser elaborado e analisado.

Todos os materiais utilizados para elaboração e melhor compreensão do tema

estão respaldados em pesquisas bibliográficas de renomados entendedores pertinentes,

leitura de periódicos jurídicos e trabalhos acadêmicos, assim como análise de alguns

julgados, tanto do STJ (Superior Tribunal de Justiça), quanto do STF (Supremo

Tribunal Federal), e suas tendências a respeito do tema.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 08 1. DO ESTELIONATO 09 1.1- Apontamentos Históricos 09 1.2- Da Conceituação de Estelionato 13 2. DO ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO 14 2.1- Apontamentos Históricos 14 2.2- Conceito 20 2.3- Bem Jurídico e Sujeitos do Delito 22 3. O CRIME DE ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO: EXAME DO TIPO PENAL, COMPETÊNCIA E INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA 22 3.1- Tipo Penal 24 3.1.1 Verbos Nucleares do Tipo 25 3.1.2- Vantagem Ilícita 26 3.1.3- Prejuízo Alheio 27 3.1.4- Tipos Objetivos 28 3.1.5- Incidência da Majorante 28 3.1.6- Bem Jurídico 29 3.1.7- Sujeito Ativo 30 3.1.8- Sujeito Passivo 30 3.1.9- Elemento Subjetivo 31 4. OS DIFERENTES MOMENTOS CONSUMATIVOS ADOTADOS PARA O CRIME DE ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO E SUAS CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS 32 4.1- Estelionato previdenciário como crime instantâneo ou instantâneo de efeitos permanentes 34 4.2 Estelionato previdenciário como crime permanente ou eventualmente permanente 38 4.3- Classificação Mista 42 4.4 Estelionato previdenciário como crime continuado 44 CONCLUSÃO 46

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INTRODUÇÃO

O estelionato, delito previsto no artigo 171 do Código Penal, são meios

fraudulentos por parte do sujeito ativo com o objetivo de obter, para si ou para outrem,

vantagem ilícita economicamente apreciável em prejuízo alheio.

Porém o nosso judiciário passou a receber, com frequência, a situação de

estelionato na qual o sujeito passivo venha a ser a Previdência Social. Nas ações penais

verificava-se a perpetração de fraude contra a Autarquia Previdenciária, por meio de

recebimento de parcelas indevidas de benefícios concedidos pelo INSS, decorrentes

basicamente da falsificação de documentos ou de vínculos empregatícios não

comprovados. Referindo-se a este delito a doutrina passou a utilizar a nomenclatura

“estelionato previdenciário”.

Segundo entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça, o tipo de

estelionato contra a Previdência Social é crime permanente. O Supremo Tribunal

Federal, contudo, é tendencioso no sentido de se constituir crime instantâneo de efeitos

permanentes.

A doutrina vem buscando saídas para tal discussão e, atualmente, apresenta a

possibilidade de considerar o estelionato previdenciário como concurso de crimes em

continuidade delitiva (art. 71 do Código Penal) ou, ainda, como concurso formal (artigo

70 do Código Penal).

Optar por uma classificação em detrimento das outras acarreta consequências

práticas importantes, merecendo especial atenção as questões da prescrição da pretensão

punitiva e da autuação em flagrante.

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1. DO ESTELIONATO

Este capítulo tem por objetivo traçar alguns comentários acerca da conduta típica

de estelionato. Limitando tão somente ao caput do artigo 171 do Código Penal,

considerando as variadas modalidades desse delito, expostas nos incisos do parágrafo

segundo do referido artigo, à margem do presente trabalho.

1.1- Apontamentos Históricos

O estelionato é cometido desde os primórdios da civilização, sendo que, nos

primeiros séculos, tal delito era tratado de forma bastante severa. Verifica-se, contudo,

que esse crime só assumiu objeto próprio, tornando-se entidade distinta e diversificada

da falsidade ou de outros crimes contra o patrimônio, nos fins do século XVIII. Até

então, o estelionato possuía natureza extraordinária, aplicando-se aos casos em que não

fosse possível configurar a conduta como sendo outro delito patrimonial. Nesse sentido,

expôs Romeu de Almeida Salles Júnior:

Segundo historiadores, o direito romano antigo desconhecia a figura do delito de estelionato. Achava-se ele era integrado no dolus malus, delito privado de criação pretoriana. Ao tempo do império (sec. II D.C.) apareceu tratado genericamente como estelionato. Era delito extraordinário e abrangia casos que não merecessem enquadramento em outro delito de natureza patrimonial. Continuou o estelionato a ser tratado como delito suplementar no direito intermédio. Não tinha objeto próprio. Somente em fins do século XVIII surgiu o estelionato como entidade distinta, autônoma, diversificando-se da falsidade.1

Mário Zangari, em sua obra Do Estelionato, enfatiza:

A figura jurídica em apreço [sic] sofre uma evolução, pois, muitos crimes que eram considerados como de furto na antiga Roma, no Direito Intermédio, passaram a constituir crime de estelionato. Como Ravizza esclarece, no Direito Moderno, os criminalistas preocuparam-se em acentuar a

1 SALLES JÚNIOR, Romeu de Almeida. Apropriação Indébita e Estelionato: indagações, doutrina, jurisprudência e prática, p. 209.

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distinção existente entre o estelionato e os outros crimes contra o patrimônio. 2

Acerca da origem do estelionato, Rogério Greco destaca:

Desde que surgiram as relações sociais, o homem se vale da fraude para dissimular seus verdadeiros sentimentos, intenções, ou seja, para, de alguma forma, ocultar ou falsear a verdade, a fim de obter vantagens que, em tese, lhe seriam indevidas. Veja-se o exemplo citado pela Bíblia, que ocorreu entre Jacó e seu pai Isaque. Como seu irmão Esaú tinha o direito de primogenitura, deveria receber a bênção de seu pai, que já se encontrava avançado em idade, prestes a morrer. Jacó, no entanto, induzido por sua mãe, almejando receber a bênção no lugar de seu irmão, aproveitando-se do fato de que seu pai já não mais enxergava, se fez passar por Esaú.3

Ademais, Mário Zangari, ao ressaltar os traços históricos existentes, salienta a

gravidade com a qual era punido o infrator do delito. Dispõe que em diversos povos –

como na Índia, Babilônia e Egito – a pena capital era a sanção imposta ao estelionatário.

Na antiga China, por sua vez, a fraude era punida com a amputação do nariz:

Na antiga China, existiam leis que puniam a fraude com a amputação do nariz. Entre os hebreus o estelionato também era punido com penas severas. Na Babilônia a pena era mais severa, pois, ao estelionatário, aplicava-se a pena capital. O Código de Manu, que foi a legislação do povo indiano, contemplava penas severíssimas aos que praticavam o crime de estelionato. Assim é que, segundo Manzini, os estelionatários eram punidos com a pena de morte e seus corpos esquartejados.4

Salienta-se que as sanções severas impostas na antiguidade eram aplicadas desde

que os infratores pertencessem às castas inferiores. Carlos Roberto Bacila, ao abordar o

Código de Manu, assim dispôs:

2 ZANGARI, Mário. Do Estelionato: doutrina e prática, p. 13. 3 GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: parte especial, vol III, p. 240. Cabe mencionar o caráter patrimonial decorrente da aludida benção, eis que com esta tornava-se o primogênito senhor de todos os bens da família. 4 ZANGARI, M. Obra Citada, p. 11-12.

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Na Índia, o Código de Manu (Manava-Dharma-Sastra), que remonta ao século XIII a.C., atribui ao Deus Brahma o direito de castigar, que o delega ao rei. A legislação que já conseguia distinguir, ainda que de maneira rudimentar, o dolo da culpa e do caso fortuito, entretanto, pertencia a um povo rigorosamente dividido em classes sociais, baseado na crença religiosa, mas que, no fim de tudo, fazia com que os ricos não sofressem penas corporais e que os membros das castas superiores ficassem impunes ainda que praticassem crimes.5

Natavelmente, rigorosas as leis primitivas que puniam os integrantes das castas

inferiores que cometessem o estelionato. Quanto à pena de morte, entende-se que essa

medida é ineficaz e em nada contribui para a redução do índice de criminalidade, tal

qual manifestado por Cesare Beccaria:

A pena de morte, pois, não se apoia em nenhum direito. É guerra que se declara a um cidadão pelo país, que considera necessária ou útil a eliminação desse cidadão. Se eu provar, contudo, que a morte nada tem de útil ou de necessário, ganharei a causa da humanidade. [...] A experiência de todos os séculos demonstra que a pena de morte jamais deteve celerados determinados de praticar o mal. [...] O rigor do castigo faz menor efeito sobre o espírito do homem do que a duração da pena, pois a nossa sensibilidade é mais fácil e mais constantemente atingida por uma impressão ligeira, porém freqüente, do que por abalo violento, porém passageiro.6

Por fim, quanto às penas corporais impostas, como a amputação do nariz do

infrator. Seria uma maneira utilizada de forma oficial pelos governantes de se criar,

embora tal criação seja absurda e inaceitável, duas espécies de seres: os estigmatizados

e os “normais”.

Acerca dos estigmas, convém ressaltar o trabalho de Carlos Roberto Bacila,

segundo este:

Estigma é um sinal ou marca que alguém possui, que recebe um significado depreciativo. No início era uma marca oficial gravada a fogo nas costas ou no rosto das pessoas. Entretanto, não se trata somente de atributos físicos, mas também da imagem social que se faz de

5 BACILA, Carlos Roberto. Estigmas: um estudo sobre os preconceitos, p. 63. 6 BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas, p. 52-53.

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alguém para inclusive poder-se controlá-lo e até mesmo de linguagem de relações, para empregar expressão de Erving Goffman, que compreende que o estigma gera profundo descrédito e pode também ser entendido como defeito, fraqueza e desvantagem. Daí a criação absurda de duas espécies de seres: os estigmatizados e os “normais”, pois, afinal, considera-se que o estigmatizado não é completamente humano.7

Adentrando na Legislação Brasileira, vislumbra-se que o Código de 1830 trazia

um tipo penal com a denominação de estelionato (artigo 264), no qual se ressaltava o

artifício e a fraude para a consumação do delito.

Subsequente, na Consolidação das Leis Penais de 1932, elaborada por Vicente

Piragibe, contemplava-se a figura do estelionato no artigo 338. De forma semelhante ao

que ocorre no atual artigo 171 do Código Penal, consagrou o legislador, naquele

dispositivo, diversas modalidades de fraude que daria forma a realização do tipo. A

pena, por sua vez, assumia os ensinamentos do princípio humanitário. Deste modo,

havia previsão de pena privativa de liberdade de um a quatro anos, acrescida de multa

no importe de 5 a 20% do valor do objeto sobre o qual recaísse o crime.

Por fim, o projeto de Alcantara Machado convertido no Código Penal de 1940

impôs algumas alterações acerca do dispositivo previsto no Código de 1890.

No que concerne a essas modificações, ressalta-se, novamente, o ensinamento de

Mário Zangari:

Assim é que, prevê a circunstância não só da vantagem auferida pelo crime, em benefício do estelionatário, mas também de terceiro e considera fraude não sómente [sic] aquela que induz a vítima em êrro [sic], mas também qualquer emprêgo [sic] fraudulento que mantenha o sujeito passivo do crime em erro [sic] preexistente. Como focaliza o ex-Ministro Francisco Campos na “Exposição de Motivos”, o próprio silêncio, quando malicioso ou intencional acêrca [sic] do preexistente êrro [sic] da vítima, constitui meio fraudulento característico do estelionato.8

Impende registrar, ainda, que as sanções previstas sofreram pequeno gravame. A

pena privativa de liberdade passou a constar no liame entre um e cinco anos de reclusão,

7 BACILA, C. R. Idem, p. 24-25. 8 ZANGARI, M. Obra Citada, p. 22.

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bem como a pena de multa passou a ser fixada com vistas em dias-multa, seguindo a

regra do atual artigo 49 do Código Penal.

1.2- Da Conceituação de Estelionato

A palavra estelionato tem origem em stellio que significa camaleão. Da mesma

forma que este animal tem a capacidade de mudar de cor, confundindo a sua presa e o

seu predador, tal fato ocorre com o estelionatário. Este, em razão dos seus “disfarces”,

engana a vítima utilizando-se de meios fraudulentos, objetivando êxito em sua conduta

criminosa.

O Código Penal Brasileiro, em seu artigo 171, caput, dispõe que o estelionato

consistiria em “Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio,

induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro

meio fraudulento”.

Conforme leciona Salles Júnior, não se tem uma autêntica definição, eis que o

legislador preferiu tão-somente elencar os elementos constitutivos. Criou-se, deste

modo, uma fórmula genérica na qual os componentes aparecem em destaque.

Não resta dúvida de que o delito pode apresentar-se nas mais diversas formas. Porém, por mais engenhosa que seja a trama, para que se tenha o estelionato é necessário que estejam presentes os seus elementos constitutivos e que são postos em relevo pelo art. 171 do Cód. Penal. Ausente um desses elementos, não se verificará a configuração do crime em estudo.9

Mas quais seriam os elementos constitutivos inerentes à redação do artigo 171

do Código Penal? Responde Magalhães Noronha:

Várias e imprevisíveis são as formas que o estelionato pode assumir, mas todas têm de apresentar elementos comuns, sob pena de não se caracterizar o crime, podendo, então, surgir outro delito. Se quisermos decompô-lo em seus elementos, de maneira ampla, e abstraídos o sujeito ativo, o passivo e o dolo que aparecem em todo crime, podemos dizer que lhe são característicos: a) a consecução da vantagem ilícita; b) o emprego de meio fraudulento; c) o erro causado ou mantido por esse meio; d) o nexo de

9 SALLES JÚNIOR, R. de A. Obra Citada, p. 213.

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causalidade entre o erro e a prestação da vantagem; e) a lesão patrimonial. Se preferirmos sintetizar, podemos circunscrever o crime a: meio fraudulento; erro causado ou mantido; vantagem indevida; lesão ao patrimônio. Resume-se assim o crime ao polinômio: meio fraudulento + erro+ vantagem ilícita + lesão patrimonial = estelionato.10

2. DO ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO

O ordenamento jurídico brasileiro não possui tipo autônomo referente ao

instituto “estelionato previdenciário”, sendo este regrado pelo artigo 171, caput, do

Código Penal cominado com a causa de aumento prevista no parágrafo terceiro do

mesmo.

Art. 171 – Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento: Pena – reclusão, de um a cinco anos, e multa. [...] § 3º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é cometido em detrimento de entidade de direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficência.

Todavia, antes de aprofundarmos na discussão acerca do tipo e correlata pena,

convém analisar alguns outros fatores como a parte histórica e o conceito do delito em

questão.

2.1- Apontamentos Históricos

Já vimos anteriormente que o delito em comento estava previsto no artigo 95,

alínea j, da Lei nº. 8.212/91, o qual dispunha:

Art. 95. Constitui crime: [...] j) obter ou tentar obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo direto ou indireto da Seguridade Social ou de suas entidades, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante

10 NORONHA, E. Magalhães. Direito Penal, Vol II, p. 369.

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artifício, contrafação, imitação, alteração ardilosa, falsificação ou qualquer outro meio fraudulento.

Tem-se que a Lei nº. 8.212/91 aborda11 o tema referente ao financiamento e

organização da Seguridade Social, bem como regulou a matéria objeto da Lei

nº.3.807/60 em sua totalidade. Deste modo, as condutas tipificadas no já referido art. 95

passaram a ser tratadas como crimes contra a Seguridade Social, especificados em lei

própria.

Destaca-se que a lei da década de 60 tipificava, em seu art. 86, a apropriação

indébita das contribuições e de outras quaisquer importâncias devidas às instituições e

arrecadadas dos segurados ou do público. Posteriormente, em 1966, o artigo 155 da

mesma lei sofreu alterações de modo a equiparar certas condutas aos crimes de

sonegação fiscal (então tipificado na Lei nº. 4.729/65), apropriação indébita (artigo 168

do Código Penal), falsidade ideológica (artigo 299 do Código Penal) e estelionato

(artigo 171 do Código Penal).

Vez que a Lei nº. 8.212/91 regulou integralmente a matéria objeto da Lei nº.

3.807/60 quedou esta revogada tacitamente.

Todavia, o artigo 95 da Lei nº. 8.212/91 – excepcionadas as alíneas d, e e f –

não previa penas, limitando-se a afirmar que as condutas ali elencadas constituíam

crimes. Neste sentido, destacou Francisco Dias Teixeira:

Os arts. 86 e 155 da Lei nº 3.807/60 foram substituídos pelo art. 95 da Lei 8.212/91. Porém, o art. 95, ao contrário do art. 155, não se reporta a outros tipos penais preexistentes. O art. 95 limita-se a dizer que aquelas condutas elencadas constituem crime; e o parágrafo 1º diz que, aos crimes previstos nas alíneas "d", "e" e "f" (ou seja: apropriação indevida de contribuição) a pena é aquela cominada no art. 5º da Lei nº 7.492/86, que é de dois a seis anos de reclusão. Quanto às alíneas "a", "b" e "c" (sonegação fiscal); "g", "h" e "i" (falsidade ideológica); e "j" (estelionato) do referido art. 95, não é prevista pena.12

11 Embora os artigos relativos aos crimes previdenciários tenham sido revogados, a referida lei continua em vigor no que concerne ao financiamento e organização da Seguridade Social. 12 TEIXEIRA, Francisco Dias. Crime contra a Previdência Social em face da Lei nº. 9.983/00. In Boletim dos Procuradores da República, nº. 30, p. 3.

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Com a imperfeita redação do referido artigo 95 acarretou profunda discussão

doutrinária. Isto porque as alíneas diversas das que foram excepcionadas continuaram

recebendo da jurisprudência, por analogia, as penas baseadas nas leis tributárias e penais

anteriormente editadas. Entretanto, tal conduta feria o princípio da legalidade, garantido

constitucionalmente no artigo 5º., inciso XXXIX, e também no artigo 1º. do Código

Penal, dos quais destaca-se que não há pena sem prévia cominação legal.

Questões desta ordem tornaram imperioso o surgimento de uma nova legislação

que suprisse a aludida omissão, fato este que ocorreu em 2000 com a publicação da Lei

nº. 9.983.

Ocorre que o crime de estelionato praticado em detrimento da Previdência Social

não fora contemplado pelas alterações trazidas pela Lei n. 9.983/00, a qual inseriu no

Código Penal, entre outros, os crimes de apropriação indébita previdenciária (art. 168-

A), falsum em detrimento da Previdência (art. 297, §§ 3º e 4º), inserção de dados

falsos em sistemas de informações (art. 313-A) e a sonegação de contribuição

previdenciária (art. 337-A).

Com a nova legislação, em seu artigo 3º, acaba por revogar expressamente as

alíneas do artigo 95 da Lei nº. 8.212/91. Diante da derrogação da legislação anterior, o

estelionato previdenciário passou a ser regido pelo artigo 171 do Código Penal

cominado com a causa de aumento prevista em seu parágrafo terceiro.

Sobre a Lei nº. 9.983/2000, Francisco Dias Teixeira dispôs:

Esta lei revogou expressamente o art. 95 da Lei nº 8.212/91, com exceção de seu § 2º; e inseriu no Código Penal, a grosso modo, os mesmos tipos então descritos no mencionado art. 95, atinentes a condutas lesivas à Previdência Social. Adotou-se, pois, uma terceira técnica: ao invés de relacionar, na lei previdenciária, as condutas criminosas contra a Previdência Social, reportando-se ao Código Penal apenas quanto à pena, conforme se fez na Lei nº 3.807/60, ou de regular toda a matéria penal na lei previdenciária, conforme tentou-se fazer através da Lei nº 8.212/91, a questão agora passou a ser regulada inteiramente no Código Penal. Parece que a nova técnica revela uma opção política do legislador, objetivando, por um lado, dar maior visibilidade aos crimes praticados contra a Previdência Social, e, por outro lado, colocar essas figuras penais a salvo da instabilidade a que estavam sujeitas na lei previdenciária. Também, sob o aspecto simbólico, parece que sua inserção no Código Penal confere ao tipo um

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status mais elevado na escala da reprovabilidade da conduta.13

No mesmo sentido, expôs Euro Bento Maciel Filho:

Induvidosamente, a partir da Lei Federal nº. 9.983/2000, a relação entre o Direito Penal e o Direito Previdenciário, embora já existisse anteriormente – precisamente desde a Lei nº. 3.807, de 26 de agosto de 1960, que primeiramente previu o que se poderia chamar de “crimes previdenciários”–, tornou-se muito mais evidente, muito mais sólida.14

Depreende-se, deste modo, a intenção política do legislador dotar de maior

censurabilidade a conduta ilícita, antijurídica e culpável praticada em detrimento da

Previdência Social. Tal interesse ressai da importante função desempenhada pela

Previdência Social e os prejuízos que esta vem sofrendo em decorrência das ações dos

estelionatários.

Acerca da função da Previdência Social, bem explanou Nelson Bernardes de

Souza:

"Ganharás o pão com o suor de seu rosto". Esta sentença bíblica ecoa no ouvido da humanidade há milênios e o homem não conseguiu, ainda, libertar-se desta condenação. Está destinado a empregar sua capacidade laborativa para poder obter os bens necessários à sua subsistência. Para isso conta com a força bruta de seu corpo e com as energias de sua mente. Ferramentas que se estragam à medida que o organismo biológico envelhece, ou até mesmo antes, diante de acontecimentos imprevisíveis. Está o homem exposto a toda sorte de risco, que a qualquer momento podem minimizar sua força de trabalho, impedindo-o de prover ao seu sustento e de sua família. Necessita então de amparo, de socorro que possibilite a continuação de sua existência sem que se prive do mínimo razoável para sua subsistência. Se não pode obtê-lo pelos seus meios próprios, alguém há de fazer por ele. Surge assim a idéia de socorro mútuo, assistência, finalmente, de previdência, em que o encargo

13 TEIXEIRA, F. D. Idem, ibidem. 14 MACIEL FILHO, Euro Bento. Crimes Previdenciários: análise crítica dos delitos clássicos contra a previdência social, à luz da Lei n. 9.983, de 14.7.2000, p. 5.

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de assistir aos que atingiram o limiar de suas forças ou capacidade é repartido entre todos os membros da coletividade. É a Previdência Social, também chamada por alguns de Seguro Social.15

Por sua vez, em relação ao rombo ocasionado aos cofres do INSS (Instituto

Nacional de Seguridade Social) tem-se uma pesquisa feita pelos Ministérios da Justiça e

da Previdência Social, datada de 09 de dezembro de 2003, segundo a qual se apurou que

“são pagos por ano R$ 107 bilhões em benefícios, desses cerca de R$ 3,15 bilhões são

fraudados.”16 Certo é que este montante de benefícios previdenciários fraudados, ou

seja, pagos indevidamente em decorrência da atitude de estelionatários, é extremamente

elevado. No mesmo sentido, expõe Euro Bento Maciel Filho:

Lamentavelmente, é notório que o INSS não reúne condições para evitar as fraudes de que tem sido vitima (inclusive, como comentado na parte inicial deste trabalho, um dos motivos adotados para justificar o uso do poder coercitivo do Direito Penal como instrumento de combate ao déficit dos sistemas de Previdência é, justamente, o alto número de fraudes contra o sistema). O pior nisso tudo é que, via de regra, o “estelionato previdenciário” não se resume a um único ato, a uma única “vantagem ilícita”, visto que, rotineiramente, o INSS só descobre a fraude de que foi vítima muitos anos depois.17

Não obstante, sendo a Previdência Social regulada pelo binômio contribuintes-

beneficiários, o dano patrimonial sofrido pelo INSS é sentido pela parcela considerável

da população que efetivamente trabalhou e recolheu suas contribuições por vários

anos18, ou seja, o delito em tela possui um caráter individual, o que demonstra tratar-se

de crime objetivamente grave que merece especial atenção tanto por parte do legislativo

quanto do judiciário.

Em relação à fraude contra a Previdência Social e os prejuízos que tal conduta

acarreta à sociedade como um todo, é conveniente mencionar:

15 SOUZA, Nelson Bernardes. Ilícitos Previdenciários: crimes sem pena?Jus Navegandi. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1495>. 16 TRÊS, Celso Antônio. Teoria Geral do Delito Pelo Colarinho Branco, p. 190. 17 MACIEL FILHO, E. B. Obra Citada, p. 143. 18 Emprega-se no nosso país o modelo contributivo, segundo o qual os cidadãos, para que possam gozar no futuro do recebimento de benefícios previdenciários, devem necessariamente contribuir ao sistema por meio do pagamento de contribuições sociais.

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A fraude não só afeta o desenvolvimento de políticas sociais, vez que redunda em prejuízo de indivíduos concretos. A fraude nas cotizações causa de modo direto um prejuízo ao patrimônio da Segurança Social, o qual vê reduzido os recursos que possui para desenvolver sua política redistributiva e suas ações prestacionais, com o que de fato se produz uma alteração da distribuição de renda.19

Sob outro viés, torna-se ainda mais grave a conduta delitiva se for verificada a

crise pela qual passa a Seguridade Social. Vislumbra-se um aumento contínuo dos

beneficiários com redução dos contribuintes, efeito decorrente da elevação da

expectativa de vida e redução da natalidade, bem como da crescente evasão e sonegação

do pagamento das contribuições sociais. Visando solucionar tal problema (em especial

no que concerne à sonegação das contribuições), a aplicação do Direito Penal se faz

necessária. Nas palavras de Euro Bento Maciel Filho:

Com efeito, ao afirmarmos que o Direito Penal é regido pelo princípio da subsidiariedade, que lhes confere o caráter de ultima ratio, estamos dizendo, em outras palavras, que a sua intervenção só é legítima quando houver “a certeza de que os demais ramos do Direito se revelam incapazes de solucionar o conflito social e dar proteção a bens jurídicos”. Nessa ordem de idéias, induvidoso que o uso do Direito Penal para a punição dos crimes previdenciários, embora não seja muito recente, tem se mostrado como uma tentativa quase desesperada para se garantir a eficiência de um sistema praticamente falido; tanto é assim que alguns países, pouco a pouco, vêm recrudescendo o tratamento penal do “criminoso previdenciário” com leis cada vez mais duras, justamente porque não têm conseguido solucionar o problema de outra forma mais “suave”.20

Portanto, os doutrinadores vêm se utilizando da retórica, salientando a natureza

supra-individual e a falência sistemática da Seguridade Social, para demonstrar a

importância de uma maior reprimenda penal. Contudo, verifica-se que se houvesse um 19 BRANDARIZ GARCIA, José Ángel. El Delito de Defraudación a La Seguridad Social. Apud. MACIEL FILHO, E. B. Obra Citada, p. 14. Tradução livre. 20 MACIEL FILHO, E. B. Obra Citada, p. 4.

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maior controle, por exemplo, dos benefícios concedidos pelo Instituto Nacional de

Previdência Social, poder-se- ia dispor de uma resposta mais branda a solucionar os

problemas destacados. Critica-se, desta forma, a inversão do princípio da intervenção

mínima, eis que na falta de organização e fiscalização por parte da autarquia

previdenciária, opta-se pela utilização do direito penal.

2.2- Conceito

No capítulo anterior, vimos que estelionato corresponderia ao emprego de meios

fraudulentos por parte do sujeito ativo com o objetivo de conseguir, para si ou para

outrem, vantagem ilícita economicamente apreciável em prejuízo alheio.

Ocorre que o judiciário brasileiro passou a enfrentar, com frequência, a situação

de estelionato na qual o sujeito passivo era a Previdência Social. Para referir-se a tal

delito, a doutrina passou a utilizar da expressão “estelionato previdenciário”.

Assim, pode-se esboçar uma definição do estelionato previdenciário como sendo

a fraude praticada contra a Autarquia Previdenciária, por meio de recebimento de

parcelas indevidas de aposentadoria, auxílio-doença ou outro eventual benefício

concedido pelo INSS, decorrentes basicamente da falsificação de documentos ou de

vínculos empregatícios não comprovados.

Luiz Flávio Gomes apresenta uma definição mais sucinta, tratando o estelionato

previdenciário como a “percepção de benefício previdenciário mediante fraude”.21

Por sua vez, Fábio Zambitte Ibrahim define o estelionato previdenciário da

seguinte forma:

É crime contra o patrimônio da seguridade social, sendo o delito material, pois sua concretização toma lugar com a obtenção da vantagem indevida, como o recebimento de benefício, oriundo de ardil praticado perante o INSS. É estelionato qualificado, apesar de a qualificadora do § 3º não mencionar expressamente a previdência social, conforme verbete nº. 24 da Súmula de Jurisprudência do STJ.22

21 GOMES, Luiz Flávio. Estelionato previdenciário: crime instantâneo ou permanente? Crime único, continuado ou concurso formal? Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8991>. 22 IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário, p. 465.

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Verifica-se que a definição proposta por Fábio Zambitte Ibrahim pauta-se na

súmula nº. 24 do STJ, a qual dispõe: “aplica-se ao crime de estelionato, em que figure

como vítima entidade autárquica da Previdência Social, a qualificadora do § 3º do art.

171 do Código Penal.” Aludida súmula, entretanto, serve apenas para dirimir eventual

dúvida acerca da aplicação da causa de aumento prevista no parágrafo terceiro do artigo

171 do Código Penal, sendo certo que o INSS encaixa-se perfeitamente no conceito de

“entidade de assistência social ou beneficiária”.

Por outro lado, contrariando a redação da súmula em tela, o parágrafo terceiro

não corresponde a uma qualificadora, mas sim a uma causa majorante de pena. Neste

sentido Cezar Roberto Bitencourt expõe:

O estelionato não apresenta figuras qualificadas, mas prevê a majoração da pena aplicada em um terço (§ 3º.), se a infração é cometida em prejuízo de entidade de direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficência.23

Euro Bento Maciel Filho endossa com o posicionamento de Cezar Bitencourt,

apontando os motivos que fundamentaram a inserção da aludida causa de aumento no

Código:

A norma prevista no § 3º, do art. 171, do Código Penal, é uma causa de aumeo de pena, não um tipo penal autônomo – muito embora exista uma pequena corrente doutrinária que vê o § 3º, do art. 171, do Código Penal, como uma forma “qualificada” de estelionato –, que se aplica tanto ao estelionato previsto no caput quanto às demais modalidades típicas elencadas no § 2º, do art. 171, do Código Penal. O fundamento desta causa de aumento de pena reside na maior extensão do dano causado pelo fato, vez que a conduta criminosa, aqui, atinge entidades de expressivo interesse coletivo (vale lembrar que o bem jurídico aqui protegido é coletivo, supra-individual), quais sejam, “entidades de direito público” ou “instituto de economia popular” e “instituto de assistência social ou beneficiária”.24

23 BITENCOURT, Cezar Roberto. Código Penal Comentado, p.770. 24 MACIEL FILHO, E. B. Obra Citada, p. 140-141.

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2.3- Bem Jurídico e Sujeitos do Delito

Tratando-se de estelionato, o bem jurídico tutelado pela norma penal é o

patrimônio. Entretanto, conforme dito anteriormente, aqui não se protege o patrimônio

pessoal, mas sim o patrimônio do INSS que é coletivo.

Naquilo que concerne aos sujeitos do delito, vislumbra-se que o sujeito ativo

pode ser qualquer indivíduo desde que dotado do dolo específico cujo elemento

subjetivo do tipo diverso do dolo corresponde à ação com intuito de obter vantagem

ilícita para si ou para outrem. Logo, trata-se de crime classificado como comum.

Por sua vez, o sujeito passivo do estelionato previdenciário não pode ser outro

que não o INSS.

3. O CRIME DE ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO: EXAME DO TIPO

PENAL, COMPETÊNCIA E INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA

INSIGNIFICÂNCIA

O delito de estelionato previdenciário, assim entendido aquele perpetrado em

detrimento de entidade de previdência social, com o intuito de obter fraudulentamente

benefício previdenciário, tem sua tipificação legal estampada no artigo 171, caput, do

Código Penal, in casu, com a conjugação da majorante de pena prevista no § 3º do

referido artigo.

Com efeito, consoante apontado por Luiz Flávio Gomes (2006), a despeito de a

Lei n. 9.983/2000, vigente desde o dia 15 de outubro de 2000, ter alterado

significativamente o regramento acerca dos crimes previdenciários no Brasil, olvidou-se

do chamado estelionato previdenciário, que continua regido pelo artigo 171, § 3º, do

nosso Código Penal.

Destaque-se, para a caracterização do delito de estelionato previdenciário, em

razão dos fins a que se dirige o presente texto, a conduta do agente que obtém

fraudulentamente, seja por ação ou omissão, benefício previdenciário a que não faz jus,

induzindo e/ou mantendo em erro entidade de previdência social.

Ademais, o objeto de estudo cinge-se aos fatos praticados contra vítimas que

ostentem a qualidade de pessoas jurídicas de direito público, como gestoras de sistemas

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de seguro social, conforme regras e princípios ditados pela Constituição Federal, em

seus artigos 19425 e 201.

Nessa senda, então, gize-se inicialmente que a Previdência Social:

[...] é o sistema pelo qual, mediante contribuição, as pessoas vinculadas a algum tipo de atividade laborativa e seus dependentes ficam resguardadas quanto a eventos de infortunística (morte, invalidez, idade avançada, doença, acidente de trabalho, desemprego involuntário), ou outros que a lei considera que exijam um amparo financeiro ao indivíduo (maternidade, prole, reclusão), mediante prestações pecuniárias (benefícios previdenciários) ou serviços.26

A Constituição da República Federativa do Brasil, nos incisos do artigo 201,

elenca as contingências sociais que serão atendidas pela previdência social, mais

especificamente pelo Regime Geral de Previdência Social, nos seguintes termos, textus:

I – cobertura dos eventos de doença, invalidez, morte e idade avançada; II – proteção à maternidade, especialmente à gestante; III – proteção ao trabalhador em situação de desemprego involuntário; IV – salário-família e auxílio-reclusão para os dependentes dos segurados de baixa renda; V – pensão por morte do segurado, homem ou mulher, ao cônjuge ou companheiro e dependentes [...]

Destarte, as entidades de previdência social devem garantir, ao menos, a

cobertura desses eventos e situações, dispondo de uma espécie de benefício

previdenciário para cada uma das contingências sociais previstas na Carta Magna. 25 Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social. Parágrafo único. Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a seguridade social, com base nos seguintes objetivos: I - universalidade da cobertura e do atendimento; II - uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações urbanas e rurais; III - seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços; IV - irredutibilidade do valor dos benefícios; V - eqüidade na forma de participação no custeio; VI - diversidade da base de financiamento; VII - caráter democrático e descentralizado da administração, mediante gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos empregadores, dos aposentados e do Governo nos órgãos colegiados. 26 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de direito previdenciário. p.85

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Nesse norte, a conduta do agente criminoso será direcionada a fraudar os

requisitos necessários para a obtenção dos diferentes benefícios previdenciários,

modificando a verdade dos fatos a fim de amparar o requerimento sabidamente ilícito

do benefício.

Desse modo, as fraudes empreendidas contra o INSS representam a imensa

maioria dos crimes praticados contra a previdência social.

Certo é que, em tais situações, estar-se-á diante do chamado crime de estelionato

previdenciário, consagrado com essa nomenclatura pela doutrina e jurisprudência, e

previsto no artigo 171, § 3º, do Código Penal.

3.1- Tipo Penal

A figura típica do crime de estelionato contra a previdência social resta assim

delineada no ordenamento jurídico pátrio, inserta no arcabouço repressivo do Código

Penal (Decreto-lei nº 2.848/1940), litteris:

Art. 171 – Obter, para si ou para outrem, vantagem ilícita, em prejuízo alheio, induzindo ou mantendo alguém em erro, mediante artifício, ardil, ou qualquer outro meio fraudulento: Pena - reclusão, de um a cinco anos, e multa. [...] § 3º - A pena aumenta-se de um terço, se o crime é cometido em detrimento de entidade de direito público ou de instituto de economia popular, assistência social ou beneficência.

A palavra estelionato, segundo trazido por Sérgio Biagi Gregório (2012) em

Dicionário Enciclopédico virtual, tem origem “do latim ‘stellionatus’, da raiz ‘stellio’ =

lagartixa, camaleão, cuja pele assume colorações diversas, símbolo, para os latinos, de

esperteza e simulação.” (grifos do autor).

Em idêntico sentido e com perfeita observação:

[...] a palavra estelionato se origina de stellio, ou seja, camaleão, justamente pela qualidade que tem esse animal para mudar de cor, confundido sua presa, facilitando, assim, o bote fatal, bem como para poder fugir, também,

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dos seus predadores naturais, que não conseguem, em virtude de suas mutações, perceber a sua presença, tal como ocorre com o estelionatário que, em razão de seus disfarces, sejam físicos ou psíquicos, engana a vítima com sua fraude, a fim de que tenha êxito na sua empresa criminosa.27

Consoante anotado por José Paulo Baltazar Júnior (2010, p. 64), em uma noção

preliminar:

Dá-se pela obtenção de vantagem ilícita, em prejuízo alheio, utilizando o agente, em lugar da clandestinidade, como se dá, usualmente, no furto, ou, como no roubo, da astúcia, da mistificação, do engodo, embuste, trapaça ou enganação [...].

Anote-se que o tipo penal em tela é bastante complexo, apresentando-se como

uma trama de atos e consequências que, necessariamente, terão de conjugar-se para a

materialização do crime.

Esquematizando:

Para que o estelionato se configure, é necessário: 1º) o emprego, pelo agente, de artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento; 2º) induzimento ou manutenção da vítima em erro; 3º) obtenção da vantagem patrimonial ilícita pelo agente; 4º) prejuízo alheio (do enganado ou de terceira pessoa). Portanto, mister se faz que haja o duplo resultado (vantagem ilícita e prejuízo alheio) relacionado com a fraude (ardil, artifício, etc.) e o erro que esta provocou. 28

Assim, é imperioso ir além, explorando os contornos do tipo penal em suas

pontuais e específicas nuances.

É o que se passa a fazer.

3.1.1 Verbos Nucleares do Tipo

Segundo bem se pode observar no tipo penal, acima transcrito, a conduta será

sempre composta, vez que a prática do crime consiste em obter vantagem indevida

induzindo ou mantendo alguém em erro.

27 GRECO, Rogério. Código penal comentado. p.515 28 DELMANTO, Celso et al. Código penal comentado. p. 396

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A conduta nuclear primordial vem representada pelo verbo obter, ou seja, lograr

proveito ou vantagem ilícita em decorrência do engano provocado no ofendido. Para

obter a vantagem indevida, o agente cuidará de induzir ou manter a vítima em erro,

fazendo com que esta colabore com ele, sem perceber que está se despojando de seus

pertences.

Por outro lado, “manter significa fazer permanecer ou conservar” (NUCCI,

2007, p. 729). Assim, nesta análise, a vítima já se encontra em erro, voluntário ou não,

limitando-se o agente, mediante fraude, a não alterar os fatos, fazendo com que o

ofendido permaneça na situação de erro em que se envolveu.

Importante esclarecer, consoante exposto por Fernando Capez, que o erro:

Consiste na falsa percepção da realidade, provocando uma manifestação de vontade viciada. A situação na qual a vítima acredita não existe. Houvesse o conhecimento verdadeiro dos fatos, jamais teria ocorrido a vantagem patrimonial ao agente, que, para obtê-la, provoca ou mantém a vítima no erro [...].29

No caso do estelionato previdenciário é comum a conduta do agente que,

mediante fraude, costumeiramente consistente na apresentação de documentos

ideologicamente ou materialmente falsos ou ainda por meio de declarações inverídicas,

falseia a verdade, induzindo em erro o servidor responsável pelo atendimento e,

consequentemente, a entidade previdenciária, redundando na concessão de benefício

indevido, vez que, se revelada a situação real, o indeferimento seria o consentâneo

lógico.

Numa segunda possibilidade, igualmente reticente, encontra-se a omissão, pelos

dependentes ou terceiro, do óbito do titular de benefício previdenciário, havendo a

continuidade dos saques dos valores creditados, mantendo a entidade de previdência em

erro, vez que esta acredita serem ainda devidos os proventos, quando já não mais o são.

3.1.2- Vantagem Ilícita

É certo que o intento principal do sujeito ativo do crime de estelionato é a

obtenção da vantagem ilícita, sendo a fraude o meio utilizado para chegar a esse fim.

29 CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal: parte especial. p.537

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A doutrina não é unânime a respeito da natureza dessa vantagem ilícita obtida

pelo agente, isto é, se deve, ou não, ser de natureza econômica.

Greco (2011, p. 514) e Capez, (2008, p. 537), este citando ainda Damásio de

Jesus, sustentam que a vantagem ilícita há de ter natureza econômica, na medida em que

se trata de crime patrimonial, inserto dentro do título do Código Penal que protege o

patrimônio.

Em sentido oposto, Bitencourt (2011, p. 274-276, grifos do autor), filiando-se a

entendimento também esposado por Luiz Régis Prado, entende que a vantagem ilícita

obtida pelo agente pode ter qualquer natureza, sob o argumento de que:

[...] os crimes contra o patrimônio protegem a inviolabilidade patrimonial da sociedade em geral e da vítima em particular, o que não se confunde com a vantagem ilícita conseguida pelo agente. Por isso, não é vantagem obtida que deve ter natureza econômica; o prejuízo sofrido pela vítima é que deve ter essa qualidade.

Por fim, saliente-se que a vantagem deve ser ilícita, injusta, indevida. Caso

contrário, estar-se-á diante de fato atípico ou outra infração penal.

3.1.3- Prejuízo Alheio

Para a sua perfeita concretização, o delito de estelionato é necessário que seja

satisfeito o binômio vantagem ilícita/prejuízo alheio.

Rogério Greco (2011, p. 514) bem sinala que:

Além da vantagem ilícita obtida pelo agente com seu comportamento, a vítima sofre prejuízo, também, de natureza econômica. Assim, tanto poderá perder aquilo que já possuía [...], ou mesmo deixar de ganhar o que lhe era devido, como no caso da vítima que, enganada pelo agente, não comparece, sendo obrigatória sua presença, ao local onde receberia uma premiação, perdendo tal direito, que foi transferido ao agente, segundo beneficiado na lista de premiações.

Atente-se que o prejuízo suportado pela vítima consiste em um dano de natureza

patrimonial, isto é, em um desfalque no patrimônio da pessoa (CAPEZ, 2008, p. 537).

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Deveras, trata-se de crime que exige a ocorrência de resultado, não sendo

infração penal de perigo, concreto ou abstrato. Somente com a ocorrência do prejuízo

alheio, oriundo da fraude empregada, é que restará consumado o crime em testilha; caso

contrário, estar-se-á diante de crime tentado.

3.1.4- Tipos Objetivos

No estelionato, a fim de enganar o sujeito passivo, o agente pode empregar

artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento.

Caracterizando o artifício e o ardil e, sobremaneira, precisando a diferenciação

entre ambos, valiosa é a lição de Capez (2008, p. 536, grifos do autor), ao expor que:

a) Artifício: significa fraude no sentido material. Segundo Mirabete, “o artifício existe quando o agente se utilizar de um aparato que modifica, ao menos aparentemente, o aspecto material da coisa, figurando entre esses meios o documento falso ou outra falsificação qualquer, o disfarce, a modificação por aparelhos mecânicos ou elétricos, filmes, efeitos de luz etc.”. b) Ardil: é fraude no sentido imaterial, intelectualizada, dirigindo-se à inteligência da vítima e objetivando excitar nela uma paixão, emoção ou convicção de uma motivação ilusória. Uma boa conversa, uma simulação de doença, sem nenhum outro disfarce ou aparato, além da “cara-de-pau”.

A expressão “qualquer outro meio fraudulento”, por sua vez, abarcando

inclusive o artifício e o ardil, trata-se de interpretação analógica, abrangendo qualquer

outro meio semelhante a esses que seja apto a ludibriar o ofendido (NUCCI, 2007, p.

730).

Por derradeiro, mencione-se que o meio fraudulento empregado deve ser

suficientemente idôneo para causar embuste na vítima, isto é, induzi-la ou mantê-la em

erro.

3.1.5- Incidência da Majorante

De fato, cuida-se o estelionato previdenciário de crime perpetrado em detrimento

de entidades de direito público, representantes e gestoras de interesses sociais e difusos.

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Atento a isso, o legislador dispensou tratamento mais gravoso ao fato, em

virtude das nefastas consequências da ação criminosa para a sociedade.

Rogério Greco (2011, p. 524), bem pontua que:

A razão de ser do aumento de pena diz respeito ao fato de que todas as entidades arroladas pelo parágrafo prestam serviços fundamentais à sociedade. Assim, o comportamento do agente, causando prejuízo a essas entidades, atinge, reflexamente, a sociedade. Na verdade, embora a entidade prejudicada seja determinada, o número de pessoas que sofre com a conduta do agente é indeterminado.

Esse apontamento amolda-se perfeitamente à fraude praticada contra a

previdência social, visto que a lesão aos cofres públicos atinge indiretamente todo o

contingente de segurados, que contribuem, compulsória ou facultativamente, para o

sistema de proteção social.

Esclareça-se que, como o sistema de previdência pública é organizado sob o

regime de repartição30, a fraude de uma pessoa, que se torna indevidamente beneficiária,

lesiona o patrimônio de todo o grupo de segurados contribuintes.

Nesse norte, aliás, foi editada a Súmula n. 24 pelo Superior Tribunal de Justiça,

dispondo que “aplica-se ao crime de estelionato, em que figure como vítima entidade

autárquica da Previdência Social, a qualificadora [sic] do § 3º, do art. 171 do Código

Penal”.

Trata-se, em verdade, de majorante específica, com de aumento de pena em

patamar fracionário.

3.1.6- Bem Jurídico

Estando o crime de estelionato inserto dentro do Título II do Código Penal

Brasileiro, intitulado “Dos crimes contra o patrimônio”, é evidente ser este o bem

jurídico protegido, essencialmente, pelo tipo penal.

Não obstante,

30 O traço peculiar do regime de repartição é a solidariedade intergerações, ou seja, os segurados na ativa (contribuintes) arcam com o pagamento dos benefícios do grupo de segurados em inatividade (beneficiários de proventos).

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Secundariamente, é protegida também a boa-fé, ou seja, tanto o “interesse social da confiança mútua nos relacionamentos patrimoniais individuais, quando o interesse público de impedir o emprego de engano para induzir quem quer que seja a prestações indevidas, com prejuízo alheio” (TRF4, AC20017011001423-1/PR, Fábio Rosa, 7º T., u., DJ 24.4.02). (BALTAZAR JÚNIOR, 2010, p. 64).

Deveras, o anseio do estelionatário será sempre dirigido ao acréscimo de seu

patrimônio ou de outrem, em prejuízo do patrimônio de alguém, vitimado pela ação

delitiva, a qual violará a confiança e respeito esperados em uma relação bilateral, seja

privada ou comercial.

A ação do sujeito ativo, portanto, é sempre jurídica e moralmente ilícita.

3.1.7- Sujeito Ativo

O crime de estelionato previdenciário pode ser cometido por qualquer pessoa

(crime comum), não exigindo o tipo penal nenhuma condição especial do agente.

Porém, não é rara a prática do crime por servidor ou ex-servidor da entidade de

previdência vitimada, o qual se aproveita da prerrogativa de acesso aos sistemas de

gestão de benefícios e/ou do conhecimento das rotinas internas e eventuais brechas dos

sistemas informatizados ou procedimentos administrativos da entidade, para fraudar a

concessão do benefício.

Outrossim, no caso do estelionato contra a Previdência Social, é frequente o

concurso de agentes. Por isso, o legislador destacou no tipo penal que a vantagem

indevida pode ser para si (o sujeito ativo) ou para outrem.

Dessa maneira, se o agente requerente de benefício previdenciário tiver ciência

da fraude, aderindo e auxiliando o intermediário, ou vice-versa, ambos estarão insertos

na prática do crime sob comento.

3.1.8- Sujeito Passivo

Tratando-se do denominado crime de “estelionato previdenciário”, é evidente

que o sujeito passivo do delito será a entidade de previdência social atingida com a

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conduta do agente, enquanto pessoa jurídica, a qual sofrerá o desfalque econômico em

razão da ação delitiva.

Não obstante, a doutrina assinala que também é ofendido pela prática do crime,

podendo ser considerada sujeito passivo do crime, a pessoa enganada, quando diversa

daquela que sofre o prejuízo (BITENCOURT, 2011, p. 267).

Essa situação, aliás, é perfeitamente aplicável ao crime sob comento, vez que, no

crime contra a previdência social, serão vítimas tanto a pessoa jurídica (INSS, IPE,

PREVIROSA, por exemplo) quanto o servidor ludibriado.

Ressalve-se, por fim, que o sujeito passivo do crime deve ser certo e

determinado.

3.1.9- Elemento Subjetivo

Segundo referência uníssona nas doutrinas de Nucci (2007), Delmanto et al

(2002), Capez, (2008), Mirabete (2002), Bitencourt (2011) e Greco (2011), utilizadas

como parâmetro demonstrativo, o elemento anímico do crime de estelionato é o dolo,

com um fim especial de agir, não havendo previsão legal de modalidade culposa.

Bitencourt (2011, p. 276-277) complementa referindo que o dolo é

“representado pela vontade livre e consciente de ludibriar alguém, por qualquer meio

fraudulento, para obter vantagem indevida, em prejuízo de outrem.” Não bastasse, o

mesmo autor, citando e seguindo lição de Nélson Hungria, faz questão de frisar que o

dolo deve permear todos os aspectos da prática delitiva, isto é, não deve restringisse

apenas à ação como um todo, mas abranger diretamente o meio fraudulento, a vantagem

ilícita e o prejuízo alheio.

Outrossim, saliente-se que a conduta do agente há de ser direcionada à obtenção

de vantagem sabidamente indevida, haja vista que, caso seja justa e de direito, estar-se-

á diante da possível prática do crime de exercício arbitrário das próprias razões (art. 345

do Código Penal), mas não de estelionato. Ademais, se o agente pressupõe ser justa e

legal a vantagem, mas tal não o é, haverá erro de tipo.

Entretanto, não basta para a caracterização do ilícito o dolo genérico, exigindo o

tipo penal um adendo peculiar, a fim de que se configure o dolo específico.

Nessa senda, “[...] existe o elemento subjetivo do tipo específico (ou dolo

específico), que é a vontade de obter lucro indevido, destinando-o para si ou para

outrem.” (NUCCI, 2007, p. 729).

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Com efeito, elucidando a questão, de forma bastante clara e precisa, Bitencourt

(2011, p. 277, grifos do autor) leciona que:

Faz-se necessário, ainda, o elemento subjetivo especial do tipo, constituído pelo especial fim de obter vantagem patrimonial ilícita, para si ou para outrem. A simples finalidade de produzir dano patrimonial em prejuízo de alguém, sem visar a (sic) obtenção de proveito injusto, não caracteriza o estelionato.

Com isso, percebe-se que o crime de estelionato visa reprimir e punir a ação

daquele que, voluntariamente e com evidente má-fé, utiliza-se de traquejos desleais para

locupletar-se indevidamente, lesando outrem.

4. DOS MOMENTOS CONSUMATIVOS ADOTADOS PARA O CRIME DE

ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO E SUAS CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS

Partindo das premissas e conceitos expostos no capítulo anterior, os quais são

aplicáveis à integralidade dos fatos criminosos passíveis de caracterização como

estelionato previdenciário, surge então questão por demais controversa e objeto de

diversos contornos jurídicos, qual seja, o momento temporal em que o crime de

estelionato previdenciário entende-se consumado.

Se a tipificação do crime é questão tranquila e que não desperta, a priori,

maiores indagações, tal circunstância não se verifica quando se fala da consumação do

crime.

Inicialmente, cabe esclarecer que a característica peculiar do crime de

estelionato previdenciário, está exatamente em decorrência da qual despontam os

diferentes entendimentos, objeto de análise do presente estudo, diz com relação ao fato

de que a obtenção da vantagem indevida pelo agente criminoso, de regra, protrai-se no

tempo, isto é, o recebimento do benefício previdenciário obtido indevidamente dá-se em

parcelas mensais e sucessivas.

Assim, o agente arquiteta a fraude com o objetivo de obter, para si ou para

outrem, benefício previdenciário de prestação continuada, como por exemplo o de

qualquer benefício previdenciário.

Fazendo isso, o autor do delito aufere, mês a mês após a concessão indevida do

benefício, a vantagem ilícita visada.

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Diante dessa situação fática, diferentes teorias despontam com relação à

caracterização jurídica desses recebimentos posteriores à efetivação da fraude,

sustentando-os ora como plena consumação delitiva protraída no tempo; ora como

meros efeitos de delito já consumado; ora como delitos autônomos em relação à fraude

que os originou.

Dito de outra forma,

há discussão sobre a consumação do estelionato em que o recebimento da vantagem se dá em prestações, como no caso do estelionato na obtenção de benefício previdenciário de prestação continuada, [...] havendo três posições na matéria, afirmando a ocorrência de: a) crime eventualmente permanente; b) crime continuado; c) crime instantâneo de efeitos permanentes.31

Ney Fayet Júnior (2007, p. 133) complementa, ainda, trazendo interpretação

segundo a qual se trataria “de um delito que permitira a dupla classificação em se

tratando da hipótese de co-delinquência [sic] (instantâneo para um; permanente para

outro).”

A matéria não é pacífica, quer na doutrina, quer na jurisprudência, conforme se

demonstrará adiante.

Saliente-se, de antemão, que o principal efeito advindo a partir da corrente

adotada se dará com relação ao marco inicial do cômputo do prazo prescricional.

Sabe-se que a prescrição consiste na perda pelo Estado do direito de punir, em

razão do decurso do tempo.

Outrossim, em matéria de prescrição, há de se distinguir os conceitos de ius

puniendi e ius punitionis. O primeiro surge para o Estado com a ocorrência do fato

criminoso, e determinará a prescrição da pretensão punitiva. O segundo se concretiza

após o trânsito em julgado de sentença condenatória, e relaciona-se com a prescrição da

pretensão executória.32

No conciso e preciso apontamento de Julio Fabbrini Mirabete:

Ocorrido o crime, nasce para o Estado à pretensão de punir o autor do fato criminoso. Essa pretensão deve, no entanto, ser exercida dentro de determinado lapso

31 BALTAZAR JÚNIOR, José Paulo. Crimes federais. p.77 32 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte especial. p. 810-813

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temporal [...]. Escoado esse prazo, que é submetido a interrupções ou suspensões, ocorre a prescrição da pretensão punitiva, chamada impropriamente de prescrição da ação penal.33

Este trabalho, atento ao fato de que perpassa o estabelecimento do momento

consumativo do crime de estelionato previdenciário, isto é, quando ocorreu o delito,

limita-se à abordagem do instituto da prescrição no interim de tempo compreendido

entre a data do fato criminoso (consumação ou cessação da permanência) e do

recebimento da denúncia (primeiro marco interruptivo), conforme combinação das

previsões dos artigos 109, caput, 111 e 117, I, todos do Decreto-lei n. 2.848/194034

(Código Penal), com a redação determinada pela Lei n. 12.234, de 5 de maio de 2010.

Assim, fala-se em prescrição da pretensão punitiva estatal.

Não obstante, há ainda reflexos no estado (ou não) de flagrância, na graduação

de pena, na hipótese de coautoria, entre outros.

Na sequência, inicia-se à exposição das diferentes facetas adquiridas pelo crime

de estelionato previdenciário na delimitação de seu momento consumativo.

4.1- Estelionato previdenciário como crime instantâneo ou instantâneo de efeitos

permanentes

Tratando-se de crime material, encontram-se arrazoados sustentando o crime de

estelionato previdenciário como sendo instantâneo. Destarte, indo além, alguns juristas

complementam sua caracterização para instantâneo de efeitos permanentes.

Primeiramente, cumpre trazer breve noção acerca da consumação delitiva, de

modo genérico.

Está consumado o crime quando o tipo penal está inteiramente realizado, ou seja, quando o fato concreto se subsume no tipo abstrato descrito na lei penal. Preenchidos todos os elementos do tipo objetivo pelo fato

33 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal: parte especial. p.392 34 Art. 109. A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, salvo o disposto no § 1o do art. 110 deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime [...]: Art. 111 - A prescrição, antes de transitar em julgado a sentença final, começa a correr: I - do dia em que o crime se consumou; [...] III - nos crimes permanentes, do dia em que cessou a permanência; Art. 117 - O curso da prescrição interrompe-se: I - pelo recebimento da denúncia ou da queixa;

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natural, ocorreu a consumação. Segundo o art. 14, inciso I [do Código Penal], diz-se o crime consumado “quando nele se reúnem todos os elementos de sua definição legal”.35

Desse modo, tem-se que o estelionato resta consumado quando o agente

criminoso obtém a vantagem ilícita, causando prejuízo alheio, tendo utilizado de

artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento para induzir ou manter a vítima em

erro.

Não obstante, Cezar Roberto Bitencourt faz a ressalva de que:

Não se confunde a consumação com o crime exaurido, pois neste, após a consumação, outros resultados lesivos ocorrem. [...] Com efeito, o crime pode estar consumado e dele ainda não haver resultado todo o dano que o agente previra e visara, e que a própria tipificação proíbe.36

Destarte, uma vez consumado, o crime material produz o resultado desejado pelo

agente, podendo então ser de natureza instantânea ou não.

O crime instantâneo consiste naquele em que a consumação ocorre em

determinado momento e não mais se prolonga no tempo, uma vez consumado, está

perfeito e acabado, não havendo mais reflexos ulteriores.

Crime instantâneo de efeitos permanentes, por sua vez, tem a peculiaridade de

que os efeitos do crime, já consumado, permanecem no tempo, independe da vontade ou

continuidade da ação do sujeito.

Tendo em mente o exposto, alguns autores e juristas consideram que o crime de

estelionato previdenciário possui essa natureza, isto é, de crime instantâneo, ainda que

de efeitos permanentes, reputando-o consumado, com o preenchimento de todas as

elementares do núcleo, quando da concessão irregular do benefício previdenciário e

recebimento da primeira parcela indevida.

Nesse sentido, o iter criminis perduraria até o momento em que houvesse a

obtenção da primeira parcela monetária indevida, vinda ao poder do agente criminoso

em razão da fraude anteriormente provocada no requerimento e encaminhamento

espúrios do benefício. A continuidade do recebimento periódico da vantagem indevida

consistiria, nesse caso, em meros efeitos do crime já perfeito e acabado.

35 MIRABETE, Renato N. Fabbrini. Manual de direito penal: parte geral. p.141 36 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte especial. p.464

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Para muitos, o delito de estelionato com fins previdenciários seria um crime instantâneo de efeitos permanentes, pois o momento consumativo se deu quando houve a obtenção da vantagem ilícita em prejuízo alheio. Vale dizer, quando do recebimento da primeira parcela indevida, já haveria a consumação do delito; os posteriores seriam os efeitos do crime que o agente aproveita. Os principais argumentos utilizados para embasar esse entendimento consistem na idéia (sic) de que os recebimentos reiterados dos benefícios são, em verdade, o exaurimento do crime – que se estenderia temporalmente-, e não a sua consumação. [...] E, ao contrário do que dizem alguns, o sujeito ativo não estaria em uma permanente consumação do crime; apenas auferindo as vantagens do delito já consumado. Também se argumenta que a cessação da conduta do agente não permite o restabelecimento do bem lesado – característica também que excluiria a classificação do delito como permanente.37

Essa é a corrente seguida por Ney Fayet Júnior, quando refere que “se levarmos

em conta a própria essência dos delitos instantâneos chegaremos facilmente à conclusão

segundo a qual todos os seus requisitos se fazem presentes no que se vincula à figura

típica do artigo 171, § 3º, do Código Penal”.

No mesmo entendimento, Nucci sustenta que o crime de estelionato é sempre

instantâneo, com a ressalva de que, em se tratando de crime praticado para o

recebimento mensal de benefício do INSS, conforme exemplifica, o fato ganharia a

feição de crime instantâneo de efeitos permanentes.

Também, para Bitencourt e Luiz Flávio Gomes trata-se o crime de estelionato

previdenciário instantâneo de efeitos permanente, refutando a ideia de permanência

delitiva.

Na jurisprudência, como referência máxima dessa corrente, encontra-se recente

orientação externada pela sexta turma do egrégio Superior Tribunal de Justiça. Confira-

se a seguinte ementa:

HABEAS CORPUS. RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. ESTELIONATO PRATICADO CONTRA A PREVIDÊNCIA SOCIAL. OBTENÇÃO DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS A PARTIR DE DADOS FALSOS. CRIME INSTANTÂNEO DE EFEITOS PERMANENTES. TERMO INICIAL DO LAPSO PRESCRICIONAL. RECEBIMENTO DA

37 FAYET JUNIOR, Ney. Do crime continuado. p.142

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PRIMEIRA PARCELA INDEVIDA. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. PENA IN ABSTRATO. 1. A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça firmou orientação no sentido de que o crime de estelionato praticado contra a Previdência Social, consubstanciado na concessão de benefícios previdenciários a partir de dados falsos, é crime instantâneo de efeitos permanentes, tomando, assim, como dies a quo para a contagem do prazo prescricional, a data do início do pagamento do benefício fraudulento. (Habeas Corpus nº 121.336/SP, Relator Ministro Celso Limongi - Desembargador convocado do TJ/SP, DJe 30/03/2009). 2. No caso, a paciente foi denunciada pela suposta prática do crime previsto no art. 171, § 3º, do Código Penal, ao qual é cominada a pena em abstrato de 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de reclusão. Nos termos do art. 109, inciso III, do Código Penal, o lapso de tempo em que se opera a prescrição da pretensão punitiva nessa hipótese é de 12 (doze) anos. Todavia, observa-se, ainda, a paciente conta com idade superior a 70 anos, razão pela qual deve incidir a redução pela metade do prazo prescricional, conforme as disposições do art. 115, segunda parte, do Código Penal brasileiro. 3. Considerando a data da percepção do primeiro benefício - 5.2.2003 -, momento de consumação do crime, e o recebimento da denúncia, que ocorreu em 13.04.2011, já transcorreu tempo suficiente para se verificar a extinção da punibilidade, com amparo no art. 107, IV, c/c o art. 109, ambos do Código Penal. 4. Ordem de habeas corpus concedida.

No Tribunal Regional Federal da 4ª Região, encontra-se julgado que bem traduz

a aplicação da instantaneidade ao crime de estelionato previdenciário, em caso no qual

estavam sendo julgados servidores do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS),

acusados de intermediar as fraudes na concessão de benefícios, mediante a inserção de

dados falsos nos sistemas informatizados. A ementa a seguir sintetiza o tratamento

jurídico dispensado nesses casos:

PENAL. INÉPCIA DA DENÚNCIA. INSERÇÃODE DADOS FALSOS EM SISTEMA DE INFORMAÇÕES (ARTIGO 313-A DO CÓDIGO PENAL). DOLO. PENA-BASE. PROCESSOS EM ANDAMENTO. NÃO UTILIZAÇÃO. ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO. CONTINUIDADE DELITIVA. Se a denúncia descreve de forma clara os fatos ilícitos imputados aos réus, revelando indícios da autoria e da materialidade do delito, permitindo ao réu exercer seu direito de defesa, não há que se cogitar de inépcia da peça incoativa.

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Se o Ministério Público imputou a funcionário do Instituto Nacional do Seguro Social a inserção de dados falsos em sistema de informações, a correta tipificação do delito é a do artigo 313-A do Código Penal. O tipo penal do artigo 313-A do Código Penal não exige que tenha o réu falsificado algum documento ou recebido algum valor para inserir os dados falsos no sistema informatizado do INSS, mas tão somente que tenha inserido os dados com o fim de obter vantagem indevida para si ou para outrem. Processos em andamento, sem trânsito em julgado, não podem ser utilizados para exasperar a pena-base, nos termos da súmula 444 do Superior Tribunal de Justiça. O estelionato previdenciário, em relação ao terceiro que realiza a fraude, é delito instantâneo, que se encerra com a concessão do benefício, não sendo o caso de se considerar o número de meses em que recebido o benefício para fins de continuidade delitiva.

Em suma, portanto, havendo ou não a particularização dos possíveis autores do

crime em razão de suas condutas, a natureza instantânea do crime de estelionato

previdenciário encontra adeptos na seara jurídica.

4.2 Estelionato previdenciário como crime permanente ou eventualmente

permanente

Igualmente observa-se no plano jurídico interno a sustentação de que o crime de

estelionato previdenciário carregaria consigo o traço da permanência delitiva.

Segundo Mirabete um crime é permanente quando sua consumação se prolonga

no tempo, dependente da ação do sujeito direcionada nesse sentido.

Importa pontuar que a principal característica do crime permanente é a de que o

sujeito ativo tem a disponibilidade de fazer cessar a prática criminosa no momento em

que quiser, visto que, enquanto age, a consumação continua indefinidamente. Destaque-

se que, em sendo caso de crime instantâneo de efeitos permanentes, antes exposto, uma

vez deflagrada a ação criminosa, o agente não mais tem ingerência sobre a consumação

do crime, porque já ocorrida.

Nesse prisma, têm-se posicionamentos favoráveis a aplicabilidade de tal

conceituação ao crime de estelionato previdenciário.

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Nos tribunais superiores, a quinta turma do Superior Tribunal de Justiça

reproduz entendimento reputando o estelionato previdenciário como crime permanente

para aquele que aufere o proveito ilícito:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. ESTELIONATO CONTRA A PREVIDÊNCIA SOCIAL. PRESCRIÇÃO AFASTADA. CRIME PERMANENTE EM RELAÇÃO AO BENEFICIÁRIO. PRECEDENTES. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. A natureza do crime de estelionato contra a Previdência Social daquele que aufere a vantagem indevida é permanente, cujo lapso inicial do prazo prescricional coincide com o recebimento da última parcela do benefício previdenciário. Precedentes. 2. O Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, faz distinção da natureza do estelionato previdenciário a partir de quem o pratica: se o próprio beneficiário for o autor do fato, a infração penal terá natureza permanente; se a fraude for implementada por terceiro para que outrem obtenha o benefício, tratar-se-á de crime instantâneo de efeitos permanentes. 3. In casu, nos termos dos arts. 109, IV, 111, III, e 117 do CP, o prazo prescricional do ilícito em comento só teve início em 28/3/2003, quando cessou o pagamento indevido do benefício previdenciário indevidamente percebido pelo agravante, de modo que não decorreu o período de tempo entre os marcos interruptivos apto ao reconhecimento da prescrição. 4. Agravo regimental não provido. (BRASIL, 2012-4).

Rogério Greco segue mesmo entendimento de tratar-se de crime permanente,

seguindo orientação do Superior Tribunal de Justiça, sem fazer a distinção, contudo,

entre as possíveis diferenciações dos autores do crime.

Fábio Bitencourt da Rosa assim se posiciona:

Na hipótese de fraude, assim, desenvolve-se a ação delituosa no procedimento, com a produção de prova baseada em documentos falsificados. Tal comportamento fraudulento se materializa e se esgota no procedimento administrativo destinado à concessão do benefício. Concluído o mesmo, considera-se acabada a fase executiva do crime que configura o estelionato. O primeiro recebimento de valores constitui o início da fase de consumação. No mês seguinte, o novo recebimento

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caracteriza ainda fase consumativa, e assim por diante. A hipótese, então, caracteriza perfeitamente o crime eventualmente permanente, como antes examinado.

José Júlio Lozano Júnior38 possui idêntico entendimento.

No Tribunal Regional Federal da 2ª Região há entendimento, ao que parece

uníssono, de que o delito em comento seria efetivamente de natureza permanente,

conforme bem se pode observar na ementa selecionada, e a seguir exposta:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL RECEBIDA COMO RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. [...] SEGURADO DENUNCIADO PELA PRÁTICA DE ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO (ART. 171 § 3º DO CP). CRIME PERMANENTE. MOMENTO CONSUMATIVO E INÍCIO DO PRAZO PRESCRICIONAL (ART. 111, III, DO CP). SUSPENSÃO ADMINISTRATIVA DO BENEFÍCIO. RECURSO DESPROVIDO. I – [...] II - O estelionato praticado contra a previdência social, na modalidade de percepção mensal de benefício previdenciário, é crime permanente, sendo certo que, a partir do instante em que o INSS suspende o pagamento do benefício por detectar a irregularidade (fraude) cometida, não está mais mantido em erro, iniciando-se a contagem do prazo prescricional, já que cessada a circunstância de permanência do delito (art. 111, III, do CP), sendo este, portanto, o termo inicial do prazo prescricional. III - No presente caso, verifica-se que o benefício previdenciário nº 42/106.833.702-3, concedido a [...], foi suspenso administrativamente em 01/10/1998 (fl. 23), e que a denúncia somente foi recebida em 10/01/2011 (fls. 297/298), tendo, portanto, decorrido mais de 12 anos, lapso temporal previsto (art. 109, III, do CP) para a prescrição da pretensão punitiva estatal pela pena máxima (6 anos e 8 meses) cominada ao crime em comento (art. 171, § 3º CP). IV - Recurso a que se NEGA PROVIMENTO.

Veja-se a peculiaridade relevante apontada por esse julgado: a cessação da

permanência do crime é fixada tendo em conta a data em que a entidade de previdência

social vitimada suspende/bloqueia o pagamento do benefício, considerando-se que a

partir daí, ciente da fraude, já não mais permanece induzida em erro.

38 LOZANO JÚNIOR, José Júlio. Prescrição penal. p.81

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Do exposto, verifica-se que há sustentação jurídica para a caracterização do

estelionato contra a previdência social como crime permanente, em que a consumação

delitiva se prolonga no tempo, enquanto houver recebimento de vantagem indevida,

mantida a entidade vitimada em erro e sofrendo desfalque econômico.

Contudo, em sentido oposto, a quinta turma do colendo Tribunal Regional

Federal da 3ª Região sufraga arrazoados contrários à caracterização do estelionato

previdenciário como crime permanente. Sintetizando a tese defendida, o

Desembargador Federal André Nekatschalow, em recente apreciação do Recurso em

Sentido Estrito n. 0008360-44.2004.4.03.6181/SP, ao ementar o julgado e proferir seu

voto, sustentou:

PENAL. ESTELIONATO. NÃO É CRIME PERMANENTE. PRESCRIÇÃO. OCORRÊNCIA. TERMO INICIAL DO PRAZO PRESCRICIONAL DO DELITO DE ESTELIONATO REVIDENCIÁRIO É CONTADO A PARTIR DA DATA DA CONSUMAÇÃO DO DELITO. NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. 1. Crime permanente é aquele cuja configuração depende da contínua atividade antijurídica do sujeito ativo, cuja cessação enseja o restabelecimento do bem lesado. É o que se verifica nos exemplos paradigmáticos adotados doutrinariamente (sequestro, cárcere privado). 2. O estelionato não é crime permanente, pois o término da atividade ilícita do agente não ocasiona o simultâneo restabelecimento do bem lesado. Ao contrário do que sucede com a liberdade, que é restituída com a cessação da atividade criminosa nos delitos de sequestro e cárcere privado, de incontroversa natureza permanente, o patrimônio da vítima não é a ela reintegrado pela interrupção da conduta do agente que está a cometer o delito de estelionato. 3. O termo inicial do prazo prescricional do delito de estelionato previdenciário é contado a partir da data da consumação do delito, que ocorre com o recebimento da primeira parcela de prestação do benefício obtido mediante fraude. 4. Prescrição. Ocorrência. O delito se consumou na data de percepção da primeira parcela do benefício (27.05.98, fls. 99 e 349), houve prescrição em 26.05.10, tendo sido apresentada a denúncia quando já ultrapassado o prazo prescricional de 12 (doze) anos (25.04.11, fl. 349). 5. Recurso em sentido estrito desprovido. [...]

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O estelionato não pode ser classificado como crime permanente, uma vez que, após sua consumação, a respectiva subsistência não fica na dependência da conduta do sujeito ativo. Este, caso cesse a atividade ilícita, não ocasiona o restabelecimento do bem lesado. Trata-se de crime de resultado, que reclama a obtenção de vantagem indevida mediante fraude. Com a obtenção da vantagem, preenchidos os demais requisitos, a cessação do erro em que foi mantida a vítima não provoca o restabelecimento do bem lesado, dado que o sujeito ativo, nessa situação, já se apropriou da vantagem.

Com ênfase, portanto, entende o magistrado ser o crime de natureza instantânea,

afastando a ideia de permanência do delito.

Não obstante, se considerado crime permanente, ou eventualmente permanente,

o delito de estelionato previdenciário desencadeia determinadas situações consentâneas.

4.3- Classificação Mista

Como visto, o delito de estelionato previdenciário pode assumir, a priori,

natureza de crime instantâneo de efeitos permanente ou de crime permanente. Não

bastasse existir tal diferenciação, há uma terceira hipótese em que entende ser possível a

dupla caracterização ao mesmo crime de estelionato previdenciário, numa espécie de

mescla das espécies de consumação delitiva.

E mais, registre-se que esse pensamento é oriundo de discussões jurídicas

travadas no plenário do mais elevado e importante órgão jurisdicional do país, qual seja,

o Supremo Tribunal Federal (STF).

Com efeito, é imperioso destacar por meio de jurisprudência consolidada em

ambas as turmas que o compõe, atribui atualmente caráter dúplice ao crime de

estelionato previdenciário, a teor das seguintes ementas:

PENAL. HABEAS CORPUS. ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO. ART. 171, § 3º, DO CÓDIGO PENAL. CRIME PERMANENTE. BENEFICIÁRIO. PRAZO PRESCRICIONAL. INÍCIO DA CONTAGEM. CESSAÇÃO DA PERMANÊNCIA. ORDEM DENEGADA. 1. O agente que perpetra a fraude contra a Previdência Social recebe tratamento jurídico-penal diverso daquele que, ciente da fraude, figura como beneficiário das parcelas. O primeiro pratica crime instantâneo de efeitos permanentes; já o segundo pratica

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crime de natureza permanente, cuja execução se prolonga no tempo, renovando-se a cada parcela recebida da Previdência. 2. Consectariamente, em se tratando de crime praticado pelo beneficiário, o prazo prescricional começa a fluir da cessação da permanência. Precedentes: HC nº 99.112, rel. Min. Marco Aurélio, j. 20/4/2010, 1ª Turma; HC 101.481, rel. min. Dias Toffoli, j. 26/4/2011, 1ª Turma; HC 102.774/RS, rel. Min. Ellen Gracie, j. 14/12/2010, 2ª Turma, DJ de 7/2/2011. 3. In casu, narra a denúncia que o paciente participou não apenas da fraude à entidade de Previdência Social, por meio de conluio com servidor do INSS, mas figurou como destinatário dos benefícios previdenciários, que recebeu até 30/10/2006. 4. Dessa forma, forçoso reconhecer que o prazo prescricional teve início apenas na referida data, em que cessada a permanência. 5. Ordem denegada. (BRASIL, 2011³). AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. CRIME DE ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO. RÉU BENEFICIÁRIO DAS PARCELAS INDEVIDAS. CRIME PERMANENTE. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. HIGIDEZ DA PRETENSÃO PUNITIVA. PRECEDENTES. 1. Em tema de estelionato previdenciário, o Supremo Tribunal Federal tem uma jurisprudência firme quanto à natureza binária da infração. Isso porque é de se distinguir aquele que, em interesse próprio, recebe o benefício ilicitamente daquele que comete uma falsidade para permitir que outrem obtenha a vantagem indevida. No primeiro caso, a conduta, a despeito de produzir efeitos permanentes no tocante ao beneficiário da indevida vantagem, materializa, instantaneamente, os elementos do tipo penal. Já naquelas situações em que a conduta é cometida pelo próprio beneficiário e renovada mensalmente, o crime assume a natureza permanente, dado que, para além de o delito se protrair no tempo, o agente tem o poder de, a qualquer tempo, fazer cessar a ação delitiva. Precedentes. 2. Agravo regimental desprovido.

Na origem da discussão, o Ministro Marco Aurélio assim dissertou:

2. Observem a variedade de situações. Mostra-se impossível confundir o crime instantâneo de efeito permanente com a prática delituosa que se projeta no tempo. Na espécie, o paciente, beneficiário do resultado do crime, foi condenado por estelionato. Ora, a tipologia definida no artigo 171 do Código Penal indica que, enquanto se mantém outrem em erro, mediante artifício, ardil ou qualquer outro meio fraudulento, há a prática

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criminosa. Uma coisa é terceiro vir a implementar fraude para uma pessoa diferente lograr o benefício. Em relação a ele, considerada a fraude, considerada a participação delimitada no tempo, configura-se crime instantâneo de resultados permanentes. Algo diverso é a atuação do próprio beneficiário do resultado do delito. Nessa hipótese, ante o tipo do artigo 171 do Código Penal, o caso concreto revela crime permanente. Vale dizer: enquanto existir a obtenção da vantagem, presentes parcelas sucessivas, o prejudicado fica mantido em erro dosado penalmente.

Não obstante, autêntica análise do tema pelo Supremo Tribunal Federal foi

realizada por ocasião do julgamento de n. 86.467-8/RS, de relatoria do Ministro Marco

Aurélio, iniciado em 27 de março de 2007, quando, posto em julgamento pela primeira

turma do órgão, restou suscitada pelo Ministro Carlos Britto divergência jurisprudencial

entre as turmas, tendo o feito sido submetido então, em 23 de abril de 2007, à

apreciação pelo Tribunal Pleno, onde ocorreu a discussão e esclarecimento da temática

pelos insignes ministros, despontando entendimento que viria a ser concretizado e

pacificado pelo STF (inteiro teor do acórdão no Anexo A).

Registre-se que o tratamento binário conferido pelo STF ao crime de estelionato

previdenciário, com raras exceções, algumas expostas no presente trabalho, é replicado

nos demais órgãos jurisdicionais pátrios, sobretudo pelos 5 (cinco) Tribunais Regionais

Federais que perfazem a jurisdição federal no território nacional.

Desse modo, afigura-se que, a partir das peculiaridades que pode assumir o

delito de estelionato previdenciário, a jurisprudência há de evoluir e acompanhar os

desdobramentos fáticos para a aplicação da norma penal.

4.4- Estelionato previdenciário como crime continuado

Por último, sustenta-se ainda a hipótese de o estelionato previdenciário possuir

natureza de crime continuado.

A figura do crime continuado consiste, em uma ficção jurídica, inserida dentro

da matéria penal atinente ao concurso de crimes, visto que se consubstancia num

tratamento jurídico específico dado ao caso de diversas condutas criminosas, as quais

são vistas de forma diferenciada pelo ordenamento jurídico, quando satisfeitos

determinados requisitos.

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O crime continuado é disciplinado pelo artigo 71 do Código Penal (Decreto-lei

n. 2.848/1940), assim elaborado:

Art. 71 - Quando o agente, mediante mais de uma ação ou omissão, pratica dois ou mais crimes da mesma espécie e, pelas condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes, devem os subsequentes ser havidos como continuação do primeiro, aplica-se-lhe a pena de um só dos crimes, se idênticas, ou a mais grave, se diversas, aumentada, em qualquer caso, de um sexto a dois terços.

Com redação dada pela Lei n. 7.209, de 11 de julho de 1984, esse dispositivo

legal implementa o crime continuado como ficção jurídica, onde a unidade delitiva é

simples criação da lei, com finalidade exclusiva de aplicação da pena; também adota a

teoria objetiva para o instituto da continuidade delitiva, afirmando ser este apurável

por meio de elementos constitutivos puramente objetivos, não importando se há

unidade de desígnio ou unidade de resolução criminosa.

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CONCLUSÃO

Diante de todo o exposto, concluímos que o crime de estelionato previdenciário

é figura típica e de grande relevância no âmbito jurídico, em razão de proteger bem

jurídico inerente a toda massa de trabalhadores do país e trata-se de infração penal que

comporta diferentes formas de perpetração e diversas maneiras de caracterização do

autor do ilícito. Em virtude disso, em parte, é que despontam os diferentes

entendimentos na doutrina e jurisprudência com relação ao momento consumativo do

crime de estelionato previdenciário.

Pode-se observar que o estelionato previdenciário é crime com interessantes e

específicas nuances jurídicas e fáticas, afigurando-se como tipo penal composto e

complexo.

Com efeito, percebe-se que a prática do crime pode ganhar diferentes contornos

a partir da condição da pessoa que o pratica e do formato da fraude que é formulada,

ocasionando análises particularizadas de cada caso penal.

Além disso, há entendimentos dissonantes, cada qual com fundamentação para

tanto, no que tange ao momento consumativo do crime de estelionato previdenciário,

sendo que a interpretação dada ao tema acarreta determinadas consequências jurídicas.

Entendemos o crime de estelionato previdenciário como instantâneo de efeitos

permanentes, sendo que a periodicidade mensal caracterizaria a hipótese de

continuidade delitiva, seja para o titular do benefício ou intermediário na concessão

ilícita. Isso porque se tem que o dolo de ambos permando toda a prática ilícita, sendo

que, no intervalo de tempo entre um e outro recebimento indevido, não há ofensa

permanente ao bem jurídico patrimônio, a qual volta a se perfectibilizar sempre que

auferida vantagem indevida (saque de valores), em nova prática criminosa, quando

mantida em erro a entidade vitimada, em razão do silêncio de quem pratica crime com

relação à fraude.

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ANEXOS

RECURSO ESPECIAL Nº 1.114.342 - RS (2009/0087417-3)

RELATOR : MINISTRO JORGE MUSSI

RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

RECORRIDO : RAMONA FELISSA ÁVILA DE MOURA

ADVOGADO : DENNIS OTTE LACERDA - DEFENSOR

PÚBLICO E OUTROS

EMENTA

ESTELIONATO CONTRA A PREVIDÊNCIA SOCIAL. PERCEPÇAO

FRAUDULENTA DE BENEFÍCIO. CRIME DE NATUREZA PERMANENTE.

PRESCRIÇAO. LAPSO QUE SE INICIA A PARTIR DA CESSAÇAO DO

RECEBIMENTO DA VANTAGEM INDEVIDA. INTELIGÊNCIA DO ART. 111,

III, DO CP.

1. O crime de estelionato contra a previdência social quando praticado pelo

beneficiário é classificado pela 5ª Turma desta Corte Superior como sendo de

natureza permanente.

2. Assim, nos termos do inciso III do art. 111 do Código Penal, o lapso

prescricional inicia-se a partir da cessação da permanência, no caso, com a última

percepção do benefício indevido, e não do recebimento da primeira parcela da

prestação previdenciária.

3. Recurso especial conhecido e provido para afastar o reconhecimento da

prescrição retroativa.

ACÓRDAO

Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quinta

Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas

taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer do recurso e lhe dar

provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Março

Aurélio Bellizze, Adilson Vieira Macabu (Desembargador convocado do TJ/RJ) e

Laurita Vaz votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Gilson Dipp.

Brasília (DF), 20 de setembro de 2011. (Data do Julgamento).

MINISTRO JORGE MUSSI

Relator

RECURSO ESPECIAL Nº 1.114.342 - RS (2009/0087417-3) (f)

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RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

RECORRIDO : RAMONA FELISSA ÁVILA DE MOURA

ADVOGADO : DENNIS OTTE LACERDA - DEFENSOR

PÚBLICO E OUTROS

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO JORGE MUSSI (Relator): Trata-se de recurso

especial interposto pelo Ministério Público Federal, com fulcro no art. 105, III, a,

da Constituição da República, contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª

Região.

Consta dos autos que a Recorrida foi denunciada pela suposta prática do

delito previsto no art. 171, 3º, do Código Penal, nos seguintes termos:

"Durante o período compreendido entre janeiro e novembro de 2004, no

município de São Nicolau/RS, a denunciada sacou, de forma indevida, os valores

dos benefícios previdenciários depositados em nome de sua genitora, após o

falecimento desta, ocorrido em 02 de janeiro de 2004. Para tanto, induziu e

manteve em erro, pelo período citado, o INSS e a agência bancária pagadora, ao

não informar o óbito em questão.

Com efeito, a denunciada obteve para si vantagem ilícita em detrimento do

INSS, efetuando saques, mensalmente, da conta corrente n.º 6.152-2 (Banco do

Brasil), titulada pela falecida VICENTINA ÁVILA DE MOURA, como se a

segurada viva estivesse, causando um prejuízo à Previdência Social no valor de R$

4.451,01 (quatro mil, quatrocentos e cinquenta e um reais e um centavo).

A materialidade é firme, consubstanciada na certidão de óbito da segurada

e em relatório que confirma os saques, proveniente do procedimento

administrativo oriundo do INSS acostado nos autos às fls. 38/40.

Em relação à autoria, há veementes indícios que revelam ser a indiciada a

responsável pelos saques. Em declarações prestadas às fls. 124 e 125, IVO ÁVILA

DE MOURA e DELIRIA ÁVILA DE MOURA, irmãos da ré, apontaram esta

como a responsável pelo ilícito. Outrossim, a própria indiciada, conforme se

depreende dos autos á fl. 126, confessou ter realizado os saques na conta da

segurada." (fls. 2/3)

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A denúncia foi recebida em 21/2/2008 (fl. 134). Após regular instrução

criminal, foi a acusada condenada nos exatos termos da vestibular acusatória à

pena de 1 (um) ano, 6 (seis) meses e 20 (vinte) dias de reclusão, em regime aberto,

mais 30 (trinta) dias multa, substituída a sanção corporal por restritivas de

direitos. A sentença foi publicada no dia 15/7/2008 (fl. 169).

Contra tal decisão, a defesa interpôs recurso de apelação, tendo a Corte

local, por unanimidade, dado provimento ao reclamo em acórdão que restou assim

ementado:

"PENAL. ESTELIONATO CONTRA O INSS. PERCEPÇAO INDEVIDA

DE APOSENTADORIA. ART. 171, 3º, DO CP. CRIME INSTANTÂNEO.

PRESCRIÇAO. TERMO INICIAL. PAGAMENTO DA PRIMEIRA PARCELA.

EXTINÇAO DA PUNIBILIDADE.

1. Na linha do atual entendimento do Pleno do STF (HC n.º 86.467/RS), nos

ditos estelionatos de rendas, deve-se tomar como março inicial do prazo

prescricional a data do primeiro pagamento do benefício, por se tratar de crime

instantâneo, ainda que de efeitos permanentes. 2. No caso, tendo em vista a pena

imposta na sentença, a prescrição ocorre em quatro anos (art. 109, V, CP), lapso

temporal já transcorrido entre a data do fato e a do recebimento da denúncia. 3.

Extinção da punibilidade." (fl. 207)

Irresignado, o Parquet Federal interpõe o presente recurso especial ao

fundamento de que o aresto objurgado teria negado vigência ao art. 1111, III,

doCódigo Penall, uma vez que o crime de estelionato previdenciário perpetrado

pela beneficiária seria crime permanente, somente podendo o termo prescricional

ser iniciado quando do último saque efetuado pela Ré.

Requer o provimento do apelo nobre a fim de que seja dado prosseguimento

ao procedimento criminal instaurado em desfavor da Recorrida.

Contrarrazoado o recurso (fls. 224/225v), foi o recurso admitido na Origem

(fls. 227/227v).

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Remetido o feito a este Superior Tribunal de Justiça, manifestou-se a

Subprocuradoria Geral da República pelo desprovimento do reclamo especial.

É o relatório.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.114.342 - RS (2009/0087417-3) (f)

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO JORGE MUSSI (Relator): Inicialmente,

rechaça-se a preliminar arguida nas contrarrazões ao recurso especial, relativa à

falta de prequestionamento, já que é desnecessária a expressa menção do

dispositivo legal tido por violado no acórdão recorrido, pois o tema nele inserto foi

objeto de devida apreciação pela Corte de origem.

Nesse sentido, já decidiu a Quinta Turma deste Sodalício:

"RECURSO ESPECIAL. PENAL E PROCESSUAL PENAL. VIOLAÇAO

AO ART. 619 DO CPP NAO RECONHECIDA. ROUBO. MOMENTO DA

CONSUMAÇAO DO DELITO. CESSAÇAO DA CLANDESTINIDADE OU

VIOLÊNCIA. REINCIDÊNCIA AGRAVAMENTO DA PENA. NON BIS IN

IDEM. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E, NESSA PARTE,

PROVIDO.

"1. Para que se tenha acesso à via especial, é suficiente a ocorrência do

prequestionamento implícito, ou seja, basta que o Tribunal a quo tenha se

pronunciado a respeito da tese jurídica levantada, sendo desnecessária a menção

expressa aos dispositivos legais tidos por violados. "[...]"4. Recurso parcialmente

conhecido e, nessa parte, provido para reconhecer a forma consumada ao crime de

roubo, bem como a aplicação da agravante da reincidência na dosimetria da

pena"(grifou-se) (REsp 767.584/RS, rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA,

Quinta Turma, p. no DJU de 24-04-2006, p. 453).

Da mesma forma, a Sexta Turma:

"EMBARGOS DE DECLARAÇAO EM RECURSO ESPECIAL.

DIREITO PROCESSUAL PENAL. AÇAO PENAL PRIVADA. HONORÁRIOS

ADVOCATÍCIOS. CONDENAÇAO. POSSIBILIDADE.

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PREQUESTIONAMENTO EXPLÍCITO. DESNECESSIDADE. DISSÍDIO

CONFIGURADO.

"[...]

"2. A Excelsa Corte Especial deste Superior Tribunal de Justiça firmou

posicionamento no sentido de que, para fins de prequestionamento, a violação de

lei federal não exige, necessariamente, que o dispositivo venha expressamente

mencionado no acórdão estadual, bastando, a ensejar a interposição de recurso

especial, que a matéria da impugnação tenha sido argüida, debatida e decidida.

"[...]"4. Embargos acolhidos, sem efeitos infringentes"(grifou-se) (EDcl no REsp

275.650/SP, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, SEXTA TURMA,

julgado em 29.11.2005, DJ 06.02.2006 p. 364).

Passa-se à análise do mérito.

Por meio deste recurso especial o Ministério Público pretende, em síntese,

seja afastada a extinção da punibilidade da recorrida pela prescrição, sustentando

tratar-se o estelionato contra a previdência social de crime permanente.

Em que pese a existência de divergência doutrinária e jurisprudencial sobre

a natureza do crime de estelionato contra a Previdência Social praticado pelo

beneficiário, se delito permanente, ou instantâneo de efeitos permanentes, o certo é

que a jurisprudência da Quinta Turma pacificou-se no sentido de se tratar de

crime permanente. Confira-se:

"PENAL. RECURSO ESPECIAL. ART. 171, 3º, DO CP. DELITO

PERMANENTE. PRESCRIÇAO DA PRETENSAO PUNITIVA. BENEFICIÁRIO

DE PRESTAÇÕES SUCESSIVAS. TERMO INICIAL. PERCEPÇAO DA

ÚLTIMA PARCELA INDEVIDA. INSERÇAO DE DADOS FALSOS PARA

HABILITAÇAO AO RECEBIMENTO DO BENEFÍCIO. CRIME

INSTANTÂNEO SEGUNDO ORIENTAÇAO DO PLENÁRIO DO C. STF.

RESSALVA DO RELATOR QUANTO A ESTA ORIENTAÇAO. TERMO

INICIAL. DATA DO FATO.

"I - O estelionato previdenciário, em que há percepção de parcelas

sucessivas do benefício, é crime permanente cujo lapso prescricional começa a

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contar da data em que cessa a permanência (artigo 111, inciso III, do Código

Penal). (Precedentes).

"II - Escorreita a orientação do e. Tribunal a quo que considerou cessada a

permanência delitiva na data do recebimento da última parcela indevida, in casu,

aquela determinada administrativamente pelo INSS.

"III - Assim, o fato da recorrida ter percebido após esta primeira

interrupção, e, em virtude exclusivamente de cumprimento de decisão judicial,

posteriormente, parcelas deste mesmo benefício previdenciário, não autoriza

concluir que esta segunda interrupção tenha sido a data da cessação da

permanência, notadamente por não se configurar, nesta segunda hipótese, o ardil

do agente.

" IV - "O crime consubstanciado na concessão de aposentadoria a partir de

dados falsos é instantâneo, não o transmudando em permanente o fato de terceiro

haver sido beneficiado com a fraude de forma projetada no tempo. A óptica afasta

a contagem do prazo prescricional a partir da cessação dos efeitos - artigo 111,

inciso III, do Código Penal." (HC 86.467/RS, Tribunal Pleno, Rel. Min. Março

Aurélio, DJU de 22/06/2007).

Recurso especial desprovido.

(REsp 1057510/RJ, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA,

julgado em 08/09/2009, DJe 13/10/2009)

"AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. PENAL.

ESTELIONATO. FRAUDE. PREVIDÊNCIA SOCIAL. CRIME PERMANENTE.

TERMO INICIAL DO PRAZO PRESCRICIONAL. ART. 111, INCISO III, DO

CÓDIGO PENAL.

"1. Inexistindo qualquer fundamento apto a afastar as razões consideradas

no julgado ora agravado, deve ser a decisão mantida por seus próprios

fundamentos.

"2. Este Superior Tribunal de justiça firmou jurisprudência no sentido de

que o crime de estelionato praticado contra a Previdência Social, ensejando a

percepção sucessiva e indevida de benefícios previdenciários, constitui delito

permanente, e não delito instantâneo de efeitos permanentes.

"3. Agravo regimental desprovido".

(AgRg no Ag 1068130/ES, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA

TURMA, julgado em 29/04/2009, DJe 25/05/2009).

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"PENAL. ESTELIONATO CONTRA A PREVIDÊNCIA SOCIAL.

APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. PRESTAÇÕES SUCESSIVAS.

CONFIGURAÇAO DA PERMANÊNCIA. PRESCRIÇAO. TERMO A QUO.

ÚLTIMA PARCELA RECEBIDA. NAO-OCORRÊNCIA DA PRESCRIÇAO.

RECURSO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

"1. O Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido de que

o delito de estelionato contra a previdência é de natureza permanente, ou seja,

prolonga-se no tempo, razão por que o março inicial para a contagem do lapso

temporal dá-se a partir do recebimento do último benefício indevido.

"2. Consoante estabelece o art. 111, inciso III, do Código Penal, a

prescrição, nos crimes permanentes, somente começa a correr do dia em que cessa

a permanência, no caso, verificada em dezembro de 2002. Daí por que se impõe o

regular processamento da ação penal, pela não-ocorrência da prescrição.

"3. Recurso ordinário a que se nega provimento".

(RHC 20968/SP, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA

TURMA, julgado em 28/11/2007, DJ 07/02/2008 p. 1).

AGRAVOS REGIMENTAIS NO RECURSO ESPECIAL. PENAL.

ESTELIONATO. FRAUDE CONTRA A PREVIDÊNCIA SOCIAL. CRIME

PERMANENTE. TERMO INICIAL DO PRAZO PRESCRICIONAL.

CESSAÇAO DO RECEBIMENTO DAS PRESTAÇÕES INDEVIDAS. ART. 111,

INCISO III, DO CÓDIGO PENAL. PRESCRIÇAO. NAO OCORRÊNCIA.

AGRAVOS DESPROVIDOS.

1. A consumação do crime de estelionato contra a Previdência Social, com a

prática de fraude para obtenção de benefício previdenciário de forma sucessiva e

periódica, é de natureza permanente.

2. O termo inicial do prazo prescricional se dá com a cessação do

recebimento do benefício previdenciário, nos termos do art. 111, inciso III, do

Código Penal. Dessa forma, não se verifica a prescrição da pretensão punitiva

estatal.

3. Agravos regimentais desprovidos. (AgRg no Resp. 1201169/RJ, Rel. Min.

LAURITA VAZ, Quinta Turma, julgado em 9/8/2011 e DJe 19/8/2011)

O Supremo Tribunal Federal, por meio de sua Primeira Turma, tem

distinguido a natureza do estelionato Previdenciário a partir de quem o pratica. Se

o próprio beneficiário for o autor do fato, a infração penal terá natureza

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permanente. Por outro lado, na hipótese de fraude implementada por terceiro para

que outrem obtenha o benefício, tratar-se-á de crime instantâneo de efeitos

permanentes. Nesse sentido, trago à colação o julgamento do HC 99.112/AM,

noticiado no Informativo 583 da Suprema Corte:

Estelionato Previdenciário: Natureza e Prescrição

O denominado estelionato contra a Previdência Social (CP, art. 171, 3º),

quando praticado pelo próprio beneficiário do resultado do delito, é crime

permanente. Com base nesse entendimento, a Turma indeferiu habeas corpus no

qual se pleiteava a declaração de extinção da punibilidade de condenado por

fraude contra a Previdência Social em proveito próprio por haver declarado

vínculo empregatício inexistente com empresas, com o fim de complementar

período necessário para a aposentadoria por tempo de contribuição. Consignou-se

que o STF tem distinguindo as situações: a do terceiro que implementa fraude

para que uma pessoa diferente possa lograr o benefício em que configurado crime

instantâneo de efeitos permanentes e a do beneficiário acusado pela fraude, que

comete crime permanente enquanto mantiver em erro o INSS. Precedentes

citados: HC 75053/SP (DJU de 30.4.98); HC 79744/SP (DJU de 12.4.2002) e HC

86467/RS (DJU de 22.6.2007)."

Confira-se, a propósito, a ementa do referido julgado:

PRESCRIÇAO - CRIME INSTANTÂNEO E CRIME PERMANENTE -

PREVIDÊNCIA SOCIAL - BENEFÍCIO - RELAÇAO JURÍDICA

CONTINUADA - FRAUDE. Enquanto a fraude perpetrada por terceiro

consubstancia crime instantâneo de efeito permanente, a prática delituosa por

parte do beneficiário da previdência, considerada relação jurídica continuada, é

enquadrável como permanente, renovando-se ante a periodicidade do benefício.

(HC 99112, Relator (a): Min. MARÇO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em

20/04/2010, DJe-120 DIVULG 30-06-2010 PUBLIC 01-07-2010 EMENT VOL-

02408-04 PP-01244)

E ainda:

EMENTA: PENAL. HABEAS CORPUS. ESTELIONATO

PREVIDENCIÁRIO (ART. 171, 3º, DO CÓDIGO PENAL. CRIME

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PERMANENTE. BENEFICIÁRIO. PRAZO PRESCRICIONAL. INÍCIO DA

CONTAGEM. CESSAÇAO DA PERMANÊNCIA. PRESCRIÇAO EM

PERSPECTIVA. TEMA NAO APRECIADO NA ORIGEM.

INCOGNOSCIBILIDADE. INSTITUTO NAO ACOLHIDO PELO E. STF. 1. O

agente que perpetra a fraude contra a Previdência Social recebe tratamento

jurídico-penal diverso daquele que, ciente da fraude, figura como beneficiário das

parcelas. O primeiro pratica crime instantâneo de efeitos permanentes; já o

segundo pratica crime de natureza permanente, cuja execução se prolonga no

tempo, renovando-se a cada parcela recebida da Previdência. 2. Consectariamente,

em se tratando de crime praticado pelo beneficiário, o prazo prescricional começa

a fluir da cessação da permanência. Precedentes: HC nº 99.112, rel. Min. Março

Aurélio, j. 20/4/2010, 1ª Turma; HC 101.481, rel. min. Dias Toffoli, j. 26/4/2011, 1ª

Turma; HC 102.774/RS, rel. Min. Ellen Gracie, j. 14/12/2010, 2ª Turma, DJ de

7/2/2011. 3. In casu, narra a denúncia que a paciente participou não apenas da

fraude à entidade de Previdência Social, por meio de conluio com servidores do

INSS, mas figurou como destinatária dos benefícios previdenciários, que recebeu

até 30/10/2006. 4. Dessa forma, forçoso reconhecer que o prazo prescricional teve

início apenas na referida data, em que cessada a permanência. 5. A prescrição não

submetida à instância a quo torna inviável o seu conhecimento em sede de writ

impetrado perante a Suprema Corte, sob pena de supressão de instância.

Precedentes: HC 100616 / SP - Relator Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda

Turma, Julgamento em 08/02/2011, DJ de 14/3/2011; HC 103835/SP Relator: Min.

RICARDO LEWANDOWSKI, Primeira Turma, Julgamento em 14/12/2010, DJ de

8/2/2011. 6. A prescrição em perspectiva, projetada ou antecipada, mercê da

ausência de previsão legal, é inadmissível de ser conhecida e acolhida. (RE 602527

QO-RG/RS, rel. Min. Cezar Peluso, Plenário, DJ de 18/12/2009). 7. Parecer pela

denegação da ordem. 8. Ordem denegada. (HC n.º 102.491/RJ, Rel. Min. LUIZ

FUX, Primeira Turma, julgado em 10/5/2011 e DJe 25/5/2011).

EMENTA Habeas corpus. Penal. Crime de estelionato contra a Previdência

Social. Art. 171, 3º, do Código Penal. Paciente que praticou a fraude contra a

Previdência Social em proveito próprio, visando a obtenção indevida de benefício

previdenciário. Crime permanente. Prescrição. Não ocorrência. Termo inicial.

Data do recebimento indevido da última prestação do benefício irregular.

Precedentes. Ordem denegada. 1. Esta Suprema Corte já se pronunciou no sentido

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de que “o crime de estelionato contra a Previdência Social, quando praticado pelo

próprio beneficiário das prestações, tem caráter permanente, o que fixa como

termo inicial do prazo prescricional a data da cessão da permanência” (RHC nº

105.761/PA, Primeira Turma, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, DJe de

1º/2/11). 2. Aplicando esse entendimento ao caso concreto, entre os marcos

interruptivos da prescrição (art. 117 do Código Penal), não transcorreu lapso

temporal superior a 4 (quatro) anos (art. 109, inciso V, do Código Penal),

considerando a pena corporal aplicada à paciente. 3. Levando-se em conta o último

março interruptivo (art. 117, inciso IV, do Código Penal), a prescrição da

pretensão punitiva estatal do delito praticado ocorrerá somente em junho de 2012.

4. Ordem denegada. (HC n.º 98194/RS, Rel. Min. DIAS TOFFOLI, Primeira

Turma, julgado em 3/5/2011 e DJe 29/7/2011).

EMENTA: HABEAS CORPUS. CRIME MILITAR. ESTELIONATO

PREVIDENCIÁRIO. BENEFICIÁRIO DAS PARCELAS INDEVIDAS. CRIME

PERMANENTE. PRESCRIÇAO. TERMO INICIAL. HIGIDEZ DA

PRETENSAO PUNITIVA. ORDEM INDEFERIDA. 1. Em tema de estelionato

previdenciário, o Supremo Tribunal Federal tem uma jurisprudência firme quanto

à natureza binária da infração. Isso porque é de se distinguir entre a situação

fática daquele que comete uma falsidade para permitir que outrem obtenha a

vantagem indevida, daquele que, em interesse próprio, recebe o benefício

ilicitamente. No primeiro caso, a conduta, a despeito de produzir efeitos

permanentes no tocante ao beneficiário da indevida vantagem, materializa,

instantaneamente, os elementos do tipo penal. Já naquelas situações em que a

conduta é cometida pelo próprio beneficiário e renovada mensalmente, o crime

assume a natureza permanente, dado que, para além de o delito se protrair no

tempo, o agente tem o poder de, a qualquer tempo, fazer cessar a ação delitiva.

Precedentes. 2. No caso, o paciente, indevidamente, sacou os valores depositados na

conta-corrente de sua falecida irmã no período de janeiro de 2000 a maio de 2005.

É falar: em proveito próprio, ele cometeu a fraude contra a Administração Militar.

Donde ressai a natureza permanente da infração, a atrair a incidência do inciso III

do art. 111 do Código Penal. 3. Habeas corpus indeferido. (HC n.º 104.880/RJ, Rel.

Min. AYRES BRITTO, Segunda Turma, julgado em 14/9/2010 e DJe 21/10/2010).

No caso, a recorrida recebia aposentadoria de pessoa morta, obtida, assim,

por meio de induzimento em erro da Autarquia Federal. Em casos tais, o termo

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inicial do prazo prescricional do estelionato contra a Previdência Social se dá com

a cessação do recebimento do benefício indevido, o qual ocorreu em novembro de

2004 (fl. 161).

Considerando a pena fixada na origem (1 ano, 6 meses e 20 dias de

reclusão), o prazo prescricional é de 4 (quatro) anos, de acordo com o art. 109,

inciso V, do Código Penal, de tal sorte que não transcorreu o referido lapso desde a

cessação do recebimento do benefício indevido, novembro de 2004 (fl. 161), até o

recebimento da exordial acusatória em 21/2/2008 (fl. 134), ou entre este e a

sentença condenatória (publicada no dia 15/7/2008), não podendo falar-se, então,

em prescrição da pretensão punitiva.

Desta forma, na linha do entendimento que vem sendo adotado por esta

Corte, considerando que o estelionato contra a previdência social praticado pelo

beneficiário da prestação indevida se trata de crime permanente, não se vislumbra

a ocorrência da causa de extinção da punibilidade.

Ante o exposto, conheço do recurso especial e dou-lhe provimento para

afastar o reconhecimento da prescrição, devendo os autos serem remetidos ao

Tribunal Regional Federal da 4ª Região para julgamento das demais matérias

aventadas pela defesa no recurso de apelação lá interposto.

É o voto.

CERTIDAO DE JULGAMENTO

QUINTA TURMA

Número Registro: 2009/0087417-3

REsp 1.114.342 / RS

Número Origem: 200771050025957

MATÉRIA CRIMINAL

PAUTA: 20/09/2011 JULGADO: 20/09/2011

Relator

Exmo. Sr. Ministro JORGE MUSSI

Presidente da Sessão

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Exmo. Sr. Ministro JORGE MUSSI

Subprocurador-Geral da República

Exmo. Sr. Dr. FRANCISCO XAVIER PINHEIRO FILHO

Secretário

Bel. LAURO ROCHA REIS

AUTUAÇAO

RECORRENTE : MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

RECORRIDO : RAMONA FELISSA ÁVILA DE MOURA

ADVOGADO : DENNIS OTTE LACERDA - DEFENSOR

PÚBLICO E OUTROS

ASSUNTO: DIREITO PENAL - Crimes contra o Patrimônio - Estelionato

CERTIDAO

Certifico que a egrégia QUINTA TURMA, ao apreciar o processo em

epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

"A Turma, por unanimidade, conheceu do recurso e lhe deu provimento,

nos termos do voto do Sr. Ministro Relator."

Os Srs. Ministros Março Aurélio Bellizze, Adilson Vieira Macabu

(Desembargador convocado do TJ/RJ) e Laurita Vaz votaram com o Sr. Ministro

Relator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Gilson Dipp.

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BIBLIOGRAFIA CONSULTADA

BACILA, Carlos Roberto. Estigmas: um estudo sobre os preconceitos. 2ed. Ampl. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008. BALTAZAR JÚNIOR, José Paulo. Crimes federais. 5. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2010. BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas: texto integral. Tradução de Torrieri Guimarães. São Paulo: Martin Claret, 2004. BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte especial. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, v. 3. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em: 23 abr. 2014. CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal: parte especial. IIv. 5 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva 2005. CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de direito previdenciário. 13. ed. São Paulo: Conceito Editorial, 2011. DELMANTO, Celso et al. Código Penal Comentado. 7 ed. rev., atual. e ampl. Rio de Janeiro: Renovar, 2007. FAYET JUNIOR, Ney. Do crime continuado. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2001. GOMES, Luiz Flávio. Estelionato previdenciário: crime instantâneo ou permanente? Crime único, continuado ou concurso formal? Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n.1188, 2 out. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=8991>. Acesso em 23 jul. 2014. GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: parte especial. IIIv. 4 ed. rev., ampl e atual. Niterói: Impetus, 2007. IBRAHIM, Fábio Zambitte. Curso de Direito Previdenciário. 13 ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Impetus, 2008. LOZANO JÚNIOR, José Júlio. Prescrição penal. São Paulo: Saraiva, 2002. MACIEL FILHO, Euro Bento. Crimes Previdenciários: análise crítica dos delitos clássicos contra a previdência social, à luz da Lei n. 9.983, de 14.7.2000. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2004. MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal: parte especial. 19. ed. São Paulo: Atlas, 2002, v. 2.

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NORONHA, E. Magalhães. Direito Penal. Iv. 33 ed. rev e atual por Adalberto José Q. T. de Camargo Aranha. São Paulo: Saraiva, 1998. SALLES JÚNIOR, Romeu de Almeida. Apropriação Indébita e Estelionato: indagações, doutrina, jurisprudência e prática. Bauru: Editora Jalovi Ltda, 1979. SOUZA, Nelson Bernardes. Ilícitos Previdenciários: crimes sem pena?Jus Navegandi, Teresina, ano 1, n. 9, mar. 1997. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1495>. Acesso em 23 abr. 2014. TEIXEIRA, Francisco Dias Teixeira. Crime contra a Previdência Social em face da Lei n. 9.983/00. In Boletim dos Procuradores da República. Ano III. N. 30. Outubro de 2000. TRÊS, Celso Antônio. Teoria Geral do Delito Pelo Colarinho Branco. Curitiba: Imprensa Oficial, 2006.

ZANGARI, Mário. Do Estelionato: doutrina e prática. São Paulo: Edições e Publicações Brasil Editora S/A [1958].

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BIBLIOGRAFIA CITADA

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2012. DJe em 01 ago. 2012. Disponível em: <https://ww2.stj.jus.br/processo/jsp/revista/abreDocumento.jsp?componente=ITA&sequencial=1162338&num_registro=201101596050&data=20120801&formato=PDF>. Acesso em: 23 abril. 2014. ______, 2012. Tribunal Regional Federal da 2ª Região. Recurso em sentido estrito n.2003.51.01.542007-2. Segunda Turma Especializada. Relator Desembargador Federal MESSOD AZULAY NETO. Julgado em 14 fev. 2012. E-DJF2R em 05 mar. 2012, p. 143. Disponível em <http://www.trf2.gov.br/cgibin/pdbi?PRO=200351015420072&TOPERA=1&I1=OK>. Acesso em 23 abril. 2014. ______, 2012. Tribunal Regional Federal da 3ª Região. Recurso em sentido estrito n. 0008360-44.2004.4.03.6181/SP. Quinta Turma. Relator Desembargador Federal ANDRÉ NEKATSCHALOW. Julgado em 17 set. 2012. D.E. em 28 set. 2012. Disponível em: <http://web.trf3.jus.br/acordaos/Acordao/BuscarDocumentoGedpro/2280158>. Acesso em: 23 abril. 2014. ______, 2012. Supremo Tribunal Federal. Agravo regimental em recurso extraordinário com agravo n. 663735/ES. Segunda Turma. Relator Ministro AYRES BRITTO. Julgado em 07 fev. 2012. DJe em 19 mar. 2012. Disponível em: <http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=1827434>. Acesso em: 23 abril 2014.

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ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 02 AGRADECIMENTO 03 DEDICATÓRIA 04 RESUMO 05 METODOLOGIA 06 SUMÁRIO 07 INTRODUÇÃO 08 1. DO ESTELIONATO 09 1.1- Apontamentos Históricos 09 1.2- Do Conceito de Estelionato 13 2. DO ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO 14 2.1- Apontamentos Históricos 14 2.2- Conceito 20 2.3- Bem Jurídico e Sujeitos do Delito 22 3. O CRIME DE ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO: EXAME DO TIPO PENAL, COMPETÊNCIA E INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA 24 3.1- Tipo Penal 24 3.1.1 Verbos Nucleares do Tipo 25 3.1.2- Vantagem Ilícita 26 3.1.3- Prejuízo Alheio 27 3.1.4- Tipos Objetivos 28 3.1.5- Incidência da Majorante 28 3.1.6- Bem Jurídico 39 3.1.7- Sujeito Ativo 30 3.1.8- Sujeito Passivo 30 3.1.9- Elemento Subjetivo 31 4. OS DIFERENTES MOMENTOS CONSUMATIVOS ADOTADOS PARA O CRIME DE ESTELIONATO PREVIDENCIÁRIO E SUAS CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS 32 4.1- Estelionato previdenciário como crime instantâneo ou instantâneo de efeitos permanentes 34 4.2 Estelionato previdenciário como crime permanente ou eventualmente permanente 38 4.3- Classificação Mista 42 4.4 Estelionato previdenciário como crime continuado 44 CONCLUSÃO 46 ANEXO 47 BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 59 BIBLIOGRAFIA CITADA 61 ÍNDICE 64

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