documento internacional do mes - dez 2014

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Documento Internacional do MES- Dezembro de 2014 Um novo período histórico e o lugar dos revolucionários I O ascenso do movimento de massas e a necessidade de uma estratégia socialista A maior crise do capital desde 1929 se iniciou em 2008. Depois de seu início se multiplicaram no mundo os processos de luta social. Tunísia, Egito, mundo árabe, Londres, Espanha, EUA, Ucrânia. Foram acontecimentos que marcaram o mundo e condicionam muitos dos processos econômicos e políticos posteriores. Como regra abrem ou intensificam crises econômicas e dificultam a adoção de medidas econômicas de ajuste capitalista. Produzem uma nova vanguarda social. Massificam pautas democráticas e de transição. Os efeitos do novo período do ponto de vista da ação de massas se fizeram sentir, sobretudo, de 2011 pra cá, em geral na forma de ocupações de praças, levantes de rua, e até verdadeiras revoluções que puseram abaixo regimes ditatoriais. Revoluções, aliás, que inauguraram este período histórico de intensificação dos conflitos. A Grécia já havia aparecido como sintoma. Não é a toa que logo depois da crise aberta em 2009 foi um dos pontos mais altos. Mas a Grécia não ficou isolada. Trata-se de um fenômeno mundial. Eles marcam por um período a situação dos países. É certo que atrasos na consciência, ausência de horizontes e alternativas em termos subjetivos, falta de organizações democráticas do movimento de massas objetivamente muitas vezes trazem contradições e retrocessos. Foi o caso justamente da primeira onda, em que boa parte das revoluções árabes (Líbia, Síria e Egito), depois de despertarem enormes esperanças, retrocederam. Mas os países não voltam mais a ser o que eram, pois são regiões desestabilizadas. E no plano mundial retrocessos e reveses locais não alteram a perspectivas de novos levantes, novos grandes acontecimentos. Vimos isso no Brasil, na Turquia, e agora em Hong Kong e no México. Nos EUA, como veremos, as lutas de resistência, seja a luta contra a guerra, seja contra o racismo, por questões democráticas em geral têm pesado para desestabilizar o imperialismo. Apesar dos efeitos do terrorismo, o povo dos EUA não abandonou a demanda por reivindicações democráticas, e em alguns momentos chegou a estender esta demanda para outras partes do mundo e começa a questionar em defesa dos seus direitos sociais contra os privilégios de Wall Street. A rebelião da juventude negra, a partir da impunidade de um policial que matou um jovem em Ferguson, se estendeu por todo território norte-americano. Na Europa Ocidental, a exceção do sul do continente, não tivemos ainda grandes processos de mobilização de massas unificados que tenham centralizado a atenção da vida nacional. Embora tenham existido muitas lutas sociais, em particular na Franca, há maior polarização e um crescimento de alternativas de direita, sendo esta perspectiva ainda mais acentuada em países do norte europeu. Acreditamos que o proletariado europeu, de grande tradição e conquistas de muitos direitos, travará grandes combates. No sul da Europa, contudo, já tivemos levantes sociais, como foi o 15 M na Espanha. E é justamente no sul da Europa onde se visualizaram possibilidades novas na configuração política do mundo. Começa lentamente a se estabelecer uma novidade política no sul da Europa como desdobramentos destes processos sociais. As mobilizações que estão marcando a situação mundial promovem, malgrado a ausência de organizações marxistas revolucionárias com peso de massas, toda a sorte de organizações, e, sobretudo, movimentos, frentes e até partidos progressistas - alguns anticapitalistas que começam a ter chances reais de

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Atualização do debate e Orientação da política Internacional.

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Page 1: Documento Internacional do MES -  dez 2014

Documento Internacional do MES- Dezembro de 2014

Um novo período histórico e o lugar dos revolucionários

I O ascenso do movimento de massas e a necessidade de uma estratégia socialista

A maior crise do capital desde 1929 se iniciou em 2008. Depois de seu início se multiplicaram no mundo os

processos de luta social. Tunísia, Egito, mundo árabe, Londres, Espanha, EUA, Ucrânia. Foram acontecimentos que

marcaram o mundo e condicionam muitos dos processos econômicos e políticos posteriores. Como regra abrem ou

intensificam crises econômicas e dificultam a adoção de medidas econômicas de ajuste capitalista. Produzem uma

nova vanguarda social. Massificam pautas democráticas e de transição. Os efeitos do novo período do ponto de vista

da ação de massas se fizeram sentir, sobretudo, de 2011 pra cá, em geral na forma de ocupações de praças, levantes

de rua, e até verdadeiras revoluções que puseram abaixo regimes ditatoriais. Revoluções, aliás, que inauguraram

este período histórico de intensificação dos conflitos.

A Grécia já havia aparecido como sintoma. Não é a toa que logo depois da crise aberta em 2009 foi um dos

pontos mais altos. Mas a Grécia não ficou isolada. Trata-se de um fenômeno mundial. Eles marcam por um período a

situação dos países. É certo que atrasos na consciência, ausência de horizontes e alternativas em termos subjetivos,

falta de organizações democráticas do movimento de massas objetivamente muitas vezes trazem contradições e

retrocessos. Foi o caso justamente da primeira onda, em que boa parte das revoluções árabes (Líbia, Síria e Egito),

depois de despertarem enormes esperanças, retrocederam. Mas os países não voltam mais a ser o que eram, pois

são regiões desestabilizadas. E no plano mundial retrocessos e reveses locais não alteram a perspectivas de novos

levantes, novos grandes acontecimentos. Vimos isso no Brasil, na Turquia, e agora em Hong Kong e no México.

Nos EUA, como veremos, as lutas de resistência, seja a luta contra a guerra, seja contra o racismo, por

questões democráticas em geral têm pesado para desestabilizar o imperialismo. Apesar dos efeitos do terrorismo, o

povo dos EUA não abandonou a demanda por reivindicações democráticas, e em alguns momentos chegou a

estender esta demanda para outras partes do mundo e começa a questionar em defesa dos seus direitos sociais

contra os privilégios de Wall Street. A rebelião da juventude negra, a partir da impunidade de um policial que matou

um jovem em Ferguson, se estendeu por todo território norte-americano. Na Europa Ocidental, a exceção do sul do

continente, não tivemos ainda grandes processos de mobilização de massas unificados que tenham centralizado a

atenção da vida nacional. Embora tenham existido muitas lutas sociais, em particular na Franca, há maior

polarização e um crescimento de alternativas de direita, sendo esta perspectiva ainda mais acentuada em países do

norte europeu. Acreditamos que o proletariado europeu, de grande tradição e conquistas de muitos direitos,

travará grandes combates. No sul da Europa, contudo, já tivemos levantes sociais, como foi o 15 M na Espanha.

E é justamente no sul da Europa onde se visualizaram possibilidades novas na configuração política do

mundo. Começa lentamente a se estabelecer uma novidade política no sul da Europa como desdobramentos destes

processos sociais. As mobilizações que estão marcando a situação mundial promovem, malgrado a ausência de

organizações marxistas revolucionárias com peso de massas, toda a sorte de organizações, e, sobretudo,

movimentos, frentes e até partidos progressistas - alguns anticapitalistas que começam a ter chances reais de

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chegarem ao governo em seus países. É o caso do Podemos na Espanha e do Syriza na Grécia, ambos com chances

de vencer eleições. O que irá ocorrer se esta hipótese for confirmada?

Na próxima conjuntura teremos que discutir estas questões. Partir das experiências históricas como o

stalinismo, da social democracia, do eurocomunismo e agora, recentemente, das experiências dos governos de

movimentos, partidos, superestruturas da América Latina - que no seu tempo foram as expressões de mobilizações

de massas revolucionárias - como o MAS, na Bolívia, Rafael Correa, no Equador, e a mais debatida, o chavismo na

Venezuela. Em alguns países este ascenso democrático e social, nacionalista e anti-imperialista, foi também

poderoso. Mas as superestruturas traíram imediatamente, produzindo um vazio de direção, abrindo também

enormes oportunidades para forças de esquerda. É o caso do Peru. Ai, embora as direções que encabeçaram a

primeira onda tenham traído, não lograram manter planos neoliberais estáveis. Mas não há o que discutir da

experiência de Humalla a não ser a rapidez da traição como, aliás, ocorreu com o governo Lúcio Gutierez no Equador

– que traiu o processo revolucionário e foi derrubado pelo movimento de massas.

O que na Europa ainda não existe, isto é, governos que surgiram de processos de mobilizações de massas, na

América Latina já está presente há mais de uma década. Em alguns casos há sinais de esgotamento, como na

Venezuela. Em outros as experiências nacionais do movimento de massas renovam a aposta, como na Bolívia e no

Equador. É fundamental o balanço destas experiências, sobre suas perspectivas e a política dos revolucionários

diante delas.

O Brasil é um caso a parte. O PT chegou ao poder depois de um longo processo de acomodação política. Foi

uma vitória eleitoral muito distante do ponto alto do ascenso representado pela campanha de Lula de 89. Assim já

chegou como produto de uma conciliação, não de um levante de massas ou mesmo de uma forte mobilização

radicalizada ainda que eleitoral. O levante de junho de 2013 mostrou que já chegou a hora de levantes que

desgastam e se enfrentam até mesmo com as direções tradicionais do movimento de massas quando as mesmas

chegam ao governo e aplicam os planos de ajuste capitalistas. Parece que hoje como nunca está em vigor a máxima

do manifesto comunista “tudo que é sólido desmancha no ar”.

Assim, entramos num período onde debates estratégicos devem ser retomados com força como único

caminho para a renovação do marxismo e sua constituição como uma corrente viva e forte do movimento operário.

A ausência desta corrente com força no movimento de massas nos dias atuais é uma das principais expressões das

dificuldades e das limitações do atual período.

De qualquer forma, a tendência no próximo período é de continuidade das lutas do movimento de massas

no mundo todo. Não poderia deixar de ser assim, já que o capitalismo seguirá tendo que atacar aos interesses dos

trabalhadores. O capitalismo vive uma crise de longa duração. Mas nesta longa duração não temos apenas

possibilidades de acumulação e de saltos no processo de construção de uma alternativa. Há riscos crescentes de

degradação, de retrocessos. Na sua agonia não há, portanto, apenas as possibilidades de superação do sistema, mas

também que o mesmo nos arraste para o caos e a barbárie que aparecem com força em partes importantes do

mundo. Por isso estamos longe de minimizar os riscos. É claro que estas perspectivas são poderosas e para elas o

capitalismo nos conduz. Contra as tendências da barbárie devemos nos mobilizar. E afirmar uma saída dos

trabalhadores e dos povos em luta.

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II Crise de longa duração

É certo que estamos numa crise de longa duração. Todos consideram que esta crise somente encontra algum

parâmetro de comparação com a crise de 1929. François Chesnais chega a definir que ela vem depois de 50 anos de

acumulação capitalista, ou seja, uma expansão do capital de meio século. Sendo certa a tese de Chesnais fica

evidente a dimensão da mudança de que estamos falando. Outra variante interpretativa é de que a atual crise se

inscreve nos chamados ciclos de Kondratief. Esta teoria define que o modo de produção capitalista se divide em

períodos alternados – mais ou menos 25 anos cada– em ciclos cuja marca é a expansão da produção, crescimentos

mais acentuados e longos e recessões mais curtas e fracas, com períodos descendentes, com ciclos cuja

característica era oposta. Isto é, as recessões eram mais longas e severas e a recuperação curta e moderada.

Para elucidar um pouco o que significam estes ciclos em termos históricos, vale citar longamente Gunder

Frank e sua descrição destas chamadas ondas largas.

“A primeira onda longa desde a revolução industrial (que inovou ou pôs os cimentos para a inovação técnica

das máquinas a motor durante a crise de 1762-1789) esteve associada, como sustentou Mandel, com a fabricação

(literalmente) a mão destas máquinas (têxtil e de outras classes) e com as máquinas a vapor que as impulsionavam.

A fase ascendente durou desde 1790/93 até 1816/25 (segundo as distintas interpretações) e a fase descendente até

1847/48. A derrota da revolução de 1848 infringiu um duro golpe, político e econômico, às classes trabalhadoras

europeias e criou as condições socioeconômicas para uma nova onda de expansão que vai de 1849 a 1873. Esta

expansão esteve ligada à revolução e expansão dos transportes por ferrovia e transatlânticos a vapor...” (p. 58).

Depois seguiu uma nova crise, a de 1873 que os historiadores denominaram a grande depressão, onda de descenso

e que foi até o final do século XIX, seguida de uma nova onda expansiva que durou até 1913, vésperas da primeira

guerra mundial. Foi esta a época da relativa decadência britânica e o início dos avanços dos EUA, Alemanha, Japão e

Rússia (Gunder Frank). Foi a época do surgimento do imperialismo clássico. A expansão deste período até a primeira

guerra esteve ligada, na leitura de Mandel e de Gunder, às inovações da chamada segunda revolução industrial – do

motor de combustão interno dos automóveis, dos motores e a iluminação elétrica assim como com os grandes

investimentos em infraestrutura. Seguindo Gunder Frank, “A seguinte fase descendente discorre desde 1913/19

(antes ou depois da primeira guerra mundial) até 1940/45 (antes ou depois da segunda guerra mundial). Incluiu a

“grande depressão” dos anos 30, logo em seguida do crash financeiro de Wall Street em 1929”. (p. 59). Esta

depressão foi seguida pela expansão do pós-guerra, ligada a nova expansão da indústria do automóvel, aeronáutica

e petroquímica e o início da terceira revolução tecnológica eletrônica e nuclear. “Desde 1967, o sistema econômico

do mundo capitalista parece haver entrado em uma nova fase descendente ou período de crise econômica” (p. 59).

A periodização de Gunder Frank termina aqui.

Se admitimos a força explicativa da teoria das ondas longas, sem dúvida a última de tonalidade

contracionista foi a iniciada em 1967 e que durou até 1990. De 1990 até 2007 a onda foi expansiva – tendo como

base novamente a indústria automotiva (se espalhando pelo mundo), o armamento, a especulação imobiliária, a

restauração do capitalismo na China, na ex-URSS e no leste europeu, e sobretudo, no passo seguinte e consolidação

da revolução tecnológica eletrônica, com a massificação da informática e da computação. Analisando a crise aberta

em 67 e ainda não fechada em 1987, quando estourou um novo crash em Wall Street, Moreno dizia que poderia

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haver uma nova onda expansiva se um novo ramo de produção de massas surgisse, levantando a hipótese da

computação. Os anos seguintes mostrariam que a hipótese de Moreno do Correio Internacional de 87 se confirmara.

Existiram neste período crise em várias regiões, como 94 no México, 97 no sudeste asiático, 99 no Brasil e na Rússia,

2001 nos EUA e na Argentina. Mas não atingiram todos os países nem impediram a dinâmica geral de expansão do

capital baseada não apenas na revolução tecnológica, mas na precarização das condições de trabalho e sobretudo no

crédito público que salvou o sistema e ao mesmo tempo preparou as condições da crise atual. Os fatores de

expansão encontraram obstáculos e limites que estão com dificuldades de transpor.

Chesnais explica sinteticamente as características da situação atual do modo de produção capitalista. Numa

entrevista na qual saudava o livro O Capital no século XXI de Thomas Piketty, definiu que além da desigualdade o

capitalismo tem problemas mais amplos, a concentração industrial, a monopolização e ainda a “queda da taxa de

formação de capital, a ausência de inovações tecnológicas que requerem novos grandes investimentos e despesas

com salários (levando a uma nova longa onda shumpeteriana), a contínua ênfase em indústrias que deram tudo que

podiam dar em termos de crescimento e têm efeitos bumerangues contrários (a dependência nos automóveis é a

primeira da lista).

É por conta dos obstáculos enfrentados pelo capitalismo e da escassez de lucros decorrentes da produção

que tanto dinheiro vai para o setor imobiliário –com as bolhas de imóveis– e uma grande quantidade é ainda

destinada à especulação financeira através da negociação de papéis sobre a produção atual e futura (ações e títulos

públicos e privados).

Trata-se do capital fictício. Ele não acrescenta nada ao estoque de investimento nem serve de apoio ao

crescimento. E os derivativos, que representam a maior parte da atividade do mercado financeiro, são uma forma

ainda mais aguda do capital puramente fictício. (05-06 de 2014 Folha de SP François Chesnais)

E agora? Qual novo ramo de produção? Automóveis novamente? Claro que não. Quando citamos

longamente Gunder Frank, as citações se centraram na periodização dos chamados ciclos de Kondratief e o vínculo

que tais ondas tiveram com as mudanças tecnológicas e ramos produtivos. Mas há outros fatores. A saída da crise de

29 teve relação com ramos de produção – automóvel foi um deles – mas também com o nazismo, cuja consequência

foi a destruição de forças produtivas a partir do qual se deu a reconstrução e a redução dos salários na Europa, em

particular na Alemanha. A crise de caráter contracionista aberta em 67, por exemplo, se resolveu na ascensão do

neoliberalismo, na derrota dos mineiros ingleses e dos controladores de voo dos EUA a partir do final dos anos 70 e

início dos anos 80, combinado com a expansão baseada no crédito público. E a expansão do crédito encontrou a

revolução tecnológica e o ramo da informática, somado ainda à abertura dos mercados do leste e do início da

restauração do capitalismo na China. Por isso no final o crash de 87 ao invés de ser a expressão do início de uma

nova grande crise acabou sendo revertido e dando lugar para uma retomada da expansão capitalista.

A computação pode indicar um novo ascenso do capital? Não é isso que tem ocorrido. Então, para uma nova

retomada se precisa de condições prévias. É preciso um ataque ao nível de vida mais brutal, ataque que tem

dificuldades de ser levado adiante na profundida e extensão exigida em função das lutas sociais. E é preciso

provavelmente um novo ramo de produção, já que a crise é de superprodução. Não há uma situação em que a

humanidade esteja sedenta por uma nova mercadoria com capacidade de ser produzida massivamente no mundo

como no seu momento foram os computadores, os celulares, que entraram no mercado como parte de uma

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revolução tecnológica que reduziu preços de produção de inúmeras outras mercadorias, além de baratear o

transporte, os custos administrativos, etc. As buscas de novas tecnologias e as revoluções da energia limpa junto

com a indústria armamentista e as expansões das cidades são caminhos que os EUA encontraram para seguirem

acumulando capital em escala ampliada. Mas é difícil que uma nova onda de expansão ocorra sem uma redução

significativa do nível de vida das massas. Ademais não está na pauta multidões da classe média alta viajando pelo

espaço, por exemplo.

Husson retoma a noção de ondas largas para discutir as saídas diante do impasse da crise econômica:

“Um dos pontos importantes da teoria das ondas largas [ou longas] é romper a simetria das inflexões: a

passagem da fase expansiva para a fase depressiva é “endógena”, no sentido que é resultado de mecanismos

internos ao sistema. A passagem da fase depressiva para uma nova fase expansiva é, pelo contrário, uma passagem

“exógena”, não automática, e supõe uma reconfiguração do entorno social e institucional. A ideia chave é que a o

ciclo de entrada numa fase expansiva não está dado de antemão e requer construir uma nova ‘ordem produtiva’”.

Dito de outra forma, as contradições que se desenvolveram abrindo o ciclo da fase depressiva, tomado na

crise aberta de 2007/08, não resolvem a própria crise. Para assistirmos ao desenlace da crise, a retomada do

crescimento econômico de conjunto, precisamos tomar o pulso de vários fatores de caráter social e político. Uma

interpenetração que em última instância é decidida pelas variadas formas da luta de classes.

Do ponto de vista da direção das classes dominantes a aposta continua sendo a de superar as crises

aumentando a exploração. Esta lógica tem levado a crescente concentração de riqueza nas mãos de poucas

famílias/empresas. Se nos cartazes das manifestações pelo mundo afora se convoca os 99% a lutar contra os

privilégios de 1%, outros autores como Anibal Ramos já falavam da “ditadura das 200 famílias.” Esta lógica do

sistema capitalista por sua vez faz com que estados burgueses sejam questionados cada vez mais. Um

questionamento que incide em alguns países na superestrutura e nos regimes políticos a tal ponto que as

contradições e dificuldades da aplicação dos planos do capital financeiro encontram mais obstáculos.

A relação entre a luta de classes e as mediações dos tipos de regime político que encontramos no século XXI

é o vetor mais importante para analisarmos os prognósticos possíveis para os próximos anos.

O prognóstico é que a crise capitalista seguirá se arrastando, na medida em que não vemos perspectiva de

guerra mundial (a guerra foi a principal solução para a crise de 1929), nem abertura de um novo ramo de produção à

vista, o que se soma à crise da dívida pública para complicar uma recuperação sustentada. Tampouco está no

horizonte de curto prazo grandes derrotas do movimento operário que permitam uma brutal extração de mais valia

além do que temos visto na China. E mesmo esta já tem sido insuficiente para sustentar o crescimento como tinha

contribuído até então. Mesmo na China, que foi uma poderosa contenção da depressão sistêmica do capitalismo

mundial, há riscos crescentes de desaceleração e desestabilização.

Segundo David Harvey, os investimentos em bens imóveis na China já chegam a 75% do PIB. Este

conceituado estudioso marxista faz análises científicas relacionando as crises imobiliárias com as crises econômicas.

E diz sobre a China que “a possibilidade de um colapso seguido por um longo período de estagnação ao estilo

japonês é muito real” (Cidades Rebeldes, pág. 123). E sabe-se que Japão passou estagnado durante todos os anos 90

e nunca mais voltou a ser um polo capaz de conduzir à expansão do capital. Agora, o anúncio que de que Japão

voltou à recessão, ainda no mês de novembro, foi outro golpe duro para os analistas que apregoavam a

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“recuperação da economia mundial”. A terceira economia mundial divulgou dados de queda de 1,6% no terceiro

trimestre, levando Shinzo Abe a convocar eleições antecipadas, com um questionamento maior de seu plano de

reformas, batizado com entusiasmo inicial de “Abenomics”.

A crise econômica do capitalismo tende a se arrastar, sem necessariamente depressão, mas sem

crescimento sustentado em escala mundial. Já são 07 anos completos. Não há indicações de melhoria, de nova onda

expansionista. O que temos visto é um quadro de estagnação generalizada com algumas partes da economia em

recessão como parece de novo estar ocorrendo com a Europa ocidental.

Mas os choques e ajustes não são todos iguais. Dependem não apenas da intensidade da crise econômica

mas também da força da classe dominante, ou melhor dizendo da relação de forças entre as classes em cada país. Se

em alguns países os choques não são levados adiante de modo imediato e violento, em outros encontram

mediações políticas e sociais. Há, contudo, uma tendência ao ajuste que é comum e também uma tendência de

generalização dos conflitos. Nos modelos de ajuste também se percebe o incremento da concentração econômica, e,

portanto, uma expropriação de setores burgueses mais débeis, sejam de outros países ou mesmo no interior de cada

país. Isso provoca divergências interburguesas, embora as classes dominantes se unam contra os trabalhadores e os

povos quando seus interesses comuns de classes são ameaçados.

A crise e a reação de massas provocam, portanto, também movimentação nas classes dominantes e nos

setores médios. Combinação entre a luta dos dois setores burgueses nos EUA como explica Dumenil em seu mais

recente livro sobre a crise do neoliberalismo. Sua separação entre capitalistas financeiros e gerenciais pode ainda

necessitar maior exame, mas é certo que nem todos os capitalistas adotam o mesmo plano econômico para

reproduzir o capital. Também temos visto no mundo a diversificação dos polos de poder burguês, com a entrada em

cena da China, dos Brics, além dos já poderosos, EUA, Alemanha, etc. Estes fatores ajudam a arrastar a crise no

tempo, a prolongar a mesma sem um desenlace, dificultando e até deteriorando as condições de dominação da

burguesia e especialmente do capital financeiro como carro chefe dos interesses do sistema capitalista mundial. As

condições de dominação se complicam mais ainda quando há pressões pela independência nacional em regiões

importantes, como na Catalunha e na Escócia, para citar as mais recentes.

III A situação do Imperialismo

É preciso um esforço para ver as mudanças históricas em curso. Temos um processo profundo, uma

novidade visível num mundo que até 1989 era marcado pelos pactos de Yalta e Poosdam, pela coexistência pacifica

entre os EUA e o stalinismo, pela chamada guerra fria, cuja marca maior era precisamente dois grandes poderes com

contradições entre si mas que de maneira última eram contenções da revolução social e política. Depois de 89, outro

cenário mundial se estabeleceu, desta vez dominado pelo peso da hegemonia unilateral dos EUA. Agora, cuja marca

podemos apontar em 2008, não só não há mais o stalinismo– derrotado em 1989 – mas também os EUA não

dominam mais como antes. Eles vêm perdendo sua hegemonia anterior de aparecer como caminho e esperança do

mundo, como direção política das nações. Tem sido cada vez mais limitado à sua superior capacidade tecnológica e

militar. Sendo que também no terreno militar o imperialismo perdeu força, está impossibilitado de realizar

intervenções em inúmeras situações que antes lhe fariam intervir promovendo golpes ou envio direto de tropas.

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Há heterogeneidade maior entre as forças burguesas nas formações capitalistas, produto de pressões das

lutas internas de cada país, de forças sociais heterogêneas mas resistentes – por temor de se enfrentar com seus

próprios povos - a aspectos mais pesados dos planos neoliberais - que exercem força interna e que não permitem ou

no mínimo dificultam uma política unificada a favor dos interesses do capital financeiro para solucionar a crise do

ponto de vista dos interesses destes capitais. Os governos do PT no Brasil navegavam em setores burgueses deste

tipo. As expressões mais à esquerda de governos independentes na América Latina, como Bolívia e Venezuela, são

expressões também de maior heterogeneidade das formações capitalistas. A expressão mais potente e mais

conservadora do ponto de vista da manutenção do sistema mundo mas ao mesmo tempo da impossibilidade dos

EUA arbitrar sozinho os conflitos e atuar na condução do mundo apenas segundo seus interesses, sem negociação, é

a ascensão da China. Todos têm acordo em defender o capitalismo, e portanto todos tem acordo, por óbvio, em

aumentar a taxa de mais valia e a exploração dos trabalhadores, mas a unidade política mundial da burguesia como

classe social está fraturada.

Uma vez mais Husson, agora em outro texto sobre o Imperialismo:

“A consequência das mudanças assinaladas (...), a saber é a industrialização dos países da periferia, uma

industrialização que já não se limita a cadeias de montagem (indústrias têxtil e eletrônica) senão que abarca

também produtos de alta tecnologia e inclusive a produção de bens de equipamentos. Os chamados “tigres” e em

particular Coréia do Sul, abriram o caminho, um caminho que China percorre com ímpeto ainda maior. A economia

mundial está formada hoje em dia por uma retícula complexa de capitais que determinam as “cadeias de valores

globais”. Este termo designa a repartição dos diferentes segmentos da atividade produtiva entre os vários países,

desde que o desenho da produção até a entrega ao consumidor final. Isso significa que passamos de uma

internacionalização a uma globalização do capital, que dá lugar a uma organização da produção baseada na

combinação de vários países. A imagem da econômica mundial deixou de ser, portanto, apenas a da configuração

assimétrica entre países imperialistas e países dependentes e mostra uma integração de segmentos das economias

nacionais sob a égide das empresas multinacionais que criam um autêntico tecido que envolve a economia mundial.”

Especifiquemos um pouco mais uma das novidades do atual período histórico. A continuidade da crise

econômica se combina com outro fator político que tem sido fundamental e favorável para as forças revolucionárias

no mundo e que explica também uma multipolaridade, com o peso maior de potências emergentes: a crise da

dominação do imperialismo ianque, expressa entre outras questões nas derrotas sofridas nas guerras do Iraque e do

Afeganistão. Também esta questão não se explica sem o início do ascenso nos EUA. Nos EUA Ocuppy Wall Street foi

apenas um sinal. Provavelmente ainda foi mais um sintoma do que a eclosão de uma mudança de qualidade. Neste

país as contradições estão se concentrando. Desde 2003 com as mobilizações anti-guerra a situação vem mudando.

A tragédia de 11 de setembro logrou por pouco tempo dar legitimidade para a opção militar

contrarrevolucionária no mundo. O clima de terror interno inicial e que volta e meia é reacendido pelas ações

terroristas não evitou o desenvolvimento do descontentamento e do protesto. Não se explica a situação mundial

atual sem estas mobilizações que foram as maiores da história em número de pessoas – fevereiro de 2003. E depois

se expressaram na eleição de Obama.

As dificuldades do imperialismo em geral e do norte americano em particular de colocar suas tropas em terra

se soma com a perspectiva de que tenhamos a continuidade e até o aumento de conflitos bélicos. Hoje temos uma

Page 8: Documento Internacional do MES -  dez 2014

série de ocupação imperialistas em curso e pesadas incursões militares como as mais expressivas no Iraque e

Afeganistão, mas também Mali e Paquistão. Estes são conflitos localizados em territórios estratégicos como no caso

entre Rússia e Ucrânia. E ao mesmo tempo EUA tentam tirar suas tropas ou reduzi-las.

Quanto ao problema do Imperialismo nos dias de hoje, sobre seus vários conflitos e guerras, vale a pena

citar Pierre Rousset:

“Minha hipótese é que não vamos a uma III Guerra mundial, como a I II Grande Guerra, porque não

assistimos a um conflito com o caráter de repartir territórios como tinha sentido no passado. Porém os fatores de

guerra são muito profundos e diversos: novos conflitos entre as potencias, competições no mercado global, o acesso

aos recursos, colapso das sociedades(...) Isso significa entramos em um mundo constantemente em guerras (no

plural). Que toda guerra deve ser analisada em sua especificidade. No entanto, precisamos de pontos de referência

para continuar a ter uma bússola em uma geopolítica complexa: independência de classe contra o imperialismo,

contra o militarismo, contra o fascismo e o surgimento de movimentos de identidade "antisolidários" (racista,

islamofóbico e antissemita, xenófobo, castistas, fundamentalistas e outros).”

E neste cenário os EUA estão mais fracos, não são mais fortes para atuar como xerife do mundo. Sequer a

frustração com o presidente Obama tem acalmado as tensões em prol das mobilizações. Os protestos contra o

racismo se intensificaram depois do Ocuppy, protestos que somente tiverem envergadura nos anos 60. Não se trata

de uma ascensão linear, sem reveses. Há muitas forças contrárias. Mas a tendência dominante nos EUA é de mais

lutas sociais. As mobilizações democráticas e a luta pelos direitos civis no interior deste país tiveram peso na política

mundial em muitos momentos, tendo ajudado até a eclosão da primavera árabe (a importância das denúncias de

Wikileaks contra Mubarak e Ben Ali).

Acompanhar a dinâmica dos EUA será chave, finalmente, porque dela dependerá em última análise não

apenas a capacidade do imperialismo de desenhar o mundo pela força das armas, mas possibilidades de se abrir um

forte caminho de esperança para os povos do mundo todo. As vitórias obtidas pelo movimento pelo salário mínimo

de 15$ por hora, primeiro em Seattle e logo em seguida em vários estados, através da votação de leis e a aprovação

em plebiscitos são sinais de animação do movimento de massas e da juventude. Conforme o movimento 15$Now”

Alasca, Arkansas, Nebraska e Dakota do Sul aprovaram propostas de aumento do salário mínimo, como o fizeram os

eleitores de San Francisco e Oakland, Califórnia. Em Illinois e em vários condados do Wisconsin - estados que

elegeram governadores republicanos - importantes maiorias aprovaram iniciativas não vinculativas para aumentar o

salário mínimo”. Não por acaso, foi em Seattle que ocorreu a primeira vitória em muitos anos de uma vereadora

diretamente socialista.

Este caminho dos EUA é fundamental de ser visualizado minimamente porque a falta de uma alternativa

diante das tragédias sociais, econômicas, ambientais tem cumprido um papel objetivo no incremento das

dificuldades das lutas operárias e populares. E processos de luta favoráveis nos EUA animam e indicam direção para

os trabalhadores no mundo todo. A rebelião da juventude de Ferguson, se espalhando como um rastilho de pólvora

por todo o país é um exemplo do contágio. A partir da absurda absolvição do policial que matou o jovem negro Mike

Brown, uma mobilização de dezenas de milhares de pessoas tomou às ruas das maiores cidades dos Estados Unidos.

Um dos maiores movimentos democráticos deste tipo na história recente dos EUA. E num momento onde o governo

Page 9: Documento Internacional do MES -  dez 2014

Obama enfrenta uma oposição conservadora à sua tímida reforma migratória que formalizaria milhões de latinos

como residentes no país.

Estas novas possibilidades de lutas são fundamentais ainda mais que a ausência de uma direção de massas

alternativa, a falta de um modelo pela positiva para superar a crise do capital tem dito consequências muitas vezes

trágicas. Mais destacadamente onde o próprio imperialismo tem atuado militarmente, a ausência de uma

consciência de massas mais avançada e de organizações correspondentes faz com que a crise capitalista em algumas

regiões combinada com os traumas sociais deixados pela intervenção imperialista e seus aliados, fortaleça novas

direções independentes do imperialismo mas com ideologias reacionárias e pré-capitalistas. A ocorrência de

fenômenos regressivos em partes do mundo, como o crescimento de forças políticas reacionárias ligadas à religião e

a modelos econômicos capitalistas autoritários, pré-capitalistas, regressões a formas de repressão terrivelmente

irracionais como EI se soma o aumento das forças da extrema direita em outros países e crescimento de máfias e do

crime organizado como forças da ordem capitalista.

Precisamos, ademais, da bússola comentada por Pierre Rousset para ter posição em inúmeros conflitos que

ocorrem no mundo e que envolvem interesses variados, contrarrevolucionários, cuja complexidade aumenta pela

ausência de direções alternativas fortes dos trabalhadores. O conflito na Ucrânia, por exemplo, opôs interesses

contrarrevolucionários variados. Uma rebelião de caráter popular desorganizou o antigo consenso e pôs travas no

plano de expansão eurasiano de Putin. O momento seguinte foi de atuação dos interesses imperialistas para

normalizar o país. O governo que foi produto desta rebelião inconsciente não conseguiu se firmar e responde aos

interesses norte-americanos. Assim, por um lado atuam os interesses russos: ganhar terreno no controle territorial

para refundação de planos panrussos, estimulando intentos separatistas como em Donestk e outras regiões

fronteiriças; por outro lado os Estados Unidos tem interesses em manter a Ucrânia sob sua órbita em acordos com a

EU. Os Estados Unidos querem aprovar o TIPP, Tratado que homologa várias relações econômicas diretas com a

União Europeia. Finalmente a Alemanha joga também numa direção paralela- quer seguir comercializando com

Moscou, estendendo a partir daí sua rota a Pequim. Quer manter sua hegemonia na Zona Euro, ainda que ampliando

certa multilateralidade em direção ao Pacífico. Num cenário assim a defesa da autodeterminação dos povos e da luta

dos trabalhadores é chave. E esta autodeterminação se reconhece não apenas nas urnas mas na força das ruas.

Somente assim se pode construir uma política estratégica de federar os povos e as repúblicas. Esta é nossa primeira

bússola, defendendo as mobilizações que coloquem na pauta bandeiras democráticas e a conquista de liberdades

públicas.

Tendo esta questão da defesa das bandeiras democráticas agarradas firmemente não há como se confundir

sobre o papel do EI/ISIS neste momento. Está no centro da conflagração dos principais conflitos no Iraque e na Síria,

por exemplo. As cenas bárbaras das decapitações chocam o mundo. Estas forças reacionárias são dissidências

fortemente armadas de grupos como a AlQueada e AlNusra. O enclave do EI, declarado como um moderno

“califado” agrupa territórios do Iraque e da Síria. A desagregação do Iraque é nítida. As antigas fronteiras do Oriente

Médio estão deixando de existir; e o controle que o EI detém sobre o território é muito perigoso, sua política contra

os curdos é de limpeza étnica. Além é claro de métodos violentos e autocráticos para impor suas decisões e uma

brutal agressão contra as mulheres e LGBTS. Por mais que se reivindiquem contra o imperialismo norte americano,

aqui está mais claro do que nunca que o a aplicação da linha “o inimigo do meu inimigo é meu amigo” é um desastre

Page 10: Documento Internacional do MES -  dez 2014

absoluto. Estes setores são obscuros, contrarrevolucionários. No continente africano também se fortalecem

correntes/milícias desta ordem. Na Nigéria, onde está se tornando tristemente celebre o grupo “Boko Haram”,

responsável pelo sequestro de 200 jovens, submetidas a torturas e humilhações. São forças reacionárias, obscuras,

que cumprem um papel tão nefasto quanto o imperialismo com suas intervenções. E representam retrocessos

pesados e difíceis de serem superados, se constituindo em barreiras enormes da revolução socialista mundial.

Além de catástrofes como as que têm ocorrido na Síria e agora no Iraque, há momentos em que o equilíbrio

na relação de forças entre as classes tem sido rompido contra o povo de modo estrutural. Em partes inteiras do

mundo e parcelas importantes de cada um dos países o nível de desigualdade aumenta e há sinais de destruição em

massa e de barbárie, sejam por crises naturais sem que a formação social tenha condições de planejamento e

reconstrução, como foi o caso do Haiti, sejam crises agudas de saúde pública, por exemplo, como agora no

continente africano.

O vírus Ebola é apenas um sintoma do abandono de regiões inteiras do planeta. Estes processos de

regressão social brutal são sintomas de uma decadência geral do sistema que ameaça arrastar toda a humanidade

para uma situação de caos, de miséria e até de liquidação física. Isso é assim porque a crise que vivemos não é

apenas econômica, mas ambiental, moral, uma crise civilizatória porque ameaça a existência mesma da

humanidade.

Estamos longe, portanto, de prever um caminho fácil para os dramas deste século. Os conflitos serão

intensos. As dificuldades sempre presentes da luta palestina parecem mostrar de modo dramático todas as

contradições da situação. A perspectiva segue sendo de guerras, intervenções regionais, catástrofes ecológicas e

sociais. E tudo isso se agrava pela falta de uma perspectiva socialista à vista. A identificação entre o stalinismo e o

comunismo segue pesando enormente na consciência do movimento de massas. A ausência de alternativas políticas

de massas e as dificuldades de surgimentos de uma nova institucionalidade paralela aos velhos aparatos estatais

durante os processos revolucionários recentes tem imposto enormes dificuldades em relação a uma saída positiva

da situação atual e nos impõe a previsão de que estamos diante de uma luta de longa duração.

Em resumo, vemos a continuidade da crise econômica e desestabilizações políticas, dificuldades de controle

por parte das direções tradicionais burocráticas do movimento de massas. A vantagem do capital é a falta de

alternativa socialista. A consciência limitada. O limite do horizonte, sobretudo pela ausência de mobilizações cuja

marca seja a organização de poderes próprios e institucionais do movimento e ausência de direções revolucionários

que retroalimentam a falta de consciência e de modelo. Neste sentido podemos dizer que continua a crise do

marxismo que pode ser chamada também de crise de direção revolucionária na terminologia do programa de

transição. A discordância entre modelo/alternativa e a irrupção de massas pontua uma crise social recorrente.

Do grau de intensidade da existência de todos os fatores assinalados acima e da combinação entre eles em

cada região ou país marca as especificidades regionais e nacionais.

IV. As mobilizações e a construção de alternativas

Page 11: Documento Internacional do MES -  dez 2014

A crise econômica de 2007/08 abriu uma nova etapa. Definimos como Giro Histórico pois colocou no

horizonte de médio prazo possibilidades estruturais de alteração. Nos remetemos ao documento de nossa corrente

de 2009, na qual nos apoiávamos em Marx.

“Com a crise econômica atual, podemos considerar que entramos num novo período histórico? O famoso

prefácio de Marx no qual sua concepção sobre a história é esquematizada segue útil para clarificar nossas ideias.

"Na produção social de sua existência, os homens entram em relações determinadas, necessárias, independentes de

sua vontade; estas relações de produção correspondem a um grau determinado de desenvolvimento de suas forças

materiais de produção.

O conjunto destas relações de produção constitui a estrutura econômica da sociedade, a base real sobre a

qual se eleva uma superestrutura jurídica e política e à qual correspondem formas determinadas de consciência

social. Em um certo estágio de desenvolvimento as forças produtivas e materiais da sociedade entram em

contradição com as relações de produção existentes, ou, o que não é mais que a expressão jurídica disso, com as

relações de propriedade no seio das quais se haviam movido até então. De forma de desenvolvimento das forças

produtivas que eram, estas relações transformam-se em seus entraves. Abre-se então uma época de revolução

social". Marx insistia que "suas relações materiais - as relações materiais dos homens - estão na base de todas as

suas outras relações". Logo, quando se alteram as forças produtivas, também são pressionadas para se modificar as

relações sociais. "Pela descoberta de um novo engenho de guerra, a arma de fogo, toda a organização interna do

Exército foi modificada", afirmava. Quando as mesmas entram em contradição com as relações de produção, entra-

se numa época de lutas e revoluções para que estas relações de produção ou de propriedade sejam superadas.

Cremos que é justo afirmar que estamos num período deste tipo.”

O Giro Histórico marcou o início de um longo processo, de instabilidade recorrente, mudanças nas relações

entre as classes e mesmo entre Estados. Até aqui temos assistido novas mobilizações, com a juventude à cabeça,

que retomam o método da ação independente de massas, que guardam limites por conta do atraso na consciência

política e organizativa- herança do período anterior.

Neste sentido é fundamental nos determos mais nas mobilizações que tem marcado o mundo. Somente

nelas se pode ir forjando uma alternativa e enfrentando as dificuldades. São precisamente nos momentos de

maiores mobilizações que se pode, por exemplo, enfrentar as máfias, máfias que vão se constituindo como uma

característica sistêmica – junto com a corrupção – do próprio modo de produção capitalista, como ficou claro agora

na luta contra o massacre dos 43 estudantes do México e em menor medida quando o Rio viveu a luta pela CPI das

milícias e seu suporte de massas obtido na primavera carioca (lutas que não liquidaram o crime organizado no Rio,

mas que mostraram o caminho para combatê-lo).

Podemos esquematizar o novo período em 3 fases.

1ª fase/onda - de 07/08 onde a crise se alastra do terreno econômico para o terreno social. Retração no

conjunto das economias centrais, com epicentro nos EUA. Debilitamento do imperialismo. Maior papel relativo dos

países dependentes no “Sistema-Mundo”. Ascensão da linha “Brics”. Solvência política e econômica da Grécia.

2ª fase/onda - Com a entrada em cena das massas árabes, com suas revoluções democráticas, tivemos um

exemplo capaz de irradiar politicamente tal indignação. A “primavera árabe” abriu uma nova situação mais

favorável, onde a condição de crise também se reverteria em mobilizações revolucionárias, num primeiro momento

Page 12: Documento Internacional do MES -  dez 2014

contra as ditaduras de décadas - Tunísia, Egito, Líbia, Iêmen, Síria - para logo se alastrar contra regimes

democráticos. Movimento dos indignados na Espanha e na Grécia, Ocuppy, entre outros movimentos.

3ª fase/onda - Combinação da entrada dos Brics no processo de mobilização mundial [na rota dos

indignados] com o retrocesso/estagnação do processo de revolução no mundo árabe. Crise na Líbia, genocídio na

Síria e recomposição no Egito com restauração dos militares no poder. Por outro lado, as jornadas de junho no Brasil

e na Turquia, as mobilizações que chegaram ao leste europeu. E começou um processo de recomposição política

através de alternativas por fora do social-liberalismo, notadamente Syriza e Podemos. Também como fruto da maior

polarização, na Europa cresceram as alternativas de extrema-direita, eurocéticas e antiimigrantes.

O aspecto qualitativo desta fase foi o deslocamento da onda de mobilizações, juvenil e popular, para os

BRICS e as possibilidades abertas na Espanha e na Grécia em termos políticos que podem abrir uma 4ª fase. A

entrada de um gigante como o Brasil, a ruptura de massas com o governo de Erdogan na Turquia, a recomposição do

movimento operário na África do Sul, o ingresso dos Brics na “rota dos indignados”. Mesmo na Rússia e na China

temos expressões distorcidas desse processo: a luta na Ucrânia contra a anexação à Rússia e as mobilizações de

Hong Kong.

Temos duas expressões mais gerais, dois polos extremos deste novo período e de suas contradições:

- Por um lado as lutas encabeçadas e simbolizadas por Assange/ Snowden. Esta luta contra o imperialismo é

contra a privatização dos meios de comunicação e pelo fim da diplomacia secreta. Por outro lado há a possibilidade

de um regime de maior controle, um crescimento das medidas antidemocráticas ditadas pelos sistemas da Google e

do Facebook em parceria com as redes de inteligência mundial.

- Num polo temos a luta pelo direito ao Estado Palestino e todas as suas implicações: o crescimento na

opinião pública mundial do reconhecimento do direito do Estado Palestino (o governo da Suécia reconheceu este

direito e na primeira quinzena de novembro, foi o parlamento espanhol que aprovou tal reconhecimento, por

exemplo). Por outro lado temos uma postura mais belicista e agressiva do Estado de Israel, como visto na sua

recente operação Margem Protetora. Neste caso estamos vendo o Estado de Israel estar mais forte do ponto de

vista militar e mais fraco no sentido diplomático.

Estes polos devem ser levados em conta ao se examinar a revolução árabe, perpassada ainda pelas forças

reacionárias ligadas ao islamismo. Trata-se de um processo de larga duração, com períodos de revolução, de

estagnação, contrarrevolução. Retrocesso no Egito. Caos na Líbia. Guerra sangrenta na Síria. Estagnação na Tunísia,

onde a esquerda conseguiu eleger 14 deputados, pela Frente Popular.

E ao mesmo tempo de novos processos, em países que não se estabilizam. Apesar dos retrocessos não se

pode perder de vista que são retrocessos depois de revoluções chaves. Houve uma mudança no humor político da

ampla vanguarda mundial em combate contra a crise desde 2008. Depois da queda de Ben Ali, ditador que governou

por décadas a Tunísia, o contágio se espalhou pelo Egito, derrubando também a Mubarak. Também foram

derrubados pela via de rebeliões populares os governos da Líbia, Kadafi e do Iêmen, Saleh. No Bahrein, tropas

Sauditas ocuparam o país, evitando que a crise pudesse se converter numa insurreição.

Este cenário possibilitou progressos à Causa Palestina. E isolou ainda mais o governo de Israel. O rápido

ascenso da Irmandade Muçulmana e grupos aliados dominou a conjuntura dos primeiros anos da revolução.

Entretanto, o ponto de inflexão na Síria, onde uma sangrenta guerra civil arrastou para a barbárie centenas de

Page 13: Documento Internacional do MES -  dez 2014

milhares de pessoas, e o movimento que culminou com a saída de Morsi do poder no Egito, abrindo as portas para o

restabelecimento de um governo militar- desencadeou uma feroz repressão contra as correntes vinculadas com a

Irmandade. A atual situação do mundo árabe é muito complexa. A falta de uma alternativa laica, democrática e anti-

imperialista também aqui cobra seu peso.

No continente Africano, as recentes mudanças no cenário político também contagiam. A revolução popular

de Burkina Fasso, ex-colônia francesa ilustrou bem a radicalidade do movimento de massas. O que vai acontecer na

África do Sul é decisivo. Neste país que viveu uma verdadeira revolução democrática e negra que liquidou o regime

do Apartheid, as massas começam a dar um salto de qualidade em sua consciência, a partir das greves da Copa de

2010- onde 70 mil operários cruzaram os braços. A greve mineira de Marikana e a reorganização do movimento

sindical deram continuidade a este passo. A morte da máxima expressão democrática do povo Africano, Nelson

Mandela também encerra um ciclo, abrindo novas hipóteses de trabalho, com o fortalecimento de direções políticas

e sindicais independentes.

Contudo, o período segue sendo de latência. Não se estabilizou um poder contrarrevolucionário capaz de

fazer retornar ao período anterior a 2011. O risco da expansão do califado deve ser mensurado na luta militar que

empreende o povo curdo, liderado pelo PKK e Ocallan. Da vitória contra o EI/ISIS depende a possibilidade da

retomada do rumo das mobilizações de massa que marcaram o período da “primavera árabe”.

São polos extremos de uma situação cheia de contradições, cujo pano de fundo segue sendo a crise

econômica mundial do capitalismo. Do ponto de vista da construção de alternativas pela positiva, sem dúvida, os

polos mais avançados se encontram no sul da Europa, particularmente na Grécia e na Espanha. Mas antes vejamos

brevemente a experiência política que permitiu durante os anos 90 se manter acesa a esperança de um novo

mundo: o bolivarianismo.

V. América Latina: progressos, limites e superação do bolivarianismo

Para aprofundarmos a discussão, vale retomar o que dizíamos em abril de 2013, quando abordávamos as

mudanças que haviam ocorrido na América Latina a partir das lutas dos finais dos anos 90, na virada do século:

“O ascenso produziu diferentes tipos de governo, visto que cada realidade nacional atende a um nível de

desenvolvimento da luta de classes e da construção subjetiva de alternativas pela esquerda. De forma esquemática,

como parte deste novo cenário produziram-se três tipos de governo, ainda que com alguma heterogeneidade entre

eles: nos países onde há maior desagregação do tecido social – e onde a esquerda tem menos peso urbano e

organizado –, produziu-se um giro à direita com governos mais conservadores. Uma direita populista com um

programa mais duro centrado no “combate à violência urbana”. Suas principais expressões são México e Colômbia –

com governos do tipo Uribe/ Santos.

O segundo tipo de governo é o que se produziu especialmente no Brasil, onde o peso do ascenso foi menor –

na verdade aqui toda a década de 90 e o início dos anos 2000 se mantiveram da mesma forma, a marca foi de

relativamente baixa atividade do movimento de massas – facilitando e permitindo que a direção do PT optasse por

uma via de conciliação de classes. O PT é a forma máxima deste tipo de governo, definido como social-liberal. Um

governo composto por lideranças políticas oriundas da esquerda, ex-guerrilheiros, sindicalistas, ativistas dos Direitos

Page 14: Documento Internacional do MES -  dez 2014

Humanos, com forte ênfase em medidas compensatórias e políticas sociais. Mas que tem como seu programa a

garantia da governabilidade, dos ajustes e da sustentação do próprio regime, pactuando com a direita e as classes

dominantes do país. Também poderíamos enquadrar neste tipo de governo, ressalvando como já dito as diferenças,

os governos de Bachelet no Chile [que provavelmente vai voltar ao poder neste ano], de Ortega, Funes e os governos

dos Kirchner na Argentina.”

Como expressão mais avançada do processo que percorreu o continente tivemos no governo de Chávez e na

Venezuela uma corrente que representou na superestrutura o repúdio do movimento de massas ao neoliberalismo

e, sobretudo, ao imperialismo. Como parte do ascenso continental podemos definir como governos bolivarianos,

além da Venezuela, o Equador e a Bolívia.”

Aqui queremos fazer uma definição geral: o bolivarianismo surgiu no calor das lutas dos povos da América

Latina. E a posição de nossa corrente de ser parte deste movimento foi um acerto histórico, nos permitindo ser parte

ativa e dinâmica das lutas dos povos e crescer como um polo marxista consciente que não aceitou ser mera

testemunha do processo. Este processo foi claramente progressista porque construiu novos regimes independentes

do imperialismo e permitiu avanços na consciência de milhões de trabalhadores e jovens da América Latina. Assim

apresentando e fortalecendo no mundo a possibilidade do socialismo como horizonte estratégico.

O fato de que depois de mais de mais de dez anos de experiências tenhamos sérios elementos de

esgotamento do bolivarianismo não altera este balanço. E a prática deve ser útil como critério. Se bem é verdade

que considerações pragmáticas não devem ser um critério definidor sempre. Quando a escala de tempo é medida

em mais de uma década é lógico que o resultado das políticas deve ser levado em conta. O que aconteceu com as

forças trotskistas que se colocaram na perspectiva de se postular como esquerda por fora do processo e que

apresentaram a estratégia de promover a derrubada revolucionária destes governos e regime? Não passaram de

comentaristas da situação, se reduzindo a núcleos tremendamente marginais – quando existentes – e na sua fraca

atuação - quando atuavam - apareceram mais fazendo o jogo da burguesia opositora do que construindo um polo de

trabalhadores independentes digno de nota.

Em contrapartida nossa corrente, também com herança trotskistas, pode se desenvolver na Venezuela.

Mantivemos, ademais, nossa independência do chavismo e não deixamos de tomar parte no processo, sendo

reconhecidos como tal. Assim, estamos em condições de lutar para contribuir por uma alternativa de esquerda

contra a direita e contra as tendências cada vez mais fortes de converter o chavismo num aparato burguês e

burocrático sem retorno. Sabemos que tal alternativa é difícil porque o chavismo teve um aspecto tão positivo que a

autoridade dos que assumiram o comando depois de sua morte, embora abandone muito das medidas que Chávez

defendia, continua tendo mais peso do que nossas forças.

A experiência da América Latina vai servir para a discussão da Europa. Há um processo de luta política e de

construção de alternativas contra a austeridade. Partidos progressistas, anticapitalistas surgiram em dois dos países

mais avançados da luta de classes, Espanha e Grécia, o Podemos e o Syriza, respectivamente. Ambas formações

políticas são as expressões partidárias do ascendo do movimento de massas e adotam uma plataforma que assume

partes fundamentais das demandas deste movimento. São projetos que se fortaleceram sobretudo negando os

projetos burgueses tradicionais e que mantem vínculos diretos e orgânicos com as mobilizações e protestos dos

últimos anos. Ambos podem chegar ao governo e se aplicarem suas plataformas podem representar governos de

Page 15: Documento Internacional do MES -  dez 2014

ruptura com os planos de austeridade do sistema capitalista levados adiante sob os ditames da Alemanha. Caso isso

ocorra pode representar uma nova configuração política para todo o sul da Europa. Incidirão em Portugal e Itália

imediatamente e sendo um polo para os trabalhadores de todos os países.

É claro que isso pode não se dar se estes partidos fracassarem como projetos alternativos aos governos de

ajuste. Mas nossa aposta deve ser lutar para que isso não ocorra e para que estes partidos governem. É importante

sermos parte deste processo se estes partidos assumem um compromisso de luta contra a austeridade,

principalmente quando de fato este compromisso não seja apenas de palavras.

Como dissemos, as possibilidades de governos anti-austeridade na Europa encontram paralelo na América

Latino no advento do bolivarianismo dos anos 2000. Nossa corrente reconheceu a importância do bolivarianismo

desde o início. E embora tenham sinais de esgotamento, ainda é um fato da política latino-americana e deve ser

apoiado contra o imperialismo. Este movimento se mantém até hoje, com por exemplo, o jornalista Assange na

embaixada do Equador, enquanto Snowden não foi aceito como exilado no Brasil.

Isso no marco de que há tendências de esgotamento do projeto. A situação da Venezuela que se combina

com o burocratismo e a corrupção, com sua carga de ineficiência e privilégios revoltantes, é o ponto mais avançado

deste esgotamento. A situação de Maduro é demasiada instável. Se ainda existem pressões de massa para manter as

conquistas sociais adquiridas nos anos Chávez, a direção burocrática do PSUV cada vez mais persegue e combate os

seus oposicionistas, sufocando o debate político sobre os rumos do país - já em situação econômica gravíssima. Isso

faz com que os setores críticos ao governo, mas defensores do processo, se organizem e se agrupem mais. A recente

conferência do Marea Socialista demonstrou esse espaço. Para além do ativismo militante oriundo do Marea,

participaram uma série de ex-ministros, intelectuais, militares de esquerda, jornalistas e comunicadores, apontando

para a vivacidade do processo.

A situação da Bolívia parece ser diferente e melhor. É preciso estudar até onde se mantem os vínculos com o

questionamento ao sistema capitalista mundo. É certo que foi produto de uma revolução democrática a favor da

identidade indígena e isso ainda se mantem e se defende no governo. Assim como a Venezuela se mantem

independente do imperialismo em seu propósito de manter o controle nacional do petróleo. A independência do

imperialismo parece ser uma marca que inclui países como Uruguai, com suas posições políticas democráticas que

estimulam lutas em outros países. Além é claro de Cuba, que embora esgotada totalmente como modelo alternativo

se mantem como um país independente dos EUA e como um contraponto político na América Latina em alguns

momentos, como foi no seu tempo o ALBA contra a Alca. Todos estes processos, portanto, são contrários aos planos

de ajuste do capital, planos que não são apenas econômicos, mas políticos e militares.

Em outros países que foram aliados incertos dos bolivarianos e tiverem uma política de aliança muito mais

sólida com suas respectivas burguesias - sendo muitos mera reciclagem de processos burgueses anteriores - como é

o caso da Argentina, mais do que crescimento de forças de direita o que temos visto é bronca pela esquerda no

plano social com repercussão política já em curso.

A Argentina é justamente uma das expressões de países da região em que os governos são diretamente

burgueses mas não aplicam os planos que o imperialismo demanda porque suas políticas são aplicadas enfrentando

um poderoso movimento de massas. São governos que atuam sob o calor do ascenso. Na Argentina ao longo dos

últimos dez anos os K não puderam aplicar os mesmos planos de Menem. Depois de 2001 não há força que consiga.

Page 16: Documento Internacional do MES -  dez 2014

No Brasil depois de junho de 2013 nenhum governo poderia promover um ajuste puro e simples, duro e neoliberal.

Nem se o PSDB vencesse as eleições. A correlação de forças estrutural mudou em muitos países, em especial na

América Latina, contra os interesses do capital financeiro. E esta mudança em alguns casos se expressou nos

governos. Saber trabalhar em países com estas características tem sido uma prova.

No caso do Brasil, como dissemos, não existiu o bolivarianismo. Qualquer linha de disputa do governo teria

significado uma capitulação. Por isso foi um acerto ter fundado o PSOL. Dez anos depois o crescimento do PSOL e o

esgotamento do PT mostram que a linha foi correta. Passamos a prova da prática. É lógico que ainda não terminou,

embora seja certo que o PSOL terá um enorme crescimento eleitoral nas eleições municipais de 2016. Certamente

vencerá ou disputará de igual para igual com o PT em inúmeras capitais, na esteira da forte campanha eleitoral de

2014 onde o partido ganhou muito capital político. O desafio do partido será também ter sucesso nas lutas dos

trabalhadores para ir se provando como alternativa real.

De modo geral nossa orientação na América Latina foi participar dos processos bolivarianos, mantendo a

independência e uma linha de oposição de esquerda, nos postulando como alternativa abertamente opositora no

caso dos governos burgueses de frente popular ou social-liberais como foi – e segue sendo – os governos petistas,

por exemplo. E mesmo nos chamados países bolivarianos sua falta de consequência na defesa de um projeto

alternativo, anticapitalista e antiburocrático como regra leva a que estes mesmos governos apliquem planos de

ajuste econômico contra os povos e que promovam internamente burocracias estatais ao seu redor e ou se

consolidam na defesa de interesses de setores burgueses nacionais.

Por isso qualquer linha de defesa eventual destes governos quando são atacados por interesses do capital

financeiro não pode se confundir com alinhamento nem com defesa de sua estratégia de desenvolvimento de

capitalismo nacional. Nas definições estratégicas destes governos seguem pesando ainda mais o papel do governo

brasileiro de ser o principal diplomata da região para manter a estabilidade capitalista sem romper os laços com o

imperialismo e estimulando os setores mais conciliadores envolvidos nos processos de luta nacionalista.

Um retomada do Ascenso se iniciou nos países do Conesul entre 2011-13, com Chile, Brasil e Argentina.

Como prenúncio de “Fim de ciclo”, acompanhamos a ruptura de setores de massa com os governos ditos

“progressistas”. Do ponto de vista social, com as greves gerais na Argentina e as Jornadas de Junho no Brasil e do

ponto de vista eleitoral sinais de cansaço.

A entrada do Brasil no contexto de luta com as Jornadas de Junho foi uma mudança qualitativa para a

situação política na América Latina. O peso do Brasil é enorme. Além de seu lugar no mercado mundial, não

podemos esquecer que o Brasil cumpre um papel de subimperialismo com suas principais empresas- agora acusadas

de corrupção com muitos de seus executivos presos- atuando em vários países. A mudança no panorama da

América Latina responde diretamente às mudanças em curso em nosso país.

A direita tradicional, cientes dessa situação de crise, viu na eleição brasileira uma forma de recompor sua

localização no continente, numa linha “restauracionista”. Movimentaram-se nessa direção. A derrota de Aécio, a

vitória acachapante de Evo e o caminho tranquilo para a Frente Ampla no II turno uruguaio indica que mesmo

vivendo um esgotamento do ciclo anterior, temos importantes mediações nos ritmos e que a burguesia mais

conservadora tem dificuldades em retornar ao poder com um programa neoliberal “duro”. Um pequeno país como o

Page 17: Documento Internacional do MES -  dez 2014

Uruguai mostra como persiste as contradições dos países que experimentaram governos independentes e como

seria um grave erro não reconhecer no bolivarianismo elementos progressistas que devemos apoiar.

Tudo indica que no domingo 30 de novembro, a Frente Ampla conquistará o terceiro mandato

consecutivo com cerca de 60 % dos votos, somando 15 anos de governo independente do imperialismo no Uruguai.

No contexto latino americano, o avançado processo histórico da democracia uruguaia permitiu avanços

implementados pelo governo Mujica (legalização do aborto, da maconha, vitória contra a maioridade penal) que são

exemplos para lutas na América Latina. Por outro lado, na área econômica, o governo vem criando um novo ciclo de

desenvolvimento econômico capitalista através da reformulação da matriz produtiva tradicional, fundamentada no

tripé pecuária-agricultura-turismo, abrindo o território para mega empreendimentos estrangeiros no setor de

celulose. E mais recentemente, na tentativa de implementar um polêmico projeto de mega minería a céu aberto

para a exploração de aço, o que tem levantado um duro embate sobre a vocação produtiva do pequeno país latino

americano.

Existe assim uma luta aberta para esse novo período na América Latina. Uma luta política que passa pela

Venezuela, por entendermos a fundo os aspectos progressistas do bolivarianismo e suas limitações.

Desta vez, ao contrário do ascenso dos anos 2000, onde o centro foram as lutas do campo, um ascenso

popular e camponês, com o surgimento de novas direções, como o MAS na Bolívia, Chavismo na Venezuela, o MST

no Brasil, hoje temos novas características na vaga de lutas que percorre o continente.

O ascenso é eminente urbano. As mobilizações estudantis no Chile, as mobilizações operárias na Argentina e

a base juvenil e popular que se move no Brasil são indicadores do caráter majoritariamente urbano. O processo

ocorre no coração das grandes cidades latino-americanas.

No atual ciclo o palco central das lutas ocorre nas principais economias do continente. Ou seja, o epicentro

está nos países centrais, com sociedades complexas e um nível de desenvolvimento mais avançando.

Existe uma vanguarda juvenil e radicalizada atuando nas ruas, no movimento estudantil e nas fileiras da

classe. A juventude está na primeira fileira, uma nova geração que tem 30 anos ou menos e que não viu as

experiências anteriores, entrou na vida política após a queda do muro de Berlim e conheceu as direções do Fórum

de São Paulo já no governo ou em vias de governar. Essa vanguarda tem como ponto débil a falta de referências e

organizações centralizadas para dar cabo às tarefas. Apesar de um processo lento, ainda não surgiram organismos

auto organizados para representar, democraticamente, as demandas do movimento de massas.

Ao contrário do ciclo de rebeliões dos anos 2000, que encontrou uma classe trabalhadora diretamente

golpeada pelo neoliberalismo, o nível de conquistas e organização é superior, nos setores organizados de

trabalhadores e do povo. Isso reflete também nas condições objetivas.

E existe, de outra, parte setores da esquerda revolucionária, com sólida implantação de vanguarda, com

acesso ao parlamento e capacidade de influência em setores minoritários de massa, em boa parte desses países. A

presença destes setores foi e será muito importante nos processos mais avançados: Jornadas de Junho no Brasil,

greves na Argentina, luta contra mineração no sul peruano e ativismo estudantil no Chile.

O México, o segundo gigante continental, abre outra chave de possibilidades. O brutal desaparecimento de

43 estudantes na cidade de Iguala despertou energias sociais que podem abrir um cenário de rebelião juvenil no

México. Essa é a luta mais importante da juventude no mundo.

Page 18: Documento Internacional do MES -  dez 2014

O caso conhecido como “massacre de Atyotznapa” é a maior crise institucional do México recente. Ela se

combinou com a greve nacional de estudantes dos IPN (Institutos Politécnicos Nacionais) e desnudou o narco-regime

do governo de Peña Nieto em acordo com os três partidos do regime (PRI, PAN, PRD). Tal acordo foi selado com o

nome de “Pacto pelo México” e tinha em seu programa a impunidade às grandes quadrilhas e cartéis e a imposição

de um ajuste que passava por contrarreformas e a privatização da PEMEX. O movimento juvenil do México carecia

de uma ação centralizada. Com a ocupação política e territorial dos cartéis e do crime organizado sobre a política, o

movimento operário e popular sofreu um refluxo. Longe dos anos em que os zapatistas promoveram o famoso

levante de Chiapas, evento que impactou toda a vanguarda nos anos 90, o cenário no século XXI foi de retrocesso e

violência. As eleições são notadamente fraudadas e os partidos colaboram entre si para manter a impunidade. As

milícias e os cartéis dominam a cena, atuando contra lideranças civis e de movimentos sociais. Um verdadeiro

genocídio contra o ativismo.

Tivemos lutas episódicas como a comuna de Oaxaca, lutas de professores, marchas como a “outra

campanha”. Porém depois da derrota da greve da UNAM de 1999 houve um processo de regressão geral. Algumas

iniciativas da juventude, pontualmente, trouxeram novas vanguardas, sendo importantes ainda que sem capacidade

de inverter a correlação de forças: o movimento contra a fraude eleitoral conhecido como #yosoyel132 e a luta

contra o aumento do metrô no ano de 2013. Foram embriões que aglutinaram a vanguarda, influenciados pela onda

internacional de indignados. O novo momento porém não guarda comparações. Se trata do maior movimento social

do México em vinte anos. Alguns analistas comparam com a movimentação estudantil de 1968, reagindo ao

massacre de Tlatelolco e gerando uma rebelião estudantil.

No Peru, onde nossa corrente conserva um dos seus mais importantes trabalhos, a luta contra da região de

Cajamarca segue marcando uma conjuntura de desgaste do governo de Ollanta Humalla. A vitória dos setores

envolvidos na coalizão eleitoral ao redor de Gregório Santos reflete de forma direta a luta contra o projeto “Conga”,

de mineração intensiva do sul peruano. O êxito eleitoral abre o caminho para impulsionar uma unidade mais ampla

para as eleições nacionais. Nossas forças aí têm se multiplicado na juventude, onde disputamos inclusive a direção

do movimento universitário nacional.

A dinâmica continental, com a retração geral da economia baseada na exportação e no “boom” das

commodittes da década passada, deve ser de ampliação dos conflitos e de crises dos governos. O fim dos anos

“prósperos” como consequência do desacelera mento da economia chinesa e dos limites do modelo extrativista-

minerador devem levar a luta de classes na América Latina a temperaturas crescentes. O ocaso da corrupção na

gestão desses negócios, onde a maior parte das empreiteiras que se movimentaram no continente com o plano

IIRSA estão questionadas pelo escândalo de corrupção da operação “Lava-jato” no Brasil, vai impactar diretamente

na percepção das massas sobre os regimes.

Um processo que apenas começa e que será a grande prova para nossa corrente internacional.

VI. Novas possibilidades na Europa?

A Europa se encontra numa encruzilhada. A crise econômica e social se agudiza e se translada para os

regimes políticos. A crise se expressa nas castas corruptas. Aqui temos que discutir a situação concreta atual da

Page 19: Documento Internacional do MES -  dez 2014

Grécia e da Espanha. Discutir quais as chances de uma vitória da esquerda e discutir as perspectivas. Afirmar os

riscos de que se adaptam mas também as chances de que enfrentem o capital ainda que parcialmente. E portanto

afirmar a necessidade de uma organização independente mas abrir a hipótese de ser parte do processo. Sobretudo

se ele vier acompanhado de enfrentamentos reais, que mesmo sendo resultado de eleições, não seja de eleições

normais, mas resultado de confrontos, ao estilo do que foi Bolívia, Venezuela, não do Brasil de Lula. Ou seja, é

preciso ver o que pode ocorrer se esta hipótese de governos de esquerda anti austeridade se elejam.

A organização Internacional do Trabalho (OIT) num informe recente afirmou que a política de consolidação

fiscal contribuiu para elevar a pobreza e exclusão social que já afeta a 123 milhões de pessoas na União Europeia, ou

seja, 24% da população da Europa. A Alemanha leva dois trimestres com a atividade econômica em retração. A

França, nestes dois trimestres teve um crescimento próximo de zero. Sem falar da Itália onde o PIB está negativo há

dois anos.

A crise evidencia altos níveis de regressão social. Os direitos sociais e civis logrados ao longo do século XX,

institucionalizados no Estado de Bem-Estar Social, estão sendo retirados.

A situação gera uma maior contradição com o imperialismo alemão- vanguarda nos planos de austeridade,

na defesa dos mecanismos de comprometimento com as dívidas públicas e os bancos.

Numa visão geral acerca do continente podemos afirmar que estamos numa correlação de forças ainda

desfavorável, pelo baixo nível de atividade do movimento operário organizado nos países centrais como França,

Alemanha e Inglaterra. O que prima é uma polarização crescente, onde existem dificuldades para a afirmação de um

polo nitidamente de esquerda e o crescimento de correntes de extrema-direita, xenófobas, antiimigrantes,

eurocéticas.

Existem aspectos políticos que indicam o espaço à esquerda e explicam as possibilidades abertas e/ou em

construção: o stalinismo como aparato contrarrevolucionário perdeu força; o avanço da consciência acerca das

tarefas democráticas, a luta pela participação cidadã, etc. Um terceiro aspecto: a crise da social democracia. A

desvantagem consiste justamente na repetição de erros, sobretudo da socialdemocracia, a possibilidade destes

processos se adaptarem a uma lógica de administração da crise.

Esta realidade propiciou a abertura de crises sociais e políticas. A crise econômica e social exacerbou os

traços mais nefastos dos regimes. E tal crise arrastou a Europa para um impasse.

E nesse impasse temos evidenciado o maior atraso: os regimes dos partidos capitalistas, sejam

conservadores ou socialdemocratas se fragilizam. Entretanto sem a capacidade de superação por uma ação

independente da classe trabalhadora.

Aí reside o principal elemento do “impasse”. Podemos ver esse elemento expresso de variadas e múltiplas

formas: no crescimento de correntes eurocéticas e de extrema-direita; na dificuldade de resolução da crise

ucraniana; no despontar de partidos diretamente fascistas e a ampliação da xenofobia [Aurora Dourada na Grécia].

E porque esse desacerto entre o apodrecimento dos regimes e suas castas e o surgimento de alternativas

democráticas e anticapitalistas? É aí que pesa a contradição da consciência de classe e da retração do movimento

socialista, elemento que pesa na análise de dirigentes como Fraçois Sabado- no seu texto “Notas sobre a situação

mundial”. Do nosso ponto de vista, são elementos contraditórios:

Page 20: Documento Internacional do MES -  dez 2014

- O revés que significou na consciência a derrota dos dois principais projetos da classe trabalhadora

europeia- mais do que em qualquer lugar do mundo- a socialdemocracia e os PC’s.

- As derrotas objetivas do movimento operário nos últimos vinte anos: parcialização/fragmentação do

trabalho, reestruturação produtiva, perda de direitos, ideologia pouco coletiva dentro das empresas e retração

salarial em países como Alemanha, Itália e França.

- A restauração no leste europeu. Onde existe uma ampla noção de que o socialismo está identificado com o

stalinismo e este identificado com um desastre do ponto de vista da gestão da vida social.

- A direção majoritária dos sindicatos ainda está nas mãos dos aparatos dos PC’s e da Socialdemocracia. O

caso da UGT/CCOO na Espanha; da CGTP em Portugal, CGIL na Itália, TUC no Reino Unido; a maior parte do

movimento operário grego ainda é hegemonizada pelo PC. Isso é um entrave para o desenvolvimento da energia

represada em meio aos trabalhadores.

Há uma retomada das lutas em vários países, contudo, onde a resistência heroica da Grécia- foram dezenas

de greves gerais nos últimos cinco anos, que sinaliza também sinais de cansaço, e o ascenso entusiasmado na

Espanha, ainda estão na dianteira.

No sul da Europa, há uma condição diferenciada. Foram os países mais atingidos pela crise. A denominação

que esses países obtiveram, pejorativamente, no mundo das finanças, PIGS [“Porcos”, usando o acróstico das iniciais

de Portugal, Irlanda/Itália, Grécia e Espanha] sinaliza a agudeza dos problemas econômicos desses países. Com um

alto nível de endividamento tiveram que recorrer a empréstimos sob controle direto da Troika, tendo como

contrapartida um severo programa de ajustes, que incluía a retirada de direitos elementares como o 14 e 15 salários,

a mudança nas leis de aposentadoria e previdência social e a privatização de setores essenciais. Tudo isso registrado

nos chamados “memorandos”.

Existe um movimento real contra a austeridade. Esse movimento teve picos sociais- com a greve de 14 de

novembro de 2012- ibérica e mediterrânea- e um novo auge político na assembleia fundacional de Podemos, onde

Tsipras, ao lado de Iglesias convocou a unidade do sul da Europa para enfrentar a Troika e abrir um novo ciclo por

fora do ajuste.

O processo iniciado com 15-M tem seus antecedentes na rebelião que a juventude grega protagonizou entre

08-09. E guarda similitudes com os portugueses das mobilizações convocadas pelo grupo denominado “geração à

rasca”. A base social destes movimentos é uma juventude escolarizada, com poucas perspectivas de emprego,

quando muito precarizado ou informal. Chamados de NINI [nem, nem, em espanhol] porque diplomados não tem

condições de arrumar trabalho. Tal base social também foi o detonador da revolução árabe- lembremos do jovem

Mohamed Bouzazi que ateou fogo no seu próprio corpo, era um diplomado e sequer poderia vender alimentos na

feira de sua cidade. A migração de jovens africanos para a Europa do Sul e de jovens dos países mais atingidos pela

crise para países ainda prósperos também deixa o rastro desta nova condição política.

O arrojo político de Iglesias e seu “agrupamento”, os professores reunidos no programa televisivo La Tuerka,

teve o mérito de conseguir representar este “mal-estar” expresso por essa franja precarizada.

Este novo movimento contra a austeridade tem como polo avançado as lutas da Espanha e Grécia e como

referentes políticos, o Podemos e o Syriza. Certamente, tal unidade vai impactar sobre outros países como o caso de

Page 21: Documento Internacional do MES -  dez 2014

Portugal ou mesmo a Itália, onde após anos de desterro da esquerda social e política, a lista Tsipras emplacou uma

boa votação, rompendo a cláusula de barreira e ingressando no Parlamento Europeu.

Na Espanha, o movimento dos indignados fissurou o regime nascido do pacto de Moncloa, em 1978. Naquela

ocasião, quando das lutas contra o franquismo, o PSOE, a Coroa, o PP, o PC e os sindicatos acertaram uma saída

pactuada para a crise. Ao contrário do vizinho Portugal, não seria pela via revolucionária a transição, garantindo a

manutenção das instituições depois da queda do franquismo. O 15- M abriu uma janela de questionamento ao

regime de 1978 e seus principais alicerces: a Coroa, a Unidade nacional sob controle férreo de Madrid e o

bipartidarismo inaugurado pelo governo de Felipe Gonzalez. A jornada de mobilizações questionou diretamente

esses pilares. A renúncia do Rei Juan Carlos, depois de sucessivos escândalos de corrupção e de luxuria, foi uma

tentativa de salvar a Coroa, agora sob a pele do jovem príncipe Felipe. Contudo, o sentimento republicano imbricado

na consigna de democracia real já ganha amplas capas da sociedade espanhola. Com o despertar do movimento de

massas também ganhou força a luta independentista- que tinha sido derrotada ainda no período que foi

hegemonizada por setores guerrilheristas como o ETA.

A luta dos catalães, colocando mais de um milhão de pessoas nas ruas em três ocasiões, durante o dia

nacional[Diada] gerou um ponto de ruptura com o governo de Madrid. Na consulta convocada no dia 9N cerca de 2

milhões e 300 mil catalães votaram majoritariamente pela independência. No País Basco se reacendeu a esperança

com a força da luta na Catalunha. Nas eleições, as correntes da esquerda soberanista venceram em vários distritos e

municípios. Em menor medida, também na Galicia as posições soberanistas se reforçam. O terceiro pilar, o

bipartidarismo do PP-PSOE foi arrasado. Depois de perder as eleições pós 15M, o que levou a muitos impressionistas

a atacarem o movimento dos indignados por reforçar, em imediato a direita, o PSOE não conseguiu recompor sua

base, nem social nem eleitoralmente. O governo conservador de Rajoy, levando adiante medidas de austeridade

está marcado pela debilidade, ora por conta dos escândalos intermináveis de corrupção, ora pela resistência do

movimento de massas. Seu partido aparece em terceiro lugar apenas nas intenções de voto.

O movimento de massa se animou com a entrada em cena dos indignados. E conseguiu seguir acumulando,

numa estratégia objetiva que envolveu o “sentido comum” do qual fala Iglesias e Podemos. Isso retroalimentou o

ânimo de vários setores. Tivemos além da greve geral do 14-11-12, lutas importantes com as “marés”, confluência

de setores como a educação, a saúde, a luta dos bairro Gamonal em Burgos que se constituiu num símbolo contra a

especulação imobiliária, o surgimento do movimento de sem-teto[Plataforma dos Atingidos pelas Hipotecas, PAH],

greves importantes como a de Panrico e Coca-Cola, as marchas dos mineiros de Astúrias, greves estudantis, a

reversão do plano de privatização dos hospitais madrilenhos, a vitória contra lei do aborto por parte do movimento

de mulheres e por fim, a “Marcha da Dignidade” que levou centenas de milhares às ruas como elemento catalisador

de todas as lutas.

Este é o cenário no qual se forja o Podemos. Uma organização que reflete esses setores, que tem um apelo

fortemente democrático- a despeito das outras experiências da esquerda no século XX- onde após os anos 30, os

PC’s e seus satélites eram altamente centralizados- tendo uma participação de mais de 112 mil cidadãos na

elaboração dos documentos preparatórios para a sua Assembleia Nacional. O programa do Podemos está em plena

construção. Não poucas pressões, porém, as entrevistas de Iglesias e o movimento em torno de suas propostas

levam a uma ruptura com o capital financeiro e com o imperialismo europeu e americano, materializada na

Page 22: Documento Internacional do MES -  dez 2014

discussão sobre a saída da OTAN. Seria esse um programa, que se levado a cabo com pressão social levaria a uma

Espanha anticapital financeiro, antiOtan e com um caráter de país democrático e independente.

A Grécia é o elo mais débil do sistema de dominação europeu. Se não conserva o mesmo grau de

entusiasmo recente da Espanha, o país viveu uma experiência ainda mais intensa com os desmandos da Troika e a

unidade dos partidos dominantes para salvar o regime. Depois das primeiras crises políticas, envolvendo a queda do

governo conservador, o PASOK- Partido socialdemocrata- assumiu as rédeas da situação política, iniciando seu

declínio final. Como principal responsável por implementar os planos de ajuste, o governo do PASOK foi questionado

em todos os terrenos, com greves gerais quase que bimestrais durante um período de cerca de 3 anos. A mais

importante derivou numa greve de 48 horas com enfrentamentos agudos nos principais centros urbanos da Grécia e

com um saldo de 3 mortos. Como uma tentativa de salvar o regime, imposto pela Troika, logo em seguida de um

governo de caráter técnico, se montou um gabinete de unidade nacional entre a direita, Nova Democracia, o PASOK

e Dimar [sócio menor da coalizão que rompeu alguns meses mais tarde] como forma de manter o capitalismo grego

funcionando. Syriza [partido da esquerda radical, em grego] saltou então de3-4 % para quase 30% sendo o partido

mais votado nas eleições europeias e regionais, ganhando prefeituras e regiões, a mais importante delas, a Região

de Ática, mais populosa e importante do país, onde fica a capital Atenas. O fôlego da luta social diminui após as

sucessivas greves gerais e a necessidade do governo e da burguesia de seguir adiante o ajuste sobre as costas do

povo grego. Isso levou ao terreno da política eleitoral a disputa central, gerando expectativas nos resultados numa

mudança pela via das urnas.

As “explosões” se tornaram menos intensas e houve certa normalização no terreno da ação direta. A última

grande manifestação de caráter nacional, que quase levou a queda do governo, foi o fechamento da ERT [a TV

estatal], seguida da ocupação de seus estúdios e transmissores por parte dos trabalhadores e greve geral em

solidariedade. No plano das ruas, também o fenômeno no fascismo é real, quase dramático. As correntes que

conformaram o partido Aurora Dourada- claramente fascista, com símbolos, métodos e programa de inspiração

nazista- ganharam peso entre as classes médias desesperadas, os desempregados e com especial penetração nas

forças armadas e policiais. O assassinado do rapper Fyssas, ativista de esquerda, gerou comoção nacional e fez com

que o governo pedisse a prisão de vários líderes do AD. A crise dos partidos majoritários tem reforçado o peso

eleitoral e social de AD, que alcançou 9, 4% dos votos nas últimas eleições. Os partidos do governo saíram

derrotados das urnas- Nova Democracia perdeu 7 pontos, conquistando apenas 22, 7% e o PASOK teve 8%. Dimar

[Esquerda Democrática], que rompeu com o governo foi duramente penalizado, alcançando magros 1,2%. O partido

“Gregos Independentes”, ruptura de direita das últimas coalizões teve 3,46%. A nova formação, marcada por figuras

televisivas, difusora da perspectiva de “sociedade em rede”, o “Rio”, teve 6.5%. O KKE, Partido Comunista, com sua

política sectária e antiunidade- afirma que Syriza e AD são a mesma coisa, por vezes- baseada no estalinismo de

terceiro período- teve 6,1%. Os demais partidos, incluindo Antarsya[coalizão anticapitalista, de forças que atuam por

fora de Syriza] não obtiveram representação parlamentar. A crise grega vai seguir, com a perspectiva da queda do

governo. É quase impossível que Samaras consiga reaver o voto de confiança marcado para o começo de 2015. E

lentamente o movimento social começa a recobrar o protagonismo. As marchas pelo aniversário da ocupação de

estudantes durante a ditadura dos Coronéis em 1973 foram massivas. Há uma importante movimentação de

prefeitos para evitar cortes e demissões Dezenove prefeitos e o governador da região da Ática recusaram-se a

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implementar a lei 4250/2014. Esta lei foi criada com um único propósito: saquear mais milhares de trabalhadores do

conselho local e do serviço público. Isto para permitir que o governo atinja as metas orçamentárias estabelecidas

pela Troika – a Comissão Europeia, o Banco Central Europeu e o Fundo Monetário Internacional.

O fato é que a questão de um governo de Syriza está colocada na ordem do dia. Seus desdobramentos, a

mudança na correlação de forças, as pressões sobre o programa, a reação da burguesia são fatores que vão

determinar a situação da Europa. Para os socialistas, um governo do Syriza seria sem dúvida um grande passo à

frente- não isento de contradições. Abriria uma nova etapa na luta política nos países centrais, teria enormes

impactos sobre Espanha, Portugal e toda a Europa do Sul. A estratégia de unidade entre países para enfrentar a

austeridade e o problema das dívidas é um dos eixos do próximo período. O próprio Tsipras afirma a necessidade de

uma conferência de emergência para discutir o problema das dívidas, usando como exemplo a conferência de 1953,

onde a dívida alemã- principal nação credora nos dias de hoje- foi relativizada depois da II Grande Guerra.

A burguesia grega e imperialista, através de seus grandes meios de comunicação, faz uma guerra suja contra

a esquerda radical, afirmando que a única via possível é seguir a austeridade. “Ou nós ou o caos” brada a elite

europeia, temendo perder seus privilégios.

Não podemos isolar a situação de Grécia e Espanha, ainda que são os pontos mais altos do continente. O

complexo cenário europeu é marcado por desigualdades.

Os enfrentamentos entre a Ucrânia e setores separatistas animados pela Rússia tem importância política e

econômica no cenário. Um acirramento do conflito nesta região abre uma frente de ampla instabilidade. É uma

região de suma importância por conta de sua localização e interesses envolvidos.

A outra “frente” é ver como se desenvolvem as lutas contra o ajuste no conjunto dos outros países. A

entrada em cena do proletariado italiano, com greves nas indústrias do centro e do norte do país contra a reforma

trabalhista de Renzi mostra que existe espaço. A manifestação de 120 mil na Bélgica e o as lutas que percorrem a

Irlanda- 150 mil nas ruas de Dublin em 1 de novembro contra a taxa de água- vão dando canal para o

descontentamento social. Estão convocadas greves gerais para Itália no dia 12/12 e para a Bélgica no dia 15/12.

Devemos examinar os impactos sobre os países que estão mais atrasados, do ponto de vista, da

reorganização das forças sociais da classe trabalhadora e da esquerda. Nestes países, diante da fragilidade de uma

resposta do movimento operário e/ou da esquerda radical, crescem alternativas de direita e extrema-direita. Essa foi

a tendência apontada nas eleições europeias em países do leste europeu, nórdicos, na França e no Reino Unido.

UKIP e Frente Nacional de Le Pen se consideraram os grandes vencedores. E a Alemanha segue com o governo de

Merkel, de unidade nacional entre o CDU e SDP, como ponto de lança do ajuste e hegemônico na condução da UE. A

França tem um governo débil, crise no partido da direita- UMP- que pode abrir espaço à extrema-direita. A tarefa da

esquerda é reverter o cenário de paralisia do movimento de massas. As greves que tivemos- funcionários da cultura,

ferroviários, pilotos de avião e a mobilização contra a construção de represas no interior do país. O fenômeno de

crise de representação derivou em Grillo na Itália.

A socialdemocracia como já dito, amarga sua pior crise. Depois do desmantelamento do Pasok, perdeu

terreno em vários países, conservando ainda posições em Portugal, contudo tendo seus principais partidos

enredados em crises estruturais. Na Itália, Renzi, que alijou toda a velha guarda do antigo PCI/DS da direção do PD,

vem perdendo espaço rapidamente com suas reformas impopulares; na Espanha, o PSOE viu sua votação cair pela

Page 24: Documento Internacional do MES -  dez 2014

metade; o PS francês enfrenta a mais grave crise de sua história, durante o governo Holland/Valls, com cerca de um

terço de seus deputados ameaçando conformar um novo partido. Como são processos recentes, não sabemos qual o

alcance da crise desses partidos. Porém, sua profundidade leva a perder peso eleitoral e social entre sua tradicional

base na classe trabalhadora. Isso abre um espaço à esquerda, que antes os partidos da esquerda radical não tinham

condições de ocupar.

Como subproduto da crise, cresce o soberanismo e nacionalismo de esquerda. As demonstrações mais

recentes ficaram por conta de Escócia e Catalunha. Em ambos os casos, são lutas nacionais contra o centralismo

retrogrado de regimes monárquicos. E refletem, majoritariamente, um setor do movimento de massas que busca

protestar contra a austeridade, sendo portanto, um processo progressivo. Limitado, pois também serve para desviar

o foco da luta contra os grandes capitalistas, mas democrático, gerando crise nos regimes e burguesias dominantes.

A impressionante mobilização da campanha pelo Sim na Escócia gerou vários coletivos da campanha radical pela

independência[RIP] encabeçada pelo socialista Tommy Sheridan e pelo SSP. No caso da Catalunha, a esquerda se

agrupou na campanha SI-SI, pleiteando um processo constituinte pleno.

Outro problema fundamental para a esquerda é como combater à direita e o fascismo. Tanto do ponto de

vista armado quanto do ponto de vista político. A defesa da unidade dos trabalhadores, especialmente os imigrantes

é a bandeira central para evitar a xenofobia, principal combustível das organizações fascistas do presente período. A

manifestação do dia 18 de outubro na Itália, da Liga do Norte e o congresso da FN na França sinalizam que estes

setores têm grupos de choque e vão disputar nas ruas seu programa de esmagamento das organizações operárias,

democráticas e combativas.

VII. Nossa orientação

De todas as características da situação mundial devemos nos apoiar nas mais favoráveis para as tendências

da revolução:

O ponto de apoio maior das tendências revolucionarias e de nossa intervenção deve ser alicerçada na

reivindicação dos processos de mobilização revolucionária, nos grandes acontecimentos: Tunísia, praça Tahir, 15 M,

Ocupy Wall Street, junho de 2013 no Brasil, levante na Turquia, agora Hong Kong. Antes estes mesmos processos se

expressaram na Argentina, em 2001, na Bolívia, com a guerra das águas em 2000.

Estes processos levantam uma serie de bandeiras de transição: democráticas, contra as ditaduras, direitos

sociais, civis, ecológicas, em defesa dos recursos naturais, políticas que sem serem diretamente socialistas,

mobilizam e se aproximam de uma linha de combate dos monopólios privados. Na cotidianidade das lutas nacionais

se expressam em lutas que vão desde luta antirracista, Lgbts, direitos das mulheres, movimentos nacionalistas e

indígenas, defesa da Palestina, contra a intervenções imperialista mas também contra os ataques de Talibãs, dos EI,

além da constante e estruturante política de classe, que devem ser o eixo do programa político nos países

capitalistas de desenvolvimento avançado ou médio.

Uma hipótese que se abre: governos anti austeridade no coração da Europa

Page 25: Documento Internacional do MES -  dez 2014

A possibilidade da combinação de lutas e eleições pode levar ao governo Syriza na Grécia e Podemos na

Espanha, organizando um movimento político real, alternativo à austeridade no Sul da Europa. Acreditamos que essa

novidade merece ser apoiada e acompanhada com entusiasmo.

Isso não significa desconhecer os limites. Estamos apoiando Syriza desde 2011, com Luciana Genro

participando do comício final em Atenas em 2012. E com ida de vários militantes e dirigentes para acompanhar esse

processo. No caso de Podemos, fenômeno mais veloz e recente, ainda estamos buscando uma reunião com essa

direção, contudo sabemos de certa confusão a respeito do caráter do governo Dilma. As confusões e vacilações

sobre a política externa em geral tem correspondência na política interna.

Dentro destes movimentos amplos é preciso construir polos marxistas revolucionários que defendam a

estratégia de mobilização permanente e luta pelo poder dos trabalhadores que passa pelo desenvolvimento da auto-

organização democrática do movimento de massas.

Estes acontecimentos devem balizar nossa atuação e ligar nosso trabalho a estas heranças do movimento de

massas e suas demandas. Tomamos a juventude como prioridade. Não tem o peso das traições e derrotas. Sempre

foi a vanguarda nos processos: década de 60 e agora, nas primaveras árabes, no Brasil e agora em Hong Kong. Ao

longo dos últimos 15 anos este tem sido uma marca de nossa corrente: ligar-se aos processos sem deixar de

desenvolver no seu interior um polo marxista. Isso se expressou na presença ativa nos Fóruns sociais mundial e na

atuação sobre o bolivarianismo – sobretudo chavismo

Dentre as várias tarefas, reiteramos a atenção ao lugar da juventude nas vanguardas do mundo. O apoio aos

levantes juvenis como o do México, solidariedade militante. Preparar o acampamento internacional da juventude

2016.

Se apoiar na experiência do PSOL – a campanha de Luciana Genro e sua importância para a corrente

Defendemos com seguir de forma imediata a campanha em torno de Assange e Snowden. Tomar a

campanha democrática é fundamental para hierarquizar nosso nível de relações. A conquista que significou o

contato com Glenn e sua relação direta com Luciana. Seguir desenvolvendo o wikileaks.

Vamos retomar com mais força o trabalho internacional da corrente, privilegiando as relações com a IV

internacional, com setores da esquerda combativa mundial como o Podemos, Syriza, o Bloco de Esquerda português,

abrindo espaço para debater com outras organizações marxistas revolucionárias como a CIT.

VIII. Um debate teórico programático e político

Queremos listas alguns debates urgentes para serem feitos no seio da corrente e da vanguarda socialista.

Pretendemos ir desenvolvendo está agenda política e de discussão teórica ao longo do próximo período. Aqui

apenas assinalamos alguns tópicos.

A importância das eleições. O problema da tática, estratégia e do programa: um programa democrático,

antibancos, por um novo pacto de países devedores. O lugar da Assembleia Constituinte. Assédio ao poder.

Combinação de lutas de rua com eleições. O problema do desvio oportunista e da diluição do sentido de classe.

Page 26: Documento Internacional do MES -  dez 2014

A questão da revolução permanente:- Ditadura democrática poderia ser similar aos governos da esquerda

anti austeridade? O problema do “chicote” da contrarrevolução: os fascistas, LePen e a necessidade de armamento

das massas?

Seria os governos da “esquerda” anti austeridade similares ao que propunha Lenin como Ditadura

democrática ou os “governos de Esquerda” dos II e III congressos da Internacional Comunista- onde tanto Lenin

quanto Trotsky defendiam a possibilidade de conformar governos regionais e nacionais, a partir de eleições com a

presença dos partidos socialdemocratas independentes e de esquerda.

Qual a experiência dos partidos anticapitalistas nos últimos dez anos? Derrota do NPA, processo mais

longevo do Bloco- apesar de seu revés eleitoral, qual impacto de Podemos e Syriza sobre as novas formações? Qual o

lugar dos revolucionários nessas formações?

A aposta na luta de classes. Necessidade do reagrupamento das forças anticapitalistas para enfrentar o novo

período.

A batalha em defesa de um marxismo renovado. Contra os setores do Fórum de São Paulo que buscam nos

isolar: aparatos contrarrevolucionários que existem como o núcleo dirigente do PT, PCdoB, ala burocrática do PSUV,

sua influência sobre os novos fenômenos. Contra as organizações sectárias que tem como centro o isolamento da

realidade, repetindo dogmas.

Colocamos tais discussões, a luz da intervenção real da luta de classes, do acompanhamento da esquerda

mundial, para fortalecer os laços e a unidade daqueles que defendem uma saída socialista e internacionalista para o

século XXI.